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COMANDO DA AERONÁUTICA CENTRO DE INVESTIGAÇÃO E PREVENÇÃO DE ACIDENTES AERONÁUTICOS RELATÓRIO FINAL A - 582/CENIPA/2014 OCORRÊNCIA: ACIDENTE AERONAVE: PR-TKB MODELO: ATR 42-500 DATA: 06JAN2012

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COMANDO DA AERONÁUTICA

CENTRO DE INVESTIGAÇÃO E PREVENÇÃO DE ACIDENTES AERONÁUTICOS

RELATÓRIO FINAL

A - 582/CENIPA/2014

OCORRÊNCIA: ACIDENTE

AERONAVE: PR-TKB

MODELO: ATR 42-500

DATA: 06JAN2012

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ADVERTÊNCIA

Em consonância com a Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986, Artigo 86, compete ao

Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos – SIPAER – planejar, orientar,

coordenar, controlar e executar as atividades de investigação e de prevenção de acidentes

aeronáuticos.

A elaboração deste Relatório Final, lastreada na Convenção sobre Aviação Civil

Internacional, foi conduzida com base em fatores contribuintes e hipóteses levantadas, sendo um

documento técnico que reflete o resultado obtido pelo SIPAER em relação às circunstâncias que

contribuíram ou que podem ter contribuído para desencadear esta ocorrência.

Não é foco do mesmo quantificar o grau de contribuição dos fatores contribuintes,

incluindo as variáveis que condicionam o desempenho humano, sejam elas individuais,

psicossociais ou organizacionais, e que possam ter interagido, propiciando o cenário favorável ao

acidente.

O objetivo único deste trabalho é recomendar o estudo e o estabelecimento de

providências de caráter preventivo, cuja decisão quanto à pertinência e ao seu acatamento será de

responsabilidade exclusiva do Presidente, Diretor, Chefe ou correspondente ao nível mais alto na

hierarquia da organização para a qual são dirigidos.

Este relatório não recorre a quaisquer procedimentos de prova para apuração de

responsabilidade no âmbito administrativo, civil ou criminal; estando em conformidade com o item

3.1 do “attachment E” do Anexo 13 “legal guidance for the protection of information from safety

data collection and processing systems” da Convenção de Chicago de 1944, recepcionada pelo

ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto n º 21.713, de 27 de agosto de 1946.

Outrossim, deve-se salientar a importância de resguardar as pessoas responsáveis pelo

fornecimento de informações relativas à ocorrência de um acidente aeronáutico, tendo em vista que

toda colaboração decorre da voluntariedade e é baseada no princípio da confiança. Por essa

razão, a utilização deste Relatório para fins punitivos, em relação aos seus colaboradores, além de

macular o princípio da "não autoincriminação" deduzido do "direito ao silêncio", albergado pela

Constituição Federal, pode desencadear o esvaziamento das contribuições voluntárias, fonte de

informação imprescindível para o SIPAER.

Consequentemente, o seu uso para qualquer outro propósito, que não o de prevenção de

futuros acidentes, poderá induzir a interpretações e a conclusões errôneas.

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SINOPSE

O presente Relatório Final refere-se ao acidente com a aeronave PR-TKB, modelo ATR 42-500, ocorrido em 06JAN2012, classificado como com pessoal em voo.

Durante a descida para o pouso, a tripulação realizou manobras para evitar um conflito de tráfego aéreo, de acordo com o TCAS Resolution, causando ferimentos (fratura óssea) em uma passageira que estava em pé.

A tripulação e os demais passageiros saíram ilesos.

A aeronave não teve danos.

Foi designado representante acreditado do Bureau d'Enquêtes et d'Analyses (BEA).

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ÍNDICE

GLOSSÁRIO DE TERMOS TÉCNICOS E ABREVIATURAS ............................................. 5

1. INFORMAÇÕES FACTUAIS. ......................................................................................... 6

1.1. Histórico do voo. ............................................................................................................ 6

1.2. Lesões às pessoas. ....................................................................................................... 6

1.3. Danos à aeronave. ........................................................................................................ 6

1.4. Outros danos. ................................................................................................................ 6

1.5. Informações acerca do pessoal envolvido. .................................................................... 6

1.5.1. Experiência de voo dos tripulantes. .......................................................................... 6

1.5.2. Formação. ................................................................................................................ 7

1.5.3. Categorias das licenças e validade dos certificados e habilitações. ........................ 7

1.5.4. Qualificação e experiência no tipo de voo. ............................................................... 7

1.5.5. Validade da inspeção de saúde. .............................................................................. 7

1.6. Informações acerca da aeronave. ................................................................................. 7

1.7. Informações meteorológicas. ........................................................................................ 7

1.8. Auxílios à navegação. ................................................................................................... 7

1.9. Comunicações. .............................................................................................................. 7

1.10. Informações acerca do aeródromo. ........................................................................... 10

1.11. Gravadores de voo. ................................................................................................... 10

1.12. Informações acerca do impacto e dos destroços. ..................................................... 10

1.13. Informações médicas, ergonômicas e psicológicas. ................................................. 10

1.13.1. Aspectos médicos. ................................................................................................ 10

1.13.2. Informações ergonômicas..................................................................................... 10

1.13.3. Aspectos Psicológicos. ......................................................................................... 10

1.14. Informações acerca de fogo. ..................................................................................... 12

1.15. Informações acerca de sobrevivência e/ou de abandono da aeronave. ................... 12

1.16. Exames, testes e pesquisas. ..................................................................................... 12

1.17. Informações organizacionais e de gerenciamento. ................................................... 12

1.18. Informações operacionais. ........................................................................................ 13

1.19. Informações adicionais. ............................................................................................. 13

1.20. Utilização ou efetivação de outras técnicas de investigação. .................................... 16

2. ANÁLISE. ..................................................................................................................... 16

3. CONCLUSÃO. .............................................................................................................. 22

3.1. Fatos. .......................................................................................................................... 22

3.2. Fatores contribuintes. .................................................................................................. 23

4. RECOMENDAÇÃO DE SEGURANÇA ........................................................................ 26

5. AÇÃO CORRETIVA OU PREVENTIVA JÁ ADOTADA. .............................................. 26

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GLOSSÁRIO DE TERMOS TÉCNICOS E ABREVIATURAS

ANAC Agência Nacional de Aviação Civil

ATCO Controlador de Tráfego Aéreo

ATS Air Traffic Services

CA Certificado de Aeronavegabilidade

CENIPA Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos

CG Centro de Gravidade

CHT Certificado de Habilitação Técnica

CIV Caderneta Individual de Voo

CM Certificado de Matrícula

CMA Certificado Médico Aeronáutico

GSO Gestor de Segurança Operacional

IFR Instrument Flight Rules

INFRAERO Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária

Lat Latitude

Long Longitude

METAR Meteorological Aerodrome Report

MGSO Manual de Gerenciamento de Segurança Operacional

MNTE Aviões Monomotores Terrestres

MLTE Aviões Multimotores Terrestres

NTSB National Transportation Safety Board

PCM Piloto Comercial - Avião

PPR Piloto Privado – Avião

PLA Piloto de Linha Aérea – Avião

RBHA Regulamento Brasileiro de Homologação Aeronáutica

RELPREV Relatório de Prevenção

RS Recomendação de Segurança

SBGR Indicativo de Localidade - Aeródromo de Guarulhos

SBJV Indicativo de Localidade - Aeródromo de Joinville

SERIPA V Quinto Serviço Regional de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos

SIPAER Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos

UTC Universal Time Coordinated

VFR Visual Flight Rules

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1. INFORMAÇÕES FACTUAIS.

Aeronave

Modelo: ATR 42-500 Operador:

Matrícula: PT-TKB TRIP Linhas Aéreas

Fabricante: ATR

Ocorrência

Data/hora: 06JAN2012 / 20:20 UTC Tipo(s):

Local: TMA - SP Com pessoal em voo

Lat. 23º40’12”S Long. 046º22’45”W

Município – UF: Guarulhos – SP

1.1. Histórico do voo.

A aeronave decolou do Aeródromo de Joinville, SC (SBJV), com destino ao Aeródromo de Guarulhos, SP (SBGR), para cumprir a programação do voo TIB5333.

Durante a realização do procedimento STAR RONUT1 em SBGR, cruzando o FL110, o equipamento TCAS da aeronave apresentou uma mensagem de TCAS Advisory seguida de TCAS Resolution.

A tripulação efetuou as manobras previstas para evitar o conflito de tráfego aéreo. Durante a manobra, uma passageira, que se encontrava em pé próximo ao banheiro, sofreu uma queda, vindo a lesionar-se.

Após o pouso, a passageira foi atendida pelo Posto Médico da INFRAERO em SBGR e foi encaminhada ao Hospital de Guarulhos, onde foram constatadas fraturas no pé e tornozelo direitos.

