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COORDENAÇÃO GERAL Celso Fernandes Campilongo Alvaro de Azevedo Gonzaga André Luiz Freire ENCICLOPÉDIA JURÍDICA DA PUCSP TOMO 2 DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL COORDENAÇÃO DO TOMO 2 Vidal Serrano Nunes Júnior Maurício Zockun Carolina Zancaner Zockun André Luiz Freire

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COORDENAÇÃO GERAL

Celso Fernandes Campilongo

Alvaro de Azevedo Gonzaga

André Luiz Freire

ENCICLOPÉDIA JURÍDICA DA PUCSP

TOMO 2

DIREITO ADMINISTRATIVO E

CONSTITUCIONAL

COORDENAÇÃO DO TOMO 2

Vidal Serrano Nunes Júnior

Maurício Zockun

Carolina Zancaner Zockun

André Luiz Freire

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ENCICLOPÉDIA JURÍDICA DA PUCSP DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL

1

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA

DE SÃO PAULO

FACULDADE DE DIREITO

DIRETOR

Pedro Paulo Teixeira Manus

DIRETOR ADJUNTO

Vidal Serrano Nunes Júnior

ENCICLOPÉDIA JURÍDICA DA PUCSP | ISBN 978-85-60453-35-1

<https://enciclopediajuridica.pucsp.br>

CONSELHO EDITORIAL

Celso Antônio Bandeira de Mello

Elizabeth Nazar Carrazza

Fábio Ulhoa Coelho

Fernando Menezes de Almeida

Guilherme Nucci

José Manoel de Arruda Alvim

Luiz Alberto David Araújo

Luiz Edson Fachin

Marco Antonio Marques da Silva

Maria Helena Diniz

Nelson Nery Júnior

Oswaldo Duek Marques

Paulo de Barros Carvalho

Ronaldo Porto Macedo Júnior

Roque Antonio Carrazza

Rosa Maria de Andrade Nery

Rui da Cunha Martins

Tercio Sampaio Ferraz Junior

Teresa Celina de Arruda Alvim

Wagner Balera

TOMO DE DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL | ISBN 978-85-60453-37-5

Enciclopédia Jurídica da PUCSP, tomo II (recurso eletrônico)

: direito administrativo e constitucional / coord. Vidal Serrano Nunes Jr. [et al.] - São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017

Recurso eletrônico World Wide Web (10 tomos) Bibliografia.

1.Direito - Enciclopédia. I. Campilongo, Celso Fernandes. II. Gonzaga, Alvaro. III. Freire,

André Luiz. IV. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

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Marcos de Lima Porta

INTRODUÇÃO

A ideia primordial desse verbete é descrever de forma clara, simples e objetiva

um regime jurídico disciplinar dos magistrados brasileiros, tema que faz parte do direito

da função pública e que visa a aperfeiçoar o campo interno do Poder Judiciário e, por

conseguinte, o próprio Estado Democrático de Direito pátrio.

A partir da identificação do cenário de construção do direito brasileiro, por

critérios científicos, serão apartados, respectivamente, o direito público e dentro dele o

direito administrativo e, em consequência, o regime jurídico disciplinar dos magistrados.

Neste espaço e no contexto da Magistratura brasileira, serão esclarecidas suas vigas

estruturantes e as esferas que o compõe, a saber: o ilícito administrativo disciplinar, o

processo administrativo disciplinar e as sanções disciplinares.

Sobre cada qual assunto algumas tintas serão gastas no desenvolvimento deste

trabalho, objetivando-se a obtenção ao final de uma unidade jurídico-sistemática segundo

as regras editoriais sugeridas.

SUMÁRIO

Introdução ......................................................................................................................... 2

1. O Direito Administrativo e o Regime Jurídico Disciplinar .................................... 3

2. Os magistrados ........................................................................................................ 4

2.1. A competência disciplinar dos Órgãos Correicionais do Poder Judiciário .... 5

2.1.1. As autoridades competentes para processar e julgar Magistrados na

via Administrativa disciplinar ............................................................ 6

3. As esferas jurídicas que compõem o regime jurídico disciplinar dos Magistrados

(previsões normativas disciplinares, sanções administrativas disciplinares e os

processos administrativos disciplinares) ................................................................. 7

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3.1. Condutas ........................................................................................................ 8

3.1.1. Condutas positivas ............................................................................. 8

3.1.1.1. Deveres relativos à presença do Magistrado ....................... 8

3.1.1.2. Deveres relativos ao ambiente de trabalho .......................... 9

3.1.1.3. Deveres relativos à pessoa e aos procedimentos do

Magistrado ........................................................................... 9

3.1.1.4. Deveres relativos ao exercício da função pública do

Magistrado ......................................................................... 10

3.1.2. Condutas Negativas ......................................................................... 10

3.1.2.1. Vedações relativas ao cargo ou à função: .......................... 11

3.1.2.2. Vedações relativas ao exercício do Magistrado................. 11

3.2. As sanções disciplinares .............................................................................. 12

3.3. Os processos administrativos disciplinares ................................................. 15

3.3.1. A investigação preliminar e o processo administrativo disciplinar . 17

3.3.2. Processos (instrumentos) previstos no Regimento Interno do CNJ . 19

4. Conclusão .............................................................................................................. 20

Referências ..................................................................................................................... 21

1. O DIREITO ADMINISTRATIVO E O REGIME JURÍDICO DISCIPLINAR

O Direito Administrativo expressa sua própria função/atividade administrativa

que pode ser qualificada como sancionatória, regulamentar, disciplinar, entre outras. Cada

uma delas possui características próprias; daí sua autonomia.

