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Relatório de Estágio apresentado para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ensino do Português e das Línguas Clássicas no 3º ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário, realizado sob a orientação científica do Professor Doutor Helder Godinho, Professor Catedrático do Departamento de Línguas, Literaturas e Culturas e do Professor Doutor Manuel Rodrigues, Professor Auxiliar do Departamento de Estudos Portugueses da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

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Relatório de Estágio apresentado para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de

Mestre em Ensino do Português e das Línguas Clássicas no 3º ciclo do Ensino Básico e no Ensino

Secundário, realizado sob a orientação científica do Professor Doutor Helder Godinho, Professor

Catedrático do Departamento de Línguas, Literaturas e Culturas e do Professor Doutor Manuel

Rodrigues, Professor Auxiliar do Departamento de Estudos Portugueses da Faculdade de Ciências

Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

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Ao Jorge, aos meus pais, aos meus irmãos, à minha avó.

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AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, agradeço à minha orientadora, Regina Garcia, e à minha colega

de estágio, Cátia Ramalhinho, que demonstraram ser a orientadora e a colega ideais, através

da sua dedicação, compreensão e competências profissionais.

Agradeço igualmente aos meus orientadores e professores do Mestrado em Ensino,

em especial, ao Professor Doutor Manuel Rodrigues, pela sua paciência e compreensão e à

Professora Doutora Graciete Silva, pelos seus excelentes seminários de Língua e Literatura.

Este relatório de estágio é também fruto da bondade demonstrada pela Ana Turíbio,

a quem tenho de agradecer a imensa amizade, a alegria e a fé. Sem a sua ajuda, não seria

possível conhecer tão profundamente o escritor Vergílio Ferreira. Agradeço também a

oportunidade que o Professor Doutor Helder Godinho me concedeu, ao integrar o CEIL e a

equipa de edição crítica. Para além disso, agradeço os seus conselhos, a sua sabedoria e a

ajuda que me prestou, enquanto orientador deste relatório.

Passados dois anos letivos, dirijo os meus agradecimentos a todas as pessoas com

quem me tenho cruzado nas escolas por onde passei, em especial à Olívia Reis, à Andrea

Gil, à Maria José Carvalho, à Marina Gavinho, à Graciete Marques e à Andreia Esteves.

Neste percurso, ainda inicial, gostaria de agradecer igualmente aos meus alunos do

Externato Alexandre Herculano, da EPAR, da Escola Básica E.B. 2/3 Padre Alberto Neto e

do Colégio da Bafureira, por me ensinarem a admirar a diversidade e a abraçar o ensino do

Português com paixão e determinação.

Agradeço ao Professor Doutor Ivo Castro tudo o que aprendi, durante as sessões das

Oficinas de Edição na Faculdade de Letras de Lisboa.

Aos meus pais, agradeço a confiança que depositaram no meu percurso, apesar da

distância que nos separa. Ao meu irmão, Rui, agradeço a sua inteligência, amizade e força,

que tanto carinho me deu desde criança. À minha avó, agradeço o seu amor incondicional, a

sabedoria dos seus cabelos brancos e as suas canções.

Agradeço ainda às minhas amigas Nina, Céline, Helena, Joana e Edgar, por terem

sempre paciência para as minhas dúvidas existenciais.

Por fim, agradeço ao Jorge, o eterno companheiro de todos os meus setembros, pelo

seu amor.

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DA PRÁTICA DO ENSINO À SUA REFLEXÃO: OS MANUSCRITOS DOS

AUTORES E A CRÍTICA TEXTUAL COMO INSTRUMENTOS DIDÁTICOS

CÁTIA SOFIA SANTOS BARROSO

PALAVRAS-CHAVE: didática – crítica textual – manuscrito – escrita

RESUMO

Este relatório de estágio contempla as reflexões sobre a minha Prática de Ensino

Supervisiona (PES) nas seguintes instituições: Escola Secundária José Gomes Ferreira e

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, durante o ano

letivo de 2010/2011. Abrange uma componente descritiva sobre o trabalho desenvolvido

nas instituições referidas e uma componente reflexiva, na qual aprofundo não só

pressupostos didáticos das disciplinas de Latim e de Português, mas também a articulação

entre crítica textual e o ensino da língua e da literatura. A observação e condução de aulas

são relativas ao 7º e 9º do Ensino Básico, ao 11º ano do Ensino Secundário e ao 1º ano da

licenciatura em Estudos Portugueses.

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FROM THE PRACTICE OF TEACHING TO ITS REFLECTION: THE

MANUSCRIPTS OF WRITERS AND TEXTUAL CRITICISM AS TEACHING

TOOLS

CÁTIA SOFIA SANTOS BARROSO

KEYWORDS: didactics - textual criticism – manuscripts – writing

ABSTRACT

This report focuses on the reflections about my Supervised Teaching Practice at the

following institutions: Escola Secundária José Gomes Ferreira and Faculdade de Ciências

Sociais e Humanas – Universidade Nova de Lisboa, throughout the academic year

2010/2011. It covers a descriptive component about my work at these institutions and a

reflexive component concerning not only didactic topics of Latin and Portuguese, but also a

link between the textual criticism and the teaching of language and literature. Classroom

observation and practice refers to the 7th

, 9th and 11

th grades high school and to the first year

of the graduation in Portuguese Studies.

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Índice

Introdução.............................................................................................................................1

Capítulo I – As instituições cooperantes…………………………………………………….…2

I.1 – Escola Secundária José Gomes Ferreira……………………………………….…..2

I.1.1- Contexto de integração na instituição…………………………………….2

I.1.2 – Caracterização da instituição……………………………………….……3

I.1.2.1 – A dimensão física……………………….……......……………………….4

I.1.2.2 – A dimensão humana……………………….......…………………….……5

I.2 – Faculdade de Ciências Sociais e Humanas………….....……………………...7

I.2.1 – Contexto de realização da PES de Latim……………….....…………………….…...7

I.2.2 – Caracterização da instituição…………………………….....………………….…….8

Capítulo II – Prática do Ensino Supervisionada de Português……….……...…….…..9

II.1 – Planificação dos trabalhos a desenvolver……………………...……………9

II.2 – Caracterização da turma 11º5……………………………....………………10

II.3 – O período de observação para uma prática reflexiva………...…………….13

II.4 – Prática do Ensino Supervisionada de Português…………...………………18

II.4.1 – Aulas de extensão curricular – PORTEC………………………....…...…..………18

II.4.2- Planificação e condução das aulas - unidades didáticas 3 e 5……..………........…..21

II.4.2.1 – Unidade didática :Frei Luís de Sousa…...……………...…….....……..23

II.4.2.2 – Unidade didática :Lírica de Cesário Verde…………………........….…28

II.4.3- Avaliação dos alunos……………………………………..……...…32

II.4.4- Papel desempenhado na comunidade educativa da ESJGF…....…..33

II.4.4.1 – As reuniões de trabalho…………………….……..………...…………33

II.4.4.2 – Participação em aulas do 3º ciclo: 7º3 e 7º4………….……...………..35

II.4.4.3 – Projeto de Educação Sexual promovido pelo CAOJ………....……….37

Capítulo III – Prática do Ensino Supervisionada de Latim……….……..……..……38

III.1 – Circunstâncias em que decorreu a PES de Latim……….…………..……38

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III.2 – Caracterização das turmas de Latim I e II………………….……………40

III.3 – Período de observação das aulas do Prof. André Simões……….…....….40

III.4 – Planificação e condução das aulas……………………………………...42

Capítulo IV – Os manuscritos dos escritores e a crítica textual como instrumentos

didáticos……………………………………………………..…………………………43

IV.1 – O contributo da crítica textual para a didática da língua e da literatura...43

IV.2 – A visita à oficina do escritor Vergílio Ferreira………………………….47

Conclusão…………………………………………………………………………...…50

Bibliografia…………………………………………………………………………….51

Anexos…………………………………………………………………………………55

Anexo 1 – Powerpoint – A prosódia – PORTEC...........................................................56

Anexo 2– Ficha de Trabalho – A prosódia – PORTEC.................................................58

Anexo 3 – Powerpoint – A semântica lexical – PORTEC.............................................60

Anexo 4 – Ficha de trabalho – A semântica lexical – PORTEC....................................63

Anexo 5 – Texto utilizado para a ficha de semântica lexical – PORTEC......................65

Anexo 6 – Planificação da aula – Funções Sintáticas – PORTEC.................................66

Anexo 7 – Ficha de trabalho – Funções Sintáticas – PORTEC.....................................67

Anexo 8 – Ficha de trabalho – Orações Complexas – PORTEC..................................69

Anexo 9 – Powerpoint – O Romantismo e o Classicismo ............................................71

Anexo 10 – Ficha de trabalho – O Romantismo e o Classicismo..................................72

Anexo 11 – Ficha de trabalho – Ato I de Frei Luís de Sousa (1ª aula).........................74

Anexo 12 – Planificação de aula – Ato I de Frei Luís de Sousa (2ª aula)....................76

Anexo 13 – Ficha de trabalho – Ato III de Frei Luís de Sousa....................................77

Anexo 14 – Planificação da última aula de Frei Luís de Sousa...................................79

Anexo 15 - Ficha informativa – O sebastianismo em Frei Luís de Sousa...................80

Anexo 16 – Teste de Avaliação da unidade nº3...........................................................82

Anexo 17 – Plano de aula – O contexto da poesia de Cesário Verde..........................85

Anexo 18 – A biografia de Cesário Verde por Maria Júlia..........................................87

Anexo 19 – Powerpoint – O contexto da poesia de Cesário Verde.............................88

Anexo 20 – Ficha de trabalho – O contexto da poesia de Cesário Verde....................91

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Anexo 21 – Ficha de trabalho – Análise do poema “De Tarde”..................................93

Anexo 22 - Ficha de trabalho – Análise do poema “O Sentimento dum Ocidental”...94

Anexo 23 – Teste de Avaliação da unidade nº5.............................................................96

Anexo 24 – Análise dos contos escritos pelos alunos : “Um pintor na China Antiga”..99

Anexo 25 – Cronograma das aulas de Latim.................................................................101

Anexo 26 - Ficha de trabalho de Latim : Fábula de Fedro............................................103

Anexo 27- Planificação de uma aula de Latim: Futuro Imperfeito...............................104

Anexo 28 - Ficha de trabalho de Latim: Futuro Imperfeito..........................................105

Anexo 29 – Guião da Visita à Oficina de Vergílio Ferreira..........................................108

Anexo 30 – Fotografias.................................................................................................110

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INTRODUÇÃO

Este relatório de estágio incide sobre a minha Prática do Ensino Supervisionada de

Português, realizada na Escola Secundária José Gomes Ferreira e a minha Prática do Ensino

Supervisionada de Latim, que ocorreu na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas.

O corpo do relatório dividir-se-á em quatro capítulos. No primeiro capítulo,

intitulado “As instituições cooperantes”, procederei à habitual descrição das instituições, na

sua vertente física e humana, com o intuito de contextualizar a minha prática letiva. No

entanto, para além desse ato descritivo, procurarei relacionar as circunstâncias que

envolveram os dois estágios com as atividades produzidas e o resultado das mesmas. No

segundo capítulo, intitulado “Prática do Ensino Supervisionada de Português”, abordarei os

vários elementos envolvidos no estágio de Português, nomeadamente a planificação e

condução dos trabalhos; a pesquisa e a conceção dos materiais didáticos utilizados; o

envolvimento e a relação pedagógica construída com a orientadora, a colega de estágio e,

essencialmente, com os alunos do 11º5; as ferramentas adquiridas durante o período de

observação de aulas e a integração na comunidade educativa, através das reuniões de

trabalho, participação em aulas do 3º ciclo e na atividade de investigação que será o objeto

de reflexão teórica no capítulo quatro. No terceiro capítulo, intitulado “Prática do Ensino

Supervisionada de Latim”, descreverei as circunstâncias particulares que envolveram o

estágio de Latim, que se distanciaram das dos estágios habituais, inferindo os aspetos

positivos desta experiência, mas também referenciado os aspetos que foram condicionados

pelas referidas circunstâncias. A componente descritiva e a componente reflexiva

requeridas para o relatório de estágio situam-se assim ao longo dos três primeiros capítulos.

No quarto capítulo, porém, desenvolverei um tópico de reflexão didática: procurarei

averiguar de que forma os manuscritos dos escritores e a crítica textual podem servir como

um instrumento didático multifacetado, isto é, como uma ferramenta para ensinar a escrita,

a cultura, a literatura (pelos problemas teóricos levantados pelos editores críticos) e a

própria evolução da língua.

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CAPÍTULO I – AS INSTITUIÇÕES COOPERANTES

I.1. Escola Secundária José Gomes Ferreira

I.1.1 - Contexto de integração na instituição

Antes do início do ano letivo 2010-2011, as alunas do mestrado em Ensino do

Português e Línguas Clássicas foram convocadas pela Professora Doutora Graciete Silva,

para uma reunião a realizar na FCSH, com o objetivo de definir a distribuição dos grupos

de trabalho da Prática de Ensino Supervisionada, pelas instituições cooperantes. Sem existir

necessidade de aplicar os critérios de desempate, as alunas chegaram facilmente a um

consenso, o que agilizou a preparação do estágio e os contactos com os orientadores das

respetivas instituições. Assim, ficou decidido que eu e a minha colega de estágio, Cátia

Ramalhinho, seríamos acolhidas pela Escola Secundária José Gomes Ferreira, instituição

com a qual a FCSH tem vindo a estabelecer protocolos de cooperação, sob a orientação

pedagógica da Professora Regina Garcia.

Do excelente elenco de instituições cooperantes disponível, as minhas preferências

recaíram sempre na ESJGF. Influenciada pela experiência da minha colega de mestrado,

Filipa Filipe, da qual recebi sempre opiniões favoráveis acerca do seu estágio, considerei

que esta instituição me ofereceria as condições necessárias para realizar um estágio do qual

colheria não apenas uma ótima experiência profissional, mas também uma frutífera

experiência pessoal, o que se viria, aliás, a comprovar. Para além disso, outros fatores

contribuiriam para esta preferência: a localização na freguesia de Benfica, zona acessível da

cidade de Lisboa; o contacto com uma população e com um contexto escolares bastante

distintos daqueles que frequentei enquanto aluna de um antigo liceu no interior do país, e,

consequentemente, a perspetiva moderna da ESJGF, pretendendo, contudo, preservar a

qualidade e o rigor, epítetos que predicam o nome da instituição e sem os quais não creio

que possa existir uma educação de qualidade.

Foi imbuída por este entusiasmo que, no dia 6 de setembro de 2010, estabeleci o

primeiro contacto com a ESJGF. Eu e a minha colega fomos acolhidas pela orientadora de

estágio, que nos apresentou a escola e nos apresentou à escola, dando-nos algumas

indicações acerca do funcionamento do estágio. Logo nesse momento de apresentação, foi

possível reconhecer vários aspetos que viriam a constituir o perfil profissional da

Professora Regina Garcia, enquanto orientadora de estágio, pautado por um acentuado rigor

e profissionalismo, aliados a uma forte sensibilidade e sabedoria, o que permitiu a

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construção de uma relação profissional e interpessoal, entre as estagiárias e a orientadora,

baseada na confiança e compreensão, incutindo assim um clima de trabalho equilibrado,

produtivo e dotado de um constante espírito de motivação.

Com efeito, através do discurso de abertura do ano letivo, proferido pelo diretor da

escola, o Professor Manuel Esperança, foi possível verificar a coesão do corpo docente da

ESJGF, nomeadamente no que se refere aos princípios enunciados no seu projeto

educativo.1 Apesar de reconhecer os professores como núcleo fundamental na sua conceção

de escola, este projeto ressalva que toda a comunidade educativa, sobretudo alunos e

encarregados de educação, também se deve envolver nesse processo.2

A partir destas primeiras impressões, foi possível confirmar algumas das minhas

expetativas em relação à ESJGF, facto que me incutiu uma forte motivação para iniciar o

estágio.

I.1.2 - Caracterização da instituição

Constituindo-se como um dos pontos estruturais previstos na elaboração de um

relatório de estágio, a caracterização da instituição cooperante deverá funcionar como uma

ferramenta útil para uma reflexão acerca do percurso da PES. Na verdade, não importa

apenas descrever os espaços escolares e os órgãos de funcionamento da escola, traçar um

perfil da população escolar, recolher os dados que se referem aos resultados escolares

atingidos, ou mencionar a posição conquistada pela instituição no ranking nacional,

concebido a partir das médias de classificação obtidas nas provas nacionais. Com efeito,

esse registo não é suficiente, sendo também necessário refletir de que forma essas marcas

identitárias se poderão articular com o funcionamento da vida escolar de todos os seus

membros, incluindo o meu percurso enquanto estagiária. Desta forma, tal como vem

proposto no Projeto Educativo (2008-2011) da ESJGF, a caracterização da instituição

dividir-se-á em duas componentes: a dimensão física e a dimensão humana. Para além das

observações feitas presencialmente, ao longo do ano de estágio nessa instituição,

1 A forte consciência educativa dos seus professores, atuando de forma coordenada, reconhece, em cada

momento, o rumo educativo por que se coresponsabiliza e cuja qualidade assegura, fazendo desta conduta a

sua principal marca identitária. (Projeto Educativo 2008-2011)

(http://www.esjgf.com/site/Documentos/Escola/2009-2010/PEDUCATIVO.pdf) 2 Tal não significa que se espere dos alunos e seus encarregados de educação um papel meramente recetivo e

passivo; pelo contrário, exige da sua parte uma atitude participativa, empenhada e responsável. (idem)

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documentei esta caracterização com o PE (2008-2011), com informações cedidas pela

orientadora de estágio e obtidas no sítio da ESJGF na internet.3

I.1.2.1 A dimensão física

A ESJGF situa-se em Benfica, freguesia de Lisboa que apresenta uma elevada

densidade populacional, facto que terá motivado a criação de uma escola secundária na

zona, levada a cabo pelo esforço da população e das entidades locais. Até à data da sua

abertura ao público, no dia 20 de novembro de 1980, a população estudantil tinha de se

distribuir por várias escolas, em pontos mais distantes da cidade. Esta atitude de

determinação e perseverança de um grupo de cidadãos na construção de uma escola pública

pode ver-se refletida na própria filosofia educativa da ESJGF.

