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1. Introdução

O reconhecimento universal de que os seres humanos merecem igual respeito, inde-pendentemente de suas diferenças biológicas e culturais não é fruto do mundo moderno. A noção de direitos humanos, sendo aqueles inalienáveis e intrínsecos à pessoa e exigíveis em todo lugar e tempo, acompanhou a evolu-ção da humanidade nos seus vários estágios até a hodierna civilização.

Direitos fundamentais, direitos do homem, direitos naturais, direitos básicos, garantias individuais dentre outros são algu-mas desinências as quais designam o assunto em questão. Observa-se que qualquer defini-ção a ser usada corresponderá, de uma forma simplificada, a um mínimo ético relacionado às necessidades fundamentais do homem que são iguais a toda pessoa e devem ser res-peitadas para que o homem não se reduza a esse mínimo, perdendo a sua dignidade. Mi-guel Reale (1991, p.210) enunciou que o ser humano é “o valor fundamental, um valor-fonte” que está acima de todo o ordenamento jurídico, um ser que vale por si só, um pos-tulado que reflete em um princípio basilar, a dignidade da pessoa humana.

2. Os Direitos Humanos

A idéia de direitos humanos esteve li-gada a diversos momentos históricos em que se buscava uma afirmação dessa dignidade. Para alguns autores, esses direitos surgiram de lutas e conquistas de cada povo, manifes-tando-se assim, em diferentes textos e decla-rações que eram o resultado de uma tentativa de resgate de qualquer opressão, exploração

e preconceito. Enquanto para outros, os di-reitos humanos eram direitos naturais dos homens, devendo ser entendidos como um conjunto de normas eternas, universais e su-periores ao direito positivo.

Dessa forma, o conceito dos direitos humanos é adaptável conforme a concepção político-ideológica da organização da vida social. Posto isto, tem-se que desde a Anti-guidade certos valores humanos eram pro-tegidos por meio de leituras religiosas tanto pelo humanismo oriental, por intermédio das tradições hindus, chinesas e islâmicas, quan-to pelo humanismo ocidental judaico-cristão e greco-romano. (DORMELLES, 1997).

Segundo João Ricardo W. Dormelles (1997, p.16) há três concepções filosóficas que possibilitaram o desenvolvimento con-ceitual dos direitos humanos, quais sejam: concepção idealista, concepção positivista e concepção crítico-materialista.

A primeira concepção surge com a Es-cola do Direito Natural no século XVII, em que os direitos humanos eram entendidos como valores divinos, advindos de uma or-dem supra-estatal. Portanto, os direitos hu-manos existiriam independentemente de um reconhecimento do Estado, posto que eram ideais.

A concepção positivista transfere os direitos humanos para o campo do positi-vismo jurídico. A partir dessa concepção os direitos humanos não eram tidos como um produto ideal de uma força divina, pois para garantir a sua existência e eficácia era preciso que cada direito estivesse positivado em lei.

Por último, a terceira concepção se passa durante o século XIX e traz em seu bojo os ideais de Karl Marx, sendo uma con-

A SAÚDE E A INTEGRIDADE DO TRABALHADOR COMO UM DIREITO FUNDAMENTAL: UMA REFLEXÃO TEÓRICAMarina Francói¹Marcia Cristina Sampaio Mendes²

¹Bacharelada em Direito pelas Faculdades COC²Profa. Orientadora- docente das Faculdades COC na área de Direito do Trabalho.

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cepção de perfil histórico que defende serem os direitos humanos normas decorrentes de lutas sociais travadas em prol de um mínimo ético de convivência humana.

Note-se que os direitos humanos são um conjunto de normas e valores que expres-sam a essência do ser humano sendo um sus-tentáculo do princípio da dignidade humana. É nítido o caráter de não concorrência desses direitos em relação a outros, o que garante sua supremacia em detrimento ao Estado e a sociedade.

No que tange, contudo, ao funda-mento dos direitos humanos, Norberto Bob-bio (1992, p.46) afirma que a busca por um fundamento absoluto de tais direitos perdeu o seu campo, vez que não se pode atribuir esse fundamento absoluto a direitos histo-ricamente relativos. Todavia, algumas teses atuais refutam esse pensamento no sentido de que a justificativa principal dos direitos humanos reside no princípio guia da digni-dade da pessoa humana. Essa dignidade está intimamente relacionada as condições mate-riais e espirituais que consintam com o de-senvolvimento do homem.

Vieira de Andrade (1983, p.94-95) es-tabeleceu pela primeira vez uma correlação entre os direitos humanos e o princípio da dignidade da pessoa humana, quando decla-rou em sua tese que:

(...) direitos fundamentais têm de ser os direitos básicos, essenciais, principais, mesmo que fora do catálogo ou da Constituição. E, o elemento intencional do critério proposto, a referência ao princípio da dignidade humana, deve ser enriquecido com esta nota, para afastar direitos individuais que não mereçam aquele significativo. (ANDRADE, p.94-95)

Neste sentido, podemos concluir que

o fundamento dos direitos humanos repou-sa na luta por uma vida digna, uma batalha

histórica a qual resultou na evolução das três gerações dos direitos fundamentais. Tais di-reitos visam garantir e preservar a dignidade da pessoa humana, a qual resulta de condi-ções que viabilizam o pleno desenvolvimento do ser humano. Essa possibilidade de desen-volvimento pleno (material, espiritual e inte-lectual) se faz acerca da igualdade de oportu-nidade que é fruto da igualdade humana, um fundamento absoluto.

2.2.As Gerações dos Direitos Humanos

A evolução dos direitos humanos é tratada pela doutrina clássica de forma fra-cionada numa tríade conhecida como as três gerações dos direitos humanos. Essa divisão não indica que os direitos humanos são divi-síveis e, por isso, foram implantados de ma-neira sucessiva e fragmentada; apenas nos traz a idéia de que os direitos foram conquis-tados por povos diferentes em momentos históricos diversos.

O reconhecimento dos valores huma-nos foi gradativamente positivado a partir dos direitos de liberdades, dos direitos so-ciais e por último dos direitos dos povos.

Sendo assim, primeiramente tem-se os direitos de primeira geração que são cha-mados de direitos civis e políticos, os quais se consolidaram com as reinvidicações da classe burguesa no século XVIII em torno do direi-to à liberdade, como o direito à liberdade de pensamento, de locomoção, de propriedade, de voto, de expressão etc. Esse movimento teve início na Inglaterra com a Carta Magna de 1215, em seguida com um documento cha-mado Bill of Rights em 1689. Posteriormente, na América surge a Constituição da Filadélfia em 1787 que viabilizou a criação da Declara-ção dos Direitos do Homem e do Cidadão na época da Revolução Francesa em 1789.

Karl Marx criticava os direitos da pri-meira geração, a qual dizia ter caráter retórico. Neste diapasão, os direitos conquistados pela

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de a existência de uma quarta geração dos di-reitos humanos, que está ligada aos direitos surgidos com a globalização, como o direito à informação, à democracia e ao pluralismo. Destarte, acreditamos que essas categorias enunciadas pelo renomado constituciona-lista brasileiro se enquadram na terceira ge-ração, posto que os direitos dos povos têm como eixo o valor solidariedade que abarca uma dimensão transindividual e planetária.

Pode-se dizer que a concepção que traduz os direitos humanos como indivisíveis e universais tem sua origem na modernidade, quando partimos do pressuposto Renascen-tista de que o homem e seus direitos indivi-duais estão no centro do universo; Portanto, segundo Flávia Piovesan (2007, p.135) “uma geração de direitos não substitui a outra”, ademais a idéia de tais direitos serem univer-sais não esbarra nas “particularidades nacio-nais e regionais e bases históricas, culturais e religiosas”, pois os direitos humanos de-vem ser considerados globalmente exigíveis, cabendo a cada Estado aplicá-los de forma “justa e equânime, com os mesmos parâme-tros e com a mesma ênfase”.

2.3. A Normatização Hodierna

Como leciona Norberto Bobbio (1992, p.24), “o problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los”. O Di-reito Internacional dos Direitos Humanos se consolidou no século XX, a partir da Segunda Guerra Mundial como um movimento capaz de responder a todas as atrocidades causa-das pelas duas grandes guerras. Segundo Flávia Piovesan (2007, p.117), “se a Segunda Guerra significou a ruptura com os direitos humanos, o pós-guerra deveria significar sua reconstrução”.

A certeza de que era necessária uma delimitação da soberania estatal por meio de uma sistematização normativa interna-

segunda geração são indispensáveis para o gozo das liberdades obtidas por meio da pri-meira geração. A segunda geração possui seu cerne no valor da igualdade que é produto de várias lutas proletárias no século XIX, que tinham como finalidade adquirir condições essenciais para os trabalhadores, surgindo dessa forma, os direitos sócio-econômicos e culturais, tais como o direito ao trabalho, à moradia, à saúde, à educação, ao lazer dentre inúmeros direitos da classe trabalhadora.

Por se tratar justamente de direitos proletários, que esses direitos foram procla-mados pela primeira vez no Manifesto Co-munista em 1848, fortalecendo-se na Cons-tituição Francesa de 1864 e, ganhando status de direitos e garantias fundamentais do indi-víduo na Constituição Mexicana de 1917³ e também na Constituição de Weimar em 1919 na Alemanha.

Já os direitos humanos da terceira geração, alcunhados também de direitos dos povos, que têm como valor a solidariedade, advêm de lutas e protestos sociais do século XX, principalmente a partir da situação ca-tastrófica deixada pelas duas grandes guerras (COMPARATO, 2003). Os direitos avocados nessa geração são direitos transindividuais, como por exemplo, o direito ao patrimônio genético intocável, o direito ao meio ambien-te sadio, o direito à autonomia dos povos, o direito ao desenvolvimento, o direito à paz enfim, direitos transnacionais que trazem uma noção ampliada e indivisível dos di-reitos humanos. Constam tais direitos em diversos tratados de direitos humanos, em cartas constitucionais como a Carta Africana dos direitos humanos e dos povos (1981), em convenções como a Convenção sobre o Direi-to ao Desenvolvimento (1986), bem como na Declaração do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992) e na Declaração Universal sobre o Genoma Hu-mano e os Direitos Humanos (1997).

Paulo Bonavides (2006, p.525) defen-

³ Segundo Fábio Konder Comparato, a Constituição Mexicana de 1917 foi “a primeira a atribuir aos direitos trabalhistas a qualidade de direitos fundamentais, juntamente com as liberdades individuais e os direitos políticos”. A afirmação histórica dos direitos humanos, p. 174.

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cional, a qual garantisse eficácia e proteção aos direitos humanos, impulsionou numa preocupação em positivar todos os direitos humanos surgidos durante a história.

Assim, os direitos humanos contem-porâneos possuem como base normativa internacional a Declaração Universal dos Di-reitos Humanos proclamada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, a qual deu início, juntamente com a Organização das Nações Unidas, a um desen-cadeamento de elaborações de leis globais capazes de proporcionar validade e solidez à todas as gerações dos direitos humanos antes vistos apenas em lutas sociais.

Observa-se com a Declaração Univer-sal dos Direitos Humanos uma expansão aos direitos sociais, alguns salientamos: o direito à seguridade social e à saúde5 (arts. XXII e XXV); o direito ao trabalho e à proteção con-tra o desemprego (art. XXIII, “1”); os direitos mínimos dos trabalhadores (arts. XXIII, “2” e “3”, e XXIV); o direito à educação gratuita (art. XXVI) entre outros. Fortificou-se tam-bém com a Declaração Universal a indivisibi-lidade dos direitos do homem, ao passo que se convergiram os direitos civis e políticos com os direitos econômicos, sociais e cultu-rais, refutando o legado nazista de que cabia à determinada raça uma titularidade de di-reitos.

Dessa forma, começa-se a perceber que o fundamento dos direitos humanos – a dignidade humana – passou a ser o pon-to de partida na criação das legislações no pós-guerra, uma vez que “a sobrevivência da humanidade exigia a colaboração de todos os povos, na reorganização das relações interna-cionais com base no respeito incondicional à dignidade humana” (COMPARATO, p.210).

Dentre os mais relevantes documen-tos jurídicos-políticos promulgados no âmbi-to da ONU em 1966 e ratificados pelo Brasil em 1991, podemos mencionar o Pacto Inter-nacional sobre Direitos Civis e Políticos e o

Pacto Internacional sobre Direitos Econômi-cos, Sociais e Culturais. Enquanto o primeiro abordava questões relacionadas à liberdade das pessoas como um direito protegido con-tra os abusos do poder estatal; o segundo pacto preconizava os direitos de igualdade àqueles grupos sociais menos favorecidos que sofriam com a segregação econômica imposta por uma minoria dominadora.

Ainda na seara da internacionalização dos direitos humanos, tem-se pela primeira vez a cautela em criar tratados e declarações que protegiam os direitos de terceira gera-ção, como o direito ao meio ambiente salu-bre do trabalho, à paz, à biodiversidade, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, à independência, ao desenvolvimento e auto-nomia dos povos etc.

2.4. A Constituição Brasileira de 1988

Com vistas ao direito interno, foi por meio do processo de democratização no Bra-sil que houve a possibilidade de se elaborar uma nova Carta Constitucional, a qual foi promulgada em outubro de 1988 e levou o nome de Constituição-cidadã. A partir do ad-vento desta os direitos humanos ganharam status constitucional, expandindo assim, o rol de direitos e garantias fundamentais, tendo como alicerce do Estado Democráti-co de Direito a dignidade da pessoa humana (WEIS, 2006).

Diante do que estabelece o art. 5º, §2º da Constituição Federal de 88, “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Fede-rativa do Brasil seja parte”, José Afonso da Silva (2007, p.178) alega que em nosso orde-namento jurídico os direitos fundamentais possuem três fontes: a Constituição Federal; princípios e regimes legitimados por esta; bem como os tratados e convenções inter-

5 Art. XXV: “Todo homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar, a si e à sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação (...)”.

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3. O Direito à Saúde do Trabalhador como um Direito Fundamental

O direito à saúde é um direito natu-ral quando analisado sob o prisma de ser um direito inalienável, imprescindível e inato ao homem. Não podia ser tratado de maneira diferente o direito à saúde do trabalhador, um direito fundamental que está intimamen-te relacionado a uma vida digna e, na esfera trabalhista a uma boa prestação laboral ao empregador.

Esse direito contém um valor essen-cial para o ordenamento jurídico, vez que sem ele a dignidade da pessoa humana fica-ria comprometida. Nesse sentido, observa-se que o direito à saúde, e de igual modo o direito à saúde do trabalhador têm natureza jurídica de direito humano, estando ele po-sitivado ou não, é um direito que deve ser respeito e cumprido, afinal se refere ao pleno bem estar físico e psíquico do ser humano. O Estado, por sua vez, deve proporcionar a sua população serviços públicos de saúde que ofereçam condições favoráveis tanto de prevenção quanto de tratamento de doenças. É direito de qualquer cidadão brasileiro exi-gir prestações positivas ao Estado, posto que nosso sistema jurídico é dotado de diversas normas de ordem pública e documentos in-ternacionais que aclamam o direito à saúde.

A própria Organização Internacional do Trabalho (1919) exerceu significativas contribuições aos seus Estados signatários no que toca à criação de recomendações e convenções relativas ao direito à saúde do trabalhador. Há em seus textos uma idéia de interdependência entre o direito à vida, o direito à saúde e o direito ao meio ambiente sadio. Embora no Brasil a doutrina traba-lhista seja considerada uma ciência jurídica autônoma, é fundamental que haja um trata-mento sistematizado dessa matéria, inviabi-lizando assim, uma dissolução entre o Direi-to do Trabalho, o Direito Constitucional e os Direitos Humanos.

nacionais que são adotados pelo Brasil. A celeuma neste caso se instaurava sobre a in-corporação no sistema jurídico brasileiro dos tratados e convenções internacionais de di-reitos humanos, que teve uma solução com o advento da Emenda Constitucional 45/2004 que acrescentou o §3º ao art. 5º da Magna Carta. Posto isto, a recepção deste parágra-fo garantiu status de norma constitucional formal a todos os tratados e convenções in-ternacionais de direitos humanos que forem ratificados segundo o procedimento legal inserto no art. 60 da Constituição, o qual é destinado para as aprovações das emendas constitucionais pelo Congresso.

Neste sentido, José Afonso da Silva (2007, p.179) declara que aquelas normas infraconstitucionais que violarem as normas internacionais incorporadas pela Constitui-ção na forma do §3º, serão inconstitucionais e sujeitas ao controle de constitucionalidade.

Por meio de uma interpretação sis-temática da Constituição de 88, conclui-se que há uma rede normativa de interdepen-dência entre os direitos de primeira, segun-da e terceira geração, não podendo afirmar que existe uma hierarquia entre as mesmas, ou que há uma primazia entre os direitos à vida, à saúde e ao meio ambiente. Cançado Trindade (1993, p.191-192) critica a teoria geracional dos direitos humanos ao passo que sustenta que essas três gerações não se sucedem ou se substituem; Para arrematar, as lições do magistrado José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva, que em sua obra “A saúde do trabalhador como um direito humano – conteúdo essencial da dignidade humana”, aduz que:

O fim último de se proteger a saú-de do trabalhador é o de preservar sua integridade física e moral, vale dizer, sua própria vida. Para tanto, a prevenção do meio ambiente do trabalho, local em que aquele pas-sa grande parte de sua vida, torna-se condição sine qua non para o sucesso da referida tutela. (SILVA, 2007, p.59 )

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3.1. Conceito de saúde – clássico e moderno

O conceito de saúde por muito tempo foi tido como um conceito negativo em que se levava em consideração apenas a inexistência de doenças. Ainda nos dias atuais, observa-se que esse conceito clássico exerce influência no pensamento das pessoas, bem como na prática médica, visto que a preocupação em relação à saúde não é maior em prevenção, mas na cura de doenças (OLIVEIRA SILVA, 2008).

O artigo 196 da Constituição Federal de 1988 enuncia que:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doen-ça e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, pro-teção e recuperação.

A leitura desse dispositivo nos mostra que a Carta Magna adotou uma concepção de saúde que não é simplesmente curativa, ou seja, aquela que tem como escopo restabele-cer um estado saudável após a enfermidade, mas também como sendo uma prestação so-cial que se volta aos aspectos da prevenção em especial (SILVA, 2007).

Percebe-se então, que não há dúvidas de que o moderno conceito de saúde com-preende tanto a definição negativa quanto a positiva e que o direito à saúde engloba o bem-estar físico e funcional, sendo indispen-sável um meio ambiente social que ofereça boa qualidade de vida.

3.2. Direito à saúde e à vida

É remota a preocupação com a saúde pública. Os romanos, após terem assumido o legado da cultura grega, deixaram impor-tantes contribuições como a construção de sistemas de esgotos e de banhos, suprimen-tos de água e outras instalações sanitárias,

tornando-se conhecidos na História como engenheiros. Ademais, não se encontra estu-dos referentes à saúde do trabalhador antes do período romano, em que foi estabelecida pela primeira vez uma relação entre as doen-ças e o trabalho (ROSEN, 1994).

Diga-se de passagem, o desenvolvi-mento do sistema capitalista de produção trouxe um significativo avanço tecnológico e científico incontestável para a história. To-davia, paralelamente a todo esse progresso nascia outra história, que segundo João L. G. Medeiros (apud OLIVEIRA SILVA, 2008) era tida como epidemia da pobreza. O au-mento da jornada de trabalho, a exigência da força de trabalho de mulheres e crianças nas indústrias, o êxodo rural, a degradação do ambiente urbano foram alguns dos desastres que contradiziam o novo sistema (OLIVEIRA SILVA, 2008).

A época da Miséria Operária no sécu-lo XIX relacionava o direito à saúde do tra-balhador como uma luta pela sobrevivência, viver era para aquele tempo um não morrer. Pode-se falar que eram dois os objetivos fa-cilmente encontrados pelas lutas operárias nessa “pré-história da saúde dos trabalhado-res”: o direito à vida (ou a sobrevivência) e a liberdade de organização. “Salvar o corpo dos acidentes, prevenir as doenças profissio-nais e as intoxicações por produtos indus-triais, assegurar aos trabalhadores cuidados e tratamentos convenientes” era o guia das reinvidicações dos trabalhadores pela frente à saúde. Nesse sentido, a palavra que nor-teou todo o século XIX é a redução da jor-nada de trabalho. Surge pois, no fim desse século, algumas leis sociais que colocavam a saúde em um plano mais acessível, como a lei sobre a higiene e a segurança dos traba-lhadores da indústria (1893) e a lei sobre aci-dentes de trabalho e sua indenização (1898). Insta salientar que a aplicação dos benefícios alcançados pelo movimento operário não foi capaz de abranger todas as esferas trabalhis-tas, visto que a evolução dessa relação saúde-trabalho era mais rápida nos pólos onde os

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trabalhadores eram mais numerosos (gran-des empresas) e o trabalho possuía valor eco-nômico estratégico (DEJOURS, 1992).

Com efeito, no período das duas Grandes Guerras Mundiais intensificou-se o saldo qualitativo na produção industrial; os esforços de produção para poder atender as demandas necessárias da guerra, as experi-ências infrutíferas de redução da duração da jornada de trabalho, além da falta de mão-de-obra pelos altos números de mortos e fe-ridos decorrentes das guerras contribuíram para uma reviravolta na relação homem-tra-balho. Cresciam-se assim, novas reinvidica-ções operárias na busca de melhorias dessa condição. Nesse diapasão, as iniciativas de proteção daqueles trabalhadores feridos e da mão-de-obra desfalcada obtiveram avanço em torno da jornada de trabalho, da medici-na do trabalho e da indenização das doenças adquiridas nesse âmbito (DEJOURS, 1992).

Por meio da criação da OIT (Organi-zação Internacional do Trabalho) em 1919, houve um marco em relação à consagração do direito trabalhista no plano universal, in-clusive no tocante à saúde do trabalhador. Essa etapa de internacionalização da tutela aos direitos trabalhistas buscava uma maior eficácia na proteção dos mesmos. Outras batalhas foram vencidas como a redução da jornada de trabalho para 8 horas diárias feita por Albert Thomas em 1916, a institucionali-zação da medicina do trabalho e da Previdên-cia Social, entre outras. (DEJOURS, 1992)

Cristophe Dejours (1992) sustenta ainda que durante o período de 1914 a 1968 houve um significativo progresso advindo das lutas trabalhistas em relação às condi-ções de trabalho, viabilizando assim que a luta pela sobrevivência cedesse lugar à luta pela saúde do corpo. A palavra de ordem en-tão era melhoria das condições de trabalho, pela segurança, pela higiene e pela prevenção de doenças.

Segundo o autor, após 1968 reconhe-ce-se que a organização do modo trabalhista (a divisão do trabalho, o sistema hierárquico,

as modalidades de comando, as relações de poder etc) resultou em outra lesão à saúde do trabalhador, qual seja, o sofrimento mental. Inicia-se assim, uma nova frente de luta ope-rária – a saúde mental – que devido ao seu grau de complexidade é até hoje posta em discussão.

Destarte, é sob essa perspectiva histó-rica que o direito à saúde no trabalho ganhou força atualmente. De acordo com a premissa de que a saúde é o mais completo bem-estar físico, mental e social que o Estado deve pro-porcionar às pessoas, chegamos à conclusão de que o ser humano tem como direito hu-mano fundamental o gozo no grau máximo da saúde adquirida tanto pelas prestações positivas do Estado e de terceiros quanto pelas abstenções de certas práticas lesivas a mesma.

Converge com a saúde do trabalhador também seu direito à vida, o que torna clara a interdependência entre os direitos humanos liberais e sociais, vez que o trabalhador não terá uma vida digna se sua saúde estiver de-bilitada, não havendo sentido em proteger os direitos materiais dos trabalhadores caso es-tes não tenham saúde para continuar a pres-tar serviços (OLIVEIRA SILVA, 2008).

O direito à vida digna sedia todos os demais direitos fundamentais à pessoa hu-mana. José Afonso da Silva leciona que o di-reito à vida

é um fator preponderante, que há de estar acima de quaisquer outras considerações como as de desen-volvimento, como as de respeito ao direito de propriedade, como as da iniciativa privada. Também estes são garantidos no texto cons-titucional, mas, a toda evidência, não podem primar sobre o direito fundamental à vida, que está em jogo quando se discute a tutela da qualidade do meio ambiente. É que a tutela da qualidade do meio am-biente é instrumental no sentido de que, através dela, o que se protege é um valor maior: a qualidade de vida (SILVA 2004, p. 70).

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Portanto, também nesta ótica aduz José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva (2008) que o Estado Democrático de Direito em que se constitui a República Federativa do Brasil tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana (art.1º, III), sendo inviolável o direito à vida (art.5º, ca-put), encontrando-se dentre os direitos e ga-rantias fundamentais o direito social à saúde (art.6º).

3.4. Natureza jurídica do art. 7º, XXII da Constituição Federal de 1988

Promover o bem de todos (art. 3º, IV, CF) é um dos objetivos traçados pela Consti-tuição pátria de 1988 que garante em seu art. 6º, dentro do Título dos direitos e garantias fundamentais e no art. 196 do Título da or-dem social, o direito à saúde a todos.

Para definir a natureza jurídica de uma norma é preciso delimitar seu conteú-do. Quando a saúde é vista como um direito, esta deve ser entendida sob um ângulo uni-versal, posto que sua importância é essencial ao homem. Segundo esse entendimento, te-mos que alguns direitos como o de liberda-de, igualdade, propriedade dentre outros perdem seu relevante papel caso o direito à saúde não seja respeitado. Cabe observar, portanto, a complementaridade dos direitos fundamentais do ser humano. É, portanto, diante do prisma de direito humano que o direito à saúde tem sua natureza jurídica de-finida.

Cumpre notar que as Constituições anteriores não positivaram o direito à saúde como um direito fundamental. Foi apenas com a criação da Constituição Federal de 1988 que se inovou o ordenamento jurídico brasileiro por meio dos direitos e garantias fundamentais do homem, tratando a partir dessa ótica o direito à saúde como um direito humano fundamental. Assim também é in-terpretado o direito à saúde do trabalhador no ambiente laboral.

No Direito do Trabalho a dimensão

da proteção jurídica à saúde do trabalhador cresceu devido a sua maior importância dada pela Carta Magna de 1988. Percebeu-se que a qualidade de vida do trabalhador está in-timamente lincada à sua integridade física e bem-estar, ressaltando com veemência Se-bastião Geraldo de Oliveira que é impossível ter qualidade de vida sem ter qualidade de trabalho, pois o homem passa grande parte da sua vida no ambiente laboral. Nesse senti-do, o constitucionalista José Afonso da Silva leciona que:

é espantoso como um bem extra-ordinariamente relevante à vida humana só agora é elevado à con-dição de direito fundamental do homem. E há de informa-se pelo princípio de que o direito igual à vida de todos os seres humanos significa também que, nos casos de doença, cada um tem o direito a um tratamento condigno de acor-do com o estado atual da ciência médica, independentemente de sua situação econômica, sob pena de não ter muito valor sua consig-nação em normas constitucionais (SILVA, 2006, p.308)

3.5. O princípio da prevenção no meio ambiente do trabalho

O direito ao trabalho é disciplinado pela Carta Magna de 1988 como um alicerce da ordem econômica, sendo fonte de dignida-de e meio que possibilita o alcance do bem-estar e da justiça sociais (ROSSIT, 2001).

Vale observar que o trabalho é uma condição imprescindível para que haja dig-nidade efetiva da pessoa humana, pode-se pois afirmar que a boa condição social do trabalhador está intimamente relacionada à existência de condições dignas de trabalho. Verifica-se então um liame entre o trabalho e a saúde, estabelecendo a necessidade de proteger o meio ambiente do trabalho para se obter uma melhor qualidade de vida e, por conseqüência, preservar a saúde do trabalhador.

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Sem informação organizada e sem pesquisa não há prevenção (MACHADO, 2004).

Raimundo Simão de Melo (2004) aponta o princípio da prevenção como um princípio-mãe da ciência ambiental, o qual está consagrado no art. 225 da Constituição Federal, bem como encontra seu fundamen-to no princípio n.15 da Declaração do Rio de Janeiro de 1992, sobre meio ambiente e de-senvolvimento. Por fim, declara que referido princípio “deve ser o norte para a apreciação das liminares e tutelas antecipadas nas ações que visem à tutela do meio ambiente do tra-balho e a preservação da saúde dos trabalha-dores, considerando-se mera probabilidade de dano” (MELO, 2004).

A crescente preocupação com o am-biente do trabalho culminou numa amplia-ção do campo da tutela à saúde do trabalha-dor; não basta que o ambiente de trabalho seja apenas salubre, uma vez que deve pro-piciar ao trabalhador tanto saúde física como mental. Portanto, dada a importância do tra-balhador estar inserido num âmbito laboral que lhe garanta uma boa qualidade de vida, pode-se utilizar como inspiração a denomi-nação meio ambiente ecologicamente equi-librado para criar um novo termo chamado meio ambiente do trabalho socialmente equi-librado, o qual exprime o verdadeiro intuito de toda essa prevenção.

3.6. As normas pertinentes ao meio ambiente do trabalho

A classificação da saúde dada pela Lei Magna de 1988 como um direito social, possibilitou que o empregador recebesse a incumbência de diminuir a incidência de condições e fatores danosos à saúde; ade-mais, garantiu a redução dos riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança, dentre outros direitos que foram elaborados com o escopo de pro-teger todos aqueles que trabalham (ROSSIT, 2001). No que tange ao direito ao meio am-biente equilibrado tem-se como classificação

Augusto Cançado Trindade (1993) sustenta que apenas em 1970 a internacio-nalização da luta por uma proteção ao meio ambiente equilibrado ganhou seu espaço por meio do advento da Declaração de Esto-colmo sobre o Meio-Ambiente Humano de 1972, havendo uma evolução paralela com a proteção dos direitos humanos. No Brasil em 1981 foi promulgada a Lei n. 6.938 que instituiu no país a Política Nacional do Meio Ambiente, a qual tinha como objetivo princi-pal preservar a qualidade do meio ambiente ecologicamente equilibrado, sem desfavore-cer o desenvolvimento econômico e social. A referida lei encontra-se em harmonia com a atual Constituição Federal que trata em seu art. 225, sobre a tutela de todos os aspectos do meio ambiente, seja este natural, artifi-cial, cultural ou do trabalho.

José Afonso da Silva (2008) aduz que o ambiente do trabalho é um complexo de bens imóveis e móveis de uma empresa ou de uma sociedade, objeto de direitos subjetivos privados e de direitos invioláveis da saúde e da integridade física dos trabalhadores que o frequentam. Prossegue o jurista afirman-do que embora o meio ambiente do trabalho esteja inserido no meio ambiente artificial, aquele é digno de tratamento especial, pois se refere ao local o qual o trabalhador passa boa parte da sua vida, sendo que a qualida-de de vida do mesmo depende, portanto, da qualidade do ambiente onde labora.

Neste diapasão, o dever jurídico de evitar a consumação de danos no meio am-biente do trabalho encontra-se em normati-zações internacionais e legislações nacionais, inclusive na Carta Política vigente, como anteriormente explanado. Esses arcabouços jurídicos têm como denominador comum a necessidade de prever, prevenir e evitar transformações prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente. Surge assim, o princípio da prevenção que significa agir antecipada-mente, de maneira que para se ter ação é pre-ciso que haja um conhecimento formado, ou seja, um estudo daquilo que irá se prevenir.

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um direito difuso, sendo um bem comum do povo e, portanto, indivisível e essencial à qualidade de vida (MACHADO, 2004). Trata-se também de um direito social que exige prestações positivas por parte do Esta-do, assim como pela sociedade, sendo ambos os responsáveis pela prevenção e defesa do meio ambiente. Pode-se verificar um vínculo do direito à saúde com o direito ao meio am-biente saudável, uma vez que sem a existên-cia deste, o direito à vida estaria inviabilizado em seu exercício e gozo pleno.

No tocante ao meio ambiente este é dividido em: meio ambiente natural; meio ambiente cultural; meio ambiente artificial e meio ambiente do trabalho. O primeiro é constituído por meio de recursos naturais, como a água, o ar, o solo, a fauna e a flora. Em contrapartida, o meio ambiente artificial é o espaço físico transformado pela ação do homem de forma contínua, tendo em mira a vida em sociedade. Subdivide-se em meio ambiente urbano, periférico e rural. Já o meio ambiente cultural constitui-se por bens, valores e tradições que fazem parte da identi-dade e formação de uma sociedade. Por fim, o meio ambiente do trabalho – objeto des-se estudo – entende-se como o local onde é desenvolvida a prestação de serviço, ou seja, onde o homem obtém os meios para prover a sua subsistência, podendo ser o estabeleci-mento empresarial, o ambiente urbano, no caso dos que executam atividades externas e até mesmo o domicílio do trabalhador, no caso de empregado a domicílio.

Em relação ao meio ambiente do tra-balho tem-se como bem jurídico tutelado a saúde e a segurança do trabalhador. Nesse sentido, observa-se que o direito ao meio ambiente do trabalho equilibrado significa um direito ao exercício de atividades laborais em condições dignas, sem insalubridade ou periculosidade, isto é, com qualidade de vida. Portanto, quando se fala em direito à saúde a Carta Magna remete ao Título VIII, que dis-põe sobre a Ordem Social, capítulo II, seção II, estabelecendo que se trata de um direito

de todos, isto é, difusamente encontrado na sociedade. Da mesma forma também é tra-tado no título da Ordem Social, no capítulo VI, o direito ao meio ambiente equilibrado. Sendo assim, vê-se que a Constituição Fede-ral pátria incorporou, em todos os aspectos, a tendência moderna de assegurar o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225), incumbindo ao Poder Público e à coletividade defendê-lo e preser-vá-lo, inclusive no que tange ao ambiente do trabalho, manifestamente expresso em seu art. 200, VIII.

No âmbito infraconstitucional tem-se a Lei n. 6.938/81 (LPNMA) que juntamente com outros dispositivos legais como a CLT e a Portaria n. 3.214/1997 do MTE, formam o controle jurídico de proteção ao meio am-biente do trabalho e à saúde do trabalhador (MELO, 2009). A Organização Internacional do Trabalho criou também uma significativa normatização sobre segurança e saúde do trabalhador em suas convenções de n. 148, 155 e 161 que foram aprovadas e ratificadas pelo Brasil. De acordo com Sebastião Geral-do de Oliveira (2002) tais convenções são consideradas por ele como as de mais impor-tância nesta seara, pelo fato de se aplicarem a uma generalidade dos trabalhadores. Outra relevante convenção é a de n. 187 de 2006, que embora não tenha entrado ainda em vi-gor traz consigo uma vasta proteção a saúde do trabalhador.