A função administrativa disciplinar é a que interessa para este trabalho; ela é

uma atividade imprescindível para a realização das tarefas administrativas, pois sua

existência e adoção é do interesse da coletividade na medida em que a Administração

Pública, por natureza, para o seu desenvolvimento, exige disciplina e ordem,

constituindo-se, no âmbito administrativo, em linhas gerais, na “faculdade de punir

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internamente as infrações funcionais dos servidores e demais pessoas sujeitas à disciplina

dos órgãos e serviços da Administração”.1 Visa, acima de tudo pois, ao aperfeiçoamento

da Administração Pública no seu campo interno, observando-se os direitos dos

administrados que a ela se submetem.

2. OS MAGISTRADOS

Os Magistrados são agentes públicos. Fazem parte da Administração Pública do

Poder Judiciário Nacional.

Por possuírem um vínculo jurídico especial se submetem a um regime jurídico

próprio, diverso das demais categorias jurídicas de agentes públicos.

A Constituição Federal revela os órgãos que compõem o Poder Judiciário e

dispõe uma determinada hierarquia funcional.

Assim, tem-se uma divisão entre os Magistrados que atuam nos Tribunais

Superiores e os Magistrados que atuam nos Tribunais Inferiores. Nestes últimos, ainda, é

possível haver uma divisão em dois graus: os Magistrados que atuam em primeira

instância e os Magistrados que atuam em segunda instância. No primeiro caso, estão, por

exemplo, os Ministros do STF e do STJ. No segundo, os Desembargadores e os Juízes de

Direito.

Em geral, os Magistrados sujeitam-se ao controle jurídico-disciplinar e, ao

lesarem a ordem jurídica, devem sofrer as consequências jurídicas do exercício do jus

puniendi administrativo do Poder Judiciário, traduzidas na aplicação de uma sanção

administrativo-disciplinar, caso procedente a imputação jurídica apresentada pela

Autoridade Competente. No caso, a responsabilidade é administrativo-disciplinar.

Há, porém, duas classes de Magistrados que não sofrem as consequências

jurídicas do regime jurídico administrativo disciplinar, a saber: os Magistrados do STF e

os Conselheiros que compõem o CNJ.

O art. 52, II, da CF confere ao Senado Federal a competência para processar e

julgar os Ministros do STF e os Membros do CNJ por crime de responsabilidade

1 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 124.

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(qualificados por comportamentos de inteiro conteúdo político), cuja ilicitude é de

natureza diversa da ilicitude disciplinar.

Em relação aos demais Magistrados, a Constituição Federal e a Lei Orgânica da

Magistratura estabelecem a responsabilização jurídico-disciplinar.

E o arcabouço jurídico que trata desse tema não se esgota nesses diplomas

jurídicos. Há previsões normativas dispostas nos Códigos de Processo Civil e Penal, em

Regimentos Internos de Tribunais, em Leis Estaduais, em Emendas Regimentais, entre

outros; essas, ainda, consubstanciam em regimes disciplinares peculiares, segundo o

vínculo jurídico do Magistrado.2

As diferenças atualmente são insignificantes por conta da edição da Resolução

135 de 13 de julho de 2011 do CNJ3 que em nível nacional uniformizou as normas

relativas ao processo administrativo disciplinar aplicável aos Magistrados, acerca do rito

e das penalidades, além de outras providências (cf. ementa da Resolução). Como se não

bastasse, também há os precedentes administrativos que balizam e orientam com

segurança jurídica esse assunto tratado.

2.1. A competência disciplinar dos Órgãos Correicionais do Poder Judiciário

Quanto à competência disciplinar, após calorosa discussão sobre o assunto, o

STF decidiu pela competência concorrente entre o CNJ e os Tribunais nos quais os

desembargadores, os juízes e os Ministros (aqueles que se submetem ao regime

administrativo disciplinar) estão vinculados, considerando constitucional o art. 12 da

Resolução 135/2011 (art. 99, CF e art. 27 da LOMAN – cf. Ação Direta de

Inconstitucionalidade (medida liminar) 4638, Rel. Min. Marco Aurélio, do STF).

2 Esta é a inteligência do art. 15 da LOMAN: “Art. 15. Os órgãos do Poder Judiciário da União (art. 1º, I a VI) têm a organização e a competência definidas na Constituição, na lei e, quanto aos tribunais, ainda, no respectivo Regimento Interno”. 3 Faz parte dos Considerando desta Resolução o seguinte: “Considerando que as leis de organização judiciária dos Estados, os Regimentos dos Tribunais e Resoluções em vigor a respeito da matéria são discrepantes, que se encontram muitas das quais desatualizadas ou superadas; Considerando a necessidade de sistematizar a disciplina legal em vigor acerca da matéria”.

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2.1.1. As autoridades competentes para processar e julgar Magistrados na via

Administrativa disciplinar

O jus puniendi estatal se concretiza pelo exercício da função administrativa

disciplinar. Para a eclosão da competência administrativa é preciso verificar sua

delimitação e a sua vinculação estabelecida pelo Direito. A partir daí será possível tratar

da Autoridade Pública e do seu exercício.

Esse direito nasce a partir do momento em que ocorre uma falta funcional

cometida por um Magistrado, e que se desenvolve por intermédio do processo

administrativo disciplinar até culminar no ato final que é uma absolvição ou condenação

administrativa.

O STF é o órgão máximo do Poder Judiciário, além de guardião da Constituição

Federal. Atua como última instância jurídico-jurisdicional; controla nesta via o CNJ por

intermédio das ações judiciais de natureza constitucional que tratam de atos deste próprio

novo órgão (art. 102, I, “r”, CF).

