Regulação e Agências Reguladoras

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Regulação e Agências Reguladoras Governança e Análise de Impacto Regulatório Casa Civil da Presidência da República Pedro Ivo Sebba Ramalho Organização Alexandre Santos de Aragão Bernardo Mueller Carlos García Fernández César Mattos Dirceu Raposo de Mello Donald Macrae Francisco Gaetani Jim Tozzi Kélvia Albuquerque Luiz Alberto dos Santos Marcelo Ramos Pedro Farias Pedro Ivo Sebba Ramalho Ronaldo Seroa da Motta Verônica Cruz

Transcript of Regulação e Agências Reguladoras

  • Regulao e Agncias ReguladorasGovernana e Anlise de Impacto Regulatrio

    Casa Civil da Presidncia da Repblica

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    o Pedro Ivo Sebba Ramalho

    Casa Civil daPresidncia da Repblica

    Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional de Gesto em Regulao - PRO-REG

    Apoio: Realizao:

    Organizao

    Alexandre Santos de AragoBernardo MuellerCarlos Garca FernndezCsar MattosDirceu Raposo de MelloDonald MacraeFrancisco GaetaniJim TozziKlvia AlbuquerqueLuiz Alberto dos SantosMarcelo RamosPedro FariasPedro Ivo Sebba RamalhoRonaldo Seroa da MottaVernica Cruz

    O interesse pelos temas da regulao estatal de mercados e do papel das agncias reguladoras tem ganhado cada vez mais espao na atualidade.

    No Brasil, grandes esforos tm sido feitos para articular iniciativas que caminhem rumo ao desenvolvimento, promovendo o crescimento e o bem-estar social por meio da criao de ambiente favorvel aos investimentos e estabilidade econmica. Para trilhar esse caminho, considera-se essencial o fortalecimento institucional e o incremento da credibilidade do sistema regulatrio brasileiro.

    O novo sistema regulatrio brasileiro, criado a partir do surgimento das agncias reguladoras durante a reforma regulatria da dcada de 1990, ainda est em fase de consolidao. Questionamentos sobre a legitimidade das agncias reguladoras so frequentes e refletem o ineditismo desse arranjo institucional frente estrutura e tradio estatal brasileira. Com pouco mais de uma dcada, as dez agncias reguladoras federais encontram-se em momento-chave para o ajuste de seu desenho institucional e de sua atuao regulatria.

    Este livro fruto de parceria entre a Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria Anvisa e a Casa Civil da Presidncia da Repblica no mbito do Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gesto em Regulao PRO-REG. A ideia de organizar o livro originou-se no Seminrio Internacional de Avaliao do Impacto Regulatrio: experincias e contribuies para a melhoria da qualidade da regulao, realizado em outubro de 2007 pela Anvisa em conjunto com a Casa Civil e os Ministrios da Fazenda e do Planejamento, Oramento e Gesto, tendo ainda o apoio da Organizao para Cooperao e Desenvolvimento Econmico OCDE.

    O livro est dividido em quatro partes. A primeira composta por captulos que apresentam aspectos relacionados teoria utilizada para exercer a regulao econmica de mercados. Na segunda, os captulos tm em comum a valorizao do arranjo institucional para compreender o funcionamento do sistema regulatrio e o de defesa da concorrncia no Brasil. A terceira parte conta com captulos relacionados s iniciativas do governo federal para ampliao da governana regulatria por meio do fortalecimento da capacidade institucional do sistema regulatrio. So as perspectivas da Casa Civil da Presidncia da Repblica, dos Ministrios da Fazenda e do Planejamento, Oramento e Gesto, do Banco Interamericano de Desenvolvimento BID e da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria. A quarta e ltima parte do livro composta por vises de especialistas estrangeiros sobre a anlise de impacto regulatrio, na perspectiva de sua implantao no Brasil.

    Alm dos palestrantes e debatedores do Seminrio, outros especialistas compem a publicao, que pretende ser referncia atual e til aos pesquisadores do grande tema da regulao e aos operadores da poltica regulatria e da regulao no Estado brasileiro.

  • Pedro Ivo Sebba RamalhoOrganizao

    Regulao e Agncias ReguladorasGovernana e Anlise de Impacto Regulatrio

    Casa Civil daPresidncia da Repblica

    1 Edio

    Braslia

    2009

  • Copyright 2009. Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria Anvisa e Casa Civil da Presidncia da Repblica.Todos os direitos reservados. permitida a reproduo parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte e que no sejapara venda ou qualquer fim comercial. A responsabilidade pelos direitos autorais de textos e imagens desta obra dos autores. A Anvisa e a Casa Civil, igualmente, no se responsabilizam pelas ideias contidas nesta publicao.

    Presidente da RepblicaLuiz Incio Lula da Silva

    Ministrio da Sade

    Ministro de Estado da SadeJos Gomes Temporo

    Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria

    Diretor-PresidenteDirceu Raposo de Mello

    DiretoresAgnelo Santos Queiroz FilhoDirceu Brs Aparecido BarbanoJos Agenor lvares da SilvaMaria Ceclia Martins Brito

    Casa Civil da Presidncia da Repblica

    Ministra-Chefe da Casa CivilDilma Rousseff

    Subchefia de Anlise e Acompanhamento de Polticas Governamentais

    SubchefeLuiz Alberto dos Santos

    Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gesto em Regulao PRO-REG

    Comit Gestor do PRO-REGCasa Civil da Presidncia da RepblicaLuiz Alberto dos Santos (coordenador)Rodrigo Augusto Rodrigues (suplente)

    Ministrio da FazendaMarcelo de Matos Ramos (titular)Pricilla Maria Santana (suplente)

    Ministrio do Planejamento, Oramento e GestoPatrcia Vieira da Costa (titular)Luis Henrique D'Andrea (suplente)

    Coordenador Tcnico do PRO-REGJadir Proena

    Representantes da Anvisa no Comit Consultivo do PRO-REGDirceu Raposo de Mello (titular)Pedro Ivo Sebba Ramalho (suplente)

    Elaborao, edio e distribuioAgncia Nacional de Vigilncia SanitriaSIA, Trecho 5, rea Especial 57, Lote 20071205-050, Braslia DFTel.: (61) 3462 6000Home page: www.anvisa.gov.brE-mail: [email protected]

    Assessoria de Divulgao e Comunicao InstitucionalMartha Nazar Corra

    Coordenao editorialPablo Barcellos

    OrganizadorPedro Ivo Sebba Ramalho

    Coordenao executivaFlvia Neves Rocha Alves

    AutoresAlexandre Santos de AragoBernardo MuellerCarlos Garca FernndezCsar MattosDirceu Raposo de MelloDonald MacraeFrancisco GaetaniJim TozziKlvia AlbuquerqueLuiz Alberto dos SantosMarcelo RamosPedro FariasPedro Ivo Sebba RamalhoRonaldo Seroa da MottaVernica Cruz

    Tiragem: 1.000 exemplares - 1 edio.

    Ficha CatalogrficaRegulao e Agncias Reguladoras: governana e anlise de impacto regulatrio / Pedro Ivo Sebba Ramalho (Org.) Braslia: Anvisa, 2009.

    288 p.

    ISBN 978-85-88233-27-0

  • Sumrio

    Agradecimentos ................................................................................... 5Apresentao ....................................................................................... 7Sobre os autores .................................................................................19

    PARTE 1TEORIA DA REGULAO: PRNCIPIOS E FUNDAMENTOS PARA A REGULAO ECONMICA DE MERCADO ........................................ 27

    Captulo 1Interpretao consequencialista e anlise econmica do Direito Pblico luz dos princpios constitucionais da eficincia e da economicidade .....29Alexandre Santos de Arago

    Captulo 2Estado e regulao: fundamentos tericos ..........................................53Vernica Cruz

    Captulo 3Princpios de regulao econmica .................................................... 87Ronaldo Seroa da Motta

    PARTE 2DESENHO INSTITUCIONAL DO SISTEMA REGULATRIO E DA DEFESA DA CONCORRNCIA NO BRASIL .......................................105

    Captulo 4Instituies e salvaguardas no sistema regulatrio brasileiro ...........107Bernardo Mueller

    Captulo 5Regulao e agncias reguladoras: reforma regulatria da dcada de 1990 e desenho institucional das agncias no Brasil .........................125Pedro Ivo Sebba Ramalho

    Captulo 6Evoluo institucional da defesa da concorrncia no Brasil: a reforma do Cade ............................................................................................. 161Csar Mattos

  • PARTE 3GOVERNANA REGULATRIA NO BRASIL: FORTALECIMENTO DA CAPACIDADE PARA GESTO EM REGULAO ............................... 175

    Captulo 7Desafios da governana regulatria no Brasil ................................... 177Luiz Alberto dos Santos

    Captulo 8Anlise de impacto regulatrio e melhoria regulatria .....................189Francisco Gaetani e Klvia Albuquerque

    Captulo 9Governana regulatria: experincias e contribuies para uma melhor qualidade regulatria ........................................................................ 197Marcelo Ramos

    Captulo 10Mejorando la gestin de la regulacin: la experiencia del Banco Interamericano de Desarrollo BID en Brasil ................................. 207Pedro Farias

    Captulo 11Boas prticas regulatrias: previsibilidade e transparncia na Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria ...................................................... 229Dirceu Raposo de Mello e Pedro Ivo Sebba Ramalho

    PARTE 4ANLISE DE IMPACTO REGULATRIO: EXPERINCIAS INTERNACIONAIS ........................................................................... 253

    Captulo 12Anlise de Impacto Regulatrio AIR: a experincia do Reino Unido ...........................................................255Donald Macrae

    Captulo 13Da necessidade de uma reviso regulatria centralizada ................. 265Jim Tozzi

    Captulo 14La Manifestacin de Impacto Regulatorio MIR: una MIRada a la regulacin de calidad ........................................................................275Carlos Garca Fernndez

  • 5Agradecimentos

    importante registrar os agradecimentos para as pessoas que viabilizaram a publicao deste livro, originado do Seminrio Internacional de Avaliao do Impacto Regulatrio.

