Regulação para Entidades Sem Fins Lucrativos: Uma …...O setor de saneamento é um exemplo claro...
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ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento 1
XVIII Exposição de Experiências Municipais em Saneamento
De 4 a 9 de maio de 2014 - Uberlândia - MG
Samuel Alves Barbi Costa(1)
Economista, Mestre em Saúde Pública com ênfase em Gestão e Regulação dos Serviços de
Saneamento Básico na Fundação Oswaldo Cruz - FIOCRUZ. Gerente de Fiscalização
Econômico-Financeira na Agência Reguladora dos Serviços de Abastecimento de Água e de
Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais – ARSAE-MG.
Raphael Castanheira Brandão
Economista, Mestre em Ciências Econômicas na Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG.
Assessor da Coordenadoria de Regulação e Fiscalização Econômico-Financeira da Agência
Reguladora dos Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de
Minas Gerais – ARSAE-MG.
Vitor Hugo Conrado Lopes
Economista, Pós Graduado em Gestão com ênfase em Finanças na Fundação Dom Cabral - FDC.
Analista de Regulação Econômico-Financeira na Agência Reguladora dos Serviços de
Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais – ARSAE-MG.
Bruno Aguiar Carrara de Melo
Economista e Físico pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG. Coordenador de
Regulação e Fiscalização Econômico-Financeira da Arsae-MG. Trabalhou no setor elétrico de
1994 a 2010 no desenvolvimento de estudos de caracterização da carga, custos marginais,
estrutura tarifária, revisão tarifária e previsão de demanda em empresas como AES Sul, AES
Eletropaulo, Celpa, Celpe, Cemat, Cemig, Ceron, CPFL, Eletroacre, RGE, dentre outras.
Endereço(1): Cidade Administrativa - Rodovia Prefeito Américo Gianetti, s/nº – Serra Verde –
Edifício Gerais / 12º andar – Cep.: 31630-901 – Telefone: +55 (31) 3915-8060 - email:
Regulação para Entidades Sem Fins Lucrativos: Uma Proposta de
Metodologia
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RESUMO
Este trabalho apresenta uma metodologia de regulação para entidades sem fins lucrativos, que
mescla aspectos da regulação pelo custo do serviço e da regulação por preço-teto. São discutidos
dois estudos de caso em que esta metodologia híbrida foi aplicada. Em suma, pôde-se
demonstrar que é possível elaborar modalidades de regulação adaptadas, gerando incentivos aos
investimentos prudentes, à eficiência nos custos operacionais, além de garantir o equilíbrio
econômico financeiro das prestadoras de saneamento.
Palavras-chave: Regulação Econômica, Saneamento Básico, Revisão Tarifária, Modicidade,
Equilíbrio Econômico Financeiro.
INTRODUÇÃO
Setores estruturados em redes apresentam economias de escala e tendem a se organizar na
forma de monopólios naturais, situação em que apenas uma empresa minimiza os custos de
operação no mercado, sendo inviabilizada a concorrência. Um dos papéis primordiais da
regulação econômica é limitar o abuso de poder econômico de monopólio das empresas,
especialmente quando não há produtos substitutos.
O setor de saneamento é um exemplo claro de monopólio natural. Altos investimentos são
necessários para a construção de estações de tratamento de água e de esgoto, além de uma
enorme e complexa rede de distribuição de água e de coleta dos efluentes. No entanto, feito o
investimento, o custo de se adicionar outro usuário à rede existente é baixo. A economia de
escala resultante inviabiliza a competição no setor. A regulação deve desenvolver instrumentos
para simular a competição em setores não concorrenciais, promovendo o controle do poder de
mercado dos prestadores, zelando pela qualidade dos serviços e estimulando a eficiência
operacional.
Entretanto, as metodologias mais tradicionais de regulação são, de maneira preponderante,
desenvolvidas para atender à lógica de mercado, tendo foco em firmas de finalidade lucrativa. No
Brasil, por exemplo, é comum a prestação dos serviços de saneamento na forma organizacional
de autarquias municipais sem fins lucrativos.
Conforme a legislação que rege o setor de saneamento, essas entidades também devem ser
reguladas, no entanto, é necessário que recebam um tratamento regulatório diferenciado, uma vez
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que os incentivos de mercado não são capazes de estimular essas entidades a perseguir a
eficiência operacional. Portanto, este trabalho tem como objetivo apresentar uma metodologia de
regulação adaptada para entidades sem fins lucrativos, a fim de instigá-las à excelência na
prestação dos serviços.