Quanto à via administrativa, o STF controla o CNJ ao eleger seu Presidente, ao

escolher certos Conselheiros (art. 7º, I, RISTF e Resolução 503/2013, do STF) além da

Presidência do CNJ ser exercida pelo Presidente do STF.

Em relação à previsão constitucional do Ministro-Corregedor (art. 103-B, § 5º,

da CF) – curiosamente, a Reforma não fala em Corregedoria, mas em Ministro-

Corregedor –, compete a ele receber reclamações e denúncias relativas aos magistrados

(inciso I), de fazer inspeções e correição geral (inciso II) e, finalmente, requisitar

magistrados, delegando-lhes atribuições, e requisitar servidores de juízos ou tribunais,

inclusive nos Estados, Distrito Federal e Territórios (inciso III), visando à agilidade,

unidade e aperfeiçoamento da Justiça.

O Regimento Interno do CNJ dispõe sobre os procedimentos e as formas que

devem ser adotadas para o processamento e o julgamento pelo CNJ de um Magistrado

faltoso.

Nos demais Tribunais do Brasil, a competência para a apuração das faltas

disciplinares está afeta ao próprio Tribunal onde o Juiz ou Desembargador ou Ministro

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esteja vinculado. Esta é a inteligência dos art. 99 da Constituição Federal e art. 21, VI, da

LOMAN.4 Na Justiça Federal, por exemplo, há o Conselho da Justiça Federal:

“o órgão central das atividades sistêmicas da Justiça Federal, cabendo-lhe a

supervisão administrativa e orçamentária, com poderes correcionais, cujas

decisões possuem caráter vinculante, ou seja, são de observância obrigatória

por todas as unidades da Justiça Federal de primeiro e segundo graus,

conforme estabelece o art. 105, parágrafo único, inc. II, da Constituição

Federal e no art. 3º da Lei n. 11.798/2008”.5

E sobre a autoridade competente para dar início às investigações disciplinares,

depende do Tribunal envolvido, por exemplo, em São Paulo, na Justiça Estadual quem

detém essa atribuição quando se trata de Juiz é o Corregedor Geral de Justiça; já quanto

aos Desembargadores, cabe ao Presidente do Tribunal dar início à eventual atuação

correcional.

3. AS ESFERAS JURÍDICAS QUE COMPÕEM O REGIME JURÍDICO DISCIPLINAR DOS

MAGISTRADOS (PREVISÕES NORMATIVAS DISCIPLINARES, SANÇÕES ADMINISTRATIVAS

DISCIPLINARES E OS PROCESSOS ADMINISTRATIVOS DISCIPLINARES)

Com a submissão praticamente de todos os Magistrados brasileiros ao regime

jurídico administrativo disciplinar, por consequência, diversas obrigações a eles são

impostas. Por mais que não queiram, têm o dever de satisfazê-las, uma vez que sua

vontade é relegada para segundo plano por conta da natureza pública da atividade que

exercem.

Ao descumprirem qualquer uma dessas obrigações, nasce para a Administração

Pública o também dever de agir, ou seja, o dever de exercer a competência disciplinar

sobre esses Magistrados, na esfera administrativa, por conta da prática de uma falta

administrativa disciplinar.

4 A propósito, o E. STF assim decidiu na questão de ordem na ação originária AO-QO 968/Amazonas, Relator, Min. Sidney Sanches, j. 20/02/2003. Ressalve-se a hipótese de competência originária do STF, do art. 102, I, n, da Constituição Federal (Cf. AO-AgR 813/CE – CEARÁ, AG.REG., na Ação Originária, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 15/08/2001). 5 <http://www.cjf.jus.br/cjf/conheca-o-cjf/>, acesso em 21.12.2016.

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Como são regras que visam ao aperfeiçoamento da Administração Pública no

seu campo interno, e podem gerar restrição de direito do Magistrado, devem estar

positivadas no sistema jurídico em vigor.

Destacam-se as previsões legais contidas na Constituição Federal, na LOMAN

e nos Códigos de Processo Civil e Processo Penal. Há normativos relevantes, tais como a

Resolução 135/2011 do CNJ, que possui força equivalente à lei.6

Os deveres são doutrinariamente definidos como condutas positivas que os

Magistrados devem cumprir. Há também as condutas negativas, as transgressões

disciplinares. Salvo as previsões do CPC e do CPP, algumas delas serão a seguir tratadas.

3.1. Condutas

3.1.1. Condutas positivas

Inspirando-se na classificação apresentada por Edmir Netto de Araújo,7 quando

menciona dos servidores públicos em geral, tem-se que as condutas positivas (os deveres),

podem ser:

3.1.1.1. Deveres relativos à presença do Magistrado

É imprescindível a presença do Magistrado na Comarca ou Seção Judiciária em

que atua, porque, uma vez vivenciando o dia-a-dia das pessoas da Cidade onde trabalha,

sua atuação será mais efetiva e compreensível, além de garantir uma eventual intervenção

judicial urgente fora dos horários regulamentares do fórum.

Nesse contexto, a Constituição Federal em seu art. 93, VII, prevê o seguinte: “o

juiz titular residirá na respectiva comarca, salvo autorização do Tribunal”. Este

dispositivo foi alterado pela EC 45/2004 na sua parte final. Isto porque há diversos lugares

em que o Magistrado não consegue residir pelas condições naturais que a Cidade ou

6 FRANÇA, Carlos Alberto; GOMES, José Eduardo Garrido. Processo administrativo disciplinar no Poder Judiciário do Estado de Goiás, pp. 131 e 132. 7 ARAÚJO, Edmir Netto de. O ilícito administrativo e seu processo, passim.