    Inicialmente, aos colaboradores para a realizao do Seminrio. Na

    Secretaria de Gesto do Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto,

    meus agradecimentos Klvia Albuquerque. Na Anvisa, aos colegas do

    Ncleo de Assessoramento em Relaes Internacionais Marta Veloso, Ana Paula Soares Juca da Silveira e Silva, Renata Carvalho e Mateus Rodrigues

    Cerqueira; da Unidade de Promoo de Eventos Profa. Maria Amlia, Maria de Ftima e Gilson Cezzar; da Coordenao de Cerimonial Kay Tostes e Christian Martins de Sabia; e da Assessoria de Divulgao e Comunicao

    Institucional poca, Renatha Melo. Agradecimentos ao Stephane Jacobzone, da Organizao para Cooperao e Desenvolvimento Econmico OCDE, que foi o ponto de colaborao da Organizao realizao do evento e esteve presente

    para proferir a Conferncia Magna bastante apreciada pelos presentes.Alm disso, a publicao deste livro no seria possvel sem o apoio e a

    colaborao de grande nmero de pessoas. Agradeo de maneira especial aos

    autores, que prontamente atenderam ao convite para integrar o livro, mesmo

    nos casos de curto espao temporal para elaborao e entrega dos textos:

    Alexandre Santos de Arago, Bernardo Mueller, Carlos Garca Fernndez,

    Csar Mattos, Dirceu Raposo de Mello, Donald Macrae, Francisco Gaetani,

    Jim Tozzi, Klvia Albuquerque, Luiz Alberto dos Santos, Marcelo Ramos,

    Pedro Farias, Ronaldo Seroa da Motta, Vernica Cruz e Martha Fabiola

    Carren-Gmez, da Cofemer, que participou do Seminrio e foi o contato para

  • 6envio do texto daquele rgo. Na Casa Civil, aos parceiros da Subchefia de Anlise e Acompanhamento de Polticas Governamentais Luiz Alberto dos Santos, Rodrigo Rodrigues, Jadir Proena e Giselle Santa Cruz, sem os quais

    nem o Seminrio, nem o livro teriam existido. Esperamos que ainda haja

    muitos outros projetos comuns. Estaremos sempre disposio. Na Anvisa,

    ao Diretor-Presidente Dirceu Raposo de Mello, pelo apoio a nossas iniciativas

    e prioridade para este projeto. Assessoria de Divulgao e Comunicao

    Institucional Martha Correa, Carlos Augusto e Pablo Barcellos , a nossa gratido por todo o apoio na colaborao e profissionalismo para a consecuo das etapas editoriais em tempo recorde. Forte agradecimento ao pessoal da

    Assessoria Tcnica e Parlamentar Gustavo Trindade, Adriana Ivama e Danitza Buvinich , em especial Flvia Neves Rocha Alves, que foi pronta colaboradora em vrios momentos da organizao deste livro.

  • 7Apresentao

    O interesse pelos temas da regulao estatal de mercados e do papel das agncias reguladoras tem ganhado cada vez mais espao na atualidade. Vivemos hoje crise financeira mundial na qual a chamada mo visvel do Estado se sobrepe propalada metfora da mo invisvel do mercado, de Adam Smith, para quem os mercados deveriam se autorregular, com mnima

    presena da ao estatal na economia.

    Mais regulao o que os agentes econmicos, surpreendentemente,

    pedem hoje aos governos. Em todo o mundo, recrudesce o debate sobre o

    modelo de desenvolvimento das naes e de quanto Estado devemos ter. Isso contra as previses daqueles que, ao fim do sculo passado, pensavam termos chegado a uma espcie de fim da histria. A forte interveno do Estado, via regulao de mercados, agora a nova fase do capitalismo mundial.

    No Brasil, grandes esforos tm sido feitos para articular iniciativas que caminhem rumo ao desenvolvimento, promovendo o crescimento e o bem-

    estar social por meio da criao de ambiente favorvel aos investimentos e estabilidade econmica. Para trilhar esse caminho, considera-se essencial

    o fortalecimento institucional e o incremento da credibilidade do sistema regulatrio brasileiro. Atributos como a previsibilidade do processo decisrio

    em matrias regulatrias e a estabilidade das regras para os negcios so

    exemplos de fundamentos necessrios para a elevao do nvel de confiana no sistema. Na verdade, no se trata de regular mais, e sim de produzir

    regulao mais inteligente.

    O novo sistema regulatrio brasileiro, criado a partir do surgimento das

    agncias reguladoras durante a reforma regulatria da dcada de 1990, ainda est em fase de consolidao. Questionamentos sobre a legitimidade das agncias reguladoras so frequentes e refletem o ineditismo desse arranjo

  • 8institucional frente estrutura e tradio estatal brasileira. Com pouco mais de uma dcada, as dez agncias reguladoras federais encontram-se em momento-chave para o ajuste de seu desenho institucional e de sua atuao regulatria.

    O governo federal tem-se ocupado com o aperfeioamento do sistema regulatrio, principalmente por meio de iniciativas como a proposio

    do Projeto de Lei n 3.337/2004, que dispe sobre a gesto, a organizao e o controle social das agncias reguladoras, e a criao do Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gesto em Regulao PRO-REG, institudo pelo Decreto n 6.062/2007. Concebido para melhorar a qualidade da regulao dos rgos e entidades federais, o PRO-REG objetiva fortalecer o sistema regulatrio e a capacidade de formulao e anlise de polticas pblicas em setores regulados; melhorar a coordenao e

    o alinhamento estratgico entre polticas setoriais e o processo regulatrio;

    fortalecer a autonomia, a transparncia e o desempenho das agncias reguladoras; e desenvolver e aperfeioar os mecanismos para o exerccio do controle social e da transparncia no mbito do processo regulatrio.

    Uma importante atividade desenvolvida no mbito do PRO-REG foi o Seminrio Internacional de Avaliao do Impacto Regulatrio: experincias e contribuies para a melhoria da qualidade da regulao, realizado

    em outubro de 2007. O evento foi organizado e promovido pela Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria Anvisa em conjunto com a Casa Civil da Presidncia da Repblica e os Ministrios da Fazenda e do Planejamento, Oramento e Gesto, tendo ainda o apoio da Organizao para Cooperao e

    Desenvolvimento Econmico OCDE. O Seminrio contou com a participao de alguns dos principais especialistas nacionais e internacionais no tema da

    regulao, com destaque para a discusso da anlise de impacto regulatrio

    entendida como ferramenta valiosa para melhoria da qualidade regulatria e desenvolvimento da governana regulatria no Brasil.

    Este livro fruto dessa parceria entre a Anvisa e a Casa Civil da Presidncia da Repblica. A ideia de organizar o livro originou-se no Seminrio. Alm dos palestrantes e debatedores daquele evento, outros

    especialistas compem a publicao, que pretende ser referncia atual e til aos pesquisadores do grande tema da regulao e aos operadores da poltica

    regulatria e da regulao no Estado brasileiro.

  • 9O livro est dividido em quatro partes. A primeira composta por

    captulos que apresentam aspectos relacionados teoria utilizada para

    exercer a regulao econmica de mercados.

    O Captulo 1, escrito por Alexandre Santos de Arago, discute os

    princpios constitucionais da eficincia e da economicidade, especialmente sobre como se d sua recepo pelo Direito Pblico Econmico sob o ponto

    de vista pragmtico-consequencialista. Trata-se de trabalho claramente

    orientado pela Escola Law and Economics, ou Anlise Econmica do Direito,

    que encontra nos fundamentos da microeconomia a orientao para que a interpretao dos preceitos legais seja a mais coerente com a realidade ftica, como a racionalidade e a eficincia podem contribuir para que o sistema de normas induza certos comportamentos e uma sano afete o comportamento dos agentes. Para o autor, a perspectiva consequencialista e pragmtica do

    Direito a que deve influir e orientar as atividades administrativa e judicante, sob pena de no se conseguir realizar na prtica os objetivos jurdicos

    definidos em lei. Tal perspectiva extremamente relevante para a teoria da regulao, visto que o sistema regulatrio deve observar que sua interveno

    na economia s ter efetividade e, como se diz no Brasil, a regulamentao elaborada seja uma lei que pegue, se a interpretao mais correta e adequada for aquela considerada mais eficiente e econmica para os agentes.

    No Captulo 2, Vernica Cruz apresenta abordagem ampla do processo

    de reforma regulatria e das motivaes para a disseminao de novo sistema regulatrio na Amrica Latina e no Brasil. As concepes correntes

    sobre o papel do Estado para exerccio da regulao so abordadas de forma sistemtica. As razes para a criao das agncias reguladoras so baseadas tanto em argumentos positivos como normativos, havendo ampla variedade

    de combinaes possveis e verificveis. A autora sustenta que os trs pilares sobre os quais se fundamentou teoricamente a criao das agncias reguladoras delegao, credibilidade e especializao dos agentes no foram suficientemente assimilados na prtica do caso brasileiro. Ao enfatizar a relevncia do papel das instituies, defende a valorizao dos mecanismos de transparncia e accountability para devolver ao sistema regulatrio o peso do controle democrtico das decises, mitigado com o distanciamento

    das agncias do poder poltico e da sociedade.

  • 10

    Ronaldo Seroa da Motta, no terceiro captulo da primeira parte do livro,

    apresenta as dimenses consideradas mais relevantes para a construo e

    operao de sistemas de regulao econmica e de defesa da concorrncia. Em texto que prima pela objetividade, clareza e didatismo, so abordados

    e contextualizados os conceitos de eficincia produtiva; custos afundados; subsdios cruzados; verticalizao; alocao de risco; parceria pblico-

    privada; gesto privada; critrios de acesso; estruturas de governana;

    critrios de entrada e sada e sistema tarifrio. Ao fim, o autor aponta as perspectivas de avano do sistema regulatrio brasileiro frente tramitao do PL n 3.337/2004 e defende a elevao do desempenho e da transparncia do sistema pelo exerccio do poder poltico do Congresso Nacional e controle

    social das agncias reguladoras, o que ir fortalecer a governana regulatria. Na segunda parte do livro, os captulos tm em comum a valorizao

    do arranjo institucional para compreender o funcionamento do sistema regulatrio e o de defesa da concorrncia no Brasil.

    O Captulo 4, de autoria de Bernardo Mueller, analisa o ambiente e

    a poltica regulatria brasileira frente estrutura institucional do pas, considerando-se fundamentalmente as restries e constrangimentos, tomados como salvaguardas para os agentes econmicos que necessitam

    de protees e garantias para operar seus negcios e ter incentivos para

    o investimento. O autor apresenta trs casos de tentativa de mudanas na dinmica da regulao realizadas pelo governo Lula e analisa relaes entre controle das agncias e custos de credibilidade. O instrumental analtico baseado nos supostos de comportamento estratgico e preferncias dos atores. A concluso do professor Mueller otimista em relao s instituies nacionais, uma vez que os casos analisados apontam para estrutura

    institucional que garante relativa estabilidade a todo o sistema poltico e

    econmico brasileiro, o que aponta para amadurecimento consistente da

    regulao no pas.

    No Captulo 5, Pedro Ivo Sebba Ramalho apresenta a criao das

    agncias reguladoras brasileiras por meio da caracterizao dos processos de agencificao e reforma regulatria. dada nfase anlise do desenho institucional das dez agncias como produto de contexto particular formado pelos objetivos do ento governo para a criao de agncias autnomas e

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    as condies polticas reais dadas pelo arranjo institucional do perodo. O

    autor aponta ainda elementos de possvel ajuste do desenho institucional e

    funcionamento das agncias reguladoras, ainda em construo, a partir do desenrolar da tramitao da proposta legislativa do Poder Executivo PL n 3.337/2004 , ora em debate no Congresso Nacional. Ao fim, conclui que a perspectiva para as agncias reguladoras o ajuste estrutural de seu desenho institucional, com expectativa de impacto positivo sobre seu

    funcionamento, em especial de sua relao com a sociedade, por meio do aprimoramento de processos e mecanismos de accountability, contrafluxo da tendncia ao insulamento burocrtico.

