Revista ContraMão Parte 2

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A queda do muro da Santa Bárbara A dor, o sofrimento e a angustia dos moradores da Vila Santa Barbara que tiveram suas casas inun- dadas pela água represada por um muro construido ao lado das casas. Descaso 16 O s moradores da vila Santa Bárbara não sabem ao certo quem é o verdadeiro dono/a das terras por eles ocupadas em 1997. Aos arredores da vila existe um espaço muito grande pertencente ao senhor João Claudino, em 2006 um muro foi construído para dividir a propriedade da comunidade da vila, as famílias que ocupavam esse terreno foram tiradas de suas casas e colocadas do outro lado do muro. Antes da construção do muro, os moradores não sofriam com o alagamento de suas casas, existia um tipo de galeria que não deixava a água escapar e ir de encontro a casa das famílias, essa galeria recebia toda a água que descia dos conjuntos mais altos da vila. No final de 2008, uma grande enchente atingiu as redondezas da vila próximas ao muro, alagando muitas casas. Na frente desse muro há um calçamento alto e as casas são na parte baixa, o que intensifica o processo de acumulo de água. A moradora atingida pela enchente Âmparo relata que “a casa era de taipa quando o muro caiu, a minha casa, a da vizinha caíram, tinha muita água acumulada no pé do muro e quando caiu invadiu e derrubou muita casa, muita casa que já tava construída também caiu”. As famílias atingidas relataram não ter recebido a ajuda necessária, suas casas eram de barro e muitos eletrodomésticos e móveis foram perdidos. Na época, o Armazém Paraíba de também propriedade do senhor João Claudino, ajudou-os com o concerto de alguns móveis ou eletrodomésticos, não alcançando a grande perca que as famílias tiveram. Uma das moradoras atingidas chamada Roberta, diz que “os funcionários do Paraíba levaram nossas coisas, algumas eles devolveram concertadas, outras nem mesmo devolveram, os móveis foram trocados por outros velhos e feios”. Após a enchente, o muro foi levantado e no local onde acumulava água foram feitas algumas manilhas, a fim de diminuir o acúmulo de água. Os moradores

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Produção acadêmica / Universidade Estadual do Piauí

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A queda do muro da Santa BárbaraA dor, o sofrimento e a angustia dos moradores da Vila Santa Barbara que tiveram suas casas inun-dadas pela água represada por um muro construido ao lado das casas.

Descaso

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Os moradores da vila Santa Bárbara não sabem ao certo quem é o verdadeiro dono/a das terras por

eles ocupadas em 1997. Aos arredores da vila existe um espaço muito grande pertencente ao senhor João Claudino, em 2006 um muro foi construído para dividir a propriedade da comunidade da vila, as famílias que ocupavam esse terreno foram tiradas de suas casas e colocadas do outro lado do muro. Antes da construção do muro, os moradores não sofriam com o alagamento de suas casas, existia um tipo de galeria que não deixava a água escapar e ir de encontro a casa das famílias, essa galeria recebia toda a água que descia dos conjuntos mais altos da vila. No final de 2008, uma grande enchente atingiu as redondezas da vila próximas ao muro, alagando muitas casas. Na frente desse muro há um calçamento alto e as casas são na parte baixa, o que intensifica o processo de acumulo de água. A moradora atingida pela enchente Âmparo relata que

“a casa era de taipa quando o muro caiu, a minha casa, a da vizinha caíram, tinha muita água acumulada no pé do muro e quando caiu invadiu e derrubou muita casa, muita casa que já tava construída também caiu”. As famílias atingidas relataram não ter recebido a ajuda necessária, suas casas eram de barro e muitos eletrodomésticos e móveis foram perdidos. Na época, o Armazém Paraíba de também propriedade do senhor João Claudino, ajudou-os com o concerto de alguns móveis ou eletrodomésticos, não alcançando a grande perca que as famílias tiveram. Uma das moradoras atingidas chamada Roberta, diz que “os funcionários do Paraíba levaram nossas coisas, algumas eles devolveram concertadas, outras nem mesmo devolveram, os móveis foram trocados por outros velhos e feios”. Após a enchente, o muro foi levantado e no local onde acumulava água foram feitas algumas manilhas, a fim de diminuir o acúmulo de água. Os moradores