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Comarca oferecem. Nesses casos, excepcionalmente, pode haver a autorização do

Tribunal ao qual o Magistrado está vinculado.

Este proceder, porém, situa-se numa linha tênue entre a legalidade e a

ilegalidade. O caso concreto é que vai determinar essas exigências porque há casos, por

exemplo, onde o Magistrado deve sair do fórum na luz do dia, por motivo de segurança.

A regra de residência na Comarca também serve para o juiz auxiliar de Vara Judicial por

conta da vinculação específica a uma unidade judiciária e ser sua atividade de caráter

premente e necessária.8

Outro dever inserto neste item é a pontualidade: o art. 35, VI, da LOMAN prevê

o seguinte: “comparecer pontualmente à hora de iniciar-se o expediente ou a sessão e não

se ausentar injustificadamente antes de seu término”.

A pontualidade revela a seriedade e a organização do trabalho a ser

desenvolvido.

3.1.1.2. Deveres relativos ao ambiente de trabalho

O art. 35, IV, da LOMAN prevê que o Magistrado deve tratar com urbanidade

as partes, os Membros do Ministério Público, os Advogados, as testemunhas, os

Funcionários e Auxiliares da Justiça e atender aos que o procurar a qualquer momento,

quanto se trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência.

3.1.1.3. Deveres relativos à pessoa e aos procedimentos do Magistrado

O art. 35, VIII, prevê o seguinte: “manter conduta irrepreensível na vida pública

e particular”. O Magistrado, em razão da importância do cargo que ocupa chega a ser juiz

quase vinte e quatro horas por dia. Não há espaço para se separar a vida particular da vida

profissional. Talvez se possa separar a vida íntima e a vida particular.

A intenção dessa previsão normativa visa à dignidade da função pública do

Magistrado.

8 No Estado de São Paulo, o E. Tribunal de Justiça regulamentou este tema por intermédio do Provimento 923/2005. O CNJ por sua vez também regulamentou este assunto por intermédio da Resolução 37, de 6 de junho de 2007.

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Exemplo clássico disto é o Magistrado desmedido que pede com frequência,

dinheiro emprestado em instituição financeira sem, futuramente, conseguir honrar com

seus compromissos.

3.1.1.4. Deveres relativos ao exercício da função pública do Magistrado

O art. 35, I, diz que: “[c]umprir e fazer cumprir, com independência, serenidade

e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício”. Na verdade, o Magistrado está

obrigado a cumprir o Direito posto e não as disposições legais e regulamentares em si.

Talvez uma redação mais atual disso possa se dar da seguinte maneira: “Cumprir e fazer

cumprir o Direito em vigor, observando as normas legais e regulamentares”.

De outra feita, a inclusão das expressões “independência” e “serenidade” podem

servir de efeito moral, porque elas já são inerentes à própria atividade do Magistrado. A

observação “das normas legais e regulamentares” serve como norte e devem ser

prestigiadas pelo Magistrado; até que se declare o contrário, essas normas são

presumivelmente válidas e legítimas.

O art. 35, VII, prevê o seguinte: “exercer assídua fiscalização sobre os

subordinados, especialmente no que se refere à cobrança de custas e emolumentos,

embora não haja reclamação das partes”.

O art. 98, § 2º, da Constituição Federal prevê: “[a]s custas e emolumentos serão

destinados exclusivamente ao custeio dos serviços afetos às atividades específicas da

Justiça”.

Trata-se de verba pública indispensável para a garantia da autonomia financeira

do próprio Poder Judiciário, além da sua natureza, e, portanto, pertencente à sociedade.

3.1.2. Condutas Negativas

São as transgressões disciplinares, ou seja, atitudes que o Magistrado não deve

tomar, pena de infringir a regra jurídica vigente.

Assim há, por exemplos:

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3.1.2.1. Vedações relativas ao cargo ou à função

Com base na Constituição Federal, há as seguintes hipóteses legais: i) “Exercer,

ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo de magistério, desde que não

prejudicial ao exercício da magistratura” (art. 95, parágrafo único, I). A profissão de

Magistrado requer o tempo suficiente e necessário para atender satisfatoriamente os

interesses da coletividade. Com isso, veda-se a possibilidade de relegar para segundo

plano a função de Magistrado em detrimento da atividade de magistério. Parece óbvio

que isto devesse ser respeitado, porém, por estar previsto na Lei das Leis é porque se fez

necessário expressamente normatizar a mencionada conduta. Os limites desta norma

jurídica devem ser apresentados com certa razoabilidade, proporcionalidade e justeza ao

caso concreto;9 ii) na LOMAN há o art. 36, I, que prevê o seguinte: “I - exercer o comércio

ou participar de sociedade comercial, inclusive de economia mista, exceto como acionista

ou quotista”. Aqui talvez ficasse melhor a redação de outro Estatuto: “Exercer atividades

empresariais incompatíveis com a função”; e o inciso II: “Exercer cargo de direção ou

técnico de sociedade civil, associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade,

salvo de associação de classe, e sem remuneração”. Esta previsão legal parece que estaria

mais adequada a atual realidade.

