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RPG Rev Pós Grad 2011;18(4):260-5 260 Remoção de retentores metálicos intrarradiculares com o Saca-pinos M&V: relato de casos clínicos CARLOS AUGUSTO DE MORAIS SOUTO PANTOJA * , JULIANA MARIA COSTA NUÑEZ PANTOJA ** , CAIO CEZAR RANDI FERRAZ *** , JOSÉ FLÁVIO AFFONSO DE ALMEIDA **** * Doutorando em Clínica Odontológica, Departamento de Odontologia Restauradora, Área de Endodontia, Faculdade de Odontologia de Piraci- caba, Universidade Estadual de Campinas (FOP/UNICAMP) – Piracicaba/SP. ** Pós-Doutoranda em Clínica Odontológica, Departamento de Prótese e Periodontia, Área de Prótese Dental, Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Universidade Estadual de Campinas (FOP/UNICAMP) – Piracicaba/SP. *** Professor Adjunto da Área de Endodontia – Departamento de Odontologia Restauradora da Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Universi- dade Estadual de Campinas (FOP/UNICAMP) – Piracicaba/SP. **** Professor Doutor da Área de Endodontia – Departamento de Odontologia Restauradora da Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Universi- dade Estadual de Campinas (FOP/UNICAMP) – Piracicaba/SP. RESUMO O endodontista em sua clínica diária depara-se, com alguma frequência, com a necessidade de realiza- ção do retratamento endodôntico e, muitas vezes, previa- mente a esse procedimento, faz-se necessária a remoção de retentores intrarradiculares. Diversos aparelhos são disponibilizados no mercado com a finalidade de pro- mover o tracionamento do retentor intrarradicular. Den- tre eles, destaca-se o Saca-pinos M&V ® , que pode ser utilizado isoladamente ou associado a outras técnicas previamente à tração. Nesse sentido, o presente trabalho relata dois casos clínicos distintos, que descrevem o uso desse dispositivo, suas vantagens, limitações e a influên- cia de outras técnicas durante a remoção. DESCRITORES Endodontia. Remoção. Técnica para retentor in- trarradicular. INTRODUÇÃO Durante a execução de um plano de tratamento odontológico, o cirurgião-dentista se depara, muitas vezes, com a necessidade de retratamento do sistema de canais radiculares. Isso, devido à ausência de repa- ro dos tecidos periapicais ou a tratamento endodôntico inadequado. Contudo, em algumas situações, o acesso a esse sistema encontra-se obstruído por núcleos e pinos intrarradiculares, os quais devem ser removidos previa- mente à reintervenção endodôntica. A remoção de núcleos metálicos fundidos é ain- da um grande desafio ao endodontista, principalmente quando estes retentores apresentam dimensões e forma- tos inadequados. Em especial, nesses casos, a remoção pode resultar em comprometimento da integridade do remanescente radicular e, consequentemente, em ne- cessidade de exodontia da raiz residual fraturada. Existem diversas técnicas e dispositivos propos- tos na literatura, desde a década de 1970, que bus- cam promover uma remoção com maior segurança e previsibilidade 2,3,5,6 . A associação das técnicas tem demonstrado maior eficiência na remoção dos reten- tores intrarradiculares, quando comparadas às técni- cas isoladas 1,7,10 . A vibração promovida pelas pontas de ultrassom, na linha de cimentação, pode facilitar a fragmentação do cimento existente entre o retentor e as paredes do canal, facilitando, desta forma, sua remoção com a aplicação da força de tração. O emprego do ul- trassom com essa finalidade tem sido muito discutido na literatura até os dias atuais, e alguns autores citam inclusive esse uso como elemento único da técnica de remoção de pinos intrarradiculares 7 . Quando utilizado isoladamente durante a remoção de retentores, geral- mente, é necessário um maior intervalo de tempo para a obtenção de sucesso. Entretanto, seu uso prolongado pode levar ao aquecimento e causar danos ao ligamento Trabalho realizado na Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas (FOP/Unicamp) – Campinas/SP. Endereço para correspondência: Carlos Augusto de Morais Souto Pantoja Departamento de Odontologia Restauradora, da Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Universidade Estadual de Campinas (FOP/Unicamp) Avenida Limeira, 901 – Caixa Postal 52 CEP 13414-018 – Piracicaba/SP Fone: (19) 2106-5215 / (19) 3421-0144 E-mail: [email protected]

