RESUMO - POVOS SEM ESCRITA, MESOPOTÂMIA, EGITO, HEBREUS, ÍNDIA, CHINA, GRÉCIA ANTIGA e ROMA

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HISTÓRIA DO DIREITO NAS SOCIEDADES SEM ESCRITA Embora algumas vezes as pessoas confundissem Direito e Leis escritas se partiram do pressuposto de que um conjunto de regras ou normas que regulamentam uma sociedade pode ser chamado de direito, todas as comunidades humanas que existem ou existiram no mundo – indiferentemente de quaisquer características que tenham – produzem ou produziram seu “Direito”. Porém, só se pode estudar a História do Direito a partir do advento da escrita (que varia no tempo e de povo para povo), antes disso chama-se Pré-história. Já nessa Pré-história há instituições que dependem muito de conceitos jurídicos, como o casamento, poder paternal ou maternal, propriedade, contratos, etc. Povos sem escrita ou ágrafos ( a= negação + grafos= escrita) não tem um tempo determinado. Podem ser homens da caverna de 3.000 a.C. ou índios brasileiros até a chegada de Cabral, ou até mesmo tribos da floresta Amazônica que ainda hoje não entraram em contato com o homem branco. Diante dessa multiplicidade de povos e tempos será comentada alguma característica geral desses grupos: 1. São abstratos: como são direitos não escritos, a possibilidade de abstração fica limitada. As regras devem ser decoradas e passadas de pessoa para pessoa de forma mais clara possível. 2. São números: cada comunidade tem seu próprio costume e vive isolada no espaço e, muitas vezes, no tempo. Os raros contatos entre grupos vizinhos têm como objetivo a guerra. 3. São relativamente diversificados: esta distância (no tempo e no espaço) faz com que cada comunidade produza mais dessemelhanças do que semelhanças em seus direitos. 4. São impregnados de religiosidade: como a maior parte dos fenômenos são explicados, por estes povos, através da religião, a regra jurídica não foge a este contexto. Na maior parte das vezes a distinção entre regra religiosa e regra jurídica torna-se impossível. 5. São direitos em nascimento: a diferença entre o que é jurídico e o que não é muito difícil. Esta distinção só se torna possível quando o direito passa do comportamento inconsciente (derivado de puro reflexo) ao comportamento consciente, fruto de reflexão.

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HISTÓRIA DO DIREITO NAS SOCIEDADES SEM ESCRITA

Embora algumas vezes as pessoas confundissem Direito e Leis escritas se partiram do pressuposto de que um conjunto de regras ou normas que regulamentam uma sociedade pode ser chamado de direito, todas as comunidades humanas que existem ou existiram no mundo – indiferentemente de quaisquer características que tenham – produzem ou produziram seu “Direito”.

Porém, só se pode estudar a História do Direito a partir do advento da escrita (que varia no tempo e de povo para povo), antes disso chama-se Pré-história. Já nessa Pré-história há instituições que dependem muito de conceitos jurídicos, como o casamento, poder paternal ou maternal, propriedade, contratos, etc.

Povos sem escrita ou ágrafos ( a= negação + grafos= escrita) não tem um tempo determinado. Podem ser homens da caverna de 3.000 a.C. ou índios brasileiros até a chegada de Cabral, ou até mesmo tribos da floresta Amazônica que ainda hoje não entraram em contato com o homem branco.

Diante dessa multiplicidade de povos e tempos será comentada alguma característica geral desses grupos:

1. São abstratos: como são direitos não escritos, a possibilidade de abstração fica limitada. As regras devem ser decoradas e passadas de pessoa para pessoa de forma mais clara possível.

2. São números: cada comunidade tem seu próprio costume e vive isolada no espaço e, muitas vezes, no tempo. Os raros contatos entre grupos vizinhos têm como objetivo a guerra.

3. São relativamente diversificados: esta distância (no tempo e no espaço) faz com que cada comunidade produza mais dessemelhanças do que semelhanças em seus direitos.

4. São impregnados de religiosidade: como a maior parte dos fenômenos são explicados, por estes povos, através da religião, a regra jurídica não foge a este contexto. Na maior parte das vezes a distinção entre regra religiosa e regra jurídica torna-se impossível.

5. São direitos em nascimento: a diferença entre o que é jurídico e o que não é muito difícil. Esta distinção só se torna possível quando o direito passa do comportamento inconsciente (derivado de puro reflexo) ao comportamento consciente, fruto de reflexão.

Fontes dos Direitos dos Povos Ágrafos - Utilizam basicamente os costumes como fonte de suas normas, ou seja, o que é tradicional no viver e conviver de sua comunidade torna-se a regra a ser seguida .Entretanto, o costume não é a única fonte do direito destes povos. Nos grupos sociais onde se pode distinguir pessoas que detêm algum tipo de poder estes impor regras de comportamento, dando ordens que acabam tendo caráter geral e permanente. O precedente também é utilizado como fonte. As pessoas que julgam (chefes ou anciãos) tendem a, voluntariamente ou involuntariamente aplicarem soluções já utilizadas anteriormente.

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As regras são transmitidas a todos pelo chefe, em intervalos regulares de tempo. Outras formas são os Provérbios e Adágios que desempenham papel decisivo na tarefa de fazer conhecer as normas da comunidade.

HISTÓRIA DO DIREITO NAS SOCIEDADES NAS SOCIEDADES ORIENTAIS - ORIENTE PROXIMO

MESOPOTÂMIA

Foi na Mesopotâmia (= entre rios – Eufrates e Tigre) que o homem inventou o Estado, o Governo, a cerveja...... e a escrita. O tipo de escrita que inventaram foi a cuneiforme (sistema de escrita, o mais antigo conhecido, deriva do latimcuneus cunha + forma forma, foi inventado pelos sumerianos seguramente desde o 4º milênio. O termo cuneiforme caracteriza o aspecto anguloso dos símbolos, impressas em argila úmida ou, raramente, em pedra).

Foram os primeiros a terem leis escritas. Tem-se notícia que no terceiro milênio antes de Cristo o chefe da cidade adotava medidas sociais para coibir abusos e corrigir injustiças.

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O corpo de lei mais antigo que se conhece é o Ur-Nammu (fundador da 3ª dinastia de Ur, 2111-2094 a.C.). Na mesma região em 1948 foram identificadas outras leis chamadas de Eshunna.

No final de 1.901 e início de 1902 d.C. que foi encontrado o Código de Hammurabium conjunto de lei posto de maneira organizada contendo 282 artigos, o qual foi feita a mando do Rei Hammurabi, que reinou na Babilônia entre 1.792 e 1.750 a.C.

Porém, foram as leis escritas de Ur-Nammu (rei sumeriano) e Eshunna que provocaram forte influência no Código de Hammurabi. A lei e a justiça eram conceitos fundamentais da Antiga Suméria.

O direito privado sumeriano reconhecia:

1. Alguma independência em relação ao marido;2. O divórcio era reconhecido através de decisão judicial e poderia favorecer a

qualquer dos cônjuges;3. O repúdio da mulher acarretava uma indenização pecuniária e somente era

permitido pelos motivos indicados pela lei.4. O adultério era um delito, porém sem conseqüências se havia o perdão do

marido;5. O filho que renegasse o pai poderia ter a mão cortada ou ser vendido como

escravo;6. A esposa era responsável pelas dívidas do marido.

As leis penais dos sumerianos muitas vezes substituíam o Princípio da Pena de Talião por multas ou por indenizações legais.

O Código de Hammurabi foi feito utilizando de toda a legislação precedente. Hammurabi não apenas ordenou a feitura do Código. Para uma melhor utilização da Direito como ferramenta de controle ele também reorganizou a Justiça (em moldes muito próximos aos que hoje utilizamos).

Anteriormente, o Poder Judiciário era exercido pelos sacerdotes em nome dos deuses. Hammurabi conferiu à justiça real supremacia sobre a justiça sacerdotal, deu-lhe uniformidade de organização e regulamentou cuidadosamente o processamento das ações, compreendendo nessa regulamentação a propositura, o recebimento ou não pelo juiz, a instrução completada pelo depoimento de testemunhas e diligências in loco, e finalmente, a sentença. Foi estabelecida então uma organização judiciária que incluía até o Ministério Público e um direito processual. A sociedade da Babilônia da época de Hammurabi é dividida em três camadas sociais, conforme indica o próprio código:

1. Os “awilum”: o homem livre, com todos os direitos de cidadão. É o maior grupo e abrangia tanto ricos como pobres, desde que fossem livres.

1. Os “muskênum”: era uma camada intermediária entre os awilum e os escravos, formada por funcionários públicos, com direitos e deveres específicos.

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1. Os escravos: eram a minoria da população, geralmente prisioneiros de guerras (wardum escravos, e amtum escravas.

Escravo é propriedade, bem alienável, ou seja, algo que pode ser vendido, comprado, alugada, dado, eliminado ... Escravo é, portanto, coisa.

A escravidão originava-se de guerras – quando o derrotado era pego pelos vencedores, de dívidas – quando o indivíduo penhorava o próprio corpo ou de alguém da família como garantia no pagamento da dívida, do nascimento.