METODOLOGIA
A fim de apresentar uma metodologia customizada para a regulação de entidades sem fins
lucrativos, é necessário caracterizar muito bem o setor de saneamento e entender os
fundamentos dos modelos tradicionais de regulação, quais sejam: regulação por custo do serviço
e por preço teto.
O elevado custo fixo necessário, aliado a um capital bastante especifico, gera como consequência
que o atendimento dos critérios de eficiência produtiva seja possível com a atuação de uma única
empresa no mercado – característica típica do monopólio natural e do setor de saneamento – em
que os custos de produção são minimizados com a operação de uma única firma. Tal condição de
monopólio acarreta problemas em relação a eficiência alocativa, os quais devem ser tratados
pelos órgãos reguladores (TUROLLA, 2002).
A regulação visa a maximização do bem-estar social em um ambiente de monopólio natural, esse
entendido como uma “falha de mercado” a qual deve ser corrigida pela ação de entidades
reguladoras dotadas de independência decisória, autonomia técnica, administrativa, orçamentária
e financeira em relação ao governo.
A regulação econômica, então, define um conjunto de regras específicas para a instituição de
tarifas e preços induzindo os operadores a produzirem o que é desejável, de forma a alcançar
resultados ótimos no que concerne aos preços praticados, às quantidades produzidas e aos
padrões de qualidade oferecidos (MARQUES, 2011).
As metodologias de regulação mais tradicionais partem do pressuposto que as companhias
reguladas são empresas com finalidade lucrativa. Nesse contexto se enquadram o método de
regulação por custo do serviço (taxa de retorno) e por incentivos de desempenho.
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Regulação por Custo do serviço (Taxa de Retorno)
A regulação por custo do serviço define as tarifas com base nos custos do prestador e assim
garante sua recuperação e estabelece uma remuneração adequada, determinada pela entidade
reguladora, a incidir sobre os investimentos efetuados. (SAPPINGTON, 2000).
A grande vantagem do emprego deste modelo consiste no estabelecimento de uma relação direta
entre os custos, os preços e os lucros do prestador de serviços. O regulador define os preços que
serão responsáveis por retornar a remuneração definida, traz sustentabilidade ao negócio e
promove conforto aos investidores, os quais terão os riscos minimizados pela lógica da garantia
de retorno sobre os investimentos incorridos e redução dos riscos do ambiente institucional.
(JAMISON, 2007).
As entidades reguladas por custo do serviço, no entanto, não contam com incentivos para a
redução de custos operacionais. A remuneração auferida é independente do seu desempenho. A
eliminação de desperdícios e os consequentes ganhos de eficiência, bem como a inovação, ficam
inibidos (BARBI & CÔRTES, 2013b). Além disso, a ausência de tais incentivos pode gerar tanto o
inchaço de custos operacionais, como também elevação desnecessária da base de ativos,
gerando como consequência a elevação das tarifas. Sobre este ponto se fundamenta a maior
crítica ao modelo de regulação por custo do serviço (CARRARA & TUROLLA, 2013).
Outro entrave associado a este método ocorre quando a taxa de remuneração é superior ao custo
de capital, podendo existir sobreinvestimento. Frente a essa situação, o prestador de serviços
procura aumentar os investimentos realizados obtendo um lucro adicional por cada unidade de
capital suplementar despendida. Este fenômeno é chamado de efeito de Averch-Johnson. O caso
contrário, subinvestimento, pode ocorrer se a taxa de remuneração estabelecida for inferior ao
custo de capital. (MARQUES, 2011, p.52).
O modelo de custo do serviço é interessante quando o objetivo principal é a universalização. Ao
trazer garantias de remuneração dos investimentos e reduzir os riscos do ambiente institucional,
os investidores são atraídos. No entanto, as tarifas provavelmente serão progressivamente
aumentadas, seja com a elevação da base de capital, ou mesmo com a ineficiência presente nos
custos operacionais.
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Regulação por Incentivos Limites de Preço (Price Cap)
Diferentemente da regulação por custo do serviço, a regulação por incentivos introduz a
componente de produtividade associada à redução dos custos como elemento principal do
método regulatório. Incluem-se nessa definição alguns métodos, com grande destaque para a
regulação por limites de preço (Price Cap)1.
