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03REVISTA CONECTA

SUMÁRIO

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carta ao leitor

16Brasil inovativoEsforços são premiados

20Pesquisa, desenvolvimento e inovaçãoRelação universidade-empresa:uma parceria que pode dar certo

24spin-offsHistórias que inspiram

31PIT nas ICTs paulistasPrograma representa esforço paraaproximar instituições e mercado

28Bruno Moreira e Roberto A. LotufoA metodologia do Programa deInvestigação Tecnológica

44Robert F. BinderFontes de investimentoem capital de risco

64Abraham Sin Oih Yo e Paulo Brito Moreira de AzevedoValoração de tecnologias: questões chaves para aplicação

34casesArquitetura e Urbanismo

06entrevistaJoão FurtadoLegislação deve ajudar política de soluções para problemas nacionais

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Acústica

Amostra das tecnologias analisadas pelo PIT-SPLista de Tecnologias

artigosDiógenes Feldhaus e Victor FernandesOpen Inovation: nova roupagem para conceitos já estabelecidos

82dicas de livros

11reportagensSistema Nacional de InovaçãoInovação no Brasil: a distânciaentre esforços e resultados

42Física

47Engenharia Mecânica

50Engenharia Sanitária

52Engenharia Química

58Química

59Farmácia

68Engenharia de Alimentos

70Biotecnologia

74Agronomia

76Genética

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EXPEDIENTE

REDAÇÃO

EDITOR CHEFE

Carlos Vogt

EDITORA EXECUTIVA

Simone Pallone

EDITORA ASSISTENTE

Patrícia Mariuzzo

REPÓRTERES

Daniela Lot, Fábio Reynol, Flávia Gouveia, Flavia Natércia, Gabriela Di Giulio, Marta Kanashiro,

Michela de Paulo, Patrícia Mariuzzo, Sara Nanni, Susana Dias

COLABORADORES

Fernando Petermann (fotos), Companhia de Comunicação (arte),

Wanda Jorge (projeto editorial e revisão de provas finais)

REVISÃO

Daisy Silva de Lara

FOTO DA CAPA

Randy Faris/CORBIS/LatinStock

PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO

Fabiana Pacola Ius / Neo Arte

IMPRESSÃO

Gráfica Editora Modelo Ltda. - Campinas/SP

LABJOR

Universidade Estadual de CampinasCidade Universitária Zeferino Vaz, s/n

Prédio V da Reitoria, 3º piso - Campinas - SP - CEP 13083-970Tel. (19) 3289-3120 Fax (19) 3521-7857

e-mail: [email protected]

PROGRAMA DE INVESTIGAÇÃO TECNOLÓGICA - SÃO PAULO

www.pit-sp.org.br

COMITÊ GESTOR DO PITAngela Cristina Azanha Puhlmann

Oswaldo MassambaniRoberto de Alencar Lotufo

Sérgio R. R. de Queiroz

GERENTES DO PITClaudio Fuentes (IPT),

Janaína César (Unicamp),José Ricardo Mendonça (USP), Leopoldo Zuaneti (Unesp) e

Rodolfo Politano (Ipen)

COORDENADORES DA PUBLICAÇÃO

Bruno MoreiraLívia Fioravanti

Cartas e mensagens eletrônicas devem ser enviadas para Instituto Inovação

Av. Dr. Romeu Tórtima, 699 - Cidade Universitária Campinas - SP - CEP 13084-791

e-mail: [email protected]

A revista Conecta é uma publicação elaborada pelosNúcleos de Inovação Tecnológica do Ipen, IPT, Unesp,

Unicamp e USP e pelo Instituto Inovação como parte das atividades de divulgação do Programa de

Investigação Tecnológica de São Paulo (PIT-SP).

04REVISTA CONECTA

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05REVISTA CONECTA

VVVacina contra salmonelose, radiofármaco para tratamen-

to de câncer, chocolate de cupuaçu, mini-estação para tratamento

de esgoto, herbicida menos poluente, plásticos biodegradáveis,

estas são algumas das tecnologias que foram analisadas pelo

Programa de Investigação Tecnológica de São Paulo (PIT-SP),

metodologia desenvolvida pela Unicamp em parceria com o

Instituto Inovação e conduzida pelos Núcleos de Inovação

Tecnológica (NITs) das três universidades públicas do estado

e dois institutos de pesquisa — Unicamp, Unesp, USP, Ipen e

IPT. A metodologia baseada na Diligência da Inovação ®e adap-

tada para o ambiente dos NITs, visa encontrar entre as diver-

sas tecnologias desenvolvidas nessas instituições de ensino e

pesquisa, quais delas apresentam maior potencial para entrar

no mercado.

Existem três características que tornam este programa estru-

turante e único: 1) formação de recursos humanos para ges-

tão da inovação, pois são os alunos bolsistas, na maioria per-

tencentes a cursos de graduação, que fazem a investigação den-

tro de um processo de supervisão e treinamento; 2) difusão da

cultura de inovação nas ICTs — Instituições Científicas e

Tecnológicas, pois informações de mercado e de negócios são

discutidas junto aos grupos de pesquisa; 3) implementação de

uma metologia de gestão para os NITs no suporte à prospec-

ção, proteção, valoração e comercialização dos resultados de

pesquisas das ICTs.

A Lei de Inovação de 2004 traz grande ênfase para estí-

mulo ao desenvolvimento científico e tecnológico nas ICTs,

definindo o NIT como responsável pela gestão da política de

inovação. Existem ainda poucos instrumentos e metodologias

difundidas para que esses núcleos venham a cumprir o seu

papel. Este programa pode servir de exemplo a ser estimulado

pelos órgãos governamentais de C, T & I e seguido por outros

NITs do país.

A aproximação entre instituições científicas e o setor

industrial torna-se cada vez mais imperativa, no contexto de

uma economia mais competitiva a cada dia, na qual a ino-

vação tecnológica encontra lugar de destaque. E para isso

o estímulo vem sendo gerado em forma de novas leis, finan-

ciamentos, capacitação de recursos humanos e, por que

não dizer, divulgação, como a que encontramos por meio

desta revista, e também de eventos, como o Conecta, que

em sua segunda edição pretende mostrar não apenas os

resultados do PIT-SP, mas de todo o conjunto de incenti-

vos à inovação que teve grande impulso a partir dos anos

1990 e que ao mesmo tempo que começa a apresentar resul-

tados, vai se aperfeiçoando e constituindo um novo Sistema

Nacional de Inovação, mais próximo do que deve ser um

sistema capaz de alavancar soluções criativas e inovadoras

para uma sociedade moderna, globalizada, capaz de gerar

mais conhecimento e riqueza.

Angela Cristina Azanha Pulhman Coordenadora do Núcleo de Propriedade Intelectual e Comercializaçãode Tecnologia do IPTOswaldo Massambani Diretor da Agência USP de InovaçãoRoberto de Alencar Lotufo Diretor executivo da Agência de Inovação Inova Unicamp

...A aproximação entre instituições científicas e o setor industrial torna-se cada vez mais imperativa, no contexto

de uma economia mais competitiva a cada dia, na qual a inovação tecnológica encontra lugar de destaque....

CARTA AO LEITOR

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Legislação deve ajudar política desoluções para problemas nacionais

Com uma trajetória profissional voltada para o tema do desenvol-vimento industrial e tecnológico e da inovação, o economista e pro-fessor João Furtado comenta a Lei de Inovação, suas leis corre-latas e os instrumentos de política de C,T&I no Brasil. Suas opi-niões sobre as ações necessárias para promover a inovação no paíssão marcadas pela preocupação constante com o desenvolvimen-to. Atualmente, Furtado dedica-se à atividade docente na EscolaPolitécnica da Universidade de São Paulo (USP), orienta diversostrabalhos relacionados ao desenvolvimento, é diretor adjunto daFundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp),editor-executivo da Revista Brasileira de Inovação e participa de umconjunto de projetos envolvendo o tema da inovação.

A Lei de Inovação entrou em vigor em 2004. Seus pilares sãoo incentivo ao pesquisador empreendedor e estímulos fis-cais ao investimento empresarial em P&D. Que efeitos podemser atribuídos a ela, no que se refere aos esforços na direçãoda inovação?Em termos de resultados palpáveis, ainda não temos nada muito sig-nificativo. Algumas empresas têm despertado para esses esforços, masos resultados efetivos são entre pífios e muito modestos. Uma políti-ca que não seja turbinada com incentivos de natureza fiscal ou mui-ta pressão regulamentar, como padrões de qualidade, normas técni-cas etc, é incapaz de produzir resultados rapidamente. A Lei deInovação é um pano de fundo que cria algumas possibilidades, masnenhuma delas se torna efetiva sem um certo tempo ou medidascomplementares. O tempo ainda não transcorreu e as medidas com-plementares estão ocorrendo agora. Essas sim são muito vigorosas. A Lei do Bem anunciou uma série de medidas que as empresas esta-vam tateantemente começando a usar, a política anunciada no dia

12 de maio, turbina isso com apoios de natureza fiscal e com certoapoio financeiro por parte do BNDES. Incentivos fiscais de um lado,financeiros de outro, sobre uma base regulamentar adequada, geramefeitos mais vigorosos, sobretudo porque a economia do país estácrescendo, e numa situação em que o câmbio não favorece a prote-ção. E se o câmbio não favorece essa proteção, pelo contrário, abrea economia cada dia mais aos produtos importados, as empresasterão que se defender com saltos de qualidade, produtividade, efi-ciência e inovação.

Que efeitos se pode esperar da Lei de Inovação e suas leiscorrelatas enquanto instrumentos de política?Espera-se uma convergência das empresas brasileiras para uma situa-ção normal no mundo, que é ter ao lado de departamentos de enge-nharia vigorosos das empresas, departamentos de P&D igualmen-te robustos, capazes de colocar na empresa capacidades de desenvolverinternamente soluções e produtos, e também a capacidade de dia-logar com o mundo externo à empresa: outras empresas, fornece-dores, consumidores, institutos e organizações responsáveis pela pro-dução de conhecimento novo. Sem essa estrutura, sua capacidade de avançar se torna muito limi-tada. Então, se espera que as empresas utilizem o conjunto de ins-trumentos da Lei de Inovação e da Lei do Bem para constituíremdepartamentos internos vigorosos, capazes de alavancá-las pelo seupróprio esforço e pelo seu relacionamento com o mundo externo.

Em quanto tempo é possível obter esses resultados?Quando se iniciou o movimento da qualidade no Brasil, no iníciodos anos 90, em resposta às ditas “carroças do Collor”, à indústriade má qualidade, com padrões produtivos deficientes e produtospouco atualizados, ninguém imaginava que os resultados viessem tãorapidamente. Porém foram restritos. Algumas empresas aderirammuito rápido ao esforço, mas a maior parte delas continuou alheia,

REVISTA CONECTA

ENTREVISTA João Furtado

FLÁVIA GOUVEIA

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e nós continuamos a ter uma indústria onde grande parte do teci-do produtivo é deficiente, sem padrões de qualidade, técnicos e deprodutividade adequados. Podemos esperar uma repetição disso. Algumas grandes empresasvão convergir rapidamente, aproveitarão esses estímulos do aparatoinstitucional de natureza fiscal e financeira, sobretudo as que podemusufruir dos benefícios da Lei do Bem e da Lei de Inovação, con-centrados nas empresas que declaram imposto de renda, perto de8% do total de empresas.

Em sua opinião, o que deve ser feito para que os resultadossejam efetivos?O cumprimento dessa tarefa deve considerar estímulos e pressões.A primeira das pressões é suprimir definitivamente a possibilidadede que as empresas consigam existir com base em heterodoxias fis-

cais, trabalhistas etc. Quem é que vai investir em ganhos incremen-tais de unidades de percentuais se pode ter ganhos de dezenas deporcentagem com “maracutaias” fiscais e trabalhistas? Pelo lado dos estímulos é preciso construir um sistema de extensio-nismo industrial e tecnológico, capaz de levar a modernidade paradentro das pequenas e médias empresas. Um estímulo de verdade,que passasse pelo sistema de ensino profissionalizante e pelas uni-versidades, que formam os engenheiros.

Os instrumentos de incentivo à Ciência, Tecnologia e Inovaçãono Brasil (Leis do Bem, de Inovação, de Patentes, deInformática) podem ser considerados parte de uma políti-ca de C,T&I de longo prazo? São eles estímulos integrados,em função de um eixo de orientação para o país, cujos impac-tos ultrapassam mandatos de governo? Os instrumentos são, no máximo, coerentes, mas não constituemum arcabouço bem articulado. A prova disso é que os diferentesorganismos governamentais continuam com um enorme grau de desar-ticulação e são incapazes de construir amarrações em determinadosfóruns. Por exemplo, essa nova política de desenvolvimento anun-cia que o Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico eIndustrial vai ter determinados papéis. Um deles deveria ser o de esti-mular que os organismos cobrassem retorno para os seus investi-mentos, de forma coerente, integrada e articulada, para não acon-tecer de uma empresa ganhar benefícios de vários organismos, se apro-veitar da liberalidade do Estado para receber vantagens e não entre-gar resultados.No caso da política de informática, trata-se de uma política de Estado,com variantes momentâneas. Persiste no Brasil um conjunto de polí-ticas de apoio aos setores de informática, microeletrônica, eletrôni-ca, telecomunicações etc. O setor vive há mais de 30 anos com dife-rentes estímulos, uns mais vigorosos, outros menos, uns mais pere-nes, outros menos, mas se mantém o apoio.

E esse apoio é coerente? Em minha opinião, não. É pouco coerente porque se insiste na idéiade que o mais importante é ter produção local, quando o mais impor-tante é ter capacidade inovadora local e soluções capazes de se tor-narem vencedoras internacionalmente. O complexo eletrônico, detelecomunicações e informática tem que ser reconstruído no Brasilnão do material para o material, mas do imaterial para o material,da solução tecnológica para as bases materiais dessa solução. A maior

07REVISTA CONECTA

Incentivos fiscais de um lado,financeiros de outro, sobre uma

base regulamentar adequada,geram efeitos mais vigorosos,

sobretudo porque a economia dopaís está crescendo

EDUA

RDO

CESA

R/FAP

ESP

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parte dos componentes do complexo eletrônico e informático podeser resumida em dois tipos: inacessíveis ou irrelevantes, commodi-tizados. As soluções inovadoras podem ser construídas com base emcommodities. A criação de valor e riqueza deve estar baseada em soluções quesejam brasileiras para o mundo. O exemplo mais conspícuo disso,de uma solução engenhosa brasileira que poderia ter se tornadomundial e não foi, é a urna eletrônica. Não é preciso ter uma indús-tria eletrônica poderosíssima para fazer artefatos eletrônicos, infor-máticos e de telecomunicações consistentes. A urna eletrônica pode-ria ter sido uma solução brasileira para o mundo e não foi. Não apro-veitamos essa oportunidade. A nossa indústria se formou na idéiade que “primeiro o mercado interno e depois, muito gradualmen-te, o mercado externo”. É um erro pensar dessa forma num mun-do em que os ciclos de vida dos produtos são curtíssimos. Se o Brasilnão aproveita oportunidades como essa visando a escala mundial,um outro país irá aproveitá-la. No caso da urna eletrônica, umaempresa estrangeira aproveitou a oportunidade e comprou a solu-ção brasileira.

A Lei de Inovação pode ser considerada um incentivo hori-zontal, que beneficia todos os setores da mesma forma? Teoricamente sim, mas há empresas que não precisam contratarmestres e doutores para fazerem P&D e desenvolvimento de enge-nharia, enquanto outras precisam. Nesse sentido ela é horizon-tal, mas não beneficia todas as empresas na mesma medida. Umaempresa do setor de móveis ou de plástico não precisa de mestrese doutores. Uma empresa de informática ou de biotecnologia,quase por definição, trabalha com mestres e doutores. Então, ape-sar de ser uma política horizontal, ela estimula diferentemente varia-dos setores.

Quanto às empresas, os mecanismos legislativos beneficiamigualmente empresas de diferentes portes?Não, porque os benefícios fiscais associados à Lei de Inovação e àLei do Bem são, sobretudo, deduções do imposto de renda que exis-tem só para as empresas que declaram imposto de renda, menos deuma em cada dez, praticamente uma em cada vinte. É preciso criarmecanismos fiscais igualmente vigorosos para os 93, 94% das empre-sas que ficaram de fora. E o principal deles deveria ser um mecanismode extensionismo industrial e tecnológico, uma espécie de chequeem branco. Dessa forma, qualquer empresa disposta a gastar em ser-

viços de engenharia, serviços de assistência técnica, encomendas tec-nológicas etc, poderia gastar por meio desse crédito, que funciona-ria exatamente como um cheque em branco. Então, para uma empre-sa de porte pequeno ou médio, contratar serviços para melhorar olayout, reduzir o tempo de desenvolvimento de seus produtos, melho-rar sua eficiência técnica, ou por qualquer outra razão, os recursosdisponíveis teriam de ser equivalentes aos recursos fiscais que hojeestão turbinando a grande empresa. Seria um outro eixo dessa mes-ma política, que reconhecesse o fato de ter ficado de fora a parte maisimportante do tecido industrial brasileiro, que são as pequenas emédias empresas.

A Lei de Inovação atinge as empresas estrangeiras no Brasilde forma diferente em relação às empresas de capital pre-dominantemente nacional?Não, a Lei de Inovação não faz distinção entre empresas de dife-rentes origens. Porém, o que ocorre é que as pequenas e médiasempresas no Brasil são majo-ritariamente nacionais. Emfunção de seu porte, declaramlucro presumido e, conse-qüentemente, não têm acessoaos benefícios da Lei. A maio-ria das empresas estrangeirasopera no Brasil com apuraçãode lucro real e, portanto,podem beneficiar-se dos incen-tivos em proporção relativa-mente maior do que as empre-sas nacionais. Nesse sentido, embora não haja discriminação explí-cita, é como se houvesse, pois a indústria nacional acaba prejudica-da. Isso decorre das diferenças nas formas de declaração de lucro entreempresas nacionais e estrangeiras.

O Brasil possui exemplos de inovações em setores tidoscomo de baixa tecnologia, como bioengenharia ou explo-ração de petróleo em águas profundas. Em sua opinião, apolítica de C,T&I do país deve dar prioridade à inovação nossetores eleitos como high tech, em consonância com polí-ticas alinhadas com as diretrizes internacionais, como é a PIT-CE (que elegeu alguns setores como prioritários ), ou aos seto-res tradicionais?

ENTREVISTA João Furtado

EDUARDO CESAR/FAPESP

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Nem um nem outro. A política deveria utilizar os setores fortes,em que o Brasil é competitivo e em que exista uma forte concor-rência entre as empresas e uma forte concorrência voltada para oaumento da produção, da qualidade, da produtividade, da ino-vatividade, inclusive para conquistar patentes no mercado inter-nacional. O país deveria aproveitar esse amplo tecido produtivo,vigoroso e dinâmico, para vincular-se aos setores internacionalmenteconsiderados inovadores. Desta forma, seria possível desenvolver informática, eletrônica eoutras soluções engenhosas para setores em que o país é forte, comoo agronegócio brasileiro. É possível vincular a mineração brasileiraà eletrônica, é possível utilizar eletrônica, informática, telecomuni-cações e o programa espacial brasileiro para planejar efetivamentesoluções para nossos problemas. O esforço brasileiro de pesquisa edesenvolvimento para a agricultura é mais significativo em termosrelativos do que o esforço brasileiro em alguns dos chamados seto-res tecnologicamente avançados, a exemplo do farmacêutico.

No último World Development Report, há uma estatística que mos-tra que o esforço brasileiro em desenvolvimento científico e tecno-lógico para a agricultura equivale a quase 2% do PIB agrícola, por-tanto muito superior ao investimento que nossa farmacêutica fazem P&D, como percentual do PIB setorial. Isso em termos relati-vos, mas como o setor do agronegócio brasileiro é 30 vezes maior doque o setor farmacêutico, então esse esforço é 50 vezes maior (apro-ximando os números) e muito próximo aos esforços dos principaispaíses desenvolvidos. Só estamos muito atrás do Japão, que gasta3,5% do seu PIB agrícola em P&D. No Brasil, o gasto em P&D agrí-cola passou de 1,2% para 1,8% entre o início dos anos 80 e o finaldos 90. Isso sugere que as políticas deveriam acoplar as áreas clássi-cas de alta tecnologia às áreas tradicionais em que o Brasil se desta-

ca, sobretudo se isso pudesse ser feito por meio de encomendas tec-nológicas de risco do governo – ou por ele intermediadas, utilizan-do-se cheques e créditos fiscais, de forma que as grandes empresas,como Petrobras e Vale do Rio Doce, obtivessem estímulos para trans-feri-los às pequenas e médias. Esta seria uma articulação consisten-te. A Petrobras, desde os núcleos de articulação com a indústria, oschamados NAIs, nos anos 50, foi uma grande construtora de solu-ções industriais e tecnológicas. O país poderia ter centenas de empre-sas nacionais, em diferentes setores, fazendo o mesmo. Os fundosde eletricidade, do petróleo etc, poderiam ser usados deliberada-mente com esse propósito. São usados, mas de forma modesta epouco dinâmica.

O senhor diria que falta essa consciência ao governo?Não falta consciência, mas falta aos organismos públicos aprofun-dar os mecanismos de articulação. A política brasileira continuainsistindo sobre a capacitação da oferta quando ela deveria acentuara demanda. Quais são os setores que podem demandar soluçõesengenhosas, inovadoras, tecnologicamente consistentes para o con-junto do tecido produtivo? São os setores que estão em crescimen-to, setores das competências estabelecidas brasileiras e algumas deinformação. O agronegócio é evidente, mas energia também é, assimcomo as energias renováveis, metal-mecânica...

Além de mecanismos legislativos, quais outros meios o paíspoderia utilizar para promover a produção de conheci-mento e tecnologia inovadores no contexto internacional?A primeira coisa é a identificação de oportunidades nascidas de pro-gramas brasileiros, da multiplicidade cultural brasileira, dos proble-mas sociais, que possam se tornar soluções mundiais. O etanol éum caso exemplar, foi uma solução muito criticada durante 25 anos,e que hoje o mundo cobiça. Entrevistei uma empresa de Piracicabarecentemente e fiz a seguinte pergunta: “quantas vezes vocês ‘mor-reram’?”, ao que eles responderam, “em 1999, nós morremos 365vezes”. O barril de petróleo, que hoje custa quase 120 dólares, cus-tava, em 1999, 12 dólares, um décimo desse valor. Como pode umaindústria, que foi constituída para competir num contexto em queo barril de petróleo custasse 30, 40 dólares, sobreviver com um pre-ço de petróleo a 12? Mas sobreviveu e está aí até hoje. Os conserva-dores sempre dizem o seguinte: “se só tem no Brasil e não é jabuti-caba, é burrada”. O etanol não é jabuticaba, só tem no Brasil e omundo inteiro inveja! A urna eletrônica, a declaração eletrônica

O complexo eletrônico, de telecomunicações e

informática tem que ser reconstruído no Brasil não domaterial para o material, mas do imaterial para o material

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ENTREVISTA João Furtado

do imposto de renda e o Bolsa Família são exemplos promissores.São estímulos que o governo brasileiro conseguiu desenvolver, cria-dores de soluções engenhosas. O terreno mais fértil para a inova-ção deveria ser o das políticas públicas, articulando demandassociais com a engenhosidade do nosso tecido industrial e do apa-relho de pesquisa que o Brasil desenvolveu. O aparato institucio-nal é menos importante do que o uso engenhoso aplicado, dire-cionado e inteligente desse aparelho legislativo. Com pouca legis-lação e muita determinação se faz muito. Apenas com muito apa-relho legislativo não se chega a lugar nenhum.

O senhor acredita que a Lei de Inovação brasileira colocaem risco a qualidade do ensino superior, ao estimular opesquisador a dedicar-se apenas às áreas da ciência compotencial inovador mais imediato, negligenciando a ciên-cia básica?Não, definitivamente. Trabalhar na universidade é ser empreende-

dor e não ser burocrata, dar aula. Há muito tempo os bons pesqui-sadores universitários já se tornaram empreendedores. E se ele é umcientista relevante, ele já terá criado na universidade herdeiros quesaberão pegar o bastão e seguir adiante na corrida. O bom pesqui-sador forma sucessores e é capaz de fazer empreendimentos de natu-reza econômica e comercial fora dos muros universitários, porqueele é relevante. Portanto, não há nenhum problema desse tipo, aocontrário, quanto mais pessoas saírem, mais vínculos entre o mun-do lá fora e o mundo universitário serão criados.

A Lei de Inovação e as outras leis correlatas tiveram maisacertos ou erros? Do ponto de vista legislativo, mais acertos do que erros. Do pontode vista operacional, mais letargia do que efetividade. Todos os meca-nismos institucionais precisam ser operacionalizados de forma vigo-rosa e consistente. Não há problemas do ponto de vista institucio-nal. Há uma operacionalização efetiva ou não.

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11REVISTA CONECTA

Inovação no Brasil: a distância entre esforços e resultados

Mecanismos legislativos e planos de incentivo refletem a preocupação do governo com o tema, mas a construção de um sistema integrado ainda é um objetivo a ser perseguido

SISTEMA NACIONALDE INOVAÇÃO

Os instrumentos de incentivo existem, os agentesconstituintes do sistema estão todos presentes. O quefalta, então, para que a inovação seja o grande motordo crescimento e do desenvolvimento da economiabrasileira? Especialistas de naturezas distintas — aca-dêmicos, com passagem pelo setor público ou ligadosa empresas privadas — divergem em alguns aspectos,mas estão afinados na recomendação de que é preci-so articulação entre os agentes e ampliação do cam-po de abrangência de alguns instrumentos de estí-mulo à inovação. “Articulação é fundamental. Semarticulação não há sistema, mas promovê-la não é umatarefa trivial”, diz Sérgio Queiroz, professor doDepartamento de Política Científica e Tecnológicado Instituto de Geociências da Unicamp.

Carlos Américo Pacheco, professor do Institutode Economia da Unicamp e ex-secretário executivo do Ministériode Ciência e Tecnologia (MCT), na gestão 1999-2002, faz umbalanço positivo da evolução por que passou o país. “Vejo umainteração cada vez maior entre os atores de nosso sistema, esti-mulada por um ambiente que dá ênfase à inovação e tambémpor instrumentos específicos das agências de fomento, mas tam-bém creio que a Lei de Inovação se revelou pouco eficaz em pro-mover um arranjo mais eficiente para a cooperação entre osvários atores.”

O país não tem uma política de inovação de verdade, massim um conjunto desarticulado de ações pontuais na opiniãodo consultor e empresário Maurício Ghetler, da I4PRO, empre-sa de automação de processos em seguros. “Como regra geral,o lado acadêmico tem que se aproximar bem mais do ladoempresarial, que além de potencial investidor em inovações,pode mostrar a realidade e orientar a pesquisa e o desenvolvi-

mento de produtos e serviços, compartilhando riscos e resul-tados”, recomenda Ghetler.

Apesar da consciência de que ainda há um considerável cami-nho a ser percorrido para que seja colocada no centro das estra-tégias das empresas e instituições integrantes do sistema de ino-vação do país, vale destacar que, nos últimos 60 anos, houve umaimportante evolução da estrutura política e organizacional ligadaà promoção de inovações bem como à disseminação de infor-mações sobre o tema junto a diversos atores de interesse.

Instituições, políticas e leis de incentivoPara se ter uma idéia, o MCT foi criado somente em 1985.

Antes dele, outros organismos e instrumentos de incentivo àciência, tecnologia e inovação já haviam sido instituídos, mascom efetividade muitas vezes questionável. O Conselho Nacionalde Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a

A nanotecnologia é um dos 25 setores atendidos pela Política de Desenvolvimento Produtivo, do MDIC

FLÁVIA GOUVEIAPTERUS SANTA-CRUZ/UFPE

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Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior(Capes) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico(BNDE, atualmente também Social – BNDES) foram criados noinício da década de 1950, mas somente no final dos anos 1960surgiram medidas de maior impacto, com a instituição daFinanciadora de Estudos e Projetos (Finep), a criação do FundoNacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT)e da primeira Fundação de Amparo à Pesquisa (a Fapesp, em SãoPaulo). Ainda assim, a atuação desses agentes mostrou-se com-prometida ante a desaceleração da economia mundial, e brasi-leira, no início dos anos 80, com a crise do petróleo e o aumen-to das taxas de juros internacionais.

A criação dos Fundos Setoriais no final da década de 90 e o lan-çamento da Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior(Pitce), em 2004, marcaram a retomada da preocupação do gover-no com a inovação como motor do crescimento econômico, numcenário relativa-mente favorável decontrole da inflaçãoe maior estabilidadedos investimentosprodutivos. Em2007, foi lançadopelo MCT o Planode Ação da Ciência,Tecnologia e Inovação, reforçado nas diretrizes da mais recentePolítica para o Desenvolvimento Produtivo, anunciada no dia 12de maio deste ano (veja box).

Segundo Pacheco, os destaques da nova Política deDesenvolvimento Produtivo na área de inovação são o aumento dalinha de financiamento que o BNDES já tinha para atividades deP&D empresariais, a ampliação do Fundo Tecnológico (Funtec), acriação de área de renda variável no âmbito do BNDES e a deso-neração de parte da folha de pagamento das empresas que expor-tam software. “Acho as medidas da nova política muito positivas,pois estendem a agenda de inovação para além do âmbito do MCT.A movimentação do BNDES nessa direção é central, pois isso levao tema da inovação para o centro da área econômica, o que é vitalpara o sucesso dessas iniciativas”, diz o ex-secretário do MCT.

As diretrizes do Plano de Ação do MCT foram comentadaspelo ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, em entre-vista ao programa Bom Dia Ministro, da Empresa Brasil de

Comunicação (EBC), no dia 24 de abril. Um dos destaques foi apreocupação com a descentralização da produção de ciência, tec-nologia e inovação no Brasil. “O desenvolvimento científico nopaís ainda é muito recente e concentrado na região Sudeste”, dis-se Rezende, “mas temos o desafio de mudar esse quadro”. Rezendelembra que os editais do MCT contam com uma cláusula segun-do a qual pelo menos 30% dos recursos de cada chamada públicadevem ser destinados aos grupos das regiões Norte, Nordeste eCentro-Oeste. De acordo com o ministro, essa medida já começoua produzir efeitos.

Outros instrumentos de incentivo à C,T&I com resultados posi-tivos, como as ações de fomento promovidas por financiadoras ebancos de desenvolvimento ou o estímulo à interação entre uni-versidades e empresas, tão caro às agências de inovação, merecemganhar as regiões mais distantes do pólo paulista.

Quanto ao arcabouço legislativo, ainda há muita discussão sobrea articulação e efi-ciência das leis deincentivo à inovação.Recentemente, opresidente Lula proi-biu as empresas be-neficiárias da Lei deInformática de usu-fruir dos benefícios

da Lei de Inovação, alegando que o acúmulo de benefícios sobre oIPI seria indevido. Os especialistas divergem sobre o assunto. Deacordo com Maurício Ghetler, as exigências de um elevado per-centual de exportação para a obtenção dos benefícios ignoram ofato de que as empresas não começam a vender produtos novos nomercado externo com tamanha ousadia.

Inovação na empresaSe no passado as instituições públicas de ensino e pesquisa eram

vistas como as principais produtoras de inovação, hoje já se reco-nhece a importância das empresas como as detentoras de conhe-cimentos fundamentais para gerar e transformar novas idéias emnegócios de sucesso. Sérgio Queiroz lembra que, nos países desen-volvidos, são as empresas que assumem a liderança das inovações,e ressalta a diferença entre invenção e inovação, sendo esta últimanecessariamente sancionada pelo mercado. “Evidentemente, asempresas não inovam sozinhas. Sua relação com os demais atores

REVISTA CONECTA

SISTEMA NACIONALDE INOVAÇÃO

CARLOS AMÉRICO PACHECO EDUARDO COSTACARLOS H.

DE BRITO CRUZSÉRGIO

REZENDE

ABRMIGUEL BOYAYANJ. L. RIBEIROASCOM/SD-SP

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do sistema é fundamental, daí a importância das políticas”, pon-dera Queiroz.

É consenso entre os especialistas que o grande desafio do Brasilhoje é ampliar a atividade de pesquisa e desenvolvimento (P&D)nas empresas: tanto o número de empresas que fazem P&D comoo valor gasto pelas empresas que já realizam essas atividades. ParaPacheco, não faltam instrumentos, mas sim usar esses instrumen-tos no apoio à P&D nas empresas. “O que irá auxiliar muito essemovimento é a recuperação do investimento produtivo, pois esseesforço privado só se revela de fato promissor quando o investi-mento se amplia”.

Visando aumentar o financiamento às empresas que quereminovar, a Finep possui uma série de linhas de fomento para empre-sas de diferentes portes. Eduardo Costa, diretor de tecnologia dainstituição ressalta, porém, a necessidade de atenção especial àspequenas empresas, que já enfrentam maiores dificuldades desdea formulação de seus projetos. O financiamento por meio de capi-tal de risco (Programa Venture Fórum) tem se mostrado muito efi-ciente, mas ainda não atingiu a escala que a Finep gostaria. Muitasempresas pequenas desconhecem essa forma de aporte de capital.“O investidor torna-se sócio temporário da pequena empresa, depoisvende sua parte e sai do negócio”, explica Costa.

Ghetler acredita que há um mito de que a inovação radical sejaa mais importante. “Após trabalhar bastante com P&D, aprendique, em tecnologia, vale mais o aperfeiçoamento de idéias já exis-tentes que a descoberta de uma nova”. Ele lembra que o iPhonefoi inovador por trazer um aperfeiçoamento de interface e de design,mas ressalta que suas funções principais já eram fornecidas por umsimples Smartphone com Pocket PC ou Symbian, lançados cincoanos antes. “Tecnicamente, o iPhone pouco agrega, mas temos dereconhecer que foi um fenômeno em 2007”, diz ele. Em outroscasos, a inovação está no modelo de negócio com o qual se distri-bui um produto e não no produto em si.

Recursos humanosParece clara a idéia de que a inovação está predominantemen-

te nas empresas, mas, antes de tudo, a inovação está nas pessoas.São os recursos humanos os responsáveis pelas idéias que se tornarãoinovações. Daí a importância das políticas de educação e formaçãoprofissional. Ajustar as necessidades das empresas à oferta de mão-de-obra revela-se, portanto, um importante desafio para o sistemade inovação de um país.

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Sofisticação e multidisciplinaridade são atributos cada vezmais exigidos pelo mercado. Eduardo Costa aponta a educaçãobásica como o grande gargalo no Brasil. “Temos desemprego comaumento da demanda de força de trabalho por parte das empre-sas. O que explica isso é a falta de capacitação da mão-de-obraofertada”, diz.

Para reduzir as deficiências na formação de mão-de-obraqualificada para a inovação, o professor Sérgio Queiroz sugereque sejam eleitas disciplinas das áreas técnicas e de engenhariacomo alvo de políticas de incentivo à formação de recursoshumanos, “caso contrário, poderemos ver o Brasil importarchineses”. Ele lembra também que o custo da mão-de-obra é umfator relevante na conta das empresas contratantes e acreditaque o câmbio valorizado pode ameaçar a atratividade dos enge-nheiros brasileiros no contexto de internacionalização dos gru-pos empresariais.

Aposta em setores-chavePara o economista e professor da Universidade Federal de

Minas Gerais (UFMG) Eduardo da Motta e Albuquerque, aspolíticas de C,T&I devem basear-se em escolhas setoriais estra-tégicas, de forma a combinar a construção do sistema de ino-vação com um efetivo sistema de bem-estar social. Estudioso dasestatísticas de patentes no Brasil e no mundo, Albuquerqueconsidera importante avaliar até que ponto o forte predomíniode empresas não-residentes como autoras de patentes registra-das no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI)pode significar bloqueios ou dificuldades para a entrada doBrasil em áreas decisivas do progresso tecnológico contempo-râneo. “O contraste é nítido: os residentes priorizam tecnolo-gias tradicionais, enquanto os não-residentes concentram-senas áreas características dos paradigmas tecnológicos mais recen-tes. Isso sugere que o país precisa de maior capacitação tecno-lógica interna para contornar esses eventuais bloqueios”. Umexemplo de setor estratégico, na opinião de Albuquerque, é osetor de saúde, sobretudo porque representa uma ponte como sistema de bem-estar social.