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Remoção de retentores metálicos intrarradiculares com o Saca-pinos M&V: relato de casos clínicosCARLOS AUGUSTO DE MORAIS SOUTO PANTOJA*, JULIANA MARIA COSTA NUÑEZ PANTOJA**, CAIO CEZAR RANDI FERRAZ***, JOSÉ FLÁVIO AFFONSO DE ALMEIDA****

* Doutorando em Clínica Odontológica, Departamento de Odontologia Restauradora, Área de Endodontia, Faculdade de Odontologia de Piraci-caba, Universidade Estadual de Campinas (FOP/UNICAMP) – Piracicaba/SP.

** Pós-Doutoranda em Clínica Odontológica, Departamento de Prótese e Periodontia, Área de Prótese Dental, Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Universidade Estadual de Campinas (FOP/UNICAMP) – Piracicaba/SP.

*** Professor Adjunto da Área de Endodontia – Departamento de Odontologia Restauradora da Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Universi-dade Estadual de Campinas (FOP/UNICAMP) – Piracicaba/SP.

**** Professor Doutor da Área de Endodontia – Departamento de Odontologia Restauradora da Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Universi-dade Estadual de Campinas (FOP/UNICAMP) – Piracicaba/SP.

Resumo

O endodontista em sua clínica diária depara-se, com alguma frequência, com a necessidade de realiza-ção do retratamento endodôntico e, muitas vezes, previa-mente a esse procedimento, faz-se necessária a remoção de retentores intrarradiculares. Diversos aparelhos são disponibilizados no mercado com a finalidade de pro-mover o tracionamento do retentor intrarradicular. Den-tre eles, destaca-se o Saca-pinos M&V®, que pode ser utilizado isoladamente ou associado a outras técnicas previamente à tração. Nesse sentido, o presente trabalho relata dois casos clínicos distintos, que descrevem o uso desse dispositivo, suas vantagens, limitações e a influên-cia de outras técnicas durante a remoção.

DescRitoRes

Endodontia. Remoção. Técnica para retentor in-trarradicular.

intRoDução

Durante a execução de um plano de tratamento odontológico, o cirurgião-dentista se depara, muitas

vezes, com a necessidade de retratamento do sistema de canais radiculares. Isso, devido à ausência de repa-ro dos tecidos periapicais ou a tratamento endodôntico inadequado. Contudo, em algumas situações, o acesso a esse sistema encontra-se obstruído por núcleos e pinos intrarradiculares, os quais devem ser removidos previa-mente à reintervenção endodôntica.

A remoção de núcleos metálicos fundidos é ain-da um grande desafio ao endodontista, principalmente quando estes retentores apresentam dimensões e forma-tos inadequados. Em especial, nesses casos, a remoção pode resultar em comprometimento da integridade do remanescente radicular e, consequentemente, em ne-cessidade de exodontia da raiz residual fraturada.

Existem diversas técnicas e dispositivos propos-tos na literatura, desde a década de 1970, que bus-cam promover uma remoção com maior segurança e previsibilidade2,3,5,6. A associação das técnicas tem demonstrado maior eficiência na remoção dos reten-tores intrarradiculares, quando comparadas às técni-cas isoladas1,7,10. A vibração promovida pelas pontas de ultrassom, na linha de cimentação, pode facilitar a fragmentação do cimento existente entre o retentor e as paredes do canal, facilitando, desta forma, sua remoção com a aplicação da força de tração. O emprego do ul-trassom com essa finalidade tem sido muito discutido na literatura até os dias atuais, e alguns autores citam inclusive esse uso como elemento único da técnica de remoção de pinos intrarradiculares7. Quando utilizado isoladamente durante a remoção de retentores, geral-mente, é necessário um maior intervalo de tempo para a obtenção de sucesso. Entretanto, seu uso prolongado pode levar ao aquecimento e causar danos ao ligamento

