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REFLEXÕES ACERCA DO CONSUMO ESTÉTICO DE CORPOS GORDOS NO UNIVERSO DRAG QUEEN Lua Lamberti (UEM) Suelen Soares Barcelo de Miranda (UEM) Eliane Rose Maio (UEM) [email protected] Resumo Como intuito para este trabalho, apresentam-se reflexões acerca das performances Drags, questionando padrões corporais instaurados socialmente, refutando assim, imagem corporal, identidade e a subversão destes corpos. Como objetivo geral, busca-se discutir as diferentes formas de aceitação que uma artista Drag gorda pode ter nas redes sociais. A metodologia de trabalho refere-se à análise de conteúdo, envolvendo análises dos perfis da rede social Instagram de três Drag Queens, finalistas da sétima temporada do reality show americano RuPaul’s Drag Race, Violet Chachki, Pearl e Ginger Minj. Ante a isto, apresenta-se ao longo do trabalho, como a imagem do corpo gordo repercute artisticamente na sociedade, compreendendo que se tratam de corpos subversivos e muitas vezes são menos apreciadas por tal marcador. Palavras-chave: Performance; Drag Queen; Corpos gordos. Introdução Com base em Camila Moreira e Paulo Santana (2018), constata-se que o programa RuPaul’s Drag Race, bem como os shows da Drag Queen cantora Pabllo Vittar, são permeados por quadros sociais que permitem desenvolver diferentes performances. Para além, possibilitam debates acerca das questões de gênero, sexualidade, identidade e as performances destes corpos no meio social a diferentes públicos. Com isto, se parte da concepção de que a figura da Drag Queen pode denunciar as construções de gênero pelo viés da paródia, da arte ou da reprodução

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REFLEXÕES ACERCA DO CONSUMO ESTÉTICO DE CORPOS GORDOS NO UNIVERSO DRAG QUEEN

Lua Lamberti (UEM) Suelen Soares Barcelo de Miranda (UEM)

Eliane Rose Maio (UEM) [email protected]

Resumo

Como intuito para este trabalho, apresentam-se reflexões acerca das performances Drags, questionando padrões corporais instaurados socialmente, refutando assim, imagem corporal, identidade e a subversão destes corpos. Como objetivo geral, busca-se discutir as diferentes formas de aceitação que uma artista Drag gorda pode ter nas redes sociais. A metodologia de trabalho refere-se à análise de conteúdo, envolvendo análises dos perfis da rede social Instagram de três Drag Queens, finalistas da sétima temporada do reality show americano RuPaul’s Drag Race, Violet Chachki, Pearl e Ginger Minj. Ante a isto, apresenta-se ao longo do trabalho, como a imagem do corpo gordo repercute artisticamente na sociedade, compreendendo que se tratam de corpos subversivos e muitas vezes são menos apreciadas por tal marcador. Palavras-chave: Performance; Drag Queen; Corpos gordos. Introdução

Com base em Camila Moreira e Paulo Santana (2018), constata-se que o

programa RuPaul’s Drag Race, bem como os shows da Drag Queen cantora Pabllo

Vittar, são permeados por quadros sociais que permitem desenvolver diferentes

performances. Para além, possibilitam debates acerca das questões de gênero,

sexualidade, identidade e as performances destes corpos no meio social a diferentes

públicos. Com isto, se parte da concepção de que a figura da Drag Queen pode

denunciar as construções de gênero pelo viés da paródia, da arte ou da reprodução

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de signos sociais (LOURO, 2018). É possível, então, ponderar que a mesma

linguagem artística pode reproduzir ou perpetuar padrões de caráter hegemônicos?

O objetivo geral deste trabalho é discutir as diferentes formas de aceitação

corpo gordo que uma artista Drag pode ter, analisando perfis da rede social

Instagram de três Drag Queens. O recorte trata-se das três finalistas da sétima

temporada, no ano de 2015, do reality show americano RuPaul’s Drag Race, que

estreou em 2009. Violet Chachki, a vencedora, uma Queen magra, tem em seu perfil

1,4 milhões de seguidores. Pearl, uma das finalistas, também magra, é seguida por

1 milhão de pessoas. Ao passo que Ginger Minj, uma Drag gorda, mais velha que as

outras duas, é seguida por 441 mil pessoas. Desse modo, a partir da discrepância

dos números, é possível questionar traços de gordofobia, aversão, descaso,

desrespeito com o corpo gordo, afinal, além de as três dividirem a exata mesma

plataforma, Ginger participou do RuPaul’s Drag Race All Stars, ou seja, esteve

televisionada por duas vezes, e ainda assim não chegou na metade dos números

das Queens magras que apareceram uma única vez.

Entende-se em Santos e Sanchotene (2017) que a gordofobia refere-se a

repulsão à gordura, tanto no fato de engordar, quanto com relação às pessoas

gordas. Essa aversão para Silvana Campos et al. (2016), ocorre devido aos

distúrbios acerca das imagens corporais serem amparados por discursos biomédicos

que validam os padrões sociais, estéticos e corporais, associando o corpo gordo à

falta de saúde e a repulsão, logo, essa caracterização do corpo gordo como doente,

tende a reforçar estigmas e transtornos.

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Desenvolvimento

A arte Drag Queen pode carregar em si a potência de questionar os

constructos de gênero, fazendo-se paródia dos mesmos. Entretanto, mesmo dentro

do universo de artistas subversivas, as padronizações hegemônicas ainda ressoam.