Inicialmente designada como “Escola Secundária de Benfica”, mais tarde viria a

adotar o nome do seu patrono, o escritor português José Gomes Ferreira, pai do arquiteto

responsável pela conceção dos edifícios escolares, Raul Hestnes Ferreira, cujo trabalho

viria a ser agraciado com o prémio Valmor, em 1982. De facto, a arquitetura vanguardista

do edifício escolar distinguiu-se na época das fachadas características dos antigos liceus e

atuais escolas secundárias da cidade, cuja imponência física se evidenciava, sendo até, por

vezes, erradamente conotada com um tipo de ensino mais tradicionalista.

Atualmente, a escola é constituída por cinco blocos, pelos quais se distribuem as

salas de aula, oficinas e laboratórios, existindo ainda um pavilhão gimnodesportivo. No

bloco central da escola, Bloco C, onde se situam a Biblioteca – CRE, os serviços de gestão

e administração e vários núcleos de atividades, como a Associação de Estudantes e o Clube

Europeu, existe um amplo auditório que se constitui como um local de polivalência. As

salas de aula caracterizam-se pela disposição tradicional das mesas, confinando-se o seu

espaço ao estritamente necessário para o funcionamento da aula, facto que vai ao encontro

da conceção da aula como o núcleo da escola, apresentada no PE. No mesmo documento,

foi assumida uma das principais fragilidades da escola, a inexistência de um refeitório para

os alunos, que apenas tinham acesso a uma pequena cafetaria. Porém, esta situação foi

alterada em janeiro de 2011, através da construção de um refeitório comum às escolas

vizinhas: Agrupamento de Escolas Quinta de Marrocos e Agrupamento de Escolas Pedro de

Santarém.

3 Dados referentes ao ano letivo 2010/2001 em http://sites.esjgf.com, consultado no dia 7 de março de 2012.

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Os cinco blocos que constituem a escola, situados no cimo de uma colina, surgem

camuflados por uma extensa área arborizada, distanciando a escola da zona circundante,

permitindo que as atividades letivas decorram num local recolhido, ideal para a

concentração na aprendizagem.

I.1.2.2 A Dimensão Humana

Entende-se por dimensão humana o conjunto de todas as pessoas que constituem a

comunidade escolar da ESJGF, cujas diferentes funções convergem na ação educativa. No

topo da organização, situa-se o corpo diretivo da escola, constituído pelo diretor, Dr.

Manuel Esperança, a subdiretora, Dr.ª Maria do Sameiro Vale e respetivas adjuntas. Em

conjunto com a direção, funcionam o conselho geral e o conselho administrativo, apoiados

pelos diversos assistentes de apoio técnico e operacional, reunindo um total de 34

funcionários. Noutra vertente, situa-se o conselho pedagógico cuja atuação se propaga pelos

departamentos curriculares, grupos de disciplina, conselhos de turma e conselhos de

diretores de turma.

No ano letivo de 2010-2011, o corpo docente da ESJGF era constituído por um total

de 119 professores, subdividindo-se em várias categorias: efetivos, não efetivos e

contratados. Importa salientar que 89 desses professores são efetivos, representando cerca

de 75% do corpo docente da escola. A partir deste dado, é possível concluir que a ESJGF

apresenta uma notória estabilidade do seu corpo docente, facto que, segundo o PE, se tem

vindo a verificar praticamente desde a abertura da instituição ao público. Esta estabilidade

permite a existência de um grupo docente coeso, cujo conhecimento profundo da instituição

permite desenvolver de forma consistente os pressupostos pedagógicos, enraizados na

história educativa da ESJGF, não dispensado, no entanto, o acolhimento de novos

membros, como tem vindo a acontecer com os estagiários.

Relativamente ao universo estudantil, no ano letivo de 2010-2011, a ESJGF

apresentava um total de 1080 alunos matriculados, sendo que 383 destes alunos ocupavam

a fatia da formação geral do 3º ciclo do Ensino Básico, enquanto os restantes 697 se

encontravam distribuídos pelos cursos do Ensino Secundário: Ciências e Tecnologias, com

364 alunos, Línguas e Humanidades com 158 alunos, Ciências Socioeconómicas com 108

alunos, e Artes Visuais com 64 alunos. A partir dos dados consultados, constata-se que a

taxa de abandono escolar, após a conclusão do 3º ciclo, é irrelevante, optando a maioria dos

alunos pela frequência do Ensino Secundário na mesma escola. Com efeito, a população

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estudantil da ESJFG apresenta resultados escolares muito satisfatórios nas avaliações

internas e externas. Este êxito resulta de uma conjugação de vários fatores: em primeiro

lugar, atinge-se devido à eficácia das opções pedagógicas praticadas pela instituição; em

segundo lugar, relaciona-se com os aspetos socioeconómicos que caracterizam a classe

social média e média-alta, de onde é proveniente a maior parte dos alunos da ESJGF, que

constituem uma população estudantil bastante homogénea. Este fator não só permite um

acesso mais facilitado a recursos culturais e educativos, como também evidencia a

inexistência de problemas de indisciplina, o que proporciona as condições adequadas à

aprendizagem. Para além disso, os alunos provêm de meios familiares que podem tornar

sustentáveis projetos futuros, como a possibilidade de ingresso no Ensino Superior,

condição nem sempre verificada em outras escolas públicas, nomeadamente em ambientes

sociais mais vulneráveis, como áreas suburbanas mais problemáticas ou zonas interiores do

país mais isoladas, embora também aí existam frequentes casos de sucesso escolar. Assim,

conclui-se que a ESJGF apresenta uma clara homogeneidade da sua população estudantil,

não sendo esta caracterizada por uma diversidade multicultural ou multilinguística, sendo a

maior parte dos alunos de nacionalidade portuguesa, como aliás se pode verificar pela

inexistência da disciplina de Português Língua Não-Materna no currículo da escola.

Para além da oferta educativa, a ESJGF apresenta ainda um vasto leque de

atividades extracurriculares, dinamizadas pelos diversos núcleos de atividades, tais como, o

Jornal Voz Ativa, o Clube de Fotografia, o Clube Europeu, o clube do Comércio Justo, a

Associação de Estudantes e o Desporto Escolar.

Quanto aos serviços primários em funcionamento na ESJGF incluem-se a secretaria,

a papelaria, a reprografia, o bar, a cantina (partilhada com outras escolas), a Biblioteca –

CRE, que se destaca pela sua dimensão multifacetada tanto na extensão significativa do seu

espólio documental, como na multiplicidade de recursos disponíveis. A ESJGF dispõe

ainda de outros serviços, como a ação social escolar, o serviço de psicologia e orientação e

o núcleo de apoio aos alunos com necessidades educativas especiais. Esta instituição

destaca-se ainda pela sua abertura ao exterior, pelo desenvolvimento de projetos de

intercâmbio cultural e pela realização de conferências e palestras.

Por fim, importa referir o papel dos encarregados de educação, como intervenientes

na vida da comunidade escolar. Embora o interesse manifestado pela vida escolar dos seus

educandos seja bastante evidente, no PE (2008-2011) pode ler-se que existe ainda um

grande caminho a percorrer no que diz respeito à mobilização dos encarregados de

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educação, que revelam uma atitude de tranquilidade e de acomodação, talvez por existir a

perceção de que a escola não apresenta grandes problemas de funcionamento.4

Considero ainda pertinente referir a relevância da conceção do PE, o qual define,

coerentemente, as metas, apresentando estratégias consistentes para a sua concretização,

responsabilizando todos os membros da comunidade escolar pela melhoria da qualidade do

ensino e, sobretudo, oferecendo aos seus alunos uma educação baseada em valores que

poderão aplicar enquanto cidadãos de uma sociedade responsável e autorregulada.

I.2 - Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa

I.2.1 - Contexto de realização da Prática de Ensino Supervisionada de Latim

Durante a reunião anteriormente referida, a Professora Graciete Silva informou as

alunas de que, ao contrário do previsto para a PES de Português, existia a possibilidade de a

FCSH não conseguir estabelecer protocolos com instituições de ensino secundário para a

realização da PES de Latim. Por um lado, esta impossibilidade não causou muita surpresa

às alunas presentes, uma vez que, no Seminário de Didática das Línguas Clássicas, o

declínio do ensino do Latim nas escolas portuguesas, tendência que se avolumou nos

últimos anos, tinha já sido tema de reflexão. Por outro lado, o ciclo de estudos frequentado

conferir-nos-ia uma habilitação profissional para a docência das línguas clássicas no ensino

secundário, facto que provocou nas mestrandas alguma apreensão e preocupação no

momento em que receberam esta notícia, uma vez que a não realização da PES em Latim

implicaria uma formação algo deficitária, mesmo que não fosse previsível que a lecionação

desta disciplina ocorresse num futuro próximo. Desta forma, eu e a minha colega, Cátia

Ramalhinho, resolvemos, em conjunto com o Professor Manuel Rodrigues e com a

professora Graciete Silva, pesquisar e contactar, através dos meios possíveis, as escolas

que, no distrito de Lisboa, ofereciam a disciplina de Latim no seu currículo escolar.

Todavia, esse esforço não alcançou nenhum resultado, sendo que a única escola secundária

do ensino público da cidade de Lisboa que manteria em funcionamento a disciplina, Escola

Secundária de Camões, já estabelecera um protocolo com a FLUL.5

4 Projeto Educativo 2008-2011 da Escola Secundária José Gomes Ferreira, disponível para consulta no sítio

da internet: http://www.esjgf.com/site/Documentos/Escola/2009-2010/PEDUCATIVO.pdf 5 A título de apontamento, importa referir que no ano letivo de 2011-2012, os professores da FCSH

conseguiram estabelecer um protocolo com esta escola, que acolheu não só os alunos estagiários da Faculdade

de Letras da UL, como também os da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da UNL.

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Na reunião seguinte, os orientadores da FCSH, propuseram as várias alternativas

encontradas para tentar compensar a impossibilidade de realizar a PES de Latim nas

condições previstas pelo regulamento interno da FCSH e pelo decreto- lei nº43/2007, que

regulamenta o funcionamento dos ciclos de estudos conducentes à habilitação profissional

para a docência. Desta forma, foram criados três núcleos de estágio: 1) o primeiro foi

formado pelas três mestrandas que realizariam o seu estágio de Português na Escola

Secundária Pedro Nunes, onde a disciplina tinha vindo a ser oferecida em anos letivos

anteriores; 2) o segundo foi formado pelas quatro mestrandas que seriam orientadas pela

Professora Doutora Inês de Ornellas e Castro, nas turmas de Latim da licenciatura de

regime diurno em Estudos Portugueses na FCSH; 3) o terceiro foi formado por mim e pela

minha colega, Lisete Silva, sob a orientação do Professor Doutor André Simões, nas turmas

de Latim da mesma licenciatura em regime pós-laboral. Apesar de oferecerem diferentes

condições de funcionamento, as alternativas propostas pareceram mais benéficas do que um

possível cenário de simulação de aulas, através do qual não poderia acontecer uma genuína

relação pedagógica, dado que estaria em falta o elemento essencial para que esta fosse

possível – os alunos. Com efeito, ensinar Latim, no âmbito de um curso livre, numa escola

secundária, requer disposições e linguagens diferentes daquelas exigidas para a lecionação

da disciplina a alunos do ensino superior. Apesar de os conteúdos e os objetivos serem

comuns a ambos os níveis de ensino – a aprendizagem da língua latina num nível elementar

- o contexto do processo de ensino e aprendizagem apresenta diferentes metodologias e

especificidades, com as quais não estávamos familiarizadas. Efetivamente, embora

estivesse satisfeita com esta alternativa proposta pelos orientadores da FCSH, foi com

alguma inquietação que dei início à minha PES de Latim.

I.2.2 – Caracterização da instituição

A FCSH é uma das nove unidades orgânicas que constituem a Universidade Nova

de Lisboa, instituição do ensino superior público português, tendo sido fundada em 1978,

privilegiando uma interdisciplinaridade entre as Ciências Sociais e as Ciências Humanas.

Atualmente, a instituição apresenta, nas palavras do seu diretor, o Professor Doutor João

Sàágua, três linhas de atuação: a ligação entre ensino e investigação, a preocupação

constante com a internacionalização; o esforço continuado com vista à inserção dos nossos

estudantes na vida ativa. 6

6 Disponível em http://www.fcsh.unl.pt/faculdade/mensagem-do-director

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9

A FCSH localiza-se numa zona central de Lisboa, na Avenida de Berna. É

constituída atualmente por cinco edifícios: os edifícios B1 e B2, Torre A, onde se localizam

secretariados de departamentos e salas de aula, equipadas com vários equipamentos

tecnológicos; a Torre B, onde se localizam salas de aula, anfiteatros, secretariados,

auditórios, uma cantina, a Associação de Estudantes, uma reprografia, a Biblioteca Mário

Sottomayor Cardia, os diversos gabinetes dos órgãos de gestão e os serviços

administrativos e o edifício i&D (Investigação e Doutoramento), onde funcionam os cursos

de doutoramento e as 25 unidades de investigação da FCSH.

Em 2011, a FCSH apresentava um total de 306 professores, sendo que 98% deste

corpo docente era constituído por professores doutorados. Quanto ao seu corpo discente, a

FCSH era constituída por 5309 alunos, que se repartiam pelos 14 cursos de licenciatura, 47

cursos de mestrado e 21 cursos de doutoramento oferecidos pelos 13 departamentos que

constituem a instituição. Para além desta oferta educativa, a FCSH é também constituída

por uma Escola de Verão e pelo instituto de línguas, ILNOVA.

CAPÍTULO II: PRÁTICA DO ENSINO SUPERVISIONADA DE PORTUGUÊS

II.1 – Planificação dos trabalhos a desenvolver

Numa das primeiras reuniões, a Professora Regina Garcia informou-nos de que

nesse ano letivo estaria responsável apenas por uma turma do 11º ano, sendo as restantes

turmas do 12º ano. Assim, ao contrário do que tinha sucedido com os dois estagiários que

estiveram na ESJGF no ano letivo anterior, onde cada um desenvolveu o seu estágio numa

turma diferente de 11º ano, no ano letivo corrente, eu e a minha colega desenvolveríamos o

nosso trabalho, em conjunto, com a mesma turma, o 11º5. Esta opção metodológica

justificava-se por vários motivos. Em primeiro lugar, no final do 12º ano os alunos estão

sujeitos à realização das provas de exame nacional que, no caso da população discente da

ESJGF, representam um fator decisivo no acesso ao ensino superior. Desta forma, um

trabalho experimental como é o do estagiário, embora sujeito a uma prática de ensino

supervisionada, poderia comprometer os objetivos estipulados pelo departamento para o 12º

ano. Existindo no 12º ano a necessidade de uma preparação mais intensiva e direcionada

dos conteúdos sujeitos a avaliação no exame nacional, não haveria muito espaço, ao longo

do ano letivo, para uma prática reflexiva do ensino, que contempla o erro e a sua superação,

através de reformulações das metodologias e das práticas de ensino adotadas. Por outro

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10

lado, como continua a acontecer, ao longo do processo de aprendizagem, a avaliação

sumativa continua a ser mais valorizada por alguns alunos e encarregados de educação do

que o processo contínuo da avaliação formativa, o que tende a sobrevalorizar a

aprendizagem no final de ciclo, como é alertado por Maria Roldão.7 Assim, esta perspetiva

que encara como decisivo o momento de avaliação sumativa poderia não compreender a

condução das aulas do 12º ano por alunas estagiárias, ainda que as suas competências

científicas jamais tivessem sido postas em causa.

Decidido, então, o nível de ensino em que decorreria o estágio, procedeu-se à

planificação. A planificação a longo prazo foi elaborada pelos professores do grupo

Português, contemplando a calendarização do ano letivo, definindo o número de aulas

previstas, a organização das sequências didáticas por período, a definição de conteúdos, em

articulação com as competências previstas para a disciplina e a realização de atividades

como visitas de estudo, no âmbito dos conteúdos da disciplina. Após a reunião de grupo, o

núcleo de estágio procedeu à distribuição e calendarização das unidades didáticas: a

Professora Regina Garcia iniciaria o ano letivo com o estudo do discurso político e

argumentativo e o Sermão de Santo António aos Peixes, do Padre António Vieira, para que

houvesse um período de observação de aulas e de integração das estagiárias; no 2º período,

a unidade didática do texto dramático Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett, seria

planificada e executada pelas estagiárias e, uma vez que o estágio terminaria no dia 30 de

Maio de 2011, no 3º período, a Professora Regina retomaria a condução das aulas com a

leitura do texto narrativo Os Maias, de Eça de Queirós, e do texto lírico de Cesário Verde.

Esta planificação sofreu, contudo, uma alteração. Após eu e a minha colega termos

concluído, no 2º período, a unidade didática prevista, a Professora Regina propôs-nos que

continuássemos a nossa experiência, ficando nós também encarregues de planificar e

executar as aulas referentes ao texto lírico de Cesário Verde, antecipando-as, assim, ao

estudo do texto narrativo Os Maias, que decorreria no 3º período. Esta proposta foi aceite

por ambas com entusiasmo, pois teríamos a oportunidade de prolongar a nossa experiência

didática, experimentando diferentes conteúdos.

II.2 - Caracterização da turma 11º 5

Antes de avançar com a descrição da planificação e condução de aulas, é necessário

ter em conta a caracterização da turma com a qual se vai trabalhar. Na verdade, as

7 A «avaliação» (o teste, a ficha, o que quer que seja) vive por si nas nossas escolas, comanda largamente os

seus ritmos, e constitui uma entidade respeitada na cultura escolar (Roldão, 2005:45).

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11

características do público-alvo condicionam o ato de planificar.8 Embora os objetivos

estipulados pela tutela sejam uniformes para todas as escolas, no que diz respeito aos

conteúdos programáticos e às competências a desenvolver, cabe aos professores, agentes

educativos no terreno, desenvolver as estratégias mais adequadas a cada turma. Após uma

avaliação de diagnóstico inicial, o professor detetará os pontos que apresentam mais

lacunas, de forma a preparar tarefas concretas de treino para as colmatar, ao mesmo tempo

que insistirá, através de atividades de reforço positivo, nos pontos em que os alunos

manifestam um melhor domínio cognitivo. Assim se conclui que, numa planificação, não

basta adicionar colunas à lista dos objetivos e competências, dado que o modus operandi

varia consoante as necessidades de cada turma. Mesmo que as turmas se situem no mesmo

nível de ensino, existirá sempre um fator que as distinguirá das restantes, pois, cada aluno,

atuando com o conjunto da turma e a turma em conjunto com cada aluno, criará uma

identidade única que determinará diferentes relações pedagógicas.