Trabalho realizado na Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas (FOP/Unicamp) – Campinas/SP. Endereço para correspondência: Carlos Augusto de Morais Souto PantojaDepartamento de Odontologia Restauradora, da Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Universidade Estadual de Campinas (FOP/Unicamp)Avenida Limeira, 901 – Caixa Postal 52CEP 13414-018 – Piracicaba/SPFone: (19) 2106-5215 / (19) 3421-0144E-mail: [email protected]

Figura 1 - O Saca-pinos M&V® com seus respectivos dispositivos (espátula metálica e chave para aprisionamento dos mordentes).

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periodontal. A vibração ultrassônica aplicada ao metal por um longo período de tempo pode promover um aquecimento do núcleo metálico e causar possíveis da-nos, tanto à estrutura dentinária, quanto ao espaço ocu-pado pelo ligamento periodontal7.

Na década de 1980, o Prof. Dr. Luiz Valdrighi, da Área de Endodontia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP/UNICAMP), e o cirurgião-dentista es-pecialista em Endodontia Hugo Jorge de Moraes desen-volveram o dispositivo Saca-pinos M&V® (TRIGONA Ind. Com. Produtos Odontológicos Ltda., Rio Claro, SP) (Figura 1)8. Este tem como princípio de funciona-mento a realização da tração do núcleo metálico fundi-do, na medida em que a raiz residual é empurrada no sentido do longo eixo do retentor8. O Saca-pinos M&V® apresenta mordentes horizontais que se fixam à porção coronária do núcleo a ser removido, e verticais, os quais são responsáveis pela compressão exercida sobre a raiz remanescente.

Segundo Silva et al.8, esse dispositivo é capaz de remover pinos de dentes anteriores e pré-molares com segurança, mostrando um índice de sucesso de 99% dos casos em 18 anos do curso de Especialização da FOP/UNICAMP8, o que persistiu ao longo dos dez anos se-guintes, até os dias atuais.

Dessa maneira, o presente trabalho teve por objeti-vo descrever e discutir duas técnicas distintas de remo-ção de retentores intrarradiculares que são realizadas fazendo-se uso do Saca-pinos M&V®, utilizando-se ou não a vibração ultrassônica previamente à tração.

caso clínico 1

A paciente C.N.P., 38 anos, compareceu à clí-nica odontológica do Curso de Especialização em Endodontia da FOP/UNICAMP, com encaminhamento feito por um cirurgião-dentista, solicitando a remoção do retentor metálico intrarradicular do dente 11. De acordo com o plano de tratamento estabelecido pelo profissional, o dente seria submetido à reintervenção endodôntica e teria sua coroa protética substituída.

Na consulta inicial, a paciente relatou dor de ori-gem dental durante a mastigação e demonstrou insatis-fação com a estética da peça protética. Após a realiza-ção da tomada radiográfica (Figura 2) e da execução do teste de percussão vertical, verificou-se a presença de sintomatologia dolorosa e leve espessamento do liga-mento periodontal. No teste de palpação, não foi detec-tada sintomatologia dolorosa e alteração de volume na região apical.

Os procedimentos envolvidos na remoção do re-tentor intrarradicular foram realizados com o auxílio da magnificação oferecida pelo uso do microscópio opera-tório, da vibração promovida pelas pontas ultrassônicas e do tracionamento exercido pelo Saca-pinos M&V®. De acordo com o princípio de funcionamento deste dis-positivo, o retentor intrarradicular deve ser puxado por uma força de tração paralela ao longo eixo do canal ra-dicular, portanto, sem causar nenhum tipo de alteração no remanescente dental10.

A coroa protética do elemento dental 11 foi re-movida por meio de desgaste com o auxílio de brocas diamantadas esféricas, expondo todas as faces do pino metálico e a base da raiz nas porções proximais. Pontas de ultrassom, específicas para a terapia endodôntica, foram utilizadas na eliminação da linha de cimentação existente entre o retentor intrarradicular e a parede den-tinária, até a profundidade aproximada de 1 mm.