1.2. Lesões às pessoas.

Lesões Tripulantes Passageiros Terceiros

Fatais - - -

Graves - 1 -

Leves - - -

Ilesos 3 13 -

1.3. Danos à aeronave.

Não houve.

1.4. Outros danos.

Não houve.

1.5. Informações acerca do pessoal envolvido.

1.5.1. Experiência de voo dos tripulantes.

Horas Voadas

Discriminação Piloto Copiloto

Totais 23.000:00 3.800:00

Totais, nos últimos 30 dias 63:45 41:10

Totais, nas últimas 24 horas 02:30 02:30

Neste tipo de aeronave 267:25 2.557:20

Neste tipo, nos últimos 30 dias 63:45 41:00

Neste tipo, nas últimas 24 horas 02:30 02:30

Obs.: Os dados relativos às horas voadas foram fornecidos pelo operador da aeronave.

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1.5.2. Formação.

O piloto realizou o curso de Piloto Privado – Avião (PPR) no Aeroclube do Rio Grande do Sul, em 1972.

O copiloto realizou o curso de Piloto Privado – Avião (PPR) no Aeroclube de Votuporanga, em 2004.

1.5.3. Categorias das licenças e validade dos certificados e habilitações.

O piloto possuía a licença de Piloto de Linha Aérea – Avião (PLA) e estava com as habilitações técnicas de aeronave tipo ATR - 42, Multimotor Terrestre (MLTE) e voo por instrumentos (IFR) válidas.

O copiloto possuía a licença de Piloto de Linha Aérea – Avião (PLA) e estava com as habilitações técnicas de aeronave tipo ATR - 42, Multimotor Terrestre (MLTE) e voo por instrumentos (IFR) válidas.

1.5.4. Qualificação e experiência no tipo de voo.

Os pilotos estavam qualificados e possuíam experiência no tipo de voo.

1.5.5. Validade da inspeção de saúde.

Os pilotos estavam com os Certificados de Capacidade Física (CCF) válidos.

1.6. Informações acerca da aeronave.

A aeronave, de número de série 610, foi fabricada em 2001.

O Certificado de Aeronavegabilidade (CA) estava válido.

As cadernetas de célula, motor e hélice estavam com as escriturações atualizadas.

A última inspeção da aeronave, do tipo “Check 4A”, foi realizada em 29OUT2011 pela oficina da própria empresa, em Belo Horizonte, MG, estando com 304 horas e 44 minutos voadas após a inspeção.

A última revisão da aeronave, do tipo “Check C”, foi realizada em 22JUN2010 pela oficina da própria empresa, em Belo Horizonte, MG, estando com 4.273 horas e 42 minutos voadas após a revisão.

1.7. Informações meteorológicas.

Nada a relatar.

1.8. Auxílios à navegação.

Nada a relatar.

1.9. Comunicações.

O voo, procedente de SBJV, ingressou na Área Terminal de São Paulo pelo Setor Sudoeste com destino a SBGR. Este voo prosseguia via posição ASONO, no FL230.

Segundo a Carta de Acordo Operacional (CAOP), de 05MAR2010, que envolve o Centro de Controle de Curitiba (ACC-CW) e o Controle de Aproximação de São Paulo (APP-SP), as aeronaves com destino a Guarulhos devem ser orientadas pelo ACC para a Rota de Chegada Padrão (STAR) em uso no momento.

Quanto ao tipo de autorização, cabe ressaltar que o APP pode autorizar que a aeronave cumpra a STAR realizando a navegação lateral e vertical respeitando os limites de altitude constantes na Carta até o nível de voo previsto na carta na autorização (nesse caso, usa-se o termo “Via Chegada”).

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Cabe ao piloto realizar a navegação horizontal e vertical, respeitando os limites de nível/altitude da carta, até o nível/altitude da autorização. Ao atingir o limite da autorização, o Controle pode definir outra autorização com um novo nível/altitude.

Outro tipo de autorização seria o uso do termo “Chegada” – com o cancelamento explícito dos limites de nível/altitude de certo trecho da STAR, por exemplo: “Chegada RONUT 1, desça até o nível 100, cancelada a restrição de nível mínimo em LOVE”.

Ainda voando na área de responsabilidade do Centro de Controle de Curitiba (ACC-CW), os tripulantes da aeronave indagaram qual seria a STAR para aproximação em SBGR.

O ACC-CW entrou em coordenação com o APP-SP, antes da transferência de controle e comunicações e o APP-SP informou ao ACC-CW que a aeronave deveria interceptar a STAR, ainda não informada, na posição ASONO.

Neste momento, houve um equívoco na coordenação por parte do APP-SP, pois não havia qualquer publicação de STAR para Guarulhos que se iniciava na posição ASONO.

O áudio das comunicações entre o ACC-CW com o TIB5333 deixa claro que o ACC-CW informou a STAR RONUT 1 (figura 1) como sendo a prevista em Guarulhos.

Antes da transferência de controle do TIB5333 pelo ACC-CW para o APP-SP, foi necessária a coordenação entre esses dois órgãos, por meio de telefonia fixa, para que o APP-SP pudesse ratificar a STAR prevista e o ponto em que o TIB5333 iria interceptar a Chegada para SBGR. O APP-SP, então, confirmou ao ACC-CW que a STAR prevista era a RONUT 1.

Depois de realizada a coordenação, já sob a responsabilidade do APP-SP (utilizando-se do Sistema de Vigilância ATS), o TIB5333 foi indagado pelo Controlador de Tráfego Aéreo (ATCO) do APP-SP se a aeronave teria condições de prosseguir direto para a posição GURU (ponto específico na STAR situado na parte intermediária da STAR – ver figura 1), visando encurtar a trajetória inicial da STAR RONUT 1, que era a chegada prevista para SBGR, ao mesmo tempo em que sequenciava esta aeronave dentro da Terminal São Paulo.

Ao receber a resposta afirmativa por parte do TIB5333, o ATCO do APP-SP autorizou a aeronave voar para a Posição GURU.

Cabe destacar que em nenhum momento o APP-SP deixou expresso o nome da STAR (RONUT 1) e qual era a autorização a partir da posição GURU, ou seja, se o TIB5333 estaria autorizado a prosseguir no perfil da STAR realizando a navegação lateral e vertical até o nível de voo ou altitude autorizada pelo órgão ATC, cumprindo as restrições de nível/altitude mínimo constantes na carta informada (VIA CHEGADA), ou se a aeronave estava autorizada a executar a STAR, desconsiderando apenas a restrição de nível mínimo prevista para um determinado ponto, descendo para o FL ou altitude autorizada, mantendo as demais restrições previstas nesse procedimento (CHEGADA).

Enquanto voava na proa de GURU, o TIB5333 foi autorizado, pelo APP-SP, a descer para os níveis 180, 150 e, finalmente, o 120.

Ainda segundo a transcrição da conversa entre os pilotos do TIB 5333 e o Controle de Tráfego Aéreo, houve dúvidas quanto ao entendimento das orientações de descida por parte do TIB5333.

Ao receber a orientação do controle para, em GURU, reinterceptar a chegada, o TIB5333 coteja na sequência: ”Afirmativo, após Guru mantém o perfil da chegada”.

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Figura 1 - STAR RONUT 1

Os termos “Reinterceptar a Chegada” e “Manter o Perfil”, utilizados pelo ATCO do APP-SP e pelo TIB5333, respectivamente, não estavam previstos na fraseologia padrão da ICA 100-12. Caberia, ainda, ao ATCO do APP-SP, questionar ou reorientar o TIB533 após uso de fraseologia não prevista, o que não ocorreu.

Após passar a posição GURU, o copiloto, que estava na condição de PF no momento, continuou descendo abaixo da restrição do FL120.

Ao interceptar a STAR RONUT 1 na Posição GURU, o TIB5333 não cumpriu a instrução emitida pelo APP-SP em relação a sua descida ao FL 120. Deixou de observar, também, a restrição do FL120 no trecho entre as posições GURU e LOVE prevista na STAR RONUT 1.

Ao cruzar o FL117, o TIB5333 foi alertado pelo APP-SP da existência de uma aeronave que era tráfego essencial em ascensão para o FL100.

Apesar disto, o TIB5333 continuou sua descida, quando, por já ter passado o FL120, foi reorientado pelo APP-SP a manter o FL110, em função da proximidade com o tráfego GOL1516 que executava o procedimento de saída de Congonhas em ascensão para o FL100.

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O comandante questionou, já quase no FL110, se deveria manter o FL120 (já ultrapassado) e informou que estava “Via Chegada”.

Apesar de o TIB5333 não ter cumprido a restrição do FL 120, houve tempo hábil para que as coordenações entre os setores do APP-SP fossem realizadas.

Logo após a aeronave nivelar no FL110, a visualização radar mostrou uma variação de subida de quase 500 pés sem qualquer orientação por parte do APP-SP.

