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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATU SENSU” PROJETO VEZ DO MESTRE RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS AO MEIO AMBIENTE E A DEVIDA REPARAÇÃO Douglas Holanda Barbosa RIO DE JANEIRO 2005

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATU SENSU”

PROJETO VEZ DO MESTRE

RESPONSABILIDADE CIVIL

POR DANOS AO MEIO AMBIENTE

E A DEVIDA REPARAÇÃO

Douglas Holanda Barbosa

RIO DE JANEIRO 2005

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

RESPONSABILIDADE CIVIL

POR DANOS AO MEIO AMBIENTE

E A DEVIDA REPARAÇÃO

Monografia apresentada como exigência final do Curso de Pós-graduação em Direito Ambiental da UCAM – Universidade Cândido Mendes, tendo como escopo a questão da reparação ambiental na esfera civil, com o objetivo primordial de se chegar ao estado no qual o bem ambiental originalmente se encontrava.

RIO DE JANEIRO

2005

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DEDICATÓRIA

Aos meus pais Delson e Mara, por tudo o que hoje sou, o que com eles aprendi, por todo amor e carinho a mim dispensados. O reconhecimento eterno pelo que me proporcionaram – a oportunidade de chegar aonde cheguei.

Por fim, em especial, a minha companheira de todas as horas, Débora, por dividir comigo todos os momentos desse meu trabalho monográfico.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 07 CAPÍTULO I 08

NOÇÕES GERAIS DA ESFERA AMBIENTAL 08

CAPÍTULO II 26

DA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL 26

CAPÍTULO III 42

A QUESTÃO DA DEVIDA COMPROVAÇÃO, VALORAÇÃO E REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL 42

CONCLUSÃO 61

BIBLIOGRAFIA 62

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RESUMO

O surgimento das principais inovações na legislação ambiental está

atrelado à promulgação da Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, cujos comandos

atenderam às exigências da coletividade. Além de conferir legitimidade ao Ministério

Público para atuar em defesa do meio ambiente, a referida legislação infraconstitucional

estabeleceu o conceito de poluidor, principal responsável pelo dano ambiental.

Mas a principal característica contida na Lei 6.938/81 diz respeito à

inserção da regra da RESPONSABILIDADE OBJETIVA nas questões relacionadas

ao meio ambiente. Tal comando legal também é denominado pela doutrina pátria como

teoria do risco, na qual aquele que, através de sua atividade, cria um risco de dano para

terceiros, deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua atividade e o seu comportamento

sejam isentos de culpa.

O referido enquadramento difere daquele existente no direito privado,

isto porque na esfera do dano ambiental não há necessidade do ato ser ilícito e não se

perquire a culpa do autor do dano tal linha de posicionamento, tem-se que para a

caracterização do dano ambiental somente é necessária a demonstração do causador da

conduta ou atividade/omissão, o dano ambiental e finalmente o nexo causal.

Nesta condição e à luz das disposições legais, cabe estabelecer a quem

compete a responsabilidade pela reparação do dano ambiental.

Pode-se dizer que a responsabilidade primeira – mas não exclusiva –

pelos danos ambientais cabe ao empreendedor, pois é ele o titular do dever principal de

zelar pelo meio ambiente e é ele quem aproveita, direta e economicamente, a atividade

lesiva.

Ressalta-se que, na hipótese de existir mais de um empreendedor, a

reparação poderá ser exigida de qualquer um dos responsáveis, em virtude da

solidariedade de ambos.

Em suma, deve-se sempre ter em mente que no âmbito do direito

ambiental a responsabilidade pelo dano é objetiva — teoria do risco — e para sua

caracterização basta a comprovação de que o prejuízo decorreu do resultado de

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determinada atividade e não do comportamento do agente.

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INTRODUÇÃO

A monografia que ora se conclui, foi dividida basicamente em três partes,

cada uma compondo um capítulo específico. Em seu primeiro capítulo, a intenção maior

foi transmitir uma noção inicial a respeito do histórico da legislação ambiental

brasileira, da conceituação doutrinária sobre meio ambiente e poluição e, também,

apresentar os princípios básicos da questão ambiental.

No segundo capítulo, foi analisado a responsabilidade sob diversos

ângulos, verificando como se deu a instituição da responsabilidade objetiva na

legislação brasileira. Contou ainda, o referido capítulo, com uma abordagem sobre a

responsabilidade civil subjetiva, assim como a responsabilidade civil objetiva e suas

peculiaridades.

Por fim, o terceiro e último capítulo tratou do dano ao meio ambiente e o

problema que envolve sua comprovação e conseqüente valoração, passando por

questões como a avaliação monetária do meio ambiente e o dano futuro, a reparação do

dano em seu caráter essencial para que se alcance o almejado objetivo de evitar ou, pelo

menos, retardar efeitos maiores de degradação ambiental.

Nesta última parte ainda tiveram lugar a exposição de alguns óbices

levantados pelos principais doutrinadores, bem como sucintas sugestões de alternativas

e modificações, que se julgadas cabíveis, podem reduzir as conseqüências dos

obstáculos apresentados.

Entre as considerações finais pode destacar-se a constatação de que o

Direito Ambiental tem recebido maior atenção nos últimos anos, sendo que ainda não se

aproxima da importância que normalmente se atribui a outros ramos do direito; e a

verificação de que na própria doutrina encontram-se alternativas relevantes para os

problemas de preservação e reparação ambiental.

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CAPÍTULO I

Noções Gerais da Esfera Ambiental

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1.1 - Breve Histórico da Legislação Ambiental Brasileira

A legislação brasileira, assim como ocorreu em diversos outros países,

inclusive nos ditos desenvolvidos, tardou a contemplar expressamente a questão

ambiental em sua Constituição Federal, vindo isso a ocorrer apenas com a promulgação

da Carta Magna no ano de 1988. Além disso, os dispositivos legais dedicados à temática

do meio ambiente e que a norteiam e direcionam, encontravam-se dispersos e, de certa

forma, dificilmente aplicáveis.

Em virtude de tal constatação, apresenta-se de relevante interesse, antes

de desenvolver um estudo direcionado ao chamado Direito Ambiental, que se faça uma

abordagem, ainda que sucinta, da evolução histórica da legislação ambiental no

ordenamento jurídico pátrio até os dias atuais, passando pelo supracitado texto

constitucional.

Apesar da atual Constituição estar apenas iniciando sua segunda década

de vigência, e da legislação esparsa anterior pertinente à tutela do meio ambiente não

ser tão antiga em relação à mesma, observa Paulo Affonso Leme Machado1:

“O Direito Ambiental constituiu-se mais

rapidamente no Brasil que na maioria dos países. O fato

de não termos um código ambiental não impediu a

sistematização das novas regras jurídicas.”

Assim sendo, podemos elaborar um quadro cronológico, expondo como

sobrevieram os principais dispositivos legais com o objetivo de proteger o patrimônio

ambiental e delimitar sua exploração, da seguinte maneira:

· 1965 – Lei n.º 4.771, de 15 de setembro, alterada pela lei

n.º 7.803/89: instituiu o Código Florestal, que, entre outras disposições,

1MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, 7ª Ed., São Paulo: Malheiros, 1998.

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reconheceu a atribuição dos Municípios elaborarem os respectivos planos

diretores e leis de uso do solo (art. 2º , parágrafo único), previu a

recuperação da cobertura vegetal (art. 18), definiu o que são as áreas de

preservação permanente (art. 20), e teve aplicação ampla na área penal (art.

26 e seguintes);

· 1967 – Decreto- lei n.º 221, de 28 de fevereiro: instituiu o

chamado Código de Pesca, que, entre outros dispositivos, estabelece

proibições à pesca (art. 35), regulamenta o lançamento de efluentes das redes

de esgoto e os resíduos líquidos ou sólidos industriais às águas (art. 37),

estabelece penas às infrações (art. 57 e seguintes);

· 1980 – Lei n.º 6.803, de 02 de julho: refere-se ao Estudo

de Impacto Ambiental.

· 1981 – Lei n.º 6.938, de 31 de agosto: dispõe sobre a

Política Nacional de Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação

e aplicação. Estabeleceu seus objetivos (art. 4 º) e a constituição do Sistema

Nacional do Meio Ambiente (art. 6º , alterado pela lei n.º 8.028/98);-

· 1988 – Constituição da República Federativa do Brasil,

promulgada em 05 de outubro: prevê um capítulo integralmente dedicado ao

meio ambiente (capítulo VI, do título VIII, da Ordem Social) que é, em

suma, o artigo 225, onde estabelece:

“Todos têm direito ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e

essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder

público a à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para

as presentes e futuras gerações”.

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· 1992 – Declaração do Rio de Janeiro: surgiu da

Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que

reuniu as principais autoridades internacionais para tratar do meio ambiente e

estabeleceu princípios para uma melhor condução das atividades objetivando a

preservação ambiental;

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1.2 - Meio Ambiente e Poluição

A conceituação do que vem a ser o meio ambiente e, principalmente, a

sua poluição é um tópico de conhecimento necessário para quem inicia uma análise

mais extensa no que se refere a esse meio ambiente, considerando-se base primordial

para tal. Sendo assim, fazem parte dos textos introdutórios de grande parte dos

doutrinadores que tratam do tema, apesar de sua previsão e conceituação legal

específica na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, desde 1981, de certa maneira

diminuir sua aplicabilidade.

A poluição é outro fenômeno, se pode ser assim chamado, que tem que

ser estudado na intenção de buscar uma definição que possibilite avançar nos trabalhos

com o máximo de compreensão das características da mesma bem como de suas

conseqüências.

Os autores também têm dedicado parte de suas obras à questão que

envolve a elaboração de um conceito para definir o que é poluição, sendo nesse

propósito bastante abrangentes.

Hely Lopes Meirelles 2 assim apresenta seu conceito de poluição:

“Poluição é toda alteração das propriedades

naturais do meio ambiente, causadas por agente de qualquer

espécie, prejudicial à saúde, à segurança ou ao bem estar da

população sujeita a seus efeitos”.

Nessa mesma linha de pensamento, o autor José Afonso da Silva 3 define

poluição como:

2 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir, Ed. Revista dos Tribunais. São Paulo, 4ª ed., 1983, p. 178. 3 SILVA, José Afonso da. Direito urbanístico Brasileiro .,São Paulo: Ed. Revista dos tribunais, 1981, p. 443.

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“Qualquer modificação das características do

meio ambiente, de modo a torná-lo impróprio às formas de vida

que ele normalmente abriga”.

Por sua vez, mostrando-se mais completa e atualizada, a Lei n.º 6.938, de

31 de agosto de 1981, dispõe que para fins legais entende-se poluição como a

degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente

prejudiquem a saúde, a segurança e o bem estar da população, criem condições adversas

às atividades sociais e econômicas, afetem desfavoravelmente a biota, afetem as

condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente ou, ainda, que lancem matérias ou

energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos. Nota-se que com essa

abrangência, a legislação protegeu o homem, a comunidade, o lazer, o desenvolvimento

econômico, o patrimônio público e o privado, a paisagem, os monumentos naturais e

seus arredores, além dos locais de valor histórico ou artístico.