Alguns pontos do Código de Hammurabi:

Pena de Talião - O Princípio da Pena ou Lei de Talião é um dos mais utilizados por todos os povos antigos. É apontado como sendo a primeira forma que a sociedade encontrou para estabelecer as penas para seus delitos. Este princípio utiliza-se da frase “olho por olho, dente por dente”, não é uma lei, mas uma idéia que indica que a pena para o delito é equivalente ao dano causado. Utiliza-se deste princípio no tocante a danos físicos, chegando a aplicá-lo radicalmente mesmo quando, para conseguir a equivalência, penaliza outras pessoas que não o culpado. O Princípio da Pena de Talião não contava quando os danos físicos eram aplicados a escravos à medida que estes podem ser definidos como bens alienáveis, o dano contra um bem deve ter ressarcimento material.

Falso Testemunho - O Falso Testemunho era tratado com severidade, uma vez que contavam na maior parte dos processos somente com testemunhas. O Código faz uma distinção do falso realizado num processo que envolve a pena de morte de outro que envolve apenas pagamento, pois neste ele carregará a pena do processo, e naquele será morto.

Roubo e Receptação - O Código Hammurabiano penaliza tanto o que roubou ou furtou quanto aquele que recebeu a mercadoria roubada.

Estupro -O estupro sem pena alguma para a vítima era previsto somente para as “virgens casadas”, ou seja, mulheres que embora tenham o contrato de casamento firmado, ainda não coabitavam com seus maridos.

Família - O sistema familiar era o patriarcal, e o casamento monogâmico, embora fosse admitido o concubinato.Esta aparente discrepância era resolvida pelo fato de uma concubina jamais ter o status ou os mesmos direitos de esposa. O casamento legítimo era somente válido se houvesse contrato.Havia a possibilidade de casamentos entre as camadas sociais e o Código regulamentava o direito de herança nos filhos nascidos deste tipo de casamento.No casamento o regime era o de comunhão de bens.

Escravos - A escravidão por dívida era limitada no tempo pelo prazo de 3 anos, após era concedida sua libertação. Se uma escrava, tomada como concubina pelo senhor, se desse a este filhos que ele reconhece, essa escrava não mais poderia ser vendida.

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Divórcio -O marido podia repudiar a mulher nos casos de recusa ou negligência em “seus deveres de esposa e dona-de-casa”. Qualquer dos dois cônjuges podia repudiar o outro por má conduta, mas neste caso a mulher para repudiar o homem deveria ter uma conduta ilibada.

Adultério - Somente a mulher cometia o crime de adultério, o homem era, no máximo, cúmplice. Quando pegos, os adúlteros pagavam com a vida, entretanto o Código prevê o perdão do marido.

Adoção - Se a criança fosse adotada logo após seu nascimento, não poderia mais ser reclamada. Se a criança tivesse mais idade e pedisse por seus pais, deveria ser devolvida. Se fosse para aprender um ofício e o ensinamento estivesse sendo feito, não poderia ser reclamada, porém, caso contrário poderia retornar a casa de seu pai. Em outros casos se o adotado renegasse sua adoção, seria severamente punido. Se o casal, após adotar, tivesse filhos e desejasse romper o contrato de adoção, o adotado teria direito a uma parte do patrimônio deles a título de indenização.

Herança - Não havia a primogenitura, entretanto o filho mais velho poderia na hora da partilha ser o primeiro a escolher. A tendência era sempre dividir em partes iguais. Estavam excluídas da herança as filhas já casadas, pois já haviam recebido o dote. As filhas solteiras, quando cassassem, receberiam seu dote das mãos dos irmãos. Os filhos poderiam ser deserdados, mas para isto deveria haver um exame por parte dos juízes, se o filho não cometeu falta suficientemente grave para excluí-lo da herança, o pai não poderá deserdar o filho.

Processo - Havia uma mistura do sagrado com o profano no julgamento, embora a justiça leiga teve mais importância que a sacerdotal. O juiz leigo não poderia alterar seu julgamento após o encerramento do processo.

Trabalho - Aborda leis sobre o trabalho, prevê e pune o erro médico. Prevê a remuneração de inúmeros profissionais, tais como, médico, lavrador, pastor, alfaiate...etc.

Defesa do Consumidor - Haviam leis que protegiam os cidadãos do mau prestador de serviços, pelo menos em alguns casos.

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EGITO

No Egito, a civilização se formou às margens do rio Nilo, por volta de 5.000-4.000 anos a.C. Os historiadores datam o início da primeira dinastia egípcia em 2.920 a.C., que foi o ano em que aconteceu a unificação do Egito em um reino só; isso porque antes havia dois reinos, um com a capital em Mênfis e o outro em Tebas. Com a unificação, passa a existir um reino só, governado a partir de Mênfis. 

De junho a setembro, as chuvas provocavam enchentes, que inundavam uma grande extensão do vale do Nilo. Quando as águas voltavam ao seu nível normal, elas deixavam uma área de terra fértil, devido ao depósito de humus (matéria orgânica) que o rio trazia, onde os egípcios plantavam cereais e outros alimentos, e criavam seus animais. O Nilo era tão importante para aquela comunidade que ele era considerado um deus.

As cheias do Nilo eram estáveis e regulares, o que fazia com que os egípcios acreditassem na existência de um poder divino que controlava a natureza impondo ordem ao caos e garantindo a existência daquela população, que dependia do Nilo. O Egito era o Nilo. E quem simbolizava esse triunfo de uma ordem inabalável sobre o caos era o faraó, o líder supremo que, além de rei, era deus. 

Nenhum historiador sabe afirmar com certeza, mas acredita-se que foi um sacerdote que, com sua sabedoria, conseguiu se impor sobre aquela comunidade neolítica e, a partir de um uso inteligente dos recursos simbólicos, conseguiu garantir a manutenção do seu poder (e de sua família) sobre toda a sociedade. 

O faraó era um soberano centralizador, que governava sobre toda a civilização egípcia, controlando a economia, a administração, a religião e ditando as normas de conduta, o direito. Esse direito, embora continuasse fortemente ligado aos costumes e à religião, já era um direito escrito, porém, não codificado (ou seja, as leis escritas no Egito Antigo não se encontravam reunidas em um corpo legislativo único). Se existiram códigos legislativos egípcios, eles ainda não foram encontrados. 

Lei escrita é indício de uma complexidade maior do direito. A necessidade do registro escrito surge em decorrência das dificuldades em administrar um estado que cresce cada vez mais, com funcionários espalhados por todo o vale do Nilo, devendo obediência direta ao faraó. A complexidade dessa dministração superou o poder da memória em registrar dados, instruções, informações, costumes, etc. 

A sociedade egípcia também era muito complexa: havia o faraó, que era rei e deus ao mesmo tempo, vivia no seu palácio e era dono de todas as terras do Egito – embora ainda não existisse a noção que temos hoje de propriedade privada, ele era dono porque as terras pertenciam ao estado, e o estado era ele – , havia sacerdotes, que não eram deuses, mas eram responsáveis pela organização dos rituais sagrados, inclusive do culto ao próprio faraó, que era um deus; havia muitos camponeses, que cultivavam a terra e pagavam impostos ao faraó, que se via no direito de cobrá-los (o sacerdote supremo - faraó - e, ao

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mesmo tempo, líder supremo, se diferenciou tanto naquela sociedade, que ele se tornou deus e passou a ter o direito de cobrar de seus súditos impostos para a manutenção do estado); havia  ainda artesãos, marceneiros, sapateiros, pedreiros, ferreiros, pintores, escultores, perfumistas, ourives, soldados, etc.; havia também escravos, que eram povos que lutavam contra os egípcios e eram derrotados e escravizados; e não podemos nos esquecer dos funcionários da administração: o Egito não era uma simples aldeia: era um estado centralizado em Mênfis (que hoje é a cidade do Cairo), com funcionários espalhados por todo o vale do Nilo, administrando esse estado para o faraó, inclusive a justiça: o faraó ditava as leis e os oficiais de justiça deviam garantir que essas leis fossem cumpridas.

HEBREUS

A característica que marca toda a história desse povo é que eram monoteístas (mono = um, théos + deus). Portanto, para os hebreus a lei foi inspirada por Deus e ir contra ela seria o equivalente de ir contra o próprio Deus. Então, o leigo e o divino interagem de tal forma que pecado e crime se confundem, o direito é imutável, somente Deus pode modificá-lo. Os rabinos (chefes religiosos) podem até interpretá-lo para adapta-lo à evolução social, entretanto nunca podem modificá-lo.

A base moral da Legislação Mosaica pode ser encontrada nos Dez Mandamentos (escritos por Deus).

A Torá, também chamada de Pentateuco, é formada pelos cinco primeiros livros da Bíblia: o Gênesis, o Exôdo, o Levítico, o Números e o Deuteronômio. Em toda a

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Torá encontra-se leis, entretanto, é no livro de Deuteronômio a maior reunião de leis.

A tradição indica Moisés como autor do Pentateuco, portanto autor do Deuteronômio, das chamadas Leis Mosaicas.