Não houve qualquer informação ao APP-SP sobre o cumprimento de manobra evasiva do TCAS do TIB5333 ou do GLO1516.

1.10. Informações acerca do aeródromo.

A ocorrência se deu fora de aeródromo.

1.11. Gravadores de voo.

Devido ao fato de a Ação Inicial ter sido iniciada apenas alguns dias depois de ocorrido o acidente e da aeronave ter continuado o voo no mesmo dia, não foi possível recuperar os dados dos gravadores de voo.

1.12. Informações acerca do impacto e dos destroços.

Nada a relatar.

1.13. Informações médicas, ergonômicas e psicológicas.

1.13.1. Aspectos médicos.

Não pesquisado.

1.13.2. Informações ergonômicas.

Nada a relatar.

1.13.3. Aspectos Psicológicos.

Informações individuais

A tripulação possuía a formação prevista para exercer as suas funções. O comandante era um piloto experiente, possuía aproximadamente 23.000 horas de voo, realizadas em empresas de linha aérea. No modelo de aeronave que voava no momento do acidente contava com, aproximadamente, 300 horas.

O copiloto era mais experiente no modelo de aeronave que o comandante, possuindo 2.500 horas de voo nesse modelo. Sua experiência anterior era na aviação não regular, principalmente no norte do país.

A comissária trabalhava há um ano e três meses e já havia realizado três voos sozinha (sem outro comissário). Recebeu as alterações do manual de comissários para realizar voos com apenas um comissário por email e, até o momento do acidente, considerava ser “tranquilo” realizar a tarefa sozinha, pois, normalmente, isso ocorria nos voos com poucos passageiros a bordo.

Informações psicossociais

Aparentemente, a comunicação interpessoal na cabine estava reduzida ao mínimo necessário.

As comunicações do controle foram, parcialmente, absorvidas pelo copiloto e o comandante pode não ter monitorado este processo.

Sugere-se que houve uma baixa integração entre os membros da tripulação, como se a cabine fosse independente do restante da aeronave e as ocorrências não tivessem interferência uma nas outras.

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Os dois pilotos ainda não tinham passado pela experiência de ter voado com apenas uma comissária a bordo. Após a ocorrência (RA) que resultou em uma manobra mais brusca da aeronave não houve preocupação com as possíveis consequências para passageiros e demais tripulantes.

A tripulação não percebeu a gravidade do evento e iria prosseguir para a próxima etapa da escala. Seguiriam como se o evento fosse uma ocorrência rotineira. A tripulação foi retirada do voo depois de seguir as orientações do Setor de Safety da empresa.

Informações organizacionais

A decisão de passar a voar com apenas um comissário a bordo foi tomada de forma setorizada, e essa mudança não foi formalizada aos comandantes por meio de documentos formais.

Não foi realizado um gerenciamento do risco para a implantação da mudança, assim como não foram avaliados riscos com o fato de que o comissário poderia, por exemplo, ter uma incapacitação em voo, como quase ocorreu nesse caso em que a comissária precisou dar atenção a vitima e estava sozinha.

Não havia qualquer tipo de orientação aos pilotos de como proceder com este tipo de composição da tripulação.

Outro aspecto a ser ressaltado é que a empresa aérea estava passando por uma expansão nos últimos dois anos, provocando mudanças em função do crescimento, com dificuldades nos processos de comunicação entre os setores.

O Setor de Safety e a chefia de operações não tinham conhecimento do resultado de um questionário de diagnóstico organizacional aplicado aos tripulantes pela empresa terceirizada. O material audiovisual pertinente às aulas ministradas não se encontrava na empresa.

A empresa passava por reformulação de processos de treinamento, que envolviam a instrução operacional e o simulador. O treinamento operacional ocorria de forma descentralizada para os pilotos e comissários. Não foram identificados sistemas de acompanhamento do treinamento de comissários.

A empresa que prestou o serviço médico quando a aeronave chegou a Guarulhos era terceirizada pela administração aeroportuária e, de acordo com a investigação realizada, não possuía informações sobre o interior das aeronaves, dificultando uma ação mais rápida e adequada. Os médicos não possuíam conhecimentos de medicina aeroespacial e não conheciam as rotinas das empresas aéreas.

Quanto aos tripulantes, não houve um acompanhamento de suporte para o evento. O copiloto foi demitido alguns dias após a ocorrência.

A administração da empresa disse que apoiava as ações do Setor de Safety, porém, na prática, o setor estava bastante limitado em termos de pessoal e apoio, contando com um efetivo considerado pequeno.

O efetivo do Setor de Safety contava com cinco pessoas para, aproximadamente, 1.100 tripulantes (680 pilotos e 480 comissários).

Apenas uma pessoa no Setor de Safety foi designada como responsável pelo programa de resposta a crise e tinha a responsabilidade de acompanhar e dar treinamento para 87 bases. Uma empresa terceirizada foi contratada para suporte em caso de acionamento da sala de crise, mas não foi acionada neste evento.

O Gerente de Segurança Operacional, além de suas funções organizacionais, foi identificado como um dos poucos checadores da empresa, tanto em rota, como no

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simulador. Portanto, era constantemente requisitado para estas atividades, passando grande parte do seu tempo fora da empresa e do país.

1.14. Informações acerca de fogo.

Não houve fogo.

1.15. Informações acerca de sobrevivência e/ou de abandono da aeronave.

A vítima sofreu uma fratura no tornozelo e pé direitos. Após o pouso, uma pessoa que se apresentou como sendo da área médica, pediu que a passageira descesse sozinha, o que foi seriamente contestado por esta.

Na sequência dos fatos identificou-se que não havia equipamento adequado para retirá-la da aeronave, tendo-se que improvisar, com uma cadeira de rodas, sua retirada da aeronave.

Os profissionais da área médica, em entrevista durante a investigação, informaram desconhecer o layout daquela aeronave.

1.16. Exames, testes e pesquisas.

Nada a relatar.

1.17. Informações organizacionais e de gerenciamento.

Identificou-se durante a investigação deste acidente que o treinamento de CRM fornecido aos profissionais da empresa era provido por empresas terceirizadas. O treinamento ministrado aos comissários era diferente daquele ministrado aos pilotos, contrariando um princípio básico desta ferramenta que é o de permitir que todos os profissionais da organização trabalhem de forma harmônica, conjunta e eficiente.

Verificou-se, ainda, que a supervisão por parte da empresa em relação a estes treinamentos não era adequada. A supervisão teria permitido identificar que os objetivos propostos para o treinamento de CRM não estavam sendo atingidos.

É importante salientar que tal treinamento, quando aplicado de forma adequada, contribui também para o fortalecimento da cultura de segurança de voo.

Os Relatórios de Prevenção (RELPREV) elaborados pelos comissários passavam, obrigatoriamente, pela chefia do setor, o que contraria um dos quatro subcomponentes da cultura de segurança de voo – a cultura de reporte – na qual os profissionais sentem-se motivados para reportar quaisquer situações de risco, sem receios de sofrerem consequências por suas ações e compreenderem que essa é a maneira mais simples de participarem das atividades de prevenção. Em outras palavras, aqueles profissionais raramente preenchiam um RELPREV.

O Setor de Safety estava subdimensionado para o tamanho da organização. Eram apenas cinco profissionais para desempenhar todas as atividades de prevenção de acidentes e incidentes aeronáuticos, incluindo entre elas o gerenciamento de RELPREV, a investigação de incidentes aeronáuticos e ocorrências de solo, a realização de atividades educativas e promocionais voltadas à prevenção, e à supervisão de atividades realizadas por outros setores com impacto direto na segurança de voo como, por exemplo, o treinamento de CRM e o Gerenciamento do Risco relacionado à mudança em relação ao número de comissários a bordo.

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1.18. Informações operacionais.

A aeronave estava dentro dos limites de peso e balanceamento especificados pelo fabricante.

A utilização de um comissário nos voos da empresa nesse modelo de aeronave estava de acordo com o previsto na documentação da empresa e nos regulamentos da Agência Nacional de Aviação Civil.

O Manual de Comissários, Rev. 03, Seção 7, da TRIP LINHAS AÉREAS, de 1 de julho de 2010, estabelece que:

o comissário(a) deve auxiliar o Comandante na execução das tarefas para atender à emergência; auxiliar os passageiros quanto aos procedimentos a serem adotados e coordenar todas as ações visando à segurança das pessoas e da aeronave entre outras atribuições.

O Standard Operational Procedures (S.O.P) ATR-42/72, de 26/02/2008, era um manual que tinha por objetivo estabelecer a política da TRIP Linhas Aéreas quanto a operação da aeronave ATR42 e apresentar as diferenças cabíveis ao ATR72 e, no item 3.20, relativo ao briefing de descida / aproximação / pouso, estabelecia que as restrições de Minimum Sector Altitude (MSA) e outras observações da trajetória de descida quanto ao relevo e steps na descida deveriam ser comentados.

