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Literatura

Romantismo: prosa

Resumo

O Romantismo é, sem dúvidas, um dos maiores movimentos literários do século XIX. Baseado em

características como a subjetividade, a idealização amorosa, a fuga à realidade e

o nacionalismo, suas influências marcaram não só a arte, como a cultura e os

costumes daquele momento, que retratavam os valores burgueses da época.

Diferente da poesia, a prosa é uma modelo de texto escrito em parágrafos,

narrando os acontecimentos de um enredo junto a um grande aspecto descritivo.

A prosa romântica, em especial, se subdivide em quatro tipos de romance: o

regionalista, o indianista, o urbano e o histórico. A valorização da individualidade

permitiu que inúmeros autores retratassem as diferentes características do Brasil,

que estava marcado tanto pelas diversidades locais pelo país (língua, cultura e

valores regionais) quanto pelo cenário urbano que atendia às necessidades da

burguesia. Além disso, é importante dizer que, na prosa, não há a divisão entre

gerações (como ocorre na poesia), pois muitas obras eram publicadas quase que,

simultaneamente, e, o maior nome da prosa romântica é o escritor José de

Alencar.

Contexto histórico

Os principais acontecimentos e influências que marcaram esse período são:

• Instalação da Corte Portuguesa no Brasil (1808);

• Independência do Brasil (1822);

• Abertura dos Portos;

• Chegadas das missões estrangeiras (científicas e culturais);

• Surgimento da imprensa nacional;

• Revolução Industrial;

• Era Napoleônica;

• Revolução Francesa.

O romance indianista No romance indianista, é comum vermos a construção da imagem de índio de forma heróica, como o

salvador da nação a fim de implantar um sentimento de amor à pátria. Sua imagem é aproximada a de um

cavaleiro medieval, ideal propagado na Europa durante a Idade Média. Além disso, a natureza não atua como

plano de fundo e ganha vitalidade, força, fazendo com que muitas das vezes haja uma noção de

personificação do ambiente natural, como também a associação ao meio selvagem.

O choque cultural entre colonizadores e índios sempre será apresentado nas prosas indianistas, tal como a

apresentação de suas diferenças, como costumes, linguagens, hábitos, entre outros. Algumas obras de

destaque são “O Guarani”, “Iracema” e “Ubirajara”, todas de José de Alencar.

A Alma da Rosa, John William Waterhouse (1908).

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Literatura

O romance regionalista O romance regional foi primordial para o incentivo de uma literatura que abordasse acerca das diversidades

locais. Entre suas características, há a valorização de aspectos étnicos, linguísticos, sociais e culturais sobre

várias regiões do país. Ademais, as principais regiões abordadas foram o Rio de Janeiro (que era a capital

do Brasil naquele período) e as regiões Sul, Nordeste e Centro-Oeste.

O contraste de valores e costumes será abordado nos romances, em geral, propagados por personagens que

passam a conviver recentemente em um mesmo ambiente, mostrando determinadas distinções entre o meio

urbano e o meio rural. Entre as principais obras, temos “Inocência”, de Visconde de Tauany, “O gaúcho”, de

José de Alencar, e “O Cabeleira”, de Franklin Távora.

O romance urbano O romance urbano foi o que melhor atendeu às necessidades da burguesia, pois retratava sobre a vida

cotidiana e seus costumes, pondo em discussão os valores morais vividos na época, entre eles, o casamento

promovido de acordo com a classe social.

Entre as obras, podemos destacar: “A Moreninha”, de Joaquim Manuel de Macedo, “Memórias de um

sargento de milícias”; de Manuel Antônio de Almeida e “Lucíola” e “Senhora”, de José de Alencar. Além disso,

o autor Álvares de Azevedo também teve papel importantíssimo na prosa, e desenvolveu as obras “O

Macário” e “Noites na Taverna”.

O romance histórico O romance histórico, como o própria nome já nos ajuda a explicar, marcava em sua narrativa os principais

acontecimentos históricos do século XIX no Brasil. A composição da narrativa é feita a partir de relatos e

documentos informativos sobre uma determinada época ou movimento social.

Há dois romances de destaque: “As Minas de Prata” e “Guerra dos Mascates”, ambos de José de Alencar.

Textos de apoio

Texto 1

Senhora (fragmento)

— O senhor não retribuiu meu amor e nem o compreendeu. Supôs que eu lhe dava apenas a preferência entre

outros namorados, e o escolhia para herói dos meus romances, até aparecer algum casamento, que o senhor

moço, honesto, estimaria para colher à sombra o fruto de suas flores poéticas. Bem vê que eu o distingo dos

outros, que ofereciam brutalmente mas com franqueza e sem rebuço, a perdição e a verganha.

Seixas abaixou a cabeça.

— Conheci que não amava-me, como eu desejava e merecia ser amada. Mas não era sua a culpa e só minha

que não soube inspirar-lhe a paixão, que eu sentia. Mais tarde, o senhor retirou-me essa mesma afeição com

que me consolava e transportou-a para outra, em quem não podia encontrar o que eu lhe dera, um coração

virgem e cheio de paixão com que o adorava. Entretanto, ainda tive forças para perdoar-lhe e amá-lo.

A moça agitou então a fronte com uma vibração altiva:

— Mas o senhor não me abandonou pelo amor de Adelaide e sim pelo seu dote, um mesquinho dote de trinta

contos! Eis o que não tinha o direito de fazer, e que jamais lhe podia perdoar! Desprezasse-me embora, mas

não descesse da altura em que o havia colocado dentro de minha alma. Eu tinha um ídolo; o senhor abateu-

o de seu pedestal, e atirou-o no pó. Essa degradação do homem a quem eu adorava, eis o seu crime; a

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Literatura

sociedade não tem leis para puni-lo, mas há um remorso para ele. Não se assassina assim um coração que

Deus criou para amar, incutindo-lhe a descrença e o ódio.

Seixas que tinha curvado a fronte, ergueu-a de novo, e fitou os olhos da moça. Conservava ainda as feições

contraídas e gotas de suor borbulhavam na raiz dos seus belos cabelos negros.

— A riqueza que Deus me concedeu chegou já tarde; nem ao menos permitiu-me o prazer da ilusão, que têm

as mulheres enganadas. Quando a recebi, já conhecia o mundo e suas misérias; já sabia que a moça rica é

um arranjo e não uma esposa; pois bem, disse eu, essa riqueza servirá para dar-me a única satisfação que

ainda posso ter neste mundo. Mostrar a esse homem que não soube me compreender, que a mulher o amava,

e que alma perdeu. Entretanto ainda eu afagava uma esperança. Se ele recusa nobremente a proposta

aviltante, eu irei lançar-me a seus pés. Suplicar-lhe-ei que aceite a minha riqueza, que a dissipe se quiser;

consinta-me que eu o ame. Esta última consolação, o senhor a arrebatou. Que me restava? Outrora atava-

se o cadáver ao homicida, para expiação da culpa; o senhor matou-me o coração; era justo que o prendesse

ao despojo de sua vítima. Mas não desespere, o suplício não pode ser longo: este constante martírio a que

estamos condenados acabará por extinguir-me o último alento; o senhor ficará livre e rico. ALENCAR, José de. Senhora. 23 ed. São Paulo: Ática, 1992

Texto 2

O Guarani (fragmento)

O braço de Loredano estendeu-se sobre o leito; porém a mão que se adiantava e ia tocar o corpo de Cecília

estacou no meio do movimento, e subitamente impelida foi bater de encontro à parede.

Uma seta, que não se podia saber de onde vinha, atravessara o espaço com a rapidez de um raio, e antes

que se ouvisse o sibilo forte e agudo pregara a mão do italiano ao muro do aposento.

O aventureiro vacilou e abateu-se por detrás da cama; era tempo, porque uma segunda seta, despedida com

a mesma força e a mesma rapidez, cravava-se no lugar onde há pouco se projetava a sombra de sua cabeça.

Passou se então, ao redor da inocente menina adormecida na isenção de sua alma pura, uma cena horrível,

porém silenciosa.

Loredano nos transes da dor por que passava, compreendera o que sucedia; tinha adivinhado naquela seta

que o ferira a mão de Peri; e sem ver, sentia o índio aproximar se terrível de ódio, de vingança, de cólera e

desespero pela ofensa que acabava de sofrer sua senhora.

Então o réprobo teve medo; erguendo-se sobre os joelhos arrancou convulsivamente com os dentes a seta

que pregava sua mão à parede, e precipitou-se para o jardim, cego, louco e delirante.

Nesse mesmo instante, dois segundos talvez depois que a última flecha caíra no aposento, a folhagem do

óleo que ficava fronteiro à janela de Cecília agitou-se e um vulto embalançando-se sobre o abismo, suspenso

por um frágil galho da árvore, veio cair sobre o peitoril.

Aí agarrando-se à ombreira saltou dentro do aposento com uma agilidade extraordinária; a luz dando em

cheio sobre ele desenhou o seu corpo flexível e as suas formas esbeltas.

Era Peri.

O índio avançou-se para o leito, e vendo sua senhora salva respirou; com efeito a menina, a meio despertada

pelo rumor da fugida de Loredano, voltara-se do outro lado e continuara o sono forte e reparador como é

sempre o sono da juventude e da inocência.

Peri quis seguir o italiano e matá-lo, como já tinha feito aos seus dois cúmplices; mas resolveu não deixar a

menina exposta a um novo insulto, como o que acabava de sofrer, e tratou antes de velar sobre sua

segurança e sossego.

O primeiro cuidado do índio foi apagar a vela, depois fechando os olhos aproximou-se do leito e com uma

delicadeza extrema puxou a colcha de damasco azul até ao colo da menina.

Parecia-lhe uma profanação que seus olhos admirassem as graças e os encantos que o pudor de Cecília

trazia sempre vendados; pensava que o homem que uma vez tivesse visto tanta beleza, nunca mais devia

ver a luz do dia.

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Depois desse primeiro desvelo, o índio restabeleceu a ordem no aposento; deitou a roupa na cômoda, fechou

a gelosia e as abas da janela, lavou as nódoas de sangue que ficaram impressas na parede e no soalho; e

tudo isto com tanta solicitude, tão sutilmente, que não perturbou o sono da menina.

Quando acabou o seu trabalho, aproximou-se de novo do leito, e à luz frouxa da lamparina contemplou as

feições mimosas e encantadoras de Cecília.

Estava tão alegre, tão satisfeito de ter chegado a tempo de salvá-la de uma ofensa e talvez de um crime; era

tão feliz de vê-la tranquila e risonha sem ter sofrido o menor susto, o mais leve abalo, que sentiu a

necessidade de exprimir-lhe por algum modo a sua ventura.

Nisto seus olhos abaixando-se descobriram sobre o tapete da cama dois pantufos mimosos forrados de

cetim e tão pequeninos que pareciam feitos para os pés de uma criança; ajoelhou e beijou-os com respeito,

como se foram relíquia sagrada.

Eram então perto de quatro horas; pouco tardava para amanhecer; as estrelas já iam se apagando a uma e

uma; e a noite começava a perder o silêncio profundo da natureza quando dorme.

O índio fechou por fora a porta do quarto que dava para o jardim, e metendo a chave na cintura, sentou-se

na soleira como cão fiel que guarda a casa de seu senhor, resolvido a não deixar ninguém aproximar-se.

Aí refletiu sobre o que acabava de passar; e acusava-se a si mesmo de ter deixado o italiano penetrar no

aposento de sua senhora: Peri porem caluniava-se, porque só a Providência podia ter feito nessa noite mais

do que ele; porque tudo quanto era possível à inteligência, à coragem, à sagacidade e à força do homem, o

índio havia realizado. ALENCAR, José de. O guarani. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000135.pdf.

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Exercícios

1. O sertão e o sertanejo “Ali começa o sertão chamado bruto. Nesses campos, tão diversos pelo matiz das cores, o capim

crescido e ressecado pelo ardor do sol transforma-se em vicejante tapete de relva, quando lavra o

incêndio que algum tropeiro, por acaso ou mero desenfado, ateia com uma faúlha do seu isqueiro.

Minando à surda na touceira, queda a vívida centelha. Corra daí a instantes qualquer aragem, por débil

que seja, e levanta-se a língua de fogo esguia e trêmula, como que a contemplar medrosa e vacilante

os espaços imensos que se alongam diante dela. O fogo, detido em pontos, aqui, ali, a consumir com

mais lentidão algum estorvo, vai aos poucos morrendo até se extinguir de todo, deixando como sinal

da avassaladora passagem o alvacento lençol, que lhe foi seguindo os velozes passos. Por toda a

parte melancolia; de todos os lados tétricas perspectivas. É cair, porém, daí a dias copiosa chuva, e

parece que uma varinha de fada andou por aqueles sombrios recantos a traçar às pressas jardins

encantados e nunca vistos. Entra tudo num trabalho íntimo de espantosa atividade.” TAUNAY, Visconde de. Inocência.

O romance romântico teve fundamental importância na formação da ideia de nação. Considerando o

trecho acima, é possível reconhecer que uma das principais e permanentes contribuições do

Romantismo para construção da identidade da nação é a:

a) possibilidade de apresentar uma dimensão desconhecida da natureza nacional, marcada pelo

subdesenvolvimento e pela falta de perspectiva de renovação.

b) consciência da exploração da terra pelos colonizadores e pela classe dominante local, o que

coibiu a exploração desenfreada das riquezas naturais do país.

c) construção, em linguagem simples, realista e documental, sem fantasia ou exaltação, de uma

imagem da terra que revelou o quanto é grandiosa a natureza brasileira.

d) expansão dos limites geográficos da terra, que promoveu o sentimento de unidade do território

nacional e deu a conhecer os lugares mais distantes do Brasil aos brasileiros.

e) valorização da vida urbana e do progresso, em detrimento do interior do Brasil, formulando um

conceito de nação centrado nos modelos da nascente burguesia brasileira.

