SOBREIRO FICHA TEMÁTICA N.º 1 FICHA TEMÁTICA N.º 2 FICHA ...
Revista Iniciação edição temática em Sustentabilidadade
-
Upload
senac-sao-paulo -
Category
Education
-
view
815 -
download
27
description
Transcript of Revista Iniciação edição temática em Sustentabilidadade
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática em Sustentabilidade Vol. 4 nº 2 - Agosto de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179-474X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
Editorial
Sustentabilidade é a palavra-chave do Século 21. Por isso é gratificante ler uma
amostra do que os jovens que estão se preparando para comandar as necessárias
transformações que garantirão o futuro de nossa civilização já estão pesquisando,
criando e aplicando hoje no campo ambiental. Conhecer um pouco do que estão
produzindo nos traz orgulho e esperança de um futuro saudável, consciente e
responsável.
Da qualidade do ar em ciclovia paulistana a espaços participativos paraenses,
passando pela moda sustentável e o consumo de frutas, entre outros importantes
estudos, esta edição temática em sustentabilidade da Revista Iniciação traz uma
relevante seleção de artigos, rigorosamente selecionados pelo competente trabalho
editorial da Profa. Dra. Emília Satoshi Myamaru Seo.
Aos jovens autores aqui presentes, e seus respectivos orientadores e
instituições, registramos nossas congratulações e agradecimentos, em nome de toda
a sociedade, pela forma brilhante que se dedicam à missão de preservar e melhorar
a qualidade de vida desta e de futuras gerações.
Em tempo: esta, como todas as edições da Revista Iniciação, dá sua
contribuição ao meio-ambiente ao não consumir uma única folha de papel em todo o
seu ciclo, da chamada de trabalhos à publicação ;-).
Boa leitura.
Romero Tori
Editor
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática em Sustentabilidade Vol. 4 nº 2 - Agosto de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179-474X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
Apresentação do Dossiê
Caros leitores,
Fiquei muito feliz em receber o convite do Prof. Dr. Romero Tori como coeditora
da Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística, na Temática
Sustentabilidade.
Nesta edição, poderão aproveitar para ter uma excelente leitura dos trabalhos
de alunos de Iniciação Científica e Trabalhos de Conclusão de Curso com diversidade
de temas voltados ao meio ambiente, moda e saúde e bem estar, sob a ótica da
sustentabilidade. Os artigos apresentados nesta edição evidenciaram em incorporar
os pilares da sustentabilidade, permitindo-nos a refletir sobre os aspectos
socioambientais, sobre o bem estar da sociedade e saúde para nosso planeta.
Quero agradecer aos autores desta edição, todos os avaliadores e à equipe
executiva, que nos contribuíram para produzir mais este número da Revista de
Iniciação Científica, Tecnológica e Artística. Especial agradecimento ao editor desta
Revista, Dr. Romero Tori e à Anielly Rosa, nossa secretária executiva, sem a qual
não teríamos condições de realizar esta edição.
Deixo registrado o meu convite a todos os leitores que nos contribuam
enviando os artigos nas futuras edições da temática Sustentabilidade, pois a
finalidade é fortalecer na disseminação das pesquisas científicas realizadas pelos
alunos e seus orientadores.
Boa leitura!
Emília Satoshi Miyamaru Seo
Coeditora
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática em Sustentabilidade Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179474 X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
Reflexos Sociais da Atuação de Espaços Participativos: o Caso do
Conselho da Cidadania de Belterra-PA
Social Reflections of the Action of Participatory Spaces: the Case of
Citizenship Council from Belterra - PA
Gabriela Torquato Fernandez, Manuela Lourenço do Amaral Malheiros, Patrícia Thomé de Souza Prette, Graziela Azevedo
Escola de Administração de Empresas da Fundação Getulio Vargas – EAESP-FGV
Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas – GVCES
[email protected], [email protected], [email protected],
Resumo. O presente artigo tem o objetivo de compreender “se e como o desenho
institucional de espaços participativos reflete em seu poder de atuação na sociedade”
a partir do estudo de caso sobre o Conselho da Cidadania de Belterra, no estado do
Pará, buscando analisar a contribuição do formato institucional desse espaço
participativo para o empoderamento da população. Para tanto, foi realizada breve
revisão bibliográfica, além da coleta de dados primários e secundários. O Conselho da
Cidadania pode ser avaliado como um importante espaço participativo da região,
construído com a função de ser um espaço de deliberação, por meio do qual a
população pode ter a oportunidade de participar da vida pública. O engajamento dos
cidadãos surge como potencial instrumento para que o governo possa trabalhar de
forma mais democrática, visando à melhoria da qualidade de vida, já que parte das
questões públicas surge a partir da demanda da própria população.
Palavras-chave: Conselho da Cidadania, participação, empoderamento, deliberação,
espaços participativos, desenho institucional, mini-público.
Abstract. This paper aims to understand "whether and how the institutional design of
participatory spaces reflects in its power to act through society" from the case study
of the Citizenship Council of Belterra, Pará State, investigating the contribution of the
institutional format of this participatory space for the empowerment of the population.
In this sense, a brief literature review was performed, in addition to collecting primary
and secondary data. The Citizenship Council can be evaluated as an important public
space in the region, built with the function of being a space of deliberation, whereby
the population may have the opportunity to participate in public life. The citizen
engagement emerges as a potential instrument for the government to work more
democratically, aiming to improve the quality of life, as part of public affairs arises
from the demands of the population.
Key words: Council of Citizenship, participation, empowerment, deliberation,
participation spaces, institutional design, mini-public.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
2
1. Introdução
Ao longo da história da região Norte do Brasil, aspectos como o crescimento
demográfico, a estrutura fundiária e, principalmente, as próprias características e
desafios da vida cotidiana das populações que vivem em locais de intensa relação com
a floresta, muitas vezes isoladas ou com difícil acesso à infraestrutura de centros
urbanos, estimularam o surgimento de conflitos envolvendo questões sociais
relacionadas à melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Isso fez com que estes
passassem a se organizar em associações, comunidades e grupos que representassem
os interesses de pessoas com pensamentos, condições ou sonhos em comum. A partir
disso, floresce um posicionamento perante o governo e a sociedade e, com o
desenvolvimento dessa estrutura de representação, criaram-se espaços de
participação, em que um grupo é capaz de ser ouvido e lutar para o atendimento de
suas necessidades, contribuindo, por fim, para o desenvolvimento local,
empoderamento e participação social, conceitos discutidos ao longo do presente
trabalho.
Localizada a oeste do estado do Pará, ao Norte do Brasil, Belterra conta, de acordo com
o censo 2010, com 16.318 habitantes – com população estimada para 2013 de 16.808
-, com uma área municipal delimitada em 4.398km², a qual se distingue em área rural
(90%) e área urbana (10%). A área rural divide-se em FLONA (Floresta Nacional do
Tapajós – 70%), Área de Preservação Ambiental do Aramanai (APA - 10%) e uma última
área rural, fora das áreas de preservação (trecho da BR – 163 – 10%). Ainda prevalece
sobre a região o controle de terras por parte de poucos habitantes (30% da área sob o
comando de 25 famílias), explorando, principalmente aspectos agropecuários. A
principal atividade comercial da região é a agricultura, acompanhada da pecuária e
práticas extrativistas (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2007; IBGE, 2010).
Observa-se, a partir desta breve descrição, a peculiaridade apresentada pelo município
de Belterra em relação às características amazônicas, inseparáveis de sua formação
particularmente urbana e rural concomitantes. Em casos como este, muitas vezes a
definição do que é um meio urbano em comparação com um meio majoritariamente
rural pode não ser tão esclarecido, assim como Abramovay observa:
O acesso a infraestruturas e serviços básicos e um mínimo de
adensamento são suficientes para que a população se torne
“urbana”. Com isso, o meio rural corresponde aos remanescentes
ainda não atingidos pelas cidades e sua emancipação social passa
a ser vista — de maneira distorcida — como “urbanização do
campo” (ABRAMOVAY, 2000, p. 2).
A região de Belterra demonstra características urbanas mais centralizadas em
determinada área do município, margeando a avenida principal da cidade, sendo que,
ao se afastar desta, predomina o aspecto rural, com estradas de terra, campos
(desmatados, muitas vezes, para o cultivo da soja) e floresta amazônica. Muitas famílias
vivem às margens do Rio Tapajós, compondo comunidades ribeirinhas que ainda estão
sob a jurisdição municipal de Belterra, assim como aquelas que estabeleceram moradias
às margens da BR-163. Observa-se então a influência de grandes distâncias que se
formaram ao longo da história do município a partir de sua delimitação geográfica,
caracterizando um território distinto:
Ao aliar grandes distâncias geográficas, significativas
dificuldades de locomoção das pessoas e frágeis desempenhos
de políticas públicas e iniciativas do governo local, muitas regiões
amazônicas se caracterizam pelo que se denomina aqui por
“território esfacelado”. (AZEVEDO, 2012, p. 40)
Como ferramenta para que o município de Belterra não se tornasse um “território
esfacelado”, completamente influenciado pelas distâncias, falta de informação e acesso
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
3
às pessoas que ali viviam e vivem, surge o Plano Diretor de 2007 e a consequente
criação do Conselho da Cidadania, de forma que a população obtivesse uma alternativa
para que suas opiniões e críticas pudessem ser ouvidas de alguma forma,
caracterizando uma participação social potencialmente mais ativa.
A forma como a história regional impactou na organização da população local, bem
como o cenário amazônico em que vivem, devem ser considerados no contexto deste
trabalho, visto que desde então, as pessoas carregam em si a herança da cultura local
e seus costumes – aspectos relevantes na organização social dos dias de hoje. Dessa
forma, percebe-se que a cultura pode servir como uma vertente de análise muito
importante para a compreensão das atitudes dos cidadãos e sua capacidade de
organização e preocupação com a vida social como um todo, capazes de pensar, na
maioria das vezes, não só em si mesmos, mas em sua família e nos grupos aos quais
pertencem. Muitas de suas atitudes e desejos em relação ao âmbito social são
consequências do cenário em que viveram e continuam a viver, sendo o
desenvolvimento local um produto almejado que encontrou no plano diretor municipal
de 2007 uma oportunidade de ser mais especificamente trabalhado.
Considerado por diversos autores como parte relevante e, por alguns autores, até como
quase sinônimo da tão almejada sustentabilidade ou desenvolvimento sustentável, o
desenvolvimento local se baseia na valorização e melhoria das relações em nível local,
tomando a perspectiva de que estes impactos positivos no micro são o caminho para
alcançar grandes avanços em termos de desenvolvimento da sociedade como um todo,
considerando aspectos sociais, econômicos e ambientais. E tal olhar para o local vem
acompanhado de maior preocupação em oportunizar situações de participação,
articulação e engajamento da sociedade para o empoderamento de grupos, como no
caso do surgimento de Conselhos.
Estes espaços participativos podem ser construídos com a função de deliberação, por
meio do qual as pessoas podem ter a oportunidade de participar da vida pública,
defendendo os interesses do grupo que representam. O engajamento dos cidadãos
surge, assim, como potencial instrumento para que o governo possa trabalhar de forma
mais democrática, ressoando questões públicas que surgem a partir da demanda da
própria população.
É a partir desse cenário que o presente artigo se fundamenta, com o objetivo geral de
pesquisar, analisar e compreender como questão de pesquisa: “se e como o desenho
institucional de espaços participativos reflete em seu poder de atuação na sociedade”.
Para tanto, o trabalho aborda o caso do Conselho da Cidadania de Belterra, no estado
do Pará, buscando analisar a contribuição do formato institucional desse espaço
participativo para o empoderamento da população. Em 2007, Belterra foi premiada com
o selo Cidade Cidadã, conferido pela Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara
dos Deputados, em razão de ter sido um dos municípios com melhor experiência na
elaboração participativa de seu Plano Diretor (MINISTÉRIO DA CIDADE, 2007), situação
em que o Conselho da Cidadania exerceu papel central. Apesar de considerado
importante tema de pesquisa, o julgamento sobre o real impacto e efetividade do
Conselho extrapola os limites deste trabalho e não será, portanto, discutido.
O conteúdo do trabalho está estruturado em cinco seções além desta introdução. A
próxima seção trata de uma breve revisão bibliográfica acerca do referencial teórico
relacionado à pesquisa, que é seguida por uma seção que apresenta a metodologia
utilizada no preparo, coleta e análise dos dados de pesquisa. A quarta seção relata
aspectos relevantes sobre o objeto de estudo, o Conselho da Cidadania de Belterra,
enquanto a quinta seção traz considerações sobre esse Conselho à luz da pergunta de
pesquisa e das contribuições teóricas de Archon Fung acerca das escolhas de desenho
institucional de mini-públicos. Por fim, a última seção relata as principais reflexões e
considerações finais sobre a pesquisa.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
4
2. Referencial teórico
Tanto no âmbito do escopo do tema da pesquisa em sustentabilidade a respeito da
“participação social para o empoderamento”, como principalmente, da pergunta mais
específica referente à constituição, atuação e contribuição do Conselho da Cidadania de
Belterra para o empoderamento da população local, percebem-se três conceitos
principais a serem compreendidos para este artigo: participação, empoderamento e
desenvolvimento local. É acerca de tais temas que a breve revisão bibliográfica a seguir
é apresentada.
No que tange à participação civil, consideram-se fundamental as contribuições de Pedro
Roberto Jacobi, tido como referência ao se tratar de assuntos relacionados à
sustentabilidade, ciências sociais e conciliação entre o poder público e populações de
determinados locais. Em sua obra “Reflexões sobre as possibilidades de inovação na
relação poder público-sociedade civil no Brasil”, Jacobi relaciona a ampliação da
cidadania ativa e a atuação dos órgãos públicos brasileiros, analisando como poderia
ser e como são, de fato, a relação entre esses dois atores políticos. Reflete-se sobre as
práticas participativas, as quais podem funcionar como ferramentas para se atingir uma
nova qualidade de cidadania, abrindo desde a gestão pública à participação da
sociedade civil como forma de controlar e fiscalizar as ações do Estado, além de poder
se revelar como força indutora de novas políticas sociais (JACOBI, 2001).
Observa-se, em sua obra, a expansão do associativismo civil a partir de duas origens
principais: crises econômicas e a perplexidade causada pela institucionalização, sendo
cada vez mais comum observar sua existência, principalmente, em municípios
brasileiros mais restritos e de menor porte, onde uma organização populacional é,
teoricamente, mais simples. Entretanto, atualmente, percebe-se um déficit de
participação civil somado à volatilidade eleitoral, fazendo com que a organização de
associações para a defesa de uma determinada causa seja, muitas vezes, desacreditada
e desestimulada (JACOBI, 2001).
Segundo o autor, a população é quem cria as condições para influenciar a dinâmica de
funcionamento de um órgão do Estado, garantindo, desta forma, a participação das
diferenças e uma “estatização da sociedade” (ou “socialização do Estado”), visando,
mesmo que indiretamente, uma atualização dos princípios ético-políticos da
democracia. A cidadania deve ser um dos fatores pelo qual lutam as organizações,
buscando construir as identidades dos sujeitos sociais, a constitucionalização dos
contextos em que vivem, mostrando e atendendo às necessidades expressas por seus
componentes, podendo até mesmo, redefinir gestões públicas. Deve haver ainda, uma
motivação social concreta, baseada em uma institucionalização da relação
Estado/Sociedade, capaz de questionar o status quo, fiscalizar, controlar e sugerir
mudanças na administração pública (JACOBI, 2001).
Em suma, o autor demonstra que a participação social corresponde a um processo
contínuo de democratização da vida municipal, isto é, de redefinição entre o público e
o privado, por meio da redistribuição do poder em favor dos sujeitos sociais que
geralmente não têm acesso, de modo a favorecer a equanimidade social. Portanto, a
participação civil permite aumento da possibilidade de representar a pluralidade de
interesses da sociedade e favorecimento da qualidade e equidade das políticas públicas
(JACOBI, 2001).
De modo complementar ao conceito de participação civil, a antropologia moderna muito
tem estudado a respeito do empoderamento, do termo em inglês empowerment. Para
Maria Da Glória Gohn (2004), a mobilização da sociedade civil na esfera pública torna
a comunidade “protagonista de sua própria história”. Segundo a autora, “o local gera
capital social quando gera autoconfiança nos indivíduos de uma localidade, para que
superem suas dificuldades. Gera, junto com a solidariedade, coesão social, forças
emancipatórias, fontes para mudanças e transformação social” (GOHN, 2004, p.24).
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
5
Já Laverack e Wallerstein (2001), outros estudiosos do empoderamento, afirmam que
o empowerment é mais bem concebido e avaliado como um processo contínuo, com os
participantes passando do nível de fortalecimento pessoal ao desenvolvimento de
pequenos grupos de apoio, de organizações comunitárias, parcerias e finalmente à ação
política. Isto é, o empoderamento se caracteriza por um processo no qual as pessoas
vão além da participação, resultando em influências nas decisões públicas por meio de
deliberações, como apresentado por Archon Fung (LAVERACK; WALLERSTEIN, 2001;
FUNG, 2003).
Assim, para o empoderamento é preciso haver o exercício da deliberação através de
associações que, segundo Francisco Oliveira, têm como função negociar com o governo.
As associações criam dessa forma espaços participativos, como um “sistema paralelo,
parapolítico, que aglutina mais que os partidos políticos e a partir do qual se estrutura
ação política” (OLIVEIRA, 1990, p. 55).
Estes “novos espaços participativos” (CORNWALL; COELHO, 2004), segundo Vera
Schattan P. Coelho e Andrea Cornwall (2007, p.1):
Também são, em muitos aspectos, espaços intermediários,
condutores para negociação, informação e intercâmbio. Podem
ser providos por ou para o Estado, apoiado em configurações por
meio de garantias legais ou constitucionais e considerado por
atores estatais como o espaço em que os cidadãos e seus
representantes são convidados a participar. No entanto, eles
também podem ser vistos como espaços conquistados por
demandas da sociedade civil para inclusão. Alguns são fugazes,
eventos únicos de consulta; outros são instituições
regulamentadas com presença mais duradoura na paisagem da
governança.
Este tipo de espaço público para participação no Estado é observado em Belterra, sendo
reconhecido ainda como um caso de sucesso justamente pelas características de sua
institucionalização e mobilização da população. Por meio de maior engajamento de
atores de destaque na sociedade foi possível evoluir ainda mais, tendo estes a
motivação de passar para outras pessoas o significado de se participar de espaços como
o Conselho da Cidadania para que seus próprios interesses fossem levados em
consideração pelos órgãos municipais de administração.
Os Conselhos são uma das modalidades para o exercício da
cidadania. Cumpre destacar, entretanto, que a participação da
sociedade civil não pode, nunca, se resumir à participação nos
espaços dos conselhos ou outros criados na esfera pública. (...)
ela deverá advir de estruturas participativas organizadas
autonomamente na sociedade civil. O chamado trabalho de base
é fundamental para alimentar e fortalecer a representação
coletiva nos colegiados da esfera pública. Essa esfera pública não
pode ser vista como um degrau superior, que surgiu para
eliminar ou superar formas e níveis de mobilização e organização
que existiram na sociedade brasileira nos anos 1970/80, pois
esta é uma visão etapista, linear e evolutiva (GOHN, 2004).