Como se pôde constatar pelas definições de poluição apresentadas, esse

fenômeno, se assim pode ser chamado, se traduz invariavelmente em destruição. Essa

destruição, qualquer que seja a forma como se manifeste, gera prejuízos de toda ordem,

seja em termos de economia, saúde ou segurança, entre outros, a um incalculável

número de vítimas.

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1.3 - Os Princípios Básicos do Direito Ambiental

A questão ambiental, como assunto de preocupação da Comunidade

Internacional, foi, nas últimas duas décadas, objeto de importantes manifestações na

forma de declarações de princípios que, principalmente, visam traçar algumas linhas de

ação no que se refere aos modos de atuação necessários à proteção do meio ambiente,

ressaltando entre eles a importância da participação popular no processo como um todo,

a necessidade de uma educação que contemple a causa do meio ambiente em todos os

seus níveis, a prevenção como forma de diminuir os danos e evitar prejuízos

irrecuperáveis e, ainda, a imputação ao poluidor da obrigação de reparar os danos que

causar.

Começou a surgir dessa maneira o reconhecimento oficial e internacional

da importância de que se revestiam discussões relacionadas à ecologia e à preservação

do meio ambiente que, até então, estavam restritas a alguns países mais desenvolvidos.

A Declaração Internacional de Estocolmo, na Suécia, elaborada em 1972,

resultado da I Conferência Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, da qual

participaram representantes de 113 países, é considerada um marco histórico político

internacional decisivo para o surgimento de políticas de gerenciamento do ambiente,

estabeleceu 23 princípios internacionais de proteção ambiental, em época na qual a

legislação brasileira apesar de já contar com o chamado Código de Águas, instituído

pelo Decreto n.º 24.643, de 10 de julho de 1934, e o Código Florestal, Lei n.º 4.771, de

15 de setembro de 1965, ainda não atribuía em sua plenitude ao bem ambiental o caráter

de interesse coletivo.

Em junho de 1985, o Conselho da Comunidade Européia aprovou e

divulgou um conjunto de diretrizes objetivando o aperfeiçoamento da política de

preservação do meio ambiente e da qualidade de vida especialmente na Europa,

repercutindo evidentemente nos estudos realizados nos países dos demais continentes.

Na Reunião Mundial das Associações de Direito do Meio Ambiente,

realizada em 15 de novembro de 1990, na Universidade de Limoges, na França,

aprovou-se uma Declaração de Recomendações, que leva o mesmo nome, abordando

quinze conjuntos de recomendações para melhoria do meio ambiente em todo o mundo,

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entre as quais destacam-se as recomendações sobre a responsabilidade sem culpa por

dano ambiental, que deve, segundo tal declaração, ser afirmado nos textos nacionais e

internacionais como princípio geral, salvo no que concerne à responsabilidade penal.

Menos de dois anos após a Declaração de Limoges, entre 3 e 14 de junho

de 1992, realizou-se na cidade do Rio de Janeiro, a Conferência das Nações Unidas

sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, com a participação de representantes dos

mais diversos países e organizações, na qual elaborou-se a Carta do Rio sobre

Desenvolvimento e Meio Ambiente, cujos princípios mais importantes, entre os 27

proclamados, serão abordados a seguir, em conjunto com as orientações internacionais

anteriormente referenciadas e a posteriormente realizada Convenção de Lugano, na

Suíça.

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1.3.1 - O Princípio da Educação Ambiental

O princípio da educação ambiental surge como forma de possibilitar às

populações o conhecimento necessário para que se possam implementar as mais

diversas atividades e ações relacionadas à preservação do meio ambiente, inclusive a

compreensão e adoção dos outros princípios estabelecidos.

A anteriormente citada Declaração de Estocolmo 4 estabeleceu, com

respeito à educação, que:

“É indispensável um trabalho de educação sobre

as questões ambientais, visando tanto às gerações jovens como os

adultos, dispensando a devida atenção ao setor das populações

menos privilegiadas, com a finalidade de desenvolver as bases

necessárias para esclarecer a opinião pública e dar aos

indivíduos, empresas e coletividades o sentido de suas

responsabilidades, relativamente à proteção humana e

melhoramento do meio ambiente, em toda a sua dimensão

humana”.

Nota-se no texto transcrito a presença de uma preocupação maior com as

ditas “populações menos privilegiadas”, ponto no qual se pode estabelecer uma crítica

baseada no fato de que as pessoas com maiores possibilidades de controlar e influenciar

os processos de produção, os ocupantes de posições de comando dentro do contexto

social, os legisladores em geral e, até mesmo, os tantos operadores do Direito, não são,

de maneira alguma, considerados como aqueles.

O princípio da Educação Ambiental deve ser entendido em seu aspecto

mais amplo, ou seja, o mais abrangente possível. Não há o porque restringi- lo a uma

determinada faixa da população, do território ou qualquer outra diminuição de sua

capacidade de atuar.

4 Declaração Internacional de Estocolmo, princípio n.º 19.

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Tal pensamento é assim manifestado pela Constituição Federal, que em

seu artigo 225, parágrafo 1º, inciso IV, prevê como incumbência do Poder Público:

“Promover a educação ambiental em todos os

níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação

do meio ambiente”.

Por todos os níveis de ensino deve ser entendida a educação primária,

secundária e, também, a educação superior, devendo ser estabelecidos os conteúdos

mais adequados a cada grau de conhecimento, não se excluindo do Poder Público a

responsabilidade pela orientação e fiscalização do referido ensino nas escolas e colégios

particulares.

Reveste-se de grande importância a inserção de tópicos relativos à

prevenção de atividades e comportamentos poluidores, por menores que sejam, e

estudos básicos de legislação ambiental nos meios acadêmicos em geral, e não apenas

em uma minoria de cursos privilegiados com tal valorização curricular.

Assim podemos dizer que, o Brasil não tem uma política educacional

definida, muito menos uma política para a chamada Educação Ambiental. Imerso em

dificuldades econômicas crônicas, e em exaustivas e infrutíferas discussões acadêmicas

de cunho epistemológico sobre a natureza da educação ambiental, o Brasil viu os anos

passarem, e ficou atrás na história. Confundiu-se o ensino da Ecologia com a prática da

Educação Ambiental e produziu-se toda uma geração de materiais educativos

absolutamente equivocados, a despeito de sua importância no contexto evolucionário.

Dentro desse contexto de valorização da educação ambiental, foi, em 27

de abril de 1999, sancionada a Lei Federal n.º 9.795, que cria a Política Nacional de

Educação Ambiental, a ser regulamentada em um prazo de noventa dias após a

publicação.

A lei define princípios básicos da educação ambiental, como: o enfoque

humanista, holístico, democrático e participativo; a vinculação entre a ética, a educação,

o trabalho e as práticas sociais; e o reconhecimento e o respeito à pluralidade e à

diversidade individual e cultural. São definidos, ainda, objetivos fundamentais, entre

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eles, o desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio ambiente em suas

múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos, psicopolíticos, legais,

políticos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos.

O advento desta recente lei, vêm, assim, propiciar uma nova preocupação

,desta feita, que realmente seja praticada uma política educacional efetiva no âmbito do

meio ambiente.

A questão da educação ambiental também abrange as Ciências Jurídicas,

ou seja, a necessidade de que todos os personagens que operam de alguma forma no

campo do Direito, dominem os conceitos básicos e os princípios mais relevantes, tendo

papel fundamental nessa empreitada a inclusão de disciplinas, de caráter obrigatório,

relacionadas ao assunto em questão, possibilitando a obtenção, análise e discussão das

noções elementares sobre o chamado Direito Ambiental, por parte dos futuros

magistrados, membros do Ministério Público e advogados.

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1.3.2 - O Princípio da Precaução e o Papel do Poder Público

A prevenção é, sem dúvida, a solução que melhor se aplica a qualquer

tipo de problema, qualquer que seja o assunto em tela. No que se refere a danos

ambientais, essa observação ganha contornos ainda de maior importância, haja vista as

dificuldades para atingir-se uma reparação integral dos eventuais danos, questão que

será oportunamente tratada. Ensina a respeito Hely Lopes Meirelles 5 que:

“Melhor será, sempre, a ação preventiva, visto que

há lesões irreparáveis “in specie”, como a derrubada ilegal de

uma floresta nativa ou a destruição de um bem histórico, valioso

pela sua origem e autenticidade”.

A observação sobre a suscetibilidade limitada dos danos causados ao

meio ambiente em relação à esperada reparação, enseja a inclusão, entre os princípios

mais importantes dos enunciados na Declaração do Rio de Janeiro de 1992, do Princípio

n.º 15 6, da Precaução, no qual observa-se:

“De modo a proteger o meio ambiente, o

princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos

Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver

ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta

certeza científica não deve ser utilizada como razão para

postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para

prevenir a degradação ambiental”.

5 MEIRELLES, Hely Lopes. Proteção ambiental e ação civil pública. RT 611/11. 6 Declaração do Rio de Janeiro de 1992, do Princípio n.º 15

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O princípio da precaução, em sua aplicação, tem como um dos itens mais

importantes o estudo prévio de impacto ambiental, cujo valor é inegável quando

executado corretamente e com isenção.

O estudo prévio de impacto ambiental, como exemplo do

reconhecimento legal da necessidade de antever conseqüências, tem previsão na

Constituição Federal, cujo artigo 225, parágrafo 1º , inciso IV, preceitua como

obrigação do Poder Público:

“Exigir, na forma da lei, para instalação de obra

ou atividade potencialmente causadora de significativa

degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto

ambiental, a que se dará publicidade”.

As principais características do estudo prévio de impacto ambiental são:

o estudo deve ser anterior à autorização da obra ou atividade; deve ser obrigatoriamente

exigido pelo Poder Público; para a instalação da obra e para o funcionamento da

atividade podem ser exigidos estudos distintos; e o estudo deve ser revestido de

publicidade.

As verificações e análises do estudo terminam por um juízo de valor, ou

seja, uma avaliação favorável ou desfavorável ao projeto. Ressalta a doutrina que não se

admite um estudo de impacto ambiental que se abstenha de emitir a avaliação do projeto

verificado.

No âmbito do Direito Ambiental, o princípio da prevenção dos danos, ou

da precaução, pode ser considerado como um pilar básico para as ações que procuram

tutelar o meio ambiente. Assim, deve-se buscar sempre o máximo de conscientização

entre os integrantes da sociedade para alcançar-se a efetiva adoção das medidas

preventivas legais e, também das não previstas em lei, como as que podem ser

implementadas pela população em si, sendo também relacionadas às mencionadas na

abordagem da questão da educação, com o fim de, inclusive, conduzir a uma eficaz

participação popular.

