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Crises do Capitalismo, Estado e Desenvolvimento Regional Santa Cruz do Sul, RS, Brasil, 4 a 6 de setembro de 2013 REGIÃO METROPOLITANA E DESENVOLVIMENTO: EMBATES, DESAFIOS E INCERTEZAS NA RM DE CAMPINAS-SP Orlando Moreira Junior 1 Resumo: O presente trabalho expõe um debate envolvendo a relação entre criação institucional de uma região metropolitana e o desenvolvimento, especialmente, econômico e social. Prioriza-se uma análise geográfica do tema. Nesta, despontam uma série de questionamentos que envolvem a criação da região metropolitana e os desdobramentos socioespaciais, que nem sempre são favorecedoras do desenvolvimento regional. O referencial empírico é a Região Metropolitana de Campinas-SP, na qual são observadas uma série de aspectos que revelam uma diferenciação espacial entre as municipalidades que a compõe. Ademais, procura-se contextualizar o conjunto das cidades da região a partir dos aspectos econômicos atrelados ao processo de urbanização, por meio do qual é possível verificar a constituição de espaços pautados na competitividade e na diferenciação. Logo, tem-se uma série de fatores que representam desafios e incertezas na gestão e planejamento regional que deveriam estar voltados para a promoção da equidade territorial. Palavras-chave: região, desenvolvimento, metropolização. INTRODUÇÃO Este trabalho é uma reflexão que surge com o desenvolvimento da pesquisa de Doutoramento, realizado pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia do IGCE-UNESP, cujo título é “As cidades pequenas na Região Metropolitana de Campinas-SP: dinâmica demográfica, papéis urbanos e (re) produção do espaço”. Diante da análise que vem sendo realizada até o presente momento emerge a questão voltada ao desenvolvimento regional e local, uma vez que se trata de uma das regiões mais dinâmicas economicamente do estado de São Paulo e do Brasil. A questão do desenvolvimento aparece diante de uma visão de metrópole enquanto espaço de centralidade em relação ao restante do território, dominando e articulando áreas de tamanho significativo. Todavia, o desenvolvimento não ocorre de 1 Doutorando em Geografia pelo IGCE/UNESP. Bolsista CAPES. Contato: [email protected]

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REGIÃO METROPOLITANA E DESENVOLVIMENTO: EMBATES,

DESAFIOS E INCERTEZAS NA RM DE CAMPINAS-SP

Orlando Moreira Junior1

Resumo: O presente trabalho expõe um debate envolvendo a relação entre criação institucional de uma região metropolitana e o desenvolvimento, especialmente, econômico e social. Prioriza-se uma análise geográfica do tema. Nesta, despontam uma série de questionamentos que envolvem a criação da região metropolitana e os desdobramentos socioespaciais, que nem sempre são favorecedoras do desenvolvimento regional. O referencial empírico é a Região Metropolitana de Campinas-SP, na qual são observadas uma série de aspectos que revelam uma diferenciação espacial entre as municipalidades que a compõe. Ademais, procura-se contextualizar o conjunto das cidades da região a partir dos aspectos econômicos atrelados ao processo de urbanização, por meio do qual é possível verificar a constituição de espaços pautados na competitividade e na diferenciação. Logo, tem-se uma série de fatores que representam desafios e incertezas na gestão e planejamento regional que deveriam estar voltados para a promoção da equidade territorial. Palavras-chave: região, desenvolvimento, metropolização.

INTRODUÇÃO

Este trabalho é uma reflexão que surge com o desenvolvimento da pesquisa de

Doutoramento, realizado pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia do IGCE-UNESP,

cujo título é “As cidades pequenas na Região Metropolitana de Campinas-SP: dinâmica

demográfica, papéis urbanos e (re) produção do espaço”. Diante da análise que vem sendo

realizada até o presente momento emerge a questão voltada ao desenvolvimento regional e

local, uma vez que se trata de uma das regiões mais dinâmicas economicamente do estado

de São Paulo e do Brasil.

A questão do desenvolvimento aparece diante de uma visão de metrópole

enquanto espaço de centralidade em relação ao restante do território, dominando e

articulando áreas de tamanho significativo. Todavia, o desenvolvimento não ocorre de

1 Doutorando em Geografia pelo IGCE/UNESP. Bolsista CAPES.

Contato: [email protected]

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forma uniforme em todas as municipalidades de uma região metropolitana. Algumas

tenderam a continuar em permanente estado de estagnação.

Diversos são os problemas que afetam as regiões metropolitanas. As

desigualdades e disparidades sociais e espaciais são visíveis aos olhos. É possível

perceber a existência de bairros com infraestrutura impecável e com residências de luxo,

coexistindo a curta distância, com bairros miseráveis, sem infraestrutura sanitária, com

problemas ambientais graves, com serviços públicos (de saúde, educação e segurança)

deficientes. Ademais, os atuais padrões de desenvolvimento tem resultado na degradação

socioambiental que aflige, sobretudo, as classes de menor poder aquisitivo, como a falta de

condições sanitárias mínimas em muitas áreas, destruição de recursos naturais.

Diante deste cenário, é que o presente trabalho procura discutir acerca da relação

entre a criação de regiões metropolitanas e as possibilidades efetivas de desenvolvimento

regional, tendo como referencial empírico a Região Metropolitana de Campinas-SP.

Ressalte-se que esta proposta está fundamentada numa leitura geográfica do

desenvolvimento regional e territorial. Desta forma, inicialmente procura-se discorrer sobre o

conceito de região na Geografia, procurando estabelecer suas interações com o

desenvolvimento. Em seguida, é feita uma análise crítica da criação de regiões

metropolitanas no país. Posteriormente, é realizada uma leitura da criação da RM de

Campinas, destacando algumas de suas características socioeconômicas e espaciais. Por

fim, procura-se, tendo por base esta região, discutir as interações entre o chamado

desenvolvimento e algumas questões ligadas aos processos econômicos e socioespaciais.