A regulação por limite de preços consiste no estabelecimento de um teto para os preços do
serviço ou bem fornecido. São determinados ciclos de revisões tarifárias periódicos em que as
tarifas são mantidas constantes, com alterações somente devido a efeitos inflacionários
(reajustes).
As revisões têm por objetivo estabelecer o equilíbrio econômico financeiro dos serviços, definir os
padrões de eficiência e os incentivos ao desempenho dos prestadores, além de determinar os
critérios de compartilhamento dos ganhos de produtividade com os usuários. Os reajustes
tarifários, por sua vez, objetivam manter o poder de compra das prestadoras nos períodos entre
revisões, atualizando as suas tarifas com base em índices de inflação, descontado o fator de
compartilhamento de produtividade, denominado fator X.
O fator X é um indicador de ganhos de produtividade, calculado no momento da revisão tarifária.
Atua distribuindo tais ganhos, estimados para o período entre revisões, ao longo dos reajustes
tarifários. Para acumular maiores lucros, o prestador se verá obrigado a ganhar mais
produtividade do que o previsto pelo ente regulador. (BARBI & CÔRTES, 2013b).
Nos modelos de Price Cap, os custos e lucros da companhia regulada não são observados para o
processo de definição dos preços, diferentemente do que ocorre no modelo por custo de serviços.
(JAMISON, 2007). Dessa forma, a definição do preço máximo deve se utilizar de técnicas
alternativas de comparação, como o benchmarking.
Entende-se por benchmarking a comparação entre resultados de desempenho das operadoras em
relação aos seus pares ou a uma empresa de referência fictícia. O princípio básico deste método
de regulação consiste em obter informações sobre o conjunto de entidades que apresentam
mesmo tipo de atividades, observando suas melhores práticas para se estabelecer uma forma
1 Destacam-se, também, como métodos de regulação por incentivo, a Receita-teto (Revenue Cap) e a Regulação por Comparação
(Yardstick Competition).
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artificial de competição visando a melhoria de seu desempenho. No Price Cap, estes mecanismos
podem ser aplicados em dois momentos:
a) Determinação do Equilíbrio: No instante da revisão tarifária, é necessário estabelecer o
equilíbrio econômico financeiro da prestação dos serviços. Como no Price Cap não são
observados os custos da firma, os mecanismos de benchmarking serão responsáveis
por fornecer o preço de equilíbrio do início do ciclo de revisão.
b) Determinação do Fator X: Os padrões de produtividade são definidos pela entidade
reguladora no momento da revisão tarifária. O benchmarking é aplicado com o intuito
de estimar os ganhos de produtividade para o ciclo de revisão, sendo subdividos em
uma trajetória ao longo dos reajustes, caracterizando o Fator X.
Assim, o prestador se esforçará para obter maiores lucros, tentando reduzir seus custos
operacionais. Ao fim do ciclo tarifário, o regulador poderá redefinir os preços em uma revisão
tarifária, repassando os ganhos de produtividade aos usuários (CARRARA & TUROLLA, 2013).
Pondera-se que o ganho de margem (lucro) via incentivos à eficiência operacional e redução dos
custos pode impactar negativamente na qualidade dos serviços, ou em baixos investimentos em
expansão, elementos que devem ser também considerados pelo regulador.
A Necessidade de Regulação das Entidades sem fins lucrativos
A Lei Federal Nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, denominada Lei Nacional do Saneamento
(LNS), exige que a regulação dos serviços seja efetuada por agências dotadas de independência
decisória, autonomia administrativa, orçamentária e financeira, responsáveis por estabelecer
normas para a adequada prestação dos serviços e reprimir o abuso do poder econômico dos
prestadores. A existência das entidades reguladoras é essencial mesmo nos casos de prestação
direta de serviços pelos municípios ou na modalidade de autarquia municipal. (CUNHA, 2013).
Mesmo para prestadores sem fins lucrativos, pela tecnicidade e independência decisória, a
regulação econômica justifica-se como forma de evitar que ineficiência operacional, falta de
prudência dos investimentos ou intervenção política interfiram na definição de tarifas.