A turma onde desenvolvi o meu trabalho ao longo do ano letivo, 11º5, pertencia ao

curso científico-humanístico de Artes Visuais do ensino secundário. Desde logo, foi

possível fazer uma distinção entre esta turma e as restantes turmas da ESJGF, uma vez que

os resultados apresentados se situavam um pouco abaixo da média da escola. No início do

ano letivo, a turma era constituída por 23 alunos, dos quais 22 frequentavam a disciplina de

Português, dividindo-se em 11 rapazes e 11 raparigas, nascidos entre os anos de 1992 e de

1994, sendo que 8 destes alunos já tinham reprovado nos anos letivos anteriores, pelo

menos, uma vez. A maioria dos alunos da turma era de nacionalidade portuguesa, à exceção

de dois alunos: um natural da China e outro da Moldávia. Embora ambos tivessem

nacionalidade estrangeira, o seu conhecimento do Português era diferente: para a aluna

chinesa, o Português do Brasil constituía-se como a sua língua segunda, em convivência

com a sua língua materna, o mandarim, e, para o aluno moldavo, o Português apresentava-

se como uma língua verdadeiramente estrangeira, fator que influenciou o seu desempenho

ao longo do ano letivo. A partir dos registos biográficos arquivados na secretaria, foi

possível recolher alguns dados como a zona de residência dos alunos, que variava entre a

freguesia de Benfica e outras freguesias da cidade, bem como localidades fora do concelho

8 Creio que uma das qualidades principais de um bom professor consiste em ter aquilo a que Aristóteles

chama de φρόνησις (traduzida por “sensatez” pelo Professor António de Castro Caeiro) na Ética a Nicómaco. Esta virtude teórica define-se pela boa deliberação em situações particulares, onde o conhecimento meramente

teórico não contribui para produzir uma ação correta, pois é a perceção das circunstâncias particulares que de

cada vez se constituem que o professor deverá ter em conta para agir corretamente: (Aristóteles; 2009:

1140b1)

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12

de Lisboa; as profissões e a situação económica dos pais e encarregados de educação e

também os resultados escolares dos anos anteriores, os quais decidi não registar para evitar

que os mesmos não influenciassem subjetivamente a minha opinião acerca dos alunos e

para que não interferissem também, ainda que de forma inconsciente, no processo de

avaliação, o qual pretendi que dependesse ao máximo das evidências cognitivas observadas

nas atitudes, participações orais e escritas, fizessem elas parte de um momento formal ou

informal de avaliação. Na verdade, como lembra Postic, as avaliações anteriores podem

influenciar as avaliações recentes.9

Relativamente aos resultados obtidos ao longo do ano letivo, a turma apresentou

uma heterogeneidade percetível, sendo que a média das suas avaliações foi de 11, 46

valores, situando-se a nota mais elevada no nível 15 e a mais inferior no nível 9, registando

a avaliação da turma um movimento de ascensão: 10,63 no final do primeiro período, 11,75

valores no final do segundo período e 12 valores no final do terceiro período.

Em relação à sua caracterização psicossocial, a turma apresentou-se bastante

homogénea, na medida em que não se registaram situações particulares de indisciplina ou

outros casos dignos de registo. No entanto, a nível individual, no final de um ano letivo, e

estando apenas a trabalhar com uma turma, já era possível conhecer alguns dos principais

traços de personalidade de cada aluno. Considero que a relação pedagógica estabelecida

com a turma foi um dos principais fatores que influenciaram o resultado positivo da minha

PES. Na verdade, os alunos sempre apresentaram uma atitude colaborativa comigo e com a

minha colega de estágio. Embora conscientes da nossa condição de professoras (e alunas)

estagiárias, foi possível construir uma harmoniosa relação pedagógica entre ambas as

partes, tendo os alunos distinguido claramente a posição entre professor e aluno, ao mesmo

tempo que nunca contestaram nenhuma prática diferente daquelas apresentadas pela

professora da disciplina, adotando sempre uma atitude de cooperação e entusiasmo perante

novos métodos e abordagens. Pode dizer-se que uma turma que tem a capacidade de

acolher e fazer um esforço por compreender, numa só disciplina, três linguagens distintas,

ainda que convergentes, apresenta aquilo que o professor mais pode desejar: o

entendimento, a compreensão e o diálogo aberto, atitudes indispensáveis à aprendizagem e

ao caráter humanista da tarefa de educar. Contudo, não é suficiente referir a ausência de

indisciplina e congratular-me com esse facto, mas sublinhar que me considerei privilegiada

9 O conhecimento que o avaliador tem das performances escolares anteriores dos alunos leva-o a procurar

uma coerência entre as avaliações sucessivas, o que, por vezes, é um obstáculo à tomada de consciência das

efetivas variações do aluno. (Postic; 2008:115)

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por ter trabalhado com alunos tão criativos e questionadores como estes. Assumi este

privilégio como um novo desafio. Ao invés de me cingir aos conteúdos e objetivos

estabelecidos, crendo numa visão sedutora de “tarefa cumprida”, estabeleci como

compromisso incrementar novas metodologias que superassem a aprendizagem formal,

tentando que estes alunos, uma vez que reuniam as condições necessárias, experimentassem

novas metas e caminhos e desenvolvessem o seu interesse e conhecimento.

II.3 – O período de observação para uma prática reflexiva

Concordando com a perspetiva que concebe um bom professor como aquele que

adquiriu uma sólida competência científica, poderei acrescentar que, no início da sua

prática de ensino, esta base é condição necessária, mas não suficiente para a sua atuação.

De facto, o ato de ensinar pressupõe uma articulação entre essa base científica e as diversas

opções pedagógicas disponíveis, cujo resultado é a didática daquilo que ensina. No início

da sua prática, a inexperiência do estagiário, neste campo prático, está confinada a uma

visão pessoal e subjetiva do ato de ensinar, construída a partir da sua experiência enquanto

aluno que elegeu os seus modelos a partir dos professores que teve ao longo da sua vida

académica. No momento em que é convidado a observar, esta inexperiência pedagógica

poderá conduzir o estagiário a prolongar essa tendência: eleger o professor observado como

o modelo a seguir, uma vez que o professor-orientador é um exemplo que garante, à

partida, o sucesso. Portanto, a tarefa de observar poderá constituir-se, inicialmente, como a

tarefa de imitar. Decerto que este não é o objetivo da observação de aulas. Se, no início, a

observação, afetada pela insegurança, se foca demasiado no professor-orientador, ao longo

da sua tarefa, o estagiário reconhece as múltiplas ferramentas que esta lhe pode fornecer.

Sobre a importância da observação de aulas por parte de um professor estagiário,

Wajnryb diz: this stage (…) is akin to the «silent phase» of a beginning language learner

who listens, looks, observes, considers, analyses, reflects, but, significantly, is not required

to produce. (Wajnryb:1992:7). Nesta descrição, parece haver uma certa discordância entre a

enumeração de processos físicos e mentais elaborados pelo professor estagiário, durante a

fase de observação de aulas, e a conclusão final, segundo a qual este não é obrigado a

produzir. No entanto, a contradição desaparecerá se for tido em conta que Wajnryb se

refere apenas à produção verbal por parte do estagiário. De facto, a fase de observação pode

ser descrita como uma fase muito produtiva, uma vez que ela será o sustentáculo da futura

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fase ativa, aquela em que o professor estagiário toma o comando da aula, exigindo-se que

este adquira uma postura de profissional reflexivo. Quando observa, o estagiário fica mais

apto para refletir, uma vez que as suas energias não estão canalizadas para a sua

performance de dinamizador da aula, circunstância em que este não é o único sujeito de

atuação, se for concedido espaço de atuação também aos alunos, cujas intervenções estão

revestidas da imprevisibilidade para a qual o professor tem de estar preparado (científica e

pedagogicamente).

O momento de observação inicial, que compreendeu o 1º período de aulas,

lecionadas pela minha orientadora, permitiu que me dotasse de várias competências. Uma

vez que aquela seria a turma com a qual desenvolveria o meu estágio, tive, inicialmente,

especial atenção a aspetos que me permitissem agir em contexto. Assim, foquei-me nas

rotinas funcionais estabelecidas e na sua influência no ritmo do fluxo de aula, encarada

como um todo. No momento inicial, a Professora Regina criava uma certa atmosfera que

permitia aos alunos concentrarem-se na aula. As rotinas de início e final de aula permitem

ao aluno instalar-se e concentrar-se nos noventa minutos seguintes, através de rotinas tão

simples como a chamada, o registo do sumário, o cumprimento de certas regras que

equilibram a postura dos alunos na sala de aula e o estabelecimento de um ponto de ligação

com a aula anterior, por exemplo, através da correção do trabalho de casa de que se partiria

para outros pontos. Na minha opinião, a relação pedagógica da Professora Regina pauta-se

pelo equilíbrio entre duas forças que aparentemente se podem anular: a regra e a liberdade.

As aulas do 11º5 não eram caracterizadas por intervenções dispersas ou barulhentas dos

alunos, verificáveis numa atmosfera empolgada; no entanto, tal não significava que esta

aula fosse silenciosa, no sentido em que silêncio significa passividade. O aluno era incitado

a intervir quando quisesse, desde que o fizesse de uma forma adequada. Para esta

moderação, contribuiu a organização fluente e clara do discurso da professora, pautada por

um ritmo que permitia o diálogo e a partilha. Se, por um lado, este clima de diálogo quebra

os ritmos marcados e inflexíveis, sendo reservado tempo para a voz do aluno, o que, por

vezes, trai as planificações rigorosas feitas pelo professor, permite, por outro lado, uma

aprendizagem efetiva e ativa por parte dos alunos, que não são reduzidos a um estatuto de

recetáculos de matérias e conteúdos. A inexistência de ocorrências provocadas por motivos

disciplinares é o retrato deste clima harmonioso. Foi ainda nesta fase inicial que me foi

possível munir-me de uma das ferramentas fundamentais do professor: o conhecimento do

sujeito com quem atua: a turma. Do fundo da sala de aula, são visíveis pormenores que nos

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permitem construir uma visão mais objetiva, da qual nem sempre o professor dispõe, na sua

habitual localização, em que tem de se focar em múltiplas situações em simultâneo. Neste

sentido, verifiquei que a presença de um aluno numa aula não se deve apenas à sua

intervenção oral, mas também à sua linguagem corporal, sendo possível verificar os

momentos ou as tarefas em que um aluno fica mais entusiasmado ou, pelo contrário, em

que se verifica algum constrangimento ou timidez. A partir destas observações, fui

construindo uma visão do aluno enquanto indivíduo, para além da visão global da turma.

Assim, quando dei as minhas aulas, tentei direcionar as minhas questões e desafios, tendo

em conta as características individuais de cada aluno, com as suas dificuldades e com os

seus pontos fortes, usados como o catalisador da motivação.

Se no início da fase de observação me foquei em aspetos mais funcionais,

rapidamente fui desenvolvendo reflexões metodológicas e didáticas. Uma das questões que

aprendi a ter em conta foi a diversidade de recursos que pode estar associada à aula de

Português, através da exploração estética da imagem, do som e da palavra, opção que a

Professora Regina implementou no estudo dos textos literários. Neste ponto, quero destacar

a importância que a adoção do manual pode ter tido para contribuir para esta exploração de

recursos. O manual adotado pela escola apresenta o título simbólico de Antologia, conceito

cujo significado etimológico Vítor Aguiar e Silva lembra na sua defesa da textualidade

canónica.10

Assim, o manual tem como principal função ser o suporte textual literário,

contrariando a tendência quase mercantil que pretende que o manual substitua o professor,

na medida em que é estruturado de uma forma completamente diretiva, através de questões

de interpretação fechadas, exercícios de escrita que tenham de concluir as ideias já

concluídas pela própria formulação do exercício, informação exaustiva dos aspetos

históricos, sociais e políticos da época, com referências culturais confinadas à arte nacional

e ilustrações abundantes e tenebrosas dos textos literários. Pelo contrário, este manual

apresenta a simplicidade gráfica dos conteúdos que um bom manual de literatura deve ter –

os textos - abrindo caminho a uma leitura e interpretações construídas pelo professor e

pelos alunos. É a partir dos textos literários que se estuda a época, a língua e a cultura e não

através do percurso inverso, em que o texto literário surge como um adorno das épocas

culturais ou como ilustração da evolução da língua, considerado como o património

marmóreo que vigora ainda nos Programas de Português, permanecendo intocável e dotado

10 É urgente recuperar para os livros escolares de Português os significados originários, tantas vezes

esquecidos e desfigurados, das palavras «antologia» e «florilégio»: colheita e coleção de flores, conjunto dos

mais belos, gráceis e esplendorosos textos. (Aguiar e Silva; 1998-1999: 25)

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de um caráter contemplativo. O predomínio desta visão pode ser verificado através da ideia

comum de que os alunos apresentam dificuldade e desinteresse em ler os textos,

recorrendo-se, assim, da bibliografia passiva sobre o mesmo, como alerta Carlos Ceia.11

Felizmente, nem todos os estudantes de Português têm sido formados segundo este

método. Na verdade, como se verificou com as aulas da Professora Regina, o texto é o

ponto de partida para o próprio texto, para o conteúdo estético, cultural e ideológico da

literatura e para a forma estilística, evolutiva, normativa e descritiva da Língua Portuguesa.

A propósito do estudo do Sermão de Santo António aos Peixes, a Professora Regina

demonstrou a importância da palavra enquanto instrumento persuasivo e não exclusivo de

uma época cultural fechada. Não se limitando a ensinar o Sermão como um mero exemplo

da estrutura do texto argumentativo, que os alunos tantas vezes são convidados a praticar

com temas atuais, mas, por vezes, demasiado vagos para haver espaço para uma

argumentação genuína, a Professora Regina convidou os alunos a estabelecerem algumas

relações comparativas. Uma delas deu-se através da análise do discurso de Barack Obama

sobre a educação, através do qual os alunos deduziram a estrutura do texto argumentativo; a

outra deu-se através da visita de estudo à Assembleia da República, em que os alunos

tinham como tarefa identificar os argumentos e os métodos usados na contra-argumentação,

no debate entre os deputados. Os alunos, curiosamente, não só identificaram os pontos

fulcrais, como se surpreenderam com a inabilidade verificada em algumas situações, em

que o mau uso da palavra traiu a contra-argumentação, evidenciando uma insuficiência

retórica e discursiva. Para explorar esta faceta da linguagem, a Professora Regina organizou

ainda um debate em que os alunos, expostos à filmagem desta atividade, levaram a cabo um

exercício de autoanálise, quanto ao volume da voz, à dicção, à postura e aos gestos, isto é, a

todas os efeitos que suportam o texto que tem como objetivo ser ouvido antes de ser lido.

Estes exercícios permitiram analisar o texto literário a vários níveis, contrariando a sua

condição essencialista e o purismo que, por vezes, lhe é atribuído, tornando-o num

organismo vivo da atividade humana, libertando-o da sua época, fechada na bibliografia

passiva e devolvendo-o ao diálogo permanente com a posteridade. Podemos afirmar que

este é o objetivo e o proveito pedagógico que se pode retirar do texto literário.

A observação das aulas da minha colega de estágio envolveu uma dinâmica distinta

das verificadas pela observação das aulas da Professora Regina e da observação habitual

11 O estudante de Português tem sido formado com o discurso parafrástico, quando devia ter contacto direto

com o próprio texto parafraseado (Ceia; 2002: 58).

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feita pelos colegas de estágio. Em primeiro lugar, constituiu-se como um trabalho de grupo.

Como já foi referido, habitualmente é atribuída uma turma diferente a cada estagiário,

confinando-se os outros colegas de estágio a meras tarefas de observação e comentário.

Porém, não foram estas as circunstâncias que se verificaram na nossa situação, uma vez que

ambas desenvolvemos o estágio com a mesma turma, sendo-nos atribuída a tarefa de

lecionar, em conjunto, as unidades didáticas do texto dramático e do texto lírico. Na minha

opinião, estas circunstâncias colocaram-nos um desafio e um nível de exigência mais

profundos, na medida em que o estágio deixou de ser um ato individual para ser um ato

partilhado. Assim, as tarefas que habitualmente são feitas individualmente pelo estagiário,

teriam de ser concebidas por ambas, o que nos exigiu trabalhar a uma só voz, repensando as

nossas dúvidas e certezas e refletindo sobre pontos de vista e crenças pessoais,

transformando as dissonâncias em consonâncias. Este esforço cooperativo revelou-se

extremamente enriquecedor, tendo sido mesmo um dos principais fatores do sucesso do

nosso estágio. Se, por vezes, no âmbito individual, existe uma certa tendência para a

competição, no nosso caso, se tal hipótese se verificasse, o nosso trabalho teria saído

prejudicado. Este trabalho conjunto não permitiu tais dispersões. A tarefa de planificação

implicou uma divisão das partes textuais a analisar, os atos e as cenas de Frei Luís de

Sousa, e os poemas de Cesário Verde. Desta forma, a planificação deixou de ser um ato

meramente formal, passando a ser um exercício de reformulação e reflexão constante.

Ambas tivemos de ter a audácia de manter um fio condutor nas nossas aulas, através das

ligações aos conteúdos que uma e outra tinham lecionado, tendo em conta a não repetição

dos mesmos. Simultaneamente, foi possível a cada uma de nós fazer as suas próprias

pesquisas, imprimindo um pouco da nossa leitura interpretativa, o que, no entanto, não

provocou incoerências ou divergências, conclusão que tiro a partir da reação dos alunos,

que acolheram e trabalharam igualmente com cada uma de nós, não tendo em algum

momento manifestado qualquer preferência. Este exercício resultou numa surpreendente e

enriquecedora leitura do ato de ensinar – a relação e a aprendizagem com o outro, seja o

outro o colega ou o aluno. Esta disposição colaborativa e cooperativa foi, na minha opinião,

a chave para o sucesso de ambas, na medida em que um trabalho em equipa permite uma

visão crítica do outro, algo que nem sempre se verifica na autoanálise marcada, por vezes,

pelo egocentrismo. Desta forma, no nosso caso, o estágio foi um período em que as

satisfações pessoais foram superadas por um objetivo comum: o êxito da tarefa educativa.