O Flight Crew Operation Manual (FCOM) era o manual utilizado pela TRIP LINHAS AÉREAS para fins de treinamento dos pilotos, com foco em procedimentos técnicos e características de desempenho. Todo o seu conteúdo e repasse das atualizações aos tripulantes era controlado pela empresa.

Esse manual previa, com relação à operação do TCAS, que o piloto não deveria iniciar manobras evasivas usando apenas as informações de tráfego mostradas na tela do equipamento (traffic display) ou nos casos de Traffic Advisory. Tais informações serviam apenas como um meio de assistência para localização visual dos tráfegos.

Nos casos de Resolution Advisory, o piloto deveria seguir as instruções do TCAS, a não ser que considerasse que a manobra fosse insegura para a aeronave. No entanto, o FCOM esclarecia que a realização de manobras em direção oposta aos avisos de Resolution Advisory eram extremamente perigosas e proibidas, a não ser que o piloto pudesse determinar visualmente que isso significaria uma separação segura.

Além disso, as manobras deveriam ser realizadas com o piloto automático desengajado de modo a cumprir pelo menos o mínimo previsto pelo TCAS. Além disso, o piloto deveria retornar, assim que possível, ao perfil autorizado pelo órgão ATC, assim que ouvisse a mensagem “ Clear of Conflict”.

1.19. Informações adicionais.

A Instrução de Aviação Civil (IAC) 060-1002A, de 14 de abril de 2005, servia de fundamento para que todos os segmentos do Sistema de Aviação Civil aplicassem a Filosofia de CRM, visando ao aprimoramento da eficiência e da eficácia operacional em benefício da Segurança de Voo.

No título Treinamento em Gerenciamento de Recursos de Equipes (Corporate Resource Management - CRM), entende-se, exclusivamente para os efeitos desta IAC, que o termo Corporate (Equipes) seria utilizado para expressar todas as equipes que compõem uma organização envolvida na atividade aérea, tais como, mas não limitado a, tripulantes técnicos e de cabine, pessoal da manutenção, despachantes operacionais de voo e de terra, pessoal de rampa, pessoal de check-in / check-out, alta direção, pessoal administrativo e outros segmentos.

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Esta IAC, que trata sobre o Treinamento em Gerenciamento de Recursos de Equipes (Corporate Resource Management – CRM), previa no item 2, relativo às definições, que:

2.2 Treinamento em Gerenciamento de Recursos de Equipes (Corporate Resource Management – CRM):

É a aplicação de conceitos de gerenciamento moderno, tanto na cabine de pilotagem como em outras atividades operativas e administrativas que interferem no voo, visando ao uso eficiente e eficaz de todos os recursos disponíveis (humanos, equipamentos e informações) que interagem nesta situação.

O item 3, que abordava os conceitos básicos do Treinamento em CRM, estipulava que:

3.1: Os conceitos de CRM estão baseados na premissa de que um elevado grau de proficiência técnica é essencial para que as operações aéreas sejam seguras, eficientes e eficazes. O conhecimento de conceitos de CRM nunca compensará a falta de proficiência técnica. Da mesma forma, uma elevada proficiência técnica não garantirá operações seguras sem que haja a coordenação de toda a equipe.

3.4: A inclusão de situações que envolvam operações de rotina no treinamento em CRM tem um forte efeito positivo nos participantes, devido aos exercícios ali vivenciados, contribuindo para a redução do estresse em momentos de alta carga de trabalho. A contínua Prática de CRM permite, também, um desempenho satisfatório do grupo durante situações de emergência, quando a pressão do tempo exige uma resposta rápida.

O item 4.2, Compromisso da Alta Direção, destacava:

Que a Filosofia de CRM é muito melhor incorporada à cultura organizacional quando o escalão constituído pela alta direção (presidência, diretorias e gerências) está em consonância com os conceitos de CRM e forneça os recursos necessários para a implantação do Treinamento.

Dentre os conceitos de CRM, um dos mais importantes é o da comunicação, através do qual todos os níveis de gerenciamento, de forma interativa e sinérgica, se comprometem com a cultura de segurança. A presença de todos os conceitos de CRM nos diversos manuais da organização, fornecendo aos grupos orientações de procedimentos e políticas necessárias, contribui para que haja uma aceitação tácita da Filosofia de CRM e a sua subsequente prática em todos os níveis da organização.

A fim de cumprir o que estabelecia a Instrução de Aviação Civil (IAC) 200-1001, de 26 de janeiro de 2005, a qual determinava as diretrizes para a elaboração do Plano de Assistência às Vítimas de Acidente Aeronáutico e Apoio a seus Familiares, a empresa elaborou o seu Plano Local de Emergência para Assistência às Vítimas e suas Famílias em Caso de Acidente Aeronáutico – Guarulhos (SP), de 27/SET/2011, a qual determinava procedimentos e estabelecia responsabilidades para assegurar um eficiente e rápido gerenciamento de crises resultantes de acidentes, incidentes graves, ou outras situações que pudessem impedir as operações normais de aeronaves da empresa.

De acordo com este documento, a Gerência de Segurança de Voo deveria conduzir treinamentos e simulações para verificação de sua eficácia, ao menos uma vez ao ano. Os Gerentes, supervisores, agentes, mecânicos e demais funcionários incluídos neste plano, deveriam assegurar-se de que todo o pessoal incluído no plano tivesse conhecimento e estivesse familiarizado com as funções e responsabilidades a ele, ou ela, atribuídas.

A Circular de Informação Aeronáutica, de 24 de setembro de 2009 (AIC 24/09), do Departamento de Controle do Espaço Aéreo, estabelecia os procedimentos e as fraseologias a serem aplicadas para autorizar uma aeronave a subir acima de nível/altitude especificado em uma SID (saída padrão por instrumentos) ou ainda para descer abaixo de nível/altitude especificado em uma STAR (chegada padrão por

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instrumentos) e aplicava-se aos Órgãos ATS e aos usuários do Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro.

Esta AIC discriminava, como uma de suas regras gerais:

“Quando em uma STAR, a aeronave for autorizada pelo ATC para descer a um nível/altitude abaixo daqueles especificados na STAR, a aeronave deverá seguir as restrições de nível/altitude publicadas, a menos que o ATC cancele explicitamente essas restrições.”

O item 4 do mesmo documento tratava das regras específicas, em especial quanto à autorização para a aeronave descer abaixo de nível/altitude especificado em uma STAR. Este subitem explicava que, no caso de uma aeronave ser autorizada a descer para um nível/altitude abaixo daquele especificado em determinado ponto na STAR, essa aeronave deveria manter a rota dessa STAR, desconsiderando apenas a restrição de nível/altitude prevista para o ponto definido pelo ATC e descer para o nível/altitude autorizado, mantendo as demais restrições previstas na citada STAR.

A Instrução do Comando da Aeronáutica 100-32 (ICA 100-32/2008), válida a partir de 20 de novembro de 2008, tratava dos Procedimentos Operacionais e Orientações de Treinamento para Pilotos e Controladores de Tráfego Aéreo com Relação ao Sistema Anticolisão de Bordo (ACAS).

Esta ICA, que tinha a finalidade de divulgar informações e procedimentos operacionais relativos ao ACAS, bem como apresentar as orientações para o treinamento sobre as capacidades e limitações daquele sistema (ACAS), estabelecia que os pilotos deveriam utilizar os avisos gerados pelo sistema anticolisão de bordo (ACAS) para prevenir potenciais colisões, melhorar o conhecimento situacional, bem como efetuar a busca ativa e obtenção visual do tráfego conflitante.

Em hipótese alguma os procedimentos especificados nessa ICA deveriam impedir o piloto-em-comando de tomar decisões a seu melhor juízo e com a plena autoridade para escolher a melhor solução para resolver um conflito de tráfego ou evitar uma colisão em potencial.

A capacidade do ACAS de desempenhar sua função de ajudar os pilotos a evitarem colisões potenciais dependeria da resposta correta e oportuna dos pilotos aos avisos do ACAS.

A experiência operacional tem mostrado que a resposta correta dos pilotos depende da eficácia do treinamento inicial e periódico sobre os procedimentos ACAS.

No caso de um RA, os pilotos deveriam responder imediatamente, seguindo o indicado no RA, a menos que isso pudesse por em perigo a segurança da aeronave.

Devia-se ter em mente que o tráfego observado visualmente poderia não ser o mesmo que causou um RA. A percepção visual de um encontro poderia ser errônea, principalmente à noite.

Também, é importante observar que era obrigação do piloto seguir o RA mesmo se houvesse conflito entre o RA e a instrução do controle de tráfego aéreo (ATC) para manobra e não efetuar manobra contrária ao sentido de um RA.

