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Retro-análise da curva recalque vs tempo utilizando as teorias de Terzaghi e de Taylor e Merchant Raphael Felipe Carneiro Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected] Denise Maria Soares Gerscovich Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected] Bernadete Ragoni Danziger Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected] Rogério Luiz Feijó Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected] RESUMO. A teoria clássica de adensamento de Terzaghi pressupõe que os recalques de compressão primária ocorrem durante o processo de fluxo transiente, cujo término, teoricamente, se dá num tempo infinito. Do ponto de vista prático, considera-se que porcentagens de adensamento superiores a 90% já podem ser consideradas como limites do processo, visto que os recalques remanescentes são desprezíveis. Em alguns solos, particularmente àqueles com elevado teor de matéria orgânica, a existência de um processo de fluência sob tensão constante é, então, considerada como tendo seu início ao final do recalque primário. Este recalque, denominado secundário, ocorre por uma instabilidade estrutural do arcabouço sólido, fazendo com que as partículas de argila continuem se movimentando. Desta forma as deformações ocorrem sob tensão efetiva constante, contrariando o princípio que deformações só ocorrem quando há variações nas tensões transmitidas ao arcabouço sólido. Taylor e Merchant apresentaram uma teoria de adensamento unidimensional, que incorpora o efeito da compressão secundária e que tem como base os efeitos da viscosidade da água adsorvida. Com isso, as variações volumétricas ao longo do tempo dependem não só das características de compressibilidade, mas também da viscosidade. Este trabalho apresenta a aplicação das teorias de Terzaghi e de Taylor e Merchant na reprodução da curva recalque vs tempo de um aterro instrumentado, executado sobre camada de argila mole, localizado próximo ao rio Sarapuí, na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro. PALAVRAS-CHAVE: Argila mole, Adensamento, Aterro, Solo compressível. 1 INTRODUÇÃO A teoria clássica de adensamento de Terzaghi e Frolich (1936) pressupõe que, após os recalques de compressão primária, devidos à dissipação dos excessos de poro-pressão gerados na construção, inicia-se um novo processo de recalque, denominado secundário. Segundo Terzaghi, uma vez que o recalque secundário está associado a uma condição de tensão efetiva vertical constante, as deformações são atribuídas ao mecanismo de fluência. Seu valor é estimado exclusivamente em função do tempo e geralmente considera-se, para fins de projeto, o período correspondente à vida útil da obra. O presente trabalho tem como objetivo apresentar uma forma alternativa de analisar o fenômeno do recalque secundário, de prever sua magnitude e evolução no tempo. Esta metodologia será aplicada ao aterro experimental executado na argila de Sarapuí, Rio de Janeiro.

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Retro-análise da curva recalque vs tempo utilizando as teorias de Terzaghi e de Taylor e Merchant - CARNEIRO, 2012

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Retro-análise da curva recalque vs tempo utilizando as teorias de

Terzaghi e de Taylor e Merchant

Raphael Felipe Carneiro

Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected]

Denise Maria Soares Gerscovich

Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected]

Bernadete Ragoni Danziger

Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected]

Rogério Luiz Feijó

Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, [email protected]

RESUMO. A teoria clássica de adensamento de Terzaghi pressupõe que os recalques de compressão

primária ocorrem durante o processo de fluxo transiente, cujo término, teoricamente, se dá num

tempo infinito. Do ponto de vista prático, considera-se que porcentagens de adensamento superiores

a 90% já podem ser consideradas como limites do processo, visto que os recalques remanescentes

são desprezíveis. Em alguns solos, particularmente àqueles com elevado teor de matéria orgânica, a

existência de um processo de fluência sob tensão constante é, então, considerada como tendo seu

início ao final do recalque primário. Este recalque, denominado secundário, ocorre por uma

instabilidade estrutural do arcabouço sólido, fazendo com que as partículas de argila continuem se