    Csar Mattos o autor do Captulo 6, no qual feita anlise do sistema de defesa da concorrncia no Brasil. Trata-se do exame das principais mudanas previstas para o que se convencionou chamar de novo Cade, em referncia s mudanas previstas no PL n 5.877/2005, do Poder Executivo, que reestrutura institucionalmente o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrncia SBDC, remodelando as funes do atual Conselho Administrativo de Defesa Econmica Cade, da Secretaria de Direito Econmico do Ministrio da Justia SDE/MJ e da Secretaria de Acompanhamento Econmico do Ministrio da Fazenda Seae/MF. So discutidos aspectos relativos introduo do exame prvio na anlise dos Atos de Concentrao ACs no Cade; racionalizao burocrtica que deve reduzir custos aumentando a

    eficincia dos processos; mudana nos critrios de notificao dos ACs; aos aperfeioamentos na poltica de combate aos cartis; e s alteraes conceituais do ponto de vista econmico na lei. O Projeto de Lei parte do

    Programa de Acelerao do Crescimento PAC e foi recentemente enviado ao Senado Federal, aps sua aprovao no Plenrio da Cmara dos Deputados.

    A terceira parte do livro conta com captulos relacionados s iniciativas

    do governo federal para ampliao da governana regulatria por meio do fortalecimento da capacidade institucional do sistema regulatrio. So as perspectivas da Casa Civil da Presidncia da Repblica, dos Ministrios da Fazenda e do Planejamento, Oramento e Gesto, do Banco Interamericano

    de Desenvolvimento BID e da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria. Nos trs primeiros casos, os textos refletem as apresentaes realizadas pelos autores no painel Governana Regulatria: experincias e contribuies

  • 12

    para uma melhor qualidade regulatria, realizado durante o Seminrio

    Internacional de Anlise de Impacto Regulatrio, em outubro de 2007.

    Luiz Alberto dos Santos, no Captulo 7, apresenta panorama da atualidade

    da gesto pblica brasileira e eficincia da atuao do Estado, com nfase nos desafios da regulao. dado destaque s questes da transparncia e acesso a informaes, da participao, da excessiva e fragmentada produo legislativa, da judicializao e da qualidade da justia brasileira. A discusso

    sobre o desenho institucional e funcionamento das agncias e outros rgos reguladores, associada aos marcos regulatrios setoriais, o ponto de

    chegada. Os principais desafios colocados como parte da agenda do prximo perodo so o aumento da legitimidade, capacidade e transparncia das instituies regulatrias; a clareza de papis, limites e responsabilidades

    dos atores governamentais envolvidos na regulao; a definio clara e precisa da extenso e dos limites da autonomia das agncias reguladoras; o aperfeioamento dos mecanismos de coordenao e superviso, e a implementao da anlise de impacto regulatrio, como resultado de processo

    de envolvimento e parceria entre as instituies de governo e a sociedade; e o

    aperfeioamento dos marcos regulatrios e da simplificao administrativa, com a reduo dos excessos burocrticos. Para o autor, o enfrentamento desses desafios dar as bases para o fortalecimento institucional, tarefa permanente para se alcanar novo patamar de desenvolvimento da governana regulatria

    no Brasil.

    O Captulo 8, de autoria de Francisco Gaetani e Klvia Albuquerque,

    elegante sntese do estado da arte da poltica regulatria no Brasil. Inicia

    discorrendo sobre a ascenso do Estado Regulador nas ltimas dcadas

    em pases da Europa e em pases emergentes. Aponta que a instaurao

    da regulao pelos Estados ocorreu de maneira diversa, com ou sem

    privatizao de empresas pblicas, havendo tendncia de criao de agncias reguladoras em diferentes setores econmicos. No caso do Brasil, os autores lembram que os marcos regulatrios, necessrios operao da regulao

    em setores privatizados, foram constitudos tardiamente, aps os processos de privatizao. No caso das agncias reguladoras, pontuam que o esforo de consolidao institucional somente se iniciou a partir de 2003 e por um

    governo que no tinha empatia com as polticas privatizantes do antecessor.

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    Tratam, ainda, de apresentar a dinmica de aprendizado sobre polticas pblicas, enfatizando o papel do dilogo que propicia trocas entre atores no nvel internacional, por meio de diversas organizaes-chave. No campo da

    regulao, os autores destacam o papel estratgico desempenhado pela OCDE,

    que desde 1997 vem desenvolvendo o Programa de Melhoria Regulatria

    para aumentar a qualidade da regulao em vrios pases. O captulo aborda

    tambm as atuais iniciativas do governo federal para melhorar a qualidade da regulao no pas, necessrias para promover o desenvolvimento depois

    de vencida a guerra contra a hiperinflao e alcanada a estabilidade macroeconmica. Por fim, ao ressaltar a anlise de impacto regulatrio como valiosa ferramenta de gesto, os autores concluem que o aprimoramento do marco regulatrio do pas depende tambm do comprometimento de

    outros poderes, de outras instncias governamentais, do setor produtivo e dos cidados.

    As funes e as perspectivas da Secretaria de Acompanhamento Econmico do Ministrio da Fazenda Seae/MF no campo regulatrio e da defesa da concorrncia so os objetos de anlise do Captulo 9, de autoria de Marcelo Ramos. Inicialmente, o texto aponta uma srie de conceitos-chave

    para caracterizar o campo da regulao denominado de better regulation,

    estruturado nos ltimos anos em pases desenvolvidos e organismos

    multilaterais com o objetivo de promover a governana regulatria. A

    emergncia do Estado Regulador colocou, segundo Ramos, a questo do dficit de legitimidade para as agncias reguladoras, rgos relativamente autnomos e dirigidos por atores no eleitos diretamente. Surge, assim,

    a Anlise de Impacto Regulatrio AIR, processo pelo qual os rgos reguladores identificam e quantificam os benefcios e custos relevantes que provavelmente sero as consequncias da adoo de proposta de regulao, geralmente por meio de regulamentao. Discorre sobre a estruturao das

    AIRs nos EUA e na Europa para finalmente mencionar a criao do Impact Assessment Board, na Secretaria Geral da Comisso Europeia, com o objetivo

    de supervisionar a qualidade das anlises de impacto produzidas pelos

    demais rgos da Comisso durante a proposio de novas polticas pblicas.

    Em seguida, o autor apresenta a Seae/MF, que atua fundamentalmente nos campos de promoo e defesa da concorrncia, de regulao econmica e de

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    acompanhamento de mercados. Recentemente, a Seae vem aplicando Roteiro

    de Anlise Concorrencial de normas regulatrias, usado na anlise de normas

    propostas por agncias reguladoras. Por fim, o autor defende que a Seae vem desempenhando componente da AIR e espera contribuir para a melhoria

    da qualidade da regulao no Brasil, ao incorporar a anlise concorrencial

    reviso das regras regulatrias como primeiro passo para a elaborao de

    poltica de anlise de impacto regulatrio no Brasil.

    No Captulo 10, de autoria de Pedro Farias, temos a oportunidade de

    conhecer a viso do Banco Interamericano de Desenvolvimento BID sobre a melhoria da gesto em regulao no Brasil. O objetivo do captulo apresentar

    a experincia de construo e implementao de estratgia de assistncia tcnica e financiamento de atividades relacionadas ao fortalecimento institucional de atividades regulatrias do governo brasileiro. Inicialmente,

    o autor discorre sobre as experincias internacional e brasileira no campo da gesto em regulao, apontando que o Programa proposto buscou

    adequar as lies de pases mais desenvolvidos em matria regulatria ao

    contexto poltico-institucional do Brasil. Em seguida, descreve a estratgia

    de elaborao do Programa por meio de iniciativas como, entre outras,

    realizao de misses em pases EUA, Mxico e Bolvia para conhecer as estratgias de superviso de agncias reguladoras, mecanismos de avaliao de desempenho, eficincia e prestao de contas. Farias ento apresenta os objetivos, componentes, estrutura e mtodos de acompanhamento e

    avaliao do Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para

    Gesto em Regulao PRO-REG. Ao fim, aponta as lies aprendidas e as perspectivas do Programa, destacando, ainda no incio de sua implementao,

    as potencialidades de avanos para a melhoria e modernizao da gesto e a

    ampliao da qualidade da regulao.

    De autoria de Dirceu Raposo de Mello e Pedro Ivo Sebba Ramalho, o

    Captulo 11, ltimo da Parte 3, discute o tema das boas prticas regulatrias

    nas agncias reguladoras, apresentando os recentes avanos da experincia da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria. Com base no resgate do contexto internacional de desenvolvimento institucional das agncias reguladoras, e nas recentes recomendaes relacionadas governana regulatria, os

    autores apresentam as iniciativas da Anvisa no desenho e implementao

  • 15

    de programa de boas prticas regulatrias construdo a partir das diretrizes

    governamentais formuladas para o sistema regulatrio brasileiro, em geral, e para o setor sade, em particular. Inicialmente, discutem o surgimento e

    o desenvolvimento da regulao e das agncias reguladoras nos EUA. Em seguida, apresentam a viso da OCDE sobre a reforma regulatria e as principais recomendaes daquele organismo para melhorar a qualidade e

    a efetividade de polticas regulatrias nos pases. Partindo da caracterizao da Agncia em seu desenho institucional, sua abrangncia de atuao e suas peculiaridades, os autores descrevem o Programa de Melhoria do Processo

    de Regulamentao da Anvisa. Os componentes da Agenda Regulatria, da

    Anlise de Impacto Regulatrio e dos processos de ampliao da transparncia e da participao social no processo regulatrio so destacados. Concluem que

    o Programa de Boas Prticas Regulatrias da Anvisa, elaborado e institudo

    em sintonia com as diretrizes do PRO-REG e com a Poltica de Sade, alm

    de iniciativa pioneira na Administrao Pblica federal brasileira, pode ser considerado importante contribuio para a promoo de ambiente

    institucional favorvel ao desenvolvimento social e econmico do pas.A Parte 4 do livro trata de apresentar vises de especialistas estrangeiros

    sobre a anlise de impacto regulatrio, na perspectiva de sua implantao

    no Brasil.

    O Captulo 12, assinado por Donald Macrae, da Comisso para Melhoria

    da Regulao do Reino Unido, baseado em sua palestra proferida no painel Anlise de Impacto Regulatrio como Ferramenta para a Qualidade Regulatria: experincias e desafios do Seminrio. O autor apresenta inicialmente a Anlise de Impacto Regulatrio como ferramenta para escolhas entre polticas que pode ter diferentes abordagens, nveis de complexidade e formas de resultados. Pondera que as AIRs haviam-se tornado muito mais formalidade que parte importante do processo de tomadas de deciso sobre polticas. Seu custo e dificuldade acabaram por tornar a AIR ferramenta com muito potencial e poucos retornos. Macrae passa ento a resgatar o papel e

    as experincias de trs grupos ou organizaes no Reino Unido relacionadas a polticas pblicas e regulao: o Grupo de Reforma Poltica, o Painel de Questionamento do Departamento de Assuntos Ambientais, Alimentares e Rurais e a Comisso para a Melhoria da Regulao. Aps analisar as

  • 16

    dificuldades apontadas pelos trs grupos acima, aponta que a execuo de AIRs pode ser considerada uma das atividades mais difceis na produo de polticas pblicas. Segundo Macrae, quase todas as polticas governamentais

    tero algum impacto, mas podem existir impactos maiores e no previstos.

