Regulamento CE n.o 44 2001 Analise Juris

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Universidade do Minho Escola de Direito Mestrado em Direito da União Europeia 2014/2015 CONTENCIOSO DA UNIÃO EUROPEIA Docente: Joana Covelo de Abreu Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução das decisões em matéria civil e comercial Análise do acórdão Wintersteiger, Processo C- 523/10 Realizado por Sónia Pereira, PG27569

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Regulamente 1215/2012 e subsequente análise

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Universidade do Minho

Escola de Direito

Mestrado em Direito da União Europeia 2014/2015

CONTENCIOSO DA UNIÃO EUROPEIA

Docente: Joana Covelo de Abreu

Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho,

de 22 de Dezembro de 2000, relativo à

competência judiciária, ao reconhecimento e

à execução das decisões em matéria civil e

comercial

Análise do acórdão Wintersteiger, Processo C-

523/10

Realizado por Sónia Pereira, PG27569

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I – Índice

II - Introdução

………………………………… Página 3

III - Acórdão Wintersteiger

………………………………… Página 6

IV - O futuro introduzido pelo

Regulamento n.º 1215/2012

………………………………… Página 13

V – Considerações Finais …………………………………

Página 15

VI - Bibliografia ………………………………… Página 17

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II – Introdução

O Regulamento (CE) n.º 44/2001 relativo à competência judiciária, ao

reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial [adiante,

Regulamento], como o próprio nome indica é um Regulamento e assim sendo,

seguindo o artigo 288.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

[TFUE], apresenta caracter geral e obrigatório em todos os seus elementos sendo

diretamente aplicável em todos os Estados-Membros.

A Comunidade Europeia tem na sua base um objetivo claro e enunciado no

considerando 1 do Regulamento, a manutenção e o desenvolvimento de um

espaço de liberdade, de segurança e de justiça em que seja assegurada a livre

circulação de pessoas. A fim de criar este ambicionado espaço torna-se relevante

a comunidade adaptar, entre outras, medidas mo domínio da cooperação

judiciária em matéria civil relevantes para o bom funcionamento do mercado

interno já que como comunidade de Estados Membros é lógico afirmar que

existem disparidades nas regras nacionais em matéria de competência judicial e

de reconhecimento das decisões judiciais.

O considerando 2 apresenta então que a relevância deste Regulamento deve-se à

necessidade de disposições que permitam unificar as regras de conflito de

jurisdição em matéria civil e comercial, bem como simplificar as formalidades

com vista ao reconhecimento e à execução rápidos e simples de decisões

proferidas nos Estados Membros (claro está, os abrangidos pelo Regulamento).

Verdade seja dita, a nível do processo civil europeu ainda não se chegou a uma

harmonização, porém existem certas matérias em que existe uma certa tendência

para haver uma harmonia. No artigo 81.º n.º6 do Tratado da União Europeia

desenvolve-se os temas da cooperação transfronteiriça e do reconhecimento

mútuo. O Regulamento insere-se no domínio da cooperação judiciária em

matéria civil nos termos do artigo 65.º do Tratado. De notar que, em

conformidade com os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade

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enunciados no artigo 5.º do Tratado, o Regulamento vê-se como um mínimo

necessário concebível aos Estados-Membros alcançados.

O Regulamento n.º 44/2001 veio substituir a Convenção de Bruxelas de 1968 e

foi entretanto revogado pelo Regulamento n.º 1215/2012 que entra em vigor a 10

de Janeiro de 2015. Das alterações que este regulamento introduziu falar-se-á

num outro capítulo.

Ora o Regulamento estabelece um conjunto de regras que visam determinar quais

os tribunais internacionalmente competentes para conhecer litígios

plurilocalizados. São três os âmbitos de preenchimento cumulativo, a saber:

1 – Âmbito objetivo: de acordo com o artigo 1.º do Regulamento aplica-se aos

litígios de natureza civil e comercial, ficando excluídas as matérias previstas no

n.º 2 do artigo 1º.

2 – Âmbito Subjetivo: este âmbito encontra-se regulado nos artigos 2.º e

seguintes, sendo a regra geral ter o réu o seu domicílio ou sede num Estado

Membro da União Europeia que tenha adotado o Regulamento. Contudo, como

qualquer regra esta apresenta exceções:

a) Caso de competências exclusivas – artigo 22.º;

b) Existir entre as partes pacto de jurisdição;

c) Aplicação dos critérios de competência especiais dos artigos 5 e seguintes.