A efetividade e as especificidades da participação civil, entretanto, segundo o autor da
Universidade de Harvard, Archon Fung, depende de uma série de elementos que irão
caracterizar o conceito denominado de desenho institucional. De acordo com Kiser e
Ostrom, o desenho institucional é definido por um conjunto de “regras utilizadas para
determinar quem e o que está incluído em situações de decisão, como se estrutura a
informação, quais as ações que podem ser tomadas e em que sequência, e como as
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
6
ações individuais serão agregadas e transformadas em decisões coletivas” (ap. LEVI,
p.80).
Em seu artigo “Recipes for Public Spheres: Eight Insitucional Design Choices and Their
Consequences”, Fung discorre sobre as oito principais escolhas do desenho institucional
de um espaço participativo, bem como suas consequências e impactos para os
resultados obtidos em diferentes âmbitos. O artigo sistematiza e simplifica a análise
acerca do conceito de desenho institucional, de maneira complementar às análises e
abordagem desenvolvidas pela autora Lígia Helena Hahn Luchmann em seu texto “O
desenho institucional dos Conselhos Gestores” (FUNG, 2003; LÜCHMANN, 2008).
Pode-se considerar ambos os posicionamentos como referência em razão de suas
peculiaridades, o primeiro devido à sistematização da análise de espaços participativos
em um trabalho, o segundo devido à consideração de Conselhos Gestores e da
profundidade do desenvolvimento dos aspectos, apresentados em linguagem clara e
objetiva (FUNG, 2003; LÜCHMANN, 2008).
Lígia Lüchmann discorre sobre os fatores considerados determinantes para a
implementação (virtuosa) de experiências de democracia deliberativa, visto que a
participação da sociedade civil por si só não garante a reversão de uma lógica de poder
em direção ao aprofundamento da democracia (LÜCHMANN, 2008).
A autora destaca a importância da influência de fatores como:
os aspectos históricos; a qualificação dos atores participantes; o
acesso à informação; a motivação dos atores à participação; as
características dos procedimentos de operacionalização e
princípios do espaço participativo (participação e tomada de
decisão); a heterogeneidade e grau de representatividade dos
atores; a organização da sociedade civil; os recursos disponíveis;
o comprometimento político; as ações de implementação,
acompanhamento e sustentação de práticas de gestão
democrática; a garantia do pluralismo, igualdade e liberdade; a
capacidade das instituições de empoderar os atores sociais; a
importância da existência de espaços e mecanismos
participativos diversos; as decisões sobre localidade, tempo e
frequência do processo deliberativo; os impactos da legalidade e
obrigatoriedade de dados espaços participativos; entre outros
(LÜCHMANN, 2008).
Destaca-se ainda o trabalho de Velásquez (1999), o qual comenta a respeito do tripé
de elementos centrais ao controle social de gestão pública: estrutura de oportunidade
política (opções oferecidas por um sistema político); constituição de identidades sociais
(grau de articulação, heterogeneidade, rede de relações sociais e tradição associativa);
e motivação.
Com relação à estruturação da sociedade civil, Archon Fung apresenta a definição de
mini-público, o qual segmenta milhares em grupos menores, conscientemente
organizados em deliberações públicas, e os quais, segundo o autor, representam o
esforço mais promissor de engajamento civil e deliberação pública, sendo estes
heterogêneos, múltiplos e capazes de deliberar acerca dos mais diversos temas (FUNG,
2003).
Como anteriormente citado, Fung (2003) sistematiza as escolhas a respeito do desenho
institucional em oito principais: tipos de minipúblicos; recrutamento e seleção de
participantes; temas e escopos das deliberações; estilos de deliberações; interação e
recorrência; objetivos; empowerment; e monitoramento.
Por meio do referencial acima citado é possível melhor compreender a correlação entre
a participação e o empoderamento, e também, alguns de seus principais impactos para
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
7
os cidadãos envolvidos. No âmbito coletivo é possível analisar as consequências desse
aumento de participação, motivação, ação e empoderamento, isto é, do impacto dos
indivíduos de certa região na tomada de decisão dos órgãos e instituições públicas,
especialmente no que se refere à política pública. Dessa forma, por melhor compreender
suas necessidades e impactos das ações discutidas, as consequências da participação e
empoderamento abrangem também o desenvolvimento local.
Este desenvolvimento, entretanto, não possui mais a abordagem tecnicista, atrelada
exclusivamente ao desenvolvimento econômico e descomprometido com os impactos
nos atores da localidade. Segundo Oliveira (2002), este desenvolvimento se dá por meio
da emergência da necessidade de “capacidade efetiva de participação da cidadania”, a
qual resgata a ágora grega,
posto que a forma democrática representativa é insuficiente para
dar conta da profunda separação entre governantes e
governados na escala moderna (...) O desenvolvimento local
poderia criar um lócus interativo de cidadãos, recuperando a
iniciativa e a autonomia na gestão do bem comum (OLIVEIRA,
2002, p.14).
De forma complementar, Martins (2002) afirma que o diferencial do desenvolvimento
local não está “em seus objetivos (bem-estar, qualidade de vida, endogenia, sinergias
etc.), mas na postura que atribui e assegura à comunidade o papel de agente e não
apenas de beneficiária do desenvolvimento” Martins (2002, p.2).
Observa-se que a gestão do bem comum pode ser realizada a partir de uma maior
participação da população frente a aspectos público municipais, em que há uma maior
preocupação em se estabelecer decisões que influenciem no desenvolvimento local da
região, de forma que essas acompanhem as necessidades sociais, promovendo
resultados significativos, além de serem monitoradas de forma que permitam a
perpetuação da satisfação dos cidadãos que ali vivem.
Partindo dos conceitos supracitados, procurou-se delinear os instrumentos de pesquisa
e método para análise dos dados, apresentados na seção a seguir.
3. Metodologia
Investigar é uma forma de relatar o mundo e a pesquisa social é
tanto um produto social para relatar quanto um produtor de
relatos; uma maneira de contar - e produzir - o mundo. A
pesquisa nasce da curiosidade e da experiência tomados como
processos sociais e intersubjetivos de fazer uma experiência ou
refletir sobre uma experiência (SPINK, 2003, p. 26).
Como metodologia para este trabalho, procurou-se realizar a pesquisa em campo de
maneira a possibilitar certo grau de convivência com a realidade local, buscando
entender da melhor forma possível o modo de vida cultivado por seus habitantes, bem
como seus costumes, crenças, hábitos e comportamento. Reconheceu-se a importância
do pesquisador aprender a se atentar à própria cotidianidade, reconhecendo que é nesta
que são projetados e negociados os sentidos; e aprender a fazer isso como parte
ordinária do próprio cotidiano, não como um pesquisador participante e muito menos
como um observador distante. Buscou-se, em outras palavras, conhecer o outro e
realizar trocas diversas, para se ter uma visão mais objetiva, conhecer seus pontos de
vista e de onde falam; ou seja, uma subjetividade construída intersubjetivamente
(SPINK, 2008, p. 71-72).
Dentro deste “tumulto conflituoso de argumentos parciais, de artefatos e
materialidade”, preza-se pela utilização de instrumentos variados de pesquisa, a fim de
“nos localizar psicossocialmente e territorialmente mais perto das partes e lugares mais
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
8
densos das múltiplas interseções e interfaces críticas do campo-tema onde as práticas
discursivas se confrontam” (SPINK, 2003, p. 36).
Observou-se que o presente estudo poderia se desenvolver sob uma ótica qualitativa,
estruturado como um estudo de caso, método que procurará enfrentar uma situação
tecnicamente diferenciada em que existirão muito mais variáveis, de acordo com Yin
(2010).
Foram realizadas entrevistas semiestruturadas, importantes como uma espécie de guia
para o diálogo com esses atores locais, no qual há um roteiro como base a ser seguido,
contendo perguntas-chave (anexo 1). Spink (2008, p.72) afirma que, ao contrário dos
métodos planejados em que se delineia a priori um roteiro de entrevista com perguntas
sobre um tema previamente acordado e operacionalmente definido, um pesquisador, no
cotidiano, frequentemente se utiliza de conversas espontâneas em encontros situados.
Pelo fato de a pesquisa envolver diversos grupos de atores, foi necessário adequar o
roteiro de pesquisa às particularidades de cada um deles, realizando perguntas mais
específicas e, assim, maximizando a qualidade e aproveitamento dos dados obtidos.
Dessa forma, elaborou-se um roteiro voltado às figuras ligadas ao próprio Conselho da
Cidadania e aos indivíduos relacionados à Prefeitura Municipal de Belterra e outro para
ser aplicado às lideranças comunitárias ou outros órgãos e pessoas indiretamente
ligados ao Conselho.
Procurou-se estabelecer uma conversa informal, construindo um ambiente agradável,
no qual fosse transmitida confiança. Inicialmente eram explicadas as intenções e
objetivos do trabalho, bem como o tema da pesquisa para que todos estivessem
alinhados quanto às suas expectativas. Foram consideradas também determinadas
observações feitas pelos entrevistados, mesmo que estas não estivessem diretamente
relacionadas às perguntas ou à própria pesquisa permitindo também que estes fizessem
perguntas aos membros do grupo, de maneira coletiva ou individual.
Vale ressaltar que foram realizadas reuniões a fim de analisar a qualidade das
informações obtidas, percepções gerais sobre as entrevistas, pesquisa e vivência,
possíveis melhorias em relação ao roteiro de entrevistas, ao modo como as entrevistas
eram conduzidas, e até ao rumo da pesquisa como um todo. Dessa forma, com a
contínua análise do trabalho realizado foi possível aperfeiçoar cada vez mais a pesquisa
que estava sendo realizada, bem como dar espaço aos aprendizados e reflexões sobre
a experiência.
Nos casos em que foi preciso se locomover até uma comunidade específica que, por
vezes só era possível o acesso por meio de barco ou caminhonete, era necessária a
articulação de um esquema de transporte, normalmente conduzido com o apoio das
lideranças comunitárias. Estes foram peças chaves, não só no mapeamento dos atores
principais para a pesquisa, mas também ao informá-los antecipadamente das intenções
do trabalho. Esse detalhe se mostrou muito importante como um ato de “pedir licença”
por entrar naquela comunidade e, muitas vezes, na própria casa das pessoas. Esta foi
uma parte integrante do compromisso ético das pesquisadoras na realização do projeto
de pesquisa, durante as entrevistas e mais ainda, em todo o período no campo.
Para enriquecer a pesquisa e torná-la mais realista quanto ao panorama social do
município de Belterra, procurou-se captar opiniões diferentes sobre o Conselho da
Cidadania, com a inclusão na agenda de lideranças comunitárias, moradores de todos
os distritos do município e representantes dos diversos grupos ali presentes, além de
membros do Conselho da Cidadania e do governo municipal, contemplando um total de
37 entrevistas.
Além das entrevistas semiestruturadas, outro instrumento de pesquisa utilizado foi a
observação direta, com a participação em quatro reuniões comunitárias, a partir de uma
abordagem que considera o conceito e importância de cotidiano e de micro lugares.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
9
Fez-se importante também a coleta de dados secundários a partir, principalmente, da
análise de documentos, tais como: revistas e jornais locais; ata de reuniões do Conselho
da Cidadania; documentos de divulgação e comunicação das decisões deste conselho;
blog do Conselho da Cidadania; e qualquer peça de comunicação em geral que se
demonstrou potencialmente hábil a oferecer um conhecimento diversificado sobre o
objeto de pesquisa (YIN, 2010, p. 128-132).
A partir da coleta de informações por meio dos instrumentos acima explicitados, o
método de análise de dados utilizado para lidar com a pergunta de pesquisa foi a análise
de conteúdo, forma clássica que permite analisar qualquer tipo de dados de material
textual, inclusive entrevistas estruturadas e semiestruturadas (FLICK, 2009). Ao se
coletar os dados, foi preciso classificá-los de forma a categorizar os tipos de respostas
para que pudessem ser considerados adequadamente na compreensão do caso à luz da
pergunta de pesquisa colocada (BELL, 2008).
Ao declarar os pesquisadores parte de um campo-tema, foi demonstrada a convicção
ética e política de que, de maneira análoga a psicólogos sociais, fosse possível contribuir
e estar disposto a discutir a relevância de sua contribuição com qualquer indivíduo e
em quaisquer circunstâncias.
Temos algo a contribuir porque temos um mínimo de
disciplinariedade que inclui a vontade de discutir entre nós a
validade daquilo que fazemos – como também fazem entre si os
especialistas em transplantes de coração, os cozinheiros, os
jardineiros, os pedreiros e os presidentes. Somos somente uma
parte de uma ecologia de saberes, cada uma das quais partindo
de um ponto distinto e pensando que tem algo a contribuir
(SPINK, 2008, p. 76).
Assim, foi por meio da metodologia descrita, bem como da breve revisão bibliográfica
apresentada, que se conduziu a análise do caso do Conselho da Cidadania de Belterra,
buscando contemplar os objetivos da pesquisa.
4. O Caso do Conselho da Cidadania de Belterra
De acordo com a forma como essa região do Brasil sofreu seu povoamento e exploração,
bem como a partir de informações obtidas nas entrevistas realizadas com atores locais,
percebe-se a emergência de um sentimento de união social frente às dificuldades
enfrentadas. Não por acaso é comum encontrar “comunidades” e grupos organizados
em várias partes do município, muitas vezes isolados e muito distantes do centro
urbano. Em vista da grande dimensão territorial do município, foram estabelecidas
grandes áreas de intervalo entre as concentrações de pessoas, tanto entre o urbano e
o ambiente rural de floresta, quando entre as populações residentes neste meio rural
amazônico, formando comunidades. Em geral, nestes locais vivem pequenos
aglomerados de pessoas, que se organizam coletivamente para efetivar o
funcionamento de atividades básicas necessárias à sua sobrevivência, como por
exemplo, a obtenção de comida, água e saneamento básico.
Para além de um contexto geográfico e ambiental específico, com fortes traços da
Amazônia, e do contexto de desenvolvimento econômico e social muito particular, é
possível apontar especificidades que marcam os valores, a cultura e o dia a dia
da população que vive na região.
Com área superior à do município de São Paulo, Belterra possui 4.398km², sendo que
apenas 10% deste território consistem em área urbana e zona de expansão urbana,
(IBGE, 2010). Formalmente essas regiões são divididas em sete distritos, incluindo a
sede que corresponde à área considerada urbana, como mostra a Figura 1.
Figura 1: Mapa dos distritos e comunidades do município de Belterra-PA.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
10
Fonte: FASE, 2006.
O Conselho da Cidadania de Belterra, associação criada em 2007, fundado como um
órgão consultivo e deliberativo durante o processo de elaboração do Plano Diretor
Participativo trata especialmente de demandas e prioridades para gestão do orçamento
municipal, visando promover debates entre a população e gestores públicos, sobre
diversas temáticas, as quais beneficiem todos os cidadãos. Há discussões, por exemplo,
sobre a gestão e planejamento do município, incluindo questões relacionadas à
educação, saúde, infraestrutura, criação de das políticas públicas, como política urbana,
territorial e habitacional, visando o desenvolvimento local, econômico e social.
É composto por integrantes da sociedade civil e do poder público, representando 70%
e 30% do total, respectivamente, com mandatos de dois anos. É atualmente composto
por 27 integrantes, dos quais 10 provêm do poder público municipal. Dentre estes, há
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
11
a participação, conforme observado por meio da participação em algumas reuniões, de
líderes comunitários e representantes de diversas associações, cada qual defendendo
os interesses do grupo que fazem parte. Apresentam-se líderes de comunidades
localizadas tanto às margens da BR-163, quanto do Rio Tapajós, além de representantes
de associações como a FASE (Federação de Órgãos para Assistência Social e
Educacional), Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Federação da FLONA Tapajós, entre
outros.
No primeiro Congresso da Cidadania, realizado em 2007, ocasião na qual diversos
segmentos da sociedade foram convidados a participar e contribuir, foi realizada uma
votação a fim de selecionar um grupo de segmentos e organizações que representassem
a sociedade civil e governo e, desta forma, caracterizassem o Conselho Executivo. Este é responsável por realizar as principais discussões, além de tomar as decisões que
impactem toda a estrutura do Conselho da Cidadania em si, e que são posteriormente
levadas ao Conselho Distrital, para validação, constituindo uma estrutura que visa
facilitar e otimizar a tomada de decisão. Este Congresso acontece a cada 2 anos,
momento no qual nova eleição e reflexão e revisão dos resultados e do planejamento.
As deliberações do Conselho da Cidadania acontecem, em geral, a cada 15 dias, durante
as reuniões do Conselho Executivo, a fim de monitorar as decisões tomadas e fazer
devida revisão e ajustes que se façam necessários para alcance dos objetivos visados.
A fim de capilarizar a participação e representação da população e de diferentes distritos
e regiões do município, foi criado o Conselho Distrital no início de 2012, como parte da
estratégia do Conselho da Cidadania. Para selecionar os participantes deste conselho,
cada comunidade, através de uma assembleia convocada pela associação comunitária,
elegeu delegados de maneira proporcional aos participantes da reunião, tendo a
comunidade direito a um novo delegado a cada dez presentes. Estes delegados
representam suas comunidades e, agrupados com os diversos representantes do distrito
ao qual pertencem, têm como principais atribuições discutir os interesses mútuos do
distrito e representá-lo frente ao Conselho Distrital, que posteriormente leva tais
demandas ao Conselho da Cidadania.
Nas reuniões quinzenais promovidas pelo Conselho Executivo, são realizadas discussões
mais rotineiras e cotidianas, enquanto que nas Assembleias dos Conselhos Distritais são
tratados assuntos mais estratégicos e relevantes frente a um maior número de
participantes.
Vale ressaltar que as assembleias e reuniões são abertas a toda a população,
restringindo apenas o direito ao voto e dando preferência de fala aos delegados e
representantes oficiais do Conselho. Entretanto, a participação do público civil é
amplamente estimulada, como por meio da expressão de suas opiniões e críticas. De
acordo com seus principais dirigentes, os participantes da sessão de discussão e/ou
apresentação de propostas, não só podem como devem, se manifestar caso tenham
alguma opinião sobre o assunto em questão, levantando a mão e demonstrando a
vontade de contribuir com seu pensamento.