Sobre a Convenção n. 148 da OIT tem-se como foco o meio ambiente do traba-lho (contaminação do ar, ruído e vibrações) e responsabiliza o Estado na elaboração da legislação nacional sobre medidas de pre-venção, os empregadores pela aplicação das medidas definidas e os empregados pela ob-servância das normas, apresentação de pro-postas, recebimento de informações, e orien-tação. Quanto à Convenção n. 155 o tema abordado é segurança, saúde dos trabalhado-res e meio ambiente, estabelecendo a com-petência do Estado na elaboração e execução de políticas nacionais de saúde, segurança e

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aprofundar a temática para melhor conhecer e analisar elementos concretos que eviden-ciem a(s) forma(s) como estes direitos são socialmente percebidos e efetivados.

meio ambiente do trabalho, instituindo um sistema de inspeção, para controle e aplica-ção da legislação, com reexame periódico das leis e políticas adotadas; aos empregados foi assegurado o direito de deixar o local de tra-balho, sem aplicação de sanção, sempre que houver motivo razoável que traga perigo gra-ve para a vida ou saúde; e aos empregadores, estes devem zelar pela eliminação de riscos e fornecer vestimentas e equipamentos de proteção, além de prover os estabelecimen-tos de meios para situações de urgência e aci-dentes. Por último, a Convenção n. 161 trata de serviços de saúde do trabalho que designa um serviço investido de funções essencial-mente preventivas, destinado a aconselhar o empregador, o empregado e seus represen-tantes sobre requisitos que são necessários à manutenção de um ambiente de trabalho seguro e salubre; ademais, determina que os trabalhadores devem ser informados dos ris-cos para a saúde inerente ao seu trabalho.

4. Considerações Finais

Embora haja um sistema jurídico do-tado de avançadas normas de proteção ao meio ambiente e a saúde do trabalhador, o Brasil necessita de uma transformação na mentalidade política e nos próprios valores de sua sociedade para que se tenha eficiência na prevenção e eliminação dos riscos à saúde do trabalhador. É imprescindível que se as-suma uma conscientização por um compro-misso de adaptação do trabalho ao homem, fazendo com que este não seja objeto daquele.

Enquanto a prevenção não atingir os almejados fins, será preciso utilizar-se do ins-tituto da responsabilização com o objetivo de compensar as vítimas acidentárias pelos da-nos sofridos, servindo também como medida punitiva, preventiva e pedagógica (MELO, 2009). Não se pode afirmar ainda que o reco-nhecimento dos direitos seja um progresso, pois para sua existência efetiva é necessário que a sociedade consinta e respeite as nor-mas já conquistadas. Daí a necessidade de se

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1. Introdução

As vivências das guerras mundiais no século XX levaram os países ocidentais a estabelecer uma nova ordem jurídica, em que o foco era a universalização dos direitos fun-damentais e a efetivação em todo o mundo do ideal Iluminista da igualdade. De lá para cá, acentuam-se os debates em torno, por exemplo, da garantia de direitos especiais às minorias e grupos sociais em situação de vul-nerabilidade.

Ao mesmo tempo e paradoxalmen-te, também pode se verificar no século XX e início do XXI o fortalecimento das discussões a respeito da fundamentação de modelos ju-rídicos que permitam tratamentos diferen-ciados a determinados grupos e categorias sociais não para minimizar as razões ligadas à sua possível condição de vulnerabilidade ou carência. Pelo contrário, o debate instala-se na tentativa de privá-los de direitos e ga-rantias mínimas em relação ao “cidadão de bem”. O Ocidente passou a conviver com o crescimento de, por exemplo, políticas crimi-nais com fortes traços autoritários, persecu-tórios e totalitários, ao atuar de forma menos garantista sob grupos considerados “inimi-gos do Estado” (ZAFFARONI, 2007).

As perspectivas teóricas ligadas à idéia do Direito Penal do Inimigo, defendidas no último século principalmente por Jakobs (JAKOBS; MELIÁ, 2008) enquadram-se em tal cenário. Buscam, contraditoriamente, en-contrar legitimidade dentro de uma mesma racionalidade que afirma o ideal de univer-salização da igualdade e de universalização

da categoria genérica “sujeito de direito”, constituído pela sua diferenciação. A pers-pectiva defendida por Jakobs ganhou força, especialmente com os acontecimentos de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos, em razão das medidas adotadas contra os nome-ados terroristas, os novos inimigos do Es-tado. No contexto da América Latina, o uso cada vez mais acentuado dos mecanismos do sistema penal cautelar revela-se uma das formas mais importantes de manifestação do Direito Penal do Inimigo e de atuação de ex-ceção do Estado, mesmo nos marcos formais de um Estado Democrático.

Nesse contexto, o presente texto tem como objetivo analisar o perfil social da população carcerária do Estado de São Pau-lo, com apoio no censo penitenciário do ano 2008, à luz das discussões formuladas por Agambem (2002; 2004) e Zaffaroni (2007) sobre as características do inimigo e de Es-tado de Exceção no Direito Penal brasileiro. Por meio de tal análise, pretende-se identifi-car os espaços dentro dos territórios dos atu-ais Estados em que o direito e as garantias fundamentais aparecem suspenso em razão da configuração atual do poder punitivo do Estado. Em outros termos, busca-se ilustrar a forma atual como o poder punitivo do esta-do brasileiro tem atuado recentemente como permanência da exceção. E isso de forma mascarada por toda uma estrutura teórica fundada fantasiosamente no “Estado Demo-crático de Direito”. Este último contém em seu território campos demarcados em que o direito e a condição política do sujeito sus-pendem-se. É o espaço de permanência do horror.

AOS INIMIGOS, A EXCEÇÃO: UMA ANÁLISE SOBRE AS CARACTERÍSTICAS SOCIAIS DA POPULAÇÃO PENITENCIÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULOAna Carolina Marconato¹ Fabiana Cristina Severi²

¹Bacharelada em Direito pelas Faculdades COC²Profª. Dra. do curso de Direito das Faculdades COC.

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2. O Direito Penal brasileiro como para-digma de um direito penal de exceção

A maior parte dos Estados contempo-râneos declararam, especialmente após o fim dos conflitos da Segunda Guerra Mundial, o Estado Democrático de Direito como mode-lo de fato em suas constituições políticas. O caminho, a partir daí, foi a criação e forma-lização legal de uma enormidade de direitos que deveriam ser considerados por todos os países democráticos como sendo fundamen-tais e universais.

Todavia, ficou claro para muitos te-óricos (AGAMBEM, 2004), particularmente após os ataques nos EUA em 11 de setembro que, desde o surgimento dos Estados nazis-tas e fascistas que claramente promulgaram normas consideradas de caráter excepcional porque feriam frontalmente direitos univer-sais, a exceção em termos de criminalização seletiva tem sido a regra.

Nota-se que, apesar do horror que traz a discussão sobre os campos de concen-tração do regime nazista, convive-se hoje com a existência da prisão de Guantánamo, mantida pelos Estados Unidos, país que se consagra democrático, ou mesmo no Bra-sil, pode-se observar, como afirma Carvalho (2007), tal sentido das leis, eis que policiais chegam nas grandes favelas atirando con-tra as pessoas, sendo que nestes locais não existem inocentes, pelo simples fato de suas existências, mostrando que a vida humana é descartável e que os princípios existentes nas Constituições de nada servem atualmente. Assim, convive-se hoje com a possibilidade da “barbárie civilizada”, com um terrorismo de Estado que não respeita as normas pos-tas. Por meio de argumentos favoráveis à manutenção da ordem pública e contenção da criminalidade, quaisquer medidas podem ser tomadas, deixando as pessoas sem prote-ção, em especial os que pertencem às classes marginalizadas.

Nessa situação, pode-se observar que as garantias trazidas pelo Direito Penal não são efetivamente aplicadas, contrariando o Estado democrático de Direito, que se encon-tra em crise devido aos efeitos negativos da globalização econômica, afetando de forma direta os direitos fundamentais. Os níveis de poder social e econômico dos atores do cená-rio econômico são absurdos, controlando o poder Estatal, deixando sem proteção os que necessitam de ajuda (SARLET, 2005).

Agamben (2004) mostra as carac-terísticas dessa forma de política, que vem cada vez mais sendo encontrada em Estados que se intitulam de Direito, tornando-se um problema mundial. Ele sugere que o estado de exceção não mais deve ser compreendido como uma situação extraordinária evocada num momento de emergência, e sim, cada vez mais, como uma técnica de governo que, por ser aplicada normalmente à administra-ção da vida, se elevara ao patamar de para-digma de governo nos atuais regimes demo-cráticos.

Segundo Agamben (2004) o Estado de exceção que existe dentro dos Estados democráticos de direito são formas de dita-duras constitucionais. Existe uma normati-zação, um direito legitimamente posto, mas que, em determinado caso e em certa situa-ção, será suspenso, como se não existisse, e quem está no poder é que vai tomar essa de-cisão. Conforme o autor, a exceção seria uma espécie de exclusão; um caso singular, que é excluído da norma geral.

Assim, não se pode falar, basea-dos nas perspectivas de Jakobs (JAKOBS; MELIÀ, 2008), de um modelo de Estado de exceção destinado a certos indivíduos consi-derados perigosos, mas sim em uma exceção permanente dentro de um Estado democráti-co de direito, que não conseguiu nem mesmo efetivar suas garantias. Há uma situação de abandono e descaso com os direitos funda-mentais, em que a violência sempre foi colo-

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acabar se abandonando o vivente do direito, por isso o termo vita nua usado por Agamben (2004).

Desta forma, Carvalho (2007) através das postulações de Agamben aduz que o ho-mem na atualidade tornou-se semelhante ao homo sacer, encontrando-se privado do que seria uma forma de governo autoritária, o que lhe afasta tanto do ideal de lei positiva quando dos direitos humanos. O homem vê-se, então, diante da terrível diáspora de sua vida matável e sacrificável. Com isso, mesmo perante a inserção dos direitos humanos nas constituições dos Estados de Direito há sem-pre uma exceção, de forma que perante qual-quer perigo, alega-se a necessidade, podendo facilmente desperdiçar uma vida humana. Para Agamben (2004, p. 41): “A teoria da necessidade não é aqui outra coisa que uma teoria da exceção em virtude da qual um caso particular escapa à obrigação da observância da lei”.

Atualmente a vida política se mos-tra pela da cultura do individualismo, da reificação do indivíduo, onde medidas ex-cepcionais de violência e autoritarismo são tomadas sob os argumentos de desenvolvi-mento e proteção. De acordo com Carvalho (2007, p. 14): “No mundo contemporâneo, porém, a biopolítica se caracteriza essencial-mente como cultura do genocídio e do exter-mínio”. Demais disso, referido autor coloca que os objetos do poder do soberano, que são a igualdade e a dignidade, são usurpa-dos pelo individualismo exacerbado, através da expansão mundial, com formas cada vez mais abusivas de poder, justificadas através da expansão de mercado e de um discurso de garantir a superioridade, através de racismo étnico, cultural, religioso, global. Exemplo de tais afirmações é trazido por Agamben (2004, p. 14), onde informa que a military order promulgada pelo Presidente dos EUA em 13/11/2001 traz claramente um modelo em que ocorre a suspensão de direitos de um vivente, um verdadeiro Estado de exceção, com relação aos não-cidadãos americanos

cada pelas agências do sistema penal como a melhor solução para os conflitos sociais, exterminando os excluídos.

Agamben (2004, p.11) afirma que a situação excepcional é cada vez mais utiliza-da nos governos atuais e que “a implicação da vida nua na esfera política constitui o vín-culo originário – ainda que encoberto – do poder do soberano”.

Em Roma o homo sacer (homo sacro) era o individuo que cometia um delito e não era possível retirar sua vida diante disso. Po-rém, caso alguém lhe matasse não cometeria um homicídio. Sua vida não era importante. Para Agamben (2002) a vida do homo sacer é a vida sacra, seria a vida insacrificável e tam-bém matável. Segundo Carvalho (2007) ele encontrava-se fora da jurisdição dos homens e também não encontrava respaldo na legis-lação divina. Será acobertada sua vida nua no interior da ordem jurídica, sem nenhuma pro-teção, de forma a lhe excluir, sendo que qual-quer pessoa e o soberano podem matá-lo.

Agamben (2004) cita como principal referencia na afirmação de um Estado de exceção como paradigma de governo o au-tor Carl Schmitt. Para este, o soberano seria quem decide sobre o Estado de exceção. Para os que estão sob o poder do soberano, a vida se encontra nua e quem está no poder vai de-cidir sobre o que deve ser feito com as pes-soas, se serão excluídas ou não da sociedade em que vivem.

Nota-se que em determinados casos a lei ou os princípios jurídicos não serão apli-cados, mesmo existentes não vão amparar certos indivíduos, diante de um ordenamen-to jurídico, este estará suspenso por determi-nação de quem está no poder. Para Agamben (2004, p. 12) quando ocorre o Estado de ex-ceção há uma crise política, onde “medidas excepcionais encontram-se na situação pa-radoxal de medidas jurídicas que não podem ser compreendidas no plano do direito, e o Estado de exceção se encontra como forma legal daquilo que não é legal”. Através de uma suspensão, no Estado de exceção, vai

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suspeitos de atividades terroristas. A ordem do presidente George Bush anula todo esta-tuto jurídico de um individuo, produzindo um ser inominável e inclassificável. São ape-nas detainees, a eles não serão aplicadas leis e nem mesmo um controle do judiciário.

A vida política atual remete seu desenvolvimento na figura de um verdadei-ro Império, existe uma nova ordem jurídica planetária, através de um poder superior que governa o mundo (CARVALHO, 2007). A figura do Império corresponde a um poder sem fronteiras e sem limites nenhum. Além disso, para alcançar tal Império há sempre uma luta. Para Negri e Hardt apud Carvalho (2007, p. 14-15)

O Império não só administra um território com sua população, mas também cria o próprio mundo que ele habita. Não apenas regula as interações humanas como procu-ra reger diretamente a natureza humana. O objeto do seu governo é a vida social como um todo, e as-sim o Império se apresenta como forma paradigmática de biopoder. Finalmente, apesar de a prática do Império banhar-se continuamen-te em sangue, o conceito de Impé-rio é sempre dedicado à paz – uma paz perpétua e universal fora da história.

O biopoder mundial pretende, mais do que por “fim a história”, reger a vida hu-mana, através de suas indicações e pela visão das classes que estão no poder do que seja viável a alcançar a dignidade. Assim, usa de mecanismos e formas de legitimação que le-vam a um “amplo e assombroso processo de vitimação de abundantes contingentes popu-lacionais e de degradação da dignidade hu-mana” (CARVALHO, 2007, p. 15).

Essa nova ordem aparenta-se como desumana e excludente, o que importa é so-mente as relações sociais relativas ao mer-cado, as pessoas se encontram vulneráveis perante esta agressiva situação, sendo que as

agências tornam-se cada vez menos proteti-vas, caracterizando um verdadeiro retorno ao estado de natureza. Diante disso, tem-se a repressão como forma de controle as pes-soas, tentando recompor as relações sociais extremamente degradadas. Para Carvalho (2007, p. 16): “são os fracassos da política e da democracia como alternativa à violência que determinam o uso da força e da repressão como mecanismo de gestão dos conflitos”.

Por meio das exigências de regulação e segurança, bem como de um maior contro-le, cada vez mais latentes em face das classes sociais afastadas da aquisição de bens e con-sumo, tem-se um Estado de exceção como forma política dos Estados constitucionais. O subdesenvolvimento viria a ser uma forma de exceção permanente do sistema capitalista na sua periferia. Através da idéia de Império, atualmente deve-se procurar a manutenção da ordem, baseando-se na excepcionalidade do que é urgente.

O Estado deixa de regular, como lhe cabe, as relações sociais, com o capitalismo, o mercado é quem define. Observa-se aí um processo de desinstituição que leva a elimi-nação das relações sociais, bem como a vio-lência, criando uma situação de anomia. Isso porque há uma crescente marginalização econômica de certas classes sociais, diante da revolução tecnológica que vem eliminan-do postos de trabalho. Além disso, há a des-truição das próprias instituições com o novo modelo jurídico político, que busca o romper as fronteiras através do capital e com as re-des de comunicação.

Por certo a sociedade pós-moderna não encontrou uma ordem necessária, para se embasar na sociedade moderna, esta mar-cada pela reafirmação do Estado-nação e pela pureza de seus indivíduos, que chega-ram a casos extremos como o nazismo. Hoje o que se tem é uma sociedade voltada exclu-sivamente ao mercado e os que não podem participar deste novo modo de vida, movido somente pelo consumo, são excluídos. Tais pessoas, encaradas a partir da nova perspec-

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dispensável no sistema capitalista, deixando trabalhadores sem trabalho. Se há permis-são para que certas camadas da população não tenham importância, pois não são úteis para o consumo, para o senso comum da hegemonia, concede-se que estes sejam ex-terminados. Comparato (2008), em relação ao capitalismo e os direitos humanos coloca que neste sistema há uma atribuição de valor muito superior aos bens de capital do que as pessoas. Leciona Carvalho (2007, p. 21) que

A justificação moral da “barbá-rie civilizada” torna-se a pedra de toque para a pacificação das consciências. O argumento é tan-to simples quanto perverso: quem não é sujeito moral não é humano; quem não é humano carece de direitos; suprimir a quem não é humano e carece de direitos está moralmente justificado e se faz necessário se com isso se restitui a ordem social e o próprio regime de direitos.

Assim, pode-se identificar caracte-rísticas de um Direito Penal do Inimigo, com suas justificações filosóficas, em que aqueles que não servem para o convívio em socieda-de devem ser eliminados. Diversas vidas são sacrificadas para manter a ordem dentro de Estados democráticos que vivem sob o si-mulacro de um regime de direitos, o homo sacer vive com a violência institucionalizada (CARVALHO, 2007). Com a exceção perma-nente e a atuação das agências policiais, os desnecessários a população são eliminados, mesmo porque já não podem mais ser encar-cerados como a maioria, devido a crescente decadência desta medida.

Nesse sentido, para Agamben (2004) há uma exclusão-inclusão, a política existe porque o homem separa e opõe a si a vida nua e, ao mesmo tempo, se mantém em relação com ela numa exclusão inclusiva. Os presídios, reservatórios de inimicus, de hos-tis, é a representação dos campos de concen-tração contemporâneos. A permanência, na

tiva do mercado consumidor são redundan-tes, são objetos fora do lugar.

Existe, conforme Carvalho (2007), uma decomposição do espaço público, dian-te da desregulamentação, deslegalização, desconstituição e de um direito de exceção, tornando as respostas buscadas privadas e aleatórias. Têm-se apenas duas exigências: que sejam concedidas liberdades para ne-gociações sempre maiores, reduzindo desta forma a intervenção coletiva em negócios privados, e uma exigência de contenção das conseqüências da última. È necessário uma afirmação de um discurso de “lei e ordem”, como afirma Zaffaroni (2007), para cuidar das consequências sociais ocasionadas pelo sistema capitalista. A sociabilidade centra-da no trabalho não pôde resistir, e a vitória ideológica do capital transformou-se numa guerra de todos contra todos.

Diante disso, nos Estados contempo-râneos a biopolítica se converteu em “Tânato política”, eis que não há mais uma proteção da vida humana, é a vida nua trazida por Agamben (2004). Existe cada vez mais uma forma repressiva de controle sobre as vidas das pessoas, correspondendo a um Estado de Exceção, demonstrando que retirar uma vida é apenas uma decisão política. Por conseqü-ência, há um processo de vitimização, com a retirada de direitos caracterizando uma vida política discriminatória. Existem, de um lado, os sujeitos que vivem com dignidade inques-tionável e de outro, os que se encontram com os direitos suspensos e degradados por cor-responderem a seres perigosos para a visão dominante da sociedade. A biopolítica, na visão de Agamben (2002), seria o momento em que a vida entra na história, isto é, torna-se objeto e objetivo das técnicas políticas de controle do saber e passa a ser concebida como domínio de valor e utilidade.

Encontra-se aberta a possibilida-de de uma nova “barbárie civilizada”, como ocorreu nos campos de concentração ale-mães. O ser humano é cada vez mais indi-vidualista, a massa trabalhadora tornou-se

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América Latina do horror inaugurado nos Estados modernos pelos fascismos do sécu-lo XX. É o espaço da eliminação dos corpos, da vida matável sem sacrifício, sem procedi-mento, sem regras, na suspensão do Direito.

3. Poder seletivo, Estado de Exceção e o Direito Penal do Inimigo.

Historicamente, o poder punitivo do Estado sempre atuou de forma a selecio-nar um número determinado de pessoas, so-bre as quais exercerá todo o processo de cri-minalização. Muitas vezes, destes indivíduos, retira-se o caráter de ser humano, tratando-os apenas como entes perigosos. Estes não merecem a aplicação das garantias constitu-cionais de um Estado de direito. Tais pessoas são tratadas como os inimigos da sociedade. O tratamento diferenciado é observado tanto doutrinariamente quanto legalmente (ZA-FFARONI, 2007).

Zaffaroni (2007) considera que se criou nas últimas décadas em todo o Ociden-te um novo discurso de autoritarismo cool no Direito Penal. Usado como propaganda, de-fende o que está na moda, o que é cool, não há uma convicção profunda, apenas adere ao que se diz para não ser estigmatizado ou visto como antiquado, perdendo espaço na publi-cidade. O discurso autoritário cool carece de embasamento acadêmico. Trata-se de sim-ples propaganda, como se o poder punitivo fosse uma mercadoria. Os que vão difundir este discurso único são formadores de opi-nião, não possuem dados empíricos. Muitas vezes o utilizam para manipular as opiniões das vítimas ou de seus parentes, para reali-zarem uma campanha de “lei e ordem”, com objetivo de vingança. Segundo Gomes (2009) o discurso de lei e ordem trazido pela mídia expõe a violência como um produto de mer-cado. Através desta manipulação, vão influir nas condutas dos políticos e abalar os pilares da democracia.

O autoritarismo é difundido no mundo, através desse discurso populares-

co (volkish). Torna-se mais fácil alcançar as pessoas, que pelo baixo grau de cultura ade-rem ao que lhe são postos. A polarização da riqueza tornou a classe média anômica e a fez reclamar por normas sem motivos. Existem leis que se escondem atrás de um discurso autoritário simplificado e popular, prove-niente do modelo norte-americano, que ser-ve na verdade como controle para a classe que lhe reafirma.

Assim o poder legislativo aceita o discurso, elaborando normais penais mais rígidas, eis que segundo Carvalho (2007, p. 34): “leis penais são baratas, de propaganda fácil e a opinião pública se engana com su-ficiente freqüência sobre sua eficácia”. Neste sentido, afirma Gomes (2009) que o Direito Penal serve como instrumento para soluções de problemas, porém é certo que seu uso re-corrente não soluciona os conflitos, sendo que para tal autor isso reflete o simbolismo do direito penal.

A essência do tratamento diferen-ciado de certos indivíduos está na negação de ser considerado como pessoa, mas como entes perigosos. Existe uma diferença entre os cidadãos (pessoas) e os não cidadãos (ini-migos) conforme expõe Martín (2007). Esta aceitação confronta o Estado de direito. Não será levado em conta se a “não pessoa” con-siderada perigosa possui certos direitos, mas se algum deles lhe é privado por sua condição de ente perigoso.

Na América Latina, o poder puniti-vo é exercido através de medidas de conten-ção provisórias. A liberdade é privada antes de uma sentença definitiva, por uma medida preventiva, apenas por presunção de pericu-losidade de um individuo. Em relação diver-sa ao que ocorre com o discurso norte ameri-cano nos Estados Unidos, nos países latinos, o sistema penal pretende controlar os exclu-ídos, como os desempregados, enquanto os policiais controlam o poder político, sendo estes independentes e corrompidos (ZAFFA-RONI, 2007). Nesta região, o discurso cool é inserido em uma sociedade onde há a inver-

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nunca será suprimida, apenas reduzida. Com isso, a parte penal tornou-se o campo mais afetado pelo Estado de policia, já que é o lado mais vulnerável de um Estado de direito. Se uma legislação faz mais concessões ao poder punitivo, a seletividade arbitrária também será expandida pelas agências de criminali-zação secundárias e menor será o exercício do controle jurídico nestes casos.

A seletividade se desenvolve por meio da criminalização primária e secundá-ria. A primeira é elaborada pelas agências po-líticas, corresponde ao ato de elaborar uma lei penal que incrimine um fato, e a conseqüente punição de certas pessoas. Já a criminaliza-ção secundária será executado por meio de outras agências em relação àquelas em que a lei foi elaborada. Corresponde à ação exer-cida sobre pessoas em concreto. Inicia-se nessa etapa o desencadeamento de uma série de atos, que poderão chegar até a imposição de pena a um indivíduo, restringindo-se sua liberdade. Serão responsáveis durante todo o procedimento as agências policiais, judiciais, e por fim a agência penitenciária (ZAFFARO-NI; PIERANGELI, 2008).

A criminalização primária é exten-sa. Os conflitos criminalizados que existem em uma sociedade são demasiadamente mais altos que aqueles que chegam ao co-nhecimento das agências. Os números reais são nomeados como cifras ocultas (BARAT-TA, 2002). As agências que vão exercer a cri-minalização secundária são deficientes e por isso o sistema penal leva até o final da crimi-nalização secundária uma pequena parte da que foi prevista primariamente.

De acordo com Baratta (2002), na criminalização primária há uma expressão do sistema de valores nas leis. Dá-se prefe-rência a cultura burguesa e individualista, protegendo o patrimônio privado e se diri-gindo às maneiras de desvios que são típicos de grupos sociais mais baixos. Isto pode ser observado no elevado número de delitos con-tra o patrimônio, conforme estatísticas judi-ciárias.

são do sistema penal. Existem prisões lota-das de pessoas sem condenação e o direito à execução penal é quase impossível, tendo em vista que é aplicado a um número reduzido de detentos.

Cerca de três quartos dos presos da América Latina encontram-se neste confi-namento cautelar. A seletividade é praticada através do processo de criminalização secun-dária, onde existe um tratamento diferencia-do. Através de confinamentos de contenção, prolongados ou indefinidos, todos são consi-derados inimigos. O instrumento do direito penal liberal é o direito processual, o qual vai legitimar os confinamentos cautelares, es-gotando assim a maior parte do exercício do poder punitivo. Nessa esteira, afirma Batista sobre o sistema latino-americano (2003, p. 54)

O sistema penal está estruturalmen-te montado para que não opere a legalidade processual e para exercer seu poder com o máximo de arbitrariedade seletiva dirigida aos setores vulneráveis. Na América Latina, a própria lei se ocupa de renunciar à legalidade concedendo ampla margem de arbitrarieda-de as suas agências.

Assim, existe na América Latina um desdobramento do sistema penal em sistema penal cautelar e sistema penal de condena-ção, sendo que o primeiro tornou-se mais importante que o segundo, eis que corres-ponde ao maior número de criminalização, produto de infrações de pouca gravidade. Através de um direito penal autoritário, reco-nhecendo ou não sua natureza penal, nega-se a vigência do principio da inocência, previsto nas Constituições. O sistema penal cautelar, como forma predominante no exercício do poder punitivo implica em um grave defeito, pois leva as agências executivas, em especial a policial, a defenderem sua arbitrariedade (ZAFFARONI, 2007).

Zaffaroni (2007) explica que o poder punitivo contém a elevada seletividade como uma característica estrutural, sendo assim

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Verifica-se que a criminalização pri-mária atua com certa seleção, porém de certo modo distante, já que não é possível identifi-car a quem serão aplicados de fato os precei-tos legais. Todavia, devido aos seus defeitos estruturais, sua pouca capacidade de opera-cionalização, as agências de criminalização secundárias agem de forma manifestamente selecionante. Com isso, definem quem são as pessoas criminalizadas, bem como as vítimas que merecem proteção. Com a pouca capaci-dade de atuação, resta a tais agências a inati-vidade ou a seleção, escolhendo por esta últi-ma, já que não é admissível a extinção destas em um Estado. O poder de seleção é exerci-do de forma latente pelas agências policiais como ensina Batista e Zaffaroni (2007).

È de se ressaltar que a seleção pelas agências policiais é feita em conjunto com o poder de outras agências, como as políticas e de comunicação. Nesta última, os empresá-rios morais vão orientar a empresa crimina-lizante, tanto as agências políticas na sanção de uma lei penal nova, quanto na seleção das agencias secundárias. Ensina Batista (2003, p. 56) que “os meios de comunicação de mas-sa, principalmente a televisão, são hoje fun-damentais para o exercício de todo sistema penal [...]”.

Na criminalização secundária, se-gundo Baratta (2002), ocorre a acentuação da seletividade do sistema penal. Os precon-ceitos e estereótipos guiam as ações dos ór-gãos investigadores e jurídicos, que levam a procurar a criminalidade nos estratos sociais onde esta é esperada. Ensina Shecaira (2004, p. 352) que os operadores jurídicos, princi-palmente o magistrado pertence a um “mun-do diferente ao do processado”. Desta forma, indivíduos de classes marginalizadas são co-locados de forma desfavoráveis no processo. Assim, tem-se a impunidade como regra e a criminalização secundária como exceção. Neste sentido, Vasconcellos (2007) entende que uma sociedade dividida preserva os va-lores que melhor atendem aos anseios dos detentores do poder.

Cria-se através da seleção dos atos mais grosseiros cometidos por pessoas sem acesso à comunicação social, estereótipos perante a coletividade. Assim, são determi-nados os inimigos da sociedade, através de pessoas sem valor, aos quais são imputados todos os problemas existentes na coletivi-dade. A imagem do delinqüente é formada através de sua classe social, etnia, idade e es-tética, através do preconceito que é gerado. Segundo Batista e Zaffaroni (2007, p. 46) “o estereótipo acaba sendo o principal critério seletivo da criminalização secundária”. Dian-te de tal fato vai se encontrar uma população carcerária relacionada a valores estéticos. As escolas biológicas criminológicas traziam como motivo para um crime o que na verda-de trata-se de causa para a criminalização.

A seletividade operacional das agências secundárias e sua orientação buro-crática vai atingir apenas os que têm baixa defesa perante o poder punitivo, os que são mais vulneráveis a criminalização secundá-ria. De acordo com Carvalho (2007, p. 35): “o perfil da população carcerária termina de corroborar os altos graus de seletividade e as características precisas dos segmentos vulne-ráveis”. Noutro giro, podemos afirmar ainda, segundo Batista (2003), que a etiquetagem assume o papel do estereótipo, sendo que as pessoas selecionadas acabam por assumir os papéis que lhes são destinados.

O modo seletivo como operam as agências secundárias busca sempre um falso inimigo (BATISTA; ZAFFARONI, 2007), de acordo com a classe social, etnia, religião etc. É mais fácil identificar um inimigo fingindo resolver os problemas reclamados pela co-letividade, através dos discursos midiáticos, viabilizando a atuação das agências, sem grandes esforços. O sistema penal não atua de forma harmônica, mas sim de modo di-vidido, onde cada agência vai possuir inte-resses próprios. Leciona Shecaira (2004, p. 349) que tais agências “atuam como agências independentes, quando não inimigas”.

Dependendo da sociedade em foco

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afirma que se tratam de dados fidedignos da atual realidade carcerária de São Paulo.

Inicialmente cumpre ressaltar que a primeira parte dos dados é fornecida pela Secretaria de Justiça. A população do Estado corresponde a 41.585,931 milhões de pes-soas. Neste relatório existem dados sobre a população carcerária fornecidos tanto pela Secretaria de Justiça quanto pelos Estabele-cimentos penais.

Primeiramente observamos os da-dos referentes à quantidade de presos na po-lícia, cerca de 13.351 mil homens e mulheres. Por certo se trata de uma quantidade consi-derável, confirmando a posição dos penalis-tas, em especial Batista e Zaffaroni (2007), quanto à arbitrariedade das agências poli-ciais em privar a liberdade de pessoas sele-cionadas, as quais estão distantes do devido processo legal.

Em segundo lugar nos dados da ca-tegoria de população, fornecidos pela Secre-taria de Justiça, encontram-se a quantidade de presos existentes nos estabelecimentos penais, sendo cerca de 145.096 mil pessoas. A maioria cumpre pena em regime fechado (80.654 mil), secundariamente estão os pre-sos provisórios, grande problema da América Latina, como já exposto, com cerca de 43.862 mil homens e mulheres. Neste item não hou-ve a separação entre os valores referentes a homens e mulheres. Um pequeno número de homens (18.290 mil) e de mulheres (1.091 mil) cumprem pena em regime semi-aberto (19.381 mil no total). As medidas de seguran-ça de internação e tratamento ambulatorial também possuem números ínfimos, sendo 934 homens e 82 mulheres internados e, 65 homens e 118 mulheres em tratamento am-bulatorial.

Diante destas informações, um pon-to que merece atento é a latente disparidade entre a diferença do número de homens e mulheres encarcerados. A quantidade de ho-mens que estão detidos é infinitamente maior do que mulheres. Com isso, relacionando-se com a teoria estudada, podemos afirmar que

a seletividade possui medidas diferentes. Será mais latente em uma sociedade estrati-ficada, com grande disparidade social, onde as agências atuaram de forma mais violenta. Entretanto, em outras sociedades, onde não há o problema da polarização da riqueza, sua seletividade se dará pelos preconceitos ra-ciais e pela imigração (Shecaira, 2008). Para Baratta (2002) o sistema penal mantém a es-trutura vertical da sociedade, criando contra-estímulos à integração dos setores mais bai-xos e marginalizados da população, ou ainda, põe em ação mecanismos marginalizadores.

4. Breve análise do Relatório de Infor-mações sobre a população do Sistema Penitenciário do Estado de São Paulo.

Os novos campos de concentração nos Estados contemporâneos não se revelam facilmente enquanto tal. É preciso desnudá-los, identificar os espaços dentro dos territó-rios dos atuais Estados em que o direito está suspenso e a vida é considerada cindida da sua condição política, é vida nua. Por isso, importante se faz, a partir dos dados quan-titativos oferecidos pelas próprias agências estatais, evidenciar o horror.

Nesse sentido, após os dados teó-ricos levantados neste trabalho, pretende-se fazer uma breve análise da situação carcerá-ria atual, com ênfase no perfil das pessoas que se encontram presas, e sua relação na existência dos possíveis inimigos no direito penal. Foi escolhido o relatório referente ao ano de 2008, do Estado de São Paulo, encon-trado no site do Departamento Penitenciário Nacional, tendo em vista que se trata do lo-cal onde podemos observar a realidade, além de seu notável desenvolvimento econômico frente aos outros estados do Brasil. Ademais, trata-se do Estado com maior quantidade populacional em nosso país.

Observa-se que não se sabe quais os métodos e precisões utilizados para colher os números constantes no relatório. Porém, o site pertencente ao Ministério da Justiça

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a exclusão social que sofre um inimigo da so-ciedade, seja pela sua presunção de periculo-sidade, seja por seu status no atual desenvol-vimento desenfreado do capitalismo, é maior no caso dos homens, que geram mais insegu-rança a sociedade, eis que correspondem ao estereótipo do delinquente que não merece as garantias penais e processuais. Nesta es-teira, outro apontamento que pode ser feito se relaciona com o crescimento industrial e a sobra da mão de obra dos trabalhadores, que através de seu encarceramento desocupam os grandes centros urbanos, deixando um bom cenário para a classe hegemônica que se encontra no poder, fingindo existir um Esta-do democrático de direito.

Sobre a situação da mulher encar-cerada, em 2007 a Centro Pela Justiça e pelo Direito Internacional (CEJIL) e pelas enti-dades que constituem o Grupo de Estudos e Trabalho Mulheres Encarceradas finalizaram o Relatório sobre as mulheres encarceradas no Brasil, realizando um levantamento a res-peito dos números, do perfil e das condições gerais da mulher encarcerada, em termos de garantias ou não direitos (civis, políticos, sociais, econômicos e culturais). Nesse rela-tório, em síntese, o que se constatou foi que a situação das de violação dos direitos nas unidades prisionais femininas no Brasil são iguais aos homens. Tanto nas masculinas, quanto nas femininas, são vários os direitos violados, reproduzindo o mesmo desamparo experimentado pelos homens presos.