3.1.2.2. Vedações relativas ao exercício do Magistrado

O art. 36, III, da LOMAN: “manifestar, por qualquer meio de comunicação,

opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo

sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvado crítica nos autos e

em obras técnicas ou no exercício do magistério. Parágrafo único (Vetado.)”. A

preservação da independência do Magistrado é fundamental para o seu pleno exercício

funcional. Daí a razão da norma jurídica; porém, a crítica que se faz diz respeito à

extensão desta proibição, especialmente quando cotejada como o princípio da liberdade

9 O CNJ regulamentou esta matéria por intermédio da Resolução 34, de 24 de abril de 2007.

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de pensamento previsto na Constituição Federal que está alojada em nível hierárquico

superior à Lei Orgânica da Magistratura.10

Nesses termos, muitas anomalias, lacunas e normas obsoletas existem; há

necessidade premente de se atualizar, tanto quanto os deveres como também as

transgressões dos Magistrados.

3.2. As sanções disciplinares

Como consequência do direito do Estado de punir em termos administrativos,

tem-se as sanções ou penalidades administrativo-disciplinares. Elas concretizam o direito

de punir estatal ao restringirem direitos dos acusados, impondo-lhes uma reprimenda,

bem como servem de desestímulo para que outros Magistrados, especialmente, não

deixem de cumprir as normas jurídicas disciplinares em vigor.11

O rol de sanções administrativas dos Magistrados é escalonado partindo-se da

pena mais leve para a mais gravosa. Apesar disto, o sistema legal precisa ser revisto

atualizado e aperfeiçoado, conforme será exposto abaixo.

No atual sistema, as sanções estão previstas no art. 42 da LOMAN. Este diploma

jurídico criou um sistema único de sanções assim dispostas: a) advertência; b) censura;

c) remoção compulsória; d) disponibilidade com vencimentos proporcionais; d)

aposentadoria com vencimentos proporcionais; e, e) demissão. No anteprojeto de Lei

elaborado pelo STF, além dessas há ainda as penas de suspensão e de perda do cargo (art.

109), sendo que esta última é restrita ao processo judicial.

O CNJ, por intermédio da Resolução 135, de 13 de julho de 2011, em seu art. 3º,

§ 1º, estabeleceu que fosse aplicável às penas, desde que compatíveis, as previstas no art.

6º, § 1º, da Lei 4.898/1965 (Lei contra o Abuso de Autoridade). Este diploma legal

acrescenta as penas de repreensão, de suspensão do cargo, por prazo de cinco a cento e

10 Em São Paulo, foi recebida uma imputação administrativa disciplinar por maioria de votos contra uma Magistrada que criticou uma decisão jurisdicional do Tribunal de Justiça de São Paulo. Conferir: <www.conjur.com.br>: “Caso Carandiru: Juíza que criticou desembargadores responderá processo” do dia 23 de maio de 2007, acesso em 30 de maio de 2007. 11 Isto é o que acontece, por exemplo, quando se vê no diário oficial a publicação de instauração de processo administrativo disciplinar contra Magistrado. Os demais Magistrados ao lerem e tomarem conhecimento desta notícia confirmam as responsabilidades de suas atividades públicas.

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oitenta dias, com perda de vencimentos e vantagens, destituição de função e demissão a

bem do serviço público.

Do que consta da LOMAN, vê-se que a primeira delas é a pena de advertência

(inciso I) – constante também do anteprojeto do STF – que deve ser aplicada

“reservadamente, por escrito, no caso de negligência no cumprimento dos deveres do

cargo”. Esta pena é a mais leve e tem correlação lógica com os ilícitos administrativos-

disciplinares mencionados.

Trata-se de uma pena aplicável a ocorrências isoladas. É de cunho moral.

Quando houver reiterada negligência no cumprimento dos deveres, há a pena de

censura – que consta também do anteprojeto do STF – que deve ser aplicada

reservadamente, por escrito (art. 43, LOMAN). Assim como a advertência é também de

cunho moral. Uma vez punido com esta pena, realmente não poderá figurar na lista de

promoção por merecimento pelo prazo de um (1) ano a partir do trânsito em julgado

administrativo.12

Nessa hipótese, ainda, poderá contar pontos negativos para efeito de avaliação

de desempenho. Poderia haver também, neste aspecto, uma hipótese de conversão da pena

de censura para a pena de advertência, desde que presentes alguns requisitos legais.

A próxima pena prevista é a de remoção compulsória (inciso III). Ela é

considerada uma pena secundária ou acessória em outros Estatutos de Servidores, além

de ser possível haver a cumulação com outras penalidades.

No caso dos Magistrados, é uma pena principal, de cunho administrativo e

residual (art. 6º, Resolução 135/2011 CNJ), e que não se confunde com a remoção

prevista no art. 31 da LOMAN; ela pode ser de pouca utilidade se apenas se transferir o

juiz que não consegue desenvolver suas atividades públicas em determinada Comarca.

Pode ser um prêmio e não uma reprimenda em si ao Magistrado faltoso.

A próxima pena é a de disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo

de serviço, que está prevista na Constituição Federal, art. 93, VIII, na LOMAN, art. 42,

IV, e também na Resolução 135/2011 do CNJ (art. 6º).

12 A Resolução 135/2011 do CNJ no artigo 23, § 2º, prevê que o juiz não vitalício ficará impedido de ser promovido ou removido quando forem aplicadas as penas de censura ou de remoção compulsória. Ver também art. 44, parágrafo único, da LOMAN.

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Ela não se confunde igualmente com a disponibilidade prevista no art. 31 da

LOMAN: “[e] m caso de mudança da sede ou do juízo será facultado ao juiz remover-se

para ela ou para comarca de igual entrância, ou obter a disponibilidade com vencimentos

integrais”.

Além disso, é inaplicável a norma da irredutibilidade de ganhos ao caso, por

conta da natureza punitiva do ato aplicado.

Portanto, a pena mencionada subsiste formal e materialmente no rol das

penalidades dos Magistrados. Considerada grave, serve para o caso de o Magistrado não

ter o tempo suficiente para a aposentadoria, quando deve permanecer disponível à

Administração Pública, podendo ser convocado a qualquer momento e vedado o caráter

perpétuo da pena.