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1.3.3 - Princípio da Participação Popular

A participação popular é outro princípio estabelecido pela Declaração do

Rio de Janeiro, revestindo-se de uma importância toda especial, no sentido de que a real

participação popular tem a capacidade de reforçar decisivamente as ações

implementadas pelo Estado, especialmente em países, regiões ou simplesmente cidades

onde este mesmo Estado, através de seus representantes, não comporta-se, por diversas

razões, da maneira mais eficiente.

O princípio em questão é o de n.º 10 da Carta do Rio de Janeiro 7, o qual

menciona a relevância da participação popular e da ampla informação dos cidadãos em

geral, nos seguintes termos:

“As questões ambientais são tratadas de forma

mais adequada quando envolvem a participação de todos os

cidadãos interessados no nível adequado. No âmbito nacional,

cada habitante deve ter acesso às informações que digam respeito

ao meio ambiente e exigir que sejam de conhecimento das

autoridades públicas, inclusive as que digam respeito a material

tóxico e perigoso, e atividades relacionadas a serem realizadas

em suas comunidades; e à oportunidade de participar nos

processos decisórios respectivos. Os Estados devem promover e

encorajar o interesse e a participação da população através da

mais ampla divulgação de informação”.

O encorajamento e o incentivo da população para participar é, como

pode verificar-se no disposto pelo referido princípio, uma obrigação do Estado, que

deve buscar desenvolver na população a vontade e o interesse de participar em

atividades direcionadas para a divulgação de informações e conhecimentos sobre

prevenção e preservação do meio ambiente.

7 Carta do Rio de Janeiro sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente. 1992, Princípio n.º 10.

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A partir dos movimentos ativistas da sociedade civil na América do

Norte, durante a década de sessenta, movimentos sociais surgiram manifestando

preocupações, especialmente com a questão nuclear. Desde aqueles tempos notou-se

inequivocamente que a participação desses movimentos mostra-se de caráter primordial

para a proteção da integridade do sistema global do meio ambiente e do

desenvolvimento.

O princípio da participação popular também é visto sob o ponto de vista

do direito à informação e à participação propriamente dita, sendo conhecido também

por princípio democrático, por assegurar ao cidadão o direito pleno de participar na

elaboração das políticas públicas ambientais.

Nesse processo é indispensável a participação das populações mais

atingidas pela degradação ambiental, que devem exercer uma certa pressão política para

que os governantes, em suas esferas, intensifiquem sua fiscalização sobre as diversas

atividades poluidoras, para que seja o poluidor aquele que efetivamente pague pelo que

provocou, como impõe um dos princípios mais importantes, a seguir apresentado.

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1.3.4 - O Princípio do Poluidor-Pagador

O princípio chamado do “poluidor-pagador” é amplamente discutido,

principalmente por suas importantes características e conseqüências, tendo sido

introduzido no âmbito do Direito Ambiental brasileiro, juntamente com a

responsabilidade civil objetiva, pela Lei n.º 6.938/81, que em seu artigo 14, parágrafo

1º, prevê:

“Sem obstar a aplicação das penalidades previstas

neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da

existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao

meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”.

A supracitada lei, que dispõe sobre a Política Nacional de Meio

Ambiente, têm, segundo lê-se no artigo 4º, inciso VII, como um de seus objetivos a

imposição ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar ou indenizar os danos

causados e, ao usuário, impor uma contribuição pela utilização dos recursos ambientais

com fins econômicos.

Torna-se relevante analisar o que dispõe a Constituição Federal de 1988

sobre o assunto, no artigo 225, parágrafos 2º e 3º, respectivamente:

“Aquele que explorar recursos minerais fica

obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com

solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma

da lei”.

“As condutas e atividades consideradas lesivas ao

meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou

jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente

da obrigação de reparar os danos causados”.

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O poluidor é obrigado a corrigir ou recuperar o ambiente afetado, com os

encargos resultantes dessa obrigação, sendo- lhe vedada a possibilidade de prosseguir na

ação poluente. Para esse fim estabeleceu-se a exigência de um Plano de Recuperação da

Área Degradada.

A Declaração do Rio de Janeiro incluiu, entre seus 27 princípios, o de n.º

16 8, texto que, referindo-se ao “poluidor-pagador” estabelece:

“As autoridades nacionais devem se esforçar para

garantir a internacionalização dos custos da proteção ambiental e

o uso de instrumentos econômicos, levando em conta que o

poluidor deve, em princípio, arcar com os custos da poluição

provocada; e com observância dos interesses públicos, sem

perturbar o comércio e o investimento internacionais”.

Não deve configurar-se, o princípio do “poluidor-pagador”, como uma

pura e simples “compra do direito de poluir”, partindo do eventual fato do poluidor

dispor-se a pagar pelos danos que provocou ou pelos recursos que utilizou,

transformando-se em situação vantajosa àqueles que se beneficiam poluindo e

degradando.

O princípio poluidor-pagador não pode ser enxergado como criando um

“direito de poluir”, desde que o poluidor se predisponha a pagar pelos recursos que

utilizou ou danificou. Seu objetivo principal não é a reparação ou mesmo a repressão do

dano ambiental. Estas, como se sabe, são fundamentalmente retrospectivas. Sua

aplicação, ao contrário, deve ser uma alavanca efetiva de prevenção do dano ambiental,

fazendo com que a atividade de preservação e conservação dos recursos ambientais seja

mais barata que a da devastação. O dano ambiental não pode, em circunstância alguma,

valer a pena para o poluidor.

Ainda, o princípio do poluidor-pagador pode ser, também, visto como

uma imposição ao poluidor do dever de arcar com as despesas decorrentes das ações de

8 Carta do Rio de Janeiro sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente. 1992, Princípio n.º 16.

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prevenção, reparação e repressão da poluição, conseqüentemente sendo incluídos, dessa

maneira, os custos de proteção ambiental em geral.

O objetivo maior do princípio do poluidor-pagador é fazer com que os

custos das medidas de proteção do meio ambiente – as externalidades ambientais -

repercutam nos custos finais de produtos e serviços cuja produção esteja na origem da

atividade poluidora.

Sem dúvida, também no que se refere à causa do meio ambiente, o fato

de arcar de alguma forma com o prejuízo torna menos provável a aceitação de práticas

nocivas à coletividade.

De posse de uma noção sucinta porém essencial dos conceitos básicos do

Direito Ambiental, seu histórico e seus princípios mais destacados, já possibilitando

visualizar algumas questões fundamentais, pode empreender-se o avanço para a

abordagem da responsabilidade civil na esfera ambiental e seu entorno propriamente

dito.

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26

CAPÍTULO II

DA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL

“Tornando escassa nossa fauna e flora E tudo o mais que tu exploras Como uma cobra que devora o próprio rabo Estás em busca do teu fim Eu digo tudo isso por mim Pressinto um futuro em que não haverá Nem sombra de lembranças do teu nome Bicho mau, bicho mau, bicho homem”

(Mauricio Baia & Rock Boys – Bicho Homem)

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2.1 - Da Responsabilidade Civil

É inegável a importância do instituto da Responsabilidade Civil, nos

tempos atuais, por se dirigir à restauração de um equilíbrio moral e patrimonial desfeito

e à redistribuição da riqueza em conformidade com os ditames da justiça, tutelando a

pertinência de um bem, com todas as suas utilidades, presentes e futuras, a um sujeito

determinado.

Podemos considerar o interesse em restabelecer o equilíbrio violado pelo

dano como a fonte geradora da responsabilidade civil. É a perda ou a diminuição

verificadas no patrimônio do lesado ou o dano moral que geram a reação legal, movida

pela ilicitude da ação do autor da lesão ou pelo risco da atividade. Além do ato ilícito,

há outros fatos geradores de responsabilidade, em que o dano é reparável sem o

fundamento da culpa, baseando-se no risco objetivamente considerado e a existência de

casos de responsabilidade por ato lícito, em que o dano nasce de um fato, permitido

legalmente, praticado pelo responsável, obrigando-o a ressarcir o lesado do prejuízo que

lhe causou. O estado de necessidade regulado no Código Civil, nos artigos 188, II, 929,

930 e parágrafo único e parágrafo único, mostra-nos a possibilidade de conciliar a

licitude da ação e o dever de indenizar o dano. A obrigação recairá sobre o autor do

fato, que terá, porém, ação regressiva contra o terceiro, causador do perigo, ou contra a

pessoa em defesa de quem se causou o dano.

A responsabilidade civil cinge-se, portanto, à reparação do dano causado

a outrem, desfazendo tanto quanto possível seus efeitos, restituindo o prejudicado ao

status quo ante. A responsabilidade civil constitui uma relação obrigacional que tem por

objeto a prestação de ressarcimento. Tal obrigação de ressarcir o prejuízo causado pode

originar-se: a) da inexecução do contrato; e b) da lesão a direito subjetivo, sem que

preexista entre lesado e lesante qualquer relação jurídica que a possibilite.

A responsabilidade civil pressupõe uma relação jurídica entre a pessoa

que sofreu o prejuízo e a que deve repará- lo, deslocando o ônus do dano sofrido pelo

lesado para a outra pessoa que, por lei, deverá suportá- lo, atendendo assim à

necessidade moral, social e jurídica de garantir a segurança da vítima, violada pelo autor

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do prejuízo. Visa, deste modo, garantir o direito do lesado à segurança, mediante o

pleno ressarcimento dos danos que sofreu. Logo, o princípio que domina a

Responsabilidade Civil na era contemporânea é o da restitutio in integrum, ou seja, da

reposição completa da vítima à situação anterior à lesão.

Infere-se daí que a responsabilidade aparece como uma sanção. A sanção

é uma medida legal que poderá vir a ser imposta por quem foi lesado pela violação da

norma jurídica, a fim de fazer cumprir a norma violada, de fazer reparar o dano causado

ou de infundir respeito à ordem jurídica. A responsabilidade civil constitui uma sanção

civil, por decorrer de infração de norma de direito privado, cujo objetivo é o interesse

particular, e, em sua natureza, é compensatória, por abranger indenização ou reparação

de dano causado por ato ilícito, contratual ou extracontratual e por ato lícito.

Devemos considerar, portanto, a importância deste instituto no mundo

contemporâneo, pois o antes inimaginável progresso e conseqüente complexidade de

nossa sociedade torna a Responsabilidade Civil basilar para a manutenção da ordem

jurídica e da estabilidade social.

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2.2 - Responsabilidade Civil Subjetiva X Objetiva

Entre as diversas funções desempenhadas pela ciência do Direito, na

busca dos objetivos de preservação da vida e de suas condições de desenvolvimento

pode-se observar primeiramente o estabelecimento de normas que prevejam e

desencorajem condutas nocivas aos fins propostos de proteção e recuperação do meio

ambiente e de sua compatibilização com as atividades cotidianas do homem.

Ainda, deve criar, através de dispositivos legais, formas de estimular o

desenvolvimento de ações e condutas que contribuam para o alcance dos fins

considerados de interesse público, no que se refere à melhoria de condições ambientais

e da qualidade de vida.

