RecensãO
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Apresentação Enquadramento Teórico
Problema da autopercepção da aceitabilidade ética das tácticas negociais
Ética e Negociação Contexto sócio-organizacional e os Processos
Sociocognitivos Descrição do estudo de base Objectivos do estudo desenvolvido Método utilizado
Participantes Procedimentos
Análise de resultados Discussão geral e conclusões do estudo Reflexão final
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Eduardo Simões e Maria Benedicta Monteiro, apresentam um estudo sobre a origem do julgamento ético, em contexto de negociação, levantando questões em torno da influência de factores sociais na aceitabilidade de determinadas tácticas negociais mais comuns.
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Algumas referências
Perante a fragilidade e complexidade que a comunicação organizacional implica, mesmo um código de ética bem definido e publicado pode falir (Darley, 1996, 2001)
A maldição do conhecimento, concerne à exigência que se faz aos colaboradores da organização, na compreensão total daquilo que os responsáveis pretendem transmitir. (Camerer, Loewenstein & Weber, 1989)
A ilusão de transparência, acontece quando os responsáveis julgam que os colaboradores seguem à risca aquilo que lhes foi pedido. (Keysar, Ginzel & Bazerman, 1995)
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O sistema de recompensa transmite mensagens, que surgem de forma involuntária mas eficaz, e orientam os colaboradores no sentido do que lhes parece ser mais importante para a organização, mesmo indo de encontro ao que estava estabelecido formalmente.
Quadros organizacionais, que denotam um sentido ético elevado, podem acabar por prejudicar o cliente. (Darley, 2001)
O sistema de recompensas pode ser um factor crítico para a integridade ética das organizações. (Jensen, 2001)
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A natureza da actividade também dita muito do que é aceitável na negociação.
A negociação ocorre em privado e em condições de incerteza, pelo que suscita sempre dúvidas em relação à sua legitimidade ética. As estratégias e tácticas na negociação estão sujeitas à aprovação dos intervenientes, sofrendo com a percepção que cada qual tem delas.
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É difícil evitar a questão ética nos comportamentos de negociação, em especial nos contextos organizacionais. (Raiffa,1982).
Numa negociação em que as partes detêm informação exclusiva, que só cada uma delas conhece, fomentam-se as preferências de cada parte por si. Qualquer informação que surja de uma das partes e que não seja do conhecimento da outra, designa-se “cheap talk” (conversa fiada).(Valley, Thompson e Bazerman, 2002)
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Há 4 grupos de orientações normativas, ligadas à avaliação das estratégias e tácticas negociais (Hitt, 1990):
1- Decisão baseada nos resultados previstos, em que o negociador procura maximizar o interesse próprio;
2- Decisão baseada na legalidade, tendo em atenção as leis e normas sociais vigentes;
3- Decisão baseada na estratégia e nos valores da organização a que pertence, que se apoia no contrato social formado entre o sujeito e a organização em que se inclui;
4- Decisão baseada em crenças e valores pessoais.
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Do ponto de vista ético, há tácticas questionáveis:
Distorção da informação acerca da posição e preferências do negociador, como, por exemplo, exagerar o valor da oferta inicial;
Manipulação deliberada dos processos de inferência do oponente, de maneira a que este conclua incorrectamente, mas de forma favorável ao negociador. Esta manipulação consiste na omissão de informação ou no fornecimento de informação de forma enviesada;
Manipulação da rede social do oponente, para enfraquecer a posição dele, em relação aos seus colaboradores. Pode-se até usar informação que esteja fora do âmbito da negociação;
Procedimentos de negociação de má fé, como, por exemplo, retirar ofertas que haviam sido feitas originalmente ou negar acordos já feitos.
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Orientações divergentes:
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Por um lado:O uso da mentira voluntária faz parte da
negociação, ainda que esta esteja sujeita à aceitabilidade, dependendo de factores e valores pessoais dos negociadores. (Lewicki, Hiam e Olander, 1996)
O engano e a distorção de informação são aspectos esperados e aceitáveis no contexto negocial. (Strudler, 1995)
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Por outro lado: Defende-se a necessidade de preservar
uma “moralidade prática”, de maneira geral nos negociadores. (Dees & Crampton)
Segundo esta linha de pensamento, as informações enviesadas provocam atrasos nas negociações e podem até levar ao abandono das mesmas, se as partes em causa tiverem a percepção de que o acordo não é possível ou não é aceitável.