3 – Âmbito temporal: o presente regulamento aplica-se a ações intentadas a partir

de 1 de Março de 2002 (artigos 66.º e 76.º do Regulamento).

Importa referir que toda a questão que aqui trabalharemos relaciona-se com o

âmbito subjetivo relativo à 3ª exceção enunciada: a existência de critérios de

competência especial aplicáveis ao caso concreto, mais concretamente ao que se

refere o n.º 3 do artigo 5.º.

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Ora, no Regulamento a competência está definida no Capitulo II Secção 1 artigos

2.º a 4.º, sendo o artigo 5.º parte da secção 2 relativa às competências especiais.

A regra geral está estipulada no artigo 2.º em que se afirma “as pessoas

domiciliadas no território de um Estado Membro devem ser demandadas,

independentemente da sua nacionalidade, perante os tribunais desse Estado”. O

artigo 2.º no seu n.º3 refere-se às pessoas que não possuem a nacionalidade do

Estado-Membro em que estão domiciliadas, estas ficam contudo sujeitas às

regras de competência aplicáveis aos nacionais desse mesmo estado.

O artigo 3.º afirma que “as pessoas domiciliadas no território de um Estado-

Membro só podem ser demandadas perante os tribunais de um outro Estado-

Membro por força das regras enumeradas nas secções 2 a 7 do Capitulo II do

Regulamento.

No artigo 4.º expõe-se a situação do requerido não ter domicílio no território de

um Estado-Membro. Nestes casos a competência será regulada em cada Estado

Membro tendo em atenção as regras dos artigos 22.º e 23.º.

O artigo 5.º é então o primeiro artigo da Secção 2, sendo esta referida pelo artigo

3.º, e como tal é um artigo de competência especial que estabelece as situações

em que uma pessoa com domicílio no território de um Estado-Membro pode ser

demandada noutro Estado.

Nos acórdãos a ser analisados está em causa o n.º 3 deste artigo: “[Uma pessoa

com domicílio no território de um Estado-Membro pode ser demandada noutro

Estado-Membro] em matéria extracontratual, perante o tribunal do lugar onde

ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso”.

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III - Acórdão Wintersteiger

Competência judiciária e execução de decisões em matéria civil e comercial /

Marcas Processo C-523/10

O acórdão Wintersteiger tem como partes a empresa Wintersteiger, empresa com

sede na Áustria que produz e comercializa em todo o mundo máquinas de

reparação e manutenção de esquis e pranchas de snowboard, incluindo peças

sobressalentes e respetivos acessórios. A outra parte é a Products 4U, empresa

com sede na Alemanha que desenvolve e comercializa máquinas de reparação e

manutenção de esquis e pranchas de snowboard. Vende também acessórios para

máquinas de outros fabricantes, designadamente para as da Wintersteiger. Esses

acessórios designados Wintersteiger-Zubehôr não são produzidos pela recorrente

e não estão por si autorizados. A Products 4U exerce a atividade em todo o

mundo incluindo na Áustria.

Desde 1 de Dezembro de 2008 que a Products 4U reservou a palavra-chave

(AdWord) “Wintersteiger” no âmbito do sistema publicitário desenvolvido pelo

prestador de serviços de referenciamento na Internet Google.

No Google Alemão (Google.de) quando introduzido “Wintersteiger” o motor de

busca apresentava como primeiro resultado da pesquisa uma ligação para o sítio

da internet da Wintersteiger, contudo na parte direita do ecrã aparecia um

anúncio publicitário com o título “Anzeige” (anúncio) da Products 4U. A quando

o clique no título “Skiwerkdtattzubehör” (material de oficina de reparação de

esquis) o utilizador era dirigido para a oferta “Wintersteiger-zubehör” (acessórios

Wintersteiger) contida no sítio de Internet da Products 4U.

Wintersteiger considerando que, através do anúncio inserido no sítio

“google.de”, a Products 4U causava prejuízo à sua marca austríaca intentou nos

tribunais austríacos uma ação para cessação de utilização. Quanto à competência

desses órgãos jurisdicionais para conhecer o pedido, a Wintersteiger invocou o

artigo 5.º n.º3 do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho de 22 de Dezembro

de 2000 relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de

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decisões em matéria civil e comercial. Invocava que o “google.de” podia

igualmente ser consultado na Áustria e que esse serviço de referenciamento era

prestado em língua alemã.