2. Assinale a alternativa correta sobre a prosa romântica no Brasil.

a) Retrata uma série de transformações econômicas, científicas e ideológicas, decorrentes de uma

nova revolução industrial.

b) Tem como principais características o racionalismo, a imitação dos clássicos, o bucolismo e o

pastoralismo.

c) Iniciou em meados do século XVI e caracteriza-se pela fluidez do tempo, que coloca o homem

diante de um dilema: viver a vida ou preparar-se para a morte?

d) Há o predomínio da objetividade, da observação, da verossimilhança e, principalmente, de uma

visão cientificista da existência.

e) Tem em José de Alencar um dos seus autores mais expressivos e também nomes como Joaquim

Manoel de Macedo e Bernardo Guimarães, entre outros.

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Literatura

3. “Vocês mulheres têm isso de comum com as flores, que umas são filhas da sombra e abrem com a

noite, e outras são filhas da luz e carecem do Sol. Aurélia é como estas; nasceu para a riqueza. Quando

admirava a sua formosura naquela salinha térrea de Santa Tereza, parecia-me que ela vivia ali exilada.

Faltava o diadema, o trono, as galas, a multidão submissa; mas a rainha ali estava em todo o seu

esplendor. Deus a destinara à opulência.”

Do texto depreende-se que:

a) romances românticos regionalistas, como Senhora, exaltam a beleza natural feminina.

b) os romances realistas de Aluísio Azevedo denunciam o artificialismo da beleza feminina.

c) as obras modernistas têm, entre outros, o objetivo de criticar a submissão da mulher à riqueza

material.

d) a linguagem descritiva dos escritores naturalistas caracteriza a sensualidade e a espiritualidade

da mulher.

e) a personagem feminina foi caracterizada sob a perspectiva idealizadora típica dos autores

românticos.

4. “Ele era o inimigo do rei”, nas palavras de seu biógrafo, Lira Neto. Ou, ainda, “ um romancista que

colecionava desafetos azucrinava D. Pedro II e acabou inventando o Brasil”. Assim era JOSÉ DE

Alencar (1829-1877), o conhecido autor de O guarani e Iracema, tido como o pai do romance no Brasil.

Além de criar clássicos da literatura brasileira com temas nativistas, indianistas e históricos, ele foi

também folhetinista, diretor de jornal, autor de peças de teatro, advogado, deputado federal e até

ministro da Justiça. Para ajudar na descoberta das múltiplas facetas desse personagem do século

XIX, parte de seu acervo inédito será digitalizada. História Viva, n.99,2011.

Com base no texto, que trata do papel do escritor José de Alencar e da futura digitalização de sua obra,

depreende-se que

a) a digitalização dos textos é importante para que os leitores possam compreender seus romances.

b) o conhecido autor de O guarani e Iracema foi importante porque deixou uma vasta obra literária

com temática atemporal.

c) a divulgação das obras de José de Alencar, por meio da digitalização, demonstra sua importância

para a história do Brasil imperial.

d) a digitalização dos textos de José de Alencar terá importante papel na preservação da memória

linguística e da identidade nacional.

e) o grande romancista José de Alencar é importante porque se destacou por sua temática

indianista.

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Leia o trecho do romance Iracema, de José de Alencar, para responser às questões 5 e 6.

Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia nas frondes da carnaúba;

Verdes mares que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, perlongando as alvas

praias ensombradas de coqueiros;

Serenai, verdes mares, e alisai docemente a vaga impetuosa para que o barco aventureiro manso

resvale à flor das águas.

5. Esse trecho é o início do romance Iracema. Dele, como um todo, é possível afirmar que:

a) Iracema é uma lenda criada por Alencar para explicar poeticamente as origens das raças

indígenas da América.

b) as personagens Iracema, Martim e Moacir participam da luta fratricida entre os Tabajaras e os

Potiguaras.

c) o romance, elaborado com recursos de linguagem figurada, é considerado o exemplar mais

perfeito da prosa poética na ficção romântica brasileira.

d) o nome da personagem-título é anagrama de América e essa relação caracteriza a obra como um

romance histórico.

e) a palavra Iracema é o resultado da aglutinação de duas outras da língua guarani e significa “lábios

de fel”.

6. O índio, em alguns romances de José de Alencar, como Iracema e Ubirajara, é:

a) retratado com objetividade, numa perspectiva rigorosa e científica.

b) idealizado sobre o pano de fundo da natureza, da qual é o herói épico.

c) pretexto episódico para descrição da natureza.

d) visto com o desprezo do branco preconceituoso, que o considera inferior.

e) representado como um primitivo feroz e de maus instintos.

7. "Então passou-se sobre este vasto deserto d'água e céu uma cena estupenda, heroica, sobre-humana;

um espetáculo grandioso, uma sublime loucura.

Peri alucinado suspendeu-se aos cipós que se entrelaçavam pelos ramos das árvores já cobertas

d'água, e com esforço desesperado cingindo o tronco da palmeira nos seus braços hirtos, abalou-os

até as raízes." O Guarani – José de Alencar

O texto acima exemplifica uma característica romântica de José de Alencar, que é a:

a) imaginação criadora.

b) consciência da solidão.

c) ânsia de glória.

d) idealização do personagem.

e) valorização da natureza

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8. Nos romances “Senhora” e “Lucíola”, José de Alencar dá um passo em relação à crítica dos valores da sociedade burguesa, na medida em que coloca como protagonistas personagens que se deixam corromper por dinheiro. Entretanto, essa crítica se dilui e ele se reafirma como escritor romântico, nessas obras, porque:

a) pune os protagonistas no final, levando-os a um casamento infeliz.

b) justifica o conflito dos protagonistas com a sociedade pela diferença de raça: uns, índios

idealizados; outros, brasileiros com maneiras europeias.

c) confirma os valores burgueses, condenando os protagonistas à morte.

d) resolve a contradição entre o dinheiro e valores morais tornando os protagonistas ricos e

poderosos.

e) permite aos protagonistas recuperarem sua dignidade pela força do amor.

9. Iracema “Além, muito além daquela serra que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema. Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna e mais longos que seu talhe de palmeira. O favo da jati não era doce como o seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado. Mais rápida que a ema selvagem, a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo, da grande nação tabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, alisava apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as primeiras águas.”

José de Alencar

Ao caracterizar Iracema, José de Alencar relaciona-a a elementos da natureza, pondo aquela em

relação a esta em uma posição de:

a) equilíbrio

b) dependência

c) complementaridade

d) vantagem

e) verossimilhança

10. Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia nas frondes da carnaúba;

Verdes mares que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, perlongando as alvas

praias ensombradas de coqueiros; Serenai, verdes mares, e alisai docemente a vaga impetuosa para

que o barco aventureiro manso resvale à flor das águas. O trecho acima integra o romance Iracema, sobre o qual Machado de Assis se referiu como um

verdadeiro poema em prosa. Indique, nas alternativas abaixo, aquela que se mostra ERRADA quanto

ao texto em pauta. a) Evidencia um proposital trabalho de linguagem, marcada por significativo uso de figuras de estilo,

entre as quais se põe a comparação.

b) Apresenta musicalidade, ritmo e cadência que o aproximam da poesia metrificada de extração

popular.

c) Faz aflorar no tecido poético a força da função conativa como apelo para abrandar os elementos

e as forças da natureza.

d) Utiliza apenas a construção anafórica para dar força ao texto, não se valendo de outras figuras

que poderiam potencializar sua dimensão poética.

e) Demonstra abandono da formalidade, uma vez que é característica da escola literária do autor

repudiar o clássico e formalizado jeito de produção escrita.

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Gabarito

1. D

Uma das características do romance regional é a descrever locais mais afastados da capital, contribuindo para a expansão e conhecimento de regiões que até então, não eram exploradas no âmbito literário, como também a possibilidade de conhecer e valorizar o cenário brasileiro e suas enormes diversidades regionais, como percebe-se no trecho da obra “Inocência”.

2. E A alternativa se sustenta como correta, porque é a única a falar somente sobre o Romantismo. As demais misturam características de outros movimentos literários.

3. E A idealização da mulher é uma característica dos românticos. O texto da questão elucida esse aspecto marcante desse estilo literário.

4. D O texto defende eu a ideia de que “para ajudar na descoberta das múltiplas facetas” de José de Alencar, sua obra será digitalizada. Por isso a alternativa D, ao defender a importância do ato, é a resposta correta.

5. C Iracema foi classificada como poema em prosa por Machado de Assis devido a sua grande expressividade e presença de recursos de estilo, como as figuras de linguagem.

6. B A representação do elemento indígena é distorcida da realidade em que ele viveu, com o processo colonizador. Após a Independência do Brasil, faz-se necessário a construção de uma identidade brasileira e a figura do índio é retomada como um elemento idealizado junto ao cenário da natureza. Além disso, esse índio aproxima-se de um herói medieval.

7. D Peri é descrito com características sobre-humanas. Logo, há uma idealização e exaltação exagerada do personagem, característica do Romantismo prosa em relação às personificações nativas do contexto brasileiro.

8. E É comum nos romances de Alencar que os personagens sejam salvos, sublimados pelo amor. Ao final das duas narrativas, as personagens encontram suas redenções em sacrifícios em nome do amor.

9. D Nessa questão, é preciso observar que os elementos da natureza nunca chegam perto da excelência de Iracema. A adjetivação da personagem a coloca sempre acima das demais criaturas e elementos da natureza.

10. D Embora haja a presença da figura de linguagem anafórica, o texto também apresenta outras figuras de linguagem, não se atendo -exclusivamente- a uma forma ou estilo de escrita.

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Literatura

Realismo e Naturalismo

Resumo

O Realismo

Visando combater as fortes influências do Romantismo, no

século XIX, o movimento Realista surge com uma reação ao

subjetivismo e ao idealismo amoroso. Neste sentido, a

literatura, assim como as outras manifestações artísticas

desse movimento literário buscou denunciar a hipocrisia das

relações sociais frente ao início da formação do cenário

burguês, prezando, ainda, por um resgate ao objetivismo.

Contexto histórico

Os principais acontecimentos da metade do século XIX que marcaram o contexto histórico realista são:

• Valorização das correntes filosóficas científicas que buscavam compreender o indivíduo;

• Acelerado progresso tecnológico;

• Revoltas Liberais;

• Positivismo;

• Empirismo;

• Evolucionismo;

• Influência determinista

Características do Realismo

Como o próprio nome da escola já pressupõe, o Realismo lida com fatos, com a realidade do homem e a

sociedade em conjunto. Por se desvincular da subjetividade romântica, este movimento propõe uma visão

crítica à realidade e às relações junto ao uso de uma linguagem culta e direta. Veja, abaixo, as principais

características do Realismo:

• Objetivismo;

• Descritivismo;

• Compromisso com o real;

• Denúncia da hipocrisia humana;

• Retrato da mulher com qualidades, mas também, defeitos;

• Enfoque nos aspectos psicológicos;

• Herói problemático;

• Amor subordinado aos interesses;

• Apresentação dos costumes/valores da classe média;

• Universalismo.

(O Desesperado, Gustave Coubert. 1845)

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Literatura

Como menciona Alfredo Bosi, em sua obra História Concisa da Literatura Brasileira (1970): “Do Romantismo

ao Realismo, houve uma passagem do vago ao típico, do idealizante ao factual. Quanto à composição, os

narradores realistas brasileiros também procuraram alcançar maior coerência no esquema dos episódios [...]

por necessidades objetivas do ambiente”. Dessa forma, é possível perceber que, sobretudo ao que

corresponde a escola literária em questão no Brasil, surge uma necessidade de evidenciar a realidade da

época e transformá-la em literatura.

Como representantes da escola literária, destacam Machado de Assis e Martins Pena no Brasil e, em Portugal,

Eça de Queirós.

Trecho da obra “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis.

Capítulo 7

O Delírio

Que me conste, ainda ninguém relatou o seu próprio delírio; faço-o eu, e a ciência mo agradecerá. Se o leitor

não é dado à contemplação destes fenômenos mentais, pode saltar o capítulo; vá direito à narração. Mas, por

menos curioso que seja, sempre lhe digo que é interessante saber o que se passou na minha cabeça durante

uns vinte a trinta minutos.

Primeiramente, tomei a figura de um barbeiro chinês, bojudo, destro, escanhoando um mandarim, que me

pagava o trabalho com beliscões e confeitos: caprichos de mandarim.

Logo depois, senti-me transformado na Suma Teologica de São Tomás, impressa num volume, e encadernada

em marroquim, com fechos de prata e estampas; idéia esta que me deu ao corpo a mais completa imobilidade;

e ainda agora me lembra que, sendo as minhas mãos os fechos do livro, e cruzando-as eu sobre o ventre,

alguém as descruzava (Virgília decerto), porque a atitude lhe dava a imagem de um defunto.

ASSIS, Machado. Memórias Póstumas de Brás Cubas. Ed Nova Aguilar, 1994. p 8-9.

O Naturalismo

Quanto ao Naturalismo, embora seja uma corrente do movimento literário realista, possui um maior enfoque

nas classes populares. Assim, a literatura naturalista propõe uma nova maneira de observar a sociedade e

denunciar a condição humana e a divisão de classes que surgem com o contexto burguês. É importante dizer

que, por ser uma corrente do Realismo, muitas de suas características remetem aos traços realistas, tais

como a visão crítica, o descritivismo e a objetividade.