"Uma outra perspectiva chama a atenção para a importância dopotencial inovador existente no Brasil em áreas que demandamsoluções customizadas aos problemas tipicamente brasileiros, quepodem permear, inclusive, setores tradicionais (considerados inter-nacionalmente como pouco dinâmicos em termos de inovação).

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14REVISTA CONECTA

SISTEMA NACIONALDE INOVAÇÃO

Dessa forma, as possibilidades de sucesso seriam potencializadas,pois os conhecimentos tecnológicos avançados estariam a serviçode demandas locais e não empregados em áreas cuja concorrênciabrasileira estaria virtualmente perdida ante a consolidada superio-ridade internacional. A inovação sobre essas bases permitiria, nofuturo, o desenvolvimento de produtos e serviços relacionados,com perspectivas de conquista de mercados mundiais. (leia a entre-vista com João Furtado nesta revista).

Para Eduardo Costa, da Finep, “não podemos querer ser com-petitivos em todos os setores. É preciso dar oportunidades de recu-peração às empresas órfãs do câmbio, como as dos setores de cal-çados e têxtil. Caso contrário, corremos o risco de perder 100 milpostos de trabalho por ano”.

Estudioso dos sistemas nacionais de inovação, o economistanorte-americano RichardNelson, professor de econo-mia política internacional naUniversidade Columbia eprofessor visitante daUniversidade de Manchester,acredita que o Brasil deveriaevitar o que ele chamou de“fetiche high tech”. “Com suaeconomia diversificada, o país deveria encorajar a inovaçãoem um amplo espectro. Entretanto, isso não significa que cer-tas áreas não devam receber uma atenção especial”, afirmaNelson.

O Brasil no mundoEm 25 de abril, houve um seminário no Instituto de Estudos

Avançados da Universidade de São Paulo, para apresentação ediscussão dos resultados da pesquisa “Mobilização brasileira paraa inovação”, conhecida por Mobit. A pesquisa foi uma demandada Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), doObservatório da Inovação e Competitividade e do Centro deAnálise e Planejamento (Cebrap), e analisou os sistemas de ino-vação de sete países — Estados Unidos, França, Canadá, Irlanda,Reino Unido, Finlândia e Japão — além de levantar dados sobreo Brasil.

Entre as constatações da pesquisa, observou-se que, apesar dasdiferenças entre os sete países, todos estão preocupados com suas

capacidades de elaboração, seleção e execução de políticas, com ênfa-se na inovação em suas estratégias competitivas. Com relação aoBrasil, o estudo destaca os avanços na aproximação universidade-empre-sa, apesar de permanecerem resistências e inadequações institucio-nais não resolvidas, nem mesmo com a Lei de Inovação. O Brasiltambém caminhou no sentido de criar um sistema competitivo nabusca de financiamento.

Em todos os países estudados, há grande estímulo para a arti-culação do governo com o setor produtivo, o que não aconteceainda no Brasil. Segundo o coordenador da pesquisa GlaucoArbix, também coordenador-geral do Observatório da Inovaçãoe Competitividade e professor do Departamento de Sociologia daFFLCH/USP, a presença do Estado é forte nos sete países, até mes-mo nos EUA, que se manifestam contra a intervenção estatal.

Todos adotaram políticas indus-triais que definem áreas prio-ritárias. "O Brasil tem dificul-dade em determinar a relaçãoentre orçamento e priorida-de", criticou Arbix durante oevento.

O diretor científico daFapesp, Carlos Henrique de

Brito Cruz, que participou do evento como debatedor, lembrouque no Brasil ainda predomina a visão da universidade como umsimples laboratório de P&D que a empresa deveria ter e não tem.Para ele, falta uma coordenação suficientemente legítima entre osatores do sistema brasileiro de inovação. Brito Cruz também lem-brou que o investimento em P&D no país em relação a seu ProdutoInterno Bruto (PIB) está estacionado na casa do 1% desde, pelomenos, o começo desta década. O desafio, portanto, é criar formasde provocar o aumento do investimento das empresas.

Entretanto, a comparação do Brasil com outros países é algo quemerece cuidado. As especificidades de um país podem revelar-sesuficientemente fortes para justificar fracassos quando se tenta repro-duzir processos bem sucedidos trilhados por outra economia. Emoutros casos, boas lições podem ser aprendidas. Segundo RichardNelson, o Brasil deveria seguir o exemplo da China, que promoveuuma forte pressão para que as empresas multinacionais inovassem.“Mas não se pode esquecer que cada país tem suas características.Não existe um único ‘jeito certo’” conclui.

EDUARDO M. ALBUQUERQUE SÉRGIO QUEIROZ MAURÍCIO GHETLER

DIVULGAÇÃODIVULGAÇÃO ASCOM/SD-SP

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POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO PRODUTIVO MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO,INDÚSTRIA E COMÉRCIO (MDIC)

Lançada em 12 de maio deste ano, é umaseqüência da antiga Pitce. Suas principais metas,a serem alcançadas até 2010, são: ampliar oinvestimento fixo, de 17,8% para 21% do PIB;elevar o gasto privado em P&D, de 0,51% em2005 para 0,65% do PIB (PAC da C&T, lançadoem 2007); ampliar a participação das exportações brasileiras no mundo, de 1,18%para 1,25%; e dinamizar os gastos privados emP&D, ampliando em 10% o número de empresas exportadoras. Define também 25 setores chave, a serem atendidos por suas diretrizes, seis deles de forma prioritária: nanotecnologia, biotecnologia, complexo de defesa (incluindo enriquecimento de urânio), complexo industrial da saúde, energia e tecnologia da informação.

PLANO DE AÇÃO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA (MCT)

Conhecido como PAC da Ciência e lançado nofim de 2007, visa a estimular o investimento emP&D no setor privado, que, em 2006, destinoucerca de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB)nacional para a atividade. A meta é aumentaresse investimento para 0,65% do PIB até 2010.Para isso, o MCT pretende investir em bolsas depesquisa, programas, como os Fundos Setoriais,e oferecer incentivos fiscais para as empresasrealizarem P&D no Brasil. Suas prioridades estratégicas são: expansão e consolidação do sistema nacional de C,T&I; promoção da inovação tecnológica nas empresas; P,D&I em áreas estratégicas; C&T para o desenvolvimento social.

LEGISLAÇÃO FEDERAL *

LEI DO BEM (LEI Nº 11.196/05) – principais incentivos são: abatimento de gastos com inovação sobre o lucrotributável; possibilidade de redução de 50% do IPI incidente sobre equipamentos, máquinas, aparelhos e instru-mentos destinados para pesquisa e desenvolvimento tecnológico; redução do IRPJ (Imposto de Renda sobre PessoaJurídica) na depreciação e na amortização aceleradas de máquinas, equipamentos e aparelhos; e subvenção de 60%da remuneração de mestres e doutores, empregados em atividades de inovação em empresas localizadas no Brasilpor agências de fomento em C&T.

LEI ROUANET DA PESQUISA (LEI Nº 11.487/07) – regulamentada em novembro de 2007, modifica a Lei do Bemao incluir a isenção fiscal para empresas que atuarem em parcerias com instituições científicas e tecnológicas (ICTs).

LEI DE INOVAÇÃO (LEI Nº 10.973/04) – define mecanismos de incentivo à CT&I, entre os quais a subvenção aempresas inovadoras, o estabelecimento de dispositivos legais para a incubação de empresas no espaço público e acriação de regras para a participação do pesquisador público nos processos de inovação tecnológica desenvolvidosnas empresas. A lei permite ainda o compartilhamento de infra-estrutura, equipamentos e recursos humanos, públi-cos e privados, para o desenvolvimento tecnológico e a geração de produtos e processos inovadores. Cria, também,os NITs, responsáveis pela política de inovação nas ICTs.

LEI DE INFORMÁTICA (LEI Nº 11.077/04, QUE ALTEROU AS LEIS Nº 10.664/03, 10.176/01 E 8.248/91, ) exige o cumprimento de um conjunto mínimo de operações a serem realizadas no país (o Processo Produtivo Básicoou PPB), o investimento da empresa em P&D, cria um incentivo extra para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e define a redução de IPI até 2019. Também estipula que os 5% em P&D sejam calculados sobre o fatura-mento com os produtos incentivados, e não mais sobre o faturamento global da empresa. A lei não obriga que osprodutos fabricados no Brasil sejam desenvolvidos aqui, mas sua reedição criou um adicional para produtos cujodesenvolvimento é feito localmente.

Leis de Proteção Intelectual**

LEI DE PATENTES (LEI Nº 9.279/96) regula as obrigações e os direitos ligados à propriedade industrial, visan-do garantir ao inventor de um novo produto, processo de produção ou modelo de utilidade com aplicação indus-trial, a propriedade de sua invenção por um determinado período, durante o qual qualquer outro interessando emfabricar a invenção, com fins comerciais, deverá obter licença do autor e pagar-lhe royalties;

LEI DE PROTEÇÃO DE CULTIVARES (LEI NO. 9.456/97) concede direitos de propriedade intelectual àquele queobtiver um cultivar, espécie de planta que foi melhorada devido à alteração ou introdução de uma característica queantes não possuía. A Lei impede, durante determinado período, a comercialização de variedades vegetais por ter-ceiros não autorizados, assim como de seu material de reprodução ou multiplicação comercial em todo o territó-rio brasileiro.

**As leis de proteção intelectual nem sempre são consideradas de incentivo à inovação. Há especialistas que defendem que, para algumas áreas, essas leis freiam o processo de inovação, sobretudo quando se trata de inovação incremental

*Existem também instrumentos de abrangência estadual e municipal em diversas unidades da federação, não destacadas neste quadro.

PRINCIPAIS INCENTIVOS À INOVAÇÃO VIGENTES NO BRASIL

PLANOS E POLÍTICAS MINISTERIAIS

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16REVISTA CONECTA

Esforços são premiados

Gradualmente, empresas brasileiras encampam inovação como ferramenta competitiva

Pelo menos uma vez na vida, homens e mulheres muçulmanosdevem fazer a peregrinação para Meca, cidade sagrada onde nasceuMaomé, o criador do islamismo. Anualmente, cerca de três milhõesde islâmicos fazem a viagem a pé ou em camelos. A religião não per-mite que, no trajeto, algo separe os fiéis do contato com o céu. Asolução: um ônibus sem teto, inovação desenvolvida pela Marcopolo,empresa brasileira fabricante de carrocerias de ônibus, presente em11 países. A Marcopolo é um exemplo de empresa brasileira queinveste em inovação. Nos países mais desenvolvidos as empresascriaram, com apoio do setor público, sólida capacidade de realizarpesquisa e desenvolvimento, viabilizando um ambiente de inova-ção. No Brasil, a cultura da inovação ainda é incipiente, mas casoscomo o da Marcopolo indicam mudanças nesse cenário.

A Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica (Pintec) de 2005mostrou que 32,8 mil empresas inovaram em produto ou proces-so no triênio 2003-2005. Desse total, 30.377 são industriais e 2.418de serviços. No período, o número de empresas inovadoras naindústria passou de 28.036 para 30.377, um aumento de 8,4%.Além disso, segundo a pesquisa, realizada pelo Instituto Brasileirode Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com a Financiadorade Estudos e Projetos (Finep), houve aumento da parcela do fatu-ramento que as empresas industriais gastam com inovações: de2,5% em 2003 para 2,8% em 2005. “Estes números sinalizam umaumento da cultura inovativa nas empresas brasileiras”, acredita aeconomista Mariana Rebouças, coordenadora da Pintec.“Paulatinamente elas têm percebido a importância da inovaçãocomo ferramenta competitiva”, diz.

Longo caminho A despeito da melhora nos indicadores, a verdade é que a ino-

vação caminha devagar no Brasil. Se pensarmos que de 2003 a 2005houve um aumento no número de indústrias no país, é possível con-cluir que o número de empresas inovadoras manteve-se constanteno total das empresas industriais. A Pintec mostra que a participa-

ção das empresas inovadoras no total das empresas industriais foide 33,4%. Esse quadro é resultado de anos de proteção à indústria,que acabou criando um cenário que dispensava a necessidade deaperfeiçoar processos ou introduzir novos produtos para competircom outros países ou mesmo no mercado interno. A indústria bra-sileira cresceu, portanto, em um ambiente institucional marcadopor elevada proteção à concorrência internacional, por meio detarifas e restrições comerciais a produtos estrangeiros. Ao mesmotempo, era fácil o acesso às tecnologias vindas do exterior.

Mas se até o início da década de 90 não havia um impulso deinovação autônomo no país, a partir daí o ambiente institucionalmudou: abertura comercial, globalização econômica, integraçãoregional, acordos multilaterais de comércio e de propriedade inte-lectual colocaram as empresas brasileiras frente à concorrência deprodutos vindos de todos os lugares do planeta. O que antes nãoera um problema, passou a ser.

Inovação na lataO governo tem se preocupado em criar instrumentos para moti-

var a inovação nas empresas, tanto através da regulamentação deleis, quanto por meio de financiamento. “O montante de recursosdisponíveis para a área de inovação é substancial, apesar de o pro-cesso para obtê-los ainda precisar de aprimoramentos”, acreditaGustavo Zevallos, do Monitor Group, que conduziu o estudo “101inovações brasileiras”, apresentado durante a VIII ConferênciaAnpei de Inovação Tecnológica. Na opinião do executivo, o finan-ciamento governamental pode ajudar, mas é importante que asempresas criem modelos de gestão de inovação que se sustentempelo resultado e não sejam exclusivamente dependentes dos incen-tivos governamentais. A maior dificuldade é mesmo mudar a ati-tude frente à inovação, acredita o norte-americano Jay Paap, espe-cialista com mais de quatro décadas de experiência no assunto, quedurante apresentação na conferência da Anpei afirmou que inovarnão é difícil, não requer recursos a perder de vista, nem um exér-cito de cientistas com título de doutor. “O real motivo pelo qual

BRASIL INOVATIVO

PATRÍCIA MARIUZZO

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empresas e países não inovam é o modo como pensam”, afirmou.A Brasilata, fabricante de embalagens metálicas, é um exemplo

de empresa com pensamento inovador. No ano passado a empre-sa obteve 1º lugar no Índice Brasil de Inovação (IBI), criado por pes-quisadores da Unicamp, no grupo média-baixa intensidade tecno-lógica e o terceiro lugar no Prêmio Finep de Inovação Tecnológica,categoria produto. A empresa não tem um departamento de P&De segundo Marilivia de Barri, coordenadora de desenvolvimento depessoal, as inovações decorrem da adoção de uma prática empre-sarial que valoriza o funcionário. “Essa cultura é traduzida peloProjeto Simplificação, que transforma os 900 funcionários em 900inventores”, diz ela. “A Brasilata é uma organização inovadora por-que produz simultaneamente diversificação e aperfeiçoamento emseus produtos, processos e estratégias”, explica.

A empresa criou um sistema de fechamento de latas metálicasmais resistente às pressões internas, choques, pancadas e ao tom-bamento. É mais fácil de abrir e fechar, dificulta a violação e apre-senta uma economia de material que, dependendo do diâmetro dalata, varia de 19 a 25% no conjunto anel-tampa. As latas com essatecnologia agregada, são comercializadas no Brasil e exportadas paraos países do Mercosul. A licença de fabricação do produto já foi ven-dida para Itália e México e já tem patente nos Estados Unidos.Agora a empresa vai expandir o negócio para latas de alimentos empó, como leite e chocolate.

A patente é uma ferramenta muito importante quando umaempresa quer atingir o mercado externo. Conforme explica o asses-sor técnico da presidência do Instituto Nacional da PropriedadeIndustrial (INPI), Sergio Paulino, os países que mais patenteiamnos Estados Unidos são grandes exportadores. Entre eles Coréia,Alemanha e Taiwan. Na história do desenvolvimento industrial noBrasil, entretanto, são poucas as empresas que privilegiaram a pro-dução para o mercado externo. “No contexto brasileiro atual apatente é mais importante para fazer a difusão da tecnologia doque para protegê-la de algum competidor”, acredita Paulino. Issoacontece porque a maioria das patentes depositadas hoje no Brasil

são geradas nos institutos de pesquisa, os chamados ICTs, ou seja,fora do seu lugar de aplicação. Para se ter um exemplo, a institui-ção que mais patenteia no Brasil é a Unicamp. “Mais do que refle-tir o que as empresas estão fazendo, o número de patentes refleteo que o sistema está fazendo. Ele reflete um padrão de desenvolvi-mento industrial”, completa Paulino.

Outro aspecto importante a ser destacado sobre a inovação érelativo à qualidade dos empregos que gera. Segundo pesquisa rea-lizada em 2006, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada(Ipea), ligado ao Ministério do Planejamento, Orçamento de Gestão,as grandes firmas brasileiras (com mais de 500 funcionários), maisinovadoras e mais avançadas tecnologicamente, geraram mais empre-gos do que a média do país. Nessas empresas o crescimento deempregos com carteira assinada foi de 29%, maior do que a médiadas empresas do país que foi de19%.

Ousadia“Atingir o sucesso no mercado exige ousadia misturada com

desenvolvimento tecnológico”, acredita Leandro Haach, gerentede inovação e qualidade da Cordoaria São Leopoldo, CSL, quefabrica cabos e cordas para diversas finalidades. A empresa do RioGrande do Sul tem um departamento de pesquisa estruturado etrata a inovação tecnológica como estratégia de longo prazo.

O grande salto da empresa foi solucionar o problema de anco-ramento das plataformas de petróleo da Petrobras feito com cor-rentes de aço. A CSL desenvolveu, em parceria com o Centro dePesquisas da Petrobras (Cenpes), um cabo de poliéster de alta resis-tência à ruptura, com baixíssimo alongamento. “Construímos umenorme dinamômetro para fazer ensaios, capaz de testar cabos de1500 toneladas/força e investimos pesado na qualificação de nos-sos funcionários”, conta o gerente. A Cordoaria é a maior fabri-cante do mundo de cabos de ancoragem de unidades flutuantes“Nosso foco hoje é a busca das matérias-primas que substituirão opoliéster em águas profundas, oferecendo maior eficiência em menorvolume nas instalações.

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Durante muito tempo a CSL usou como matéria-primafibras naturais; o salto tecnológico se deu com o ingresso

das fibras sintéticas, passando a fabricar cabos de altíssimaresistência, usados para ancoramento de grandes

embarcações e até plataformas de petróleo

FOTOS: DIVULGAÇÃO

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OOppeenn iinnnnoovvaattiioonn:: nova roupagem para conceitos já estabelecidos

Durante a última conferência da Anpei (Associação Nacionalde Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia das EmpresasInovadoras), em maio, o norte-americano Jay Paap tratou em suapalestra de um tema muito em voga no último ano: open innovation.Considerando sua extensa experiência como consultor de empre-sas como Alcan, Proctor & Gamble e Westinghouse (algumas delasjá extintas), Paap fez uma apresentação esclarecedora sobre o querepresenta a inovação aberta. Para alívio ou frustração dos presen-tes, ele definiu essa nova tendência como sendo um conjunto deconceitos já conhecidos, reorganizados e identificados com umanova denominação. Se considera temas e ferramentas já amadure-cidos e experimentados, esse conjunto de conceito mostra-se, então,um alvo facilmente alcançável por qualquer organização. E por esta-rem reorganizados em torno de uma nova nomenclatura, tornam-se mais interessantes, atraindo mais pessoas e motivando sua utili-zação pelos gestores da inovação.

Inovação é o processo de criação e transformação de invençõesem produtos e serviços de sucesso. Tem claramente um conceitomercadológico e é, primordialmente, realizada pelas empresas. Noprocesso de gestão da inovação, é necessário desenvolver produtose serviços e comercializá-los em um contexto único, inovador. Openinnovation compreende, de forma ampla, “todos os mecanismospelos quais uma empresa envolve outras organizações para identi-ficação, desenvolvimento ou comercialização de produtos e servi-ços inovadores”, segundo Paap.

Para o criador do termo open innovation, Henry Chesbrough, pro-fessor da Universidade de Berkeley, e diretor-executivo do Centerfor Open Innovation, embora o processo de desenvolvimento denovas tecnologias seja importante, o desafio também está relacio-nado à inovação nos modelos de negócio. Assim, muitas vezes a cha-ve do sucesso do produto ou serviço não está necessariamente natecnologia embarcada, mas no canal de venda (por exemplo, mode-lo Natura de venda “porta a porta”), na logística (modelo Amazon

de manutenção de estoques virtuais), no processo de captura devalor (modelo GM de venda do Celta via internet), apenas parailustrar alguns exemplos de destaque nos últimos anos. Originadosde forma intuitiva ou planejada, atualmente várias outras expe-riências florescem em diversos ramos de atividade.

Outra definição relevante refere-se ao tipo de inovação que umaempresa procura estimular: radical ou incremental. Conforme dadosda última Pintec – Pesquisa de Inovação Tecnológica, do IBGE,uma parcela significativa da indústria brasileira ainda concentrafortemente seus esforços em inovação incremental e dispõe depequena equipe e infra-estrutura para realização de PD&I (pesquisa,desenvolvimento e inovação). E, no caso de inovações radicais, geral-mente o conhecimento necessário é difuso e não está internaliza-do na empresa. Esses cenários incentivam a promoção do open inno-vation, pois a realização da inovação combina perfeitamente comesforços externos à organização. Quando se trata de inovação incre-mental, a baixa capacidade de realização da inovação deve ser com-plementada pela rede de parceiros externos. Considerando-se a ino-vação radical, a expertise (específica) está além das fronteiras físicasda empresa. Além disso, existe uma barreira cultural à introduçãode produtos e serviços radicalmente inovadores, uma dificuldademelhor contornável por meio de parceiros externos.

Os instrumentos para a realização da inovação aberta são diver-sos. Um deles é o corporate venturing, uma situação bastante propí-cia ao ambiente atual de negócios no Brasil, com o fortalecimentoe profissionalização das atividades de empreendedorismo nas uni-versidades e incubadoras, assim como maior presença de capitalempreendedor oriundo de diversas fontes, tais como fundos de seedcapital e venture capital. De forma simplificada, corporate venturingcorresponde à criação, por parte de empresas, de novas iniciativasde negócio com capital empreendedor próprio. Desta forma, aempresa consegue manter as suas atividades e foco principal, masdá oportunidade a novos projetos inovadores surgirem como um

REVISTA CONECTA

ARTIGO DIÓGENES FELDHAUS VICTOR FERNANDES

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novo empreendimento. Para uma spin-off é fundamental buscarapoio para transformar-se em um grande empreendimento, sejaapoio financeiro (fundos, agências de fomento), tecnológico (par-cerias com universidades são muito freqüentes nessa fase) ou de outranatureza. Como o novo empreendimento é filiado à empresa-mãe,todo o esforço de parcerias externas enquadra-se no conceito deopen innovation.

No contato da equipe da Inova Unicamp com alunos e pes-quisadores que demonstram interesse em transformar suas linhasde pesquisa em futuras empresas, percebemos uma grande neces-sidade de estabelecimento de parcerias para viabilizar tais projetos.Parcerias para desenvolvimento tecnológico, obtenção de finan-ciamento, acesso a canais de venda, expertise em gestão de pessoasetc. O processo de empreendedorismo é, em grande extensão, umaaula prática de inovação aberta, com os empreendedores de suces-so tendo se graduado magna cum laude. O processo de pré-incuba-ção, que significa o desenvolvimento de idéias em planos de negó-cio e protótipos, com orientação de um mentor empresarial e outroacadêmico, é uma das ferra-mentas utilizadas por empresaspara aproximá-las de futuros par-ceiros (empreendedores) quepodem oferecer produtos e ser-viços estratégicos ao seu negócio.

Para um empresário, a participação de fornecedores e clientesno processo de PD&I talvez seja algo natural e consolidado, umavez que todas essas organizações são do tipo “empresas” e com obje-tivos econômicos complementares. Contudo, para promover a ino-vação muito se discute sobre qual é o papel das universidades nocontexto de open innovation. Poderíamos discorrer longamente sobreas oportunidades de interação, mas listamos apenas alguns exem-plos: desenvolvimento de pesquisa básica ou aplicada, utilizando ainfra-estrutura e estoque de conhecimento das universidades; par-ticipação em consórcios de tecnologia pré-competitiva gerenciadospor universidades e apoiados por múltiplas companhias, diluindoriscos e investimentos; incubação de projetos de PD&I das empre-sas em locais específicos das universidades destinados a essa finali-dade (como parques científicos, p.ex.); licenciamento de tecnolo-gias e patentes das universidades, acelerando o processo de inova-ção nas empresas. Para as universidades se engajarem nesse pro-cesso, é necessário uma transformação cultural e aproximação dasfirmas, movimentos que se intensificaram muito nos últimos anos.

Tomamos como exemplo a Unicamp, onde mais de 180 contratosde pesquisa colaborativa e 30 licenciamentos foram estabelecidosnos últimos três anos.

ExperiênciasO caso da IBM pode ilustrar o alcance de uma estratégia de ino-

vação fortemente apoiada por parcerias externas. Depois de chegarpróxima a um monopólio, a partir dos anos 90 a empresa precisouadotar uma nova abordagem. Na busca de novas fontes de receita,a multinacional criou linhas de pesquisa colaborativa com outrasempresas e centros de pesquisa, dividindo riscos e custos, o que lhegarantiu um papel de liderança na área de semicondutores e servi-ços. Além disso, passou a conceder licenças referentes à sua pro-priedade intelectual. Em 2007, uma receita de mais de 118 bilhõesde dólares veio desse novo braço da IBM — a IBM Global Services— criado há menos de 20 anos.

Outra iniciativa que ilustra o potencial do open innovation é aestratégia da Natura quanto ao seu relacionamento com universi-

dades. Principalmente com o lan-çamento do programa NaturaCampus, a empresa aumenta asua capacidade de renovar seuportfólio de tecnologias apoiadopor idéias originadas por uni-

versidades e integradas à estratégia da empresa. Como a Naturacompete em um mercado muito disputado, caracterizado por pro-dutos com ciclo de vida relativamente curtos, e com gigantes inter-nacionais com alta capacidade de investimento e infra-estrutura dePD&I, a idéia de ampliar a sua capacidade de PD&I através de par-cerias vem se mostrando uma estratégia promissora.

Concluindo, open innovation é um conceito que se renova cons-tantemente, já que encampa as experiências e aprendizados passa-dos. Observa-se uma tendência cada vez maior de incorporar umaestratégia mais agressiva de relacionamento com parceiros externospara promoção da inovação nas empresas. Novas ferramentas emodelos de parceria serão criados no Brasil nos próximos anos.Devemos contar também com a chegada de ferramentas já testa-das em países tão diversos como China, Austrália ou África do Sul.

19REVISTA CONECTA

No processo de gestão da inovação, é necessário desenvolver produtos e serviços e comercializá-los em um

contexto único, inovador

DIÓGENES FELDHAUS é Diretor de Desenvolvimento de Parcerias da Agênciade Inovação Inova Unicamp desde julho de 2007.

VICTOR FERNANDES é Diretor de Desenvolvimento de Produtos da Natura.

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Relação universidade-empresa: uma parceria que pode dar certo

Colaboração gera bons resultados graças a iniciativasdo poder público e esforços das instituições acadêmicas. O desafio agora é gerenciar essa relação

Alta tecnologia e investimentos pesados em pesquisa e desen-volvimento. Certamente essas características são fundamentais paraque a Empresa Brasileira de Compressores S.A. – Embraco garan-ta a posição de líder mundial na fabricação de compressores her-méticos para refrigeração. Mas a empresa brasileira também credi-ta seu sucesso como resultado direto das parcerias que estabelece,desde o início da década de 1980, com universidades e instituiçõesde pesquisas, sobretudo com a Universidade Federal de SantaCatarina (UFSC), com quem recentemente inaugurou um Pólo deLaboratórios de Pesquisa em Refrigeração e Termofísica. Graças aessas parcerias, a Embraco é conhecida como uma empresa quetem foco na pesquisa e na busca de produtos com maior eficiênciaenergética, baixo nível de ruído e confiabilidade.

As relações de parceria e cooperação têm sido estratégicas paragarantir o fortalecimento da empresa e para gerar conhecimen-to, na opinião de Guilherme Lima, relações institucionais emP&D da Embraco. Hoje a empresa tem convênio com dezenasde grupos de pesquisas no Brasil e no exterior, para a realizaçãode estudos nas mais diversas áreas. No conjunto internacionalestão Estados Unidos, Alemanha, França, Finlândia, Noruega,Holanda, China e Japão. Além dos 10 laboratórios, para supor-te ao desenvolvimento tecnológico de novos produtos espalhadosno Brasil, a empresa conta com outros 28 que atuam como umaextensão dos laboratórios de seus clientes que buscam novas solu-ções para refrigeração — são oito na Itália, oito na Eslováquia,nove na China e três nos Estados Unidos.

A empresa, como aponta Lima, sabe que sua história bem suce-dida está diretamente relacionada a uma atitude que hoje tem setornado cada vez mais vital em um mercado competitivo: estabele-cer e fortalecer parcerias para pesquisar, desenvolver e inovar. “OBrasil conta hoje com diversos marcos regulatórios que facilitam acooperação entre universidades e empresas, como a criação dosFundos Setoriais e a Lei de Inovação. A necessidade está no enten-dimento por esses dois atores do que deve ser a parceria. O insu-

cesso acontece quando a empresa enxerga na universidade um cami-nho para terceirização de P&D, e não uma fonte de cooperação”,aponta Lima.

A relação antes conflituosa entre universidades e empresas, mar-cada por propósitos diferentes, tem sido substituída por uma cola-boração institucionalizada e com resultados positivos, graças prin-cipalmente às iniciativas por parte do poder público e aos esforçosdespendidos pelas instituições acadêmicas, por seus docentes e pes-quisadores. O desafio está na gestão desse relacionamento entreesses dois mundos, aparentemente, diferentes: “esse relacionamentoprecisa ser muito bem gerenciado para que seja saudável e para quenão interfira na liberdade acadêmica e de pesquisa, tão necessáriapara as grandes contribuições que a universidade traz para a socie-dade”, diz Roberto de Alencar Lotufo, diretor da Agência de InovaçãoInova Unicamp, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Quando essa interação se dá no nível da pesquisa e leva à pro-dução de novos conhecimentos, ela é frutífera para a universidade,além de beneficiar a empresa. “Quando essa interação é vista comoa promoção de um negócio, sem medida dos custos para a docên-cia (por exemplo, quando docentes reduzem a dedicação aos alu-nos) e para a pesquisa, (privilegiar a pesquisa aplicada em detrimentoda criação de novas teorias), ela pode dar origem, para a universi-dade, a prejuízos maiores que os possíveis benefícios dessa interação.A universidade não pode perder sua identidade nesse processo, sobpena de sacrificar sua própria essência, que é a capacidade de criar”,diz a pesquisadora Sandra Brizolla, do Departamento de PolíticaCientífica e Tecnológica do Instituto de Geociências da Unicamp.

Diferentes parceriasO interesse pela parceria vem do entendimento de que a capa-

cidade de inovar está na raiz da competitividade, que requer aces-so a conhecimentos de origem variada, e de que as universidades,ao realizarem pesquisas, são grandes geradoras de conhecimentosnovos. “A palavra ‘parceria’ é bastante genérica e imprecisa. Elacorresponde a diferentes situações de interações: consultorias,

PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E INOVAÇÃO

GABRIELA DI GIULIO

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pesquisa cooperativa, solicitação de cursos de especialização, pedi-do de serviços de testes ou de laudos técnicos, instalação em incu-badora, licenciamento de tecnologia. Portanto, é difícil estabele-cer um padrão de relações entre as universidades e as empresas.As experiências são diversas, às vezes extremamente modestas, emoutros casos são projetos de pesquisa para dois ou três anos comfinanciamento e equipes importantes”, aponta Anne MarieDelaunay Maculan, pesquisadora da Universidade Federal do Riode Janeiro (UFRJ).

Segundo ela, em alguns casos as empresas apresentam deman-das para realização de pequenos serviços técnicos. Tais demandaspermitem o estabelecimento entre esses dois atores de relações for-mais, que podem se tornar o suporte para uma colaboração futu-ra mais intensa e com objetivos mais complexos. Há casos em quea empresa chega à universidade com um problema específico e pre-cisa encontrar uma solução. O papel fundamental dos pesquisadores,nesses casos, é equacionar e definir qual é o verdadeiro problema.“A situação mais favorável ao avanço do conhecimento e a sua apli-cação é quando há efetiva participação conjunta no desenvolvi-mento de projetos de pesquisa. Os dois lados vão aproveitar mui-to mais porque vão interagir na geração dos novos conhecimentos.Mas a empresa deve ter uma estratégia tecnológica bem definida einvestimentos correlatos”, diz Anne Marie.

A Embraco, por exemplo, conta atualmente com quatro tipos

de parcerias/convênios estabelecidos com instituições de pesquisa:o consórcio, que visa à pesquisa básica; as parcerias pré-competi-tivas, estabelecidas tanto com universidades como com empresaspara pesquisas em cooperação de médio prazo; as parcerias tipospot, caracterizadas por uma aproximação forte com a universi-dade; e os programas de pesquisas, que têm como objetivos odesenvolvimento de conhecimento e de pessoas com uma visãode longo prazo.

GargalosAs dificuldades no estabelecimento de parcerias estão atreladas,

principalmente, à ausência de mecanismos eficazes na definiçãodos direitos de propriedade, às dificuldades de comunicação, à buro-cracia e à ausência de financiamento adequado. É possível aindaverificar diferenças de cultura da universidade e da empresa no quetange ao período de duração das atividades de P&D, “o curto ver-sus o longo prazo”, pontua Márcia Siqueira Rapini, doutorandaem economia pela UFRJ.

Para facilitar o diálogo entre essas duas culturas, algumas açõessão necessárias. As empresas precisam se qualificar melhor tecno-logicamente para poder perceber o potencial de investir em P&De inovar. Uma das primeiras medidas seria facilitar a contrataçãode recursos humanos mais qualificados que seriam os “intérpretes”entre a pesquisa acadêmica e o mundo dos negócios.

“Por outro lado, imaginar que os recursos oriundos de contra-tos com empresas possam substituir o financiamento público da pes-quisa é uma ilusão. As estatísticas de outros países mostram que asempresas têm participação maior nos investimentos totais em P&D.Isso não significa que elas financiam as universidades, significa queelas investem em projetos próprios de P&D. A participação médiadas empresas nos orçamentos das maiores universidades de pes-quisa norte-americanas não chega a 10%”, explica Anne Marie.

Para Sandra Brizolla, as leis de promoção ao investimento emP&D no Brasil ainda são muito tímidas, quando comparadascom outros países, como a Austrália. “Por outro lado, o nível edu-cacional do país desestimula a modernização tecnológica de empre-sas, principalmente daquelas que, apesar disso, dão bom lucropor serem protegidas de alguma maneira”, considera. A pesqui-sadora vai além ao apontar que a própria gerência das empresasé formada por pessoas que, em muitos casos, não conseguem dia-logar com os pesquisadores que poderiam promover avanços emseu processo produtivo.

21REVISTA CONECTA

Embraco credita seu sucesso às parcerias com instituições de pesquisa desde 1980

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PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E INOVAÇÃO

Por isso mesmo, a importância das chamadas agências de ino-vação e dos escritórios de transferência de tecnologia. “É preciso quealguém faça a mediação entre essas duas culturas diferentes. Essa éa função desses escritórios, que procuram ver os interesses dos doislados e verificar como é possível promover uma parceria adequa-damente”, explica Luis Afonso Bermudez, professor da Universidadede Brasília (UnB) e ex-presidente da Associação Nacional de EntidadesPromotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec). Para ele,as agências de inovação e os escritórios também têm o papel de for-mar, dentro das universidades, uma cultura a respeito da importânciadas parcerias com empresas. “É um trabalho de convencer os pes-quisadores a olharem para um horizonte um pouco mais longo doque o seu laboratório”.

Exemplos de sucessoÉ fato que as parcerias, no Brasil, foram estimuladas pelos edi-

tais de aplicação dos Fundos Setoriais a partir de 2000. A Lei daInovação, de 2004, também tem contribuído, já que incentiva asparcerias na medida em que coloca regras mais claras para a coo-peração das universidades com as empresas. Entretanto, como des-taca a pesquisadora Anne Marie, as experiências de parceria aindasão recentes e insuficientemente investigadas. “Precisamos multi-plicar os estudos de caso de maneira a subsidiar melhor a defini-ção de políticas de incentivos às parcerias. Muitas delas começamde maneira informal, o que dificulta a análise da gênese do processo,dos motivos, das dificuldades. Por isso mesmo, as agências de fomen-to à pesquisa deveriam promover sistematicamente avaliações deimpacto”, sugere.