De acordo com o Chefe de Gabinete da prefeitura, com relação ao processo de discussão
por parte dos distritos, cada um elege prioridades, que são analisadas e orçadas no
âmbito do Conselho da Cidadania. Para verificar quantas e quais prioridades poderão
ser devidamente atendidas. Este processo conta, também, com votações abertas com
participação democrática. As decisões são tomadas pelos delegados eleitos por distrito
durante o Congresso da Cidadania (realizado a cada 2 anos pelo Conselho da
Cidadania). Ao final desse período é realizado um balanço para se constatar se a medida
foi ou não implementada. De acordo com atores locais, o resultado das discussões
decorrentes do Congresso também proporciona elementos para o planejamento da
atuação das secretarias municipais e de Câmara dos Vereadores.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
12
5. O caso do Conselho da Cidadania de Belterra e a literatura
Para o embasamento da pesquisa, foram levadas em consideração as obras literárias
apresentadas no referencial teórico, que tratam de assuntos relacionados ao tema em
questão, sendo o texto “Recipes for Public Spheres: Eight Institutional Design Choices
and their Consequences”, de Archon Fung, o principal pilar de análise. Em seus escritos,
Fung discorre sobre oito pontos principais que influenciam o desenho institucional
presente nas sociedades contemporâneas e em sua estrutura de organização. Nesta
seção, o Conselho da Cidadania é analisado à luz dos oito pontos citados por Fung, com
o intuito de analisar, de maneira mais sistêmica, o desenho institucional do Conselho
da Cidadania de Belterra (FUNG, 2003).
Visão e tipo de minipúblico
De acordo com Fung, minipúblicos funcionam como associações de influência social e
trabalham na reforma do pensamento ao invés de escolher formas revolucionárias de
solucionar problemas sociais. Em Belterra houve, após a elaboração do Plano Diretor
municipal (realizado em 2007), a implementação do Conselho da Cidadania, um espaço
voltado à participação popular, com vistas a engajar o senso crítico da sociedade e
estimular a participação civil na vida pública do município, como maneira de “reformar”
o pensamento social sobre os aspectos públicos que estão no entorno de seus
habitantes. Com isso, a cidade ganhou o prêmio de Cidade Cidadã, a partir do
desenvolvimento do Conselho da Cidadania, em que se previa a criação de condições
coerentes para que os cidadãos formassem e articulassem opiniões a partir de
deliberações e conversações, funcionando como um conselho consultivo e deliberativo
participativo, que se pode relacionar ao conceito de minipúblico apresentado por Fung.
Percebe-se que, apesar da participação ativa de alguns cidadãos relevantes no
município e do conhecimento desta entidade por grande parcela dos moradores da
região local, boa parte da população ainda desconhece a existência do Conselho da
Cidadania assim como muitos, mesmo sabendo de sua presença, não se sentem
beneficiados por qualquer tipo de atividade desenvolvida pelo espaço. Houve relatos em
que cidadãos disseram que já tinham “ouvido falar” na instituição, entretanto, nunca
haviam se defrontado com algo realizado por este, enquanto outros entrevistados
apontaram que, no início de sua atividade, o Conselho se mostrava mais ativo, porém,
gradualmente, foi diminuindo sua presença no cotidiano local.
Quem? Recrutamento e seleção dos participantes
A estruturação do Conselho da Cidadania em Conselho Distrital possibilita afirmar que
o Conselho segue muito próximo aos pontos que Fung (2003) ressalta em seu texto,
aqui usado como modelo. De maneira complementar, primeiramente, todos podem
participar das Assembleias e reuniões realizadas, respeitando o princípio da equidade.
Fung (2003), entretanto, levanta um contraponto deste modelo, ao qual se refere como
voluntarismo, em que, apesar do participante ser movido pela motivação pessoal em
participar, pode-se privilegiar atores com melhores condições socioeconômicas, como o
acesso a meios de comunicação e de transporte, como visto no caso de Belterra.
A solução para tal questão, proposta por Fung, é também observada no modelo do
Conselho da Cidadania, em que, por meio de reuniões nas diferentes comunidades e
localidades do município, são escolhidos representantes e debatidos temas relevantes
para cada localidade, dentro do contexto do Conselho Distrital, de modo a democratizar
a participação dos diferentes segmentos da sociedade.
Além disso, impactando em outra temática levantada por Fung, quanto ao problema
das disparidades no acesso a recursos e ao impacto deste nos resultados do Conselho,
faz-se importante ressaltar que a Prefeitura Municipal, por meio da Secretaria de
Planejamento, se responsabiliza pelos recursos financeiros necessários para a
alimentação e locomoção dos participantes da reunião – elemento que poderia ser
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
13
impedir significativamente para a viabilidade da participação de diversas lideranças,
visto que há limitações com relação aos locais mais distantes e aos altos custos de
locomoção. Por exemplo, há locais em que apenas o transporte hidroviário é possível,
pela inexistência ou precariedade das estradas. Entretanto, às vezes não há
embarcações do porte necessário para as viagens requeridas, ou não há dinheiro para
arcar com os custos do combustível. Sem contar, é claro, com o tempo investido, que
significa menor período de trabalho para geração de renda.
O quê? Assunto e escopo das deliberações
A partir da formação de minipúblicos, uma sequencia ou um grupo de temas é
cuidadosamente selecionado para ser discutido dentro de suas deliberações. Com o
Conselho da Cidadania não é diferente. Visto que a instituição compõe um local em que
se procura a participação populacional sobre questões públicas, são realizadas reuniões
com indivíduos do próprio Conselho e cidadãos representativos como forma de se
discutir temáticas municipais que envolvem a vida social como um todo. De acordo com
o chefe de gabinete da cidade de Belterra, são discutidos no Conselho da Cidadania
assuntos relacionados à infraestrutura municipal tais como a pavimentação de vias, a
estrutura para a existência de água encanada, o fornecimento de máquinas para a
realização de obras em geral, a construção de escolas, postos médicos e hospitais, entre
outros, ou seja, temáticas que, de uma forma abrangente, envolvem política, segurança
civil, educação e saúde.
Já no Conselho Distrital, órgão de menor porte, elaborado pelas populações presentes
nos distritos que compõem todo o município de Belterra, são discutidas questões de
âmbito mais local, referentes também à saúde, segurança e educação de seus
habitantes. Tal Conselho foi formado a partir da demanda originada pelos belterrenses,
principalmente devido à grande proporção territorial e à crítica em relação à falta de
infraestrutura do município, alguns dos principais motivos identificados pelos atores
locais que impediam a ampla participação social no Conselho da Cidadania e
dificultavam ao poder público municipal realizar uma administração mais coerente com
as necessidades da população local.
Como? Modo de deliberação
Nas reuniões do Conselho da Cidadania a participação do público civil, e não apenas dos
representantes, é amplamente estimulada, tanto para expressar suas opiniões, como
críticas. Entretanto, em algumas das entrevistas realizadas com lideranças da sociedade
civil, alguns afirmaram que nas reuniões somente os dirigentes poderiam falar, estando
alguns indivíduos ali presentes apenas para ouvir, em relevante ponto de oposição às
características fundantes do Conselho.
Em Assembleia realizada pelo Conselho da Cidadania em julho de 2012, acompanhada
nos termos da elaboração deste trabalho, houve a participação de dirigentes do
Conselho bem como de líderes comunitários e representantes de associações locais.
Observou-se que, nesta assembleia, qualquer indivíduo, fosse ele do Conselho da
Cidadania ou da sociedade civil, poderia expressar livremente sua opinião em qualquer
momento da reunião, falando de seu próprio assento ou indo até a frente de todos os
expectadores. Vários participantes demonstraram vontade de participação e expressão
crítica das atitudes tanto do governo quanto do próprio Conselho, defendendo os
interesses sociais municipais e também de suas respectivas associações.
Consequentemente, pôde-se constatar a liberdade de expressão de ideias fornecida
àqueles que demonstram engajamento pelas questões públicas municipais.
Nas tomadas de decisões, segundo os dirigentes do Conselho, são realizadas votações
que contam com a participação de conselheiros e civis, de forma a se estabelecer uma
determinação à base do “bem comum”, uma das formas de decisão propostas por Fung.
Quando? Recorrência
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
14
As deliberações promovidas pelo Conselho da Cidadania ocorrem, em geral, a cada 15
dias, durante as reuniões do Conselho Executivo, como forma de realizar sua
manutenção e o monitoramento das decisões. É realizada, duas vezes ao ano, a
Assembleia Geral, em que participam não só membros do Conselho, mas também
líderes comunitários, representantes de determinadas associações municipais e
representantes de instituições de maior porte que apoiam e influenciam as decisões
locais, como por exemplo, a FASE e a Federação da FLONA Tapajós. As Assembleias são
reuniões abertas ao público, representando a participação democrática também citada
por Fung. Especialmente no caso das assembleias, estas não são suficientes para
atender a todas as demandas do munícipio. Entretanto, o aumento de sua recorrência
é dificultado pela falta de recursos para viabilizar a locomoção até o local da reunião,
pelos custos e pela distância, em muitos casos. Além disso, por serem voluntários, a
participação acarreta na perda de dias de trabalho, o que compromete ainda mais o seu
engajamento de maneira mais recorrente.
Por quê? Interesses em jogo (stakes)
Uma discussão do minipúblico se torna muito mais interessante a partir do momento
em que seus integrantes se mostram interessados pelo assunto a ser tratado, além de
possuírem interesse naquilo em que vai se basear a deliberação. Archon Fung considera
atitudes como esta como “hot deliberation”, ou seja, uma deliberação em que se
percebe grande motivação e vontade das pessoas em participar e discutir. No Conselho
da Cidadania se procura despertar essa motivação tanto em seus membros quanto nos
potenciais participantes de suas reuniões e população como um todo, com vistas a
florescer na sociedade local o senso crítico político e o poder de reivindicação por seus
direitos. De acordo com o chefe de Gabinete, tem-se o desejo de se estimular o senso
político da sociedade a partir da própria composição do Executivo do Conselho da
Cidadania, em 30% por membros do governo e 70% da sociedade civil
Em geral, as pessoas que participam do Conselho, mais especificamente no caso dos
representantes da sociedade civil, possuem uma motivação pessoal muito grande,
apesar de muitas vezes possuírem pouco ou nenhum conhecimento mais específico e
teórico, ou até mesmo, não saberem ler e escrever. Isso porque acreditam que o
Conselho seja um meio efetivo de serem ouvidos e poderem participar das decisões
políticas. Dessa forma, acreditam e lutam pela efetivação dos anseios dos grupos que
representam, a defesa de ações e medidas que promovam melhorias a seus problemas
e o atendimento de necessidades básicas, a exemplo de saúde e educação.
Empowerment
Um dos objetivos pelo qual o Conselho da Cidadania foi criado é o de trazer a população
para as discussões das ações públicas, e também promover a organização desta de
maneira a atender as suas demandas e estabelecer prioridades para o orçamento
público do município. Neste tópico, Fung (2003) afirma que um minipúblico é
empoderado apenas se os resultados das deliberações, ou seja, o que é decidido no
Conselho é capaz de influenciar as decisões públicas.
De fato, muitas das decisões do governo estão baseadas nas discussões que acontecem
nesse espaço. O próprio orçamento do governo municipal, que segue o modelo de
Planejamento e Orçamento Participativo é coordenado pelo Conselho, refletindo o poder
de influência que este tem nas decisões públicas. Muitas destas são direcionadas por
meio dos resultados das discussões feitas dentro do Conselho, com a participação da
sociedade civil. Entretanto, por outro lado, muitas dessas ações discutidas e decididas
não são implementadas pelo governo, e nem ao menos é fornecido à população
qualquer justificativa quanto à situação do encaminhamento das medidas que deveriam
ser tomadas.
Monitoramento
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
15
Segundo Fung (2003), haver participantes que avaliem as discussões a respeito da
qualidade do que esta sendo realizado durante o processo de implementação, agrega
importantes benefícios. O primeiro benefício se relaciona com o aprendizado público, no
qual as pessoas adquirem experiência e aprendem que tipo de decisão possui maior
probabilidade de funcionar, dadas certas condições, numa espécie de escola para
cidadania. O outro benefício se refere à possibilidade de accountability do governo,
estimulando o aperfeiçoamento de políticas públicas.
Na experiência de Belterra, o que houve com a criação do Plano Diretor e do Conselho
da Cidadania foi uma mudança de cultura para uma sociedade civil mais participativa
nas discussões das políticas públicas. A população passou a cobrar mais
veementemente o que deseja e, de certa forma, a ajudar a prefeitura a priorizar as
políticas a serem implementadas. Em meio a isso, surgiu também a discussão de que
esta não só deve assumir o papel de reivindicadora, como também a responsabilidade
de fiscalizar o governo durante o processo de implementação de suas obras, como
também sugere Fung. Dessa forma, foram mencionadas tentativas de estruturação de
uma comissão fiscalizadora para as obras. Tanto o modelo de fiscalização por distrito
como por obra. não tiveram sucesso significativo, em razão do excesso de trabalho que
o Conselho da Cidadania chamou para si com o acúmulo de muitas responsabilidades,
que deveria não só eleger, mas também analisar as avaliações feitas pelas comissões
das obras da prefeitura.
É possível dizer, baseando-se em Fung, que o baixo nível de efetivação em termos de
implementação dos resultados das discussões feitas pelo Conselho pode estar
relacionado a essa falta de fiscalização da sociedade civil sobre as obras do governo. É
complicado afirmar que é a única razão, afinal, a prefeitura trabalha dentro de
limitações de orçamento e não tem como realizar tudo, por isso se priorizam ações.
Contudo, mais da metade dos entrevistados relatou situações nas quais as obras não
foram realizadas seguindo o devido padrão de qualidade ou ao menos terminadas. Além
disso, outros poucos afirmaram que pressionaram o governo e com certo esforço
conseguiram que essas falhas fossem corrigidas nas suas respectivas comunidades.
Desse modo, estes benefícios mencionados por Fung ainda precisam ser trabalhados
não só pela prefeitura municipal em relação à accountability, mas também, e
principalmente, pela sociedade belterrense, que é o principal agente estimulador disso
e a maior beneficiária dos resultados efetivos.
6. Considerações finais e reflexões
Reforçando a importância de ouvir a população para a tomada de decisão como um
caminho para a mudança, a solução desenvolvida com a construção do Conselho da
Cidadania tem se mostrado uma boa escolha. Não apenas pelo prêmio recebido como
Cidade Cidadã, mas é evidente a mudança que o instrumento agrega àqueles que nele
participam, como relatado por diversas pessoas o grande aprendizado que adquirem ao
conhecerem outras pessoas, seus diferentes pontos de vista, dificuldades e
necessidades, permitindo o contato com realidades outras, abrindo portas para o
conhecimento de outros modos de vida, ampliando sua visão de mundo.
Além disso, percebe-se que a participação em um órgão como este desperta a crença e
a confiança em si mesmo, no poder de agir, de transformar e de contribuir, e acima de
tudo, no potencial que, individualmente e juntos, possuem de contribuir com a
superação de problemas e com a transformação daquela realidade. Este
empoderamento é muito importante para a autoestima dos participantes,
representando uma ferramenta também para contagiar outras pessoas a fim de terem
esperança, de se mobilizarem e de lutarem por um futuro melhor. Somente com esta
força será possível transformar a realidade. Dessa forma, é possível despertar o que há
de melhor em cada ser, o respeito e o amor, a fé e a esperança de construir melhores
condições de vida, contribuindo para o bem-estar de todos.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
16
Por outro lado, o desenho institucional do Conselho em questão, conforme a análise
apresentada na seção anterior, possui algumas falhas e oportunidades não exploradas
que prejudicam seu desempenho e as perspectivas de sua perpetuidade. A comunicação
apresenta-se como uma importante ferramenta para o sucesso do Conselho da
Cidadania, por exemplo. É por meio desta que a mobilização poderá ser ampliada, que
a população terá conhecimento desta grande oportunidade, saberá como participar e
saberá seu papel, e poderá acompanhar a execução das propostas e os resultados
alcançados. A comunicação é também essencial para o melhor alinhamento de objetivos
e papéis, para a construção das propostas, políticas públicas e decisões a serem
tomadas, além do relacionamento entre a população e autoridades públicas. Entretanto,
atualmente não há qualquer meio oficial para divulgação das reuniões, propostas
debatidas e resultados alcançados, muito menos para a mobilização e conscientização
das oportunidades e importância da participação no Conselho.
Deve-se considerar também que não é apenas a comunicação que dificulta o
acompanhamento da execução das decisões. O modelo planejado para organizar tal
função foi prejudicado pela existência de apenas voluntários como membros do
Conselho, sem recursos ou fundos financeiros para apoiar sua atuação. Desta forma,
não há dinheiro, tempo e conhecimento técnico e de gestão suficientes para
acompanhar, fiscalizar e averiguar o andamento do que foi planejado. Vale ressaltar
que tal condição prejudica o funcionamento do Conselho de maneira geral.
Mesmo quando se obtêm um consenso que agrade às necessidades da população, o
governo local tem grande dificuldade em executar o almejado em razão da ausência de
profissionais capacitados, ainda mais em dadas especialidades técnicas, para realizar
devido planejamento e articulação das ações e políticas. A precariedade do sistema de
ensino da região prejudica também a formação dos participantes do Conselho da
Cidadania, impactando na sua capacidade de tomar decisões conforme requerido. Como
exemplo, pode-se citar a dificuldade de pensar mais a longo prazo e de forma mais
sistêmica.
Essa discussão sobre o poder de avaliação da população caracteriza também uma briga
política entre partidos que apoiam e valorizam a participação popular nas decisões
políticas, e aqueles que acreditam que não se deva dar tamanha liberdade àqueles que
não possuem o discernimento correto para determinado nível de decisão de âmbito do
orçamento municipal, por exemplo. Estes últimos argumentam ainda que o
consentimento com interesses da população, em certa medida, é apenas justificado pelo
desejo de satisfazer a população a curto prazo, e mascarar atitudes desonestas,
argumento este também utilizado contra quem prefere distanciar a população das
decisões.
A diferença politica também abrange diferentes visões sobre a teoria de
desenvolvimento aplicada no planejamento da cidade, sobre o nível de condições e
facilidades de uma grande metrópole que devem ser incorporadas a um município como
Belterra. Como exemplo pode-se citar a energia elétrica, fundamental para facilitar a
comunicação por meio de aparelhos móveis e a própria conservação de alimentos. Por
outro lado, permite acesso à transmissão de informações e realidades muito distantes
do viável à população local, a exemplo de programas de televisão. Estes geram uma
ambição por alcançar um estilo de vida incompatível com a realidade regional. Muitos
jovens, inclusive, são estimulados a se mudarem para grandes centros urbanos em
busca desse sonho de vida, mas acabam sendo marginalizados em razão da falta de
capacitação.
O nível de desenvolvimento impacta nos meios para ativação da atividade econômica e
geração de renda, os quais estão diretamente ligados à preservação do ecossistema
animal e vegetal. Por outro lado, o quanto a sustentabilidade desses recursos deve se
sobrepor ao direito desses cidadãos de ter acesso a melhores condições de vida também
está em pauta.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
17
Da mesma forma, uma melhor condição de vida, atrelada ao acesso a novas tecnologias,
serviços e produtos, está diretamente ligada à mudança do estilo de vida da região, o
qual muitas vezes não está de acordo com as respectivas condições. Como exemplo
pode-se citar a preocupação de certos indígenas sobre a chegada de produtos
industrializados. Apesar de trazerem novas opções e oportunidades nutricionais de
grandes cidades, estes trazem consigo a necessidade de utilização de mais recursos,
além da geração de resíduos, com os quais a região não está preparada para lidar. Da
mesma forma, os conhecimentos culturais de cultivo e de relacionamento com a
natureza ao redor são também afetados.