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II.4 – Prática do Ensino Supervisionada de Português

II.4.1. – Aulas de extensão curricular: PORTEC

Durante 1º período, para além do seu horário letivo, a turma 11º5 dispunha ainda de

uma aula semanal de Português, com a duração de 45 minutos. Uma vez que no ano letivo

anterior, a professora que acompanhava a turma não pôde, por motivos de saúde, concluir

as aulas previstas na planificação anual, esta turma ficou com cerca de 15 aulas de 90

minutos em atraso. Assim, estas aulas de extensão curricular tiveram como principal

objetivo recuperar, da melhor forma possível, a aprendizagem dos conteúdos relativos ao

ano letivo anterior. Embora as aulas apresentassem um caráter de frequência não

obrigatória, os alunos foram assíduos e os conteúdos lecionados foram alvos de avaliação

nos testes de avaliação.

A planificação e execução destas aulas foram confiadas pela Professora Regina a

nós, estagiárias, iniciando-se assim a nossa experiência de Prática do Ensino

Supervisionada. O nosso primeiro objetivo foi fazer um levantamento dos conteúdos não

lecionados. Como não seria possível abordá-los na sua totalidade, a não ser que o

fizéssemos de uma forma muito superficial, procedemos a uma seleção daqueles conteúdos

cuja aprendizagem seria mobilizada e articulada com os conteúdos lecionados durante o 11º

ano, incindindo, sobretudo, em tópicos gramaticais. Para a preparação das aulas, utilizei

várias gramáticas e compêndios12

. Para a execução das aulas, elaborei fichas de trabalho,

com o auxílio dos materiais consultados e recorri a apresentações em PowerPoint, para

apresentar sínteses informativas e exercícios. Estas aulas funcionaram como uma espécie de

oficina da língua, abordando a norma e variação linguística, fonologia, semântica lexical,

pragmática e linguística textual.

Durante os seminários de Didática da Língua e Literatura, que acompanhei em

simultâneo com a minha atividade na escola, fui convidada a refletir sobre a recente

polémica instalada, resultante da sobrevalorização dos conteúdos linguísticos em

detrimento dos conteúdos literários, nos programas e nas aulas de Português. Vários autores

defendem que existe uma inseparabilidade entre ensino da língua e ensino da literatura.

Esta quezília não é exclusiva do panorama do ensino básico e secundário e da

implementação dos novos Programas de Português, já que deriva da antiga oposição entre

12 Entre as quais destaco as seguintes: Gramática Prática de Português – Da Comunicação à Expressão, da

autoria de M. Olga Azeredo et al., Gramática de Português – 3º ciclo do Ensino Básico e Ensino Secundário,

da autoria de V. Moreira e H. Pimenta e Gramática da Língua Portuguesa de Maria Helena Mateus, Inês

Duarte e Isabel Hub Faria.

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Filologia, Retórica e Literatura, que tem marcado a discussão universitária ao longo dos

seus séculos de existência.13

Embora exista uma tradição que insista em separar o professor

do ensino básico e secundário do investigador universitário, como denuncia Ceia14

, um

professor deverá investigar para que possa ensinar com qualidade. Foi neste sentido que

tentei conduzir a minha prática, articulando-a com as reflexões teóricas dos seminários.

Contudo, não foi fácil chegar a este consenso entre ensino da língua e literatura, já que, na

minha opinião, a nova terminologia linguística apresenta uma natureza tão prolixa, num

sistema que parece fechar-se sobre si mesmo, que, num primeiro momento, a urgência foi

relacioná-la com a terminologia anterior antes de a relacionar com o texto. A própria

definição de literatura parece ser facilmente encontrada nas gramáticas atuais, ao lado das

outras tipologias textuais, distinguindo-se destas apenas pela sua intenção estética e pelo

facto de o problema da verdade da mensagem ocupar um lugar secundário, utilizando uma

linguagem conotativa (Azeredo et al.; 2010:391). Perante isto, como enfrentar este

problema, já que a própria literatura é apenas um pequeno ramo da família linguística? Na

medida em que parece ser um exemplo de um registo de língua, parece ser possível que um

excerto de Eça de Queirós tenha a mesma natureza que uma frase emitida num contexto

familiar ou na gíria futebolística. No entanto, um professor reflexivo deve conseguir

libertar-se desta tendência de reduzir de forma tão simplista a literatura a uma entrada de

um compêndio, ao invés de se “tornar escravo” de programas e ideologias, atitude, que, na

minha opinião, alguns profissionais adotam para se descartarem do esforço criativo e crítico

que o ensino do Português implica. Por isso, julgo que os manuais, programas e outros

diplomas oficiais são objetos interpretáveis, e é com esse intuito que são concebidos; ou

seja, para serem lidos criticamente pelos profissionais que os estudam, em vez de serem

lidos como um manual de instruções. Não é essa a intenção de quem os escreve, mas parece

ser essa a intenção de quem os lê. Pelo lado oposto, parece existir por parte de outros

profissionais uma atitude que hostiliza as aprendizagens linguísticas, como forma de defesa

do ensino da Literatura, fazendo-se acompanhar de uma visão apocalíptica que considera o

“complemento oblíquo” como uma maleita que poderá destronar o interesse do aluno pela

disciplina de Português. Ora, o professor deverá tentar um equilíbrio entre estes dois

13 Esta reflexão acerca do curriculum universitário está a ser levada a cabo por investigadores do Laboratório

de Estudos Avançados de Literatura da FCSH, num projeto que pretende redesenhar o panorama dos estudos

literários na universidade. 14 O Professor de Português, porque leciona, “não tem disponibilidade” para se dedicar à pesquisa. Daí que

caiba ao investigador cumprir esta função de recolher, tratar e divulgar a informação do sistema escolar (...)

Talvez seja esta a diferença entre um investigador, um profissional de literatura e o professor de literatura.

Mas não há maior equívoco (Ceia; 2002:19)

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pontos, para apresentar de forma natural estes conteúdos aos alunos, não como se a língua e

a literatura fossem rivais, mas como algo que funciona reciprocamente.

Foi neste sentido que tentei conduzir as aulas de PORTEC, concebidas como

“oficinas de língua”. No entanto, na minha primeira aula, dedicada ao estudo da prosódia,

tive algumas dificuldades em libertar-me dessa tendência teoricista do ensino da língua,

ensinando meras definições, ilustrando-as com exemplos (Cf. Anexos 1 e 2). Contudo, no

decurso da própria aula, percebi que o movimento inverso poderia resultar numa

aprendizagem mais eficaz. Assim, a partir do enunciado “Vai às aulas.”, convidei os alunos

a criarem enunciados com significados diferentes, empregando apenas as características

prosódicas da língua. Assim, foi possível conduzir os alunos a uma reflexão

metalinguística, levando-os a reconhecer a importância da entoação, ferramenta que

utilizamos de forma quase inconsciente. Nas três aulas seguintes, procurei dar continuidade

a esta metodologia, ou seja, através da resolução de fichas de trabalho, tentei que os alunos

chegassem a conclusões teóricas, numa prática dedutiva. O material linguístico era disposto

nas fichas de trabalho para a prática de um trabalho experimental, como sendo a matéria-

prima que viria a constituir a reflexão metalinguística. Assim, na aula dedicada à semântica

lexical, foquei-me, primeiramente, na combinação de várias palavras, cujo contexto

condicionava as relações semânticas estabelecidas entre si, levando os alunos a refletir na

importância do contexto relacional (Cf. Anexos 3, 4 e 5). As duas últimas aulas requereram

uma metodologia um pouco diferente, pois, pela primeira vez, era introduzida àqueles

alunos a nova terminologia sintática, que agora integra conceitos de morfologia. Num

primeiro momento, tentei que os alunos mobilizassem os conhecimentos já adquiridos neste

campo. Partindo do núcleo da frase – sujeito, predicado – expandiram-se as possibilidades

sintáticas da frase, num plano comparativo entre a terminologia antiga e a atual (Cf. Anexos

6 e 7). Surpreendentemente, os antigos complementos circunstanciais deixaram de ser

apenas as respostas às típicas questões “Quando?”, “Como?”, “Porquê?”, que eram também

as táticas para acertar na resposta certa, para serem um elemento não nuclear da frase,

justificando-se assim a divisão em grupos de frase. Aquilo que, no início, considerei

complicado de ensinar levou-me a concluir que permitiu aos alunos pensar a frase de uma

forma mais estruturada e menos mecanicista, algo que os poderia ajudar também no próprio

ato reflexivo da escrita. Concluí que a nova terminologia, quando usada adequadamente,

pode ser uma importante ferramenta para o ensino da língua e da literatura, se não nos

detivermos no único propósito de a considerar como algo tão científico e complexo que não

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seja relacionável com o texto lido e escrito, já que a linguagem se constitui não só como a

matéria do texto, mas também como a matéria do pensamento.

II.4.2 – Planificação e condução de aulas nas unidades didáticas nº 3 e nº 5

As aulas de PORTEC, que decorreram durante o 1º período, constituíram-se como

uma experiência de lecionação que nos permitiu, a mim e à minha colega de estágio, dar

início à nossa PES de forma mais contextualizada. Tal como ficou definido na planificação

anual, elaborada no início do ano letivo, a prática do ensino supervisionada do núcleo de

estágio decorreria no início do 2º período, com a preparação e execução da unidade didática

nº3, dedicada à leitura integral do texto dramático Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett,

que se prolongou, até ao final do 2º período, com a preparação e execução da unidade

didática nº5, dedicada ao estudo do texto lírico de Cesário Verde. A Professora Regina

entendeu que deveríamos prolongar a nossa experiência, uma vez que as circunstâncias da

realização do estágio reduziram o número de aulas lecionadas por cada estagiária, em

relação aos anos letivos anteriores. Esta decisão foi recebida com entusiasmo, pois, se por

um lado, poderíamos enriquecer a nossa experiência didática, por outro lado, esta decisão

significava que a Professora Regina depositava um voto de confiança no trabalho que

estávamos a desenvolver.

À semelhança do que aconteceu com as aulas de PORTEC, para a planificação

destas unidades didáticas, reunimo-nos para proceder à distribuição de aulas e conteúdos a

lecionar por cada uma de nós. Tendo por base os objetivos previstos pelo Programa de

Português, envolvemo-nos também na elaboração de atividades e abordagens que pudessem

superar e aprofundar os pressupostos gerais estipulados pelo documento oficial,

enriquecendo a nossa experiência e a dos alunos. Porém, a introdução de novas

metodologias e perspetivas estava, de certa forma, condicionada pelo pouco tempo de que

dispúnhamos para a prática letiva. Para além disso, as circunstâncias, que confinavam o

nosso trabalho à partilha da mesma turma, exigiram de nós um grande empenho na

cooperação e coordenação das atividades letivas.

Da planificação dos conteúdos até ao momento da aula, houve um longo caminho de

preparação. Partindo das orientações programáticas, decidi conceber a minha prática tendo

como base fundamental o texto literário, excluindo, à partida, os paratextos e as inúmeras

sugestões didáticas já existentes nos manuais. Creio que a extensa e variada oferta

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disponível no mercado editorial, ou o mau uso que se faz desta, pretende introduzir uma

ideia errónea de que o texto literário é substituível. Tal como para o estudo da composição

de uma rocha, o professor de Ciências Naturais não se limita ao uso do manual que

descreve a rocha, tentando introduzir nas suas aulas de caráter experimental, sempre que

possível, o próprio objeto de estudo, isto é, a própria rocha, assim, também o professor de

Português deverá partir do texto literário para o seu ensino, sendo o principal objetivo o

contato efetivo que os alunos têm com este através da sua leitura. Foi neste sentido que o

texto integral de Frei Luís de Sousa e os poemas de Cesário Verde, ambos incluídos no

manual Antologia, se constituíram como o ponto de partida e o objeto de estudo eleito para

as minhas aulas. Penso que o primeiro aspeto que se deve valorizar no estudo da literatura é

o suporte textual. Por vezes, acredita-se, com pouca sensatez, que este suporte textual não é

suficiente para estimular o interesse dos alunos. Assim, crê-se que as dramatizações das

peças de teatro, concebidas pelas companhias de teatro em grande número para receber as

visitas das escolas, os documentários sobre a vida dos autores ou as adaptações

cinematográficas das obras são as melhores ferramentas didáticas que se podem utilizar

para captar a atenção e o interesse do aluno no texto. Ora, julgo que existem metodologias

mais acertadas do que essa, pois o recurso a tais opções poderá transmitir ao aluno a ideia

de que o estudo do texto necessita de ser fundamentado e defendido, ou seja, que o texto é

importante apenas porque existe um filme, porque existe uma peça, ou uma música sobre

ele. Os alunos são suficientemente perspicazes para concluírem que o texto não se bastou a

si mesmo e que foi necessário torná-lo um produto de merchandising para sobreviver ao

seu lugar no programa escolar, justificando-se assim o infeliz rótulo de “leitura

obrigatória”. O texto deve bastar-se a si mesmo e o bom professor deve ser capaz de

explorar as potencialidades estéticas deste, quer seja pelas suas propriedades sonoras,

através da leitura expressiva, quer seja pelas suas propriedades semânticas, através da

leitura interpretativa, produzindo imagens, ideias, juízos e sensações. Porém, na escola,

muitas vezes, antes de ser uma obra de arte, o texto literário é um veículo para ensinar a

época e a língua, ficando assim a sua dimensão estética encerrada num ideal irrealizável.

Por vezes, a educação estética é confundida com um momento recreativo,

reservando-se um pequeno espaço para fazer uma visita de estudo ou para mostrar um

excerto de um filme, lembrando-nos de que aquele texto e o seu autor existem como

património na nossa sociedade cultural. Talvez seja esta forma instrumentalizada de utilizar

os textos literários para o ensino da língua e da época que os acabam por tornar em algo

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acessório nos programas. Na verdade, se o texto literário servir apenas para ensinar a língua

e a história de determinada época, pode correr-se o risco de que este seja substituído por

outros suportes textuais não-literários, que cumprem os requisitos necessários para esse

objetivo de aprendizagem. O que tem de se repensar, mais do que o texto enquanto

património nacional, é o texto enquanto obra de arte capaz de proporcionar fruição estética.

Em Educação pela Arte, Read defende que o sistema educacional não deve apenas

privilegiar o conhecimento científico e utilitarista. Para o autor, é essencial que na educação

possa existir espaço para a espontaneidade criativa e imaginativa, algo que se tem vindo a

perder com o sentimento de frustração nascido da “convenção social” e da “fadiga

mecânica” que marcam a sociedade contemporânea. Não havendo espaço para a

individualidade criativa e imaginativa, a personalidade do indivíduo desintegra-se e as

energias reprimidas tenderão, inevitavelmente, para a destruição.15

Apesar de concordar

com esta perspetiva, não posso deixar de reconhecer que o conhecimento científico também

é essencial e deve ser transmitido pela escola. Contudo, mais uma vez, julgo que deve

existir um ponto de equilíbrio. Portanto, o lugar que pretendo para o texto literário não é o

de uma perspetiva essencialista que o sacraliza e o deifica, negando a sua relação com o

mundo. Ainda que não tenha sido o contexto a criá-la, mas o seu autor, a obra de arte

dialoga com o mundo.

Neste sentido, antes de colocar os alunos em contato com as obras literárias, tive a

preocupação de proceder a uma breve contextualização cultural, para que melhor pudessem

compreender linguagens distintas das suas.

II.4.2.1 – Unidade didática nº 3: Frei Luís de Sousa

No prolongamento da primeira aula da sequência nº3, conduzida pela minha colega,

dedicada ao estudo do contexto de Frei Luís de Sousa, optei por fazer a leitura e discussão

da Memória ao Conservatório Real de Almeida Garrett. A partir desta atividade, os alunos

tiraram algumas conclusões acerca do texto que iriam estudar, através dos olhos do próprio

autor. Na verdade, Garrett sentiu necessidade de se justificar à época, fazendo uma

caracterização híbrida da sua obra, que, ironicamente, muitas vezes é reduzida a quadros

informativos dos manuais escolares que elencam as marcas da tragédia e do drama em Frei

15 O fim da educação é a integração – a preparação de cada criança para o seu lugar na sociedade, não

apenas no seu aspeto vocacional mas também espiritual e mental, então, não é de informação que ela

necessita: é de sabedoria, equilíbrio, autorrealização, gosto – qualidades que apenas podem porvir de um

exercício unificado dos sentidos para a atividade de viver. (Read; 2010: 278)

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Luís de Sousa.16

O autor, desta forma, antecipa-se à crítica literária da época, advertindo-a

de que o seu texto não se circunscreve aos valores estéticos do século XIX.17

Optando pela

sua linha de leitura, deveremos ter em conta que no seu texto coexistem valores estéticos do

Romantismo e do Classicismo. Para introduzir os alunos nesta leitura, evitei a tradicional e

exaustiva tarefa de deteção e registo das características de ambas as épocas, em tabelas

informativas. Como professora de uma turma de Artes Visuais, encontrava-me numa

situação privilegiada para evitar este método tradicionalista e enfadonho. Após a leitura e

discussão da Memória de Garrett, projetei, no quadro da sala de aula, duas pinturas de

épocas diferentes que representavam o mesmo motivo: embarcações abaladas por

tempestades marítimas; Vaso de Guerra Holandês e outros navios sob vento forte, de

Simon de Vlieger (1640-45) e Vapor numa Tempestade de neve, Joseph Turner (1842),

acompanhadas respetivamente pela sinfonia nº 40 em sol menor de Mozart (1788) e a

abertura do Ato III, “Cavalgada das Valquírias” da ópera de Wagner (1854). Embora a

observação dos alunos já estivesse de alguma forma condicionada pela associação musical,

pretendi que não estivessem visíveis quaisquer legendas que os permitissem localizar

temporalmente as pinturas (Cf. Anexo 9). No quadro de Vlieger, são visíveis alguns barcos,

controlados pelos seus tripulantes, permanecendo firmes nas ondas. Porém, o vento que faz

inchar as velas e os tons acinzentados e amarelados que preenchem o céu, restando apenas

um pequeno vestígio de azul, indiciam uma tempestade iminente. Neste momento, porém,

ainda nos é transmitida uma sensação de calma e segurança pelos homens capazes de

enfrentar a tempestade. A sinfonia de Mozart contribui também, pela sua graça e leveza,

para suscitar essas emoções. Pelo contrário, na pintura de Turner, os detalhes não são

visíveis na rodopiante representação da tempestade, cuja violência não nos dá tempo para

os observar. Apenas é possível vislumbrar o casco escuro do barco e o vulto de uma

bandeira agitada pelo vento, numa batalha contra a violência do mar. Tanto na pintura de

Turner, que poderá ser a representação dos momentos finais da luta do Homem contra a

violência da Natureza, como no excerto musical de Wagner, que representa a cavalgada das

Valquírias, o ritmo acelerado suscita emoções crescentes, que poderiam constituir o

16 Escuso dizer-vos, Senhores, que me não julguei obrigado a ser escravo da cronologia, nem a rejeitar por

impróprio da cena tudo quanto a severa crítica moderna indigitou como arriscado de se apurar para a

História. Eu sacrifico às musas de Homero, não às de Heródoto. (Garrett; 2010: 156) 17 Contento-me para minha obra com o título modesto de drama: só peço que a não julguem pelas leis que

regem, (…) porque a minha, se na forma desmerece da categoria, pela índole há-de ficar pertencendo sempre

ao antigo género trágico. (idem: 155)

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momento de clímax da tragédia clássica.18

. Através das perceções visuais e auditivas,

obtidas pela observação das pinturas e audição dos excertos musicais, os alunos elaboraram

um exercício de escrita que tinha como objetivo relacionar as obras de arte apresentadas

com duas falas da personagem Maria; a primeira, pertencente ao Ato I e a segunda ao Ato

III de Frei Luís de Sousa. Durante a leitura da peça, os alunos veriam os seus protagonistas

numa luta contra o destino. No primeiro Ato, tal como na primeira pintura, o homem ainda

tinha capacidades para enfrentar e dominar as forças opositoras, como representa o triunfo

heroico de Manuel de Sousa sobre os seus inimigos, enquanto no Ato III, os protagonistas

são vencidos pela inevitável violência do destino, tal como parece ser representado pela

tempestade de Turner (Cf. Anexo 10).