Esta ICA estabelecia ainda que, tão logo possível, quando permitido pela carga de trabalho da tripulação, esta deveria notificar o órgão ATC apropriado sobre qualquer RA que requeresse um desvio da instrução ou autorização vigente do ATC.

A menos que fosse informado pelo piloto, o ATC não saberia quando o ACAS emite os RA. É possível que o ATC emita instruções que sejam, por desconhecimento, contrárias às emissões dos RA do ACAS. Então, era importante que o ATC fosse

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notificado quando uma instrução ou autorização do ATC não estivesse sendo seguida por estar em conflito com um RA.

Segundo a instrução, o piloto deveria, ainda, limitar as alterações da trajetória de voo a uma extensão mínima necessária para cumprir os RA e retornar prontamente aos termos da instrução ou autorização do ATC quando o conflito estivesse resolvido, notificando o ATC quando retornasse à autorização vigente.

NOTA: A fraseologia a ser usada para a notificação de manobras em resposta a um Aviso de Resolução está contida na ICA 100-12, “Regras do Ar e Serviços de Tráfego Aéreo”.

1.20. Utilização ou efetivação de outras técnicas de investigação.

Não houve.

2. ANÁLISE.

A aeronave realizava o voo TIB5333 de Joinville para Guarulhos no FL230.

Este voo prosseguia via posição ASONO, no nível de voo 230 (FL230).

Houve um equívoco na coordenação por parte do ATCO assistente do APP-SP, pois não havia qualquer publicação de STAR para Guarulhos que se iniciava na Posição ASONO.

As condições meteorológicas no SBGR eram boas, com visibilidade superior a 10 quilômetros.

Próximo da entrada da terminal São Paulo, o TIB5333 solicitou ao APP uma proa ideal para ASONO.

Neste momento foi indagado se teria condições de prosseguir direto para a posição GURU (Ponto específico na STAR situado na parte intermediária da STAR), visando completar a STAR RONUT 1, a chegada prevista para SBGR. Ao receber a resposta afirmativa por parte do TIB5333, o APP-SP autorizou essa aeronave voar para a Posição GURU. Em nenhum momento o TIB5333 foi informado pelo APP-SP qual a chegada prevista para SBGR e se seria autorizado “Chegada” ou “Via Chegada”.

A autorização para o início da Chegada se deu na área do Centro de Controle (ACC), em coordenação com o Controle de Aproximação (APP) responsável pelo voo da aeronave. Este procedimento era adotado pelo fato de a STAR iniciar fora da terminal, o que também permitia a descida da aeronave sem interrupções desnecessárias.

No caso específico de São Paulo, a informação da STAR prevista para os aeroportos localizados dentro da terminal São Paulo era dada pelo Centro de Controle de Área de Curitiba ou de Brasília (ACC-CW / ACC-BS) em função da aerovia e do setor de aproximação. O APP-SP, por força de Acordo Operacional com os órgãos adjacentes, informava os procedimentos de chegadas previstos, aos Centros de Controle, para que as aeronaves recebessem a autorização da STAR antes dos fixos de início desse procedimento de descida.

Importante ressaltar que o APP-SP autorizou o TIB5333, desde a entrada da terminal, a voar para a posição GURU e “reinterceptar” a chegada a partir daquele ponto. Entende-se que não poderia ser uma reinterceptação, pois, até então, o TIB5333 não tinha voado no perfil da STAR RONUT 1. De qualquer forma, considerando-se que o ACC-CW informou qual seria a chegada prevista para SBGR (RONUT 1), entende-se que a falta de questionamento por parte da tripulação do TIB5333, até o ponto de interceptação da STAR (Posição GURU), descartou-se qualquer hipótese de “não familiarização” com a Chegada para Guarulhos.

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Durante as entrevistas com os pilotos ficou claro que eles estavam realizando a RONUT 1, porém, para eles, não estava claro se a autorização era “Chegada” ou “Via Chegada”. Entretanto tal fato não contribuiu para o acidente visto que, entre as posições GURU e LOVE, o nível mínimo era o FL 120.

A carta que trazia a STAR RONUT 1 trazia também a IMBEK 1 e a USABA 3, porém, a partir de GURU todas seguiam o mesmo perfil. Em outras palavras, como o TIB5333 foi orientado a aproar GURU e “reinterceptar” a chegada, não deveria haver dúvidas em relação ao perfil a ser seguido nem aos níveis mínimos a serem respeitados (a STAR RONUT 1 previa que a aeronave deveria considerar como nível mínimo o FL 120 entre as posições GURU e LOVE).

Esta nova autorização de tráfego aéreo emitida pelo APP-SP, coerente com a projeção do voo e da STAR RONUT 1, visou encurtar a trajetória inicial daquela STAR, ao mesmo tempo em que sequenciou o TIB5333 dentro da terminal São Paulo.

Após ter sido orientado pelo APP-SP a “reinterceptar” a chegada a partir da posição GURU, o TIB5333 cotejou da seguinte forma: “Afirmativo, após Guru mantém o perfil da chegada”. O termo “reinterceptar”, utilizado pelo APP-SP não estava previsto na ICA 100-12 (2009). Da mesma forma o termo “manter o perfil da chegada”, utilizado pelo TIB5333, também não estava previsto na fraseologia padrão daquela ICA. “Manter o Perfil” era um termo que, apesar de não previsto em legislação, era bastante utilizado por pilotos e controladores. Por não estar elencado no rol das definições do SISCEAB, pode tornar-se vago para alguns procedimentos, em especial quando da realização de uma STAR. Tal situação pode ensejar dúvidas e levar a situações de risco desnecessárias.

A Circular de Informação Aeronáutica, de 24 de setembro de 2009 (AIC 24/09), do DECEA, estabelecia os procedimentos e as fraseologias a serem aplicadas para autorizar uma aeronave a subir acima de nível/altitude especificado em uma SID (saída padrão por instrumentos) ou ainda para descer abaixo de nível/altitude especificado em uma STAR (chegada padrão por instrumentos) e aplicava-se aos Órgãos ATS e aos usuários do Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro. Os procedimentos, descritos no item 1.19 deste relatório, deixam claro que para se descer abaixo de nível/altitude especificado em uma STAR, neste caso seria o FL120 entre GURU e LOVE (STAR RONUT 1), dever-se-ia deixar claro que aquela restrição estava cancelada.

O TIB5333, quando voando na proa de GURU, foi autorizado a descer para os níveis FL180, FL150, e finalmente o FL120, havendo cotejamento por parte da tripulação. Após a autorização de descida para o FL120, o APP-SP informou ao TIB5333 que ele deveria, a partir de GURU, “interceptar a chegada”, ocorrendo, o cotejamento, da seguinte forma – “afirmativo, após GURU mantém o perfil da chegada”.

Próximo à posição GURU, o TIB5333 atingiu o FL120, porém, o copiloto, que era o PF, selecionou, no “altitude select” o FL100, que era o nível mínimo na posição FAET (a próxima após LOVE) e continuou sua descida para este nível.

Ao cruzar o FL117 foi alertado para um tráfego essencial na posição de 09 horas, cruzando o FL 090 em ascensão ao FL100. Tratava-se de uma aeronave da GOL Linhas Aéreas que havia decolado de Congonhas (SBSP). Neste momento, ainda em descida o TIB5333 cotejou afirmando que tinha sido autorizado para o FL120 e que estava “Via Chegada” (este fato denota a baixa consciência situacional da tripulação).

Percebendo que o TIB5333 continuava sua descida (já havia cruzado o FL115), o APP-SP determinou a aquela aeronave nivelar no FL110. Praticamente no FL110 o TIB5333 teve um “TCAS Advisory” e, logo na sequência, um “Resolution Advisory”. O copiloto realizou a manobra evasiva, ganhando aproximadamente 500 pés (voltou ao FL115). Ao término da manobra (mensagem de “Clear of Conflict”) o copiloto “picou” a

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aeronave de forma brusca, causando “G negativo”. A passageira, que neste momento estava em pé, bateu sua cabeça no teto da aeronave e caiu, fraturando seu pé.

A investigação chegou à conclusão de que o comandante não percebeu que o copiloto não seguia o procedimento previsto para a descida e que também não seguiu adequadamente as orientações dos órgãos de controle, deixando também de perceber que o procedimento estava sendo realizado fora do padrão.

Quanto à padronização de procedimentos, o Standard Operational Procedures previa a realização um briefing de descida contemplando, dentre outros pontos importantes, a Minimum Sector Altitude (MSA) e outras observações da trajetória de descida quanto ao relevo e steps na descida e descrever toda a trajetória de aproximação e pouso (visual ou instrumento), inclusive ponto e trajetória de arremetida.