Por fim, percebe-se a necessidade de que as figuras públicas do município de Belterra
a favor do funcionamento do Conselho da Cidadania, bem como dos participantes deste
órgão, atentem para o aperfeiçoamento dos pontos mencionados anteriormente sobre
a adequação de seu desenho institucional, e especialmente, para a ampliação e
abrangência de sua atuação, de forma a não privilegiar uma parcela populacional, mas
sim, atender a toda a região municipal que necessita de uma forma geral, de melhor
infraestrutura, qualificação em aspectos da saúde, segurança e educação, de maneira
a se respeitar os direitos de cada cidadão em relação às suas condições de vida.
Sugere-se, pois, a complementação do presente estudo com avaliações mais detalhadas
e mensurações mais precisas do real impacto do Conselho da Cidadania, e das medidas
tomadas por este, para o munícipio e sua população. Com isto, será possível avaliar a
importância e impacto de cada aspecto do desenho institucional para que este possa
ser melhor reformulado.
Dessa forma, espera-se que o caso do Conselho da Cidadania seja um exemplo de
espaço participativo para inspirar a construção de outras ferramentas como esta em
outras localidades, e que auxilie na reflexão sobre os níveis e características de
desenvolvimento e de construção de políticas públicas em municípios com dificuldades
semelhantes.
Referências
ABRAMOVAY, R. Funções e medidas da ruralidade no desenvolvimento
contemporâneo. Rio de Janeiro: IPEA (Instituto Econômico de Pesquisa Aplicada),
2000. Disponível em: http:// www.ipea.gov.br/pud/td/autor005.html. Acesso em:
04.nov.2012.
AZEVEDO, GRAZIELA DONARIO. Conselhos Municipais como Canal de Participação
Pública: desafios para populações rurais na Amazônia. Um estudo de caso
sobre Juruti-PA. Dissertação (CMAPG) - Escola de Administração de Empresas de São
Paulo, 2012.
BELL, J. Projeto de pesquisa: guia para pesquisadores iniciantes em educação,
saúde e ciências sociais. 4a.ed. Porto Alegre: Artmed. 2008.
CONSELHO DA CIDADANIA. Conselho da Cidadania realiza 1ª Assembleia
Ordinária de 2012. Disponível em:<http://belterra.pa.gov.br/gestao/81-conselho-
da-cidadania-realiza-1-assembleia-ordinaria-de-2012.html>. Acessoem: 26.mai.2012.
CORNWALL, A.; COELHO, V. Spaces for Change? The Politics of Citizen Participation
in NewDemocratic Arenas, London: Zed Books, 2007.
CRESWELL, JOHN W. Research Design -Qualitative, Quantitative, and mixed
methods approaches. 2.ed., p. 204-216.
FASE. Belterra: plano diretor participativo rende prêmio. Disponível
em:<http://www.fase.org.br/v2/pagina.php?id=1841>. Acesso em: 28.mai. 2012.
FASE. Mapa dos distritos e comunidades do município de Belterra-PA. Material
parte de divulgação de trabalho da FASE Amazônia, coletado em campo. 2006.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
18
FLICK, U. Introdução à Pesquisa Qualitativa. 3a. ed. Porto Alegre: Artmed
Bookman, 2009.
FUNG, A. Recipes for Public Spheres: Eight Institucional Design Choices and
Their Consequences. The Journal of Political Philosophy, Volume 11, 2003.
GOHN, M. Empoderamento e participação da comunidade em políticas sociais.
Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 13, n. 2, Aug. 2004. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902004000200003
&lng=en&nrm=isso>. Acesso em: 04.nov.2012.
IBGE. Censo Demográfico de 2010. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/>. Último acesso em: 25. mai.2012.
JACOBI, P. Reflexões sobre as possibilidades de inovação na relação poder
público-sociedade civil no Brasil. Revista Organizações e Sociedade, 2001.
LAVERACK, Glenn. An Identification and Interpretation of the organizational
aspects of community empowerment. Oxford University Press and Community
Development Journal, 2001.
LEWIN, K. Field Theory in Social Science. London: Tavistock, 1952.
LEWIN,K. Principles of Topological Psychology. NY: McGrill Hill, 1936.
LÜCHMANN, L. O Desenho Institucional dos Conselhos Gestores. João Pessoa:
Editora Universitária da UFPB, 2008.
MARTINS, S. Desenvolvimento Local: questões conceituais e metodológicas.
Revista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 3, N. 5, p. 51-59, Set.2002.
MINISTÉRIO DAS CIDADES. Banco de Experiências de Planos Diretores
Participativos. 2007. Disponível em: <
http://www.cidades.gov.br/index.php/planejamento-urbano/380-para>. Acesso em:
20.set.2012
PATEMAN, C. Participação e Teoria Democrática. Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro,
1992.
PREFEITURA DE BELTERRA. Prefeitura Municipal de Belterra, História. Disponível
em: <http://belterra.pa.gov.br/o-municipio/historia.html>. Acesso em: 26 mai. 2012.
SILVERMAN, D. Interpretação de dados qualitativos. 3ªed.: Porto Alegre: Artmed,
2009.
SINDICATO. Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Belterra em Assembleia
Geral. Disponível
em:<http://cidadaniabelterra.redemocoronga.org.br/2011/01/31/sindicato-dos-
trabalhadores-rurais-de-belterra-em-assembleia-geral/>. Acesso em: 26. mai. 2012.
SPINK, P. K. O pesquisador conversador no cotidiano. Psicologia & Sociedade,
SciELO Brasil, 2008.
SPINK, P. K. Pesquisa de campo em psicologia social: uma perspectiva pós-
construcionista. Psicologia& Sociedade, SciELO Brasil, 2003.
TATAGIBA. Sociedade Civil e Espaços Públicos. Editora Paz e Terra, São Paulo, 2002.
YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 4. ed., Porto Alegre:
Bookman, 2010.
Anexos
1- Roteiro de entrevistas
a. Anexo 1a - Roteiro de entrevista semi-estruturada com membros do CC
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
19
A pessoa e a cidade
1- Como é viver em Belterra? Sempre morou aqui?
2- O que o senhor faz aqui?
3- Idade
Perfil associativista
4- Conte um pouco sobre sua relação com o Conselho
5- Você representa(va) então qual instituição? Desde quando?
6- Faz parte de outros grupos ou associações?
7- Como foi a criação desses grupos? Eles existem desde quando?
8- Como foi que começou a participar?
Perfil do Conselho
9- Como foi a criação do conselho? Quem coordenou o processo? Tem lei de criação?
Quando foi isso?
10- Quem faz parte do Conselho? Sempre foram essas organizações? Isso muda? O
governo municipal faz parte?
11- Como é a escolha das organizações que fazem parte do Conselho?
12- Qual a relação do Conselho com as comunidades rurais? Há representantes das
comunidades no Conselho? Como foram escolhidos?
13- Com que freqüência o Conselho se reúne? Quem articula/marca a reunião?
Pauta e discussões
14- Qual o papel do Conselho? O que o Conselho faz?
15- Quais os principais temas discutidos no Conselho? Quem propõe a pauta?
16- Tem algum outro tema que deveria ser discutido?
Decisão e encaminhamentos
17- Como são as reuniões? Todos falam? Alguém coordena a reunião?
18- Tomam decisões nas reuniões? Como é o processo de tomada de decisão? É
votação? É consenso?
19- As decisões são divulgadas? Como?
20- Como é o encaminhamento dos resultados das discussões? Quais são os caminhos?
Isso chega até o governo municipal? Como?
21- Tem alguma decisão do Conselho que foi implementada? Quem implementou?
22- Quais os maiores desafios para implementar as decisões tomadas no âmbito do
Conselho?
Avaliações
23- Como o senhor percebe a atuação do Conselho?
24- Qual a relação do Conselho com o Plano Diretor? E hoje? Existe um papel de
monitoramento?
24- Como o senhor entende o papel do conselheiro?
b. Anexo 1b - Roteiro de entrevista semi-estruturada com lideranças
comunitárias e representantes de associações comunitárias
A pessoa e a cidade
1- Como é viver em Belterra? Sempre morou aqui?
2- O que o senhor faz aqui?
3- Idade
Perfil associativista
4- Aqui o senhor de algum grupo ou associação?
5- Como foi a criação desses grupos? Eles existem desde quando?
6- Como foi que começou a participar?
7- Há outros grupos ou associações na comunidade?
8- Esses grupos são formalizados?
9- Quem faz parte desses grupos? Qualquer morador pode participar?
10- Com que freqüência esses grupos se reúnem? Quem articula/marca a reunião?
11- Conte os principais assuntos discutidos nos grupos.
Relação com o Conselho e avaliações
12- Conte um pouco sobre sua relação com o Conselho: fez/faz parte? Quando?
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
20
13- Tem alguma relação entre a associação que faz parte e o Conselho?
14- Como o senhor percebe a atuação do Conselho? O que o senhor acha do Conselho?
15- Como vocês ficam sabendo do que acontece no Conselho?
16- Como o senhor entende o papel do conselheiro?
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática em Sustentabilidade Vol. 4 no 2 – Agosto de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179-474X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
Fotocatálise Heterogênea com a utilização de luz solar na degradação do Azul de Metileno
Heterogeneous Photocatalysis using sunlight in the degradation of Methylene Blue
Ana Paula Menezes de Oliveira
Centro Universitário Senac - SENAC
Área de Ciências Ambientais – Engenharia Ambiental
Alexandre Saron
Centro Universitário Senac - SENAC
Área de Ciências Ambientais – Engenharia Ambiental – Professor Orientador
Resumo. Problemas ambientais assolam nossa realidade e, a cada dia, surgem novas soluções para a minimização dos impactos causados, decorrentes das atividades humanas. A busca por tratamentos efetivos ganham o mercado e o meio científico, dentre eles, tratamentos de efluentes por Processos Oxidativos Avançados (POA). Técnicas inovadoras, que impactem cada vez menos o meio ambiente são associadas aos POAs, como a substituição de um catalisador mais agressivo, ao meio, por outro com menor agressividade, além de propor a utilização ao máximo dos recursos naturais para obtenção de energia, como por exemplo, Fotocatálise Heterogênea utilizando a luz solar. Com a finalidade de propor uma técnica alternativa no tratamento de efluentes industriais é que se optou pelo estudo da fotocatálise heterogênea, uma vez que segundo levantamos bibliográficos, tem sido amplamente estudada, no tratamento de efluentes líquidos ou gasosos e se demonstrado versátil na interação com diversos contaminantes. Neste estudo, a utilização da fotocatálise heterogênea para a degradação do azul de metileno, apresentou resultados perceptíveis a olho nu, sendo considerada uma tecnologia válida no tratamento de efluentes industriais contendo corante.
Palavras-chave: Tratamento de efluentes, Processos Oxidativos Avançados (POA), Fotocatálise heterogênea, Azul de metileno, Dióxido de titânio (TiO2). Abstract. Environmental problems make our reality and every day there are new solutions for minimizing caused the impacts arising from human activities. The search for effective treatments to market gains and the scientific community including effluent treatment by Advanced Oxidation Processes (AOP). Innovative techniques that affect less the environment are associated with the AOP, such as replacement of a catalyst the most aggressive to the other part with less aggressive, and propose to use the most natural resources for energy, such as, Heterogeneous Photocatalysis using sunlight.In order to propose an alternative technique in the treatment of industrial effluents is that it was chosen for study of heterogeneous photocatalysis since according to raise bibliographic has been extensisively studied in the treatment liquid or gaseous effluent and versatile shown in the interaction with more contaminants, This study the use of heterogeneous photocatalysis to the degradation the methylene
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
2
blue visibly showed results being considered a valid technology in the treatment industrial wastewater containing dye.
Key words: Effluent treatment, Advanced Oxidation Processes (AOP),
Heterogeneous photocatalysis, Methylene blue, Titanium Dioxide (TiO2).
1. Introdução
Um dos males que assolam o mundo é sem dúvida a poluição ambiental, nela está atrelada; o mau uso dos recursos naturais e a ineficiência legal, bem como sua fiscalização, além do desconhecimento das consequências acerca de determinadas substâncias dispostas no meio (TEIXEIRA E JARDIM, 2004). O resultado da preocupação com o meio ambiente é uma dita conscientização, por parte da sociedade, em face aos problemas apresentados. Essa conscientização resulta no estabelecimento de normas e leis cada vez mais restritivas a fim de minimizar impactos no meio ambiente. No Brasil, entretanto, essas medidas ainda são insuficientes, o que gera necessidade de outras soluções, como a proposição de novos tratamentos de efluentes que garantam um baixo nível de contaminantes e destinação adequada aos resíduos gerados (NOGUEIRA E JARDIM, 1997).
Como solução, novos processos de tratamento de resíduos estão em desenvolvimento. ‘Processos Oxidativos Avançados’ (POAs), que são um deles, vêm atraindo grande interesse no meio científico por trazerem grandes vantagens à longo prazo (NOGUEIRA E JARDIM, 1997). Esse processo – POA- tem por finalidade a mineralização dos poluentes, ou seja, a conversão em CO2 e H2O e, ácidos minerais como o HCl. Muitos dos POAs ocorrem em temperatura ambiente e utilizam essa energia para produzir intermediários com alto potencial oxidativo e redutivo, que servem para “atacarem” os compostos alvos (BAIRD E CANN, 2011). Entre os POAs, a Fotocatálise Heterogênea (FH) tem sido amplamente estudada, principalmente nas últimas duas décadas. Teve origem na década de setenta, quando pesquisas em células fotoeletroquímicas começaram a ser desenvolvidas com o objetivo de produção de combustíveis a partir de materiais baratos, visando à transformação da energia solar em química.
O princípio da fotocatálise heterogênea envolve a ativação de um semicondutor (geralmente, dióxido de titânio, TiO2) por luz solar ou artificial. (NOGUEIRA E JARDIM, 1997). Uma grande variedade de classes de compostos orgânicos tóxicos é passível de degradação por fotocatálise heterogênea. Muitos trabalhos têm demonstrado ser possível a completa degradação de contaminantes orgânicos como: fenol, hidrocarbonetos clorados, clorofenóis, inseticidas, corantes e outros, na presença de TiO2 e da luz solar (NOGUEIRA E JARDIM, 1997).
Como ponto central desse estudo, o tipo de poluição a ter maior atenção será quanto à poluição hídrica - decorrente da disposição de compostos químicos, muitas vezes sem tratamento, lançados nos corpos d’água – e, dessa maneira, o estudo aprofundado do tratamento de efluentes por meio da Fotocatálise Heterogênea, utilizando a luz solar para a degradação do composto químico azul de metileno, que segundo Fabrício, 2010 é largamente utilizado em vários tipos de processos produtivos; comumente aplicado na produção de papel e outros materiais como poliésteres e nylons e, além disso, segundo Classificação de Utilização por Substrato e informações obtidas por meio da Associação Brasileira da Indústria Química (ABIQUIM), o azul de metileno por se tratar também de um corante básico pode ser empregado para coloração de couro, lã, e madeira.
2. Fundamentação teórica
Azul de metileno
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
3
O azul de metileno é muito utilizado como um indicador de reações REDOX em química analítica. Soluções com este corante são azuis quando em um ambiente oxidante, mas tornam-se incolores quando expostas a um agente redutor (INSTITUTO DE QUÍMICA DA USP). É classificado como um corante básico, aromático heterocíclico, solúvel em água ou álcool (Lima apud POGGERE et al, 2011), pertence à classe das fenotiazinas (Schiavo, 2010 apud POGGERE et al, 2011) e é reconhecido com a fórmula química C16H18ClN3S. 3H2O.
Figura 1. Estrutura molecular do corante azul de metileno FONTE: Merk Chemicals (2011) apud POGGERE et al, 2001
O azul de metileno também é classificado com um corante tiazínico, isto é, básicos e/ou mordentes, segundo Classificações Químicas da ABIQUIM, do tipo catiônico (FABRÍCIO, 2010). Uma das características dos corantes básicos é que são solúveis em água e produzem cátions coloridos em solução, desta forma também são reconhecidos como corantes catiônicos. (Guaratini e Zanoni, 2000 apud POGGERE et al, 2011).
Uso
Corantes são largamente utilizados em vários tipos de processos produtivos, comumente aplicado na produção de papel e outros materiais como poliésteres e nylons. (FABRÍCIO, 2010). Segundo Classificação de Utilização por Substrato e informações obtidas no sitio da Associação Brasileira da Indústria Química (ABIQUIM), o azul de metileno por se tratar também de um corante básico pode ser empregado para coloração de couro, fibras sintéticas, lã, madeira e papel.
Alguns corantes básicos apresentam atividade biológica e são usados em medicamentos como antissépticos (Hunger, 2003 apud POGGERE et al, 2011), por ser também classificado como fenotiazina pode compor medicamentos tais antihistamínicos e antipsicóticos. (FABRÍCIO, 2010), então o azul de metileno pode estar presente, seja nas indústrias têxteis, farmacêuticas, de papel e celulose e etc. Portanto, efluentes que contenham em sua composição corantes, devem ser tratados, de modo a não se obter líquido ainda colorido. Um dos métodos, hoje, que podem ser empregados é o tratamento desses efluentes por POA, conforme será descrito a seguir.
Processos Oxidativos Avançados – POA
Os POAs, em sua concepção, tendem a ocorrer com uma combinação de agentes oxidantes fortes (Peróxido de Hidrogênio - H2O2 ou Ozônio - O3), irradiação (UV ou ultrassom) e, catalisadores ou fotocatalisadores (íons metálicos) que são estudados atualmente nos processos de tratamento de efluentes, devido ao seu alto poder de oxidação da matéria (BILA, AZEVEDO E DEZZOTTI, 2008). Esse processo – POA – tem por finalidade a mineralização dos poluentes, ou seja, a conversão em CO2 e H2O e, ácidos minerais como o HCl. Muitos dos POAs ocorrem em temperatura ambiente e utilizam essa energia para produzir intermediários com alto potencial oxidativo/ redutor, que servem para “atacarem” os compostos alvos. Em sua maioria, os POAs, envolvem a geração significativa de radicais hidroxilas livre (OH-), os quais, em solução aquosa tornam-se agentes oxidantes poderosos e por vezes a luz ultravioleta (UV) é comumente utilizada para dar o start up (início) à produção desses radicais livres (BAIRD E CANN, 2011).
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
4
Assim, pode-se dizer que é favorável no processo de tratamento à geração de radicais livres de hidroxilas, por serem estas, por sua vez, segundo Dezzotti et alii (2008) e Teixeira e Jardim (2004) são espécies muito reativas e com baixa seletividade com constantes de reação na ordem de 106 – 109 M-1s-1; reagem com a maior parte das moléculas orgânicas (TEIXEIRA e JARDIM, 2004; FERREIRA, 2005; TIBURTIUS e PERALTA-ZAMORA, 2005; DEZOTTI, et al, 2008;).