Products 4U contestou a competência internacional dos tribunais austríacos assim

como, a título subsidiário, a existência de prejuízo à marca Wintersteiger. Sendo

o sítio alemão “Google.de” exclusivamente dirigido a utilizadores alemães, o

anúncio contravertido era apenas destinado a clientes alemães.

O Tribunal de Primeira Instância considerou que o sítio se destinava a alemães

pelo que os tribunais austríacos não eram competentes para conhecer a ação.

O Tribunal de Recurso confirma a sua competência internacional mas considera

que a Wintersteiger não era titular de nenhum direito e por essa razão julgou o

pedido improcedente.

Oberster Gerichtshof chamado a pronunciar-se em sede de recurso de “Revision”

interroga-se se no caso em apreço, em que condições a publicidade feita através

da utilização da marca austríaca Wintersteiger num sítio Internet que opera com

um nome de domínio de topo nacional “.de” pode fundamentar a competência

dos tribunais austríacos nos termos do artigo 5º nº3 do Regulamento, para

conhecer uma ação de cessação de utilização da marca austríaca.

Devido às dúvidas, este órgão jurisdicional decide, então, suspender a instância e

submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1. Deve a expressão “lugar onde ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso”

constante do art. 5.º n.º 3 do Regulamento, em caso de alegada violação de uma

marca do Estado do Foro por parte de uma pessoa residente noutro Estado-

Membro mediante a utilização de uma palavra-chave (AdWord) idêntica a esta

marca num motor de busca da Internet que oferece os seus serviços em diferentes

domínios de topo nacionais específicos, ser interpretada no sentido de que:

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a) a competência apenas é estabelecida se a palavra-chave for utilizada no

sítio Internet do motor de busca cujo domínio de topo seja o do Estado do

Foro;

b) a competência apenas é estabelecida se o sítio Internet do motor de busca

em que a palavra-chave é utilizado puder ser consultado no Estado do

Foro;

c) a competência depende da verificação de outros requisitos para além da

possibilidade de consulta do sítio Internet?

2. Em caso de resposta afirmativa à [primeira questão, alínea c)]: Que

critérios devem ser utilizados para determinar se a competência conferida

pelo artigo 5.º n.º3 do Regulamento resulta da utilização de uma marca do

Estado do Foro como palavra-passe (AdWord) num sítio Internet de um

motor de busca com um domínio de topo nacional específico diferente do do

Estado do Foro?”

No que respeita às questões prejudiciais encontramos uma menção ao acórdão

eDate Advertising. Este acórdão onde se encontram apensos os processos C-

509/09 e C-161/10 tem como objeto também a interpretação do artigo 5.º n.º 3 do

Regulamento e dos artigos 3.º n.º 1 e 2 da Diretiva 2000/31/CE do Parlamento

Europeu e do Conselho de 8 de Junho de 2000. Os órgãos jurisdicionais

questionam-se sobre o alcance da competência dos tribunais nacionais para

conhecer de litígios sobre a violação de direitos de personalidade cometidos

através de um sítio da Internet. O acórdão eDate Advertising é de suma

importância e pede aqui a sua enunciação já que surge como forma de permitir à

jurisdição europeia definir uma decisão numa realidade sujeita a grandes

mudanças, a imprensa. Enunciando o advogado geral Pedro Cruz Villalón,

responsável pelas considerações gerais a este acórdão, a imprensa de suporte de

papel cedeu terreno, a um ritmo crescente, aos meios de comunicação eletrónicos

divulgados através da Internet, sejam eles, anúncios como no caso do acórdão

Wintersteiger, sejam eles notícias satíricas publicadas em sítios da Internet como

no acórdão eDate.

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A regra da competência especial prevista, por derrogação do principio da

competência dos tribunais do domicílio do demandado, no artigo 5.º n.º3 desse

regulamento baseia-se na existência de um elemento de conexão particularmente

estreito entre o litígio e os tribunais do lugar onde ocorreu o facto danoso, que

justifica uma atribuição de competência a estes últimos por razões de boa

administração da justiça e de organização útil do processo.