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“Foi em 2008, não tinha manilha e o muro era cheio de buraquinho e teve um dia que acumulou muito lixo, por causa da grande chuva o muro caiu e tudo aqui encheu de água, nas casas lá de baixo e no visinho de trás. A gente tava aqui dentro de casa indo dormir e quando o papai foi lá fora olhar o muro e a mamãe que tava lá em baixo do muro e na hora que ela saiu o muro caiu, se ela tivesse em baixo ainda... Era muita água e começou a entrar, as camas saiam boiando que nem um patinho.Ninguém ajudou a reconstruir nossa casa, os tijolos foi o pai que comprou e a Teresa Brito deu 3 colchões pra gente dormir, porque se não a gente ia dormir no chão.Hoje em dia eu não fico em casa sozinha quando ta chovendo, eu vou pra casa da minha tia com medo da água entrar de novo”, diz Roberta.

Roberta Milena, 14 anos.

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afirmam que mesmo após a implantação, continuam acontecendo alagamentos, pois a espécie da galeria que existia foi destruída e no lugar nada foi feito. Os moradores vivem com medo de novamente perderem suas casas e seus pertences e infelizmente eles não têm a atenção necessária que melhore suas condições de vida. Os moradores já tentaram acionar órgãos competentes como a Superintendência de Desenvolvimento Urbano - SDU leste, eles pedem mais atenção à sua área, que seja construído uma galeria digna e um

calçamento que resolva em parte seus problemas, “o mais importante que a gente precisa aqui é uma galeria, porque é muita água que desce”, diz a moradora Âmparo. Até o presente momento ainda não tiveram respostas concretas sobre os pedidos.Os moradores apontam também a falta da atuação de políticos na área, o senhor Francisco Pereira diz que “toda vez que tem enchente no dia seguinte aparece um político querendo prestar solidariedade e depois nunca mais aparece, nuca ninguém aparece para fazer nada por aqui”

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Perfil

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Jane Riosmulher, mãe e lider comunitáriaDesde 2001, quando mudou para

a Vila Santa Barbara, Jane Rios já participava das mobilizações

dentro da comunidade, através do conselho comunitário. Já foi da associação de moradores por três anos, mas ela afirma que mesmo não sendo presidente da associação fez e faz muitos trabalhos pra comunidade, “eu faço isso é porque gosto mesmo, não é por dinheiro, interesse, é porque eu gosto mesmo”. Conversamos um pouco com Jane e ela explicou um pouco sobre sua participação na associação de moradores, conselho comunitário e sua posição em relação a participação das pessoas no movimento de bairro. Jane, explica que quando entrou na associação de moradores só havia ela e outra mulher na diretoria. Diz ainda que, naquela época, havia mais de 300 moradores cadastrados, que pagavam todo mês uma mensalidade de 1 real. “Nesse período conseguimos uma escola municipal, Marcilio Rangel, conseguimos 230 caso, pelo projeto morar melhor, conseguimos melhorias nas linhas de ônibus, e alguns pedaços de calçamento” diz. No período da ocupação foram muitas famílias que participaram intensamente do processo, entretanto, essa participação foi aos poucos sendo diminuída. “Eu avalio a participação das pessoas desde a época quando chegamos ate hoje, naquela época não tinha água,