Todavia, essa realidade que ultra-passa as condições inadequadas de habitabi-lidade e salubridade e a recorrência de tortura e maus tratos no cotidiano do cumprimento de penas, soma-se e se agravada por conta das recorrentes violações de gênero prati-cadas contra as mulheres. Apesar de terem recebido sentenças de restrição de liberdade, o que se verifica na prática é que há uma ex-tensão de privações nas unidades prisionais femininas que se caracterizam violações aos direitos humanos das mulheres presas. As mulheres não são privadas só de seu direi-

to à liberdade, são privadas de seu direito à intimidade, à privacidade, à saúde, inclusive sexual e reprodutiva; à segurança pessoal. As situações específicas que afetam as mulheres em particular são potencializadas nos cárce-res para as mulheres em situação de maior vulnerabilidade como grávidas, doentes, idosas, pessoas com deficiência mental, indí-genas, vítimas de violência sexual e estran-geiras. Existe uma completa ausência de po-líticas penitenciárias específicas para mulher presa.

Um indicador objetivo disso é a não elaboração e publicização, de dados consis-tentes e suficientes para conhecer quantita-tivamente os problemas das mulheres. As informações pontuais que se tem acesso não recebem o tratamento qualitativo da perspec-tiva de gênero, nem descriminação nas aná-lises quantitativas. Como conseqüência são raras as políticas públicas com perspectiva de gênero, que incluam ou considerem a com-preensão sobre o problema com sensibilidade para as peculiaridades da situação da mulher encarcerada. De acordo com o relatório,

Para além das violações (...) referi-das, as mulheres encarceradas são objeto de violações geradas pela discriminação de gênero, e pela negligência do Estado quanto à identificação e atenção às suas ne-cessidades específicas. A Conven-ção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Con-tra a Mulher (Convenção de Belém do Pará) como instrumento inter-nacional específico de proteção é, da mesma forma, severamente violada. A mulher detida no siste-ma prisional brasileiro, nas con-dições descritas a seguir, sofre violações decorrentes das carac-terísticas inerentes à qualidade de pessoa do sexo feminino, quais se-jam violência física, sexual e sofri-mento psicológico” (2007, p. 57).

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de 31 cadeias públicas masculinas, o que não é permitido. Por fim, é de se ressaltar o pe-queno número de hospitais de custódia e tra-tamento psiquiátrico, sendo 03 masculinos e 01 feminino. Sendo assim, muitas pessoas que necessitam de um tratamento diferen-ciado por problemas mentais, inclusive os viciados em tóxicos, não recebem adequado tratamento, sendo encarceradas como as de-mais.

Prosseguindo a análise do relató-rio encontram-se os dados relativos ao gasto mensal com o Sistema Penitenciário, cor-respondendo a R$ 2.285.071.326 bilhões de reais. Neste item verificamos que se tratam de valores excessivos, que muitas vezes po-deriam ser investidos em outras áreas, como na educação e projetos sociais, prevenindo que pessoas com baixa instrução e recursos econômicos cometam delitos. Não existe uma separação entre os gastos com os esta-belecimentos femininos e masculinos, onde provavelmente a maior parte é fornecida aos detentos, deixando as mulheres em abando-no, afinal estas não representam nada para a atual sociedade.

Na segunda parte do relatório os dados são fornecidos pelos estabelecimentos penais, onde alguns deixaram de responder determinadas informações. Encontram-se cadastrados 143 estabelecimentos. O primei-ro dado fornecido corresponde a quantidade de presos internados, que possui mínima di-ferença com os dados fornecidos pela Secre-taria de Justiça, dispensando nova análise. Secundariamente existem os números relati-vos a quantidade de presos provenientes da Justiça Federal, que consideramos sem rele-vância para esta pesquisa.

A segunda categoria respondida pelos estabelecimentos relaciona-se com o perfil do preso. Primeiramente observamos os dados relativos a quantidade de presos por grau de instrução. Analisando os núme-ros fornecidos vê-se que a gritante maioria, tanto de homens (57.092 mil) como de mu-lheres (2.654 mil), estudaram apenas até o

Prosseguindo-se na análise, obser-vamos que o número de vagas existentes nos estabelecimentos penitenciários, cerca de 96.540, é bem menor do que o número de detentos (145.096), demonstrando o proble-ma do sistema carcerário que não atinge sua intenção de ressocialização, apenas deixam as pessoas que lá se encontram em precária situação de subsistência, convivendo com di-versos tipos de violência, retirando a digni-dade daquele que cometeu um delito, a qual é garantida a todas as pessoas conforme a Carta Magna brasileira.

Em seqüência, são fornecidos os da-dos referentes ao número de estabelecimen-tos penais. Existem apenas 84 penitenciárias masculinas e 10 femininas, mostrando certo descaso com as mulheres que são ignoradas pelo Estado, como colocado acima.

Retomando o número de estabe-lecimentos penais, observamos que existe um número ínfimo de colônias agrícolas, industriais ou similares, correspondendo a 12 masculinas e 01 feminina. Por certo isto se mostra como um defeito, eis que nestes estabelecimentos são cumpridas as penas que possibilitam o regime semi-aberto. Na maioria das vezes os presos chegam nestes estabelecimentos através da progressão de regime, benefício importante para a resso-cialização dos detentos e são impedidos pela falta de vagas. Cumpre analisar também que no regime semi-aberto são dadas mais possi-bilidades aos detentos, estes podem estudar e trabalhar fora do estabelecimento, sendo uma medida adequada, devendo o Estado aumentar o número de colônias agrícolas ou industriais.

Em seguida cabe verificar que não existem casas de albergados, destinadas ao cumprimento de pena cujo regime seja o aberto. Isto configura outro problema em nosso sistema penal, eis que o próprio Có-digo Penal Brasileiro prevê a existência de tal estabelecimento. Contudo, o Estado abre um espaço de exceção, não cumprindo o que orienta a lei. Posteriormente, existem cerca

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ensino fundamental incompleto. Em seguida encontram-se os que cursaram até o ensino fundamental completo: 20.290 mil homens e 1.215 mil mulheres. Por certo na realidade sócio-econômica em que vivemos o grau de instrução das pessoas depende da classe so-cial a que pertencem, eis que se fazem parte de famílias com poucos recursos, terminam por deixar os estudos para trabalhar.

Segundo Baratta (2002) a seletivi-dade começa na escola. Isto ocasiona mui-tas vezes em fatores que auxiliam a pessoa cometer um delito, como no caso de parcas condições econômicas de sustentar a si e a sua família. Demais disso, existe a questão da vulnerabilidade de certas pessoas, que são selecionadas pelas agências do sistema penal, sendo vistas com preconceito. Com certeza as pessoas com baixa instrução se tornam vulneráveis, eis que não possuem conhecimentos de seus direitos, tornando-se um fácil alvo de arbitrariedades.

Em seguida, existe a quantidade de presos conforme a nacionalidade, outro pon-to que não parece oportuno analisar com base na teoria levantada. Observa-se apenas que a grande maioria se trata de brasileiro nato (134.063 mil). O dado posterior relaciona-se com a quantidade de presos por tempo total das penas. A maioria das mulheres cumpre pena de 04 anos. Por outro lado os homens em sua maioria cumprem pena de 04 a 08 anos, dado que se relaciona com a quantida-de de detentos cumprindo pena em regime fechado.

O próximo dado fornecido que se mostra importante para o presente trabalho, ainda na categoria de perfil do preso, refere-se com o número de detentos por crimes con-sumados e tentados. Ressalta-se que alguns estabelecimentos não forneceram tais dados. Referente a quantidade de homens presos, que são considerados mais importantes a este trabalho por serem vistos como os estereóti-pos dos inimigos da sociedade, dos 135.725 mil presos no total, 93.954 mil se encontram detidos pela prática de crimes contra o patri-

mônio, principalmente por furto e roubo. Ve-rificamos nestes dados novamente a questão da seletividade de certas pessoas frente ao sistema penal. Na atual situação do mundo, em que o controle sobre a vida dos homens é feito pelas relações econômicas, não existem empregos e oportunidades de uma vida dig-na para todos. Tal fato se relaciona com um verdadeiro abismo econômico existente en-tre as classes sociais, onde algumas têm mui-to e outras nada, levando, por conseguinte, a ocorrência dos crimes contra o patrimônio. A classe hegemônica acha que resolverá os problemas escondendo nas prisões aqueles considerados inúteis, os que não fazem parte do mercado de trabalho, não são consumi-dores, tornando-se vidas desnecessárias ao atual sistema capitalista.

Continuando a análise, ainda sobre o perfil do preso, encontram-se os números totais de delitos tentados e consumados, que não se entende importante a essa pesquisa. Na sequência estão os números de presos pri-mários e reincidentes. Aqui cumpre ressaltar que no caso dos homens a maioria detida se tratam de reincidentes (39.906 mil), confir-mando a falha no sistema penitenciário atu-al, que apenas degrada um ser humano, sem possibilidade de ressocialização e reeduca-ção, impossibilitando que exista outro cami-nho a não ser o da criminalidade. Além disso, o fato de ter sido encarcerado acaba geran-do um preconceito contra aquele ind ividuo, continuado a ser visto como um inimigo da sociedade e esta, por sua vez, fecha as portas para que o condenado se ressocialize, como ensina Shecaira. Já no caso das mulheres a maioria correspondente a 2.480 mil se trata de presas não reincidentes.

Prosseguindo, observam-se os da-dos relativos à quantidade de presos por fai-xa etária. No caso dos homens (40.479 mil) e também das mulheres (3.334 mil) são jovens, possuem entre 18 a 24 anos e 25 a 29 anos. Verifica-se que se tratam de pessoas que não tiveram chances de acesso ao mercado de trabalho, pois como já exposto possuem uma

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tivamente a grande quantidade de pessoas presas, que não são fornecidos tratamentos ambulatoriais adequados, assim como fal-tam leitos para gestantes no caso das mu-lheres, apenas 81, em locais onde há gran-de incidência de contaminações e violência contra os que lá se encontram. Mais uma vez ressalta-se o descaso do Estado, que tem o dever de propiciar condições para que todos vivam com dignidade, desrespeitando o que determina nossa Constituição, configurando novamente uma exceção.

Os próximos indicadores, relativos a quantidade de fugas, de abandono, reinclu-sões, presos envolvidos em motins e rebeli-ões, quantidade de óbitos, procedimentos disciplinares iniciados e concluídos não se mostram relevantes neste trabalho, de acor-do com a teoria levantada e o que se pretende confirmar com esta sincrética análise.

Por fim, na categoria capacidade de ocupação, observamos o número de va-gas existentes nos estabelecimentos penais, sendo certo que a capacidade existente para os presos no cárcere é bem menor do que o número real de presos. Fato considerado importante a esta pesquisa é o número de vagas disponíveis para presos provisórios, correspondente a 16. 715 mil no total. Ocorre que em todo o Estado de São Paulo existem cerca de 42.168 mil presos provisórios. Isto confirma o grave problema das prisões cau-telares na América Latina, exposto por Za-ffaroni (2007), sendo que além de superlotar as prisões, há um desrespeito ao princípio da inocência, também previsto na Constituição Federal.

Diante disso, podemos notar, mes-mo de forma superficial, a existência de um inimigo no sistema penal brasileiro e em decorrência a abertura de exceções, mesmo estando em um Estado de direito. Observa-se a presença de características comuns a quase toda população carcerária, o que vem a confirmar a seletividade sofrida por algu-mas pessoas, conforme sua cor, sexo, grau de instrução etc. Além disso, ressalta-se o pro-

instrução baixa. Por certo tais pessoas dificil-mente chegaram a uma idade mais avançada, tendo em vista a elevada taxa de mortalidade entre elas.

A informação seguinte correspon-de a quantidade de presos por cor de pele/etnia. A maioria dos homens e mulheres são negros e pardos, sendo 68.134 mil e 3.198 mil respectivamente. Isto demonstra a exis-tência ainda de um preconceito contra estas pessoas, mantido ao longo dos séculos no di-reito penal. Devido a todo processo históri-co, onde os negros sofreram atrocidades por sua cor de pele, vemos que ainda permanece a discriminação de tais pessoas e a sua pre-sunção de periculosidade, sendo inimigos em potenciais, mesmo não se encontrando em situação delituosa, as autoridades policiais sempre os colocam como suspeitos, sendo um público permanente para as arbitrarie-dades dessas agências.

Mudando a categoria para o Trata-mento Prisional, ainda com o preenchimento pelo estabelecimento penal, encontram-se a quantidade de presos que trabalham fora dos estabelecimentos (8.307 mil homens e 458 mulheres) e no interior deste (29.934 homens e 2.240 mulheres). Podemos obser-var que os números são baixos, se relativos a toda população carcerária. É certo que o tra-balho serve como uma medida de ressociali-zação, além do benefício da remição. Sendo assim, o sistema penitenciário de São Paulo não está apto a promover uma melhoria na vida do detento, para que volte ao convívio da sociedade, deixando os encarcerados em precárias situações e sem uma ocupação. Ressalta-se que a maioria, correspondente a 14.657 homens e 1.172 mulheres, trabalham ajudando no sistema penal, o que impossi-bilita a aprendizagem de uma profissão para quando deixarem o cárcere e procurarem uma vaga no mercado de trabalho.

Na quantidade de leitos, 598 mas-culinos e 22 femininos, verificamos o precá-rio atendimento prestado aos encarcerados. Caso adoeçam vemos por estes dados, rela-

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blema do cárcere em nossa sociedade, que se mostra cada vez mais uma medida precária para a reeducação de quem praticou um deli-to, atentando gravemente contra a dignidade das pessoas.

5. Conclusão

No Brasil mesmo sob a égide de um direito penal pertencente ao Estado demo-crático de direito, podemos ver que direitos e garantias não são cumpridos, tornando com que a exceção se torne a regra. O filosofo ita-liano Giorgio Agamben foi quem explicou a situação de exceção dentro dos Estados atu-ais, intitulados como democráticos de direi-to, com maior precisão, alarmando para a gravidade que isto pode ocasionar. Na exce-ção existe uma regra, uma lei, que em deter-minado caso não é aplicada. Assim, no Brasil podemos observar tal situação constante-mente, com a ação arbitraria das agências do sistema penal, bem como em leis penais que confrontam princípios constitucionais. Nes-te diapasão, a existência de um direito penal do inimigo, em situações excepcionais, é algo que no Brasil não pode existir, porque, em regra, nos deparamos com um verdadeiro di-reito penal que trata de forma desigual deter-minadas pessoas, os inimigos. Diante disso, a possibilidade da barbárie torna-se possível, como já assistimos por diversas vezes, tor-nando-se a vida humana sem valor perante o que determina o Estado e os detentores do poder, se trata de uma vida nua.

Analisando um relatório do censo penitenciário de São Paulo, pode-se confir-mar, mesmo com dados obtidos sem muita precisão, que a população carcerária confir-ma os estereótipos escolhidos pela coletivida-de. A maioria se trata de homens, com pouca idade, baixa escolaridade e lá se encontram devido à prática de crimes contra o patrimô-nio. Outro elevado número corresponde aos presos provisórios, pela simples presunção de periculosidade, como afirma Zaffaroni (2007). Isso mostra que a situação brasilei-

ra confirma a exclusão causada pelo abismo entre as classes sociais, advindo do sistema capitalismo. A marginalização que sofrem os pobres, na maioria das vezes privados de quaisquer direitos e garantias, termina por incentivar que certos indivíduos sejam mais aptos a pratica de delitos, bem como são sele-cionados pelas agências policiais mais facil-mente devido a sua vulnerabilidade.

No Direito Penal atual, construí-do ao longo dos anos por meio de batalhas travadas com o autoritarismo do Estado e a supressão de garantias, analisa-se que ain-da não se pode afirmar a existência de um modelo ideal de um Direito Penal do Estado democrático de direito. Pela incapacidade do Estado de resolver seus conflitos, pelo des-comprometimento dos juristas, pela atuação da mídia ou do poder legislativo nas elabora-ções das leis penais, vê-se que o poder puniti-vo só consegue se efetivar em relação àqueles advindos das classes marginalizadas, os quais são tratados de forma arbitrária, já que nem mesmo conhecem os direitos que possuem. Por certo os crimes praticados pelas classes sociais mais elevadas, como crimes econômi-cos e tributários, poucas vezes são incrimina-dos, sendo que causam muitas vezes ofensas de maior grau à bens fundamentais do que os pequenos delitos contra o patrimônio.

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1. Introdução

O mundo vive uma diversa aborda-gem sobre imigrantes, em especial na Euro-pa, onde a xenofobia e os processos migrató-rios são intensificados devido às promessas de qualidade de vida e oportunidades de tra-balho. Tal processo xenófobo se agrava a par-tir do momento em que os países europeus entram em crise econômica e os cidadãos passam a disputar oportunidades de empre-go com os estrangeiros.

A comunicação passa, em meio à cri-se, a discutir temas relacionados ao desem-prego na Europa, com indícios de xenofobia. Em diversas matérias, de distintos periódicos europeus, a questão crise se misturou com a imigração, o que provocou uma contextuali-zação na mensagem que nos levou a crer que o discurso destes poderia ser analisado como preconceituoso e xenófobo. A opção desta pesquisa foi o desenvolvimento de uma aná-lise do discurso para confirmar as impressões com relação às mensagens noticiosas produ-zidas pela imprensa européia.

Escolhemos, então, o jornal El País como objeto de estudo, por ser o principal periódico de um país que recebe um expres-sivo número de imigrantes latino-america-nos. Para o desenvolvimento desta pesquisa, definimos como recorte um período da cole-ta do material para análise, com os jornais

publicados entre 19 de abril e 17 de maio de 2009 na editoria internacional. Inicialmente, realizamos uma pesquisa bibliográfica sobre o jornalismo internacional e o El País. Foram adotados os conceitos dos estruturalistas Teun van Dijk (2002) e Patrick Charaudeau (2003).

O artigo justifica-se por ser um tema atual e relevante, pois as discussões sobre crise e xenofobia estão relacionadas com os países considerados ricos e os que sobrevi-vem deste eixo econômico. Ao mesmo tempo, a mídia tem adotado o assunto como pauta principal, o que torna a discussão ainda mais importante. Também foram discutidos du-rante o artigo conceitos sobre jornalismo in-ternacional, o que serviu para contextualizar e dar embasamento sobre a temática.

2. A Comunicação Internacional

De acordo com Traquina (2005, p.20), o jornalismo é uma forma de respon-der às perguntas que as pessoas se fazem dia-riamente, “o que aconteceu?”, “como foi?”, “onde foi?”, “quem foi?”, “o que está aconte-cendo no mundo?”, ou seja, o chamado lide.

Basta um olhar distraído aos di-versos produtos jornalísticos para confirmar que é uma atividade criativa, plenamente demonstra-

A CONSTRUÇÃO DA FIGURA DO IMIGRANTE LATINO-AMERICANO PELO JORNAL EL PAÍS EM TEMPOS DE CRISEMichel Montefeltro¹ Laís Santos de Paula² Denis Porto Renó³

¹Jornalista, graduado pela UNICOC, Ribeirão Preto. Prepara-se para cursar pós-graduação Lato Sensu sobre Jornalismo Internacional. Atua como webjornalista. E-mail: [email protected]²Jornalista, graduada pela UNICOC, Ribeirão Preto. Estudou seis meses na Universidad Rey Juan Carlos, como complemento de sua formação. Atuou como jornalista na EPTV de Ribeirão Preto. E-mail: [email protected]³Jornalista, doutor em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (Brasil), onde investiga so-bre comunicação e novas tecnologias, em especial mobilidade e Internet. Foi orientador desta pesquisa, desenvol-vida pelos alunos como trabalho de conclusão de curso. É professor visitante da Universidade Técnica Particular de Loja (Loja, Equador), onde orienta estudos sobre a mesma temática. E-mail: [email protected]

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da, de forma periódica, pela in-venção de novas palavras e pela criação do mundo em notícias, embora seja uma criatividade res-tringida pela tirania do tempo, dos formatos e das hierarquias supe-riores, possivelmente do próprio dono da empresa (TRAQUINA, 2005, p.22).

Em uma breve passagem pelos jornais diários, segundo o autor, pode-se ver a vida dividida em seções que vão da sociedade, à economia, à ciência e ao ambiente, à educa-ção, à cultura, à arte, aos livros e à televisão, que cobre o planeta com a divisão do mundo em regional, nacional e internacional. “Um exame da maioria dos livros e manuais sobre jornalismo define as notícias em última análi-se como tudo o que é importante” (Traquina, 2005, p.19). Para o autor, existe hierarquia que pode definir a importância entre nacio-nal e internacional. Por isso, se faz importan-te abordar o que é o jornalismo internacional e como ele surgiu.

Segundo o Oxford English Dictionary 4, foi na década de 1920 que as pessoas come-çaram a pensar e a falar sobre mídia. Uma geração depois, na década de 1950, a popula-ção do mundo passou a mencionar uma “re-volução na comunicação”. No entanto, para Briggs & Burke (2004, p.13), o interesse pela comunicação é muito mais antigo. A retórica, estudo da arte de se comunicar oralmente e por escrito era valorizada na Grécia e Roma antigas.

Porém, o surgimento do que hoje é conhecido como imprensa aconteceu, de acordo com os autores (2004, p.25), no sécu-lo XV, com a invenção de uma das máquinas mais importantes para a comunicação até hoje. A prensa gráfica foi construída na déca-da de 1450 por Johann Gutenberg.

A prática da impressão gráfica se espalhou pela Europa (...), Por

volta de 1.500, haviam sido insta-ladas máquinas de impressão em mais de 250 lugares na Europa – 80 na Itália, 52 na Alemanha e 43 na França. As prensas chegaram à Basiléia em 1466, a Roma em 1467, a Paris e Pilsen em 1486, à Veneza em 1469, a Valência, Cra-cóvia e Buda em 1473 e a Praga em 1477. Todas essas gráficas produ-ziam cerca de 27 mil edições até o ano de 1500, o que significa que – estimando-se uma média de 500 cópias por edição – cerca de 13 mi-lhões de livros estavam circulando na Europa com cem milhões de habitantes (BRIGGS & BRUKE, 2004, p.26).

O surgimento dos jornais no século XVII aumentou os rumores e a ansiedade so-bre os efeitos da nova tecnologia. Ainda de acordo com Briggs & Burke (2004, p. 29), com a invenção da prensa gráfica, ou tipo-grafia, houve um problema. No começo deste período a dificuldade era a escassez de livros e de informação. Já no século, XVI, o que aconteceu foi o oposto. Segundo os autores, “alguns escritores queixavam-se de que ha-via tantos livros que as pessoas não teriam tempo para ler os títulos”. Para Briggs & Burke, a invenção da prensa gráfica mudou a estrutura ocupacional das cidades.

Uma das conseqüências mais im-portantes da invenção da prensa gráfica foi o envolvimento intenso dos negociantes no processo de difundir o conhecimento. Para vender mais livros, e lucrar mais, os editores publicavam catálogos e se envolviam com outras formas de publicidade. Somente na Grã-Bretanha estima-se que 15 milhões de jornais tenham sido vendidos no ano de 1792. E o jornal diário, semanal ou bissemanal era complementado por publicações mensais ou trimestrais, que foram chamadas, posterior-mente, de periódicos ou revistas.

4 Disponível em http://www.oed.com/about/. Acessado em 05/10/2009. O Oxford English Dictionary (OED) é um dicionário publicado pela Oxford University Press e é considerado um dos mais conceituados da língua inglesa.

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mandavam para Augsburgo informações so-bre a cotação de determinadas mercadorias nas feiras, do câmbio e ainda dos conflitos existentes nas mais diferentes regiões e que podia prejudicar a economia e os negócios. As notícias eram transmitidas dentro das próprias casas bancárias.

De acordo com o autor, na época do mercantilismo6 houve uma ascensão do jor-nalismo internacional. Folhas com notícias de economia e política de toda a Europa eram impressas e vendidas a quem quisesse comprar e não mais circulavam dentro de um mesmo aglomerado comercial e finan-ceiro, como acontecia com a casa de Függer. As informações impressas passaram a ser compradas por grupos indistintos de pessoas que mais tarde seriam chamadas de agentes econômicos.

Pode-se falar quase que de uma epidemia de publicações pareci-das que floresceu sobre a Euro-pa na primeira metade do século XVII. Entre 1610 e 1645, esses jornais baseados em informações econômicas e políticas estrangei-ras já circulavam a Suíça, Áustria, Hungria, Inglaterra e França (NA-TALI, 2004, p. 23)

Na segunda metade do século XIX, de 1861 até 1865, a Guerra Civil Americana foi acompanhada por 150 correspondentes de guerra. Os jornais e revistas já estruturados como empresas procuravam obter mais in-formações com menor custo. A idéia, então, foi a de constituir um local, onde um mesmo repórter ou uma equipe de repórteres pu-dessem produzir material para mais de um órgão de imprensa. Surge então a agência de notícias.

De acordo com Natali (2004, p. 31),

Anos mais tarde, no final do século XIX, começo do XX, as pessoas assistiram a uma revolução nas tecnologias de comuni-cação e informação. O que levou a formação dos meios de comunicação como instituições privadas de alcance global, tanto para o jor-nalismo quanto para o entretenimento – cul-tura e diversão. Por causa disso, os meios de comunicação foram se aperfeiçoando cada vez mais para se adaptarem ao mundo que estava se modernizando. Em 1980, por exemplo, a rede de televisão CNN5, que hoje é uma das referências em jornalismo inter-nacional começou as transmissões de rede. O fato que a fez ganhar notoriedade foi a cober-tura da guerra do golfo, em janeiro de 1991.

3. Jornalismo Internacional

Segundo Natali (2004, p.19), jornalis-tas de todo o mundo dizem que o jornalismo internacional nasceu em Londres, no século, no século XIX, quando os periódicos impres-sos ampliavam a área geográfica de interesse e de cobertura em razão da expansão do im-pério colonial britânico. Levando as notícias sobre Londres a outras partes da Inglaterra. Mas de acordo com o autor (2004, p.19), esse viés do jornalismo nasceu muito antes disso.

Ainda segundo Natali (2004, p. 20), Jacob Függer, um dos banqueiros mais im-portantes da época (séculos XV e XVI) na Europa, morava na cidade de Augsburgo, na Alemanha. O banco dele controlava as jazi-das de cobre da Hungria e possuía reservas de 4,7 floris, o equivalente a 13 toneladas de ouro. Com tamanha fortuna, ele financiou a campanha de Carlos V para tornar-se impe-rador na época do Império Cristão do Oci-dente. Függer tinha negócios com várias par-tes da Europa, e para se manter informado do que acontecia em cada lugar, os agentes dele

5Disponível em http://dn.sapo.pt/inicio/interior.aspx?content_id=601301. Acessado em 25/11/2009. O site é do jornal português “Diário de Notícias”. A matéria fala sobre o lançamento de um livro que traz a história rede de TV CNN. Durante a reportagem o jornalista Miguel Gaspar faz um breve histórico sobre a CNN.6Disponível em http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=746. Acessado em 06/10/2009. Pode-se dizer que o mercantilismo é um conjunto de práticas adotadas pelo Estado absolutista na época moderna, com a finalidade de obter poder e riqueza. A concepção predominante parte do simples fato de que a riqueza da nação é determinada pela quantidade de ouro e prata que ela [a nação] possui.

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4. Agências de NotíciasUma forma comum entre os meios de

comunicação que noticiam os acontecimen-tos internacionais, e que não conseguem ter uma equipe jornalística no local dos fatos, é comprar a informação de uma agência de notícias.

De acordo com a UNESCO7 (Organi-zação das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), as agências de notícias ou da informação são uma empresa que tem principalmente por objeto, qualquer que seja a sua forma jurídica, obter notícias e docu-mentação de atualidades, que sirvam para exprimir ou representar os fatos, distribuin-do-os a um conjunto de empresas da infor-mação, e excepcionalmente, as particulares, mediante o pagamento de determinada im-portância, de acordo com as leis e usos co-merciais, sempre à base de um serviço o mais completo e imparcial possível.

As agências de notícias surgiram no século XIX. Período este, em que houve vá-rios progressos técnicos e científicos na área da impressão, como a invenção da máquina rotativa, do linotipo e do telégrafo.

O surgimento das agências noticiosas data exatamente do período citado acima ca-racterizado pela transformação da imprensa de opinião em imprensa informativa, mais acessível e generalista. Favorecidas com o progresso tecnológico da comunicação, so-bretudo a invenção do telégrafo, que tornou possível a partir da primeira metade do sécu-lo XIX, a transmissão rápida e a distância de informações. As agências passaram assim a encontrar o seu lugar no campo da mídia.

No nascimento desta nova ativida-de pode-se citar Charles-Louis Havas. Em 1835, em Paris, arruinado em decorrência da derrota de Napoleão Bonaparte na bata-lha de Waterloo, partindo de uma premissa de que nenhum jornal teria a possibilidades financeiras para manter uma rede de corres-pondentes em todos os locais importantes

em 1865, a agência Reuters, hoje uma das mais respeitadas e conhecidas do mundo, foi quem noticiou primeiro o assassinato do en-tão presidente dos Estados Unidos da Amé-rica, Abraham Lincoln. A notícia vinha por malotes transportados em navio. Mas como a situação política em Washington estava tensa, a própria agência interceptou a cor-respondência do correio, que ainda percorria o litoral da Irlanda, de onde foi transmitida a Londres por um telégrafo.

Para o autor, “as agências deram viabilidade econômica ao noticiário inter-nacional”. Um texto distribuído a centenas de jornais que assinam os serviços de uma agência sai mais barato que um texto produ-zido e enviado por um correspondente. Com as notícias internacionais, a necessidade de que o jornalista falasse cada vez mais línguas se tornava maior. Atualmente, essa questão não é mais de atualidade pela simples razão de que agências de notícias internacionais como a francesa AFP, a alemã DPA e a ita-liana ANSA, não dispõe mais de serviços em português. Elas distribuem os telegramas em espanhol. Segundo Natali (2004, p. 73):

Fluência não significa “entender mais ou menos” ou “quebrar o galho”. É preciso mergulhar a fundo no idioma para captar certas mudanças que não permitirão apenas uma tradução correta, mas também dire-cionarão nossa própria percepção sobre um acontecimento.

Ainda de acordo com Natali (2004, p. 95), o jornalismo internacional tem uma característica que não é exclusiva dele. Boa parte das pautas é previsível. Reuniões do Conselho de Segurança da ONU e as nego-ciações que as precedem, conferências temá-ticas ou regionais, viagens oficiais de gover-nantes ou o jogo de pressões diplomáticas para solucionar algum impasse. Porém, não há previsibilidade quando há acidentes aé-reos, agressões militares contra terroristas, atentados, terremotos e crises.

7 Disponível em: http://arturaraujo.blogspot.com/2008/04/o-que-agncia-hoyler-o-que-so-as-agncias.html. Acessado em 13/11/2009. Artur Araujo é professor mestre em jornalismo e dá aulas na Pontifícia Universi-dade Católica (PUC) de Campinas e possui um blog com os slides das aulas que ministra na universidade.

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nacional com jornais da Itália, França, Ale-manha, Inglaterra e Estados Unidos. Inovou em vários aspectos jornalísticos, o que aju-dou a construir sua imagem de credibilidade e prestígio. Em 1980, foi o primeiro jornal da Espanha a criar um Estatuto da Redação e a figura do ombudsman10.

Fundado no dia 04 de maio de 1976, por José Ortega, Jesús de Polanco e Juan Luis Cebrián, o jornal nasceu num período de transição política do regime ditatorial para a democracia. Seis meses após a morte do general Francisco Franco (1892 – 1975), que liderou o período de ditadura na Espa-nha e presidiu o país por 34 anos. Em sua linha editorial, o El País ressaltava defesa à liberdade e apoio a essa mudança política e social11.

Em 1977, o jornal cria e pública o “Li-vro de Estilo do El País”12. Referência ainda hoje para jornalistas não só espanhóis, mas de diferentes partes do mundo. Apesar de publicado e comercializado, o Grupo PRISA define o livro como um “código interno de re-dação que recorre além das regras formais de expressão, mas cláusulas de conduta essen-ciais sobre como os profissionais do diário devem realizar suas tarefas”13.

Em 1981, no dia 23 de fevereiro, o jornal ganhou credibilidade após ao 23-F, episódio em que um grupo de guardas civis tentou dar um golpe de Estado contra o Par-lamento. Antes mesmo que o Rei Juan Car-los I se pronunciasse na televisão espanhola condenando o golpe, o El Pais publicou uma edição especial do jornal intitulada “El Pais, Con La Constituición”. Foi o primeiro diário que saiu às ruas naquela noite posicionando-

sob o ponto de vista informativo. Ele então transforma o estabelecimento de tradução de correspondência estrangeira, que havia adquirido em 1832, e cria um serviço de di-fusão de informações, conhecida como Agên-cia Havas. Mais tarde a Havas deu origem a uma das agências de notícias internacionais mais importantes do mundo, a France Pres-se (AFP). A partir daí começa a história das agências de notícias internacionais em todo o mundo.

Havas marcou a evolução do campo jornalístico. A fundação da agência dele ins-pirou a criação de outras, dois de seus anti-gos colaboradores, Wolff e Reuter, fundaram a Agência Wolff na Alemanha (1848) e a Agência Reuter na Inglaterra (1851), respec-tivamente. Em 1848, uma cooperativa de seis jornais nova-iorquinos fundava a Associated Press.

5. O jornal El Pais

O El País, propriedade do Grupo PRI-SA8, é o jornal diário de conteúdo geral com maior difusão e influência na Espanha. O jor-nal se define como “um diário independente, de qualidade, vocação européia e defensor da democracia pluralista”9, de acordo com seus primeiros editoriais.

Com sede em Madri, possui hoje oito edições regionais na Espanha. Além de qua-tro edições internacionais, na Alemanha, Bélgica, México e Argentina, onde se publi-ca uma edição global que é distribuída pela América Latina.

Ao longo de sua história, o El País firmou vários acordos de colaboração inter-

8 Disponível em http://www.prisa.com/areas-actividad/elpais/. Acessado em 18/09/2009.9 Idem.10 Disponível em http://www.elpais.com/fotogalerias/popup_aninacion.html?xref=20041011elpepusoc_2&k=breve_historia_pais. Acessado em 18/09/09.11 Disponível em http://www.revistalatinacs.org/09/art/05_804_03_Brasil/Denis_Porto_Reno_e_Ingrid_Gomes.html. Acessado em 18/09/09 12 Disponível em http://www.prisa.com/responsabilidad-social/periodismo-haciendo-escuela/. Acessado em 18/09/09.13 Idem.

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6. Considerações finais

As análises das matérias foram feitas separadamente seguindo o conceito de análi-se de discurso defendido por Morris (2003).