Algumas Leis do Deuteronômio

Justiça - A legislação hebraica é bastante rigorosa na questão da justiça prevendo, inclusive, a obrigatoriedade da imparcialidade no julgamento. Para a operacionalização da justiça fica estabelecido que cada cidade terá, obrigatoriamente, que contar com juízes e que estes não poderão corromper-se.

Processo - A questão de não cometer injustiças é um ponto que difere os hebreus dos outros povos, já que praticamente não se admite julgamento sem investigação ou julgamento por forças naturais ou deuses.

Pena de Talião - É a Bíblia que primeiro descreve o Princípio da Pena de Talião. Entretanto, embora esse princípio fosse usado entre os hebreus, o era de maneira mais amena que entre os outros povos porque outros princípios limitavam sua aplicação.

Individualidade das Penas - Este princípio que individualiza as penas minimiza a ação do Princípio da Pena de Talião.

Lapidação - Lapidação é a nome que se dá a pena mais comum do Antigo Testamento. É a morte por apedrejamento. Para os israelitas morreria dessa forma os idólatras, feiticeiros, filhos rebeldes e as adúlteras.

Cidades de Refúgio - A preocupação com a justiça chega ao ponto de prever e obrigar o estabelecimento de cidades de refúgio (ou asilo), onde pessoas com problemas poderiam se refugiar para que fosse feita a justiça com calma e não no calor de fortes emoções.

Homicídio Involuntário e Homicídio - O Princípio da Pena de Talião era usado como base na penalização deste delito. Entretanto, os hebreus não permitem a punição daqueles que cometeram homicídio “sem querer”. Não se deve utilizar o termo culposo para um povo que não concebia negligência, imprudência ou imperícia como causas de homicídios ou danos.

Testemunhas -A prova testemunhal era primordial na Antiguidade e os hebreus têm um preceito legal que até hoje pode ser visto. Onde uma única testemunha não era suficiente, deveria haver duas ou três testemunhas.

As penas para o falso testemunho eram pesadas, sendo aquela equivalente à pena que o acusado teria se fosse condenado (Princípio da Pena de Talião).

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Matrimônio - Este não era de direito religioso ou civil, mas era um assunto puramente particular entre duas famílias.

Adultério - Embora o peso maior do adultério esteja sobre a mulher casada, aqui também há um certo peso do crime também para o homem.

Divórcio - Todos os povos da Antiguidade prevêem o divórcio. Este só começou a ser proibido a partir do cristianismo. Na Legislação Mosaica, somente os homens podem divorciar-se, às mulheres não cabiam a iniciativa, mesmo assim deveria haver algo vergonhoso na esposa para o marido pudesse repudiá-la.

Concubinato - É considerado algo normal, apenas no Livro de Levítico que ordenava que as concubinas não fossem irmãs.

Estupro -O estupro sem pena para a vítima é previsto somente no caso específico de a mulher ter sido violentada em um lugar onde poderia ter gritado sem que ninguém a ouvisse.

Herança e Primogenitura - O primogênito era beneficiado em detrimento dos outros filhos homens (já que as mulheres tinham direito apenas ao dote).

Defloração - Aplica-se a mulher virgem não comprometida. O homem que for pego em flagrante deverá indenizar o pai da jovem e ela ficará sendo sua esposa e não poderá devolve-la durante toda a vida.

Escravos - Aquele que se tornará escravo em razão de pagamento de dívida ficará em liberdade no sétimo ano, e deveria receber algo a deixar a casa do senhor, não é considerado como forma de pagamento.

Caridade - Entre os hebreus a caridade era prevista em lei, uma vez que se pauta na questão religiosa.

Governo - Quem institui o Governo é Deus, portanto, o rei não pode se sentir muito acima dos demais mortais. Quem os escolhiam eram os profetas a mando, segundo a crença israelita, de Deus.

Fraude Comercial e Juros - A Legislação Hebraica proíbe a utilização de pesos e medidas diversos, bem como o empréstimo a juro entre os israelitas, poderia cobrar juro do estrangeiro.

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HISTÓRIA DO DIREITO NAS SOCIEDADES ORIENTAIS - EXTREMO ORIENTE

INDIA

Sabemos que a mais antiga civilização da Índia - testemunhada pelas ruínas de Mohenjo-Daro e Harapa - transformou-se, por volta de 1600 a.C., com a invasão de povos provenientes do sudoeste da Ásia.

Estes povos, os árias, indo-europeus, vindos talvez das regiões do Cáucaso, estabeleceram-se às margens do rio Ganges, ampliando, nos séculos sucessivos, sua área de influência até a região da atual Nova Délhi, e impondo-se às primitivas populações com a introdução de técnicas agrícolas, artesanais e militares muito desenvolvidas. Já no século III a.C., sob o rei Asoka, a Índia formava um grande reino unificado.

* Sociedade. A sociedade da Índia, que se fora aos poucos estruturando, dividia-se em rígidas camadas sociais, as castas, consideradas de instituição divina. As pessoas pertenciam a uma determinada casta por nascimento; não podiam mudar de casta, nem casar ou ter o menor contato com elementos de outra casta.

As castas eram quatro: dos sacerdotes (brâmanes), dos guerreiros (xátrias), dos camponeses, comerciantes e artesãos (vaicias), da população conquistada (sudras). Abaixo destes havia os párias, que não pertenciam a casta alguma (daí o termo pária significar, para nós, ainda hoje, o indivíduo fora da sociedade).

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* Religião. As crenças religiosas mais antigas da Índia encontram-se documentadas em vários textos sagrados, redigidos em língua sânscrita, dentre os quais sobressaem os Vedas.

Os textos sagrados revelam a crença em uma série de divindades personificadoras das forças da natureza, afirmam a sobrevivência da alma e a íntima comunhão de cada indivíduo com o universo.

Por volta de 500 a.C. surgiram, na Índia, os ensinamentos morais e filosóficos de um membro da casta guerreira, Sidarta Gautama, conhecido como Buda (Iluminado). Esses ensinamentos, ganhando muitos adeptos, transformaram-se em religião, a religião budista. O budismo prega a gradativa purificação do homem, a fim de permitir-lhe vencer o sofrimento e a miséria, conduzindo-o à perfeita paz e liberdade do espírito (o Nirvana).

A religião budista tornou-se religião oficial em parte da Índia (século III a.C.) e penetrou, a seguir, em outras regiões do Extremo Oriente, como China, Japão, Ceilão, Tibete.

Com a expansão dos árabes até a Índia, aí se difundiu também a crença muçulmana; e o domínio dos turcos acabou intensificando a islamização de boa parte dos territórios indianos.

CHINA

Estruturada em base agrícola, a sociedade chinesa, tradicional e conservadora, evoluiu lentamente, com o correr dos séculos, sobrevivendo a crises políticas e econômicas, aperfeiçoando técnicas, atingindo alto grau de civilização e cultura, vindo assim a constituir, na época medieval, um dos mais importantes e mais poderosos impérios do Extremo Oriente.

* Filosofia e religião da China. A civilização chinesa, desde os mais remotos tempos, apoiou-se nos princípios filosóficos expressos no Tao (= caminho), que oferecia aos homens uma solução prática para a vida.

No século VI a.C., o pensador Lao-Tsé, baseando-se no Tao, desenvolveu uma doutrina filosófica, o taoísmo, que aconselhava sobretudo a meditação, a fim de permitir ao homem, penetrando em seu mundo interior, sentir melhor as forças básicas do universo. Essa doutrina filosófica transformou-se em religião cuja essência consiste em ser o homem bom, humilde, tolerante, devendo respeitar ao máximo as leis da natureza.

No século V a.C., outro grande pensador,Confúcio, sublinhou a ideia de que o homem pode vir a ser feliz na Terra, bastando para tanto desenvolver todas as boas qualidades que a natureza humana encerra; e, como Lao-Tsé, pregou a bondade, a tolerância e o respeito. Além disso, relevou especialmente as vantagens da educação, das boas maneiras, da tradição, para a conquista de um harmonioso relacionamento humano entre todas as classes sociais.

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Os ensinamentos de Confúcio transformaram-se para o povo da China em um admirável sistema de princípios morais e, através da obra de seus seguidores, tornou-se doutrina conhecida por confucionismo.

O taoísmo, o confucionismo e depois o budismo (vindo da Índia) desempenharam papel importante na história da civilização e da cultura chinesa.

* Evolução histórica da China. O regime de governo predominante na China era a monarquia teocrática: o imperador intitulava-se filho de Deus, encarnando a suprema autoridade política e religiosa. Dentre as várias dinastias imperiais que governaram a China destacaram-se:

- A dinastia Ch'in (século III a.C.): unificou a China, antes dividida em numerosos principados; fortificou o poder central, destruindo o poder dos nobres; instituiu rígido controle burocrático e militar nas províncias, impondo a todas elas as mesmas leis e o mesmo sistema de pesos e medidas. Construiu larga rede de estradas; para defender as fronteiras do norte e do leste contra a invasão dos hunos, fez construir a Grande Muralha, aproveitando algumas fortificações já existentes.