não tinha luz, nem calçamento, nem escola ou transporte, enfim, as dificuldades eram enormes e por isso que os moradores eram mais participativos, mas agora mudou, tem um certo desenvolvimento, e eles não se interessam mais. Também porque tem muito morador novato, que não passaram pela historia do bairro e não se interessam pela associação. Estão conformados e falta coletividade” Falando mais especificamente da associação de moradores, Jane diz que ”a participação das pessoas na associação deixa muito a desejar, eles não participam, mais de 90% das pessoas não participam das mobilizações aqui pelo bairro. Eles cobram muito das lideranças, cobrar eles cobram muito, mas participar? E as pessoas quando querem cobrar alguma coisa, tem que participar, porque uma andorinha só não faz verão”. Por fim, perguntamos a Jane como foi, na avaliação dela, o ultimo pleito para a eleição de uma nova diretoria. Nesse sentido, ela afirma que “o ultimo processo eleitoral da associação de moradores, teve uma participação muito pequena da população, o atual presidente optou por fazer o cadastramento somente em um único local, e só no final de semana, mas nem todo mundo sabia disso e tinha gente que não tinha tempo e por isso ficou muitas pessoas sem votar”.

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A Vila Santa Barbara, que é fruto de uma ocupação de 1999, desde o inicio teve sérios problemas que vão desde

a falta de saneamento, transporte público de qualidade até educação, saúde, economia, etc. Entretanto, as lutas dos moradores e das moradoras do bairro vêm nesses quase 15 anos de história conseguindo grandes avanços para a comunidade. No que se refere educação, o bairro conta hoje com duas escolas, uma municipal e uma estadual, além do Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) Madre Tereza de Calcutar. A CMEI Madre Teresa, antes chamada de creche é muito nova, foi implantada a cerca de 4 anos e essa é a primeira e única creche da vila. ¬Ela tem a capacidade de atender 300 crianças, entre a creche e pré-escola, sendo que a creche é de 0 a 3 e a pré-escola ate 6 anos. “temos 3 turmas de maternal, turma de 1º período e 2º período. Atendemos as crianças da Santa Barbara, Sigefredo Pacheco, Dom Avelar, vila Teresa Brito” explica a diretora da escola, Lia Raquel Gomes de Melo. Não é novidade que a educação

Educação

A educação infantil na Santa BárbaraUma etapa de formação que requer um esforço maior.

no Brasil passa por um serio problema de financiamento, entretanto, segundo afirma a diretora, a educação infantil nos últimos anos melhorou muito, “a gente tinha antes uma educação muito assistencialista, mas hoje não vemos mais isso, nossas crianças quando saem do 2º período, já saem alfabetizadas” diz. Estruturalmente, o que mais a escola reclama é com relação as paredes semi-abertas das salas de aula, são salas de meia parede, que tanto prejudicam os professores quanto a concentração e aprendizagem das crianças. Para ela, as maiores dificuldades são em relação a própria conscientização dos pais, “a mentalidade dos pais é se livrar”, diz a diretora, que completa “mas nos acompanhamos as faltas, buscamos o contato com essas famílias pra ver o que estar acontecendo”. Isso não pode, todavia, ser considerado com algo desconectado da atual forma de organização do trabalho, a grande maioria das famílias, principalmente das periferias, precisa trabalhar dois, a vezes até três turnos para ter condições de manter o orçamento familiar. Isso produz

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uma necessidade de manter os filhos em um ambiente seguro, como a escola. Pode-se perceber isso também através grande rotatividade das famílias no bairro, como afirma Lia Raquel, “as famílias mudam de bairro muito rápido e as crianças mudam de escola também muito rápido e se você for ver isso acontece em muitas escolas, aqui na Madre Teresa não é diferente”.

Relação com a comunidade A relação e interação com a comunidade é feita através de oficinas, mostras de arte e palestras, como forma de trazer os pais e a comunidade para dentro da escola. A diretora diz ainda que ”temos parceria com faculdades que vêm prestar serviço à escola, serviço odontológico, psicológico, pedagógico, serviço médico, etc”. A escola dispõe ainda de um conselho escolar, de reuniões anuais e plantões escolares, que fazem junto com os pais, “mas é muito difícil, por que sempre há a questão da falta de tempo, da indisponibilidade por

parte dos pais”.