Um acréscimo de resina composta (Filtek™ Z250, 3M, Minnesota, EUA) foi realizado na porção cervical da raiz com o objetivo de criar uma superfície perpen-dicular ao longo eixo do pino metálico (Figura 3), o que possibilitou o estabelecimento de uma força de tração exercida pelo Saca-pinos M&V® com a mesma direção que a direção deste eixo10. Nos casos em que as superfí-cies mesial e distal do elemento dental em questão pos-suírem a mesma altura ou alturas muito próximas, essa manobra não é necessária.

Foi posicionada uma haste metálica fina (que faz parte do conjunto do saca-pinos) na porção cervical da raiz, a fim de permitir uma melhor distribuição das

Figura 2 - Radiografia periapical: caso clínico 1.

Figura 3 - Acréscimo de resina composta na base da raiz, criando uma superfície perpendicular ao longo eixo do pino metálico.

Figura 4 - (A) Encaixe da haste metálica na base da base da raiz; (B) Aprisionamento dos mordentes horizontais nas faces vestibular e lingual do retentor intrarradicular; (C) Deslocamento dos mor-dentes verticais até a base da raiz; (D) Estabilização do Saca-pinos M&V® durante a remoção do retentor intrarradicular.

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forças, minimizando possíveis diferenças de altura das bases dentais ou restauradas e evitar a ocorrência de trincas e fraturas no remanescente radicular. O Saca-pinos M&V® foi colocado sobre a haste metálica de forma a permitir o posicionamento do pino, perpendi-cularmente aos mordentes horizontais e paralelamente aos mordentes verticais10. As roldanas do dispositivo foram acionadas no sentido anti-horário, com o auxí-lio de uma chave metálica, para a apreensão dos mor-dentes horizontais e para a realização do tracionamento do retentor intrarradicular, pelos mordentes verticais. Durante a execução destes procedimentos foi necessá-rio promover o apoio digital do Saca-pinos M&V® e da chave com a finalidade de evitar o deslocamento deste dispositivo, reduzindo a tensão sobre a raiz. A roldana superior do dispositivo foi acionada, fazendo com que os mordentes verticais fossem deslocados em direção ao longo eixo do dente, no sentido apical (Figura 4), até a movimentação do retentor metálico (Figura 5), sem que ocorresse nenhum dano ao remanescente radicular.

Após a completa remoção, foi realizado o retrata-mento endodôntico; confeccionada e cimentada uma coroa unitária provisória para posterior execução dos procedimentos protéticos definitivos.

caso clínico 2

A paciente V.C., 33 anos, estava sob tratamen-to odontológico na Clínica de Graduação da FOP/UNICAMP e, no planejamento a ser executado, o ele-mento dental 21 deveria ser submetido à reinterven-ção endodôntica com posterior reabilitação protética. Entretanto, para a realização destes procedimentos foi necessário realizar previamente a remoção do retentor metálico intrarradicular.

De acordo com a avaliação radiográfica e com o resultado positivo do teste de percussão, verificou-se a necessidade de realização do retratamento endodôntico (Figura 6). A má adaptação e o comprometimento da estética da coroa total do dente 21 foram fatores que levaram à sua substituição.

De forma semelhante ao relato de caso descrito anteriormente, após a remoção da coroa, as faces vesti-bular e lingual do retentor intrarradicular foram desgas-tadas para facilitar o aprisionamento do pino metálico pelos mordentes laterais do Saca-pinos M&V®10.

Diferentemente do caso anterior, a linha de cimen-tação existente entre o pino metálico e a parede den-tinária não foi removida com o auxílio de pontas ul-trassônicas, e sim com a penetração de brocas esféricas

Figura 6 - Radiografia periapical: caso clínico 2.

Figura 7 - Acréscimo de ionômero de vidro na base da raiz para criar uma superfície perpendicular ao longo eixo do retentor intrar-radicular.