Elevar tarifas é uma tarefa muito custosa para o poder público. Sendo assim, fatores políticos
podem atrasar reposicionamentos tarifários de forma a evitar os resultados negativos dessas
iniciativas em sua administração. Sendo assim, os prestadores de saneamento podem sofrer
contínuos desequilíbrios econômico-financeiros, capazes de prejudicar o planejamento, execução,
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a ampliação e a qualidade dos serviços prestados. A regulação reduz o vínculo político ao instituir
critérios técnicos e periódicos de reposiocionamento das tarifas, de modo a garantir o equilíbrio às
entidades e defender os direitos dos usuários de acessar os serviços com qualidade a preços
módicos.
Uma vez compreendido que os processos de regulação são essenciais mesmo para entidades
sem fins lucrativos, é necessária a construção de uma metodologia adaptada para elas. O
primeiro passo para isso é entender que os métodos tradicionais de regulação, apresentados
anteriormente, convivem com própositos bastante diferentes.
A regulação por custo de serviço objetiva promover a universalização dos serviços prestados e o
equilíbrio econômico-financeiro dos prestadores baseando-se em seus próprios custos para o
estabelecimento das tarifas. Nesse sentido, a eficiência operacional fica em segundo plano, o que
não acontece na regulação por preço teto, a qual incentiva o prestador a empreender esforços e
investir em inovações que resultem a redução dos custos, estimulando assim, a eficiência sobre
os custos operacionais.
Jamison (2007) alega que ao escolher um dos método, os reguladores devem ponderar os
problemas potenciais e benefícios das metodologias. Cada qual pode ser adequada a uma
situação específica. Em alguns casos, os métodos híbridos seriam aqueles que mais fazem
sentido, podendo apresentar os melhores resultados em termos institucionais, políticos e
econômicos. Uma metodologia híbrida é aquela que busca mesclar diferentes métodos de
regulação na tentativa de maximizar suas potencialidades e minimizar seus problemas.
Este trabalho apresenta uma metodologia híbrida entre regulação por custo de serviço e
regulação por incentivos, com ênfase no equilíbrio econômico-financeiro das entidades sem fins
lucrativos. Esta metodologia foi influenciada por aspectos da regulação do setor elétrico brasileiro,
promovida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e já foi implementada sobre os
Serviços Autônomos de Água e Esgoto (Saae’s) dos municípios de Passos e Itabira, em Minas
Gerais, regulados pela Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de
Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais (Arsae-MG).
Regulação Híbrida: Metodologia Proposta para os Entes sem fins lucrativos
A Revisão Tarifária pode ser entendida como o momento no qual os custos da prestadora são
analisados detalhadamente para se estabelecer o nível de custos eficientes que garantam tanto o
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equilíbrio econômico-financeiro da prestação dos serviços quanto a modicidade tarifária. (ARSAE,
2011).
O Reposicionamento Tarifário (RT) é o índice de atualização das tarifas realizado no momento da
Revisão. Ele é representado pela razão entre a Receita Requerida (RR) e a Receita Verificada
(RV), conforme a equação segunte:
A Receita Verificada é calculada pela aplicação das tarifas vigentes ao mercado efetivo pelo
prestador, retornando o nível de receita com as tarifas antes da realização da Revisão.
A Receita Requerida, por sua vez, pode ser entendida como o custo a ser reconhecido pelo
regulador para a prestação dos serviços. O cálculo da Receita Requerida é o ponto central da
Revisão Tarifária pois exige a análise cuidadosa por parte do regulador para a definição dos
custos eficientes (ARSAE, 2011). A análise dos custos é essencial para garantir o equilíbrio
econômico-financeiro da prestação dos serviços. Sendo assim, o momento da definição inicial de
preços teria forte inflluência do método de regulação por custo de serviço.
A Receita Requerida é constituída por gastos relacionados à operação, preservação e ampliação
dos serviços, conforme a equação abaixo:
onde: CO: Custos Operacionais;
CC: Custo de Capital;
MAN: Despesas com Manutenção de Ativos.
Na metodologia do custo do serviço, o Custo de Capital é calculado a partir da avaliação da base
de ativos do prestador e a aplicação de uma taxa de remuneração sobre ela. As entidades que
são o foco desta metodologia não necessitam de remuneração sobre os investimentos realizados,
uma vez que não tem fins lucrativos. Assim, a valoração do Custo de Capital é simplificada,
podendo ser adotado um plano de investimentos a ser executado pelo prestador durante o
período entre revisões que, se aprovado pela entidade reguladora, passa a ter seu valor
incorporado nas tarifas.