No acórdão eDate Advertising encontramos a expressão “lugar onde ocorreu ou

poderá ocorrer o facto danoso” que se refere simultaneamente ao lugar da

materialização do dano e ao lugar do evento causal que está na origem do dano,

de modo que o requerido pode ser demandado, à escolha do requerente, perante o

tribunal de um ou outro desses lugares.

Estes dois lugares podem constituir uma conexão significativa do ponto de vista

da competência judiciária, sendo cada um deles susceptível, segundo as

circunstâncias, de fornecer uma indicação particularmente útil no que diz respeito

à prova e à organização do processo.

Lugar da materialização do dano:

Acórdão Zuid-Chemie 16/07/2009 C-189/08

Tribunal de Justiça definiu com lugar em que o facto suscetível de desencadear

responsabilidade extracontratual provocou um dano.

eDate Advertising

No âmbito da Internet, o Tribunal de Justiça afirma que em cado de alegada

violação de direitos de personalidade através de conteúdos colocados em linha

num sítio Internet, a pessoa que se considerar lesada tem a faculdade de intentar

uma ação fundada em responsabilidade pela totalidade dos danos causados nos

órgãos jurisdicionais do Estado-Membro onde se encontra o centro dos seus

interesses.

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Critério do centro de interesses do lesado está em conformidade com o

objetivo de previsibilidade da competência jurisdicional na medida em que

permite simultaneamente ao demandante identificar facilmente o órgão

jurisdicional que pode recorrer e ao requerente prever razoavelmente aquele no

qual pode ser demandado.

Como referido pelo advogado geral no considerando 20 das conclusões gerais,

esta apreciação é feita no contexto particular das violações aos direitos de

personalidade, o que está aqui em causa é violação de direitos de propriedade

intelectual. Numa situação em que uma pessoa se considera lesada nos seus

direitos de personalidade falamos de direitos que são protegidos em todos os

Estados-Membros (é o que acontece no acórdão eDate Advertising antes

mencionado). A proteção conferida pelo registo de uma marca nacional está, em

princípio, limitada ao território do Estado-Membro do registo pelo que, regra

geral, o seu titular não pode invocar a referida proteção fora desse território.

A questão de saber se a utilização, para fins publicitários, de um sinal idêntico a

uma marca nacional num sítio Internet que opera unicamente sob um domínio de

topo nacional que não o do Estado-Membro de registo da marca viola

efetivamente esta última insere-se na apreciação do mérito do recurso que o

órgão jurisdicional competente efetuará à luz do direito material aplicável.

O objetivo de previsibilidade e o objetivo da boa administração da justiça

militam a favor de uma atribuição de competência, a título de materialização do

dano, aos órgãos jurisdicionais do Estado-Membro em que o direito em causa é

protegido.

Com efeito, são os órgãos jurisdicionais do Estado-Membro do registo da marca

em causa que estão em melhores condições para avaliar, tendo em noção a

Diretiva 2008/95, se, numa situação como a que está em causa no processo

principal, foi efetivamente violada a marca nacional protegida.

Esses órgãos jurisdicionais estão habilitados a conhecer, por um lado, da

totalidade do dano alegadamente causado ao titular do direito protegido pela

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violação cometida e, por outro lado, de um pedido de cessação do

comportamento lesivo do referido direito.

Lugar do evento causal:

No que a este ponto respeita, importa observar que a limitação territorial da

proteção de uma marca nacional não é suscetível de excluir a competência

internacional de órgãos jurisdicionais que não sejam os do Estado-Membro onde

a referida marca está registada.

É jurisprudência constante que as disposições do Regulamento devem ser

interpretadas de maneira autónoma, com referência ao seu sistema e aos seus

objetivos, entre os quais figuram o objetivo da previsibilidade da atribuição da

competência e o de assegurar a boa administração da justiça e a organização útil

do processo.

O lugar do evento causal de um alegado dano pode constituir uma conexão

significativa do ponto de vista da competência judiciária, uma vez que é capaz de

fornecer uma indicação particularmente útil no que respeita à administração da

prova e à organização do processo.

Numa situação como a do processo principal a utilidade da indicação fornecida

pelo lugar do evento causal consiste na facilidade que o órgão jurisdicional desse

local possui para a recolha de provas referentes ao evento.