Caso o briefing tivesse sido realizado conforme previsto, o nível mínimo (FL120) entre as posições GURU e LOVE teria sido comentado pelo copiloto/comandante, o que aumentaria o alerta situacional destes profissionais. O comandante não percebeu que o copiloto tinha selecionado o FL100 no altitude select, o que reforça a baixa consciência situacional e interação por parte da tripulação de cabine.

Durante as entrevistas realizadas com diversos profissionais da empresa, identificou-se que os treinamentos de CRM na empresa ocorriam de forma bastante desconexa e isolada. Isto ia de encontro ao que preconizava a IAC 060-1002A, que prega que o Treinamento em Gerenciamento de Recursos de Equipes (Corporate Resource Management - CRM), devia ser utilizado para capacitar e motivar todas as equipes que compõem uma organização envolvida na atividade aérea.

Ainda, de acordo com esta IAC, o treinamento em CRM deveria criar oportunidades para que o grupo praticasse e desenvolvesse os conceitos de liderança e trabalho de equipe, de acordo com a sua real função.

Neste acidente aeronáutico ficou claro que houve um lapso de integração entre os membros da tripulação, como se a cabine fosse independente do restante da aeronave, e aquela ocorrência não fosse afetar o voo como um todo. Tal fato reflete a forma com que o treinamento de CRM era tratado dentro da empresa - apenas como “Cockpit Resource Management”. Houve pouca coordenação entre a comissária e os pilotos. Não houve quaisquer orientações do comandante em relação ao desembarque dos passageiros, incluindo-se a vítima, após o pouso.

A comissária, que caiu durante manobra TCAS, orientou a vítima e passageiros que lhe deram suporte durante o final da descida e pouso da aeronave. Suas iniciativas, independentes de orientações do comandante, contribuíram para que a passageira machucada e os demais passageiros permanecessem calmos. Após o pouso, foi a comissária, também, quem coordenou o desembarque da vítima e passageiros (mais uma vez, sem orientações do comandante).

A inclusão de situações que envolvam operações de rotina no treinamento em CRM, em especial durante o simulador, tem um forte efeito positivo nos participantes, devido aos exercícios ali vivenciados, contribuindo para a redução do estresse em momentos de alta carga de trabalho. Em outras palavras, exercitam-se situações normais e anormais, ditas do dia a dia, e que trazem grandes benefícios à segurança de voo. A contínua prática de CRM permite, também, um desempenho satisfatório do grupo durante situações de emergência, quando a pressão do tempo exige uma resposta rápida.

No caso da TRIP Linhas Aéreas, empresas diferentes treinavam setores diferentes, criando um antagonismo da própria filosofia do CRM, que é de mostrar a importância da integração entre os setores e do trabalho. Ficou evidente esta desconexão quando nem o Setor de Segurança de Voo nem a Chefia de Operações tinham conhecimento do

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resultado do questionário de diagnóstico organizacional aplicado aos tripulantes. Identificou-se, ainda, que aquela empresa (TRIP) passa por reformulação de processos de treinamento que envolve a instrução e o simulador.

A IAC 060-1002A ressaltava que a TRIP deveria instituir um controle de qualidade para os treinamentos em CRM ministrados, através do acompanhamento e levantamento periódico de suas demandas, para que estes pudessem suprir as necessidades desta. Em outras palavras, um controle de qualidade que assegurasse que os principais objetivos daquele treinamento – eficiência, envolvimento de todos da empresa, assertividade, consciência situacional e segurança de voo, estivessem sendo plenamente atingidos.

Identificou-se ainda, durante a investigação, que os tripulantes tinham experiências distintas em termos de horas de voo totais e na aeronave, bem como no tempo de empresa. Provavelmente, as diferenças entre essas experiências de voo, nas culturas dos pilotos, e em especial na qualidade e filosofia dos treinamentos de CRM fornecidos pela TRIP Linhas Aéreas foram determinantes na (falta) interação da equipe (sinergia).

A TRIP Linhas Aéreas seguia o FCOM da aeronave ATR, utilizado por tripulantes do ATR 72 e do ATR 42 para fins de treinamento. De acordo com este manual, manobras evasivas TCAS deveriam ser realizadas com o piloto automático desengajado e limitadas ao mínimo necessário para cumprir com o Resolution Advisory (RA). Seguindo este manual, o piloto deveria retornar imediatamente para o nível autorizado anteriormente pelo ATC quando a mensagem “Clear of Conflict” aparecesse para o tripulante realizando a manobra evasiva.

Apesar do Programa de Treinamento de Operações daquela empresa prever, nos treinamentos iniciais e periódicos, o uso e a operação do TCAS, com a finalidade de permitir que o aluno (piloto) fosse capaz de compreender as normas, os requisitos e os procedimentos para operar o equipamento, incluindo-se manobras evasivas, a atuação dos pilotos neste acidente demonstra que esses treinamentos fornecidos pela TRIP Linhas Aéreas, não foram eficientes o suficiente para capacitar os pilotos, em especial o copiloto, a realizar a manobra com segurança sem expor os passageiros a risco desnecessário.

Por ocasião deste acidente, ficou bastante evidente que o copiloto, que voava a aeronave, foi brusco durante a manobra evasiva. Pode-se afirmar isto porque, após as entrevistas com os tripulantes, identificou-se que a comissária, que estava em pé próxima ao banheiro da aeronave, caiu no início da manobra - “G positivo”.

Na parte mais alta da manobra, o copiloto cumpriu o previsto para aquela situação, ou seja, retornou ao nível autorizado anteriormente pelo ATC (FL110), porém, de maneira brusca, derrubando também a passageira que se feriu.

Outro fato que reforça a deficiência nos treinamentos de TCAS foi o não cumprimento, por parte do PR-TKB, do previsto na legislação que orienta que “tão logo possível, quando for permitido pela carga de trabalho da tripulação, notificar o órgão ATC apropriado sobre qualquer RA que requeira um desvio da instrução ou autorização vigente do ATC”. Neste episódio o APP-SP, apesar de visualizar pelo radar a subida do PR-TKB do FL110 ao FL115, não foi notificado da manobra pelos tripulantes daquela aeronave.

Considerando que os pilotos não perceberam, inicialmente, que tinham ultrapassado o FL120, nível mínimo previsto entre as posições GURU e LOVE, considerando que foram “advertidos” pelo APP-SP para nivelarem no FL110, considerando que foram alertados também pelo APP-SP que havia um tráfego essencial que nivelaria no FL100, considerando que, quando alertado pelo APP SP para nivelar no FL110 quando cruzavam o FL115, o comandante cotejou que o PR-TKB tinha sido autorizado para o FL120 e Via

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Chegada, e finalmente que tiveram um “TCAS Advisory e na sequencia um “Resolution Advisory”, pode-se dizer com alto grau de certeza que o alerta situacional dos pilotos estava baixo.

Quanto à decisão de passar a se voar com apenas um comissário a bordo, esta decisão foi tomada de forma setorizada, sem que outros setores, que seriam afetados direta ou indiretamente por aquela decisão fossem até mesmo informados.

Isto apenas reforça que os diversos setores dentro da TRIP Linhas Aéreas demonstravam pouca interação e troca de informações. Não houve uma avaliação e gerenciamento do risco para a implantação da mudança. Para exemplificar, não foram avaliadas situações de risco como o fato de que um comissário pode, por várias razões, ficar incapacitado.

O manual de comissários não tinha sido atualizado/adaptado considerando esta mudança. Nenhum piloto da organização foi informado, de forma documental, da mudança que ocorreu na sua tripulação (apenas um comissário a bordo). Não havia quaisquer orientações por parte da empresa de como proceder com este tipo de composição da tripulação, seja em situações normais, seja em situações de emergência. Não houve treinamentos para os profissionais da empresa após a mudança. Neste voo, por exemplo, o comandante não explorou no seu briefing à tripulação a condição peculiar de um comissário a bordo.

Em outras palavras, uma situação anormal, por falta de procedimentos previstos, poderia ficar bastante séria com consequências imprevisíveis. Uma mudança deste porte requer a avaliação do risco e a aplicação de medidas mitigadoras que eliminem ou reduzam o risco a um nível aceitável.

Quanto ao Plano Local de Emergência para Assistência às Vítimas e suas Famílias em Caso de Acidente Aeronáutico – Guarulhos (SP), da TRIP Linhas Aéreas verificou-se que o apoio prestado à vítima não atendeu o que prevê a IAC 200-1001, a qual estabelecia as ações da responsabilidade da empresa para prover assistência, serviços e informações às vítimas e as medidas de apoio a seus familiares, denotando, novamente, falta de interação entre os diversos setores da empresa e desta com o operador de aeródromo.

A investigação deste acidente também chegou à conclusão de que não havia motivação, por parte dos comissários, do uso de Relatórios de Prevenção, a mais importante ferramenta da prevenção de acidentes. Todas as informações envolvendo tripulantes, direta ou indiretamente, deviam transitar pela chefia.