Em seguida, há a penalidade da aposentadoria compulsória com vencimentos

proporcionais ao tempo de serviço. Esta penalidade desliga o Magistrado em definitivo

dos quadros da Magistratura.

A crítica que a ela se faz é a seguinte: como pode um Magistrado gravemente

faltoso, que lesa o direito e a coletividade, no final, possa ser beneficiado com a pena de

aposentadoria e ganhos? Diante dos novos paradigmas constitucionais tal pena pode se

revelar ilógica e sem razoabilidade. Tanto é verdade que passou a ser batizada de

“benefício do pijama”.13

Quanto à pena seguinte, de demissão, vê-se que ela está prevista no art. 47 da

LOMAN e é cabível contra os Magistrados não vitalícios,14 porque, segundo o disposto

no art. 95, I, da Constituição Federal, no caso dos Magistrados vitalícios, somente poderá

haver a perda do cargo por intermédio de sentença judicial transitada em julgado.15 O

anteprojeto do STF sobre o Estatuto da Magistratura também é neste sentido.

Situação diferente da perda do cargo é aquela decorrente como efeito de uma

condenação criminal. Neste caso, será automática e, após o trânsito em julgado da decisão

criminal, basta que exista a comunicação do Órgão Criminal para o Tribunal ao qual o

13 Cf. <http://www.senado.gov.br>. Em “Casagrande lamenta que país sofra com corrupção nos três poderes”, agência Senado, de 30 de maio de 2007, plenário. Acesso em 30.05.2007. 14 Nesse sentido é o art. 23, par. 3º da Resolução 135/2011 do E. CNJ. 15 Aqui se aplica também as penas previstas na Lei de Improbidade (Lei 8.429/1992, art. 12).

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Magistrado está vinculado para haver a demissão. Neste caso, exigirá um simples

procedimento administrativo voltado para a formalização do desligamento.

A respeito deste tema, ainda é relevante mencionar que esta decisão criminal

pode ser proferida: a) pelo STF, no caso de julgamento de crime comum dos Ministros

dos Tribunais Superiores e de seus pares (art. 102, I, “b” e “c”, CF); b) pelo STJ, nos

casos de Desembargadores Federais e Estaduais (art. 105, I, “A”, CF); c) pelos TRF´s, os

juízes federais (art. 108, I, “a”, CF); e d) aos Tribunais de Justiça dos Estados. os juízes

estaduais (art. 96, III, CF).

Finalmente, não há a previsão da pena de cassação de aposentadoria (de

constitucionalidade questionada) nem quanto à possibilidade de ser aplicar uma pena

consistente na obrigação do faltoso frequentar cursos de reciclagem. Sobre a primeira

delas, de fato, com o atual sistema previdenciário já há decisões que sustentam pela sua

inconstitucionalidade (TJSP, Mandado de Segurança nº 2091987-98.2014.8.26.0000, por

maioria, Rel. Des. Paulo Dimas Mascaretti, j. 28.01.2015).

3.3. Os processos administrativos disciplinares

Todos esses instrumentos jurídicos estatais fazem parte do ordenamento jurídico

em vigor e apresentam um núcleo comum em que se revelam “notas predominantes da

processualidade jurídica, presentes em vários âmbitos em que se expressa”.16 Ele é

formado pelos seguintes traços que se configuram como uma constante: i) um fieri e um

factum; ii) a autonomia relativa e as ligações lógico-jurídicas entre o direito material e o

direito processual; iii) o necessário encadeamento sucessivo, causal, direcionado a um

resultado unitário final. Em razão do objeto deste trabalho, esses traços não serão

analisados. O que importa tão-somente é mencioná-los e afirmar que eles estão presentes

em todos os fenômenos da processualidade jurídico-estatais; em razão disso, formam um

regime jurídico informador do processo.17

16 MEDAUAR, Odete. A processualidade no direito administrativo, p. 23. Sobre a existência de um núcleo comum da processualidade, ver Romeu Felipe Bacelllar Filho (Princípios constitucionais do processo administrativo disciplinar, p. 53). 17MEDAUAR, Odete. Op. cit., p. 23.

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No campo específico do Direito Administrativo, o fenômeno da processualidade

jurídico-estatal sofre a intervenção – gerando a integração entre as normas jurídicas – das

regras e princípios que são próprios dessa disciplina jurídica. Ao ser recortado num

âmbito mais concreto, esse fenômeno da processualidade jurídico-estatal administrativa

é designado pela expressão processo administrativo.

Essa expressão, em nosso sistema jurídico, possui mais de um significado. De

um lado, designa relação jurídica processual, uma vez que adquire autonomia relativa18

do direito material envolvido e estabelece um liame jurídico entre a Administração, e o

Administrado ou os Administrados. No mesmo plano jurídico, mas numa outra acepção,

a expressão processo administrativo designa procedimento, isto é, rito processual e

pressuposto objetivo de formação do ato administrativo. Enquanto rito processual,

segundo a natureza do provimento administrativo final que se visa a obter,19 poderá haver

ou não a litigância ou a acusação em geral. Nesses termos, os ritos procedimentais que

não contêm esses qualificativos são agrupados sob uma categoria jurídica própria,

denominada simples processos20 ou simples expedientes.21 Esses processos englobam os

processos administrativos de provimentos meramente declaratórios, por sinal, mais

comuns na esfera do Direito Administrativo.