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Consideraram-se sob a denominação Manutenções os recursos necessários para a garantir a
atualização e condições de operação dos ativos associados à prestação dos serviços. Tais
recursos possibilitam reparos ou substituição de itens desgastados ou obsoletos.
Os Custos Operacionais (CO) são aqueles essenciais ao funcionamento dos sistemas de água e
de esgoto, tais como gastos com pessoal, serviços de terceiros, energia elétrica e material de
tratamento. Assim como na regulação por custo de serviço, o estabelecimento dos Custos
Operacionais regulatórios parte da apuração dos custos contábeis em um períoddo de referência.
(ARSAE, 2012). Sabe-se, no entanto, que a verificação dos custos incorridos e o repasse dos
mesmos às tarifas não introduzem qualquer incentivo à eficiência operacional do prestador. Logo,
é necessário a inclusão de mecanismos de melhoria do desempenho ao se definir os custos
operacionais numa revisão tarifária.
Na presente metodologia, os incentivos ao desempenho sobre os Custos Operacionais são
empregados tanto na definição da Receita Requerida, quanto na avaliação do Fator X.
No primeiro caso, para se incorporar incentivos de desempenho, é necessário desvincular as
tarifas dos custos incorridos pela prestadora, assim como previsto na metodologia de regulação
Price Cap. Para tanto, a observação do histórico de custos do próprio prestador é alternativa
viável. Caso esta análise indique o alcance de algum ganho em eficiência operacional num
passado recente, mas que não se verifica no momento de elaboração da revisão tarifária, a
entidade reguladora poderá adotar os parâmetros históricos como referência para a definição da
receita requerida ao longo do novo ciclo tarifário. O prestador deverá, por conseguinte, resgatar os
ganhos de eficiência operacional para que as tarifas sejam capazes de cobrir seus custos.
Uma alternativa para se desvincular as tarifas dos custos incorridos é a análise das melhores
práticas do mercado observadas a partir de prestadores com características semelhantes ao do
prestador regulado. A aplicação de técnicas de benchmarking, com a estimação de fronteiras de
eficiência, tornam-se essenciais neste caso. O uso das melhores práticas como referência para o
estabelecimento dos custos a serem cobertos pelas tarifas estimulam os prestadores regulados a
buscar medidas e ações que visem à eficiência em suas operações.
No entanto, caso as diferenças entre os custos incorridos pela prestadora e aqueles obtidos pela
análise histórica ou a de benchmarking sejam significativas o suficiente para implicar fortes
reduções nas tarifas, é prudente considerar que parte dos ganhos de eficiência a serem obtidos
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pelo prestador se dê ao longo do ciclo tarifário. Dessa forma, a metodologia proposta por este
trabalho prevê a incorporação dos mecanismos de incentivo à eficiência na construção do Fator X,
que será aplicado durante os reajustes tarifários. Tal proposta é adequada também na medida em
que ações para obtenção de melhor desempenho operacional pelo prestador são custosos e, em
geral, levam algum tempo. Portanto, a distribuição da aplicação dos mecanismos de incentivo ao
longo do ciclo tarifário através do Fator X atenua os impactos percebidos pelo prestador sobre as
suas tarifas.
Portanto, a metodologia híbrida proposta por este artigo mescla características dos modelos de
regulação de Custos de Serviços e de Price Cap. O primeiro é considerado na medida em que os
custos dos prestadores regulados são analisados para o estabelecimento da Receita Requerida.
Os elementos da metodologia de Price Cap, por sua vez, compõem esta metodologia híbrida no
estabelecimento dos custos operacionais eficientes e do Fator X. Na busca pela desvinculação
das tarifas em relação aos custos incorridos pelo prestador, técnicas de benchmarking servem de
referência para a avaliação da revisão tarifária. Desta forma, os incentivos à eficiência
operacional, característica elementar do Price Cap, é incorporada ao método híbrido de regulação
econômica.
RESULTADOS
A aplicação de modelos híbridos, os quais consideram diferentes metodologias de regulação,
pode ser percebida nas Revisões Tarifárias realizadas pela Arsae-MG para os Serviços
Autônomos de Água e Esgoto dos municípios de Passos e Itabira. Em tais processos destacam-se
aspectos distintos considerados nas análises: os custos operacionais e os custos de capital.
Sobre os Custos Operacionais, compreendidos pelos gastos com Energia Elétrica, Material de
Tratamento, Pessoal e Serviços de Terceiros, por exemplo, a Agência Reguladora avaliou, a partir
de informações contábeis e operacionais, os custos incorridos em certo período de tempo.