Foram analisadas todas as matérias publicadas na editoria internacional do jor-nal El País por um mês. O El País é o jornal de maior difusão na Espanha e um dos jor-nais mais influentes da Europa. A forma em que este veículo se refere aos países latino-americanos e os assuntos que ele aborda so-bre essa região constroem a imagem da figu-ra dos cidadãos da América Latina, inclusive dos imigrantes.

Ao total foram publicadas 37 matérias que abordavam o tema no período analisa-do. Apenas os discursos do tipo mítico e de propaganda não foram utilizados. Todas pos-suíam o discurso político. Ou seja, todas de alguma forma falavam sobre a política e os líderes de governo da América Latina.

Problemas políticos internos ou ex-ternos no país foram tema de 30 matérias. Crises entre países ou entre governo e oposi-ção foram os temas mais freqüentes aborda-dos pelo jornal.

Muitas vezes este discurso político foi acompanhado pelo discurso crítico. O dis-curso crítico é aquele que agrega valores, po-sitivos ou não, e por isso deve ser usado com muito cuidado pelo jornalismo, que deve aproximar-se da imparcialidade o máximo possível.

O discurso crítico esteve presente em 23 matérias. Enquanto o discurso científico, aquele que busca pesquisas, fontes e dados confiáveis foi utilizado apenas em 20 maté-rias. Ou seja, conclui-se que a opinião do jor-nal, dos autores e dos entrevistados buscados por eles prevaleceu sobre a essência jornalís-tica que visa mostrar simplesmente os fatos

se claramente contra a tentativa de golpe, chamando aos cidadãos a manifestarem-se a favor da democracia. Com a criação do Es-tatuto e a resposta do El Pais em relação ao 23-F, a audiência do jornal aumentou de 843 mil leitores em 1980 para 1,14 milhão de lei-tores em 198114.

Em 1992, o El País foi o primeiro jor-nal espanhol a imprimir exemplares no ex-terior, especificamente na França. No ano seguinte, começa a sua publicação diária no México15. Para conquistar o novo público la-tino, o jornal oferece um novo tratamento aos temas de saúde, educação, ciência e co-municação em páginas especiais que se pu-blicaram ao longo da semana.

Em 2000, o jornal inglês Internatio-nal Herald Tribune encomendou uma pes-quisa feita em 17 países europeus que revelou o El Pais como o nono jornal europeu com maior credibilidade e o quinto em relação à influência exercida nos principais diários do continente16.

Em 2007 o jornal passa pela “maior transformação de sua história”17, apostando em novos temas, mais fotos e gráficos e uma nova diagramação. O jornal coloca o acento no logo e substitui o histórico slogan. “Diario independiente de la mañana”, que o acompa-nhou desde sua fundação por “el periodico global de noticias en español”.

A partir de 2009, o principal objetivo do El País é a integração das redações. Segun-do o grupo PRISA, a integração prevê promo-ver convergência. Para o grupo, a idéia é tor-nar o El País um grande produtor de conteúdo, tanto impresso quanto online. Mas o objetivo de cortar custos se torna óbvio. Mesmo com a crise, nos últimos três anos, o jornal apre-sentou um crescimento de 8%. Atualmente, dirigido por Javier Moreno, o El País possui cerca de 2,2 milhões de leitores.

14 Disponível em http://www.elpais.com/fotogalerias/popup_aninacion.html?xref=20041011elpepusoc_2&k=breve_historia_pais. Acessado em 19/09/09.15 Idem.16 Ibidem.17 Disponível em http://www.prisa.com/areas-actividad/elpais/. Acessado em 20/09/09.

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| A CONSTRUÇÃO DA FIGURA DO IMIGRANTE LATINO-AMERICANO PELO JORNAL EL PAÍS EM TEMPOS DE CRISE |

como aconteceram. Também é possível concluir que o jor-

nal constrói uma imagem de dependência da América Latina em relação aos Estados Uni-dos, principalmente Cuba. Foram publicadas 13 matérias que citavam de alguma forma, sutil ou não, essa relação de dependência. Apenas de Cuba, foram sete matérias. O jor-nal se mostrou muitas vezes claramente con-tra os governos de Cuba e Venezuela, criti-cando Castro e Chávez.

Os governos das nações latino-ame-ricanas foram retratas como esquerdistas e o Brasil como líder na região. Sobre o Brasil houve ainda uma contradição em duas maté-rias. Uma delas publicou que com a doença de Dilma Rousseff começou uma discussão no Partido dos Trabalhadores e no país sobre uma possível reforma na Constituição para permitir o terceiro mandato do presidente Lula. Já a outra, publicada poucos dias de-pois, disse que surgiu um boato e não uma discussão oficial.

Foram abordados também temas como a violência de presos políticos e o nar-cotráfico em diferentes países do continente.

Por esses motivos, conclui-se que a imagem da população latino-americana é construída sutilmente de forma negati-va pelo El País. Abordando apenas temas que mostram as fragilidades do continente, aumenta-se no público espanhol a crença de inferioridade e dependência destes povos em relação às maiores potências mundiais.

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VERÓN, Eliseo. Fragmentos de um tecido. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2005.

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46 | Revista Multidisciplinar de Iniciação Científica

1. Introdução

Produzir texto, seja ele falado ou escrito, verbal ou não verbal é uma tarefa complexa, pois tanto exige conhecimento de mundo, como conhecimentos linguísticos e gramaticais dos falantes. A organização da linguagem escrita e a linguagem falada são diferentes: as pausas, as interrupções, os marcadores são típicos da modalidade da lín-gua falada e decorrem de sua produção, que é simultânea ao planejamento. Já a escrita, por sua vez, por ter a possibilidade de ser plane-jada previamente, de correção dos erros, traz mais frequentemente os padrões da norma culta. Porém, a maioria dos discentes des-conhece as diferenças entre as duas varieda-des e acaba fazendo da escrita uma simples transcrição da fala, o que não é adequado, principalmente quando se leva em conta que a norma padrão não permite que a língua es-crita seja um reflexo da língua falada. Essas diferenças entre a linguagem oral e a escrita podem gerar dificuldade para os alunos, po-dendo até comprometer a construção e/ou compreensão do texto. A presente pesquisa teve como objetivo analisar a eficiência da coerência e coesão no entendimento da men-sagem. A pesquisa consiste num estudo de cunho bibliográfico sobre o assunto, fazendo referências e citações de autores que investi-garam o impacto desses elementos na com-posição textual,dentre os quais, destacamos principalmente Ingedore Grunfeld Villa-ça KOCK, Luiz Carlos TRAVAGLIA (1993, 2002), e Sueli Cristina MARQUESI (2004).

Foi possível concluir que de fato a coesão e coerência são elementos indispensáveis para que a mensagem seja efetivamente compre-endida e o texto corretamente escrito, uma vez que estão relacionados com elementos gramaticais, bem como a conexão entre as sentenças.

Diante da necessidade do homem se comunicar com os outros indivíduos, torna-se primordial que ele se aproprie da lin-guagem oral e escrita para demonstrar sua competência linguística. Contudo, muitas vezes percebe-se a dificuldade de transpor-tar para o papel o que se pretende escrever, principalmente porque na fala podem estar representadas diversidades, sejam de caráter regional ou mesmo por conta do contexto em que se encontra, entretanto, essa praticidade não pode refletir na escrita, ou seja, muitas pessoas costumam escrever da forma como falam e a escrita não aceita tais transcrições de fala.

No papel, a linguagem escrita deve obedecer aos padrões da norma culta, o que exigindo dos alunos a compreensão das es-truturas do texto, incluindo os fatores de coe-são e coerência, elementos importantes para a construção geral do texto, a fim de possibi-litar seu entendimento por parte do leitor.

Nesse sentido, percebe-se então a im-portância da coerência e coesão na formação do texto, na organização das ideias nas frases, como também a ligação por certos elementos, facilitando a retomada de frases já mencio-nadas. Convém enfatizar que nenhum texto é uma peça isolada e que o significado das par-

A IMPORTÂNCIA DOS FATORES DE COESÃO E COERÊNCIA PARA A INTERPRETAÇÃO TEXTUALAdriana Antonia do MonteCristiane Botelho de AssisIrma Alessandra Carvalho Pinto¹

¹Alunas do curso de Licenciatura em Letras Português/Inglês da Faculdade Interativa COC.

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tes é sempre determinado pelo contexto ao qual se encaixa numa dada situação.

Diante da necessidade de investigar sobre até que ponto os fatores de coesão e co-erência podem influenciar na interpretação textual, a presente pesquisa objetivou iden-tificar conceitos relevantes, tais como texto, contexto, coesão e coerência, bem como de que forma esses elementos se articulam para a organização das idéias e entendimento da mensagem.

2. Considerações sobre Texto e Contexto

2.1.Texto

Quando se fala em texto, não se tra-ta apenas em reportar-se às letras impressas em uma página, ou um conjunto de frases. De acordo com Koch (2005), o texto além de proferir um enunciado com contexto especí-fico, também é considerado uma manifesta-ção da linguagem:

Texto é uma manifestação verbal constituída de elementos linguís-ticos selecionados e ordenada pelos co-enunciadores, durante a atividade verbal, de modo a per-mitir-lhes na interação, não ape-nas a depreensão de conteúdos semânticos, em decorrência da ativação de processos e estratégias de ordem cognitiva, como tam-bém a interação (ou atuação) de acordo com práticas sociocultu-rais (KOCH, 2005, p.27).

Nessa perspectiva, entende-se que o texto se configura como um meio de comu-nicação expressa de forma ordenada, pos-sibilitando aos indivíduos a compreensão do conteúdo. Entre os elementos que fazem parte do texto, destacam-se as frases, que dependem diretamente do contexto no qual estão incluídas para emitir mensagens com-preensíveis.

Kaufman e Rodríguez (1995) também apresentam uma definição para o texto:

Produto da atividade verbal hu-mana é uma unidade semântica, de caráter social, que se estrutura mediante um conjunto de regras combinatórias de elementos tex-tuais e oracionais, para manifestar a intenção comunicativa do emis-sor. Tem uma estrutura genérica, uma coesão interna e funciona como uma totalidade. Os compo-nentes linguísticos do texto vincu-lam-se entre si através de distintas estratégias de coesão e de coerên-cia (KAUFMAN; RODRIGUEZ (1995, p.146).

Nesse sentido, entende-se que texto é uma ação entre os indivíduos e a sociedade, o seu funcionamento se dá com a ligação dos elementos de coesão e coerência, para uma melhor compreensão.

Segundo Platão e Savioli (2005) o tex-to é composto por partes que são interdepen-dentes, e para que seja concebido um texto, é preciso que o sentido das frases esteja co-erente e manifestem as diferentes intenções do emissor, tais como informar, entreter, convencer, seduzir, etc.

Para que se ampliem as possibilida-des de o aluno desenvolver sua habilidade de escrita, isto é, para que produza textos a par-tir de seu próprio entendimento e não como repetição de ideias do autor, é preciso que ele compreenda como funciona um texto. Para isso, é imprescindível que ele tenha acesso aos mais diversos gêneros textuais, conhe-çam sua estrutura, finalidade, suporte, o que lhes possibilitará a construção de textos com suas próprias ideias, ou seja, escritores autô-nomos.

2.2 Contexto

Para Rethinking (apud KOCH, 2003,

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Embora muitos elementos interfiram na interpretação de textos por parte dos alu-nos, a presente pesquisa aborda apenas as-pectos relacionados aos fatores de coesão e coerência, os principais podem comprometer ou facilitar o entendimento do texto. Nesse sentido, percebe-se a necessidade apresentar os conceitos desses dois elementos, antes de analisar sua influência na interpretação de textos, a fim de que seja possível ampliar as possibilidades de pesquisas, estudos e rees-truturação de ideias.

3.1 Definição e relação entre coesão e coerência

De acordo com Koch e Travaglia (1993), a coesão é um fator que facilita a re-lação com a coerência, embora não seja um fator indispensável para que exista a coerên-cia. Na verdade, a coesão ajuda a perceber a coerência na compreensão do texto. De acor-do com os autores, “coesão é, então, a ligação entre os elementos superficiais do texto, o modo como eles se relacionam, o modo como as frases ou partes delas se combinam para assegurar um desenvolvimento proposicio-nal” (KOCH; TRAVAGLIA (1993, p.13-14).

Para Halliday e Hansan (apud KOCH; TRAVAGLIA, 1993, p.14) a coesão está relacio-na às relações de significado que existem den-tro do texto, ou seja, é o que faz dele um texto e não uma sequência de frases sem sentido.

De acordo com Beaugrand e Dress-ler (apud KOCH; TRAVAGLIA, 1993, p.16), a coesão é o meio pelo qual os elementos do texto se encontram relacionados entre si.

Com o objetivo de exemplificar como a coesão pode estar presente em um texto, Cabral (2009) menciona um trecho de Jor-dão e Bellezi (2007):

Os sem-terra fizeram um protesto em Brasília contra a política agrá-ria do país, porque consideram in-justa a atual distribuição de terras. Porém o ministro da Agricultura considerou a manifestação um ato

p.21) não existe uma definição única de con-texto, ou seja, não há um conceito padrão definido para determinar o significado de contexto.

Com base em análises no contexto de situações, Hyme (apud KOCH, 2003, p.22) caracteriza contexto como um esquema que contempla elementos diversos, tais como: cenário e/ou lugar, falantes, propósitos e re-sultados, sequência de atos, normas de inte-ração e interpretação e gêneros textuais.

Nessa perspectiva, entende-se que para que um texto seja iniciado, é preciso definir um lugar ou cenário onde os fatos acontecerão, os participantes que dele farão parte - distribuídos em falantes e ouvintes - além do conteúdo ou mensagem que deseja ser emitida, obedecendo a regras e a normas para que seja possível que o ouvinte e/ou lei-tor compreenda. É necessário ainda a defini-ção de finalidades e propósitos.

No entendimento de Platão e Savioli (2005), contexto é definido da seguinte forma:

É a unidade maior em que a uni-dade menor está inserida. Assim, a frase (unidade maior) serve de contexto para a palavra; o texto, para a frase, etc. O contexto pode ser explicito, quando é expresso com palavras, ou implícito, quan-do está embutido na situação em que o texto é produzido (PLATÃO; SAVIOLI, 2005, p.14-15).

Logo, é possível concluir que contexto engloba um conjunto de conhecimentos lin-guísticos que possibilitam uma situação co-municativa. Ele adquire muita importância na Lingüística Textual, que revolucionou a maneira de analisar os textos. Antes, o texto era considerado em si, como algo fechado, atualmente, analisa-se todas as referências extratextuais que possam auxiliar na com-preensão.

3. Fatores de Coesão e Coerência e a Inter-pretação de Textos

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de rebeldia, uma vez que o proje-to de Reforma Agrária pretende assentar milhares de sem-terra (JORDÃO; BELLEZI, 2007 apud CABRAL, 2009, p.1).

De acordo com a autora, os termos destacados têm a função de unir as partes do texto, ou seja, são responsáveis pela coesão textual. Cabral (2009) esclarece que vários recursos estão associados à coesão de textos, entretanto, a autora destaca:

• Palavras de transição – trata-se de palavras que estabelecem a inter-relação en-tre os enunciados, sejam frases, orações ou parágrafos. Podem ser representadas por preposições, conjunções, alguns advérbios e locuções adverbiais e podem indicar uma in-trodução (inicialmente, primeiramente, antes de tudo), uma continuação (além disso, bem como), conclusão (afinal, portanto, enfim), tempo (enquanto isso, ocasionalmente, atu-almente), conformidade (conforme, de acor-do com, igualmente), causa e conseqüência (por isso, daí, assim), ou esclarecimento (isto é, ou seja, quer dizer). Alguns exemplos são mencionados a fim de ilustrar as possibilida-des de coesão textual.

• Coesão por referência – diz respeito às palavras que têm a função de fazer refe-rência.

- pronomes pessoais: eu, tu, ele, me, te, os... - pronomes possessivos: meu, teu, seu, nosso... - pronomes demonstrativos: este, esse, aquele... - pronomes indefinidos: algum, nenhum, todo... - pronomes relativos: que, o qual, onde... - advérbios de lugar: aqui, aí, lá... (CABRAL, 2009, p.2).

• Coesão por substituição – ocorre quando o nome (de pessoa, lugar, objeto, etc), verbos, períodos ou trechos do texto são substituídos por uma palavra ou expres-são que se aproximem no sentido, evitando, assim, a repetição do nome no decorrer do texto. A palavra Brasília, por exemplo, em outros momentos do texto pode ser substitu-

ída pela expressão “capital do Brasil”. Diante da importância dos termos de

coesão para melhor compreensão da mensa-gem, também se torna necessário ressaltar o valor da coerência. Na definição de Franck (apud KOCH; TRAVAGLIA, 1993, p.15) coe-rência significa:

A conexão formal e de conteúdo entre elementos seqüenciais (fra-ses, enunciados, atos de fala etc.) que coloca estes elementos em re-lação uns com os outros e o insere numa forma de organização su-perior como, por exemplo, nomes em uma lista, frases em um texto, atos de fala numa sequencia (dia-lógica) etc.

A coerência trata da continuidade dos sentidos, ou seja, trata-se da “configuração de conceitos e relações subjacentes à super-fície do texto e são mutuamente acessíveis e relevantes” (p.16).

A coerência está intimamente ligada com a boa formação do texto, numa situação comunicativa entre os usuários, fazendo com que o texto faça sentido para os mesmos. Sendo assim, está direcionada à interpreta-bilidade do texto e à capacidade que cada re-ceptor tem de entender e compreender o seu sentido. Porém, faz-se necessário esclarecer que a coerência é vista também como uma continuidade de sentido perceptível no texto, mas essa percepção não está ligada à grama-ticalidade apenas, pois, enquanto a coesão é explicitamente revelada por meio de marcas linguísticas presentes na superfície textual, a coerência é ao mesmo tempo semântica e pragmática e, embora esses dois fatores pre-dominem, ela possui dimensão sintática gra-matical e linguística. Koch; Travaglia (2008) afirmam que:

A coerência está diretamente liga-da a possibilidade de estabelecer um sentido para o texto, ou seja, ela é o que faz com que um tex-to faça sentido para os usuários, devendo, portanto ser entendido

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tivamente para que o texto seja construído com coerência, possibilitando a compreen-são da mensagem e, portanto, garantindo a interpretação segura do texto. Koch e Tra-vaglia (2002) se referem a esses elementos como fatores de coerência, os quais serão tratados a seguir.

3.1.1 Elementos linguísticos

Os elementos linguísticos têm grande importância na determinação da coerência de um texto. Koch e Travaglia (2002) reco-nhecem que as apenas as palavras não são suficientes para garantir o sentido de um texto, mas são importantes elementos para o estabelecimento da coerência. De acordo com os autores:

Esses elementos servem como pistas para a ativação dos conhe-cimentos armazenados na memó-ria, constituem o ponto de partida para a elaboração de inferências, ajudam a captar a orientação ar-gumentativa dos enunciados que compõem o texto, etc. (KOCH; TRAVAGLIA, 2002, p.71).

Percebe-se que os elementos linguís-ticos são importantes em seu significado, bem como na relação que estabelecem entre eles, ou seja, na integração dos recursos que fazem parte do contexto linguístico.

3.1.2 Conhecimento de mundo

Koch e Travaglia (2002) atribuem grande importância ao conhecimento de mundo, citando-o como importante elemen-to favorecedor da interpretação de um texto. De acordo com as autoras, é difícil entender o sentido de um texto se o conteúdo do qual ele trata não for do conhecimento do leitor. “É o que aconteceria a muitos de nós se nos defrontássemos com um tratado de física quântica!” (p.72).

Para Gonçalves e Dias (2003), o co-

como um princípio de interpreta-bilidade, ligada à inteligibilidade do texto numa situação de comu-nicação e a capacidade que o re-ceptor tem para calcular o sentido do texto. Este sentido, evidente-mente, deve ser do todo, pois a coerência é global (p. 21).

Dessa forma, a coerência tem a ver com a formação do texto num sentido de co-municação, interação e interlocução numa si-tuação comunicativa. Ao construir um texto, é preciso que os elementos estejam ligados, estabelecendo uma relação de sentido.

Independente da concepção teórica apresentada, Koch e Travaglia (1993) afir-mam que todos os estudiosos concordam que a coesão e coerência “estão intimamente relacionadas no processo de produção e com-preensão do texto” (p.23).

3.2 A interpretação de textos relacio-nada com a coesão e coerência

Para que um texto seja compreendido pelo leitor, é preciso que ele tenha sido cons-truído de forma coerente. Bernárdez (apud KOCH; TRAVAGLIA, 1993, p.36) cita três importantes etapas para construção de um texto coerente: a primeira diz respeito à in-tenção comunicativa do falante; a segunda se refere ao planejamento que o falante desen-volve para conseguir que seu texto cumpra sua intenção comunicativa, contemplando os fatores situacionais, etc.; a terceira e última fase trata das operações que o falante realiza para expressar-se, possibilitando ao ouvinte a identificação da intenção comunicativa.

Bortone (2008) alerta sobre a neces-sidade de estruturar os textos de acordo com seu gênero. “Um poema, por exemplo, geral-mente vem em versos, dispostos um abaixo do outro, formando estrofes. Uma propa-ganda geralmente vem com gravuras e letras grandes para chamar mais a atenção do leitor etc.” (p.218).

Alguns fatores contribuem significa-

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informação.Para que um texto seja coerente e bem

interpretado, Koch e Travaglia (2002) orien-tam que é preciso equilibrar as informações dadas com as novas. As autoras explicam que se um texto apresenta apenas informação nova, certamente ele se torna incompreensí-vel. Em contrapartida, se ele apresenta ape-nas informação dada, ele se torna redundan-te e não alcança seu propósito comunicativo.

Para ilustrar a importância do co-nhecimento compartilhado, Koch e Trava-glia (2002) apresentam o seguinte exemplo: “Hoje é dia de pagar o carnê”. Neste caso, o “carnê” deve ser de conhecimento comum do produtor e do receptor da mensagem para que a mesma tenha algum sentido, ou seja, o co-nhecimento deve ser compartilhado entre eles.

3.1.4 Inferências

Koch e Travaglia (2002) consideram as inferências um fator importante para a interpretação do texto e destacam que elas estão diretamente ligadas ao conhecimento de mundo. De acordo com os autores, a in-ferência estabelece uma relação implícita no texto, entre dois elementos ou mais.

Exemplo:Ana Maria viajou para Europa sozinha.As inferências possíveis nessa frase são:Ana Maria está de férias.Ana Maria tem dinheiro.Ana Maria é solteira.

Não significa que todas as inferências são necessárias, principalmente porque al-gumas dependem do contexto e da sequência do texto.

Nessa perspectiva, Bortone (2008) destaca a importância de identificar o con-texto em que o texto está inserido, afirman-do que isso ajuda muito na compreensão do mesmo. A autora explica que:

Quando nossos alunos percebem o contexto da leitura, torna-se mais

nhecimento de mundo é muito importante porque:

Favorece o processo de compre-ensão que se realiza por meio da construção do mundo textual, da articulação entre os elementos do texto e do estabelecimento da continuidade de sentido. Assim, o conhecimento de mundo ou sa-ber enciclopédico se constitui em um dos fatores pela construção de sentido e, consequentemente, pela coerência textual (DIAS, GON-ÇALVES, 2003, p.2).

O conhecimento de mundo é amplia-do a partir das experiências vividas pelo in-divíduo, ou seja, quanto mais contato com o mundo ele tiver e quanto mais experiências ele viver, certamente esse conhecimento irá aumentar e refletir positivamente na inter-pretação (e produção) de textos.

Bortone (2008) exemplifica a impor-tância do conhecimento de mundo mencio-nando um pequeno trecho: “Era um típico dia de verão em Salvador” (p.219). De acordo com a autora, essa pequena frase possibilita que vários esquemas mentais de conheci-mento de mundo possam ser utilizados para caracterizar um dia de verão em Salvador. A autora explica:

Podemos entender esse este dia como um dia de muito sol e calor, muitas pessoas na praia, sabore-ando comidas típicas, como aca-rajé e camarão, tomando água de coco, ouvindo música axé, vendo as baianas com traje típico, apre-ciando os trios elétricos, entre ou-tras (BORTONE, 2008, p.219).

3.1.3 Conhecimento Compartilhado

O conhecimento compartilhado se refere ao grau de similaridade do conhe-cimento de mundo que emissor e receptor apresentam, estabelecendo uma relação de integração entre a informação dada e a nova

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sidade de adequação de cada texto à situação comunicativa que se pretende alcançar.

3.1.6 Informatividade

A informatividade está relacionada ao grau de previsão das informações contidas no texto, ou seja, quanto mais previsível ou esperada for a informação nele apresentada, menos informativo ele será e vice-versa. Para Koch e Travaglia (1993), “a informatividade exerce, assim, importante papel na seleção e arranjo de alternativas no texto, podendo facilitar ou dificultar o estabelecimento da coerência” (p.81). Para ilustrar esse conceito, Bortone (2008, p.230) descreve o texto de Parcelo Pacheco:

Arte- Pai, você conhece o Miquelângelo?- Miquelângelo? Conheço. Foi um grande artista. Pintou a capela...- A capela sistina, a casa do papa, as paredes, o teto... pintava bem, NE, pai? Foi o papa quem mandou pintar. Pagava pro Michelangelo e dava ain-da casa, comida e roupa lavada. Vida boa, NE?- E como você sabe disso tudo?- Eu vi num filme. Legal esse negócio de pintar parede, heim, pai?- Hum, hum... legal, muito legal...- Que bom que você acha legal, pai... As paredes eu já pintei..., mas pra pintar o teto eu vou precisar de uma mãozinha sua.

Marcelo Pacheco (Paieê!) – Quinte-to Editorial, São Paulo.

O texto amplia a possibilidade de coerência na medida em que apresenta in-formações sobre Michelangelo, bem como o trabalho artístico que produzia, ou seja, a in-formatividade do referido texto proporciona maior coerência para o leitor.

fácil a compreensão do texto, por-que esses indicadores facilitam a percepção das inferências, uma vez que o contexto situacional em que está inserido o texto faz parte do nosso conhecimento de mundo (BORTONE, 2008, p.225).

A quantidade de informações explí-citas é proporcional ao grau de familiari-dade ou intimidade entre os interlocutores. Para ilustrar esse conceito, Koch e Travaglia (2002) apresentam como exemplo o seguinte diálogo:

– A campainha!– Estou de camisola.– Tudo bem.Percebe-se que não existe necessaria-

mente uma relação entre as três falas. Con-tudo, não é difícil estabelecer uma relação entre elas. O diálogo mencionado, para ser completo, é apresentado pelas autoras da se-guinte forma:

– A campainha está tocando, vá atender.– Não posso, estou de camisola.– Tudo bem, então eu atendo.

É muito comum alguns textos, prin-cipalmente aqueles que se configuram como um diálogo ou que apresentam algum, terem informações omitidas, mas que podem ser facilmente inferidas, dependendo do grau de conhecimento de mundo do leitor, bem como da familiaridade entre emissor e receptor.

3.1.5 Situacionalidade

A situacionalidade, segundo Beau-grande e Dressler (apud KOCH; TRAVA-GLIA, 1993, p.76), “refere-se ao conjunto de elementos que tornam um texto relevante para dada situação de comunicação corrente ou passível de ser reconstituída”.

Dessa forma, na intenção de cons-truir um texto coerente, a situacionalidade é relevante, na medida em que o texto pode ser compreensível e coerente em dada situação e pode não sê-lo em outra, indicando a neces-

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dois textos para ilustrar esse conceito:

Texto original

Meus oito anosCasimiro de Abreu

Ah que saudades que eu tenhoda aurora da minha vidaDa minha infância queridaQue os anos não trazem maisQue amor, que sonho, que floresNaquelas tardes fagueiras,A sombra das bananeiras,Debaixo dos laranjais.Como são belos os diasDo despontar da existência! [...]

Texto Parodiado

Doze AnosChico Buarque

Ai, que saudades que tenhoDos meus doze anosQue saudade ingrataDar banda por aíFazendo grandes planosE chutando lataTrocando figurinhaMatando passarinhoColecionando minhocaJogando muito botãoRodopiando piãoFazendo troca-trocaAi que saudades que tenho [...]

Fonte: BORTONE, 2008, p.267-268.

3.1.8 Intencionalidade

Ao produzir um texto, é preciso de-terminar objetivos ou propósitos para que se estabeleça estratégias de escrita que possibi-litem a compreensão do mesmo. Para Koch e Travaglia (2002), a intencionalidade se refe-

3.1.7 Intertextualidade

Bortone (2008) se refere à intertex-tualidade como o momento em que, quando lemos um texto, percebemos marcas e/ou re-ferências de textos anteriormente lidos.

É possível identificar elementos se-melhantes nos dois textos que podem ser associados pelo leitor em momentos diferen-ciados, ou seja, mesmo que os textos não te-nham sido lidos no mesmo momento é possí-vel identificar a intertextualidade.

Bortone (2008) afirma que a intertex-tualidade pode ocorrer de duas formas: por meio da paráfrase e da paródia. Sobre a pri-meira, a autora afirma que ela pode ser cons-truída com base em um texto inicial, man-tendo as mesmas idéias. “A paráfrase retoma o texto anterior, mas não altera suas ideias, e sim as reitera” (p.266). Exemplo:

Texto OriginalMinha terra tem palmeirasOnde canta o sabiá,As aves que aqui gorjeiamNão gorjeiam como lá.(Gonçalves Dias, “Canção do exílio”).

ParáfraseMeus olhos brasileiros se fecham saudososMinha boca procura a ‘Canção do Exílio’.Como era mesmo a ‘Canção do Exílio’?Eu tão esquecido de minha terra…Ai terra que tem palmeirasOnde canta o sabiá!

(Carlos Drummond de Andrade, “Europa, França e Bahia”). Fonte: INFOESCOLA, 2009, p.1).

Já sobre a Paródia, Bortone (2008) esclarece que nela também há uma retomada das idéias de um texto anterior, mas, ao con-trário da paráfrase, corromper essas idéias. “Rompe-se com a ideologia do texto anterior por meio de recursos como o humor, a crítica e a brincadeira” (p.266). A autora menciona

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re “ao modo como os emissores usam textos para perseguir e realizar suas intenções, pro-duzindo, para tanto, textos adequados à ob-tenção dos efeitos desejados (p.97). Bortone (2008) cita como possibilidades de intenções do produtor do texto: produzir emoções, per-suadir o leitor e passar informações.

Para Gonçalves e Dias (2003), todos esses elementos linguísticos mencionados são importantes e funcionam como meios para ativar o conhecimento de mundo e se referem à relação entre texto e contexto. De acordo com as autoras, esses elementos são imprescindíveis para se alcançar a coerência textual, mas não são os únicos responsáveis pelo significado do texto.

4. Conclusão

Diante dos conceitos aqui apresenta-dos, é possível concluir que os elementos de coesão e coerência são importantes no pro-cesso cooperativo entre escritor e leitor, ou seja, associados a outros elementos linguísti-cos eles contribuem para favorecer a compre-ensão e interpretação de textos. Por um lado, a coesão está associada ao uso adequado de alguns itens de ordem gramatical, enquanto que a coerência se configura como uma ação comunicativa entre emissor e receptor, ou seja, trata-se no sentido que o texto produzi-do tem para o leitor.

Não basta apenas determinar a or-ganização e estética textual para que o texto se torne compreensível. É preciso que suas idéias se fundamentem na construção de um sentido, para que o leitor possa compreender a mensagem, ou seja, faz-se necessário que exista uma harmonia entre as idéias e uma relação entre as sentenças tornando, assim, o texto coerente.

A pesquisa também identificou os prin-cipais fatores de coerência, indispensáveis para a produção e interpretação de textos, uma vez que exercem grande influência nesses procedi-mentos, já que determina a conexão de ideias.

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| A IMPORTÂNCIA DOS FATORES DE COESÃO E COERÊNCIA PARA A INTERPRETAÇÃO TEXTUAL |

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É notável que a educação brasileira encontra-se com dificuldades, dados do IBGE e INEP confirmam essa afirmação ao indicar que muitas crianças ainda estão fora da es-cola, mesmo no ensino fundamental, nível que teoricamente seria obrigatório a todos, e muitos que estão na escola não saem aptos para a convivência nessa nova sociedade que se baseia na leitura e escrita.

Também se observa fatores muito pre-sentes na educação, tais como a evasão e a re-petência, pois muitas crianças entram no sis-tema escolar, mas são obrigados a abandonar o ensino, por diversos motivos, como ter que contribuir para um aumento da renda fami-liar, desencadeando um trabalho precoce, ou por se deparar com um sistema que valoriza somente os costumes, valores e linguagem da classe dominante, fazendo com que os domi-nados, sintam-se excluídos e marginalizados do sistema escolar (SOARES, 2002).

Segundo Soares (2002) na sociedade atual a necessidade da leitura e escrita se faz cada vez mais presente, uma vez que, tudo gira em torno desse mundo letrado, além da grande era tecnológica que sofre constantes mudanças e está alicerçada na escrita, conse-quentemente pessoas que apenas conseguem decifrar o código escrito não conseguem se inserir nessa nova sociedade. Portanto não basta ser apenas alfabetizado, mas sim saber utilizar as práticas de leitura e escrita nas di-versas atividades cotidianas.

A democratização do ensino tem sido defendida desde 1882, por Rui Barbosa, ao analisar a educação e perceber grandes falhas

em seu sistema. Após esse momento e até nos dias atuais a democratização do ensino tem estado nos discursos políticos em busca da igualdade social, porém mesmo com au-mento na oferta de vagas ainda grande par-te da classe popular continua fora da escola ou não permanece nela, mesmo no ensino fundamental, nível obrigatório assegurado Constitucionalmente (SOARES, 2002).

Segundo Soares (2002), as classes populares viveram e vivem até hoje uma luta constante para acesso a escola pública: “Nes-ta luta, porém o povo ainda não é vencedor, continua vencido: não há escola para todos, e a escola que existe é antes contra o povo que para o povo” (SOARES, 2002. p. 9).

Ainda Soares (2002) prova que não há escola para todos ao mostrar dados do censo realizado no ano de 1980, indicando que cerca de 30% de crianças brasileiras de 7 a 14 anos, encontravam-se fora da escola e ao fazer análise dos dados por Estado, é possível notar que em muitos estados metade da po-pulação dessa mesma faixa etária encontra-se fora da escola. E ainda mostra que a escola é antes contra o povo que para o povo, ao evi-denciar que estatisticamente de cada 1000 crianças que iniciam a 1ª série, menos da me-tade chega à 2ª, menos de um terço consegue atingir a 4ª, e menos de um quinto conclui o 1º grau, mostrando assim, as elevadas taxas de evasão e repetência.

Para uma possível transformação do quadro educacional é necessário a mobili-zação e o investimento nos profissionais da educação e na sua formação, é de extrema

ALFABETIZAÇÃO, LETRAMENTO E PRÁTICA DOCENTE¹

Geisa Gabriela FlôresGraziela Dias da SilvaNatália Cubianchi Furtado

¹Este artigo é fruto de pesquisa realizada como Trabalho de Conclusão de Curso, para a Graduação em Pedagogia – Licenciatura, das Faculdades COC, realizado sob orientação da Profa. Dra. Marina Caprio.

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importância prepará-los para utilizar os di-versos métodos existentes, de forma atender todos os alunos, independentemente da clas-se social.