O CONCEITO DE REGIÃO NA GEOGRAFIA

A Geografia preocupa-se, principalmente, com a distribuição e organização dos

elementos no espaço. O estudo da região na Geografia estabelece a diferenciação de áreas

considerando o aspecto econômico, social, político, administrativo ou as condições naturais.

A concepção de região de Vidal de La Blache foi fundamental para as bases da Geografia

Regional, como destaca Sposito (2004), partindo da descrição dos aspectos físicos até

atingir os aspectos humanos, inicialmente, pela descrição da população e, posteriormente,

das relações econômicas, ou seja, estabelece uma combinação do conjunto de elementos

humanos e naturais.

Benko (1999) contribui com a compreensão histórica da interação entre economia e

espaço que dão suporte na construção daquilo que poderia ser denominado de Ciência

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Regional. Para tanto, se ampara na forte base econômica que fortaleceu o desenvolvimento

das teorias de localização, a partir da hierarquização das regiões, das cidades e de suas

áreas de influência. Esta abordagem, analítica e teórica, por muito tempo exerceu influência

sobre o pensamento geográfico, pois reúne predicativos que permitem sua interpretação: a

localização das atividades econômicas; a organização e estruturação do espaço; as

interações espaciais; e, o desenvolvimento regional.

Espaço, território, região, lugar e paisagem são conceitos-chave na Geografia.

Outrora considerada uma das mais importantes pela Geografia Clássica, o conceito de

região junto com o de paisagem, sofreram um relativo desprezo por parte dos geógrafos por

certo período. Os conceitos de espaço e de território caíram nas graças da Geografia e

dominaram o debate.

No entanto, a palavra região, bem como outros conceitos geográficos, sempre teve

largo uso pelo senso comum. Está presente em matérias jornalísticas, em planos de

governo ou mesmo utilizada no dia a dia para delimitar uma porção da superfície terrestre.

Portanto, cabe aqui uma preocupação geográfica, do ponto de vista científico, para tal

conceito. Este, sempre esteve ligado à diferenciação ou divisão da superfície terrestre. Isto

se estabelecia em função de alguma particularidade ou singularidade de sua realidade física

e/ou humana. Todavia, ela tem assumido novos e diferentes significados.

Convém retomar os ensinamentos de Corrêa (1991), Gomes (1995) e Lencione

(1999) quando clarificam que “região” não é um conceito unívoco e incontestável. Sua

aplicação não é exclusivamente geográfica, apesar de ser na Geografia que se encontram

as bases do desenvolvimento de conceitos e noções relativos à região (LENCIONI, 1999).

Porém, mesmo no âmbito desta ciência, este conceito assume variadas definições pelas

diversas correntes do pensamento geográfico.

Na Geografia Alemã despontou a noção de região natural. Já na Escola Francesa a

região surge como um dado concreto, no qual se desenvolve o conceito de região

geográfica. Esta seria uma extensão territorial onde se entrelaçam elementos humanos e

naturais, visto que, este conjunto de traços característicos grava no espírito do geógrafo a

ideia de região (VIDAL DE LA BLACHE, 1982). Além de levar a uma regionalização do

território francês, de acordo com as regiões geográficas, esta concepção também

influenciou, por exemplo, a primeira regionalização do Brasil.

A Escola Norte-Americana representa um momento de transição metodológica. De

acordo com Gomes (1995), a região é para Hartshorne uma construção intelectual. Esta

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corrente traz a noção de regionalização ao associar o espaço ao caráter idiográfico ou

nomotético da realidade. Dentro desta corrente, Lencione (1999), aponta que a Geografia

pode ser idiográfica quando estuda a relação de fenômenos particulares numa determinada

área e nomotética quando os fenômenos podem ser classificados em categorias,

possibilitando a dedução de leis gerais.

Para a Geografia Quantitativa segue a ideia de uma Geografia mais teórica. Nesta

escola a região é uma classe de área. Pode ser definida, estatisticamente, como um

conjunto de lugares onde as diferenças internas entre esses lugares são menores que as

existentes entre eles e qualquer elemento de outro conjunto de lugares (CORRÊA, 1991).

Ou seja, as regiões são identificadas a partir de dados estatísticos. Esta corrente dá

destaque à explicação de padrões espaciais, via teorias de localização e de

desenvolvimento regional.

A Geografia Radical, segundo Gomes (1995), critica a região funcional e a técnica

estatística da corrente Quantitativa. Esta corrente do pensamento geográfico concebe a

região como parte de uma totalidade histórica e, portanto, não harmônica, daí a ênfase no

desenvolvimento desigual e combinado e no subdesenvolvimento (LENCIONE, 1999). A lei

do desenvolvimento desigual e combinado traduz-se, espacialmente, num processo de

regionalização, ou seja, de diferenciação de áreas. Assim, a região tem como característica

essencial a sua inserção na divisão territorial do trabalho e a associação de relações de

produção distintas. Nesta direção, Sposito (2004), embasado por uma Geografia Regional

marxista, afirma que o pensamento geográfico considera a incorporação da variedade local

à dinâmica capitalista, na qual a reestruturação industrial leva a reestruturação regional.

Fica explícito que as várias correntes do pensamento geográfico atribuíram

importância diferenciada para o estudo regional. Estes sempre tiveram carregados de um

arcabouço ideológico e político. O que influenciou a sua concepção, ora como plano de

discurso ora como objeto da prática. Ao mesmo tempo em que é inevitável refletir sobre sua

influência e nas contribuições que mantiveram com as políticas de planejamento e

desenvolvimento pela esfera pública, principalmente.