Dentre os POAs destacam-se os que incluem ozônio, reativo de Fenton, Foto Fenton e a Fotocatálise com TiO2. Todos esses métodos podem ocorrer com ou sem irradiação UV (BILA, AZEVEDO E DEZZOTTI, 2008; POLEZI, 2003).
Os POAs, ainda podem ser classificados quanto aos sistemas típicos existentes, pois podem ser de caráter homogêneo ou heterogêneo. São classificados assim, uma vez que processos que envolvem a presença de catalisadores sólidos são chamados de heterogêneos, enquanto que os demais são os tidos homogêneos.
Fotocatálise heterogênea utilizando o TIO2
A fotocatálise heterogênea é o processo que envolve reações redox, induzidas pela radiação solar, na superfície de semicondutores minerais (catalisadores) como, por exemplo, TiO2, CdS, ZnO, WO3, ZnS, BiO3 e Fe2O3 (FERREIRA E DANIEL, 2004).
O processo de fotocatálise que, por definição da palavra, deriva de fotoquímica + catálise, consiste na reação catalítica por fotoativação de um semicondutor inorgânico. A energia do fóton deve ser maior ou igual à energia do “band gap” (quantidade mínima de energia requerida para excitar o elétron) do semicondutor e assim provocar a transferência de elétrons (DANIEL, 2001; FERREIRA E DANIEL, 2004; MONTAGNER, PASCHOALINO E JARDIM, 2005; FERREIRA, 2005).
Em outras palavras, o mecanismo da fotocatalise heterogênea envolve a fotoativação do semicondutor com a luz solar ou artificial. Todo semicondutor possuí bandas de valência (BV) e bandas de condução (BC), quando esse semicondutor é irradiado com radiação UV, numa energia maior que sua energia de band gap, são gerados elétrons (eBC-) na banda de condução e lacunas (hVB+) na banda de valência (NOGUEIRA E JARDIM, 1997). Dessa forma, sob irradiação, um elétron é transferido da banda de valência (BV) para a banda de condução (BC). Por reações REDOX, que catalisam reações químicas, oxidam compostos orgânicos até mineralizar a matéria, isto é, transformá-la em CO2 e H2O, e reduzindo metais dissolvidos ou outras espécies presentes (ZIOLLI E JARDIM, 1998 apud FERREIRA E DANIEL, 2004).
A seguir, Figura 2 do mecanismo simplificado da fotocatálise heterogênea.
Figura 2. Mecanismo simplificado da fotoativação de um semicondutor. Fonte: MONTAGNER, PASCHOALINO E JARDIM, 2005.
As lacunas fotogeradas mostram potenciais bastante positivos, na faixa de +2,0 a +3,5 volts medidos contra um eletrodo de calomelano saturado dependendo do semicondutor e do pH e podem oxidar a molécula orgânica formando R+ ou reagir
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
5
com OH- ou H2O oxidando estas espécies a OH. a partir de moléculas de água adsorvidas na superfície do semicondutor (equação 1-3), os quais podem subsequentemente oxidar o contaminante orgânico (NOGUEIRA E JARDIM, 1997).
A eficiência da fotocatálise depende da competição entre o processo em que o elétron é retirado da superfície do semicondutor e o processo de recombinação do par elétron/lacuna o qual resulta na liberação de calor (equação 4) (NOGUEIRA E JARDIM, 1997).
A energia necessária para ativar o TiO2 é de aproximadamente 3,2 volts - o que corresponde à radiação UV de comprimento de onda inferior à 387 nm. Dentre os semicondutores, o TiO2 tem sido o mais amplamente estudado e aplicado no tratamento de efluentes, pois traz consigo características atrativas, tais como não tóxico, baixo custo, insolubilidade em água, fotoestabilidade, estabilidade química em uma ampla faixa de pH e possibilidade de ativação pela luz solar, o que reduz os custos do processo (NOGUEIRA, ALBERICI & JARDIM, 1997 apud MONTAGNER, PASCHOALINO E JARDIM, 2005).
Dióxido de Titânio (TiO2)
Existem em três formas alotrópicas para o TiO2 que são: anatase, rutilo e brookite, onde as 2 primeiras são mais ocorrentes. A forma rutilo é inativa para a fotodegradação de compostos orgânicos sendo que a razão para tal hipótese ainda não é totalmente esclarecida. No entanto, a baixa capacidade de adsorção de O2 em sua superfície é apontada como um dos possíveis fatores (NOGUEIRA E JARDIM, 1997; MONTAGNER, PASCHOALINO E JARDIM, 2005).
Figura 3. Formas alotrópicas do TiO2. a) anatase e b) rutilo Fonte: CANDAL, et alli., 2001 apud MONTAGNER, PASCHOALINO E JARDIM, 2005.
Para reações fotocatalíticas o fotocatalizador deve estar suportado, isto é, fixado em um meio suporte. Existem vários tipos de suportes propostos atualmente, como por exemplo, vidro, sílica-gel, fibras óticas de quartzo, membranas microporosas de celulose, argilas de alumina, monolíticos cerâmicos, zeólitas, aço inoxidável etc (POZZO et alli., 1997 apud BISPO JÚNIOR, 2005).
3. Objetivo
Estudo da eficiência da fotocatálise heterogênea, utilizando a luz solar no tratamento de efluentes industriais, sintetizado em laboratório que contenha azul de metileno, com a finalidade de observação na degradação da cor.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
6
4. Material e Método
Reator
Foi confeccionado um reator que consiste basicamente numa placa de vidro jateada de 1,20 X 0.54 m e fixada com dióxido de titânio (TiO2), por onde o efluente irá passar. O efluente é armazenado em um tanque, bombeado até a placa e é coletado novamente no tanque de armazenamento e assim recirculado (FERREIRA e DANIEL, 2004).
Figura 4. Representação esquemática dos experimentos Fonte: FERREIRA E DANIEL, 2004.
Figura 5. Instalação experimental.
Fixação de TiO2 na placa de vidro
Seguindo a metodologia aplicada por Ferreira (2005), o catalisador utilizado será o TiO2 e para suportá-lo em vidro segui-se as seguintes etapas: lavagem da placa de vidro com detergente e posteriormente com solução de ácido nítrico a 10% e em seguida foi aplicado a suspensão de TiO2 a 10% ( pH de 3,68), deixado escoar o excesso por gravidade e com o auxilio de um soprador térmico (vazão de ar 240-400 L/min e temperatura de 300 – 500 °C), foi seca a camada do catalisador. Esse processo foi repetido por 3 vezes até obter uma concentração de aproximadamente 10g de TiO2/m2 (FERREIRA, 2005 apud. Ferreira e Nogueira, 1998).
Efluente
Foi sintetizado em laboratório efluente contendo azul de metileno para ser recirculado no reator. Esse efluente foi preparado com água destilada a uma concentração de 20 ppm de azul de metileno, por se tratar da concentração mínima permissível para analisar a degradação da cor.
Operação
O reator foi deixado exposto ao sol, voltado para o norte e a inclinação da placa de vidro numa angulação de aproximadamente 23º devido a localização geográfica de São Paulo estar na latitude 23º, de modo a proporcionar, enquanto o sol estiver incidindo sob a placa, uma incidência uniforme em toda ela.
Para as análises da degradação do azul de metileno o reator foi operado de 2 a 5 horas e de hora em hora fora recolhida uma amostra com cerca de 50 mL do efluente circulado no reator.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
7
5. Resultados e discussão
O efluente tinha uma concentração inicial de 20 ppm. Dessas amostras todas foram submetidas a análises químicas para os parâmetros de pH, condutividade e também submetidos a espectrofotometria verificando os níveis de absorbância. Com os dados levantados das análises, também foi possível elaborar um gráfico com a curva de degradação do azul de metileno para todas as análises, conforme seguem:
Tabela 1 – Resultados das análises Análise A
Horário
Amostra Data Início Término pH Condutividade (µS) Absorbância
Pura A 11/06/2013 13:30 - 8,08 81,2 2,3821
1A 11/06/2013 13:30 14:30 8,24 102,6 2,3282
2A 11/06/2013 13:30 15:30 8,21 112,6 1,9644
CONDIÇÕES EXPERIMENTAL
Volume (litros) Concentração (ppm) Vazão (L/hora) Condições Meteorológicas
2 20 72 Nublado
Tabela 2 – Resultados da análise B
Análise B
Horário
Amostra Data Início Término pH Condutividade (µS) Absorbância
Pura B 12/06/2013 10:40 - 7,91 84,1 2,3952
1B 12/06/2013 10:40 11:40 8,1 103,9 2,1466
2B 12/06/2013 10:40 12:40 8 125,3 0,8653
3B 12/06/2013 10:40 13:40 7,96 148,8 0,4069
4B 12/06/2013 10:40 14:40 7,9 234 0,1868
CONDIÇÕES EXPERIMENTAL
Volume (litros) Concentração (ppm) Vazão (L/hora) Condições Meteorológicas
2 20 72 Tempo claro, com nuvens e com sol
Tendo em vista a evaporação considerável do efluente como foi observado nas análises anteriores, foi proposto que o reator operasse com um volume maior, neste caso, foi preparado nova solução do azul de metileno de 5 litros, abaixo, tabela com resultados desta análise:
Tabela 3 – Resultados da análise C Análise C
Horário
Amostra Data Início Término pH Condutividade (µS) Absorbância
Pura C 13/06/2013 12:00 - 8,01 87,1 2,4154
1C 13/06/2013 12:00 13:00 8,11 90,1 2,3952
2C 13/06/2013 12:00 14:00 8,14 94 2,3696
3C 13/06/2013 12:00 15:00 8,19 209 2,3396
4C 13/06/2013 12:00 16:00 8,17 104,3 2,1284
5C 13/06/2013 12:00 17:00 8,13 108,3 1,9947
CONDIÇÕES EXPERIMENTAL
Volume (litros) Concentração (ppm) Vazão (L/hora) Condições Meteorológicas
5 20 72 Tempo claro, com nuvens e com sol
Após o teste com o volume de 5 litros, optou-se diminuir o volume para operação do reator, lidando com situações limites para as análises (quantidade mínima para operação), então a última análise, análise D operou com 2,5 L num total de 4 horas conforme seguem resultados:
Tabela 4 – Resultados da análise D Análise D
Horário
Amostra Data Início Término pH Condutividade (µS) Absorbância
Pura D 14/06/2013 12:30 - 7,86 323 2,4018
1D 14/06/2013 12:30 13:30 7,99 110,2 2,3339
2D 14/06/2013 12:30 14:30 8,04 130,9 1,4046
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
8
3D 14/06/2013 12:30 15:30 8,06 150,7 0,9723
4D 14/06/2013 12:30 16:30 8,06 165,1 0,7503
CONDIÇÕES EXPERIMENTAL
Volume (litros) Concentração (ppm) Vazão (L/hora) Condições Metereológicas
2,5 20 72 Ensolarado
Figura 6. Curva de degradação do azul de metileno.
A seguir figuras 7, 8, 9 e 10 das análises A, B. C e D:
Figura 7. Puro A, 1A E 2A respectivamente.
Figura 8. Puro B, 1B, 2B, 3B E 4B respectivamente.
Figura 9. Puro C, 1C, 2C, 3C, 4C e 5C respectivamente.
Figura 10. Puro D, 1D, 2D, 3D E 4D respectivamente.
Para a análise A, foi observado as seguintes características na operação; tempo nublado, a bomba operou na vazão de 72 L/h num total de 2 horas com 2L de efluente. Ao fim das coletas observou-se a degradação da cor a olho nu, comparando as 3 amostras coletadas. No segundo dia, análise B, as condições de operação seguiram: tempo claro, com nuvens e insolação esporádica, a bomba operou na mesma vazão 72 L/h com 2L de efluente num total de 4 horas, observou-se considerável degradação da cor. No terceiro dia, análise C, tempo nas mesmas condições da análise B. bomba operando com a mesma vazão, porém em 5 L de efluente, totalizando de 4 horas de operação. Quase não ocorreu a degradação da cor, pelo menos a olho nu. No quarto e último dia, análise D, o tempo estava ensolarado, bomba operando com a mesma vazão, 72L/h, para 2,5 L de efluente e possibilitou verificar a degradação da cor a olho nu.
6. Conclusões
A Figura 2 demonstra a degradação da cor de cada análise realizada. Nota-se dois contrapontos principais; A análise C que teve maior intervalo de horas de operação, porém se comparado com a análise B teve menor degradação da cor. A esse fator é atribuído pelo maior volume de operação adotado para análise C, diminuindo a
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
9
quantidade de ciclos passados pelo reator e também pela não incidência constante de sol sob o reator durante o experimento. Deste modo, pode-se observar que reatores fotocatalíticos são operados com baixos volume, num máximo de 2L, porque o que vai influenciar diretamente a degradação dos compostos analisados no efluente é a quantidade de ciclos que este irá passar pelo fotocatalisador.
O sol presente faz com que essa degradação se intensifique, porém foi observado na análise A, primeiro dia, em condições de irradiação solar bem mais amenas do que operadas para as análises B, C e D, ainda sim podemos constatar uma degradação da cor a olho nu, entretanto para análise C, como o reator operou com um volume maior, cerca de 5 litros, a quantidade de vezes que o efluente passou pelo reator foi menor e assim obtivemos uma degradação quase que desprezível, a olho nu. Assim, aumentar o volume para evitar situações limites de falta de efluente a ser bombeado, após algumas horas de operação pode ser uma boa estratégia, mas para termos uma visão perceptível de degradação da cor também teríamos que aumentar a vazão da bomba e assim o efluente passar o maior número de vezes sob a placa.
Referências
Associação Brasileira da Indústria Química (ABIQUIM): Disponível em: < http://www.abiquim.org.br/corantes/cor_classificacao.asp> Acesso em: 27/04/2011;
BAIRD, Colin e CANN, Michael. Química Ambiental. 4ª Edição. Bookman. Porto Alegre, 2011;
BILA, Daniele Maia, AZEVEDO, Eduardo Bessa e DEZZOTTI, Márcia. Ozonização e Processos Oxidativos Avançados. In: DEZZOTTI et alii, Márcia. Processos e Técnicas para o Controle Ambiental de Efluentes Líquidos. Rio de Janeiro: E-papers, Série Escola Piloto de Engenharia Química COPPE/UFRJ, 2008;
BISPO JÚNIOR, Nilson José de Oliveira. Estudo Cinético e modelagem de um reator fotocatalítico anular com TiO2 imobilizado. 2005. Tese de Doutorado. Dissertação de Mestrado em Engenharia Química, COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro, 88 p.
BOLTON, J.R. Light compendium: ultraviolet principles and applications. EPA-N w s ee (1999), n.66, p.9 37;
DEZOTTI, Márcia. Processos e técnicas para o controle ambiental de efluentes líquidos: Volume 5 da Série Escola Piloto de Engenharia Química. Editora E-papers, 2008.
FABRÍCIO, Tailena Naiara Rodrigues et al. Produção de Biossurfactante e Biodegradação no Cultivo de Geobacillus stearothermophilus com Corante Azul de Metileno. In: V CONNEPI-2010. 2010.
FERREIRA, Ivete Vasconcelos Lopes; DANIEL, Luiz Antonio. Fotocatálise heterogênea com TiO2 aplicada ao tratamento de esgoto sanitário secundário; TiO2 heterogeneous photocatalysis in secondary wastewater treatment. Eng. sanit. ambient, v. 9, n. 4, p. 335-342, 2004.
GONÇALVES, Ricardo Franci.; FILHO, Bruno Coraucci.; CHERNICHARO, Carlos Augusto Lemos et alli. Capítulo 6: Desinfecção por radiação ultra violeta. In: GONÇALVEZ, Ricardo Franci, JORDÃO, Eduardo Pacheco e SOBRINHO, Pedro Alem. Capítulo 1. In: GONÇALVES, Ricardo Franci. Desinfecção de efluentes sanitários. Rio de Janeiro : ABES, RiMa, 2003. 438 p. Projeto PROSAB. ISBN 85-86552-72-0;
HARM, Walter. Biological effects of ultraviolet radiation. Cambridge: Cambridge University Press, 1980.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
10
INTITUITO DE QUÍMICA DA USP, Disponível em: << http://www2.iq.usp.br/pos-graduacao/images/documentos_pae/1sem2010/fisico_quimica/leandro.pdf>> Acesso em: 05/05/2012;
MONTAGNER, C. C.; PASCHOALINO, M. P.; JARDIM, W. F. Aplicação da fotocatálise heterogênea na desinfecção de água e ar. Caderno temático, v. 4, 2005.
NOGUEIRA, Raquel FP; JARDIM, Wilson F. A fotocatálise heterogênea e sua aplicação ambiental. Química Nova, v. 21, n. 1, p. 69-72, 1998. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/qn/v21n1/3471.pdf> Acesso em: 02/05/2012;
POLEZI, Mauricio. Aplicação de processo oxidativo avançado (H2O2/UV) no efluente de uma ETE para fins de reuso. 2003. Disponível em: << http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?view=vtls000313574>>. Acessado em: 12/03/2013;
POGGERE, Paula Andreia et al. Azul de Metileno: Propriedades e Tratamentos. Anais do III ENDICT – Encontro de Divulgação Científica e Tecnológica. Universidade Tecnológica Federal do Paraná- Câmpus Toledo, 2011. Disponível em: < http://www.utfpr.edu.br/toledo/estrutura-universitaria/diretorias/dirppg/anais-do-endict-encontro-de-divulgacao-cientifica-e-tecnologica/anais-do-iii-endict/AZUL%20DE%20METILENO%20PROPRIEDADES%20E%20TRATAMENTOS.pdf> Acesso em: 27/04/2011;
POZZO, Roberto L.; BALTANAS, Miguel A.; CASSANO, Alberto E. Supported titanium oxide as photocatalyst in water decontamination: state of the art. Catalysis Today, v. 39, n. 3, p. 219-231, 1997.
TEIXEIRA, C. P. A. B.; JARDIM, W. de F. Processos oxidativos avançados: conceitos teóricos. Caderno temático, v. 3, p. 83, 2004. Disponível em: http://lqa.iqm.unicamp.br/cadernos/caderno3.pdf Acesso em: 27/04/2012;
TIBURTIUS, Elaine Regina Lopes; PERALTA-ZAMORA, Patricio; EMMEL, Alexandre and LEAL, Elenise Sauer. Degradação de BTXs via processos oxidativos avançados. Quím. Nova [online]. 2005, vol.28, n.1, pp. 61-64. ISSN 0100-4042;
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática em Sustentabilidade Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179474 X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
Identificações dos aspectos e impactos ambientais associados à
cadeia produtiva do etanol – a partir da cana-de-açúcar:
contribuição para o estabelecimento do perfil de desempenho
ambiental por meio da técnica de Avaliação de Ciclo de Vida (ACV)
Identifications of the aspects and environmental impacts associated to the
productive chain of the ethanol – from the sugar cane: contribution for the
establishment of the profile of environmental performance through the
technique of the Life Cycle Assessment (LCA)
ARAUJO, Nayla Aparecida Alves1. SEO, Emília Satoshi Miyamaru2 1Tecnologa em Gestão Ambiental; Bolsista do CNPq; Centro Universitário SENAC – SP. 2Professor(a) e orientador(a) do Centro Universitário Senac [email protected]; [email protected]
RESUMO. Em busca de alternativas que diminuísse o uso de derivados do petróleo, o
setor sucroenergético encontrou uma alternativa singular: a produção do álcool etílico
hidratado – o etanol, a partir da cana-de-açúcar. O Brasil destaca-se sendo o maior
produtor de etanol, concentrando 90% do plantio da cana na região centro-sul. Por sua
vez, mesmo com a introdução de novas técnicas e tecnologias que incorpore uma
postura de prevenção ao meio ambiente, o processo produtivo do álcool etílico
apresenta-se como um grande causador de impactos ambientais em seu processo
produtivo. Impactos estes gerados pelo uso de agroquímicos nos tratos culturais,
emissão de gases tóxicos durante a colheita manual utilizando métodos como a
queimada (um método facilitador aos trabalhadores rurais), consumo de água para
lavagem da cana e diversas outras atividades no processo produtivo, e significativo
consumo de energia elétrica.