movimentando. Desta forma as deformações ocorrem sob tensão efetiva constante, contrariando o

princípio que deformações só ocorrem quando há variações nas tensões transmitidas ao arcabouço

sólido. Taylor e Merchant apresentaram uma teoria de adensamento unidimensional, que incorpora

o efeito da compressão secundária e que tem como base os efeitos da viscosidade da água

adsorvida. Com isso, as variações volumétricas ao longo do tempo dependem não só das

características de compressibilidade, mas também da viscosidade. Este trabalho apresenta a

aplicação das teorias de Terzaghi e de Taylor e Merchant na reprodução da curva recalque vs tempo

de um aterro instrumentado, executado sobre camada de argila mole, localizado próximo ao rio

Sarapuí, na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro.

PALAVRAS-CHAVE: Argila mole, Adensamento, Aterro, Solo compressível.

1 INTRODUÇÃO

A teoria clássica de adensamento de Terzaghi e

Frolich (1936) pressupõe que, após os recalques

de compressão primária, devidos à dissipação

dos excessos de poro-pressão gerados na

construção, inicia-se um novo processo de

recalque, denominado secundário.

Segundo Terzaghi, uma vez que o recalque

secundário está associado a uma condição de

tensão efetiva vertical constante, as

deformações são atribuídas ao mecanismo de

fluência. Seu valor é estimado exclusivamente

em função do tempo e geralmente considera-se,

para fins de projeto, o período correspondente à

vida útil da obra.

O presente trabalho tem como objetivo

apresentar uma forma alternativa de analisar o

fenômeno do recalque secundário, de prever sua

magnitude e evolução no tempo. Esta

metodologia será aplicada ao aterro

experimental executado na argila de Sarapuí,

Rio de Janeiro.

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2 TEORIAS DE ADENSAMENTO

2.1 Analogia mecânica de Terzaghi

Segundo Terzaghi e Frolich (1936), a

compressão ocorre exclusivamente pela

variação das tensões efetivas. No clássico

modelo, mostrado na Figura 1, o solo saturado é

representado por uma mola, envolta por água,

sendo o fluxo controlado por uma válvula. No

instante em que o carregamento é aplicado,

inicia-se a expulsão da água através dos vazios

do solo. Se as deformações laterais estiverem

impedidas (carregamentos considerados

infinitos), o acréscimo de poro-pressão no

instante inicial corresponde a todo o acréscimo

de tensão vertical. No caso das deformações

laterais permitidas (carregamentos finitos),

parte do carregamento é suportada pela água e

parte pelos grãos, causando variação da tensão

vertical efetiva instantaneamente e, como

conseqüência, recalque imediato.

Figura 1. Analogia hidromecânica. (a) Modelo real; (b)

Modelo físico; (c) Carga aplicada com a válvula fechada

(t=0); (d) Após abertura da válvula (t0+); (e) Situação

final de equilíbrio.

De uma forma ou de outra, ao longo do

processo de fluxo, o excesso de poro-pressão é

dissipado, resultando em aumento da tensão

efetiva vertical. Conforme a água é expulsa do

solo, o índice de vazios diminui e o recalque,

dito primário, ocorre. Teoricamente, este

fenômeno, conhecido como adensamento,

apresenta duração infinita, ou seja, a

transferência do acréscimo de pressão na água

para o solo não possui um instante final. Por

isso, em projetos de engenharia admite-se que o

recalque primário está praticamente findado ao

atingir 90% de sua magnitude. Neste momento,

considera-se que o recalque secundário começa

a se manifestar. Como as tensões efetivas

verticais já foram dissipadas, Terzaghi atribui o

recalque secundário ao rearranjo gradual dos

grãos, de forma que o solo encontre uma

configuração mais estável. Esta explicação

contradiz o próprio princípio de Terzaghi, que

diz só haver recalques em presença de variação

de tensões efetivas.