Afinal, refletir sobre a região envolve considerar os pontos de vista ou aspectos

econômicos, sociais, políticos, naturais, administrativos e a escala. Sendo que este último

sofre, na atualidade, as consequências diretas de um mundo globalizado. A globalização faz

com que se tenha um mosaico tão fragmentado de unidades espaciais que ou a região

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muda de escala ou se dissolve entre áreas descontínuas e redes globalmente articuladas

(HAESBAERT, 1999).

Contudo, a globalização também representa um discurso de possível

homogeneização do espaço mundial. Isto remonta para a ideia de que as regiões, neste

contexto, se dissolvem. Assim, na visão descrita por Haesbaert (op. cit.), tem-se uma

contraposição com a velha ideia de região como unidade espacial contínua, não

fragmentada. As questões regionais, conforme o autor, devem ser analisadas, no contexto

atual, a partir dos territórios-rede. Este representaria o papel articulador entre diversas

localidades ou países, visando estratégias de inserção no mercado globalizado.

Vê-se, assim, que a região engloba, simultaneamente, aspectos diversos. As

relações econômicas, políticas e sociais que se manifestam na escala local, são fortemente

influenciadas pelos interesses globais. Por conta disto, a questão da escala, cada vez mais,

é incorporada ao debate urbano e regional. O ordenamento territorial, particularmente nesse

momento de novos arranjos espaciais, voltados à inserção dos espaços à economia

globalizada, sofre influência de fatores associados a transformações multi-escalares.

No Brasil, os estudos regionais adquiriram importância a partir da criação do

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1937. Desde então, diversos

estudos procuraram discutir tanto o processo de regionalização do país quanto elaborar

estudos e políticas voltados para o crescimento econômico. Em certa medida, a região, em

geral, tendeu a manter uma relação intrínseca ao planejamento. Não por acaso, muitos

associam o insucesso dos planos de desenvolvimento regional, no país, ao descrédito do

próprio conceito de região.

Neste contexto a concepção de desenvolvimento regional é substituída pela ideia

de desenvolvimento territorial. Mas isto não significa que as regiões deixaram de existir.

Pelo contrário, assumiram uma maior complexidade analítica. O comando econômico e os

interesses do capital ditam a direção dos fatores favoráveis à localização das atividades

desempenhadas numa região ou em determinada localidade. O desenvolvimento está

vinculado à noção de modelo na análise e de ordenação do território. Há um impacto

recíproco nos territórios e nos modelos de desenvolvimento, pelos atributos ou carências

dos territórios e pelas estratégias de desenvolvimento implementadas (VITTE, 2007)

Ante estes pressupostos, o presente trabalho visa contribuir na reflexão do

desenvolvimentos local e/ou regional da Região Metropolitana de Campinas, abordando

temas frequentes à Geografia Econômica e à Geografia Regional. Inicialmente, é valido

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destacar que a dinâmica territorial desta região será definida aqui, de acordo com a proposta

de Pires (2006), cuja base advém da escola da regulação. Nesta perspectiva, a dinâmica

territorial pode ser compreendida como um encontro entre as estratégias das empresas com

um potencial local de recursos que revelam ou ativam essas estratégias (PIRES, 2006).

Sem deixar de considerar, é claro, o papel da conformação institucional de uma região.

Sob este olhar o espaço, a região ou o território se apresentam como instrumentos

para pensar a organização da sociedade, suas atividades e relações. No entanto, indiferente

da categoria de análise, deve-se considerar o fato de toda cidade ter sua biografia, o que

dificulta a elaboração de generalizações. No caso de se considerar o estudo sobre as

regiões metropolitanas, esta problemática se intensifica devido q diversidade das formas e

significados que elas assumem no território brasileiro.

AS REGIÕES METROPOLITANAS NO BRASIL: AS DIMENSÕES GEOGRÁFICA,

INSTITUCIONAL E REAL

O estudo das metrópoles foi, no passado, campo de interesse da Geografia

Regional. Isto devido, sobretudo, a sua ordem de grandeza e de influência sobre

determinada área. Posteriormente, os estudos de Geografia Urbana permitiram aprofundar e

identificar os principais paradigmas sobre a cidade e o urbano. Numa perspectiva para além

da relação entre a forma e a função, comumente estabelecida por urbanistas, arquitetos e

engenheiros, a Geografia Urbana se mostra mais preocupada com as relações entre forma

e conteúdo.

Diante disto, cabe aqui refletir sobre a criação desenfreada que vem ocorrendo no

país nos últimos anos. Este aspecto cria, por um lado, embates teóricos e experienciais

acerca de região metropolitana, pois existe na maioria das vezes, um descompasso entre a

concepção geográfica e institucionalizada desta forma urbana e o fato concreto em sua

dimensão espacial. Por outro, recai sobre as incertezas nos objetivos legais da criação de

uma região metropolitana enquanto meio efetivo de promover o desenvolvimento regional.

O processo de metropolização é uma característica marcante da urbanização

brasileira. Em 2010, o país possuía trinte e nove regiões metropolitanas distribuídas por todo

território nacional. porém, estas são complexas e heterogêneas, cujas diversidades se

manifestam em termos de tamanho de área e de população, além da existência de

municipalidades com variadas classes populacionais.

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De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a Região

Metropolitana é uma região estabelecida por legislação estadual e constituída por

agrupamentos de municípios limítrofes (que fazem fronteiras), com o objetivo de integrar a

organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.

As regiões metropolitanas brasileiras foram criadas por lei, em 1973, que as definiu

como um conjunto de municípios contíguos e integrados socioeconomicamente a uma

cidade central, com serviços públicos e infraestrutura comum, que deveriam ser

reconhecidos pelo IBGE. Todavia, a Constituição Federal de 1988 delegou aos estados a

competência para criar e institucionalizar regiões metropolitanas:

Os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum. (BRASIL, 1988)

Portanto, cada unidade federativa do Brasil tem autonomia para criar suas Regiões

Metropolitanas, sendo a concentração populacional e a conurbação os principais critérios

utilizados. A formação dessas áreas objetiva a realização de políticas públicas destinadas à

melhoria da qualidade dos serviços públicos, englobando todos os municípios da região.