- A dinastia Han (séculos III a.C. - III d.C.): foi uma das mais célebres e ilustres na história da China. Estendeu as fronteiras territoriais, estabeleceu contato com outros povos, desenvolvendo o comércio sobretudo por intermédio de caravanas na rota da seda, em cujo percurso comerciavam-se artigos de luxo (tecidos de seda, especiarias e peles) que alcançavam elevadíssimo preço. O contato entre mercadores de várias procedências favoreceu a troca de informações e conhecimentos importantes. De um desses contatos estabelecido com regiões da Índia resultou a penetração na China da religião budista (século I a.C.).

Na mesma época, entretanto, em que as tribos germânicas começaram a transpor as fronteiras do Império Romano, apressando o seu decínio, povos bárbaros da Ásia central, iniciaram ataques à China, rompendo a Grande Muralha e ameaçando o império.

Sobreveio, assim, um longo período de quatro séculos conturbado por invasões e guerras, com insegurança política, falta de governo central, declínio econômico, que só veio a terminar com a ascensão de uma nova dinastia.

- A dinastia Tang (séculos VII-X): teve longa duração, conseguiu repelir invasores, expandir o território chinês em várias regiões asiáticas, fortalecer a administração, incentivar a educação e as artes, levando a cultura a um elevado nível de florescimento, dar prosperidade ao país, restabelecendo o equilíbrio econômico e o comércio exterior. Mas o avanço dos árabes na Ásia acabou provocando novo declínio econômico e a queda da dinastia Tang.

Sucedeu-se uma fase assinalada por contínuas ameaças externas e, por fim, no século XIII, a China foi tomada de assalto pelos mongóis sob a chefia de Gêngis-Cã. Seus sucessores estenderam rapidamente o poderio mongólico para além da China, até a Pérsia, a Rússia, a Ásia central. Nesse processo, porém, assimilaram hábitos e costumes chineses; demonstrando grande habilidade política, durante

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o governo de Cublai-Cã, o célebre veneziano Marco Polo teve ocasião de visitar a China e outras remotas regiões asiáticas.

No século XIV os chineses conseguiram libertar-se do domínio mongólico e instituiu-se o governo da dinastia Ming (séc. XIV-XVII), que marcou o início do isolamento da China com relação à Europa, isolamento esse que, durante 300 anos, iria intensificar-se cada vez mais.

Arte do Extremo Oriente

A arte hindu evoluiu lenta e continuamente, sempre por um processo de justaposição de formas antigas e novas.

A arquitetura é essencialmente religiosa e marcada, a partir do século VI a.C., pela filosofia budista.

Os santuários eram concebidos como modelo, em escala reduzida, do universo. No centro havia o templo onde se encontrava a imagem divina. O santuário era fechado por uma muralha, simbolizando as montanhas que circundam a Terra, e pontilhado por pequenos lagos que lembram os oceanos terrestres. Na direção dos quatro pontos cardeais abriam-se portas representando aberturas na abóboda celeste, isto é, as estrelas, através das quais estabelecia-se o contato entre Deus e os homens.

Os santuários hindus, dos mais simples aos mais complexos, seguiam este esquema simbólico. Caracterizavam também os santuários uma variedade rebuscada de detalhes, ornamentação profusa com baixos-relevos e esculturas. À ornamentação rebuscada na arquitetura contrapunha-se a simplicidade da pintura, uma das mais belas manifestações da arte hindu.

A arte da China, como a vida chinesa, era de caráter acentuadamente conservador. Sobressaía o gosto pelos pequenos objetos de adorno e ornamentação, executados em materiais difíceis de serem trabalhados, bronze, jade, laca, marfim, exigindo paciência, minúcia e grande habilidade técnica.

Também na arquitetura transparece a índole conservadora dos chineses. Palácios, edifícios administrativos, templos obedecem a um mesmo esquema arquitetônico: várias construções, unidas umas às outras por pátios e pavilhões formavam um todo harmonioso, integrado na paisagem, evidenciando a preponderância do conjunto sobre a construção isolada.

Com a difusão do budismo na China, ganhou importância a escultura e multiplicaram-se os edifícios religiosos, aparecendo templos cercados de muros. Um elemento chinês típico é o telhado de pontas curvas, característico dos pagodes.

Nos séculos VII e VIII desenvolveu-se a arte da porcelana com a qual os chineses se tornaram famosos; e, paralelamente, foi evoluindo a pintura, sobretudo a

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pintura da paisagem, realizada com rara beleza e delicadeza de traços e de colorido, sobre papel ou seda.

HISTÓRIA DO DIREITO NAS SOCIEDADES NAS SOCIEDADES CLÁSSICAS - GRÉCIA ANTIGA

Na Grécia Antiga desenvolveram-se as primeiras especulações de caráter eminentemente filosófico de que se tem notícia. Sabe-se que o legado das gentes da Hélade à formação do Pensamento Ocidental é de difícil mensuração.

No campo da política, Atenas foi a responsável imediata por ter presenteado o mundo com o germe da democracia. As obras de pensadores gregos da estirpe de Platão e Aristóteles se tornaram, por assim ser, a referência intelectual para

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as gerações vindouras. Nesse sentido, deve-se desde logo admitir que a inquietação pelo saber marcou profundamente o espírito desta civilização.

A busca apaixonada pelo conhecimento assinalou sobremaneira a orientação cultural da nação helênica. Não por acaso, os gregos se acharam superiores aos demais povos, os quais eram rotulados de "bárbaros".

Todavia, não se deve jamais perder de vista o fato de que o universo helênico era composto por inúmeras cidades-estado (polis) independentes.

A formação do cosmopolitismo grego é o resultado direto de um processo lento e gradual de sedentarização surgido em função da desintegração dos sistemas clânicos. Do Período Micênico (1500 – 1100 a.C.), pouco se sabe, exceto que a povoação dos Balcãs coincide com a Idade do Bronze no Oriente Próximo.

Os mais antigos habitantes da Grécia foram os aqueus, cários, jônios e dórios. Estes últimos penetraram nas terras da Lacedemônia durante o final do III e inicio do II milênio antes de Cristo.

Muitas das gentes em questão eram provenientes da Anatólia e, ao que parece, eram aparentadas. A proximidade ao litoral foi primeiramente buscada já que as terras do interior nem sempre eram agricultáveis, o que fez com que o interior pedregoso do país fosse legado ao pastoreio.

Ademais, havia a vantagem do fácil escoamento dos produtos por toda a costa do Mediterrâneo. Isto viria a favorecer, posteriormente, uma vigorosa tradição náutica entre os gregos.

Poemas épicos, como a Ilíada e a Odisséia, atribuídos a Homero (século VIII a.C.), talvez sejam as únicas fontes literárias a fornecer dados plausíveis para a reconstrução do passado helênico.

É bem verdade que estes elementos ainda não são suficientemente precisos para delimitar com exatidão os contornos da percepção jurídica dos séculos X, IX ou VIII a. C.

Entretanto, ninguém poderá desconsiderar sua utilidade, apesar de a preocupação do autor nunca ter sido a de apresentar dados de caráter historiográfico que servissem, no futuro, de suporte ao pesquisador.

As Dificuldades para o Conhecimento do Direito Helênico

O Direito nas cidades-estados da Grécia Antiga ainda foi muito pouco estudado no Brasil, apesar de sua inquestionável importância. Vale ressaltar que, persistem muitas lacunas sobre o tema em questão, o que gerou entre os desavisados a crença de que a atividade legislativa na Grécia Antiga tenha sido incipiente e, na percepção de alguns, até mesmo inexistente.

A principal razão a corroborar para o alastramento desta equivocada opinião consiste na exigüidade de fontes. Sabe-se que nem sempre tem sido possível contar com um conjunto de leis cuidadosamente registradas, como no caso do Código de Hamurábi, cuja estela está exposta no Louvre, ou em rolos de pergaminhos devidamente sistematizados, como ocorre com a Torah de Moisés.

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As fontes para o conhecimento do Direito Helênico, de outra sorte, quase sempre se apresentam de maneira fragmentária, desconexa e não-sistematizada. Como bem destacou Gilissen, na atualidade, melhor se conhece o Direito Privado de Atenas[1].

Deste modo, achados arqueológicos como aquele efetivado por Frederik Hallbherr, que encontrou na cidade-estado de Gortina, na ilha de Creta, um verdadeiro "código de leis", são extremamente raros.

Assim, não havendo muitas vezes as fontes diretas, recorrer-se-á aos escritos filosóficos para se tentar reconstruir esse imenso quebra-cabeça que é o direito grego antigo.

Em função disso, torna-se praticamente impossível descartar obras da importância de A Política, de Aristóteles. O referido pensador, homem curioso por excelência, cuidou de esboçar um quadro significativo permeado por comentários sobre algumas das constituições vigentes nas principais cidades-estado gregas. Ora, como negar o valor jurídico de tal trabalho para a História do Direito?

A PERCEPÇÃO DO FENÔMENO JURÍDICO ENTRE OS GREGOS

São também exíguas as informações sobre o Direito Grego em períodos distantes. Fustel de Coulanges, porém, realizou um feito digno de nota ao estudar as percepções jurídicas de romanos e gregos em tempos imemoriais.