    Na concluso, o autor ressalta que agora o Reino Unido utiliza modelo

    simplificado de AIR, que apresenta os resultados em termos de questes-chave em at duas pginas para os decisores.

    No Captulo 13, Jim Tozzi apresenta a viso de sua organizao no-

    governamental sobre a estrutura institucional e o funcionamento das agncias reguladoras brasileiras. Para tanto, o autor, ex-diretor assistente do Office of Management and Budget OMB da Casa Branca, EUA, faz um resgate dos perodos relativos aos mandatos dos Presidentes Nixon, Ford,

    Carter, Reagan, Clinton e Bush para apresentar a evoluo da legislao e do

    funcionamento dos rgos de superviso das agncias de regulao daquele pas. Destaca a edio da Lei de Reduo da Burocracia (Paperwork Reduction

    Act), utilizada para controlar as informaes coletadas pelo governo, e da Lei da Qualidade dos Dados (Data Quality Act), que serve para regular as informaes divulgadas pelo governo. As duas legislaes, com o trabalho do Office of Information and Regulatory Affairs OIRA/OMB, constituem o que o autor chamou de Tringulo Federal de Informaes, mecanismo pelo qual so realizadas as revises regulatrias baseadas em estudos de

    Anlises de Impacto Regulatrio. Ao fim, Tozzi conclui que a deciso mais acertada para as autoridades brasileiras seria a instaurao de sistema de

    reviso regulatrio que seja operado e garantido por autoridade regulatria

    centralizada responsvel pela publicao de regras de bom governo que regulem os reguladores e que tenham autoridade e recursos para imp-las. Ainda, para o autor, a autoridade regulatria centralizada deve exigir e

    impor compromissos por parte das agncias regulatrias para com terceiros; implementar processo de soluo de conflitos para resolver problemas com diretrizes conflitantes divulgadas pelas agncias regulatrias; e reiterar o fato de que as atividades das agncias regulatrias devem ser transparentes.

    O Captulo 14, de autoria de Carlos Garca Fernndez, apresenta a

    Comisin Federal de Mejora Regulatoria Cofemer e seu trabalho de anlise de propostas de regulao produzidas pelos rgos do governo mexicano.

  • 17

    Criada no mbito da poltica de melhoria regulatria do Mxico, a Cofemer surgiu com propsito de fomentar a qualidade de marco regulatrio daquele pas como fator primordial de garantia do Estado de Direito que promova permanentemente a competitividade e crie ambiente de atrao de

    investimentos privados. Sua misso inclui ainda a promoo da transparncia na elaborao e aplicao das regulaes, a fim de gerar benefcios superiores a seus custos e o mximo benefcio para a sociedade. A Comisso atua de acordo com os limites estabelecidos pela Ley Federal de Procedimiento Administrativo LFPA, de abril de 2000. O mtodo bsico utilizado pela Comisso a anlise da Manifestacin de Impacto Regulatorio MIR, recebida por ela sempre que algum rgo envia proposta de novo regulamento

    para sua anlise. A MIR foi introduzida no Mxico no ano 2000 para todos os anteprojetos de regulamento que impliquem custos para os particulares.

    Nesse aspecto, o procedimento de consulta pblica elemento-chave para a

    promoo da transparncia e controle da sociedade e melhoria da qualidade da regulao. Segundo o autor, tal processo de reviso aberta no s promove a transparncia das mudanas regulatrias propostas, permitindo o enriquecimento da discusso com aumento e qualificao das informaes aos reguladores, como tambm permite compartilhar os custos polticos de

    sua aprovao.

    Neste livro os leitores interessados no tema encontraro rico terreno para

    refletir sobre as possibilidades da regulao, ou mesmo consultar experincias de execuo de projetos relacionados melhoria da qualidade regulatria. A

    riqueza est tanto na excelncia dos captulos quanto na diversidade de seus temas e abordagens. So projetos como este que nos fazem acreditar que a regulao federal brasileira tem enorme possibilidade de desenvolvimento e aprimoramento pela capacidade dos servidores pblicos que atuam em

    diversos espaos, sempre comprometidos com a sociedade.

    Braslia, fevereiro de 2009.

    O organizador

  • 19

    Sobre os autores

    Alexandre Santos de Arago

    Doutor em Direito do Estado pela Universidade de So Paulo USP. Mestre em Direito Pblico pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro UERJ. Procurador do Estado do Rio de Janeiro, Advogado. Professor Adjunto de Direito Administrativo da UERJ. Professor do Mestrado em Regulao e Concorrncia da Universidade Candido Mendes. Professor Visitante do Instituto de Economia da UFRJ. Professor de Ps-graduao da Fundao Getlio Vargas FGV do Rio de Janeiro e de So Paulo. Contato: [email protected].

    Bernardo Mueller

    Mestre e doutor pela University of Illinois at Champaign-Urbana (1993 e 1994). Professor de Economia na Universidade de Braslia UnB desde 1995. Suas reas de interesse so Economia Poltica, Economia da Regulao,

    Nova Economia das Instituies e Economia do Meio Ambiente. Possui mais

    de quarenta publicaes em livros e peridicos nacionais e internacionais,

    entre eles The Journal of Law Economics and Organisation, The Quarterly Review of Economics and Finance, Journal of Environmental Economics and Management, Land, Comparative Political Studies. Tambm editor

    associado do peridico Environment and Development Economics. Contatos:

    [email protected] e www.angelfire.com/ky2/mueller.

    Carlos Garca Fernndez

    Graduado em Direito pela Universidade Ibero-americana, Mxico, e Mestre em

    Direito Comercial Europeu pela Universidade de Bristol, Inglaterra. Trabalhou

    em escritrios de advocacia no Mxico e na Inglaterra e como consultor em

  • 20

    investimento estrangeiro na UNCTAD, OMC, OEA e Comunidade Andina. No

    governo do Mxico, foi Diretor de Assuntos Internacionais da Direo Geral de Investimento Estrangeiro da Secretaria de Comrcio e Fomento Industrial

    e Diretor Geral de Investimento Estrangeiro da Secretaria de Economia. Foi

    professor do Departamento de Direito da Universidade Ibero-americana e professor convidado da Escola Livre de Direito, da Itam, da Universidade Anhuac e da Universidade Pan-americana. o Titular da Comisso Federal

    de Melhoria Regulatria do Mxico Cofemer desde abril de 2004. Contato: [email protected].

    Csar MattosDoutor em Economia pela Universidade de Braslia UnB e Programa de Visiting da Capes na Universidade de Oxford, Reino Unido. Mestre em Economia pela PUC/RJ e bacharel em Economia pela UnB. Publicou em

    todos os principais peridicos de Economia brasileiros e em peridicos

    internacionais. Editou duas coletneas de artigos sobre antitruste no Brasil. Seus temas de interesse so Defesa da Concorrncia, Regulao Econmica em especial Telecomunicaes e Anlise Econmica do Direito. Pesquisador Associado do Cerme/UnB. Foi Consultor da Cmara dos Deputados, Secretrio Adjunto da Sain/MF, Assessor do Cade, Coordenador

    da SPE/MF, Assessor em Baker & Mckenzie, Banco Mundial e PSDB na

    Cmara dos Deputados. Atualmente Conselheiro do Cade, com mandato at novembro de 2010. Contato: [email protected].

    Dirceu Raposo de Mello

    Farmacutico, doutor em Anlises Clnicas, mestre em Cincias da Sade e especialista em Biotica, Administrao Hospitalar, Anlises Clnicas

    e Toxicolgicas, Patologia Clnica e Farmcia Homeoptica. professor universitrio e servidor da Prefeitura de So Paulo SP. Atualmente Diretor-Presidente da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria Anvisa pelo segundo mandato at janeiro de 2011. Contato: [email protected].

  • 21

    Donald Macrae

    Graduado em Direto pela Universidade de Edimburgo em 1974. Durante

    32 anos trabalhou em nove ministrios diferentes, tendo chegado posio de Diretor Geral. Possui grande experincia com legislao em todos os nveis, desde os tratados internacionais at regulamentaes secundrias,

    incluindo regulao de grandes polticas pblicas. consultor em Regulao

    e Poltica, membro da Comisso para a Melhoria da Regulamentao e

    Presidente do Grupo de Reforma Poltica. Atualmente trabalha na Nigria com desenvolvimento de polticas estratgicas, na Grcia na OCDE com regulao da segurana de alimentos e no Reino Unido com regulao do

    risco. Contato: [email protected].

    Francisco Gaetani

    Mestre em Polticas Pblicas e doutor em Cincia Poltica pela London School of Economics and Political Science. funcionrio de carreira do governo federal, tendo trabalhado em diversos rgos da Administrao Pblica federal, estadual e municipal e em organismos internacionais. Atualmente Secretrio Executivo Adjunto do Ministrio do Planejamento, Oramento

    e Gesto. Alm de Poltica Pblica, tem interesse nas reas de Planejamento

    em Cincia e Tecnologia e Administrao. Possui quatorze artigos publicados em peridicos no Brasil e no exterior. Entre eles destacam-se A reforma do

    Estado no contexto latino-americano (Enap, 1998) e The reform of Brazilian

    State apparatus (London School of Economics, 1998). Contato: [email protected].

    Jim Tozzi

    Doutor em Economia e Administrao de Negcios pela Universidade da

    Flrida. Trabalhou em cinco administraes presidenciais dos EUA. Na

    dcada de 1980, administrou o programa da Casa Branca para reforma do processo regulatrio dos EUA. membro da Academia Americana de Homens

    e Mulheres da Cincia. Reconhecido como um dos criadores da anlise

  • 22

    regulatria e como precursor da aplicao da anlise de custo-benefcio nas regulaes federais nos EUA. No Brasil, o criador do Centro de Regulao e Efetividade CRE, organizao sem fins lucrativos destinada melhoria da regulao. Contato: [email protected].

    Klvia AlbuquerqueEconomista pela Universidade de Braslia UnB, com ps-graduao em Administrao Pblica pela Fundao Getulio Vargas FGV. Publicou, entre outros, o Documento de Trabalho A retomada da reforma/melhora

    regulatria no Brasil: um passo fundamental para o crescimento econmico sustentado (Seae, 2006). Exerceu funes na Secretaria de Acompanhamento Econmico do Ministrio da Fazenda Seae/MF e na Secretaria de Gesto do Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto Seges/Mpog. Foi representante do MF e do Mpog no Comit Gestor do Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para a Gesto em Regulao

    PRO-REG. Gerente Regional em So Paulo da Agncia Nacional de Aviao Civil, sendo servidora pblica federal integrante da carreira dos Especialistas em Polticas Pblicas e Gesto Governamental. Contato:

    [email protected].