Apesar de uma região metropolitana, no Brasil, ser instituída por lei, deve-se

admitir que enquanto fato concreto do processo de urbanização, uma região metropolitana

não se cria. Os processos e fenômenos que engendram a produção do espaço, por si,

consolidam sua formação. Isto significa que esta não pode ser criada, apenas reconhecida,

enquanto fenômeno geográfico. Sua institucionalização ocorre com a finalidade de integrar a

organização, planejamento e gestão de interesse comum dos municípios.

Num estudo publicado em 2011 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

(Ipea) contribui para a análise desta situação. De acordo com a pesquisa, a mudança na

Constituição de 1988, que atribui a competência de criar regiões metropolitanas aos

estados, colaborou para intensificar o fenômeno de metropolização institucional. Recai-se

num descompasso entre região metropolitano enquanto fenômeno geográfico e como forma

espacial institucionalizada.

Como resultado tem-se situações díspares no país. Existem regiões metropolitanas

compostas tanto por apenas dois municípios (como é o caso de Macapá), quanto por

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regiões com mais de trinta (como são os casos, por exemplo, de São Paulo e Belo

Horizonte). Também cria-se aquelas sem a existência de uma metrópole propriamente dita.

Diversos apontamentos gerais podem ser elencados nesta análise de

incongruência entre as dimensões geográfica, institucional e real de uma região

metropolitana. Pode-se acrescentar, ainda, a existência de regiões metropolitanas com

população total inferior a 500 mil de habitantes (Macapá, Sudoeste Maranhense e Lages).

Há, também, casos em que se tem a preponderância de cidades que podem ser

consideradas pequenas na composição de muitas das regiões metropolitanas (Carbonífera,

Vale do Aço e Agreste, por exemplo). Nota-se, então, grandes diferenças na área territorial e

no número de municípios que conformam as regiões metropolitanas.

Toda esta variedade de contextos anuncia que, mesmo havendo uma

institucionalização desenfreada de regiões metropolitanas no país, análises sobre elas

devem recair sobre o seu processo de metropolização. Isto significa apontar que este

cenário complexo, variado e multifacetado de regiões metropolitanas revela uma

incongruência entre uma definição geográfica e uma definição institucional (administrativa)

deste fenômeno urbano no território nacional. Os interesses políticos ou a falsa ideia de que

a criação de uma região metropolitana para gerir determinado território é a melhor saída

para resolver os chamados “problemas urbanos” ainda se sobressai, em detrimento de uma

concepção socioespacial.

A REGIÃO METROPOLITANA DE CAMPINAS

Quando falamos de Campinas é possível remeter o pensamento para diversas

direções. A cidade de Campinas, uma das maiores cidades do Estado de São Paulo e de

grande dinamismo econômico, a qual poder-se-ia atribuir o conceito de tecnopolo definido

por Benko (2002). A Região Administrativa de Campinas, composta por 90 municípios, e

que, nos anos de 1960 e 1970, tornou-se um dos principais eixos de desenvolvimento do

Estado de São Paulo, o que lhe conferiu grande dinamismo populacional. A Região

Metropolitana de Campinas, formada por 19 municípios e que representa uma das áreas

mais dinâmicas economicamente do território nacional.

É interessante observar como Campinas envolve diferentes leituras regionais.

Campinas enquanto Região Metropolitana, Administrativa, de Governo, de áreas de

influência delimitadas pelo IBGE, ou mesmo como metrópole de equilíbrio ou polo de

crescimento. Estas diversas leituras de Campinas ou de suas diferentes regiões tornam-se

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ainda mais complexas ao considerar que existe ao redor da metrópole um conjunto de

cidades de porte médio juntamente com um número significativo de cidades pequenas.

Adiciona-se o fato de que muitas cidades que não faz parte da Região Metropolitana terem,

também, interligações importantes com Campinas.

Portanto, em termos de regionalização, tem seu início nos anos de 1960. Momento

fortemente influenciado pelas políticas territoriais de desenvolvimento. Já a criação da

Região Metropolitana ocorre no ano 2000, pela Lei complementar 870, obedecendo-se o

artigo 153 da Constituição Estadual e a Lei complementar 760/1994. Esta lei explica o

princípio de integração que deve estar presente na organização regional do Estado.

Na proposta de análise deste artigo será considerado os municípios que compõe a

Região Metropolitana de Campinas. Esta representa uma das regiões mais dinâmicas do

cenário econômico brasileiro. Na figura 1 está registrada a espacialização dos municípios

que formam a Região Metropolitana de Campinas., com base nos dados de 2010.

Figura 1: Mapa dos municípios que formam a Região Metropolitana de Campinas, por classe de tamanho populacional em 2010. Org. Orlando Moreira Junior, 2013.

Na figura pode-se observar que a Região Metropolitana de Campinas, em 2010,

possuía três municípios com menos de 25 mil habitantes, quatro com população entre 25 e

30 mil habitantes, três com população entre 50 e 75 mil, um na faixa entre 75 e 100 mil e

oito municípios com mais de 100 mil habitantes. Nota-se que nas duas primeiras classes, a

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maioria dos municípios encontra-se localizados na parte norte da metrópole, enquanto que

na porção leste e oeste, com exceção de Monte Mor, estão aqueles com mais de 100 mil.

Uma característica recente é da região é o elevado crescimento da população

urbana nas últimas décadas. A maioria dos municípios apresentou, de acordo com o censo

de 2010, mais de 90% de população urbana, índice maior que a média nacional. Como

consequência do aumento do número de pessoas vivendo nas cidades, ocorre o aumento

da expansão do espaço urbano dos municípios e da Região Metropolitana como um todo.