Vagas e demanda O número de morados da Santa Barbara cresceu muito nos últimos anos, passando de 500 famílias para ......, isso fez com que com o número de crianças crescesse bastante e que as vagas disponibilizadas pela única escola de ensino infantil do bairro não fossem suficientes. ”Quando a gente faz a matricula e falta vaga temos vagas nos bairros vizinhos, que têm escola, mas são bairros próximos” diz a direto.Uma semana antes das matriculas, a fila já começa a se formar do lado de fora da escola. Jane Maria Rios, moradora antiga do bairro e líder comunitária, diz que faltam vagas na escola e ela mesma precisa ficar na fila para garantir vagas.

Pessoas com deficiência Na CEMEI Madre Teresa tem um caso de uma criança autista, um problema muito sério que necessita tanto do apoio familiar quanto escolar. A professora Lia Raquel conta que o caso de uma criança com autismo da escola é um pouco mais delicada, por que a família se recusou a levar a criança ao medico para um diagnostico, apesar dos avisos diários dados pelas professoras e pedagogas. Mas o agravamento do caso levou a família da criança levá-la ao médico, o laudo comprou o autismo. Mas, segundo conta a professora, “a mãe disse que não iria trazê-lo mais para a escola, por que ele iria ser descriminado, mas eu falei pra ela que quem esta descriminando o filho dela é ela mesma”. A escola fez um trabalho de convencimento para que a família trouxesse a criança para a escola, “até ameaçar de denunciar ao conselho tutelar eu ameacei”diz a diretora da escola, que completa, “enfim conseguimos trazê-lo para a escola, hoje temos uma professora que o acompanha direto, como a forma adequada de ensino e aprendizagem”.

Professora Lia Raquel, diretora da CMEI

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Saúde

Abrigo São Lucas O tão conhecido Abrigo São Lucas localiza-se no Bairro Santa Bárbara. Essa entidade filantrópica tem como finalidade acolher pesssoas idosas, exclusicamente a partir dos 60 anos,que se encontram em situação de risco, maus tratos, abandonado, violência sexual física ou psicológica, e idosos que estão com o vínculo rompido, ou seja, aqueles que tinham família mas não há vínculo com eles, seja por causa de drogas, problemas pessoais, falta de contato. Os idosos que moram com filhos ou irmãos, eles só recebem se a asssitente social do abrigo perceber se é cabível ou não a internação de acolhimento, ou seja, que o vínculo com a família está realmente rompido. O idoso é recebido de forma institucional, o que lhe facilita muito, pois estando institucionalizado ele terá direito a alimentação , moradia, medicamentos e atendimento médico na própria instituição. A capacidade da casa é de 60 pessoas, mas na verdade só cabe realmente 55 camas no local. As atividades são feitas de acordo com os projetos pedagógicos, os da área de saúde e os sociais. Na área social existe o Projeto Família Amiga que garante o direito à documentação e aposentadoria. Além

Raimundo Rodrigues, residente há 6 anos, diz que é igual a morar em

um hospital

disso, ele tenta reestabelecer o vínculo com a família, pra que o idosos não necessite ficar lá até morrer. O Projeto Pedagógico tenta resgatar a cidadania através de práticas pedagógicas, como por exemplo contar uma história através de um desenho, revelando que todo mundo tem uma história de vida pra contar. Os projetos de saúde, física e motora, visam identificar as doenças mais constantes (artrose, osteoporose) e realizar atividades recreativas – dança, música, as quais os idosos se identificam bastante. A diretora do abrigo, Liliane Costa Ribeiro, trabalha há 9 anos no local e está há 2 anos na direção. Ela conta que há visita

com os familiares duas vezes ao mês, na primeira e segunda quinzena. Para ela, se não resgatar esse vínculo, o abrigo pode se transformar em um depósito de idosos, e não é esse o objetivo. Por isso, para não chegar o dia em que o idoso pedirá pra ir embora, os

profissionais do local vão trabalhando essa emancipação com eles diariamente. No ano de 2010, houveram 7 vínculos recuperados, e no ano de 2011 apenas 5. O residente Raimundo Rodrigues do Nascimento – natural de Buriti dos Lopes, está há 6 anos no abrigo e não gosta de morar no local. Ele diz que é igual morar em