A princípio, trata-se de um direito essencialmente consuetudinário, ritualístico, fundado no culto aos antepassados e desenvolvido no seio da própria família[2].

Na literatura, bem como nos escritos filosóficos, a palavra grega que se aproxima à idéia de "direito" é dikáion, que está etimologicamente associada à diakaiosúne, que pode ser traduzida como "justiça".

Os gregos desenvolveram também a consciência da existência de uma lei eterna, imutável, a reger o homem indistintamente. Ora, trata-se de uma idéia embrionária do que convencionamos chamar hoje de direito natural.

Igualmente, é creditado aos gregos o mérito de terem contribuído para o florescimento de uma noção preliminar de constitucionalismo, especialmente em Atenas, onde os cidadãos, por serem mais politizados, acabavam possuindo uma experiência mais apurada da condução da vida pública.

Deste modo, quando se trata de estudar o "direito grego", não se pode jamais perder de vista o fato de que inúmeras cidades-estado helênicas eram regidas por um ordenamento jurídico próprio, uma vez que as mesmas gozavam de plena soberania.

O "universo grego", pois contava com unidades políticas completamente independentes umas das outras. As cidades-estado, nesta conjuntura, só se prestavam a estreitar suas relações em função da formação de alguma aliança estratégica (anfictionia).

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Assim, nesta perspectiva, o direito costumeiro da belicosa Esparta é muito diferente da sofisticação das leis escritas de Atenas, cidade-estado de efervescência cultural ímpar[3].

Entretanto, não é devido esperar dos gregos uma espécie de culto à lei similar àquele que angariou espaço em Roma. Destarte, não se deve requerer das gentes da Hélade uma apreciação sistemática, precisa e dogmática do fenômeno jurídico.

O direito era tão-somente parte do regime de governo da cidade e, na visão grega, tão-somente nisso residia sua utilidade. Isso não quer dizer que os gregos vivessem alheios às questões legais como um todo. José Reinaldo de Lima Lopez, por exemplo, chama a atenção para "...o costume de aprender de cor (recitando em forma poética) alguns textos jurídicos, assim como os poemas  de Homero. As leis de Sólon eram ensinadas como poemas, de modo que o ateniense bem educado terminava por conhecer sua tradição político-jurídica comum. A literatura "jurídica " era fonte de instrução e prazer. Em geral no tempo da filosofia socrática sabia-se ler. As técnicas propriamente jurídicas eram próprias do logógrafo, o redator de discursos forenses: pedidos, defesas, etc.. O direito, presumia-se, devia ser aprendido vivenciando-o. As leis deveriam fazer parte da educação do cidadão. As discussões sobre justiça na cidade, entre os cidadãos e iguais. As leis menores não importavam para discussão pública"[4].

A ATIVA PRÁXIS LEGISLATIVA NA GRÉCIA ANTIGA

A atividade legislativa, ao contrário do que muitos acreditam, foi extremamente profícua na Grécia Antiga. A partir do início do século VII a.C., esta tendência nas cidades-estado torna-se mais significativa, principalmente, com a transição dos mores para a lei escrita. Estas constituições embrionárias passaram a ser o símbolo garantidor da estabilidade das instituições políticas do Estado. A ausência deste corpo de regras chegava a causar estranheza entre os filósofos, conforme se pode perceber na crítica de Aristóteles sobre os cretenses: "A dispensa da prestação de contas e a perpetuidade são prerrogativas muito acima de seus méritos. A falta de leis que possam servir-lhes de regra para julgar o caráter arbitrário de seus julgamentos não dá nenhuma segurança aos réus"[5].

Muitos, afinal, foram os legisladores que pontilharam o universo helênico. Os mais famosos foram Drácon, Sólon e Péricles, de Atenas, e também Licurgo, de Esparta. Mas também se pode falar de Zaleuco (Lócria), Carondas (Catânia), Filolau (Tebas), Androdamas (Régio), Hipódomo (Mileto) e Onomácrito (Lócris).

O DIREITO ATENIENSE

O Ideal Democrático no Âmago da Lei

Atenas foi, por certo, uma das mais importantes cidades da Antiguidade. Berço da erudição e do conhecimento, este centro cosmopolita alcançou notável desenvolvimento na Grécia Antiga.

Por suas ruas transitavam, diariamente, vários filósofos atraídos pela extremada valorização concedida ao saber. Não por acaso, aqui despontam, pela primeira vez na história da humanidade, os nítidos contornos dos ideais democráticos.

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Ademais, o profícuo comércio marítimo mantido com praticamente todos os povos do Mediterrâneo permitiu a ascensão de um estado pujante e potencialmente hegemônico. A natural inclinação do país à cultura, às letras e artes fez brotar uma aristocracia bem articulada politicamente, que se fazia imitada e ditava padrões de comportamento para o mundo antigo. Em virtude disso, o Direito Ateniense é, sem dúvida alguma, aquele mais bem servido de fontes dentre todas as cidades que pontilharam a imensa Hélade.

O primeiro aspecto a chamar a atenção de qualquer interessado no estudo das leis da Grécia Antiga diz respeito ao sofisticadíssimo modelo de organização judiciária de Atenas, onde já havia tribunais com competências jurisdicionais completamente distintas.

Assim, o Areópago, nas palavras de Jardé, era o mais antigo tribunal de Atenas: de acordo com a lenda, foi instituído pela deusa Atena, por ocasião do julgamento de Orestes. Suas atribuições primitivas, mal definidas, mas muito amplas, transformaram-no numa corte de justiça e num conselho político, que exercia intensa vigilância sobre toda a cidade e suas leis. Tinha Caráter aristocrático, porque era formado por antigos arcontes, que sempre eram escolhidos entre os cidadãos das duas classes mais altas, e, porque as funções de seus membros, os AREOPAGITAS (areopagítes) eram vitalícias.

Por essas mesmas razoes é que foi particularmente visado pelas reformas dos democratas: em 462, Efialtes conseguiu tirar do Areópago todo o poder político, reduzindo as suas funções apenas às judiciárias.

Com o tempo, até essas atribuições judiciárias foram-se restringindo com a criação e desenvolvimento de outros tribunais.

No século IV, o Areópoago só conservava o julgamento dos casos de homicídios com premeditação, de incêndios e de envenenamento"[6].

Interessante notar que este famoso tribunal ateniense continuou desenvolvendo suas atividades, ainda que reduzidas, até o século I da Era Cristã, mesmo quando a Grécia, já em franco declínio, tinha inevitavelmente sucumbido ao poderio romano e as suas cidades haviam perdido todo o seu antigo esplendor[7].

Tem-se notícia, inclusive, de que o apóstolo Paulo, em dado momento, fora intimado a prestar esclarecimentos às autoridades locais sobre a doutrina religiosa que pregava, a qual, segundo consta, estaria causando certos tumultos entre os cidadãos[8].

A mais democrática corte de Atenas, porém, foi aquela conhecida por Heliaia ou Tribunal dos Heliastas, um "júri popular composto de até 6.000 cidadãos, escolhidos por sorte, entre os que tivessem mais de trinta anos e se colocassem à disposição da cidade para exercer importantes funções"[9], ensina o Prof. Luis Carlos de Azevedo.

Além disso, de acordo com S. C. Todd, é possível falar da existência de pelo menos mais duas cortes na cidade de Atenas, que teriam funcionado até a metade do século IV a.C.. Trata-se de um tribunal específico par apreciar causas em que pelo menos uma das partes era estrangeira – o Xenicon Dikasterion – e também uma espécie de tribunal marítimo – o Nautodikai[10]

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É certo, pois, que a transposição dos costumes para um direito escrito facilitou a consolidação das instituições democráticas de Atenas. Sob este prisma, o legado da cidade ao direito público de ser mensurado. Ora, o poder na sociedade ateniense, pelo menos até o final do século VIII a.C., como bem observou Claude Moussé[11], era partilhado entre uma aristocracia guerreira (que possuía o monopólio da terra) e os sacerdotes (os quais, não obstante o eventual controle de todos os assuntos relacionados à religião, também cuidavam de distribuir a justiça e aplicar o direito).

Destarte, quando a oralidade é abandonada e as leis passam a ser registradas em pedra, as comunidades ganham automática estabilidade e, naturalmente, se afastam da prática de julgamentos arbitrários e de decisões inconsistentes[12].

É o que se vê quando os atenienses aprimoram seu ordenamento jurídico, definindo as condições para a validade das leis e o rechaço ao direito ancestral de caráter consuetudinário:

"As autoridades não têm permissão para usar uma lei não escrita, em caso algum. Nenhum decreto do Conselho ou da assembléia deve prevalecer sobre uma lei. Não é permitido fazer uma lei para um indivíduo se ela não se estender a todos os cidadãos atenienses e se não for votada por seis mil pessoas, por voto secreto"[13].

As leis de Atenas, agora escritas, revelam a preocupação dos governantes com a conservação da cidade e o bem-estar de seus cidadãos. O elemento público, pois, se torna primordial, o tema central de muitas dessas regras. É o que se pode notar a partir da leitura da regra relativa à limpeza (cerca de 440-439 a. C.) que se segue:

"...não é permitido autorizar que peles apodreçam no rio Ilissos acima do templo de Heracles; ninguém tem permissão para curtir peles ou jogar lixo no rio..."[14].