Internacionalmente, a União Européia tem recebido destaqueno assunto, já que há mais de vinte anos financia pesquisas coo-perativas, em estágio pré-competitivo, com o objetivo de que asempresas que participam dos projetos, numa fase posterior, pos-sam usar os resultados conforme suas necessidades, melhorandoou desenvolvendo produtos. Tais produtos, quase sempre nascemde um conjunto de conhecimentos gerados internamente na empre-sa e completados por pesquisas. Obviamente, assim como no Brasil,há dificuldades. “A França, por exemplo, já está na sua terceira leide inovação. Mas o processo de aprendizado, a capacitação tecno-lógica, a busca pela maior eficiência do uso da tecnologia nas empre-sas são passos indispensáveis para chegar à inovação”, afirma. “Anecessidade da inovação não se proclama; ela brota de um ambien-

NO MUNDO - No período pós-guerra as universidades foram chamadas a exercer papelmais direto na inovação industrial.

ESTADOS UNIDOS - Aumento do financiamento público à pesquisa acadêmica, refletindoem uma expansão das atividades de pesquisa realizadas nas instituições de ensino superior.Ao mesmo tempo, foram criados institutos nas áreas de engenharia, voltados ao desenvol-vimento de soluções tecnológicas específicas e intensificou-se o envolvimento das ativida-des universitárias com propósitos militares.

BÉLGICA - Em 1947 promoveu a criação de instituições voltadas à pesquisa aplicada e liga-das a uma ou mais universidades.

ALEMANHA - A Max Planck Society concentrou-se em pesquisa básica e os institutosFraunhofer Gesellschaft ficaram responsáveis pela realização de pesquisa aplicada por meiode contratos, tendo como missão clara a inovação industrial.

HOLANDA - O Toegepast Natuur-Wetenschappelijk foi criado como uma organização depesquisa por contratos, e também voltado à intermediação entre os dois agentes.

BRASIL - A primeira iniciativa de parceria se deu no início da década de 1970, relaciona-da ao design de hardware do primeiro microcomputador nacional envolvendo a Universidadede São Paulo (USP) e a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). Em1973, foi criada a Digibrás, holding estatal, visando à promoção da indústria brasileira decomputadores.Nos anos 1980, tem-se a primeira iniciativa de aproximação entre a academia e a indústriapartindo do governo federal com o Programa de Inovação Tecnológica, no âmbito do ConselhoNacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Em 1990, a Política Industriale de Comércio Exterior concebida destinou significativa importância à associação entre uni-versidades e empresas na modernização tecnológica do parque industrial nacional e no aumen-to da participação do setor privado nos investimentos em C&T. Recentemente, os editais de aplicação dos Fundos Setoriais e a Lei de Inovação têm incenti-vado as parcerias e impõem regras claras para a cooperação entre universidades e empresas.

Fonte: Márcia Siqueira Rapini

PARCERIAS AO LONGO DOS ANOS

Alunos da Unicamp assistem palestra sobre criação de empresa Júnior

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23REVISTA CONECTA

te econômico mais dinâmico, promovendo mais interações entreempresas e mais demandas por produtos tecnologicamente com-plexos”, diz Anne Marie.

Os Estados Unidos também saem à frente no assunto e o casomais conhecido é o da sua indústria de informática, que proliferouao lado de universidades como o Massachusetts Institute ofTechnology (MIT), que produziram inúmeras spin-offs, empresasfundadas por professores, alunos ou ex-alunos dessas instituições,que saíram das universidades ou reduziram sua dedicação ao tra-balho acadêmico.

No Brasil, cada vez mais empresas têm reconhecido que vale apena investir nessas parcerias. Exemplos disso são citados na repor-tagem sobre spin-offs que deram certo e que mostram como essascooperações são vitais para sobreviver e crescer no mercado. Nocaso das universidades, a Unicamp mostra como essas relaçõespodem ganhar reforços, principalmente quando contam com umforte aliado, como é o caso da Agência de Inovação Inova Unicamp,que tem como um de seus papéis se ocupar do licenciamento depatentes obtidas pela universidade. “O melhor exemplo que temosé o licenciamento de um medicamento para tratamento do dia-betes tipo 2. A parceria realizada com a Aché só foi possível atra-vés de patente anteriormente depositada e do licenciamento rea-lizado com o apoio da Inova”, explica Lotufo, diretor da agência.O produto, segundo ele, deve ser lançado depois de mais de seteanos de intensos investimentos e desenvolvimento para que o medi-camento pudesse ser disponibilizado ao público. “Antigamente, essetipo de oportunidade era perdido pela falta de proteção da pro-priedade intelectual, fazendo com que nenhuma empresa se aven-turasse a investir recursos sem a devida proteção para sua poste-rior comercialização”.

Parceria entre instituição e ex-alunosOutra mostra de que investir em parceria traz bons resultados,

pode ser observado no crescimento da empresa Leucotron Telecom,situada no Arranjo Produtivo Local de Santa Rita do Sapucaí (MG),conhecido como Vale da Eletrônica. Especializada no desenvolvi-mento de soluções integradas de telecomunicações para corpora-ções e mercado Soho (Small Office/Home Office), a empresa sur-giu da idéia de dois engenheiros formados pelo Instituto Nacionalde Telecomunicações (Inatel).

Criada inicialmente apenas para fabricar produtos da área médi-

ca, contava com apenas dois funcionários. Em 1988, com a explo-são das telecomunicações, os engenheiros perceberam o novo filãoque surgia e passaram a atuar apenas na fabricação de produtos vol-tados para telecom. Pesam no sucesso da empresa, que hoje contacom 157 funcionários (desses 21 na área de P&D), a constante bus-ca pelo aprimoramento na forma de trabalhar com a gestão de pes-soas e a parceria estabelecida com o Inatel, segundo Marcos GoulartVilela, um dos fundadores da empresa.

Eleita em 2006 como uma das 100 melhores empresas para setrabalhar no Brasil, segundo o Great Place to Work Institute — con-siderada uma das principais consultorias do assunto no mundo —,a Leucotron sabe que seu maior desafio hoje é se consolidar no mer-cado VoIP (Voz sobre IP), tanto no segmento corporativo como noresidencial. Para isso, investe 5% do seu faturamento (não divulga-do) em P&D. Somente nos últimos três anos, a empresa cresceumais de 150%, e projeta para 2008 um faturamento 43% superiorao do ano passado.

De olho no futuroAs perspectivas com relação às parcerias entre universidades e

empresas tendem a ser boas se, como propõe Sandra Brizolla, forempreservados, melhorados e difundidos os centros de pesquisa comcapacidade de produzir ciência na fronteira do conhecimento, semesquecer que elas dependem também do próprio dinamismo nosistema de produção.

Como observa Anne Marie, o potencial de uso econômico deconhecimentos gerados em pesquisa que levam à inovação é mui-to amplo, mas extremamente difícil de prever, planejar e organizar.Para que isso aconteça com mais intensidade, o sistema de produ-ção precisa ter dinamismo e competências para identificar as opor-tunidades de inovação abertas pelas pesquisas. Para isso, a proximidadecognitiva entre universidades e empresas é primordial. “A funçãoessencial de um projeto de pesquisa é gerar um processo que per-mita que engenheiros e cientistas sejam treinados a equacionar pro-blemas, buscar soluções novas, testar hipóteses novas e conferirconhecimentos teóricos. As empresas precisam investir em ativi-dades internas de desenvolvimento e contratar mais cientistas eengenheiros; sem isso não se pode esperar que sejam inovadoras”,explica a pesquisadora. Por outro lado, as universidades precisamfazer mais pesquisas avançadas, algumas de ponta, para absorver egerar conhecimentos na fronteira dos avanços da ciência.

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24REVISTA CONECTA

Histórias que inspiram

Empresas mostram que apoio de incubadoras, parcerias com instituições de pesquisa e espírito inovador fazem a diferença

Originadas a partir de um único empreendedor, ou de grupode pesquisadores de universidade ou instituto de pesquisa, oumesmo de uma empresa, as chamadas empresas spin-off são resul-tado de esforços de pessoas que consideram que suas pesquisas eos resultados obtidos têm potencial para gerar produtos e chegarao mercado. Grande parte dessas empresas se concentram emsetores de alta tecnologia.

No Brasil, segundo Anne Marie Delaunay Maculan, pesqui-sadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, as spin-offs ain-da apresentam grandes vulnerabilidades: o reduzido capital ini-cial, carência em experiência e competência de gestão, dificulda-des em conhecer o mercado, complexidade jurídico-legal paracriar uma empresa e escassez do capital de risco. Em outros paí-ses, segundo ela, o conceito de spin-off é mais estreito: “é umaempresa criada para obter o licenciamento de uma patente, inclu-sive pagando royalties à universidade. Em alguns casos, a univer-sidade investe capital nessa empresa”.

Para que as tecnologias desenvolvidas nas universidades ganhemforça para se tornarem a base de criação de empresas, o Brasil pre-cisa colocar em prática três instrumentos, segundo o diretor exe-cutivo da Agência de Inovação Inova Unicamp (UniversidadeEstadual de Campinas), Roberto de Alencar Lotufo. De início, auniversidade deve incluir na sua missão a formação não apenasde futuros profissionais, mas também de líderes e futuros gera-dores de emprego. A legislação precisa ser modernizada para quea universidade ou seu núcleo de inovação tecnológica (NIT) pos-sam ser sócios de empresas spin-off, para ajudá-las em seu cresci-mento. Quanto ao investimento, há a necessidade de um finan-ciamento de capital semente, fundamental no período inicial deformação de uma empresa.

Importante também é o papel das incubadoras para que essasempresas tenham vida longa. Elas cumprem a função de ajudara transformar o conhecimento gerado em produtos de interesseda sociedade. Segundo Guilherme Ary Plonski, presidente da

Associação Nacional das Entidades Promotoras deEmpreendimentos Inovadores (Anprotec), a incorporação dasincubadoras atuando junto às universidades pode ser considera-da a segunda revolução acadêmica; a primeira teria acontecido noséculo 19, ligada à incorporação de laboratórios de pesquisa, essen-ciais para a produção de conhecimento.

A Anprotec não tem um dado oficial sobre a quantidade despin-offs brasileiras, mas estima que são milhares. A taxa de sobre-vivência é considerada alta: 80% dessas empresas sobrevivem apóstrês anos de existência. Essas empresas, segundo Plonski, contamcom uma fundamentação científica e tecnológica desde sua cria-ção e são auxiliadas pela incubadora a adquirir competências rela-cionadas à gestão para assegurar mercado e recursos, além degerenciar pessoas.

Alguns casos de spin-offno Brasil são bastante conhecidos, outrosmenos. As empresas Bematech, do Paraná, Pipeway, do Rio deJaneiro, e Griaule, de São Paulo são três bons exemplos. Em comum,elas contaram com a ajuda de incubadoras, com o espírito inova-dor dos seus criadores e com os pesados investimentos em P&D.

Referência como empresa incubadaO espírito inovador de dois engenheiros, estudantes de mes-

trado na época, foi a base para a criação de uma empresa hoje vis-ta como um dos casos de empresa incubada mais bem sucedidosdo país. A Bematech, companhia que lidera o mercado brasileirode impressoras fiscais e automação comercial, surgiu em 1990, comum projeto dos engenheiros Wolney Betiol e Marcel Malczewski,desenvolvido no Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná(Cefet-PR). Por essa razão, a empresa credita, tecnicamente, seu nas-cimento à universidade. “A Bematech se originou do espíritoempreendedor de dois formandos. Na verdade, a natureza práticado trabalho desenvolvido por eles foi severamente questionada den-tro da universidade, demonstrando claramente algumas das bar-reiras culturais existentes entre empresas e universidades”, diz MiltonRibeiro, diretor de tecnologia e inovação da empresa.

SPIN-OFFS

GABRIELA DI GIULIO E PATRÍCIA MARIUZZO

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No início, a ajuda recebida da incubadora Instituto de Tecnologiado Paraná, em Curitiba, foi importante e ajudou a transformar oprojeto de uma impressora para aparelhos de telex em produto.Mas, para alcançar sua posição no mercado, a Bematech contou,de fato, com a determinação de seus fundadores, que tiveram delevantar capital privado, trabalhar pesado em automação bancária,buscar fundos de investimentos e estabelecer parcerias com uni-versidades e instituições de pesquisa.

Hoje, a Bematech é uma empresa de capital aberto, com umfaturamento líquido de R$ 240 milhões (registrado em 2007) e comuma perspectiva de crescimento entre 20 e 30% ao ano. Contacom três instalações em Curitiba, fábrica em São José dos Pinhais,São Paulo e Jundiaí e com diversas filiais no Brasil. Tem, ainda, sub-sidiárias em Taiwan, Estados Unidos, Alemanha e Argentina. Osprodutos da Bematech são vendidos no mundo todo, inclusive suagrande idéia — a impressora MP 4000, considerada a melhor impres-sora de recibos do mundo. No Brasil, a empresa detém mais de60% do mercado de impressoras fiscais.

O segredo do sucesso está na constante busca por desenvolvi-mento de produtos e processos inovadores. A empresa, de acordocom Ribeiro, investe entre 3% e 4% do seu faturamento em P&D.Dos 1,4 mil funcionários, cerca de 100 trabalham diretamente naárea de pesquisa. Todos os novos produtos colocados no mercadorefletem o trabalho que a empresa faz em parceria com universidadese instituições de pesquisa, como é o caso do Centro de Estudos eSistemas Avançados de Recife (C.E.S.A.R.), da Universidade Federaldo Ceará (UFC), dos institutos Certi, Lactec, entre outros.

Oportunidade bem aproveitadaOutro caso de sucesso de empresa de base tecnológica que

passou por incubadora é a Pipeway Engenharia, única compa-nhia do país e do hemisfério sul que fabrica e opera equipamen-tos para inspecionar o interior de tubos de óleo e gás. O objetivodesses equipamentos é conhecer o real estado de conservação dasredes de dutos que transportam óleo e gás evitando, assim, vaza-mentos e reduzindo riscos de acidentes ecológicos. Criada em1998, no Rio de Janeiro, a Pipeway nasceu na Incubadora Gênesis,da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ),como resultado de uma parceria entre o Centro de Pesquisas daPetrobras (Cenpes) e o Centro de Estudos em Telecomunicaçõesda PUC (Cetuc).

“A solução de um problema demandada pelo Cenpes, atravésde um acordo com a PUC-RJ, e a existência de um edital da incu-badora permitiram que a tecnologia que tínhamos desenvolvido,de forte potencial de mercado, pudesse ser negociada”, contaJosé Augusto Pereira da Silva, diretor presidente da Pipeway.

A empresa nasceu com sete funcionários, e hoje conta com60 colaboradores, a maioria atuando direta e indiretamente naárea de P&D. Em 2007, o faturamento foi de R$ 9 milhões e foiregistrado um crescimento de 30% em relação a 2006. “Se con-sideramos a baixa do dólar, podemos dizer que nossas operaçõespraticamente dobraram de tamanho”, diz Silva, ressaltando quecerca de 15% a 20% do faturamento é investido em P&D.

Hoje, os produtos e tecnologias da Pipeway são exportados paraa América Latina, América Central e, ainda neste semestre, esta-

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A mineira Leucotron foi criada a partir da idéia de dois engenheiros formados pelo Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel)

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rão disponíveis nos Estados Unidos, onde está sendo criada umasubsidiária. Além da matriz em São Cristóvão (RJ), a empresa con-ta com filiais em Natal (RN), na Argentina e na Colômbia.

Entre os desafios: competitividade do mercado, garantia da pres-tação de um bom serviço e oferecimento de soluções mais rápidase melhores. “Certamente, nosso maior desafio é a abertura da sub-sidiária nos Estados Unidos. Lá estão cerca de 60% dos dutos domundo. Dali, nossa empresa quer atuar também no México e noCanadá”, observa Silva. Para isso, a lição aprendida no Brasil deve-rá se intensificar: “queremos estabelecer parcerias com instituiçõesde pesquisa norte-americanas e já estamos de olho nos editais”.

Filha da Unicamp Segundo dados divulgados pela Inova Unicamp, são cerca de

150 as empresas criadas por ex-alunos e professores da universida-de. Elas são responsáveis por mais de 5 mil colaboradores diretos.A própria Inova conta com umaincubadora de empresas de base tec-nológica, a Incamp, por onde já pas-saram mais de 10 empresas. O casode maior sucesso, segundo o diretorexecutivo da agência, é a Griaule,que domina a tecnologia do SistemaAutomatizado de Identificação deImpressões Digitais (Afis, na siglaem inglês). A técnica de algoritmosde reconhecimento, desenvolvidapela empresa, tem 100% tecnolo-gia nacional e já foi chancelada pelo National Institute of StandardTechnology, dos Estados Unidos, como uma das mais eficientesdentre as disponíveis no mercado. A Griaule foi criada em 2002 epermaneceu na incubadora até 2005.

Para José Alberto Canedo, diretor de P&D da empresa, a Incampfoi fundamental por ajudar a estabelecer e manter o vínculo coma universidade. Prova disso são os projetos em andamento em par-ceria com a Unicamp para expandir sua linha de produtos.

Os produtos de reconhecimento humano, elaborados por meiode suas características biológicas — técnica conhecida como bio-metria — encontram um mercado considerado “formidável”: estãoem mais de 80 países. Hoje, a Griaule conta com 22 funcionários,seis deles ocupados em P&D. Tem um faturamento anual na ordemde R$ 4 milhões, investe 50% desse total na área de pesquisa e regis-

tra um crescimento de 20% ao ano. A empresa conta também comuma filial no Vale do Silício, nos Estados Unidos. “Estamos inse-ridos num mercado vibrante, em franco crescimento, e nossas estra-tégias parecem estar bem alinhadas com ele. Devemos sustentarum crescimento constante por vários anos”, aponta Canedo.

Enxergando longeA idéia de unir princípios de óptica, eletrônica e engenharia mecâ-

nica para fabricar equipamentos óticos de alta tecnologia foi a moti-vação que levou um grupo de pesquisadores e técnicos do Institutode Física da USP em São Carlos a criar a Opto Eletrônica Ltda. Osprimeiros produtos lançados pela empresa foram refletores odon-tológicos. Eles servem para iluminar adequadamente a boca dopaciente durante o trabalho do dentista. São feitos de vidro, comformato e características ópticas que propiciam boas condições deiluminação, com menos sombras concentrando a luz apenas na

boca do paciente e não no rostotodo, durante o trabalho do odon-tologista. “Vimos uma oportuni-dade de mercado já que era um pro-duto que vinha de fora do país”,lembra Jarbas Caiado, um dos fun-dadores da Opto. “Além de atingir100% do mercado nacional, che-gamos a ter 50% do mercado inter-nacional. Este produto alimentoudurante muitos anos nossa área deP&D”, explica ele.

A empresa foi criada em meados de 1985 e, três anos depoisjá se lançava no mercado internacional. A Opto deu origem anovas empresas, duas delas fora do Brasil, nos Estados Unidos ena Austrália. “Nosso objetivo é globalizar a empresa na área deequipamentos de oftalmologia, outro mercado em que atuamos”,afirma Caiado. A experiência adquirida na produção de equipa-mentos militares, em 2004, garantiu à Opto o convite para par-ticipar do desenvolvimento e fabricação das câmeras fotográficasdos satélites que estão sendo construídos pelos governos do Brasile da China, um projeto de R$ 75 milhões. De acordo com Caiado,tais conquistas devem-se ao investimento constante em pesquisae desenvolvimento. Para justificar essa estratégia ele compara asempresas tecnologicamente inovadoras com uma bicicleta: se vocêparar de pedalar você pára.

SPIN-OFFS

Linha de produção da Bematech, líder de mercado de impressoras de cupom fiscal

DIVULGAÇÃO/BEMATECH

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A metodologia do Programa de Investigação Tecnológica

O Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT) de uma Instituiçãode Ciência e Tecnologia (ICT), exigido pela Lei de Inovação, pos-sui entre suas atribuições a da avaliação do potencial de inova-ção dos resultados de pesquisa da instituição, visando sua pro-teção e posterior comercialização. Este texto descreve a metodo-logia de investigação de tecnologias utilizadas pelos NITs das ins-tituições participantes do Programa de Investigação Tecnológicade São Paulo, adaptada para atender à necessidade desses núcleos.

A primeira versão da metodologia de investigação das tecno-logias no estado de São Paulo, foi realizada em 2004, a partir dainiciativa da Agência de Inovação Inova Unicamp, num projetofeito em parceria com o Instituto Inovação, uma empresa priva-da que atua em atividades de gestão da inovação e tecnologia,com o objetivo de promover a aproximação entre o conhecimentocientífico gerado na América Latina e o mercado, com escritóriosem Belo Horizonte (MG) e Campinas (SP). Baseado na metodo-logia da Diligência da Inovação®, esse projeto foi desenvolvidona Unicamp com o apoio do Sebrae-SP e analisou 60 tecnologiasda universidade. A metodologia vem sendo adaptada, desde suaconcepção em 2003, com base nos resultados de sua aplicação emmais de 300 tecnologias em universidades (UFLA, UFMG, UFRJ,UFSCar, UFV, Unesp, Unicamp, Unifesp, USP), institutos depesquisa (Embrapa, Ipen, IPT, Instituto Genius) e empresas detodo o Brasil.

A Diligência da Inovação® foi elaborada inicialmente como objetivo de identificar tecnologias em desenvolvimento compotencial para gerar novos negócios, mais especificamente novasempresas de base tecnológica, tendo se mostrado muito adequadaa esse propósito, resultando na criação de várias empresas nosúltimos anos (Ecovec, Rizoflora, Comunip, Verti Tecnologias,Nanum). Sua adaptação para ser aplicada nos NITs vem sendoaprimorada principalmente pelo desenvolvimento do PIT, queenvolve a aplicação de uma mesma metodologia entre cinco

ICTs participantes do projeto: Unicamp, USP, Unesp, Ipen eIPT. O principal objetivo da investigação, nesse contexto, écaracterizar a tecnologia e o seu potencial de inovação paraapoiar sua proteção e posterior comercialização, atendendo auma das principais competências que um NIT deve ter, conformea Lei de Inovação.

A metodologiaAo se tratar de investigação do potencial de um projeto ou negó-

cio, comumente se associa essa análise a um plano de negócios.Para a elaboração desse tipo de estudo é importante que se tenhaclaro qual o modelo de receita, qual produto ou serviço a oferecer,que mercado explorar, entre outras variáveis. No entanto, quandose trata de tecnologias emergentes, geradas nos laboratórios das uni-versidades e centros de pesquisas, é necessária uma abordagem dis-tinta para lidar com as especificidades desse novo objeto. A meto-dologia tem, portanto, a proposta de investigar a tecnologia em umestágio anterior ao da existência das variáveis necessárias para cria-ção de um negócio.

Na fase de Caracterização da Tecnologia, o grande objetivo é

REVISTA CONECTA

ARTIGO BRUNO MOREIRA ROBERTO A. LOTUFO

A Diligência da Inovação tem como objeto de análise o resultado da pesquisa e consiste em quatro etapas: (1) Caracterização da Tecnologia, (2) Prova de Conceito,

(3) Análise de Mercado e por fim, (4) Análise de Viabilidade Econômica.

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analisar o processo e aplicações da tecnologia. Também as tecno-logias similares serão mapeadas, com a ajuda de uma busca de ante-rioridade nos bancos de patentes. Todo o processo é conduzido edocumentado de forma a facilitar o entendimento da tecnologia,por mais complexa que possa ser. Isso se faz importante uma vezque muitas pessoas que participam das decisões de investimentoem uma nova tecnologia têm o perfil de negócio, não necessaria-mente técnico. Um ponto de destaque nessa fase está no bom rela-cionamento que os inves-tigadores devem ter com opesquisador responsávelpela tecnologia. Sem a con-tribuição plena do pesqui-sador, o entendimento datecnologia pode ser preju-dicado, impactando noresultado final da análise.

Na segunda fase da metodologia, a Prova de Conceito, a tec-nologia é desafiada em uma situação real de campo que permi-te avaliar seu nível de aderência ao mercado. De uma maneirageral, para um pesquisador, quando sua tecnologia é patenteadasignifica que o seu papel no desenvolvimento da mesma termi-nou e que a mesma já está pronta. A verdade é que – quase inva-riavelmente – ela não se encontra de fato “pronta” para ser apli-cada no mercado, na escala exigida. A Prova de Conceito traba-lha exatamente nesse estágio entre a tecnologia “pronta” para opesquisador e o produto “pronto” para ser utilizado no merca-do. Assim, a presente etapa procura identificar as características,requisitos e funcionalidades que a tecnologia investigada deveter para ser atrativa para o mercado. Nos casos em que a provade conceito ainda não foi realizada, procura-se definir quais tes-tes deverão ser feitos.

Durante a Análise de Mercado, procura-se analisar o con-texto mercadológico das aplicações potenciais da tecnologiainvestigada. Essa análise irá permitir iden-tificar qual o mercado mais propício epromissor para inserção da tecnologia, omodelo ideal para exploração da opor-tunidade, as opções de entrada, os riscose oportunidades resultantes do ambien-te regulatório e os potenciais parceiros denegócio. Fontes de informação diversas

são utilizadas durante essa etapa: notícias, relatórios setoriais,entidades de classe, revistas especializadas, agências regulado-ras, e entrevistas com especialistas de mercado ou mesmo poten-ciais “clientes” da tecnologia.

Durante a última fase da metodologia, os estudos visam aAnálise de Viabilidade Econômica dos negócios que poderãoser desenvolvidos a partir da tecnologia. Muitos compreendemde maneira equivocada o objetivo dessa última etapa. O obje-

tivo não é valorar a tecno-logia, ou seja, estabelecero valor que seria pago paraadquiri-la, mas traduzir emlinguagem econômica obenefício que a tecnologiapoderá trazer. Estimativado tamanho do mercado,estabelecimento de preços,

projeção de receitas, levantamento de custos e outras análisesfinanceiras são realizadas durante essa etapa. Em muitas situa-ções, em função do estágio de desenvolvimento da tecnologiae da disponibilidade de informações (por exemplo, levanta-mento detalhado dos investimentos necessários em escala indus-trial, preço do produto, entre outros), a análise de viabilidadeeconômica se limita a estudos preliminares que, num momen-to posterior, poderão ser utilizados para a elaboração de umaanálise mais completa, ou mesmo um plano de negócios. Écomum, por exemplo, que esses estudos se limitem a cálculodo benefício da tecnologia para o usuário, estimativa de recei-ta ou redução de custos no processo industrial.

As informações levantadas ao longo do processo de inves-tigação — que pode levar de 4 a 12 semanas — são documenta-das em um relatório e utilizadas como base para a classificaçãoda tecnologia, segundo seu potencial de geração de valor e está-gio de desenvolvimento, sinalizando assim o seu potencial de

negócio. O resultado é que a tecnologia“diligenciada” recebe um tratamento apro-priado para ser apresentada, negociada edesenvolvida dentro da empresa ou parapotenciais parceiros. Freqüentemente, asinformações agregadas durante a diligên-cia estimulam novas patentes e a expan-são do campo de aplicação da tecnologia.

29REVISTA CONECTA

O principal objetivo da investigação, nesse contexto, é caracterizar a tecnologia e o seu potencial de

inovação para apoiar sua proteção e posterior comercialização

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30REVISTA CONECTA

ROBERTO LOTUFO é diretor executivo da Agência de Inovação Inova Unicampdesde março de 2004 e professor titular da Faculdade de Engenharia Elétricae de Computação da Universidade Estadual de Campinas.

BRUNO MOREIRA é diretor do Instituto Inovação em Campinas e responsávelpela operacionalização e gestão do PIT-SP.

Evoluções esperadasA Diligência da Inovação® passou por várias evoluções resul-

tantes das experiências e aprendizados da sua aplicação junto à aca-demia e à iniciativa privada.

Do seu foco inicial, mais voltado para a identificação de novasempresas de base tecnológica, em função dos projetos desenvol-vidos com agências de transferência de tecnologia, a metodologiafoi adaptada para a prospecção de tecnologias com potencial delicenciamento quando agregou ferramentas mais robustas de aná-lise da propriedade intelectual e divulgação das tecnologias inves-tigadas. Posteriormente, a metodologia foi totalmente revisada eadaptada para sua aplicação em maior escala. Essas adaptações incluí-ram a revisão dos critérios e roteiro de análise quanto à sua adap-tação, para utilização pela iniciativa privada. Evoluções esperadaspara a metodologia incluem ferramentas para a valoração das tec-nologias investigadas e avanço no processo de comercializaçãopropriamente dito.

Uma ferramenta para os NITsO Programa de Investigação Tecnológica se relaciona prin-

cipalmente em dois momentos com o dia-a-dia dos NITs: (1)como agente de propriedade intelectual, no instante da comu-nicação de invenção e (2) como agente de licenciamento, noinstante da negociação.

Um dos principais desafios da inserção do PIT-SP na rotinados NITs é devido às suas diferenças e exigências temporais e deseu grau de detalhamento. Enquanto o PIT-SP trabalha com umplanejamento prévio (modelo pró-ativo ou science-push) e umaseqüência uniforme e padronizada de etapas a serem analisadaspor alunos que possuem disponibilidade parcial, os agentes de par-

ceria e propriedade intelectual dos NITs trabalham sob deman-da (modelo receptivo ou market-pull), com exigências de respostasrápidas e análises feitas sob encomenda no aprofundamento neces-sário definido caso-a-caso.

Como o PIT-SP faz uma análise do potencial de inovaçãoda tecnologia de forma ofertista, sem contato direto com uminteressado na adoção da mesma, não existe a pressão de res-postas rápidas, comumente exigidas num processo de nego-ciação, no qual a urgência pela valoração e precificação da tec-nologia pode ser questão de fechar ou não um acordo de comer-cialização. Por outro lado, os agentes de parceria trabalhamsob demanda, em função do interesse de potenciais licencia-dores da tecnologia. As respostas que são dadas aos interessa-dos são baseadas em argumentos de negociação e são ofereci-das no momento adequado. Quando existe um potencial deinovação, um pequeno estudo dedicado a atender o cliente érealizado rapidamente, sob demanda. A profundidade do estu-do é definida caso-a-caso em função das exigências do inte-

ressado na tecnologia.Essa discrepância estrutural tem sido um dos

principais desafios da aplicação da metodologianos NITs. Entretanto, um dos maiores benefíciosdo programa é a formação de talentos que sãotreinados no modelo ofertista para, posterior-mente, serem excelentes agentes de inovação, tra-balhando no modelo de negociação baseado nademanda.

Em síntese, a metodologia de investigação ado-tada no PIT-SP configura-se como uma respostaobjetiva para a questão do conhecimento latentenas universidades e centros de pesquisa, um ins-trumento que favorece o avanço da tecnologia em

direção à sociedade, trazendo benefícios para todos os agentesda cadeia da inovação. Persiste um grande desafio de se aper-feiçoar a metodologia de forma a internalizá-la no modelo deatuação dos NITs — onde a agilidade e profundidade da análi-se são variáveis primordiais no sucesso da comercialização deuma tecnologia. A contínua experimentação da metodologia eo conseqüente processamento dos aprendizados contribuempara um maior entendimento e domínio, levando a uma res-posta para essa questão.

ARTIGO

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31REVISTA CONECTA

Programa representa esforço paraaproximar instituições e mercado

Implantada em três universidades e dois institutos de pesquisa, projeto ajudou a despertarpesquisadores e estudantes para questão da inovação

A última virada de século representou um marco para a ciên-cia brasileira. Há cerca de sete anos, uma série de fatores deu umconsiderável impulso na produção científica do país que conquistoua 15ª posição dos maiores geradores mundiais de conhecimentocientífico, com a publicação de 16.872 artigos em 2006, equiva-lente a quase 2% da produção mundial. A criação de fundos seto-riais destinados à pesquisa, o surgimento da Lei de Inovação em2004 e o crescimento da pós-graduação no Brasil são alguns dosfatores responsáveis por esse desempenho. No entanto, o impac-to que esse novo conhecimento trouxe à sociedade brasileira nãofoi tão notório assim. No ano passado, o Brasil figurou em 24ºlugar no ranking mundial de patentes da Organização Mundial

de Propriedade Intelectual (Ompi), com 384 registros. A diferen-ça dos números expõe o abismo entre a produção de conheci-mento e a sua aplicação em soluções para a sociedade.

Em um esforço para remover essa lacuna, a Unicamp e o InstitutoInovação, incentivados pela Secretaria de Desenvolvimento (Secretariade Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento, à época) lançaram, em2006, o Programa de Investigação Tecnológica, por meio de par-cerias com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo(Fapesp) e com a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Batizadode Programa de Investigação Tecnológica do Estado de São Paulo(PIT-SP), o programa envolveu as três universidades estaduais Unesp,Unicamp e USP e dois centros de pesquisa, o Instituto de PesquisasTecnológicas (IPT) e o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares

PIT NAS ICTS PAULISTAS

MARCELO VITORINO/FULLPRESS

Radiofarmácia do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares, uma das instituições que participou do PIT-SP, tendo duas tecnologias analisadas

FÁBIO REYNOL

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(Ipen). Através de uma metodologia desenvolvida pelo InstitutoInovação, a Diligência da Inovação®, o PIT-SP visa auxiliar os núcleosde inovação tecnológica (NIT) dessas instituições a aprimorar e agi-lizar o processo de descoberta de novas tecnologias, o seu registro ea construção de parcerias para a sua aplicação na sociedade.

Um dos primeiros obstáculos enfrentados pelo programa,especialmente nas universidades, foi a falta de conhecimentoda comunidade acadêmica sobre propriedade intelectual.“Montamos palestras e fizemos um trabalho de abordagem pes-soal com vários pesquisadores para explicar a importância dopatenteamento”, lembra Janaína César, gerente do PIT naUnicamp. Segundo ela, ainda é forte a crença de que é a publi-cação de papers que democratiza o conhecimento e não o regis-tro de patentes. Porém, quando um paper é publicado antes dopedido de patente, o país perde a oportunidade de usufruir dosbenefícios por ter gerado aquele conhecimento, conseqüente-mente é muito mais provável que a descoberta seja engavetada.“Perdemos muitas patentes por causa de trabalhos publicadosprimeiro em papers”, lamenta Janaína.

Outro desafio encontrado pelos agentes de inovação foi a con-quista da confiança dos pesquisadores. “O cientista recebe em suasala um jovem graduando, que é o perfil dos bolsistas do PIT, enão acredita que ele entenda do assunto”, conta Yeda Quinderé,agente de propriedade intelectual da Agência de Inovação InovaUnicamp. A dificuldade em conquistar a confiança foi um fatorde atraso em muitos processos. “Tivemos casos de pesquisadoresque só revelaram todas as informações sobre a sua criação no meiodo processo de registro”, expõe Yeda que afirma orgulhosa queisso não se repete após o pesquisador ter utilizado os serviços daagência. A difusão da cultura da inovação na comunidade acadê-mica foi uma dos benefícios trazidos pelo PIT. “Fizemos mais de200 palestras sobre inovação pela universidade e os próprios bol-sistas formados também acabam multiplicando essa cultura”, afir-ma Alexandre Lima, da Agência USP de Inovação. Os agentesacreditam que a disseminação da cultura de inovação é um pro-cesso gradual e irreversível. Aos poucos, as comunidades acadê-micas estão absorvendo o processo de inovação e a formação dosagentes bolsistas do PIT tende a criar novas gerações de pesquisa-dores, cada vez mais versados no tema.

Ao contrário das universidades, o desconhecimento e a resis-tência ao processo de inovação não foram problema para o PIT-SP aplicado no IPT e no Ipen. A estrutura administrativa dessas

instituições explica o motivo. Ao depender menos de recursospúblicos, os centros de pesquisa estão em constante busca por par-cerias com a iniciativa privada ou com poderes públicos para desen-volver tecnologias. Em 2006, 60% dos recursos obtidos pelo IPTvieram dessas parcerias. No Ipen, o quadro é bem parecido. “Aquié um microcosmo com características da academia, do setor comer-cial e até do industrial”, explica o gerente do PIT no Ipen, RodolfoPolitano. Por ser detentor de uma atividade muito específica e quedepende de um reator nuclear, o Ipen fabrica e comercializa radio-fármacos, em paralelo às suas atividades de pesquisa. O contatoconstante com o mercado, aliado à prospecção de recursos extra-governamentais, ajudaram o Ipen e o IPT a criar uma rotina deregistro de patentes e manter núcleos de inovação bem antes dasuniversidades.