    Luiz Alberto dos Santos

    Bacharel em Direito pela UFRGS e em Comunicao Social pela PUC-RS

    e UnB. Mestre em Administrao e doutor em Cincias Sociais pela UnB. Especialista em Polticas Pblicas e Gesto Governamental pela Escola

    Nacional de Administrao Pblica Enap. Atua nas reas de Direito, Polticas Pblicas, Administrao Pblica e Regulao. autor dos livros Reforma

    administrativa no contexto da democracia (Diap/Arko Advice Editorial,

    1997) e Agencificao, publicizao, contratualizao e controle social: possibilidades no mbito da reforma do aparelho do Estado (Diap, 2000). Integrou a Carreira de Gestores Governamentais do Governo Federal de 1990

    a 2002. Assessorou a Bancada do Partido dos Trabalhadores na Cmara dos Deputados de 1992 a 2002. Ocupa desde agosto de 2002 o cargo concursado de

    Consultor Legislativo: Administrao Pblica do Senado Federal. Coordenou

    o Grupo de Trabalho Interministerial responsvel pela elaborao da proposta

  • 23

    da Lei Geral das Agncias Reguladoras. o coordenador do Comit Gestor do Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gesto em

    Regulao PRO-REG. Desde 1o de janeiro de 2003 Subchefe de Anlise e Acompanhamento de Polticas Governamentais da Casa Civil da Presidncia da Repblica. Contato: [email protected].

    Marcelo Ramos

    Engenheiro de Produo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ. Mestre em Engenharia de Produo pela Coppe/UFRJ, com especializao

    em Economia pela George Washington University. Suas reas de interesse so Polticas de Telecomunicaes, Concorrncia, Melhoria Regulatria e Anlise de Impacto Regulatrio. Publicou, pelo Ministrio da Fazenda, os trabalhos

    Antitrust and predation: reflections on the state of art (2000), Sobre o uso eficiente do espectro radioeltrico (2006) e Neutralidade de redes: o futuro da internet e o mix institucional (2006), alm de outros artigos na Revista do

    Servio Pblico, na Res Publica, Revista da Associao dos EPPGGs e artigos

    de opinio no jornal Valor Econmico. membro da carreira de Especialista

    em Polticas Pblicas e Gesto Governamental, em exerccio no Ministrio

    da Fazenda desde o ano 2000, em que foi Coordenador Geral de Comrcio e Servios e, desde 2004, Coordenador Geral de Comunicao e Mdia na

    Secretaria de Acompanhamento Econmico. Contato: [email protected].

    Pedro Farias

    Graduado em Engenharia Civil, especialista em Polticas Pblicas e Gesto

    Governamental pela Escola Nacional de Administrao Pblica Enap e mestre em Administrao pela Universidade de Braslia (1995). Possui diversos

    trabalhos tcnicos publicados em revistas e livros especializados no campo

    da gesto pblica. Ocupou diversas posies no governo federal, incluindo os cargos de Diretor na Secretaria da Reforma do Estado do Ministrio da Administrao e Reforma do Estado, de 1995 a 1998, e de Secretrio Executivo Adjunto do Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto de 2000 a

    2003. Trabalha no Banco Interamericano de Desenvolvimento BID desde 2003 em projetos relacionados a gesto fiscal, administrao financeira,

  • 24

    servio civil, regulao, e-governo e gesto por resultados na Argentina,

    Brasil, Bolvia, Chile, Paraguai e Uruguai. Atualmente Especialista Snior em Modernizao do Estado no Departamento de Capacidade Institucional e

    Finanas do BID. Contato: [email protected].

    Pedro Ivo Sebba Ramalho

    Doutor em Cincias Sociais: especialista em Estudos Comparados sobre as Amricas pela Universidade de Braslia UnB. Sua tese aborda a criao das agncias reguladoras brasileiras em comparao ao modelo regulatrio dos EUA. Suas principais reas de interesse so Polticas Pblicas, Estrutura

    e Transformao do Estado, Regulao e Agncias Reguladoras. Compe o Comit Consultivo do Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gesto em Regulao PRO-REG, representando a Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria Anvisa. servidor pblico na carreira de Especialista em Regulao e Vigilncia Sanitria da Anvisa, em que ocupa atualmente o cargo de Assessor-Chefe da Assessoria Tcnica e Parlamentar. Contato: [email protected].

    Ronaldo Seroa da Motta

    Doutor em Economia pela University College London, Department of Economics, University of London (1985). Foi Coordenador de Estudos de Mercado e Regulao do Ipea. Professor de Economia da Regulao do Ibmec/RJ. Especialista e pesquisador nas reas de Regulao Econmica

    e Ambiental com trabalhos tericos e empricos. Entres suas publicaes

    recentes esto a co-editoria dos livros Regulao e concorrncia no Brasil: governana, incentivos e eficincia (Ipea, 2007) e Marcos regulatrios no Brasil: incentivos ao investimento e governana regulatria (Ipea, 2008); a

    autoria do livro Economia ambiental (FGV, 2006); e os artigos Efficiency and regulation in the sanitation sector in Brazil, na Utilities Policy (2007); Analysing the environmental performance of the Brazilian industrial sector,

    na Ecological Economics (2006); e Political factors and the efficiency of municipal expenditure in Brazil, na Economia Aplicada (2009). Atualmente

    exerce o cargo de Diretor da Agncia Nacional de Aviao Civil Anac. Contato: [email protected].

  • 25

    Vernica Cruz

    Doutora em Cincia Poltica pelo Iuperj, com estgio na Universidade Paris I Sorbonne. Suas reas de interesse so Polticas Pblicas, Estado

    e Governo e Accountability. Em 2007, recebeu o prmio de Melhor Tese de Doutorado da Associao Latino-americana de Cincia Poltica Alacip. mestre e graduada em Cincia Poltica pela Universidade de Braslia UnB. Atualmente faz Ps-doutorado no Iuperj, em que tambm pesquisadora associada do Ncleo de Estudos sobre Empresariado, Instituies e

    Capitalismo Neic. Contato: [email protected].

  • PARTE 1TEORIA DA REGULAO: PRNCIPIOS E FUNDAMENTOS PARA A REGULAO ECONMICA DE MERCADO

  • 29

    Captulo 1

    Interpretao consequencialista e anlise econmica do Direito Pblico luz dos princpios constitucionais da eficincia e da economicidade

    Alexandre Santos de Arago

    O Direito Pblico Econmico1 no pode se tornar refm dos argumentos

    prticos ou da realidade como ela . Em toda norma ou instituto jurdico h pretenso de mudana ou de conformao a uma realidade institucional que no necessariamente precisa ser a que j existe ou a que

    sempre existiu.2 Por outro lado, o papel dos argumentos prticos o de inserir

    o pragmatismo, o consequencialismo3 e a racionalidade econmica dentro do

    1. As consideraes contidas neste ensaio, apesar de focadas no Direito Pblico Econmico, em razo do extremo dinamismo e das demais peculiaridades que caracterizam o subsistema social da economia, so ontologicamente de Teoria Geral do Direito, sendo, portanto, aplicveis, com maior ou menor intensidade, mais ou menos numerosas ressalvas, a todas as searas do Direito.2. HESSE, Konrad. A fora normativa da Constituio. Porto Alegre: Srgio Antonio Fabris, 1991. Para a introduo do debate em nosso pas, cf. BARROSO, Lus Roberto. A efetividade das normas constitucionais: por que no uma Constituio para valer? In: CONGRESSO NACIONAL DOS PROCURADORES DE ESTADO, 1986. Anais... 3. O pragmatismo-consequencialismo de que aqui se trata o que tem a ver com a ponderao das consequncias prticas dessa ou daquela interpretao jurdica, deciso administrativa ou proposio legal. H uma srie de objees levantadas contra o uso jurdico do argumento consequencialista: (a) preocupaes de se manter a autonomia do Direito frente Poltica e Economia, searas em que a anlise das consequncias constitui trnsito dirio; (b) cuidado para no se abrir a Caixa de Pandora do argumento, de tal forma que, pelo abuso, todo e qualquer tipo de proposio jurdica contra legem encontrasse alguma fundamentao genrica; (c) receio de que o raciocnio utilitarista, to prprio ao consequencialismo, terminasse por negar, no limite, a dignidade de certas condutas humanas que no possuem valor ou produzem resultado prtico, e nisso reside seu maior valor. possvel rebater cada uma das crticas, desde que se esteja falando de uso moderado e controlado do argumento pragmtico-consequencialista: (a) quanto autonomia do Direito, importante que a argumentao jurdica que pretenda se utilizar de argumentos consequencialistas se refira a princpios jurdicos que a eles encaminhem o operador do Direito como, por exemplo, o princpio da realidade do contrato administrativo ou o princpio da praticabilidade das decises judiciais; (b) quanto ao abuso do argumento, s utiliz-lo com parcimnia, lembrando-se dos riscos; o que costuma acontecer, e, na

  • 30

    mundo jurdico para efetivamente e no apenas no mundo etreo do Dirio Oficial alcanar os objetivos e realizar os valores do prprio ordenamento jurdico-constitucional. 4

    H, ao longo dos pases e das pocas, uma srie de correntes e mtodos

    interpretativos que sustentam que as consequncias devem ser importante fator a ser considerado ao se tomarem decises jurdicas. Na verdade, h quase sempre mais de uma interpretao plausvel. O que entendemos

    que, tendencialmente, deve ser adotada a que, entre elas, melhor resultados

    realizar do ponto de vista dos objetivos visados pelo ordenamento jurdico

    para a situao que estiver sendo julgada. Adotamos, assim, um sincretismo metodolgico, empregando diversos pensamentos que tm como vetor comum o fato de prestigiarem os resultados prticos na aplicao do Direito.5

    Carlos Maximiliano j afirmava que se deve preferir [...] o sentido conducente ao resultado mais razovel, que melhor corresponda s necessidades da prtica, e seja mais

    verdade, o que deve ser evitado, o uso disfarado do consequencialismo, camuflado entre artigos, precedentes e citaes doutrinrias; (c) quanto terceira objeo, nem todo consequencialismo utilitarista: possvel avaliar as consequncias jurdicas de uma deciso operando, portanto, anlise consequencialista luz, por exemplo, da manuteno ou da alterao do sistema de princpios incorporado pela Constituio. 4. Em interessante dissertao de mestrado, Diego Werneck Arguelhes prope, focado na anlise de casos e em decises do Supremo Tribunal Federal STF, uma adoo moderada do pragmatismo-consequencialismo, ou seja, to-somente nas hipteses em que a legislao expressamente o autoriza, rejeitando tanto as vises de Ronald Dworkin quanto as de Richard Posner relativas ao tema, mas acolhendo, na ntegra, as advertncias de Cass Sunstein e, especialmente, de Adrian Vermeule quanto ao risco dos efeitos sistmicos e ao dficit de informao de juzes e aplicadores do Direito. Cf. ARGUELHES, Diego Werneck. Deuses pragmticos, mortais formalistas: a justificao consequencialista de decises judiciais. 2006. 220 f. Dissertao (Mestrado em Direito Pblico) Faculdade de Direito, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 5. No caso brasileiro, como no de outros pases de constitucionalizao recente, doutrina e jurisprudncia ainda se encontram em fase de elaborao e amadurecimento, fato que potencializa a importncia das referncias estrangeiras. Esta uma circunstncia histrica com a qual precisamos lidar, evitando dois extremos indesejveis: a subservincia intelectual, que implica a importao acrtica de frmulas alheias e, pior que tudo, a incapacidade de reflexo prpria; e a soberba intelectual, pela qual se rejeita aquilo que no se tem. Nesse ambiente, no possvel utilizar modelos puros, concebidos alhures, e se esforar para viver a vida dos outros. O sincretismo desde que consciente e coerente resulta sendo inevitvel e desejvel. (BARROSO, Lus Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalizao do Direito: o triunfo tardio do Direito Constitucional no Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 851, 1 nov. 2005. Disponvel em: . Acesso em: 18 ago. 2008, grifo nosso).