Cabe todavia, em virtude do caráter coercitivo de que se revestem as

normas jurídicas, estabelecer mecanismos para a sanção das condutas comissivas e

omissivas que infrinjam ou desrespeitem os comandos legais erigidos com vistas aos

fins de interesses públicos anteriormente mencionados. Assim, esta última função

equivale a promover a responsabilização dos agentes infratores da lei.

A responsabilidade civil é, dentro das diversas espécies do gênero, a que

visa à reconstituição da situação existente antes da ocorrência do fato causador do dano.

Nesse ponto reside sua importância para a preservação do meio ambiente, sobressaindo

sua relevância que é possível verificar que melhores serão as condições desse meio

ambiente quanto mais eficazes forem os mecanismos utilizados para evitar que os danos

ocorram e para promover a recuperação sempre que sua integridade for lesada.

O desenvolvimento da responsabilidade civil deu-se a partir do principio

da culpa, consolidado no direito romano, que originou tantos institutos hoje presentes

no chamado “Mundo Ocidental”.

Do estudo da teoria da culpa, juntamente com o pleno respeito ao

comando legal, a autonomia da vontade, não é admitida obrigação de reparar dano sem

que haja culpa do agente que ao causou.

Nesse sentido, a doutrina manifesta-se de forma a considerar a culpa em

sentido amplo, abrangendo o dolo, a imperícia, a imprudência e a negligência.

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30

Caio Mário da Silva Pereira 9 observa que :

“O conceito de culpa é um dos pontos mais

delicados que se apresentam no defrontar o problema da

responsabilidade civil”

Ainda observa o mesmo autor:

“A culpa é a inexecução de um dever que o agente

podia conhecer e observar. Se o conhecia efetivamente e o violou

deliberadamente, há delito civil ou, em matéria de contrato, dolo

contratual. Se a violação foi involuntária, podendo conhecê-la e

evitá-la, há culpa simples; fora destas matérias contratuais

denomina-se quase-delito”.

Dessa forma, na responsabilidade subjetiva, a comprovação da culpa do

agente causador do dano é indispensável, configurando-se sua responsabilidade somente

se agiu com culpa ou dolo.

A teoria subjetiva da responsabilidade civil é fundamentalmente seguida

pelo Código Civil brasileiro, baseando-se na existência da culpa por parte do agente,

cabendo ao legislador especificar os casos em que se admite a obrigação reparatória

independente de culpa.

Por sua vez, a responsabilidade objetiva é aquela na qual o agente

causador tem o dever de reparação mesmo que não tenha agido dolosamente ou não haja

configuração de culpa por parte do mesmo. O causador de um dano deverá providenciar

o ressarcimento desse dano por ele de alguma forma provocado, apesar de eventual

isenção de culpa, pois a responsabilidade lhe é imposta por disposição de lei

independentemente da ausência de culpa.

Nesse sentido manifesta-se a autora Maria Helena Diniz 10:

9 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 74

10 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro. 7º Volume. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 44.

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“O dever ressarcitório, estabelecido por lei,

ocorre sempre que se positivar a autoria de um fato lesivo, sem

necessidade de se indagar se contrariou ou não norma

predeterminada, ou melhor, se houve ou não um erro de conduta.

Com a apuração do dano, o ofensor ou seu proponente deverá

indenizá-lo”.

O elemento considerado chave para a teoria da responsabilidade objetiva

é o risco, o risco do dano oriundo de uma atividade exercida pelo agente,

economicamente benéfica a ele ou não.

Diante do anteriormente observado, nota-se que o aspecto que

fundamenta a responsabilidade civil objetiva é a desvinculação da obrigação de reparar

da presença de culpa.

Não há, em relação aos danos ambientais, a obrigação de provar a culpa

do agente, mas sim fazer prova do nexo causal. É irrelevante a conduta culposa ou

dolosa do causador do dano, uma vez que bastará a existência do nexo causal entre o

prejuízo sofrido pela vítima e a ação do agente para que surja o dever de indenizar.

Assim, ressalta também essa condição peculiar Francisco José Marques

Sampaio 11:

“Para que ele (o agente) seja obrigado a

recompor o patrimônio alheio lesado basta que, além dos

demais pressupostos também exigidos na teoria da culpa – o ato

ou fato danoso, o dano provocado e o liame de causalidade entre

eles - , seja comprovado que o dano foi proveniente do risco

criado por uma atividade de quem o causou.”

11 SAMPAIO, Francisco José Marques. Responsabilidade Civil e Reparação de Danos ao Meio Ambiente. Rio de Janeiro. Ed. Lumen Juris, 1998, p. 73.

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32

Fundamento importante dos defensores da chamada teoria objetiva é o

fato da mesma basear-se na socialização dos riscos e a preocupação de toda a sociedade

em que as violações sofridas pelo ordenamento jurídico e os conseqüentes danos

provocados ao patrimônio de terceiros, particulares ou entes públicos, sejam reparados

no maior número de casos em que for possível.

Sendo assim, aquele que desenvolve uma determinada atividade,

lucrativa ou não, mesmo sendo lícita, deve zelar de todas as maneiras para que não

resultem dela prejuízos ou desvantagens a outrem.

Apesar da forma como a legislação brasileira aborda a responsabilidade

civil ter sua fundamentação na idéia da culpa, existem diversas disposições expressas

em contrário, sendo de maior importância para o estudo em questão, o caso da Lei n.º

6.983/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente e seus fins, que em

seu art. 14, parágrafo 1º, estabelece:

“Parágrafo 1º - Sem obstar a aplicação das

penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado,

independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar

os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por

sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá

legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e

criminal, por danos causados ao meio ambiente.”

Torna-se, diante do exposto, necessário ressaltar que a responsabilidade

objetiva em matéria ambiental funciona primordialmente na tentativa de equilibrar a

agressão ao meio ambiente e sua correspondente reparação, procurando criar maiores

possibilidades de que se reparem os danos eventualmente ocorridos. Tarefa bastante

difícil, apesar das disposições da lei, e que certamente exige uma atuação rigorosa e

efetiva de todos operadores jurídicos envolvidos no contexto da proteção ambiental.

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33

2.3 - A Instituição da Responsabilidade Civil Objetiva na Legislação Ambiental

A responsabilidade civil objetiva em matéria ambiental teve seu início

com a preocupação oriunda das ações em maior evidência no final da década dos anos

setenta, isto é, da poluição das águas por óleo e a contaminação nuclear, que

culminaram com a aprovação do Decreto n.º 79.347/77 e da Lei n.º 6.453/77, sendo

posteriormente estendida aos danos ambientais de qualquer natureza.

Para Antônio Herman Benjamin, a instituição da responsabilidade

objetiva no âmbito da defesa do meio ambiente é decorrente da constatação da

impossibilidade de alcançar, sem ela, esse objetivo de defesa e garantir um mínimo de

proteção desejada. Essa é também uma tendência do direito estrangeiro. Segundo

Benjamin 12, os princípios clássicos e tradicionais da responsabilidade civil nunca

funcionaram adequadamente, como ele explica:

“Primeiro porque o dano ambiental, via de regra,

é de natureza difusa, atingindo toda uma coletividade de pessoas.

(. . .) Segundo, o regime jurídico da responsabilidade civil

aquilina exigia a prova da culpa (imprudência, negligência ou

imperícia) do poluidor, para, só então, aplicar o princípio

poluidor-pagador. Apenas o dano culposamente causado era

passível de indenização. E, como se sabe, provar que o violador

agiu com culpa era quase sempre – para não dizer sempre –

impossível”.

Os dispositivos infraconstitucionais que se referem à questão dos danos

ambientais e à responsabilidade civil objetiva são os artigos 4º , inciso VII, e 14,

parágrafo 1º,da Lei n.º 6.938/81.

12 BENJAMIN, Antônio Herman V. O princípio poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1993, p. 234.

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O artigo 4º , inciso VII, estabelece como um dos objetivos da Política

Nacional do Meio Ambiente a imposição ao poluidor e ao predador da obrigação de

recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização

de recursos ambientais com fins econômicos. Destes últimos, o que deve suscitar

maiores discussões ainda, é inegavelmente a utilização dos recursos hídricos,

considerando-se a escassez futura que se anuncia, caso o assunto continue sendo tratado,

aparente e muito provavelmente, sem a seriedade que merece.

O artigo 14, em seu parágrafo único, contempla a responsabilidade

objetiva em matéria de reparação de danos ambientais e de danos patrimoniais, por sua

vez, decorrentes de danos ambientais, ao prever a obrigação do poluidor de reparar os

danos causados ao meio ambiente e a terceiros afetados por sua atividade, havendo, ou

não, culpa.

Segundo José Afonso da Silva, a responsabilidade civil objetiva no

campo do direito ambiental teve algumas conseqüências marcantes: a) a irrelevância da

intenção danosa (basta um simples prejuízo); b) a irrelevância da mensuração do

subjetivismo (o importante é que, no nexo de causalidade, alguém que tenha

participado, de alguma sorte, deve ser apanhado nas tramas da responsabilidade

objetiva); c) a inversão do ônus da prova; d) a irrelevância da licitude da atividade; e,

ainda, e) a atenuação do relevo do nexo causal.

A respeito da responsabilidade objetiva no âmbito do direito ambiental,

é, ainda, interessante proceder a uma sucinta verificação no posicionamento e nos

ensinamentos básicos proporcionados pelos principais doutrinadores.

Paralelamente aos dispositivos legais existentes a respeito do Direito, é

interessante, para o seu aprimoramento e melhor compreensão, estudar as observações

feitas e posicionamentos adotados por alguns dos autores, apesar de sucintamente, cujas

obras têm valor reconhecido na doutrina pátria ou têm demonstrado maior interesse em

abordar a questão da proteção ao meio ambiente e seus desdobramentos no campo

jurídico.

É possível destacar observações valiosas sobre a questão da

responsabilidade objetiva como ferramenta do Direito, no intuito de operacionalizar a

defesa do meio ambiente, complementando-se certamente o conhecimento legal

adquirido.

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35

Édis Milaré 13 conclui, em um de seus artigos sobre responsabilidade por

danos ambientais, que:

“A responsabilidade civil por danos ambientais é

objetiva, independendo, portanto, de conduta culposa do

agressor, circunstância que melhor atende aos anseios da

comunidade no direito de fruir de um meio ambiente sadio e

ecologicamente equilibrado” .

O autor ainda menciona que ao não perquirir da existência de culpa,

melhor se tutela o bem-interesse que se quer preservar e faz pequena crítica à Lei n.º

6.938/81:

“O único reparo, em termos de esfera judicial do

meio ambiente, que se pode fazer a essa lei foi o de concentrar a

titularidade da ação exclusivamente nas mãos do Ministério

Público, quando matéria de tamanha magnitude requer

alargamento de atribuições, com a convocação de todas as forças

vivas da Nação para essa verdadeira cruzada em defesa de nosso

patrimônio ambiental”.