No caso em concreto, o facto gerador de uma eventual violação do direito das

marcas reside no comportamento do anunciante que recorreu do serviço de

referenciamento para a sua própria comunicação comercial.

Embora o desencadear do processo técnico de afixação pelo anunciante se efetue

num servidor que pertence ao operador do motor de busca utilizado pelo

anunciante, o lugar da sede do referido servidor não pode, em razão da sua

localização incerta, ser considerado o do evento causal.

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Tendo então em conta os objetivos de previsibilidade que as regras de

competência devem prosseguir, o lugar da sede do anunciante é aquele em que é

decidido o desencadear do processo de afixação, é aquele que se trata de um

lugar certo e identificável. Ou seja, pode então o litígio em causa ser submetido

aos órgãos jurisdicionais do Estado Membro do lugar da sede do anunciante.

A decisão declarada pelo Tribunal de Justiça (1ª Secção) foi a seguinte, citando o

redigido no acórdão:

“O artigo 5.º n.º3 do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho de 22 de

Dezembro de 2000 relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à

execução de decisões em matéria civil e comercial, deve ser interpretado no

sentido de que um litígio relativo à violação de uma marca registada num Estado-

Membro em virtude de utilização, por um anunciante, de uma palavra-chave

idêntica à referida marca no sítio Internet de um motor de busca que opera num

domínio nacional de topo de um outro Estado-Membro pode ser submetido quer

aos órgãos jurisdicionais do Estado-Membro onde a marca está registada quer

aos do Estado-Membro do lugar da sede do anunciante.”

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IV – O futuro introduzido pelo Regulamento n.º 1215/2012

O Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000,

relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução das decisões

em matéria civil e comercial foi um dos primeiros instrumentos normativos

adotados no sentido de fomentar a cooperação judiciária em matéria civil na

União Europeia.

Em 21 de abril de 2009, a Comissão adotou um relatório sobre do Regulamento

(CE) n.º 44/2001. O relatório concluía que, em geral, a aplicação do regulamento

era satisfatória, mas algumas das suas disposições deveriam ser melhor aplicadas,

dever-se-ia facilitar mais a livre circulação de decisões e continuar a reforçar o

acesso à justiça.

O regulamento n.º 1215/2012, a ser aplicado a ações intentadas a partir de 10 de

Janeiro de 2015, prima pela supressão do exequatur tendo como objetivo

promover o aumento da celeridade das decisões a nível europeu, pretende-se que

as mesmas, sendo tomadas num Estado-Membro, sejam reconhecidas noutro sem

a necessidade de recorrer a nenhum procedimento, por outras palavras, tal

supressão implica que uma decisão emanada num Estado-Membro seja

reconhecida e executada, noutro Estado-Membro, nas mesmas condições em que

este reconheceria e executaria uma decisão nele proferida. Esta alteração é

passível de ser identificada atendendo ao artigo 33.º, n.º 1 do regulamento n.º

44/2001 e ao artigo 36.º, n.º 1 do regulamento n.º 1215/2012.

Ora, tal afigura-se relevante na medida em que traduz uma redução das despesas

para particulares e empresas, em litígios transfronteiriços, garantindo uma

observância mais ágil, num Estado-Membro, das decisões emanadas num outro

Estado-Membro.

Este regulamento permite então um melhor e mais fácil acesso à justiça que se

pauta por um reconhecimento mútuo das decisões judiciais sem que haja uso de

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nenhum procedimento em concreto, e, por consequência, numa maior

convergência nos domínios do direito civil a nível da União.

Pela leitura dos considerandos tanto do Regulamento (CE) n.º44/2201 como do

Regulamento n.º 1215/2012, é possível identificar a importância do princípio da

confiança recíproca que se encontra estritamente ligado ao princípio do

reconhecimento mútuo. O contrário não seria de esperar tendo em atenção o

artigo 67.º, n.º 4 do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE),

onde se determina que «a União facilita o acesso à justiça, nomeadamente através

do princípio do reconhecimento mútuo das decisões judiciais e extrajudiciais em

matéria civil». O artigo 81.º, n.º 1, 1.ª parte do TFUE densifica esta matéria ao

declarar que «a União desenvolve uma cooperação judiciária nas matérias civis

com incidência transfronteiriça, assente no princípio do reconhecimento mútuo

das decisões judiciais e extrajudiciais». Tal cooperação pode incluir, como deriva

da sua 2.ª parte, a «adoção de medidas de aproximação das disposições

legislativas e regulamentares dos Estados-Membros».