Portanto, a finalidade do presente projeto, visa identificar os impactos e aspectos
ambientais deste processo tomando conceitos da Avaliação do Ciclo de Vida (ACV), uma
ferramenta que avalia todos os estágios do Ciclo e Normas técnicas padronizadas pela
ISO (International Organization for Standardization) da série 14000.
Palavras-chaves: Etanol. Cana-de-açúcar. Impactos ambientais. Avaliação do ciclo de
vida.
ABSTRACT. In search of alternatives for reduction of the use of derivates of the oil,
the energetic sugar sector found a singular alternative: the production of the hydrated
ethylic alcohol – the ethanol, from the sugar cane. Brazil stands out being the biggest
producer of ethanol, concentrating 90 % of the planting of the cane in the region I
south-center. For his time, with the introduction of new techniques and technologies that
a prevention posture incorporates to the environment, the productive process of the
ethylic alcohol presents itself a great transmitter of toxic gases during the manual
harvest using methods as the forest fire (a method facilitador to the rural workers),
water consumer for washing of the cane and several other activities, and bigger
consumer of electric energy. Besides the pesticides use for the cultural dealings.
So, the finality of the present project, visa to identify the impacts and environmental
aspects of this process taking concepts of the Evaluation of Vida's Cycle (ACV), a tool
that values all the traineeships of the Cycle and technical Standards standardized by ISO
(International Organization will be Standardization) of the series 14000.
Key Word: Ethanol. Sugar Cane. Environmental Impacts. Life Cycle Assessment.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
2
1. Introdução
A preocupação com as questões ambientais surgiu logo após o homem constatar que os
recursos naturais são escassos. Com isso a principal motivação era de encontrar uma
resposta singular para diminuição da utilização de derivados de combustíveis fósseis –
do petróleo.
A década de 60 marcou o início dos primeiros estudos de avaliação ambiental de
produtos, em específico, relacionado ao inventário de consumo de energia (VIGON et
al.,1993). Para Curran (1996) a adoção aos combustíveis fósseis gerou o modelo que
não atende a necessidade de preservação e conservação de recursos naturais, pois, os
combustíveis não são renováveis e seu uso promove diversos impactos ambientais,
como por exemplo, emissão de poluentes atmosféricos.
Em 1973, com a primeira crise do petróleo, o setor sucroenergético, acabou por
encontrar uma alternativa singular: a produção do álcool combustível ou etanol a partir
da cana-de-açúcar.
Em 1975, o governo brasileiro criou o Programa Nacional do Álcool (PROALCOOL), pelo
Decreto-Lei nº76.593 de 14 de novembro de 1975, possibilitando a ampliação da área
plantada com a cana-de-açúcar e a implantação de destilarias de etanol. Servindo como
alternativa para diminuir a vulnerabilidade energética do país devido à crise mundial do
petróleo. Até 1979 o programa focou-se na produção de etanol anidro para ser
adicionado à gasolina. E em segundo momento, à produção de etanol hidratado e no
desenvolvimento de motores para serem adaptados a este combustível.
E em 1984, os carros a etanol passaram a responder por 94,4% da produção das
montadoras instaladas no Brasil (SOUSA e MACEDO 2009).
Segundo Dantas Filho, Franco e Parente (2008) o Programa Proálcool, introduzido nos
meados da década de 70, produz atualmente, cerca de 15 bilhões de litros de etanol por
ano e se constitui um dos principais programas de aplicação energética da biomassa do
mundo. Enfatizam ainda que a geração de energia elétrica por meio da queima da cana-
de-açúcar é uma oportunidade de negócio, ou seja, é uma terceira fonte de receita
complementar a do açúcar e etanol.
Acredita-se que essa alternativa esteja compatível quanto às questões de
sustentabilidade.
Sustentabilidade é uma ponte de ligação entre ética, ecologia e economia. Este conceito
foi estabelecido em 1987 no Relatório de Brundtland – “Our Commum Future” (Nosso
Futuro Comum). Segundo o qual:
“Desenvolvimento sustentável é desenvolvimento que satisfaz as necessidades do
presente sem comprometer a capacidade de as gerações futuras satisfazerem suas
próprias necessidades”
O Brasil é reconhecido pela Comunidade Internacional devido a composição de uma
matriz energética extremamente limpa, reduzindo a emissão de gases de efeito estufa,
pelo uso de fontes de energia renovável. Este é um cenário propício a produção de
etanol, principalmente pelo baixo teor de carbono. (FILHO e MACEDO, 2009).
Com estes fatores dá oportunidade do Brasil se tornar líder global pelos benefícios da
produção de biocombustíveis, ligados aos atributos de sustentabilidade, juntamente com
o desenvolvimento limpo e principalmente com justiça social (SOUSA e MACEDO, 2009)
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
3
Partindo desse pressuposto, em termos globais, um dos grandes desafios atuais é a
busca pela redução de emissão de poluentes, com o aumento da eficiência ambiental nos
processos produtivos e o desenvolvimento do país, de forma que haja a integração
desses três requisitos. Estes que conceituam “sustentabilidade”.
Devido a ocorrência de diversos impactos ambientais, na década de 80, conduziu, então,
as empresas a pensarem em termos de administração de negócios a adotarem ações de
prevenção. Porém seguindo a lógica de que preservação da natureza permite reduzir
despesas operacionais.
Este é um dos pontos que o presente projeto buscou analisar, se a produção do etanol,
oriundo da cana-de-açúcar, atende ao conceito de sustentabilidade. Para tal,
Identificaram-se os aspectos e impactos ambientais associados à cadeia produtiva de
etanol, suas funções dos processos envolvidos, unidade funcional e a fronteira da cadeia
produtiva, com a coleta de dados secundários, visando fornecer dados para estabelecer
o perfil de desempenho ambiental por meio da técnica de Avaliação de Ciclo de Vida
(ACV).
Esta identificação dos aspectos e impactos ambientais dos processos envolvidos na
produção do etanol, como contribuição a uma gestão ambientalmente adequada
justifica-se pelo fato de que a humanidade evolui a partir do uso de fontes de energia
que consegue usar, cabe então esperar que ela mesma, devido ao declínio dos recursos
energéticos e da perda da biodiversidade, dos problemas da poluição e da crise social,
consiga mudar de rumo e se adaptar a um novo leque de fontes de energia, no qual
caberá a biomassa um papel fundamental (CAVALETT, ORTEGA e WATANABE. 2001).
Em termos globais, a produção e o uso de etanol no Brasil contribuíram para a redução
de 0,1% das emissões globais associadas à energia em 2006. Parece pouco, mas não é.
Para se ter uma ideia, é possível estimar que, desde o início do Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo (MDL) da ONU, em julho de 2005, até julho de 2009, o etanol
brasileiro evitou emissão equivalente a mais ou menos 60% de todos os créditos de
carbono gerados por esse mecanismo no mundo (FILHO e MACEDO. 2009)
2. Metodologia
A metodologia adotada para o desenvolvimento do presente projeto foi dividida nas
seguintes etapas, a saber:
Levantamento junto à literatura quanto à metodologia de ACV conhecendo o
status tecnológico atual da produção de etanol no país;
Definição do objetivo e escopo: definindo os objetivos e com o conhecimento
pormenorizado da tecnologia de produção de etanol a partir da cana-de-açúcar,
no que se refere a suas condicionantes operacionais e às possíveis interações
destas com o meio ambiente. Visando o estabelecimento da função processo, a
unidade em relação a qual os dados foram coletados e tratados, o sistema
estudado e a definição das categorias de impacto;
Identificação, dos aspectos ambientais relacionados a processo de produção de
etanol a partir da cana-de-açúcar, de acordo com a rota selecionada de análise. O
tratamento dos aspectos ambientais relacionados a cada etapa do processo: A
atividade em questão é constituída de levantamento dos elementos conhecidos na
metodologia de ACV de “aspectos ambientais” inerente a rota de produção de
etanol. Trata-se da compilação das entradas e saídas a cada processo em termos
de energia, matérias, geração de resíduos e emissões para água, terra e ar,
considerando as categorias de impacto e fronteiras definidas.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
4
3. Conceitos 3.1 Etanol
Tratando-se do combustível etanol, cuja fórmula é C2H5OH, sua composição química foi
determinada no século XIX pelo suíço Nicolas-Theodore de Saussure. Pode ser obtido por
vários processos, tendo como fonte de matérias primas, vegetais e hidrocarbonetos. O
álcool a partir da cana obteve melhores condições na implantação de sua estrutura, em
detrimento ao álcool produzido da mandioca, que não dispunha de meios produtivos
desenvolvidos e confiáveis (MARCOCCIA, 2007).
Em 1532, Martim Afonso iniciou o cultivo da cana-de-açúcar no Brasil, a atual fabricação
de etanol esta relacionada à produção de açúcar. Pela adaptação ao clima e solo
brasileiro, a monocultura da cana, passou a ser praticada em grandes propriedades
agrícolas. A expansão da agroindústria canavieira se intensificou na região Sudeste do
Brasil, devido ao declínio do ciclo de café, na década de 30.
A produção de Etanol no Brasil, no ano de 2008, foi de 27,5 bilhões de litros, onde cerca
de 80% da produção é consumida internamente. Os Estados de maior produção do
Etanol estão apresentados no gráfico1:
63%8%
8%
6%
4%4% 3% 4%
São Paulo
Paraná
Minas Gerais
Goiás
Mato Grosso do Sul
Mato Grosso
Alagoas
Maranhão, Paraiba e
Pernambuco
Gráfico 1 – Produção de etanol pelos maiores Estados produtores, nas safras de 08/09, quando a produção
brasileira total de etanol foi de 27,5 bilhões de litros.
Fonte: Secretaria do Estado de São Paulo/ Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais – Cadernos de Educação Ambiental (2011)
Desde julho de 2007, o etanol é adicionado na proporção de 25% em toda gasolina
vendida no Brasil. Para combater fraudes, é por meio da Resolução nº 36/2005, que a
ANP estabeleceu a obrigatoriedade da adição de corante cor laranja ao etanol anidro.
Pois como o etanol hidratado é incolor, este corante denuncia caso houver adição de
água no combustível. (Secretaria do Meio Ambiente/ Coordenadoria de Biodiversidade e
Recursos Naturais, 2011).
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
5
3.2 Avaliação do Ciclo de Vida
Devido às crescentes preocupações sobre os impactos ambientais da indústria nos
âmbitos regional e global reacenderam o interesse pelas fontes alternativas, para isso
um dos passos direcionado foi o conhecimento do Ciclo de Vida do Produto.
De acordo com Garcia, Mourad e Vilhena (2002), o primeiro passo para a
sustentabilidade é o conhecimento do ciclo de vida de um produto. Ciclo de Vida é
quando são removidos os recursos da natureza, para uma determinada fabricação,
finalizando no processo de devolução a terra. Ou seja, é uma avaliação do “berço” ao
“túmulo”.
Segundo U.S Environmental Protection Agency and Science Aplications International
Corporation, entende-se por Análise do Ciclo de Vida como ferramenta analítica de
gerenciamento ambiental, que avalia os aspectos e impactos potenciais associados a um
produto ou processo, pode contribuir significativamente para o uso racional dos recursos
investidos e, entre outras aplicações, auxiliar nas tomadas de decisão, na seleção de
indicadores ambientais para avaliação do desempenho ambiental de projetos ou
reprojetos de produtos, processos e planejamento estratégico (http://www.epa.gov,
2011)
Garcia, Mourad e Vilhena (2002) relatam que nesta avaliação deve considerar toda a
cadeia de processos, ou seja, desde sua origem, emissões e os impactos potenciais. “A
visão é ampla e não se restringe à avaliação de conceitos e parâmetros simplificados
como “reciclável” ou “retornável”, ou seja, todas as interações ambientais são
consideradas.”
A importância adquirida pela ACV nos contextos da Gestão Ambiental e da Prevenção da
Poluição fez com que a estrutura metodológica acabasse por ser padronizada pela
International Organization for Standardization (ISO), respectivamente na família 14040
da série ISO 14000. Foram lançadas até o ano de 2005 as seguintes normas técnicas
dessa coleção:
ISO 14040: Environmental management – Life Cycle Assessment –
Principles and framework (1997)
ISO 14041: Environmental management – Life Cycle Assessment – Goal
and scope definition and inventory analysis (1998)
ISO 14042: Environmental management – Life Cycle Assessment - Life
cycle impact assessment (2000)
ISO 14043: Environmental management – Life Cycle Assessment – Life
cycle interpretation (2000) (SEO e KULAY, 2006)
Deste modo, as seguintes categorias de aspectos e impactos para cada atividade do ciclo
de vida do álcool etílico hidratado combustível, estão descritas a seguir:
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
6
3.3 Aspectos e Impactos Ambientais
Segundo a definição da ISO (1997) e ABNT (2001, apud Ometto.2005), a técnica da
Avaliação de Ciclo de Vida compila os aspectos ambientais e de avaliação dos impactos
ambientais associados ao ciclo de vida de um produto ou serviço.
Aspecto Ambiental: é o elemento das atividades, produtos ou serviço de uma
organização que pode interagir com o meio ambiente.
Impactos Ambientais: é a identificação e quantificação das mudanças ambientais
causadas pela avaliação do ciclo de vida de um produto ou serviço. Em suma, são
efeitos que podem ser causados ao Homem e Meio Ambiente.
4. Interpretação dos Resultados
Este estudo baseado na Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) teve como enfoque avaliar os
impactos ambientais envolvidos no processo produtivo do etanol a partir da cana-de-
açúcar. Os elementos que compõem o escopo da ACV do álcool etílico hidratado serão
apresentados a seguir:
FUNÇÃO DO SISTEMA
Tratando-se do álcool etílico hidratado combustível, o etanol, objeto de estudo deste
projeto, tem como função a locomoção de automóveis para transporte.
UNIDADE FUNCIONAL
Sua unidade funcional é para 10.000 km percorridos por um carro de médio porte.
Chegada
à Usina
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
7
FLUXO DE REFERÊNCIA
Relacionado à unidade funcional, o fluxo de referência é para obtenção dos dados de
Inventário de Ciclo de Vida (ICV) igual a 1 tonelada de etanol.
SISTEMA DE PRODUTO
As seguintes atividades descritas a seguir compõem o sistema de produto do etanol:
Figura 1: Sistema de Produto do Álcool Etílico Hidratado combustível
Deste modo, as seguintes categorias de aspectos e impactos para cada atividade do ciclo
de vida do álcool etílico hidratado combustível, serão apresentadas a seguir:
Processo Elementar: Preparo do Solo.
Aspectos Ambientais Processo Elementar Impactos Ambientais
Uso de Maquinários PREPARO DO SOLO
Erosão do Solo
Consumo de Água Poluição das Águas
Aplicação Herbicida Escassez Recurso Natural
Queima Combustível Emissão de Gases
Desmatamento Degradação Ambiental
De acordo com Cruz, diretor científico da FAPESP, “se a cana for plantada em uma região
de floresta, é ruim partindo do ponto de vista das emissões, porém se for plantada em
áreas de pasto já degradado, já é um ponto positivo, pois desta forma fixa-se mais
carbono na terra”.
Com a finalidade de conservação do solo para que haja melhores condições de
germinação das sementes ou brotamento dos tubérculos tais operações são realizadas
como aração e gradagem ou gradagem pesada, subsolagem, sulcamento e adubação.
(OMETTO, 2005).
Castro (1985, apud Ometto 2005) apresenta que no preparo convencional do solo
divide-se em primário seguindo o processo de aração, desmatamento e operações com
rolo faca. Já no secundário segue-se pelo nivelamento do terreno, destorroamento,
incorporação de herbicidas, eliminação de ervas invasoras com o uso de gradagem e/ou
enxada rotativa.
Processo Elementar: Plantio da Cana-de-açúcar.
Preparo
do Solo
Plantio
da cana-
de-
açúcar
Tratos
culturais
Colheita
da cana-
de-açúcar
Produção
industrial
do etanol
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
8
Aspectos Ambientais Processo Elementar Impactos Ambientais
Queima Combustível PLANTIO DA CANA-DE-
AÇÚCAR
Poluição Atmosférica
O plantio da cana-de-açúcar pode ser realizado de modo manual ou mecanizado. No
modo manual utilizam-se caminhões para transporte dos trabalhadores e da cana para o
plantio, isso gera a queima de combustíveis fósseis pelo uso do diesel. No plantio
mecanizado, de acordo com a Embrapa as plantadoras já distribuem as mudas, o adubo
e o inseticida. Mas não se verifica diferença do crescimento dos talhões, tanto no modo
manual, quanto mecanizado.
Processo Elementar: Tratos culturais.
Aspectos Ambientais Processo Elementar Impactos Ambientais
Uso de Agrotóxicos TRATOS CULTURAIS
Poluição Atmosférica
Geração de Resíduos Poluição das Águas
Poluição do Solo
Diminuição da Vida Útil
do Aterro
No processo de trato cultural segundo Corbini (1987 apud Ometto 2005), as práticas
agrícolas tem as finalidades de preservação das propriedades físicas e químicas do solo;
redução de plantas invasoras; conservação do sistema de controle de erosão e controle
de pragas. Além disso, inclui a aplicação de agrotóxicos. Tais como: Aldrin (pelo seu
poder residual e acumulativo na cadeia alimentar, sendo proibido em vários países);
Ametrina; Atrazina; Clorpirifuos (considerado tóxico); 2,4 D; Diflubenzuron; Diuron;
Finitrotin; Hexazinone; Paration metil (banido pela Agência de Proteção Ambiental norte-
americana); Glifosato; Simazina; Tebuthiuron; Telrithiuron e Velpark (Ometto 2000 apud
Ometto 2005)
De acordo com o processo produtivo da ÚNICA a alternativa para diminuição ou até
mesmo a eliminação do uso de agrotóxicos se dá pela utilização de um fertilizante
orgânico feito a partir da vinhaça, um líquido com alto teor de potássio e outros
nutrientes e este se denomina como “fertirrigação”.