Nota-se que em um processo de revisão tarifária, os preços definidos devem ser capazes de
cobrir apenas os custos eficientes da prestadora, e, para a definição de eficácia dos custos é
interessante que o órgão regulador não avalie somente as despesas incorridas pelo prestador. Dai
a necessidade e utilização de técnicas de benchmarking a fim de que se identifique os gastos
operacionais eficientes tanto do Saae de Passos, quanto do Saae de Itabira (ARSAE, 2011;
ARSAE, 2012).
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Um caso especial de avaliação dos custos operacionais eficientes através de técnicas de
comparação se refere à avaliação dos custos de pessoal e serviços de terceiros do Saae de
Itabira. Para esta prestadora, a Agência identificou gastos com pessoal próprio acima da média,
quando analisado um conjunto de prestadores com características semelhantes ao Saae.
Nesta avaliação, foram utilizadas informações do Sistema Nacional de Informações sobre
Saneamento (SNIS) e aplicadas técnicas estatísticas de análise de regressão. Como resultado, foi
estimada uma redução de 19,8% nos gastos com pessoal próprio e com serviços de terceiros
durante o 1º Ciclo de Revisão Tarifária (ARSAE-MG, 2012).
Outro destaque em referência às Revisões de Passos e de Itabira foi a aplicação de redutores
relacionados a perdas de água a serem alcançados pelo Saae’s (ARSAE-MG, 2011). Com um
índice menor de perdas, menores são os gastos com energia elétrica e material de tratamento.
Dessa forma, buscou-se aplicar incentivos à redução de perdas ao não considerar completamente
os custos incorridos pelos prestadores com energia elétrica e material de tratamento.
Por fim, com a intenção de incentivar investimentos em expansão e melhoria em tratamento de
esgoto, mecanismos de bonificação e punição sobre o desempenho dos Saae’s no que tange à
abrangência e eficiência no tratamento de esgoto foram instituidos. Nos reajustes tarifários
seguintes à revisão, os Saae’s são avaliados sobre esses aspectos destacados, podendo receber
aumentos ou diminuições nas tarifas caso consigam atingir ou não, as metas estabelecidas pela
Agência. Criaram-se, portanto, mecanismos de incentivo, uma vez que as melhorias nos serviços
de esgotamento sanitário poderão se reverter em maiores recursos para o prestador.
Ao considerar os recursos para os investimentos dos Saae’s, a Arsae-MG optou por
determinações típicas de um modelo de regulação por custo de serviço. Mesmo sendo os Saae’s
autarquias sem finalidade lucrativa, a Agência identificou a necessidade destas instituições de
realizar aportes para a universalização dos serviços de saneamento. Logo, as tarifas estipuladas
pela entidade reguladora também abarcaram os recursos necessários para que as prestadoras
em questão pudessem executar os investimentos necessários ao longo do ciclo tarifário.
Em suma, ao realizar as revisões tarifárias dos Saae’s de Passos e de Itabira, a Agência
Reguladora optou por um modelo de regulação híbrido, que considera elementos da regulação por
limite de preços e que adota, também, determinações de uma regulação por custo de serviço.
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DISCUSSÃO
Ao aplicar uma metodogia híbrida, a Arsae-MG visa promover não só um ambiente seguro e
confiável, o qual estimule os investimentos e a expansão dos serviços, que são tão necessários
para o setor de saneamento no Brasil, como também estimular o prestador público a empreender
esforços na busca de melhoria continua de suas operações, aprimorando a eficiência dos
serviços.
A tentativa de alcançar os objetivos da regulação, quais sejam o de se evitar o abuso do poder de
mercado; simular condições de eficiência; e garantir a cobertura dos investimentos para a
universalização dos serviços são identificados na utilização do modelo híbrido supracitado e
exemplificado.
Ademais, é importante citar que os que os critérios e procedimentos utilizados pelo regulador
devem respeitar os princípios para uma regulação eficaz, a qual diminua tanto os riscos para os
prestadores, quanto os custos para o consumidor, visando ainda a sustentabilidade do serviço de
saneamento, premissa básica para o desenvolvimento do país.