Um exemplo disto pode ser verificado na figura 2, que apresenta a evolução da mancha

urbana, em parte da região, entre os anos de 1973 e 2005. Apesar de omitir os municípios

de Americana, Santa Bárbara D´Oeste, Cosmópolis, Nova Odessa, Artur Nogueira, Santo

Antônio de Posse, Engenheiro Coelho e Holambra, a figura revela dois momentos diferentes

na composição da mancha urbana metropolitana. Esta figura permite observar o aumento da

urbanização e o crescimento do espaço urbano que dão condições geográficas para compor

um processo de metropolização.

Figura 2: Evolução da mancha urbana na Região Metropolitana de Campinas – 1973 e 2005. / Fonte: Adaptado de Melgaço, 2008.

Dentre os processos físicos que levam à metropolização, a implantação de rodovias

desponta como elemento fundamental, visto que propicia condições para integração entre

as cidades e a intensificação dos fluxos. Na atualidade, a Região de Campinas conta com

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um amplo sistema viário, bastante ramificado. Possui uma série de rodovias que servem de

ligação entre as cidades da área metropolitana. Além disto, apresenta importantes eixos que

dão acesso a outras regiões, fundadas em momentos diferenciados: Rodovia Anhanguera

(1940), Rodovia Dom Pedro (1972), Rodovia dos Bandeirantes (1978), e Rodovia Santos

Dumont (década de 1980).

Em suma, pode-se considerar que a Região Metropolitana de Campinas conta com

uma ampla malha viária que permitiu uma densa ocupação urbana, organizada em torno de

algumas cidades de porte médio e grande principalmente, certamente muito mais integrado

do que outras formas de conurbações e redes de cidades. Se por um lado, a urbanização e

industrialização ocorridas na Região geraram grandes potencialidades e oportunidades em

função da base produtiva, por outro lado, tem-se a proliferação de favelas, violência e

pobreza que denunciam as desigualdades socioespaciais.

O padrão de urbanização da região apresenta tanto áreas interligadas

espacialmente quanto áreas dispersas pelo território, distantes e descontínuas do núcleo

metropolitano. Num primeiro momento a urbanização é marcada pelo forte processo de

verticalização, em especial, na porção mais central e mais densamente urbanizada da

região. Posteriormente, muitas das novas áreas urbanas incorporadas representavam

loteamentos fechados e condomínios horizontais, residenciais e empresariais, localizados,

geralmente, distante dos centros urbanos tradicionais e ancorados no sistema rodoviário e

no transporte individual.

Ademais, a Região Metropolitana de Campinas é marcada, por um lado, pelo forte

dinamismo econômico e, por outro, pelas desigualdades socioespaciais. Mesmo a estrutura

industrial diversificada e de alta tecnologia, bem como os serviços especializados,

característico do dinâmico setor terciário, são marcados por uma forte concentração

espacial, como pode ser verificado na figura 3. Nesta é possível identificar que a localização

tanto das indústrias quanto dos serviços especializados encontram-se altamente

concentrados no núcleo metropolitano e em nos espaços atravessados, especialmente,

pelas rodovias Anhanguera e Bandeirantes. Nota-se também que aquelas cidades com

populações inferiores a 50 mil habitantes são as que possuem números menores de

indústrias e serviços especializados, como é o caso, por exemplo, de Engenheiro Coelho,

Artur Nogueira, Santo Antônio da Posse, Holambra, Cosmópolis e Monte Mor.

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Figura 3: Localização das indústrias e dos serviços especializados na Região Metropolitana de Campinas (2002). Fonte: CAIADO; PIRES, 2006.

O processo de expansão urbana e da organização espacial da população e das

atividades econômicas expressam uma ocupação do espaço metropolitano marcados,

contraditoriamente pelos fenômenos da dispersão e da concentração. Dispersão territorial

da malha urbana e da população e concentração de atividades econômicas, serviços e

infraestruturas em alguns centros urbanos.

As transformações recentes na distribuição de atividades econômicas no território metropolitano, associadas à nova fase de processo produtivo mundial, refletem-se na organização espacial e funcional das metrópoles, redefinindo as relações de concentração e centralidade entre os municípios que a constituem. (CAIADO; PIRES, 2006, p. 291)

Uma consequência deste processo é a necessidade de deslocamentos pendulares

que são intensos na região. Um número significativo de pessoas circulam em carros

particulares, ônibus, fretados ou vans para se dirigirem até os locais de trabalho, as

universidades; para consumir nos shoppings centers ou nos grandes centros comerciais; ou

para usufruir de serviços especializados diversos.

Deste modo, muitas cidades são, corriqueiramente, intituladas de cidade dormitório,

devido os movimentos pendulares diários. Nestas cidades, ditas de caráter essencialmente

residencial, parcela da população realiza suas atividades, principalmente aquelas

relacionadas ao trabalho, em uma cidade próxima, geralmente de maior importância

econômica. A distância entre localização da população e localização dos empregos são

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fatores que contribuem para a exclusão de parte da população metropolitana (CAIADO;

PIRES, 2006). Segundo estes autores, como meio de amenizar a situação o poder público

adota políticas habitacionais e de regulação urbana, destinadas prioritariamente à população

de baixa renda. Contudo, estes empreendimentos, os conjuntos habitacionais, geralmente,

representam outras formas de contribuir com os processos excludentes, visto que se

localizam as margens das cidades e representam situações urbanas precárias de

urbanidade.

Estas características da forma de expansão, uso, ocupação e organização espacial

da Região Metropolitana de Campinas simbolizam uma complexidade que envolve questões

que atingem o nível metropolitano. O espraiamento das áreas urbanizadas, a concentração

das atividades econômicas, o adensamento de favelas, o aumento do número de bairros

ocupados por população de baixa renda, o aumento do tempo de deslocamentos, dentre

outros aspectos ligados a fortes processos de segregação espacial e exclusão social

representam desafios significativos para se pensar numa gestão metropolitana e na própria

busca do desenvolvimento regional.

METROPOLIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO NA RM DE CAMPINAS

A temática do desenvolvimento não é alheia ao debate geográfico. Afinal, o

desenvolvimento regional envolve a construção de um pensamento sobre a organização do

espaço. Esta leitura envolve questões referentes ao desenvolvimento econômico, humano e

ambiental. Em suma, a primeira se insere no paradigma da eficácia cuja medida principal é

o da produtividade; o segundo contempla o paradigma da equidade e tem na distribuição o

principal comedimento; e o último está pautado no paradigma da sustentabilidade e na

medida da preservação. Neste trabalho, o foco é refletir acerca do desenvolvimento

econômico principalmente, apesar de não deixar de considerar as demais dimensões.

Em estudos geográficos, o ato de debruçar o olhar para o desenvolvimento

regional, não raramente, é alvo de críticas, cuja justificativa principal seria a abordagem

economicista que se adota. Existem diversas discussões sobre o que se entende por

desenvolvimento, devido, sobretudo, o seu caráter ideológico. O que vale destacar é que o

desenvolvimento não pode ser visto como sinônimo de crescimento econômico. Este é uma

condição necessária, mas não suficiente para a ocorrência do desenvolvimento, que deve

contemplar também melhorias na qualidade de indicadores sociais. O Brasil, por exemplo,

entre as décadas de 1950 e 1980 teve grande crescimento econômico sem que ocorresse o

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seu pleno desenvolvimento, pois as desigualdades e injustiças sociais permaneceram, bem

como a degradação ambiental se intensificou.

Se, num primeiro momento, o desenvolvimento regional esteve diretamente

associado à industrialização ou o processo de concentração espacial da indústria, a partir do

final do século passado, o modelo de desenvolvimento esteve fortemente inspirado na teoria

do desenvolvimento endógeno que prioriza os agentes locais, tendo forte correlação com o

processo de municipalização das políticas públicas e gestão compartilhada dos municípios

que integram uma mesma região.

Numa análise que engloba uma região metropolitana, refletir sobre o processo de

metropolização, de modo geral, e da metrópole, em particular, envolve a compreensão de

três perspectivas analíticas. De acordo com Klein et al (1999), primeiramente, tem-se a

metrópole como espaço de dominação, focada na questão do Estado e na centralidade de

uma área. A segunda perspectiva procura explicar as hierarquias e a ordem das cidades e

regiões dentro dos estados nacionais – a metrópole de equilíbrio territorial. A última está

associada à teoria do desenvolvimento polarizado, do qual foram lançadas as bases do

economista François Perroux.

A compreensão do desenvolvimentos regional sob o conjunto da região

metropolitana deve ser vista com base no entendimento das diferenciações que ocorrem e

das disparidades territoriais. A existência de centros urbanos de diferentes portes, com

dinâmicas econômicas diferenciadas ou mesmo a existência de especificidades locais

interferem tanto na renda dos habitantes quanto nas variadas funções que cada cidade pode

desempenhar. Por conta destes fatores, cidades com porte populacional semelhante

possuem desempenho econômico bastante diferentes, variações em termos de vigor,

modernização e desenvolvimento técnico das atividades, dependendo de sua localização

geográfica.

A análise a partir da economia política do espaço centra-se tanto no objeto quanto

no processo que o constitui. Neste sentido, o entendimento da produção do espaço é

fundamental para compreender a organização espacial da economia e da urbanização – no

qual o espaço é explicado pelo seu uso – em diferentes momentos históricos. Portanto, o

espaço deve ser concebido enquanto expressão de uma ordem econômica e uma ordem

social que se estabelece. Os procedimentos adotados por essa forma de olhar o espaço

utilizam diversos aspectos que ajudam a entender as dinâmicas espaciais em toda a sua

complexidade. Dentre eles, pode-se destacar: a acumulação de outros tempos; as

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temporalidades; a estruturação urbana e das cidades; as relações de produção; a divisão

territorial e técnica do trabalho; a atuação ora conflituosa ora harmoniosa entre os agentes

econômicos, políticos e sociais; as vantagens comparativas locacionais; as alterações no

regime de regulação que alteram a organização econômica.

Olhar a Região Metropolitana de Campinas sob esta perspectiva analítica permite

analisar geograficamente as mudanças e permanências das funções urbanas e econômicas

que as cidades assumem na composição da rede urbana. Campinas possui aspectos

notadamente tecnopolitanos, utilizando o termo de Benko (2002), contudo, paradoxalmente,

apresenta atributos que a difere da definição do autor. Uma das características desta região

é a estrutura regional desequilibrada – centro-periferia – não integrada de forma uniforme e

com alto grau de concentração. Este quadro revela o processo de seletividade espacial que

se amplia com a globalização que, conforme Benko e Pecqueur (2001), não significa

homogeneização, mas, ao contrário, diferenciação e especialização.

Estas considerações remetem a revisitar diversas discussões no campo econômico.

Além de reportar à ideia das teorias de localização – não somente enquanto modelo –, mas

como meio de compreensão da disposição das diversas atividades em determinado

contexto espacial e temporal, coloca em questão o próprio posicionamento estratégico das

empresas. A importância dos recursos para o território também despontam nesta

apreciação, como pode ser visualizado em Benko e Pecqueur (2001), para os quais os

territórios oferecem recursos específicos, intransferíveis e incomparáveis no mercado.

Poder-se-ia também falar das vantagens comparativas locais – como infraestruturas locais,

externalidades a baixo custo e mão de obra barata –, ou das vantagens competitivas das

empresas (PORTER, 1993).