De acordo com Mortatti (2006), a partir de 1980, os métodos deixaram de ser enfatizados e começou uma reflexão a cerca das salas homogeneizadas, surgindo assim, o construtivismo, relacionado com os estudos da psicogênese da língua escrita desenvol-vidos pela autora Argentina Emília Ferreiro dente outros autores. Neste caso o mais im-portante não é mais o método e sim o pro-cesso de aprendizagem dos alunos. O cons-trutivismo surgiu não como um método, mas como uma mudança de conceito. A principal ênfase, para o processo de alfabetização é a não utilização de cartilhas, pois esse mate-rial considera a todos como iguais e para o construtivismo cada criança aprende de uma forma única em um momento único.

Goulart (2000) argumenta que os métodos tradicionais buscam alfabetizar partindo de uma unidade menor, podendo ser um fonema, sílabas e palavras sempre partindo de unidades mais simples até che-gar às mais complexas, sendo assim, o tra-balho de alfabetização de maneira geral não tem sido satisfatório, pois ao utilizar o méto-do tradicional nota-se que ele não torna os alunos letrados e cria uma barreira entre o aluno e o conhecimento, por ser um método que não valoriza o que os alunos trazem de bagagem e não trabalha através da realidade de cada momento.

De acordo com Ferreiro e Teberosky (1983, apud LUIZE, 2008) para a corren-te construtivista um aluno alfabetizado não é aquele que apenas conhece as letras, sabe ler e escrever, o aluno alfabetizado é mais do que isso, é aquele que conhece os diferentes textos, os compreende e tem a capacidade de realizar outros, assim para alfabetizar, o texto deve ser a base e não palavras e sílabas desconexas com a realidade.

Teóricos procuram defender a grande eficiência do método fônico para o desenvol-vimento dos processamentos fonológicos. “Os trabalhos de pesquisa mais rigorosos são unânimes em demonstrar que os métodos de ensino que enfatizam a instrução direta e ex-plícita do código alfabético são os que apre-sentam os melhores resultados”. (MORAIS et al, 1995, apud CAPOVILLA e CAPOVILLA, 2000. p. 31).

Quando um aluno está no processo inicial do desenvolvimento da leitura, é de extrema importância a decodificação fono-lógica, pois esta coopera para o aprendizado da ortografia das palavras, permitindo assim, o desenvolvimento da rota lexical, porém a rota fonológica continuará sendo essencial, uma vez que, os alunos sempre terão contato com novas palavras (CAPOVILLA e CAPO-VILLA, 2000).

Pesquisas tem comprovado a im-portância da consciência fonológica que se refere tanto à consciência de que as frases podem ser divididas em partes menores (pa-lavras, rimas, aliterações e sílabas) quanto a capacidade de trabalhar com essas divi-sões de forma eficaz. Bertelson et al (1989, apud CAPOVILLA e CAPOVILLA, 2000) e da Consciência fonêmica, que consiste na habilidade de decodificação dos fonemas de forma mais específica (CAPOVILLA e CAPO-VILLA, 2000).

Portanto através do estudo da abor-dagem fônica desenvolvido por Capovilla e Capovilla (2000), fica evidente que além de trabalhar a partir de textos vivenciados coti-dianamente, é essencial práticas docente vol-tadas para o desenvolvimento da consciência fonológica nos seus alunos, uma vez que, “O procedimento para desenvolver consciência fonológica é um importante instrumento que os profissionais podem usar para melhorar as habilidades de leitura e escrita de seus edu-candos e clientes” (LEYBAERT et al, 1997, apud CAPOVILLA e CAPOVILLA, 2000).

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A autora diz que o letramento é de-corrente das sociedades grafocêntricas, pois tecnologia se desenvolve de maneira acelera-da, utilizando-se primordialmente da escri-ta, por isso ser alfabetizado não basta para acompanhar toda a evolução.

Ela explica que o surgimento do con-ceito de letramento no Brasil, ocorreu desde os tempos de Brasil Colônia, pois até recen-temente, o problema era o analfabetismo, e ao ser parcialmente resolvido, abriu espaço para o letramento.

De acordo com Soares (2000) alfabe-tização é um elemento indispensável do le-tramento e sendo assim, não se distinguem, ou seja, deve-se alfabetizar letrando.

Alfabetizar letrando significa orientar a criança para que apren-da a ler e a escrever levando-a a conviver com práticas reais de leitura e de escrita, substituindo as tradicionais cartilhas por livros, por revistas, por jornais, enfim, pelo material de leitura que cir-cula na escola e na sociedade, e criando situações que tornem ne-cessárias e significativas práticas de produção de textos. (SOARES, 2000, p.3)

Ainda do ponto de vista da autora su-pracitada durante o processo de escolariza-ção o letramento deve ser responsabilidade de todos os professores, pois, em todas as disciplinas os educandos aprendem lendo e escrevendo e ao escolher os gêneros para se trabalhar em sala de aula os critérios devem ser bem fundamentados, afastando assim, os aspectos negativos e o exagero na utilização de diferentes gêneros.

Já que o letramento é responsabili-dade de todos os professores, sua formação e sua prática deve sempre estar em questão, refletindo o que deve ser melhorado, para assim promover uma educação de qualidade para todos.

Segundo Santos e Bernardes (2003), os cursos de formação de professores estão

De acordo com Goulart (2000), para formar cidadãos capazes de ler e interpretar o que lêem, o modo de se ensinar deve se mo-dificar. Os educadores precisam levar textos do cotidiano dos educandos para as salas de aula, além de permitir que os alunos iniciem sua escrita da maneira que consideram cor-retas, ou seja, inventada, para que no decor-rer do processo cheguem próximos a escrita convencional, além de respeitar a individua-lidade de cada aluno.

Estes métodos auxiliam no processo de alfabetização, portanto não pode-se deixar de lado o letramento, pois segundo Oliveira (2005), mesmo o aluno dominando o código escrito, ele ainda necessita desenvolver a flu-ência de leitura e escrita, pois sem esta fluên-cia ele pode até compreender um texto, mas não conseguirá redigir um texto.

De acordo com Soares (2000), letra-mento é a capacidade do aluno de saber ler e escrever, mas não apenas ler, e sim interpre-tar os diversos textos que fazem parte do dia- a dia, como jornais, cartas, bilhetes, receitas, documentos pessoais, sem dificuldade.

E para Kleiman (2007) letramento focaliza no ensino e na aprendizagem dos aspectos sociais da língua escrita, portanto assumir o letramento na aprendizagem dos alunos implica em alfabetizar através de práticas sociais trazidas de experiências dos educandos, levando em conta a diversidade existente nas salas de aula.

Novamente de acordo com Soares (2000), o termo letramento ainda não está presente nos dicionários, mesmo havendo arquivos e documentos que venham com esta palavra de título. O letramento não foi intro-duzido pela mídia nem pelas escolas e profes-sores, estando presente apenas no espaço de pesquisas. Portanto o conceito de letramento surgiu quando a alfabetização tornou-se in-satisfatória, desde que passaram a pensar sobre analfabetismo funcional -UNESCO na década de 70 - e perceberam que saber ler e escrever sem saber fazer uso dessas habilida-des eram insuficientes.

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te dono exclusivo do saber tem o seu papel modificado, pois o acesso as informações se tornam mais fáceis e rápidas, porém a escola não conseguiu ainda se adaptar a essa nova realidade, permitindo que o alfabetizador passe a ser muito criticado. (SANTOS e BER-NARDES, 2003).

Santos e Bernardes (2003), destacam ainda que os cursos de formação inicial de professores mantêm a dicotomia teoria/prá-tica, pois acreditam que ao ensinar a técnica, os professores se tornam aptos a desempe-nhar um papel profissional de qualidade. E os cursos de formação continuam não apre-sentando resultados significantes.

Para Santos e Bernardes (2003) a mudança da realidade educacional depende da formação de professores, estes devem ser vistos como agentes construtores de conhe-cimento.

Segundo Brito (2006) a formação do profissional da educação para as séries iniciais do ensino fundamental muitas ve-zes parece não ser tratada com seriedade e compromisso, e ao longo dos anos o trabalho docente passou por várias transformações, pois o educador não é mais considerado ape-nas transmissor de conhecimentos, e sim um profissional reflexivo, com capacidade de re-formular e criar um novo sentido ao seu fazer pedagógico.

Brito (2007) ressalta que para o pro-cesso de alfabetização ser de qualidade os cursos de formação de professores devem prepará-los para lidar com uma sala com di-ferentes níveis de desenvolvimento, uns em processo de alfabetização, outros em desen-volvimento de suas habilidades de escrita, ou ainda em diferentes níveis de letramento.

Gauthier et al (1998, apud CAMPE-LO, 2002.) mostra que um processo de ensino aprendizagem eficaz exige que a formação do professor seja adequada fazendo com que o edu-cador tenha domínio de diversificados conheci-mentos, sendo nas áreas disciplinares, curri-culares, das ciências da educação, da tradição pedagógica, experiências da ação pedagógica.

deixando a desejar, além de que, quando es-ses docentes chegam às escolas se deparam com apego aos modelos tradicionais de ges-tão escolar, não permitindo mudanças, além de se depararem com reivindicações pela va-lorização docente.

Para Kleiman (2008) há alguns anos atrás o maior questionamento não era sobre como o professor ensinava a ler e escrever, mas sim sobre a sua própria competência de conseguir fazer uso das práticas de leitura e escrita, uma vez que, uns nem conheciam a matéria que deviam ensinar, não liam e nem escreviam corretamente.

A partir dos estudos de Santos e Ber-nardes (2003), embasados nos teóricos Mag-da Soares, Antônio Nóvoa e Sônia Kramer, fica notável que a necessidade de alfabeti-zadores mais qualificados, não é atual e sim desde as primeiras décadas do século XIX e o que é nítido são cursos de licenciaturas su-perficiais que deixam grande lacuna, ao for-mar alfabetizadores despreparados.

Para Santos e Bernardes (2003) a for-mação de professores está longe da realidade, ela necessitaria formar alfabetizadores que se vêem como produtores de conhecimentos.

Santos e Bernardes (2003) defende que se deve levar em consideração a histó-ria de vida de cada professor, considerando que a maneira de viver dentro e fora da es-cola deve ser estudada e que sua identidade e cultura oculta interferem no seu trabalho diário.

“A formação dos alfabetizadores é um processo longo e complexo. Longo porque deverão estar sempre estudando. Comple-xo, porque não se tem um modelo pronto e acabado, ideal para cuidar de sua formação” (SANTOS e BERNARDES, 2003, p.10).

Santos e Bernardes (2003) a partir de pesquisas notaram que os cursos de formação de professores não conseguem articular teoria e prática, não conseguem identificar os pro-blemas mais comuns na busca de soluções.

E o que agrava ainda mais o proble-ma é que com as novas tecnologias o docen-

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Também para Brito (2007) é de extre-ma importância a valorização da língua oral e suas diferentes formas de uso como ponto de partida para a construção da escrita e tam-bém a compreensão de que a escrita infantil é resultante de suas experimentações e hipó-teses não devendo ser vista como erro.

Portanto os docentes devem ser me-lhores preparados para entender a dinâmica da aprendizagem, para que deixe de cometer sérios equívocos como o ensino da escrita de forma mecânica e técnica, mas sim voltar atenção para a formação de alunos reflexivos, capazes de usar a leitura e escrita nas práti-cas cotidianas. E um passo para isso é trans-ferir o enfoque do como ensinar para como o aluno aprende (BRITO, 2007).

Brito (2007) enfatiza que por muito tempo o uso das cartilhas predominou e com isso todos os alunos eram vistos como papéis em branco que deviam ser moldados, como também, vistos de forma homogênea, sem considerar que cada um tem uma forma úni-ca de aprendizagem e cada um se encontra em um nível de desenvolvimento.

Santos e Bernardes (2003) concorda com a autora ressaltando que as práticas do-centes tem se resumido ao ensino da leitura e escrita totalmente desvinculado com a rea-lidade, não trabalhando com textos da reali-dade social. Para Santos e Bernardes (2003, p.9) “O ensino de leitura estaria calcado na responsabilidade do alfabetizador de fazer com que a criança seja leitora e não simples-mente alfabetizada”.

Com base nas pesquisas sobre letra-mento a criança está em constante contato com a escrita em diversos momentos na so-ciedade letrada, entende suas funções e per-cebe que a escrita aparece de diversas ma-neiras como em um bilhete, jornal e revista, dessa forma, a escola deve abrir espaço para o letramento, levando para dentro das salas de aula textos das práticas sociais (BRITO, 2007).

E ainda conforme Soares (1998, apud BRITO 2007) existem diferentes níveis de letramento dependendo da necessidade do contexto e sendo assim a aprendizagem da escrita não ocorre de forma linear é um com-plexo processo que se constrói em cada indi-víduo de forma diferente.

Para Brito (2007) as crianças que chegam as escolas públicas são capazes de aprender ler e escrever, o que falta são os professores identificarem os níveis de desen-volvimento de cada um, para que as ativida-des sejam pertinentes para que avancem ain-da mais e compreendam a real função social da língua.

O professor deve ser capaz de refletir sobre sua prática e conhecer profundamen-te os conhecimentos lingüísticos (BRITO, 2007).

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1. Introdução

Tendo em vista a expansão dos cur-sos à distância no Brasil nos vários níveis de ensino, é de suma importância ao aluno desenvolver técnicas de aprendizado especí-ficas para que possa alcançar a certificação e garantir a aplicabilidade do conteúdo apre-endido no seu cotidiano.

As ferramentas tradicionais, associa-das às novas tecnologias somam-se como im-pulsionadores de auto-aprendizado, fazendo com que o aluno não se limite ao aprendizado do conteúdo formal, mas também desenvolva habilidades em outros campos necessários à demanda do mercado atual.

Com o intuito de compreender me-lhor a dinâmica desse modelo de ensino, bem como as necessidades envolvidas nesse processo, este artigo tem por objetivo geral, verificar o desempenho de alunos ingressos no curso Ensino à Distância de jovens e adul-tos de ensino fundamental e médio de uma escola da cidade de Jaú. Além disto, busca verificar nos alunos a sua percepção (e valo-rização) acerca dessa oportunidade de resga-te do seu direito ao aprendizado e ampliação dos seus estudos.

Ao pensar nessa problemática, busca-mos esclarecer a seguinte questão: Quais as dificuldades que o aluno enfrenta no curso fundamental de jovens e adultos na modali-dade de EaD?

Nesta investigação, buscamos escla-

recer como se dá o processo de Ensino à Dis-tância, utilizando para a análise dos dados, alguns dos estudos teóricos realizados até o momento como alicerce para tal investiga-ção. O universo de pesquisa envolveu uma pequena amostra, referente a nove alunos de uma instituição de ensino que frequentam o curso de jovens e adultos na modalidade a Distância, no município de Jaú, interior de São Paulo. Embora a amostra seja reduzi-da, permitiu um levantamento exploratório acerca da problemática de pesquisa, clare-ando alguns aspectos significativos acerca da questão da autonomia e aprendizagem a distância.

O instrumento de coleta de dados foi a entrevista semi-estrutura, definida em várias dimensões, sendo que este trabalho buscou centrar sua análise nas dimensões que dizem respeito às dificuldades de aprendizagem e freqüência às aulas. De acordo com a organi-zação das dimensões do questionário aplica-do, construímos categorias de análise. Estas foram destacadas conforme fatores que con-sideramos importantes de serem relatados.

2. Ensino à Distância

2.1 Conceitos

O Ensino à Distância no Brasil foi estabelecido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). O Decreto

ALGUMAS INCURSÕES ACERCA DA QUESTÃO DA AUTONOMIA DO ALUNO NO ENSINO À DISTÂNCIAAna Cláudia de Almeida Prado¹Aparecida de Fátima Murdiga²Gilvana Mara Boesso³

Luciani Marconi Caetano Martins Sgarbi4

Elizabete David Novaes5

¹ Acadêmica do curso de Pedagogia, pólo de Jaú – SP, da Faculdade Interativa COC.² Acadêmica do curso de Pedagogia, pólo de Jaú – SP, da Faculdade Interativa COC.³Acadêmica do curso de Pedagogia, pólo de Jaú – SP, da Faculdade Interativa COC.4*Acadêmica do curso de Pedagogia, pólo de Jaú – SP, da Faculdade Interativa COC.5Profª. Dra. em Sociologia. Docente das Faculdades COC e da Faculdade Interativa COC

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nº 2.494/98, que regulamenta o Art. 80 da LDB, define a EaD como sendo

... uma forma de ensino que pos-sibilita a auto-aprendizagem, com a mediação de recursos didáticos sistematicamente organizados, apresentados em diferentes su-porztes de informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados pelos diversos meios de comunicação. (BRASIL, 1998; p. 73)

Segundo Almeida (2003) o ensino a distância é uma modalidade educacional cujo desenvolvimento relaciona-se com a admi-nistração do tempo pelo aluno, o desenvolvi-mento da autonomia para realizar as ativida-des indicadas no momento em que considere adequado, desde que respeitadas às limita-ções de tempo impostas pelo andamento das atividades do curso, o diálogo com os pares para a troca de informações e o desenvolvi-mento de produções em colaboração.

Para Oliveira (2009) normalmente a EaD apresenta combinação de tecnologias convencionais e modernas que possibilitam o estudo individual ou em grupo, nos locais de trabalho ou fora, por meio de métodos de orientação e tutoria à distância. Assim, as atividades individuais ou em grupos são uma exigências da EaD como interação sín-crona (ao mesmo tempo, como, por exemplo, sala de bate-papo) e assíncronas (como, por exemplo, fóruns de discussão).

Com isso, Almeida (2003) nos diz que o ‘’estar junto virtual’’ o aluno tem o professor como orientador que acompanha seu desenvolvimento no curso, fazendo-o a refletir, compreender os possíveis equívo-cos e depurar suas produções, não estando de plantão no período integral. O professor se faz presente em determinados momentos para acompanhar o aluno, e tirar suas dúvi-das, mas não nem tem o papel de controlar

seu desempenho. Pois, ao contrário, criaria a dependência do aluno em relação às suas considerações, perpetuando a hierarquia das relações aluno–professor do EaD nos am-bientes digitais de aprendizagem, para não tornar situações tradicionais de sala de aula presenciais.

De acordo com Landim (1997) a EaD é o ensino/aprendizagem onde professores e alunos normalmente não estão juntos, fisica-mente, mas podem estar conectados, inter-ligados por tecnologias, principalmente as telemáticas, como a Internet. Como também, podem utilizar para isso, tecnologias seme-lhantes, o CD-ROM, o correio, o rádio, a te-levisão, o vídeo, o telefone, o fax.

Para Aretio (1994), a EaD tem como característica a inexistência de distâncias e fronteiras para o acesso à informação e à cultura, propondo uma aprendizagem in-dependente, tornando o aluno capaz de aprender a aprender e aprender a fazer, de forma flexível, respeitando sua autonomia em relação ao tempo, estilo, ritmo e método de aprendizagem, tornando-o consciente de suas capacidades e possibilidades para sua autoformação.

Litwin (2001) dá uma definição rápi-da sobre a Ensino a Distância (EaD), desig-nando a um conjunto de métodos, técnicas e recursos, postos à disposição de populações estudantis dotadas de um mínimo de matu-ridade e de motivação suficiente para que, em regime de auto-aprendizagem, possam adquirir conhecimentos ou qualificações a qualquer nível. Com isso, baseia-se na idéia de que qualquer pessoa, pode aprender por si próprio, sem se postular a existência de uma relação direta professor/ aluno, desde que lhe seja fornecido à totalidade dos ele-mentos didáticos associados ao aprendiza-do de uma dada disciplina: textos de base e complementares, indicações bibliográficas, exercícios e trabalhos de aplicação, várias formas de clarificação ou ilustração da maté-

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jada, e num ritmo próprio, regulado apenas pelo desejo de aprender e pela capacidade de assimilar e digerir o que se encontra pela frente, não é viável chamar essa experiência de ensino a distância, como se fosse a In-ternet que ensinasse, ou como se fossem as pessoas que estão por trás dos materiais que ensinassem. Trata-se, outrossim, de apren-dizagem mediada pela tecnologia, aprendi-zagem não decorrente do ensino, portanto, uma autoaprendizagem.

As palavras de Moran (2006, p. 22) sintetizam esta nova visão de educação, uma educação inovadora, como no fragmento que segue.

Aprendemos melhor quando vi-venciamos, experimentamos, sentimos. Aprendemos quando relacionamos, estabelecemos vín-culos, laços entre o que estava sol-to, caótico, disperso, integrando-o em um novo contexto, dando-lhe significado, encontrando um novo sentido. Aprendemos quando descobrimos novas dimensões de significação que antes se nos esca-pavam, quando vamos ampliando o círculo de compreensão do que nos rodeia, quando como numa cebola, vamos descascando novas camadas que antes permaneciam ocultas à nossa percepção, o que nos faz perceber de outra forma. Aprendemos mais quando estabe-lecemos pontes entre a reflexão e a ação, entre a experiência e a con-ceituação, entre a teoria e a práti-ca; quando ambas se alimentam mutuamente. Aprendemos quan-do equilibramos e integramos o sensorial, o racional, o emocional, o ético, o pessoal e o social. Apren-demos pelo prazer, porque gosta-mos de um assunto, de uma mídia, de uma pessoa. O jogo, o ambien-te agradável, o estímulo positivo podem facilitar a aprendizagem. “Aprendemos mais, quando con-seguimos juntar todos os fatores: temos interesse, motivação clara;

ria e, finalmente, elementos para avaliações parciais e finais.

Assim, pode-se dizer que a caracte-rística básica da EaD é o estabelecimento de um processo educativo que permita comu-nicação e interação entre professor e aluno, que se encontram distantes no espaço e no tempo.

2.2. Educação, Ensino e Aprendizagem à Distância

Para Chaves (1999) não resta dúvida de que a educação pode acontecer por meio do ensino a distância. Porém, que a educa-ção pode acontecer por meio da autoapren-dizagem, que não é provocada por nenhum processo formal de ensino, mas que acontece por meio de interações com a natureza, com outras pessoas e com o meio cultural em que vive. Segundo o mesmo autor, a aprendiza-gem que assim ocorre é mais significativa (acontece com mais facilidade, é retida por mais tempo, é mais facilmente transferida para outros domínios e contextos, entre ou-tros) do que a aprendizagem que decorre de processos formais e deliberados de ensino (i.e., através da instrução).

De acordo com Chaves (1999) nas novas tecnologias à nossa disposição, em es-pecial na Internet, e dentro da Internet, na Web, destaca-se não o fato de que podemos ensinar a distância com o auxílio delas: é que elas nos permitem criar ambientes ricos em possibilidades de aprendizagem, nos quais que pessoas interessadas e motivadas podem aprender quase qualquer coisa sem precisar de um processo de ensino formal e delibera-do.

Entretanto, quando alguém usa os recursos hoje disponíveis na Internet para aprender de forma explorativa, automoti-vada, ele usa materiais de natureza diversa, preparados e disponibilizados em momentos e contextos os mais variados, não raro sem nenhuma intenção didática, numa ordem to-talmente imprevisível e, portanto, não plane-

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gia dos sistemas educacionais para atender a grupos heterogêneos da sociedade que por inúmeras razões não tiveram acesso a ser-viços educativos regulares. Partindo desse ponto podemos afirmar que essa modalida-de de ensino evidencia-se como uma forma de superar as dificuldades relacionadas a situações geográficas, sociais, econômicas e profissionais, visto que permite a democra-tização do acesso a cursos de formação em diferentes áreas do conhecimento.

Assim, considerando o contexto mun-dial de mudanças aceleradas em todas as di-mensões da vida social que exigem adapta-ções dos sistemas educacionais a educação a distância vem adquirindo reconhecimento como uma modalidade de educação apro-priada para o alcance de metas de políticas públicas, especialmente em países como o Brasil, onde há grande dispersão geográfica dos alunos. E embora ela seja relativamente recente no país, devemos destacar iniciativas ou movimentos que contribuíram de forma significativa para que tal modalidade fosse criando ao longo dos anos uma nova metodo-logia para a disseminação do conhecimento (BELLONI, 2001).

Além disso, tal modalidade de ensino evidencia que o ciberespaço será o principal ponto de apoio de um processo ininterrupto de aprendizagem e ensino da sociedade por si mesma. E assim será possível confirmar as perspectivas dos compromissos assumidos em conferências internacionais de educação, isto é, “o direito de aprender por toda vida” (ROCHA; LIMA, 2008).

2.4. Autonomia do Aluno no Ensino a Distância

Segundo Moore (1996), a “autonomia do aluno”, é uma medida que permite que seja o aluno e não o professor a determinar os seus objetivos de aprendizagem. Tal com-portamento para Malcolm Knowles deveria ser natural para o adulto, que constitui, na verdade, o tipo de pessoa, que já tem o seu

desenvolvemos hábitos que facili-tam o processo de aprendizagem; e sentimos prazer no que estuda-mos e na forma de fazê-lo.

Aprende-se com a realidade e a mes-ma está em constante movimento, e cabe a nós enquanto profissionais da área de educa-ção criarmos situações que propiciem a nos-sos alunos o prazer em aprender.

Assim, a tecnologia, com seu leque de informações, pode ser vista como ferramenta in-dispensável no processo ensino-aprendizagem.

2.3. Novo Paradigma Educacional e a Educação a Distância

Segundo Lopes; Newman; Salva-go (2003) um novo paradigma educacional aflora, e as pessoas precisam estar prepara-das para aprender ao longo da vida, podendo intervir, adaptar-se e criar novos cenários. Neste paradigma, a visão de fragmentação e divisão vem sendo superada, marcando a sociedade do conhecimento, propondo a to-talidade, reassumindo o todo.

Essa conscientização levará o profes-sor a questionar a didática do “ensino-apren-dizagem” que prevê quem ensina (o profes-sor) e quem aprende (o aluno). Demo (2001, p. 15) efetivamente derrota essa prática como “instrucionismo, pois este apenas ensina, treina, inculca, domestica”. Demo refere-se à alusão de Paulo Freire em falar da “politici-dade da aprendizagem”, pois, para o autor, “....aprender sempre acarreta a formação de um sujeito capaz de construir sua própria au-tonomia crítica e participativa”.

Nesta perspectiva, o Ensino a Distân-cia aparece como uma possibilidade, uma alternativa pedagógica. As necessidades se diferem em cada período da história da hu-manidade, pois surgem novas necessidades na convivência social, e em especial no mer-cado de trabalho e consequentemente a edu-cação precisa acompanhar esse processo.

Barreto (2006) apresenta a EAD (Educação a Distância) como uma estraté-

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na diminuição da probabilidade de acidentes pessoais no trânsito e na escolha de um local mais confortável, tranquilo e, portanto, mais adequado para estudar, nem sempre, encon-trado na maioria das escolas (MORAES FI-LHO, 2006).

Sendo assim, quando se fala em au-tonomia, deve-se pensar em uma formação contínua, uma formação que exija do ser hu-mano a capacidade de governar por si mes-mo o seu desenvolvimento pessoal e profis-sional.

Uma primeira ligação entre auto-nomia e pesquisa é apresentada por Demo (1988, apud LOPES; NEWMAN; SALVAGO, 2003), quando aponta o caminho para que o conhecimento aconteça de uma maneira que a informação possa ser distinguida, avaliada, julgada, desdobrada e desenvolvida. Para ele, a palavra chave é “pesquisa”; não no sentido de produzir conhecimento científico, mas como “princípio educativo”. É nesse conceito que jaz o segredo da autonomia - a constru-ção da “metodologia do aprender a apren-der”. A mola mestra no processo é “a arte de questionar de modo crítico e criativo”, assim possibilitando a autonomia emancipatória no caminho da aquisição efetiva e relevante do conhecimento.

Para Mccarthy (1998) apesar de a autonomia ser possível sem treinamento e treinamento não pressupor autonomia, am-bos estão relacionados de maneira dinâmi-ca. O treinamento parece ser apropriado na maioria das situações, porque pode oferecer ao aprendiz ferramentas para aprender mais eficazmente e, por meio dessas ferramentas, pode se tornar autônomo.

De acordo com Daniel; Marquis (1979 apud LOPES; NEWMAN; SALVAGO, 2003), a independência também aparece interligada à autonomia. Ela vai além de uma visão sim-plista de liberdade de estudar quando e onde o aluno desejar, desconsiderando a intera-ção. A independência no paradigma emer-gente não se refere a um objetivo externo, mas a uma função cognitiva; refere-se ao fato

próprio conceito de independência. No en-tanto por norma, os adultos “não estão pre-parados para uma aprendizagem indepen-dente; precisam atravessar um processo de reorientação para aprenderem como adultos” (KNOWLES, 1970 apud MOORE, 1996).

Moore (1996) defende a necessidade de os “alunos compartilharem a responsabi-lidade dos seus próprios processos de apren-dizagem”. A autonomia do aluno tem a ver com a capacidade que este tem, perante os conteúdos programáticos do curso, de esta-belecer os seus próprios objetivos, metodolo-gias e materiais a utilizar, bem como etapas e modos de avaliação da sua aprendizagem e aquisição de conhecimentos/competências.

Assim, parece haver uma relação en-tre o aluno autônomo que prefere programas bem estruturados, que depois irá gerir, e o aluno que prefere programas menos estru-turados e mais dialógicos ou dialogantes, em que o professor vai adequando as metodolo-gias e ritmos às necessidades do aluno (MO-ORE, 1996).

Nesse sentido, segundo Barreto (2002) a autonomia do aluno é construída muito mais em função da visão dos respon-sáveis pelo programa educativo sobre qual o papel do aluno no processo de ensino-aprendizagem e que estratégias devem ser pensadas para fomentar esse papel, do que em função das características da tecnologia mediadora, mesmo reconhecendo que algu-mas tecnologias possibilitam mais interação que outras de acordo com a estruturação do programa.

Sendo assim, a autonomia dada ao aluno, pode ser entendida, também, como uma forma de lhe possibilitar a construção do conhecimento e da cidadania, individual e coletivamente, determinando seu próprio tempo e horário para a realização de suas ati-vidades, conciliando com seu horário de tra-balho e lazer. O seu espaço de estudo implica na redução dos custos com transporte diário, na diminuição do stress causado pela loco-moção nas vias urbanas das grandes cidades,

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disposto a ceder o controle e permitir que os aprendizes também participassem nas de-cisões no processo ensino-aprendizagem, e estes últimos precisariam estar dispostos a engajar-se e a ter responsabilidades em sua própria educação (LOPES; NEWMAN; SAL-VAGO, 2003).

Tanto professor como aluno trazem consigo experiências educacionais prévias e expectativas do ambiente presencial. Quan-do se faz a mudança para o virtual, os alunos, muitas vezes, esperam ser ensinados, e pro-fessores esperam ensinar.

Com isso, ambos merecem orienta-ções em relação ao ensino a distância, prin-cipalmente dentro deste paradigma vigente, em que a autonomia parece ser prioridade para se alcançar o aprendizado permanente, aquele que acontece ao longo da vida.

2.5. Dificuldades da Ead

De acordo com Lopes; Newman; Sal-vago, (2003) a autonomia na relação peda-gógica, significa, de um lado, reconhecer no outro sua capacidade de ser, de participar, de decidir, de ter o que oferecer e partilhar; de outro lado, significa a capacidade que o su-jeito tem de “tomar para si” sua própria for-mação, isto é, de tornar-se sujeito e objeto de formação para si mesmo.

Para o professor acostumado a se co-locar como dirigente da formação dos seus alunos e para o aluno que não tem disciplina, metas, limites, em seu processo de aprendi-zagem, isto não é fácil, pois no ambiente on-line, as dificuldades existentes na busca pela autonomia podem ser elencadas como a falta de suporte técnico, falta de competência téc-nica do aprendiz e do professor, falta de inte-resse do aluno em ser autônomo, responsabi-lizando-se em grande parte pelo seu próprio desenvolvimento, falta de flexibilidade do professor em adaptar-se à aplicação de novas metodologias e estratégias de interação apro-priadas ao contexto virtual, falta de atenção ou sensibilidade para detectar os obstáculos

de o estudante assumir responsabilidade na construção de significados em um ambiente colaborativo e interativo.

Segundo Litwin (2001) a autonomia não deve ser confundida com o autodidatis-mo. Pois o autodidata é o estudante que se-leciona os conteúdos e não conta com uma proposta pedagógica e didática para o es-tudo. Por exemplo, em uma modalidade à distância, apesar de permitir-se uma organi-zação autônoma dos estudantes em relação à escolha de espaço e tempo para o estudo, isso não significa que não haja uma proposta didática, seleção de conteúdo, orientações de prosseguimento dos estudos e propostas de atividades.

Neste sentido, segundo as autoras Lopes; Newman; Salvago (2003) a inovação está no fato de que o papel da instituição pas-sa por uma transformação, deixando de ser o único centro de informações, tornando-se espaço ideal para produção de conhecimento e cultura, privilegiando valores humanos e a afetividade, fornecendo contextos e saberes para uma autonomia de sucesso no mundo da diversidade. Hoje a tecnologia permite que se tome contato com a realidade indiretamente. Como Leite (1999) destaca, a relação do edu-cando com a realidade não se limita mais à sua experiência pessoal e ao que a escola e a família lhe proporcionam, administrando a informação e os modelos de interpretação da realidade.

Para as autoras acima citadas as fon-tes de informação estão muito mais diversi-ficadas, e a escola deveria estimular novas formas de experimentação e criação dos edu-candos. Para que essa função seja cumprida, os professores deveriam capacitar-se para isso, principalmente quando esse ensino for feito a distância, via rede de computadores, porque suas características são diferentes daquelas a que estamos acostumados no en-sino presencial.

O professor, tanto no ambiente pre-sencial como no ambiente online, sob a perspectiva da autonomia, precisaria estar

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tudo mais outro menos, tiro minhas dúvidas com a tutora ou na internet”.

“Só no horário escolar, porque tenho muito pouco tempo, então não dá pra estu-dar em casa e tirar as dúvidas só na escola mesmo”.

“Posso dizer que 90% sim (tem tem-po). Uma média de 3 dias por semana. Tiro minhas dúvidas em livros, tele curso e TV”.

Quando foi pedida uma comparação com o ensino de hoje e o ensino que obtive-ram no passado, a maioria respondeu que:

“o ensino de hoje está mais avança-do, mais aproveitado de que no passado, só deveria as aulas ser mais longas, e muita pouca hora para as aulas”.

“ o ensino está mais atualizado, a lei-tura está mais presente no dia a dia”.

“O que antes era bom, agora melho-rou bastante”.

“Hoje o ensino obtém mais dificulda-de para mim na área de matemática, pois ouve muitas mudanças em relação de letras, e muitas contas em uma.”

Quando perguntados quanto ao tem-po que voltou a estudar e quais as mudanças observadas em relação ao seu aprendizado, ou seja, o que as mudanças ocorridas acres-centaram em suas vidas, conferimos algumas das respostas:

“Por enquanto não mudou nada em minha vida, faz três meses que voltei a es-tudar, mas até lá (no final do curso) sei que vai mudar.”.

“Voltei a estudar há oito meses. Vejo que em termos de conhecimento melhorou muito, abriu uma forma de enxergar outras possibilidades”.

“A explicação é melhor com as aulas de vídeo, você aprende mais e tudo o que é passado e sempre bem explicado”.