Contudo, o regulador deve considerar alguns pontos ao aplicar a metodologia híbrida apresentada
neste artigo. Por exemplo, ao analisar os custos operacionais desvinculados dos gastos
efetivamente incorridos pelo prestador, a entidade reguladora deve ter cautela a fim de evitar o
estabelecimento de metas de eficiência operacional inalcançáveis para o prestador (INSTITUTO
ACENDE BRASIL, 2007).
Além disso, a avaliação dos custos operacionais eficientes pode empregar diversas técnicas de
benchmarking2, que são suscetíveis à discricionariedade do regulador. Logo, para se atribuir
confiabilidade e transparência ao processo, a entidade reguladora deve considerar os resultados
de diferentes técnicas e especificações previamente à aplicação destes na revisão tarifária
(INSTITUTO ACENDE BRASIL, 2007).
Outro ponto relevante a respeito do emprego de técnicas benchmarking diz respeito à base de
informações adotada para a análise das melhores práticas de mercado. O regulador deve
certificar que os dados utilizados são fidedignos e confiáveis. Para o setor de saneamento, o
Sistema Nacional de Informações sobre o Saneamento (SNIS) possui informações econômicas e
2 Segundo Marques (2011), as principais técnicas de benchmarking são a Análise de Fronteira Estocástica, o Método
de Mínimos Quadrados Ordinários, a Análise Envoltória de Dados e a Produtividade Total dos Fatores.
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operacionais para um conjunto relevante de municípios do Brasil. No entanto, assim como
destacam Barbi e Côrtes (2013b), esta base de dados apresenta limitações, como o número
reduzido de observações para variáveis qualitativas e não-confiabiliade das informações, devido
ao fato delas serem auto-declaradas. Portanto, a análise das melhores práticas de mercado,
assim como proposto pela metodologia de regulação deste artigo, deve realizar uma prospecção
minuciosa sobre a base de dados empregada, seja ela o SNIS ou outra fonte de dados.
Em relação à avaliação dos planos de investimentos a serem incorporados à tarifa, a entidade
reguladora deve somente considerar recursos voltados a obras ou ações prudentes e estritamente
necessárias à operação, universalização e ampliação da qualidade dos serviços prestados no
município. Para tanto, o regulador poderá utilizar o Plano Municipal de Saneamento Básico
(PMSB) como referência para observação dos projetos e medidas a serem executadas ao longo
do ciclo tarifário. Elemento previsto na LNS, o PMSB descreve as metas para os serviços de
saneamento e prevê os programas e ações necessárias para atingir estes objetivos.
Por fim, há de se avaliar o impacto de dispositivos de sanções sobre prestadores sem finalidade
lucrativa. Assim como destaca Barbi & Côrtes (2013a), a introdução de multas sobre entidades
sem fins lucrativos pode onerar significativamente o município e os usuários dos serviços. Dado
que as tarifas foram construídas sem a previsão de gerar recursos excedentes à operação e
ampliação dos serviços, tais prestadores poderão realizar o pagamento das sanções utilizando os
saldos para a execução dos investimentos. Dessa forma, a aplicação de multas e penalidades
limitará a capacidade de investimento do prestador, impedindo-o de executar programas e ações
importantes para o município e para os usuários. Além disso, a aplicação destas multas afetará o
equilíbrio econômico-financeiro do prestador, fundamental para a manutenção da regularidade e
qualidade dos serviços.
Portanto, a entidade reguladora deve buscar alternativas viáveis para direcionar as ações dos
prestadores dentro do que é previsto pela legislação e pelas normas de regulação, evitando a
aplicação de multas.
CONCLUSÃO
Os procedimentos de Regulação fazem-se necessários não apenas por suas justificativas legais,
mas por visarem o bem estar da sociedade, beneficiando tanto consumidores, via aplicação de
preços justos e melhor qualidade dos serviços, quanto prestadores, pela garantia de equilíbrio
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econômico-financeiro e dos altos investimentos que o setor de saneamento necessita. Com a
metodologia aqui apresentada, pôde-se demonstrar que é possível elaborar modalidades de
Regulação adaptadas para atender às necessidades das entidades sem fins lucrativos, como os
Saae’s, incentivando a realização de investimentos necessários à ampliação e melhoria dos
serviços e a obtenção de custos operacionais eficientes.
Cada modelo apresentado possui vantagens e limitações. Buscar os benefícios de cada um dos
métodos, desde que não sejam mutualmente incompatíveis, parece uma opção acertada para a
regulação de entidades locais sem fins lucrativos.
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