Agilização dos processosFoi justamente nos processos de prospecção de tecnologia e

de registro de patentes que o PIT-SP mais colaborou com os doisinstitutos. “A metodologia do PIT eliminou duplicidades e agili-zou os processos. Um estudo que levava de dois a três meses paraficar pronto, hoje é feito em menos de um mês”, exemplificaAngela Cristina Azanha Puhlmann, coordenadora do Núcleo dePropriedade Intelectual do IPT. “A meta do PIT-SP para o IPT delevantar 20 tecnologias em um ano e meio, seria impossível deser realizada pelo método anterior”, completa Angela. Essa agili-dade foi sentida também nas universidades. “Hoje, conseguimosfazer as análises de tecnologias num tempo praticamente metadedo que a Inova fazia no projeto PIT em 2005”, lembra DiógenesFeldhaus, diretor de Desenvolvimento de Parcerias da InovaUnicamp. Ao ganhar tempo, a tendência é que o PIT gere o aumen-to do registro de patentes. Até 1999, o Ipen registrava uma médiade uma patente a cada dois anos, em comparação, somente noano passado, a instituição depositou 21 patentes no InstitutoNacional de Propriedade Industrial (INPI).

Além da quantidade, o PIT ajudou a aumentar também a qua-lidade das patentes das instituições, por meio de uma visão maisafinada com o mercado. “É preciso perguntar: as patentes quedepositamos são comercializáveis? São adequadas ao mercado bra-sileiro ou internacional?”, ensina o coordenador da Agência USPde Inovação, Oswaldo Massambani, para quem o PIT trouxe umolhar mais rigoroso sobre os projetos. Os agentes conseguem per-ceber se o produto final vai gerar renda e apresentar competitivi-

REVISTA CONECTA

PIT NAS ICTS PAULISTAS

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dade no mercado. Angela Puhlmann, do IPT, também atesta essavirtude do PIT, “verificamos mais qualidade nas patentes deposi-tadas”, conta, “isso subsidia as negociações com informações maisrelevantes, o que acaba aumentando o nosso portfólio de tecno-logias para comercialização”.

Interface com o mercadoPara que a relação entre instituição de pesquisa e empresa

se fortaleça é necessário um diálogo constante entre a acade-mia e o mercado, outra atividade subsidiada pelo PIT. “O pes-quisador não tem tempo de correr atrás das empresas”, con-fessa José Luz, pesquisador do campus de Guaratinguetá daUnesp e que teve três trabalhos analisados pelo PIT-SP. Luzdesenvolveu um sistema compacto de geração de energia dealta eficiência, uma mini-estação de tratamento de esgoto e ummétodo de produção de hidrogênio a partir da fabricação deálcool anidro. Mesmo com um bom potencial de comerciali-

zação, essas tecnologias dependem do contato com parceirosinteressados e de um processo de negociação para que cheguemao mercado. Esse trabalho fica a cargo dos núcleos de inovaçãotecnológica e não do pesquisador, como explica Vera Crósta,responsável pelo desenvolvimento de parcerias da Inova: “Opesquisador se preocupa somente em passar informações téc-nicas e estabelecer padrões a serem exigidos da empresa. Asnegociações de parcerias e de valores fica a cargo da agência”,explica ela. Para José Luz, o papel do PIT na interface entre opesquisador e seus potenciais parceiros é essencial. “Através doPIT, as tecnologias são apresentadas de maneiras diferentes seo parceiro for um governo municipal, para tratar das mini-esta-ções de esgoto, ou uma usina sucroalcooleira, para a apresen-tação do sistema de produção de hidrogênio, por exemplo”, dizo pesquisador. Esse profissionalismo no tratamento da infor-mação é visível nos relatórios e valorizado pela empresa quenão está acostumada com os procedimentos acadêmicos.

33REVISTA CONECTA

Intermediar os dois mundos dis-tintos, empresarial e acadêmico, é o tra-balho do agente de inovação, profissio-nal que o PIT tem ajudado a formar. Aformação de talentos é um dos maioresbenefícios do programa, segundoRoberto Lotufo, diretor executivo daInova. “O aluno percebe que não se tra-ta apenas de questões técnicas, mas exis-tem inúmeras variáveis que interferemno processo”, opina o diretor. A geren-te do PIT-SP na Unicamp, Janaína César,que começou como bolsista durante seuperíodo de graduação, concorda comLotufo. “É um trabalho multidisciplinarque exige não só afinidade com as tec-nologias analisadas, mas também muitadiplomacia e até psicologia para saber lidar com várias pes-soas de ramos e áreas distintas”, afirma a gerente.

Para José Ricardo Mendonça, gerente do PIT-SP naUSP, o sucesso do programa se deve muito ao envolvimentodos bolsistas, o qual superou as suas expectativas. “Eles setornaram agentes multiplicadores da cultura de inovaçãona universidade”, comemora Mendonça. Além disso, coma prática eles não apenas dominam o processo de difusãodo conhecimento gerado, como também se tornaram pro-

grama é a versatilidade de sua meto-dologia. Graças a essa característica,cada instituição pôde adaptá-la à suarealidade. A Unicamp criou três níveisde estudos diferentes. Dependendoda tecnologia a Inova faz relatóriosresumidos, médios ou mais aprofun-dados. A Unesp, mesmo tendo umaparticipação no PIT-SP reduzida porter se inserido com o programa já emandamento, pretende adaptar a meto-dologia para atender às necessidadesde seus diversos campi, espalhadospelo estado de São Paulo. A USP nãoaplica o mesmo estudo de viabilida-de econômica a todas as tecnologiasestudadas; além disso, algumas par-

tes da metodologia foram absorvidas integralmente eoutras, adaptadas. Para o IPT, o PIT aprimorou um tra-balho que a instituição fazia há mais de duas décadas e oIpen aproveitou o programa especialmente para propa-gar a cultura da propriedade intelectual. Em comum, cadainstituição absorveu à sua maneira o PIT para cumpriruma importante função social da pesquisa científica e tec-nológica: a transferência do conhecimento para o usu-fruto e benefício da sociedade.

FORMAÇÃO DE ESPECIALISTAS

Equipe do Programa de Investigação Tecnológica, durante 1º Conecta, realizado em março de 2007

ANTÔNIO SCARPINETTI

fissionais especializados em construir relacionamentos entrea instituição de pesquisa e o mercado. Para Cláudio Fontes,gerente do PIT no IPT, o segredo da qualidade dessa for-mação é a prática intensiva. “No meu ponto de vista, umagente de inovação é formado após conduzir quatro oucinco processos distintos”, opina, “os casos são tão diferentesque se ele participar de apenas um não terá noção do queé ser um agente de inovação”, conclui.

Outro fator preponderante para o sucesso do pro-

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SETA - tecnologia que une chance delucro e preocupação socioambiental

Sustentabilidade é a palavra chave da tecnologia SETA. Trata-se de um “Sistema Estrutural Modular Tipo Árvore” que visa, aomesmo tempo, sustentar residências as mais diversas, com umaestrutura de madeira que remete às árvores, e tornar a habitaçãosustentável, econômica, social e ambientalmente. O sistema ins-pira-se na concepção de uma das mais relevantes obras do mun-do, a catedral inacabada Sagrada Família, do arquiteto catalão AntoniGaudí, que inverteu a imagem gótica, com um sistema tipo árvo-re, colocando o leve em baixo e o pesado em cima.

A tecnologia vem da pesquisa de doutorado do engenheiro earquiteto Décio Gonçalves, realizada no Laboratório de Moldes eEnsaios (Lame), da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU)da Universidade de São Paulo (USP), sob orientação de ArnaldoAntonio Martino. Quando a tese foi defendida, em dezembro de2007, o pedido de patente já havia sido encaminhado pela AgênciaUSP de Inovação. No trabalho foi possível atingir a estabilidadegeral da estrutura e foi apresentada uma maquete de residência uni-familiar de 380 m2. A maquete é a “a realização do virtual, a obraem miniatura”, diz Décio Gonçalves. As avaliações e ensaios finaisserão feitos com a participação da Escola Politécnica da USP. Nomomento atual, o SETA “já está plenamente apto a se inserir emqualquer programa de financiamento, público ou privado”, infor-ma o pesquisador.

Vantagens e sensibilidadesO relatório sobre a tecnologia SETA, produzido pela equipe

do PIT, dá ênfase às vantagens econômicas do sistema: como uti-liza módulos pré-fabricados, a tecnologia reduz o tempo de cons-trução e o volume total a ser transportado, minimizando os pro-blemas e custos com transporte, assim como a mão-de-obra neces-sária e evita o uso de equipamentos pesados. Tem ainda a vanta-gem de se adequar aos terrenos mais íngremes — morros e encos-

tas — sendo excelente para projetos de recuperação de moradiaspopulares. Sua aplicação é indicada para a cobertura de grandesáreas — shoppings, pavilhões, aeroportos, rodoviárias etc — devi-do ao menor custo e ao benefício de propiciar maior área de cober-tura com menor número de pilares. A estrutura idealizada alcan-çou uma ótima relação material x área (para cada m3 de madeiratem-se 15 m2 de área construída) e emprega treliças espaciais, “dia-mante de apoio”, como denomina o autor do projeto, compos-tas de peças de dimensões reduzidas. Além disso, o SETA tem umgrande potencial de gerar recursos no mercado de créditos de car-bono, e ser registrado como uma tecnologia limpa na Organizaçãodas Nações Unidas (ONU), uma vez que a utilização de madeirana construção é uma garantia efetiva de seqüestro de carbonopelas plantas.

Além das vantagens econômicas, há, na origem da tecnologiaSETA, uma sensibilidade à árvore, ao meio ambiente, que DécioGonçalves herdou de seu pai, um habilidoso e dedicado marce-neiro. Um dos objetivos do SETA, além de desenvolver o projeto,era transformar a madeira em protagonista dos projetos arquite-tônicos, rompendo com os preconceitos que existem em relaçãoa essa matéria-prima no Brasil. O impacto ambiental do empregode alumínio, aço e concreto na indústria de construção já é ampla-mente conhecido, e alternativas têm sido adotadas em todo mun-do. No Japão, 70% das habitações são em madeira, já nos EUAatinge quase 90% das habitações e Décio Gonçalves ressalta quesão casas de altíssima qualidade, que não se trata de casas pré-fabri-cadas. Para o pesquisador “estamos deixando a madeira de ladodevido aos preconceitos e ao desconhecimento desse material”.

Historicamente o Brasil criou uma relação em que o uso damadeira na construção é visto com maus olhos. “Há um desco-nhecimento enorme. Quando se fala em madeira, diz-se que elaracha, trinca, empena, queima”. Entretanto, em sua pesquisa,Décio Gonçalves demonstra que a madeira é um material que,

REVISTA CONECTA

ARQUITETURA E URBANISMO

Sistema inspirado em obra catalã ganha destaque ao valorizar a madeira na construção civil, rompendo com preconceitos em relação a esse material

SUSANA DIAS

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tomados os cuidados necessários, pode ser mais resistente, maisbarato e com melhor relação custo-benefício do que o aço e o con-creto. “A madeira, se bem trabalhada, funciona de forma magní-fica. Em nosso projeto há pesquisas e várias tecnologias de retaguarda,que dão sustentação ao melhor aproveitamento do material e per-mitem uma correta e responsável utilização da madeira. Enquantoestivermos na contramão dos países eurocêntricos vamos conti-nuar desperdiçando um material incrível por falta de conheci-mento, ou mesmo preconceito e falta de vontade política”, avaliao engenheiro.

No projeto SETA a madeira, o aço e o concreto dialogam, demodo a propiciar um resultado ambientalmente mais sustentávele economicamente mais vantajoso. O excessivo emprego da madei-ra na queima de combustível, bem como na produção de celulo-se, que são características atuais da exploração de madeira no país,são desperdícios inaceitáveis para o engenheiro. “A madeira é ummaterial nobre, cujo uso a ser priorizado deveria ser aquele que garan-te seu aproveitamento ao máximo, e a construção é um deles, poisé uma das poucas formas de produzir bens duráveis, bem comogarantir a captura de carbono”, analisa Gonçalves

Pedra de toqueO PIT identificou o potencial de aplicação e transferência tec-

nológica do SETA e, para o pesquisador, foi um reconhecimentode sua paixão, dedicação e perseverança. O Programa, na visão deGonçalves, faz uma ponte fundamental entre o pesquisador e aempresa: “O PIT cria os meios, os caminhos, orienta, atuandocomo um útero materno, uma incubadora teórica, que fornece ascondições necessárias para que a tecnologia venha ao mundo”. Aequipe do PIT, na Agência USP de Inovação, elaborou o relatórioda tecnologia e proporcionou o depósito da patente junto aoInstituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). Além disso,também propôs uma ampliação da patente, abarcando não ape-nas a madeira como matéria-prima, mas também o aço, o alumí-nio e outros materiais que venham a ser produzidos no futuro.Chamar a tecnologia de SETA também foi uma dica do PIT paratorná-la comercialmente mais interessante, além de propor umdirecionamento, um rumo ao projeto, por meio de uma “seta”. Odestaque do aspecto ambiental da tecnologia, também foi sugeri-do pelo programa, que identifica no mercado uma preocupaçãocrescente com a imagem das empresas junto aos consumidores.

Décio Gonçalves considera a FAU, aAgência USP de inovação e o PIT, juntos,a “pedra de toque” que faltava à tecnolo-gia SETA, pois permitiram aferir a quali-dade e genuinidade de seu projeto. O pes-quisador e seu orientador já solicitarambolsa de pós-doutorado junto à Fundaçãode Amparo à Pesquisa do Estado de SãoPaulo (Fapesp), para continuar a pesquisae dar corpo ao aspecto social da tecnolo-gia. A intenção é criar um centro de con-vivência comunitário utilizando a estru-tura em árvore, propiciando um espaçode lazer e estudo em que a madeira parti-cipa não apenas como estrutura do proje-to, mas como geradora de sensibilidadesao tato e ao olhar. A expectativa de DécioGonçalves é de que o PIT possa viabilizar,num futuro próximo, “uma consultoriamais objetiva, com indicações de empre-sas, promovendo a consolidação de par-cerias e obtenção de financiamento”.

35REVISTA CONECTA

Maquete de uma residência unifamiliar de 380m2

DIVULGAÇÃO

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Método de verificação de cupins nascidades pode evitar queda de árvores

O Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulocriou um procedimento, etapa por etapa, para controlar a infes-tação de cupins em edificações. Amplamente adotado pelo mer-cado, o método para realização do diagnóstico nas edificações foidesenvolvido pelo IPT nos anos 70 e contempla uma seqüênciade três passos: diagnóstico do problema, que inclui a análise donível de infestação; tomada de decisão quanto ao melhor contro-le de acordo com a espécie responsável pelos danos; e o tratamentoseguido de monitoramento de sua eficácia.

Dentre as medidas curativas ou preventivas, existe sempre apossibilidade de adoção de novas tecnologias para o controle, depreferência sem utilização de produtos químicos que podem atin-gir lençóis freáticos, como afirma Gonzalo A. Carballeira Lopez,biólogo do Laboratório de Preservação de Madeiras e Biodeterioraçãode Materiais do IPT. Um exemplo dado pelo pesquisador é a uti-lização de iscas que contaminam as colônias com produtos de açãolenta ou barreiras físicas. “Não desenvolvemos novos produtos,procuramos não lançar mão de produtos químicos e tentamos cau-sar sempre a menor destruição possível”.

De acordo com Raquel Amaral, engenheira agrônoma doLaboratório de Preservação de Madeiras e Biodeterioração deMateriais do IPT, no começo, o instituto só inspecionava edifica-ções e, posteriormente, estabeleceu então parâmetros para um tra-tamento eficiente. “Mas, com o tempo, árvores passaram a ser vis-tas como foco e passamos a estudar a interação árvore x edifica-ção, numa abordagem que deve ser integrada e aplicada não somen-te para construções como também para áreas maiores, como bair-ros e regiões da cidade”, diz Raquel. Isso fez com que aumentasseo escopo de atuação do IPT, que passou a diagnosticar a presençade cupins e outros organismos e estabelecer níveis de alerta paraas árvores. As mais antigas ou menos resistentes são candidataspreferenciais a se tornar focos de infestação.

O know how no exame de edificações, agora ampliado para asárvores, levou o grupo a solicitar uma patente para proteger a meto-dologia de diagnóstico até então realizada de maneira não muitocriteriosa. Atualmente, o grupo determina níveis de alerta para asárvores a partir da realização de uma análise visual externa e inter-na, não-destrutiva, do tronco.

Lívia Fioravanti, que acompanhou a diligência dessa tecnolo-gia no PIT-SP, destaca que entre os prováveis interessados em teresses serviços estão, além das prefeituras, principalmente de cida-des históricas, os parques temáticos, condomínios, universidades,entre outros, pois a queda de árvores, principalmente durante aschuvas e ventos fortes constitui um grande risco para as pessoas eprejuízo para as prefeituras.

Segundo Angela Cristina Azanha Puhlmann, coordenadora doNúcleo de Propriedade Intelectual e Comercialização de Tecnologia(PICT) do IPT, foram agregados dois softwares, Sisgau – Sistemade Gestão de Árvores Urbanas e Simgau– Sistema Móvel de Gestãode Árvores Urbanas, desenvolvidos pelo IPT. A estratégia de comer-cialização da tecnologia sugerida pelo PICT foi de comercializar

REVISTA CONECTA

ARQUITETURAE URBANISMO

Técnica desenvolvida pelo IPT oferece maior controle de cupins em edificações e árvores, sendo de grande interesse para prefeituras, condomínios, parques temáticos, entre outros

FLAVIA NATÉRCIA

Os cupins são insetos eusociais da ordem Isoptera e constituem um dos grupos deinvertebrados dominantes em ambientes terrestres tropicais. Estima-se que, junta-mente com abelhas e formigas, que também são insetos de alto grau de socialida-de, componham cerca de 30% da biomassa de uma floresta como a Amazônia.Grande parte do segredo está na divisão de tarefas e na organização do trabalhoque caracteriza esses insetos. Como acontece com as saúvas, a organização doscupins faz verdadeiros estragos em ambientes modificados pelo homem como plan-tações, árvores e prédios na cidade. Há colônias que atingem um tamanho de milhõesde indivíduos. Sem um manejo adequado, que promova o controle que na nature-za cabe à teia de relações ecológicas dos organismos, cidades provêm um ecossis-tema ideal para a disseminação de diversas espécies: o solo tende a ser úmido e pou-co fértil, as temperaturas são elevadas e a madeira abundante.Fonte: Costa-Leonardo, Ana Maria. Cupins-Praga: morfologia, biologia e controle / Ana Maria Costa-Leonardo – Rio Claro: A.M.C-L.; 2002 128 p. : il.

UNIÃO QUE FAZ A FORÇA

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um “pacote” composto por treinamento e capacitação aos enge-nheiros das prefeituras para realização da “Metodologia IPT paraDiagnóstico de Árvores Urbanas”, elaboração de protocolo de ins-peção, customização e licença de uso desses softwares, além de con-sultoria posterior do IPT.

Inimigo exóticoNo mundo foram registradas, até 2002, 2.860 espécies de

cupins; no Brasil, foram 290. A maioria não causa somente pre-juízos, mas traz benefícios para o homem: atuam como agentes dedecomposição e contribuem para que o solo fique poroso, aeradoe rico em sais minerais e matéria orgânica. Lopez diz que, muitasvezes, as pessoas se alarmam com espécies benéficas. Mas, antes dosusto, é preciso identificar o cupim. O conhecimento da espécieé fundamental para a determinação do tratamento correto. NoBrasil, estima-se 34 espécies de cupins como pragas urbanas, sen-do que na cidade de São Paulo, encontram-se as duas principaisespécies de cupins nocivas do ponto de vista econômico.

A principal delas é uma espécie introduzida e popularmenteconhecida como cupim-subterrâneo da espécie Coptotermes gestroi,uma ameaça a estruturas construídas com madeira onde quer queelas ocorram. Não chegam a causar a queda das árvores, para o que

outras infestações devem contribuir, no entanto, dali podem se alas-trar para outros sítios. Nativos do sudeste asiático, eles se dissemi-naram pelo mundo ao longo do século XX. Graças aos seres huma-nos, atingiram as Ilhas Marquesas, no Oceano Pacífico, em 1932.Em 1936, chegaram ao Oceano Índico pelas Ilhas Maurício e, em1957, alcançaram as Ilhas Reunião. Coletas recentes indicam a pre-sença desse cupim nas três Américas, no Taiti, na Ásia e na Áfricae suas ilhas adjacentes.

Nas regiões tropicais do Novo Mundo, foram encontrados emBarbados em 1937. Mas chegaram para viver nas árvores e cons-truções brasileiras em 1923. No Brasil, as prováveis portas de entra-da foram os portos do Rio de Janeiro e de Santos, mas o Coptotermesjá foi encontrado até em Pernambuco. Essas introduções aciden-tais se devem, provavelmente, ao transporte de madeira infectadapara construção. E o estabelecimento e até mesmo a dominânciade espécies exóticas como as de Coptotermes só acontecem emambientes modificados pelo homem. Distúrbios comumente asso-ciados à urbanização tendem a reduzir a diversidade de espécies;é menor a quantidade de predadores e competidores, que fun-cionam como mecanismos de controle das populações em ambien-tes selvagens, o que favorece a proliferação de organismos comopombos, ratos, mosquitos, baratas, formigas e cupins.

37REVISTA CONECTA

Ao lado, árvore caída devido a ação de fungos apodrecedores e

cupins-subterrâneos; acima, pesquisadora utiliza método

não-destrutivo para avaliar a ocorrênciade deterioração no tronco

FOTOS: RAQUEL AMARAL

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Tecnologia torna a possibilidade decombater o incêndio mais eficiente

O fogo tem muitas representações simbólicas como conhecimentoe transformação, mas na vida concreta e cotidiana é sinal de peri-go e muitas vezes de tragédia. É justamente no sentido de distan-ciar de forma mais eficaz fogo e tragédia que aponta a “Central deIncêndio e Alarme”, uma tecnologia desenvolvida no Instituto dePesquisas Tecnológicas (IPT) de São Paulo. Mais do que criar umnovo mecanismo de combate ao incêndio, essa novidade realizoua melhoria de uma tecnologia já existente, que lhe garantiu, com oauxílio do Núcleo de Propriedade Intelectual e Comercialização deTecnologia do IPT, o depósito de uma patente de modo de utili-dade. O Programa de Investigação Tecnológica (PIT) está agora auxi-liando o processo de comercialização dessa tecnologia. Toda essatrajetória desponta justamente num momento de evolução da áreade segurança contra incêndio no Brasil. Esse processo evolutivo dosetor no país, conta ainda com uma tendência de uniformizaçãodas leis estaduais e de normas técnicas, marcada também peloaumento de possibilidades para capacitação de pessoal e desenvol-vimento de pesquisas e tecnologias.

Com intuito de tornar a ação, frente a um caso de incêndio,mais estratégica e efetiva, e de trazer maior agilidade e dinamismoao usuário, a tecnologia incorpora componentes já existentes nocombate ao fogo, como: extintores, mangueiras e mangotinhos, acio-nador de alarme manual, alarme audio/visual, sistema de comu-nicação, luz de emergência, etc, mas centralizados em um únicoarmário. Apesar da idéia ser aparentemente simples, ela revela umagrande mudança de conceito.

A reunião de equipamentos de combate ao incêndio em umúnico local é algo comum em países como Alemanha e Japão, masainda não existia no Brasil. José Carlos Tomina, pesquisador doIPT responsável por essa inovação, explica que, atualmente, dis-positivos como extintores, hidrantes e mangueiras ficam espalha-dos pelos corredores dos andares dos edifícios, o que muitas vezes

pode confundir e retardar a ação dos ocupantes de uma edifica-ção, durante um incêndio. Tomina acrescenta que quanto maisrápido agirem os ocupantes do local, mais bem sucedida será aatuação dos bombeiros. “A disposição atual desses dispositivosmuitas vezes obriga as pessoas a deslocarem-se em diferentes dire-ções, num momento tenso como o de um incêndio. A facilidadede atuação para brigadistas e bombeiros é o que mais se busca paraminimizar danos”, diz ele.

A principal vantagem na utilização da “Central de Incêndio eAlarme” é portanto a introdução de uma nova filosofia, isto é,uma maneira mais estratégica de instalar os equipamentos que jásão tradicionalmente utilizados. A eficácia e o efeito de ampliaçãoda sensação de segurança, tendo em vista a ação mais ágil e orga-nizada de combate a incêndios, é algo novo. De acordo com o pes-quisador, a tecnologia torna a possibilidade de combater o incên-dio mais eficiente e gera procedimentos e comportamentos maisorganizados e seguros.

Além do combate ao fogo, a Central pode também assumiroutras funções de acordo com as especificidades do local aondefor instalada, pois foi prevendo a amplitude de necessidades emcaso de incêndio, que ela foi pensada.

Comercialização em destaqueCláudio Fuentes, gerente do PIT junto ao IPT e Angela Cristina

Azanha Puhlmann, coordenadora do PIT e do Núcleo de PropriedadeIntelectual e Comercialização de Tecnologia do IPT, esclarecem quequando o IPT passou a fazer parte do Programa, a patente da“Central de Incêndio e Alarme” já havia sido depositada. Puhlmannacredita que num curto espaço de tempo ela será concedida peloINPI, sendo esta mais uma razão para que a tecnologia fosse sub-metida ao programa. Ambos destacam que as orientações aos pes-quisadores para protegerem as suas tecnologias é uma sistemáticado IPT. “Algo que faz parte da rotina do instituto”, diz Fuentes.

REVISTA CONECTA

ARQUITETURA E URBANISMO

Mais que a comercialização de um produto, programa está ajudando a mudar um conceito de proteção contra incêndios

MARTA KANASHIRO

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Tomina confirma que foi por meio dessa orientação que vislum-brou as possibilidades de patenteamento de sua tecnologia."

Para direcionar corretamente esse processo de inovação já bemencaminhado, o Programa de Investigação Tecnológica está faci-litando a comercialização no mercado desse produto, por meio deduas frentes. Por um lado, está realizando estudos de mercado eentrando em contato com empresas interessadas. Por outro, e maisimportante, estabelece as possibilidades de mudanças de normastécnicas para que o produto possa ser comercializado.

A disposição dos equipamentos de combate a incêndios nosedifícios é regulada por normas técnicas brasileiras — NBRs daAssociação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). José CarlosTomina esclarece que atualmente a ABNT exige, por exemplo,uma distância de 30 metros entre os hidrantes e de 20 metros entreos extintores. Isso faz com que a “Central de Incêndios e Alarmes”não esteja de acordo com a normatização.

No entanto, tendo em vista a proposta dessa tecnologia, queacompanha o que já vem sendo feito em países desenvolvidos, eainda a evolução que apresenta no que se refere ao tempo de açãoinicial de combate ao fogo, Tomina propõe a constituição de umacomissão de estudo, no âmbito da ABNT, para adequar essas nor-mas. “A idéia — ressalta o pesquisador — não é tornar essa nova tec-nologia obrigatória, mas sim abrir a possibilidade para que esse pro-duto possa ser disponibilizado para aqueles que se interessarem”.

O PIT revela-se, então, peça-chave também nesse processo evo-lutivo do setor de segurança contra incêndio, acompanhando a ten-dência de reformulação de normas técnicas do setor. “A proposi-ção — explica Fuentes — é a de uma norma mais abrangente, quesustente a comercialização da tecnologia. De fato, o que temos aquinão é a comercialização de um produto, mas de um conceito deproteção contra incêndio. A normatização precisa acompanharesse processo”.

39REVISTA CONECTA

O alarme (1) possui duas indicações luminosas com cores distintas, (1A)indica que o sistema está desligado e operacionável; e (1B) que o alarme foiacionado. De acordo com o pesquisador, esse método de distinções decores tem por objetivo indicar aos deficientes auditivos o acionamento dosistema de alarmes. Além disso, a Central contém iluminação de emergência (2) visando facilitar a evasão do local em caso de queda daenergia elétrica. Os alarmes auditivos (3) são interligados com o sistema deacionamento de alarme manual (1), assim como a um telefone (4), de usoexclusivo no caso de um incêndio para rápida comunicação com uma brigada de incêndio ou o serviço de segurança do edifício. No módulobásico há um ou mais extintores, sendo obrigatória uma mangueira (6),acoplada ao sistema de suplemento de água através de uma válvula de abertura rápida (5). No compartimento onde é inserida a mangueira há umfecho de porta (7) que ao ser aberto aciona automaticamente as bombas. Esse sistema tem um atraso de alguns segundos, possibilitando odesativamento do botão de funcionamento automático (8) quandonecessário; o que por sua vez implica o acionamento de um sinal luminoso(9) indicando que a bomba está inoperante. Além de facilitar e agilizar aação de combate a incêndios, a “Central de Incêndio e Alarme” centralizatubulações, fiações e eletrodutos. O projeto prevê ainda um compartimento (10) que poderá ser utilizado de acordo com as condiçõesdo local onde a Central for instalada, podendo ser preenchido com umextintor adicional (11), ou com diversos kits de primeiros-socorros, macas desmontáveis, equipamento de proteção contra fogo, máscara contra gases, sinalizadores ou cordas. O conjunto também foi projetado para que o conteúdo de cada módulo seja independente dos demais.

ARTE: COMPANHIA DE COMUNICAÇÃO

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Melhor acústica para salas de música, cinema, teatro e estúdio de gravação

“Cada tipo de música necessita de um tipo de acústica. A rever-beração — halo sonoro que prolonga o som no tempo e em todasas direções —, ou difusão do som, influencia os estilos de músicae a clareza com que são ouvidos. A reverberação é bem-vinda namúsica, mas sempre com moderação. Se for exagerada pode com-prometer a qualidade do som e, se for muito pequena, os sonsficam isolados, sem a união necessária para que se torne audível.O estudo da acústica busca promover esse equilíbrio frágil, quepode ser comparado à habilidade de um cozinheiro para deixaruma omelete no ponto”, explica José Augusto Mannis, composi-tor e professor de música do Instituto de Artes da Unicamp. Eledesenvolveu uma tecnologia que permite, por meio de algoritmos,produzir difusores de som que melhoram a acústica de cinemas,teatros, estúdios de gravação, auditórios, home theaters, salas de pro-jeção e salas de aula.

Os difusores de som existem desde a década de 1970. Os maisconhecidos são os difusores por reflexão com interferência de fase(ou difusores de Schroeder) que apresentam irregularidades abrup-tas em seu design. Segundo Mannis, esse tipo de difusor é bastanteeficiente para determinadas situações. No entanto, em pequenassalas a reverberação não é adequada: as irre-gularidades abruptas provocam perda deenergia — cerca de cinco decibels cada vezque há incidência de uma onda sonora.“Em ambientes pequenos o som chega abater centenas de vezes por segundo nasparedes, assim, depois de aproximadamenteuma dezena de reflexões o som perde suaintensidade ou até desaparece. Comeceientão a questionar como seria possívelmelhorar a reverberação nesses ambientespara que o som continuasse a existir sem

alteração de seu timbre mesmo depois de muitas reflexões nasparedes de uma mesma sala”, explicou Mannis.

O objetivo era obter um difusor cujo desempenho não impli-casse em tanta perda de energia das ondas incidentes. No designdos difusores por reflexão com interferência de fase há uma seqüên-cia numérica que gera a sua organização. Essa seqüência é quase amesma ordem dada às notas musicais na música serial conhecidacomo música dodecafônica, idealizada no começo do século XXpor Schoenberg, e por ele denominada técnica de composiçãocom 12 sons. Mannis começou a pensar que “se uma seqüênciade notas pode ser transformada num difusor, e um difusor numaseqüência de notas, então é possível desenhar um difusor pen-sando em notas”. Dessa forma, ele passou a criar superfícies comirregularidades comandadas por essas seqüências numéricas oualgoritmos, gerando formas de desenhos geométricos contínuosao invés de articulações abruptas.

Ao longo do seu trabalho de pesquisa, Mannis também per-cebeu que difusores com perfis arredondados e regulares, pro-postos pelos pesquisadores Kyioshi Masuda, do Technology ResearchCenter, Taisen Corp. (Yokohama, Japão) e Koishi Fujiwara, doDepartamento de Design Acústico, do Kyushu Institute off Design

(Fukuoka, Japão), em 1995, funcionammelhor do que aqueles irregulares. “Percebique uma saída possível para minha pesquisaseria mesclar características dos difusorespor reflexão com interferência de fase como design de difusor empregado por Masudae Fujiwara em seu experimento”, explica opesquisador, que elaborou então sériesnuméricas capazes de modular diversos parâ-metros de construção de difusores acústi-cos. Na Universidade do Rio de Janeiro(UniRio), ele pôde aplicar esse conceito

REVISTA CONECTA

ACÚSTICA

Se uma seqüência de notas pode ser transformada num difusor, e um difusor numa seqüência de notas, então é possível desenhar um difusor pensando em notas

SARA NANNI

As imagens ilustram o difusor acústico e como

deve ser aplicado

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numa sala muito estreita que precisava ser transformada em estú-dio. Como não havia espaço suficiente para dispor difusores compainéis muito grandes, Mannis aliou as técnicas de Fujiwara àssuas criações de difusores sonoros a partir de processo serial.Medições feitas na cabine de gravação do local, denominado SalaVilla-Lobos, comprovaram a eficiência da tecnologia.

Mannis agora trabalha para validar os elementos empregadosna sua pesquisa. Novos investimentos devem viabilizar a aplicaçãode simulações mais complexas, que exigem aplicativos e softwaresmais caros. “Procuro aplicar os difusores que criei em casos diver-sificados”, afirma o pesquisador que, na Unicamp, já desenvolveum projeto para adequar a acústica de 20 salas de aula e de práti-ca musical do Instituto de Artes. O Museu da Imagem e do Som(MIS), em São Paulo, também encomendou ao músico um pro-jeto que proporcionará verificar a eficiência desses difusores. Eledestaca ainda que as superfícies seriais podem ser trabalhadas emconjunto com arquitetos e artistas plásticos para que ganhem for-mas belas, sem perder a eficiência acústica.

As informações levantadas pelo Programa de Investigação

Tecnológica (PIT-SP) permitiram elaborar o relatório para pedidode depósito de patente no INPI. É a primeira patente depositadapelo Instituto de Artes da Unicamp. Com isso, será possível incluiro Instituto em processos de transferência de tecnologia.

Compositor formado pelo Conservatório de Paris, com mes-trado na Universidade de Paris VIII, há 11 anos Mannis trabalhacom difusores de som. Sua pesquisa teve início quando, a pedi-do do Laboratório de Acústica Musical e Informática doDepartamento de Música da USP, participou da conclusão deum projeto para a construção de um estúdio de gravação. Umavez despertado para o assunto, deu continuidade aos estudosna Unicamp, onde defendeu a tese de doutorado “Design dedifusores sonoros a partir de processo serial: adequação acús-tica de pequenas salas à performance e audição musical”, emfevereiro deste ano. “Nas pequenas salas, ou pequenos estúdios,há pouca reverberação, portanto pouca difusão do som. Comeceientão a questionar como seria possível melhorar a reverbera-ção nesses ambientes. Foi assim que comecei a estudar os difu-sores”, conta o pesquisador.

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Sala Villa Lobos equipada com superfície ondulada que evita alteração do timbre de som

FOTOS: DIVULGAÇÃO

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Polímeros que emitem luz geram tecnologia concorrente ao cristal líquido

Telas flexíveis podem ser usadas em computadores, jornais ele-trônicos, aparelhos que podem ser carregados no bolso, entreoutros. Se essa tela flexível tiver um dispositivo como há nos celu-lares, é possível receber e atualizar informações via comunicaçãosem fio. “É como se fossem aquelas transparências utilizadas emretroprojetores, que pode ser dobrada e carregada, e depois ser liga-da em algum dispositivo, ou ter uma bateria”, explica o físicoOsvaldo Novais de Oliveira Junior, do Grupo de Polímeros daUniversidade de São Paulo (USP), de São Carlos. “Chu”, como éconhecido na universidade, é responsável pela pesquisa que mos-tra que os LEDs (sigla em inglês para diodos emissores de luz)podem ter usos que vão além de ser uma luzinha que fica acesa(em stand by) no aparelho de TV e em outros mostradores de ele-trodomésticos e eletroeletrônicos.