Nas aulas que se seguiram, dedicadas à leitura do texto, elaborei fichas de

interpretação textual que valorizavam os aspetos linguísticos, semânticos e estéticos da

obra. Pretendi dar continuidade a esta valorização dos elementos estéticos que, geralmente,

no estudo de Frei Luís de Sousa, é desvalorizada em detrimento da análise dos valores

sociais e religiosos da época. Embora estes fossem também objeto de reflexão na nossa

análise, as fichas de trabalho incidiram maioritariamente numa análise textual minuciosa.

Por exemplo, em vez da tradicional questão do retrato físico e psicológico, os alunos

partiam da análise do discurso das personagens, tendo em conta a organização sintática, a

pontuação e os ritmos, para a sua caracterização, não se focando apenas no conteúdo

semântico dos enunciados. Assim, a análise das didascálias ganhou particular importância

(Cf. Anexo 11). Na aula em que foi concluída a leitura do ato III, os alunos analisaram as

didascálias iniciais de cada ato, relacionando as modificações que a fisionomia do espaço

cénico foi sofrendo ao longo dos três atos com o percurso trágico dos protagonistas. No

primeiro ato, as personagens encontravam-se num espaço ornamentado com fausto, de

cores alegres, em que a comunicação com o exterior era clara e luminosa, sendo a

proximidade do rio Tejo o símbolo da integração das personagens no mundo social.

Contudo, no segundo ato, a mudança forçada das personagens para o palácio de D. João de

Portugal, introdu-las num espaço que encerra em si o passado, onde os eminentes retratos

do rei D. Sebastião e de D. João surgem como fantasmas que vêm assombrar o bem-estar

da família. O retrato de D. João vem substituir, simbolicamente, o retrato de D. Manuel de

18 Tal como refere E.H. Gombrich (Gombrich; 2006: 494): é uma tormenta desse tipo assustador e

empolgante que imaginamos ao ler um poema romântico ou ao escutar música romântica. Em Turner, a

natureza reflete e expressa sempre as emoções do homem. Sentimo-nos pequenos e esmagados perante

poderes que não podemos dominar.

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Sousa, destruído pelas chamas do incêndio, o que anuncia a ressurreição do primeiro e a

morte do segundo. Ao contrário do que acontecia no primeiro ato, aqui, o espaço não se

abre ao exterior, antes se fecha, através da comunicação simbólica que o palácio estabelece

com a capela. A predominância dos tons vermelhos e negros e o simbolismo dos adereços

existentes prenunciam a tragédia que se abaterá sobre a família. No último ato, o espaço

não apresenta ornato algum, apenas os utensílios necessários às cerimónias religiosas, em

que se destaca uma cruz negra coberta por uma toalha branca. A comunicação com o

exterior é anulada com a morte de Maria e com a renúncia de Madalena e Manuel ao

mundo terreno. Com a morte física, apenas sobra espaço para uma vivência espiritual com

Deus. Nesta análise, a progressão temporal assume um especial relevo: o percurso das

personagens inicia-se com o crepúsculo e a tragédia decorrerá a altas horas da noite. A

noite, como tantos outros elementos que foram explorados simbolicamente, impede a

luminosidade, envolvendo as personagens no mistério ininteligível do seu destino.

O número reduzido de personagens da peça, regra que obedece à estrutura da

tragédia clássica, permitiu uma análise detalhada e nuclear de cada uma delas. Neste

contexto, os alunos foram submetidos a um exercício de intertextualidade que permitiu

estabelecer um diálogo da obra garrettiana com outras obras literárias e aprofundar, em

comparação com estas, a dimensão psicológica das personagens. Assim, num destes

exercícios, surgiam excertos dispersos da tragédia Hamlet, de William Shakespeare, para

que os alunos pudessem escrever à frente de cada um deles o nome de uma personagem

garrettiana que poderia ter proferido as palavras das personagens shakespearianas. Também

os elementos da tragédia clássica foram analisados sob uma perspetiva comparativa. Num

outro exercício, a anagnórise analisou-se através da comparação da passagem da Odisseia

de Homero, em que Euricleia reconhece o seu amo Ulisses, pela sua cicatriz, com a

passagem textual de Frei Luís de Sousa, em que Telmo reconhece, através da voz, que o

Romeiro é o seu amo, D. João de Portugal. Este exercício de intertextualidade permite que

os alunos tenham uma visão mais abrangente da história literária, reconhecendo topoi

comuns, permitindo estabelecer relações mais complexas da literatura com o mundo,

tornando o património nacional em património da humanidade (Cf. Anexo 13).

Ao longo desta unidade didática, a leitura, a discussão e a formulação estratégica de

questões de interpretação, orais e escritas, constituíram-se como a metodologia principal.

Durante as aulas, procedia-se a uma leitura expressiva e interpretativa, estabelecia-se uma

discussão oral sobre as ambiguidades de significado presentes no texto, terminando com a

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resolução das fichas de trabalho. Evitei, sempre que possível, que a resolução dessas fichas

se constituísse como um trabalho de casa, pois defendo que o trabalho do aluno deve ser

realizado na aula, onde a presença do professor permite uma aprendizagem mais

acompanhada. A sala de aula é o local de trabalho do aluno, que deverá ser complementado

no espaço extraescolar com um estudo livre dos conteúdos aprendidos, em conformidade

com as necessidades de aprendizagem apresentadas por cada aluno. Na minha opinião,

existe uma contradição bastante evidente no ensino da disciplina de Português. Embora a

avaliação seja feita através de provas escritas, culminando esta tendência nas provas de

exame nacional, na aula de Português não é reservado espaço e tempo suficientes para o

treino da escrita. Parte-se do princípio, tantas vezes errado, de que o aluno já sabe escrever

corretamente. E, caso o aluno apresente dificuldades nesse domínio, é-lhe atribuída a culpa

desse facto, esquecendo-se os professores da possibilidade de esse treino não ter sido feito

adequadamente em anos anteriores. Tanto eu, como a minha colega de estágio, tivemos

sempre a preocupação de valorizar a aprendizagem da escrita na sala de aula, envolvendo

frequentemente os alunos na escrita de textos, conferindo uma particular importância à

planificação e revisão textual. Numa das minhas aulas, os alunos escreveram uma notícia

sobre o incêndio no palácio de Manuel de Sousa Coutinho. Depois de ter assinalado os

erros sintáticos e ortográficos, na aula seguinte, distribuí os textos aos alunos, que foram

envolvidos numa discussão oral onde refletiam sobre os erros assinalados. Este tipo de

correção coletiva permitiu que os alunos refletissem mais aprofundadamente sobre os erros

que cometiam, o que poderia contribuir para evitar a sua repetição em trabalhos futuros.

Esta unidade didática foi concluída com um projeto denominado Recriação Artística

dos Cenários de Frei Luís de Sousa. Eu e a minha colega compusemos os vários grupos de

trabalho para que existisse um maior equilíbrio na distribuição das atividades por todos os

elementos do grupo. Este projeto foi concebido tendo em conta as características da turma,

que poderiam operacionalizar as aprendizagens das outras disciplinas da sua área de

estudos, como a Geometria Descritiva e o Desenho. Na verdade, o facto de serem alunos de

Artes Visuais constituiu-se como o principal motivo para a escolha deste trabalho final.

Neste ponto, incidiram também os resultados que os alunos obtiveram a partir da frequente

exploração estética em que os envolvi durante as aulas. De facto, a atenção com que foram

analisados os elementos visuais e sonoros do texto teve repercussão nos trabalhos finais dos

alunos, que revelaram um apurado sentido estético e uma técnica bastante desenvolvida. Os

alunos escolheram livremente os suportes dos seus trabalhos, que variaram entre a maqueta

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utilizada em arquitetura, a banda desenhada, o suporte audiovisual, a ilustração, o desenho e

o retrato das personagens. A avaliação do trabalho contemplou maioritariamente a

criatividade demonstrada na expressão plástica. Para além disso, os alunos tiveram também

de escrever um texto, onde fundamentassem o suporte construído enquadrando-o com o

estudo da peça. Os resultados obtidos foram muito satisfatórios, já que os alunos se

sentiram motivados por se verem envolvidos num exercício que lhes permitia imprimir a

sua individualidade e imaginação nos trabalhos concebidos. Por outro lado, os alunos

sentiram-se gratos por terem tido oportunidade de se manifestarem artisticamente, algo que

vai ao encontro das suas vocações. Ao contrário do que é comum acontecer, a visita de

estudo destes alunos foi realizada por si mesmos; isto é, foi a partir das suas recriações

artísticas que construíram a representação visual da obra literária e não a partir de outras

recriações já existentes, como filmes ou encenações teatrais. Na medida em que a sua

individualidade contribuiu para construir essa representação, acredito que os valores

estéticos e éticos existentes na literatura foram vivenciados, por parte destes alunos, de uma

forma mais genuína e aprofundada.19

II.4.2.2. – Unidade didática nº5: O texto lírico de Cesário Verde

A unidade didática nº 5 contemplou o estudo da lírica de Cesário Verde. Durante

esta unidade, dei um total de três aulas: a primeira, dedicada a uma contextualização que

deu conta dos movimentos artísticos que sucederam ao Romantismo; a segunda aula que

consistiu numa análise literária do poema “De Tarde” e a última dedicada à leitura

expressiva do poema “O Sentimento dum Ocidental”. Estas aulas foram intercaladas com

as da minha colega de estágio, que analisou com os alunos os poemas “Contrariedades” e

“Num Bairro Moderno”.

Na primeira aula, procurei utilizar uma estratégia diferente para apresentar aos

alunos os dados biográficos do poeta, figura que lhes era quase desconhecida. A partir de

uma pesquisa dos dados biográficos, escrevi um texto que os reunisse, cujo narrador era

Maria Júlia, a irmã de Cesário Verde, a quem o poeta se refere no poema “Nós” (Cf. Anexo

18). Desta forma, iniciei a aula com a leitura deste texto, despertando, assim, a curiosidade

dos alunos, perante aquela voz desconhecida. Depois de adquiridas as informações

19 Herbert Read defende que as atividades práticas são necessárias se se pretende que o seu conhecimento

seja real, não apenas verbal; se se pretende que a sua educação lhes conceda padrões de julgamento e

comparação. (Read; 2010: 294)

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essenciais acerca da biografia do poeta, os alunos foram advertidos para a singularidade da

lírica de Cesário Verde, poeta que não se insere militantemente num movimento artístico.

Como refere a narradora do texto, Cesário distinguiu-se dos poetas portugueses, alguns

deles ultrarromânticos, colhendo influências na poesia francesa, sobretudo, em Baudelaire.

Tendo em conta as circunstâncias particulares desta turma e as preferências

manifestadas pelos alunos, decidi introduzir novamente a observação de obras de arte

durante a aula, desta vez para os familiarizar com novos tipos de arte: o naturalismo e o

impressionismo, cujas características estão presentes na obra do poeta (Cf. Anexos 19 e

20). Para a preparação desta unidade didática, baseei-me no texto O pintor da vida

moderna, de Charles Baudelaire, no qual o poeta francês define como objetivo do artista a

procura da Modernidade.20

Esta definição dos pressupostos de uma nova poética foi

fundamental para abordar e compreender alguma da poesia de Cesário Verde,

nomeadamente o poema “De Tarde” analisado na aula seguinte.

Nessa aula, em primeiro lugar, foi feita uma leitura expressiva do poema. Após esta

leitura, partimos para a habitual discussão oral, formulada a partir de questões colocadas

por mim, de forma a explorar mais profundamente alguns aspetos. Assim, os alunos

detiveram-se na análise formal do poema, sobretudo quanto à classificação da rima e ao

reconhecimento de outros artifícios poéticos e retóricos, como a repetição de sons, a

aliteração presente no verso A um granzoal azul de grão-de-bico, e diversas sinestesias

como pão-de-ló molhado em malvasia. A partir do levantamento destes aspetos, os alunos,

foram reconhecendo este poema como o produto da visão do artista Moderno: Houve uma

coisa simplesmente bela,/ E que, sem ter história, nem grandezas, / Em todo o caso dava

uma aguarela (Verde; 2009:86). Nestes versos, os alunos atentaram na palavra “aguarela”,

associando a pintura à poesia e o pintor ao poeta. Aqui, o poeta demite-se da sua função de

cronista, focando-se na sua visão de artista, que tinha a capacidade de transformar a

realidade, através da sua imaginação, na procura do Belo. Esta busca pelo Belo foi

motivada pela figura feminina que vai apanhar papoulas, compondo-as num ramalhete.

Após a descrição breve do pic-nic, ao qual o poeta não parece atribuir singular importância,

fazendo uma enumeração apressada dos alimentos que o compunham, existe uma paragem

sugerida pela conjunção coordenativa adversativa com que se inicia a última estrofe:

“Mas”. Aqui, o poeta pretende regressar à procura do momento singular, “um” ramalhete é

20 O que ele pretende é retirar da moda o que ela pode conter de poético no histórico, extrair o eterno do

transitório. (Baudelaire; 2006:289)

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agora “o” ramalhete, em que a substituição do determinante artigo indefinido, que antes

pertencia ao retrato da realidade, pelo determinante artigo definido, transforma a realidade

em criação poética e a visão geral em visão particular. Então, alguns alunos relacionaram o

poema com a definição baudelairiana dos objetivos do artista moderno: retirar o poético do

histórico e o eterno do transitório, ou seja, retirar do pic-nic (elemento histórico e

transitório) aquilo que este tinha de poético e eterno: a beleza feminina, a sensualidade e o

erotismo. Esta aula terminou com a resolução de uma ficha de trabalho (Cf. Anexo 21) e

com a entrega de trabalhos escritos, em que os alunos partiram da pesquisa de poemas de

poetas portugueses onde eram feitas referências a Cesário Verde, num exercício de

intertextualidade, destacando-se de entre eles o poema Homenagem a Cesário Verde, de

Mário Cesariny.

A última aula que dei nesta unidade didática foi dedicada à leitura do poema O

Sentimento dum Ocidental (Verde; 2009: 78-85). Dada a grande extensão do poema,

constituído por quarenta e quatro estrofes, a primeira pergunta que coloquei a mim mesma

foi: como analisar um poema tão longo numa aula de noventa minutos? Perante isto, tinha

duas opções: ou optava por selecionar apenas algumas das quatro partes em que se divide o

poema, cortando-o, ou adaptava uma estratégia global de análise. Escolhi a última opção,

pois fazer uma leitura parcial deste poema condicionaria a sua interpretação, ao quebrar o

efeito do jogo temporal patente na deambulação do poeta.

Desta forma, tornou-se necessário conceber uma atividade de leitura que colmatasse

a previsível dispersão e inquietação da turma perante a leitura e audição de um poema tão

longo. Assim, tentei experimentar a estratégia do efeito surpresa, que costuma despertar a

curiosidade dos alunos, mantendo-os mais atentos. Antes de a aula começar, dispus quatro

cadeiras no centro da sala, ocupando cada uma delas a posição de cada um dos quatro

pontos cardeais. Quando a aula começou, chamei três alunos para lhes explicar, em privado,

o que tinham de fazer: eu leria a primeira parte do poema e eles leriam as restantes. Escolhi

alunos com uma participação menos ativa nas aulas para os desafiar e estimular, o que

poderia ser também um risco que poderia comprometer o decurso da atividade. No entanto,

estes alunos superaram as minhas expetativas, lendo com bastante correção um poema que

nunca antes tinham lido, num tom de voz audível e com uma boa dicção, respeitando ritmos

e pausas, e autocorrigindo-se, sempre que necessário. Para além disto, estes alunos puseram

em prática as instruções dadas. O poema só poderia ser lido na cadeira que se situava no

ponto ocidental da sala. Assim, quando concluía a leitura de uma parte, o leitor concedia o

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seu lugar ao próximo. À restante turma, apenas dei instruções para que permanecessem

atentos à leitura e sublinhassem os vocábulos cujo significado pudessem desconhecer.