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Figura 5 - (A) Retentor intrarradicular em posição inicial; (B) Movimentação do retentor intrarradicular após a aplicação da força de tração; (C) Remoção do conjunto Saca-pinos M&V®, retentor e material restaurador.

diamantadas de diâmetro reduzido, a 1 mm de profun-didade. A ausência da vibração promovida pelas pontas de ultrassom dificultou a remoção do núcleo metálico, sendo necessária a aplicação de maior força de tração pelo Saca-pinos M&V®, quando comparado à força exercida no Caso 1. Da mesma forma, foi observado um aumento no tempo de execução dos procedimentos de remoção do pino metálico.

Na porção cervical da raiz foi acrescentado o ma-terial restaurador ionômero de vidro, para promover o nivelamento da base da raiz10 e para suportar a força de tração gerada pelos mordentes superiores (Figura 7). Tanto o ionômero de vidro, quanto a resina compos-ta, são materiais que podem ser empregados para este fim, e a escolha irá depender da acessibilidade deste material.

O Saca-pinos M&V® foi colocado na base da raiz de forma a permitir o posicionamento do retentor. O método e os procedimentos executados durante a re-moção do retentor intrarradicular também foram seme-lhantes aos realizados no caso anterior (Figura 8).

Após sua completa remoção, o conduto radicular foi retratado e uma coroa unitária provisória foi con-feccionada e cimentada, para posterior execução dos procedimentos protéticos definitivos.

Discussão

A taxa de insucesso do tratamento endodônti-co citada na literatura atual gira em torno de 10%4. Sabe-se que a primeira opção de tratamento para esses casos é o retratamento não cirúrgico do sistema de ca-nais radiculares. Grande parte dos casos de insucesso apresenta-se com o acesso aos canais radiculares obs-truídos por coroas totais e retentores intrarradiculares, que devem ser removidos previamente ao retratamen-to endodôntico.

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Durante os procedimentos de remoção dos retento-res intrarradiculares, o endodontista pode se deparar com desagradáveis situações, como fraturas ou perfurações da raiz remanescente, o que pode levar o fracasso do trata-mento. Para evitar esses dissabores, diversos dispositivos foram projetados com a finalidade de permitir o traciona-mento seguro dos núcleos metálicos fundidos2,3,5,8,9.

Nos casos clínicos anteriormente descritos, fez-se uso do dispositivo Saca-pinos M&V® (TRIGONA Ind. Com. Produtos Odontológicos Ltda., Rio Claro, SP) para realizar o tracionamento dos pinos intrarradi-culares. Esse dispositivo foi elaborado partindo-se do princípio de funcionamento de que, ao se empurrar a raiz do elemento dental, aprisionando-se o pino, este é consequentemente tracionado e removido8.

A técnica oferecida por esse dispositivo permite a remoção de núcleos cimentados em incisivos, caninos e pré-molares das arcadas superior e inferior8. Esta pode ser considerada uma grande vantagem de utilização, quando comparada a outras técnicas, que empregam dispositivos com dimensões e designs desfavoráveis, não permitindo a remoção de pinos cimentados em pré-molares e molares10.

No caso clínico 1, fez-se uso de recursos auxiliares à remoção do núcleo metálico, tais como a magnifica-ção e iluminação do microscópio clínico e as vibrações ultrassônicas do aparelho de ultrassom. A ampliação e iluminação do campo operatório permitiram uma me-lhor visualização dos limites de ação das brocas e das pontas de ultrassom, o que possibilitou maior controle do desgaste do retentor e da estrutura do remanescente dental, além de permitir a quebra da linha de cimenta-ção existente entre o núcleo metálico e as paredes den-tinárias. Com a associação desses recursos, foi possível

Figura 8 - (A) Aprisionamento dos mordentes horizontais e verticais no retentor intrarradicular; (B) Remoção do conjunto Saca-pinos M&V®, retentor e material restaurador.

evitar a possibilidade de ocorrência de perfurações. Além disso, a quebra da linha de cimentação previa-mente à tração contribuiu para diminuição da força necessária ao deslocamento do retentor intrarradicular, tornando mais fácil e rápido o processo de remoção, de acordo com Berbert et al.1. Isso explica o motivo pelo qual foi mais fácil e rápida a remoção do núcleo no pri-meiro caso descrito, quando comparado ao segundo.