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O sujeito pode adoptar as normas éticas informais que estão presentes na sua vida organizacional. O ambiente cultural dos negociadores afecta a forma como encaram as normas da organização, no que diz respeito à ética nas tácticas de negociação, assim:
Negociadores de culturas colectivistas-verticais
(importância dos valores do grupo em detrimento dos valores individuais) tendem a usar mais a mentira e o enviesamento da informação.
Negociadores de culturas individualistas-horizontais (carácter individualista, baixo nível de diferenciação hieráriquica) tendem a usar menos a mentira e o enviesamento da informação.
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Os negociadores costumam autojustificar o uso de tácticas eticamente duvidosas, quando têm a expectativa de que o oponente vai utilizá-las, especialmente quando se espera uma situação de assimetria nos ganhos (Tenbrunsel, 1998).
Num estudo de (Thompson, 2000), a maioria dos sujeitos mostrou-se disposta a mentir ou distorcer informação, identificando rapidamente situações em que tal prática seria aceitável.
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A motivação e os interesses influenciam a interpretação que os negociadores fazem das normas (Tenbrunsel, 1998, Tenbrunsel & Messick, 2001).
Se o interesse é mais individual, a mentira surge com mais facilidade (O’Connor & Carnevale, 1997).
O julgamento ético orienta-se para o auto-favorecimento e quando a táctica favorece o negociador, este considera-a mais aceitável.
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Kramer e Messick (1996), ao analisarem a forma como os indivíduos se comportam face a dilemas organizacionais, apresentam três tipos de enquadramento:
Enquadramento contextual; Enquadramento temporal; Enquadramento da identidade.
O enquadramento adoptado é importante para o modo como é visto o risco. Os compradores enquadram as trocas negociais em termos de perdas, enquanto os vendedores o fazem em termos de ganhos.
O papel que o sujeito adopta na negociação influencia o modo cognitivo como ela é entendida e transformada pelos negociadores (Neale & Bazerman, 1991).
No caso do enquadramento da identidade, a identidade social determina o julgamento ético das tácticas de negociação.
É possível que, na altura de julgarem o valor ético de comportamentos negociais, os sujeitos utilizem normas pessoais de aceitabilidade ética, em conformidade com o papel social que desempenham na negociação.
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Na linha dos estudos de Robinson, Lewicki & Donahue (2000).No original, a população participante conta com 762 estudantes, aos quais foi administrado um questionário com 30 itens, em que se apresentavam tácticas negociais comuns que teriam de ser avaliadas numa escala de 7 pontos, quanto à sua aceitabilidade ética. Os estudantes foram sujeitos a simulações prévias de situações de negociação, com o objectivo de se obterem medidas de desempenho negocial. O questionário original foi reduzido para 16 itens, constituindo cinco factores:
Factor 1- Tácticas competitivas tradicionais, ou seja, procedimentos usados frequentemente em contexto negocial competitivo; inclui 3 itens.
Factor 2- Ataques à rede social do oponente, isto é, formas de desqualificação pessoal ou profissional junto de colaboradores do oponente; inclui 3 itens.
Factor 3- Tácticas destinadas a manipular a percepção do oponente; inclui 3 itens.
Factor 4- Tácticas de distorção de informação; inclui 4 itens. Factor 5- Tácticas para obtenção inapropriada de informação da outra
parte; inclui 3 itens.
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Construção de um instrumento que seja útil à investigação em Portugal.
Procura-se analisar a adequação do modelo factorial de Robinson et al (2000) a uma população de negociadores profissionais portugueses.
Procura-se analisar assimetrias de julgamento ético, decorrentes do papel social que cada negociador desempenha.
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Amostra por conveniência, de 198 elementos, dos quais 72 mulheres.
Área industrial, comercial e de serviços.
A dominante profissional destes sujeitos é a negociação de bens, equipamentos e serviços, sendo 97 deles compradores e 101, vendedores.
A experiência profissional em negociação foi avaliada em 4,27 anos (D.P.= 1,38; Mínimo=1; Máximo=18).
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Versão portuguesa do Questionário de Incidentes Negociais, de Robinson et al. (2000).
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Procedeu-se a uma análise factorial que revelou uma
inadequação do modelo relativamente aos dados. A estrutura final do questionário apresenta 12 itens, repartidos por 4 factores:
Factor 1- Tácticas competitivas tradicionais; inclui 3 itens, como no original.
Factor 2- Tácticas para obtenção inapropriada de informação da outra parte; inclui 3 itens, como no original.
Factor 3- Falseamento intencional de informação; inclui 3 itens, retirados de outros factores para formar este novo factor.