Citando o escrito pelo professor de Direito na Universidade de Milão, Bruno

Nascimbene, no artigo “Le traite de Lisbonne et l’espace judiciaire européen: le

principe de confiance réciproque et de reconnaissance mutuelle”: “La confiance

n’est exige pas une identité de situations et réglés, mais une équivalence,

substantielle ou procédurale de façon qu’une décision prise par une autorité

nationale pourrait être acceptée en tant que telle par une autorité nationale d’un

autre État, et donc les résultats obtenus par un État peuvent prendre effet dans la

sphère juridique d’un autre État membre, quel qu’il soit.”

O artigo que aqui foi analisado, artigo 5.º N.º3 do Regulamento (CE) n.º 44/2001

não sofre alterações relevantes sendo que no Regulamento n.º 1215/12 passa a

ser o artigo 7.º nº2.

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V – Considerações Finais

O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) demonstra dar importância aos

Regulamentos, tendo em atenção o que eles pretendem, a quando a formulação

de decisões, sem nunca deixar de lado as circunstâncias do caso em concreto. Os

Regulamentos são instrumentos de elevada relevância a nível da União Europeia

e a sua boa interpretação mostra-se fundamental.

O Regulamento n.º 44/2001, agora Regulamento n.º 1215/2012, por todas as

razões descritas, pede uma boa aplicação a nível da União. Pretende-se uma

facilidade de reconhecimento das decisões sem deixar de lado a celeridade

destas. O TJUE tem dado adequadas respostas sobre a interpretação deste

Regulamento. No acórdão analisado, Wintersteiger, centramo-nos apenas na

questão da competência em matéria extracontratual. Analisando o exposto neste

acórdão e conjugando com o também enunciado no acórdão eDate Advertising,

retiramos conclusões jurisprudenciais que facilitam a leitura do artigo 5.ª n.º 3 do

Regulamento.

O artigo 5.º n.º3 estabelece uma regra da competência especial, derrogando o

principio da competência dos tribunais do domicílio do demandado. Este artigo

traz a relevo a existência de um elemento de conexão particularmente estreito

entre o litígio e os tribunais do lugar onde ocorreu o facto danoso, justificando-se

uma atribuição de competência a estes últimos por razões de boa administração

da justiça e de organização útil do processo.

No descrito no acórdão eDate Advertising encontramos a expressão “lugar onde

ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso” decifrada. Repetindo o já exposto

anteriormente, lugar da materialização do dano e/ao lugar do evento causal que

está na origem do dano, de modo que o requerido pode ser demandado, à escolha

do requerente, perante o tribunal de um ou outro desses lugares importando a

conexão significativa do ponto de vista da competência judiciária. Dever-se-á de

atender às circunstâncias do caso em concreto.

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Jurisprudência recorrente do TJUE permite concluir que as disposições do

Regulamento devem ser interpretadas de maneira autónoma, com referência ao

seu sistema e aos seus objetivos, entre os quais figuram o objetivo da

previsibilidade da atribuição da competência e o de assegurar a boa

administração da justiça e a organização útil do processo.

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V – Bibliografia

Jornal Oficial da União Europeia, L351, 55º, 20 de Dezembro de 2012

COVELO DE ABREU, Joana; Unio, EU Law Journal, texto relativo a tutela

jurisdicional efetiva no âmbito da cooperação judiciária em matéria civil e a

jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia: a cláusula de ordem

pública e a revelia absoluta como causas de recusa de reconhecimento e de

execução de decisões no contexto da União;

MOTA DE CAMPOS, João; MOTA DE CAMPOS, João Luís; PINTO

PEREIRA, António; Manual de Direito Europeu; Coimbra Editora, 7ª edição, p.

312 a 324;

NASCIMBENE ,Bruno; Revue des Affaires Européennes, «Le traite de Lisbonne

et l’espace judiciaire européen: le principe de confiance réciproque et de

reconnaissance mutuelle»,– Law & European Affairs;

Livro verde sobre a revisão do regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho,

relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões

em matéria civil e comercial;