Paulo Affonso Leme Machado 14, referindo-se a quem por ação ou

omissão agride o meio ambiente, observa :

“Mesmo na hipótese de o dano resultar de caso

fortuito ou força maior, como um acontecimento da natureza,

permanece ou sobrevive a responsabilidade do indigitado

infrator, pois a simples “atividade” imporia o dever de

indenizar”.

13 MILARÉ, Édis,. O Ministério Público e a responsabilidade civil do profissional nas atividades modificadoras do meio ambiente. RT 623/31. 14 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Obra citada, p. 157.

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36

Ao empreender a leitura dos ensinamentos de Francisco José Marques

Sampaio, nota-se a importância que este remete à responsabilidade objetiva, como

instituto extremamente necessário aos objetivos comuns da sociedade e, ainda, a

maneira como o autor defende sua permanência no âmbito do Direito Ambiental, sem o

qual, certamente haveria um retrocesso com graves conseqüências.

José Afonso da Silva afirma, por sua vez, que a responsabilidade pelo

dano ambiental existe mesmo que o poluidor exerça a sua atividade dentro dos padrões

fixados, fato, porém, que não desobriga o agente de verificar se uma atividade é ou não

prejudicial ou se está ou não causando danos, impondo um dever de permanente

vigilância ao poluidor em potencial.

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2.4 - A Questão Responsabilidade Civil Objetiva e sua Necessária

Aplicação

Ao ver anteriormente os pontos principais da responsabilidade objetiva,

não é difícil perceber a importância de que os causadores de danos ambientais realmente

sejam obrigados a responder por eles, independentemente de terem agido com culpa ou

não. Considera-se uma das mais importantes armas disponíveis na luta para evitar ou

reparar os atos danosos ao meio ambiente, possibilitando que um número cada vez

maior de situações possam ser devidamente reparadas.

Assim, se estabelece uma tentativa de evitar que ocorram casos de danos

evidentes quanto à sua existência, porém, não reparados pela falta do requisito da culpa

comprovada do agente.

O grau de complexidade da vida moderna e a interdependência crescente

entre as pessoas, mormente nos grandes conglomerados urbanos, a exploração de

recursos naturais e os processos de agigantamento das atividades empresariais, a

sempre crescente participação do Estado quer na economia, quer atuando com vistas ao

atendimento das necessidades públicas, tudo isso, e outra dezena de fatores que

poderiam ser enumerados, concorrem para a ampliação de situações onde pessoas

eventualmente fossem lesadas, mas onde era impossível definir com precisão a culpa do

agente causador do dano. Reconhecia-se a existência deste, reconhecia-se que alguém

havia sido lesado, todavia permanecia a vítima indene pela impossibilidade de apontar

com segurança o requisito da culpa do agente.

Apesar de todos os aspectos verificados a respeito da necessidade da

aplicação da responsabilidade civil objetiva, impressiona o surgimento de controvérsias

e discussões sobre a base do assunto, como a suscitada pelo veto presidencial ao Projeto

de Lei n.º 1.164- E/91, referente à Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que em seu

artigo 5º, continha disposição semelhante ao parágrafo 1º do artigo 14 da Lei n.º

6.938/81, reforçando este, expressamente, o caráter objetivo da responsabilidade civil

por danos ambientais.

Em uma primeira análise poderia considerar-se que o referido veto

estaria funcionando no sentido de afastar o regime da responsabilidade objetiva para os

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danos ao meio ambiente, tendo ocorrido inclusive a divulgação dessa idéia através de

meios de comunicação nacionais, como menciona Francisco José Marques Sampaio 15

que se manifesta contrário à idéia:

“Não encontramos fundamento razoável que

sustente tal ponto de vista, porque a aposição do veto ao

mencionado artigo, excluindo-o do texto da lei, de modo algum

afeta a vigência da norma semelhante existente em lei anterior

que dispõe sobre a matéria e que não foi revogada, expressa nem

tacitamente, pela Lei 9.605/98”.

Juntamente com o veto presidencial ao artigo 5º, deu-se também o veto

ao artigo 1º do Projeto de Lei n.º 1.164-E/91, que estabelecia que condutas e atividades

lesivas ao meio ambiente seriam punidas “com sanções administrativas, civis e penais,

na forma estabelecida nesta Lei”, sendo que a ementa da Lei n.º 9.605/98 não prevê

disposição sobre sanções civis, somente administrativas e penais, ou seja, não trata o

assunto completamente.

Assim, com a impossibilidade de considerar que a nova lei afasta as

anteriores por supostamente englobar completamente o tema, permanecem os

mandamentos dispostos na nova lei como normas complementares e compatíveis com o

princípio da reparabilidade de danos ao meio ambiente e a terceiros, como estabelecido

na Lei n.º 6.938, de 1981.

15 SAMPAIO, Francisco José Marques. O dano ambiental e a responsabilidade. In: Revista Forense. V. 317. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p. 115.

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2.5 - A Existência do Prejuízo e a Relação de Causalidade

Um dos fatores fundamentais que devem ser comprovados para a

configuração da responsabilidade civil por dano ambiental, assim como para os demais

tipos de dano, é a existência certa de um prejuízo sofrido, ou seja, que haja algo a ser

reparado, um comprovado prejuízo a ser reposto, um estado ou uma situação anterior a

ser recomposta.

Assim, para referir-se à responsabilidade civil, faz-se necessário

averiguar a existência de um dano que haja modificado, prejudicialmente, a situação que

anteriormente existia, assim se pronunciando José dos Santos Carvalho Filho 16:

“O interesse em restabelecer o equilíbrio

econômico-jurídico alterado pelo dano é a causa geradora da

responsabilidade civil”.

Nas palavras de Caio Mário da Silva Pereira 17, sintetizando a

necessidade da ocorrência de fato que provoque prejuízo para que se cogite

responsabilidade civil, aquele autor observa:

“Não havendo prejuízo, não há responsabilidade

civil”.

O prejuízo a ser reparado deve ser de natureza grave e periódica,

podendo ser causado por um acontecimento único e de caráter acidental. Não devem ser

considerados poluição ou serem investidas de anormalidade, ocorrências como ruídos

momentâneos, odores passageiros ou excepcionais e outros em que não se manifesta

uma destruição ou em que não seja exorbitada a capacidade de assimilação e de

16 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ação civil pública: comentários por artigo. 1ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1995, p. 381-384. 17 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. 2ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 42.

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40

eliminação dos resíduos que porventura houver. O prejuízo deve ser uma anormalidade

em relação à vítima, não sendo preciso que a atividade que o causou também o seja.

Em relação à normalidade dos resultados de uma determinada atividade,

podem surgir dúvidas de até que ponto é normal e a partir de quando essa normalidade é

transgredida.

Para alguns autores, é aceitável um certo grau de prejuízo para as pessoas

que vivem em determinado ambiente, desde que a atividade poluidora não esgote as

possibilidades de vida e de trabalho naquele meio, apenas reduzindo-os a uma condição

“menos agradável”, em relação ao que seria se não houvesse o foco gerador da poluição.

Um destes, Giles Martin, bastante evidenciado nas obras de Paulo Affonso Leme

Machado 18, refere-se à anormalidade da seguinte maneira:

“O limiar da anormalidade é, portanto,

ultrapassado quando a utilização do meio ambiente o torna

parcial ou totalmente impróprio a outros usos”.

Quanto à comprovação de um dano ambiental futuro, ou seja, que pode

configurar-se com o passar do tempo, far-se-á um estudo específico mais adiante no

presente trabalho.

Por seu turno, a relação de causalidade é um dos pontos principais que

suscitam uma análise mais apurada quando se estudam os danos ambientais e sua

respectiva responsabilidade. É necessário estabelecer uma relação nítida entre a

ocorrência danosa verificada e sua fonte.

Deve estabelecer-se uma relação entre o comportamento do agente e o

dano, para certificar que o dano decorre da conduta deste, mesmo que seja plenamente

lícita.

Esse pensamento, que norteia a teoria da responsabilidade civil, deve ser

visto sempre no contexto da legislação ambiental, ou seja, levando em consideração, por

exemplo, a inversão do ônus da prova, que é uma importante conseqüência da adoção da

responsabilidade objetiva, através da qual pode-se partir da presunção de que o agente

18 MACHADO. Obra citada, p. 277

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causou o prejuízo e, por isso, este deverá provar, no sentido de excluir sua

responsabilidade.

No caso de que a atividade do agente seja potencialmente capaz de

produzir efeitos danosos ao meio ambiente, deverá ser logo invertido o ônus da prova,

produzindo-se imediatamente a presunção de responsabilidade quanto ao agente, a partir

da qual o presumido poluidor procurará as provas que lhe excluam a responsabilidade.

A causa exata de um ou de vários danos simultâneos causados ao meio

ambiente pode ser algo de difícil descoberta, inclusive havendo a possibilidade de

pluralidade de autores, ou seja, vários focos poluidores, o que pode tornar muito mais

trabalhoso o estabelecimento de uma relação de causalidade que possa indicar

certamente aquele que deve ocupar-se da reparação correspondente.

Desse modo, a relação de causalidade tem que ser comprovada, sendo

incabível a reparação quando esta não o for, ou, no caso da inversão do ônus da prova, o

agente comprovar que não deu causa ao dano.

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CAPÍTULO III

A QUESTÃO DA DEVIDA COMPROVAÇÃO,

VALORAÇÃO E REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL

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3.1 - Obstáculos à Constatação e Comprovação do Dano Ambiental

A constatação do dano ambiental e sua comprovação são de grande

importância para a questão da preservação do meio ambiente, haja vista serem o início

do que poderia ser chamado de processo de reparação dos danos.

Observa-se porém, que nem sempre é fácil perceber ou constatar que um

dano esteja ocorrendo ao meio ambiente, como é o caso de contaminações lentas e

graduais da água por produtos químicos. Da mesma maneira acaba sendo difícil

comprovar que um dano ambiental realmente tenha ocorrido.

Não é raro ocorrer, que na proposição de uma ação civil pública de

responsabilidade por danos ambientais, o Poder Público, ou as associações civis de

proteção ao meio ambiente, também legitimadas pela Lei n.º 7.347, de 24 de julho de

1985 , se depare com um obstáculo ao ter que apresentar ao juízo provas claras e

conclusivas da ocorrência do dano ambiental.

Uma das grandes dificuldades se configura quando é necessário provar

danos cuja natureza faz com que se manifestem ao longo do tempo, podendo ser em

anos ou décadas.

Não se pode deixar de considerar também, outro dos obstáculos

identificados à comprovação do dano ambiental, que é a necessidade de perícias que

dificultam, ou até mesmo impedem, o sucesso de eventuais ações judiciais.

A questão, certamente complexa, não fica restrita apenas ao problema da

constatação e comprovação do dano ambiental. Em determinadas situações é muito

complicado estabelecer a relação de causalidade entre o dano causado e o fato gerador

deste.