A tecnologia utiliza um polímero que emite luz, com o objeti-vo principal de produzir aplicações semelhantes às dos dispositi-vos de cristal líquido, presentes em displays, telas de computado-res ou de televisão. Os LEDs poliméricos e os LEDs de materialorgânico são a tecnologia utilizada para isso. Os LEDs orgânicossão produzidos a partir de moléculas quecontêm íons de terras raras, um tipo de com-posto de elementos químicos. Os LEDs poli-méricos podem ser feitos com silício.

O LED é formado por dois eletrodos queconduzem eletricidade, sendo um deles trans-parente para que a luz possa sair. Entre essesdois eletrodos se coloca um material de poten-cial elétrico, para gerar luz. Trata-se de umprocesso bem diferente da tecnologia de cris-tal líquido, aponta Oliveira. “O cristal líqui-do dá transparência, deixa ou não passar a luz,mas precisa de outra fonte de luz, tanto que

a tela de cristal líquido tem uma fonte de luz própria, convencional,como a luz branca, por exemplo. Ao passo que nos LEDs poliméri-cos, o próprio material é fonte de luz”, compara o físico.

O grande desafio da equipe de Oliveira era conseguir otimizaruma etapa crítica da cadeia produtiva da fabricação do LED, queera a injeção de cargas. Para um LED ser eficiente é preciso inje-tar carga elétrica nos dois eletrodos, positivas de um lado e nega-tivas de outro, de modo que se recombinem dentro do material eemitam luz. É justamente essa recombinação de cargas que permitea emissão de luz. Era preciso encontrar uma maneira eficiente deinjetar as cargas, o que o grupo conseguiu utilizando um novo tipode material, chamado ionômero — um polímero mil vezes mais finodo que um fio de cabelo e que contém eletricidade suficiente paragarantir a eficiência desejada. O dispositivo obtido apresentoudesempenho superior aos existentes, e o procedimento para suaobtenção permitiu um alto grau de controle. Como conseqüên-cia, a tecnologia foi patenteada.

Essa patente chamou a atenção da Agência USP de Inovação,que escolheu a tecnologia para ser avaliada pelo Programa deInvestigação Tecnológica de São Paulo (PIT-SP), por ser passível de

ser licenciada por uma indústria. Oliveirarelata que a partir do primeiro contato, aequipe do PIT estudou a tecnologia e estáproduzindo um documento, no qual nãosó os aspectos técnicos e tecnológicos sãolevados em conta, como também os aspec-tos mercadológicos.

O pesquisador já havia interagido coma equipe do programa em outra patente,gerada pela pesquisa de armazenamentoóptico de informação em material plásti-co. Para ele, a interação com a equipe doPIT fez diferença por terem realizado um

REVISTA CONECTA

FÍSICA

Ler seu jornal ou enviar e-mail por um pedaço de plástico dobrável, quepossa ser carregado no bolso, não são coisas de um futuro distante

A pesquisa consistiu na utilização de um dispositivo comlaser num plástico especial onde puderam ser armaze-nadas informações que ficavam escondidas, só poden-do ser lidas com a ajuda de um aparelho especial paraisso. Com essa tecnologia, Oliveira ressalta que pode sergarantida a segurança dos cartões de crédito, por exem-plo, uma vez que fica muito mais difícil copiar as infor-mações: “no caso desta patente o relatório foi produ-zido pelo pessoal do PIT e ficou excelente, inclusivecom sugestões de possíveis aplicações que nós nemtínhamos pensado. Isso é algo que nos deixou bastantecontentes e eu acho que é possível encontrar parceirospara licenciamento da tecnologia”.

SEGURANÇA

DANIELA LOT

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trabalho que o grupo não poderia fazer, por uma questão de tem-po e de desconhecimento. “Nesse relatório final do nosso produ-to de armazenamento óptico, por exemplo, além deles terem tra-zido idéias de possíveis aplicações que nós não tínhamos pensado,eles também avaliaram a possibilidade da nossa tecnologia com-petir com outras existentes. Sabíamos que nossa tecnologia era ori-ginal, mas não fizemos um estudo detalhado para saber quais eramas tecnologias concorrentes e eles fizeram isso”. De acordo comOliveira, esse trabalho do PIT possibilitou afirmar, com um graude certeza razoável, a viabilidade da tecnologia para algumas novasaplicações. O próximo passo será encontrar um parceiro interes-sado para dar continuidade ao seu desenvolvimento.

Barreiras“A limitação dos LEDs está no custo”, lamenta Oliveira. Como

a tecnologia de display de cristal líquido (LCD, da sigla em inglêspara liquid crystal display) se popularizou bastante nos últimos anos,o preço também caiu muito, porque já é produzida em escala indus-trial, dificultando a competitividade para algumas aplicações. Poresta razão, as principais empresas que produzem LEDs poliméri-cos ou LEDs orgânicos têm buscado nichos de mercado em quea competição com o LCD não seja tão forte, como por exemplopara a obtenção de telas flexíveis. Ainda assim, há apenas algunsprotótipos, por causa do alto custo.

Oliveira diz que o fato da patente não ser do produto todo, esim de um dos elos da cadeia, pode dificultar a comercialização.“A indústria que queira licenciar a tecnologia não irá conseguir fabri-car um produto diretamente a partir da nossa patente, mas há umapossibilidade grande de repasse do conhecimento da tecnologiapara uma indústria que atue no setor”. O físico ressalta que aindanão há indústrias brasileiras que possam fazer isso, mas que talvezuma nova indústria ou uma multinacional que atue no Brasil pos-sam se interessar.

Iluminação menos poluenteUma outra área em que os LEDs poliméricos podem ser empre-

gados é na iluminação, na substituição das lâmpadas fluorescen-tes que têm o inconveniente de poluir o ambiente por conter mer-cúrio em sua composição. Isso torna o seu descarte um processobastante caro e problemático porque dificilmente se encontra umadestinação apropriada para esse mercúrio. Com os LEDs polimé-ricos não haveria esse problema. Em Nova York, por exemplo, atela do Nasdaq Markesite Tower na Times Square, que decora afachada e indica a cotação da bolsa, utiliza iluminação de LED.

Os LEDs já são utilizados na iluminação de residências. Elasgastam o mínimo de energia e duram muitas vezes mais que as lâm-padas fluorescentes. Existem novos lançamentos no mercado mas,como ainda não são produzidas em escala comercial, apresentamainda um custo muito alto.

43REVISTA CONECTA

Painel à base de leds poliméricos ilumina fachada da Nasdaq, a bolsa eletrônica que controla a maior parte das ações do setor tecnológico; nos detalhes,

laboratório de espectroscopia não-linear de interfaces e impressora de soluçõespoliméricas para produção de dispositivos emissores de luz (PLEDs)

PAULO MIRAN FELIPPE J. PAVINA

JASON SZENES/EFE/AE

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Fontes de investimento em capital de risco

Depois de uma tentativa inicial frustrada na década de 1980, ocapital de risco voltou ao Brasil no final da década de 1990, e come-çou a florescer a partir de 2000. Apesar da intensa atividade dosetor nos últimos oito anos, no entanto, a percepção por parte dogrande público é ainda muito pequena, e mesmo entre os empreen-dedores que buscam essa fonte de recursos há uma certa descren-ça de que o dinheiro efetivamente exista. Provavelmente a explica-ção está no fato de que essa modalidade de investimento representaum desvio radical do modelo empresarial adotado pelo Brasil emtempos recentes. Estamos falando de financiar, de forma não one-rosa, empreendimentos que sejam concebidos com planejamentode longo prazo, através de um plano de negócios, com estatutosempresariais que garantam um tratamento igualitário entre os acio-nistas (governança corporativa) e com uma contabilidade confiá-vel, que registre todos os atos financeiros da empresa, desde lucrosaté impostos (transparência). Quantas empresas nascentes, ou mes-mo desenvolvidas, existem no Brasil com essas características?Felizmente elas existem, em número cada vez maior, e é certo quenos próximos anos, o grande público tomará conhecimento delas.O Novo Mercado da Bovespa, por exemplo, já registra cerca de 80empresas com essas características e a tendência é crescente.

Mas, afinal, onde estão os investidores em capital de risco?Suponhamos que você seja um empreendedor moderno, dispos-to a se enquadrar nos conceitos acima citados e pronto para enfren-tar as enormes dificuldades do nosso ambiente regulatório e fis-cal. Você provavelmente poderia começar a procurar bem do seulado; com sua família, seus parentes e seus amigos. Este é o cha-mado dinheiro do amor (love money), que normalmente é obtidomais por laços afetivos do empreendedor do que pela atratividadeda sua empresa. Sabendo que uma maioria dos novos empreen-dimentos não chega a completar um ano de existência e que a con-corrência, hoje globalizada, é feroz, você tem que se assegurar quea sua empresa tem reais condições de competir no mercado antes

de procurar os mais próximos. Para citar apenas um exemplo, ovizinho de um inventor em Nova York acreditou tanto no pro-cesso de reprografia que lhe foi apresentado, que hipotecou suacasa para investir em um empreendimento nascente que se tor-nou a Xerox Corporation. O ponto importante a se ressaltar aquié que a busca por capital começa com os mais próximos. Se vocênão conseguir convencer os mais próximos é bom rever seus pla-nos. Esta modalidade de investimento, vindo do mercado infor-mal, representa nos Estados Unidos cerca de 20% do total capta-do anualmente para capital de risco.

Na fronteira entre o mercado informal e o formal atuam indi-víduos que vieram a ser conhecidos como “angel investors”, ou natradução direta, investidores anjo. São aposentados, executivos bemsucedidos, empreendedores que venderam as suas empresas, líde-res comunitários, ricos e outros que estão dispostos a ajudar novosempreendimentos com seu dinheiro e sua experiência. Apesar des-se tipo de investidor ser mais comumente encontrado no mercadoamericano, já existem no Brasil muitos indivíduos, e mais recente-mente, grupos de indivíduos, como a Gávea Angels do Rio deJaneiro, SP Angels, Floripa Angels, que atuam como investidores

REVISTA CONECTA

ARTIGO ROBERT E. BINDER

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individuais em busca de boas oportunidades de investimento emempresas. Ainda pouco desenvolvida aqui, essa atividade é vitalpara o apoio inicial às empresas nascentes porque esse tipo de inves-tidor, além do capital, normalmente aporta experiência e orienta-ção para as novas empresas. O “capital competente” que os “angelinvestors” injetam na economia está na base do desenvolvimento docapital de risco. Portanto, onovo empreendedor, depoisde abastecido do capital doamor, deve procurar, na suacomunidade, as fontespotenciais de capital com-petente. Receberá um dinheiro para desenvolver sua empresa emtroca de um sócio que lhe adquirirá parte de suas ações e que con-tribuirá com o desenvolvimento e a profissionalização da sua empre-sa. A maior parte do dinheiro investido nos Estados Unidos em capi-tal de risco provém dos investidores anjo. Normalmente, a atuaçãodos anjos fica restrita à região geográfica em que habitam.

Em seguida aos recursos investidos por “anjos”, como primei-ra fonte de recursos do mercado formal, existem os chamados fun-dos de capital semente. Apesar de ainda pouco desenvolvidos noBrasil as iniciativas da Finep — programa Inovar Semente — e maisrecentemente do BNDES — Criatec — deverão começar a preen-cher a lacuna existente entre os empreendimentos, ou projetos nas-centes, e a disponibilidade real de recursos. A atuação ainda inci-piente desse tipo de fundo é provavelmente responsável pela sen-sação de desamparo descrito por muitos empreendedores novos.Tal fato constitui hoje a maior lacuna no nosso processo de desen-volvimento do capital de risco porque o importante programa de

“incubadoras de empresas”, coordenado pela Anprotec, não encon-trou o respaldo necessário para que as jovens empresas “gradua-das”, que estão sendo lançadas no mercado, tenham acesso real acapital. Todos os países que desenvolveram com sucesso o capitalde risco contaram com programas de capital semente, ou forte atua-ção dos investidores anjo.

Desde 1994 existem noBrasil os chamados FundosMútuos de Investimentosem Empresas Emergentes(FMIEE’s), criados pelaComissão de Valores

Mobiliários (CVM) através da Instrução 209. Neste momento, exis-tem cerca de 40 FMIEE´s registrados na CVM. Esses fundos seocupam de investir em empresas com faturamento anual não supe-rior a R$ 200 milhões. Equivalem ao que os norte-americanos cha-mam de fundos de venture capital. O volume de recursos para inves-timentos nessa modalidade supera R$ 3 bilhões e, seguramente, exis-tem mais recursos disponíveis do que alternativas qualificadas deinvestimento. Normalmente, as empresas que recebem investi-mentos desses fundos são de porte médio, ou pequeno, mas quejá possuem um produto testado no mercado. Os investidores des-sa modalidade em geral desempenham um papel ativo no desen-volvimento das empresas investidas, isto é, procuram adicionar valoraos seus investimentos.

Em 2003, atendendo uma demanda do mercado, a CVMcriou os Fundos de Investimentos em Participações (FIP’s), ouInstrução CVM 391. Este tipo de fundo não tem qualquer limi-tação por faturamento, setor, ou origem. Equivale ao que se cha-ma no mercado internacional de fundo de “private equity”. Estetipo de fundo tende a investir em empresas e participações maio-res. A legislação que criou os FIP’s atendeu a quase todos os plei-tos dos investidores, sendo bastante flexível e prática, motivo peloqual temos assistido nos últimos anos a um rápido crescimentodessa modalidade de investimento. Investidores em participaçõesnormalmente adotam uma postura mais passiva do que os inves-tidores de venture capital e concentram sua atenção em operaçõesde maior vulto.

Atuam, também, na chamada indústria do capital de risco osinvestidores corporativos. Muitas empresas de grande porte, prin-cipalmente aquelas que se desenvolveram através do capital de ris-co, alocam uma parte do seu caixa para investimentos nessa moda-

45REVISTA CONECTA

O capital competente que os investidores anjos injetam na economia

está na base do desenvolvimento do capital de risco

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46REVISTA CONECTA

ROBERT E. BINDER é fundador e ex-diretor executivo da Associação Brasileirade Capital de Risco e sócio da Antera Gestão de Recursos S.A., gestora do fun-do Criatec do BNDES.

lidade. Às vezes criam empresas separadas, como por exemplo aVotorantim Capital Partners, e às vezes aportam recursos direta-mente do caixa da empresa, como por exemplo a Promon Engenharia.A Intel, que é outra empresa que desenvolve essa atividade a nívelmundial, investe em empresas que se encontram dentro das dire-trizes de suas estratégicas futuras. Outras não fazem distinção de setor,desde que considerem o empreendimento um bom investimento.

Algumas holdings também fazem investimentos de capital derisco. Como a legislação fiscal brasileira não oferece qualquer van-tagem ao investidor de capital de risco, os investidores estrangei-ros normalmente preferem constituir uma empresa holding emalgum paraíso fiscal, ou nos seus próprios países de origem e efe-tuar seus investimentos dessa forma. Um exemplo de uma holdingmultinacional que realiza investimentos em empresas brasileiras éa Eccelera, do Grupo Cisneiros. Esta forma de investimento é apreferida por investidores internacionais que não se sentem con-fortáveis com a legislação brasileira, porque esta não oferece pro-teção adequada ao acionista minoritário, ou garantia de aplicaçãodas cláusulas contratuais normalmente utilizadas em operaçõesdo gênero.

Outra fonte de investimentos provém dos gestores profissionaisde recursos, os “assets”. Estes se organizam sob várias formas jurí-dicas e podem administrar vários tipos de fundos, ou “famílias defundos”. Um bom exemplo de um banco de investimentos queadministra uma família de fundos é o Banco Pactual, que entreseus fundos possui vários focados em capital de risco. É importan-te ressaltar que as operações de capital de risco envolvem um tipode conhecimento e prática que exigem um profissional especifica-mente preparado para isto. Muitos gestores se dedicam exclusiva-mente ao capital de risco, como é o caso da CRP de Porto Alegre,o mais antigo gestor em atividade no Brasil. Portanto, mesmo fazen-do parte de uma família de fundos, o fundo de capital de risco énormalmente administrado de forma distinta dos demais.

Os fundos de pensão normalmente não investem diretamenteem empresas, mas podem vir a fazê-lo, principalmente em grandesinvestimentos de private equity. Em geral os fundos de pensão pre-ferem investir através dos fundos de capital de risco. A legislaçãobásica que disciplina os investimentos dos fundos de pensão,Resolução Bacen 2829 e sucedâneas, permite que esses invistam noschamados fundos CVM 209 (FMIEE), ou CVM 391 (FIP). Os pro-blemas recentes da economia brasileira, principalmente aquelesrelacionados ao déficit público e a conseqüente taxa de juros inter-na, fizeram com que os fundos de pensão se mantivessem afasta-dos dos investimentos de capital de risco. Em países desenvolvidosos fundos de pensão são responsáveis pela maior parte dos recur-

sos investidos em capital de risco. É de se prever que em futuro pró-ximo, com a melhora da economia e a maturidade política que esta-mos conquistando, os investimentos de longo prazo e de maior ris-co voltem a fazer parte das carteiras dos fundos de pensão. Este éum dos principais desafios atuais da jovem indústria brasileira decapital de risco.

Sem contar os angel investors, neste momento atuam no Brasilcerca de 80 fundos de capital de risco em suas várias composi-ções jurídicas acima descritas. Os empreendedores brasileirospodem estar certos de que não faltam recursos para empresas quetenham alto potencial de retorno. No entanto, para que possamchegar aos venture capitalists, como são chamados os gestores derecursos desta atividade, precisam reunir condições que aindanão são muito comuns no Brasil como, por exemplo, um plane-jamento empresarial bem feito (plano de negócios), uma conta-bilidade transparente, um produto competitivo no mercado glo-bal e uma estrutura empresarial que garanta proteção aos acionistas.Entre as prioridades da indústria estão a educação, para que pos-sa ser criado um novo paradigma empresarial no Brasil, a intro-dução do capital semente, para que as jovens empresas possamganhar corpo até chegarem aos gestores de recursos, e a viabiliza-ção dos mecanismos de saída para que os investidores possam rea-lizar os seus lucros e reinvestir na atividade. O círculo virtuoso docapital de risco é um forte indutor para novas empresas, empre-gos, inovação, desenvolvimento tecnológico, indústrias e valoragregado à produção.

Portanto, mãos à obra, porque o dinheiro está aí.

ARTIGO

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47REVISTA CONECTA

Combustível do futuro

A diversificação da matriz energética e o aumento da produçãode energia no Brasil são fontes constantes de preocupação. O hidro-gênio é uma aposta importante nesse universo, não apenas por serum combustível não poluente e possuir alto poder calorífico, mas por-que pode gerar renda, desenvolvimento e, se depender das expecta-tivas de uma nova tecnologia desenvolvida na Universidade EstadualPaulista Júlio de Mesquita (Unesp), pode ainda tornar o Brasil com-petitivo e inserido na disputa pelo mercado mundial dessa fonte deenergia.

De olho nesse potencial, uma pesquisa do Grupo de Otimizaçãode Sistemas Energéticos (Gose), sob a coordenação de José Luz Silveira,da Faculdade de Engenharia da Unesp gerou uma tecnologia que per-mite obter hidrogênio como fonte energética, em escala industrial.A reforma a vapor de etanol é a tecnologia para a obtenção desse gáspor meio do etanol submetido a elevadas pressões e temperaturas.

O engenheiro mecânico e pesquisador da Unesp explica que, uti-lizando o bagaço de cana (biomassa), proveniente da produção de álcool,pode-se gerar um vapor da mistura de álcool anidro (etanol quandomisturado com água) e água destilada, que passa por um processo dereforma e produz hidrogênio. A queima dessa biomassa produz calore energia para a usina e pode gerar também hidrogênio, onde monó-xido de carbono (CO) e gás carbônico (CO2), são eliminados porsistemas catalíticos e de purificação.

A reforma a vapor é um método já estabelecido e comum paraproduzir gases ricos em hidrogênio, no entanto, diferentemente domodo tradicional, essa novidade utiliza pressões menores (de umaatmosfera), e torna-se mais eficiente e econômica. Cria também umprocesso sustentável, já que é originado da própria biomassa. Por seroriginado da biomassa, e o hidrogênio obtido nesse processo tam-bém pode ser considerado renovável”, defende Silveira .

Além disso, a idéia insere a produção de hidrogênio no setorsucroalcooleiro, ampliando as possibilidades dessa cadeia produtiva.“A idéia do Gose é de que seja firmada mais uma frente de produ-ção nas usinas, um novo setor, em que parte do álcool anidro sejadesviado para produção de hidrogênio”, afirma o pesquisador. Nestecaso, a indústria sucroalcooleira, além de açúcar, álcool etílico e álcool

anidro, passará a produzir hidrogênio em grande escala. Ele ressalta,ainda, que até 2013 carros movidos a hidrogênio devem entrar nomercado brasileiro, o que tornará a produção nacional desse com-bustível limpo ainda mais interessante.

Atualmente existem dois protótipos dos reformadores de etanol.Um em funcionamento na Unesp (Guaratinguetá) e, outro, insta-lado no Laboratório de Hidrogênio da Companhia Energética deMinas Gerais (Cemig), em Belo Horizonte (MG). Esses reformado-res de etanol podem produzir de 0,7 a 3 m3 de hidrogênio por hora,o necessário para alimentação de células a combustível entre 1 e 5kW, respectivamente. Com essa potência esses equipamentos sãocapazes de suprir as necessidades de uma residência com até cincopessoas, uma vez que, para o caso de banho pode ser utilizada a téc-nica de co-geração, que recupera calor residual da célula a combus-tível para a produção de água quente a 40 graus Celsius.

A instalação de um reformador de grande porte em uma usinade açúcar e álcool, produzindo algo em torno de 100 m3 por hora éa proposta de Silveira para colocar a indústria sucroalcooleira do paísna disputa pelo mercado mundial de hidrogênio. “A viabilidade téc-nica e econômica já está comprovada. O grande objetivo agora é bus-car parcerias junto a agências de fomento, indústrias do setor sucroal-cooleiro e concessionárias interessadas em financiar essa instalação”,diz o pesquisador.

É nesse momento que o Programa de Investigação Tecnológica(PIT) atuará de forma decisiva. Leopoldo Zuaneti, gerente do PIT jun-to à Unesp, afirma que o programa tem grandes expectativas comrelação a essa tecnologia, e vai verificar a viabilidade da produção dehidrogênio por reforma a vapor e valoração da tecnologia para pos-terior comercialização. Nesse sentido, deverá proceder agora umaampla investigação para dimensionar seu valor.

Zuaneti explica que a identificação de nichos de mercado peloprograma ajudará na busca de possíveis interessados em firmar par-cerias para financiamento e implementação dos reformadores emusinas de açúcar e álcool de grande porte. Silveira acrescenta que atecnologia nesse porte ainda não está patenteada e que a atuação doPIT será importante no processo de valoração e na busca de apoioda indústria sucroalcooleira e também do governo.

ENGENHARIA MECÂNICA

Pesquisa desenvolvida na Unesp gerou uma tecnologia que permite obter hidrogênio como fonte energética, em escala industrial

MARTA KANASHIRO

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Novo design de scanner óptico: economiana fabricação e no consumo de energia

Os scanners ópticos representam uma solução tecnológica quefaz parte do cotidiano da vida moderna, compondo impressorasa laser, microscópicos de varredura a laser e leitoras de código debarra encontradas nos supermercados e outros estabelecimentoscomerciais. Com a função de controlar de forma precisa a direçãoda propagação de um feixe luminoso (em geral laser), os scannersópticos hoje disponíveis comercialmente são grandes e muito caros.Eles são compostos de um pequeno espelho que, ao girar, posicionao feixe de laser de acordo com a necessidade do equipamento emque está inserido. “Nós trabalhamos para tornar esse dispositivomenor, mais barato e fácil de ser produzido”, afirma Luiz OtávioSaraiva Ferreira, engenheiro eletrônico e professor do Departamentode Mecânica Computacional da Faculdade de Engenharia Mecânicada Unicamp, que estuda o assunto há mais de 20 anos.

Ferreira explica que os scan-ners convencionais são verdadei-ros mecanismos de relojoaria, comuma mecânica complicada dedezenas de peças que precisam sermontadas e ajustadas. “Nosso dis-positivo é feito de uma peça úni-ca”, compara o professor que ago-ra comemora os resultados da tesede doutorado do seu orientando,o físico Luiz Cláudio Marangonide Oliveira, intitulada“Contribuições para a melhoriado desempenho e viabilidade defabricação de scanners indutivos”,que conseguiu tornar esse dispo-sitivo ainda mais eficiente e eco-nômico, o que resultou em depó-

sito de pedido de patente de invenção pela Agência de InovaçãoInova Unicamp.

Essa tecnologia foi investigada pelo Programa de InvestigaçãoTecnológica (PIT-SP) e envolveu pesquisadores já habituados adepósito de patentes — foi a terceira vez que Ferreira entrou compedido para patenteamento de scanner. O relatório do PIT aca-bou por contribuir também para a redação do texto da patente,facilitando a abordagem de outras possibilidades de mercado ecampos de atuação para a tecnologia, como a indústria de equi-pamentos de corte em diversos materiais e gravação a laser.

O scanner de uma única peça é produzido através de proces-so semelhante ao utilizado em gráficas para fazer matrizes de impres-são, o chamado processo fotolitográfico, que também é usado naindústria eletrônica para fabricar chips de computador. Por meiodele é possível fazer muitas peças em tamanho pequeno, de uma

única vez, tornando a produçãosimples e barata. “Isso é muitodiferente de fazer peça por peça,que depois precisam ser monta-das, ajustadas e calibradas”, enfa-tiza Ferreira.

Odesign dessa peça única foipossível graças à utilização deconceitos da microeletrônicapara a planarização da máquina,que assim pode ser produzidaem lotes pelo processo fotolito-gráfico, resultando em reduçãode custos e melhoria de desem-penho. É também esse processoque proporciona a fabricação depeças planas tão pequenas. “Nãoconseguiríamos fazer peças des-

REVISTA CONECTA

ENGENHARIAMECÂNICA

Relatório do PIT contribuiu para a redação do texto da patente da tecnologia, facilitando a abordagem de outras possibilidades de mercado e campos de atuação, como a indústria de equipamentos de corte em diversos materiais e gravação a laser

SARA NANNI

As peças de metal que compõem o scanner foram usinadas por processo fotolitográfico

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se tamanho através da mecânica convencional, porque é muitodifícil manusear peças tão pequenas”, comenta o pesquisador.

O primeiro scanner óptico desenvolvido por Ferreira foi fei-to de silício — mesmo material utilizado para fazer chip eletrôni-co —, mais leve e resistente do que o aço. E, como o scanner ópti-co possui um espelho que precisa se mover rápido para promo-ver a deflexão do feixe de laser, o fato de o silício ser leve faz comque esse espelho mova-se ainda com mais velocidade. No entan-to, os pesquisadores perceberam que trabalhar apenas com essematerial tornaria inviável a produção industrial dos scanners, por-que no Brasil não há indústria que domine o processo de usina-gem química do silício. “Então decidimos desenvolver uma novageração de dispositivos mais adequados à indústria existente nopaís”, justifica Ferreira. Foi assim que a pesquisa migrou da utili-zação do silício para uma tecnologia à base de metais. Em parce-ria com uma empresa nacional — Metalfoto Indústria e Comérciode Fotofabricação — alguns protótipos pré-industriais foram pro-duzidos. As peças de metal que compõem os scanners tambémforam usinadas quimicamente por processo fotolitográfico igualao aplicado às peças de silício.

Os polímeros compõem ainda outra alternativa de materialpara produzir os dispositivos dos scanners, que ficam com umdesempenho menor, porém muito mais baratos se comparadosaos de metal. Assim, os pesquisadores conseguiram criar três alter-

nativas de dispositivos, sempre mantendo as demais inovações –formato plano e produção em lotes.

Outra vantagem da inovação é o acoplamento forte desses scan-ners. Os equipamentos convencionais possuem acoplamento fra-co, ou seja, não há um caminho de ferro para o campo magnéti-co fluir da bobina do estator (peça que fica parada) até a bobinado rotor (peça que se move). Já nos fortemente acoplados há umcaminho de ferro para o campo magnético fluir entre essas peças.O campo magnético flui milhares de vezes mais facilmente pelocaminho de ferro que pelo caminho de ar, e, com isso, o scannercom acoplamento forte funciona de forma mais eficiente, consu-mindo menos energia.

Após muitos anos trabalhando na fabricação e mecânica dosscanners, Ferreira agora busca complementar a tecnologia paradeixá-la pronta para as aplicações finais. O próximo passo é o desen-volvimento do circuito de controle do dispositivo, ou seja, a parteeletrônica. Com o pacote tecnológico pronto, os scanners ópticospoderão ganhar um mercado bastante diversificado, que abrangeindústrias de equipamentos gráficos (impressoras a laser e equi-pamentos de corte e gravação a laser), ópticos (para inspeção emedição), sistemas de projeção de imagens (projetores para ima-gens e displays retinais), entretenimento (para projeção de formase imagens em grandes anteparos) e equipamentos médico-hospi-talares (para cirurgias a laser).

49REVISTA CONECTA

À esquerda, equipamento de tamanho reduzido em comparação ao convencional; à direita, detalhe da localização do feixe luminoso

FOTOS: DIVULGAÇÃO

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Inovação combina saneamento ambiental e geração de energia

A Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas(ONU) declarou 2008 como o Ano Internacional do sanea-mento, com o intuito de incentivar ações em todo o mundo,que acelerem a redução da porcentagem de pessoas que não têmacesso a esse serviço básico. Segundo a organização, 40% da popu-lação mundial vive nessa condição. De acordo com dados de2007, da pesquisa “Trata Brasil: Saneamento e Saúde”, desen-volvida pelo Centro de Pesquisas Sociais da Fundação GetúlioVargas (FGV-SP), apenas 47% da população brasileira têm aces-so hoje à rede geral de esgoto. O relatório da primeira fase dapesquisa afirma ainda que, com o atual nível de investimento

em obras de saneamento, o Brasil só conhecerá a universaliza-ção do acesso ao esgoto tratado quando o país comemorar 300anos de independência, em 2122.

Em geral, quando o assunto é saneamento básico, as notí-cias são alarmantes. A preocupação com esse quadro levoupesquisadores da Universidade Estadual Paulista Júlio deMesquita (Unesp) e da Universidade de Taubaté (Unitau) apesquisarem uma solução ambiental, energética e economi-camente viável para o saneamento básico. O animador resul-tado dessa pesquisa já é uma realidade e recebeu o nome deminiEETERA – Mini-estação Eco Eficiente de Tratamentode Esgoto e Reuso de Águas. A tecnologia promove sanea-

REVISTA CONECTA

ENGENHARIASANITÁRIA

Mini-estação desenvolvida pela Unesp e Unitau pode ajudar a garantir acesso a esgoto tratado até mesmo em regiões onde não há energia elétrica

MARTA KANASHIRO

VALTER CAMPANATO/ABR

Ruas de bairro popular a dez quilômetros do centro de Brasília; pesquisa da FGV constatou que apenas 47% dos brasileiros tem acesso à rede de esgoto

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mento ambiental de esgoto, aproveitamento energético dobiogás produzido e reuso do esgoto tratado. Dessa forma, anovidade não apenas mitiga o impacto ambiental causadopelo descarte inadequado de esgoto nos corpos d’água, mastambém o do biogás na atmosfera.

A miniEETERA é composta por um sistema biodigestor anae-róbio-aeróbio-anóxio, no qual primeiro o esgoto é tratado por viaanaeróbia (sem ar), por meio de reatores anaeróbios de fluxoascendente em manto de lodo, dispostos em série, formando cas-cata e com sistema separador de fases em formato helicoidal. Emseguida, é tratado de forma aeróbia (com ar) e anóxia (sem ar, masna presença de nitrato), por meio de um reator híbrido aeróbio-anóxio tubular com aeração por bolha final, ambos construídosem polímero e concreto armado. Esse sistema é associado a outro,compacto, de co-geração de energia acionando o biogás, capaz deproduzir, simultaneamente, energia elétrica e água quente.Completa a mini-estação, o sistema de reuso de águas para ferti-irrigação, composto por uma rede de distribuição e de goteja-mento do efluente tratado.

A tecnologia, que já recebeu diversos prêmios, foi desenvolvidapor um grupo de pesquisadores, dentre eles, José Luz Silveira, Wendellde Queiroz Lamas e Fernando Spinola, todos da Faculdade deEngenharia mecânica da Unesp (campus Guaratinguetá) e porEderaldo Godoy Junior, da Unitau. O sistema proposto tem umaplanta piloto de implantação, em escala real, funcionando na Unesp,com capacidade para tratar 70 m3 /dia de esgoto e, estima-se quetenha uma produção média de 30N m3 / dia de biogás.

Ao contrário das técnicas atuais, essa tecnologia propõe mudan-ças na forma de construção de mini-estações e, principalmente,no aproveitamento dos produtos gerados durante o processo de

tratamento de esgoto. Por um lado, ao utilizar o polímero e o con-creto armado para construção da mini-estação, em lugar do tradi-cional ferro e concreto, a tecnologia se torna muito mais econô-mica, evitando também que haja corrosão ocasionada pelo ácidosulfídrico, presente no biogás. Por outro, pode produzir biogáspara que a própria mini-estação funcione, podendo ser instaladainclusive em locais sem acesso à energia. Assim, além de ter comobenefício o baixo custo operacional e a auto-suficiência energéti-ca, a mini-estação pode ser aplicada no tratamento de águas parageração de energia, permitindo o controle da poluição ambientale também a obtenção de biofertilizante.

Rumo à comercialização De acordo com Leopoldo Zuaneti, gerente do PIT junto à

Unesp, o objetivo agora é o direcionamento dessa tecnologia paracomercialização. Estão sendo feitos estudos para verificar a viabi-lidade e aplicabilidade da miniEETERA no mercado e para agre-gar valor ao produto. A tecnologia tem grande potencial, em espe-cial pelos seus efeitos ambientais e está de acordo com as normastécnicas do setor de saneamento.

De acordo com José Luz Silveira, a atuação do PIT está sendofundamental para essa etapa inovativa. O levantamento de mer-cado feito pelo programa poderá trazer visibilidade a possíveis par-ceiros que possam financiar a sua implementação. Em princípio,o público alvo são companhias de saneamento, edifícios, condo-mínios, parques, casas em área de praia, chácaras, sítios, fazenda,agroindústria e indústria alimentícia. Além dos benefícios já men-cionados, a tecnologia ainda traz uma boa oportunidade aos seusparceiros, que é a transferência de know-how, adquirido durante oprocesso de desenvolvimento do projeto.

51REVISTA CONECTA

Mini-estação de tratamento de esgoto implantada na Unesp, campus de Guaratinguetá

DIVULGAÇÃO

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Tecnologia transforma resíduosperigosos em substâncias inócuas

Um avançado processo de tratamento de resíduos perigosos,baseado na oxidação de sais fundidos foi desenvolvido no Institutode Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), uma autarquia do gover-no do estado de São Paulo, vinculada à Secretaria de Desenvolvimento.A tecnologia, que já está sendo patenteada, inclui a concepção, cons-trução e montagem de um equipamento, no qual os resíduos nosestados sólido, líquido e gasoso são transformados em água e gás car-bônico, substâncias inócuas para o meio ambiente. O processo tam-bém possui um sistema exclusivo de injeção, constituído por duaslanças que aumentam a eficácia da degradação do resíduo.

A tecnologia foi identificada pelo Programa de InvestigaçãoTecnológica do Estado de São Paulo (PIT-SP) como um promissorproduto para o mercado. O pesquisador responsável pelo equipa-mento, Paulo Ernesto Lainetti, chefe da Divisão de TecnologiaQuímica e Ambiental do Ipen, sentiu-se desafiado ao perceber quesua pesquisa poderia ser difundida e desenvolvida junto a empre-sas, revela Rodolfo Politano, gerente do PIT no Ipen. A fase pilotoda pesquisa já estava bastante avançada e a atuação do programamostrou uma nova visão para o pesquisador, inclusive a possibili-dade de transferir a tecnologia para o mercado.

A pesquisa teve início em 1999, e a tecnologia desenvolvidafoi resultado da tese de doutorado de Lainetti. A tecnologia des-tina-se, sobretudo, ao tratamento de resíduos orgânicos perigosose de difícil manipulação. Tais resíduos, quando eliminados pormétodos mais comuns, como a incineração, liberam para a atmos-

fera substâncias nocivas ao meio ambiente. Uma das vantagensdo sistema é a sua adaptação para pequenas escalas e possível usoem uma unidade móvel de tratamento de resíduos, diferente-mente dos incineradores que, em geral, são grandes unidades ins-taladas em local fixo. “Isso implica em menores investimentos,menor impacto ambiental e eliminação dos riscos de acidentescom o transporte dos resíduos perigosos para os locais de pro-cessamento”, ressalta o pesquisador.