Processo Elementar: Colheita da Cana-de-Açúcar.
Aspectos Impactos Processo Elementar Impactos Ambientais
Queima Combustível COLHEITA DA CANA-
Poluição Atmosférica
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
9
Queima da Palha DE-AÇÚCAR
Este é um dos processos de grande caracterização de impactos ambientais pela emissão
de gases tóxicos. Utilizam-se duas formas de colheita: Manual e Mecanizada. Na fase da
colheita manual se utiliza a prática da queima da palha da cana-de-açúcar como
despalhador e facilitador do corte.
Lei Estadual nº 10.547, de maio de 2000, que define
procedimentos, proibições e estabeleceu regras de execução e
medidas de precaução a serem obedecidas quando do emprego do
fogo em práticas agrícolas e Lei nº 11.241, de 19 de setembro de
2002, que dispõem sobre a eliminação gradativa da queima da
palha da cana-de-açúcar. (SMA, 2011).
De acordo com Silva (1998 apud Ometto 2005), apresenta em três fases o processo de
queima da palha:
a. Ignição: Por ser o inicio do processo há presença de oxigênio e baixas temperaturas.
Portanto, baixa concentração de poluentes;
b. Combustão incompleta: Já atinge altas temperaturas e formação de gases tóxicos,
como CO2, NOx e SO2.
c. Resfriamento: Caracteriza-se pela dispersão de materiais particulados,
hidrocarbonetos policíclicos aromáticos e outras substâncias orgânicas.
Na mecanizada devido a utilização de caminhões e maquinários, apesar de eliminar o
processo de queima, o consumo do diesel para sua locomoção emite o dióxido de
carbono, CO2.
Ometto (2005) explica que a quantidade de CO2 emitido pela queimada da palha é
indicada como emissão atmosférica, mesmo que essa quantidade seja absorvida no
crescimento da cana.
Processo Elementar: Transporte da cana-de-açúcar até a USINA.
Aspectos Ambientais Processo Elementar Impactos Ambientais
Queima Combustível TRANSPORTE DA
CANA-DE-AÇÚCAR
Poluição Atmosférica
No transporte da cana-de-açúcar até a USINA para o inicio do processo produtivo do
etanol, utiliza-se caminhões e com isso o consumo do Diesel, emitindo assim CO2.
Processo Elementar: Produção Industrial do álcool etílico hidratado combustível.
O processo que será apresentado a seguir, com seus aspectos e impactos ambientais,
seguem pela 1- lavagem da cana, 2- moagem da cana, 3- tratamento do caldo, 4-
fermentação do caldo e 5- destilação do caldo.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
10
Aspectos Ambientais Processo Elementar Impactos Ambientais
Consumo de Água LAVAGEM DA CANA-DE-
AÇÚCAR
Escassez do Recurso
Natural
Geração de Efluente Poluição das Águas
1- Após o processo de colheita, por ser perecível, a cana-de-açúcar chega rapidamente
a USINA, para que se evite a perda de qualidade. A cana que foi colhida
manualmente, passa pelo processo de lavagem para retirada das impurezas, devido
a utilização da queima da palha. Por sua vez, uma quantidade significativa de água é
utilizada.
Aspectos Ambientais Processo Elementar Impactos Ambientais
Consumo de Energia
Elétrica MOAGEM DA CANA-DE-
AÇÚCAR
Escassez de Recurso
Natural
Consumo de Água para
embebição
2- Nesta etapa a cana percorre por uma esteira, logo após sob pressão de rolos ou
difusores, resta o bagaço da cana-de-açúcar. Este bagaço, um resíduo fibroso, é
encaminhado à geração de bioeletricidade. Já o caldo oriundo deste processo seguirá
para a produção do etanol.
Aspectos Ambientais Processo Elementar Impactos Ambientais
Consumo de Energia
Elétrica TRATAMENTO DO
CALDO
Escassez de Recurso
Natural
Consumo de Combustível Poluição Atmosférica
- Bagaço
- Caldo
- Torta de Filtro
- Lodo
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
11
3- No tratamento do caldo da cana-de-açúcar, gera a chamada “torta de filtro”, que
recuperada na usina será utilizado como adubo orgânico. O lodo resultante deste
processo é encaminhado à uma filtração a vácuo. O Diesel utilizado é referente aos
caminhões que levarão a torta de filtro até o campo.
Aspectos Ambientais Processo Elementar Impactos Ambientais
Consumo de Energia
Elétrica FERMENTAÇÃO DO
CALDO
Escassez de Recurso
Natural
4- Na etapa de fermentação, o caldo passa por vários processos de filtragem formando
o “mosto”. Este caldo já purificado e misturado a leveduras é considerado como um
vinho fermentado.
Aspectos Ambientais Processo Elementar Impactos Ambientais
Consumo de Energia
Elétrica DESTILAÇÃO DO CALDO
Escassez de Recurso
Natural
5- O álcool do vinho fermentado, gerado no processo de fermentação, passa por uma
recuperação em colunas de destilação e retificação, surgindo então o etanol. Nesta
etapa obtêm-se a “vinhaça”, servindo como fertilizante orgânico, com alto teor de
potássio e outros nutrientes. Esta vinhaça por sua vez é considerada de grande carga
poluidora de uma destilaria. (Ometto, 2005).
De acordo com Ometto (2005) as categorias de potenciais de impactos pelo método
EDIP são consideradas para cada unidade do ciclo de vida do etanol, da seguinte forma:
Consumo de recursos
Renováveis
No processo de colheita manual a cana deve ser lavada para retirada de impurezas, além
de outras utilizações dentro do processo produtivo (como água para embebição, água
para lavagem das dornas de fermentação, água de resfriamento de fermentação, água
de resfriamento dos condensadores) torna-se grande consumidora de água.
Não- renováveis
- Mosto
- Vinhaça
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
12
Nas atividades de tratos culturais, preparo do solo e colheita da cana, devido ao alto uso
de agroquímicos e do consumo de diesel nas máquinas agrícolas, nos caminhões e nos
ônibus.
Energia
A produção do Etanol é a maior consumidora de energia elétrica.
Potenciais de Impactos Ambientais
Potencial aquecimento global
A colheita é a atividade de maior potencial para o efeito estufa.
Potencial de Formação Fotoquímica de Ozônio Troposférico
A atividade de maior potencial para formação de ozônio é a colheita da cana, devido a
queimada emitindo hidrocarbonetos e ao monóxido de carbono.
Potencial de Acidificação do meio
A atividade de maior potencial para acidificação do meio é a colheita da cana. Isso se
deve aos óxidos de nitrogênios (NOx) emitidos durante a queima.
Potencial de Eutrofização
As atividades que mais podem contribuir são as que incorporam nutrientes ao solo
(trabalhos culturais, fertirrigação e plantio)
Potencial de Ecotoxicidade
Pode ser causada, principalmente, pelas atividades de tratos culturais, plantio da cana-
de-açúcar, preparo do solo devido ao uso intensivo de agrotóxicos aplicados diretamente
ao solo.
Potencial de Toxicidade humana
Principalmente na atividade da colheita, devido a emissão dos gases tóxicos na queima,
incluindo o material particulado emitido, e pelo uso de diesel nos caminhões, máquinas
agrícolas e ônibus.
5. Considerações Finais
Um dos grandes pensamentos em termos de administração de negócios é a busca pela
redução das emissões de poluentes, com aumento da eficiência ambiental nos processos
produtivos e o desenvolvimento do país. Desta forma, em suas atividades de produção,
devido grandes ocorrências de impactos ambientais, na década de 1980, a visão das
empresas era apenas do controle “end of pipe”, uma ação reativa em que diante todo o
processo, no fim adicionavam uma ação de prevenção. Ou seja, a postura das empresas
só era efetiva na prevenção de um acidente ou desastre após o acontecimento.
Tal perspectiva cria um cenário vantajoso à implementação de técnicas que reforcem
Estudos de Impacto Ambiental, Sistemas de Gestão Ambiental, Programas de Prevenção
da Poluição, Avaliações de Riscos Ambientais, entre outros. Principalmente, pela
exigência atual da sociedade voltada ao monitoramento e a avaliação ambiental. Tal
preocupação relaciona-se a importância de saber até que ponto certos impactos
ambientais podem comprometer a preservação dos equilíbrios socioambientais.
Diante o exposto, o setor sucroenergético considera a produção do etanol combustível
como grande potencializador de um mercado global, no que tange o abastecimento
nacional e internacional. Atendendo aos conceitos de sustentabilidade – ponte de ligação
entre economia, ecologia e ética, definido em 1987 no Relatório de Brundtland.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
13
Atualmente o Brasil é considerado um dos maiores produtores de etanol. Pela análise
econômica, este processo brasileiro é o mais rentável. Pelas questões ambientais, de
fato, reduz em 90% das emissões de gases de efeito estufa comparados ao uso de
combustíveis fósseis. Já pelas questões sociais o setor sucroenergético tem grande
elevação na contratação de mão-de-obra. Porém, esta visão prevalece primordialmente
nos interesses econômicos.
Mesmo diante, de uma alternativa sustentável em resposta à dependência do uso do
petróleo, o processo produtivo do etanol requer o uso de derivados de combustíveis
fósseis, como o diesel utilizado nos caminhões e maquinários. Além do uso de
herbicidas, agrotóxicos, queimada da palha, uso intensivo da água, gasto com energia
elétrica entre outros, descaracteriza esta produção como fonte alternativa segura. A
contratação de mão-de-obra, para os tratos culturais, não é efetiva, ocorrendo apenas
na época de colheita. Há diversas queixas e denuncias contra o tipo de ambiente hostil,
periculoso e insalubre dos quais esses trabalhadores rurais enfrentam.
O que caracteriza a produção do etanol oriundo da cana-de-açúcar, não são interesses
de um desenvolvimento sustentável com melhorias ambientais, ganhos sociais e geração
de riquezas, mas de um abastecimento no mercado interno e externo acarretando outros
problemas, por falta de políticas publicas consistentes.
Espera-se que diante tal constatação, a próxima Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento Sustentável, a RIO+20, definam ações de indicadores ambientais com
a determinação de escalas aceitáveis de degradação ambiental, considerando-se riscos
de perdas irreversíveis e limites dos recursos naturais globais à expansão do subsistema
econômico.
Esse é um desafio no âmbito ambiental, conectar todos os setores em um único
propósito de preservar e conservar, não somente a natureza, mas o meio em que este
se insere, possibilitando as presentes e futuras gerações o direito de viverem em um
ambiente sadio e equilibrado, conforme preconizado no Art. 225 de nossa Constituição
da República Federativa do Brasil de 1988.
O essencial não se deve estar em apenas falar sobre como definir e enfrentar nossos
próprios desafios, mas buscar soluções dentro de tal realidade de vida e comportamento,
ou seja, estamos coletivamente e individualmente parte desse problema e, portanto
devemos também se tornar parte da solução.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
CURRAN, M.A. Environmental Life Cycle Assessment. Nova Iorque: McGraw Hill,
1996.
CAVALLET, Otavio; ORTEGA, Enrique. WATANABE, Marcos. A produção de etanol em
micro e mini-destilarias. Laboratório de Engenharia Ecológica. São Paulo. FEA.
COORDENADORIA DE BIODIVERSIDADE E RECURSOS NATURAIS; SECRETARIA DO MEIO
AMBIENTE. Etanol e Biodiesel- Cadernos de Educação Ambiental. São Paulo: SMA,
2011.
DANTAS FILHO, P.; FRANCO, E.G. e PARENTE, V. Análise da viabilidade econômica
financeira de um projeto de cogeração de energia através do bagaço de cana-
de-açúcar. Anais do 3 rd Internationational Congress Univerty Industry Cooperation, 7
a 10 de dezembro de 2008.
FILHO, Luis Gylvan Meira; MACEDO , Isaias C. Etanol e Bioeletricidade:Uso do etanol
contribui para reduzir o aquecimento global. São Paulo. ÚNICA.2009.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
14
KULAY, Luiz Alexandre; SEO, Emília Satoshi Miyamaru. Avaliação do Ciclo de Vida:
Ferramenta gerencial para tomada de decisão. Revista de Gestão Integrada em
Saúde do Trabalho e Meio Ambiente. São Paulo. SENAC. 2006.
MARCOCCIA, R. A participação do etanol brasileiro em uma nova perspectiva na
matriz energética mundial. Dissertação de mestrado apresentada na escola
Politécnica da Universidade de São Paulo, USP. 2007.
MOURAD, Anna Lúcia; GARCIA, Eloísa E.C.; VILHENA, André. Avaliação do Ciclo de
Vida. Edição 2. Campinas: CETEA/ CEMPRE. 2002.
OMETTO, Aldo Roberto. Avaliação do ciclo de vida do álcool etílico hidratado
combustível pelos métodos EDIP, Exergia e Emergia. Tese (Doutorado) –
Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos,
2005.
SOUSA, Eduardo Leão; MACEDO, Isaias de Carvalho. Etanol e Bioeletricidade: A
cana-de-açúcar no futuro da matriz energética. São Paulo: União da indústria de
cana-de-açúcar. Unicamp. 2009.
U.S. ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY AND SCIENCE APLICATIONS
INTERNATIONAL CORPORATION. LCAccess – LCA 101. Disponível em
<http://www.Epa.gov> acessado em maio de 2011.
VIGON, B.W. et AL. Life Cycle Assessment; Inventory Guidelines and principles.
Cincinnati: EPA, 1993.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática em Sustentabilidade Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179474 X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
LOGISTICA REVERSA DE PNEUS INSERVIVEIS NO MUNICIPIO DE
SÃO PAULO: ESTUDO DE CASO – EMPRESA BRIDGESTONE
Reverse logistics scrap tires: case study
Cleia Rodrigues da Silva1 e Emília Satoshi Miyamaru Seo2
1Estudante do Curso de Tecnologia em Gestão Ambiental. E-mail:
2 Pesquisadora e professora do Centro Universitário Senac e Instituto de Pesquisas
Energéticas e Nucleares.
Resumo
O presente artigo tem como objetivo apresentar o mapeamento das práticas de
Logística Reversa para pneus inservíveis no município de São Paulo, identificando tal
sistema e o que vem sendo implantado em relação a coleta e destinação correta dos
mesmos, no qual foi utilizado como metodologia de pesquisa um aprofundado
levantamento de dados secundários, considerando a problemática dos resíduos sólidos
advinda do aumento da população e consequentemente da industrialização, agravada
nas últimas décadas. O conceito de Logística Reversa revela-se uma alternativa viável,
onde toda a metodologia aplicada, prevista em Lei, determina que empresas produtoras
de inúmeros materiais implantem tal conceito. Incluso nestes produtos estão os pneus,
objeto de pesquisa primordial neste trabalho, onde se buscou a captação de dados
relevantes a produção, consumo e possíveis tratamentos como meios de minimizar a
destinação dos mesmos aos aterros municipais, diminuindo os impactos adversos
implícitos, bem como o uso das bases legislativas vigentes que garante conhecer o
cenário do atual processo em que se encontra tal instrumento. Concluindo-se dentre
outras, que a prática de Logística Reversa necessita de regularizações organizacionais
no setor.
Palavras-chave: Logistica Reversa, resíduos solidos e pneus.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
2
Abstract
The present article aims to present the mapping practices of reverse logistics for
waste tires in São Paulo , identifying such a system and what is being implemented
regarding the collection and proper disposal of the same , which was used as a research
methodology one thorough survey of secondary data , considering the problem of solid
waste arising from population growth and industrialization consequently , exacerbated
in recent decades . The concept of Reverse Logistics proves to be a viable alternative
where the entire methodology, provided by law, determines that numerous materials
producing companies to deploy such a concept . Included in these products are tires ,
primary research object in this paper , where we seek to capture relevant data
production , consumption and possible treatments as a means of minimizing the
allocation thereof to municipal landfills , reducing the implicit adverse impacts , as well
as the use of existing legal bases which ensures meet the scenario in which the current
process is such an instrument. Concluding among other things , that the practice of
Reverse Logistics requires organizational adjustments in the industry.
Keywords: Reverse logistics, solid waste and tires
1. Apresentação
A destinação incorreta de pneus inserviveis, que de acordo com a Resolução
Conama nº 416/2009 se trata de “pneu usado que apresente danos irreparáveis em sua
estrutura não se prestando mais à rodagem ou à reforma”, acarreta em um passivo
ambiental de grande risco para a população e o meio ambiente em si, por possuir
componentes altamente inflamáveis e tóxicos, além de propiciar a proliferação de
vetores.
A Lei Federal nº. 12.305/2010 que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos
– PNRS, determina dentre outras diretrizes a implantação do sistema de Logística
Reversa para inúmeros resíduos, dentre eles o pneu inservível.
Segundo Leite (2003, p. 17), logística reversa é:
(...) a área da logística empresarial que planeja, opera e controla o fluxo e as
informações logísticas correspondentes, do retorno dos bens de pós-venda e de pós-consumo ao ciclo de negócios ou ao ciclo produtivo, por meio de canais de distribuição reversos, agregando-lhes valor de diversas naturezas: econômico, ecológico, legal, logístico, de imagem corporativa, entre outros.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
3
Havendo dois principais canais de atuação sendo eles:
Bens de pós-venda consiste no retorno dos bens industriais que por
diversos motivos como término de validade, estoques excessivos no canal
de distribuição, por estarem em consignação, por apresentarem
problemas de qualidade e defeitos etc. retornam á cadeia de suprimentos,
reintegrando-os ao ciclo de negócios alguns desses motivos podem ser
caracterizados como
Bens de pós-consumo são bens industriais que apresentam ciclos de
vida útil de algumas semanas ou anos, classificados como semiduráveis
e duráveis respectivamente, após os quais são descartados pela
sociedade (LEITE, 2009)
Este segundo representa o canal de atuação ao qual se aplica o atual objeto de estudo.
Para caracterização deste cenário, utilizou-se como base de estudo o Município
de São Paulo e especificamente os pneus produzidos e vendidos pela empresa
Bridgestone com o intuito de abranger as dificuldades encontradas na implantação de
tal sistema, onde realizou-se o mapeamento dos pontos de revenda dos pneus
fabricados pela mencionada empresa e os pontos de coleta dos mesmos.
Considerando também que a produção e consequentemente o consumo de pneus
que vem aumentando gradativamente, o objetivo deste artigo é a análise dos indícios
que determinam as premissas para a instauração do sistema de Logística Reversa de
Pneus Inservíveis na maior metrópole do país.
A metodologia aplicada para caracterizou-se por levantamentos de dados
secundários com pesquisas em bibliografias referentes ao tema, além de pesquisa por
meios eletrônicos e em bancos de dados específicos, órgãos privados e públicos
relacionados. Fontes secundárias de bases legislativas e associações como ANIP
(Associação Nacional das Indústrias de Pneumático). É apresentado também um estudo
de caso da Empresa Bridgestone.