Características do Naturalismo

Veja, abaixo, os aspectos mais marcantes desse movimento:

• Visão determinista;

• Animalização dos personagens;

• Objetivismo científico;

• Sexualização do elemento feminino;

• Impessoalidade;

• Descritivismo;

• Foco no coletivo;

• Valorização de aspectos biológicos;

• Despreocupação com a moral;

• Linguagem mais simples.

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3

Literatura

Os grandes nomes dessa época eram Júlio Ribeiro, Domingos Olímpio, Adolfo Caminha, Raul Pompeia e

Aluísio Azevedo. Este último é o principal autor da época, e as obras que mais se destacam são “O mulato”,

“Casa de pensão” e “O Cortiço” com enfoque de escrita para o romance de tese.

O romance de tese

O romance de tese tem influência da visão determinista em seu texto, em outras palavras, o narrador tenta

mostrar que o homem não consegue vencer e é movido pelas forças no meio, da raça e do contexto histórico.

Dessa maneira, há uma valorização dos aspectos patológicos e, para o leitor, a previsibilidade de entender

que os personagens não conseguem promover nenhum tipo de transgressão, pois estão vinculados ao

Determinismo da época.

Trecho da obra “O cortiço”, na qual o espaço do cortiço é apresentado aos leitores:

Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e

janelas alinhadas.

Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada, sete horas de chumbo. Como que se sentiam

ainda na indolência de neblina as derradeiras notas da última guitarra da noite antecedente, dissolvendo-se à

luz loura e tenra da aurora, que nem um suspiro de saudade perdido em terra alheia.

A roupa lavada, que ficara de véspera nos coradouros, umedecia o ar e punha-lhe um farto acre de sabão

ordinário. As pedras do chão, esbranquiçadas no lugar da lavagem e em alguns pontos azuladas pelo anil,

mostrava uma palidez grisalha e triste, feita de acumulações de espumas secas.

Entretanto, das portas surgiam cabeças congestionadas de sono; ouviam-se amplos bocejos, fortes como o

marulhar das ondas; pigarreava-se grosso por toda a parte; começavam as xícaras a tilintar; o cheiro quente

do café aquecia, suplantando todos os outros; trocavam-se de janela para janela as primeiras palavras, os

bons dias; reatavam-se conversas interrompidas à noite; a pequenada cá fora traquinava já, e lá dentro das

casas vinham choros abafados de crianças que ainda não andam. No confuso rumor que se formava,

destacavam-se risos, sons de vozes que altercavam, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos,

cacarejar de galinhas. De alguns quartos saíram mulheres que vinham dependurar cá fora, na parede, a gaiola

do papagaio, e os louros, à semelhança dos donos, cumprimentavam-se ruidosamente, espanejando-se à luz

nova do dia.

Daí a pouco, em volta das bicas era um zunzum crescente; uma aglomeração tumultuosa de machos e fêmeas.

Uns, após outros, lavavam a cara, incomodamente, debaixo do fio de água que escorria da altura de uns cinco

palmos. O chão inundava-se. As mulheres precisavam já prender as saias entre as coxas para não as molhar;

via-se-lhes a tostada nudez dos braços e do pescoço, que elas despiam suspendendo o cabelo todo para o

alto do casco; os homens, esses não se preocupavam em não molhar o pelo, ao contrário metiam a cabeça

bem debaixo da água e esfregavam com força as ventas e as barbas, fossando e fungando contra as palmas

da mão. As portas das latrinas não descansavam, era um abrir e fechar de cada instante, um entrar e sair sem

tréguas. Não se demoravam lá dentro e vinham ainda amarrando as calças e as saias; as crianças não se

davam o trabalho de lá ir, despachavam-se li mesmo, no capinzal dos fundos, por detrás da estalagem ou no

recanto das hortas.

O rumor crescia, condensando-se: o zunzum de todos os dias acentuava-se; já se não destacavam vozes

dispersas, mas um só ruído compacto que enchia todo o cortiço. Começavam a fazer compras na venda;

ensarilhavam-se discussões e resingas; ouviam-se gargalhadas e pragas; já se não falava, gritava-se. Sentia-

se naquela fermentação sangüínea, naquela gula viçosa de plantas rasteiras que mergulhavam os pés

vigorosos na lama preta e nutriente da vida, o prazer animal de existir, a triunfante satisfação de respirar sobre

a terra. AZEVEDO, Aluísio. O Cortiço. São Paulo: Ática, 1995, p.35-36.

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Literatura

— Quem me procura?... exclamou João Romão com disfarce, chegando ao armazém.

Um homem alto, com ar de estróina, adiantou-se e entregou-lhe uma folha de papel.

161

João Romão, um pouco trêmulo, abriu-a defronte dos olhos e leu-a demoradamente. Um silêncio formou-se

em torno dele; os caixeiros pararam em meio do serviço, intimidados por aquela cena em que entrava a polícia.

— Está aqui com efeito... disse afinal o negociante. Pensei que fosse livre...

— É minha escrava, afirmou o outro. Quer entregar-ma?...

— Mas imediatamente.

— Onde está ela?

— Deve estar lá dentro. Tenha a bondade de entrar...

O sujeito fez sina! aos dois urbanos, que o acompanharam logo, e encaminharam-se

todos para o interior da casa. Botelho, à frente deles, ensinava-lhes o caminho. João Romão ia atrás, pálido,

com as mãos cruzadas nas costas.

Atravessaram o armazém, depois um pequeno corredor que dava para um pátio calçado, chegaram finalmente

à cozinha. Bertoleza, que havia já feito subir o jantar dos caixeiros, estava de cócoras, no chão, escamando

peixe, para a ceia do seu homem, quando viu parar defronte dela aquele grupo sinistro.

Reconheceu logo o filho mais velho do seu primitivo senhor, e um calafrio percorreu-lhe o corpo. Num relance

de grande perigo compreendeu a situação; adivinhou tudo com a lucidez de quem se vê perdido para sempre:

adivinhou que tinha sido enganada; que a sua carta de alforria era uma mentira, e que o seu amante, não tendo

coragem para matá-la, restituía-a ao cativeiro.

Seu primeiro impulso foi de fugir. Mal, porém, circunvagou os olhos em torno de si, procurando escapula, o

senhor adiantou-se dela e segurou-lhe o ombro.

— É esta! disse aos soldados que, com um gesto, intimaram a desgraçada a segui-los. — Prendam-na! É

escrava minha!

A negra, imóvel, cercada de escamas e tripas de peixe, com uma das mãos espalmada no chão e com a outra

segurando a faca de cozinha, olhou aterrada para eles, sem pestanejar.

Os policiais, vendo que ela se não despachava, desembainharam os sabres. Bertoleza então, erguendo-se

com ímpeto de anta bravia, recuou de um salto e, antes que alguém conseguisse alcançá-la, já de um só golpe

certeiro e fundo rasgara o ventre de lado a lado.

E depois embarcou para a frente, rugindo e esfocinhando moribunda numa lameira de

sangue.

João Romão fugira até ao canto mais escuro do armazém, tapando o rosto com as mãos.

Nesse momento parava à porta da rua uma carruagem. Era uma comissão de abolicionistas que vinha, de

casaca! trazer-lhe respeitosamente o diploma de sócio benemérito.

Ele mandou que os conduzissem para a sala de visitas. (AZEVEDO, Aluísio. O cortiço. São Paulo: Círculo do livro, 1991.)

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Literatura

Exercícios

1. “O Realismo é a anatomia do caráter. É a crítica do homem. É a arte que nos pinta a nossos próprios

olhos – para nos conhecermos, para que saibamos se somos verdadeiros ou falsos, para condenar o

que houver de mau na nossa sociedade.” Para realizar essa proposta literária, quais os recursos

utilizados no discurso realista?

a) Determinismo social ou biológico e imaginação criadora.

b) Linguagem natural, sem rebuscamentos e preocupação com mensagem que revela o materialismo do homem.

c) Preocupação revolucionária e senso de mistério.

d) Acentuação sobre temáticas paradoxais e retorno ao passado.

e) Presença de uma antiguidade clássica e necessidade de identidade nacional.

2. O mulato

Ana Rosa cresceu; aprendera de cor a gramática do Sotero dos Reis; lera alguma coisa; sabia

rudimentos de francês e tocava modinhas sentimentais ao violão e ao piano. Não era estúpida; tinha a

intuição perfeita da virtude, um modo bonito, e por vezes lamentara não ser mais instruída. Conhecia

muitos trabalhos de agulha; bordava como poucas, e dispunha de uma gargantazinha de contralto que

fazia gosto de ouvir.

Uma só palavra boiava à superfície dos seus pensamentos: “Mulato”. E crescia, crescia,

transformandose em tenebrosa nuvem, que escondia todo o seu passado. Ideia parasita, que

estrangulava todas as outras ideias.

— Mulato!

Esta só palavra explicava-lhe agora todos os mesquinhos escrúpulos, que a sociedade do Maranhão

usara para com ele. Explicava tudo: a frieza de certas famílias a quem visitara; as reticências dos que

lhe falavam de seus antepassados; a reserva e a cautela dos que, em sua presença, discutiam questões

de raça e de sangue. AZEVEDO, A. O Mulato. São Paulo: Ática, 1996 (fragmento).

O texto de Aluísio Azevedo é representativo do Naturalismo, vigente no final do século XIX. Nesse

fragmento, o narrador expressa fidelidade ao discurso naturalista, pois

a) relaciona a posição social a padrões de comportamento e à condição de raça.

b) apresenta os homens e as mulheres melhores do que eram no século XIX.

c) mostra a pouca cultura feminina e a distribuição de saberes entre homens e mulheres.

d) ilustra os diferentes modos que um indivíduo tinha de ascender socialmente.

e) critica a educação oferecida às mulheres e os maus-tratos dispensados aos negros.

3. “Daí a pouco, em volta das bicas era um zunzum crescente, uma aglomeração tumultuosa de machos

e fêmeas. Uns, após outros, lavavam a cara, incomodamente, debaixo do fio d’água que escorria da

altura de uns cinco palmos. O chão inundava-se. As mulheres precisavam já prender as saias entre as

coxas para não as molhar; viase-lhes a tostada nudez dos braços e do pescoço, que elas despiam,

suspendendo o cabelo todo para o alto do casco; os homens, esses não se preocupavam em não

molhar o pêlo, ao contrário metiam a cabeça bem debaixo da água e esfregavam com força as ventas

e as barbas, fossando e fungando contra as palmas das mãos.” AZEVEDO, Aluísio de. O Cortiço. São Paulo: Martins Fontes, 1968.

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Literatura

Este fragmento pertence a O Cortiço, obra emblemática do Naturalismo. São características desse

fragmento, típicas desse movimento literário, entre outras,

a) o idealismo na descrição feminina.

b) a sensualidade idealizada.

c) a visão da realidade atrelada aos elementos naturais.

d) a fuga à realidade, a partir de um local idealizado, como o cortiço.

e) a descrição visando aproximar homens de animais e destacar aspectos desagradáveis do

ambiente.

4. “Mas Luísa, a Luisinha, saiu muito boa dona de casa; tinha cuidados muito simpáticos nos seus

arranjos; era asseada, alegre como um passarinho, como um passarinho amiga do ninho e das carícias

do macho; e aquele serzinho louro e meigo veio dar à sua casa um encanto sério. (…)

Estavam casados havia três anos. Que bom que tinha sido! Ele próprio melhorara; achava-se mais

inteligente, mais alegre … E recordando aquela existência fácil e doce, soprava o fumo do charuto, a

perna traçada, a alma dilatada, sentindo-se tão bem na vida como no seu jaquetão de flanela!” (Eça de Queirós, O primo Basílio)

Assinale a alternativa correta quanto ao movimento Realista.

a) A prosa realista, com intuito moralizador, desmascara o casamento por interesse, tão comum no século XIX, para defender uma relação amorosa autêntica, segundo princípios filosóficos do platonismo.

b) A prosa romântica analisa mais profundamente a natureza humana, evitando a apresentação de caracteres padronizados em termos de paixões, virtudes e defeitos.

c) A prosa realista põe em cena personagens tipificados que, metamorfoseados em heróis valorosos, correspondem à expressão da consciência e valores coletivos.

d) A prosa realista, apoiando-se em teorias cientificistas do século XIX, empreende a análise de instituições burguesas, como o casamento, por exemplo, denunciando as bases frágeis dessa união.

e) A prosa romântica recria o passado histórico com o intuito de ironizar os mitos nacionais.

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Literatura

Texto para as questões 5 e 6.

E Jerônimo via e escutava, sentindo ir-se-lhe toda a alma pelos olhos enamorados.

Naquela mulata estava o grande mistério, a síntese das impressões que ele recebeu chegando aqui: ela

era a luz ardente do meio-dia; ela era o calor vermelho das sestas da fazenda; era o aroma quente dos

trevos e das baunilhas, que o atordoara nas matas brasileiras; era a palmeira virginal e esquiva que se

não torce a nenhuma outra planta; era o veneno e era o açúcar gostoso; era o sapoti mais doce que mel

e era a castanha do caju, que abre feridas com o seu azeite de fogo; ela era a cobra verde e traiçoeira,

a lagarta viscosa, a muriçoca doida, que esvoaçava havia muito tempo e torno do corpo dele,

acordando-lhe as fibras embambecidas pela saudade da terra, picando-lhe as artérias, para lhe cuspir

dentro do sangue uma centelha naquele amor setentrional, uma nota daquela música feita de gemidos

de prazer, uma larva daquela nuvem de cantáridas que zumbiam em torno da Rita Baiana e espalhavam-

se pelo ar numa fosforescência afrodisíaca. Aluísio Azevedo, O cortiço.