A técnica é inédita no Brasil e promove uma decomposição maiscompleta e segura de resíduos orgânicos considerados críticos, comoos poluentes orgânicos persistentes (POPs), os pesticidas, PCBs, pro-dutos químicos obsoletos, além dos compostos extremamente ener-géticos, como propelentes e explosivos. Esses compostos são acusa-dos de causar doenças graves e má-formação em seres humanos eanimais. Por isso é preciso coletá-los e destruí-los adequadamente.

O processo apresenta características intrinsecamente segurasquanto à decomposição de compostos organoclorados e de outroscompostos halogenados, bem como para aqueles que contenhamenxofre e fósforo. A oxidação de materiais orgânicos, abaixo dasuperfície de um banho salino, permite que as moléculas de hidro-carbonetos sejam imediatamente oxidadas a dióxido de carbono eágua na forma de vapor. Nesse processo, o resíduo e o oxidante(normalmente o ar) são misturados em um leito turbulento de saisem estado de fusão. Não há formação de chama, como na incine-ração e outros processos de tratamento de resíduos envolvendo acombustão. Outro diferencial da tecnologia é o uso de sais fundi-

dos, que aumentam a eficiência da troca de calor ao reagircom os compostos dos resíduos. Por fim, o sal também podeser reutilizado no processo em outras aplicações.

Primeiro protótipoOs recursos para o desenvolvimento da tecnologia vie-

ram do próprio Ipen, que é gerenciado técnica, administra-

REVISTA CONECTA

ENGENHARIAQUÍMICA

Equipamento desenvolvido no Ipen possui um sistema exclusivo de injeção que já está sendo patenteado

MICHELA DE PAULO

Na maioria dos casos é de responsabilidade do próprio gerador do resíduo dar o devido tratamentopara tal. Apenas nos casos de resíduos domiciliares, públicos e em alguns poucos casos de resídu-os comerciais (até no máximo 50 kg), cabe à prefeitura do local se responsabilizar pelo tratamentoe destinação final. Dados da Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos (Abetre)mostram que o Brasil trata apenas 22% dos resíduos industriais perigosos. O restante, 78%, querepresentam 2,3 milhões de toneladas, é despejado em lixões.

RESÍDUOS INDUSTRIAIS – QUEM É RESPONSÁVEL?

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tiva e financeiramente pela Comissão Nacional de Energia Nuclear.Os equipamentos utilizados estavam ociosos e pertenciam ao Ciclodo Combustível Nuclear. O primeiro protótipo do equipamento foiconstruído em laboratório e, atualmente, encontra-se em um está-gio chamado de unidade-piloto. O pesquisador conta, ainda, queum dos equipamentos utilizados durante a pesquisa, encontra-sequebrado e sem possibilidade de conserto. “Esse equipamento eracompartilhado por diversas áreas. Estamos tentando viabilizar a aqui-sição de um novo, mas os custos são elevados”, afirma.

Para a obtenção de novos recursos para a continuidade dos estu-dos, os pesquisadores submeteram um projeto ao Programa deInovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe), da Fundaçãode Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), ainda emanálise. O objetivo é a viabilização do processo de degradação depesticidas que são, em geral, organoclorados e outros organohalo-genados. A empresa Vitex Agricultura e Pecuária, com sede na capi-tal paulista, contribuirá com sua experiência e conhecimento sobreo mercado de pesticidas. Uma das vertentes do projeto é demons-trar a viabilidade do processo ao órgão ambiental, no caso aCompanhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb).

Para Lainetti, o investimento das empresas brasileiras em pes-quisa ainda é muito pequeno. Boa parte dos recursos provém deverbas do governo e para o país tornar-se mais competitivo, princi-palmente no setor industrial, este quadro precisa mudar.

Mercado e novas tecnologiasA introdução de novas tecnologias no mercado depende tam-

bém da evolução da legislação ambiental e de suas exigências quan-to ao controle das emissões de resíduos. Hoje, a escolha do méto-do para tratamento não se baseia em critérios de adequação doresíduo à tecnologia, mas principalmente, ao custo do tratamen-to. Dessa forma, nem sempre a eliminação do resíduo a custos bai-xos significa que houve um tratamento eficiente e seguro ao meioambiente.

“O tratamento de resíduos perigosos implica, certamente, emcustos adicionais para as empresas, e com uma legislação brandaou pouco específica, algumas empresas preferem correr o risco.Ainda que a educação seja de fundamental importância para a solu-ção dos conflitos existentes nas sociedades civilizadas, multas e pena-lizações são necessárias para combater os recalcitrantes”, observa opesquisador Lainetti.

No Brasil, a Lei de Crimes Ambientais foi aprovada no iníciode 1998, estabelecendo pesadas sanções para os responsáveis peladisposição inadequada de resíduos. Para regulamentar a questão hátambém as resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente,Conama, (para o licenciamento de resíduos industriais perigosos,destinação final de resíduos sólidos), a Convenção da Basiléia e olicenciamento ambiental, obrigatório para a instalação de indús-trias, por exemplo.

O governo federal, através do Ministério do Meio Ambiente(MMA) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos RecursosNaturais Renováveis (Ibama) está propondo um projeto para carac-terizar os resíduos industriais por meio de um inventário nacional,visando traçar e desenvolver uma política de atuação que reduza aprodução e destinação inadequada de resíduos perigosos.

53REVISTA CONECTA

Acima, equipamento elaborado peloIpen para o tratamento de resíduos

orgânicos perigosos em sais fundidos; ao lado, decomposição

dos resíduos em sais fundidos

Funcionamento do processo de tratamento de resíduos perigosos baseado na oxidação de sais fundidos

FOTOS: PAULO LAINETTI/IPEN

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Novo biodiesel entra na reta de chegada ao mercado

Torna-se cada vez mais urgente implementar ações que, de for-ma efetiva, possam reduzir a dependência do petróleo nas matri-zes energéticas. Alta de preços, instabilidade no mercado interna-cional, redução das reservas, impacto ambiental do seu refino e dacombustão de seus derivados, são alguns dos problemas que oscombustíveis fósseis têm gerado. O biodiesel é um candidato queapresenta potencialidades extremamente atraentes do ponto devista econômico, social e ambiental.

De olho nessa possibilidade, os pesquisadores da equipe doprofessor Miguel Joaquim Dabdoub Paz,químico e coordenador do Laboratóriode Desenvolvimento de TecnologiasLimpas (Ladetel), do Departamento deQuímica da Universidade de São Paulo(USP) de Ribeirão Preto, têm investidono aprimoramento da tecnologia do bio-diesel. Diminuir o tempo e o custo daprodução e elevar a pureza e o aprovei-tamento do produto final são metas quejá foram alcançadas. O desenvolvimentoda tecnologia já está na reta final e depen-de apenas de empresas interessadas emadquiri-la.

Daniel Dias, agente de inovação dopólo Piracicaba (SP) da Agência USP deInovação, conta que três aspectos fizeramcom que a tecnologia do biodiesel fosseselecionada pelo Programa de InvestigaçãoTecnológica: "Pelo fato do biodiesel seruma alternativa de combustível renová-vel, com potencial de substituir parcial-mente as demandas de petróleo; por ter

o potencial de ser contemplada por políticas públicas como o PlanoNacional de Agroenergia; e por existir ainda a previsão de partici-pação cada vez maior do biodiesel em nossa matriz energética". OPlano Nacional prioriza o desenvolvimento e transferência deconhecimentos e tecnologias que contribuam para a produção euso sustentável de energia renovável, visando promover maior com-petitividade no agronegócio brasileiro e dar suporte às políticaspúblicas. O biodiesel é uma das estrelas do Plano, colocado comouma das grandes esperanças para ampliar a contribuição brasilei-ra na redução das emissões de carbono e a participação nos negó-

cios do mercado de créditos de carbono.

Patentes: catalisadores Em 2004, Miguel Dabdoub deposi-

tou a patente de invenção para o "Processode preparação de biodiesel e biodieselassim obtido". De acordo com Daniel Dias,foram depositadas ainda mais duas paten-tes, agora de catalisadores, responsáveispor "acelerar o processo de transformaçãode óleo vegetal em biodiesel”. Trata-se deuma solução adequada para a obtençãode um produto com pureza bastante ele-vada, de forma econômica e simplificada.Com a realização do processo patentea-do, o produto final — o biodiesel — atin-ge os mais elevados padrões de qualidadeespecificados em normas européias, nor-te-americanas e brasileiras.

Esse biodiesel foi desenvolvido utili-zando matérias-primas de origem vegetalou animal, misturadas ao etanol ou meta-nol. Anteriormente, o processo de pro-

REVISTA CONECTA

ENGENHARIAQUÍMICA

Pesquisadores da USP de Ribeirão Preto melhoram produção de biodieselcom catalisadores e obtêm produto mais rentável e eficiente

SUSANA DIAS

Patente do produto foi depositada apenas no Brasil

DIVULGAÇÃO

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dução de biodiesel era feito somente a partir da misturas com ometanol, que é poluente e, na maior parte dos casos, extraído decombustíveis fósseis. O desafio central da equipe de Miguel Dabdoubera o de baixar os preços para tornar o biodiesel competitivo e esta-belecer um programa eficiente, e com matérias-primas bastantediversificadas, para que o produto final não ficasse à mercê das flu-tuações e disponibilidades das culturas.

O novo biodiesel patenteado constitui um importante passona superação desses desafios ao apresentar grande flexibilidadequanto às potenciais matérias-primas. Ele pode ser feito a partirde diversos materiais, como, por exemplo, materiais de origemvegetal (soja, amendoim e outros grãos, mamona, dendê, algasmarinhas) e gordura animal (o sebo bovino é apontado como alter-nativa mais interessante), além da possibilidade de utilização de resí-duos que podem ser poluentes.

A patente do biodiesel foi depositada apenas no Brasil e o tex-to completo encontra-se acessível. Para Daniel Dias, isso é umadesvantagem quando se pensa no mercado internacional, masque pode ser superada pelo fato do Brasil ter uma grande área paraprodução de matéria-prima, além de clima e outras condiçõesfavoráveis à produção desse biocombustível. "Se tivéssemos umametodologia como a do PIT-SP, por ocasião do depósito ou dodesenvolvimento da tecnologia, talvez tivéssemos gerado um estu-do que despertasse o interesse de parceiros para arcar com o cus-to do depósito internacional. Dessa forma, a tecnologia poderiater sido depositada em outros países com potencial de produçãode biodiesel e haveria maior interesse por parte de outras empre-sas", avalia o agente.

Inovação e biocombustíveisPara a produção do biodiesel são

utilizados catalisadores que tornamo processo de transformação dosóleos ou gorduras em biodiesel maiseficiente. No processo tradicional,o tempo de produção de uma tone-lada de óleo é de, aproximadamen-te, seis horas. Já no novo processo,desenvolvido por Miguel Dabdoube sua equipe, utiliza catalisadores,indutores e absorventes que otimi-zam a reação e facilitam o processo

de separação biodiesel e subprodutos. Além disso, antes do processo patenteado pela USP Ribeirão

Preto, o biodiesel obtido tinha a desvantagem, em relação ao die-sel do petróleo, de promover carbonização e formar depósitos nosbicos injetores nos motores dos veículos. Isso se deve às própriascaracterísticas dos óleos e gorduras. Um dos desafios tecnológi-cos que a equipe de Miguel Dabdoub tem enfrentado com afin-co, nos últimos anos, é exatamente obter um combustível a par-tir de matéria vegetal ou animal que tenha propriedades seme-lhantes às do diesel de petróleo. A transesterificação dos óleos egorduras ácidos graxos é a reação que tem permitido a obtençãode um combustível com menor densidade e viscosidade. Alémdisso, esse processo permite remover a glicerina, substância quese transforma em acroleína, durante a queima do combustível,gerando conseqüências para saúde e ambiente, uma vez que é cor-rosiva, irritante e tóxica. A remoção da glicerina permite reduziros custos de produção do biodiesel, já que esta pode ser comer-cializada, com mercado certo e de alto valor agregado.

O mercado de combustíveis renováveis tende a crescer emtodo mundo e a expectativa é de que o Brasil possa atender par-te dessa demanda com o biodiesel. Nesse sentido, a redução doscustos e o aprimoramento da tecnologia do biodiesel tornam-seessenciais e passam pela ampliação de incentivos à pesquisa,desenvolvimento e produção. Além de transferir a tecnologia donovo biodiesel para empresas interessadas, a equipe de Dabdoub,com o apoio da Agência USP e do PIT-SP, também procura par-ceiros para a continuidade das pesquisas e desenvolvimento deinovações.

55REVISTA CONECTA

Veículo da empresa Real Ônibus, movido a biodiesel, que circula pelas ruas de Copacabana, no Rio de Janeiro

DIVULGAÇÃO

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Setor cerâmico ganha equipamentopara diminuir emissão de poluentes

Diminuir a emissão de um dos principais poluentes atmosféri-cos — os fluoretos — para valores menores do que o estabelecido pelaCompanhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) é ogrande diferencial de um equipamento termo-ativado para trata-mento de emissões gasosas, desenvolvido pelo Instituto de PesquisasTecnológicas (IPT), em parceria com as empresas Comgás e Key-Tek,esta última sediada em Santo André (SP). A tecnologia contou como auxílio do Programa de Investigação Tecnológica do Estado deSão Paulo (PIT-SP) que forneceu subsídios ao instituto para a reda-ção e definição da patente do equipamento, que já foi solicitada.

A tecnologia consiste na depuração (ou purificação) dos gasesemitidos pelas indústrias de base mineral. Para isso, utiliza-se um for-no abastecido com gás natural que promove o aquecimento doambiente. O calor aumenta a reatividade da adsorção química, queé a adesão de moléculas de um fluido – no caso o fluoreto – a umasuperfície sólida que, nesse processo, são pelo-tas de cal hidratadas. O resultado é uma maioreficiência na depuração do fluoreto, sendo estauma das principais características e vantagensdo sistema em comparação às tecnologias simi-lares, que utilizam o adsorvedor químico sem aativação térmica. A tecnologia criada pelo IPTpossui uma câmara termo-ativada, capaz de ope-rar em temperaturas elevadas, aumentando a efi-ciência das reações descritas.

O processo termo-ativado para tratamen-to de emissões gasosas foi testado em escalapiloto na indústria Nardini Cerâmica, per-tencente ao arranjo industrial produtor de cerâ-mica na cidade de Santa Gertrudes (SP). Paraa realização dos testes e experimentos, foi cons-truído na empresa o protótipo de um equipa-

mento. “Tivemos algumas dificuldades de ordem técnica, com amontagem do protótipo e em relação às análises químicas, mas omaior problema foi realizar testes em uma fábrica que não podeparar, e onde a atenção dada ao trabalho de pesquisa tem baixaprioridade”, analisa o geólogo José Francisco Marciano Motta,coordenador da pesquisa e responsável pela Seção de RecursosMinerais e Tecnologia Cerâmica do IPT.

Mais vantagensOutra grande vantagem da tecnologia é reduzir significativa-

mente o porte dos filtros tradicionais (mangas) quando comparadocom outros métodos de depuração, como o via-seca; além de tam-bém dispensar o uso da água, quando comparado com os métodosvia úmida ou semi-úmida. “Quanto ao tamanho e economia, oequipamento em desenvolvimento é mais compacto, de custo ope-racional mais simples e deve gerar ‘resíduo’ com granulometria e

REVISTA CONECTA

Protótipo do equipamento construído para tratamento de emissões gasosas

ENGENHARIAQUÍMICA

Processo inédito para tratamento de emissões gasosas teve auxílio doPIT para definição e redação do tipo de patente a ser desenvolvida

MICHELA DE PAULO

DIVULGAÇÃO/IPT

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qualidade adequada para se tornar matéria-prima em outro setorindustrial” explica Motta. O processo produz como subproduto afluorita, que possui valor comercial como fundente. O fundentepermite que reações no processo ocorram a temperaturas mais bai-xas, economizando energia. Por exemplo, para a fabricação de vidro,a areia é o principal componente e só se funde a cerca de 1.700o C.Mas adicionando-se um fundente (no caso soda ou borax), as indús-trias conseguem que a mistura se funda em 1.500o C. No ramo side-rúrgico, na fabricação de ferro-ligas também pode-se usar a fluoritacomo fundente.

Na visão de Hudson Brito, consultor técnico da Comgás, amaior vantagem do equipamento é não utilizar energia elétrica esim o gás natural, uma fonte de energia que apresenta diversas van-tagens. Além de ser uma energia mais barata, quando utilizadoem instalações industriais o gás natural reduz a possibilidade decorrosão e não causa incrustações nos equipamentos, prolongan-do sua vida útil; diminui problemas de poluição ao meio ambien-te, evitando gastos com sistemas anti-poluentes e com tratamentode efluentes; melhora a produtividade e a qualidade em vários pro-cessos produtivos, aumentando a competitividade externa dos pro-dutos; proporciona maior segurança, por ser mais leve que o ar e,em caso de vazamento, o gás se dissipa rapidamente na atmosfe-ra, diminuindo o risco de explosões e incêndios.

Mediante alguma adaptação, o equipamento desenvolvido peloIPT tem potencial para ser utilizado nas indústrias de alumínio,vidro e fertilizantes. A cal hidratada pelotizada, por exemplo, usa-da como depurador químico da tecnologia, após a saturação podeser utilizada como insumo em outros segmentos industriais, ou atémesmo ser incorporada à massa cerâmica.

MercadoO processo mostrou-se viável, mas o protótipo não está em sua

forma acabada. Ainda falta um melhor desenvolvimento de enge-

nharia, para ajustar e automatizar o equipamento. “Estamos, ago-ra, com um projeto de reavaliação, montagem de um novo protó-tipo em escala maior, para execução de medições e monitoramen-to do desempenho. Depois disso, pretendemos montar um equi-pamento em escala real, no entanto, ainda não decidimos em quefábrica será instalado”, revela Motta.

O pesquisador conta que a idéia de realizar a pesquisa surgiuquando a Cetesb determinou o limite de emissões para fluoreto pelasindústrias de placas cerâmicas do Pólo Cerâmico de Santa Gertrudes,maior pólo cerâmico brasileiro e das Américas. Os compostos defluoreto na forma gasosa, mesmo em baixas concentrações, podemresultar em danos sensíveis ao meio ambiente e ao ser humano. Porisso, muitas empresas instalaram filtros para abatimento de fluo-reto. “Os empresários foram obrigados a colocar os filtros tradi-cionais (mangas) e agora, somente quando eles tiverem que trocaros filtros é que teremos a chance de oferecer a nova tecnologia desen-volvida com o IPT”, conclui Brito. Na opinião de Motta, a implan-tação da nova tecnologia é de custo similar à anterior, eventual-mente até um pouco menor. Além disso, o setor de revestimentoscerâmicos está sempre atualizado e encontra-se bastante fortaleci-do economicamente, o que indica que a nova tecnologia deverá serassimilada facilmente.

Apoio à inovação“O principal resultado da atuação do PIT em relação a essa tec-

nologia foi a visão da natureza da patente, ou seja, definimos pri-meiro qual o tipo de patente do processo, para sua posterior reda-ção”, afirma Cláudio Fuentes, gerente do PIT no IPT. O programanão influenciou diretamente a chegada dessa tecnologia ao mercado,pois desde o início da pesquisa a empresa era parceira do IPT.

Segundo Angela Puhlmann, coordenadora do PIT e do NIT doIPT, o suporte do programa também foi importante para a decisãodos pesquisadores quanto aos rumos dos trabalhos. Em abril desteano, iniciou-se uma nova pesquisa em escala industrial do equipa-mento. “Há um contrato recém assinado entre IPT, Comgás e AgênciaReguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo(Arsesp), utilizando recursos da Comgás para dar continuidade aotrabalho”, diz Motta, do IPT. De acordo com Hudson Brito, os estu-dos devem terminar em 2010. O consultor da Comgás afirma quea empresa, desde 2004, é obrigada a investir 0,5% da margem líqui-da de lucro em pesquisa e desenvolvimento, o que lhes garantiu umconjunto de projetos focados no segmento cerâmico.

57REVISTA CONECTA

Equipamentos laboratoriais utilizados no projeto

DIVULGAÇÃO/IPT

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Separando o joio do trigo

Imagine um estudo de doping para analisar se um deter-minado atleta ingeriu um tipo de hormônio. Geralmente, uti-liza-se exame de urina, saliva, ou sangue para verificar a pre-sença desse hormônio. No entanto, esses fluidos corporais nãopodem ser analisados diretamente no aparelho de análise, edevem passar por procedimentos prévios para preparar as amos-tras. É necessário processar esses fluidos, para que o hormônioseja separado (purificado) e concentrado, e só depois seja sub-metido à análise. O mesmo vale quando se fala da análise daságuas de um rio que estejam contaminadas por determinadassubstâncias. Separar misturas e componentes, purificar subs-tâncias de uma amostra para análise é o tema de uma tecnolo-gia desenvolvida no Instituto de Química da UniversidadeEstadual Campinas (Unicamp), que promete maior eficiênciae menor custo ao processo.

Há muitos anos já se utiliza a técnica de cromatografia comométodo para fazer essas separações químicas e identificar com-ponentes. Essa técnica foi criada pelo botânico russo MikhaelTswett, em 1906, quando separou substâncias de extratos de plan-ta e, desde então, vem evoluindo. A incessante busca por méto-dos capazes de extrair substâncias com mais eficiência, deve-seao fato das etapas de purificação e concentração de substânciasnos processos de extração serem fundamentais para a eficiên-cia da análise.

Em muitas ocasiões, é extremamente lento, caro e pouco efi-ciente o processo de extração para se chegar a uma substância dealta pureza, que já tenha eliminado os outros componentes mis-turados (interferentes). O sistema de extração desenvolvido naUnicamp, por Ricardo Mathias e Susanne Rath pode modificarconsideravelmente esse quadro, pois permite eliminar interferen-tes com menor uso de solventes, em menor tempo, realizando umaextração mais seletiva. De acordo com Susanne e Mathias, com essanova técnica é possível a redução dos custos das análises, o aumen-to da eficiência da extração, a obtenção de substâncias mais con-centradas, e a viabilização de análises de amostras que antes o sis-

tema convencional não permitia. Mathias explica que o processo de separação de substâncias

por afinidade entre materiais — cromatografia — já existia, e que omérito da pesquisa realizada foi incluir nesse processo a eletricidadedurante a extração. De acordo com ele, é uma idéia simples, ins-pirada num processo conhecido como eletrocromatografia capi-lar. “Esse outro método — diz ele — existe em micro-escala, já o quefizemos servirá para escalas maiores”.

A melhoria que é obtida pelo uso da eletricidade na separaçãodas substâncias ocorre por atração eletrostática (cargas positivas enegativas) ainda tem a vantagem de não ser uma inovação queintroduz no processo novos materiais (substâncias). De acordo comos pesquisadores, é comum que as inovações nessa área se dêempela introdução de outros materiais no processo, mas estes sem-pre precisam ser avaliados para verificar a possibilidade do seuimpacto ambiental e sua adequação às normas técnicas. “Comonão é o caso de um novo material, mas de uma nova técnica, entãoo mercado poderá absorver essa inovação de forma muito mais rápi-da”, destacam os pesquisadores.

A tecnologia foi patenteada por Susanne e Mathias em 2007,por meio da Agência de Inovação Inova Unicamp, mas ainda nãoestá licenciada e atualmente encontra-se em escala laboratorial.Segundo Janaína César, gerente do Programa de InvestigaçãoTecnológica junto a Unicamp, o PIT teve como tarefa ampliar avisão do mercado em que a tecnologia está inserida e, conse-qüentemente, o levantamento de possíveis empresas que pode-riam se interessar pela pesquisa desenvolvida na universidade. Agrande aposta é na comercialização dessa tecnologia, que poderáser oferecida para análises em centros de toxicologia, centros depesquisa, laboratórios de análises clinicas, centrais analíticas e emcentros de bioequivalência, dentre muitos outros campos possí-veis de aplicação e interesse.

Os pesquisadores têm ainda a expectativa de ampliar a paten-te, aperfeiçoando ainda mais a técnica já desenvolvida. Para eleshá grande possibilidade de interesse internacional no produto eque seja inovador e competitivo no mercado mundial.

REVISTA CONECTA

QUÍMICA

Novo método promete processo de purificação de amostras para análise de maneira mais rápida e eficiente

MARTA KANASHIRO

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Antídoto tropical para a úlcera

Do extrato das folhas da guaçatonga (Casearia sylvestris) devemsurgir novos produtos para o combate das úlceras gastroduode-nais: cápsulas, pastilhas, pílulas, elixires, xaropes, injeções. Compostosquímicos do grupo das casearinas com atividade antiulcerosa foramisolados, identificados e avaliados em uma parceria de pesquisa-dores do Departamento de Farmacologia do Instituto de CiênciasBiomédicas da Universidade de São Paulo (USP) com oDepartamento de Química Orgânica do Instituto de Química daUniversidade Estadual Paulista (Unesp) de Araraquara. O traba-lho resultou numa patente relativa ao extrato da guaçatonga parao tratamento de úlceras em seres humanos, animais domésticos eeqüinos. Os titulares da patente são a USP, a Unesp e a Fundaçãode Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que finan-ciou a pesquisa. A idéia é licenciar a tecnologia para uma indús-tria farmacêutica, que se encarregaria de conduzir os ensaios clí-nicos em humanos, cujo custo é estimado em US$ 500 mil.

A guaçatonga é nativa dos trópicos; sua distribuição se estendedo Caribe à Argentina. No Brasil, é encontrada em diversas forma-ções florestais: Cerrado, Mata Atlântica, Amazônia. Também conhe-cida como guassatonga, vaçatunga, erva-bugre, café-do-diabo, língua-de-tiú, pau-de-largarto e muitos outros nomes populares, essa plan-ta é tradicionalmente utilizada para diversos fins: o suco da casca éusado contra febres, diarréias, herpes e mordedura de cobra; elixi-res são preparados contra reumatismo, artrite, eczemas, sarnas e úlce-ras. A ação cicatrizante vem de uma lenda indígena segundo a qualo lagarto só enfrenta a cobra na presença de uma guaçatonga — sefor picado, pode comer a raiz da planta. Pesquisadores japoneses jápatentearam o uso de seu extrato contra tumores e outros usos daplanta têm sido investigados por cientistas de diversos países.

Foram necessários muitos testes até se chegar a um extratoadequado. Em camundongos, ratos, coelhos, cachorros e eqüi-nos a regressão das úlceras foi total. A patente foi obtida apenaspara os extratos e frações de guaçatonga porque a molécula res-ponsável pela cicatrização, ou seja, o princípio ativo não foi iso-lado ainda. Depois disso, será necessário desvendar o mecanismo

de ação da substância. Os resultados dos testes mostram que medi-camentos baseados no extrato da planta combinarão diversascaracterísticas vantajosas em relação aos tratamentos existentesno mercado — entre eles, os antiácidos e a intervenção cirúrgica.Poderão ser administrados em doses menores, como tambémserão reduzidos o tempo de tratamento e a freqüência com queo medicamento deve ser tomado.

O extrato da planta aumenta também a camada de mucosa quereveste as paredes do estômago; não tem efeitos abortivos; não alte-ra o pH (“acidez”) do suco gástrico; age em todos os níveis de lesão(leve, moderada e grave) e, por último, mas não menos importante,produz uma cicatrização da área lesada que é cerca de duas vezesmais rápida que a induzida por outras drogas. O grupo lideradopor Jayme Sertié, da USP, pretende, agora, melhorar as condiçõesde extração, obter moléculas de maior nível de pureza e realizar tes-tes toxicológicos pré-clínicos em animais e os ensaios clínicos emvoluntários adultos sadios e portadores de úlcera. Esses passospodem tomar de três a cinco anos.

Diferentemente do que ficou cristalizado no senso comum, apartir do que acreditavam os médicos, úlceras não resultam somen-te de estresse. Por mais incrível que seja a idéia de um organismosobreviver à acidez do estômago, a maioria das lesões está associa-da a uma bactéria, chamada Helicobacter pylori, que aproveita osmomentos de baixa imunológica para atacar o órgão. Hoje se sabeque ela é responsável por mais de 95% dos casos de úlcera gastro-duodenal e 80% de úlcera gástrica. O uso de antiinflamatóriostambém pode causar úlceras, sobretudo na população mais idosa.O grau de infecção pela H. pylori varia entre faixas etárias, regiõese níveis socioeconômicos. No Brasil, estima-se a prevalência em 13-70% nas pessoas de 0 a 20 anos e em 70-94% nos indivíduos comidade superior a 30 anos.

Assim, pode-se dizer que os remédios terão grande potencialde venda. Ainda mais porque os pesquisadores recomendam quecada cápsula seja vendida por menos de R$ 3,00, tornando o cus-to do tratamento acessível mesmo aos cidadãos mais carentes eportadores da forma leve da doença.

FARMÁCIA

Resultados de testes feitos com CCaasseeaarriiaa ssyyllvveessttrriiss mostram que medicamentos baseados no extrato da planta combinarão diversas características vantajosas em relação aos tratamentos existentes no mercado

FLAVIA NATÉRCIA

59REVISTA CONECTA

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Pesquisa pode dar origem a novosmedicamentos para anemia falciforme

Desenvolver um novo medicamento para o tratamento depacientes da anemia falciforme é o objetivo de uma pesquisa desen-volvida pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de MesquitaFilho” (Unesp), e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp),em conjunto com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)e Universidade Federal de Alagoas (Ufal). A anemia falciforme éuma doença hereditária grave em que as células sanguíneas sãodeformadas, adquirindo forma de foice. O doente pode sofrer cri-ses dolorosas, úlceras na pele, icterícia, infecções bacterianas e pos-terior fibrose do baço, o que pode levá-lo à morte. Além disso,enquanto as células normais vivem aproximadamente 120 dias nacorrente sanguínea, as células de sangue falciformes vivem entre10 e 20 dias. Como elas não são substituídas rapidamente, o san-gue é cronicamente escasso de células vermelhas. O resultado é umquadro de anemia crônica.

A anemia falciforme não tem cura. O tratamento disponívelhoje apenas ameniza os sintomas da doença. O único fármaco dis-ponível é a hidroxiuréia, um medicamento qui-mioterápico, utilizado em pacientes com câncer.“O tempo pelo qual o paciente vai receber o medi-camento é indefinido. Muitas vezes o tratamen-to é iniciado muito cedo porque algumas pessoascomeçam a ter sintomas com apenas seis mesesde vida. Não se sabe ainda os efeitos a longo pra-zo”, explica Fernando Ferreira Costa, professorda Faculdade de Ciências Médicas (FCM) daUnicamp. “Por ser um inibidor da síntese deDNA, a hidroxiuréia é uma substância extrema-mente tóxica em tratamentos prolongados. Por issoum de nossos objetivos é buscar novos compos-tos, mais seguros e eficazes, que possam ser umaalternativa ao tratamento da doença”, explica Jean

Leandro dos Santos, pesquisador da Faculdade de CiênciasFarmacêuticas da Unesp de Araraquara.

Chaves duplasA pesquisa resultou no desenvolvimento de compostos que

atuam da mesma forma que a hidroxiuréia, mas sem a característi-ca genotóxica. Para isso foi utilizada a estratégia de modificaçãomolecular denominada hibridação. Por meio dessa técnica umaequipe de pesquisadores da Unesp buscou conservar as caracterís-ticas benéficas da molécula talidomida e da hidroxiuréia. A tali-domida é uma substância utilizada como fármaco sedativo e hip-nótico, além disso, possui propriedades antiinflamatórias. Devidoaos seus efeitos chamados teratogênicos (anomalias e malforma-ções ligadas ao desenvolvimento embrionário ou fetal), deve ser evi-tada durante a gravidez. Entretanto, apesar dos efeitos negativos, atalidomida tem o poder de inibir a citocina TNF-alfa, substânciaque se apresenta em níveis elevados nos pacientes com anemia fal-ciforme e que é responsável pelo agravamento das crises dolorosas.

“De uma maneira simplista, podemos imaginarcada fármaco como uma chave que se liga a umaúnica fechadura — o receptor — para produzir efei-tos farmacológicos específicos daquele receptor oualvo. Por meio da hibridação conseguimos dese-nhar estruturas químicas que funcionam comochaves duplas, capazes, portanto, de atuar em alvosdiferentes com uma única estrutura química”, escla-rece Santos. Assim, uma mesma molécula combi-na dois efeitos benéficos no tratamento da doen-ça: atividade antiinflamatória e analgésica e a capa-cidade de aumentar a síntese de hemoglobina fetal.

Nos testes in vitro realizados até agora, noHemocentro da Unicamp percebeu-se que essescompostos têm a capacidade de doar óxido nítri-

REVISTA CONECTA

Células sanguíneas normais e a célula em forma de foice, determinante

da anemia falciforme

FARMÁCIA

No Brasil, uma em cada mil pessoas nasce com a doença, e os gastos com medicamentos para o tratamento, que apenas ameniza os sintomas, chegam a R$ 4 bilhões por ano

PATRÍCIA MARIUZZO

REPRODUÇÃO

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co, um vasodilatador responsável pela manu-tenção do fluxo e pressão sanguínea nor-mal. Eles também aumentam a hemoglo-bina fetal, o mesmo mecanismo de açãobenéfico, explorado com o tratamento usan-do hidroxiuréia. A pesquisa ainda está emfase pré-clínica. Nesta fase são checados parâ-metros de segurança e eficácia, por meio deestudos de toxicidade e de atividade in vitroe in vivo, isto é, em animais. “Vamos apli-car esses compostos em camundongos trans-gênicos que possuem anemia falciforme.Esses animais são um modelo experimen-tal de fundamental importância para ava-liarmos os efeitos sobre a fisiopatologia dadoença”, explica Carolina Lanaro, pesquisadora da área de hema-tologia, da FCM da Unicamp. Os pesquisadores ressaltam que osresultados obtidos até agora, embora promissores, ainda são ini-ciais. Eles só serão definitivos após os testes clínicos, próxima faseda pesquisa, onde são avaliadas a segurança e eficácia do com-posto em seres humanos.

A análise dessa tecnologia, que integra o Programa de InvestigaçãoTecnológica do Estado de São Paulo (PIT-SP), permitiu agregar valorà pesquisa ao trazer informações de mercado para elaboração do

modelo de negócio mais viável. Seu públi-co alvo seriam indústrias farmacêuticas quejá possuem no mercado algum medicamentopara tratamento da anemia falciforme ouempresas que realizam pesquisas na área eque desejem apoiar a finalização da pesqui-sa, industrializar e comercializar o fármaco.Se a tecnologia for licenciada em seu atualestágio de desenvolvimento, os parceirospoderiam acelerar a entrada dos compostosnos testes clínicos. Segundo Carolina Lanaro,seria papel desses parceiros definir a via deuso do medicamento (oral, injetável, etc) deacordo com a estabilidade do fármaco e aspretensões comerciais da empresa.

No Brasil, uma em cada mil pessoas nasce com anemia fal-ciforme. O teste do pezinho, um conjunto de exames realizadono bebê nos primeiros dias de vida, é capaz de detectar mais de45 doenças, entre elas esse tipo de anemia. Segundo dados doMinistério da Saúde, em 2005 a doença acometia entre 40 mile 50 mil brasileiros. Estes números tornam a doença um pro-blema de saúde pública. Ainda de acordo com o Ministério, em2005, os gastos com medicamentos para pacientes com anemiafalciforme foram estimados em R$ 4 bilhões.

61REVISTA CONECTA

Rosenício Eustáquio Nunes é aluno de iniciação cien-tífica do Laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento deFármacos, da Unesp de Araraquara, uma das instituiçõesque participa dessa pesquisa. Nunes tem anemia falci-forme e foi ele o autor da proposta de estudar novoscompostos que pudessem auxiliar no tratamento dadoença. “Até então, não conhecíamos nada em nossolaboratório sobre anemia falciforme. O desafio propos-to por Nunes acabou nos estimulando a estudar a doençae buscar um candidato a fármaco que pudesse melhorara qualidade de vida dos portadores da doença”, conta JeanLeandro dos Santos. Infelizmente, Nunes teve que seafastar do trabalho no Laboratório por causa das conse-qüências da doença, mas acompanha o projeto, mesmode longe, e já comemora o potencial promissor do novocomposto desenvolvido por seus colegas de pesquisa.