2.2 Proposta de Lacerda e Martins (1985)

Lacerda e Martins (1985) propuseram uma

teoria na qual a compressão secundária também

acontece por variações na tensão efetiva. Neste

caso, a tensão efetiva vertical permanece

constante enquanto a horizontal cresce,

tendendo a se igualar com a vertical; isto é,

fazendo com que k0 tenda a 1.

A partir desta premissa, os efeitos da

compressão secundária teriam uma duração

limitada, a qual estaria associada a uma

trajetória iniciada na curva de adensamento

primário e finalizada na curva paralela à linha

de compressão virgem, como mostra a Figura 2.

Nesta figura, caso as tensões efetivas verticais

sejam superiores à observada no ponto C (por

exemplo, pontos A e B), a trajetória de

compressao secundária será descendente até

encontrar a linha k0 = 1; ou seja, haverá redução

de índice de vazios para um valor de ’v

constante. Por outro lado, caso o solo seja muito

pré-adensado (pontos D e E), a trajetóra de

compressao secundária será de expansão e

haverá redução da tensão efetiva horizontal.

De acordo com os autores, é possível estimar

os recalques primário (trecho AC) e secundário

(trecho CD) em função dos parâmetros cc e cr

(Figura 3); ou melhor:

e

0

0s

e1

Hρ (1)

onde H0 é a espessura da camada, e0 o índice de

vazios inicial e e a variaçao do índice de

vazios.

No caso de recalque primário, e pode

decorrer de três situações: se o carregamento

inicia no trecho de recompressão e ultrapassa a

tensão de pré-adensamento σ’vm; se o

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carregamento inicia no trecho de recompressão

e não ultrapassa da tensão de pré-adensamento

σ’vm; e se o carregamento inicia no trecho de

compressão virgem.

Figura 2. Relações e x σ′v considerando compressão e

expansão secundárias.

2.3 Cálculo dos recalques

Para o cálculo do recalque secundário,

define-se o termo OCRsec, como a razão de pré-

adensamento para fins de cálculo do

adensamento secundário em relação à linha do

adensamento primário (Equação 2).

vf

vssec

σ'

σ'OCR (2)

Figura 3. Modelo para estimativa do recalque total.

A variação do índice de vazios

correspondente ao recalque secundário é

calculada subtraindo as variaçoes nos trechos

CE e ED (eCE – eED). Com isso, tem-se:

f

secrc

0

0s

OCR

OCRlog cc

e1

Hρ (3)

onde OCRf é a razão de adensamento final, dada

por:

vf

vmf

σ'

σ'OCR (4)

Caso a tensão final se encontre na curva de

compressão virgem, OCRf é igual a 1 e a

equação (3) passa a ser:

secrc

0

0s OCRlog cc

e1

(5)

3 EVOLUÇÃO DOS RECALQUES NO

TEMPO

A porcentagem de adensamento (U) proposta na

teoria do adensamento de Terzaghi e Frolich

permite estimar a curva carga x recalque,

considerando-se exclusivamente a magnitude

do recalque primário.

Para o recalque secundário, este se inicia ao

final do primário e sua evolução no tempo é

estimada assumindo-se uma relação constante

entre o índice de vazios e o logaritmo do tempo

(Figura 4). No entanto, é razoável supor que,

na pratica, ao contrario da teoria de Terzaghi, o

recalque secundário ocorre simultaneamente ao

adensamento primário.

Figura 4. Gráfico recalque vs tempo.

Trajetórias de compressão secundária

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A teoria de Taylor e Merchant (1940) é capaz

de descrever a evolução dos recalques, já

considerando o recalque secundário, através de

uma equação diferencial mais complexa que a

de Terzaghi (Equação 6).