5. O efeito expressivo do texto – bem como seu pertencimento ao Naturalismo em literatura – baseiam-

se amplamente no procedimento de explorar de modo intensivo aspectos biológicos da natureza. Entre

esses procedimentos empregados no texto, só NÃO se encontra a

a) representação do homem como ser vivo em interação constante com o ambiente.

b) exploração exaustiva dos receptores sensoriais humanos (audição, visão, olfação, gustação), bem

como dos receptores mecânicos

c) figuração variada tanto de plantas quanto de animais, inclusive observados em sua interação.

d) ênfase em processos naturais ligados à reprodução humana e à metamorfose em animais.

e) focalização dos processos de seleção natural como principal força direcionadora do processo

evolutivo.

6. Para entender as impressões de Jerônimo diante da natureza brasileira, é preciso ter como pressuposto

que há

a) um contraste entre a experiência prévia da personagem e sua vivência da diversidade biológica

do país em que agora se encontra.

b) uma continuidade na experiência de vida da personagem, posto que a diversidade biológica aqui

e em seu local de origem são muito semelhantes.

c) uma ampliação no universo de conhecimento da personagem, que já tinha vivência de diversidade

biológica semelhante, mas a expande aqui.

d) um equívoco na forma como a personagem percebe e vivencia a diversidade biológica local, que

não comporta os organismos que ele julga ver.

e) um estreitamento na experiência de vida do personagem, que vem de um local com maior

diversidade de ambientes e de organismos..

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Literatura

7. Um dia, meu pai tomou-me pela mão, minha mãe beijou-me a testa, molhando-me de lágrimas os

cabelos e eu parti.

Duas vezes fora visitar o Ateneu antes da minha instalação.

Ateneu era o grande colégio da época. Afamado por um sistema de nutrido reclame, mantido por um

diretor que de tempos a tempos reformava o estabelecimento, pintando-o jeitosamente de novidade,

como os negociantes que liquidam para recomeçar com artigos de última remessa; o Ateneu desde

muito tinha consolidado crédito na preferência dos pais, sem levar em conta a simpatia da meninada,

a cercar de aclamações o bombo vistoso dos anúncios.

O Dr. Aristarco Argolo de Ramos, da conhecida família do Visconde de Ramos, do Norte, enchia o

império com o seu renome de pedagogo. Eram boletins de propaganda pelas províncias, conferências

em diversos pontos da cidade, a pedidos, à substância, atochando a imprensa dos lugarejos, caixões,

sobretudo, de livros elementares, fabricados às pressas com o ofegante e esbaforido concurso de

professores prudentemente anônimos, caixões e mais caixões de volumes cartonados em Leipzig,

inundando as escolas públicas de toda a parte com a sua invasão de capas azuis, róseas, amarelas,

em que o nome de Aristarco, inteiro e sonoro, oferecia-se ao pasmo venerador dos esfaimados de

alfabeto dos confins da pátria. Os lugares que os não procuravam eram um belo dia surpreendidos pela

enchente, gratuita, espontânea, irresistível! E não havia senão aceitar a farinha daquela marca para o

pão do espírito. POMPÉIA, R. O Ateneu. São Paulo: Scipione, 2005.

Ao descrever o Ateneu e as atitudes de seu diretor, o narrador revela um olhar sobre a inserção social

do colégio demarcado pela:

a) ideologia mercantil da educação, repercutida nas vaidades pessoais.

b) interferência afetiva das famílias, determinantes no processo educacional.

c) produção pioneira de material didático, responsável pela facilitação do ensino.

d) ampliação do acesso à educação, com a negociação dos custos escolares.

e) cumplicidade entre educadores e famílias, unidos pelo interesse comum do avanço social.

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Literatura

8. “Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas. Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada, sete horas de chumbo. […].

O rumor crescia, condensando-se; o zunzum de todos os dias acentuava-se; já se não destacavam

vozes dispersas, mas um só ruído compacto que enchia todo o cortiço. Começavam a fazer compras

na venda; ensarilhavam-se discussões e rezingas; ouviam-se gargalhadas e pragas; já se não falava,

gritava-se. Sentia-se naquela fermentação sanguínea, naquela gula viçosa de plantas rasteiras que

mergulham os pés vigorosos na lama preta e nutriente da vida, o prazer animal de existir, a triunfante

satisfação de respirar sobre a terra. AZEVEDO, Aluísio. O cortiço. 15. ed. São Paulo: Ática, 1984. p. 28-29.

Assinale a alternativa que NÃO corresponde a uma possível leitura do fragmento citado:

a) No texto, o narrador enfatiza a força do coletivo. Todo o cortiço é apresentado como um

personagem que, aos poucos, acorda como uma colmeia humana.

b) O texto apresenta um dinamismo descritivo, ao enfatizar os elementos visuais, olfativos e

auditivos.

c) O discurso naturalista de Aluísio Azevedo enfatiza nos personagens de O Cortiço o aspecto

animalesco, “rasteiro” do ser humano, mas também a sua vitalidade e energia naturais, oriundas

do prazer de existir.

d) Através da descrição do despertar do cortiço, o narrador apresenta os elementos introspectivos

dos personagens, procurando criar correspondências entre o mundo físico e o metafísico.

e) Observa-se, no discurso de Aluísio Azevedo, pela constante utilização de metáforas e sinestesias,

uma preocupação em apresentar elementos descritivos que comprovem a sua tese determinista.

9. "Em vez de ir ao espelho, que pensais que fez Capitu? Não vos esqueçais que estava sentada de costas

para mim. Capitu derreou a cabeça, a tal ponto que me foi preciso acudir com as mãos e ampará-la; o

espaldar da cadeira era baixo. Inclinei-me depois sobre ela, rosto a rosto, mas trocados, os olhos de um

na linha da boca do outro. Pedi-lhe que levantasse a cabeça, podia ficar tonta, machucar o pescoço.

Cheguei a dizer que estava feia; nem esta razão a moveu."

Na fase da análise psicológica e social, a ficção de Machado de Assis salienta, como ilustra o texto

transcrito a:

a) hipocrisia social.

b) vaidade egoística.

c) ambiguidade feminina.

d) impossibilidade amorosa.

e) insanidade velada.

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Literatura

10. A questão a seguir baseia-se no seguinte fragmento do romance O cortiço (1890), de Aluísio Azevedo

(1857-1913).

O cortiço “Fechou-se um entra-e-sai de marimbondos defronte daquelas cem casinhas ameaçadas pelo fogo.

Homens e mulheres corriam de cá para lá com os tarecos ao ombro, numa balbúrdia de doidos. O pátio

e a rua enchiam-se agora de camas velhas e colchões espocados. Ninguém se conhecia naquela zumba

de gritos sem nexo, e choro de crianças esmagadas, e pragas arrancadas pela dor e pelo desespero.

Da casa do Barão saíam clamores apopléticos; ouviam-se os guinchos de Zulmira que se espolinhava

com um ataque. E começou a aparecer água. Quem a trouxe? Ninguém sabia dizê-lo; mas viam-se

baldes e baldes que se despejavam sobre as chamas.

Os sinos da vizinhança começaram a badalar. E tudo era um clamor. A Bruxa surgiu à janela da sua

casa, como à boca de uma fornalha acesa. Estava horrível; nunca fora tão bruxa. O seu moreno trigueiro,

de cabocla velha, reluzia que nem metal em brasa; a sua crina preta, desgrenhada, escorrida e

abundante como as das éguas selvagens, dava-lhe um caráter fantástico de fúria saída do inferno.

E ela ria-se, ébria de satisfação, sem sentir as queimaduras e as feridas, vitoriosa no meio daquela orgia

de fogo, com que ultimamente vivia a sonhar em segredo a sua alma extravagante de maluca. Ia atirar-

se cá para fora, quando se ouviu estalar o madeiramento da casa incendiada, que abateu rapidamente,

sepultando a louca num montão de brasas. Aluísio Azevedo

O caráter naturalista nessa obra de Aluísio Azevedo oferece, de maneira figurada, um retrato de nosso

país, no final do século XIX. Põe em evidência a competição dos mais fortes, entre si, e estes,

esmagando as camadas de baixo, compostas de brancos pobres, mestiços e escravos africanos. No

ambiente de degradação de um cortiço, o autor expõe um quadro tenso de misérias materiais e

humanas. No fragmento, há várias outras características do Naturalismo.

Aponte a alternativa em que as duas características apresentadas são corretas.

a) Exploração do comportamento anormal e dos instintos baixos; enfoque da vida e dos fatos sociais

contemporâneos ao escritor.

b) Visão subjetivista dada pelo foco narrativo; tensão conflitiva entre o ser humano e o meio ambiente.

c) Preferência pelos temas do passado, propiciando uma visão objetiva dos fatos; crítica aos valores

burgueses e predileção pelos mais pobres.

d) A onisciência do narrador imprime-lhe o papel de criador, e se confunde com a ideia de Deus;

utilização de preciosismos vocabulares, para enfatizar o distanciamento entre a enunciação e os

fatos enunciados.

e) Exploração de um tema em que o ser humano é aviltado pelo mais forte; predominância de

elementos anti científicos, para ajustar a narração ao ambiente degradante dos personagens.

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Literatura

Gabarito

1. B

Entre as informações analisadas, a alternativa B se faz a única completamente correta. Uma das

principais características do Realismo é o objetivismo e o compromisso com a realidade, desvinculando-

se da imaginação e do senso de mistério. Também há a presença de linguagem simples e a necessidade

de demonstrar o materialismo humano com as mudanças sociais. Ademais, como o realismo busca

retratar as relações sociais do presente, o retorno ao passado seria incoerente ao movimento literário.

2. A

O Naturalismo é um movimento literário que, dentre outras coisas, procurou aplicar as correntes

científicas – determinismo, positivos, método científico etc – do século XIX na Literatura. Dessa forma,

é comum que seus textos: tratem suas personagens de forma animalizada, agindo por instinto; abordem

os problemas sociais como patologias; tenham compromisso com a realidade, etc. Sendo assim, nesse

fragmento, o narrador é fiel ao naturalismo por relacionar a posição social a padrões de comportamento

e à condição de raça, tratando assuntos como um cientista faz um experimento.

3. E

A descrição, a zoomorfização e o detalhamento da realidade são características do Realismo e estão

evidentes no trecho destacado. As informações contidas nas alternativas A, B e D não pertencem ao

Realismo.

4. D

O realismo acrescenta um olhar crítico sobre as relações, principalmente sobre o casamento que, muitas

vezes, é fragilizado por meio dos interesses de ascensão financeira. Na obra de Eça de Queiroz, a

personagem Luisa vivia em um casamento ocioso, o que a faz procurar novos anseios e desejos, quando

se tornará uma mulher adúltera.

5. E

A alternativa E está incorreta, pois no trecho do livro “O cortiço” – assim como no Naturalismo – não há

a ideia de seleção natural, mas sim de determinismo biológico, pois as personagens não são selecionadas

naturalmente, mas são reflexo do meio em que vivem (como exemplo Jerônimo e Pombinha).

6. A

As impressões do personagem em relação à natureza brasileira são baseadas em sua experiência como

homem português: é tudo novo e muito diverso.

7. A

O texto revela as estratégias publicitárias utilizadas pelo diretor do Ateneu para garantir a notoriedade de

sua escola.

8. D

O Realismo não se preocupava com a representação do metafísico.

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Literatura

9. C

Na prosa realista, a mulher é vista como ambígua e capaz de interpretar várias caaracterísticas que, para

a época, não era bem visto socialmente pela figura feminina. Desse modo, Machado encontra na literatura

uma forma de destituir a figura incapaz de cometer erros e ser misteriosa, trazendo a realidade para

personagens mulheres.

10. A Comentário: No fragmento analisado, é possível perceber a abordagem relacionada ao comportamento

humano e aos instintos selvagens que muitas vezes nos movem. A obra realista analisa esses

comportamentos sociais, a partir de correntes filosóficas contemporâneas ao movimento literário, como

o cientificismo, determinismo, entre outros.

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Literatura

Machado de Assis: vida e obra

Resumo

Joaquim Maria Machado de Assis é um dos maiores nomes da literatura brasileira. De origem humilde e

mestiça, o carioca, gago e epilético, nascido no Morro do Livramento, atuou como jornalista, cronista, crítico,

dramaturgo e poeta, superando os preconceitos através de seu inegável talento autodidata. O primeiro

presidente da Academia Brasileira de Letras é o principal nome do Realismo brasileiro, mas sua obra deixou

um legado para diferentes estilos e gêneros literários.

No início de sua carreira, apostou em textos mais tradicionais, mas logo foi

desenvolvendo um estilo muito particular de produção literária com fortes

influências de Alemeida Garrett, romancista português. Sua extensa

produção inspirou grandes nomes – como Olavo Bilac e Lima Barreto – e

ainda inspira escritores contemporâneos.

Em 1855, publica o poema “Ela” e ingressa num mundo do qual nunca mais

sairia: o das letras. Dono de um estilo original e reticente que transborda

humor pessimista, ironia e profunda observação psicológica de suas

personagens, Machado presenteou nossa literatura com obras

singulares. Além de romancista, o autor foi peça ilustre na criação de contos

para a composição artística brasileira. Sua percepção narrativa fora tão

grande que, para representar o principal prêmio literário brasileiro, oferecido

pela Academia Brasileira de Letras, seu nome foi utilizado como forma de

homenagem.

Assim, como não se intrigar com o “defunto autor “ contando suas memórias póstumas? Como não se

envolver com as questões psicoexistenciais e tendenciosas sobre um suposto triângulo amoroso? Machado

é atemporal pela forma com a qual ele trata as questões em seus romances. Dentre as questões sem

resposta que perpassam a existência da humanidade, uma delas foi trazida pelo autor: Capitu traiu Bentinho

ou não?