No final da leitura, coloquei a primeira questão aos alunos: “Por que se

movimentaram os vossos colegas desta forma?” Os alunos concluíram que esse movimento

seguia o dos ponteiros do relógio, sugerindo a passagem das horas no evidente percurso

temporal traçado no poema. Após a explicitação dos vocábulos de significado

desconhecido, procedemos à habitual troca de ideias para a interpretação do poema. Os

principais tópicos de leitura foram os seguintes (Cf. Anexo 22): 1) delinear o percurso

temporal e espacial do sujeito poético pela cidade de Lisboa; 2) referir o contexto da

publicação do poema, publicado no dia 10 de Junho de 1880, no âmbito das comemorações

do tricentenário da morte de Camões; 3) aproveitando o facto de esta turma ser constituída

por alunos naturais ou residentes em Lisboa, foi mobilizado o seu conhecimento dos locais

e a sua relação emocional com a cidade, reconhecendo-a como um local de contrastes

arquitetónicos, sociais e culturais; 4) estabelecer diferenças entre outras cidades europeias

mais recentes e Lisboa, onde coexistiam na época de Cesário Verde os magasins,

burguesinhas, a cor monótona e londrina, cavalos mecklemburgueses e candeeiros a gás,

ou seja, os topoi da arte da Europa moderna e as especificidades da antiga Lisboa dos

bairros históricos. O poeta vai situar-se no Ocidente da Europa para cantar os seus

vestígios, preservando a sua memória cultural a Idade Média, as crónicas navais. Este

retrato da cidade de prédios sepulcrais com dimensões de montes é feito de forma a realçar

os seus contrastes físicos e sociais: as ruas tortuosas e íngremes contrapostas às construções

retas e iguais da baixa pombalina; as varinas em oposição às burguesinhas; as janelas

trapeiras em oposição às fachadas augustas; 5) a introdução das características realistas

como preparação para a leitura do romance queirosiano Os Maias, que seria estudado na

unidade didática seguinte. Mais uma vez, o conhecimento concreto dos alunos da cidade de

Lisboa permitiu identificar alguns locais retratados pelo poeta. Para contrastar com o

Realismo evidente no poema, foram referenciadas as raras notas impressionistas, mas,

mesmo assim, existentes. Esta existência provoca uma espécie de dilema no poeta,

sugerindo até uma incapacidade de o mesmo se concretizar no Realismo: quisera eu que o

real e a análise mo dessem, não poder pintar com versos magistrais e salubres. Assim, as

referências impressionistas surgem subtilmente e evoco as crónicas navais, eu acho sempre

assumpto a quadros revoltados, eu penso ver círios laterais. Mais uma vez, os alunos

foram convidados a reconhecer o artista moderno neste poema de Cesário Verde. O poeta

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que se quer diluir na multidão foi imediatamente comparado, pelos alunos, a uma pintura de

Manet, que tinha sido projetada na aula de contextualização (Cf. Anexo 19), intitulada

Monet pintando num barco (1874), representando o artista que abandona o ateliê e se dilui

na multidão, permanecendo escondido do mundo.21

O sujeito poético de O Sentimento dum

Ocidental é o herói de uma viagem, definida por M.S. Lourenço como epopeia

crepuscular, partindo da distinção adiantada por Milton entre epopeia longa e epopeia

breve.22

Foi através desta distinção que foi justificada aos alunos a quase não celebração de

Camões num poema supostamente de índole comemorativa, em que a sua estátua surgia em

dimensões desproporcionais em relação às “exíguas pimenteiras” que proliferavam num

local vulgar e mal frequentado. Cesário, afinal, canta o artista moderno, num mundo e

numa época, em que a viagem é mais psicológica do que física, em que os mares a

desbravar são agora a consciência do homem.

II.4.3 - Avaliação dos alunos

A avaliação dos alunos do 11º 5 foi, ao longo de todo o ano letivo, realizada pelo

núcleo de estágio. No primeiro período, a professora Regina deu-nos a corrigir algumas

questões dos testes. A partir do segundo período, a resolução dos testes foi totalmente

confiada a mim e à minha colega de estágio. Obviamente, os testes não foram o único

elemento de avaliação dos alunos, ainda que ocupassem a maior fatia no peso final (Cf.

Anexos 16 e 23). Ao longo das aulas, tivemos sempre o cuidado de realizar uma avaliação

contínua, registando as participações dos alunos na aula, os trabalhos de casa e atitudes

como a pontualidade ou a assiduidade. Na turma, existiam três alunos com necessidades

educativas especiais, devido aos problemas manifestados na sua aprendizagem pela

dislexia, disortografia, défice de atenção e hiperatividade. Para estes alunos, foram

utilizadas estratégias e métodos de avaliação adequados às suas necessidades, implicando

um aumento do tempo na resolução do teste, a redução de questões nas provas e ainda uma

penalização menor dos erros ortográficos.

21 O amante da vida universal entra na multidão como quem entra num imenso reservatório de eletricidade.

Podemos também compará-lo a um espelho tão imenso como essa multidão; a um caleidoscópio dotado de

consciência, que, a cada um dos seus movimentos, representa a vida múltipla e a graça notável de todos os

elementos da vida. É um «eu» insaciável do «não-eu», que a cada instante o traduz e exprime em imagens

mais vivas que a própria vida, sempre instável e fugidia. (Baudelaire; 2006; 287) 22 No género breve de poema épico o chefe conduz-se a si próprio. Ele já não funda uma nova ordem

religiosa e política (…) a ação heroica é a transformação cognitiva da experienciada pelo poeta enquanto

erra pela triste cidade, subindo e descendo, no crepúsculo nebuloso (Lourenço; 2002: 118-119)

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A avaliação dos alunos foi uma das tarefas que me suscitou mais dúvidas, sobretudo

na correção de exercícios de expressão escrita. Embora utilizasse uma simbologia

específica para a correção e me guiasse pelos critérios regulamentados pelo GAVE para os

exames nacionais, surgiram-me algumas incertezas, que tentei sempre dissipar com a

orientadora, que tinha já muita experiência no assunto, inclusivamente como corretora de

exames nacionais. Na verdade, a avaliação é sempre um momento decisivo, que pode

influenciar de forma definitiva o percurso académico dos alunos, requerendo, desta forma,

uma reflexão bastante profunda. De uma forma geral, a turma apresentou resultados

médios, excetuando o caso de uma aluna que ficou retida no 11º ano. A turma apresentou

ainda duas desistências na disciplina de Português por parte de dois alunos que se

encontravam a realizar melhoria de nota. Os dois alunos estrangeiros da turma, a aluna

chinesa e o aluno moldavo, apresentaram algumas dificuldades no domínio da língua

portuguesa, sendo que este facto acabou por prejudicar a sua avaliação. Porém, mesmo

apresentando este fraco domínio da língua, estes alunos não puderam frequentar a disciplina

de Português Língua Não-Materna, oferecida pelo currículo do Ministério da Educação.

Como a escola apresentava poucos casos desta natureza, não se considerou justificável a

abertura de uma turma, sugerindo-se outras opções, como a transferência dos alunos para

outras escolas que ofereciam esta possibilidade. Na minha opinião, embora reconheça que

tenha de ser feita uma gestão adequada dos recursos humanos, penso que este foi o único

aspeto que posso sinalizar como ponto negativo no funcionamento da ESJGF. Na verdade,

esta instituição oferece condições excelentes tanto à aprendizagem dos alunos como ao

bem-estar dos seus funcionários, pelo que a oferta do Português – Língua Não Materna se

justificaria e enquadraria nos pressupostos do seu projeto educativo.

II.4.4 - Papel desempenhado na comunidade educativa da ESJGF

II.4.4.1 – As reuniões de trabalho

Para além do trabalho desenvolvido no âmbito do núcleo de estágio, juntamente

com o colega de estágio e sob a supervisão do professor orientador, a Prática do Ensino

Supervisionada pressupõe, igualmente, que o estagiário desempenhe um papel ativo na

comunidade educativa da instituição onde é acolhido, envolvendo-se em projetos

extracurriculares e outras tarefas de caráter não letivo. Neste sentido, a Professora Regina

teve sempre a preocupação de assegurar que a presença do núcleo de estágio neste campo

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se concretizasse de forma efetiva. Na verdade, o estágio não só proporciona experiência na

prática do ensino, como permite também que o estagiário se familiarize com as linguagens

e os procedimentos do sistema educacional, tutelado pelo Ministério. As reuniões de

trabalho em que participei incluíram as reuniões de conselho de turma do 11º5, as do grupo

disciplinar de Português e as do Departamento de Línguas.

Nas reuniões de conselho de turma, foi possível acompanhar a evolução da turma,

ao longo de todo o ano letivo, participando nos momentos de avaliação nos finais de

período e contribuindo para a adoção de estratégias que reforçassem a aprendizagem dos

alunos. Nas reuniões de grupo disciplinar de Português e do Departamento de Línguas, a

ordem de trabalhos contemplava tarefas de natureza diversa, como a conceção de materiais

didáticos e instrumentos de avaliação, divulgação de informações oficiais, planificações

anuais, organização de visitas de estudo e outras atividades extracurriculares, análise dos

resultados dos alunos e definição de estratégias de reforço da aprendizagem. Apesar de

exigirem um esforço complementar aos professores, considero que estas reuniões de

trabalho são fundamentais para o funcionamento da escola, evitando que o trabalho do

professor permaneça isolado e disperso. Assim, é possível dialogar, adotar estratégias

comuns e atingir mais facilmente os objetivos desejados.

Numa destas reuniões, no 1º período, foi solicitado aos professores que

apresentassem projetos ou atividades que gostassem de realizar na escola. Nesta ocasião,

pedi a palavra e apresentei aos professores presentes o projeto de investigação em que

estava envolvida, o qual foi acolhido com muito interesse e entusiasmo. Assim, ficou

definida a minha participação nas turmas do 9º ano, com uma atividade intitulada “Visita à

oficina do escritor Vergílio Ferreira”. Logo no início do ano letivo, nos seminários da

faculdade, a Professora Graciete Silva explicou aos mestrandos a importância da escolha

atempada de um tema ou projeto a desenvolver na escola, para que o mesmo se constituísse

como objeto de reflexão teórica do relatório de estágio. Para mim, esta escolha não foi

difícil, já que pretendia aliar à prática do ensino do Português uma outra experiência

académica levada a cabo no centro de investigação Centro de Estudos sobre o Imaginário

Literário (CEIL) da FCSH, na vertente da edição textual do espólio de Vergílio Ferreira.

Este projeto consiste em verificar de que forma os manuscritos dos escritores e a edição

crítica textual podem contribuir como instrumentos didáticos. Como referi, foi possível pôr

em prática este projeto na ESJGF, permitindo, desta forma, que a reflexão teórica do

presente relatório de estágio se sustentasse em resultados práticos.

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II. 4.4.2 – Participação em aulas do 3º ciclo - 7º3 e 7º4

O mestrado em Ensino confere habilitação profissional para lecionar a disciplina de

Português no Ensino Secundário, mas também no 3º ciclo do Ensino Básico. Uma vez que

o nosso estágio decorria numa turma do 11º ano, eu e a minha colega decidimos aproveitar

o facto de estarmos na escola para propormos a outros professores a nossa participação nas

suas aulas, a fim de enriquecer a nossa experiência letiva com turmas de outros níveis de

aprendizagem. A Professora Olívia Reis acedeu a este pedido, com muito entusiasmo,

frisando, no entanto, que a nossa participação não obedeceria aos moldes das aulas

supervisionadas, uma vez que o intuito não era a nossa avaliação enquanto estagiárias, mas

o aprofundamento da nossa experiência letiva. Desta forma, todas as tarefas de

planificação, condução de aulas e correção de textos foram desenvolvidas num trabalho

conjunto entre as estagiárias e a professora, compreendendo um total de três aulas

dedicadas à unidade didática do texto literário A Fuga de Wang-Fô, de Marguerite

Yourcenar, nas turmas 7º3 e 7º4.

Através da participação nestas aulas, foi possível testemunhar os benefícios que

derivam de uma relação pedagógica harmoniosa, bem como verificar os frutos colhidos de

uma metodologia do ensino da disciplina de Português que se distinguia em certos aspetos

das práticas habituais. Num nível de ensino em que os alunos são mais jovens,

encontrando-se no período da adolescência, que, por vezes, se caracteriza pela

vulnerabilidade e sensibilidade dos jovens, foi possível verificar que a relação dos alunos

com a professora se baseava sobretudo na afetividade. Na verdade, os alunos e a professora

revelaram uma relação de cumplicidade. Se, por um lado, alguns dos alunos, no início da

aula, sentiam necessidade de abraçar a professora, por outro lado, nos momentos de

responsabilização, também compreendiam facilmente os conselhos e chamadas de atenção,

tanto em relação ao seu trabalho como alunos, bem como às suas atitudes enquanto pessoas.

Esta observação permitiu-me concluir que, ao contrário do que preconcebia, é possível

compatibilizar o afeto e a maturidade. Por vezes, considerava que se o professor tivesse

uma relação mais próxima com os alunos, a aprendizagem e a responsabilidade da turma

ficariam comprometidas. No entanto, esta experiência permitiu-me verificar que nem

sempre isso acontece mas, pelo contrário, se o professor apresentar as qualidades da

Professora Olívia, o afeto pode mesmo tornar mais frutuosa a aprendizagem e a relação de

bem-estar do aluno com a vida escolar. Obviamente, os alunos do 3º ciclo e do Ensino

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Secundário requerem uma relação pedagógica de pressupostos adequados ao seu estádio de

desenvolvimento, contudo, este facto é muitas vezes sobrevalorizado, como salienta Read.23

Nos encontros com a Professora Olívia, dei-me conta das preocupações,

manifestadas pela professora, em relação à seleção e presença dos textos literários nas suas

aulas, revelando-nos que acompanhava com regularidade a publicação de textos literários

infantis e juvenis, aos quais dedicava algum tempo na sua leitura e análise. Embora, na sua

opinião, muitas publicações não apresentem qualidade, a professora salientou que havia

outras que mereciam a nossa atenção, sobretudo, porque entravam em diálogo com outros

textos, aprofundando-se, assim, a formação do aluno enquanto leitor crítico e autónomo.

Esta valorização do ato de leitura era aliada, pela professora, à valorização da escrita, numa

dinâmica de reciprocidade, algo que pude verificar nas aulas em que participei.

A Fuga de Wang-Fô, uma narrativa de Marguerite Yourcenar, estava incluída nas

leituras para o 7º ano de escolaridade até à implementação do novo programa de Português

para o Ensino Básico, ocasião em que se tornou uma leitura de carácter opcional, podendo

ser substituída por outros textos. Este facto preocupou bastante a Professora Olívia, que

faria, naquele ano letivo, a exploração deste texto pela última vez enquanto leitura não

recreativa. Na verdade, numa das reuniões testemunhei que alguns dos professores

presentes preferiam outros textos, por este apresentar dificuldades de interpretação aos

alunos. Pelo contrário, a Professora Olívia valorizava este texto precisamente por esse

motivo, pois o que interessava colher da sua leitura era a exploração das ambiguidades de

sentido. Antes de os alunos lerem o texto ou sequer suspeitarem de que o iriam fazer, na

primeira aula, propusemos uma atividade de escrita, cujo resultado seria mobilizado para a

interpretação textual. Enquanto, no quadro, eram projetadas ilustrações de G. Lemoine de A

Fuga de Wang-Fô, da edição “Contexto e Imagem”, acompanhadas por excertos de música

tradicional chinesa, os alunos escreviam um texto de conteúdo livre partindo do título “Um

pintor na China Antiga.” De seguida, nós próprias lemos, em voz alta, o texto integral, já

que o manual “Sentidos” apenas incluía excertos e adaptações do texto original. Durante a

leitura, os alunos mostraram-se atentos, estimulados pelo confronto com as histórias que

tinham acabado de escrever. Finda a leitura, foi feita uma exploração textual, através do

diálogo em grande grupo, explorando as categorias da narrativa, o vocabulário

desconhecido, tendo sido também lançado um debate sobre os valores éticos das

23 A criança é a mesma desde o seu nascimento até à sua maturidade, e a sua educação deveria consistir num

processo uno e indiviso. (Read; 2010: 285)

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personagens, que se afastam dos da sociedade ocidental contemporânea. O momento mais

desafiante para os alunos foi a discussão do desenlace do conto. Esta narrativa aberta

oferece várias interpretações e sugestões, e, como crianças que querem ganhar um jogo,

rapidamente se formaram diferentes fações que apoiavam desenlaces diferentes para o

enredo. Porém, o resultado derradeiro desta discussão não foi decidir se os protagonistas

tinham ou não morrido, mas reconhecer a complexidade e ambiguidade semânticas que o

texto literário suscita, não exigindo vereditos, mas estimulando a possibilidade da abertura

interpretativa.

A correção dos textos dos alunos foi dividida por mim e pela minha colega de

estágio, tendo-me cabido a correção dos textos do 7º3 (Cf. Anexo 24). Esta tarefa revelou-

se muito útil para a minha reflexão, pois permitiu-me verificar de que forma os alunos

mobilizaram os seus horizontes de expetativa invocados pelo seu imaginário cultural e de

que forma os relacionaram com as imagens, os sons e as sugestões aos quais foram

expostos durante a escrita. Do ponto de vista textual, fiz também um levantamento, a nível

individual, dos erros ortográficos e uma verificação do uso do adjetivo e dos pronomes,

informação que reuni num documento que entreguei à Professora Olívia.

II.4.4.3 -Projeto de Educação Sexual promovido pelo CAOJ

Por intermédio de uma amiga, estudante do curso de Medicina, integrei um projeto

de voluntariado promovido pela Fundação Portuguesa “A comunidade contra a SIDA” e

pelo Centro de Acolhimento e Orientação Jovem (CAOJ) designado “Educação pelos

Pares”, tendo como objetivo a dinamização da educação sexual em contexto escolar,

através de jovens voluntários, sendo estes, na sua maioria, estudantes universitários. Após

ter concluído o período de formação, integrei a equipa que iria desenvolver o seu trabalho

na ESJGF, sob a coordenação da Dra. Gabriela Fonseca. A formação dividiu-se em duas

componentes: pedagógica e científica. Na componente científica, tive oportunidade de

adquirir os conhecimentos científicos necessários para promover a educação sexual, como a

prevenção de comportamentos de risco e o estudo de doenças sexualmente transmissíveis.

Na primeira sessão de atividades, foi criada uma “caixa de dúvidas”, para que os

alunos expusessem de forma sigilosa as suas questões em relação à sexualidade. A partir

das dúvidas colocadas, agrupar-se-iam vários temas para formar trabalhos de grupo.

Através do acompanhamento da Dra. Gabriela, cada grupo exploraria um tema, dissipando

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as suas dúvidas e consolidando conhecimentos, através da própria pesquisa. Foram ainda

realizados jogos de grupo semelhantes àqueles que ocorreram durante a formação, o que

permitiu que os alunos se sentissem mais à vontade para abordarem assuntos que lhes

causavam algum constrangimento. Foi interessante observar as diferentes reações, facto que

prova que a educação sexual ainda está longe de ser um tema consensual e acessível a toda

a população escolar. As assimetrias reveladas provam que este tipo de conhecimento ainda

não institucionalizado se confina à educação familiar, condicionada por diferentes perfis

sociais, culturais e religiosos. Tendo em conta este facto, foi realizada uma reunião de

esclarecimento para os encarregados de educação, que, de uma forma geral, aprovaram este

projeto, reconhecendo a sua importância para o crescimento saudável dos seus educandos.