Todavia, quando o rito contiver a litigância, ou o acusado, ou os acusados em

geral estar-se-ão diante de um processo administrativo qualificado, ao qual pode ser

atribuído o nome de processo administrativo qualificado (sentido estrito). Estes

englobam tão-somente os processos administrativos disciplinares, sancionatórios, e

revisivos por provocação quer de um interessado, quer de qualquer administrado, por

intermédio do exercício do direito de petição; eles são próprios dos provimentos ou atos

administrativos de caráter disciplinar, sancionatório ou revisivo por provocação.22

Portanto, nesse trabalho a expressão “processo administrativo disciplinar” pode

ser entendida como designativo geral da categoria de todos os processos e também de

18Trata-se de autonomia relativa porque o direito adjetivo está a serviço do direito material e, em última análise, do Estado Democrático de Direito. 19Ver sobre esse assunto a obra de Gilson Delgado Miranda (Procedimento sumário, p. 49). 20 O termo simples foi adotado das afirmações do Mestre Egon Bockmann Moreira no artigo “Processo administrativo e o princípio da eficiência”, inserto no livro As leis de processo administrativo: Lei federal 9.784/99 e Lei paulista 10.177/98, p. 334. 21Esse termo é utilizado por MEIRELLES Hely Lopes (Direito administrativo brasileiro, p. 559). 22 Esta parte do texto consta em maior amplitude no livro: PORTA, Marcos de Lima. Processo Administrativo e o devido processo legal, passim.

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forma específica quando contiver acusação em geral, o que o torna complexo ou

qualificado.

Quanto aos nomes designados pelo ordenamento jurídico em vigor, há:

3.3.1. A investigação preliminar e o processo administrativo disciplinar

A investigação preliminar possui rito que se desenvolve por intermédio da

própria dinâmica das investigações. O regime jurídico da investigação preliminar prevê a

natureza investigativa deste instrumento; deve ser utilizada quando há indefinição de

autoria ou insuficiência de materialidade. Deve ser instaurada de ofício pelo Corregedor

da Justiça, no caso de Magistrados de primeiro grau ou pelo Presidente do Tribunal no

caso de Desembargador (art. 8º da Resolução 135/2011). Também pode ser instaurada

por denúncias:

“Art. 9º A notícia de irregularidade praticada por magistrados poderá ser feita

por toda e qualquer pessoa, exigindo-se formulação por escrito, com

confirmação da autenticidade, a identificação e o endereço do denunciante”.

Uma vez convicto de que há indícios de autoria e materialidade delitiva

administrativa disciplinar, o Corregedor ou o Presidente, dependendo do grau do

Magistrado, apresentará a acusação e logo em seguida, deverá conceder ao Magistrado

um prazo de quinze dias para a defesa prévia, contado da data da entrega da cópia do teor

da acusação e das provas existentes (art. 14, caput).

“Art. 14. (...)

§ 1º Findo o prazo da defesa prévia, haja ou não sido apresentada, o relator

submeterá ao Tribunal Pleno ou ao seu Órgão Especial relatório conclusivo

com a proposta de instauração do processo administrativo disciplinar, ou de

arquivamento, intimando o magistrado ou seu defensor, se houver, da data da

sessão do julgamento.

§ 2º O Corregedor relatará a acusação perante o Órgão Censor, no caso de

magistrado de primeiro grau, e o Presidente do Tribunal, nos demais casos”.

No caso de se decidir pela instauração do processo administrativo disciplinar

(art. 14, § 4º), pela maioria absoluta dos membros do Tribunal ou do respectivo Órgão

Especial, o acórdão deverá vir acompanhado da portaria que conterá a imputação dos

fatos e a delimitação do teor da acusação, assinada pelo Presidente do Órgão (art. 14, §

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5º).23 O acompanhamento será realizado pela Corregedoria do CNJ (art. 14, § 6º) e caso

seja a proposta de abertura adiada ou deixe de ser apreciada por falta de quórum,

igualmente, deverá ser encaminhado para a Corregedoria do CNJ, no prazo de 15 dias,

cópia da ata da sessão respectiva, com a especificação dos nomes dos presentes, dos

ausentes, dos suspeitos e dos impedidos (art. 14, § 4º).

Nesta mesma sessão, será sorteado o Relator, não havendo revisor,

estabelecendo a Resolução o prazo de 140 dias para a conclusão do processo prorrogável,

quando imprescindível para o término da instrução e houver motivo justificado, mediante

deliberação do Plenário ou Órgão Especial (art. 14, § 9º). A Resolução 30/2007 previa o

prazo menor e permitia a prorrogação até o dobro ou mais, quando a delonga decorresse

do exercício do direito de defesa (art. 7º, § 5º). Nesta oportunidade também poderá ser

decidido a respeito do afastamento cautelar ou não do Magistrado das suas funções

judicantes (art. 15).

O processo administrativo disciplinar ao final prevê a possibilidade de se

restringir direitos. Por conta disso, devem ser rigorosamente observados: (1) a ampla

defesa administrativa que abrange: (i) direito de produzir provas antes da decisão final;

(ii) direito à revisibilidade (duplo grau); (iii) direito de produzir provas: (iii.a) a

impossibilidade de produção de provas ilícitas; (iii.b) a impossibilidade de produção de

provas protelatórias e desnecessárias; (iii.c) o direito ao silêncio; e, (iii.d) a possibilidade

de realização de provas tardias; (iv) a impossibilidade de reformatio in pejus; e, (v) a

imprescindibilidade de defesa técnica; (2) contraditório administrativo: (i) a necessidade

de informar e a possibilidade de reagir; (ii) o princípio do administrador competente e

imparcial; (iii) o princípio do acesso aos elementos do processo; (iv) a necessidade de

audiência do interessado; e, (v) a oportunidade de reação; e, (3) o devido processo legal

nas faces substantiva e adjetiva.

