Resenha - Rubem Alves

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Resenha Crítica ALVES, Rubem. Educação dos Sentidos e mais... 9ª ed. Campinas, SP: Verus Editora, 2012, 124p. Com o olhar de um poeta, Rubem Alves aborda ao longo do livro o prazer do aprendizado. De forma crítica, profunda e desafiadora direciona-se a refletir a educação por meio dos sentidos: ver, ouvir, tocar. Além de tratar de temas correlatos aos sentidos, dialogando sobre arte, leitura, ensino e de modo peculiar o vestibular. Na primeira parte do livro, Rubem Alves dialoga com o leitor sobre o que considera a tarefa da educação: dotar as pessoas de caixas - a caixa de ferramentas e a caixa de brinquedos. Quanto a primeira, citada como melhorias para o corpo que proporciona meios para se viver, o autor ressalta que a tarefa de cada geração seria passar aos filhos, de herança, mas discorre sobre algo que observa também como importante: a arte de construir ferramentas, para a realização da qual se exige saber pensar. A caixa de ferramentas também necessita ter utilidade, sem a qual não perdura. E a caixa de brinquedos, que representa as razões de se viver, e que não foi feita para ser útil, mas desfrutada. Possibilitar amar algo por ele mesmo. Assim questiona sobre como a escola ensina. A partir do que descreve como tarefas da educação, propõe pensar nessas tarefas a partir da caixa de brinquedos. Para ele “uma inteligência flácida é uma inteligência sem desejo. [...] é a emoção que procura a inteligência (p.20) e são os

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Resenha Crítica

ALVES, Rubem. Educação dos Sentidos e mais... 9ª ed. Campinas, SP: Verus Editora, 2012, 124p.

Com o olhar de um poeta, Rubem Alves aborda ao longo do livro o prazer do

aprendizado. De forma crítica, profunda e desafiadora direciona-se a refletir a

educação por meio dos sentidos: ver, ouvir, tocar. Além de tratar de temas correlatos

aos sentidos, dialogando sobre arte, leitura, ensino e de modo peculiar o vestibular.

Na primeira parte do livro, Rubem Alves dialoga com o leitor sobre o que

considera a tarefa da educação: dotar as pessoas de caixas - a caixa de ferramentas

e a caixa de brinquedos. Quanto a primeira, citada como melhorias para o corpo que

proporciona meios para se viver, o autor ressalta que a tarefa de cada geração seria

passar aos filhos, de herança, mas discorre sobre algo que observa também como

importante: a arte de construir ferramentas, para a realização da qual se exige saber

pensar. A caixa de ferramentas também necessita ter utilidade, sem a qual não

perdura. E a caixa de brinquedos, que representa as razões de se viver, e que não

foi feita para ser útil, mas desfrutada. Possibilitar amar algo por ele mesmo. Assim

questiona sobre como a escola ensina.

A partir do que descreve como tarefas da educação, propõe pensar nessas

tarefas a partir da caixa de brinquedos. Para ele “uma inteligência flácida é uma

inteligência sem desejo. [...] é a emoção que procura a inteligência (p.20) e são os

sentidos (educados) que proporcionam esse prazer, e assim relata, com a

intensidade de sua caixa de brinquedos, sobre a arte de ver; de ouvir; o aprender a

escutar os sons do mundo, de permitir-se a contemplação, ouvir a música (música

da natureza e dos objetos sonoros criados) e viajar com ela, assim como o tato,

como sensibilidades a serem usufruídas pela educação.

Quanto ao tato, o autor abre um parênteses, definindo-o como a divisa entre

Eros e tânatos. Eros por ser fonte de prazer, onde o amor se realiza, ou em seu

lugar a tortura, tânatos. Enquanto fonte de prazer, discorre sobre o seio, que exerce

uma função prática: alimentar, mas também proporciona o prazer tátil; como tortura

decide tratar sobre o bullying por ser uma forma de tortura no ambiente escolar.

Assim o autor trata nesta primeira parte da educação pela sensibilidade,

experiências essenciais que devem inscrever-se no espaço escolar.

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Em sua segunda parte, conduz a pensar o aprender como ações, sensações

e sentimentos. E assim revela: É brincando que se aprende. Porque o brinquedo

teria por propriedade incitar ao desafio, desafio também à inteligência, e a

inteligência gosta de brincar e é brincando que se torna mais inteligente. Ressalta

ainda, aprendo porque amo. Aprende-se algo do qual não se gostava por se gostar

da pessoa que ensina. Por amor passa-se a gostar de algo como forma de estar

com o outro.

Nesse contexto também provoca o leitor a pensar sobre ensino e vestibular, e

faz uma crítica ao vestibular comparando-o a uma sombra que se estende para trás,

pela imposição que coloca ao ensino, determinando os padrões de conhecimentos e

inteligência a serem estabelecidos. Revela que, o que sobrevive a ação do

esquecimento é aquilo que realmente foi aprendido, fez sentido, a memória guarda

aquilo que lhe dá prazer.

É na crítica ao vestibular, ao indagar sobre que competências são adquiridas

com o vestibular, entendendo que competência relaciona-se a capacidade de

resolver problemas reais e concretos que se apresentam à vida, que Rubem Alves

retorna ao início de seu diálogo, as caixas: de ferramentas, que contém os

conhecimentos-ferramentas, que ajudam a entender e a fazer as coisas e a de

brinquedos, com os prazeres, que dão alegria e sentido à vida.

Ao falar do prazer, seduz o leitor a refletir sobre o prazer na leitura, porém

discorre que a leitura assim como a música são artes, exigem ritmo e musicalidade

para que se possa contemplá-los. O gostar começa pelo ouvir, e assim como na

música em que gostar vem pelo ouvir um piano ou outro instrumento sendo bem

tocado, na leitura o gosto surge ouvindo o artista lê e interpretar (dar vida) um texto.

Rubem Alves desvela significados da educação para as quais fechamos os

olhos por achar que apenas certos caminhos levam a boas escolhas. Assim fala da

poesia por ela mesma, sem querer interpretá-la, mas senti-la. Das limitações da

ciência, diante de um mundo real que metodologias científicas não conseguem

abarcar. E que, como escritor, escreve para mudar olhares. Para ele pensar não é

saber respostas, mas saber fazer as perguntas, e o “início do pensamento se

encontra nos olhos que têm a capacidade de se assombrar com o que veem” (p.79).

Com analogias simples, mas com muita riqueza e com auxílio da literatura e

de grande poetas associa a beleza da arte e do contato com os sentidos ao

desvelamento que a educação precisa proporcionar, a suas infinitas possibilidades.

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Sua leitura leva a compreensão da sensibilidade que os sentidos possuem para a

vida, e nesse contexto para a educação, pensar em uma educação com sentido, faz-

se por meio da educação dos sentidos.