Outra questão relevante é comprovar alguma coisa que ainda não

aconteceu, ou seja, que ainda está no plano futuro, certamente não é das tarefas mais

simples, sendo no âmbito da defesa do meio ambiente uma das questões mais

discutíveis. Como comprovar e avaliar um dano ambiental que vai sendo provocado aos

poucos, se os seus efeitos somente se manifestarão no futuro? Sobre a possibilidade de

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fazê-lo ou não, há opiniões bastante divergentes entre aqueles que, de alguma forma, se

debruçaram sobre o tema.

O maior problema desse tema é verificar que muitos danos ocorridos por

todo o mundo, alguns irreparáveis, eram deveras previsíveis e, talvez em muitos dos

casos passíveis de ser comprovados. A atividade pode ser produzida hoje e os efeitos do

dano só aparecerem após vários anos ou, o que é pior, já em outra geração. Em outros

casos, o dano imediatamente visível é só a ponta do iceberg, sendo que é com base nele

que se calcula o valor global e da indenização.

Muitas vezes o dano futuro não pode ser comprovado de plano, vindo

assim a ocorrer efetivamente no futuro, sem que se tenha podido adotar qualquer

medida em sentido contrário. Por isso, devem ser medidos seus efeitos, tanto quanto

seja possível, através de provas periciais. Sendo viável demonstrar que um certo efeito

decorre normalmente de um dano ocorrido, mesmo que não fique evidente que já

ocorreu, ou que vá ocorrer, deveriam ser adotadas medidas, no sentido de minimizá- lo.

Estas ficariam a cargo do causador, ou seriam custeadas por este.

Nessa linha de pensamento se expressa Francisco José Marques Sampaio 19:

“Quando não houver a possibilidade de adotar

qualquer das as medidas, em virtude da natureza do dano

verificado ou da impossibilidade de prever-se onde e em que

condições os efeitos adversos vão ocorrer, bem como quem serão

o indivíduos ou coletividades afetados – como saber-se, por

exemplo, quem desenvolverá moléstias, como câncer, em virtude

de ingerir água proveniente de rio contaminado por poluentes

químicos – deve-se adotar a solução prevista na teoria clássica

da responsabilidade civil, isto é, o arbitramento do valor da

respectiva indenização, a ser destinada ao fundo de

reconstituição dos bens lesados, tal como determina a lei da ação

civil pública.”

19 SAMPAIO, Francisco José Marques. Obra citada, p. 230

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O citado autor ainda observa que os recursos da indenização devem

permanecer disponíveis, durante o lapso de tempo em que se estima que os efeitos

adversos possam ocorrer, para ser empregados no enfrentamento dos problemas que

estejam relacionados com o referido dano.

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3.2 - A Avaliação dos Danos Ambientais e a sua Reparação como Ponto

Essencial

Avaliar um impacto ambiental é considerado uma tarefa complexa e que

pode ficar envolta em uma grande controvérsia. Surgem inevitavelmente certos

questionamentos como: é possível, ou não, fixar um valor justo para a vida de um

animal ou para a de toda uma floresta? Qual o preço da vida existente em um

determinado trecho de um rio? A morte de um animal ou de uma planta pode ser

compensada arbitrando-se um valor a ser pago pelo responsável? E a extinção de uma

espécie ?

Como pode ser percebido, a discussão sobre o assunto é de uma

complexidade muito elevada, sendo que as questões supracitadas não estão próximas de

obter uma resposta de consenso ou que seja aceita facilmente.

Para Antônio Herman V. Benjamin 20, um problema sério em relação à

avaliação de um dano ambiental é o fato de que se calcula o valor global e final da

indenização sobre o dano imediatamente visível, que ele chama de a ponta do iceberg.

Essa comparação sugerida pelo autor, demonstra sua idéia de que grande parte do dano

ambiental não é sequer constatada de imediato, não se podendo precisar, de plano, no

que tal dano, futuramente, poderá implicar.

Esse autor ainda referindo-se às deficiências do sistema legal, lembra em

sua obra já citada que a grande maioria das ações civis públicas propostas no Brasil está

absolutamente parada exatamente na fase de cálculo do dano causado.

A avaliação de um dano ao meio ambiente pode dar-se de diversas

formas, de acordo com os critérios utilizados e do próprio conceito que se tem de dano

ao meio ambiente. Notadamente, não terão resultados iguais, avaliações distintas, uma

tomando por base o valor comercial de uma certa quantidade de madeira extraída, e,

outra, o valor de uma floresta para a manutenção da qualidade de vida da população

próxima a ela.

20 BENJAMIN, Antônio Herman V. O princípio poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1993, p. 234.

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É evidente que não pode haver fórmula matemática perfeita para que se

avalie um dano ambiental. Uma floresta destruída tem que valor ? Seu valor deve ser

atribuído pela quantidade de árvores, pela “idade” das mesmas, pela quantidade de

espécies que na dita floresta habitam ou por qualquer outro critério ?

Como foi visto anteriormente, comprovar um dano ambiental é muito

difícil, sendo conseqüentemente de tanta ou mais dificuldade fazer essa comprovação

em termos de quantificação ou de gradação.

A exatidão, que normalmente é o ideal buscado em casos de reparação, é

mais difícil de ser alcançada quando o bem em tela é o meio ambiente, considerando-se

toda a gama de modos de vida que podem ser atingidos por uma atividade poluidora.

A jurisprudência tem entendido que a avaliação feita de um determinado

dano ambiental não deve ser necessariamente exata, em razão das dificuldades que

cercam essa tarefa. Essa postura têm reflexos positivos para a tutela que se procura

implementar, na medida em que diminui a possibilidade de retardos desnecessários no

processo de avaliação dos danos.

A avaliação do patrimônio ambiental danificado, é motivo para

discussões e divergências sem resposta precisa e definitiva. Não se pode proceder como

na simples avaliação de um bem material como um carro ou uma casa. O encargo de

avaliar, na esfera do meio ambiente, tem peculiaridades decorrentes da dificuldade de se

atribuírem valores aos bens ambientais (água, ar, solo, silêncio...). Esses bens nunca

tiveram preços verdadeiros, porque se acreditava que eles eram gratuitos, além de

inesgotáveis.

Quando se fala em desenvolvimento e na satisfação das necessidades

humanas, surgem duas alternativas opostas: a primeira, considerar que o processo

produtivo deve funcionar a toda força e sem maiores restrições, situação não

sustentável; ou que deve haver crescimento e preservação do meio ambiente

simultaneamente. Essa segunda alternativa faz com que se atribua um preço a certos

bens naturais que, na verdade, não o têm.

Como se vê, a chamada avaliação monetária ambiental é um

procedimento no qual devem ser tomados todos os cuidados. Isso, principalmente para

que a situação não se transforme em um grande mercado oficial de negociações

envolvendo o meio ambiente, para não agravar ainda mais os problemas futuros.

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Do estudo realizado neste trabalho, até o presente capítulo, pode ser

percebido o conjunto de fatores que envolve o tema da preservação do meio ambiente e

da importância que isso têm para todos os tipos de vida e, principalmente, para as

gerações futuras. Isto posto, se vê que toda essa análise desemboca no fato evidente de

que os danos já causados, e os que ainda não o foram, deverão ser reparados, não se

esquecendo de que os danos ambientais são a priori irreversíveis, diferentemente dos

impactos ambientais, que através de avaliações e estudos podem ser amenizados

previamente mantendo um equilíbrio entre desenvolvimento econômico e meio

ambiente.

Para autores como Antônio Herman V. Benjamin 21, as modificações

legislativas que incorporaram, entre outros, o princípio do poluidor pagador ao Direito

Ambiental não conseguiram superar um obstáculo intransponível. O autor julga ser esse

obstáculo, o fato de o dano ambiental nem sempre ser reparável. Traduz essa idéia, sua

seguinte observação:

“Não podemos, por exemplo, substituir uma

paisagem ou uma espécie extinta; para tais casos, inexiste

reparação in integrum.”

Dessa situação, se pode observar a importância da devida reparação

ocorrer sempre que possível, mesmo que envolva uma certa gama de dificuldades. Entre

os aspectos mais relevantes da reparação do dano ambiental está o fato de se tratar, em

grande parte, de interesses difusos, ou seja, os de interesse juridicamente reconhecido,

de uma pluralidade indeterminada ou indeterminável de sujeitos que, potencialmente

pode incluir todos os participantes da comunidade.

A reparação de um dano ambiental ocorrido deve ser sempre o objetivo

principal a ser buscado. Infelizmente , segundo parte da doutrina, qualquer critério de

reparação do dano ambiental é falho ou insuficiente, não permitindo assim, que esse

objetivo seja plenamente atingido.

21 BENJAMIN, Antônio Herman V. O princípio poluidor-pagador. In: BENJAMIN (Coord.) Dano Ambiental -Prevenção, Reparação e Repressão. São Paulo: RT, 1993, p. 235.

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A primeira hipótese considerada, em termos de reparação, deve ser,

sempre que possível, a do retorno do ambiente atingido ao statu quo ante , ou seja, a seu

estado anterior.

A reconstrução de um lugar degradado não é tarefa fácil, fato pelo qual

se torna cada vez mais evidente a prioridade que deve ser dada às ações de caráter

preventivo em todos os escalões em que forem cabíveis, bem como o reconhecimento

da importância da tutela do meio ambiente em caráter reparatório.

Cabe, nesse momento, ressaltar a importância dos EPIAs e das AIAs,

como instrumentos de cunho preventivo, conforme acima citado, pois como é sabido, o

processo de licenciamento ambiental constitui-se em um único processo administrativo,

divido em três fases que se encadeiam e completam. A licença prévia é a mais

importante delas em termos ambientais, pois não só aprova a localização do

empreendimento, como as restrições, condicionantes e exigências constantes de seu

alvará condicionam as demais fases, de instalação e operação do empreendimento. É

também na fase de licença prévia, anteriormente à sua expedição, que o órgão

licenciador, nos casos previstos na legislação, poderá exigir a apresentação do EPIA,

acompanhado do respectivo RIMA. Estando ultrapassadas as fases de LP não há que se

falar em apresentação de EPIA ou de RIMA.

A norma ambiental deixa claro que esta exigência só é cabível quando do

requerimento da Licença Prévia. Nesse sentido é o dispositivo constitucional que

incumbe o Poder Público de "exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou

atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente,

estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade".

O Mestre Paulo Affonso Leme Machado, ao comentar esse dispositivo em

seu sua obra sobre o tema deixa claro que o estudo de impacto ambiental deve ser

anterior à autorização da obra e/ou autorização da atividade. Assim, esse estudo não

pode ser concomitante e nem posterior à obra ou atividade.

Aliás, essa anterioridade é clara também no primeiro documento legal

federal que regulamentou a matéria, a Resolução CONAMA nº 001/86:

"Dependerá da elaboração de estudo de

impacto ambiental e respectivo relatório de

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impacto ambiental -RIMA (...) o licenciamento de

atividades modificadoras do meio ambiente, tais

como: ...".