  • 31

    humano, benigno, suave. antes de crer que o legislador haja querido exprimir o conseqente e adequado espcie do que o evidentemente injusto, descabido, inaplicvel, sem efeito. Portanto, dentro da letra expressa, procure-se a interpretao que conduza a melhor conseqncia para a coletividade.6

    Em linha similar, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Nelson Jobim, tem sistematicamente valorizado em declaraes pblicas

    e em seus votos o peso das consequncias sobretudo econmicas nas decises judiciais.7

    Tambm Goffredo Telles Jnior leciona que [...] na interpretao das leis, mais importante do que o rigor da lgica racional o entendimento razovel dos preceitos, porque o que se espera inferir das leis no , necessariamente, a melhor concluso lgica, mas uma justa e humana soluo. O que se espera ter uma soluo atenta s variegadas condies de cada caso a que a lei interpretada se refere.8

    O Direito Pblico do Estado contemporneo visa a satisfazer determinadas necessidades sociais, sendo vinculado ao atendimento eficiente dos fins sociais e fticos aos quais se destina.9

    A eficincia, cujo contedo jurdico ser minudenciado ao longo do texto, no deve ser entendida apenas como maximizao do lucro, mas sim como

    6. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenutica e aplicao do Direito. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 165, grifo nosso.7. Cf. ARGUELHES, Diego Werneck. Argumentos consequencialistas e Estado de Direito: subsdios para uma compatibilizao. Disponvel em: . 8. TELLES JNIOR, Goffredo. Iniciao na Cincia do Direito. So Paulo: Saraiva, p. 367.9. Fbio Konder Comparato observa que em radical oposio a essa nomocracia esttica, a legitimidade do Estado contemporneo passou a ser a capacidade de realizar [...] certos objetivos predeterminados. Arremata afirmando que a legitimidade do Estado passa a fundar-se no na expresso legislativa da soberania popular, mas na realizao de finalidades coletivas, a serem realizadas programadamente. (COMPARATO, Fbio Konder. Juzo de constitucionalidade das polticas pblicas. In: Direito Administrativo e Constitucional: estudos em homenagem a Geraldo Ataliba. So Paulo: Malheiros, 1997, p. 350-351. v. 2).

  • 32

    melhor exerccio das misses de interesse coletivo que incumbe ao Estado,10 que

    deve obter a maior realizao prtica possvel das finalidades do ordenamento jurdico, com os menores nus possveis, tanto para o prprio Estado,

    especialmente de ndole financeira, como para as liberdades dos cidados.Os resultados prticos da aplicao das normas jurdicas no constituem

    preocupao apenas sociolgica,11 mas, muito pelo contrrio, so elementos

    essenciais para determinar como, a partir desses dados empricos, devam ser

    interpretadas ou reinterpretadas , legitimando a sua aplicao. Em tempos de globalizao e internacionalizao das fases da cadeia

    produtiva, cada vez mais [...] abre-se espao para a incurso da teoria econmica na teoria jurdica. Cria-se, de fato, um ambiente propcio transposio de critrios, categorias e classificaes econmicas para a teoria jurdica, na medida em que se reconhece que, funcionalmente, Direito e Economia tm o mesmo destino, delineado pela Ordem Constitucional.12

    Nesse novo cenrio internacional, a anlise econmica do Direito

    tambm tem ganhado espao.13 Armando Castelar Pinheiro ensina que o

    10. MANGANARO, Francesco. Principio di legalit e semplificazione dell'attivit amministrativa: i profili critici e principi ricostruttivi. Napoli: Edizioni Scientifiche Italiane, 2000, p. 25.11. O momento indica que a luta pela demarcao de campos disciplinares est cada vez mais perdendo o seu mpeto. Nobert Elias j falava, na dcada de 70, que a preocupao em separar a Histria da Sociologia deve ser revista. O mesmo, cremos, vale para a Teoria do Direito, a Sociologia e a Antropologia. Concluindo, a Teoria do Direito como sistema lgico no poder suprir-se por si mesma e ser cada vez mais exposta s rupturas na sua pretenso de ausncia de lacunas e contradies. Uma possibilidade compreensiva, que unifique e reconhea a falta de base Terica desta Teoria do Direito e a abra para o convvio com outras cincia de maneira no colonizadora, ou seja, com prevalncia de uma sobre a outra, poderia restabelecer suas caractersticas de narrativa lgica. (VERONESE, Alexandre. Os conceitos de sistema jurdico e de Direito em rede: anlise sociolgica e da Teoria do Direito. Plrima. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense UFF, Rio de Janeiro, v. 24, p. 147).12. NEGREIROS, Teresa. Teoria do contrato: novos paradigmas. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 387-388.13. A Anlise Econmica do Direito ou Law and Economics um movimento contemporneo que combina as cincias econmica e jurdica em uma tentativa de estudo interdisciplinar, tendo como caracterstica comum, sem distinguir tendncias e escolas, a aplicao de teoria microeconmica neoclssica do bem-estar para analisar e reformular tanto as instituies particulares como o sistema jurdico em seu conjunto. (PACHECO, Pedro Mercado. El anlisis econmico del Derecho: una reconstruccin terica.

  • 33

    Direito e a Economia, ao dilurem suas diferenas, tornam-se essenciais um para o outro.14

    A nfase na perspectiva consequencialista e pragmtica defendida por Richard Posner, que alerta para uma concepo interessada nos fatos e tambm bem informada sobre a operao, propriedades e provveis efeitos de cursos alternativos de ao.15

    E esse pensar por consequncias, essa perspectiva pragmtica quanto aos resultados, que tambm deve influir e orientar a atividade administrativa e judicante,16 se torna ainda mais relevante em se considerando as finalidades do Direito Pblico Econmico, ramo jurdico destinado a disciplinar

    tentar aplicar determinados objetivos coletivos o exerccio de atividades

    econmicas, sendo a economia o mais dinmico e globalizado de todos os subsistemas sociais.

    No se trata propriamente de sobrepujana da Economia sobre o Direito,

    mas sim de inevitvel em razo do aumento do poder efetivo dos capitais globalizados valorizao do elemento econmico na interpretao jurdica,

    elemento este que no era muito considerado pela hermenutica jurdica. Essa valorizao revela o aumento da intercomunicao entre o Direito e a

    Economia, e a tomada de conscincia por parte dos operadores daquele de que, levando em conta as pautas desta, tero mais chances de realizar na

    prtica os objetivos jurdicos, evitando inclusive efeitos colaterais adversos ou, como diria a Teoria Econmica, externalidades negativas.

    Madrid: Cento de Estudios Constitucionales, 1994, p. 181; 193-196).14. PINHEIRO, Armando Castelar. Direito, economia e mercados. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, p. 32.15. POSNER, Richard. Overcoming law. 1996, p. 5. 16. O sistema judicial no pode ser insensvel ao que ocorre no sistema econmico. (FARIA, Jos Eduardo. Direito e Economia na democratizao brasileira. So Paulo: Malheiros, 1993, p. 9). Para Antnio Menezes Cordeiro, na outra extremidade do processo, h que lidar com as denominadas consequncias da deciso [...]. Desenvolveu-se assim o factor teleolgico da interpretao [...]. Trata-se de um conjunto de regras que, habilitando o intrprete-aplicador a pensar em consequncias, permitem o conhecimento e a ponderao dos efeitos das decises. (CORDEIRO, Antnio Menezes. Prefcio. In: CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamento sistemtico e conceito de sistema na Cincia do Direito. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian, 1996. p. CIX-CXI).

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    De acordo com as lies de Neil Maccormick, [...] a inconvenincia, para no falar no absurdo, dessas conseqncias proporciona uma argumentao suficiente contra a aplicao do princpio no caso em foco. [...] Sinto-me vontade para dizer que chegar a resultados estranhos no me causa nenhum entusiasmo, especialmente quando esses resultados parecem conflitar com princpios bem conhecidos [...]. freqente que se diga intimamente quando alguma proposio apresentada, isto simplesmente no pode estar certo; e ento tente-se ver por que no pode estar certo. s vezes trata-se de um ultraje ao senso comum, s vezes ao sentido de justia de cada um, mas com maior freqncia a proposio simplesmente no se coaduna com princpios jurdicos, muito embora, ela possa aparentar ter o amparo de algumas observaes judiciais lidas fora do contexto. [...] Considerando-se que a concepo que se tem das leis racional e deliberada, parece de fato essencial que a justificao de qualquer deciso numa rea no comandada por uma norma expressa que envolva obrigao, ou quando uma norma semelhante for ambgua ou incompleta, prossiga pela verificao das decises propostas luz de suas conseqncias.17

    A economia contribui, portanto, para que o Direito seja percebido

    em nova dimenso, que extremamente til na formulao e aplicao de polticas pblicas.18

    O Direito deixa de ser aquela cincia preocupada apenas com a realizao lgica dos seus preceitos; desce do seu pedestal para aferir se esta realizao lgica esta sendo apta a realizar os seus desgnios na realidade

    da vida em sociedade. Uma interpretao/aplicao da lei que no esteja sendo capaz de atingir concreta e materialmente os seus objetivos no pode ser considerada como a interpretao mais correta. Note-se que essas mudanas metodolgicas evidenciam a queda do mito da interpretao

    17. MACCORMICK, Neil. Argumentao jurdica e Teoria do Direito. Traduo Walda Barcellos. So Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 183-193, grifo nosso.18. STIGLER, George. Law or Economics? The Journal of Law and Economics, v. 35, n. 2, p. 462, 1992.

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    como atividade meramente declaratria do que j estava na lei, da nica

    interpretao possvel, j que os resultados prticos desta ou daquela forma de aplicao da norma tero relevante papel na determinao de qual, entre

    as diversas interpretaes plausveis existentes, dever ser adotada, opo que, posteriormente, pode inclusive vir a ser alterada diante da comprovada

    mudana dos dados da realidade, que devam ser acompanhados de nova

    estratgia regulatria.