CAPÍTULO III – PRÁTICA DO ENSINO SUPERVISIONADA DE LATIM

III.1 – Circunstâncias em que decorreu a PES de Latim

A PES de Latim decorreu em moldes muito distintos dos verificados no estágio de

Português, distanciando-se deste em vários aspetos. Em primeiro lugar, não foi possível

estabelecer um protocolo com uma instituição cooperante do ensino secundário, tal como

está previsto pela legislação oficial e pelo regulamento interno da FCSH, devido aos

motivos já referidos anteriormente. Em segundo lugar, este mestrado confere o grau de

habilitação profissional para a docência da disciplina de Latim no ensino secundário, cujo

programa se distingue claramente dos planos de estudos da disciplina de Latim no ensino

superior. Uma dessas diferenças reside na estrutura do Programa de Latim para o ensino

secundário, cujas unidades didáticas surgem definidas segundo tópicos de cultura,

incindindo sobre a compreensão da génese da cultura ocidental, enquanto no ensino

superior, no plano de estudos da licenciatura em Estudos Portugueses, existem disciplinas

específicas para estes conteúdos culturais, nomeadamente as disciplinas de Cultura Clássica

Grega e de Cultura Clássica Latina. Deste modo, o estágio de Latim neste nível de ensino

excluiria, ou, pelo menos, reduziria estes conteúdos, focando-se sobretudo no aspeto

linguístico. Desta forma, não foi possível pôr em prática um dos pressupostos didáticos da

disciplina e para os quais fui preparada no seminário de Didática das Línguas Clássicas.

Para além disso, os alunos do ensino superior distinguem-se dos alunos do ensino

secundário não apenas pelas características relacionadas com a sua faixa etária, mas

também pelo facto de, para os últimos, o Latim se constituir como uma disciplina de caráter

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optativo, enquanto para os alunos universitários o Latim se constitui como uma das

disciplinas do tronco comum das unidades obrigatórias da sua licenciatura.

O estágio de Latim distanciou-se do estágio de Português pela redução de

oportunidades que ofereceu quanto ao número de aulas que me foi concedido lecionar, não

contemplando o mínimo exigido pelo regulamento interno. Para além disso, a minha

participação foi limitada, pois, em nenhuma aula foram ocupados os noventa minutos

estipulados, sendo que o tempo era dividido por mim, pela minha colega e pelo professor.

Considero que três aulas são insuficientes para que possa existir uma prática de ensino

supervisionada propriamente dita, uma vez que não existe tempo para uma prática de

ensino evolutiva, a qual se pretende que seja um caminho de reformulação e aprendizagem.

Neste sentido, também a avaliação do estagiário poderá ficar comprometida, uma vez que

as evidências demonstradas são mínimas e insuficientes para uma avaliação objetiva do seu

trabalho. Após ter sido informada da minha avaliação na PES de Latim, convoquei uma

reunião com o Professor Manuel Rodrigues e com a Professora Graciete Silva,

coordenadores do mestrado, com a finalidade de esclarecer esta situação. Talvez devido às

circunstâncias verificadas, que limitavam o tempo e as ocasiões das reuniões previstas para

a orientação, não me foi transmitida uma informação regular e frequente acerca do meu

desempenho, tendo apenas tomado conhecimento dessas informações posteriormente.

Requeri, então, aos professores, pelos motivos que mencionei acima, um prolongamento da

minha experiência letiva, através da lecionação de um maior número de aulas, tal como

vem definido no documento regulador. Evidentemente, pela sua natureza de funcionamento

tão diferente, os três núcleos de estágio não poderiam proporcionar os mesmos critérios e as

mesmas condições para que a avaliação pudesse decorrer de forma equitativa. Os

professores prestaram a maior atenção aos problemas por mim levantados, resolvendo-os da

melhor forma possível. Na verdade, foi possível lecionar mais uma aula, o que, mesmo

representando um número insuficiente, permitiu uma reformulação da minha avaliação.

Como anteriormente referi, fui integrada no núcleo de estágio orientado pelo

Professor Doutor André Simões, por minha opção, na turma de Latim da licenciatura em

regime pós-laboral, juntamente com a minha colega, Lisete Silva. Também aqui se

registaram diferenças claras em relação aos outros núcleos de estágio; desde logo, as

evidentes dissemelhanças implicadas na condução de um curso livre de Latim, como

atividade extracurricular, numa escola secundária e a lecionação da disciplina no ensino

superior. Para além deste aspeto, o núcleo de estágio da turma do regime diurno pôde

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usufruir de outras oportunidades, como a tutoria dos alunos e um maior número de aulas,

em consequência da presença constante da orientadora na faculdade, enquanto no meu caso,

apesar de toda a prestabilidade que o Professor André Simões demonstrou ao longo do

estágio, a sua disponibilidade horária foi mais reduzida, embora regular, devido ao facto de

desdobrar a sua atividade docente entre a FCSH e a FLUL.

III.2 – Caracterização das turmas de Latim I e II

O estágio de Latim foi desenvolvido com as turmas semestrais de Latim I e II da

licenciatura em Estudos Portugueses, oferecida pela FCSH em regime pós-laboral. Apesar

de não ter sido possível verificar rigorosamente o número de alunos inscritos e o número de

alunos desistentes, ao longo das aulas assistidas e lecionadas, registei a presença frequente

de doze alunos. As aulas decorriam em período pós-laboral, sendo que a maior parte destes

alunos tinha uma ocupação profissional que complementavam com a frequência da

licenciatura. Não obstante, a maioria destes alunos revelou um grande sentido de

responsabilidade e perseverança, como se pôde verificar pelas suas classificações acima das

médias verificadas nesta disciplina, situando-se num nível Bom e Muito Bom, salvo raras

exceções. Apesar de não ter sido possível verificar as datas de nascimento dos alunos, era

fácil reconhecer que se situavam numa faixa etária acima da minha, facto que me provocou

algum constrangimento. Para além disso, estes alunos revelaram uma cultura geral muito

vasta e um conhecimento bastante profundo da sua área de estudos, facto que me provocou

alguma insegurança, dada a minha condição de estagiária.

III.3 – Período de observação de aulas do Professor André Simões

Durante o 1º semestre, antes de iniciar a nossa prática letiva, eu e a minha colega de

estágio assistimos a várias aulas lecionadas pelo Professor André Simões. A partir desta

observação, foi possível reconhecer e compreender as circunstâncias que proporcionaram

os ótimos resultados alcançados pela turma. De facto, o Professor André Simões contraria

todas as opiniões que classificam a disciplina de Latim como obsoleta e maçadora. Uma das

razões apontadas para o declínio do ensino do Latim nos últimos anos está associada a uma

metodologia de ensino marcada pelo autoritarismo e pela memorização, cuja dificuldade

não se justifica em resultados produtivos. Esta metodologia ainda se pode verificar nas

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aulas de alguns professores mais tradicionalistas, convictos de que esta é a única

abordagem possível.

Como já foi referido, o plano de estudos desta disciplina no ensino superior incide,

maioritariamente, em conteúdos linguísticos, componente mais associada ao método

tradicionalista, que privilegia a memorização das declinações e conjugações. Pelo contrário,

a metodologia utilizada pelo professor implicava um estudo comparativo das declinações e

outros conteúdos, baseada no reconhecimento de semelhanças e diferenças; por exemplo,

na análise comparativa das desinências, sendo desnecessária uma memorização puramente

mecânica. Esta prática permitia, por isso, o raciocínio permanente, o estímulo da

descoberta, revestindo o ensino da língua numa atividade viva e dinâmica. Para além destas

metodologias inovadoras, que permitiam uma aprendizagem mais eficiente pelos alunos, o

Professor André Simões procedia a uma seleção rigorosa e diversificada dos textos usados

na tradução. Os suportes textuais variavam entre as máximas, provérbios, divisas

nobiliárquicas e pequenos excertos de autores latinos clássicos, introdução de versículos da

Vulgata e também de outros textos escritos em latim medieval, à semelhança da seleção

realizada pelos manuais elaborados pela Professora Maria Cristina Pimentel. Esta

diversidade permitiu demonstrar a abundância da língua latina verificada ao longo dos

séculos, eleita como língua oficial da comunicação cultural, histórica e religiosa dos povos,

não se restringindo assim ao período hegemónico do império romano.

A questão da motivação, seja no Latim ou em outras disciplinas, preocupa os

professores, que tentam encontrar as mais diversas estratégias, como salienta o Professor

Manuel Rodrigues.24

A metodologia do Professor André Simões é a prova da construção de

uma autêntica motivação interna dos alunos. Socorrendo-se apenas do quadro, das canetas

coloridas e das fichas de trabalho, em suma, dos instrumentos associados ao método

tradicional, o Professor provou que um excelente mestre não se constrói a partir dos

instrumentos físicos que utiliza, mas através da sua sabedoria, paixão e sensibilidade. Na

verdade, os ótimos resultados verificados não se deveram apenas aos alunos, mas à eficácia

do professor, pois, a mesma situação era verificável com os seus alunos da FLUL. Nas

aulas assistidas, o professor nunca permitiu que restassem dúvidas, explicando as vezes que

fossem necessárias, de formas diversas, até os alunos ficarem esclarecidos.

24 Professores há que entendem a motivação como um artifício destinado a despertar ou a manter a atenção e

o interesse do aluno. Circunscrevem-na, por isso, a um determinado momento da aula e recorrem aos mais

variados expedientes: uma gravura, um mapa, um cartaz (…) mesmo que pontualmente bem sucedida, a

motivação artificial e externa não oferece garantia de continuidade de efeitos. (Rodrigues; 1995:3)

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III.4 – Planificação e condução de aulas

No início do semestre, o orientador forneceu-nos um cronograma semestral (Cf.

Anexo 25) das aulas de Latim, sugerindo que a nossa participação ocorresse nas aulas

dedicadas a conteúdos gramaticais menos complexos, informando-nos também de que não

ocuparíamos toda a aula com a nossa intervenção, a qual deveria ser introduzida de forma

gradual. Para cada aula, eu e a minha colega de estágio elaborámos planificações e fichas

de trabalho, documentos que submetíamos à revisão do professor, através do e-mail ou

presencialmente. No dia em que decorria a aula, reuníamo-nos com o orientador para ouvir

as suas sugestões e fazer algumas correções. Nem sempre o nosso trabalho correspondeu às

expetativas do Professor, que, por vezes, preferiu que utilizássemos os materiais por si

concebidos, disponibilizados no seu sítio da internet 25

. Considero que posso justificar esta

situação, algo que não ocorreu em nenhum momento do estágio de Português, com o facto

de não ter uma formação científica do ensino do Latim tão proficiente e especializada como

aquela adquirida pelos estudantes de Estudos Clássicos, com quem o Professor estava

habituado a trabalhar na orientação de estágios. A minha aprendizagem do Latim ocorreu

no ensino secundário, época em que fundamentei mais intensivamente os meus

conhecimentos desta língua, e no ensino superior, na realização de quatro disciplinas

semestrais, correspondendo a um total de 12 créditos, quantidade talvez insuficiente para

um aluno que opte por prosseguir o mestrado em Ensino. Apesar de ter tido duas excelentes

professoras, sentir-me-ia mais segura se tivesse possibilidade de aprofundar os meus

conhecimentos, opção que tomarei no futuro, caso exista a oportunidade de lecionar esta

disciplina.

As aulas que lecionei incidiram sobretudo em conteúdos gramaticais. Para a

primeira aula, elaborei uma ficha de trabalho constituída por cinco exercícios: tradução de

um excerto de uma fábula de Fedro “Pullus ad Margaritam”; análise sintática de algumas

expressões textuais; exploração de algumas formas verbais do texto e, por fim, a tradução

de um pequeno excerto do Evangelho de São Mateus, num diálogo de intertextualidade

com a fábula de Fedro26

(Cf. Anexo 26). Apesar de ter apreciado o meu trabalho, o

Professor considerou que a ficha não se adequava ao nível de aprendizagem, tendo-me

25 Disponível em https://sites.google.com/site/asimoes1971/ 26 Evangelho Segundo São Mateus (7:6): Nolite dare sanctum canibus neque mittatis margaritas vestras ante

porcos ne forte conculcent eas pedibus suis et conversi disrumpant vos. Disponível online em

http://www.vatican.va/archive/bible/nova_vulgata/documents/nova-vulgata_novum-testamentum

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sugerido que esta fosse utilizada noutra ocasião. Assim, nessa aula, utilizei uma ficha

concebida pelo Professor.

Nas restantes aulas, lecionei os seguintes conteúdos: o futuro imperfeito do modo

indicativo, o nominativo e acusativo do tema em consoante da terceira declinação e as

orações interrogativas indiretas. Para estas aulas, concebi fichas de exercícios, que eram

elaboradas após a exposição oral, o registo no quadro e o esclarecimento das dúvidas

inerentes (Cf. Anexos 27 e 28). Apesar de não termos participado na elaboração dos testes

de avaliação, o orientador mostrou-nos como funcionava a correção das provas de

frequência realizadas pelos alunos, explicando o sistema de cotações utilizado para pontuar

as traduções, tarefa que oferecia mais complexidade.

CAPÍTULO IV - OS MANUSCRITOS DOS ESCRITORES E A CRÍTICA TEXTUAL COMO

INSTRUMENTOS DIDÁTICOS

IV.1 - O contributo da crítica textual para a didática da língua e da literatura

Para além da descrição dos trabalhos desenvolvidos durante a Prática do Ensino

Supervisionada, sob uma perspetiva reflexiva do ato de ensinar, o relatório de estágio

constitui-se também como ponto de partida para uma reflexão teórica. Neste sentido, o

tópico da minha pesquisa incidiu sobre os contributos que poderão advir da articulação

entre duas áreas científicas distintas: a crítica textual e a didática. Esta motivação partiu das

experiências, ainda incipientes, que desenvolvi em ambas. No campo da didática, esses

conhecimentos restringiram-se aos seminários que frequentei durante o mestrado que me

muniram de um manancial teórico indispensável para uma prática do ensino supervisionada

fundamentada. No campo da crítica textual, obtive algumas noções teóricas na Oficina de

Edições do Professor Ivo de Castro, a qual frequentei com o intuito de me revestir das

ferramentas teóricas essenciais para o trabalho de edição crítica que desenvolvo no espólio

de Vergílio Ferreira. A minha integração neste projeto ocorreu durante a licenciatura,

através da atribuição de uma bolsa de investigação pela FCT, pela qual fui integrada no

CEIL na equipa de edição do espólio deste escritor. Assim que comecei a desenvolver o

meu trabalho, questionei-me se os manuscritos dos escritores e as práticas utilizadas na

edição de texto poderiam ser relacionados com o ensino do Português. Antes de iniciar o

estágio, tinha já pesquisado sobre alguns pressupostos teóricos neste campo. Contudo, a

didática requeria uma prática, para que os seus avanços metodológicos se baseassem em

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dados concretos. Portanto, nesta fase, ainda não poderia ter uma noção concreta do meu

estudo, algo que só seria possível com a experiência que obtive, durante o estágio, na

ESJGF, ainda que esse trabalho se tenha revestido de um caráter puramente experimental.

O principal objetivo da crítica textual é restituir, o mais possível, os textos à sua

forma original, isto é, à criação original do seu autor. Segundo as palavras do Professor Ivo

de Castro, a edição de texto poderá ser definida como escrita realizada sobre escrita, na

medida em que reproduz as várias fases redacionais de um texto. O critério para estabelecer

a versão definitiva, tenta, ao máximo, respeitar a vontade manifestada pelo autor,

interpretando-se como sua vontade a última intervenção que o texto sofreu pela sua mão.

As variantes excluídas dos testemunhos existentes reúnem-se no aparato crítico. Assim, o

texto poderá desmistificar-se do seu estatuto de produto acabado, ao mesmo tempo que

surge como um processo mutável no tempo e no espaço. Muitas vezes, julgamos ler um

texto de um autor, mas, para além disso, estamos também a ler a interpretação ou a leitura

de um editor. O objetivo da crítica textual não é, portanto, interpretar, mas permitir que os

outros formulem interpretações a partir de dados concretos e objetivos. Neste sentido, o que

a crítica textual permite é tornar público aquilo que outrora fora privado, constituindo-se

como um ferramenta fundamental dos estudos literários, linguísticos, históricos e culturais.

Em França, vários investigadores tentaram verificar de que forma os manuscritos

dos escritores e os rascunhos, objetos da crítica textual, se poderiam constituir como

ferramentas didáticas. Por um lado, a observação destes materiais pelos alunos permite que

estes reconheçam a escrita como um processo e não apenas como um produto acabado. Ao

mesmo tempo, os alunos identificam as dificuldades encontradas por escritores canónicos,

através das suas rasuras, das suas modificações e das suas dúvidas27

. A familiarização

visual com estas intervenções textuais poderá levar o aluno a encarar o ato de escrita como

um processo reflexivo, afastando-o da ideia de inspiração superior. Obviamente, não se

espera que o aluno seja como o escritor, exigindo-lhe as mesmas virtudes artísticas, técnicas

e culturais, mas admite-se a possibilidade de o aluno ser o sujeito de escrita, tal como o é o

próprio escritor. Ser o sujeito da sua escrita implica que o aluno pratique este processo de

forma reflexiva e consciente e, sobretudo, contraria a existência de um modelo de bem-

escrever a priori, já que a inscrição do sujeito supõe uma dimensão subjetiva.

Reconhecendo esta subjetividade, o professor adotará uma postura menos rígida e menos

27 Se procurer la copie d’un avant-texte d’écrivain, en faire un transparent, le projeter devant sa classe, et se

voir, le plus souvent, agréablement surpris par les commentaires des élèves, ravis de ne pas être les seuls à

peiner pour écrire, puisque Balzac, Flaubert ou Proust ont eux aussi hésité, raturé? (Fabre-Cols; 2004:17)

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normativa em relação à produção textual dos seus alunos; ou seja, não só os alunos, como

também os professores adotarão uma postura mais aberta, não se restringindo ao seu

policiamento, ainda que este seja indispensável, podendo a sua inexistência provocar o caos

na aprendizagem.28

Desta forma, não se espera que, a partir da observação e análise dos

manuscritos dos escritores, os alunos encontrem a fórmula mágica para a eficácia absoluta

da competência escrita. Contudo, como refere Fabre-Cols, a inspiração e o dom, ainda que

existentes, não são os operantes únicos no trabalho de escrita29

.