“Voltei a estudar há três meses, estou me sentindo mais segura, mais atualizada”.

“Voltei a estudar depois de 12 anos

psicológicos, sociais e técnicos a serem en-frentados pelos participantes de um proces-so ensino/aprendizagem no contexto digital (LOPES; NEWMAN; SALVAGO, 2003).

3. Resultados da Pesquisa Empírica

Para alcançarmos os objetivos pro-postos neste estudo, buscamos esclarecer as dificuldades que os alunos encontram no processo do Ensino à Distância em uma ins-tituição de ensino na cidade de Jaú, interior do Estado de São Paulo.

O instrumento de coleta de dados foi uma entrevista semi-estrutura, definida em 5 dimensões, sendo que este trabalho centrou sua análise nas dimensões 2 e 3, que dizem respeito às dificuldades que os alunos encon-tra no estudo a distância.

Observou-se que quanto à classifica-ção na faixa etária, 78% estão entre 15 a 20 anos. Constata-se que nesta faixa etária o in-dividuo encontra-se no auge de suas funções físicas, psíquicas e intelectuais. Sendo que 22% então acima de 45 anos.

Ao analisarmos cada uma das catego-rias, trazemos as falas dos alunos como evi-dências de poder argumentativo, como colo-ca Demo (1998), possibilitando-lhes assumir o lugar que lhes deve ser atribuído, ou seja, o lugar dos principais atores deste processo de aprendizado.

Questionando-se quanto às dificulda-des que eles encontram para desenvolver seu conhecimento, 100% dos entrevistados dis-seram que é a falta de tempo para estudar so-zinhos. A maioria é do sexo feminino, e, além de trabalharem fora, também têm atividades do lar, filhos para cuidar, ficando muito difí-cil para estudar, conforme apontaram.

Para um total de 80%, o tempo dedi-cado ao estudo é somente no horário escolar, e tirar as dúvidas, somente no dia de aula. Podemos conferir estas considerações em al-gumas falas:

“Eu estudo em casa também, não te-nho horário certo para estudar. Um dia es-

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4. Conclusão

Neste trabalho, pode-se concluir que a EaD é uma modalidade de ensino que vem se desenvolvendo consideravelmente e as no-vas tecnologias de informação e comunicação ampliam as possibilidades nesta modalidade, propiciando uma maior interatividade entre os membros engajados neste processo.

Os resultados encontrados na pes-quisa mostram que a maior dificuldade en-contrada pelos alunos é a determinação do tempo para realização das suas atividades de estudo, dentre as quais, a possibilidade de compatibilizar o horário de estudo com os horários dedicados a outras atividades, como trabalho, lazer, família.

Portanto, é fundamental compreen-der a flexibilização do espaço e do tempo na modalidade de ensino EaD, como uma for-ma de conferir ao aluno, condições de acordo com as suas necessidades e características pessoais para imprimir o seu ritmo de estudo e adquirir conhecimento formal no local e no tempo que ele julgar mais adequado.

Assim, nos permitimos afirmar que a autonomia não depende somente do apren-diz e de suas características individuais. Muito mais complexa, a autonomia depende além do aprendiz, também da metodologia adotada, bem como do material utilizado e dos professores e agentes envolvidos no pro-cesso.

Acreditamos que a partir deste traba-lho poderão surgir novas pesquisas que pos-sam contribuir para esclarecer pontos que aqui não foram suficientemente aprofunda-dos, indo além da restrita amostragem utili-zada na pesquisa que realizamos.

e as mudanças foram muitas em todas as matérias. Agora... foi bom para eu ver que apesar das dificuldades nunca é tarde para aprender”.

“Voltei a estudar há nove meses, e em relação ao aprendizado eu aprendi muitas coisas: a história do Brasil, fazer as contas de matemática, etc”.

Pode-se afirmar que na EAD o aluno não pode ser um sujeito passivo, este tem que desenvolver sua autonomia, administrar suas prioridades e o tempo necessário para desenvolver as tarefas. Nesta modalidade o aluno deixa de ser um mero receptor de in-formações, como vemos em algumas situa-ções do ensino presencial, pois o aluno é o principal responsável por sua aprendizagem, que só aprenderá se houver o envolvimento deste sujeito.

Este aluno passa a ser responsável pela sua aprendizagem e, principalmente de-senvolver, com a ajuda do professor media-dor, a “aprender a aprender”.

Conforme Masetto (2002, p.144):

Por Mediação Pedagógica enten-demos a atitude, o comportamen-to do professor que se coloca como um facilitador, incentivador ou motivador da aprendizagem, que se apresenta como a disposição de ser uma ponte entre o aprendiz e sua aprendizagem – não uma pon-te estática, mas uma ponte “rolan-te”, que ativamente colabora para que o aprendiz chegue aos seus objetivos.

Assim entendemos que a EaD é uma real possibilidade. Cabe ressaltar que sempre será as pessoas o mais importante para que o processo de ensino-aprendizagem ocorra, portanto a aprendizagem se torna algo indis-pensável e de irrevogável investimento nas IES.

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1. Introdução

Neste trabalho desenvolvemos ins-trumentos que buscam tornar eficiente o aprendizado dos conceitos de redes neurais por parte dos estudantes via web, por meio de textos explicativos, imagens e softwares, de forma a aproveitar os instrumentos do en-sino de longa distância.

Redes Neurais Artificiais são abstra-ções do cérebro humano que permitem estu-dar e implementar conceitos do aprendizado por meio de uma modelagem computacio-nal. Dentre os diversos modelos existentes, o perceptron mostra-se muito eficiente na resolução de problemas de baixa complexi-dade, sendo muito utilizado por pesquisado-res. Sua aplicação envolve a transformação de sinais de entrada em uma saída mediada por pesos associados às conexões sinápticas do modelo. As redes neurais artificiais vêm conseguindo cada vez mais espaço no mundo computacional. Este é um tópico com mais de meio século de idade (remonta à década de 40), que atravessou um período de crise onde pouco se falou sobre o assunto, após a verificação de limitações dos modelos ini-ciais, até ressurgir na década de 80 e, des-de então, vem experimentando um grande crescimento e conquistando sua posição de destaque. Com este longo histórico, encon-tramos na literatura vários tópicos sobre in-teligência artificial, redes neurais artificiais e perceptrons, dentre outros, com uma grande

disseminação das informações, especialmen-te após o advento da Internet.

Figura 1. a ciência de redes neurais utiliza como modelo a estrutura do cérebro, buscando re-produzir conceitos como memória e aprendizado, por meio de modelos matemáticos.

A busca por estes materiais seja em li-vros ou na Internet, e procurar interpretá-los corretamente para obter uma compreensão do tema, é um processo por vezes trabalhoso e que consome muito tempo de alunos que almejam desenvolver pesquisa na área de In-teligência Artificial, seja em processamento de imagens, robótica, aprendizado computa-cional, dentre outros. Um outro problema re-levante é que, por vezes, os textos são muito densos e de difícil assimilação por parte dos iniciantes na área, pois são, em sua maioria, embasados por grande conteúdo matemáti-co e teórico, fatores que podem gerar grande desmotivação.

REDES NEURAIS ARTIFICIAIS: UMA PROPOSTA PARA O ENSINO A DISTÂNCIAJosé Waldik Ramon¹Daniela Barbato Jacobovitz² Jean-Jacques De Groote³

¹ Laboratório de Inteligência Artificial e Aplicações- Faculdades COC² Laboratório de Inteligência Artificial e Aplicações- Faculdades COC³ Laboratório de Inteligência Artificial e Aplicações- Faculdades COC

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No trabalho apresentado neste arti-go desenvolveu-se instrumentos que visam facilitar e tornar eficiente o aprendizado dos conceitos de redes neurais por parte dos estu-dantes. Utilizando como meio de divulgação a web, são apresentados textos explicativos, imagens e softwares, de forma a aproveitar os instrumentos do ensino de longa distância.

Nas próximas seções apresentamos detalhes da elaboração do projeto na seção II, e a seguir, na seção III mostramos os re-sultados obtidos. A seção IV é dedicada às conclusões.

2. Metodologia

O trabalho foi elaborado de forma simples e clara, procurando explicar os con-ceitos de redes neurais artificiais na forma de exemplos e associando esses exemplos a nossa realidade, de modo a permitir ao leitor abstração suficiente para assimilar os concei-tos de uma maneira eficiente.

A linha de conduta adotada no que diz respeito à definição dos conceitos, inicia com uma breve pesquisa de conteúdo histórico das redes neurais artificiais, descrevendo as motivações que levaram ao desenvolvimento da inteligência artificial e das redes neurais artificiais. A partir desse relato histórico, foi iniciada uma descrição da relação do cére-bro humano com as redes neurais artificiais, sempre procurando associar cada uma de suas partes constituintes, ou seja, o lado bio-lógico e o artificial (Fig.1).

Neurônio

Perceptron

Figura 2: O neurônio recebe sinais pelos dentritos, e passa um sinal para outros neurônios pelas sinapses. O perceptron é um modelo onde os sinais de entrada são somados, fornecendo ou não uma saída de acordo com uma regra definida por uma função de ativação.

Para demonstrar as propriedades do modelo computacional utilizou-se como base um perceptron de uma camada. Este é um modelo neural simples que se baseia no aprendizado supervisionado, e que utiliza o cálculo diferencial para reduzir gradualmen-te o erro de suas respostas a padrões que lhe são apresentados (convergência dos valores em busca de uma saída desejada).

Apesar de ser limitado a soluções particulares, conhecidas como linearmente separáveis, permite simular características importantes do cérebro como aprendizado,

plasticidade e generalização. Figura 3. Perceptrons ligados formando

uma camada para entrada de sinais e uma única para saída.

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ram utilizados no conjunto de treinamento. Para facilitar a compreensão deste tópico, foi desenvolvido um software que executa o treinamento de uma rede neural artificial e, a partir da rede treinada, responde a padrões aleatórios gerados no software. A exibição da taxa de acerto da rede é exibida em forma de gráfico, permitindo ao estudante verificar como a relação entre a quantidade de pa-drões (entradas) apresentada à rede versus a quantidade de neurônios desta, interfere na qualidade das respostas.

Uma explicação detalhada, acompa-nhada de imagens, foi incluída para a discus-são dos conceitos de separabilidade linear do perceptron (também abordando o problema do Ou-Exclusivo).

Finalizando, breves citações sobre ruído e o modelo perceptron de múltiplas camadas foram feitas. Ruído é considerado na análise da capacidade de aprendizado da rede estudante quando os padrões (dados) lhe são apresentados com imperfeições.

Figura 5. Imagem do site desenvolvi-do com o conteúdo do trabalho. Através dele alunos podem adquirir informações sobre o funcionamento básico das redes neurais de forma intuitiva, programas de demonstração da teoria.

3. Resultados

Textos explicativos e softwares em JAVA foram desenvolvidos para mostrar via web os algoritmos e conceitos envolvidos. A abordagem visou uma linguagem clara e a utilização de analogias e programas. Os algo-ritmos elaborados mostram etapas do apren-dizado do perceptron linear e também de sua versão com saídas binárias (portas lógicas), além de permitirem verificar a rede neural respondendo aos dados apresentados a ela.

Figura 4: janela desenvolvida para mos-trar o funcionamento do perceptron linear

Foram elaborados três softwares para demonstrar o comportamento do perceptron. O primeiro exibe o erro de aprendizado (di-ferença entre a resposta gerada e a esperada) diminuindo progressivamente com o ajuste das conexões (sinapses). O segundo executa o mesmo procedimento, porém de forma ite-rativa, sem o uso da função derivada clássica utilizada no modelo. Esta versão permite ao estudante visualizar, efetivamente, o ajuste das conexões da rede, o que é feito pela fun-ção derivada quando aplicada ao perceptron. O terceiro software é um aprimoramento do primeiro, com a inclusão de uma função sig-móide para modular as saídas da rede. Com essa versão, em especial, é possível demons-trar a utilização de uma rede neural artificial para resolução das portas lógicas AND e OR.

O erro de generalização é focado na seqüência. Trata-se de um fator que determi-na a capacidade de uma rede em apresentar respostas corretas para padrões que não fo-

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Referências bibliográficas

BITTENCOURT, G. Inteligência Artificial: Ferramentas e Teorias. 2. ed. Florianópolis: Editora da UFSC, 2001.

CARVALHO et al. Redes Neurais Artificiais: Teoria e Aplicações. 1. ed. São Paulo: LTC, 2000.

HAYKIN, S. Redes Neurais: Princípios e Prática. 2. ed. São Paulo: Bookman, 2001.

REZENDE, S. O. (Coord.). Sistemas Inteli-gentes: Fundamentos e Aplicações. 1. ed. São Paulo: Manole Ltda, 2003.

RICH, E.; KNIGHT, K. Artificial In-telligence. International Edition. Singapore:McGraw-Hill.

4. Conclusões

Um conteúdo teórico, aliado a ex-plicações detalhadas dos códigos-fonte e a interação com os softwares desenvolvidos, fornecem uma base consistente para o en-tendimento das redes neurais artificiais. O trabalho foi elaborado para permitir ao ini-ciante no assunto desenvolver uma seqüên-cia crescente de seus conhecimentos. Para reforçar esse objetivo, foram desenvolvidas implementações que facilitam ao estudante essa assimilação gradativa de conceitos so-bre redes neurais artificiais.

Todo o material abordado neste tra-balho está disponibilizado integralmente na Internet, tanto os textos (com suas respec-tivas figuras, tabelas e equações) quanto os softwares em Java©, na forma de applets, no endereço http://redesneurais.insidesign.com.br , permitindo que pessoas externas ao grupo de trabalho também possam desenvol-ver e aprimorar seus conhecimentos. Os sof-twares foram alocados de forma a permitir a execução e a interação do estudante com os mesmos. Além disso, todo o código-fonte de-senvolvido foi também disponibilizado para download e devidamente explicado, permitin-do análises e alterações por parte do usuário.

5. Agradecimentos

Os autores gostariam de agradecer C. Ramon e insidesign por fornecer residência em seu site para disponibilizar o trabalho du-rante o período de desenvolvimento. Gosta-riam também de agradecer Andréia Bonfante por valiosas contribuições.

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1. Introdução

Esta pesquisa visa fornecer uma so-lução para o reconhecimento de caracteres alfanuméricos, através do estudo de técnicas de processamento digital de imagens e redes neurais artificiais. O objetivo do trabalho é a aplicação destas técnicas na identificação de placas de veículos automotores.

Quando olhamos uma imagem, so-mos capazes de identificar características e estabelecer uma finalidade para cada estru-tura presente. Esta tarefa, aparentemente trivial, é na verdade um processo de grande complexidade do ponto de vista computacio-nal. O desenvolvimento de programas capa-zes de extrair informações relevantes de ima-gens representa um desafio que tem atraído a atenção de pesquisadores em áreas que vão da digitalização de textos a sistemas de segu-rança. Porém, com o desenvolvimento atual na área de processamento digital de imagens e também de redes neurais, tornam-se pos-síveis avanços relevantes na identificação de características presentes em uma imagem. Através destas técnicas é possível desenvol-ver modelos computacionais que sejam capa-zes de identificar objetos em uma imagem de forma automática, ou seja, sem a interferên-cia de usuários.

A proposta deste trabalho é inves-tigar técnicas de processamento digital de imagens (PDI) e de redes neurais artificiais (RNA) visando o desenvolvimento de um sistema computacional capaz de reconhecer automaticamente caracteres da placa de um

veículo. O processamento de imagens será utilizado para remover ruído por meio de fil-tros passa-baixa. Para identificar a placa na imagem, sua borda será realçada com filtros passa-alta, buscando a seguir isolar os carac-teres. Operações morfológicas de abertura e fechamento também serão ser aplicadas no caso de falhas nas imagens dos caracteres. A seguir, diferentes formatos de redes neu-rais artificiais serão treinadas a partir de um conjunto de exemplos. Para cada formato a capacidade de generalização das redes se-rão testadas levando em conta efeitos como translações, ruído, e diferença nas fontes dos caracteres. A finalização do trabalho se dará com união das técnicas em um único pro-grama. O objetivo é que este programa seja capaz de fornecer os caracteres da placa de forma automática, e com pequena margem de erro.

Na próxima seção mostramos o pro-cesso inicial adotado para tratar as imagens, e a seguir a conclusão do trabalho que já foi realizado até o momento.

2. Metodologia O objetivo do processamento das

imagens neste trabalho é extrair apenas as informações relevantes para o posterior trei-namento e aplicação das redes neurais. O re-sultado do processamento deve restringir os dados extraídos ao mínimo necessário, para garantir a eficiência da rede neural com rela-ção ao tempo de treinamento e a sua capaci-dade de generalização.

SISTEMA AUTOMÁTICO PARA A IDENTIFICAÇÃO DE PLACAS DE VEÍCULOSEdiel Wiezel da Silva¹ Jean Jacques de Groote²

¹ Laboratório de Inteligência Artificial e Aplicações Faculdades COC² Laboratório de Inteligência Artificial e Aplicações Faculdades COC

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2.a Pré-processamento

O processamento de uma imagem não precisa, necessariamente, resultar em uma imagem melhor do ponto de vista da inter-pretação humana e sim, para a aplicação que irá utilizá-la. A melhor forma de transformar a imagem por esse ponto de vista depende de um amplo estudo. Neste trabalho partiremos do pressuposto que uma forma adequada de transformar as imagens para a rede neural será fornecer a esta, apenas o esqueleto dos caracteres da placa.

As etapas do processo que será desen-volvido são apresentadas na figura 1.

Figura 1: processo adotado para o reco-nhecimento de caracteres

Após a aquisição da imagem o pré-processamento é realizado por meio de sua transformação para escala de cinza, redução do ruído por meio de filtros passa-baixa, li-miarização para destacar os caracteres, e operações morfológicas para remover o ruído restante e completar falhas de segmentação. A seguir um processo extrai os caracteres e envia apenas o esqueleto para o treinamento da rede neural. O mesmo processo é adotado para o teste da rede neural que é realizado após o treinamento. Durante a realização das etapas anteriores, todas as informações obtidas serão armazenadas em uma base de dados.

Desta forma, buscamos uma estrutu-ra de um sistema de visão artificial, que reali-za as seguintes etapas: aquisição da imagem, pré-processamento, segmentação, reconhe-cimento e interpretação. Para ilustrar os processos envolvidos a placa da figura abaixo será utilizada para demonstrarmos as técni-cas básicas de processamento de imagem.

Figura 2: Exemplo em escala de cinza de uma placa de carro que será utilizada nos testes.

Primeiramente fizemos a limiariza-ção na imagem, limitando a intensidade de pixels a apenas aos níveis, preto e branco (0 e 1). Podemos notar que a imagem resultante, apresentada na figura 3a, contém alguns ruí-dos. Os pequenos detalhes da imagem digital são elementos de alta freqüência, enquanto que o fundo da imagem e os objetos grandes são elementos de baixa-freqüência. Desta forma utilizamos um filtro passa-baixa, para eliminar os objetos de alta freqüência, como visto na figura 3b.

Fig. 3a

Fig. 3b

Fig. 3c

Figura 3. A imagem da figura 1 foi tratada pelos processos, (a) binarização, (b) filtro passa-baixa para reduzir o ruído e (c) passa-alta para destacar as bordas.

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2.b Redes Neurais Artificiais

Redes Neurais Artificiais são técnicas com-putacionais que propõem um modelo mate-mático baseado na estrutura neural de or-ganismos inteligentes, mais especificamente o cérebro humano [Tafner et al., 1995]. Se-gundo Haykin [Haykin, 1999], sua principal característica é a capacidade de aprender a partir de exemplos e, assim, classificar novos padrões. Inicialmente desenvolvemos um protótipo, apresentado na figura 4, onde a imagem de um caractere, ou um desenho realizado pelo mouse é apresentado à janela principal, e em seguida reduzido às dimen-sões desejadas pelo usuário. O objetivo desta redução é diminuir o número de neurônios de entrada da rede neural, aumentando a ve-locidade de treinamento. Neste caso utiliza-mos uma rede de múltiplas camadas (MLP) que está sendo treinada por meio do algorit-mo back-propagation. Os resultados obtidos com a MLP serão comparados com aqueles obtidos por redes de uma camada, os per-ceptrons simples. Como observado por Gray et al [Gray, 1995], estas redes podem levar a bons resultados, mesmo sendo limitadas a problemas linearmente separáveis.

Figura 4. Protótipo desenvolvido para treinar uma rede neural a reconhecer caracteres.

3. Conclusão O projeto encontra-se na fase de desenvolvimento em que investigamos a me-lhor forma de destacar os caracteres da placa, enquanto analisamos em paralelo o treina-mento da rede a partir de nosso protótipo. O objetivo final será unificar todo procedimen-to em um programa de reconhecimento au-tomático. A eficiência das redes neurais está associada a sua capacidade de generalizar, ou seja, a capacidade de identificar caracteres de placas que não foram utilizadas no processo de treinamento. Esta capacidade determina-rá a escolha do tipo de rede.

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Referências bibliográficas

GONZALEZ, R.C.; WOODS, R. E. Processamento de Imagens Digitais. SP: Edgard Blücher Ltda, 1992.

GONZALEZ, R. C.; WOODS, R. E. Digital Image Processing. New Jersey: Prentice Hall, 2002.

HAYKIN, S. Neural Networks. New Jersey:. Prentice Hall. 1999.

GRAY, M. S., LAWRENCE, D. T., GOLOMB, B. A., SEJNOWSKI, T. J., A perceptron reveals the face of sex. Neural Computation. San Diego: University of California, 1995.

MARQUES FILHO; VIEIRA NETO, Processamento Digital de Imagens. RJ: Brasport, 1999.

TAFNER, M. A.; XEREZ, M.; FILHO, I. W. R., Redes Neurais Artificiais: Introdução e Prin-cípios de Neurocomputação. Blumenau: EKO: Editora da FURB, 1995.

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1. Introdução

As organizações modernas, indepen-dentemente de seu tamanho, buscam a todo instante serem eficazes visando sua perpe-tuação e crescimento. A maioria dos livros e artigos sobre estratégia empresarial, escritos ao longo dos tempos procuram, em versões infinitas, cada um ao seu modo, cada um ao seu tempo, responder a quatro questões fun-damentais:

• Como criar valor para o cliente e ga-nhar dinheiro;

• Como melhorar a competitividade diante dos atuais ou potenciais concorrentes;

• Como prever as mudanças no meio ambiente que, favorável ou desfavoravelmen-te, causarão impacto no seu negócio;

• Como escolher o melhor caminho a ser seguido no futuro e garantir o crescimento a longo prazo.

Para responder a estas quatro ques-tões, uma grande quantidade de pesquisado-res, obras, e classificações surgiu no decor-rer do tempo, na tentativa de explicar como a estratégia é formada, quais os principais parâmetros e variáveis e seus principais con-textos.

Bateman & Snell (1998) afirmam que, para sobreviver e prosperar, os admi-nistradores atuais têm de pensar e agir es-trategicamente, utilizar-se dos quatro tipos de desempenho que fornecem valor para o consumidor e que devem ser superados pela organização, que são: Qualidade, Custo, Ve-locidade e Inovação.

A importância da função planeja-mento, do pensamento estratégico e do es-trategista no Brasil deve-se principalmente ao fato de que, após 1994, com o processo de abertura econômica, iniciado no gover-no Collor, que tem resultado num aumento considerável da competição entre empresas, tornou seu ambiente cada vez mais dinâmico e hostil.

O modelo neo-liberal de economia adotado pelo governo brasileiro obriga as or-ganizações a projetarem mudanças em seus mercados, técnicas de mercado, produção, modus operandi da organização, estrutura e crescimento, relações com fornecedores e clientes, obtenção e capacitação de recursos humanos e liderança.

Em função deste ritmo de mudanças ser cada vez mais rápido, torna-se essencial desenvolver na organização a capacidade de elaboração de estratégias, com o sentido de buscarem ser competitiva, zelando pela sua permanência e fixação no mercado.

2. Metodologia

Visando atingir o objetivo propos-to, foi realizado um estudo de campo junto a cinco empresas de pequeno porte, com-preendendo os setores da indústria e servi-ços. Como visto na fundamentação teórica, um dos fatores de sucesso empresarial é a estratégia, assim, na escolha das empresas pesquisadas, foram procuradas aquelas re-conhecidas por estarem entre as melhores de seus respectivos segmentos. A identificação

ANÁLISE DO PROCESSO DE FORMAÇÃO DA ESTRATÉGIA NA PEQUENA EMPRESA – UM ESTUDO MULTI-CASO NA REGIÃO DE RIBEIRÃO PRETOAlexandre de Castro Moura Duarte¹Guilherme Vezzoni²Ailton Luiz Banzi Junior³

¹ Prof. Ms. Coordenador do Curso de Engenharia de Produção das Faculdades COC ² Aluno do curso de Engenharia de produção das Faculdades COC ³ Aluno do curso de Engenharia de produção das Faculdades COC

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das pequenas empresas bem sucedidas desta região foi facilitada devido o autor ser con-sultor do SEBRAE-SP, entidade que man-tém intenso contato com as mesmas.

A escolha destes segmentos se deve a importância dos mesmos nas cidades de Ribeirão Preto, Jardinópolis, Sertãozinho e Cravinhos e também ao número expressivo destes setores na quantidade de empresas do Estado de São Paulo, conforme ilustra a figura 1. O setor de comércio, apesar de ter 43% das empresas, não foi considerado, em função de a grande maioria de estes esta-belecimentos ter menos de 10 funcionários, caracterizando-se como micro empresas e, portanto, fugindo do escopo desse trabalho.

Figura 1 - Distribuição das micro e pe-quenas empresas do Estado de São Paulo por ramo de atividade. Fonte: SEBRAE - SP

Em Ribeirão Preto, estes dois setores estudados correspondem a 50% dos estabe-lecimentos empresariais, totalizando 5848 empresas, empregando cerca de 72.572 tra-balhadores, 68% dos empregos formais, con-forme mostram as figuras 2 e 3.

Figura 2 -Estabelecimentos empresariais de Ribeirão Preto. Fonte: CODERP-RP

Figura 3 - Emprego formal em Ribeirão Preto no ano de 2000. Fonte: CODERP-RP

2.1. Caracterização da Pesquisa

Conforme Gil (2002), de acordo com os objetivos, a pesquisa pode ser classifica-da em três grupos: exploratória, descritiva e explicativa. Neste trabalho foi utilizada a pesquisa exploratória. As pesquisas ex-ploratórias, na maioria das vezes, envolvem levantamentos bibliográficos, entrevistas com pessoas que tiveram experiência prá-tica com o problema pesquisado e análise de exemplos que ajudam a compreender o problema pesquisado. Este tipo de pesquisa quase sempre aparece na forma de uma pes-quisa bibliográfica ou de um estudo de caso.

Ainda de acordo com o autor acima, de acordo com os procedimentos técnicos, a pesquisa pode ser classificada em: bibliográ-fica, documental, experimental, ex-post-fac-to, levantamento, estudo de caso, pesquisa-ação. Para Triviños (1987), o estudo de caso é um tipo relevante de pesquisa qualitativa, que possui como diferença fundamental em relação a pesquisa tradicional o método, ou mecanismo de determinação da amostra. Enquanto que na pesquisa tradicional a es-tatística se transformou no meio principal para determinação da amostra, na pesquisa qualitativa não há, em geral, essa preocupa-ção. Procura-se uma espécie de representati-vidade do grupo maior de sujeitos que farão parte da pesquisa e, ao invés de aleatorie-

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As empresas pesquisadas têm como uma característica comum o reconhecido sucesso em seus setores, mais de 13 anos de atividades, número de funcionários superior ou igual a 30, atuam em setores altamen-te competitivos, estão divididas em setores conforme mostra a tabela 1 e foram selecio-nadas em função do relacionamento do pes-quisador com seus proprietários através do SEBRAE-SP.

2.3. Instrumentos de Coleta de Dados

O processo utilizado para coleta de dados foi o de entrevista semi-estruturada realizada com o empresário. Esta entrevista foi baseada em um roteiro pré-definido, divi-dido em 2 partes:

• Parte 1: referente aos dados gerais da empresa e empresários, tem como obje-tivo conhecer a empresa quanto a sua es-trutura organizacional, tamanho, mercado,

dade, a decisão dos sujeitos de pesquisa são intencionais, em função de características específicas.

Assim, este trabalho pode ser classi-ficado como sendo um estudo exploratório e multicaso observacional, pois, parte da análi-se do processo de formulação de estratégia de cinco empresas da região de Ribeirão Preto, tendo sua origem ao longo de processos de reflexão, de consultorias em pequenas em-presas e de leituras em bibliografias da área.

2.2. Escolha dos Casos de Estudo

Na definição da unidade caso, partiu-se para a procura de pequenas empresas que tivessem mais de 10 anos de existência, pois, passaram pelos 5 anos mais difíceis decor-rentes da abertura do negócio (segundo SE-BRAE-SP (1999)) e que fossem reconhecidas como empresas de sucesso em seu setor de atuação, seja em nível regional ou nacional.

Tabela 1 - Empresas pesquisadas

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foi de 20 horas, divididas em várias sessões de 2 a 3 horas. Para facilitar a compilação dos dados e aumentar a velocidade do pro-cesso, alguns empresários permitiram que fossem gravadas as entrevistas afirmando que tal procedimento em nada atrapalharia suas respostas, porém, alguns se opuseram ao fato. Nenhum deles fez qualquer objeção quanto à citação dos nomes de suas empresas e, apesar do extenso processo de entrevista, todos ajudaram e contribuíram para a reali-zação da mesma, não se opondo a nenhuma questão e também não tendo dificuldades em respondê-las.

Os dados coletados nas entrevistas estão reproduzidos de maneira que os co-mentários relevantes dos entrevistados estão entre aspas e em itálico. Os entrevistados, citados na tabela 1, são um dos sócios das empresas.

Além disso, durante o processo de en-trevista foram analisados dados numéricos, normas e políticas das empresas e outros do-cumentos internos. Outro fator importante foi o prévio conhecimento que os empresá-rios já tinham sobre o pesquisador, facilitan-do o diálogo e a transparência dos dados a serem coletados.

3. Visões da Estratégia

Segundo Quinn (1980), estratégia é um padrão ou plano que integra as principais metas, as políticas e a seqüência de ações de uma organização em um todo coerente. Me-tas ou objetivos dizem respeito à quantifica-ção de resultados em um espaço de tempo, mas, não dizem como serão alcançados. Polí-ticas são regras ou diretrizes que expressam o limite dentro dos quais a ação deve ocorrer, e programas estabelecem a seqüência pas-so a passo das ações necessárias para que se atinja os principais objetivos.

Andrews (1971) conceituou estratégia como sendo um padrão de objetivos, propó-sitos ou metas e os principais planos e polí-ticas para alcance dessas metas, colocadas

produtos/serviços e características do em-presário.

• Parte 2: referente à formação da es-tratégia na empresa. Aqui foram analisadas as principais características e variáveis cita-das nas 10 escolas de pensamento estratégico (MINTZBERG et al, 1998) com a finalidade de comparar a teoria e prática.

Farah & Cavalcanti (1998) citam que a entrevista é um dos instrumentos uti-lizados pelos analistas para levantamento de dados e possui as seguintes vantagens:

• permite que o entrevistado se sinta encorajado a apresentar críticas ou suges-tões;

• permite ao analista uma visão gené-rica dos problemas e novas diretrizes, princi-palmente quando efetuada junto à alta admi-nistração;

• permite ao entrevistado exprimir idéias, oralmente, em clima informal.

Como cuidados a serem tomados no processo, tem-se:

• necessidade de ressaltar ao entre-vistado a importância de sua contribuição;

• estabelecer um roteiro prévio da en-trevista;

• abster-se de anotar diante do en-trevistado, fazendo-o imediatamente após a entrevista para que não se percam detalhes;

• comparecer pontualmente à entrevista;• abster-se de fazer críticas à estrutura

existente, evitando julgamentos antecipados;• abster-se de formular promessas de

benefícios pessoais ou financeiros à pessoa do entrevistado;

• procurar não interromper o entre-vistado quando não esteja de acordo com as opiniões emitidas.

Foram necessárias várias horas de

entrevista com cada empresário, devido à ex-tensão do roteiro e do pouco tempo do pro-prietário em respondê-lo de uma só vez. O tempo médio de duração de cada entrevista

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tém os métodos de planejamento racional.• Evolucionária – apóia-se na me-

táfora da evolução biológica, substituindo a disciplina do mercado pela lei da selva.

• Processualista - ênfase na natureza imperfeita da vida humana, estratégia emer-ge de um processo pragmático de aprendiza-do e comprometimento.

• Sistêmica - relativista, propõe que os objetivos e práticas da estratégia depen-dem do sistema social específico no qual o processo de desenvolvimento da mesma está inserido.

A tabela 2 fornece uma visão sobre as quatro perspectivas genéricas descritas por Whittington (2002).

de tal forma, que definem em que negócio a empresa está ou quer estar e que tipo de em-presa ela é ou quer ser.

Para Chandler (1962), estratégia é a determinação de objetivos e metas de longo prazo de uma empresa, a adoção de cursos de ação e a alocação de recursos necessários para o alcance desses objetivos.

Henderson (1998) conceitua estraté-gia como a busca deliberada de um plano de ação para desenvolver e ajustar a vantagem competitiva de uma empresa.

Para Porter (1999), estratégia é criar uma posição exclusiva e valiosa, envolvendo um diferente conjunto de atividades.

Whittington (2002) divide o estudo de estratégia em quatro escolas, (aborda-gens) que respondem a duas questões funda-mentais: para que serve a estratégia e como ela é desenvolvida. Estas abordagens são descritas como:

• Clássica - mais antiga e influente con-

Tabela 2 - As Quatro Perspectivas da Estratégia

Fonte: Adaptado de Whittington (2002, p.46).

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• A escola de configuração - formula-ção de estratégia como um processo de trans-formação.”

O autor ainda divide as dez escolas em três agrupamentos. As três primeiras são de na-tureza prescritiva, mais preocupadas em como as estratégias devem ser formuladas do que em como elas são formuladas. As seis escolas seguintes consideram aspectos espe-cíficos do processo de formulação de estraté-gia, preocupando-se menos com a prescrição do comportamento estratégico ideal do que com a descrição de como as estratégias são, de fato, formuladas. O último grupo contém apenas uma escola, a da configuração, que é uma combinação das outras escolas, onde se busca a integração, agrupando o processo de formulação de estratégias, o conteúdo das mesmas, estruturas organizacionais e seus contextos.Como se pode observar, são várias as definições e incertezas que cercam este cam-po do conhecimento, o que caracteriza estas diversas escolas de estratégia e pensamento estratégico. Outro fator interessante de se observar é que, apesar de farta, a literatura existente enfoca apenas trabalhos voltados para as grandes empresas, que possuem car-acterísticas estruturais totalmente diferentes das pequenas. Após a revisão bibliográfica realizada neste trabalho, e a constatação das diversas abor-dagens sobre o tema Estratégia, optou-se pela abordagem e pela divisão feita por Mint-zberg (1998) por ser ampla, rica em detalhes, abrangendo todas as propostas apresentadas por outros autores. Foram ainda pesquisa-dos alguns trabalhos voltados para estraté-gia empresarial de pequenas empresas, im-portantes para a formulação do problema, relativos à sobrevivência organizacional das mesmas, materiais de treinamento utilizados pelo Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de São Paulo - SEBRAE-SP (1999) e reestruturação industrial de pequenas e médias empresas.