    Os princpios da proporcionalidade e da eficincia circunscrevem o espectro das solues juridicamente possveis a uma seara de realismo e de

    responsabilidade econmica.

    Enrique Groisman observa que [...] a mera juridicidade da atuao estatal como elemento de legitimao se tornou insatisfatria a partir do momento em que comeou tambm a ser exigida a obteno de resultados. No se considera mais suficiente que os governantes no violem a lei: exige-se deles a reduo do desemprego, o crescimento econmico, o combate pobreza, soluo para os problemas de habitao e sade. A discusso sempre se coloca em relao a quais so as polticas mais adequadas para atingir estes fins, mas no h dvidas de que a lei deixou de ser apenas um meio para impedir a arbitrariedade para se converter em ponto de partida19 para uma srie de atividades nas quais h uma

    19. Em termos de limites da Administrao para a expedio de atos gerais que envolvam interpretao da lei, h de se entender que a Administrao deve atingir objetivamente o interesse pblico e se determinar apenas por esse interesse. O interesse pblico no deve apenas ser realizado, mas o agente deve estar convencido de que vai realiz-lo da melhor maneira. [...] Assim, o sentido moderno da legalidade v na lei no tanto uma condio e um limite, mas, basicamente, um instrumento de exerccio da atividade administrativa. Como instrumento, seu princpio hermenutico est na solidariedade entre meios e fins, donde a razoabilidade da atividade administrativa, submetida, ento, a uma avaliao de sua eficincia. [...] O princpio da eficincia tem por fim disciplinar a atividade administrativa nos seus resultados, tornando possvel a legitimao (mas tambm a responsabilizao) dos atos administrativos por seu xito em atingir os fins pretendidos por lei. Neste sentido, a validao do ato pelo princpio de eficincia tem estrutura finalstica (validao pela obteno do resultado pretendido por lei) e no condicional (validao pelo preenchimento das condies previstas em lei para realizao do ato, independentemente de seu resultado). Ao adquirir essa estrutura finalstica pautada pelo xito em implementar determinadas polticas pblicas, a discricionariedade, que se tornou mais ampla, ganha tambm um sentido tcnico, que representa uma importante limitao e a sujeita a controle (diz-se que a discricionariedade das agncias uma discricionariedade tcnica). Se pela legalidade estrita bastava ao administrador cumprir os requisitos formais para que emitisse seu ato de escolha, oportuna e conveniente, dentre o leque de alternativas aberto pela lei, a legalidade finalstica o vincula a uma

  • 36

    maior margem de delegao e de discricionariedade e um crescente espao para a tcnica.20

    Nesse contexto, merece meno a relao entre a eficincia e a especializao tcnico-setorial crescentemente presente no Direito Pblico

    contemporneo, tecnicidade relacionada com a especificidade das atividades a serem disciplinadas, que necessitam de normas pontuais, remetidas

    autonomia de rgos tcnicos, o que assegura de organizao de setores

    especficos, assegurando a flexibilidade e a permeabilidade s exigncias da sociedade econmica.21

    As necessidades da eficincia, na qual est contida, como veremos, a economicidade, no devem ser solucionadas pelo menosprezo lei aqui, naturalmente, entendida como bloco de juridicidade , mas sim pela valorizao dos seus elementos finalsticos. sob este prisma que as regras legais devem interpretadas e aplicadas, ou seja, todo ato, normativo ou concreto,

    s ser vlido ou validamente aplicado, se, ex vi do princpio da eficincia art. 37, caput, CF , for a maneira mais eficiente ou, na impossibilidade de se definir esta, se for pelo menos uma maneira razoavelmente eficiente de realizao dos objetivos fixados pelo ordenamento jurdico.

    O princpio da eficincia de forma alguma visa a mitigar ou a ponderar o princpio da legalidade, mas sim a embeber a legalidade de nova lgica,

    determinando a insurgncia de legalidade finalstica e material dos resultados prticos alcanados , e no mais legalidade meramente formal e abstrata.

    otimizao de sua soluo para preenchimento dos conceitos e diretrizes legais. E quando se fala em otimizao, na esteira do princpio de eficincia, entra em cena no s o xito na execuo dos objetivos legais (adequao), como tambm a ponderao dos meios em termos de necessidade (proibio de excesso), de reduo dos custos impostos aos administrados e de ponderao de outros direitos e liberdades individuais envolvidas (proporcionalidade em sentido estrito). (FERRAZ JNIOR, Trcio Sampaio. Parecer. 2004. Mimeo, grifo do autor).20. GROISMAN, Enrique. Crisis y actualidad del Derecho Administrativo Econmico. Revista de Derecho Industrial, v. 42, p. 894, passagem na qual o autor lembra que esta situao suscitou o comentrio paradoxo de que o Direito no pertence mais aos juristas. Antonio Martnez Marn assevera que a legitimidade democrtica da origem no basta para justificar o poder pblico. Tambm imprescindvel a legitimidade do exerccio. (MARN, Antonio Martnez. El buen funcionamiento de los servicios pblicos. Madrid: Tecnos, 1990, p. 13).21. COCOZZA, Francesco. Profili di Diritto Costituzionale applicato all'Edconomia. Incidenza dei Rapporti Economici sull'Organizzazione del Potere Politico e sul Sistema delle Fonti del Diritto. Torino: G. Giappichelli, 1999, p. 171. v. 1.

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    Dizendo o bvio, a partir do momento em que a eficincia e a economicidade foram expressamente inscritas no texto constitucional a Lei Magna , passaram a tambm integrar a legalidade, no mais legalidade oitoicentista,

    formalista e meramente subsuntiva, mas legalidade neopositivista.22

    dessa maneira que a aplicao tout court das regras legais deve

    ser temperada, no apenas pela outrora propugnada equidade, mas pela

    realizao das finalidades constitucionais e legais aplicveis espcie.O princpio da eficincia impe Administrao que atue de forma a

    produzir resultados favorveis consecuo dos fins que cabem ao Estado alcanar.23 Paulo Modesto ensina que

    [...] o princpio da eficincia pode ser percebido tambm como uma exigncia inerente a toda atividade pblica. Se entendermos a atividade de gesto pblica como atividade necessariamente racional e instrumental, voltada a servir o pblico, na justa ponderao das necessidades coletivas,

    22. ARAGO, Alexandre Santos de. A concepo neopositivista do princpio da legalidade. Revista de Direito Administrativo, v. 236, p. 1-20, 2005. Almiro do Couto e Silva bem coloca o neopositivismo de uma forma que os valores, ento reclamados apenas pelos jusnaturalistas, so tratados como partes integrantes e das mais relevantes do prprio ordenamento jurdico positivo: Os valores esto dentro do prprio ordenamento jurdico, sob a forma de princpios embutidos na Constituio, de maneira explcita ou implcita. Essa corrente de pensamento, que se alastrou pelo mundo, revigorou os princpios constitucionais j identificados, descobrindo-lhes novos aspectos, e acrescentou ao rol conhecido muitos outros. Os princpios adquiriram, desse modo, no Direito moderno, especialmente o Direito Pblico, um vigor que nunca tinham possudo, notadamente na configurao da coerncia do sistema. As outras normas so sempre a eles necessariamente reconduzidas e so eles que orientam a sua aplicao. (COUTO e SILVA, Almiro. Os indivduos e o Estado na realizao de tarefas pblicas. Direito Administrativo e Constitucional: estudos em homenagem a Geraldo Ataliba. So Paulo: Malheiros, 1997, p. 97, v. 2). Por essas razes, passamos a preferir o termo neo a ps-positivismo: se trata de positivismo, essencial para a diferenciao do Direito dos demais subsistemas sociais, mas um positivismo calcado em princpios capazes, o que essencial, de dialogar com valores metajurdicos , no em regras jurdicas. No estamos, naturalmente, nos referindo chamada Escola Neopositivista ou da lgica positivista, de Marburg, do incio do sculo XX, nem, tampouco, adotando o positivismo histrico. Na verdade, estamos prximos dos que se denominam ps-positivistas, apenas crendo que a denominao mais correta da posio que adotamos e tambm a de muitos dos seus prceres, como BARROSO, Lus Roberto. Fundamentos tericos e filosficos do novo Direito Constitucional brasileiro: ps-modernidade, teoria crtica e ps-positivismo. In: BARROSO, Lus Roberto (Org.). A nova interpretao constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 1-49 , em face da importncia dada positivao de valores metajurdicos, a de neopositivismo. De fato, o ps-positivismo no desacredita na razo e no Direito como instrumento de mudana social, e busca, recorrendo sobretudo aos princpios constitucionais e racionalidade prtica, catalizar as potencialidades emancipatrias da ordem jurdica. (SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relaes privadas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 78).23. DI PIETRO, Maria Sylvia. Direito Administrativo. So Paulo: Atlas, 1998, p. 73.

  • 38

    temos de admitir como inadmissvel juridicamente o comportamento administrativo negligente, contra-produtivo, ineficiente.24

    Intimamente ligado ao princpio da eficincia, figura o princpio da economicidade, que, como destaca Diogo Figueiredo Moreira Neto,

    embora referido a propsito da execuo da fiscalizao contbil, financeira e oramentria, deve ser recebido como um princpio geral do Direito

    Administrativo, em razo de sua amplitude no desempenho da administrao

    pblica interna.25

    Exige a economicidade que a Administrao adote a soluo mais

    conveniente e eficiente sob o ponto de vista da gesto dos recursos pblicos. O princpio da economicidade a expresso especializada, pecuniria, do

    princpio da eficincia.Como afirma Paulo Soares Bugarin, em monografia especfica sobre o

    tema, o princpio da economicidade [...] trata da obteno do melhor resultado estratgico possvel de uma determinada alocao de recursos financeiros, econmicos e/ou patrimoniais em um dado cenrio socioeconmico. [...] Por alocao tima entende-se aquela que propicia se alcanar o mximo resultado econmico da alocao de bens e/ou servios, ou seja, permite o alcance da mxima eficincia econmica. [...] Economizar significa maximizar lucros.26

    dessa maneira que a Constituio de 1988 [...] j estabelece todo fundamento necessrio para a afirmao e aplicao, em nosso pas, da doutrina da, assim denominada, administrao de resultado, ou seja: confere uma base institucional da legalidade finalstica. [...]

    24. MODESTO, Paulo. Notas para um debate sobre o princpio constitucional da eficincia. Revista Dilogo Jurdico, Salvador, Centro de Atualizao Jurdica CAJ, v. 1, n. 2, maio 2001. Disponvel em: . 25. MOREIRA NETO, Diogo Figueiredo. Mutaes do Direito Pblico. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 311-312.26. BUGARIN, Paulo Soares. O princpio constitucional da economicidade na jurisprudncia do Tribunal de Contas da Unio. Belo Horizonte: Frum, 2004, p. 114-117.