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No momento, há 50 idosos morando no

abrigo. O mais velho possui 104 anos e o mais novo 60 anos

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um hospital. Contou-nos que foi marinheiro exemplar no Rio de Janeiro em 1953 e como tal gosta muito de se divertir até hoje. Já fora preso algumas vezes, inclusive em Recife. Seu maior sonho é realizar um evento de boxe no Verdão. Ele diz que bateu o recorde de vadiagem quando viajava por alguns estados do Brasil enquanto marinheiro. Gosta bastante de política e fala muito no político piauienese Tomás Teixeira. Enquanto entrevistávamos, ele exigiu uma foto sua com a camisa de seu time favorito: Botafogo. Perfis como o de seu Raimundo, é facilmente entendido o porquê de não gostar de estar no abrigo. Fora desde cedo acostumado com a vida livre, e consequentemente queria isso pra sua vida até hoje. No momento, há 50 idosos morando no abrigo. O mais velho possui 104 anos e o mais novo 60 anos de idade. A fragilidade do abrigo depois desse vínculo, dá-se pelo fato de que a instituição não consegue manter o contato com os idosos depois da volta às suas famílias. Ao visitar o local, fica fácil perceber a relação de apego dos funcionários aos moradores. A diretora confessa que é uma grande tristeza quando algum deles ou delas falece: ‘’ Às vezes nós sentimos mais do que os próprios funcionários ‘’. Devido a isso, os funcionários possuem um projeto para seu

Raimundo Rodrigues, residente há 6 anos.

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Saúde

próprio acompanhamento psicológico, para casos como o de uma idosa que foi violentada sexualmente pelo filho e pelo neto aos 95 anos e que marcou emocionalmente muitos funcionários. Maria Dolores é uma das moradoras mais velhas da casa, com 100 anos. Muito lúcida e com uma simpatia estampada no rosto, ela conta que morava em Goiânia e veio a pé de lá para o Piauí: ‘’Saí de lá dia 1 de agosto e dia 7 de setembro cheguei em Gilbués’’. Ela está no abrigo há um ano, foi casada uma vez e nunca teve filhos. Ela, ao contrário de Seu Raimundo, adora o abrigo. Conversando apenas alguns minutos com ela, já deixa trasnparecer toda sua independência. Ela diz que não quer nem saber de homem em sua vida e afirma:’’ As meninas não podem acreditar nesses meninos de hoje não, chegam dizendo que são filhos de fazendeiro, e não tem nem a

cueca pra vestir.’’ A moradora mais

antiga no local é Cícera Siqueira de Sá. Ela tem 67 anos e está há quase 40 anos no abrigo.

Ela morava em Brasília, e

por volta de 1960

veio à Teresina e não

Maria Dolores, 100 anos de idade e há um ano vive no abrigo

Liliane Costa, diretora do abrigo.

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localizou sua família. Conheceu o Joaquim dos Velhos, fundador do Abrigo São lucas e relata que ele a chamou para fundar um abrigo para pessoas que não sabiam onde seus familiares estavam, assim como ela. Num dado dia ele chegou e entregou as chaves a ela, ela mesma fundou e abriu o abrigo. Ela gosta muito de morar no abrigo, diz que as meninas, funcionárias do local, fazem o possível e o impossível por eles. Ela adora quando tem festinha e piquinique, disse ainda que gosta de se dar um trato.São com essas muitas histórias de vida que qualquer pessoa que vai abrigo sai adquirindo. Liliane conta que, ao longo desses anos como administradora do local, observa fora dele que sempre quando perguntado às crianças onde você estará quando idoso, todas elas sonham com netos, uma casa distante, sossego e paz. ‘’ Ninguém quer morar em um abrigo, ela é sempre a última das instâncias ‘’, afirma a diretora. Apaixonada pelo que faz, Liliane diz que chega uma hora em que você é um peso na vida das pessoas, um carma, pois quando você está velho e tem um problema de saúde, você é descartado.