Pela observação e análise dos manuscritos e pela reflexão que tal tarefa suscita, os

alunos poderão estar aptos a adquirir uma metacognição da escrita, na medida em que criam

uma perceção do seu processo. Escrever envolve vários níveis linguísticos: sintático,

lexical, pragmático e semântico. Reconhecer a importância do rascunho possibilita, assim,

que os alunos possam autocorrigir-se mais frequentemente. No entanto, esta correção não

incidirá apenas sobre as incorreções ortográficas ou sobre as incongruências semânticas, as

vertentes mais exploradas da língua em contexto escolar, possibilitando também uma

consciência da dimensão pragmática do texto e de processos mais complexos como a

coesão e a coerência textuais, complexificando a sua dimensão semântica. Isto é, o texto é

produzido como um todo e não apenas como a junção de estruturas sintáticas. Para além

disso, estas tarefas de revisão e modificação podem envolver-se numa atividade de

enriquecimento vocabular. Tomemos o exemplo que Oriol-Boyer aponta a propósito de

Flaubert. Nos manuscritos do escritor francês, é evidente um trabalho de expansão

vocabular, na medida em que certos substantivos são usados como prescrições para que o

escritor, posteriormente, enriqueça o seu texto com a introdução de adjetivos, como se

verifica no caso de “portrait physique” (Oriol-Boyer; 2003: 36). Os escritores canónicos

poderão exercer uma influência positiva nos alunos, na medida em que as suas tarefas

preparatórias os sensibilizam para a necessidade de associar a escrita à tarefa de

planificação, mas, sobretudo, à tarefa de revisão. Nesta medida, o escritor torna-se leitor:

mettre en évidence le fait qu’écrire c’est réécrire, mais que c’est lire. (…) Faire lire pour

écrire et écrire pour mieux lire (Oriol-Boyer; 2003:87). O aluno não só se torna leitor de si

28 Pour l’enseignant cela signifierait qu’à côté de son rôle normatif indispensable, il adopte une attitude plus

ouverte, d’observation et d’interprétation. Lisant les textes d’enfants comme on peut lire des manuscrits d’écrivains, un tel enseignant serait susceptible d’accompagner l’écriture comme processus, et pas seulement

capable de juger d’un texte final. Il semble que nous n’en sommes pas là.(Fabre-Cols; 2004:17)

29 Toutefois, ce brin de rationalité a peut-être rendu enseignants et élèves moins fatalistes, moins désarmés

en la matière (…) L’observation de manuscrits d’écrivains atteste qu’en composant, les plus fameux d’entre

eux ont hésité, cherché, quelquefois renoncé (…) cette observation bouleverse sacralisantes d l’écriture.

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próprio e dos colegas como se torna um leitor mais competente dos outros escritores. É a

partir deste ponto que se infere a possibilidade de a crítica textual se instituir também como

um instrumento didático no ensino da literatura. Por um lado, a observação dos manuscritos

e dos avant-textes dos escritores constituem-se como uma abordagem mais complexa de o

aluno encarar o ato de escrita, permitindo um aprofundamento que poderá fazer com que o

este escreva melhor, ou pelo menos, que este tente escrever melhor, familiarizando-o com

esta prática, tantas vezes tida como uma competência quase inata e, por isso, negligenciada

na aula de Português. Por outro lado, é através da crítica textual que também podemos

estudar a poética de um autor, pois é a partir das suas edições críticas que poderemos

aprofundar as nossas leituras e interpretações da sua obra.

Tomarei como exemplo o caso de Fernando Pessoa, cuja obra extensíssima e de

natureza complexa tem vindo a ser, desde há décadas, uma das principais prioridades da

crítica textual no panorama português. Em Vida e Obra de Fernando Pessoa, Gaspar

Simões (Simões; 1987: 356) lembra que não devemos tomar à letra o poeta que admite não

haver nada em si do que possa legitimamente chamar-se uma evolução qualquer. Na

verdade, o crítico português infere, a partir da comparação de duas versões do poema

Ceifeira, a evolução poética de Pessoa, partindo de um conceito de lirismo clássico para o

seu próprio conceito de lirismo. A segunda versão do poema, publicada em 1924, na revista

Athena, em versão definitiva vem substituir o verso da primeira versão de 1914-1915, o que

em mim ouve está chorando… pelo verso o que em mim sente ‘stá pensando…. Esta

modificação comprova uma evolução poética, na medida em que na primeira versão existe

um lirismo das emoções, que, segundo Gaspar Simões (1987: 356-359), ainda se reveste de

um certo Paúlismo, enquanto na segunda versão, assistimos à intelectualização das

emoções verificada na lírica pessoana: a sensação (ouvir) não provoca já uma emoção que

irrompe em choro, mas surge, agora, intelectualizada: o que em mim sente ‘stá pensando. A

partir desta comparação, os alunos poderão reconhecer não só a evolução poética de

Fernando Pessoa, fruto de um aperfeiçoamento constante, bem como comprovar a

influência que as leituras feitas pelo poeta acabam por ser uma das principais fixações da

sua obra30

. É, pois, através da crítica textual que se pode comprovar e aprofundar o estudo

de um poeta que tantas vezes, na escola, só conhecemos pela sua carta a Adolfo Casais

30 Recentemente, Jerónimo Pizarro, Antonio Cardiello e Patricio Ferrari publicaram uma obra intitulada A

biblioteca particular de Fernando Pessoa que reúne o acervo da biblioteca do poeta, devidamente catalogado,

permitindo, assim, uma aproximação entre leitura e criação.

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Monteiro, em que o próprio Pessoa nos explica a origem dos seus heterónimos31

. É devido a

esta visão, na qual ingenuamente se acredita, que muitas vezes nos limitamos a catalogar

Fernando Pessoa como um génio inspirado32

.Porém, o poeta não foi apenas um génio, mas

um artista que trabalhava arduamente e lia compulsivamente outros autores. Podemos ler

tanto e trabalhar tanto como o poeta que dificilmente conseguiremos criar uma obra como a

sua. Contudo, lembro que a crítica textual não tem como objetivo prescrever receitas, por

isso, utilizar a crítica textual como objeto didático também não pretende criar poetas e

romancistas, mas, sim, escritores competentes e leitores críticos e reflexivos. Formando

leitores reflexivos, capazes de julgar, interpretar dados, inferir e escolher sentidos, estamos

também a formar leitores capazes de “ler” o mundo e a vida.

IV.2 - A visita à oficina do escritor Vergílio Ferreira

Como referi anteriormente, em conjunto com a Professora Olívia Reis, levei a cabo

uma atividade no âmbito do tópico de reflexão deste relatório. Embora tenha decorrido

como um evento de natureza informal, esta atividade permitiu-me chegar a diversas

conclusões.

O conto “A Palavra Mágica”, de Vergílio Ferreira está previsto, pelo Programa de

Português como um dos conteúdos literários para o 9º ano de escolaridade. Estava, assim,

encontrada uma circunstância que me permitia introduzir os alunos numa visita à oficina

deste escritor.33

Num primeiro momento, apresentei o escritor aos alunos, através de uma

espécie de fotobiografia, complementada por excertos textuais biográficos, retirados de

Conta-Corrente e do romance Manhã Submersa. Os alunos mostraram muita curiosidade e

simpatia pelo escritor. Num segundo momento, dei a conhecer aos alunos o método de

trabalho do escritor, referenciando os materiais e métodos utilizados: 1) os materiais de

escrita (tintas, papéis); 2) a caracterização do suporte textual, as folhas brancas, preenchidas

31 Num dia em que finalmente desistira – foi em 8 de Março de 1914 – acerquei-me de uma cómoda alta, e

tomando um papel, comecei a escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e tantos

poemas a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não conseguirei definir. Foi o dia triunfal da minha vida,

e nunca poderei ter outro assim (Pessoa; 1999:343) 32 A propósito deste passo célebre, deve-se referir o importante estudo de Ivo Castro (Editar Pessoa) para a

desmistificação desta ideia, nomeadamente o capítulo intitulado “O corpus de O Guardador de Rebanhos,

depositado na Biblioteca Nacional.” 33 Os materiais utilizados para esta sessão pertencem ao espólio do escritor, que está depositado na Biblioteca

Nacional, sob consulta reservada, cuja reprodução tem de ser autorizada pelos detentores do espólio. Por este

motivo, não será possível incluir, nos anexos deste relatório, as imagens e outros documentos referenciados

nesta oficina.

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por uma letra minúscula, sem margens, que o escritor apelida de chuvinha de palavras

microscópicas, em que uma face era deixada em branco, deixando espaço para intervenções

futuras; 3) a criação de desenhos, listas, esboços; 4) uma foto do seu ambiente de trabalho,

reconstituído na Biblioteca Municipal de Gouveia, onde estão expostos os objetos que

rodeavam o escritor (a poltrona, a tábua, a manta e o candeeiro), referindo a sua antipatia

por máquinas de escrever e secretárias (Cf. Anexo 30). Partindo de uma perspetiva mais

familiar, os alunos foram introduzidos no processo de criação do escritor. Foram dados

vários exemplos em que o escritor se socorreu da fotografia e outros suportes visuais e

auditivos que o ajudavam na descrição do espaço e das personagens. A partir da observação

de uma fotografia de uma casa junto à praia das Azenhas do Mar (Cf. Anexo 30), que ainda

hoje se conserva, os alunos foram confrontados com a leitura de um excerto do romance

Cântico Final, ficando impressionados com as semelhanças existentes. Para a escrita desse

romance, cuja protagonista é uma bailarina, o escritor sentiu necessidade de assistir a um

espetáculo do Lago dos Cisnes, em cujo panfleto surgem vários rabiscos e notas, o que

poderá ter contribuído para uma descrição mais viva dos movimentos da personagem. A

escolha dos títulos dos romances constituía-se também como uma tarefa complicada para o

escritor, tendo algumas folhas de rosto sido completamente preenchidas por hipóteses de

títulos. Os alunos ficaram bastante impressionados com estas revelações, supondo que a

tarefa de escrita para estes “escritores conhecidos” fosse algo mais automático e menos

trabalhoso. Julgo que o interesse excecional destes alunos durante a sessão foi motivado

pela prática frequente de escrita a que a Professora Olívia os tinha vindo a habituar no

decurso das suas aulas, revelando estes alunos um fascínio pela escrita bastante invulgar

nos adolescentes.

Após esta visita, foram mobilizados os conhecimentos dos alunos da sua leitura do

conto “A Palavra Mágica”, para os introduzir numa pequena tarefa de edição crítica (Cf.

Anexo 29). Comparando o manuscrito do conto com a sua versão final, os alunos fizeram o

levantamento de algumas diferenças registadas: substituição de nomes de personagens e

outras expressões que foram melhoradas para uma linguagem de registo menos regional.

Curiosamente, os alunos verificaram que o vocábulo-chave do conto “mágica” fora

substituída, no decurso do texto, pela palavra “milagrosa”. Os alunos analisaram ainda a

frase final em que o escritor substituiu “uma desforra integral” por “ter mais tento na

língua”, que acaba por se adequar mais ao conteúdo da narrativa. Para esta tarefa, os alunos

foram familiarizados com a simbologia usada no aparato crítico, usada nas edições críticas

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de Vergílio Ferreira, que dei a mostrar os alunos, nomeadamente as edições críticas de A

curva duma vida (Ferreira; 2010) e Promessa (Ferreira; 2010).

No final da sessão, lancei um desafio à turma, embora sem perspetivas de que os

alunos o viessem a aceitar de forma tão entusiasta. Um pouco espontaneamente, propus-

lhes que tentassem eles próprios elaborar um pequeno conto, para o qual construíssem o seu

dossiê genético, conceito que engloba todos os materiais de escrita preparatória de um texto

final. Esta proposta não apresentava nenhum objetivo formal de avaliação, pois apenas

visava sugerir uma nova metodologia de escrita como processo e não como produto

automático da imaginação. Os resultados foram impressionantes e até hoje ainda não tive

capacidade de valorizar, tal como mereciam ser valorizados, os manuscritos dos alunos,

através da sua análise e edição crítica. Os alunos destas duas turmas escreveram cerca de

cinquenta e cinco contos, alguns deles com dezenas de páginas, onde, para além da versão

final, incluíram rascunhos, fotografias, imagens e desenhos, imitando um pouco o que

viram do escritor Vergílio Ferreira. Os suportes eram variados e alguns dos alunos não

incluíram nenhum rascunho. Esta diversidade de suportes comprova a diversidade de

métodos individuais e subjetivos que estão implicados num ato de criação como é o da

escrita. Pelo resultado final, pude constatar que os alunos se empenharam muito nesta

atividade, chegando alguns a fazer pesquisas exaustivas sobre locais e personagens.

Entretanto, perdi o contacto com esses alunos e também com a Professora Olívia.

Desde a realização desta atividade, passaram dois anos letivos, o que me leva a supor que a

maioria dos alunos esteja a frequentar o 11º ano. Com certeza, seria curioso observar a

forma como os alunos reagiriam ao lerem novamente os seus textos. Como salienta Read

(2010: 148), à medida que a criança cresce, vai reprimindo a sua criatividade, tentando

fazer corresponder a sua criação aos modelos aceites e propostos pelos adultos. Esta quebra

da “inocência”, que acontece em tão pouco tempo, levou-me a concluir que a infância é o

melhor estádio para a aprendizagem; é na infância que a imaginação, a criatividade e a

espontaneidade se manifestam mais, fecundando abundantemente a semente da

aprendizagem que o professor lança, esperando criar uma árvore frondosa que dê mais vida

ao mundo.

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CONCLUSÃO

Neste relatório, procedi a uma descrição dos trabalhos que envolveram a minha

prática letiva quer no estágio de Português quer no estágio de Latim. Para além disso, incluí

ao longo da escrita deste trabalho uma reflexão acerca das metodologias e estratégias

utilizadas, dos materiais didáticos concebidos e das circunstâncias em que decorreram as

atividades. Escrever permitiu-me organizar, fundamentar, delinear ideias para o futuro e,

sobretudo, desenhar uma prática reflexiva docente.

Através do aprofundamento das leituras e pesquisas, foi possível corroborar com

mais firmeza a articulação que se pode estabelecer entre a crítica textual e a didática,

concluindo que os manuscritos dos escritores e todo o trabalho preparatório que antecede

um texto final podem ajudar os alunos não só a ter uma relação mais consistente com o ato

de escrita, bem como a aprofundar os seus conhecimentos linguísticos e literários. No

momento inicial deste projeto, julguei que a crítica textual se poderia constituir como

instrumento didático, apenas pelo facto de permitir aos alunos um desenvolvimento da sua

competência no ato de escrever. No entanto, ao longo da minha pesquisa, pude verificar que

a crítica textual não deve servir como uma receita que garante a eficácia absoluta dos

alunos, mas antes os envolve numa dimensão crítica e reflexiva do ato de escrever. Para

além disso, se no início julguei que a crítica textual se relacionava apenas com a escrita,

uma pesquisa mais aprofundada permitiu-me verificar que, pelos problemas teóricos que

colocam, os manuscritos e as versões de um texto constituem-se igualmente como uma

ilustração cultural e como um objeto de estudo da poética dos autores e da história da

literatura.

Através da reflexão que envolveu a produção deste relatório, foi possível proceder a

uma autoanálise, tarefa que deve sempre envolver a prática docente, na medida em que me

permite refletir sobre os erros cometidos, reforçar as estratégias eficazes e atualizar,

constantemente, os conhecimentos, construindo qualidades do ponto de vista profissional,

científico e humano.

Este trabalho serviu também como um balanço de toda a minha atividade académica

que decorreu durante o ano letivo 2010/2011, podendo concluir e reconhecer as excelentes

condições de que usufrui no estágio de Português, na Escola Secundária José Gomes

Ferreira.

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55

ANEXOS

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ANEXO 1 – Powerpoint – A prosódia - PORTEC

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ANEXO 2 – Ficha de Trabalho – A Prosódia - PORTEC

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ANEXO 3 – Powerpoint – Semântica Lexical - PORTEC

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ANEXO 4 – Ficha de Trabalho – A semântica lexical - PORTEC

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ANEXO 5 – Texto utilizado para a ficha de semântica lexical – PORTEC

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ANEXO 6 - Planificação da aula – Funções Sintáticas – PORTEC

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ANEXO 7 - Ficha de trabalho – Funções Sintáticas – PORTEC

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ANEXO 8 - Ficha de trabalho – Orações Complexas – PORTEC

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ANEXO 9 – Powerpoint – O Romantismo e o Classicismo

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ANEXO 10 - Ficha de trabalho – O Romantismo e o Classicismo

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ANEXO 11 - Ficha de trabalho – Ato I de Frei Luís de Sousa (1ª aula)

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ANEXO 12 - Planificação de aula – Ato I de Frei Luís de Sousa (2ª aula)

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ANEXO 13 - Ficha de trabalho – Ato III de Frei Luís de Sousa

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ANEXO 14 - Planificação da última aula de Frei Luís de Sousa

.

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ANEXO 15 - Ficha informativa – O sebastianismo em Frei Luís de Sousa

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ANEXO 16 - Teste de Avaliação da unidade nº3

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ANEXO 17 - Plano de aula – O contexto da poesia de Cesário Verde

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ANEXO 18 - A biografia de Cesário Verde por Maria Júlia

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ANEXO 19 - Powerpoint – O contexto da poesia de Cesário Verde

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ANEXO 20 – Ficha de trabalho – O contexto da poesia de Cesário Verde

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ANEXO 21 - Ficha de trabalho – Análise do poema “De Tarde”

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ANEXO 22 - Ficha de trabalho – Análise do poema “O Sentimento dum Ocidental”

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ANEXO 23 - Teste de Avaliação da unidade nº5

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ANEXO 24 – Análise dos contos escritos pelos alunos : “Um pintor na China Antiga”

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ANEXO 25 - Cronograma das aulas de Latim

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ANEXO 26 - Ficha de trabalho de Latim : Fábula de Fedro

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ANEXO 27 – Planificação de uma aula de Latim: Futuro Imperfeito

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ANEXO 28 – Ficha de trabalho de Latim: Futuro Imperfeito

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Anexo 29 - Guião da Visita à Oficina de Vergílio Ferreira

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ANEXO 30 – Fotografias

Fotografia1: Biblioteca Municipal Vergílio Ferreira (tirada em Gouveia, 2010)

Fotografia 2: Casa das Azenhas do Mar (projetada por Raul Lino).