Se o licenciamento ambiental, em muitos casos, dependerá da aprovação do

estudo ambiental e respectivo RIMA pelo órgão licenciador, e se o licenciamento se

inicia pela concessão da Licença Prévia, é claro que essa exigência deverá preceder à

outorga da LP. Nem teria sentido que fosse outorgada uma licença aprovando a

localização de um empreendimento e só depois se fazer a exigência do estudo de

impacto ambiental e do respectivo RIMA, que exatamente condicionam a aprovação

dessa localização e fixam as medidas mitigadoras de impactos ambientais negativos que

devem ser adotadas, principalmente na fase de instalação, mas também na de operação.

Dessa forma, é óbvio que as exigências resultantes dos estudos de impacto ambiental

devem constar já do instrumento de Licença Prévia, especialmente as referentes aos

requisitos básicos a serem considerados no Projeto Executivo, que será examinado na

fase seguinte.

No caso de queima de etapas do processo de licenciamento não se justifica a

determinação da realização do EPIA, tal como legalmente definido. Isso não quer dizer,

entretanto, que o órgão licenciador não possa, em qualquer fase do empreendimento,

solicitar a realização de outros " estudos ambientais" para poder avaliar corretamente os

de impactos ambientais do empreendimento e para melhor embasamento da decisão a

ser adotada quanto a cada uma das licenças a serem expedidas. Ao contrário, é dever do

órgão licenciador esclarecer-se devidamente sobre todos os aspectos que envolvem o

licenciamento ambiental, durante todo o processo, inclusive quando das renovações das

licenças.

Por este exato motivo a Resolução CONAMA 237/97, definiu claramente o

que denomina Estudos Ambientais. São: "todos e quaisquer estudos relativos aos

aspectos ambientais ... apresentado como subsídio para a análise da licença requerida".

Assim em qualquer fase do licenciamento o órgão licenciador pode solicitar ao

requerente da licença a realização de estudos ambientais, para subsidiar e balizar a sua

decisão. E, mais adiante, no parágrafo único do artigo 3° determina: " o órgão ambiental

competente, verificando que a atividade ou empreendimento não é potencialmente

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causador de significativa degradação do meio ambiente, definirá os estudos ambientais

pertinentes ao respectivo processo de licenciamento".

Os denominados "estudos de impacto ambiental", muitas vezes designados

pela sigla EIA, são apresentados sob a forma de relatório(s) vazado(s) em linguagem

técnica, sendo destinado(s), principalmente aos analistas ambientais para esclarecimento

de pontos obscuros ou preenchimento de lacunas de conhecimento. Já o RIMA é a

condensação, traduzida em linguagem comum das conclusões técnicas contidas no

EPIA É destinado ao público leigo e deve apresentar claramente as vantagens e

desvantagens do empreendimento, tanto do ponto de vista ambiental como de suas

implicações sócioeconômicas.

O relatório de impacto ambiental é o documento que apresenta os resultados

dos estudos técnicos e científicos de avaliação de impacto ambiental e deve esclarecer

todos os elementos da proposta em estudo, de modo que possam ser divulgados e

apreciados pelos grupos sociais interessados e por todas as instituições envolvidas na

tomada de decisão

Essa conceituação está em perfeita harmonia com o determinado no

parágrafo único do artigo 9° da Resolução CONAMA n°001/ 86:

Art. 9. O relatório de impacto ambiental - RIMA

refletirá as conclusões dos estudos de impacto ambiental e

conterá, no mínimo: (...)

Parágrafo único. O RIMA deve ser apresentado de

forma objetiva e adequada à sua compreensão. As informações

devem ser traduzidas em linguagem acessível, ilustradas por

mapas, cartas, quadros, gráficos e demais técnicas de

comunicação visual, de modo que se possam entender as

vantagens e desvantagens do projeto, bem como todas as

conseqüências ambientais de sua implementação.

Portanto, o RIMA nada mais é que a tradução em linguagem comum,

auxiliada por recursos gráficos, que facilitem sua compreensão pelo público leigo, das

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conclusões do Estudo de Impacto Ambiental. É a síntese dos trabalhos de Avaliação de

Impacto Ambiental realizados para a elaboração do EPIA, segundo as Instruções

Adicionais ministradas pelo órgão licenciador. Na verdade, é mais que isso: é a

apresentação, em linguagem corrente, facilmente inteligível pelo público comum, das

conseqüências, benéficas e adversas, que a implantação, ou não, de um determinado

empreendimento proposto terá sobre o meio ambiente natural, construído, social e

cultural.

Portanto o RIMA é destinado especialmente ao esclarecimento da opinião

pública e à discussão em audiência pública, como forma de permitir a influência da

sociedade sobre decisões ambientais que possam vir a afetá-las direta ou indiretamente,

tanto do ponto de vista de transformação ambiental, como sobre outros impactos,

positivos e negativos, do ponto de vista sócio-econômico.

Do exposto se pode concluir que é extremamente importante que tanto os

elaboradores de estudos de avaliação de impactos ambientais e as próprias autoridades

ambientais, quando solicitam estes estudos, tenham sempre presente a sua destinação,

sobretudo para evitar descumprimento da determinação constante do § 1° do artigo 16

do Decreto n° 99.274/90 pelo qual " nas atividades de licenciamento, fiscalização e

controle, deverão ser evitadas exigências burocráticas excessivas ou pedidos de

informações já disponíveis ".

Assim, esperamos haver demonstrado que embora guardem semelhanças, a

Avaliação de Impacto Ambiental, instrumento autônomo da Política Nacional do Meio

Ambiente, não pode ser confundido com o Estudo Prévio de Impacto Ambiental, que é

ferramenta indispensável de outro instrumento da mesma Política, o licenciamento

ambiental.

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3.3 - As Modalidades de Reparação

A repercussão de um dano ambiental pode não se dar necessariamente

sobre uma pessoa ou seus respectivos bens. Apesar disso, esse dano é passível de

reparação, nos termos da Lei n.º 6.938, de 1981, que no artigo 14, parágrafo 1º, obriga o

poluidor, independente de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio

ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.

O dispositivo legal acima mencionado distingue indenização de

reparação, tendo em vista suas evidentes diferenças. Apesar dessa observação, certas

colocações doutrinárias são construídas no sentido de igualar o significado de simples

indenização monetária com o de reparação de um dano . O termo reparar direciona o

pensamento mais no sentido de recomposição ou reconstituição.

Ao tratar do assunto, José Afonso da Silva 22 alude a uma “composição

do prejuízo”, como sendo sua forma mais comum a indenização, logo em seguida

mencionando que há outras formas de reparação além dessa. Assim, indenizar se

equipara a reparar.

O artigo 225, parágrafo 3º, da Constituição Federal vigente, aponta duas

modalidades de imposições ao agente poluidor: as sanções penais e administrativas, e a

obrigação de reparar o dano.

A grande dificuldade, evidentemente, não está nas sanções penais e

administrativas, mas na obrigação de reparar o dano. Em que consiste tal obrigação? A

prática judicial brasileira ainda não nos oferece uma resposta segura. Tem havido uma

certa divergência entre as diversas Cortes de Justiça existentes no País.

Indenizar através de uma quantia em dinheiro, a ocorrência de um dano

provocado, como, por exemplo, a poluição de um rio e a morte de grande parte das

espécies que ali vivem, não é o que se imagina por reparar um dano. O próprio José

Afonso da Silva 23, ao falar dos tipos de reparação, reconhece que a mortandade de

peixes em um rio é um grave dano, que não se satisfaz com a mera indenização

monetária, que às vezes não se sabe nem de quanto seria.

22 SILVA, José Afonso da. Obra citada, p. 218. 23 SILVA, José Afonso da. Obra citada, p. 220.

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Tal discussão, sobre a indenização e a reparação propriamente dita, é, por

demais pertinente, pois, como foi anteriormente estudado, um dos objetivos de todo o

trabalho desenvolvido para a proteção do meio ambiente é garantir as condições de vida

das gerações presentes e das futuras.

Assim, se torna clara a necessidade de que os danos sejam

obrigatoriamente reparados, diretamente ou através de fundos com essa destinação.

Nesse sentido, evidencia-se a importância da Ação Civil Pública,

regulada pela Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985, que criou Fundo de Defesa dos

Direitos Difusos, em que os recursos não advêm do Poder Executivo, mas das

condenações judiciais, visando a recomposição dos bens e interesses lesados.

O artigo 13, da referida lei, previu a existência de dois fundos, um gerido

por um Conselho Federal e outro gerido por Conselhos Estaduais, sendo que os valores

oriundos das ações civis públicas propostas em Juízo Federal serão geridos pelo

Conselho Federal Gestor do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos – CFDD, e os

obtidos em ações na Justiça dos Estados se destina aos Conselhos Estaduais.

Apesar do advento dos citados fundos, não é possível, em determinados

casos, reverter o quantum arbitrado para a recuperação do respectivo dano ambiental,

por tratar-se de danos tidos como irrecuperáveis.

Por todas as observações realizadas, se define, a volta ao estado anterior,

como ponto essencial e objetivo prioritário no contexto da reparação ambiental.

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3.4 - Retorno ao Status Quo Ante como Objetivo Prioritário

O objetivo prioritário, quando se discute a reparação de danos ao meio

ambiente, deve ser, sem dúvida, o retorno dos bens degradados ao estado em que se

encontravam anteriormente ao dano. Dessa maneira, estaria sendo garantida em parte a

preservação do chamado patrimônio ambiental.

Por toda a explanação realizada no sub-capítulo anterior, fica evidente

que a simples condenação ao pagamento de uma indenização, por si só, enfocada a

questão sob o ponto de vista da sustentabilidade, não resolve o problema.

É necessária uma certa atenção aos termos utilizados pela Constituição

Federal e pela legislação infraconstitucional, respectivamente: “reparação” e

“recuperação”; e “restauração” e “reconstituição”. Todos os termos apresentados

procuram, de certo modo, expressar a idéia principal de retorno a um estado anterior.

Paulo Affonso Leme Machado 24, em sua obra já citada, expõe o sentido

do termo reparar, como:

“Buscando-se o sentido do termo “reparar”

encontramos o de “reconstituição da integridade e da

funcionalidade de um objeto”.

Verdade é que não há como escapar da idéia de retorno a uma situação

da qual não se deveria ter saído. Não deve ser admitida com facilidade a hipótese de que

um determinado dano é irrecuperável.

É sabido que em Direito Penal, quando a morte de uma pessoa é

provocada por outra, não cabe condenação do culpado no sentido de fazer a vítima

retornar ao estado anterior. Se essa possibilidade existisse, independentemente do tempo

para isso necessário, desconsiderando-se as implicações de ordem religiosa,

provavelmente haveria sua previsão legal.

Pois bem, comparando um rio a uma pessoa na situação de vítima, pode

ser verificado que o rio “morto” pode vir a ser recuperado; uma área de mangue “morta”

24 MACHADO, obra citada, pág. 290

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igualmente pode ser passível de recuperação, ou , no mínimo pairam dúvidas quanto a

isso. Essa questão é colocada, em virtude da constatação de uma tendência a se

considerar danos ambientais como irrecuperáveis.