Leia um trecho do Capítulo I de Memórias Póstumas de Brás Cubas, publicado pela primeira vez em 1881:

Óbito do Autor

Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro

lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas

considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor

defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim

mais galante e mais novo. Moisés, que também contou a sua morte, não a pôs no intróito, mas no cabo;

diferença radical entre este livro e o Pentateuco.

Dito isto, expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na minha bela chácara

de Catumbi. Tinha uns sessenta e quatro anos, rijos e prósperos , era solteiro, possuía cerca de trezentos

contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. Onze amigos! Verdade é que não houve cartas

nem anúncios. Acresce que chovia - peneirava - uma chuvinha miúda, triste e constante, tão constante e tão

triste, que levou um daqueles fiéis da última hora a intercalar esta engenhosa idéia no discurso que proferiu

Retrado de Machado de Assis

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Literatura

à beira de minha cova: —"Vós , que o conhecestes, meus senhores, vós podeis dizer comigo que a natureza

parece estar chorando a perda irreparável de um dos mais belos caracteres que tem honrado a humanidade.

Este ar sombrio, estas gotas do céu, aquelas nuvens escuras que cobrem o azul como um crepe funéreo,

tudo isso é a dor crua e má que lhe rói à natureza as mais íntimas entranhas; tudo isso é um sublime louvor

ao nosso ilustre finado.

Para compreender mais sobre o autor, o domínio público dispnibiliza diversas obras para leitura de modo

gratuito. É possível acessar o acervo clicando aqui.

Selecionamos algumas sugestões de leitura de obras mais famosas do autor, todas disponíveis pelo domínio

público. Veja abaixo:

• Memórias Póstumas de Brás Cubas (Romance)

• Dom Casmurro (Romance)

• A Carteira (Conto)

• A Cartomante (Conto)

• Pai contra mãe (Conto)

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Literatura

Exercícios

1. Joaquim Maria Machado de Assis, cronista, contista, dramaturgo, jornalista, poeta, novelista, romancista, crítico e ensaísta, nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 21 de junho de 1839. Filho de um operáriomestiço de negro e português, Francisco Jose de Assis, e de D. Maria Leopoldina Machado de Assis, aquele que viria a tornar-se o maior escritor do país e um mestre da língua, perde a mãe muito cedo e criado pela madrasta, Maria Inês, também mulata, que se dedica ao menino e o matricula na escola pública, única que frequentou o autodidata Machado de Assis.

Considerando os seus conhecimentos sobre os gêneros textuais, o texto citado constitui-se de

a) fatos ficcionais, relacionados a outros de caráter realista, relativos a vida de um renomado escritor.

b) representações generalizadas acerca da vida de membros da sociedade por seus trabalhos e vida cotidiana.

c) explicações da vida de um renomado escritor, com estrutura argumentativa, destacando como tema seus principais feitos.

d) questões controversas e fatos diversos da vida de personalidade histórica, ressaltando sua intimidade familiar em detrimento de seus feitos públicos.

e) apresentação da vida de uma personalidade, organizada sobretudo pela ordem tipológica da narração, com um estilo marcado por linguagem objetiva.

Texto para as questões 2 e 3

“Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto e, se poria em

primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto que o uso vulgar seja começar pelo

nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou

propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; o segundo

e que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo.”

Memórias póstumas de Brás Cubas. Machado de Assis.

2. Essa é a abertura do famoso romance de Machado de Assis. Dentro desse contexto, já dá para se ver

o tipo de narrativa que será explorada. Assinale a alternativa correta a esse respeito.

a) A narrativa decorre de forma cronologicamente correta, de acordo com a passagem do tempo: infância, juventude, maturidade e velhice.

b) A linearidade das ações apresenta cenas de suspense, dado o comportamento inusitado dos personagens.

c) Não há como prever o final da narrativa, já que seu enredo é, propositadamente, complicado.

d) A ação terá, como cenário, os diversos centros cosmopolitas do mundo.

e) O autor usa o recurso do flashback devido a sua intenção de iniciar o romance pelo “fim”.

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Literatura

3. Em relação à questão anterior, infere-se que a linguagem dispõe de um recurso enriquecedor: a

disposição das palavras no espaço frasal. Sendo assim, que tipo de leitura pode-se fazer dessas duas

expressões: “autor defunto” e “defunto autor”?

a) A colocação da palavra defunto após a palavra autor leva-nos a pensar que o segundo elemento está em fase final de carreira.

b) Defunto autor remete à ideia de que a pessoa irá escrever suas memórias dentro de um cemitério.

c) Ambas as expressões transmitem a mesma ideia, com iguais valores semânticos.

d) A expressão defunto autor aparece de forma metaforizada, original, privilegiando uma nova forma de narração autobiográfica.

e) Ambas as construções não têm expressão na obra biográfica de Machado de Assis.

4. Mas, como digo, a mais engenhosa de todas as nossas experiências, foi a de Diogo Meireles. Lavrava

então na cidade uma singular doença, que consistia em fazer inchar os narizes, tanto e tanto, que

tomavam metade e mais da cara do paciente, e não só a punham horrenda, senão que era molesto

carregar tamanho peso. Conquanto os físicos da terra propusessem extrair os narizes inchados, para

alívio e melhoria dos enfermos, nenhum destes consentia em prestar-se ao curativo, preferindo o

excesso à lacuna, e tendo por mais aborrecível que nenhuma outra coisa a ausência daquele órgão.

Diogo Meireles, que desde algum tempo praticava a medicina, segundo ficou dito atrás, estudou a

moléstia e reconheceu que não havia perigo em desnarigar os doentes, antes era vantajoso por lhes

levar o mal, sem trazer fealdade, pois tanto valia um nariz disforme e pesado como nenhum; não

alcançou, todavia, persuadir os infelizes ao sacrifício. Então, ocorreu-lhe uma graciosa invenção.

Assim foi que, reunindo muitos físicos, filósofos, bonzos, autoridades e povo, comunicou-lhes que

tinha um segredo para eliminar o órgão; e esse segredo era nada menos que substituir o nariz

achacado por um nariz são, mas de pura natureza metafísica, isto é, inacessível aos sentidos humanos,

e contudo tão verdadeiro ou ainda mais do que o cortado; cura esta praticada por ele em várias partes,

e muito aceita aos físicos de Malabar. O assombro da assembleia foi imenso, e não menor a

incredulidade de alguns, não digo de todos, sendo que a maioria não sabia em que acreditar, pois se

lhe repugnava a metafísica do nariz, cedia, entretanto, à energia das palavras de Diogo Meireles, ao

tom alto e convencido com que ele expôs e definiu o seu remédio. ASSIS, Machado de. O Segredo do Bonzo. Papéis Avulsos. Disponível em: . Acesso em: 14 set. 2016. Adaptado.

O fragmento do conto “O Segredo do Bonzo”, de Machado de Assis, revela

a) uma censura aos médicos que, por não conhecerem o verdadeiro diagnóstico de uma patologia, inventam soluções terapêuticas absurdas e arriscadas.

b) a vaidade humana diante da possibilidade, ainda que abstrata, de receber um nariz mais bonito do que o congênito, ora disforme pela enfermidade.

c) a ausência de posicionamento crítico do povo e também de autoridades sociais diante de discursos envolventes, mas sem qualquer comprovação científica.

d) os interesses escusos de alguns profissionais da saúde que, mesmo sabendo que não há necessidade de intervenção cirúrgica, põem seus pacientes em risco.

e) o desdém manifesto por uma sociedade que está mais preocupada com a aparência do que com a essência a ponto de se convencer da eficácia do remédio proposto por Diogo Meireles.

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Literatura

5. O romance Memórias póstumas de Brás Cubas é considerado um divisor de águas tanto na obra de

Machado de Assis quanto na literatura brasileira do século XIX. Indique a alternativa em que todas as

características mencionadas podem ser adequadamente atribuídas ao romance em questão.

a) Rejeição dos valores românticos, narrativa linear e fluente de um defunto autor, visão pessimista em relação aos problemas sociais.

b) Distanciamento do determinismo científico, cultivo do humor e digressões sobre banalidades, visão reformadora das mazelas sociais.

c) Abandono das idealizações românticas, uso de técnicas pouco usuais de narrativa, sugestão implícita de contradições sociais.

d) Crítica do realismo literário, narração iniciada com a morte do narrador-personagem, tematização de conflitos sociais.

e) Apresenta uma retomada ao Romantismo, narração iniciada com o nascimento do personagem principal, tematização voltada às classes populares.

6. O romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, faz significativo uso da

linguagem figurada, o que dá ao texto uma fina dimensão estética. Assim, indique a alternativa em que

o fragmento não está corretamente classificado de acordo com a figura que nele ocorre.

a) Deixa lá dizer Pascal que o homem é um caniço pensante. Não; é uma errata pensante, isso sim. – metáfora.

b) E estando a recordá-lo, ouço um ranger de porta, um farfalhar de saias. – onomatopeia.

c) Quincas Borba não só estava louco, mas sabia que estava louco, e esse resto de consciência, como uma frouxa lamparina no meio das trevas, complicava muito o horror da situação. – eufemismo.

d) Marcela morria de amores pelo Xavier. Não morria, vivia. Viver não é a mesma coisa que morrer. – Antítese.

e) Suposto que o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método – hipérbole.

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7. Capítulo LIV — A pêndula

Saí dali a saborear o beijo. Não pude dormir; estirei-me na cama, é certo, mas foi o mesmo que nada.

Ouvi as horas todas da noite. Usualmente, quando eu perdia o sono, o bater da pêndula fazia-me muito

mal; esse tique-taque soturno, vagaroso e seco parecia dizer a cada golpe que eu ia ter um instante

menos de vida. Imaginava então um velho diabo, sentado entre dois sacos, o da vida e o da morte, e a

contá-las assim:

— Outra de menos...

— Outra de menos...

— Outra de menos...

— Outra de menos...

O mais singular é que, se o relógio parava, eu dava-lhe corda, para que ele não deixasse de bater nunca,

e eu pudesse contar todos os meus instantes perdidos. Invenções há, que se transformam ou acabam;

as mesmas instituições morrem; o relógio é definitivo e perpétuo. O derradeiro homem, ao despedir-

se do sol frio e gasto, há de ter um relógio na algibeira, para saber a hora exata em que morre.

Naquela noite não padeci essa triste sensação de enfado, mas outra, e deleitosa. As fantasias

tumultuavam-me cá dentro, vinham umas sobre outras, à semelhança de devotas que se abalroam

para ver o anjo-cantor das procissões. Não ouvia os instantes perdidos, mas os minutos ganhados. ASSIS, M. Memórias póstumas de Brás Cubas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992 (fragmento).

O capítulo apresenta o instante em que Brás Cubas revive a sensação do beijo trocado com Virgília,

casada com Lobo Neves. Nesse contexto, a metáfora do relógio desconstrói certos paradigmas

românticos, porque

a) o narrador e Virgília não têm percepção do tempo em seus encontros adúlteros.

b) como “defunto autor”, Brás Cubas reconhece a inutilidade de tentar acompanhar o fluxo do tempo.

c) na contagem das horas, o narrador metaforiza o desejo de triunfar e acumular riquezas.

d) o relógio representa a materialização do tempo e redireciona o comportamento idealista de Brás Cubas.

e) o narrador compara a duração do sabor do beijo à perpetuidade do relógio.

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Literatura

8. Talvez pareça excessivo o escrúpulo do Cotrim, a quem não souber que ele possuía um caráter

ferozmente honrado. Eu mesmo fui injusto com ele durante os anos que se seguiram ao inventário de

meu pai. Reconheço que era um modelo. Arguíam-no de avareza, e cuido que tinham razão; mas a

avareza é apenas a exageração de uma virtude, e as virtudes devem ser como os orçamentos: melhor

é o saldo que o déficit. Como era muito seco de maneiras, tinha inimigos que chegavam a acusá-lo de

bárbaro. O único fato alegado neste particular era o de mandar com frequência escravos ao calabouço,

donde eles desciam a escorrer sangue; mas, além de que ele só mandava os perversos e os fujões,

ocorre que, tendo longamente contrabandeado em escravos, habituara-se de certo modo ao trato um

pouco mais duro que esse gênero de negócio requeria, e não se pode honestamente atribuir à índole

original de um homem o que é puro efeito de relações sociais. A prova de que o Cotrim tinha

sentimentos pios encontrava-se no seu amor aos filhos, e na dor que padeceu quando morreu Sara,

dali a alguns meses; prova irrefutável, acho eu, e não única. Era tesoureiro de uma confraria, e irmão

de várias irmandades, e até irmão remido de uma destas, o que não se coaduna muito com a reputação

da avareza; verdade é que o benefício não caíra no chão: a irmandade (de que ele fora juiz) mandara-

lhe tirar o retrato a óleo. ASSIS, M. Memórias póstumas de Brás Cubas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992

Obra que inaugura o Realismo na literatura brasileira, Memórias póstumas de Brás Cubas condensa

uma expressividade que caracterizaria o estilo machadiano: a ironia. Descrevendo a moral de seu

cunhado, Cotrim, o narrador-personagem Brás Cubas refina a percepção irônica ao

a) acusar o cunhado de ser avarento para confessar-se injustiçado na divisão da herança paterna.

b) atribuir a “efeito de relações sociais” a naturalidade com que Cotrim prendia e torturava os escravos.

c) considerar os “sentimentos pios” demonstrados pelo personagem quando da perda da filha Sara.

d) menosprezar Cotrim por ser tesoureiro de uma confraria e membro remido de várias irmandades.

e) insinuar que o cunhado era um homem vaidoso e egocêntrico, contemplado com um retrato a óleo.