Ou, ainda, neste outro exemplo, a regulamentação sobre a utilização dos frutos da oliveira (azeitonas), legislação esta que assume, inevitavelmente, um teor ambientalista (meados do século IV a. C.):

"Quem quer que despoje uma oliveira em Atenas, não sendo por algum propósito religioso do povo ateniense ou de seus demos, ou para uso próprio até o limite de duas por ano, ou com vista a atenderas necessidades de uma pessoa falecida, será devedor ao tesouro de cem dracmas por cada oliveira, e um décimo dessa quantia caberá à deusa. Também deverá pagar cem dracmas por cada oliveira ao denunciante. E as acusações relativas a esta matéria serão levadas aos arcontes, de acordo com a instância pertinente. E o denunciante deverá pagar os emolumentos que lhe correspondem. E quando uma pessoa for considerada culpada, os magistrados aos quais foi levada a questão devem informar por escrito aos coletores (práktores) o montante devido ao tesouro público e o devido ao tesouro da deusa. Se não o fizerem, sobre eles recairá o débito"[15].

Não seria de se estranhar o zelo dos atenienses para com a manutenção de seus olivais. É sabido que estas árvores crescem até mesmo em terras menos férteis. A azeitona, assim, é extremamente valorizada por toda a Antiguidade.

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O azeite extraído do fruto compõe a dieta obrigatória das civilizações que se desenvolveram às margens do Mediterrâneo. Ao denunciante do ato de degradação, conforme viu-se, caberia o recebimento da quantia equivalente a cem dracmas por cada oliveira.

No vigor desse processo legislativo que tomou conta de Atenas tornam-se célebres dois arcontes[16]; cada qual representava a mais completa antítese ao outro. Comecemos por Drácon (cerca de 620 a.C.), que foi o artífice de leis pautadas na construção de um ambiente de tamanha severidade, que passou à História como um pérfido legislador.

A vileza de intenções deste famoso personagem da política ateniense e a impiedade habitual eram vícios que acompanhavam, de modo absolutamente trágico, a feitura de leis encomendadas por seus pares. Estas regras jurídicas rigorosas ao extremo, não encontraram apoio popular na cidade mais erudita da Antiguidade Clássica.

Como bem ressaltou Pinheiro, a tônica da legislação de Drácon consistia na aplicação da pena de morte para a grande maioria dos delitos, o que lhe valeu a reputação de "sanguinário"[17].

Vale lembrar que termo "lei draconiana" é corrente na atualidade entre os operadores do direito, principalmente quando o objetivo é o de se referir a uma regra cruel, desumana ou excessiva. Por estes motivos, sabe-se que seria Sólon (638-558 a.C.) o homem designado a promover uma grande reforma que se estenderia ao campo jurídico.

É bem conhecido o fato de que o intelecto de Sólon, aliado às suas boas intenções, foi chamado a corrigir os desvarios de seu predecessor. Como bem destacou Moussé, in verbis:

"Sólon, eleito arconte em 594 a.C., tomaria a si a tarefa de enfrentar a crise. Ele próprio pertencente à aristocracia, mas por temperamento ou por necessidade, fora levado a viajar, o que o colocava um pouco à margem da aristocracia tradicional. Consciente da ameaça representada por uma agitação camponesa, que poderia desembocar na tirania, e recusando-se tornar-se tirano, proclama seisachtéia, ou seja, a suspensão dos encargos, arrancando dos campos, os marcos que tornavam concreto o estado de dependência de seus proprietários, ao mesmo tempo em que anula as dívidas e revoga o direito do credor de mandar prender o devedor, fazendo retornar à Ática todos aqueles que, como escravos, haviam sido vendidos no exterior[18]".

O fato é que, por estas populares iniciativas, Sólon faria, a partir daí, seu nome ser sempre lembrado pelas gerações que se seguiriam, tendo sua legislação sido festejada como sinônimo de justiça e equidade em diversas póleis helêncicas, mesmo decorridos três séculos desde o ano de seu falecimento. Enfim, como disseram V. Diakov e S. Kovalev: "A Constituição de Atenas refletia um regime social novo que, para o seu tempo, era progressista"[19].

Do mesmo modo, o Direito Penal Ateniense parecia ser bem menos severo que aquele produzido entre os povos da Antiguidade Oriental. Klabin acredita que as formas de punição mais usuais eram as multas, o desterro, o confisco e a prisão[20].

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Pode-se perceber uma nítida intenção de abrandamento das penas, onde se evitava, até onde fosse julgada oportuna, uma sentença de morte. Isto não quer dizer que nesta famosa cidade-estado as penas eram totalmente destituídas de crueldade. Contudo, pesquisas como aquelas de Margaretha Debrunner Hall informam sobre a prática de uma espécie de crucificação –apotympanismos – em plena Atenas[21].

É bem verdade que não se tem todas as informações sobre o Direito Ateniense. Por isso, os estudiosos caminham apenas até aonde as fontes permitem chegar. Mesmo assim, algumas conclusões já podem ser obtidas graças ao bom logro das escavações arqueológicas. Na atualidade é possível dizer que, em Atenas, havia uma clara distinção entre homicídio doloso e homicídio culposo.

Ainda pairam dúvidas quanto à pena aplicada ao primeiro caso. Entretanto, no que concerne ao segundo, sabe-se que se previa o abatimento. O perdão da parentela eximia o apenado de cumprir a sentença, porém, a recusa de um só desses familiares era suficiente para ensejar que fosse levada a cabo a dita punição[22].

O adultério era considerado crime em Atenas. A disposição abaixo remonta, provavelmente, ao século V antes de Cristo: Veja-se a mesma na íntegra:

"E àquele que pega em flagrante o adúltero, não lhe é lícito continuar vivendo com sua mulher; se o fizer, será privado de seus direitos civis. E à mulher que cometeu adultério não é dado assistir ao sacrifício público; se o fizer, poderá sofrer qualquer castigo, com exceção da morte, e quem lhe aplicar o castigo não sofrerá qualquer punição"[23].

Note-se que o legislador se esquiva de pronunciar qualquer pena para o adúltero. A mulher, no entanto, estava impedida de participar de cerimônias religiosas, bem como, poderia sofrer qualquer investida nas ruas por seus algozes em razão de um comportamento execrado pela sociedade. Igualmente, não era lícito ao marido traído continuar vivendo com sua esposa. As relações extraconjugais, neste caso, determinavam o automático dever do marido de requerer o divórcio.

A recusa em admitir sua necessidade gerava o ostracismo, sanção esta que, numa cidade politizada e democrática como Atenas, gerava um sério inconveniente social.

Havia também em Atenas uma interessante lei restringindo os direitos civis a todos aqueles que se prostituíam:

"Se qualquer ateniense se prostituir, não terá permissão para se tornar um dos nove arcontes, para exercer qualquer sacerdócio, para atuar como advogado do povo ou exercer qualquer ofício, em Atenas ou outro lugar, por sorteio ou votação; não terá permissão para ser enviado como arauto, para fazer qualquer proposta na assembléia dos cidadãos e em sacrifícios públicos, para usar florão, quando todos usarem, para entrar em local de reunião purificado para a assembléia. Qualquer pessoa que, tendo sido condenada por prostituição, desobedecer a qualquer dessas proibições, será condenada à morte"[24].

Neste caso, as interdições são previstas unicamente para os casos de prostituição masculina, pois boa parte dos cargos enumerados somente podia ser

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preenchida por homens. Assim, aquele que alguma vez já havia se prostituído estava impedido de exercer diversas funções públicas e religiosas. Aqui o castigo era severo: a não-observância dessas proibições acarretava a pena capital.

Da mesma forma, também algumas questões sobre o Direito Civil Ateniense já podem ser descortinadas. Eis duas regras do direito sucessório:

"Com exceção daqueles que foram adotados quando Sólon assumiu sua magistratura, e, que, portanto, ficaram inaptos para reclamar uma herança ou renunciar a ela, qualquer homem terá direito de dispor de sua propriedade por via testamento e de acordo com seu desejos, se não tiver filhos legítimos do sexo masculino, a menos que sua mente tenha sido incapacitada por loucura, velhice, drogas ou doença, ou a menos que ele esteja sob a influência de uma mulher, ou sob coação, ou tenha sido privado de sua liberdade"[25].

"Se alguém morre sem testar, e se tiver deixado filhas, vai para elas sua propriedade; se não, farão jus à propriedade os que se seguem: irmãos que sejam filhos do mesmo pai e filhos legítimos de irmãos terão a parte correspondente a seu pai. Se não há quaisquer irmãos ou filhos de irmãos..., seus descendentes herdarão do mesmo jeito. Os (parentes) de sexo masculino e seus descendentes masculinos terão a precedência, quer sejam da mesma parentela, quer o parentesco seja mais remoto. E se não há consangüíneos do lado do pai, até o grau de filhos de primos, os parentes do lado materno herdarão igual modo. E se não houver parente nesse grau mencionado, herdará o mais próximo aparentado do lado paterno. Nenhum filho ilegítimo, de um ou outro sexo, terá direitos sagrados ou seculares de parentesco, a contar do arcontado de Euclides (403-2 a.C.)"[26].