Para que um sistema de reporte, semelhante ao RELPREV tenha sucesso, algumas características devem ser observadas, dentre elas a voluntariedade, a confidencialidade da fonte, o feedback ao autor, quando o RELPREV for identificado e a divulgação dos ensinamentos a todos da organização.

Consequentemente, ao se exigir que o RELPREV transitasse pela chefia dos comissários antes de chegar ao Safety, aquele setor desmotivava o ciclo da prevenção, levando o tripulante muitas vezes a não reportar eventos ligados à prevenção de acidentes por medo, não permitindo aos profissionais da segurança de voo ter informações necessárias para o monitoramento dos processos e, em especial, para o desenvolvimento de atividades voltadas à prevenção.

Com relação ao setor de Segurança Operacional da empresa, verificou-se que o efetivo do safety da TRIP estava bastante limitado em termos de pessoal e apoio, contando com um efetivo, em relação ao tamanho da organização, muito pequeno, não permitindo ou dificultando a execução, de forma eficiente, dos trabalhos de prevenção de acidentes aeronáuticos.

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Tais atividades exigem, para a execução de seus diversos programas, uma grande capilaridade dentro da empresa para a disseminação dos conceitos ligados a segurança de voo. Importante ressaltar que este setor também é responsável pelo desenvolvimento das investigações de eventos (exemplo: incidentes aeronáuticos e ocorrências de solo) e pela análise de relatórios de prevenção.

Com um setor de Safety mais atuante, estabelecer-se-ia (ou fortalecer-se-ia) um canal mais eficiente de comunicação dentro empresa, buscando-se o melhor aproveitamento das diversas ferramentas de prevenção. Necessário ressaltar que um Safety mais atuante contribui para o desenvolvimento de uma cultura de segurança de voo na organização, favorecendo uma resposta mais efetiva às possíveis adversidades e, em especial, a identificação de condições latentes.

A prevenção de acidentes e incidentes aeronáuticos é fundamental para o sucesso de uma empresa aérea, um valor pessoal para os funcionários dessas organizações, e uma fonte de vantagens que pode fortalecer qualquer instituição. As atividades de prevenção fazem com que todos os funcionários acreditem que acidentes podem e devem ser prevenidos. Um efetivo Sistema de Gerenciamento da Segurança de Voo exige uma maneira sistêmica quando do desenvolvimento da política de segurança de voo, de procedimentos e práticas que permitam a organização alcançar os seus objetivos relacionados à prevenção de acidentes.

A responsabilidade principal com a prevenção de acidentes cabe à alta direção de uma empresa e, claro, deve envolver todos os empregados da organização. Poucos darão o devido valor à prevenção de acidentes (e estarão motivados a participar ativamente) se não identificarem que isto é importante para a empresa. Isto se dá por meio da política estabelecida e demonstrada através de palavras e ações, por parte do alto escalão.

A segurança de voo constantemente requer mudanças em diversos setores da companhia que, por vezes, se traduzem em investimentos. Por causa desta particularidade a pessoa mais importante para a prevenção de acidentes não é o gerente de segurança de voo, e sim outra autoridade com o poder e os recursos necessários a tais mudanças – o presidente (alta-direção).

Se a alta direção não demonstrar um interesse verdadeiro (e visível) na prevenção de acidentes, praticamente ninguém da organização dará a atenção devida a esta área e, ainda, o que diz que as atitudes dos profissionais da organização são um reflexo da cultura de segurança de voo de seus gerentes.

A direção da empresa tem a autoridade e a responsabilidade de gerenciar os riscos dentro da organização, e isto pode ser alcançado com um método sistemático de identificação de situações de perigo e do gerenciamento do risco visando eliminar, reduzir, ou mitigar os fatores de risco. Apenas a alta gerência tem as ferramentas adequadas para produzir as mudanças necessárias na estrutura da instituição, pessoal, equipamentos, treinamento, políticas e procedimentos.

Um setor responsável pelo gerenciamento das atividades de prevenção, com ligação direta e com o apoio da alta direção da empresa, com um efetivo adequado ao tamanho e complexidade da instituição, teria condições de ser eficiente e eficaz no desenvolvimento das diversas atividades de prevenção de acidentes aeronáuticos e, em especial, ao fortalecimento da cultura de segurança de voo.

Neste acidente uma série de condições latentes estava presente no sistema e que se tornaram evidentes durante a investigação, dentre elas:

a) Problemas no treinamento de CRM –

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- Empresas diferentes provendo treinamento de CRM (Corporate Resource Management);

- Situações de rotina no treinamento (falta);

- Base Guarulhos despreparada para lidar com uma situação anormal;

- Deficiência na supervisão do treinamento;

- Deficiências no controle de qualidade / desempenho nos diversos treinamentos de tripulantes;

b) Cultura de Segurança de Voo deficiente;

c) Falhas no cumprimento do SOP e manuais (briefing de descida, por exemplo);

d) Falta de interação entre os diversos setores da empresa;

e) Falhas no gerenciamento do risco;

f) Ausência de sistemas de acompanhamento da instrução dos tripulantes;

g) Pouco uso do RELPREV por parte dos comissários;

h) Deficiências nos treinamentos de TCAS; e

i) Efetivo reduzido da gerência de segurança de voo.

Este acidente, que pode ser caracterizado como um acidente organizacional poderia ter sido evitado com o desenvolvimento e a manutenção de uma cultura de segurança de voo considerada saudável, onde todos os profissionais são capacitados, motivados e comprometidos com a Prevenção de Acidentes e, em todos os níveis da organização, consideram o impacto na segurança de voo em tudo que fazem.

3. CONCLUSÃO.

3.1. Fatos.

a) os pilotos estavam com o Certificados de Capacidade Física (CCF) válidos;

b) os pilotos estavam com o Certificados de Habilitação Técnica (CHT) válidos;

c) os pilotos eram qualificados e possuíam experiência no tipo de voo;

d) a aeronave estava com o Certificado de Aeronavegabilidade (CA) válido;

e) a aeronave estava dentro dos limites de peso e balanceamento;

f) a aeronave decolou com plano IFR de Joinville (SBJV) para São Paulo (SBGR);

g) o copiloto estava na condição de Pilot Flying (PF);

h) o ACC-CW informou que a STAR prevista para SBGR era a RONUT 1;

i) o APP-SP orientou o PR-TKB a prosseguir direto para a Posição GURU;

j) o APP-SP não informou se a autorização a partir da posição GURU, seria “Autorizado a Chegada” ou “Autorizado Via Chegada;

k) o PR-TKB foi autorizado, pelo APP-SP, a descer para os níveis 180, 150 e finalmente o Fl 120 na proa de Guru;

l) após passar a posição Guru, o PR-TKB continuou descendo abaixo da restrição do FL120;

m) ao cruzar o FL117, o PR-TKB foi alertado pelo APP-SP da existência de um tráfego essencial em ascensão para o FL100;

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n) o PR-TKB continuou sua descida, quando, por já ter passado o FL120, foi reorientado pelo APP-SP a manter o FL110 em função da proximidade com o tráfego GOL1516 que executava o procedimento de saída de Congonhas em ascensão para o FL 100;

o) ao perceber que o PR-TKB continuava sua descida (já havia cruzado o FL 115), o APP-SP determinou a aquela aeronave nivelasse no FL-110;

p) praticamente no FL-110 o PR-TKB teve um “TCAS Advisory” e, logo na sequência, um “Resolution Advisory”;

q) o copiloto realizou a manobra evasiva, ganhando aproximadamente 500 FT;

r) ao término da manobra (mensagem de “Clear of Conflict”) o copiloto “picou” a aeronave de forma brusca, causando “G negativo”;

s) uma passageira, que neste momento estava em pé, bateu sua cabeça no teto da aeronave e caiu, quebrando seu pé;

t) o comandante não percebeu que o copiloto não seguia o procedimento previsto para a descida e que também não seguiu adequadamente as orientações dos órgãos de controle, deixando também de perceber que o procedimento estava sendo realizado fora do padrão;

u) houve pouca coordenação entre a comissária e os pilotos. Não houve quaisquer orientações do comandante em relação ao desembarque dos passageiros, incluindo-se a vítima, após o pouso;

v) a tripulação foi retirada do voo depois de seguir as orientações do Safety da empresa, porém a aeronave prosseguiu em rota, perdendo-se dados importantes para a investigação;

w) não houve danos à aeronave; e

x) uma passageira sofreu lesões graves; e

y) a tripulação saiu ilesa.

3.2. Fatores contribuintes.

- Aplicação dos comandos – contribuiu.

O copiloto realizou a manobra evasiva e, ao término da manobra o copiloto “picou” a aeronave de maneira inadequada (forma brusca), causando “G negativo”. A passageira, que neste momento estava de pé, bateu sua cabeça no teto da aeronave e caiu, quebrando seu pé.