Mintzberg (1987, p.11) define estratégia através dos “5 P(s)”:

• “Estratégia é um plano, algum tipo de curso de ação conscientemente engendra-do, uma diretriz (ou conjunto de diretrizes) para lidar com uma determinada situação;

• Estratégia é um pretexto, apenas uma manobra específica com a finalidade de enganar o concorrente ou o competidor;

• Estratégia é um padrão, especifica-mente um padrão em um fluxo de ações, sig-nificando um comportamento consistente, intencional ou não;

• Estratégia é uma posição, uma ma-neira de colocar a organização no ambiente;

• Estratégia é uma perspectiva, seu conteúdo não apenas de uma posição escol-hida, mas de uma maneira enraizada de ver o mundo”.

Segundo Mintzberg et al (1998), existem na literatura dez escolas distintas de pensamento sobre a formação de estratégias, cada uma com um foco e uma perspectiva, todas importantes para o processo de forma-ção da estratégia, porém todas também com suas vantagens e desvantagens. São elas:

• A escola do Design - formulação de estratégia como um processo de concepção;

• A escola do Planejamento - formula-ção de estratégia como um processo formal;

• A escola do posicionamento - for-mulação de estratégia como um processo analítico;

• A escola empreendedora - formulação de estratégia como um processo visionário;

• A escola cognitiva - formulação de estratégia como um processo mental;

• A escola de Aprendizado - formula-ção de estratégia como um processo emer-gente;

• A escola do poder - formulação da estratégia como um processo de negociação;

• A escola cultural - formulação da es-tratégia como um processo de coletivo;

• A escola ambiental - formulação de estratégia como um processo reativo; e

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As tabelas 3 e 4 nos dão uma noção das dimensões - chave destas escola.

Tabela 3 -Dimensões - Chave das Escolas do Design, Planejamento, Posicionamento, Empreendedora e Cognitiva

Design Planejamento Posicionamento Empreendedora Cognitiva

Palavra Chave

Congruência/ encaixe,

competência distintiva,

SWOT, for-mulação/

Implemen-tação

Programação, orçamentação,

cenários.

Estratégia genérica, grupo estratégico, aná-lise competitiva, portifólio, curva de experiência.

Golpe ousado, visão, critério.

Mapa, quadro,

conceito, esquema,

percepção, interpre-

tação, racio-nalidade,

estilo.

EstratégiaPerspectiva planejada,

única.

Planos decom-postos em sub estratégias e programas.

Posições genéricas planejadas

(econômicas e competitivas),

também manobras

Perspectiva (visão) pessoal e

única como nicho

Perspectiva mental

(conceito individual)

Processo Básico

Cerebral, simples e informal, arbitrário, deliberado

(prescritivo)

Formal, decomposto, deliberativo (prescritivo)

Analítico, sistemático, delib-erado (prescritivo)

Visionário, intu-itivo, em grande parte deliberado

(como guarda chuva, embora

específico emer-gente) (descri-

tivo)

Mental, emer-gente (dominante ou forçado

Mudança ocasional Periódica, incre-mental

Aos poucos, freqüente

Ocasional, opor-tunista, revolu-

cionária

Enfrenta re-sistência ou construída

mental-mente

Agente Central

Executivo principal Planejadores Analistas Líder Mente

Fonte: Adaptado de MINTZBERG et al (1998, p.356).

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Tabela 4 - Dimensões - Chave das Escolas do Aprendizado, Poder, Cultural, Ambiental e Configuração

Aprendizado Poder Cultural Ambiental Configuração

Palavra Chave

Incrementalis-mo, estratégia, fazer sentido, espírito em-preendedor,

aventura, defensor,

competência essencial.

Barganha, con-flito, coalizão, interessados,

jogo político, es-tratégia coletiva,

rede, aliança.

Valores, cren-ças, mitos, cul-tura, ideologia,

simbolismo.

Adaptação, evolução,

contingên-cia, seleção,

complexidade, nicho.

Configuração, arquétipo,

período, estágio, ciclo de vida,

transfor-mação, revolução,

reformulação, revitalização.

Estratégia Padrões, única.

Padrões e posições políticos

e cooperativos

Perspectiva co-letiva, única. Nichos Qualquer um à

esquerda

Processo Básico

Emergente, informal,

confuso (de-scritivo)

Conflitivo, agressivo, con-

fuso (descritivo)

Ideológico, forçado, coleti-vo, deliberado

(descritivo)

Passivo, impos-to e emergente

(descritivo)

Intera-tivo, episódico (descritivo e prescritivo)

Mudança Contínua, incremental

Freqüente, pouco a pouco.

Não freqüente (enfrenta

resistência ideológica)

Rara e quântica

Ocasional e revolu-cionária

(outras vezes incremental)

Agente Central

Aprendizes (quem puder)

Qualquer um com poder, organização

inteira

coletividade “Ambiental”Especialmente

o principal executivo

Fonte: Adaptado de MINTZBERG et al. (1998, p.357).

4 - Análise Geral das Empresas Pesquisadas

A figura 4 resume e mostra as princi-pais variáveis encontradas na pesquisa. Nela podem ser comparadas as visões e demais as-pectos ligados à estratégia empresarial.

As visões da estratégia mais percebida nas entrevistas, de acordo com o pensamen-to dos empresários pesquisados, foram a da escola do design e empreendedora, porém, tanto a visão da escola do aprendizado e do planejamento foram citadas.

Todos empresários pesquisados sen-tem falta de um ferramental e metodologia simples, mas que apóiem no processo de ela-boração e implementação da estratégia, pois,

existe uma forte necessidade de se formalizar a visão. Talvez isso possa ser explicado pelo fato destas empresas estarem em fase de crescimento, serem referências em seus se-tores, e, portanto, terem necessidade de dar passos mais seguros, apoiando-se não só na intuição, mas também em dados quantitati-vos e ferramentas de gestão.

Verificou-se também que todas elas passaram por programas de qualidade. Algu-mas sistematizaram-no na forma de normas como a ISO 9000, e outras apenas implanta-ram sistemas de gestão com base na filosofia da qualidade, fato este que explicaria a pre-sença de ferramentas como SWOT, missão e política da qualidade.

Page 86: Revista Iniciação Cientifica COC

88 | Revista Multidisciplinar de Iniciação Científica

| ANÁLISE DO PROCESSO DE FORMAÇÃO DA ESTRATÉGIA NA PEQUENA EMPRESA – UM ESTUDO MULTI-CASO NA REGIÃO DE RIBEIRÃO PRETO |

DIMENSÕES CHAVES Frateschi Apis Flora Giglio & Bonfante Corrassol Consinco

Estratégia (principal

visão)

Perspectiva, Planejada, Única. Estratégia é um comportamento da organização em relação ao

ambiente

Perspectiva, Planejada,

Única. Estraté-gia é um com-portamento da

organização em relação ao

ambiente.

Perspectiva, Planejada, Única. Estratégia é um comportamento da organização em relação ao

ambiente

Visão, intuição, julgamento. A

estratégia existe na mente do líder

como perspec-tiva, especifica-mente um senso

de direção a longo prazo, uma

visão do futuro da organização.

Visão, intuição, julgamento A

estratégia existe na mente do líder como perspectiva, especificamente

um senso de direção a longo

prazo, uma visão do futuro da orga-

nização.

Processo Básico

Cerebral e visionário

Cerebral e visionário

Cerebral e ideológico

Visionário e cerebral

Visionário e cerebral

Agente Central

Executivo princi-pal, líder

Executivo prin-cipal, líder

Executivo princi-pal, líder

O estrategista, planejador Os planejadores

Liderança

Atenta para procedimentos,

atenta para análises, agente

de mudanças

Atenta para procedimentos,

atenta para aprendizagem,

agente de mudanças

Atenta para procedimentos, atenta ao apren-

dizado, atenta para análises

Atenta para procedimentos,

atenta para aprendizagem,

atenta para análise, agente de

mudanças

Atenta para procedimentos,

intuitiva e agente de mudanças

Processo decisório

Participativo, mais descentral-

izado

Centralizado nos sócios

Centralizado nos sócios

Centralizado na diretoria

Centralizado nos sócios

Plano Estra-tégico formal,

escritoSim Não Não Não Sim

Maior difi-culdade na estratégia

Implementação Implementação Implementação Implementação Elaboração

Ferramentas para plane-

jamento

Swot, Porter, orçamento,

custos

Pontos fortes e fracos, custos, faturamento.

Pesquisas, custos, lucro e fatura-

mento.

Orçamento, custos, legislação

e políticas.

Análise de custo, orçamento tendên-cias, faturamento bruto, lucro, cli-entes e concor-

rentes.

Estuda ambiente externo

Sim Sim Sim Sim Sim

Estuda ambiente interno

Sim Sim Sim Sim Sim

Horizonte planeja-mento

2 a 4 anos 1 a 2 anos 1 ano Acima de 4 anos 1 a 2 anos

Principal dificuldade da empresa

pessoas pessoas pessoas pessoas conhecimento

Figura 4 - Principais variáveis encontradas nas entrevistas

Page 87: Revista Iniciação Cientifica COC

89Revista Multidisciplinar de Iniciação Científica |

| ANÁLISE DO PROCESSO DE FORMAÇÃO DA ESTRATÉGIA NA PEQUENA EMPRESA – UM ESTUDO MULTI-CASO NA REGIÃO DE RIBEIRÃO PRETO |

As dificuldades enfrentadas pelas em-presas em relação à formação de pessoal foi um ponto comum que deve ser destacado. O fato é que devido o processo decisório ser centralizado, ele acarreta um grande desgas-te no dia-a-dia do empresário. Isto pode su-gerir uma necessidade de se incluir em um possível modelo de formação do pensamento estratégico, especificamente na implementa-ção da estratégia, ferramentas, mecanismos e processos de gestão de RH.

Acima de tudo, o pequeno empresá-rio mostra-se um visionário. São necessários para seu crescimento: bons recursos huma-nos, metodologias e recursos financeiros, as três maiores necessidades citadas. A forma-ção dos funcionários parece ser importan-te para a empresa e, quando se compara as dificuldades apresentadas, percebe-se que a empresa que mais utiliza mão de obra qua-lificada é a única que não coloca a variável “pessoal” como a principal dificuldade.

As ferramentas de análise financeira, como custos, lucro e orçamento, são bastante utilizadas. Notou-se também uma forte ten-dência a não buscar financiamento externo; o pequeno empresário prefere crescer mais len-tamente a se endividar e pagar juros abusivos.

A competitividade do setor e a forma-ção do empresário são fatores que influenciam a formação da estratégia e o modo de dirigir a empresa. As empresas industriais pesquisadas mostraram-se mais maduras e preparadas que as de serviço, isto poderia sugerir que a idade do setor influencie no processo estratégico.

O processo estratégico é intuitivo na maioria das empresas pesquisadas, há uma forte preocupação em estar em consonân-cia com o ambiente, o que demonstra que a adaptabilidade e a flexibilidade são fatores competitivos importantes para as pequenas empresas.

O horizonte de planejamento é coeren-te com o tipo de desenvolvimento do produto ou serviço e objetivo, a Frateschi e o Corassol têm projetos de prazos mais longos e por isso fazem análises de tempo maior.

5- Considerações Finais

O grande sucesso do Plano Real, com a estabilização da economia, mudou totalmente o cenário empresarial brasileiro, passando rapidamente de um ambiente estável para um ambiente dinâmico e de forte concorrência.

Diante destas mudanças, as empresas brasileiras se viram em um processo de luta pela sobrevivência em um tempo muito cur-to, principalmente as pequenas, que, apesar de serem mais flexíveis e velozes, dispunham de menos recursos e políticas de incentivos.

Nesta época iniciou-se um trabalho com o SEBRAE-SP, especificamente na região de Ribeirão Preto, visando o treinamento em implantação de sistemas de qualidade e técni-cas de gestão. Em observações práticas, pode-se notar que planejamento e estratégia eram fatores não muito relevantes na gestão em-presarial, e raras as empresas onde se podia encontrá-los, embora fosse uma característica comum nas empresas de sucesso da região.

O que é estratégia, como ela é formu-lada, implementada e quais as principais va-riáveis e características deste processo foram as indagações chaves dos trabalhos de cam-po. Encontrar uma maneira de ajudar um empresário em sua busca de sobrevivência e crescimento foi sempre uma grande procura.

Ao longo deste trabalho, foi possível visualizar e levantar uma grande quantida-de de informações e fatores relacionados à formulação do pensamento estratégico. Longe de esgotar este tema, e tão pouco de generalizar as conclusões obtidas, ele foi bastante útil no sentido de compreen-der aspectos da complexidade cognitiva do pensamento estratégico e de possibilidades de auxílio aos pequenos empresários brasi-leiros em sua luta diária pela manutenção de sua organização.

Baseado nas pesquisas de campo, e na experiência e conhecimento acumula-dos em trabalho com pequenas empresas, pode-se verificar que o processo estratégico

Page 88: Revista Iniciação Cientifica COC

90 | Revista Multidisciplinar de Iniciação Científica

| ANÁLISE DO PROCESSO DE FORMAÇÃO DA ESTRATÉGIA NA PEQUENA EMPRESA – UM ESTUDO MULTI-CASO NA REGIÃO DE RIBEIRÃO PRETO |

delas bastante disseminadas nas escolas do Design, Planejamento e Posicionamento, pois auxiliam na análise sistematizada dos problemas organizacionais.

Ao analisar o planejamento estratégi-co e compará-lo com o processo de estratégia na pequena empresa, ficou claro que plane-jamento estratégico não é estratégia, todas as pequenas empresas pesquisadas possuem uma estratégia, nenhuma delas possui plane-jamento estratégico, e nenhum empresário acredita que ele funcione. Ainda em relação ao planejamento estratégico, pode-se verifi-car na prática o que Mintzberg (1994) chama de falácias.

Quando perguntado sobre o horizon-te de planejamento e previsibilidade do am-biente, os pequenos empresários foram qua-se unânimes em sua resposta: impossível. Embora os resultados de suas ações tivessem perspectiva de tempo diferente, a falácia da predeterminação pode ser claramente vista nas palavras do empresário e estrategista Sr. Celso Frateschi, diretor e sócio proprietário da Indústrias Reunidas Frateschi Ltda, “pre-ver como as variáveis econômicas se compor-tarão em um ano é muito difícil, o próprio passado nos ensina.”

Em relação a falácia do desligamen-to, pude verificar que a figura do estrategis-ta sentado em sua escrivaninha elaborando planos para serem implementados pelos fun-

é abstrato, complexo, baseado em análises do ambiente, é dinâmico e fortemente ampa-rado em razão e intuição conforme mostra a figura 5.

Durante as entrevistas com os peque-nos empresários, ficou evidente a diferença entre planejamento e estratégia. Enquanto o primeiro é tratado como um processo de formalização das decisões, o segundo é visto como um guia para o futuro, uma posição no mercado, ou seja planejamento pode ter uma forte relação com a estratégia, mas não com a formação da mesma, conforme observado nos escritos de Mintzberg (1994). A tomada de decisões por parte do empresário significa fazer escolhas sobre a direção, identidade e ritmo que os negócios irão tomar e isto tal-vez sejam os propósitos do pensamento es-tratégico. Não se trata de generalização de resultados, existem muitas diferenças entre as empresas de pequeno porte, tratou-se com empresários de sucesso, que possuem nível de conhecimento e formação diferenciados.

Outro fator importante no grupo pesquisado foi o peso da intuição, fato este decorrente principalmente da vasta experiência dos empresários no ramo de negócio. Não se pode negar a importância deste fator na formação da estratégia, mas também ficou evidente que existe a necessidade do uso de ferramentas de análise e formalização do processo, sendo algumas

fig. 5 – Processo de formação da estratégia Elaboração própria

Page 89: Revista Iniciação Cientifica COC

91Revista Multidisciplinar de Iniciação Científica |

| ANÁLISE DO PROCESSO DE FORMAÇÃO DA ESTRATÉGIA NA PEQUENA EMPRESA – UM ESTUDO MULTI-CASO NA REGIÃO DE RIBEIRÃO PRETO |

lhá-lo, impedindo sua livre movimentação. Eles tem pouca necessidade de pessoas que os ajudem na formação da estratégia, neces-sitam de contrabalançar suas intuições por considerações mais sistemáticas das ques-tões, sentindo falta de planejadores aptos a isso.

Pode-se perceber que não existe uma visão única do processo de formação de es-tratégia, ela reflete os anseios, modelos men-tais, cultura, aprendizado e conhecimento do proprietário ou estrategista, não havendo, portanto, uma separação nítida, marcante, entre as dez escolas de pensamento estraté-gico estudadas.

Bethlem (2003) afirma que em sua experiência de consultoria, em mais de 300 casos descrevendo o processo estratégico em empresas brasileiras, não ter encontrado ne-nhum representante típico de qualquer das dez escolas.

Amoroso (2002) afirma que a arte de criar, desenvolver, implementar e monitorar estratégias competitivas vem sofrendo trans-formações profundas em razão das mudan-ças tecnológicas e da velocidade das informa-ções, de maneira que modelos tradicionais de planejamento como SWOT, Análise Estrutu-ral da Indústria e da Concorrência e outras, já não funcionam em muitas circunstâncias.

Existe uma grande necessidade de aquisição de conhecimento pelo pequeno empresário. A parceria com associações co-merciais e industriais, institutos de pesquisa e com as universidades podem auxiliar na obtenção de dados mercadológicos setoriais, na formação de pessoal e também na imple-mentação da estratégia, o que vem a ratificar a importância da formação de grupos de pes-quisa com foco na pequena empresa, como é o caso na EESC-USP do grupo dirigido pelo Prof. Edmundo Escrivão Filho e da FEA-USP, Ribeirão Preto, com o grupo do Prof. Dante Martineli. A realização de fóruns de discussão sobre economia, política e tecno-logias, que poderiam ser realizados por um conjunto de universidades e pesquisadores

cionários não existe, na pequena empresa o proprietário está presente em todos os luga-res, é ele quem implementa, quem assume a dianteira de todos os processos.

Devido a centralização do poder no pequeno empresário, estes além de estarem mais em contato com as operações estão tam-bém ligados com as importantes informações factuais, tendo assim autoridade para gerar a estratégia. São homens de ação, práticos, preferem o oral ao escrito, muito embora, algumas vezes, sintam falta do processo de formalização, acreditando que se os planos estiverem no papel possam assegurar o su-cesso de sua implementação.

Segundo Bennett et al (2001), o grande vilão da área da estratégia é a implementação e não o planejamento, mais ainda, o que distingue as empresas bem sucedidas é a forma como se organizam e operam para concretizar suas aspirações. O autor cita que em estudos recentes publicados pela revista Fortune, cerca de 70% dos fracassos dos presidentes não ocorrem por falha no pensamento estratégico, mas por falha na execução.

Formalizar o processo de pensamento do estrategista parece se um grande dilema e também a grande falácia da escola do pla-nejamento. A idéia de que sistemas formais podem substituir a criatividade e intuição é no mínimo grosseira. As pequenas empresas são em sua essência informais, e talvez esta seja uma das principais características que lhe provém velocidade e flexibilidade. O pe-queno empresário sente falta de alguém ou de alguma ferramenta que o auxilie na im-plementação, formalização, do pensamento estratégico. Nenhuma das ferramentas de análise propostas pelas escolas de estraté-gia pode prover criatividade e intuição, nada pode substituir a cabeça do estrategista.

Para Mintzberg (2004) na organiza-ção empreendedora, tudo gira em torno do executivo chefe, ele controla pessoalmente todas as atividades por meio da supervisão direta. O planejamento formal pode atrapa-

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92 | Revista Multidisciplinar de Iniciação Científica

| ANÁLISE DO PROCESSO DE FORMAÇÃO DA ESTRATÉGIA NA PEQUENA EMPRESA – UM ESTUDO MULTI-CASO NA REGIÃO DE RIBEIRÃO PRETO |

análise e formação da estratégia.O uso da intuição agregado a treina-

mento, informações, políticas públicas favo-ráveis, principalmente no que diz respeito ao financiamento a juros baixos de novas tecnologias, e auxílio na implantação das estratégias são fundamentais para o cresci-mento brasileiro, visto que as pequenas e mi-cro empresas são 98% das empresas do país, mantém 35 milhões de pessoas ocupadas, o equivalente a 59% da população empregada e respondem por 40% do produto interno

nacional (SEBRAE-SP, 2000).Neste trabalho pretendeu-se veri-

ficar como se dá processo de formação da estratégia junto aos pequenos empresários. Acredita-se serem importantes novas ex-plorações não só do tema, mas também do desenvolvimento de modelos de implantação da estratégia, de novos grupos de pesquisa, com foco em pequenas empresas, nas mais diversas áreas de conhecimento, que possam assessorar governos e instituições públicas e privadas a desenvolver políticas que estimu-lem o crescimento e melhoria da gestão deste grupo de empresas.

que, em parceria com as empresas juniores, viabilizariam a ajuda tão necessária à peque-na empresa, possibilitando uma diminuição na taxa de mortalidade das mesmas.

A figura 6 ilustra o que poderia ser um possível modelo do relacionamento entre instituições e as pequenas empresas no pro-cesso de estratégia.

A análise estratégica, papel desempenhado hoje exclusivamente pelo pequeno empresário passaria a contar com o apoio de instituições governamentais

e particulares de fomento aos pequenos negócios, através de análises ambientais e uso ferramentas de sistematização. A formação da estratégia ficaria a cargo do pequeno empresário, devido a sua experiência e conhecimento do ramo. Posteriormente o empresário e seu pessoal chave escolheriam estratégias possíveis que seriam decodificadas em planos, com o auxílio de empresas juniores, e posteriormente comunicados a toda equipe de pessoal da pequena empresa. Através dos resultados obtidos teríamos um feedback constante para retro-alimentar o processo de

fig. 6 - Modelo de formulação de estratégia na pequena empresa - Elaboração própria

Page 91: Revista Iniciação Cientifica COC

93Revista Multidisciplinar de Iniciação Científica |

| ANÁLISE DO PROCESSO DE FORMAÇÃO DA ESTRATÉGIA NA PEQUENA EMPRESA – UM ESTUDO MULTI-CASO NA REGIÃO DE RIBEIRÃO PRETO |

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Page 92: Revista Iniciação Cientifica COC

94 | Revista Multidisciplinar de Iniciação Científica

1- Introdução

O crescimento populacional desacele-rado, o desenvolvimento industrial e outras atividades humanas exigem cada vez mais o uso da água. É cada vez maior o consumo de água e conseqüentemente, geração de resí-duos líquidos que são muitas vezes lançados in natura nos corpos hídricos, alterando as-sim suas características naturais.

O lançamento de um efluente em um rio provoca um consumo de Oxigênio Dissol-vido (OD). Teores mínimos de OD nos rios são necessários para a existência da biodiver-sidade do corpo hídrico.

Após o lançamento de efluentes em um corpo hídrico, ocorre um processo na-tural de degradação da matéria orgânica

denominado de autodepuração. Essa auto-depuração é um fenômeno que consiste em um restabelecimento do equilíbrio do meio aquático através de mecanismos naturais, após alterações induzidas por lançamento de efluentes. A autodepuração converte os com-postos orgânicos em compostos inertes não prejudiciais na visão ecológica.

Antes do lançamento de uma car-ga poluidora, o corpo d’água, inicialmente, apresenta uma característica quanto ao seu ecossistema e após o descarte do efluente, essa característica é afetada, desequilibran-do o ecossistema que, posteriormente tende a se reorganizar.

A autodepuração é um processo natural que ocorre ao longo do espaço e do tempo e, considerando que o curso d’água

CARACTERIZAÇÃO DA SITUAÇÃO ATUAL DA QUALIDADE DA ÁGUA DE UM TRECHO URBANO DO RIBEIRÃO PRETO, RIBEIRÃO PRETO-SPRafael Baldini Teles¹Alexandre Silveira2

¹ Aluno do curso de Engenharia Ambiental – Faculdades COC² Professor - Faculdades COC/Ribeirão [email protected]

Figura 1.1 – Perfil das zonas de autodepura-ção ao longo do curso d’água. (Von Sperling)

Page 93: Revista Iniciação Cientifica COC

95Revista Multidisciplinar de Iniciação Científica |

se restabelece ao longo de um certo trecho, pode-se desmembrar esse reequilíbrio em diferentes zonas de autodepuração. O rio, em condições normais, apresenta-se em na zona de águas limpas, e logo após o descarte da carga orgânica, inicia-se o processo das zonas de degradação, zona de decomposição ativa e zona de recuperação, respectivamente, atingindo após, novamente a zona de águas limpas (Figura 1.1).

2- Objetivos

O objetivo geral deste trabalho é caracterizar qualitativamente um trecho do Ribeirão Preto após lançamento de efluentes, através de medidas das concentrações de oxigênio dissolvido (OD) e da demanda bioquímica de oxigênio (DBO). A partir desta caracterização, os dados serão utilizados para determinar a capacidade de autodepuração do curso d’água, utilizando o modelo de Streeter-Phelps.

Os objetivos específicos estão relacionados com a aplicação do modelo de Streeter-Phelps que necessita de parâmetros empíricos como dados de entrada. De uma maneira resumida, os objetivos específicos são:

1 Determinar os parâmetros necessários para a utilização do modelo: K1 – Coeficiente de desoxigenação e K2 – Coeficiente de Reaeração

2 Realizar medidas de OD e de DBO para auxílio da determinação dos parâmetros necessários.

3 Modelagem e simulação de cenários possíveis para a melhoria da qualidade de água do trecho em questão.

3- Metodologia

3.1- Caracterização da Área em Estudo

O Ribeirão Preto nasce na cidade de Cravinhos-SP, passa pelo distrito de Bonfim Paulista e encerra em Ribeirão Preto-SP, onde deságua no rio Pardo.

O projeto em estudo é realizado em um trecho do Ribeirão Preto (figura 3.1), que apresenta uma extensão de aproximadamente 300 metros e uma largura média de 10 metros. A primeira etapa consistiu na localização dos pontos de interesse: pontes para monitoramento e coleta de amostras, lançamento de efluente, galeria de água pluvial e outros.

Page 94: Revista Iniciação Cientifica COC

96 | Revista Multidisciplinar de Iniciação Científica

| CARACTERIZAÇÃO DA SITUAÇÃO ATUAL DA QUALIDADE DA ÁGUA DE UM TRECHO URBANO DO RIBEIRÃO PRETO, RIBEIRÃO PRETO-SP |

O trecho em estudo é circundado pela urbanização, mais especificamente entre os bairros Vila Tibério (jusante à esquerda), Vila Virgínia (ao lado esquerdo), Jardim Ma-ria Goreti (montante à esquerda), Vila Santa Terezinha (montante à direita), Jardim Su-maré (ao lado direito) e o Centro da cidade (jusante à direita).

3.2- Análise das Coletas

As coletas serão realizadas a fim de se analisar as condições em que o trecho do rio se encontra, mesmo sendo visível em um primeiro instante que, o trecho em estudo se encontra em condições deploráveis. Mesmo assim, é comum encontrar moradores vizi-nhos pescando às margens do rio, entrando em contato direto com a água, sem nenhum tipo de precaução e consciência (figura 3.3).

No trecho em estudo foram localiza-dos lançamentos pontuais de rede de esgoto e de galeria de águas pluviais, além de uma suposta mina d’água (segundo informação de moradores), conforme já indicado na fi-gura 3.1.

Serão realizadas 6 coletas nos pontos 1, 3, 4, 5, 6 e 7 (trecho a montante do ponto 6), conforme Figura 3.1. Após as coletas se-rem devidamente realizadas, serão efetuadas análises de OD e DBO e determinadas as va-zões dos lançamentos e do rio.

4- Resultados e conclusão

O trabalho está em andamento e atualmente passa pela etapa de coletas e análises de amostras de águas do trecho em estudo. Deste modo, não foi possível de incluir os dados. Conseqüentemente, esse resumo expandido não contém os resultados e conclusões, que constarão no trabalho completo que será enviado dentro do prazo determinado.

A análise dos resultados será feita abordando os seguintes aspectos:

1. Concentração de OD e DBO do rio (pontos 1, 3, 4, 5, 6 e 7) – enquadramento do corpo de água segundo a resolução CONAMA nº 357, de 17 de março de 2005

2. Concentração de DBO dos lança-mentos de efluente (pontos 3 e 5) – caracte-rização do efluente: doméstico ou industrial

3. Determinação de K1 e K2

4. Medição da vazão do trecho do rio

5. Simulação dos níveis de OD e DBO em função do tempo e do espaço a jusan-te dos lançamentos utilizando o modelo de Streeter-Phelps para prever a distância ne-cessária para que o Ribeirão Preto recupere a carga assimilada

Portanto, cabe ao trabalho proposto, determinar a distância necessária para a autodepuração.

Page 95: Revista Iniciação Cientifica COC

97Revista Multidisciplinar de Iniciação Científica |

| CARACTERIZAÇÃO DA SITUAÇÃO ATUAL DA QUALIDADE DA ÁGUA DE UM TRECHO URBANO DO RIBEIRÃO PRETO, RIBEIRÃO PRETO-SP |

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Page 96: Revista Iniciação Cientifica COC

98 | Revista Multidisciplinar de Iniciação Científica

1. Introdução

As atuais discussões sobre os problemas relacionados ao meio ambiente e seus reflexos na qualidade de vida de diversas comunidades e sobre o futuro do planeta têm levado em conta, cada vez mais, o papel dos recursos geológicos, pedológicos, hídricos, atmosféricos e biológicos, nos quais ocorrem as maiores agressões e impactos ao meio ambiente (WHITE et al, 1992).

Uma bacia hidrográfica deve ser entendida como sistema geomorfológico drenado por cursos de água, ou por um sistema de canais conectados, que convergem, direta ou indiretamente, para um rio principal ou para um espelho de água, constituindo-se, assim, em uma unidade sistêmica ideal para o planejamento do manejo integrado dos recursos naturais (BERTONI & LOMBARDI NETO, 1990). A idéia de bacia hidrográfica está associada à noção da existência de nascentes, divisores de águas e características dos cursos de água, principais e secundários, denominados afluentes e subafluentes.

Os cursos de água transportam detritos (sólidos) que têm origem principalmente na erosão superficial do solo, ou também chamada de erosão laminar. Nesse tipo de erosão as partículas do solo desprotegidas, são desagregadas pelo pisoteio, pelo vento e pelo impacto da chuva. O fenômeno denominado “splash” (erosão por impacto das gotas de chuva) é responsável pela desagregação das partículas de solo pela chuva. O efeito do

“splash” no solo é potencializado quando a cobertura vegetal é escassa e a intensidade de chuva é alta, aumentando a susceptibilidade do solo à erosão. O papel do “splash” varia não só com a resistência do solo ao impacto das gotas de chuva, mas também com a própria energia cinética das gotas de chuva. Dependendo da energia aplicada à superfície do solo, ocorrerá, com maior ou menor facilidade, a ruptura dos agregados e o espalhamento de pequenas partículas, formando crostas que provocam a selagem do solo (GUERRA et al., 1999).

Os sedimentos removidos de uma bacia durante chuva intensa podem ser transportados e ficar depositados em um curso de água e, ali, permanecerem até outra precipitação, quando serão novamente transportados para jusante (LOPES, 1980). A principal causadora desse problema é a erosão hídrica, processo no qual ocorre o desprendimento e transporte de partículas do solo causado pela água. Constitui-se em uma das principais causas de deterioração acelerada das terras utilizadas na agricultura. Segundo LE BISSONNAIS & SINGER (1988), a erosão hídrica resulta da interação de forças ativas como: as características da chuva, a declividade do terreno e a capacidade do solo em absorver água; e de forças passivas, como: a resistência do solo à ação erosiva da água, os métodos de cultivo e a densidade da cobertura vegetal. A resistência do solo determina a sua erodibilidade, que é a tendência inerente do solo de erodir-se em

ELABORAÇÃO DE UMA CARTA DE SUSCEPTIBILIDADE À EROSÃO DA MICROBACIA DE SÃO SIMÃO – SP ATRAVÉS DA EQUAÇÃO UNIVERSAL DA PERDA DE SOLOS ACOPLADA AO SISTEMA DE GEOPROCESSAMENTO SPRING

Marcelo Abraão Figueiredo¹Ricardo Adriano Martoni Pereira Gomes²

¹ Aluno do do Curso de Engenharia Ambiental - Faculdades COC - [email protected]² Orientador e Professor Doutor, docente das Faculdades COC - [email protected]

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diferentes proporções, devido unicamente às diferenças peculiares de cada classe de solo.

A segunda fase da erosão hídrica é caracterizada pela remoção da camada superficial do solo. Esse tipo de erosão está associado ao escoamento superficial, que muitas vezes é referenciado como escoamento laminar. Em contraste com o impacto das gotas, o escoamento laminar tem pequena capacidade de desestruturação e alta capacidade de transporte. (BRADFORD et al., 1987; GROSH & JARRETT, 1994). O impacto das gotas sobre o solo abre pequenas crateras e partículas são desprendidas e lançadas a 1,0 m de altura e 1,5 m de raio de distância. BERTONI & LOMBARDI NETO (2005) comentam que pesquisadores têm constatado que em uma única chuva ocorre o desprendimento de mais de 200 toneladas de partículas de solo por hectare.

Nesse contexto, a utilização de modelos matemáticos para avaliar a perda de solo de uma área cultivada vem se tornando uma prática de grande utilidade para o planejador conservacionista e para os estudos ambientais (GAMEIRO, 1997). O desenvolvimento de equações para calcular a perda de solos iniciou-se por volta de 1940 no Corn Belt, Estados Unidos. O processo para estimar a perda de solo nessa região entre 1940 e 1956 era conhecido como o método do plantio em declives (GAMEIRO, 1997). Durante anos, diversas tentativas foram realizadas com a finalidade de se quantificar o efeito da erosão em conjunção com as práticas de plantio (HUDSON, 1981).

BERTONI & LOMBARDI NETO (2005), descrevem a evolução dos modelos matemáticos para avaliação de perdas de solo e a introdução de outras variáveis tais como: práticas conservacionistas, erodibilidade do solo, precipitação. Estas variáveis foram sendo estudadas e introduzidas visando adaptar o modelo do Corn Belt a outras áreas cultivadas. Somente a partir da criação, em 1954, do Runoff and Soil – Loss Data Center, pelo Agricultural Research Service dos Estados Unidos da América, em cooperação

com a Universidade de Purdue, é que foram compilados novos dados e acrescentados aos já obtidos em épocas anteriores, para posteriormente ser desenvolvida a equação mais difundida atualmente, a Equação Universal de Perdas de Solo (EUPS) (CAVALIERI, 1994).

A Equação Universal de Perdas de Solo (Universal Soil Loss Equation - USLE) é um modelo elaborado para predizer a perda de solo por erosão em culturas específicas com diferentes gerenciamentos de sistemas agrários. De acordo com WISCHMEIER & SMITH (1978), o modelo proposto pela EUPS superou muitas das limitações encontradas nas equações anteriormente propostas.