Tψψ

321

0m

TM21e1ψψψ[

FM²

11U

]e1ψψψ

Tψψ

32121 (6)

onde os parametros da equação são definidos

como

..0,1,2,3,4.m;2

π12mM

2

d

v

H

tcT

v

2

d

rc

μHF

ρ

ρρ

ρr

t

p

sp

p

M²F2

1ψ1

4rFM²²M²F2

1ψ2

2

13

ψ

M²ψψ

Revisada por Christie (1965), a equação

conta com mais parâmetros a serem calculados,

embora com formato similar à tradicional. Há a

introdução do termo , denominado

“coeficiente de compressão secundária”, que

representa a consideração do efeito de

viscosidade do solo, causado pela água

adsorvida que envolve as partículas de argila

(Andrade, 2009).

O termo r é a razão entre o recalque primário

e o recalque total, necessariamente menor ou

igual a 1 (compressão secundária). Se for o caso

de expansão secundária, a equação não pode ser

aplicada. Quando r é igual a 1, o recalque

primário é igual ao recalque total, ou seja, o

recalque secundário é nulo. Neste caso, a

expressão se reduz e se torna idêntica à

porcentagem de adensamento da teoria de

Terzaghi.

O fator F seria proporcional à razão entre as

velocidades das compressões secundária e

primária. Taylor & Merchant (1940) descrevem

que, enquanto a velocidade do adensamento

primário é inversamente proporcional ao

quadrado da altura de drenagem, a velocidade

do adensamento secundário é diretamente

proporcional ao termo e independe da altura

de drenagem. Assim, para ensaios de

laboratório convencionais, pelo fato da altura de

drenagem ser muito pequena (1 cm), o valor de

F seria bastante reduzido. Martins (2008)

descreve que esse valor é da ordem de 10-4

, o

que implicaria em um valor de da ordem de

10-8

a 10-7

.

4 CASO ANALISADO

4.1 Descrição do local

Localizado às margens do rio Sarapuí, no Rio

de Janeiro, o depósito argiloso é provavelmente

o mais estudado do país. O DNER/IPR realizou,

com o auxílio de instituições de pesquisa, vários

estudos na região, que incluíram a construção

de aterros experimentais.

Foram executados dois aterros, tendo o

primeiro sido levado à ruptura em 1977

(Ortigão, 1980). O segundo aterro teve sua

execução iniciada em 1978 (DNER/IPR, 1980)

e foi designado para futura avaliação de

recalques.

A espessura da camada de argila varia em

torno de 11 metros e está assente sobre camada

de areia fina (Ortigão, 1980).

Dividido em sete seções, nomeadas de A a

G, o Aterro Experimental II foi construído parte

sobre drenos verticais de areia e parte sem

drenos. A seção A, cujos dados foram utilizados

para este trabalho, foi construída sem drenos. A

Figura 5 apresenta as características

geométricas desta seção.

4.2 Parâmetros geotécnicos

Almeida et. al. (2005) reuniram diversos dados

resultantes dos estudos na região. A compilação

dos principais parâmetros geotécnicos foi

resumida na Tabela 1 e os valores de tensões

iniciais, tensões de pré-adensamento, bem como

as respectivas razões de sobreadensamento,

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estão apresentadas na tabela 2. Os valores são

referentes ao centro de cada subcamada, de tal

modo que é possível perceber o quão baixo é o

peso específico da argila encontrada no local,

em torno de 13 kPa. O nível d’água se situa na

superfície do terreno (Ortigão, 1980).

Figura 5. Seção A do Aterro Experimental II (adaptado

de DNER/IPR, 1980).

Tabela 1. Principais parâmetros geotécnicos.