Nesta perspectiva, a metropolização deve ser percebida como a base de um

reforço territorial do poder econômico. Diante disto, a opção metodológica propicia verificar

os diferentes espaços de uma área metropolitana que possuem variações economicas

distintas, tanto espacialmente quanto em suas temporalidades. Sendo que, estes aspectos

devem ser observados, também, sob a luz da dinâmica demográfica que influencia e é

influenciada pela organização econômica, pela oferta de empregos e pela localização das

empresas, por exemplo.

Vitte (2007) expõe de modo coeso as experiências de políticas de desenvolvimento

econômico local e seus impactos no território. De modo geral, a autora destaca que a

Região Metropolitana de Campinas goza de setores e plantas industriais modernas

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articuladas a grandes e complexas cadeias produtivas, bem como um setor terciário

bastante dinâmico e diversificado. No entanto, seu desenvolvimento local deve ser

observado a partir da sinergia e inovações produzidas entre as instituições, grupos e

indivíduos. A autora cita, no âmbito organizacional, o papel de algumas formas de

cooperação entre instituições, como a Fundação Fórum Campinas (FFC)1, a Companhia de

Desenvolvimento do Polo de Alta Tecnologia de Campinas (CIATEC)2 e a Agência

Metropolitana de Campinas (AGEMCAMP)3.

Além destas formas de cooperação institucional, a autora adiciona variadas

estratégias de desenvolvimento local que são implementadas pelas municipalidades.

Destaquem-se os municípios que compõem o Circuito das Águas (Pedreira e Jaguariúna), o

Circuito das Frutas (Valinhos, Vinhedo e Itatiba), o Arranjo Produtivo Local das Flores

(Holambra) e parques temáticos como o Hopi Hari e Wet´n Wild (Vinhedo). Pedreira,

também é conhecida pela sua tradição na produção cerâmica e porcelana, sendo que suas

peças de porcelana representam 50% da produção nacional e cerca de dois terços da

receita municipal.

É válido também delinear uma análise das atividades econômicas e sua distribuição

no conjunto da região. Nesta, pode-se destacar a distribuição do PIB por setor e a

distribuição das atividades na região. A figura 3 mostra o desempenho dos setores na

participação do Produto Interno Bruto (PIB), nos anos de 1970 e 2009.

Figura 4: Participação do PIB por setor nos municípios da RM de Campinas (1970 e 2009).

Fonte: IBGE. / Org.: Orlando Moreira Junior, 2013.

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Observa-se uma diferenciação expressiva na distribuição dos setores por

municipalidade. O primeiro setor perde espaço, mantendo, em 2009, certa relevância para a

economia dos centros urbanos de menor porte, em especial em Holambra e Engenheiro

Coelho, que se emanciparam na década de 1990.

O segundo setor, tido como principal em 1970, perde espaço para o terciário.

Porém, ainda mantém importância considerável para a região como um todo e para as

cidades, em particular. Porém, é válido uma leitura diferenciada deste, afinal enquanto

existem centros onde despontam as indústrias de alta tecnologia (Campinas e Jaguariúna,

por exemplo) ou fortes no setor petroquímico (Paulínia), existem, em contrapartida cidades

em que predominam as indústrias mais simples (Monte Mor, por exemplo).

Já a quantidade de serviços requeridos na região metropolitana é variada e imensa.

Tanto aquela que se destaca para dar suporte a um setor industrial forte, quanto àquelas

que são impulsionadas pela atividade agrícola moderna, nas cidades pequenas. As

possibilidades de serviços especializados ou modernos parecem aumentar com o tamanho

e o nível funcional da cidade, já indicava Santos (2008).

Também é importante discutir as diferentes tipologias dos municípios, tendo por

base nas atividades que desenvolve. Esta indicação é fundamental para compreender,

economicamente, os papéis desempenhados pelas cidades nas no contexto de uma região

metropolitana. Como auxílio para esta apreciação será utilizado o “Atlas da Economia

Paulista” elaborado pela Fundação SEADE (2006), cuja metodologia se baseia na

participação do PIB, sendo que a representação da Região Metropolitana de Campina está

exposta na figura 5.

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Figura 5: Tipologia dos municípios da Região Metropolitana de Campinas segundo as atividades desempenhadas, em 2006. Fonte: SEADE, 2006./ Org.: Adaptado por Orlando Moreira Junior, 2013.

O cenário econômico descrito na figura demonstra a função principal que cada

municipalidade assume ante a constituição de uma rede urbana regional. Nota-se uma

variação entre as cidades pequenas. Com base na teoria dos circuitos da economia urbana

apresentada em Santos (2008), o cenário descrito na figura anterior ajuda a explicar as

relações externas da cidade, seja com sua região de influência, seja com outras cidades

(SANTOS, 2008). Nota-se, na região metropolitana, um circuito superior constituído por

instituições financeiras; comércios; indústrias de exportação e modernas; e serviços

especializados. Concomitantemente, há um circuito inferior bem marcante, constituído

essencialmente por fábricas com baixo vigor tecnológico; comércio e serviços não-

modernos; e outras atividades de pequena dimensão e baixa utilização de capital intensivo.

Sabe-se que, hoje, estas características se fazem perceber, de forma diferenciada,

na maioria das cidades brasileiras, porém o que vale aqui é a análise regional. O

desenvolvimento de uma economia urbano-regional, na região metropolitana, cria um

comportamento espacial que reafirma a lógica centro-periferias. Afinal, as cidades locais são

colocadas na periferia socioeconômica e pagam um preço elevado por sua defasagem.

Recria-se, portanto, condições para o aumento da “pobreza” das cidades, seja em suas

características urbanas ou urbanísticas, seja em seus aspectos sociais ou econômicos.