O reality show RuPaul’s Drag Race coroou, até março de 2019, 14 Queens. O

programa funciona como uma paródia dos tradicionais shows de calouros. A cada

episódio, um desafio é proposto para as artistas, que competem entre si e são

julgadas por seus desempenhos e o desfile que fazem ao final. Nenhuma das

vencedoras é uma artista gorda. O número de fãs que acompanham a carreira das

artistas magras ultrapassa em milhões os perfis de outras não magras. Ressalta-se

a problematização quanto à validação de artistas pelo viés do programa televisivo

citado, o foco dessa pesquisa é discutir os traços de gordofobia que permeiam o

público que consome a competição de Drag Queens. No caso das três aqui

analisadas, Ginger é a única que teve bom desempenho em desafios de canto,

atuação e comédia, enquanto as duas magras foram ovacionadas por seus

conceitos de alta costura e moda vanguardista, e mesmo no programa um jurado

levanta o comentário que só alguém com aquele manequim – magro – poderia ficar

bem naquela roupa.

Observando as performances desenvolvidas pelas Queens no programa e as

disparidades com relação ao número de seguidoras/es em suas redes sociais,

considera-se possivelmente, isto ocorra por se ter instaurado na sociedade

definições estéticas corporais, padronizadas. Deste modo, a maior popularidade de

artistas magras é reflexo da indústria capitalista, a qual vende a imagem de corpos

magros e padronizados, instaurando padrões de magreza sobretudo ao corpo que

performa o feminino (CAMPOS, et al. 2016).

Entende-se com Silvana Campos et al. (2016), que a transformação do corpo

em objeto de consumo, perpetua ideais mercadológicos, estéticos e padronizados,

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os quais são mantidos como referências, tanto no âmbito social quanto sexual.

Mediante a isto, aponta-se que a idealização do corpo em nível social e sexual,

volta-se para atender ao padrão de magreza da beleza, rotulando e desqualificando

o corpo gordo e suas performances.

Nesse sentido, a Drag pode desestabilizar os paradigmas engessados quanto

às construções de gênero, então será possível pensar que essa paródia artística

pode, também, ampliar as noções estéticas de corpos com outros marcadores? Às vezes a gente, como drag, se coloca na posição do erro e do engano como representação para criar discussões e reflexões, é esse o pacto ficcional que deve tentar ser instaurado quando a gente age, fala ou existe como drag. Em que momento eu estou me posicionando como um herói, um vilão, uma vítima ou um algoz? Qual a minha posição nessa narrativa que se instaura na dramaticidade que está acontecendo a partir do momento em que eu me monto? (MALONNA, 2018 apud SURIANI, 2018, p. 72).

Pensando na fala da Drag Queen brasileira, Malonna, que é uma artista

gorda, é possível vislumbrar os caminhos políticos e estéticos que a performance

transformista pode perpassar. Se uma artista magra ganha mais apreço do público,

por que uma artista gorda não? Qual parâmetro para discutir a arte que não

perpasse o corpo de quem performa?

Considerações finais

Compreende-se que a sociedade projeta uma padronização da imagem

corporal direcionada às performances do feminino, idealizando corpos magros,

esteticamente alongados, rejeitando assim, corpos que contrariem essa norma. Não

é o intuito aqui solucionar ou esgotar a questão, mas abrir debates que visem

noções fora do padrão estético da magreza, pensar em possíveis belezas que

escapam das normas e muitas vezes não são bem quistas justamente por isso.

Ginger Minj infelizmente não pôde ser coroada, mesmo com seu bom

desempenho em diversas provas durante a competição. Não é o intuito aqui diminuir

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o trabalho da ganhadora, Violet Chachki, pelo contrário, é pensar no quanto o

trabalho de uma Queen gorda precisa se multiplicar para concorrer com uma artista

de corpo padrão, mais facilmente consumível. Se entre 14 vencedoras nenhuma é

gorda, podemos pensar em traços de gordofobia que influenciam as decisões?

Sabendo que desde a quarta temporada o voto popular pesa na decisão, o que isso

diz dos/as fãs do reality? O que uma Queen gorda precisa fazer para receber o

apreço que as magras têm em suas redes sociais? São algumas das questões que

borbulham das problematizações aqui propostas. Referências

CAMPOS, Silvana da Silveira; FERREIRA, Francisco Romão; CARVALHO, Maria Claudia da Veiga Soares; KRAEMER, Fabiana Bom; SEIXAS, Cristiane Marques. O estigma da gordura entre mulheres na sociedade contemporânea. In: PRADO, S. D., et al. (Orgs). Estudos socioculturais em alimentação e saúde: saberes em rede. [online]. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2016. vol. 5, p. 231-249. LOURO, Guacira Lopes. Um corpo estranho. 3ª ver. amp. – Belo Horizonte: Autêntica, 2018.

MOREIRA, Camila Maria Santos Meira; SANTANA, Paulo Henrique Basílio. Pabllo Vittar e o Acionamento de Traços do Contemporâneo. Anais do 23º Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste, Belo Horizonte, MG, Brasil, 2018.

SANTOS, Amanda; SANCHOTENE, Nicole. “Gorda, Sim! Maravilhosa, Também!”: Do Ressentimento à Autoestima em Testemunhos de Vítimas de Gordofobia no YouTube. Anais do 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, Curitiba, PR, Brasil, 2017. SURIANI, Rafael. STREET QUEENS. São Paulo, Ogra Oficina Gráfica, 2018.