Não é nenhum segredo o fato de que nas sociedades da Antiguidade, especialmente naquelas mediterrâneas, eram mantidos, vias de regra, os privilégios sucessórios para os herdeiros do sexo masculino. No Direito Ateniense não parecem prevalecer aquelas prerrogativas próprias da primogenitura, tão ao gosto dos orientais em geral, entretanto, os varões, indubitavelmente, alcançam maiores vantagens e o seu quinhão está garantido. Mas as filhas também podem herdar, na ausência de irmãos legítimos.

Note-se que em momento nenhum se menciona a condição da viúvas. As disposições acima informam o quão corriqueiro era o recurso ao testamento entre os gregos. A segunda lei, basicamente, sintetiza a essência do Direito Sucessório ateniense.

O DIREITO ESPARTANO

O Militarismo na Constituição de Licurgo

Esparta desenvolveu-se às margens do rio Orontes, nas terras da Lacônia. Sua história começa a ser contada a partir da invasão de um povo de origem germânica, os dórios. Estes subjugam os aqueus e seus vizinhos. Inicia-se aqui a saga de uma das mais belicosas e militaristas que o mundo já conheceu.

O homem espartano, desde os sete anos de idade, ingressava no período de treinamento das forças armadas. Na juventude já era um exímio e perigoso guerreiro. As leis da cidade autorizavam o rechaço paterno às crianças

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portadoras de deficiências. O pai poderia também lançar o bebê de qualquer penhasco se imaginasse que a compleição física do mesmo fosse um eventual empecilho à carreira militar.

Os espartanos eram mestres no cultivo das tradições cívicas e amavam com fervor a sua pátria. Dedicavam-se até à morte no combate e tinham repugnância dos covardes e desertores. Eram xenófobos por excelência, pois se julgavam "iguais entre si", mas "superiores a qualquer outro povo da Hélade". Usavam uma longa cabeleira e bem forjados apetrechos de guerra. Uma longa capa vermelha tocava-lhes o calcanhar.

Um escudo e um elmo que protegia, além da cabeça, também os maxilares, trazia pavor aos adversários.

A coragem espartana foi imprescindível à manutenção da cultura grega. Entre os anos de 500 e 449 a.C. Esparta alia-se a Atenas, a fim de refrear a fúria do invasor nas chamadas "Guerras Médicas". Os soldados comandados pelo legendário Leônidas lutaram com ânimo redobrado contra os persas. Em 431 a.C. eclode o conflito contra Atenas. A guerra só terminaria em 404 a.C. com a vitória de uma enfraquecida e desgastada Esparta[27].

Quanto ao sistema político, sabe-se que Esparta tinha dois reis que provinham de duas importantes famílias aristocráticas locais: a dos Ágidas e a dos Euripôntidas. Estes, apesar de serem "reis" não possuíam irrestrita autonomia no campo da política interna e, nem tampouco, da externa.

Encontravam-se eternamente resignados a vontade superior dos aristocratas que compunham a Assembléia do Povo, chamada em Esparta de Apella ou o Conselho de Anciãos, a Gerúsia, composto apenas por vinte e oitogerontes com idade igual ou superior a sessenta anos e por dois reis. Portanto, estes dois monarcas mais se assemelhavam a chefes militares do que propriamente a monarcas. Jaeger assim os define[28]:

Os dois reis heráclitas, sem poder político na época histórica e que só no campo de batalha retomavam a importância original, eram um remanescente dos antigos reis dos exércitos do tempo das invasões dóricas e proviriam talvez do fato de se proclamarem reis conjuntamente, os dois chefes das duas hordas. A assembléia do povo espartano não é outra coisa senão a antiga comunidade guerreira. Não há nela qualquer discussão. Limita-se a votar SIM ou NÃO em face de uma proposta definida no Conselho de Anciãos. Este tem o direito de dissolver a assembléia e pode retirar da votação propostas com resultado desfavorável. O eforato é a autoridade mais poderosa do Estado e reduz ao mínimo o poder político da realeza. A sua organização representa um poder moderador no conflito de forças entre os senhores e o povo. Concede ao povo um mínimo de direitos e conserva o caráter autoritário da vida pública tradicional. É significativo que o eforato seja a única instituição não atribuída a legislação de Licurgo".

Todavia, não tem sido possível conhecer o Direito Espartano da mesma forma que o direito de sua maior rival, Atenas. O maior desafio é a inexistência de fontes diretas, o que nos leva a buscar aquelas informações prestadas por filósofos da estirpe de Aristóteles, Xenofonte, Plutarco, Tucídides, Heródoto e Políbios. Vale dizer que o próprio Corpus Iuris Civilis, de Justiniano, já atentava para essa realidade ao ressaltar que os espartanos, ao contrário dos atenienses e romanos, preferiam "confiar à memória aquilo que observavam como lei"[29].

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Destarte, devido ao caráter eminentemente consuetudinário das leis de Esparta, somente poderemos considerar seu sistema legal de forma genérica. Na opinião de Aristóteles, o Direito Espartano sofreu alguma influência do Direito Cretense, apesar de não explicar as motivações que o levaram a chegar a tais conclusões[30].

De qualquer modo, já sabemos que os espartanos possuíam um vocábulo especifico para se referir ao seu conjunto de leis. O direito era nomeado pela palavra rhetra, cujo sentido etimológico, consoante a lição de Jacqueline de Romilly, alcançava o mesmo significado do verbo "dizer"[31].

segundo Werner Jaeger, autor da célebre Paidéia, "esta pretensa legislação é o contrário do que os gregos costumavam entender por legislação.

Não é uma compilação de leis particularizadas, civis e públicas, mas sim o nomos, no sentido original da palavra: uma tradição oral válida, da qual apenas algumas leis fundamentais e solenes – as rhetra – foram fixadas por escrito. Entre estas estão as que se relacionam com as atribuições das assembléias populares, mencionadas por Plutarco. As fontes antigas não consideram esta faceta como resíduo de um estágio primitivo.

Pelo contrário, e em oposição à mania legisladora da democracia do séc. IV, têm-na como obra da sabedoria previdente de Licurgo, o qual, como Sócrates e Platão, dava maior importância à força da educação e à formação da consciência de seus cidadãos do que às prescrições escritas. Com efeito, quanto maior importância se concede à educação e à tradição oral, menor é a coação mecânica e externa da lei sobre os detalhes da vida.

No entanto, a figura do grande estadista e pedagogo Licurgo é uma interpretação idealizada da vida de Esparta,vista pelos ideais de educação da filosofia posterior[32].

Paralelamente ao direito oral, havia também um exíguo direito escrito. Tratava-se da própria "Constituição da Lacedemônia", à qual Aristóteles se refere num comentário específico incluído em sua obra maior – A Política.

Os autores da Antiguidade Clássica sempre aludiam a um homem chamado Licurgo, que teria sido o autor destas leis. Apesar disso, pouco sabemos sobre o mesmo. Ao que parece, tratava-se de um aristocrata, alguém aparentado à realeza, não obstante o fato de ainda permanecerem vivas muitas especulações sobre o assunto. O estagirita o menciona sem jamais questionar sua historicidade[33]. Xenofonte (427 – 355 d.C.), por sua vez, teve acesso a fontes bem mais antigas e também escreveu sobre o tema em questão[34].

Nenhuma delas, entretanto, foi tão detalhista quanto A Vida de Licurgo, de Plutarco (45 – 120 d.C.), o que não lega aos seus escritos maior confiabilidade, pois o mesmo teve acesso apenas a fontes bem mais tardias. Heródoto, chamado "o pai da história", chega a nos informar ter havido um antigo santuário onde Licurgo foi venerado por gerações a fio[35].

O teor costumeiro e casuístico do Direito Espartano é uma constante nos comentários dos filósofos. Vejamos o parecer de Aristóteles sobre a questão:

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"Outro absurdo não menos lamentável é ver pessoas colhidas ao acaso julgando em última instância os maiores casos. Seria necessário, pelo menos, que tivessem um código e julgassem de acordo com leis escritas, em vez de decidir, como fazem, de acordo com seus caprichos"[36].

Os atenienses credenciavam a feitura de suas leis a legisladores como Dracón e Sólon. Os cidadãos, ao passearem pelas ruas, sabiam que aquelas regras registradas em placas de bronze e à vista de todos eram obra de meros homens.

O espírito democrático a nortear a vida em sociedade impunha que as leis em extremo cruéis, como as de Dracón, deveriam ser revogadas por um novo arconte eleito pela assembléia. Como vimos, coube a Sólon levar a cabo tal tarefa.

Em Esparta, do contrário, não se pode falar o mesmo. Heródoto dá entender que as leis ainda estão adstritas ao universo do sagrado. Nesse contexto, o papel de Licurgo seria o de se servir de interlocutor entre o povo e uma suposta inspiração "recebida" junto ao famoso oráculo de Delfos[37].