Texto para as questões 9 e 10

Crônica da abolição

Eu pertenço a uma família de profetas “après coup”1 , “post factum”2 , “depois do gato morto”, ou como

melhor nome tenha em holandês. Por isso digo, juro se necessário for, que toda a história desta lei de 13 de

maio estava por mim prevista, tanto que na segunda-feira, antes mesmo dos debates, tratei de alforriar um

molecote que tinha, pessoa de seus dezoito anos, mais ou menos. Alforriá-lo era nada; entendi que, perdido

por mil, perdido por mil e quinhentos, e dei um jantar.

Neste jantar, a que meus amigos deram o nome de banquete, em falta de outro melhor, reuni umas cinco

pessoas, conquanto as notícias dissessem trinta e três (anos de Cristo), no intuito de lhe dar um aspecto

simbólico.

No golpe do meio (“coupe do milieu”3 , mas eu prefiro falar a minha língua) levantei-me eu com a taça

de champanha e declarei que, acompanhando as idéias pregadas por Cristo há dezoito séculos, restituía a

liberdade ao meu escravo Pancrácio; que entendia que a nação inteira devia acompanhar as mesmas idéias

e imitar o meu exemplo; finalmente, que a liberdade era um dom de Deus que os homens não podiam roubar

sem pecado.

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Literatura

Pancrácio, que estava à espreita, entrou na sala, como um furacão, e veio abraçar-me os pés. Um dos

meus amigos (creio que é ainda meu sobrinho) pegou de outra taça e pediu à ilustre assembléia que

correspondesse ao ato que acabava de publicar brindando ao primeiro dos cariocas. Ouvi cabisbaixo: fiz

outro discurso agradecendo, e entreguei a carta ao molecote. Todos os lenços comovidos apanharam as

lágrimas de admiração. Caí na cadeira e não vi mais nada. De noite, recebi muitos cartões. Creio que estão

pintando o meu retrato, e suponho que a óleo.

No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe com rara franqueza:

— Tu és livre, podes ir para onde quiseres. Aqui tens casa amiga, já conhecida, e tens mais um ordenado,

um ordenado que...

— Oh! meu senhô! Fico.

— Um ordenado pequeno, mas que há de crescer. Tudo cresce neste mundo: tu cresceste imensamente.

Quando nasceste eras um pirralho deste tamanho; hoje estás mais alto que eu. Deixa ver; olha, és mais alto

quatro dedos...

— Artura não qué dizê nada, não, senhô...

— Pequeno ordenado, repito, uns seis mil-réis: mas é de grão em grão que a galinha enche o seu papo.

Tu vales muito mais que uma galinha.

— Eu vaio um galo, sim, senhô.

— Justamente. Pois seis mil-réis. No fim de um ano, se andares bem, conta com oito. Oito ou sete.

Pancrácio aceitou tudo: aceitou até um peteleco que lhe dei no dia seguinte, por me não escovar bem as

botas; efeitos da liberdade. Mas eu expliquei-lhe que o peteleco, sendo um impulso natural, não podia anular

o direito civil adquirido por um título que lhe dei. Ele continuava livre, eu de mau humor; eram dois estados

naturais, quase divinos.

Tudo compreendeu o meu bom Pancrácio: daí para cá, tenho-lhe despedido alguns pontapés, um ou

outro puxão de orelhas, e chamo-lhe besta quando lhe não chamo filho do diabo; cousas todas que ele recebe

humildemente e (Deus me perdoe!) creio que até alegre. [...]

MACHADO DE ASSIS http://portal.mec.gov.br

Vocabulário:

1 “après coup”: depois do golpe

2 “post factum”: depois do fato

3 “coupe do milieu”: o autor utiliza uma expressão inexistente em francês para mostrar a ignorância do

personagem

9. Poucos dias após a Abolição da Escravatura, o escritor Machado de Assis publicou nos jornais essa crônica, na verdade um pequeno conto irônico. A ironia é uma forma de relativizar uma posição, mostrando-a sob outra perspectiva. Identifique o alvo da ironia de Machado de Assis e demonstre por que a contratação de Pancrácio como assalariado faz parte dessa ironia.

10. — Um ordenado pequeno, mas que há de crescer. Tudo cresce neste mundo: tu cresceste imensamente. Quando nasceste eras um pirralho deste tamanho; hoje estás mais alto que eu. A fala do senhor de Pancrácio deseja convencer e persuadir seu interlocutor. O argumento

apresentado, entretanto, é intencionalmente falho, isto é, configura uma falácia. Explique em que

consiste esta falácia.

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Texto para as questões 11 e 12 Pai contra mãe A escravidão levou consigo ofícios e aparelhos, como terá sucedido a outras instituições sociais. Não cito

alguns aparelhos senão por se ligarem a certo ofício. Um deles era o ferro ao pescoço, outro o ferro ao pé;

havia também a máscara de folha de flandres. A máscara fazia perder o vício da embriaguez aos escravos,

por lhes tapar a boca. Tinha só três buracos, dois para ver, um para respirar, e era fechada atrás da cabeça

por um cadeado. Com o vício de beber, perdiam a tentação de furtar, porque geralmente era dos vinténs do

senhor que eles tiravam com que matar a sede, e aí ficavam dois pecados extintos, e a sobriedade e a

honestidade certas. Era grotesca tal máscara, mas a ordem social e humana nem sempre se alcança sem o

grotesco, e alguma vez o cruel. Os funileiros as tinham penduradas, à venda, na porta das lojas. Mas não

cuidemos de máscaras.

O ferro ao pescoço era aplicado aos escravos fujões. Imaginai uma coleira grossa, com a haste grossa

também, à direita ou à esquerda, até ao alto da cabeça e fechada atrás com chave. Pesava, naturalmente,

mas era menos castigo que sinal. Escravo que fugia assim, onde quer que andasse, mostrava um reincidente,

e com pouco era pegado.

Há meio século, os escravos fugiam com frequência. Eram muitos, e nem todos gostavam da escravidão.

Sucedia ocasionalmente apanharem pancada, e nem todos gostavam de apanhar pancada. Grande parte era

apenas repreendida; havia alguém de casa que servia de padrinho, e o mesmo dono não era mau; além disso,

o sentimento da propriedade moderava a ação, porque dinheiro também dói.

A fuga repetia-se, entretanto. Casos houve, ainda que raros, em que o escravo de contrabando, apenas

comprado no Valongo, deitava a correr, sem conhecer as ruas da cidade. Dos que seguiam para casa, não

raro, apenas ladinos, pediam ao senhor que lhes marcasse aluguel, e iam ganhá-lo fora, quitandando.

Quem perdia um escravo por fuga dava algum dinheiro a quem lho levasse. Punha anúncios nas folhas

públicas, com os sinais do fugido, o nome, a roupa, o defeito físico, se o tinha, o bairro por onde andava e a

quantia de gratificação. Quando não vinha a quantia, vinha promessa: “gratificar-se-á generosamente” – ou

“receberá uma boa gratificação”. Muita vez o anúncio trazia em cima ou ao lado uma vinheta, figura de preto,

descalço, correndo, vara ao ombro, e na ponta uma trouxa. Protestava-se com todo o rigor da lei contra quem

o acoitasse.

Ora, pegar escravos fugidios era um ofício do tempo. Não seria nobre, mas por ser instrumento da força com

que se mantêm a lei e a propriedade, trazia esta outra nobreza implícita das ações reivindicadoras. Ninguém

se metia em tal ofício por desfastio ou estudo; a pobreza, a necessidade de uma achega, a inaptidão para

outros trabalhos, o acaso, e alguma vez o gosto de servir também, ainda que por outra via, davam o impulso

ao homem que se sentia bastante rijo para pôr ordem à desordem. (Contos: uma antologia, 1998.)

11. A perspectiva do narrador diante das situações e dos fatos relacionados à escravidão é marcada, sobretudo,

a) pelo saudosismo.

b) pela indiferença.

c) pela indignação.

d) pelo entusiasmo.

e) pela ironia

12. Em “o sentimento da propriedade moderava a ação, porque dinheiro tambem dói.” (3o parágrafo), a “ação a

que se refere o narrador diz respeito

a) à fuga dos escravos.

b) ao contrabando de escravos.

c) aos castigos físicos aplicados aos escravos.

d) às repreensões verbais feitas aos escravos.

e) à emancipação dos escravos.

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Literatura

Gabarito

1. E

Por se tratar da narração de aspectos pessoais de uma personalidade pública (um texto biográfico),

entende-se que a alternativa E responde corretamente a questão.

2. E

Por se tratar de uma história contada por um defunto-autor, o recurso de flashback explora as

lembranças do narrador, que já falecido narra sua vida.

3. D

Aqui, explora-se a forma metaforizada de “defunto-autor” para que se perceba uma nova maneira de se

contar ou escrever uma biografia.

4. C

No fragmento de texto, há a passagem “ físicos, filósofos, bonzos, autoridades e povo”, logo a maior

parte das pessoas ouviu o discurso inflamado, porém não o questionavam nem exigiam a prova científica,

mostrando, assim, ausência de posicionamento crítico.

5. C

O romance de Machado de Assis é uma ruptura com as idealizações românticas e apresenta

características particulares do autor que inovou a forma narrativa e questionou constantemente os

valores sociais humanos.

6. C

Em “como uma frouxa lamparina no meio das trevas” ocorre uma comparação indicada pelo termo

“como”. O Eufemismo e uma figura de linguagem em que há intenção de amenizar a mensagem dita.

7. D

As batidas do relógio desconstroem uma possível idealização romântica, pois evidenciam a

preocupação de Brás Cubas com o tempo e a sua materialização.

8. B

O narrador-personagem Brás Cubas refina a percepção irônica quando fala da maneira como Cotrim

tratava os escravos, que eram mantidos no calabouço, justamente para mostrar que ele não “possuía

um caráter ferozmente honrado”.

9. A existência de hipócritas dentre os que defendiam a abolição da escravatura. A contratação de

Pancrácio como assalariado na verdade o mantém sob o domínio e exploração do seu antigo dono, agora

patrão.

10. O personagem faz uma comparação indevida, associando o crescimento do salário ao crescimento

biológico de um ser humano.

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Literatura

11. E

Ao longo de todo o trecho,é possível ver um narrador que busca dar indiretas sobre sua opinão, no

entanto recobra ao artefato irônico para sutilmente apresentar seu ponto de vista e, ao mesmo tempo,

se afastar do enredo.

12. C

A ação mencionada pelo narrador diz respeito aos atos de tortura que os senhores de escravos tinham

com os negros mencionados. Assim, é importante destacar a ironia presente na oração, uma vez que é

uma reflexão referente ao tipo de agressão.

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Literatura

Machado de Assis: características gerais

Resumo

Joaquim Maria Machado de Assis é um dos maiores nomes da literatura brasileira. De origem humilde e

mestiça, o carioca, gago e epilético, nascido no Morro do Livramento, atuou como jornalista, cronista, crítico,

dramaturgo e poeta, superando os preconceitos através de seu inegável talento autodidata. O primeiro

presidente da Academia Brasileira de Letras é o principal nome do Realismo brasileiro, mas sua obra deixou

um legado para diferentes estilos e gêneros literários.

Características machadianas As obras machadianas eram produzidas, em sua maioria, em prosa e com o aprofundamento psicológico de

personagens e, um dos elementos mais significativos, é o posicionamento do narrador. Com caráter

persuasivo, o narrador –que por muitas vezes também é personagem- é ativo ao longo do enredo e dialoga o

tempo inteiro com o leitor. Além disso, em alguns momentos, interfere no enredo e admite uma posição

provocadora sobre seu posicionamento, incitando que o interlocutor também pense da mesma forma.

Outro ponto interessante a ser abordado, é o da descrição feminina, que está longe da figura idealizada da

escola Romântica. Aqui, a mulher é mais concreta, abordada não só por suas qualidades, mas também por

seus defeitos. É uma mulher real, sem ser fantasiada pelo narrador. Por fim, a ironia machadiana e o ceticismo

também são uns dos principais aspectos que fazem referência ao autor. Com um toque humorístico e, por

muitas vezes sutil, estes conseguem expressar – com inteligência – as verdadeiras intenções do autor,

fazendo abordagens sobre a hipocrisia humana, as relações por interesse, o adultério, a infelicidade no

casamento, a ascensão social, o egocentrismo, entre outras. Para sintetizar, é importante salientar as

características principais do autor:

• Crítica à burguesia e aos comportamentos sociais;

• Ironia e sutileza nas análises;

• Metalinguagem;

• Interação constante com o leitor;

• Drigressão – tempo não cronológico em algumas obras.

Texto I

Capítulo XXXIII: O penteado

Capitu deu-me as costas, voltando-se para o espelhinho. Peguei-lhe dos cabelos, colhi-os todos e entrei a

alisá-los com o pente, desde a testa até as últimas pontas, que lhe desciam à cintura. Em pé não dava jeito:

não esquecestes que ela era um nadinha mais alta que eu, mas ainda que fosse da mesma altura. Pedi-lhe

que se sentasse.

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Literatura

– Senta aqui, é melhor.