Factor 4-Manipulação da relação com constituintes; inclui 3 itens, retirados de outros factores para formar este novo factor.
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No que respeita a hipótese nula, confirmou-se que o papel social exerce efeito significativo sobre a aceitabilidade ética das tácticas negociais.
Os resultados sugerem que os compradores têm tendência a aceitar mais facilmente as Tácticas competitivas tradicionais (Factor 1) do que os vendedores. O contrário ocorre em relação à aceitabilidade da Obtenção inapropriada de informação (Factor 2).
O papel social não influi na aceitabilidade das tácticas relativas à Manipulação da relação com constituintes (Factor 4).
Quanto ao Falseamento intencional de informação (Factor 3), este revelou-se pouco significativo, apesar de se poder inferir uma maior propensão dos compradores admitirem o recurso a este grupo de tácticas.
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Confirmam-se as dificuldades em apresentar um modelo generalizável das orientações dos negociadores, em relação à ética das tácticas de negociação. Os factores contextuais e a constante flexibilidade de interpretação pessoal de cada situação negocial são obstáculos a ultrapassar para a construção deste modelo e de questionário de medida das orientações éticas.
Detectaram-se diferenças em relação à investigação de Robinson et al. (2000), reveladas inclusive pelo desajustamento da estrutura factorial dos questionários construídos, no que diz respeito a variáveis sociodemográficas, nacionalidade dos negociadores e o grau de experiência em negociação.
Os negociadores aceitam com facilidade o uso de tácticas tradicionais competitivas e a obtenção de informação sobre a outra parte. Estes dois conjuntos de tácticas mantêm-se nos dois modelos, porém há diferenças na obtenção inapropriada de informação. Na amostra de negociadores do estudo deste artigo, a importância da obtenção inapropriada de informação é superior que a verificada para os estudantes do estudo original.
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Influência específica da experiência negocial nos negociadores, tendo em conta que no estudo de Robinson et al os participantes eram estudantes e não negociadores profissionais.
O desempenho negocial não pode ser equiparado, o que não possibilita uma comparação válida entre as duas amostras dos dois estudos.
A hipótese da existência de assimetrias no julgamento de aceitabilidade ética de compradores e vendedores parece confirmar-se. Os vendedores consideram mais aceitáveis as tácticas que envolvem a procura de informação sobre o oponente, através de métodos eticamente duvidosos.
A tendência dos compradores assumirem o risco também se pode verificar nos resultados deste estudo.
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Este estudo permitiu a construção de um instrumento que se revela bastante útil na investigação em Psicologia Organizacional e áreas afim, o Questionário de Incidentes Negociais, original de Robinson et al (2000). No entanto, e tal como eles referem, o instrumento necessita ainda de mais trabalho em sua volta, especialmente no que diz respeito à sensibilidade.
Revela-se limitativo o uso de um questionário com um formato de perguntas já desenvolvidas por outros estudos realizados no estrangeiro (outra língua, outra nacionalidade).
É dada muito pouca informação, quer sobre a escala em si, quer sobre os estudos em que foi utilizada.
Considera-se que toda informação teórica apresentada no artigo, não é suficiente para esclarecer determinados pontos do estudo feito.
Não é referido de que modo foi traduzido o teste.
Refira-se no entanto que a escala apresentou boa consistência interna nos testes.
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Outra limitação é a variedade de sistemas de valores que pode haver dentro na mesma cultura. As variáveis regionais (cultura, costumes, crenças, valores e ética) podem influenciar o comportamento humano.
Apesar da amostra ser por conveniência, não se podem fazer generalizações, mas somente gerar ideias ou hipóteses sobre a amostra pesquisada.
Aparentemente, foi dada aos negociadores a oportunidade de agirem dentro da sua própria concepção do que é um processo de negociação. Tal característica da instrumentalização desta investigação permitiu obter resultados reveladores sobre o modo de agir e de pensar dos negociadores, o que é positivo.
Assim, e em concordância com o que dizem os autores, as inferências aqui apresentadas, acerca dos valores éticos e comportamentais dos negociadores, não pretendem ser conclusivas, mas trazem consigo a polémica para o campo comportamental e fazem emergir insights sobre a complexidade do factor cultural e social nas negociações.
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Simões, E., & Monteiro, M. B. (2004). Aceitabilidade ética das tácticas negociais em negociadores profissionais. In J. Vala, M. Garrido & P. Alcobia (Orgs.), Percursos da investigação em Psicologia Social e das Organizações, Vol. I (pp. 159-173). Lisboa: Edições Colibri.