Profundidade (m) e0 cr cc

0,0 a 1,0 4,10 0,25 2,09

1,0 a 2,0 4,10 0,25 2,09

2,0 a 3,0 4,10 0,25 2,09

3,0 a 4,0 3,97 0,24 2,04

4,0 a 5,0 3,76 0,23 1,95

5,0 a 6,0 3,55 0,22 1,86

6,0 a 7,0 3,34 0,21 1,78

7,0 a 8,0 3,13 0,20 1,69

8,0 a 9,0 2,92 0,19 1,61

9,0 a 10,0 2,71 0,18 1,52

10,0 a 10,5 2,55 0,17 1,45

4.3 Estudos sobre a compressão secundária

Feijó e Martins (1993) realizaram ensaios

oedométricos de longa duraçao, impondo

diferentes valores de OCR nas amostras ao fim

do adensamento primário, e observaram a

variação do índice de vazios. Os valores de

OCR estao mostrados na Tabela 3, em conjunto

com a estimativa do valor de ko, feita com base

na Equação 7, proposta por Mayne e Kulhawy

(1982). Admitindo um ângulo de atrito igual a

25º, os autores chegaram a valores de k0 para

cada amostra analisada variando entre 0,7 a 1,7.

senφ

0 OCRsenφ1k (7)

Tabela 2. Tensões efetivas iniciais e de pré-adensamento. Profundidade (m) ’v0 ’vm OCR

(kPa) (kPa)

0,0 a 1,0 1,35 8,02 5,94

1,0 a 2,0 4,05 13,89 3,43

2,0 a 3,0 6,75 17,93 2,66

3,0 a 4,0 9,52 21,37 2,24

4,0 a 5,0 12,55 24,85 1,98

5,0 a 6,0 15,87 28,42 1,79

6,0 a 7,0 19,46 32,06 1,65

7,0 a 8,0 23,34 37,34 1,60

8,0 a 9,0 27,49 43,99 1,60

9,0 a 10,0 31,93 51,08 1,60

10,0 a 10,5 35,44 56,70 1,60

Tabela 3. Estimativa do valor de k0 (Martins et

al.,1997)

Amostra 'vm 'v OCR k0

(kPa) (kPa)

2CP1 150 100 1,5 0,69

2CP2 200 100 2 0,77

2CP3 400 100 4 1,04

2CP4 600 100 6 1,23

2CP5 800 100 8 1,39

2CP6 1200 100 12 1,65

Os resultados de 200 dias de monitoramento

mostraram que as amostras com k0 menor do

que 1 apresentaram compressão secundária e as

amostras com k0 maior do que 1 expandiram; a

amostra com k0 igual a 1 manteve seu volume

inalterado (Figura 6).

Qualitativamente, para valores de k0 entre

Argila mole

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0,80 e 1,20, a variação de volume foi

irrelevante. Com isso, Feijó e Martins (1993)

concluíram que existe uma faixa para a Argila

de Sarapuí, entre os OCRs 2 a 6, de compressão

secundária desprezível (figura 7).

Figura 6. Comportamento da Argila do Sarapuí após

descarregamento ao fim do adensamento primário (Feijó

e Martins, 1993).

Figura 7. Zona de equilíbrio indiferente para a argila de

Sarapuí (Feijó e Martins, 1993).

Nos ensaios de laboratório, a compressão

primária ocorre em um tempo muito reduzido.

Como a curva tensão efetiva x índice de vazios

é traçada após 24h, o recalque verificado não é

apenas relativo à compressão primária, mas

também compreende parte da compressão

secundária. Com isso, Martins (2008)

recomenda considerar 1,6 como o OCR para o

fim da compressão secundária, pois uma parcela

deste recalque já aconteceu durante esse

período de recalque primário.

4.4 Monitoramento dos recalques no campo

A tabela 4 reproduz as leituras de requalque,

realizadas a partir de três placas de recalque (R)

e de um extensômetro magnético vertical (EM),

dispostos no eixo do aterro (DNER/IPR, 1980).

As medições dos recalques iniciaram dois

meses após o início da construção do aterro,

quando a altura de cada seção era cerca de 1

metro, e se estenderam por 41 meses.