Sentou-se. “Vamos ver o grande cabeleireiro”, disse-me rindo. Continuei a alisar os cabelos, com muito

cuidado, e dividi-os em duas porções iguais, para compor as duas tranças. Não as fiz logo, nem assim

depressa, como podem supor os cabeleireiros de ofício, mas devagar, devagarinho, saboreando pelo tacto

aqueles fios grossos, que eram parte dela. O trabalho era atrapalhado, às vezes por desazo, outras de

propósito, para desfazer o feito e refazê-lo. Os dedos roçavam na nuca da pequena ou nas espáduas vestidas

de chita, e a sensação era um deleite. Mas, enfim, os cabelos iam acabando, por mais que eu os quisesse

intermináveis. Não pedi ao céu que eles fossem tão longos como os da Aurora, porque não conhecia ainda

esta divindade que os velhos poetas me apresentaram depois; mas, desejei penteá-los por todos os séculos

dos séculos, tecer duas tranças que pudessem envolver o infinito por um número inominável de vezes. Se isto

vos parecer enfático, desgraçado leitor, é que nunca penteastes uma pequena, nunca pusestes as mãos

adolescentes na jovem cabeça de uma ninfa...Uma ninfa! Todo eu estou mitológico. Ainda há pouco, falando

dos seus olhos de ressaca, cheguei a escrever Tétis; risquei Tétis, risquemos ninfas; digamos somente uma

criatura amada, palavra que envolve todas as potências cristãs e pagãs. Enfim, acabei as duas tranças. Onde

estava a fita para atar-lhes as pontas? Em cima da mesa, um triste pedaço de fita enxovalhada. Juntei as

pontas das tranças, uni-as por um laço, retoquei a obra, alargando aqui, achatando ali, até que exclamei:

– Pronto!

– Estará bom?

– Veja no espelho.

Em vez de ir ao espelho, que pensais que fez Capitu? Não vos esqueçais que estava sentada, de costas para

mim. Capitu derreou a cabeça, a tal ponto que me foi preciso acudir com as mãos e ampará-la; o espaldar da

cadeira era baixo. Inclinei-me depois sobre ela, rosto a rosto, mas trocados, os olhos de um na linha da boca

do outro. Pedi-lhe que levantasse a cabeça, podia ficar tonta, machucar o pescoço. Cheguei a dizer-lhe que

estava feia; mas nem esta razão a moveu.

– Levanta, Capitu!

Não quis, não levantou a cabeça, e ficamos assim a olhar um para o outro, até que ela abrochou os lábios, eu

desci os meus, e...

Grande foi a sensação do beijo; Capitu ergueu-se, rápida, eu recuei até à parede com uma espécie de vertigem,

sem fala, os olhos escuros. Quando eles me clarearam, vi que Capitu tinha os seus no chão. Não me atrevi a

dizer nada; ainda que quisesse, faltava-me língua. Preso, atordoado, não achava gesto nem ímpeto que me

descolasse da parede e me atirasse a ela com mil palavras cálidas e mimosas...Não mofes dos meus quinze

anos, leitor precoce. Com dezessete, Des Grieux (e mais era Des Grieux) não pensava ainda na diferença dos

sexos. Disponível em: http://www.ibiblio.org/ml/libri/a/AssisJMM_DomCasmurro/node33.html

Texto II

Capítulo CXV: O almoço

Não a vi partir; mas à hora marcada senti alguma cousa que não era dor nem prazer, uma cousa mista, alívio

e saudade, tudo misturado, em iguais doses. Não se irrite o leitor com esta confissão. Eu bem sei que, para

titilar-lhe os nervos da fantasia, devia padecer um grande desespero, derramar algumas lágrimas, e não

almoçar. Seria romanesco; mas não seria biográfico. A realidade pura é que eu almocei, como nos demais

dias, acudindo ao coração com as lembranças da minha aventura, e ao estômago com os acepipes de

M. Prudhon... (....) Dsiponível em: http://www.ibiblio.org/ml/libri/a/AssisJMM_MemoriasPostumas/node118.html

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3

Literatura

Texto III

Capítulo CXXV : Epitáfio

Aqui jaz

D. Eulália damascena de brito

morta

aos dezenove anos de edade

orai por ela!

Disponível em: http://www.ibiblio.org/ml/libri/a/AssisJMM_MemoriasPostumas/node128.html

Texto IV

Capítulo CXXVI: Desconsolação

O epitáfio diz tudo. Vale mais do que se lhes narrasse a moléstia de Nhã-loló, a morte, o desespero da família,

o enterro. Ficam sabendo que morreu; acrescentarei que foi por ocasião da primeira entrada da febre amarela.

Não digo mais nada, a não ser que a acompanhei até o último jazigo, e me despedi triste, mas sem lágrimas.

Concluí que talvez não a amasse deveras.

(...)

Se não contei a morte, não conto igualmente a missa do sétimo dia. A tristeza de Damasceno era profunda;

esse pobre homem parecia uma ruína. Quinze dias depois estive com ele; continuava inconsolável, e dizia que

a dor grande com que Deus o castigara fora ainda aumentada com a que lhe infligiram os homens. Não me

disse mais nada. (...)

Texto V

Capítulo LV: O velho diálogo de Adão e Eva BRÁS CUBAS. . . . . . . . . . . . . . . . .

VIRGÍLIA

. . . . . . . . . . . . . .

BRÁS CUBAS

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

VIRGíLIA

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . !

BRáS CUBAS

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

VIRGíLIA

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ? . . . . . . . . . . . . . . . .

BRÁS CUBAS

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

VIRGÍLIA

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .?

BRÁS CUBAS

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ! . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ! . . . . . . . . . . .

VIRGÍLIA

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ? Disponível em: http://www.ibiblio.org/ml/libri/a/AssisJMM_MemoriasPostumas/node58.html

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Literatura

Texto VI

O Alienista (fragmento)

As crônicas da vila de Itaguaí dizem que em tempos remotos vivera ali um certo médico, o Dr. Simão

Bacamarte, filho da nobreza da terra e o maior dos médicos do Brasil, de Portugal e das Espanhas. Estudara

em Coimbra e Pádua. Aos trinta e quatro anos regressou ao Brasil, não podendo el-rei alcançar dele que

ficasse em Coimbra, regendo a universidade, ou em Lisboa, expedindo os negócios da monarquia.

—A ciência, disse ele a Sua Majestade, é o meu emprego único; Itaguaí é o meu universo.

Dito isso, meteu-se em Itaguaí, e entregou-se de corpo e alma ao estudo da ciência, alternando as curas com

as leituras, e demonstrando os teoremas com cataplasmas. Aos quarenta anos casou com D. Evarista da

Costa e Mascarenhas, senhora de vinte e cinco anos, viúva de um juiz de fora, e não bonita nem simpática.

Um dos tios dele, caçador de pacas perante o Eterno, e não menos franco, admirou-se de semelhante escolha

e disse-lho. Simão Bacamarte explicou-lhe que D. Evarista reunia condições fisiológicas e anatômicas de

primeira ordem, digeria com facilidade, dormia regularmente, tinha bom pulso, e excelente vista; estava assim

apta para dar-lhe filhos robustos, sãos e inteligentes. Se além dessas prendas, —únicas dignas da

preocupação de um sábio, D. Evarista era mal composta de feições, longe de lastimá-lo, agradecia-o a Deus,

porquanto não corria o risco de preterir os interesses da ciência na contemplação exclusiva, miúda e vulgar

da consorte.

D. Evarista mentiu às esperanças do Dr. Bacamarte, não lhe deu filhos robustos nem mofinos. A índole natural

da ciência é a longanimidade; o nosso médico esperou três anos, depois quatro, depois cinco. Ao cabo desse

tempo fez um estudo profundo da matéria, releu todos os escritores árabes e outros, que trouxera para Itaguaí,

enviou consultas às universidades italianas e alemãs, e acabou por aconselhar à mulher um regímen

alimentício especial. A ilustre dama, nutrida exclusivamente com a bela carne de porco de Itaguaí, não atendeu

às admoestações do esposo; e à sua resistência,—explicável, mas inqualificável,— devemos a total extinção

da dinastia dos Bacamartes.

Mas a ciência tem o inefável dom de curar todas as mágoas; o nosso médico mergulhou inteiramente no

estudo e na prática da medicina. Foi então que um dos recantos desta lhe chamou especialmente a atenção,—

o recanto psíquico, o exame de patologia cerebral. Não havia na colônia, e ainda no reino, uma só autoridade

em semelhante matéria, mal explorada, ou quase inexplorada. Simão Bacamarte compreendeu que a ciência

lusitana, e particularmente a brasileira, podia cobrir-se de "louros imarcescíveis", — expressão usada por ele

mesmo, mas em um arroubo de intimidade doméstica; exteriormente era modesto, segundo convém aos

sabedores. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bn000012.pdf

Texto VII

Capítulo CXXXVI: Inutilidade

Mas, ou muito me engano, ou acabo de escrever um capítulo inútil.

Disponível em: http://www.ibiblio.org/ml/libri/a/AssisJMM_MemoriasPostumas/node139.html

Texto VIII

Capítulo CXXXVIII: A um crítico

Meu caro crítico,

Algumas páginas atrás, dizendo eu que tinha cinquenta anos, acrescentei: “Já se vai sentindo que o meu estilo

não é tão lesto como nos primeiros dias.” Talvez aches esta frase incompreensível, sabendo-se o meu atual

estado; mas eu chamo a tua atenção para a subtileza daquele pensamento. O que eu quero dizer não é que

esteja agora mais velho do que quando comecei o livro. A morte não envelhece. Quero dizer, sim, que em cada

fase da narração da minha vida experimento a sensação correspondente. Valha-me Deus! é preciso explicar

tudo. Disponível em: http://www.ibiblio.org/ml/libri/a/AssisJMM_MemoriasPostumas/node141.html

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Literatura

Texto IX

Capítulo XXI: O almocreve

Vai então, empacou o jumento em que eu vinha montado; fustiguei-o, ele deu dois corcovos, depois mais três,

enfim mais um, que me sacudiu fora da sela, e com tal desastre, que o pé esquerdo me ficou preso no estribo;

tento agarrar-me ao ventre do animal, mas já então, espantado, disparou pela estrada afora. Digo mal: tentou

disparar, e efetivamente deu dois saltos, mas um almocreve, que ali estava, acudiu a tempo de lhe pegar na

rédea e detê-lo, não sem esforço nem perigo. Dominado o bruto, desvencilhei-me do estribo e pus-me de pé.

– Olhe do que vosmecê escapou, disse o almocreve.

E era verdade; se o jumento corre por ali fora, contundia-me deveras, e não sei se a morte não estaria no fim

do desastre; cabeça partida, uma congestão, qualquer transtorno cá dentro, lá se me ia a ciência em flor. O

almocreve salvara-me talvez a vida; era positivo; eu sentia-o no sangue que me agitava o coração. Bom

almocreve! enquanto eu tornava à consciência de mim mesmo, ele cuidava de consertar os arreios do jumento,

com muito zelo e arte. Resolvi dar-lhe três moedas de ouro das cinco que trazia comigo; não porque tal fosse

o preço da minha vida, -- essa era inestimável; mas porque era uma recompensa digna da dedicação com que

ele me salvou. Está dito, dou-lhe as três moedas.

– Pronto, disse ele, apresentando-me a rédea da cavalgadura.

– Daqui a nada, respondi; deixa-me, que ainda não estou em mim...

– Ora qual!

– Pois não é certo que ia morrendo?

– Se o jumento corre por aí fora, é possível; mas, com a ajuda do Senhor, viu vosmecê que não aconteceu

nada.

Fui aos alforjes, tirei um colete velho, em cujo bolso trazia as cinco moedas de ouro, e durante esse tempo

cogitei se não era excessiva a gratificação, se não bastavam duas moedas. Talvez uma. Com efeito, uma

moeda era bastante para lhe dar estremeções de alegria. Examinei-lhe a roupa; era um pobre diabo, que nunca

jamais vira uma moeda de ouro. Portanto, uma moeda. Tirei-a, via-a reluzir à luz do sol; não a viu o almocreve,

porque eu tinha-lhe voltado as costas; mas suspeitou-o talvez, entrou a falar ao jumento de um modo

significativo; dava-lhe conselhos, dizia-lhe que tomasse juízo, que o «senhor doutor» podia castigá-lo; um

monólogo paternal. Valha-me Deus! até ouvi estalar um beijo: era o almocreve que lhe beijava a testa.

– Olé! exclamei.

– Queira vosmecê perdoar, mas o diabo do bicho está a olhar para a gente com tanta graça...

Ri-me, hesitei, meti-lhe na mão um cruzado em prata, cavalguei o jumento, e segui a trote largo, um pouco

vexado, melhor direi um pouco incerto do efeito da pratinha. Mas a algumas braças de distância, olhei para

trás, o almocreve fazia-me grandes cortesias, com evidentes mostras de contentamento. Adverti que devia

ser assim mesmo; eu pagara-lhe bem, pagara-lhe talvez demais. Meti os dedos no bolso do colete que trazia

no corpo e senti umas moedas de cobre; eram os vinténs que eu devera ter dado ao almocreve, em lugar do

cruzado em prata. Porque, enfim, ele não levou em mira nenhuma recompensa ou virtude, cedeu a um impulso

natural, ao temperamento, aos hábitos do ofício; acresce que a circunstância de estar, não mais adiante nem

mais atrás, mas justamente no ponto do desastre, parecia constituí-lo simples instrumento de Providência; e

de um ou de outro modo, o mérito do ato era positivamente nenhum. Fiquei desconsolado com esta reflexão,

chamei-me pródigo, lancei o cruzado à conta das minhas dissipações antigas; tive (por que não direi tudo?),

tive remorsos. Disponível em: http://www.ibiblio.org/ml/libri/a/AssisJMM_MemoriasPostumas/node24.html

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Literatura

Exercícios

1. “Com efeito, um dia de manhã, estando a passear na chácara, pendurou-me uma ideia no trapézio que

eu tinha no cérebro. Uma vez pendurada, entrou a bracejar, a pernear, a fazer as mais arrojadas

cabriolas de volatim, que é possível crer. Eu deixei-me estar a contemplá-la. Súbito, deu um grande

salto, estendeu os braços e as pernas, até tomar a forma de um X: decifra-me ou devoro-te.” (Memórias póstumas de Brás Cubas – Machado de Assis)

Sobre o texto mostrado, pode-se dizer que:

a) o autor faz uma abordagem superficial da situação.

b) o autor preocupa-se com os detalhes, por meio de minuciosa descrição.

c) o autor dá relevância a outras circunstâncias, negligenciando o foco do assunto.

d) o autor não mostra preocupação com o discernimento do leitor, pois apenas sugere situações.

e) contempla a si próprio, num ritual egocêntrico e narcisista.