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Abrigo São Lucas

Cicera Ciqueira de Sá, 67 anos, mais da metade deles vivido no abrigo.

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A Saúde da vila Santa Bárbara é assistida por um Posto de Saúde da Família – PSF, que atende além

da vila, todos os conjuntos habitacionais das redondezas, posto que possui o maior número de famílias cadastradas. O posto funciona com duas equipes (98 e 99) composta cada uma por um(a) médico(a), um(a) enfermeiro(a), um(a) dentista e um técnico(a) de enfermagem que atendem uma vez por semana as famílias agendadas. As equipes ainda contam com 15 agentes de saúde, que visitam as comunidades durante a semana, a administradora do posto há sete anos, dona Maria das Graças, revela que “duas equipes não são suficientes para atender a demanda de pacientes, tem agentes nossos com mais de duzentas famílias, um agente não dá conta da demanda” e acrescenta que “na verdade, o posto funciona como um ambulatório”. Os pacientes que precisam de atendimento de urgência são encaminhados do hospital do Satélite para o posto tomar providencias e encaminhar para outras unidades. Os funcionários do posto de saúde são reféns das ações da comunidade. “Usuários de drogas, fazem uso livremente na frente e ao lado do posto de saúde e nós não podemos fazer nada”, aponta Maria das Graças. Com a falta de atenção e segurança, os funcionários são ameaçados e terminam por subordinarem-se aos mandos e desmandos da comunidade. Não existe saneamento básico na vila “nosso posto vive sujo, com essa piçarra, o carro passa e joga areia” diz Maria das Graças e a situação se agrava ainda mais, pois o carro de lixo não tem acesso a grande parte das ruas da vila,

acumulando muito lixo e favorecendo a ação de algumas doenças. Apesar de todos os encontros e desencontros, o posto de saúde tenta promover na medida do possível atividades para envolver a comunidade. Já foram realizados mutirões da limpeza, levados delegados da mulher e do idoso, para incentivar e ajudar a população. Também já foram levados projetos de faculdades que discutem a gestação e realizam campanhas de prevenção junto ao hospital. A estrutura do posto de saúde é composta por dois consultórios (médico e dentista), sala de enfermagem, sala de

Saúde

“O posto de saúde funciona, na verdade, como um ambulatório” diz Maria das Graças.

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vacinas, sala de curativos, sala de citologia e sala dos procedimentos do posto. A administradora aponta “a falta de espaço, precisamos de mais equipes e um espaço maior e próprio, pois o espaço do posto é alugado”. Dentre as doenças mais relacionadas pelos agentes de saúde, a maioria dos casos são de hipertensão, hanseníase e dependentes de remédios controlado. Casos como estupro e suicídio também foram

apontados. “Existem muitos casos de estupro, irmão com irmã, senhoras idosas, os agentes de saúde sabem mas tem medo ou são intimidados ou a família compactua com a ação” Maria das Graças explica que há a promessa de aumento e mudança do posto de saúde, o loca deixaria de ser alugado e passariam a atuar seis equipes na toda a extensão da Santa Bárbara, Vale do Gavião e redondezas.

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Campo de Futebol da Vila Santa Barbara: único espaço de lazer da região.

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Aprende – lê nos livrosLê nos olhos – aprende

A ler nos jornais:A verdade pensa com a tua cabeça.

Faça perguntas sem medoNão te convenças sozinho

Se não descobriu por siNa verdade não descobriu.

(Bertolt Brecht)