Segundo GAMEIRO (1997), a sensibilidade de modelos desse tipo é definida como uma medida dos efeitos da variação de um determinado fator no resultado final do modelo, e é uma importante ferramenta na formulação, calibração e verificação de modelos matemáticos. Ainda GAMEIRO (1997), a forma como os fatores comprimento e declividade de rampa são introduzidos no modelo assumem grande importância quando o assunto é a sua sensibilidade.

Em frente a essa realidade o presente trabalho tem a finalidade de realizar um estudo para avaliar a suscetibilidade à perda de solo por erosão laminar na Bacia do Córrego São Simão, integrando-o com diagnóstico ambiental da microbacia do córrego em estudo, visando subsidiar o planejamento e fornecimento de diretrizes ao gerenciamento da bacia, utilizando como ferramenta o geoprocessamento.

2. Material e métodos

2.1. Caracterização da área2.1.1. Aspectos geográficos gerais

A bacia do córrego São Simão está totalmente inserida no município de São Simão – SP, e apresenta uma área de 52,8 Km2, como pode ser visto nas Figuras 2.1 e 2.2.

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A nascente do córrego está localiza-da na latitude 238467,3 UTM e longitude 7620130,9 UTM (fora da área urbana da ci-dade), no seu trajeto ele atravessa a área ur-bana, e recebe efluentes industriais e domés-ticos. Sua foz está na latitude 230037,5UTM e longitude 7628438,5 UTM, na confluência com o Ribeirão Tamanduá. O município está localizado no nordeste do Estado de São Paulo, e faz parte da região administrativa de Ribeirão Preto, especificamente na área co-nhecida como Alta Mogiana. Possui cerca de 629 km2, e sua área urbana conta com apro-ximadamente 5,758 km2, e uma população de 14400 habitantes (SEADE, 2004). Tem como limite ao norte o município de Serra Azul, a leste o município de Santa Rosa de Viterbo, ao sul Santa Rita do Passa Quatro e a oeste Luis Antonio (Figura 2.2). Está dis-tante cerca de 300 km da capital e a 50 km de Ribeirão Preto por via rodoviária. (GONÇAL-VES E DIBIAZI, 2005).

2.1.2. Pedologia

Predominam os solos do tipo areno-so (cerca de 50,8% da área da bacia – Areia Quartzosa Profunda), sendo o restante da área ocupado por: Latossolo Roxo 23,5%, So-los Litólicos 15,3%, Latossolo Vermelho Es-curo 7,8%, Tipos de terreno 1,7% e Latossolo Vermelho Amarelo 0,9%.

Para essa determinação foram utili-zadas as cartas pedológicas de Ribeirão Preto e Descalvado, escala 1:100.000 (INSTITUTO AGRONÔMICO DE CAMPINAS,1983).

2.1.3. Uso e Ocupação do Solo

Na bacia do córrego São Simão, grande parte da área (69% da área total) é ocupada por pastagem, silvicultura e atividades agrícolas. Além disso, existe um distrito industrial, áreas de várzea, e de vegetação nativa, e também atividade de mineração no noroeste da bacia.

Figura 2.1. - Bacia Hi-drográfica do Córrego São Simão e a localiza-ção do Município de São Simão (GONÇALVES E DIBIAZI, 2006).

Figura 2.1. - Bacia Hidrográfica do Córrego São Simão e a localização do Muni-cípio de São Simão (GONÇALVES E DIBIAZI, 2006).

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2.2. Material cartográfico

O material cartográfico de base uti-lizado na presente pesquisa corresponde a mapas e levantamentos de procedências variadas. Devido à diversidade de origens e finalidades para as quais foram confecciona-dos, apresentam diferentes graus de detalha-mento, levantado e publicado em várias esca-las e em datas não coincidentes.

Foram utilizadas as seguintes cartas: carta planialtimétrica Descalvado, escala 1:100.000, (IAC, 1983); Folha Ribeirão Preto Escala 1:100.000 (IAC, 1983). Também foi utilizada a Carta do Brasil, folha topográfica de Cravinhos, Rio de Janeiro (IBGE, 1977), escala 1:50.000 e Carta do Brasil, folha to-pográfica de Luiz Antonio, Rio de Janeiro, (IBGE,1977), escala 1:50.000.

2.3. Material de sensoriamento remo-to e softwares

Os softwares utilizados neste trabalho foram: sistemas de informações geográficas SPRING 4.3.3. e SCARTA 4.3.3..

O SPRING é um SIG (Sistema de In-formações Geográficas) no estado-da-arte com funções de processamento de imagens, análise espacial, modelagem numérica de terreno e consulta a bancos de dados espa-ciais.

O SCARTA nada mais é do que um gerador de cartas que faz interligação com o módulo principal SPRING. Esta interligação é feita através do gerenciador de dados (ban-co de dados), portanto o gerador de cartas não terá nenhuma função para reprocessar e alterar os dados. A responsabilidade do gerador de cartas será de edição e obtenção de uma saída de apresentação gráfica de alta qualidade.

Planilhas eletrônicas como o Micro-soft® Office Excel 2003 para Windows, tam-bém tiveram sua utilidade durante a pesqui-

Figura 2.2. – Localização da Bacia Hidrográfica do Córrego São Simão e divisas do Município de São Simão (GONÇALVES E DIBIAZI, 2006).

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Onde EI é a média mensal do índice de erosão (MJ.mm/ha.L), r é a precipitação média mensal em milímetros e P é a precipi-tação média anual em m ilímetros.

EI = 67, 355* (r2/P)0,85 (2.2)

Onde EI é a média mensal do índice de erosão, MJ/ha mm; r é a precipitação mé-dia mensal em milímetro; P é a precipitação média anual mm/ano.

Para um longo período de tempo (geralmente utiliza-se 22 anos) essas duas equações estimam com relativa precisão os valores médios de EI de um local, usando so-mente totais de chuva, os quais são disponí-veis para muitos locais.

Foram utilizados dados de precipi-tação media mensal de duas estações mete-orológicas localizadas em diferentes pontos da bacia. A primeira estação continha dados de um período de 54 anos de medições, en-quanto a segunda continha um período de 33 anos. Isso proporcionou maior confiabilida-de aos resultados obtidos.

sa na execução de cálculos e manipulação de arquivos numéricos segundo as exigências do modelo USLE.

2.4. Obtenção dos parâmetros da EUPS

2.4.1. Obtenção do fator R

O fator R foi obtido a partir de dados pluviométricos médios mensais da região de estudo, os quais se encontram na Tabela 2.1 e Tabela 2.2. Nestas mesmas tabelas apresen-tam-se os cálculos do EI30 mensais segundo KUNTSCHIK (1996) Equação 2.1, e BERTO-NI & LOMBARDI NETO (1990) Equação 2.2, encontradas abaixo, juntamente com o valor do fator R anual considerado constante e não em formas de isolinhas de precipitação dada as dimensões da microbacia e, também a quantidade reduzida de pontos de monitora-mento nesta bacia. Apenas duas estações se encontram no local.

EI = 89, 823 (r2/P)0, 759 (2.1)

MESES PRECIPITAÇÃO (mm)

EI30 (MJ.mm/ha.L) (KUNTSCHIK, 1996)

EI30 (MJ.mm/ha.L) (BERTONI & LOM-

BARDI NETO, 1990)

Janeiro 269,3 1715,03 1831,58

Fevereiro 204,1 1125,81 1143,14

Março 163,8 806,43 786,73

Abril 78,7 264,98 226,21

Maio 59,2 171,90 139,33

Junho 31,1 64,82 46,74

Julho 25,1 46,81 32,47

Agosto 23,6 42,51 29,14

Setembro 60,9 179,67 146,40

Outubro 134,7 599,18 564,09

Novembro 173,9 882,73 870,56

Dezembro 264,6 1670,07 1777,89

TOTAL 1489,1 - -

Fator R anual (soma dos EI30 mensais) 7569,93 7594,29

Tabela 2.1. - Distribuição da precipitação média mensal na área de estudo (SIGRH, 2004) e cálculo do EI30 para cada mês e valor do fator R anual (período de 54 anos).

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2.4.2. Obtenção do fator K

Os valores do fator K para cada tipo de solo da região de estudo foram obtidos do livro Conservação do Solo (2005) de BER-TONI e LOMBARDI NETO. Eles estudaram 66 perfis de solo, para dois grupamentos de solo que ocorrem no estado de São Paulo, e os analisaram de acordo com o método de MIDDLETON com algumas modificações.

MIDDLETON, um dos primeiros a tentar idealizar um índice de erodibilidade do solo baseado em suas propriedades físi-cas, encontrou que a relação de dispersão, a relação de colóide/umidade equivalente e a relação de erosão foram os primeiros crité-rios que diferenciam os solos com respeito à erosão. Estabeleceu um valor-limite para se-parar solos erosivos daqueles pouco erosivos. Assim, solos que apresentassem a relação de erosão menor que 10 e a relação de disper-são menor do que 15 eram considerados não erosivos.

No caso de BERTONI & LOMBARDI

NETO (2005) foram consideradas, para cada horizonte as seguintes propriedades: argila natural, argila dispersa e umidade equivalen-te, tendo sido estudados somente os horizon-tes A e B de solos com B textural e B latossó-lico, estabelecendo-se as seguintes relações: (a) relação de dispersão – definida como a relação teor de argila natural/teor de argila dispersa, (b) relação argila dispersa/umida-de equivalente; (c) relação de erosão – razão entre relação de dispersão e a relação argila dispersa/umidade equivalente.

Verifica-se, por esses dados de BER-TONI & LOMBARDI NETO (2005), o com-portamento dos solos com B textural e B latossólico, com relação à erosão, tanto nos horizontes superficiais como nos subsuperfi-ciais, indicando que, de maneira geral, os so-los podzolizados são mais suscetíveis à ero-são (BERTONI & LOMBARDI NETO, 2005). O manejo do solo a ser adotado nos latossolos deve ser diferente daquele dos podzolizados, pois estes são mais facilmente erodíveis.

Os valores de K, para cada tipo de solo

MESES PRECIPITAÇÃO (mm)

EI30 (MJ.mm/ha.L) (KUNTSCHIK, 1996)

EI30 (MJ.mm/ha.L) (BERTONI & LOM-

BARDI NETO, 1990)

Janeiro 273,4 1716,42 1833,24

Fevereiro 223,7 1265,63 1303,29

Março 160,6 765,17 741,80

Abril 80,7 269,41 230,45

Maio 54,6 148,63 118,39

Junho 35,2 76,41 56,20

Julho 25,8 47,62 33,09

Agosto 28,9 56,61 40,17

Setembro 68,4 209,49 173,88

Outubro 134,3 583,18 547,26

Novembro 178,0 895,07 884,19

Dezembro 269,5 1679,61 1789,27

TOTAL 1533,1 - -

Fator R anual (soma dos EI30 mensais) 7713,25 7751,22

Tabela 2.2. - Distribuição da precipitação média mensal na área de estudo (SIGRH, 2004) e cálculo do EI30 para cada mês e valor do fator R anual (período de 33 anos).

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O valor de Z = 0m, previamente co-tado, deu aos divisores principais e secun-dários o comprimento de rampa 0m, pois o caminho percorrido pelas águas inicia-se no divisor de água e vai até o rio. Pelo comando mosaico, copiaram-se os rios para dentro do plano de informação e foi atribuída a esses vetores a função de linhas de quebras.

Utilizando a ferramenta MNT, co-mando mapa de distância, criou-se o PI na forma de grade retangular, com resolução em X(10m) e Y(10m). Essa grade de distân-cia teve como ponto de partida os divisores de água (0m) até as linhas de quebras carac-terizadas pelas linhas da hidrografia.

Para geração do fator S, a partir das amostras da altimetria, na categoria Relevo - MNT, através do comando MNT - Geração de grade triangular, criou-se a grade triangular (TIN) usando os rios como linha de quebra. A partir dessa grade, e com o comando MNT - Geração de grade retangular, gerou-se uma grade altimétrica com resolução X(10 m) e Y(10 m). A partir dessa grade retangular al-timétrica, usando o comando MNT - Declivi-dade, com as opções de entrada grade, saída declividade, unidade porcentagem, gerou-se o PI Declividade, com resolução X(10 m) e Y(10 m). O mapa de declividade foi obtido através do “fatiamento” da grade numérica, ou seja, da associação dos intervalos da grade a classes temáticas.

As grades retangulares do compri-mento de rampa e declividade foram intro-duzidas em um programa LEGAL. Esse pro-grama gerou na categoria Fator LS - MNT, na forma de grade retangular, com resolução de X(10 m) e Y(10 m), o PI Fator LS.

Ressalta-se que, na determinação do L, levou-se em conta a encosta natural, sem considerar a quebra da circulação da água por barreiras, como mata ou práticas conser-vacionistas.

2.5. Cálculo do potencial natural de erosão

O potencial natural à erosão é defini-

existente na área, foram obtidos por meio da tabela definida a partir das classificações sugeridas por SCOPEL & SILVA (2001) e BERTONI & LOMBARDI NETO (2005), que atribuem valores de erodibilidade corres-pondentes a cada classe de solo, levantados a campo, por meio de amostras georreferen-ciadas, determinando-se de forma indireta pelo do nomograma, desenvolvido por WIS-CHMEIER & SMITH (1965) APUD RESEN-DE & ALMEIDA (1985), cujos valores foram adaptados para a microbacia do córrego São Simão (Tabela 2.4.). Os valores de K utiliza-dos na EUPS são do horizonte superficial do solo, pois o objetivo desta é a quantificação da erosão laminar presente na bacia.

A espacialização do fator K foi fei-ta através da criação de um PI no SPRING (INPE, 2007) denominado solo onde foram digitalizadas as distintas manchas de solo abrangidas pela área de estudo, sendo cada uma delas vinculada ao valor correspondente do fator K. O PI solo foi então convertido em arquivo matricial para posterior cruzamento com os outros fatores.

2.4.3. Obtenção dos fatores L e S

Para cálculos do LS utilizaram-se a equação citada por BERTONI & LOMBARDI NETO (2005).

LS = 0,00984 * L 0,63* S 1,18 (2.3)

Onde L é o comprimento de rampa em m e S é o declive em %.

Para determinação do LS, primeiro procedeu-se à identificação individual do L (comprimento de rampa) e do S (declivida-de %). Para determinação do L, criou-se uma categoria MNT, que recebesse as informa-ções. Criou-se um PI dentro dessa categoria e pela ferramenta Editar, comando Vetorial do SPRING, no qual foram traçados manual-mente todos os divisores de água principais e secundários do retângulo do projeto (bacia e em torno).

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tros acima, gerando uma grade onde cada ponto da superfície está associado ao valor potencial natural de erosão.

De posse do mapa resultante, em modelo numérico de terreno, foi feito seu fa-tiamento, ou seja, foram definidas as classes de potencial natural à erosão na microbacia, possibilitando uma melhor visualização dos locais onde a probabilidade de ocorrer ero-são é maior.

3. Resultados e discussão

3.1. Fator Erosividade das chuvas (R)

BERTONI E LOMBARDI NETO (1990) dizem que quando outros fatores, exceto a chuva, são mantidos constantes, as perdas de solos ocasionadas pelas chuvas em terrenos cultivados são proporcionais ao va-lor do produto de sua energia cinética e in-tensidade máxima em 30 minutos. Esse efei-to representa a interação que mede como a erosão por impacto, o salpico e a turbulência se combinam com a enxurrada para trans-portar as partículas de solo desprendidas (RESENDE E ALMEIDA, 1985).

Este fator é dimensional e permite a avaliação do potencial erosivo das preci-pitações de determinado local, além de ser imprescindível aos cálculos dos fatores K (erodibilidade dos solos) e C (manejo das culturas) dessa equação. Com a determina-ção dos valores de erosividade ao longo do ano, é possível identificar os meses nos quais os riscos de perdas de solo são mais eleva-dos, razão por que exerce relevante papel no planejamento de práticas conservacionistas fundamentadas na máxima cobertura do solo (plantio direto) nas épocas críticas de maior capacidade erosiva das chuvas.

Na presente microbacia existem duas estações meteorológicas, o que é extre-mamente benéfico, pois oferece grande dis-ponibilidade de dados para diversos estudos, principalmente para este, que necessita de dados com extrema segurança, possibilitan-

do pelas características pluviométricas, pe-dológicas e geomorfológicas combinadas. A instabilidade emergente, definida pelos fato-res antrópicos, combina o potencial natural com o uso empregado ao solo.

Para estimar o Potencial Natural de Erosão (PNE) na bacia foi utilizada a seguin-te equação:

PNE= R . K . LS (2.4)

Onde R é a erosividade da chuva anu-al, K é a erodibilidade do solo e LS é uma va-riável calculada a partir do comprimento da encosta L.

Neste trabalho o valor de R corres-ponde a 7569,93 MJ.mm/ha.L. A erodibili-dade do solo (K), ou seja a resistência deste à ação da chuva, depende diretamente do tipo de solo em questão. Para cada tipo de solo há um valor associado de acordo com a Tabela 2.4..

A partir do mapa de altimetria, gerou-se um modelo numérico de terreno utilizan-do-se o interpolador TIN (grade triangular). Desta grade, gerou-se outra grade de decli-vidade e um mapa temático com classes de declividade. O valor do comprimento da en-costa (L), ou percurso da água, foi obtido a partir de um mapa de distância entre o limite da bacia e os níveis mais baixos de altime-tria, resultando em um modelo numérico de terreno.

A partir desta formulação metodoló-gica, é apresentado a seguir um programa em LEGAL que realiza este procedimento. O LEGAL foi utilizado para:

• Converter o mapa de solos em uma grade de valores de erodibilidade, utilizando-se a função PONDERE;

• Converter o mapa de classes de de-clividade em uma grade de valores médios de declividade, utilizando o valor central de cada intervalo, também através da função PONDERE;

• Aplicar a equação universal da per-da de solos considerando todos os parâme-

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do uma gestão mais adequada da bacia.O valor de erosividade encontrado na

bacia do São Simão que foi utilizado é igual a 7569,93 MJ.mm/ha.L. Este foi utilizado, pois oferecia mais precisão na base de cál-culos, devido ao período de medições de 54 anos, realizada em uma das estações meteo-rológicas encontrada na bacia. Esse valor está dentro do intervalo encontrado para as con-dições brasileiras que vai de 5000 MJ.mm/ha.L a 12000 MJ.mm/ha.L (COGO, 1988).

3.2. Fator Erodibilidade dos solos (K)

As propriedades físicas, químicas, biológicas e mineralógicas dos solos influen-ciam no estado de agregação das partículas, aumentando ou diminuindo a resistência do solo à erosão. Com isso, cada tipo de solo apresenta um valor erodibilidade diferen-te, pois mesmo que os fatores declividade, precipitação, cobertura vegetal e práticas conservacionistas fossem iguais em solos ar-gilosos e arenosos, os últimos, devido às suas características físicas e químicas, são mais susceptíveis à erosão.

As propriedades do solo que influen-ciam na erodibilidade são as que afetam a velocidade de infiltração, a permeabilidade, a capacidade de armazenamento de água e oferecem resistência às formas de dispersão, salpico, abrasão, transporte e escoamento pelas chuvas (LARIOS, 2003).

Os solos menos erodíveis são os La-tossolos, que são solos maduros e profun-dos, isto é, mais intemperizados. À medida que o grau de maturidade e profundidade vai diminuindo, o grau de erodibilidade vai au-mentando. Dessa forma, na seqüência apare-cem as Areias Quartzosas e por último, com maior grau de erodibilidade, estão os Solos Litólicos.

O resultado da espacialização dos va-lores de K está diretamente relacionado ao mapeamento dos tipos de solos presentes na bacia, pois estes valores são diretamente dependentes das propriedades intrínsecas de

cada classe de solo.O processo de classificação dos valo-

res de erodibilidade para solos do Estado de São Paulo está em expansão, porém de forma demorada.

Não existem valores de erodibilidade para os solos encontrados na microbacia do São Simão. Devido a isso, os valores utiliza-dos nesse trabalho foram extraídos de outros trabalhos, de renomados autores como BER-TONI E LOMBARDI NETO.

Esta falta de classificação faz com que este trabalho não ofereça máxima seguran-ça no tratamento de seus dados no software SPRING, podendo fornecer um mapa de sus-ceptibilidade à erosão com alguns erros.

No entanto, quando estes solos forem estudados, seja pelo IAC ou algum outro pes-quisador, seus valores de erodibilidade, não devem sofrer grandes alterações comparados com os utilizados neste trabalho.

3.3. Fator Comprimento de rampa e grau de declive (LS)

3.3.1. Fator Comprimento de rampa (L)

O fator L é considerado como o mais subjetivo, ou seja, de um intérprete para ou-tro há uma variação nos valores de L. Como este fator provoca uma alta sensibilidade no modelo EUPS, isto indica que a proposta de quantificar o volume de sedimentos é ainda um objetivo a se aprimorar, principalmente se automatizar a obtenção deste fator. Há al-gumas propostas neste sentido como a utili-zação de imagens aspectos e linearização dos comprimentos de encostas (RISSO, 1993).

Este fator tem forte ligação com o au-mento ou não da erosão. À medida que au-menta o comprimento da rampa, maior será o volume de água, aumentando também a ve-locidade de escoamento. Em alguns casos o comprimento da rampa diminui o efeito ero-sivo, considerando-se que a capacidade de infiltração e a permealibidade do solo reduz o efeito. Porém, em princípio, quanto maior

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o comprimento de rampa, mais enxurrada se acumula, e a maior energia resultante se tra-duz por uma erosão maior.

A metodologia aplicada neste traba-lho para cálculo do fator L não é a mais indi-cada, pois não considera o fluxo acumulado de água. A metodologia mais correta é aquela que emprega o conceito de contribuição de área, contendo em sua formulação o fluxo acumulado. Para isso, deve ser utilizado para o cálculo do fator de comprimento de verten-te (L) o algoritmo de DESMET & GOVERS (1996), que determina, de maneira informa-tizada (automática), este fator.

O algoritmo de DESMET & GOVERS (1996), que emprega o conceito de contribui-ção de área, requer a geração de um mapa de fluxo acumulado. Para cada pixel, calculam-se a declividade, a direção de fluxo e a quan-tidade de fluxo que se acumulou a montante daquele pixel. Dessa maneira, o fator topo-gráfico para vertentes complexas pode ser fa-cilmente calculado. Assim, com base no MNT e utilizando-se um software de geoprocessa-mento determina-se: o mapa de declividade; o mapa de coeficiente da declividade; a dire-ção de fluxo e o fluxo acumulado. A área de contribuição é gerada pelo produto do fluxo acumulado e pela área de cada célula. O fluxo acumulado é obtido em função da direção do fluxo, que, por sua vez, é obtido do MNT.

Quando comparado ao método tradi-cional de WISCHMEIER & SMITH (1978), o fator LS obtido pelo algoritmo de DESMET & GOVERS (1996) demonstra ter incorporado de forma mais fidedigna os processos de va-riação de declividade e convergência/diver-gência de fluxo nas vertentes; isso permite que a EUPS seja adequadamente aplicada na predição de perda de solo em bacias comple-xas. Isso foi observado em trabalhos como o de SILVA (2003).

No entanto, esta metodologia não pôde ser utilizada neste trabalho, pois o sof-tware de geoprocessamento SPRING 4.3.3 não realiza a geração de um mapa de fluxo acumulado de água. Isso fez com que outra

metodologia fosse escolhida e aplicada para o cálculo do comprimento de rampa. A mi-crobacia apresenta uma topografia média entre 580 a 780 m. Apenas pontos isolados da microbacia, como no seu sudeste, apre-sentam valores mais altos de topografia, va-riando entre 880 a 980 m.

3.3.2. Fator Declividade (S)

A declividade (fator S) é um dos fato-res mais relacionados com o nível de susceti-bilidade de risco. Quanto maior a declividade de uma encosta, maior é o movimento de ter-ra necessário para a ocupação, e esses cortes e aterros realizados sem obras de estabiliza-ção geram níveis maiores de riscos associa-dos a escorregamentos.

A declividade afeta diretamente o tempo que a água da chuva leva para concen-trar-se nos leitos fluviais que constituem a rede drenagem das bacias.

A magnitude dos picos de enchente e a maior ou menor oportunidade de infiltra-ção e erodibilidade dos solos dependem da rapidez com que ocorre o escoamento sobre os terrenos da bacia.

A maior classe de declividade da mi-crobacia é de 0 – 10%, esta considerada uma declividade baixa. No entanto, no centro–leste e no sudeste da bacia onde a topografia é maior, os valores de declividade ultrapas-sam os 50%, mostrando que a microbacia também apresenta encostas íngremes, o que é bastante prejudicial, já que quanto maior a declividade maior a velocidade de escoamen-to superficial da água, menor a infiltração e conseqüentemente maior a capacidade de arraste de partículas de solo, causando a ero-são. Terrenos com altas declividades estão mais suscetíveis a desabamentos e grandes movimentações de terra. Além disso, devido à declividade, terrenos podem oferecer baixa nota no que diz respeito à recarga de aqüí-feros e menor suscetibilidade de águas sub-terrâneas.

Os fatores L e S foram interligados,

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apresentando as áreas onde o relevo, ou seja, o grau de declive, ou melhor, a inclinação do terreno e o comprimento da encosta é que de-terminarão à velocidade de escoamento su-perficial, caracterizando o potencial de carre-gamento pela erosão em termos de tamanho e quantidade de material e evidenciando que, na bacia do Córrego São Simão, os valores de LS de 0 a 1,2 abrangem maior quantidade de área e em seguida estão as classes de 1,2 a 2,0 e 8,0 a 20,0.

Valores mais elevados se associam à área com declividades mais acentuadas. Tendo em vista a grande complexidade do relevo em uma bacia hidrográfica, a esti-mativa automatizada dos comprimentos de vertente dentro do SIG do tipo matricial, es-pecialmente nas áreas com vegetação natural ou em áreas de cultura sem terraceamento, continua sendo um fator limitante da mode-lagem da erosão (WEILL, 2001).

Portanto, em grande parte da micro-bacia o fator LS exerce influência importan-te no processo erosivo, se tornando um dos principais agentes causadores de erosão na microbacia.

3.4. Carta de potencial natural à erosão laminar

O potencial natural de erosão (PNE), calculado para a microbacia do Córrego São Simão - SP teve o objetivo principal de deter-minar a erosão laminar, desconsiderando-se os aspectos de uso e cobertura vegetal. As classes de perdas de solo são válidas somente para áreas continuamente destituídas de co-bertura vegetal e sem qualquer intervenção antrópica.

Segundo STEIN et al., (1987) e SCO-PEL (1988), estes valores não podem ser to-mados como dados quantitativos de perdas de terra por erosão, servindo assim, apenas para categorizar qualitativamente as áreas quanto à sua maior ou menor susceptibilida-de à erosão laminar.

A Tabela 3.1 apresenta as classes de

potencial de perdas de solo e seu respecti-vo potencial natural à erosão em ton. ha-1 ano-1. Os valores encontrados variam de 0 até mais de 4000, indicando diversas classes de potencial natural à erosão, o que pode ser verificado também na Figura 3.1, que apre-senta também o mapa de susceptibilidade à erosão na microbacia.

MACIEL (2000), em seu trabalho, obteve valores de PNE muito altos e extre-mamente altos, com perdas da ordem de 900 a 8.898 ton. ha-1 ano-1. NASCIMENTO (1998), encontrou valores do PNE alto e mui-to alto para a bacia do Rio João Leite, entre 388,33 ton.ha-1.ano-1 a 515,41 ton.ha-1.ano-1, levando-se em consideração as perdas mé-dias, acima do limite de tolerância. Por outro lado, as perdas máximas de solos, atingiram valores oscilando entre 1.574 ton.ha-1.ano-1 a 4.833 ton.ha-1.ano-1.

Na microbacia, os valores mais eleva-dos do PNE aparecem entre as classes alta a extremamente alta, podendo variar de 1000,1 a mais de 4.000 ton.ha-1.ano-1 (Tabela 3.1), enquanto os menores valores mínimos (clas-se baixa) correspondem à classe de 0 a 100 ton.ha-1.ano-1.

Os maiores valores de PNE são en-contrados no centro-oeste e sudeste da ba-cia, exatamente onde o fator LS exerce maior influência, seguido também por uma menor capacidade de suportar a erosão pelos so-

Classes de Potencial de perdas de solo

Potencial Natural à erosão (PNE) (ton.

ha-1 ano-1)

Baixa 0 - 100

Média baixa 100,1 - 200

Média 200,1 - 600

Média alta 600,1 - 1000

Alta 1000,1 - 4000

Muito alta > 4000,1

Tabela 3.1. Classes de Potencial de perdas de solo e seu respectivo potencial natural à erosão em ton. ha-1 ano-1

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los litólicos encontrados nesta região. Neste local foram encontrados valores de PNE de 9716 ton.ha-1.ano-1 , o que indica alta sus-ceptibilidade à erosão laminar. É de fato, este local que deve sofrer maior vigília quan-do qualquer tipo de intervenção antrópica (agricultura, construção civil, etc.) resolver ser desenvolvida nesse local. Sem o total cuidado, o seu potencial erosivo pode ser po-tencializado, causando prejuízo econômico e ambiental à região da microbacia.

Na microbacia existem também pon-tos isolados onde o PNE apresenta valores médios a altos, influenciados diretamente pelo fator LS, já que nesses locais se encon-tram os solos com menores valores de ero-dibilidade, ou seja, os latossolos. Apesar de grande parte da bacia ser formada por areia quartzosa, neste local os valores de PNE não ultrapassam 3000 ton.ha-1.ano-1, devido à uma baixa influência do fator LS.

Apesar de suas limitações, a espacia-lização do potencial de perda de solo pode ser utilizada em tomadas de decisão relativas ao uso do solo, pois permite identificar áreas que devem ser monitoradas principalmente do ponto de vista dos processos erosivos. A simulação do Potencial Natural de Erosão por meio da USLE permitiu identificação de regiões com alta susceptibilidade ao proces-so erosivo, como pode ser verificado em di-versas áreas da microbacia, principalmente em sua porção leste.

As estimativas de PNE podem contri-buir ainda para restringir o uso e ocupação de áreas potencialmente suscetíveis à erosão, evitando assim onerar custos de infra-estru-tura, patologias em obras da construção civil. É importante trazer a atenção dos planejado-res e autoridades locais para as regiões mais frágeis, de relevo acidentado e com solos de alta erodibilidade. Nestas áreas podem e de-

Figura 3.1 - Mapa do potencial natural de erosão laminar na microbacia.

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lhorada, para que os valores de erodibilidade associados a estes reflitam sua verdadeira lo-calização no mapa da bacia, trazendo maior segurança para quaisquer atividades que possam ser realizadas, com base no mapa de susceptibilidade à erosão, sejam estas ações de manejo ou de construção civil.

A equação universal de perda de solo (EUPS) pode ser empregada na estimativa da quantidade de solo perdida por erosão e o potencial natural de erosão em pequenas bacias (como a bacia do Córrego São Simão), quando adaptada a um SIG.

A metodologia utilizada para determi-nação dos fatores da EUPS se mostrou muito útil para a identificação das áreas com riscos de perda de solos por erosão laminar. No en-tanto, o modelo EUPS deixa muito a desejar com respeito à qualidade e confiança nos resultados obtidos, pois apresenta muitas li-mitações e erros quando utilizada em países como o Brasil. Por ser uma fórmula empírica desenvolvida nos Estados Unidos, que apre-senta condições de solos totalmente diferen-tes das brasileiras, apresenta resultados que demonstram a verdadeira situação do local, principalmente, no tocante à quantidade de solos perdida. Algumas correlações para o fator K já foram propostas, mas sua precisão esbarra sempre em muitas características re-gionais não levadas em conta. No Brasil, uma das maneiras de se contornar este problema seria repetir a metodologia desenvolvida pelo Runoff and Soil – Loss Data Center só que para uma maior gama de regiões e de solos brasileiros.

A carta de susceptibilidade à erosão tem por objetivo fornecer diretrizes à ex-pansão urbana e de áreas cultiváveis, e ao gerenciamento da bacia. Se utilizada corre-tamente, esta pode nortear um maior desen-volvimento econômico da cidade através da construção civil, e no aumento de áreas agri-cultáveis, utilizando sempre as áreas com menor susceptibilidade à erosão para a sua realização.

No caso da Bacia do Córrego de São

vem ser estabelecidos programas de comba-te, controle e prevenção da erosão, que não descartassem a possibilidade de adoção de novas alternativas de uso, menos intensivas.

4. CONCLUSÃO

Em bacias hidrográficas, os Sistemas de Informação Geográfica são instrumentos poderosos ao auxiliar no processo de mode-lagem espacial, pois este oferece a possibili-dade de integrar dados obtidos por diferentes fontes, o que permite sua aplicação nos mais variados campos relacionados às ciências da natureza. A ligação da informação espacial com a informação alfanumérica facilita a tomada de decisões e permitem a simulação dos efeitos da introdução de novos tipos de manejo, de diferentes tipos de cenário e de políticas alternativas.

Neste caso específico, isso possibilita-rá a gestão mais adequada da Bacia do Cór-rego São Simão, restringindo determinados usos do solo em áreas com maior fragilidade ambiental, o que irá incentivar a utilização de áreas com maior aptidão, tanto para agricul-tura, quanto para construção civil (rodovias, aterros sanitários, expansão urbana, etc...).

O software SPRING, mostrou-se mui-to útil quanto à confecção do mapa de sus-ceptibilidade a erosão laminar na microba-cia. As consultas ao banco de dados (através das linguagens próprias para esse fim) são simples e de fácil execução, apenas sugere-se que os novos softwares que lidam com banco de dados venham permitir que várias consul-tas possam ser feitas ao mesmo tempo atra-vés de um arquivo de regras.

Foi verificado que ao trabalhar com banco de dados, as informações devem ser precisas e exatas, assim como os critérios para confecção do mapa de susceptibilidade à erosão. Portanto, existe a necessidade que sejam estudados critérios mais objetivos e menos subjetivos, facilitando o trabalho com banco de dados. Foi notado também que o mapa de solos necessita ter sua precisão me-

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Simão, a carta de susceptibilidade à erosão mostrou que o fator LS em conjunção ao fator erodibilidade do solo são os que mais exercem influência nos valores do potencial natural à erosão, pois as áreas com maior susceptibilidade à erosão laminar são respec-tivamente as que apresentam maiores valo-res de LS e de K. Dado que o fator R é pratica-mente constante ao longo de toda a bacia.

Os dados expostos evidenciam que, para o controle do processo erosivo laminar, será necessária a readequação do uso da ter-ra, através de uma sistematização dentro de suas potencialidades naturais. Esse proce-dimento pode ser realizado de duas formas básicas: a primeira delas é pela readequação do uso, adotando-se coberturas mais densas, que sejam capazes de proteger adequada-mente os solos mais susceptíveis à erosão; e a outra é a adoção de práticas conservacio-nistas mecânicas, que fragmentem o compri-mento de rampa e diminuam a declividade do terreno, e, dessa forma, diminuindo o espaço e a velocidade de escoamento super-ficial da água.

Portanto, esse trabalho traz uma con-tribuição na determinação das perdas de solo por erosão laminar, através de uma metodo-logia sistematizada em SIG, que pode ser uti-lizada em todo o Nordeste do Estado de São Paulo e com algumas adaptações, para o res-tante do Estado de São Paulo e outras regiões do Brasil.

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