O preparo do núcleo metálico, previamente à reali-zação dos procedimentos de remoção, deverá ser realiza-do. É essencial que a porção cervical da raiz que será em-purrada esteja perpendicular ao longo eixo do retentor, que será aprisionado pelos mordentes laterais do Saca-pinos M&V®8. Caso contrário, o vetor oblíquo de forças formado irá dificultará a remoção do retentor, além de poder proporcionar a fratura do remanescente radicular. Essa situação de perpendicularidade pode ser obtida tan-to com o acréscimo de resina composta na base da raiz, quanto com o acréscimo de ionômero de vidro. Ambos os materiais oferecem resistência suficiente para suportar a força aplicada pelos mordentes verticais. Em casos de dúvida quanto à perpendicularidade do posicionamento do saca-pinos, pode-se realizar uma radiografia periapi-cal com o saco-pinos em posição e verificar se o direcio-namento do equipamento e do retentor está adequado.

Da mesma forma, é imprescindível que seja es-tabelecido um paralelismo entre as faces vestibular e lingual do retentor por meio de desgaste com broca diamantada, para facilitar o aprisionamento deste pelos mordentes horizontais8. Na ausência do paralelismo, o aprisionamento fica comprometido e a possibilida-de de deslocamento ou soltura do Saca-pinos M&V® é maior.

abstRact

Removal of intraradicular cast posts with M&V device: clinical cases report

The endodontist, in his daily clinical, encounters himself with some frequency with the necessity of endodontic retreatment. So, sometimes it is necessary to remove intraradicular cast posts previously to this procedure. Thus, some devices are available in market aiming to pull the pin to be removed. Among them, stands out the M&V® de-vice, which can be used singly or associated with other procedures previously to the tension. In this way, the present study relates two case reports, which describe this device use, including the advantages and limitations. In addition, the cases reports are compared each other showing the advantage of using this device with technical association.

DescRiptoRs

Endodontics. Lifting. Post and core technique.

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O posicionamento da haste metálica fina na porção cervical da raiz contribui para que haja melhor distribui-ção de tensões para o remanescente radicular no momen-to do tracionamento. Entretanto, muitas vezes, distâncias reduzidas entre a coroa dos elementos adjacentes, bem como condições anatômicas desfavoráveis não permitem o encaixe perfeito dessa haste. Isso é muito comum em casos de incisivos inferiores e núcleos com altura reduzi-da. No segundo caso descrito, ao contrário do primeiro, não foi possível fazer uso deste aparato de segurança, o que não inviabilizou a remoção do núcleo, pois havia pa-ralelismo entre as paredes após a restauração.

Com a descrição dos casos clínicos em questão, fica claro que a associação das técnicas de magnificação e vi-bração ao uso do Saca-pinos M&V® facilita a execução do procedimento de remoção dos núcleos metálicos fun-didos. Contudo, é importante salientar que a seleção do

caso clínico é fundamental para o sucesso do procedimen-to com o auxílio desse dispositivo. Remanescentes radi-culares fragilizados, com excesso de tecido cariado, com paredes dentinárias muito delgadas, ou com porções cer-vicais muito sub-gengivais podem resultar em fratura ra-dicular ou em impossibilidade de utilização do Saca-pinos M&V®. Nestas circunstâncias, a remoção dos retentores intrarradiculares poderá ser efetuada por meio de desgaste com o auxílio de brocas diamantadas e multilaminadas.

conclusão

O Saca-pinos M&V® é um dispositivo eficiente para a remoção de retentores metálicos intrarradicu-lares. Da mesma forma, quando é associado a outros recursos auxiliares, tais como vibração ultrassônica, magnificação e iluminação do campo operatório, o pro-cedimento torna-se mais rápido, fácil e previsível.

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Recebido em: 6/7/11 Aceito em: 3/10/11