Nota-se que na realidade o que acontece não é a irrecuperabilidade do

bem, ainda que parcial, mas o fato de não compensar de acordo com análise custo-

benefício.

Se espera que a degradação ambiental não chegue ao ponto de que se

tornem necessárias condenações a “ressuscitar” rios, mangues e outros.

Infelizmente, pelo que se pode constatar em diversos momentos do

estudo do Direito Ambiental, principalmente no que se refere à reparação dos danos

ambientais, há, ainda, muitos obstáculos no caminho a ser percorrido. Alguns deles,

podem ser considerados como óbices ao alcance dos resultados buscados.

Ao tomar ciência da situação atual, através dos estudos efetuados na

doutrina e jurisprudência, se chega à constatação de que existem diversos motivos que

dificultam o alcance dos resultados ideais em relação à proteção do meio ambiente.

Uma dificuldade natural, em virtude da atualidade do assunto,

recentemente colocado em evidência, é a falta de uma formação acadêmica mais voltada

para a importância do direito ambiental. Tal situação é facilmente exemplificada pela

não inclusão da matéria entre as de cunho obrigatório, na maioria das faculdades de

direito.

Assim expõe Paulo de Bessa Antunes 25:

“A grande dificuldade de tipificar o ilícito

ambiental é que os seus fundamentos estão, também, em uma

esfera nova e que atormenta a mentalidade conservadora. Existe

uma grande dificuldade para que se defina o agente poluidor e

degradador, ainda que os termos da lei brasileira sejam

extremamente claros”.

25 ANTUNES, obra citada, p. 150.

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O referido autor critica o Poder Judiciário pelo fato, segundo seu

entender, de que este tem abdicado de sua função cautelar em favor de uma atividade

eminentemente repressiva que, no âmbito do Direito Ambiental, é de eficácia discutível.

Ainda no âmbito do judiciário, outro óbice considerado é a necessidade

de perícias para a resolução de grande número de ações, as quais sofrem com as

deficiências de ordem material e de pessoal. Dessa forma, não é raro o fato serem

inviabilizadas condenações à reparação em virtude da inexistência de prova científica

do dano ambiental.

Para Antônio Herman V. Benjamin 26 o processo civil também se

constitui em um óbice:

“Ademais, o processo civil abre ao poluidor

incontáveis fórmulas protelatórias, sem contar as suas múltiplas

opções recursais É como se o meio ambiente danificado tivesse à

sua disposição todo o tempo do mundo para aguardar uma

eventual decisão de condenação do poluidor”.

Também entre os óbices, se incluem as dificuldades em comprovar a

existência do dano e o nexo de causalidade, tratados especificamente em capítulos

anteriores. Inicialmente a prova do nexo causal ainda é encargo da vítima do prejuízo ou

de seu representante, Ministério Público ou Organização Não Governamental – ONG.

Não pode ser esquecido como um dos óbices, no contexto geral da

questão do meio ambiente, o vultuoso interesse econômico que gira em torno dos bens

que compõe o meio ambiente.

É provável que este interesse esteja na base de diversos outros óbices

ainda não solucionados. Como foi observado no espaço destinado ao caráter econômico

do meio ambiente, os recursos naturais podem gerar lucros gigantescos, não sendo

prudente subestimar as conseqüências desse fator.

Dentro do quadro geral onde se apresentam tantos obstáculos à reparação

efetiva dos danos ambientais, se torna imprescindível que sejam apresentadas,

26 BENJAMIN, obra citada, p. 324.

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igualmente, alternativas e outros procedimentos que auxiliem a reduzir as

conseqüências desses óbices.

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3.5 - As Alternativas Propostas para a Reparação dos Danos

Ambientais

A reparação dos danos causados ao meio ambiente, como já foi

observado, constitui um objetivo essencial na luta pela conservação do patrimônio

ambiental.

Passa obrigatoriamente pela questão da reparação, a visão de sociedade

sustentável, onde não têm lugar os procedimentos que reduzam as possibilidades das

gerações futuras.

Assim sendo, diante das dificuldades que foram levantadas durante o

atual estudo acadêmico, surgem alternativas propostas para que se atinja o objetivo

comum de reparar os danos que a sociedade vem provocando ao meio ambiente.

O artigo 225, da Constituição Federal coloca o meio ambiente

ecologicamente equilibrado como bem de uso comum do povo, reconhecendo a

importância dele para a manutenção da qualidade de vida dos brasileiros.

Para que o fim ao qual se destina o referido dispositivo constitucional

seja alcançado, é imprescindível que se busquem constantemente alternativas que

desbordem os problemas capazes de prejudicar a reparação ambiental.

Atualmente uma das grandes preocupações do Judiciário é a celeridade

com que se resolvem as ações propostas. Ao considerar a freqüência com ocorrem

agressões ao meio ambiente e o agravamento do quadro de degradação ambiental, é

possível concluir que se faz necessário cada vez mais o aperfeiçoamento dos

instrumentos da responsabilidade civil voltados para a devida recuperação.

Expõe a doutrina as diversas dificuldades que existem na obtenção de

resultados satisfatórios na reparação dos danos ambientais empregando os instrumentos

tradicionais da responsabilidade civil.

Podem ser suscitados, com base na própria doutrina, algumas alternativas

que surgem quanto ao problema já abordado da comprovação do dano. Nesse tema,

pode ser citado o conselho de Antônio Herman Benjamin 27, que propõe, em sua obra já

27 BENJAMIN, obra citada, p. 324.

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citada, a imposição do princípio do in dúbio pró ambiente, nos moldes do conhecido in

dúbio pró réu.

O mesmo autor propõe outras alternativas bastante pertinentes, como é o

caso da inversão do ônus da prova da extensão do dano e do nexo causal em virtude da

disparidade dos meios probatórios, no qual se pode traçar um paralelo com o prevê o

Código de Proteção e Defesa do Consumidor.

Finalmente, Benjamin defende a possibilidade de ser proposta ação

subseqüente à principal, mesmo que esta tenha transitado em julgado, para o eventual

ressarcimento de remanescências do dano ambiental.

Como é de se esperar, Paulo Affonso Leme Machado 28 também

apresenta uma pertinente sugestão, ao tratar da instituição de um fundo comum para

evitar as conseqüências negativas da incerteza quanto à autoria da poluição. Segundo o

autor, diversos países, como Estados Unidos, Japão e França, já se utilizam desse

instituto jurídico que pode fazer grande diferença no contexto da reparação. Assim,

espera que o legislador brasileiro siga o exemplo.

Dessa maneira, são esses direitos que devem se subordinar e se

transformar em razão das necessidades maiores da sociedade, como a preservação do

meio ambiente e da qualidade de vida.

28 MACHADO. obra citada, p. 287.

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CONCLUSÃO

Não se quer apontar nada como absoluto, haja vista a rápida evolução de

alguns conceitos e posicionamentos atualmente, em especial no que se refere à

prioridade que deve receber a questão da proteção do meio ambiente, mas destacar

aqueles pontos de maior relevância e que se mostram mais evidentes.

Assim, se verifica a importância de desenvolver um estudo versando

sobre a responsabilidade civil por danos causados ao meio ambiente e sua respectiva

reparação, em virtude da vasta gama de ameaças advindas do desenvolvimento mal

planejado, das ações pouco fiscalizadas e da falta de consciência a respeito. Por esse

motivo principal foi o assunto escolhido como objeto deste importante trabalho

monográfico de conclusão de curso.

Podemos concluir assim, a partir dos estudos realizados, que:

A questão da preservação do meio ambiente tem recebido atenções

maiores do que as recebidas no passado, porém não tem sido o suficiente para reverter o

quadro de degradação e destruição do patrimônio ambiental;

Os princípios do Direito Ambiental apresentados, englobam

ensinamentos de suma importância para a sociedade como um todo, devendo ser

amplamente divulgados e postos em prática;

As ações em prol da defesa do meio ambiente devem ter eminentemente

caráter preventivo, visando evitar a ocorrência de danos, em virtude de sua difícil

reparação;

A responsabilidade civil objetiva por danos ambientais é um instituto

essencial para a eficaz tutela do meio ambiente, e como tal deve ser implementada

sempre que houver essa possibilidade;

Os operadores do Direito devem estar plenamente conscientes da

importância de seu trabalho no contexto da mobilização social para a proteção dos

recursos naturais, da qualidade de vida e da própria vida;

Mais estudos acadêmicos devem ter como área de atuação o direito do

meio ambiente, haja vista a atualidade do tema e sua importância para o conjunto social.

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BIBLIOGRAFIA

ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 2ª edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris,

1998.

BENJAMIN, Antônio V. Herman. Dano ambiental – prevenção, reparação e repressão.

Coordenador Antônio V. Herman Benjamin. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 1993.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 3ª edição, volume 7.

Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 1987.

LEITE, Eduardo de Oliveira. A monografia jurídica. 3ª edição. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1997.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 12ª edição. São Paulo:

Malheiros, 2004.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 2ª edição. Rio de Janeiro:

Forense, 1990.

RODRIGUES, Silvio. Direito civil – responsabilidade civil. 14ª edição, volume 4. São

Paulo: Saraiva, 1995.

SAMPAIO, Francisco José Marques. Responsabilidade civil e reparação de danos ao

meio ambiente. 2ª edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1998.

SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 4ª edição. 2ª tiragem. São

Paulo: Malheiros, 2003

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO CAPÍTULO I

NOÇÕES GERAIS DA ESFERA AMBIENTAL

1.1 Breve histórico da legislação ambiental brasileira 1.2 Meio ambiente e poluição

1.3 Os princípios básicos do direito ambiental

1.3.1 O princípio da educação ambiental 1.3.2 O princípio da precaução e o papel do poder público

1.3.3 Princípio da participação popular

1.3.4 O princípio do poluidor-pagador

CAPÍTULO II

DA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL

2.1 - Da responsabilidade civil

2.2 - Responsabilidade civil subjetiva x objetiva

2.3 - A instituição da responsabilidade civil objetiva na legislação ambiental

2.4 - A questão responsabilidade civil objetiva e sua necessária aplicação

2.5 - A existência do prejuízo e a relação de causalidade CAPÍTULO III

A DEVIDA COMPROVAÇÃO, VALORAÇÃO E REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL

3.1 – Obstáculos à constatação e comprovação do dano ambiental

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08 08

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3.2 - A avaliação dos danos ambientais e a sua reparação como objetivo principal 3.3 - As modalidades de reparação

3.4 - Retorno ao status quo ante como objetivo prioritário

3.5 - As alternativas propostas para a reparação dos danos ambientais

CONCLUSÃO

BIBLIOGRAFIA

ÍNDICE

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FOLHA DE AVALIAÇÃO UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO MESTRE Pós-Graduação “Lato Sensu”

RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS AO MEIO

AMBIENTE E A DEVIDA REPARAÇÃO.

Douglas Holanda Barbosa

Avaliado por: ________________________________________ Grau ______________

Rio de Janeiro, ______ de _______________________ de 2005.