2. No trecho abaixo, o narrador, ao descrever a personagem, critica sutilmente um outro estilo de época:

o romantismo.“Naquele tempo contava apenas uns quinze ou dezesseis anos; era talvez a mais

atrevida criatura da nossa raça, e, com certeza, a mais voluntariosa. Não digo que já lhe coubesse a

primazia da beleza, entre as mocinhas do tempo, porque isto não é romance, em que o autor sobredoura

a realidade e fecha os olhos às sardas e espinhas; mas também não digo que lhe maculasse o rosto

nenhuma sarda ou espinha, não. Era bonita, fresca, saía das mãos da natureza, cheia daquele feitiço,

precário e eterno, que o indivíduo passa a outro indivíduo, para os fins secretos da criação.” ASSIS, Machado de. Memórias Póstumas de Brás Cubas. Rio de Janeiro: Jackson,1957.

A frase do texto em que se percebe a crítica do narrador ao romantismo está transcrita na alternativa:

a) ... o autor sobredoura a realidade e fecha os olhos às sardas e espinhas ...

b) ... era talvez a mais atrevida criatura da nossa raça ...

c) Era bonita, fresca, saía das mãos da natureza, cheia daquele feitiço, precário e eterno, ...

d) Naquele tempo contava apenas uns quinze ou dezesseis anos ...

e) ... o indivíduo passa a outro indivíduo, para os fins secretos da criação.

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Literatura

3. Capítulo III Um criado trouxe o café. Rubião pegou na xícara e, enquanto lhe deitava açúcar, ia disfarçadamente mirando a bandeja, que era de prata lavrada. Prata, ouro, eram os metais que amava de coração; não gostava de bronze, mas o amigo Palha disse-lhe que era matéria de preço, e assim se explica este par de figuras que esta aqui na sala: um Mefistófeles e um Fausto. Tivesse, porém, de escolher, escolheria a bandeja – primor de argentaria, execução fina e acabada. O criado esperava teso e sério. Era espanhol; e não foi sem resistência que Rubião o aceitou das mãos de Cristiano; por mais que lhe dissesse que estava acostumado aos seus crioulos de Minas, e não queria línguas estrangeiras em casa, o amigo Palha insistiu, demonstrando-lhe a necessidade de ter criados brancos. Rubião cedeu com pena. O seu bom pajem, que ele queria pôr na sala, como um pedaço da província, nem pôde deixar na cozinha, onde reinava um francês, Jean; foi degradado a outros serviços.

ASSIS, M. Quincas Borba. In: Obra completa. V.1. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1993 (fragmento).

Quincas Borba situa-se entre as obras-primas do autor e da literatura brasileira. No fragmento

apresentado, a peculiaridade do texto que garante a universalizacão de sua abordagem reside

a) No conflito entre o passado pobre e o presente rico, que simboliza o triunfo da aparência sobre a essência.

b) No sentimento de nostalgia do passado devido à substituição da mão de obra escrava pela dos imigrantes.

c) Na referência a Fausto e Mefistófeles, que representam o desejo de eternização de Rubião.

d) Na admiração dos metais por parte de Rubião, que metaforicamente representam a durabilidade dos bens produzidos pelo trabalho.

e) Na resistência de Rubião aos criados estrageiros, que reproduz o sentimento de xenofobia.

4. "Enquanto uma chora, outra ri; é a lei do mundo, meu rico senhor; é a perfeição universal. Tudo chorando

seria monótono, tudo rindo cansativo, mas uma boa distribuição de lágrimas e polcas, soluços e

sarabandas, acaba por trazer à alma do mundo a variedade necessária, e faz-se o equilíbrio da vida." ASSIS, M. Quincas Borba. In: Obra completa. V.1. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1993 (fragmento).

Assinale a alternativa correta sobre Machado de Assis. a) Desde o início de sua carreira literária, seguiu de forma rigorosa os cânones da estética realista,

produzindo romances cuja base temática se apoia no determinismo cientificista.

b) Privilegiou a sondagem dos misteriosos motivos psicológicos que atuam sobre o comportamento humano, atitude que o particularizou no contexto do Realismo ortodoxo do século XIX.

c) Retratou, de acordo com princípios do Naturalismo, a degradação da sociedade burguesa de sua época, criando personagens marcados por fortes traços patológicos.

d) Embora tenha adotado o estilo realista, defendeu a tese de que a única salvação para o homem estaria na religião.

e) Sua obra é marcada por forte influência romântica, derivando daí a acentuada idealização do espírito humano tematizada em seus textos.

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Literatura

5. “Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos. Meu pai logo que teve

aragem dos quinze contos sobressaltou-se deveras; achou que o caso excedia as raias de um capricho

juvenil. — Dessa vez, disse ele, vais para Europa, vais cursar uma Universidade, provavelmente Coimbra,

quero-te homem sério e não arruador e não gatuno. E como eu fizesse um gesto de espanto: — Gatuno, sim senhor, não é outra coisa um filho que me faz isso.”

Machado de Assis – Memórias póstumas de Brás Cubas

De acordo com essa passagem da obra, pode-se antecipar a visão que Machado de Assis tinha sobre

as pessoas e sobre a sociedade. A esse respeito, assinale a alternativa correta.

a) O amor é fruto de interesse e compõe o pilar das instituições hipócritas.

b) O amor, se sincero, supera todas as barreiras, inclusive as financeiras.

c) O caráter autoritarista moldava as relações familiares, principalmente entre pai e filho.

d) Havia medo de que a marginalidade envolvesse os jovens daquela época.

e) O amor era glorificado e apontado como o único caminho para redimir as pessoas.

6. Capítulo 73 – O Luncheon

O despropósito fez-me perder outro capítulo. Que melhor não era dizer as coisas lisamente, sem todos

estes solavancos! Já comparei o meu estilo ao andar dos ébrios. Se a ideia vos parece indecorosa, direi

que ele é o que eram as minhas refeições com Virgília, na casinha da Gamboa, onde às vezes fazíamos

a nossa patuscada, o nosso luncheon. Vinho, frutas, compotas. Comíamos, é verdade, mas era um

comer virgulado de palavrinhas doces, de olhares ternos, de criancices, uma infinidade desses apartes

do coração, aliás o verdadeiro, o ininterrupto discurso do amor. Às vezes vinha o arrufo temperar o

nímio adocicado da situação. Ela deixava-me, refugiava-se num canto do canapé, ou ia para o interior

ouvir as denguices de Dona Plácida. Cinco ou dez minutos depois, reatávamos a palestra, como eu

reato a narração, para desatá-la outra vez. Note-se que, longe de termos horror ao método, era nosso

costume convidá-lo, na pessoa de Dona Plácida, a sentar-se conosco à mesa; mas Dona Plácida não

aceitava nunca.

(*) Luncheon (Ing.): lanche, refeição ligeira, merenda.

Machado de Assis, Memórias póstumas de Brás Cubas.

No trecho “se a ideia vos parece indecorosa”, revela-se:

a) o grau de desfaçatez e até de imprudência que o narrador imprime a sua relação com o leitor.

b) que o narrador substitui uma comparação inapropriada e até chula, por uma comparação propriamente decorosa.

c) que o narrador censura o pundonor exagerado e deslocado da personagem Dona Plácida.

d) o peso da censura que, na sociedade patriarcal do século XIX, recaía sobre a prática do adultério.

e) que o narrador reforma seu estilo por respeito à leitora elegante, pertencente às classes superiores, cujos interesses Machado de Assis defendia.

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Literatura

7. “O meu fim evidente era atar as duas pontas da vida, e restaurar na velhice e adolescência. Pois, senhor,

não consegui recompor o que foi nem o que fui.” O excerto acima faz parte da obra Dom Casmurro, de

Machado de Assis. A propósito da narrativa, é correto afirmar:

a) A narrativa de Bento Santiago é comparável a uma acusação: aproveitando sua formação jurídica, o narrador pretende configurar a culpa de Capitu.

b) O artifício narrativo usado é a forma de diário, de modo que o leitor receba as informações do narrador à medida que elas acontecem, mantendo-se assim a tensão.

c) Elegendo a temática do adultério, o autor resgata o romantismo de seus primeiros romances, com personagens idealizadas entregues à paixão amorosa.

d) O espaço geográfico e social representado é situado em uma província do Império, buscando demonstrar que as mazelas sociais não são prerrogativa da Corte.

e) Bentinho desejava a morte de Escobar (até tentou envenená-lo uma vez), a ponto de se sentir culpado quando o ex amigo morreu afogado.

8. "Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis [...]".Neste trecho, de Memórias

póstumas de Brás Cubas, Machado de Assis:

a) surpreende o leitor com um vocabulário exótico e comparações inesperadas.

b) dá seu depoimento autobiográfico e impressionista, através de um estilo rebuscado e colorido.

c) explora com muita felicidade a "psicologia feminina", razão pela qual foi aceito com entusiasmo pelo público ansioso de uma literatura romântica.

d) focaliza o emergente proletariado fluminense e os interesses ocultos por trás de suas ações aparentemente triviais.

e) dá um exemplo da ironia e do humor característicos de sua obra, frutos de um profundo pessimismo.

9. Texto I

(...) estás sempre aí, bruxo alusivo e zombeteiro, que revolves em mim tantos enigmas.

Carlos Drummond de Andrade (em poema dedicado a Machado de Assis) Texto II Cada criatura humana traz duas almas consigo: uma que olha de dentro para fora, outra que olha de

fora para dentro (...). Há casos, por exemplo, em que um simples botão de camisa é a alma exterior de

uma pessoa; — e assim também a polca, o voltarete, um livro, uma máquina, um par de botas (...). Há

cavalheiros, por exemplo, cuja alma exterior, nos primeiros anos, foi um chocalho ou um cavalinho de

pau, e mais tarde uma provedoria de irmandade, suponhamos. Machado de Assis

“Há cavalheiros, por exemplo, cuja alma exterior, nos primeiros anos, foi um chocalho ou um cavalinho

de pau, e mais tarde uma provedoria de irmandade, suponhamos.” Assinale a afirmação correta sobre

os exemplos apresentados no texto.

a) Correspondem a estratégia argumentativa para persuadir o interlocutor de que há uma alma exterior.

b) Funcionam como digressões, isto é, desvios com relação ao tema de teor espiritualista presente na afirmação inicial.

c) Usados ironicamente, invalidam a tese, já que provam a tendência materialista e consumista, inata no homem.

d) Contrariam a tese, na medida em que indicam coisas concretas, o que provoca efeito humorístico.

e) Embora indiquem coisas concretas, confirmam o desapego humano à materialidade do mundo.

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Literatura

10. Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em

primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo

nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou

propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda

é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo. Moisés, que também contou a sua morte, não

a pôs no introito, mas no cabo: diferença radical entre este livro e o Pentateuco.

Dito isto, expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns sessenta e quatro anos, rijos e prósperos, era solteiro, possuía cerca de trezentos contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos.

Machado de Assis, Memórias póstumas de Brás Cubas.

A leitura do excerto permite inferir vários traços de caráter do narrador-personagem. Entre os traços

relacionados abaixo, o único que NÃO é abonado ou confirmado pelo texto é o que está em

a) Exibicionismo

b) Populismo

c) Presunção

d) Irreverência

e) Vaidade

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Literatura

Gabarito

1. C

Aqui nota-se que a resposta correta é a alternativa C, porque o narrador divaga, conversa, faz rodeios,

antes de contar qual é o real objetivo da história.

2. A

A crítica contida no fragmento é em relação à idealização exagerada dos românticos que enfeitavam

demais a realidade e apagavam os defeitos.

3. A

Para atender às exigências que o novo status social impõe, Rubião precisa mudar traços de sua origem

mineira e pobre, segudo a obra. Dessa forma, a alternativa correta é a letra A, pois revela o conflito entre

o passado pobre e o presente rico.

4. B

Machado escreveu sobre as pessoas e suas personalidades sem caráter maniqueísta, explorado o

comportamento humano e suas plurais nuances.

5. A

Uma das características das obras de Machado é a crítica às instituições sociais. Aqui, o romance é

criticado, quando Marcela ama na realidade o dinheiro e não Brás Cubas.

6. A

O modo irônico e descarado como o narrador se dirige ao interlocutor (leitor) é uma característica da obra

Memórias Póstumas de Bras Cubas, uma vez que Brás utiliza de tal irrevêrencia para abordar suas

análises.

7. A

Bentinho passa a narrativa inteira moldando seu discurso e contando os fatos a partir de perspectiva

única, para acusar Capitu de traição, justificando, às custas dela, seu fim solitário e amargurado.

8. E

Neste fragmento da obra de Machado de Assis, é possível perceber a ironia do autor ao retratar um

relacionamento motivado pelo interesse financeiro, revelando um pessimismo sobre o caráter do ser

humano.

9. A

Os três textos tratam do mesmo tema, apresentando defesas de que há elementos representativos de

almas externas, comprovando sua existência. Além disso, a apresentação de exemplos daquilo que se

afirma é uma característica de Machado de Assis.

10. B

Ao dizer que foi acompanhado ao cemitério por apenas onze amigos, o narrador (defunto) mostra que

não era popular, embora tivesse poder aquisitivo e prestígio familiar.