Do ponto de vista social, os indicadores permitem mensurar e avaliar melhor as

estruturas sociais e econômicas das cidades da região. Isto possibilita estabelecer uma

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leitura das desigualdades socioespaciais e da iniquidade territorial. O IDH está entre os

principais indicadores para tal apreciação, pois consiste numa medida comparativa que

engloba as dimensões de longevidade, educação e renda. O índice varia de 0 a 1, sendo

que quanto mais próximo a 1 melhor é o nível de desenvolvimento humano local, ou seja,

melhor a qualidade de vida da população. A tabela 1 traz os índices para os municípios da

região metropolitana de Campinas no ano de 2000.

Tabela 1: Índice de Desenvolvimento Humano nos municípios da Região Metropolitana de Campinas, 2000.

Fonte: PNDU – Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil, 2000. Org.: Orlando Moreira Junior, 2013.

O IDH é um importante indicador quando se procura comparar municípios

considerando sua qualidade de vida. Nota-se, em geral, uma variação expressiva no IDH

entre os municípios de diferentes tamanhos populacionais. Com base nisto, não se pode

estabelecer uma relação direta entre o tamanho populacional com seu índice de

desenvolvimento humano.

O conjunto de situações expostos contribuem para que se chegue a conclusão de

que os processos de expansão urbana e da organização espacial da população e das

atividades econômicas expressam uma ocupação do espaço metropolitano marcado,

contraditoriamente, pela dispersão e pela concentração. Dispersão territorial da malha

urbana e da população, por um lado, e concentração de atividades econômicas, serviços e

infraestruturas em alguns centros urbanos, por outro. Desta forma, a criação institucional de

uma região metropolitana não é sinônimo de desenvolvimento, bem como não é um

propulsor dele.

Municípios IDH Municípios IDH

Vinhedo 0,857 Campinas 0,811

Paulínia 0,847 Pedreira 0,810

Valinhos 0,842 Sumaré 0,800

Americana 0,840 Cosmópolis 0,799

Indaiatuba 0,829 Artur Nogueira 0,796

Jaguariúna 0,829 Engenheiro Coelho 0,792

Itatiba 0,828 Hortolândia 0,790

Holambra 0,827 Santo Antônio de Posse 0,790

Nova Odessa 0,826 Monte Mor 0,783

Santa Bárbara d’Oeste 0,819

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenvolvimento é um conceito-chave na discussão de políticas públicas. Este

trabalho teve por objetivo contribuir na reflexão do enfoque do desenvolvimento regional,

tendo uma região metropolitana como cenário tanto das estratégias de desenvolvimento

local em seus municípios, quanto das diferenciações econômico-espaciais que nela se

manifestam.

De modo geral, pode-se concluir que a criação desenfreada de regiões

metropolitanas, no Brasil, em seu caráter institucional não condiz com a formação de um

fenômeno geográfico na maioria dos casos. Motivada por interesses estaduais, a criação de

regiões metropolitanas atrela-se à possibilidade de se ter acesso privilegiado a recursos da

União, em função da compreensão amplamente difundida que associa regiões

metropolitanas ao intenso processo de urbanização (IPEA, 2011). Isto significa, como

aponta a pesquisa, que as regiões metropolitanas são criadas por meio de práticas e

motivações que não tem, necessariamente, relação com o processo de formação

socioespacial; não estão articuladas a políticas ou estratégias de desenvolvimento territorial;

e não estão vinculadas à gestão das funções públicas de interesse comum. Logo, vê-se

mudanças conceituais e de objetivo ao se instituir uma região metropolitana.

No caso de Campinas, isto é perceptível. Apesar de possuir espaços conurbados e

bem integrados, ainda há áreas descontínuas espacialmente e fragmentada social e

economicamente. Isto gera embates na discussão dos objetivos e motivações que levam a

criação das regiões metropolitanas. Também, ampliam os desafios para a gestão do espaço

metropolitano em atender os interesses em comum, gerando uma série de incertezas acerca

do dos benefícios ao desenvolvimento regional que ela pode oferecer. Todavia, fica claro

que a criação das regiões metropolitanas tem sua relevância do ponto de vista polítco-

adiministrativo. O reconhecimento destas áreas é um importante meio de fortalecimento

institucional e de regular a organização do espaço.

NOTAS

1 De acordo com Vitte (2007) possui 11 instituições afiliadas: a UNICAMP, PUCCAMP,

Instituto Biológico, Instituto de Zootecnia, Instituto Tecnológico de Alimentos, Laboratório

Nacional de Luz Síncrotron, Embrapa, Centro de Pesquisa Renato Ascher, Instituto

Agronômico de Campinas, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações e

Coordenadoria de Assistência Técnica Integral. Esta Fundação tem por objetivo facilitar a

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troca de experiências entre as instituições de pesquisa da região, fomentar a integração

dessas entidades e tornar melhor sua atuação conjunta. Ademais, tem por pretensão

incentivar a pesquisa e a transferência de tecnologia, a organização dos empreendimentos,

bem como atrair novos investimentos para a região e criar oportunidades para os

municípios.

2 É uma empresa municipal que tem como principais atribuições o planejamento e a

execução da política de ciência e tecnologia, de P&D no Polo de Alta Tecnologia (Cf.

Correio Popular, 29/09/2003). (VITTE, op. cit.)

3 Ainda de acordo com a autora citada anteriormente, esta agência tem finalidade de integrar

a organização, o planejamento e a execução das funções públicas de interesse comum na

região. Está ligada as estratégias do governo paulista em promover o desenvolvimento

regional, tendo como objetivos: ampliar formas de cooperação entre as empresas; facilitar o

acesso as informações relativas a modelos gerenciais e a novos produtos e tendências de

mercado; articular melhores condições de financiamento; ampliar o leque e alternativas para

a formação de recursos humanos específicos; facilitar o acesso a novas tecnologias; e

capacitar para a exportação com o máximo valor agregado.

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