Resumo do Capítulo V, do livro de José Murilo de Carvalho: Os Bestializados – O Rio de Janeiro e...
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Resumo do Capítulo V, do livro de José Murilo de Carvalho: Os Bestializados – O Rio de
Janeiro e a República que não foi.
Pedro da Silva Pereira – 5º período (História noturno)
No último capítulo do livro de José Murilo de Carvalho, que tem o título de “Bestializados
ou Bilontras?”, onde ele já faz um questionamento em que viria a discorrer argumentos a favor da
astúcia popular. Logo no início deste capítulo, o autor já contrapropõe a visão dos reformistas
políticos em relação à atuação do povo na República. Para a maioria das lideranças políticas,
cidadão é aquele que é consciente dos seus direitos e deveres, que sai às ruas organizadamente
reivindicando suas demandas. Acontece que esse cidadão não existia exatamente como esperavam
os reformistas. Havia, no entanto, cidadãos que não tinham sua cidadania plena por conta de
discriminação por sua posição social, escolaridade e etnia, mas, para o aborrecimento de muitos os
cidadãos abastados faziam muita agitação, organizavam festas e tudo mais, pelo simples desejo de
se encontrarem e se divertirem onde havia também o espírito associativo que eram focadas nas
sociedades de auxílio mútuo e de natureza religiosa.
José Murilo nos diz que: “Segundo levantamento encomendado pela prefeitura havia na
cidade, em janeiro de 1912, 438 associações de auxílio mútuo, cobrindo uma população de 282.937
associados. Isto representava, aproximadamente, 50% da população de mais de 21anos, um
número impressionante.”. E com a presença constante de lideres políticos e de organizações
operárias nessas associações, acabou mudando o caráter de assistência e cooperação para órgãos de
luta e de resistência. Essa relativa organização da classe trabalhadora contribuiu para estabelecer
estratégias de luta que não se encaixavam nos meios legais da República. Muitos trabalhadores de
diversas áreas inclusive os funcionários públicos, passaram a reivindicar por melhorias nos serviços
públicos. Ou mesmo até repudiar algum ato arbitrário do governo. O que aconteceu com a maior
manifestação pública em repúdio a uma medida do governo, a Revolta da Vacina. Mesmo que
desorganizada, fragmentada, o povo pôs valer o seu direito e barrou a ação do Estado. Mas, como o
autor diz, “de modo geral, não eram colocadas demandas, mas estabelecidos limites. Não se negava
o Estado, não reivindicava participação nas decisões do governo; defendiam-se valores e direitos
considerados acima da esfera de intervenção do Estado ou protestava-se contra o que era visto como
distorção ou abuso.”.
José Murilo de Carvalho chama a atenção para o aspecto de que esse movimento popular
não era uma exigência de redução da ação do Estado. Pois não é de interesse dos trabalhadores que
o Estado reduza, pois para eles o Estado é essencial, é útil. “É uma visão antes de súdito que de
cidadão, de quem se coloca como objeto da ação do Estado e não de quem se julga no direito de
influenciar.”: assim finaliza o autor.
O autor procura explicar esse comportamento da população do Rio. Citando Max Weber,
sobre a cidade ocidental, em que define o que foi a cidade antiga e a cidade medieval, sendo a
primeira formada por cidadãos orientados pelo Estado para fins políticos e militares e a última
formada por produtores individuais que formam grupos, e por isso nasce uma nova maneira de fazer
política. Intelectuais brasileiros diziam que no Brasil a predominância da família, do grupo de
trabalho e do Estado, eram fatores que prejudicavam o desenvolvimento do país. Mas por outro
lado, o individualismo levava ao espírito associativo, à participação política. Mas também existia
intelectuais que combatiam essas ideias, como Annibal Falcão, que dizia que os povos brasileiros
por ser coletivista, família, eram mais sociáveis, preservavam a moral e os bons costumes. Enquanto
os povos de tradição protestante eram individualistas, egoístas, voltados para aspectos materiais,
para a ciência e para a competição.
Dentro de toda essa composição social, dos mais variados ideais, formava-se a população
carioca. O que, segundo o autor, toda essa composição serviu para minar velhas barreiras e derrotar
novas. Diante disso, não era de se estranhar a apatia e o cinismo do povo em relação aos
governantes. Havia muita corrupção ou o tribofe, como se chamava na época. Não se obedecia
nada, nem as leis dos homens e muito menos a de Deus. Em que, quem estava ficando mais esperto,
velhaco e gozador era a população. Porém, quando o Estado tentava colocar os pés sob o pescoço
do povo, já não se via aquele povo gozador, cínico e sim uma população furiosa, lutando para que
os deixassem em paz. Seguindo essa análise, o autor identifica como bestializado quem levava a
política a sério, que se sujeitasse as manipulações do poder. E quem ficava só do lado de fora,
assistindo, gozando de sua marginalização, enquanto a corrupção corre solta por entre as
instituições públicas, é que estava longe de ser bestializado. No mais era bilontra.
O autor conclui que as prerrogativas de um governo republicano de participação popular, da
garantia da liberdade e da igualdade eram completamente ignoradas no Brasil. Pois o regime, logo
após a euforia da novidade, se mostrou ser bastante excludente, elitista, liberal não democrático e
oligárquico. E pelo fato da população das cidades, de onde deveria vir a reação democraticamente
cívica, ainda estava sob o peso das tradições escravistas e colonial, por isso, empacava o
desenvolvimento da consciência de liberdade e igualdade. A relação da República com a cidade
somente as distanciou e assim impedia a cidadania. Porém, a República queria que o Rio de Janeiro,
principal cidade da época, servisse de vitrine e símbolo, perante a Europa, de progresso e de
democracia liberal efetivada com sucesso, isso tudo ao mesmo tempo em que cerceava as
manifestações políticas da população e dificultava a autogestão dela. Assim para a maioria dos
cidadãos a participação no poder estava fora do alcance, o povo era como espectador, no máximo,
figurante, acentua o autor. Paralelo a tudo isso, a cidade conseguia encontrar meios não
“republicanos” de participação social. O povo se aglomerava em associações e em entidades que
não se encaixavam nas estruturas do poder liberal. Foram nelas em que o povo deu cara ao Rio de
Janeiro e se auto reconheceram como cidadãos. No entanto, para José Murilo de Carvalho a Cidade,
a República e a Cidadania continuam dissociadas, quando muito perversamente entrelaçadas. E
partindo dessa análise o autor pergunta se já é tempo de o caminho para a cidadania não ser outro.
Se já é o momento de se redefinir a República, transforma-la para que a participação efetivamente
popular seja garantida, para que assim nasça um novo cidadão que seja mais próximo dos interesses
em comum e das cidades.