BUSCA PELA CURA

A farmacêutica Carolina Lanaro realiza testes in vitro no Hemocentro da Unicamp

FERNANDO PETERMANN

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Brasil produz tecnologia para terapia de combate ao câncer

O Brasil dispõe agora de tecnologia para a produção do radio-isótopo Lutécio-Octreotato, elemento radioativo utilizado na fabri-cação de um radiofármaco de alta especificidade para o trata-mento de tumores neuroendócrinos. O método de produção foidesenvolvido no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares(Ipen) e a tecnologia foi selecionada para avaliação pelo Programade Investigação Tecnológica do Estado de São Paulo (PIT-SP) devi-do à forte característica de apelo social, ou seja, um medicamen-to nacional desenvolvido por instituto público de pesquisa e uti-lizado no diagnóstico e tratamento do câncer.

Rodolfo Politano, gerente do PIT no Ipen, diz que a área desaúde e medicina sempre foi considerada prioridade pela socie-dade o que motivou o programa a selecionar a pesquisa para divul-gação. Além disso, o Ipen tem uma interação muito forte com acomunidade médica, além de diversas clínicas e hospitais do paíse o PIT tem ajudado a disseminar uma cultura da inovação entreos pesquisadores da instituição. Politano ressalta que o programanão age de forma direta na pesquisa e no contato com as empre-sas, a sua atuação é interna e de auxílio aos pesquisadores. “Onosso principal enfoque é na área jurídica e de negociação comas possíveis parcerias”, explica, “e nessa pesquisa, em especial, ocontato inicial que tivemos foi por demanda, ou seja, a própriacomunidade médica nos propôs a pesquisa com o radioisótopo”.O Lutécio-Octreotato é amplamente utilizado no exterior para otratamento de tumores neuroendócrinos, mas no Brasil seu usoainda é restrito, devido ao alto custo.

No início de 2000, o médico radiologista Aron Belfer, do hos-pital Albert Einstein foi quem primeiro procurou o instituto paraverificar a possibilidade da produção nacional do Lutécio-Octreotato. “Foi nessa época que o pessoal da Universidade deErasmus de Roterdã, na Holanda, iniciou um projeto de pesqui-sa com um peptídio marcado com Lutécio-177 para tratamento

de tumores neuroendócrinos. Como achei a pesquisa muito pro-missora, baseada em vários estudos em modelos animais, procu-rei o Ipen. Eu tinha contato com a universidade de Roterdã, poistrabalhei sete anos na Holanda, e poderia servir de ponte para pas-sar o know-how para o Ipen” esclarece Belfer.

Em 2004, a tecnologia começou a ser desenvolvida no Ipendurante o doutorado do biológo José Caldeira. “A produção roti-neira do 177Lu-Dotatate no Ipen foi um trabalho realizado com ametodologia do Centro Médico Erasmus em Roterdã e como para-lelo ao trabalho de Caldeira” afirma Marycel Barboza, gerente deprodução da Diretoria de Radiofarmácia do Ipen. Em 2006, sur-giu a parceria com o hospital Albert Einstein para a realização detestes clínicos com a substância. Aron Belfer aplicou as terapias enotou como benefícios poucos efeitos colaterais e a melhora naqualidade de vida dos pacientes. O médico explica que o trata-mento é indicado quando não existe progressão da doença, quan-do não há possibilidade de um tratamento cirúrgico e quando opaciente apresenta sintomas que não reagem a outras terapias.

O Hospital do Câncer A. C. Camargo de São Paulo e o Institutodo Câncer do Ceará também já disponibilizam o tratamento.“Essas parcerias são importantes, pois o Ipen tem a capacitação tec-nológica na marcação e desenvolvimento de radiofármacos e os hos-pitais são os portadores da meta final (pacientes)” ressalta Belfer.

RecursosOs recursos para a pesquisa vieram da Agência Internacional

de Energia Atômica (Iaea) por meio de um programa coordenadode pesquisa chamado “Development of TherapeuticRadiopharmaceuticals Base don 177-Lu for Radionuclide Therapy”.O programa foi desmembrado em sub-projetos e coube ao biólo-go José Caldeira o desenvolvimento do método para a produçãodo Lutécio-Octreotato. “A inovação dessa pesquisa é a adequaçãodas condições de síntese da substância para a obtenção do radio-

REVISTA CONECTA

FARMÁCIA

Substância utilizada no diagnóstico e tratamento de tumores neuroendócrinos já pode ser produzida e comercializada em larga escala

MICHELA DE PAULO

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fármaco. Com isso, foi possível desenvol-ver um produto com a mesma qualidadedo que é usado em outros países, como aHolanda”, esclarece Elaine Bortoleti deAraújo, orientadora da pesquisa e geren-te de garantia da qualidade do Centro deRadiofarmácia do Ipen.

Para o desenvolvimento da pesquisafoi necessária a aquisição do radioisóto-po 177 — Lu-Dotatate, que é importadodo Canadá ou da Holanda, e do peptídiooctreotate (Tate), acoplado ao agente que-

lante Dota, por isso Dotatate. Em seguida, foram realizados estu-dos de cromatografia, para avaliar a pureza radioquímica do radio-fármaco, além dos estudos de estabilidade, metodologia de puri-ficação e estudos pré-clínicos para avaliação em modelo animal.

Após todos esses passos, um “piloto de produção”, propi-ciou a simulação das condições necessárias para a produçãopropriamente dita do radiofármaco, que é a combinação dasubstância Lutécio-Octreotato com um fármaco. A tecnologiaobtida foi então transferida para a equipe de produção da radio-farmácia. “Só depois de comprovada a garantia e eficácia domedicamento é que as parcerias com os hospitais puderam seriniciadas” ressalta Araújo.

63REVISTA CONECTA

No alto, Centro de Radiofarmácia do Ipen; acima, imagem mostra os tumores antes e depois do tratamento com

lutécio. As duas imagens da direita são da tomografia computadorizada mostrando o tumor (seta) antes e na inferior após o tratamento

Alguns tumores neuroendócrinos chamados gastroen-teropancreáticos apresentam um grande número dereceptores de somatostatina, hormônio protéico pro-duzido por células delta do pâncreas. O Lutécio-Octreotato tem a característica de ser um análogo a essehormônio. Isso permite que ele se dirija diretamente aesses tumores levando radiação, com mais eficiência emenos efeito sobre os demais órgãos do corpo. Emalguns casos, porém, o tratamento não é indicado, taiscomo: gravidez da paciente, comprometimento seve-ro da função renal e hepática, quadro sanguíneo baixoou quando o paciente apresenta metástases cerebrais.

APLICAÇÃO: DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DO CÂNCER A tecnologia tem duas formas de aplicação: no trata-mento da doença, o que a encaixa no segmento de dro-gas para tratamento de câncer; e como diagnóstico da

doença, o que a encaixa no segmento de análises e exa-mes. Estes últimos são definidos como PET ouTomografia de Emissão de Pósitrons. Trata-se de um exa-me de imagem da medicina nuclear. O teste PET é mini-mamente invasivo e as doses de radioatividade absor-vidas por cada paciente são semelhantes ao de outrosestudos como a tomografia computadorizada.

LEGISLAÇÃODe acordo com a Comissão Nacional de Energia Nuclear,embora sempre tenha sido de competência da Uniãoexercer o monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra,o enriquecimento, o reprocessamento, a industrializa-ção e o comércio de minérios, minerais nucleares eseus derivados, a Emenda Constitucional nº 49, de2006, excepciona do monopólio a produção, a comer-cialização e a utilização de radioisótopos de meia-vidacurta, para usos médicos, agrícolas e industriais.

Os radioisótopos excluídos do monopólio são aquelesde meia-vida inferior a 2 horas. A meia vida do Lutécio-Octreotato é de aproximadamente 6,7 dias e, por isso,sua produção ficará restrita ao Ipen. Portanto, a tec-nologia deve ser usada para produção diretamente peloInstituto e sua venda realizada para clínicas e hospitaisinteressados.

ANVISAO uso do Lutécio-Octreotato está em fase de testesclínicos. Apenas após a finalização desses testes, seuregistro junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária(Anvisa) poderá ser requerido. A avaliação de um dos-siê de registro pela Anvisa costuma ser dividida em trêspartes: análise farmacotécnica, análise de eficácia, e aná-lise de segurança. Os testes clínicos se encaixam na aná-lise de segurança, a última parte da avaliação.

MAIS EFICIÊNCIA E MENOS EFEITOS COLATERAIS

NUCL

EAR

CLÍN

ICA

DERA

DIOS

OTOP

IA/ A

RON

BELF

ERMARCELO VITORINO/FULLPRESS

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64

Valoração de tecnologias: questões chaves para aplicação

A gestão estratégica de tecnologia tem como função principalcompor a competência tecnológica da empresa. Envolve a tarefa deresponder a questões como: quais tecnologias devem ser desenvol-vidas internamente, quais as que devem ser adquiridas externa-mente — ou através de parcerias — e quais podem ser comercializa-das pelo licenciamento.

Uma componente chave para a tomada dessas decisões é a valo-ração das tecnologias. O processo de valoração busca determinarum valor monetário de uma tecnologia. Procura quantificar seusbenefícios e custos de aquisição ou de desenvolvimento. Uma deci-são favorável à aquisição ou ao desenvolvimento da tecnologia resul-ta de uma valoração positiva, isto é, os benefícios são superiores aoscustos. O principal motivo que permeia o processo decisório é o dequanto pagar pelas alternativas tecnológicas disponíveis, levando-se em conta a sua utilidade para a empresa.

No caso de aquisição de uma tecnologia, os resultados de umestudo de valoração informam o preço máximo que a empresa deve-ria pagar, considerando os retornos, custos de implantação e riscosassociados com sua aquisição. Pagando um valor acima desse pre-ço, o risco de ocorrer uma relação custo/benefício desfavorável serámaior. Os possíveis retornos incluem receitas futuras, redução degastos com insumos, ou aumento de produtividade do processo.Os custos de implantação, por sua vez, podem envolver a necessi-dade de adequação às leis trabalhistas e às ambientais vigentes. Osriscos podem ser tanto técnicos, quanto mercadológicos.

Em mercados estabelecidos ou maduros, os preços das tecno-logias são determinados pelos mecanismos de mercado. Mesmoassim, o exercício de valoração pode ser útil, pois estabelece umareferência para comparação, dado que se o valor da tecnologia paraa empresa for maior que o preço do mercado, então vale a pena adqui-ri-la. Em situações em que o mecanismo de mercado ainda nãoestabeleceu uma sinalização clara de preços, a valoração da tecno-logia é estratégica. É o caso de tecnologias emergentes. A aquisição

de uma patente relacionada com um biocombustível de terceirageração ou de sistemas tecnológicos complexos como plataformasde petróleo são bons exemplos.

Quando se trata de desenvolvimento de tecnologias, o exercí-cio de valoração vincula-se à avaliação do potencial econômico deprojetos de P&D. O sinal verde para o desenvolvimento de umadeterminada tecnologia ou produto/processo, é dado em vista desuas perspectivas de mercado, custos e riscos associados. A questãoa ser respondida é: os retornos deste projeto compensam os riscose custos envolvidos? Aquela idéia deve prosseguir ou não no seu desen-volvimento técnico. Entretanto, o processo de valoração de proje-tos de P&D deve se adequar ao tipo de projeto e ao estágio de desen-volvimento da tecnologia. Um novo produto ou projeto de pes-quisa é muito diferente de um projeto de desenvolvimento de pro-duto já próximo da data de lançamento no mercado. A valoraçãode uma idéia ou de um projeto de pesquisa é geralmente mais sub-jetiva e aproximada, pois as informações são escassas. O objetivo,nesse caso, é obter uma noção de grandeza ou percepção da poten-cialidade técnica e econômica da proposta. A valoração de um pro-jeto de desenvolvimento já nas etapas finais, por outro lado, é geral-mente mais rica em informações, especialmente em relação à par-te técnica. Mas, mesmo assim, a subjetividade continua a permearo processo de valoração, particularmente em relação à evolução daparticipação do produto no mercado.

Fluxo de Caixa Descontado (FCD): problemas e soluções

O instrumento principal para a valoração é o Fluxo de CaixaDescontado - FCD. Este método calcula o Valor Presente Líquido(VPL) de uma tecnologia, via projeto de P&D, ou de desenvolvi-mento de produto/processo, através de seu fluxo de investimentos,despesas e receitas ao longo do horizonte de planejamento da tec-nologia. Cada entrada ou saída de caixa (fluxo) é descontada por

REVISTA CONECTA

ARTIGO ABRAHAM SIN OIH YU PAULO BRITO MOREIRA DE AZEVEDO

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uma Taxa Mínima de Atratividade -TMA (taxa de juros de baixo emédio risco oferecida pelo mercado financeiro, mais um delta deajuste ao risco) de acordo com o ano de ocorrência da mesma,perante a vida útil estimada do empreendimento. Se o resultadodo VPL for positivo significa, então, que o investimento feito foicompensador, e a TMA foi atendida. Se o VPL for negativo o negó-cio é inviável em termos financeiros, isto é, o retorno é menor queos custos. Apesar do FCD ser fundamental para a valoração de tec-nologias, sua abordagem convencional não é suficiente para lidarcom certas peculiaridades de projetos tecnológicos devido a trêsdeficiências principais:

a) Incertezas técnicas e comerciais: No campo técnico, o pro-cesso de desenvolvimento tecnológico esbarra em dificuldades quepodem inviabilizar o projeto ou estender o seu prazo de execução.No campo comercial e mercadológico há incertezas como concor-rência, aceitação da nova tecnologia, preços e custos. Acrescentem-se as incertezas relacionadas às questões legais e ambientais. Essasincertezas relacionam-sediretamente com as suaschances de sucesso, o queirá influenciar o fluxo decaixa do projeto. O proce-dimento convencional deFCD tem dificuldades para incorporar esses riscos. Entretanto, exis-tem meios de se adaptar o FCD de modo a considerar explicitamenteesses riscos. A forma mais simples é a construção de cenários levan-do em conta os riscos mais relevantes. Têm-se, assim, diversas pos-sibilidades de resultados a partir dos quais será possível estimar aschances de sucesso. O resultado da valoração considerando possí-veis cenários será uma distribuição de valores e não um valor úni-co para a tecnologia em questão.

b) Ausência de processos para identificação, coleta e análise deinformação para estimar fluxos de caixa: o FCD não oferece essesprocessos que são vistos como a tarefa mais difícil no procedimen-to de valoração. A discussão do item “a” mostrou que diversos fato-res podem determinar direta ou indiretamente o valor da tecnolo-gia destacando-se a capacitação e competência da equipe; a qualidadedo produto ou serviço envolvido; os canais de venda ou distribui-ção; as estratégias de empresas rivais e desempenho de tecnologiasconcorrentes. A identificação desses fatores e a estimativa dos pos-síveis impactos dos mesmos no desempenho do projeto tecnológi-co, não é uma tarefa fácil. Para tecnologias emergentes ou produ-

tos/processo inovadores, inexistem dados históricos para apoiar umaestimativa da sua evolução técnica e comercial. Julgamentos subje-tivos e opiniões de especialistas são geralmente as únicas fontes deinformação. Sem um procedimento estruturado para explicitar assuposições e sem o conhecimento das possíveis armadilhas psicoló-gicas, a qualidade das estimativas de fluxo de caixa para valoraçãopodem comprometer seriamente o cálculo do VPL. Entretanto,outras áreas de conhecimento, tais como análise de decisão e siste-mas de apoio à decisão, já desenvolveram um conjunto de ferra-mentas para organizar problemas não estruturados ou nebulososem gestão estratégica. O processo de valoração pode e deve apro-veitar esses conhecimentos existentes. Algumas dessas ferramentassão: o mapa cognitivo, diagrama de influência, mapa de conhecimentoe mapa mental, técnicas usadas para identificar os fatores chavesassociados a um problema e as relações entre eles com a participa-ção coletiva de especialistas ou interessados na questão. O resulta-do é um consenso do grupo sobre o escopo do problema. Outra téc-

nica bastante utilizada pararealizar prospecção com par-ticipação de especialistas é aDelphi. Uma vez identifica-dos os fatores chaves, o gru-po de especialistas pode pros-

pectar coletivamente os possíveis cenários futuros desses fatores, quepodem ser empregados para apoiar a elaboração das estimativas defluxo de caixa para a tecnologia em questão.

c) Desconsideração de decisões interligadas: o FCD não con-sidera as decisões interligadas que a empresa poderia tomar ao lon-go do desenvolvimento do projeto tecnológico, não leva em contaas possibilidades de se alterar decisões diante de possíveis mudan-ças. Com isso pode-se mascarar, positiva ou negativamente, os resul-tados de valoração. Uma alternativa para se contornar tal proble-ma é a utilização da técnica de Opções Reais, com a qual abrem-sejanelas para tomar decisões ao longo do tempo, diante da ocor-rência ou não de eventos. Pode-se, por exemplo, fazer a opção deaguardar os resultados de P&D para se tomar a decisão de investirna planta comercial. O emprego do conceito de Opções Reais tor-na a valoração um procedimento mais flexível e mais próximo darealidade do processo decisório. A implantação do procedimentode Opções Reais pode ser feita por meio da árvore de decisão emcasos não muito complexos, mas para projetos de maior comple-xidade, deve-se consultar especialistas.

65REVISTA CONECTA

O sinal verde para o desenvolvimento de uma determinada tecnologia, é

dado em vista de suas perspectivas demercado, custos e riscos associados

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66REVISTA CONECTA

PAULO BRITO MOREIRA DE AZEVEDO Pesquisador do Núcleo de Economia eAdministração da Tecnologia (NEAT) do Instituto de Pesquisas Tecnológicasdo Estado de São Paulo.

* OS AUTORES AGRADECEM A REGINA MARIA BUENO DE AZEVEDO PELO AUXÍLIO NA REVISÃO DO TEXTO.

ABRAHAM SIN OIH YU Pesquisador do Núcleo de Economia e Administraçãoda Tecnologia (NEAT) do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de SãoPaulo e Professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidadede São Paulo.

Questões organizacionais e de recursos humanosComplementando as questões técnicas descritas anteriormen-

te, este item traz uma breve discussão sobre as barreiras organiza-cionais e culturais vinculadas ao uso de valoração em organizaçõespúblicas e privadas.

Muitas empresas delegam as atividades de valoração para odepartamento financeiro da organização, que possui competênciano método FCD. Isto pode incorrer em erros uma vez que a valo-ração de tecnologia vai muito além da visão financeira. Todos osatores relevantes na gestão de tecnologia devem entender de valo-ração e participar do processo. Essa participação, utilizando pro-cessos estruturados, garante a qualidade final do procedimento.Um processo mais transparente e formalizado reduz os efeitos nega-tivos de jogos políticos na organização e dificulta a imposição de“pet projects” pelos poderosos. As organizações devem também seprevenir em relação ao risco da formalização do processo de valo-ração vir a se tornar uma prática burocrática, que levaria a valora-ção a se transformar num ritual e as decisões sobre os investimen-tos em tecnologia passariam a depender de manobras de bastido-res, via pressões e lobbies.

Há organizações que adotam uma prática informal de valora-ção de tecnologia, baseada principalmente na intuição ou no ins-tinto dos executivos. Numa área tecnológica madura, onde há mui-ta experiência acumulada, essa abordagem pode ser eficiente e efi-caz. Um possível problema dessa prática, no entanto, é a naturezatácita desse conhecimento, e se o executivo sair da empresa, levaconsigo a competência em valoração. Numa área tecnológica emer-gente, as intuições ou instintos podem não funcionar. Nessas situa-ções, vieses cognitivos podem afetar negativamente o julgamento.A solução para isso é adotar um procedimento mais estruturadode valoração no qual as suposições e os cálculos são explicitados deforma a permitir um compartilhamento amplo de informações eaccountability dos julgamentos feitos.

Conclusões e recomendaçõesA necessidade de tomada de decisões sobre investimentos em

tecnologias torna inevitável a valoração. A questão para a empresapassa a ser como implementar essa atividade.

No entendimento dos autores deste artigo, a organização deveformalizar o processo e adotar os métodos mais adequados. É impor-tante observar que a formalização não pode ser total, pois a valo-ração requer intuição e conhecimento tácito dos participantes. Oprocesso de valoração deve ser flexível e robusto para atender dife-rentes situações. Portanto, o maior desafio é determinar o grau maisapropriado de formalização para esse processo, de acordo com o

contexto da organização.Para ter flexibilidade e robustez nesse processo, a organização

deve investir na competência em valoração. O maior conhecimen-to conceitual e técnico permitem adaptabilidade da valoração às situa-ções específicas, e reduz a tendência de se aplicar o processo semalguma reflexão.

As experiências mostram que os conceitos ou teorias mais rele-vantes para a valoração de tecnologia podem ser agrupados em duascategorias. A primeira está relacionada aos conceitos em finanças eem processo decisório. No caso de finanças, o conhecimento apro-fundado em FCD é particularmente importante. Os conceitos emprocesso decisório, especialmente noções sobre riscos, incerteza, eprobabilidade são importantes para melhor entender como adaptaro FCD de modo a incorporar opções reais. Técnicas como árvore dedecisão e diagrama de influência são também muito úteis. A segun-da categoria diz respeito à gestão da tecnologia. O entendimentosobre a dinâmica da inovação é fundamental. Noções de Curva S,projeto dominante e ciclos tecnológicos são importantes para anali-sar possíveis rotas de evolução de tecnologias, e colocar as decisõesestratégicas num contexto mais amplo. Os conceitos e técnicas deprospecção tecnológica permitem estimar cenários futuros os quaissão insumos importantes para elaboração dos fluxos de caixa.

Outro ponto que merece destaque refere-se à experiência nautilização e aplicação dessas técnicas e conceitos. Como toda meto-dologia ou ferramenta não basta conhecê-las somente tecnicamente,é preciso também ter experiência na sua aplicação e isto demandatempo de aprendizado. Isso conta muito para que se chegue a bonsresultados no processo de valoração e mais rapidamente. O processode aprendizado também deve ser pautado em bom senso, criativi-dade e dedicação.

Por último, a postura dos dirigentes da organização é funda-mental para o sucesso do processo de valoração na empresa. Um pro-cesso aberto, com mais participação de atores relevantes, garante aqualidade dos resultados e, conseqüentemente, melhores decisõessobre as tecnologias. Ademais, um processo mais transparente ten-de a motivar os cientistas e engenheiros que realizam as atividadesde pesquisa e desenvolvimento. Percebendo-se como participantes,conseguirão entender melhor a visão estratégica da organização.

ARTIGO

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Chocolate de cupuaçu: processo permiteobter produto similar ao tradicional

Explorar sabores típicos da Amazônia, aplicando tecnologiasinovadoras e de modo sustentável é uma das maneiras de levarprodutos da região para outras partes do país, e para o mundo. Ocupuaçu é uma fruta nativa da Amazônia brasileira, cujas semen-tes convenientemente fermentadas, secas e torradas podem ser uti-lizadas para a obtenção de um produto similar ao chocolate. A pes-quisadora Suzana Caetano da Silva Lannes, da Faculdade deCiências Farmacêuticas da USP, desenvolveu um novo processopara fabricação de chocolates a partir das sementes desse produ-to. O cuidado na fase de beneficiamento, aliado a melhorias naformulação da massa de cupuaçu permite obter chocolates bas-tante parecidos com o produto tradicional, produzido com man-teiga de cacau.

A massa de cupuaçu é obtida das sementes da fruta que sãobeneficiadas (fermentadas e secas) e depois torradas, trituradas emoídas. O Centro de Pesquisa Agroflorestal da Amazônia Orientalda Embrapa já desenvolveu um chocolate à base de cupuaçu, o cupu-late, para qual obteve registro de patente em 2003. O cupulate, entre-tanto, apresenta problemas de textura. Segundo a pesquisadora,ele utiliza gordura (ou massa) de cupuaçu pura, o que deixa o cho-colate muito macio. Por isso ele não resiste ao calor e derrete facil-mente, adquirindo um aspecto pouco atraente para o consumidor.O cupulate não chegou a ser comercializado oficialmente e as pes-quisas na Embrapa não tiveram continuidade. “Tentamos apri-morar a formulação desenvolvida anteriormente, para que elapudesse ser produzida industrialmente e ir para o mercado”, expli-ca Lannes.

Mais qualidadePor meio da tecnologia desenvolvida pela pesquisadora da USP

podem ser fabricados tabletes do tipo branco, ao leite e meio amar-go. Ao promover a interação equilibrada da manteiga de cacau

com a manteiga de cupuaçu é possível obter um chocolate bemmais próximo dos produtos tradicionais, tanto em relação à tex-tura quanto ao sabor. A combinação evita também que o choco-late de cupuaçu fique com aquela aparência esbranquiçada quan-do colocado sob refrigeração, característica comum do chocolatetradicional, feito só com manteiga de cacau. Essa aparência tempouco impacto no sabor do chocolate, mas é suficiente para pro-vocar a rejeição do consumidor.

A tecnologia permitiu melhorar também as características doachocolatado de cupuaçu, feito a partir do cupuaçu em pó. A pes-

REVISTA CONECTA

ENGENHARIADE ALIMENTOS

Com patente solicitada, tecnologia está disponível para licenciamento por indústrias do setor ou para ser desenvolvida por ssppiinn--ooffff

PATRÍCIA MARIUZZO

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quisadora desenvolveu um produto queatinge dissolução completa no momen-to do preparo, obtendo, portanto, umdiferencial, em termos de qualidade,em relação às versões já comercializadasna região Norte. A pesquisadora criouainda três variedades de achocolatadode cupuaçu: normal, diet e adicionadode cálcio, que servem para fazer mis-turas de bolo e bebidas lácteas.

Mercado internacional em altaO Programa de Investigação Tecnológica do Estado de São

Paulo, PIT-SP, agregou importantes informações de mercado aessa tecnologia, com objetivo de elaborar modelos de negóciopara produção industrial de diferentes tipos de chocolates decupuaçu. Hoje, já existe produção artesanal desses chocolates,mas com qualidade inferior à desenvolvida pela pesquisadora.Ao contrário do que acontece com o cacau, não há ainda umaprodução em larga escala do cupuaçu. Atualmente, a produ-ção da fruta está concentrada na região Norte e é feita por

pequenos produtores que, normalmente, se reúnem em coo-perativas para obter maior poder de negociação na hora de ven-der sua produção. Todos os produtos de cupuaçu têm preçosmais acessíveis, uma vez que a manteiga de cupuaçu é cerca de30% mais barata do que a manteiga de cacau. Assim, o princi-pal benefício dessa tecnologia é a redução do custo do produ-to final, seja ele, o chocolate em tablete ou o achocolatado, emfunção da matéria-prima utilizada.

Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria deChocolate, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados (Abicab), em2006 a indústria de chocolates teve um crescimento de 7%. O mer-cado de bebidas achocolatadas tem crescido a uma média de 5%ao ano nos últimos três anos. Além do mercado interno, os mer-cados internacionais são alvo potencial de produtos desenvolvidosa partir de matérias-primas da Amazônia. A patente do processode tratamento de sementes de cupuaçu desenvolvido na USP jáestá com o pedido solicitado no Instituto Nacional de PropriedadeIndustrial (INPI), podendo ser licenciada por empresas do setoralimentício interessadas em produzir e comercializar o produto.Outra opção que poderia agregar mais valor a essa tecnologia seriacriar uma spin-off para produzir o chocolate de cupuaçu.

69REVISTA CONECTA

No ano 2000, a empresajaponesa Asahi Foods depositou no Japão, naEuropa e nos Estados Unidospedido de reconhecimentoda invenção de processopraticamente igual ao obtidona Embrapa. Pediu ainda registro da marca cupuaçu. O escritório de patentes noJapão anulou a patente daempresa, acatando os argumentos da Embrapa deque a invenção era muito semelhante à brasileira, e que onome cupuaçu não poderia ser registrado como marca.

INTERESSE INTERNACIONAL

FOTOS: CECÍLIA BASTOS / JORNAL DA USP

DIVULGAÇÃO

À esquerda, tabletes e bombons fabricados com a massadesenvolvida por Suzana Lannes, que chegou ao chocolate

mais próximo do convencional, misturando a massa de cupuaçu, feita com as sementes beneficiadas do

fruto (acima), com a manteiga de cacau

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Linhagem atenuada da bactériaSalmonella entérica gera vetor vacinal

Partindo do conceito tradicional de vacinação, pesquisadoresdo Laboratório de Genômica e Biologia Molecular Bacteriana, doInstituto de Biologia da Unicamp, desenvolveram uma linhagembacteriana para ser utilizada como vacina viva para salmonelose, doen-ça infecciosa provocada por um grupo de bactérias do gêneroSalmonella. A transmissão ocorre através da ingestão de alimentoscontaminados com fezes animais. As bactérias tiveram sua viru-lência atenuada por meio da inativação de genes específicos da espé-cie Salmonella enterica, sem, contudo, interferir na sua capacidadede estimular a resposta imune do organismo hospedeiro.

Uma vacina pode ser constituída de antígenos específicos (par-tículas ou moléculas capazes de suscitar uma resposta imune noorganismo hospedeiro) ou mesmo de uma célula bacteriana mor-ta ou viva, mas atenuada. A vacina contra a salmonelose desenvol-vida na Unicamp utiliza a célula viva de linhagens atenuadas deSalmonella enterica, que também podem ser usadas como vetoresvacinais. “Podemos manipular geneticamente essas bactérias, de talforma que elas expressem antígenos, ou seja, estruturas de outrosorganismos sejam eles vírus, bactérias, protozoários ou até antíge-nos de mamíferos”, conta Marcelo Brocchi, biólogo da Unicamp.“Nosso objetivo é construir uma vacina multifatorial, que induzproteção contra a salmonelose e, ao menos tempo, seja capaz de geraruma resposta imune contra outros agentes que provocam doenças,chamados agentes patogênicos, que tenham seus genes clonados eexpressos na linhagem”, completa.

“Buscamos desenvolver linhagens bacterianas atenuadas comrelação a sua virulência. A idéia é vacinar com a linhagem viva deSalmonella enterica, que causa uma infecção transitória nas condi-ções utilizadas. Ela não leva à doença, apenas coloniza alguns teci-dos do hospedeiro. O sistema imune é levado a reagir e reconhe-cer esse microorganismo como um invasor, induzindo uma res-posta imunológica primária. Numa segunda oportunidade, se o

organismo entrar em contato com a bactéria patogênica, uma res-posta imune específica e efetiva será ativada com maior rapidez. Aprodução de uma vacina funciona assim”, explica Brocchi, queorientou a dissertação de mestrado de Guilherme Martines TeixeiraMendes, “construção e caracterização de linhagens de Salmonella ente-ricaatenuadas quanto à virulência”, estudo financiado pela Fundaçãode Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e apoiadopelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico eTecnológico (CNPq).

A idéia de iniciar essa pesquisa aconteceu há, aproximada-mente, cinco anos na Faculdade de Medicina da USP, em RibeirãoPreto, onde Brocchi era docente e pôde auxiliar no desenvolvi-mento de algumas vacinas multifatoriais. No entanto, essas vaci-nas foram produzidas a partir de uma linhagem bacteriana ate-nuada que foi desenvolvida no exterior. “Para a comercializaçãodessas linhagens, era preciso fazer acordos com os americanos”, con-ta o pesquisador que se sentiu motivado a desenvolver um vetornacional que pudesse ser utilizado sem a necessidade de pagar royal-ties para países estrangeiros.

Além de ter sido desenvolvida no país, outra característica inte-ressante da linhagem utilizada pelos pesquisadores é o fato de tersido produzida a partir de microorganismos selvagens. “Não parti-mos para a atenuação de uma linhagem estabelecida em laborató-rio, mas sim de microorganismos selvagens que foram sendo carac-terizados através de testes moleculares. Assim as amostras de Salmonellaforam caracterizadas e estabelecidas as linhagens e os sorotipos”, expli-ca Mendes. Linhagens estabelecidas em laboratório podem ser facil-mente caracterizadas, no entanto elas são patenteadas – o que envol-veria novamente a negociação entre grupos de pesquisa – além dis-so, muitas apresentam baixa capacidade de infectar células e pro-vocar doença.

Após selecionar as linhagens, Mendes e Brocchi escolheramvários genes alvo que, quando sofrem mutações, podem atenuar

REVISTA CONECTA

BIOTECNOLOGIA

A tecnologia, com forte apelo social, tem processo de depósito de patente em andamento

SARA NANNI

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a virulência da Salmonella enterica. “O mais importante é que con-seguimos dosar essa atenuação nas bactérias, mas sem que elas per-dessem a capacidade de infectar células e provocar uma respostaimune sem desencadear a doença”, comemora Mendes. Essa linha-gem com mutação genética não provoca bacteremia, efeito fre-qüente em algumas vacinas vivas atenuadas de Salmonella exis-tentes atualmente. A bacteremia é a contaminação do sangue dohospedeiro por bactérias, o que exige uma resposta vigorosa dosistema imune e pode desencadear algumas reações indesejáveiscomo febres e resfriados.

AplicaçõesO processo de depósito de patente dessa tecnologia, com forte

apelo social, ainda está em andamento. O relatório do Programa

de Investigação Tecnológica (PIT-SP), em fase deelaboração, permitirá à Inova Unicamp uma visãomais ampla do mercado para que a transferên-cia dessa tecnologia seja realizada com sucesso.O principal desafio a ser enfrentado pelo PITserá lidar com um importante diferencial dessetipo de tecnologia: no Brasil, desde a década de80, vacinas são produzidas apenas por laborató-rios públicos. Nesse caso, será estudado comofazer o processo de transferência em um merca-do atendido predominantemente por institui-ções públicas. Havendo interesse da indústria naprodução da vacina, os biólogos acreditam quea sua aplicação inicial será veterinária. A vacinaque foi desenvolvida ainda é um protótipo, quejá foi testado em modelos animais, mas que ain-da requer uma série de experimentos até quesejam feitos ensaios em outros animais ou mes-mo em humanos.

“Talvez a grande con-tribuição dessa pesquisa nãotenha sido apenas o desen-volvimento de uma vacina,mas a possibilidade de usá-la como vetor em pesquisa,disponibilizando esse conhe-cimento para testes de novosantígenos”, avalia Mendes.

A mesma linhagem utilizada nesse trabalho pode servir de basepara que se desenvolvam novas vacinas contra outras doenças, comoa febre tifóide que ainda é um grave problema de saúde pública naÁfrica e América Latina. Mendes também recorda que a Salmonellaenterica tem sido utilizada no tratamento de alguns tipos de cân-cer, porque essa espécie apresenta uma série de características quea tornam um excelente vetor para levar proteínas terapêuticas atéos tumores. Isso abre perspectivas de uso terapêutico das linha-gens desenvolvidas. “A linhagem atenuada de Salmonella entericatem uma capacidade muito grande de carregar genes heterólogos(de outros organismos). Há muitos grupos pesquisando antígenos,sejam eles virais, bacterianos, protozoários e até de mamíferos, quepodem se beneficiar dessa descoberta”, complementa.

71REVISTA CONECTA

Pesquisador realiza experimento no laboratório em que foi desenvolvida a linhagem bacteriana que poderá vir a ser uma vacina viva contra salmonelose; no detalhe, foto

mostra cultura de células de linhagens atenuadas de Salmonella enterica

REPRODUÇÃO

FERNANDO PETERMANN

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Plásticos biodegradáveis: soluçõesintegradas para a área ambiental

Dados da Associação Brasileira da Indústria do PET (Abipet)indicam que foram produzidos mais 432 mil toneladas de emba-lagens plásticas em 2007. Numa perspectiva otimista, o país teriareciclado metade dessas embalagens, o que significa mais de 200mil toneladas de PETs depositadas em lixões e aterros sanitários.Os números são assombrosos inclusive porque não incluem todosos outros tipos de embalagens plásticas descartadas cotidiana-mente, de alimentos, cosméticos e produtos de limpeza. As emba-lagens plásticas levam mais de cem anos para serem degradadas,devido à matéria-prima da qual são feitas: derivados de petróleo,insumos não-renováveis.