  • 39

    indubitvel que o futuro deva ser realmente considerado como uma das dimenses temporais prprias a qualquer norma, o que lhe faz merecedor de uma cuidadosa ateno prospectiva, tanto por parte dos seus elaboradores quanto dos seus aplicadores.27 No basta, hoje, ao Direito, que a ao administrativa do Estado exista, seja vlida e eficaz. A simples busca da produo de efeitos, ou seja, pretender-se apenas a eficcia da ao, j era insuficiente para a Sociologia do Direito. Agora passou a s-lo tambm para o Direito Administrativo. Acrescentou-se, aos quatro princpios constitucionais da administrao pblica, um quinto, o da eficincia, que, doutrinariamente, no plano do Direito Pblico, poder ir at mais alm, para nortear, acol da ao administrativa, tambm a produo legislativa e a interpretao judiciria.28

    dizer: luz do princpio da eficincia, a includa a sua feio de economicidade, vedada a atuao jurdica contraproducente ou ineficiente luz dos valores e objetivos jurdicos visados, sendo de menor importncia o fato de ela se subsumir formalmente a alguma regra ou no.

    Sob essa perspectiva, no de forma nenhuma descartvel que, no extremo ultrapassadas todas as possibilidades hermenuticas, analgicas e de reduo teleolgica29 , uma regra jurdica em tese aplicvel e constitucional

    27. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Cidadania e administrao de resultado: o Direito Administrativo e o controle prospectivo no planejamento e nas aes do Estado. Revista de Direito e Poltica, Letras Jurdicas e Ibap, 2007, p. 19-21, grifo nosso. 28. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutaes do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 32-33.29. A regra legal, contra o seu sentido literal, mas de acordo com a teleologia imanente lei, precisa de uma restrio que no est contida no texto legal. A integrao de uma tal lacuna efetua-se acrescentando a restrio que requerida em conformidade com o sentido. Visto que com isso a regra contida na lei, concebida demasiado amplamente segundo o seu sentido literal, se reconduz e reduzida ao mbito de aplicao que lhe corresponde segundo o fim da regulao ou a conexo de sentido da lei, falamos em reduo teleolgica. [...] A reduo teleolgica comporta-se em relao interpretao restritiva de modo semelhante analogia particular em relao interpretao extensiva. O mbito de aplicao da norma umas vezes reduz-se mais do que indica o limite que se infere do sentido literal possvel e outras vezes amplia-se. Em ambos os casos, trata-se de uma continuidade de interpretao transcendendo o limite do sentido literal possvel. Como esse limite fluido, pode ser duvidoso, no caso particular, se se trata ainda de uma interpretao restritiva ou j de uma reduo teleolgica. A jurisprudncia fala, no raras vezes, de interpretao restritiva certamente a fim de dar, deste modo, a impresso

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    tenha a sua aplicao em dado caso concreto afastada por no a regra em si, mas aquela sua aplicao violar os princpios constitucionais da eficincia e da economicidade.30 No se trata, evidentemente, de um afastamento in concreto do Direito, pois ambos economicidade e eficincia so princpios constitucionais, mas apenas daquela determinada regra jurdica.

    De fato, mesmo que um dispositivo de lei seja em tese aplicvel, pode ser que, em razo das circunstncias peculiares de determinado caso concreto e dos valores e princpios constitucionais relacionados com essas

    peculiaridades, a sua aplicao, no caso, seja inconstitucional ou contrria

    aos valores que o prprio dispositivo legal visa a resguardar.31

    Por exemplo,32 a regra do Cdigo de tica Mdica que determina ao

    mdico contar ao seu paciente toda a verdade sobre a sua doena pode ser

    afastada se, em dado caso concreto, a informao puder colocar em risco a vida do paciente em razo da forte emoo que provocaria; o art. 1o da Lei no 9.494/1997, que veda, em sua literalidade de forma absoluta, a concesso de liminares contra o Estado, pode, segundo nossa tranquila jurisprudncia, ter a sua aplicao afastada se a liminar visar ao fornecimento de medicamentos vitais; a regra que estabelece limite de velocidade em determinada via

    pode ser afastada se o motorista a descumpriu por estar em situao de emergncia; uma regra que proba a entrada de ces em restaurantes deve ser afastada em relao aos ces-guia de deficientes visuais; o STF j afastou a

    de maior fidelidade lei , quando na realidade j no se trata de interpretao, mas de uma reduo teleolgica. Mas se a reduo est dirigida prpria teleologia da lei e se tm em conta as barreiras nela estabelecidas, ento no menos fiel lei do que qualquer interpretao teleolgica. (LARENZ, Karl. Metodologia da Cincia do Direito. Traduo Jos Lamego. 3. ed. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian, 1997, p. 556).30. HAGE, Jaap. Law and defeasibility. Artificial Intelligence and Law, v. 11, p. 221-243, 2003. Sobre a afastabilidade in concreto de regras jurdicas pela impossibilidade de realizao de seus fins ver, na doutrina brasileira, BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Argumentao contra legem: a teoria do discurso e a justificao jurdica nos casos mais difceis. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.31. BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderao, racionalidade e atividade jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 211-212.32. Os exemplos constam de BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderao, racionalidade e atividade jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 202 e seguintes, e VILA, Humberto. Teoria dos princpios. So Paulo: Malheiros, 2003, p. 44 e seguintes, em que tambm se encontram citadas as respectivas fontes.

  • 41

    aplicao da regra do Cdigo Penal do estupro presumido praticado contra menores de catorze anos se a suposta vtima, apesar de possuir apenas treze anos, j demonstrar inequvoca maturidade sexual; o STF no aplicou

    a regra punitiva a prefeita que contratara sem concurso pblico um gari por nove meses em face da sua pouca significncia; o STF tambm j afastou a regra constitucional pela qual o no cumprimento de precatrios judiciais

    deve levar interveno federal no ente inadimplente em casos concretos em que a medida seria incua em razo de que o interventor enfrentaria as mesmas dificuldades que o titular do Executivo para honrar a dvida: com base no princpio da proporcionalidade se considerou que a interveno na hiptese restringiria a autonomia do Estado sem qualquer proveito para o

    cumprimento da regra pretendida.33

    Analisando tais casos, Humberto vila afirma que significam [...] que o modo de aplicao da regra no est totalmente condicionado pela descrio do comportamento, mas que depende do sopesamento de circunstncias e de argumentos. E a exceo pode no estar prevista no ordenamento jurdico, situao em que o aplicador avaliar a importncia das razes contrrias aplicao da regra, sopesando os argumentos favorveis e os argumentos contrrios criao de uma exceo diante do caso concreto. [...] Como os dispositivos hipoteticamente construdos so resultados de generalizaes feitas pelo legislador, mesmo a mais precisa formulao potencialmente imprecisa, na medida em que podem surgir situaes inicialmente no previstas. Nessa hiptese o aplicador deve analisar a finalidade da regra, e somente a partir de uma ponderao de todas as circunstncias do caso pode decidir que elemento de fato tem prioridade para definir a finalidade normativa.34

    33. BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderao, racionalidade e atividade jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 214.34. VILA, Humberto. Teoria dos princpios. So Paulo: Malheiros, 2003, p. 46-48.

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    Ana Paula de Barcellos, igualmente, leciona que [...] a submisso de uma regra ao processo de ponderao poder ter como resultado final a sua no aplicao ao caso especfico.35 [...] Por conta do sentido relativamente indeterminado da idia de justia, comum que o intrprete perceba e descreva o problema como um conflito da regra com princpios como os da razoabilidade, proporcionalidade e at o da dignidade da pessoa humana, e acabe deixando de aplicar a regra alegando que procedeu a uma ponderao. [...] Embora as regras tratem, em geral, de condutas, sem maiores consideraes sobre o propsito para que foram concebidas, essas condutas esto indiretamente associadas, por evidente a fins e valores que buscam realizar.36

    Toda regra jurdica s ser vlida ou validamente aplicada se, ex vi do

    principio da eficincia37 art. 37, caput, CF , for a maneira mais eficiente ou, na impossibilidade de se definir esta, se forem pelo menos uma forma razoavelmente eficiente de realizao dos objetivos do ordenamento jurdico afinados com a situao a ser regrada.

    o princpio constitucional da eficincia art. 37, caput, CF que deve iluminar a aplicao das regras constitucionais, legais e regulamentares,

    para que ela no leve a uma consecuo ineficiente ou menos eficiente dos seus objetivos primrios. As normas jurdicas passam a ter o seu critrio de validade aferido no apenas em virtude da higidez do seu procedimento criador, como da sua aptido para atender aos objetivos da poltica pblica,

    alm da sua capacidade de resolver os males que esta pretende combater.38

    35. No apenas os princpios, mas tambm as meras regras podem ser ponderadas, j que elas tambm so, por si prprias, manifestaes dos princpios que constituem o seu substrato.36. BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderao, racionalidade e atividade jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 204-207.37. Diferentemente do que ocorre no setor privado, a eficincia, no setor pblico, no pode ser entendida apenas como maximizao do lucro, mas sim como um melhor exerccio das misses de interesse coletivo que incumbe Administrao Pblica. MANGANARO, Franceso. Principio di legalit e semplificazione delltivit amministrativa: i profili critici e principi ricostruttivi. Napoli: Edizione Scientifiche, 2000, p. 25.38. MORAND, Charles-Albert. Le Droit no-moderne des politiques publiques. Paris: LGDJ, 1999, p. 95.

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    O princpio da eficincia v-se ainda mais reforado pelo conflito positivo que possui com o princpio da proporcionalidade, j que tambm por

    fora deste, em seus elementos adequao e necessidade,39 no se poderia impor a adoo de meio normalmente uma interpretao inadequado ou desnecessariamente oneroso ao atingimento das finalidades legais, pelo simples apego a legalidade formal, impondo-se legalidade material, cujo substrato encontrar-se-ia na eficiente e menos onerosa possvel realizao dos objetivos constitucionais que estiverem em jogo.40

    Na administrao de resultado, o Princpio da Legalidade implica na indefectvel aplicao das normas que geram bons resultados; mas tambm implica na impossibilidade de aplicar normas que geram maus resultados. [...] O Princpio da Legalidade relacionado com o resultado impe, sobretudo, que o bem seja reivindicado no plano substancial: tal legalidade exclui a operatividade de previses irrelevantes em relao ao resultado administrativo.41

    39. De acordo com Daniel Sarmento, o princpio visa, em ltima anlise, conteno do arbtrio e moderao do exerccio do poder, em favor dos direitos dos particulares, desempenhando um papel extremamente relevante no controle de constitucionalidade dos atos do poder pblico, na medida em que ele permite de certa forma a penetrao no mrito do ato normativo, para aferio da sua razoabilidade e racionalidade, atravs da verificao da relao custo-benefcio da norma jurdica, e da anlise da adequao entre o seu contedo e a finalidade por ela perseguida, podendo ser dividido em trs subprincpios: (a) da adequao, que exige que as medidas adotadas tenham aptido para conduzir aos resultados almejados pelo legislador; (b) da necessidade, que impe ao legislador que, entre vrios meios aptos ao atingimento de determinados fins, opte sempre pelo menos gravoso; (c) da proporcionalidade em sentido estrito, que preconiza a ponderao entre os efeitos positivo