Aristóteles percebeu uma clara interdição ao comércio de imóveis em Esparta. O filósofo esclarece que a cultura espartana julgava ser o comércio uma prática "pouco honrosa"[38].

Esta opinião é compartilhada por Políbios, que ressalta a constância do escambo de bens de consumo no cotidiano da cidade[39].

Ensina Aristóteles que os bens eram transmitidos por testamento ou doação. A lei. Assim, havia contribuído para gerar o incremento da pobreza do país cujas riquezas se concentravam nas mãos de alguns poucos.

Outra curiosidade apontada pelo estagirita diz respeito a uma regra que isentava o indivíduo da prestação do serviço militar se o mesmo tivesse três filhos. Quatro filhos isentariam o pai de família do pagamento de tributos do estado. O ideal de civismo, profundamente arraigado às instituições da cidade, explica a promoção de banquetes públicos, ocasião esta em que os habitantes da pólis festejam juntos, apesar de que os menos favorecidos eram naturalmente excluídos pela falta de recursos para participar dos tais eventos[40].

Destarte, Licurgo deve ser sempre lembrado como o modelador de um Estado aristocrático e militarista. As virtudes cultivadas pelos cidadãos estavam ligadas à condução da guerra.

Os espartanos jamais se sobressaíram no campo da política, não obstante terem ficado eternamente lembrados por seus feitos heróicos, dentre os quais a batalha das Termófilas (480 a. C.) serve como exemplo maior.

O DESENVOLVIMENTO DO DIREITO INTERNACIONAL NA GRÉCIA ANTIGA

A Grécia Antiga conheceu largamente o desenvolvimento de uma espécie embrionária de Direito Internacional. É justamente no universo da Hélade que surgem os elementos políticos providenciais que pugnam pelo estabelecimento de uma evidenciada tradição de base consuetudinário no terreno das relações internacionais.

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É certo, pois, que o fato de cada cidade-estado ser completamente soberano contribuiu favoravelmente para a gradual construção de um efeito ideal internacionalista entre os gregos. Não por acaso, o renomado mestre da Universidade de Munique, Georg Stadmüller, utilizou em sua obra a expressão "Direito Internacional grego"[41].

Por conseguinte, diversas instituições próprias ao Direito das Gentes vão sendo progressivamente delimitadas, uma vez que a constância da beligerância entre as cidades-estado acaba por exigir novas formas de cooperação entre os envolvidos nos conflitos.

Assim, o estado de guerra quase que sempre permanente entre os gregos (principalmente a partir do século IV) viabilizou a celebração de tratados internacionais que tinham os mais diferentes objetos.

O historiador Tucídides retratou com riqueza de detalhes o contexto de tantos célebres embates do mundo antigo, bem como a conclusão de diversos pactos contendo interessantes cláusulas de não-agressão entre cidades-estado da importância de Atenas e Esparta[42].

A obra máxima do referido pensador grego – História da Guerra do Peloponeso – confirma também a profícua diplomacia realizada por intermédio de embaixadores designados para tanto, apesar de inexistirem, conforme o disposto na lição de Truyol y Serra, embaixadas permanentes[43].

Um fenômeno típico do universo helênico consistiu na formação de ligas políticas entre as cidades-estado lideradas por alguma potência hegemônica como Atenas ou Esparta e que eram chamadas de anfictionias.Estas ligas eram entidades confederadas norteadas por interesses políticos comuns, notadamente, a defesa mútua e a religião.

Para Seara Vázquez, elas significavam muito mais do que isso: as ligas antictiônicas eram modelos embrionários representativos das modernas organizações internacionais[44], cujo grande legado, na visão de Julio Linares seria a humanização do conflito[45]. Nesse sentido, muitos são os exemplos. As principais, no entanto, foram a Liga do Peloponeso (550 a.C.), liderada por Esparta, e a de Delos (478 – 477 a.C.), capitaneada por Atenas.

A mais antiga delas parece ter sido a Liga da Beócia (século VI a.C.), que tinha a sua frente a cidade de Tebas. Uma das últimas anfictionias, senão a última delas, foi a de Corinto (338 a.C.).

 

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HISTÓRIA DO DIREITO NAS SOCIEDADES CLÁSSICAS - ROMA ANTIGA

As origens mitológicas de Roma

Vamos começar nossa jornada à Roma da Antiguidade pela maneira como os

próprios romanos contavam o seu passado mais remoto: através de mitos.

Segundo a mitologia, os romanos descendem de Enéas, um herói troiano que

conseguiu escapar quando os gregos destruíram sua cidade, possivelmente no

século 15 a.C. Filho de Vênus, a deusa do amor, Enéas passou por muitas

aventuras até chegar à Itália, onde seu filho Ascânio fundaria Alba Longa, o

núcleo da futura Roma, que seria fundada por seus descendentes Rômulo e

Remo, em 753 a.C.

Rômulo e Remo eram irmãos gêmeos e, após o nascimento, foram atirados ao rio

Tibre por ordem de Amúlio, usurpador do trono de Alba Longa. No entanto,

conseguiram chegar às margens no sopé do monte Palatino e sobreviveram,

sendo amamentados por uma loba. Criados por camponeses, ao chegar à idade

adulta, depuseram o usurpador e restituíram ao trono seu avô, Númitor, de quem

receberam a missão de fundar uma nova cidade na região do Lácio.

No local escolhido, o monte Palatino, às margens do Tibre, Rômulo traçou um

sulco no chão com um arado, demarcando a sua propriedade. Insatisfeito, Remo

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saltou essa linha sobre a terra, desafiando o irmão, que o matou. Rômulo fundou

seu povoado, onde acolheu fugitivos de diversas partes da Itália. Sobre eles

reinou durante muito tempo, até desaparecer misteriosamente numa

tempestade e se transformar no deus Quirino, uma das principais deidades

mitológicas dos romanos.

Origens históricas de Roma

A data lendária (753 a.C.) da fundação de Roma não representa o período mais

antigo de ocupação do local onde a cidade surgiu. Vestígios de povoação foram

encontrados e remontam à Idade do Bronze. É provável que a cidade tenha

surgido de um forte erguido pelos habitantes do Lácio (latinos e sabinos) para

defender-se dos etruscos, que dominavam parte da península Itálica. Roma

surgiu no topo do monete Palatino e se expandiu gradualmente pelos outros seis

montes vizinhos, o Esquilino, o Célio, o Quirinal, o Viminal, o Capitolino e o

Aventino. Mas a cidade não parou de crescer ao longo dos séculos.

Primitivamente, a economia romana era baseada em atividades agrárias e

pastoris. A propriedade de terra era a base da riqueza, o que evidencia o caráter

aristocrático dessa sociedade. Os proprietários de terra eram o grupo social

dominante, sendo chamados de patrícios. Através de laços familiares formavam

clãs que compreendiam também os parentes pobres que prestavam serviços e

eram conhecidos como clientes. Finalmente, quem não pertencesse ao clã era

chamado de plebeu. Esse grupo era formado por artesãos, comerciantes,

estrangeiros e pequenos proprietários de lotes pouco férteis.

Costumes e cultura

Nesses primeiros tempos, os romanos levavam uma vida simples, trabalhando no

campo e alimtando-se de sua própria produção. A modéstia e a disciplina eram

consideradas virtudes essenciais. A família era uma instituição sagrada e seu

chefe - o pater famílias - tinha poder e direitos ilimitados sobre a mulher, os

filhos, os escravos e os bens. O velhos eram respeitados e serviam de exemplo à

comunidade. A religião - baseada no culto aos antepassados e a uma multidão de

deuses - estava presente em todos os aspectos da vida cotidiana e também tinha

um caráter cívico, ou seja, estava ligada à cidade e ao Estado romano.

De resto, com o passar dos tempos, os deuses romanos foram se identificando

com os deuses gregos, devido à grande influência que a Grécia - embora fosse

dominada por Roma - exerceria sobre ela e sua cultura. Na verdade, a arte

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grega foi uma das fontes principais da arte romana. A arquitetura talvez tenha

sido a única das artes de então em que os romanos produziram inovações

efetivas, em particular devido ao seu pragmatismo. Se para os gregos as

principais construções eram os templos, para os romanos importavam os

reservatórios de água, os aquedutos, os edifícios públicos, como os tribunais, os

circos e os mercados.

Cidadania e direito

Para Roma, o Estado estava acima de tudo e quem estivesse a serviço da res

publica (coisa pública) deveria respeitar os deuses, ser leal e corajoso e

ambicionar a glória - virtudes que evidenciam o caráter guerreiro que logo se

manifestou entre os romanos. A vida do cidadão era regulamentada por leis, que

podiam dizer respeito aos negócios do Estado (direito público) e às relações entre

famílias e particulares (direito privado).

Vale à pena notar a importância dessa distinção, até hoje fundamental para o

funcionamento do estado de direito. No entanto, essas noções bem como as

instituições que as traduziram na prática não datam do primeiro momento da

história romana, o período monárquico, mas sim do período republicano. Isso,

porém, nos obriga a deixar de lado esse esboço das origens e da organização

sócio-cultural de Roma para entrar em sua história política - o que requer um

capítulo à parte