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REVISÃO DE OFÍCIO DO LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO

“UM DEVER LEGAL”

Autor: Miqueas Liborio de Jesus Fiscal de Tributos do Município de Joinville – SC

[email protected] Reza o “ Princípio da Legalidade Objetiva ” , que a Autoridade

Administrativa deve sempre aplicar a lei de ofício, pois, seu próprio ofício, é o de cumprir e fazer cumprir a lei, de modo objetivo e desinteressadamente, uma vez que não defende um direito subjetivo e nem resguarda interesse próprio, mas pelo contrário, age para fazer valer a lei, em face do interesse público .

Ao cumprir a lei, a Autoridade Administrativa age no sentido de convalidar

o devido processo legal, insculpido no bojo constitucional como uma das garantias individuais do cidadão e da coletividade, posto que este impõe ao Administrador Público a necessidade de observar os rigores legais, retirando deste a voluntariedade, cercando-o de limites e comandos a serem seguidos, sob pena de falência dos atos praticados , cabendo a própria Administração revê-los e decretar sua nulidade, quando desgarrado do comando legal.

Sobre esse assunto, escreveu o Mestre Hely Lopes Meirelles1:

"A Administração Pública, como instituição destinad a a realizar o Direito e a propiciar o bem comum, não p ode agir fora das normas jurídicas e da moral administrativa , nem relegar os fins sociais a que sua ação se dirige. S e, por erro, culpa, dolo ou interesses escusos de seus age ntes, a atividade do Poder Público desgarra-se da lei, divo rcia-se da moral ou desvia-se do bem comum, é dever da Administração invalidar, espontaneamente ou mediant e provocação, o próprio ato, contrário à sua finalida de, por inoportuna, inconveniente, imoral ou ilegal. " (grifo nosso)

Na mesma esteira, afirma que:

“a anulação dos atos administrativos pela própria Administração constitui a forma normal de invalidaç ão de atividade ilegítima do Poder Público. Essa faculdad e assenta no poder de autotutela do estado. É uma jus tiça interna, exercida pelas autoridades administrativas em

1 In Direito administrativo brasileiro. 21a. ed. São Paulo, Malheiros Editores, 02/1996, p. 183

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defesa da instituição e da legalidade de seus atos .”2 (grifo nosso)

Doutrinariamente não há controvérsia. Em sede do Poder Judiciário, de tão debatida que foi a matéria, a mesma chegou a sua exaustão, achando-se pacificada sob o pálio das Súmulas n. 346 e 473, emanadas do egrégio Supremo Tribunal Federal, in verbis:

Súmula n.º 346. “A Administração Pública pode declarar a nulidade dos próprios atos .” (grifo nosso)

Súmula n.º 473. “A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os torn em ilegais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos a apreciação judicial ." (grifo nosso)

Sob a ótica do direito administrativo não resta duvidas quanto à

obrigatoriedade de anulação ou modificação do ato administrativo praticado, quando eivado de vícios que o torne imprestável ao fim a que se destina.

Diante disso, há de se registrar que o lançamento tributário é um ato

administrativo vinculado, assim entendido, aquele para o qual a lei estabelece os requisitos e condições para sua realização. Nessa categoria, as imposições legais estão previstas no art. 142 da Lei Federal nº 5.172/66 (Código Tributário Nacional – CTN), as quais absorvem por completo a liberdade da Autoridade Fiscal, uma vez que sua ação fica adstrita aos pressupostos estabelecidos no citado dispositivo, como requisito essencial para a validade da exigência do crédito tributário.

A Magna Carta ao delimitar o universo de tributos a serem arrecadados

pelos entes estatais impõe a máxima observância de inúmeros critérios intrínsecos, extrínsecos e intransponíveis, impondo ao Estado e ao Administrador Público a máxima obrigatoriedade de se cobrar (arrecadar) dos administrados, única e exclusivamente, o que está estabelecido nas normas instituidoras dos tributos; ou seja, nem mais e nem menos. Quaisquer atos contrários a esses ditames são nulos de pleno direito.

Neste escorço, ao efetuar o lançamento tributário, sob os rigores do

supracitado art. 142 , a Autoridade Fiscal diligente tem o dever de buscar a conformação do ato segundo as exigências legais (pressuposto de sua existência e validade), “assim entendido, a execução dos procedimentos tende ntes a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tribut o devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da pena lidade cabível”.

Inobservados alguns desses critérios, o ato praticado (lançamento)

apenas se travestirá de manifestação regular do poder estatal, mas não se 2 Ob cit, p. 190

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aperfeiçoará por estar maculado, tornando-se imprestável, devendo de plano ser alterado ou mesmo anulado.

Sobre a alteração do lançamento regularmente notificado, dispõe o art.

145 do C.T.N.:

Art. 145. O lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo só pode ser alterado em virtude de: I - impugnação do sujeito passivo; II – recurso de ofício; III – iniciativa de ofício da autoridade administrativa, nos casos previstos no artigo 149.

De uma análise apurada do referido artigo verifica-se que o rol de opções

é taxativo e encerra três hipóteses possíveis, inexistindo qualquer preferência de uma sobre a outra, ou seja, a norma não impõe obrigatoriamente que o crédito tributário somente seja alterado via impugnação do sujeito passivo; pelo contrário, a impugnação do sujeito passivo é uma das hipóteses que pode ensejar a modificação do lançamento, ou melhor, do crédito tr ibutário lançado.

O citado artigo é categórico ao elencar a alteração do crédito tributário,

via “ex-ofício”, desde que observadas as hipóteses do art. 149, in verbis:

Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos: (nosso destaque)

I – quando a lei assim o determine;

II – quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária;

III – quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade;

IV – quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória;

V – quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte;

VI – quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária;

VII – quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;

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VIII – quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior; (nosso destaque)

IX – quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade essencial.

Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública.

Ao efetuar a revisão de ofício do lançamento tributário, a Autoridade

Fiscal age no estreito cumprimento de um dever legal, qual seja, de primar pela correta aplicação da norma tributária, nos estreitos limites do princípio da legalidade, onde a Autoridade Administrativa não age imbuída de vontade própria, mas, outrossim, por impulso legal .

Ao agir de ofício, a Autoridade Fiscal valida o primado no Principio da

Eficiência insculpido no “caput” do art. 37 da Magna Carta, sobre o qual escreve Professor Alexandre de Moraes3:

(...) princípio da eficiência é aquele que impõe a Administração Pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativ a, eficaz, sem burocracia e sempre em busca de qualidade, primando pela adoção de critérios legais e morais necessários para a melhor utilização possível dos r ecursos públicos, de maneira a evitar-se desperdícios e gar antir-se uma maior rentabilidade social . Note-se que não se trata da consagração da tecnocracia, muito pelo contrário, o princípio da eficiência dirige-se para a razão e fim maior do Estado, a prestação de serviços sociais à população, visando a adoção de todos os meios legais e morais possíveis para a satisfação do bem comum. (nosso destaque)

Conclui-se que é dever de toda e qualquer Autoridade Administrativa

revisar e anular os atos administrativos quando estes se achem maculados por vícios (formais ou materiais), que os tornem imprestáveis à manifestação regular da vontade estatal.

Em matéria tributária, o dever de revisar e modificar o ato administrativo

viciado é ainda mais premente, posto que sua natureza, por ser de ordem pecuniária, pode levar a Administração Fazendária a uma aventura insólita que poderá resultar em prejuízo ao erário público, visto que a decretação da nulidade via ação judicial, acarretará verbas de sucumbência em proveito do sujeito passivo.

3 in Direito constitucional. 14a. ed., São Paulo, Atlas 2003, pág. 317.