23 Este ato administrativo deve ser bem expedido, sob pena de padecer de invalidação. A propósito o E. STJ, já decidiu o seguinte: “Servidor público (demissão). Imputação genérica na portaria de instauração do processo disciplinar e falta de indicação das normas infringidas (alegações). Pontos omissos (ocorrência). Violação dos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório (ausência). Embargos de declaração (recebimento). Conclusão do acórdão embargado (manutenção). EDcl no MS 8248/DF; EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO MANDADO DE SEGURANÇA2002/0032252-8, Rel. Min. Nilson Naves, j. 22.11.2006.

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19

3.3.2. Processos (instrumentos) previstos no Regimento Interno do CNJ

Consta do Regimento Interno do CNJ a existência de diversos tipos de processos

(Capítulo III), com destaque para os seguintes:

a) sindicância (art. 60 a 66): tem a mesma natureza da investigação preliminar;

é uma peça informativa, com prazo não excedente a 60 dias (antes eram 30 dias) para seu

término. Serve para apurar irregularidades atribuídas a magistrados ou servidores nos

serviços judiciais e auxiliares, ou a quaisquer serventuários, nas serventias e nos órgãos

prestadores de serviços notariais e de registro, cuja apreciação não se deva dar por

inspeção ou correição;

b) Reclamação Disciplinar (arts. 67 a 72): pode ser proposta contra Magistrado.

Dirigida ao Corregedor Nacional de Justiça em requerimento assinado contendo a

descrição do fato, a identificação do reclamado e as provas da infração (art. 67, caput); a

representação por excesso de prazo (art. 78): anteriormente, o Regimento Interno

mencionava em Reclamação por excesso de prazo. Novamente, a alteração normativa foi

salutar porque na verdade este dispositivo trata de procedimentos relativos à

representação por excesso de prazo, perante o CNJ. Aqui apenas se regulamenta a fase

prévia de um eventual processo administrativo disciplinar punitivo. Trata-se de um

instrumento investigatório, com determinado procedimento sem que exista amparo legal.

Porém, é possível abstrair do próprio sistema jurídico essa representação e em nível

infralegal o CNJ disciplinar sua forma e modo de se processar;

d) processo administrativo disciplinar (arts. 73 a 77): é um instrumento destinado

a apurar responsabilidades de magistrados por infração disciplinar praticada no exercício

de suas atribuições.

O art. 74 prevê a determinação de sua instalação pelo CNJ e a distribuição a um

relator a quem competirá ordenar e dirigir a instrução respectiva. Há a previsão

exemplificativa de impedimentos de Conselheiro; além do fato de que já há a menção do

Estatuto da Magistratura que sequer ainda foi positivado. No caso, deve ser levado em

conta a LOMAN.

e) pedido de avocação (arts 79 a 81): torna possível a avocação de processos dos

órgãos disciplinares originariamente competentes. Uma vez acolhido o pedido de

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avocação, o processo é distribuído no CNJ, ficando o Relator incumbido de ordená-lo e

dirigi-lo até o fim. E, por último,

f) a Revisão Disciplinar (arts. 82 a 88). Consigne-se, de início, que na LOMAN

não há qualquer regulamentação sobre este assunto. O CNJ, no exercício de sua

competência constitucional (art. 103-B), disciplinou a matéria e assim o fez nos termos

dos princípios gerais do direito público, em especial, a dignidade da pessoa humana, visto

que esse instituto, uma vez julgado procedente pode determinar a instauração de processo

administrativo disciplinar, alterar a classificação da infração, absolver ou condenar o juiz

ou membro de Tribunal, modificar a pena ou anular o processo (art. 88).

4. CONCLUSÃO

O Poder Judiciário com o passar do tempo tem ganhado consistência e

importância no cenário jurídico brasileiro.

Para o seu aperfeiçoamento imprescindível a existência de um regime jurídico

disciplinar dos Magistrados forte, consistente, atual, justo e efetivo.

Espera-se que no futuro o novo Estatuto da Magistratura venha atingir esses

propósitos.

Uma instituição organizada de forma profissional e que se propõe a ter um perfil

impessoal, racional, formal e perseguidor do interesse público da coletividade como é o

caso do Poder Judiciário, tem o dever irrenunciável de fielmente desempenhar seu

verdadeiro papel e: i) conter os excessos dos demais órgãos do Estado brasileiro; ii)

representar o princípio conservador das liberdades do cidadão; e, ainda, iii) constituir o

meio mais adequado para tornarem reais e efetivos os direitos e as garantias proclamados

pela Constituição Federal de 1988, simbolicamente chamada de Constituição Cidadã.24

Portanto, com o amadurecimento e a evolução sociocultural do País, alcançada

pelos fenômenos inconscientes das pessoas, é que no futuro – espera-se que próximo –,

se possa ter um Poder Judiciário no Brasil cada vez melhor, cada vez mais comprometido

com as causas públicas, com o regime disciplinar, e em nível mais abstrato, com um

Estado Democrático e Social de Direito.

24 Cf. decisão do Min. Celso Mello, STF, proferida no MS 23.452-RJ.

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REFERÊNCIAS

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Revista dos Tribunais, 1994.

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MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 32. ed. atual. por

Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho. São

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Ari Sundfeld; Guillermo Andrés Muñoz. (org.). São Paulo: Malheiros Editores, 2000.

PORTA, Marcos de Lima. Processo Administrativo e o devido processo legal.

São Paulo: Quartier Latin, 2003.