Tabela 4. Resultado das medições de recalque

Leitura Recalques medidos (cm)

R-3 R-13 R-12 EM-1

0 0,0 0,0 0,0 0,0

1 4,6 3,5 1,5 7,3

2 7,7 5,9 6,9 8,3

3 10,8 8,4 8,4 13,4

4 13,1 10,5 10,5 14,5

5 14,7 12,0 12,1 16,4

6 16,6 13,7 13,1 18,0

7 17,4 14,5 13,9 19,2

8 20,0 16,0 15,5 21,0

9 20,9 18,8 16,9 22,5

10 23,3 21,2 18,2 25,0

11 25,9 24,8 21,0 28,2

12 31,5 30,3 25,6 33,0

13 36,0 33,0 29,0 36,4

14 38,0 36,5 31,9 39,3

15 40,1 38,3 34,1 41,6

16 42,6 40,7 37,1 43,8

17 44,6 42,7 39,5 45,8

18 46,4 45,0 41,5 49,0

19 48,2 46,3 43,7 50,2

20 50,5 48,4 46,3 52,8

21 52,0 49,9 48,1 54,4

22 53,0 50,9 49,4 56,0

23 54,0 52,5 51,0 57,0

24 55,7 53,5 52,5 57,5

25 56,5 55,0 53,5 59,6

26 58,0 57,0 55,5 60,5

27 59,0 58,0 56,5 61,5

28 60,0 59,0 57,5 62,0

29 61,0 60,0 58,5 63,0

30 62,0 61,0 59,5 64,6

31 63,0 61,5 60,5 65,2

32 64,0 62,5 61,5 66,1

33 65,0 63,5 62,0 67,0

34 66,0 64,0 63,0 68,0

35 67,0 65,0 64,0 69,0

36 68,0 66,0 64,5 70,0

37 69,0 67,0 65,2 71,0

38 69,9 68,0 66,0 72,0

39 70,6 68,5 66,9 73,2

40 71,8 69,2 67,7 74,5

41 72,2 70,0 68,5 75,1

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5 RESULTADOS OBTIDOS

Para o cálculo do recalque primário adotou-se

que o aterro seria associado a um modelo de

carregamento finito; isto é, o excesso de poro-

pressão a ser dissipado foi calculado utilizando-

se a equação de Skempton (equação 10).

Adotou-se para o parâmetro B o valor 1

(saturado) e os valores do parâmetro A foram

obtidos de Ortigão (1980).

)](AB[u 313 (10)

Através das equações da Teoria da

Elasticidade (Poulos e Davis, 1974) para a

condição de carregamento semi-infinito, foram

calculados os acréscimos de tensão 1 e 3, causados pelo aterro, dividindo-se a espessura

da argila em subcamadas. O aterro foi

aproximado para uma seção de largura 31,42m,

com peso específico de 18,4 kN/m³, que, para

uma altura de 1,79 m, resulta numa sobrecarga

de 32,94 kPa. Os resultados estao mostrados na

Tabela 5.

Tabela 5. Cálculo do acréscimo de poro-pressão.

Z z x A u

(m) (rad) (rad) (kPa) (kPa) (kPa)

0,5 3,1 1,5 32,9 31,6 0,2 31,9

1,5 3,0 1,5 32,9 29,0 0,28 30,1

2,5 2,8 1,4 32,9 26,4 0,3 28,3

3,5 2,7 1,4 32,8 23,9 0,33 26,8

4,5 2,6 1,3 32,6 21,5 0,4 26,0

5,5 2,5 1,2 32,4 19, 0,5 25,9

6,5 2,4 1,2 32,1 17,3 0,5 24,7

7,5 2,3 1,1 31,7 15,4 0,6 25,2

8,5 2,1 1,1 31,3 13,8 0,6 24,3

9,5 2,1 1,0 30,8 12,2 0,65 24,3

10,25 2,0 1,0 30,4 11,2 0,65 23,7

A Tabela 6 resume os recalques primário e

secundário, estimados em cada subcamada,

sendo considerado OCRsec igual a 1,6.