É nesse grave problema ambiental que entram em ação os bio-plásticos — polihidroxibutiratos (PHB) da família dos polihidro-xialcanoatos (PHAs) — desenvolvidos por uma equipe doLaboratório de Biotecnologia Industrial, do Instituto de PesquisasTecnológicas (IPT) do Estado de São Paulo. Denominada "Processode produção de polímeros biodegradáveis a partir de resíduosindustriais", a tecnologia aposta num plástico com propriedadessemelhantes aos plásticos petroquímicos, mas produzidos pororganismos vivos (bactérias e fungos), para reduzir a poluiçãoambiental. Diferentemente dos outros plásticos, os desenvolvi-dos no IPT podem retornar ao ambiente, na forma de gás car-bônico e água, em um período entre seis meses e um ano. A pro-dução de plásticos biodegradáveis é um dos objetivos que essespesquisadores já perseguem desde a década de 90, conta ClaudioFuentes, gerente do Programa de Investigação Tecnológica (PIT-SP) do IPT. Esse foi um dos aspectos que chamou a atenção doPIT-SP no processo de seleção de tecnologias junto ao Instituto.O relatório do Programa destaca a vasta experiência, multidisci-plinaridade e grande interação entre pesquisadores, resultandonuma proposta de tecnologia mais abrangente e com grandespossibilidades de transferência tecnológica.

Experiência com bioplásticos"Na década de 90, quando ocorreu a crise no abastecimento de

álcool, e o enfraquecimento do Proálcool, a Cooperativa de Produtoresde Cana, Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo (Copersucar) teveinteresse em obter outro produto a partir do açúcar da cana. O IPTfez um levantamento e o plástico biodegradável a partir do açúcarfoi uma boa alternativa encontrada. Ainda não existiam polímerosfeitos a partir de sacarose, e isso se tornou um desafio tecnológicopara nós", lembra a microbiologista Maria Filomena de AndradeRodrigues, do IPT-SP, que atualmente coordena o projeto do bio-plástico a partir de resíduos industriais.

Desde a concepção do projeto, os pesquisadores do IPT plane-jaram a estrutura de todo sistema de inovação tecnológica: da pes-quisa básica em laboratório até a viabilização do produto em escalaindustrial. "Quando a tecnologia começou a ser desenvolvida nós játínhamos o objetivo de gerar um projeto piloto associado a uma usi-na", ressalta Maria Filomena. A tecnologia foi desenvolvida e paten-teada num esforço conjunto do IPT, USP e Copersucar. No ano2000, a tecnologia foi licenciada para a PHB Industrial, empresaque produz e comercializa plásticos biodegradáveis.

Glicerol: problema vira soluçãoDe acordo com Angela Puhlmann, coordenadora do PIT-SP

e do Núcleo de Propriedade Intelectual e Comercialização deTecnologia do IPT, os pesquisadores do Instituto vêm desenvol-vendo pesquisas para viabilizar usos do plástico biodegradávelem microcápsulas de liberação controlada de ativos para aplica-ção potencial nas indústrias farmacêutica, veterinária, cosméti-ca e agroquímica. “É cada vez mais importante para o Brasil man-ter-se atento para os avanços tecnológicos de processos e produ-tos que possam afetar a cadeia produtiva nacional, principal-mente aqueles com alto índice de inovação tecnológica”, diz ela.

Ao identificar que os resíduos da produção de biodiesel apre-

REVISTA CONECTA

BIOTECNOLOGIA

Programa destaca multidisciplinaridade e grande interação entrepesquisadores, resultando numa proposta de tecnologiamais abrangente e com grandes possibilidades de transferência

SUSANA DIAS

Page 73: Revista conecta

sentam alto conteúdo de glicerol aliado à perspectiva de que estesresíduos sejam gerados em excesso com o aumento da produçãode biodiesel, os pesquisadores começaram a estudar e selecionaroutras linhagens de bactérias que são capazes de produzir polí-meros com estes e outros resíduos industriais. Para produzir obioplástico, as bactérias consomem carbono e, por isso, os pes-quisadores procuram encontrar fontes de carbono renováveis ede baixo custo. Os resíduos industriais são, nesse sentido, exce-lentes fontes de carbono, garantindo outra qualidade dessa tec-nologia, a possibilidade de transformar problemas em soluções.

O glicerol é um dos resíduos que pode vir a gerar pro-blemas, visto que é um subproduto do biodiesel. Aexpectativa é que o Brasil aumente consideravelmen-te sua produção nos próximos anos.

"Encontrar usos inovadores para as toneladas des-se subproduto que serão geradas na produção de bio-disesel é um dos desafios que tem movimentado pes-quisadores no Brasil", relata Claudio Fuentes. O pedi-do de patente para produção de bioplástico a partir doglicerol já foi depositada e, segundo o relatório do PIT,não havia nenhuma outra similar na base de dados doINPI, nem em outras bases de dados, indicando a ori-ginalidade da proposta. O IPT também está desenvol-vendo mais duas tecnologias para a produção desses

plásticos a partir da pectina, ácido cítrico e resíduos industriaisque contenham essas substâncias, além de fazer estudos com óleosvegetais. O uso de substâncias que sobram das operações indus-triais como matéria-prima, torna o bioplástico uma tecnologiaduplamente responsável: do insumo utilizado ao produto geradoela está comprometida com a sustentabilidade. “A preocupaçãocom a questão ambiental é uma das linhas que orienta as priori-dades de pesquisa e desenvolvimento tecnológico do IPT”, acre-dita Claudio Fuentes.

Produção industrial: vencer desafiosO bioplástico produzido a partir dos resíduos industriais já está

disponível em escala de laboratório. "Aumentar a produtividadee o rendimento é nosso grande desafio atual. A tecnologia é aalma do negócio porque é capaz de reduzir os custos dos produ-tos. Mas, para tornar o processo economicamente viável, precisamosencontrar parceiros”, comenta Maria Filomena. Ela espera que atecnologia dos polímeros biodegradáveis se torne em breve maisdisponível no mercado. Segundo ela, neste sentido a atuação doPrograma é fundamental para auxiliar a comercializar a tecnolo-gia”. Os pesquisadores estão dispostos a procurar parceiros. Angeladestaca que o que o IPT tem condições de desenvolver a tecno-logia até o projeto básico em escala industrial, mas só poderá fazê-lo quando forem encontrados os parceiros, porque nesta fase doprocesso é preciso se adequar às condições necessárias aos clien-tes, que podem ser desde usinas produtoras de biodiesel, fábricasde sucos, entre outros.

73REVISTA CONECTA

Plástico criado a partir de organismos vivos pode acabar com as 432 mil toneladas de plásticos nos aterros e reciclagem

DIVULGAÇÃO

MARCELLO CASAL JR./ABR

Page 74: Revista conecta

74

Feitiço da vassoura de bruxa éremédio contra ervas daninhas

Duas proteínas com que o fungo Moniliophthora perniciosaleva as plantas de cacau a sofrer necrose, morrer e adquirir oaspecto de vassouras velhas podem se tornar novas armas con-tra as ervas daninhas. “Elas têm diversas características inte-ressantes. Por exemplo, são resistentes a altas temperaturas —altamente estáveis, portanto”, afirma Gonçalo Pereira, pesqui-sador que lidera a equipe do Laboratório de Genômica eExpressão (LGE) da Universidade Estadual de Campinas(Unicamp). “As duas proteínas têm perfis semelhantes de açãoe podem dar origem a herbicidas muito eficientes”, completa.Por isso o grupo foi escolhido para participar do Programa deInvestigação Tecnológica e vai entrar com um pedido de paten-te para as duas juntas, como um sistema, no Instituto Nacionalda Propriedade Industrial (INPI), com auxílio da Agência deInovação Inova Unicamp.

Tudo começou com o projeto de seqüenciamento, letra por letra,dos genes da vassoura-de-bruxa, concluído em 2003. Garimpandoas seqüências e comparando-as às que foram depositadas em ban-cos de dados genéticos, os pesquisadores chegaram a proteínas deduas classes ou tipos ligadas à açãodo fungo sobre as plantas. Essas molé-culas são parte do “feitiço” da vas-soura-de-bruxa e atacam especifica-mente plantas do grupo das dicoti-ledôneas, que acarretam grandes pre-juízos econômicos aos produtores.“A remoção das ervas daninhas é aprincipal atividade de manejo deplantas cultivadas; nas plantações decacau, em particular, são muito difí-ceis de combater”, afirma Pereira.

Segundo ele, o glifosato [N-(fos-

fonometil)glicina], o herbicida mais utilizado no mundo — repre-senta 60% do mercado mundial de herbicidas não-seletivos ouvendas superiores a um bilhão de dólares por ano — atualmentesó se mostra eficaz contra monocotiledôneas, plantas com flor defolhas estreitas (como as gramíneas, os lírios e as palmeiras) e umaúnica folha primordial para proteger o embrião em desenvolvi-mento. As dicotiledôneas, por sua vez, são plantas com flor cujosembriões têm dois cotilédones e tendem a ter folhas largas. E aservas daninhas desse tipo já não respondem ao glifosato, que é umherbicida não-seletivo (pode ser usado no combate de várias espé-cies), sistêmico (pulverizado, é absorvido pelas folhas e transpor-tado para toda a planta) e pós-emergente (aplicado depois que asplantas emergem das sementes).

Lançado em 1971 pela empresa transnacional de biotecnolo-gia Monsanto para bloquear a ação de uma enzima fundamentalno crescimento das plantas, o glifosato passou a ser utilizado maisintensivamente depois do advento das variedades transgênicasresistentes a ele. O resultado foi a seleção de ervas daninhas resis-tentes com o tempo. Assim, o controle das ervas daninhas dicoti-ledôneas, em geral requer o uso de herbicidas seletivos em com-

binação com o glifosato. Este é, por-tanto, o destino provável dos herbi-cidas em potencial descobertos einvestigados pela equipe de Pereira.

Além da resistência de algumaservas daninhas, há outros efeitos inde-sejáveis da aplicação do glifosato naslavouras: resíduos da substânciapodem ser encontrados em colheitase em animais usados na alimentaçãohumana, bem como nas águas sub-terrâneas e até na água potável. Poroutro lado, altas concentrações foram

REVISTA CONECTA

Equipe que desenvolveu o novo herbicida: Odalys, Gonçalo e Gustavo

AGRONOMIA

Pesquisadores da Unicamp desenvolvem herbicida a partir de proteínasde fungo que pode ter ampla utilização no mercado

FLAVIA NATÉRCIA

ARQUIVO PESSOAL

Page 75: Revista conecta

encontradas no solo. Já as moléculas que foram garimpadas pelaequipe de pesquisadores do LGE em meio aos genes reais ou puta-tivos (supostos) indicados pelo seqüenciamento do patógeno, con-cluído em 2003, não teriam nenhuma toxidez para seres huma-nos e, em oposição ao amplo espectro de ação do glifosato, atin-gem alvos mais específicos.

Existem duas classes de proteínas envolvidas no herbicida. Aprimeira foi objeto de estudo do doutorado de Odalys GarcíaCabrera, agora aluna de pós-doutorado no laboratório. A segun-da foi o tema da dissertação de mestrado de Gustavo Zaparoli, queestuda agora, em seu doutoramento, os mecanismos de ação dasproteínas, assim como sua relação com as células da planta. A iden-tificação de ambas se deu por meio da comparação dos resultadosdo genoma da vassoura-de-bruxa com as seqüências depositadas

em bancos de dados. “Mas o mecanismo de ação das moléculasainda não foi identificado e pouco se sabe sobre o modo como oefeito é produzido nas folhas”, afirma Zaparoli.

Agora, Odalys, Zaparoli e Pereira procuram parceiros da indús-tria para levar adiante os testes com os herbicidas potenciais.“Teremos de nos associar com empresas que produzem esse tipode substância”, afirma Pereira. “Eles têm capacidade de ampliar aescala de produção dos herbicidas e conhecem o melhor veículo,o melhor adjuvante (substância na qual dissolver) para essas pro-teínas”, completa. Segundo ele, com os testes iniciais das proteí-nas se encerra a missão da universidade, cujo papel é fazer “pro-tótipos”, criar novas possibilidades, e não colocar no mercado pro-dutos inovadores. “Essa é uma aplicação cuja importância poderáser reconhecida por toda a sociedade”, conclui.

75REVISTA CONECTA

DIVULGAÇÃO FERNANDO PETERMANN

Em sua pesquisa de mestrado, Gustavo Zaparoli aspergiusobre plantas de tabaco, do tipo dicotiledônea, similar aalgumas ervas daninhas, uma substância a partir do fungo Moniophthora perniciosa, que provoca necrose nas plantas de cacau; a ação do fungo sobre o tabaco promoveu necrose na planta (no destaque acima), o que o levou a acreditar ser possível desenvolver um novo herbicida a partir desse fungo.

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Receitas para uma cana mais doce

Num momento em que a produção de eta-nol a partir da cana-de-açúcar ganha maior pro-jeção internacional como alternativa sustentá-vel ao petróleo, variedades de cana mais docespoderiam impulsionar a produtividade semrequerer grande expansão da superfície culti-vada. Para tanto, os produtores de São Paulo ago-ra contam com os genes que os pesquisadoresdo Instituto de Química da Universidade deSão Paulo identificaram como associados à pro-dução, ao transporte ou ao acúmulo da sacarose,matéria-prima para a produção de açúcar e eta-nol. Essas receitas genéticas podem ser usadascomo marcadores moleculares para guiar o cru-zamento de variedades de elite em programasde melhoramento genético clássico. Ou dar origem a variedadestransgênicas — e polêmicas.

Comparando as receitas genéticas que são lidas de modo dife-rente nas espécies com alta e baixa capacidade de acúmulo de açú-car, a equipe da USP, liderada pela bióloga especializada em gené-tica molecular Gláucia Mendes Souza, chegou a 348 genes. Elesestão relacionados a diversos tipos de proteínas, ligadas a funçõescomo a resposta ao estresse, a biossíntese de hormônios e o meta-bolismo da parede celular. O grupo entrou com pedido de paten-te para esses genes. Manipulando-os, Gláucia diz que o ideal seriaampliar em 4% a capacidade de acumulação de sacarose.

O ponto de partida foi outro projeto que ela coordena: o geno-ma da cana-de-açúcar, chamado de Sucest, que envolveu o seqüen-ciamento (mapeamento da seqüência, letra por letra, que compõeo código genético) e a comparação dos genes da planta com genesconhecidos a partir de outros estudos e/ou organismos e seqüên-cias depositadas em bancos de dados. Desenvolvido por pesquisa-

dores de diversas universidades brasileiras, o Sucest terminou em2003, mas antes de terminar já havia se desdobrado no Sucest-Fun,rede formada para desvendar as funções dos genes seqüenciados.Outro objetivo da rede era encontrar genes de interesse agronô-mico e, em 2007, suas pesquisas se voltaram ao melhoramento.Com as seqüências identificadas pelo genoma, a equipe de Gláuciaconstruiu micro-arranjos de DNA para descobrir potenciais recei-tas para uma cana mais doce nos genes ativos nas plantas com altaacumulação de sacarose.

Quando o Programa de Investigação Tecnológica de São Paulo(PIT-SP) entrou em contato com Gláucia, a patente dos genes já haviasido solicitada, tendo inclusive a solicitação para proteção em outrospaíses iniciada. No entanto, faltava definir em que países a tecno-logia poderia e deveria ser patenteada, decisão tomada diante dospotenciais mercados. O trabalho da equipe do PIT foi o de estimaro impacto dessa tecnologia em diferentes países ou mercados. Umavez que a tecnologia se propõe a aumentar o teor de sacarose da cana-

REVISTA CONECTA

GENÉTICA

Produtores do estado de São Paulo contam agora com o conhecimentosobre genes associados à produção, ao transporte e ao acúmulo da sacarose, matéria-prima para geração de açucar e etanol

FLAVIA NATÉRCIA

Produção contínua de variedades de cana, essa do IAC: grande trunfo das lavouras brasileiras

DIVULGAÇÃO/IAC

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de-açúcar, era preciso calcular qual seria o impacto doaumento da concentração de sacarose na planta.Dependendo do resultado, é possível quantificar oganho de produção de etanol e açúcar. Fazendo umcruzamento entre a concentração de sacarose da plan-ta e a área ocupada com a cana-de-açúcar, estima-se olucro potencial do produtor.

Ferramenta genéticaOs micro-arranjos são lâminas sobre as quais se colo-

cam fragmentos de DNA multiplicados pela técnica de reação emcadeia da polimerase (polymerase chain reaction ou PCR, sigla eminglês). Essa enzima participa da duplicação do DNA nas célulase produz bilhões de cópias de um fragmento. Na técnica o DNAé submetido a um tratamento que o desnatura, deixando no chipfitas simples no lugar de fitas duplas. As moléculas de RNA (inter-mediários da transformação das informações codificadas no DNAem proteínas) dos organismos a serem comparados são extraídase, com auxílio da enzima transcriptase reversa, que faz um cami-nho contrário ao da transcrição, são transformados em DNA, queé marcado com corantes. Os fragmentos provenientes de umaamostra são corados em vermelho, os da outra amostra em verde.Todos os fragmentos (vermelhos e verdes), em seguida, são mistu-rados num único tubo de ensaio.

A mistura é incubada num chip e os fragmentos de DNA colo-ridos aderem às seqüências com as quais são semelhantes e as letrasdo código se pareiam. O DNA que não aderiu ao chip é lavado.Então o chip é posto numa caixa preta e escaneado com um laser

vermelho e um laser verde. Pontos vermelhos apa-recerão onde só houverem grudado os fragmentosda amostra corada em vermelho. Pontos verdes serãoprovenientes de uma única amostra também, a ver-de. Onde houver pontos amarelos, há genes que sãoexpressos nas duas amostras. Os micro-arranjos sãoas grandes ferramentas dos projetos transcriptoma,

que investigam a expressão diferencial de genes àscentenas ou milhares. Outra técnica utilizada foi o

PCR em tempo real.A tecnologia foi desenvolvida em parceria com duas empresas

— o Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) e a Central ÁlcoolLucélia —, que são titulares da patente, juntamente com a Fundaçãode Amparo à Pesquisa de São Paul (Fapesp), e ajudaram no finan-ciamento da pesquisa. O licenciamento deve interessar a empresasde biotecnologia e que desenvolvem plantas transgênicas. No labo-ratório, a equipe de Gláucia seguirá estudando a contribuição par-ticular de cada gene no processo de produção e acumulação da saca-rose e outros aspectos da biologia da cana. Ainda que não seja nati-va, a cana-de-açúcar é cultivada no Brasil desde o século XVI e, apartir do final do século XIX, se destaca pela seleção e pelo desen-volvimento de centenas de variedades (ver box2). A produção con-tínua de variedades novas de cana, liberadas anualmente, repre-senta um dos grandes trunfos das lavouras brasileiras. A vantagemproporcionada por essa diversidade representa, por outro lado, umempecilho no que concerne à introdução de variedades transgêni-cas da cana: a existência de variedades locais aumenta os riscos deque os genes introduzidos escapem.

77REVISTA CONECTA

O setor da cana tem um longo histórico de seleção emelhoramento genético que começou no final do século XIX,no Instituto Agronômico de Campinas (IAC), com o austría-co Franz W. Dafert. Ele fez o primeiro estudo de 42 var-iedades de Saccharum officinarum sob duas condições distin-tas de cultivo. À época, a gomose, doença detectada naslavouras da Bahia e de Pernambuco, constituía uma preocu-pação para os produtores de São Paulo, porque a cana caianaera suscetível. Mais tarde, em 1920, a doença do mosaicoalastrou-se pelos canaviais paulistas, provocando uma criseque surtiu ao menos um efeito positivo: a criação de progra-mas de melhoramento genético que já na década seguinte resul-taram em duas novas variedades, a CB e a IAC. Ao longo dastrês décadas seguintes, os programas foram aprimorados,

gerando novas variedades, testando novos métodos de cul-tivo e implementando novas técnicas, como a adubação e oespaçamento entre as plantas.

Na década de 1960, dois novos atores se integraramao cenário da pesquisa e desenvolvimento da cana: aPlanalsucar (atualmente Rede Interuniversitária para oDesenvolvimento do Setor Sucroalcooleiro - Ridesa) e aCopersucar (agora Centro de Tecnologia Canavieira - CTC).Entre outros benefícios, esses novos atores proporcionarama introdução de 678 genótipos, provenientes de diversos país-es, nos programas de melhoramento. Também realizaramexperimentos de hibridização (formação de híbridos, “mis-turas”) na Bahia, estado onde se concentra a diversidadegenética brasileira da cana-de-açúcar, e na Serra do Ouro,

em Alagoas, onde há condições perfeitas para os cruza-mentos. Foi a partir dessa base bem estabelecida e dessadinâmica que se construiu a moderna agroindústria canavieira,valendo-se das amplas possibilidades agrícolas de um paísonde não faltam sol, terra ou chuva.

Cerca de 500 variedades se encontram em campo, dasquais 50 são mais intensamente utilizadas. Entretanto, a mono-cultura é proibida: uma variedade não pode ocupar mais que15% da área plantada. Se uma praga aparece, dificilmentevai dizimar toda a lavoura. Agora, para se manter na liderançada produção de açúcar e etanol o país deve lançar mão dasferramentas da biologia molecular (genômica, proteômica, tran-scriptômica). Um grande desafio está em aliar, nas plantas, altaprodutividade com resistência a pragas.

LONGO HISTÓRICO DE PIONEIRISMO

DIVU

LGAÇ

ÃO

Page 78: Revista conecta

�� Desenvolvimento de superfícies difusoras parao melhoramento acústico de ambientes

�� Biossensor para detecção precoce da ferrugem asiática na soja

�� Uso de proteínas extraídas de fungo em herbicida biológico

�� Novo processo de desacidificação de óleos vegetais ou gordura animal para fins alimentíciose produção de biodiesel

�� Produção e aplicação de enzimas aumentam abiodisponibilidade de cereais em rações

�� Processo e formulação de produtos alimentí-cios do tipo chocolate à base de cupuaçu

�� Processo para a elaboração de produtos à basede fibras do pedúnculo do caju e seus produtos

�� Processo e sistema para preparação de purê debanana

�� Leite em pó compactado em tabletes, barrasou comprimidos

�� Metodologia para diagnósticos de cupins emárvores e edificações

�� Central de incêndios e alarme

�� Sistema estrutural modular do tipo árvore

78

Esta seção traz as tecnologias analisadas pelo Programa de Investigação Tecnológica de São Paulo

REVISTA CONECTA

LISTA DAS TECNOLOGIAS

Acústica

�� Processo de obtenção de extrato de produtosmarinhos apresentando ação antibacteriana

�� Processo de obtenção da fração volátil da oleoresina da copaíba de potencial atividadeantiinflamatória

�� Método de obtenção de uma linhagem de levedura transgênica através de plasmídeo recombinante

�� Processo de produção de polímeros biodegradáveis a partir de óleos vegetais

�� Processo de produção de polímeros biodegradáveis a partir de resíduos industriais

�� Processo de produção de polímeros biodegradáveis a partir de glicerol

�� Produção de frutooligosacarídeos - FOS

�� Produção controlada de biossurfactantes comcomposições controladas

�� Nova metodologia para modificação de mate-riais à base de quitosana

�� Linhagens de SSaallmmoonneellllaa mmuuttaannttee desenvolvidascomo vetor vacinal contra diversas doenças

�� Identificação e caracterização de indivíduos através de medidas biométricas da retina humana

�� Processo e produto para ligações entre elementos estruturais de concreto por meio deargamassa de cimento e areia modificada

�� Processo de obtenção de telha de fibrocimentocom reforço à base de polpa celulósica

�� Processo de preparação de um hidrolisado protéico microencapsulado para fins alimentícios

�� Processamento e aplicação de farinha de trigode grão inteiro em panificação

�� Novo processo de modificação de amidos permite que o insumo seja utilizado na fabricaçãode uma variedade de produtos

�� Produção de pó de monóxido de nióbio e sua aplicação em capacitores

�� Fabricação de corpo de prova de referência

�� Tratamento siderúrgico de escória de aciaria eproduto resultante como matéria-prima parafabricação de cimento

�� Aço inoxidável supermartensítico para ferramental cirúrgico

�� Atualização de posição inteligente para rastreamento de veículos

�� Sistema compacto de cogeração de eletricidade totalmente nacionalizado

�� Etiquetas eletrônicas de RFID

�� Sistema de monitoramento e controle de parâmetros e equipamentos de iluminação emvias públicas e privadas

Biotecnologia

Engenharia Civil

Agronomia

Alimentos

Arquitetura e Urbanismo

Engenharia de Alimentos

Engenharia de Materiais e Metalurgia

Computação

Engenharia de Transportes

Engenharia Elétrica

Page 79: Revista conecta

79REVISTA CONECTA

�� Produção de hidrogênio por reforma a vaporde etanol

�� Técnica de construção de secadores de alimentos a partir de fornos

�� Novas ligas metálicas para tixoconformação

�� Novo método para a fabricação de sílica vítreapara componentes ópticos

�� Novo método de separação para o sistemaágua/petróleo

�� Scanner óptico com novo design proporcionaeconomia em sua fabricação e no consumo deenergia

�� Processo de fabricação de preforma de sílica não-circular

�� Aperfeiçoamento do uso da energia térmicaem processos de produção de açúcar e etanol

�� Válvula injetora de alto desempenho para motores de combustao interna ICE

�� Fluido de corte para retificação à base de óleode mamona

�� Sistema controlador de posição linear hidropneumático

�� Reator químico para tratamento de resíduosorgânicos perigosos

�� Equipamento termo-ativado para tratamentode emissões gasosas de fluor e outros gases

�� Tratamento de resíduos de mercúrio via plasma

�� Processo e produto aditivo para redução doponto de fluidez em óleos lubrificantes, combustíveis e petróleo

�� Novo processo para obtenção de acrilato de etila

�� Fabricação de bioquerosene para aviação

�� Novo processo de separação do sistema etanol-água em processos de destilação

�� Obtenção de glicerina pura a partir de resíduos

�� Produção contínua de biocombustíveis a partirde óleos e gorduras residuais

�� Processo intensificado e via tecnologia verdepara a obtenção de acetato de etila

�� Processo de obtenção de biodiesel de elevadapureza

�� Detector nanoestruturado de sulfito emvinhos, sucos e concentrados de caldo de cana

�� Composto termoplástico biodegradável de amido

�� Tratamento de efluente industrial contendopoliorganossiloxanos

�� Mini-estação para tratamento de esgotodoméstico

�� Reciclagem de isopor

�� Processo e equipamento de esgotamento sanitário de sistemas coletores de esgoto em regiões de pequeno desnível

�� Sistema e biorreator para tratamento de águas contaminadas por gasolina

�� Método de produção de radiofármaco usadono diagnóstico e tratamento de tumores neuroendócrinos

�� Desenvolvimento de compostos para tratamento dos sintomas da anemia falciforme

�� Novas formulações lipossomais para aplicaçõesdermatológicas

�� Vacina gênica lipossomal de dose única contrainfecções micobacterianas

�� Processo de obtenção de extratos e princípio ativo de CCaasseeaarriiaa ssyyllvveessttrriiss para tratar distúrbiosgastrintestinais em humanos

�� Lectina KM+ regeneradora de tecidos e imunomoduladora

�� Dispersões de partículas de fases líquido-cristalinas como sistema de carreamento e liberação de agentes

�� Vacina para a prevenção de rodococose eqüina

�� Processo de obtenção de extratos e princípio ativo de CCaasseeaarriiaa ssyyllvveessttrriiss para tratar distúrbiosgastrintestinais em animais

�� Curativo de latex natural com atividade angiogência e cicatrizante

�� Medicamento para epilepsia

�� Uso de epítopos ou sua combinação em vacinasprofiláticas e terapêuticas anti-HIV-1

�� Unidade de potência e controle de processosindustriais

�� Combinador eletro-óptico para geração desinais pulsados ultra-rápidos de microondas

�� Dispositivo polimérico para armazenamento deinformação óptico reversível

�� Processo para fabricação de dispositivo (LED) polimérico emissor de luz

Farmácia

Engenharia Mecânica

Engenharia Química

Engenharia Sanitária

Física

Page 80: Revista conecta

�� Novo processo de obtenção de substâncias ati-vas a partir do ginseng brasileiro

�� Fitoterápico para tratamento sinérgico do cân-cer de próstata

�� Genes da cana-de-açúcar associados ao conteúdo de sacarose

�� Sistema robotizado multifuncional de projeções e exposições audiovisuais

�� Sistema para investigação diagnóstica de distúrbios metabólicos

�� Novo sistema de leito móvel para atender asnecessidades no campo de trabalho dos profissionais de radiologia

�� Novo equipamento para transporte, levantamento e posicionamento parapacientes/clientes em condições especiais

�� Protótipo para planejamento cirúrgico

�� Sensores de pressão à fibra óptica para aplicações biomédicas

�� Processo de tratamento de osteoporose nãoinvasivo e sem regime medicamentoso

80REVISTA CONECTA

LISTA DAS TECNOLOGIAS

�� Kit para validação de processos de esterilização

�� Novo contador automático para colônias microbianas

�� Simulação computacional para análise de tensão e otimização de estruturas metálicas

�� Eletrocatalisadores de partículas metálicaspara aplicação em células a combustível

�� Produto e processo de fabricação de sulfatoferroso microencapsulado para uso em alimentos

�� Novo processo de reciclagem de embalagens com multicamadas

�� Agentes redutores de atrito hidrodinâmico para bio-combustívies

�� Novo processo para a fabricação de medicamentos antidepressivos e anti-tabaco

�� Novo processo para extração em fase sólida permite aumentar a eficiência da extração

�� Desenvolvimento na técnica de espectrometria atômica com geração de Hidretos (HG-AAS) permite redução significativa de custos

�� Monitoramento da liberação de produtos encapsulados relacionados às indústrias farmacêuticas, cosméticas e alimentícias

�� Método para a caracterização da composição química de amostras de própolis

�� Processo químico simples e rápido para obtenção de peças de aluminas com propriedades hidrofóbicas

�� Novo método de síntese da kanemita sódica

�� Novo sistema para remoção de poluentes orgânicos

�� Controle de qualidade de produtos contendoSacarídeos

�� Kit para remoção de albumina em amostras deplasma sangüíneo

�� Túnel de congelamento portátil para paletes

�� Processo de obtenção de composição de amido termoplástico e borracha natural biodegradável

�� Composição fotoprotetora a base de filtros solares fotoestáveis

�� Processo de preparação da (R)-(+)-jasmolactona(óleo de jasmim) para uso na indústria alimentíciae de perfumaria

�� Sistema de gerenciamento de árvores urbanas - SISGAU

CONTATOS

IPENNúcleo de Inovação Tecnológica - [email protected]: (11) 3133-9033

IPTDiretora Adjunta de Negócios e Marketing (DANM) -Propriedade Intelectual e Comercialização de Tecnologia www.ipt.br/atividades/inovacao/[email protected]: (11) 3767-4118

UNESPNúcleo de Inovação Tecnológica - UNESPwww.unesp.br/[email protected]: (11) 5627-0314

UNICAMPAgência de Inovação INOVA Unicampwww.inova.unicamp.brTelefone: (19) 3521-5201

USPAgência USP de Inovaçã[email protected]: (11) 3091-4165

Genética

Mecatrônica e Robótica

Medicina

Modelagem e Simulação

Química

Software

Fitoterápicos Microbiologia

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82REVISTA CONECTA

DICAS DE LIVROS

Gestão integrada da inovação: estratégia, organização e desenvolvimento de produtos

Peter Georg Drucker/Editora Atlas/2008

Mais do que fazer previsões sobre o futuro o que vale é criá-lo, fazê-lo acontecer. Olivro Gestão integrada da inovação: estratégia, organização e desenvolvimento de produtos(Editora Atlas, 2008) parece seguir a risca esse pensamento do economista e admi-nistrador Peter Georg Drucker, que ficou conhecido por ser o pai da gestão moder-na. Reunindo diversos autores, as 274 páginas tratam de uma metodologia integradade gestão, que direciona a estruturação de núcleosde inovação nas empresas, para aumentar sua capa-cidade inovadora de forma articulada com outrosatores do processo produtivo. Para isso, explora ques-tões como inteligência competitiva, definições dosmodelos de inovação, motivação, organização e pla-nejamento estratégico para inovação, além de tratarde indicadores e projetos na área. Em suma, os tex-tos distribuídos em onze tópicos, trazem a tona osdesafios das empresas para manter-se no mercado etornarem-se líderes. A meta dos autores é que a lei-tura crie novas idéias e oportunidades, ajude a defi-nir estratégias de desenvolvimento tecnológico, apriorizar projetos, integrar áreas e equipes, gerenciarprojetos e desenvolver produtos inovadores. O foco é ajustado para empresas bra-sileiras, mas abarca peculiaridades nesse contexto, como empresas de diferentestamanhos. Criar o futuro nesse caso é portanto preparar as empresas para inovar.O livro é resultado de um projeto da Universidade Federal de Santa Catarina e InstitutoEuvaldo Lodi, financiado pela Finep (Financiadora de Estudos e Projetos doMinistério de Ciência e Tecnologia).

Flagrantes da vida no futuro

João Antônio Zuffo/ Editora Saraiva/2008

Novas descobertas, era da informação (ou infoera) e evolução tecnológica são os motesde Flagrantes da vida no futuro (Editora Saraiva, 2008). As 232 páginas escritas por JoãoAntônio Zuffo - um dos fundadores do Laboratório de Microeletrônica da Universidadede São Paulo e, hoje, coordenador do Laboratório de Sistemas Integráveis (LSI) – abran-gem desde inteligência artificial, micro robôs, nanotecnologia e TV tridimensional, atéeducação a distância e inclusão digital. Composto de umasérie de 70 crônicas, esses e outros temas são abordadosde forma reflexiva tendo como horizonte os próximos30 anos e as conseqüências socioeconômicas de novasdescobertas.As projeções feitas por Zuffo incluem visõesotimistas sobre a inclusão digital no Brasil e de outrospaíses emergentes, como Índia, Rússia e China, que emsua opinião terão economias que desempenharão umforte papel no cenário mundial. No caso do Brasil, essaprevisão deverá ocorrer por volta de 2010. Mais adian-te, em 2038, é a vez da erradicação do analfabetismo oque, para Zuffo, será um processo que contará com umaforte presença da educação a distância, realidade virtuale micro informática. Seguindo a trilha de figuras comoRay Kurzweil, livros com amplas reflexões sobre o futuro e sobre as inovações tecno-lógicas têm se tornado comuns nos últimos anos. No entanto, até esse livro, pouco sereservava ao contexto brasileiro. Além disso, Flagrantes da vida no futuro arrisca-se deforma inédita a transitar por outras áreas, como desigualdades sociais, política e reli-gião, que marcam a história e a realidade do país, e que decerto não podem estar ausen-tes das reflexões futuras.

The new age of innovation: driving cocreated value through global

C.K. Prahalad E M.S. Krishnan / McGraw Hill Books /2008

O recém publicado The new age of innovation: driving cocreated value through global (McGraw Hill Books, 2008) traz atona elementos importantes para solidificar a capacidade de organização que sustenta mudanças contínuas e ino-vações dentro das corporações. Na opinião dos autores, o expert em negócios C.K. Prahalad e o professor de negó-cios, tecnologia e informação M.S. Krishnan, as grandes alterações, que já são sentidas desde o cotidiano até o cená-rio de negócios e inovação, estão mudando a forma como as empresas criam valor, uma tendência que, na opiniãodeles, só irá acelerar cada vez mais nos próximos anos. O valor, segundo eles, pas-sou a ser fundado sobre experiências únicas e personalizadas dos clientes. Esse é umdos pilares das mudanças atuais, que eles denominam N=1 e que pode ser enten-dido como “cada cliente é único”. Outro pilar das transformações é que “nenhu-ma empresa é grande o suficiente para satisfazer as experiências de um cliente numdeterminado momento”. O nome desse pilar é R=G (recursos de múltiplos for-necedores freqüentemente provenientes do mundo todo) e significa que a ques-tão chave é ter acesso aos recursos e não possuí-los. Em suma, os autores alertamque a inovação é multifaceta, tem aspectos diversos que não podem ser ignorados,e que devemos ir além do que as tecnologias de ponta prefiguram . Mesmo assim,digitalização, conectividade, criação de redes sociais, convergência tecnológica eindustrias como de eletroeletrônicos, informática e comunicações caracterizamesse panorama, e uma utilização agressiva de TI, mais do que relevante, é estra-tégico para a nova era da inovação.

"Trata-se de um livro mais voltado para

gestão de empresas, e Prahalad é

uma autoridade no tema"

MARIA BEATRIZBONACCELLI, professora doDepartamento dePolítica Científica e Tecnológica daUnicamp

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