- Atenção – contribuiu.

A tripulação não realizou o briefing de descida conforme previsto nos manuais da empresa. Tal procedimento teria elevado o nível de atenção dos pilotos para as altitudes previstas para a STAR RONUT 1 e ainda para os procedimentos a serem realizados na cabine.

O comandante não percebeu que o copiloto não seguia o procedimento previsto para a descida e que também não seguiu adequadamente as orientações dos órgãos de controle, deixando também de perceber que não só que o procedimento estava sendo realizado fora do padrão bem como as indicações dos instrumentos que mostravam a altitude da aeronave.

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- Clima organizacional – indeterminado.

A empresa passava por reestruturações advindas de uma expansão, o que tornou o clima organizacional instável devido ao crescimento desordenado dos setores, que não estava sendo monitorado.

- Comunicação – contribuiu.

Houve falha ao comunicar a descida para o PR-TKB, sem que fosse definido claramente se a STAR seria cumprida “Via Chegada” ou “Chegada” e, além disso, houve a utilização de fraseologia fora da padronização prevista, tanto por parte dos controladores quanto dos pilotos.

Os processos de comunicação também foram falhos dentro da cabine durante o RA, entre o comandante e a comissária ao gerenciar o acidente, entre o pessoal de aeroportos e a vítima ao gerenciar o acidente e, finalmente, entre os diversos setores da empresa, safety, operações, comissários e treinamento pela ausência de interação em processos importantes para a prevenção de acidentes, como o treinamento de CRM ou a mudança no tamanho da tripulação do ATR-42.

- Coordenação de cabine – contribuiu.

Aparentemente, os tripulantes estavam se comunicando apenas o mínimo necessário. Além disso, parece haver uma descoordenação das tarefas, como se cada tripulante estivesse pilotando isoladamente.

Não houve interação entre os pilotos e destes com a comissária.

- Cultura do grupo de trabalho – contribuiu.

O grupo se mostrou refratário ao acidente, não conseguiu identificar sua gravidade, seguiram como se aquela ocorrência fosse uma ocorrência corriqueira. A tripulação foi retirada do voo depois de seguir as orientações do Safety da empresa, a aeronave, porém, prosseguiu em rota, perdendo-se dados importantes para a investigação.

- Cultura organizacional – contribuiu.

A cultura organizacional não privilegiava a segurança de voo. O Safety, com efetivo reduzido, não conseguia efetividade em suas ações de gerenciamento da prevenção de acidentes. Os relatos de situações de risco nem sempre chegavam aquele setor por processos falhos da organização, que bloqueavam o fluxo das informações, comprometendo assim a efetividade dos métodos reativos de prevenção.

- Desvio de navegação – contribuiu.

A carta que traz a STAR RONUT 1 prevê que a aeronave deve considerar como nível mínimo o FL120 entre as posições GURU e LOVE. Próximo à posição GURU o PR-TKB atingiu o FL120, porém continuou a sua descida que seria, inicialmente, até o FL100, visto que a seleção do “altitude select” era para o FL100.

Este fato, a descida ao FL110, abaixo da altitude mínima prevista na STAR RONUT 1 para aquele trecho, configurou desvio involuntário, pela tripulação, de um perfil de um procedimento padrão de chegada.

- Dinâmica de equipe – contribuiu.

A dinâmica das equipes não funcionou de forma adequada, tanto em processos de integração das equipes de operações, treinamento, comissários e o Safety na empresa como no caso do voo, em que houve falhas no gerenciamento de cabine e falhas no gerenciamento do acidente.

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- Formação, Capacitação e Treinamento – contribuiu.

Os treinamentos de CRM na TRIP ocorriam de forma desconexa, nos quais empresas diferentes forneciam o treinamento a diferentes setores na organização. Tal fato criou um antagonismo da própria filosofia do CRM, que é de mostrar a importância da integração entre os setores e do trabalho.

Outro fato identificado durante a investigação foi que a instrução ocorria de forma descentralizada para pilotos e comissários, nos quais temas comuns a ambos eram tratados de forma diferenciada. Não foram identificados sistemas de acompanhamento da instrução para pilotos e comissários, o que levava a falta de monitoramento na qualidade e da eficiência desses treinamentos.

- Fraseologia do Órgão ATS – indeterminado.

Ao utilizar termos não previstos na fraseologia padrão, como “Reinterceptar a Chegada” o APP SP pode ter contribuído para diminuir o alerta situacional dos tripulantes.

- Liderança – contribuiu.

O comandante não atuou de maneira eficaz visto que deixou de monitorar processos dentro da cabine. Não houve briefing antes do voo, o que seria necessário, dentre outras razões, por haver apenas uma comissária a bordo, situação nova dentro da empresa.

O comandante não atuou de forma adequada quando o copiloto deixou de seguir o procedimento previsto para a descida e as orientações dos órgãos de controle, deixando também de alertar o copiloto quando o mesmo foi “brusco” durante a realização de manobra evasiva (TCAS). Deixou, ainda, de orientar a tripulação de como proceder com a passageira acidentada.

- Percepção – indeterminado.

O PR-TKB, quando voando na proa de GURU, foi autorizado a descer para os níveis FL180, FL150, e finalmente o FL120, havendo cotejamento por parte da tripulação. Após a autorização de descida para o FL120, o APP-SP informou ao PR-TKB que ele deveria, a partir de GURU, “reinterceptar a chegada”, ocorrendo, o cotejamento, da seguinte forma – “afirmativo, após GURU mantém o perfil da chegada”. O copiloto, que estava voando a aeronave, selecionou, no “altitude select” o FL100, que era o nível mínimo na posição FAET (a próxima após LOVE). O comandante não percebeu tal fato por estar com baixa consciência situacional. Houve também falta de percepção da gravidade do RA e de suas possíveis consequências por parte dos pilotos.

- Processos organizacionais – contribuiu.

Os processos organizacionais demonstraram uma falta de integração, a decisão de passar a voar com apenas um comissário a bordo foi tomada de forma isolada não envolvendo outros setores da empresa, não foi feito um gerenciamento do risco para a mudança, demonstrando que o grupo não percebia que os processos eram sistêmicos.

- Supervisão gerencial – contribuiu.

Neste acidente uma série de condições latentes, permitidas no nível gerencial da organização, estava presente no sistema e se tornaram evidentes durante a investigação. Tais falhas refletiram deficiências de supervisão em todos os níveis gerenciais da TRIP Linhas Aéreas.

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4. RECOMENDAÇÃO DE SEGURANÇA

Medida de caráter preventivo ou corretivo emitida pelo CENIPA ou por um Elo-SIPAER

para o seu respectivo âmbito de atuação, visando eliminar um perigo ou mitigar o risco

decorrente de condição latente, ou de falha ativa, resultado da investigação de uma ocorrência

aeronáutica, ou de uma ação de prevenção e que, em nenhum caso, dará lugar a uma presunção

de culpa ou responsabilidade civil, penal ou administrativa.

Em consonância com a Lei nº 7.565/1986, as recomendações são emitidas unicamente

em proveito da segurança de voo. Estas devem ser tratadas conforme estabelecido na NSCA 3-13

“Protocolos de Investigação de Ocorrências Aeronáuticas da Aviação Civil conduzidas pelo

Estado Brasileiro”.

Recomendações emitidas no ato da publicação deste relatório.

À Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), recomenda-se:

A-582/CENIPA/2014 - 01 Emitida em: 29/07/2016

Atuar junto às empresas que operam segundo o RBAC 121 de forma tal que assegure que o treinamento de Corporate Ressource Management (CRM) esteja adequado a realidade daquela empresa, que seja constantemente avaliado e reforçado (com a participação da alta direção), envolva todos os profissionais da instituição, que garanta a integração dos diferentes setores da empresa (corporate), e que, acima de tudo, faça parte da cultura de segurança de voo da organização.

A-582/CENIPA/2014 - 02 Emitida em: 29/07/2016

Atuar junto à Administração do Aeroporto Internacional de Guarulhos, de forma que este passe a ministrar treinamento teórico e prático de atendimento às vítimas de acidentes envolvendo os principais tipos de aeronaves que operam naquela localidade, principalmente os das Linhas Aéreas Regulares, com especial ênfase ao “Layout” e aos meios de remoção de passageiros do interior destas aeronaves.

Ao Departamento de Controle do espaço Aéreo (DECEA), recomenda-se:

A-582/CENIPA/2014 - 03 Emitida em: 29/07/2016

Orientar as suas organizações subordinadas em relação ao fiel cumprimento do estabelecido na ICA 100-37, de 28ABR2014, no seu item 5.9.3 e na MCA 100-16, de 18NOV2013, no item 2.3.3.

5. AÇÃO CORRETIVA OU PREVENTIVA JÁ ADOTADA.

Não houve.

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Em, 1º de setembro de 2016.