A parcela de recalque primário foi de 1,10m

e de secundário de 0,78m. Cabe ressaltar que os

efeitos do recalque imediato foram

desconsiderados neste trabalho.

A previsão da curva recalque x tempo foi

feita considerando-se o recalque total de 1,88m

e a equação 6, proposta por Taylor e Merchant

(1940). Para tal, foi criada uma planilha Excel

com uma curva equivalente à encontrada,

utilizando os parâmetros da subcamada central

e um carregamento próximo ao real de modo a

obter os mesmos recalques encontrados. Para o

valor de , adotou-se 10-7

. Considerando as

leituras de recalque apresentadas na tabela 4

para os últimos meses verificados, foi aqui

encontrado um valor de cv, por retro-análise, de

aproximadamente 5,0 x 10-8

m/s². A tabela 7

apresenta os dados utilizados.

Tabela 6. Cálculo dos recalques para cada

subcamada.

Z primário secundário total

(m) (m) (m) (m)

0,5 0,291 0,074 0,365

1,5 0,186 0,074 0,260

2,5 0,140 0,074 0,214

3,5 0,114 0,076 0,190

4,5 0,092 0,074 0,166

5,5 0,080 0,074 0,154

6,5 0,068 0,074 0,141

7,5 0,057 0,074 0,130

8,5 0,039 0,074 0,113

9,5 0,027 0,074 0,101

10,25 0,009 0,037 0,045

TOTAL 1,10 0,78 1,88

Tabela 7. Dados utilizados na elaboração da curva

de Taylor e Merchant.

Dados de entrada Dados de saída

H0 (m) 10,50 primário (m) 1,104

e0 3,55 secundário (m) 0,773

nº de camadas

drenantes 2 total (m) 1,88

Cc 1,86

t

p

sp

p

ρ

ρ

ρρ

ρr

59%

Cr 0,22

'v0 (kPA) 15,87 2d

v

H

tcT 93,7

'vm (kPA) 28,42

'v (kPA) 32,1 95% do p (meses) 240

cv (x 10-8

m²/s) 5,0

(x 10-7

) 1 95% do t (meses) 408

OCRsec (24 h) 1,6

O gráfico comparativo entre os recalques

medidos e o calculado pode ser observado na

figura 9. É possível perceber que as curvas

praticamente se coincidem após certo período

de tempo (no caso em questão, este período é de

aproximadamente 400 dias). Para tempos

Page 8: Retro-Análise Da Curva Recalque vs Tempo Utilizando as Teorias de Terzaghi e de Taylor e Merchant - CARNEIRO, 2012

inferiores, a curva calculada apresenta

resultados de magnitude maior. Isto

provavelmente está relacionado ao fato de o

aterro ter sido construído em camadas, em vez

de instantaneamente. As leituras dos recalques

se iniciaram quando o aterro atingiu a altura de

cerca de 1 metro, sendo sua altura total de

1,79m. A correção gráfica de Terzaghi-Gilboy,

para casos como este, pode ser uma boa

alternativa.

Figura 9. Comparativo entre os recalques.

6 CONCLUSÕES

É possível perceber que, para a argila de

Sarapuí, é fundamental o cálculo dos recalques

secundários.

No caso analisado, a parcela de adensamento

secundário equivale a 70% do recalque

primário, o que corresponde a 41% do total.

Desprezá-la implica em um erro, neste caso, de

quase 80 centrímetros.

A proposta de Martins e Lacerda para cáculo

dos recalques primário e secundário, associada

à teoria de Taylor e Merchant, mostrou-se

adequada para previsao da curva carga x

recalque.

Apesar da aparente complexibilidade, a

expressão de Taylor e Merchant torna-se

bastante simples, visto que alguns parâmetros

podem ser reduzidos e que se podem efetuar os

cálculos através de planilhas eletrônicas.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à FAPERJ e ao CNPq

pelo apoio financeiro ao projeto.

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