2. Legislação Vigente
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
4
A Política Nacional dos Resíduos Sólidos Lei 12.305/2004 que institui a
regulamentação para a problemática dos resíduos, no que se refere a logística reversa,
diz:
São obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de: agrotóxicos, seus resíduos e embalagens, assim como outros produtos cuja embalagem, após o uso, constitua resíduo perigoso, observadas as regras de gerenciamento de resíduos perigosos previstas em lei ou regulamento, em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, ou em normas técnicas; pilhas e baterias; pneus; óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens; lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista; produtos eletroeletrônicos e seus componentes.
Desta forma está instaurada a base para a regulamentação para o manejo
adequado deste material, mesmo assim esta lei não foi regulamentada e apenas foram
firmados acordos setoriais para alguns produtos listados a cima, como o caso das
lâmpadas, baterias e embalagens de agrotóxicos; no quesito pneu, não existe nenhum
parâmetro condicionante. Como preconizados no Decreto 7404/2010, Seção II – Dos
instrumentos e de Forma de Implantação da Logística Reversa:
Art. 15. Os sistemas de logística reversa serão implementados e operacionalizados por meio dos seguintes instrumentos:
I - acordos setoriais;
II - regulamentos expedidos pelo Poder Público; ou
III - termos de compromisso.
§ 1o Os acordos setoriais firmados com menor abrangência geográfica podem ampliar, mas não abrandar, as medidas de proteção ambiental constantes dos acordos setoriais e termos de compromissos firmados com maior abrangência geográfica.
§ 2o Com o objetivo de verificar a necessidade de sua revisão, os acordos setoriais, os regulamentos e os termos de compromisso que disciplinam a logística reversa no âmbito federal deverão ser avaliados pelo Comitê Orientador referido na Seção III em até cinco anos contados da sua entrada em vigor.
Art. 18. Os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes dos produtos referidos nos incisos II, III, V e VI do art. 33 da Lei no 12.305, de 2010, bem como dos produtos e embalagens referidos nos incisos I e IV eno § 1o do art. 33 daquela Lei, deverão estruturar e implementar sistemas de logística reversa, mediante o retorno dos produtos e embalagens após o uso pelo consumidor.
§ 1o Na implementação e operacionalização do sistema de logística reversa poderão ser adotados procedimentos de compra de produtos ou embalagens usadas e instituídos postos de entrega de resíduos reutilizáveis e recicláveis, devendo ser priorizada, especialmente no caso de embalagens pós-consumo, a participação de cooperativas ou outras formas de associações de catadores de materiais recicláveis ou reutilizáveis.
§ 2o Para o cumprimento do disposto no caput, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes ficam responsáveis pela realização da logística reversa no limite da proporção dos produtos que colocarem no mercado interno, conforme metas progressivas, intermediárias e finais, estabelecidas no instrumento que determinar a implementação da logística reversa.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
5
A Resolução do CONAMA de n° 416 de 30 de Setembro de 2009, que dispõe
sobre a prevenção à degradação ambiental causada por pneus inservíveis e sua
destinação ambientalmente adequada, e dá outras providências, estabelece entre
outras premissas uma meta para as empresas fabricantes, sendo que a cada pneu novo
comercializado para o mercado de reposição, deverão dar destinação adequada a um
pneu inservível, de acordo com a seguinte formula:
MR = (P + I) – (E + EO), na qual:
MR = Mercado de Reposição de pneus;
P = total de pneus produzidos;
I = total de pneus importados;
E = total de pneus exportados; e
EO = total de pneus que equipam veículos novos
No estado de São Paulo, antes da instauração da Política Nacional de Resíduos
Sólidos, já haviam medidas correlacionadas a problemática “resíduos e o instrumento
logística reversa”, como é o caso da Lei Estadual 12.300, de 16 de março de 2006, que
instituiu a Política Estadual de Resíduos Sólidos que dentre outros princípios diz, no
Titulo IV, Capítulo I – Das responsabilidades:
Artigo 48 - Os geradores de resíduos são responsáveis pela gestão dos mesmos.
Parágrafo único - Para os efeitos deste artigo, equipara-se ao gerador o órgão municipal ou a entidade responsável pela coleta, pelo tratamento e pela disposição final dos resíduos urbanos.
Artigo 49 - No caso de ocorrências envolvendo resíduos que coloquem em risco ao ambiente e a saúde pública, a responsabilidade pela execução de medidas corretivas será:
I - do gerador, nos eventos ocorridos em suas instalações;
II - do gerador e do transportador, nos eventos ocorridos durante o transporte de resíduos sólidos;
III - do gerador e do gerenciador de unidades receptoras, nos eventos ocorridos nas instalações destas últimas.
A partir do Decreto Estadual n° 54.645 de 5 de agosto de 2009, que
regulamentou a Lei Estadual acima mencionada e dá providências correlatas, dentre
outras: gestão de resíduos sólidos, monitoramento dos indicadores da qualidade
ambiental, das responsabilidades e responsabilidade pós-consumo (neste caso cabendo
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
6
aos fabricantes, distribuidores ou importadores de produtos que, por suas
características, venham a gerar resíduos sólidos de significativo impacto ambiental).
A Resolução 38 da Secretaria do Meio Ambiente de 2 de Agosto de 2011, melhor
estabelece os parâmetros intrínsecos à logística reversa, pois impõe diretrizes que
evidenciem medidas regulamentadoras para resíduos considerados de significativo
impacto ambiental, sendo eles (como já estabelecido Lei 12.305/2010): óleo lubrificante
automotivo, óleo comestível, filtro de óleo lubrificante automotivo, baterias
automotivas, pilhas e baterias, produtos, eletroeletrônicos, lâmpadas contendo
mercúrio, pneus. E também produtos cujas embalagens plásticas, metálicas ou de vidro,
após o consumo, são consideradas resíduos de significativo impacto ambiental, como:
alimentos, bebidas, produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos, produtos de
limpeza e afins, agrotóxicos, óleo lubrificante automotivo.
Tendo isto estabelecido o Art. 2° desta resolução permite que:
Os fabricantes e importadores dos produtos relacionados nos incisos I e II do artigo 1º deverão apresentar à Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, no prazo de até 60 (sessenta) dias, contados a partir da publicação desta Resolução, proposta de implantação de programa de responsabilidade pós-consumo, que indique um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outro ciclo produtivo, ou outra destinação final ambientalmente adequada.
3. Tratamento de pneus inservíveis
Segundo Lagarinhos e Tenório (2008), existem várias formas de tecnologias
utilizadas para a reutilização, reciclagem e valoração energéticas para pneus inservíveis
no Brasil. Para a reutilização temos os seguintes procedimentos:
Recapagem, que consiste na remoção da banda de rodagem, tendo
também um reparo estrutural da carcaça com cordões de borracha, logo
depois a inserção de cimento para colagem da banda de rodagem.
Recauchutagem, também consiste na remoção da banda de rodagem,
porém neste processo os ombros do pneu são removidos, neste caso o
processo de recauchutagem pode ser realizado de duas formas, a
primeira seria a frio, considerado mais eficiente; e a quente que demanda
menor espaço.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
7
Remoldagem, neste mecanismo se faz a remoção da borracha das
carcaças, de talão a talão, em seguida o pneu é reconstruído e
vulcanizado, não apresentando emenda, apresentando assim maior
segurança de uso.
Existem ainda dois processos a serem indicados como medidas plausíveis para
uma alternativa correta de tratamento/destinação deste passivo ambiental, onde
considerando os estudos de Lagarinhos e Tenório (2008), temos a desvulcanização
comercial e a laminação de pneus.
No Brasil a desvulcanização consiste na regeneração dos pneus, onde:
Os pneus usados são cortados em lascas ou raspas que passam por um processo de moagem mecânica, onde são transformados em pó-de-borracha e tratados por um sistema de separação com peneiras e cilindros magnéticos. Em seguida, em autoclaves rotativas, que utiliza o vapor saturado, o material recebe oxigênio e é submetido a uma temperatura de 180 °C e a uma pressão de 15 bar, provocando o rompimento das pontes de [enxofre-enxofre] e [carbono-enxofre] entre as cadeias poliméricas. Assim, a borracha é transformada em material passível de novas formulações. A massa de borracha resultante deste processo sofre uma trituração mecânica, aumentando com isso a viscosidade, para depois ser prensada. (LAGARINHOS; TENÓRIO, 2008, p. 114 e 115).
Quanto à laminação de pneus, como o próprio nome revela, trata-se de cortes
efetuados em pneus inservíveis, para a extração de lâminas e trechos de contornos
definidos, sendo que este processo só é possível, em pneus convencionais ou diagonais,
já que o os radiais não viabilizam o processo devido à dificuldade da realização do
processo de corte. (Lagarinhos e Tenório, 2008). O quadro 1, demonstra as principais
empresas destinadoras de pneus em São Paulo e seu percentual em relação ao pais.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
8
Quadro 1 – Empresas destinadoras no estado de São Paulo
Empresa Percentual (%)
CBL COMERCIO E RECICLAGEM DE BORRACHAS LTDA 8,61
POLICARPO & CIA LTDA ME 6,44
UTEP DO BRASIL LTDA 5,98
CCB - CIMPOR CIMENTOS DO BRASIL LTDA 5,19
MIDAS ELASTOMEROS DO BRASIL LTDA 4,10
BORCOL INDUSTRIA DE BORRACHA LTDA 3,22
VOTORANTIM CIMENTOS BRASIL 1,48
ECOBALBO RECICLAGEM DE PNEUS S.A 1,27
D.D. GOMES IND. COM. DE RESIDUOS DE BORR. E PLAST. 0,54
SEMOG RESIDUOS DE BORRACHA LTDA 0,53
ECOCICLO TRATAMENTO DE MATERIAIS SOLIDOS IND. E COM. 0,45
TORRE ENGENHARIA E PESQUISA TECNOLOGICA LTDA 0,40
LAMINAÇÃO DE PNEUS NICOLETTI LTDA 0,31
CBL COMÉRCIO E RECICLAGEM DE BORRACHAS LTDA 0,14
GONÇALVES & BRESSAN LTDA 0,12
PNEUS SARAPUI COM. RECICLAGEM BORRACHAS LTDA 0,09
SUKAKO FABRICAÇÃO DE ARTEFATOS DE BORRACHA LTDA 0,09
SENERGEN ENERGIA RENOVAVEL S.A 0,03
TOTAL 38,46
Adaptado do relatório sobre pneumáticos do IBAMA, 2012.
Como demonstrado do quadro 02, a produção de Pneus vem aumentando
gradativamente ao longo dos anos segundo dados fornecidos pela ANIP, isso se deve
ao alto consumo/produtividade de veículos cada vez mais crescente nas grandes
metrópoles do país, onde segundo o Departamento Nacional de Trânsito a frota de
veículos (dados de julho/2013) no Município de São Paulo chega a 6.924.394 unidades.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
9
Quadro 02 - Produção anual de pneumáticos em unidades por grupo
Grupo de
Pneumáticos
Total 2007
(milhares)
Total 2008
(milhares)
Total 2009
(milhares)
Total 2010
(milhares)
Total 2011
(milhares)
Carga 7.319 7.367 6.034 7.735 7.449
Automóveis 28.791 29.586 27.492 33.813 32.568
Caminhonetes 6.058 5.842 5.601 7.941 8.471
Motocicletas 13.725 15.250 13.000 15.205 16.079
Outros 1.354 1.666 1.684 2.611 2.360
Total 57.247 59.711 53.811 67.305 66.927
Fonte: ANIP, 2012
4. Panorama da Logística Reversa dos Pneus Inservíveis em São Paulo
Segundo a Reciclanip, entidade sem fins lucrativos instaurada em 2007, possui
atualmente cinco membros associados sendo estes os principais fabricantes de pneus
do mundo neste caso a Bridgestone, Continental, Goodyear, Michelin e Pirelli Tem como
principal objetivo “Administrar o processo de coleta e destinação de pneus inservíveis
em todas as regiões, visando, garantir a captação de pneus, por meio da participação
de todos os elos da cadeia de produção”, criada pela ANIP, atualmente possui.
Existem 743 pontos de coleta de pneus inservíveis no Brasil, que são locais
específicos para a disposição dos pneus pela população, para que assim possa ser
realizada a destinação ambientalmente correta deste resíduo.
No estado de São Paulo o número de pontos de coleta chega a 233, superando
os demais; isto se justifica como já visto pela considerável circulação/produção de
veículos no estado.
5. Estudo de Caso – Empresa Bridgestone
Segundo dados fornecidos pela Associação Nacional das Indústrias de
Pneumáticos são seis as fábricas existentes no estado de São Paulo, sendo elas: a
Bridgestone com 2 fábricas instaladas nas cidades de Santo André e Campinas; Titan;
Rinaldi e Maggion; Pirelli e a Goodyear, sendo que as duas últimas também com duas
fábricas atuantes no município de São Paulo.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
10
A fabricante Bridgestone foi escolhida como foco no estudo de caso, pertinente
ao tema do presente estudo, pelo fato de ser considerada como a maior fabricante de
Pneus dentre as indústrias supracitadas.
A Firestone foi fundada em 3 de agosto de 1900, por Harvey Firestone em Ohio
(EUA), que incialmente fabricava pneus para carruagens e contava com 12 empregados.
Em 1923 ao obter autorização para iniciar suas operações no Brasil, instalou um
escritório de negócios em São Paulo; já em 1939 decidiu montar sua primeira fabrica
de pneus no país, em Santo André na Grande São Paulo.
Em 1988 a empresa se uniu a Bridgestone Tire & Co, fundada pelo japonês
Shojiro Ishibashi em 1930, nascendo assim a Bridgestone Americans Holding.
O quadro 03 apresenta as 16 empresas de revenda de pneus autorizados da
Bridgestone e seus respectivos bairros de localização, no município de São Paulo.
Quadro – 03 Revendedores autorizados
Empresa Bairros
Belém Pneus Bom Retiro, Pirituba, Perus
BF Compneus Casa Verde
Carclub Firestone Saúde
Cinco pneus Penha
Eder Centro Automotivo Vila Nova Conceição
FIS Centro Automotivo Itaim Bibi
Jet Serviços Itaquera
Morumbi Pneus Perdizes, Santo Amaro
Nova Rede Pneus Vila Mariana, Ipiranga
Pneulinhares Tatuapé, Lapa, Vila Leopoldina
Pneus Albuquerque Tucuruvi, Vila Maria, Campo belo,
Pinheiros.
Pneus Carrão Jd. Aricanduva, Vila Carrão
Pneus Douglas Santana, Vila Guilherme
Pneus Rodrigues Butantã
São José Pneus Santana
Zelina Pneus Vila Prudente
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
11
Na figura 1 está representada a distribuição das revendedoras de pneus da
Bridgestone autorizados em relação aos pontos de coleta de pneus inservíveis da
companhia Reciclanip no município de São Paulo, localizados nos bairros: Penha, Lapa,
Mooca, Freguesia do Ó, Brasilândia, Santo Amaro, Vila Maria e Vila Guilherme.
Figura 01 - Pontos de revenda de Pneus da Bridgestone x Pontos de coleta para pneus inservíveis
da Reciclanip no município de São Paulo.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
12
Observa-se na figura 01 supracitada, a desproporção entre os pontos de coleta
e os pontos de revenda, principalmente nas zonas sul, leste e também no centro do
município.
Intensificando a probabilidade de descarte incorreto dos pneus inservíveis no
município de São Paulo, agravando os impactos adversos recorrentes a esta prática,
como mencionado por Oliveira e Castro (2007,p.1)
(...) depositados inteiros em aterros de lixo comum ou jogados em vias públicas, rios e córregos. Quando empilhados em quintais ou terrenos baldios propiciam a proliferação de animais que podem transmitir doenças como a leptospirose e dengue, quando queimados emitem gases tóxicos.
Considerando o fato de que os pontos de coleta existentes são de
responsabilidade dos cinco principais produtores de pneus no Brasil, sendo a Pirelli,
Goodyear, Bridgestone, Continental e Michelin, portanto devem comportar o descarte
de pneus dos mesmos aumentando o agravante supramencionado.
6. Reformadoras de Pneus
Segundo a Associação Brasileira do Segmento de Reforma de Pneus (2013), o
Brasil é o 2° maior mercado mundial de pneus reformados. Com padrões de qualidade
aprovados pelo Inmetro, é uma atividade que proporciona economia de recursos
naturais empregando apenas 25% do material utilizado na produção de um pneu novo.
Atualmente são reformados mais de 7,6 milhões de pneus da linha
caminhão/ônibus, garantindo uma economia de 57 litros de petróleo por pneu
reformado na linha caminhão/ônibus, e 17 litros para a linha automóvel, gerando uma
economia total de 500 milhões de litros/ano.
No quadro 04 e quadro 05 a seguir estão apresentados a quantidade de pneus
reformados por ano no Pais e as reformadoras regularizadas segundo padrões Inmetro
respectivamente.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
13
7. Logística Reversa de Pneus
Quando os consumidores deixam os pneus nos distribuidores e revendedores
após a troca ou nos ecopontos e ecobases após o término da vida útil, é realizado uma
triagem, na qual os pneus podem ser classificados em servíveis ou inservíveis. Os
pneus servíveis são aqueles que podem ser vendidos no comércio de pneus usados,
como pneus meia-vida ou podem ser reformados, através dos processos de recapagem,
recauchutagem ou remoldagem.
Os pneus inservíveis são enviados para o processo de pré-tratamento. Este
processo consiste em várias operações, como: a separação da borracha, a separação
do aço e as fibras têxteis. O produto final dependendo do destino é o pó-de-borracha
ou lascas de pneus. Os processos mais utilizados para a trituração de pneus inservíveis
são: o processo de trituração à temperatura ambiente e o processo criogênico.
Quadro 04 - Produção de Pneus Reformados
Tipo de Veiculo Quantidade/ Ano
Caminhão e Ônibus 7.600.000.000
Automóvel 8.000.000
Motocicleta 2.000.000
Fora-de-estrada e Agrícola 300.000
Quadro 05- Reformadoras Regularizadas no Município de São Paulo
Empresa Bairros
Alvorada Reformadora Brás
Recauchutadora de Pneus Scorpion Itaim Paulista
Xpoint Com. E
Remoldagem de pneus Casa Verde
Muniz reforma de pneus Vila Chuca
Flextire Recap. De Pneus Vila Maria
Durapol – Della Via Vila Carioca
Jô Pneus Quarta Parada
Bonetti Pneus Recauchutagem Pq. Do Carmo
Centro Sul Pneus Pq. Novo Mundo
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
14
A figura 02, apresenta o fluxograma dos pneus desde a sua produção até a
destinação final, enfatizando a deficiência do sistema de logística reversa deste produto
de seu setor proveniente.
Figura 02 – Fluxograma de Pneus (Empresa Bridgestone)
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
15
8. Considerações finais
A partir dos dados apresentados e considerando os conceitos de logística Reversa
já mencionados, é possível identificar que mesmo com a disponibilidade de pontos de
coleta, e o fato de haver tecnologias capazes de reverter pneus inservíveis ao processo
de produção, a aplicação do sistema de logística reversa no município de São Paulo,
não é plena.
Deve-se este fato ao não comprometimento de alguns fabricantes pela
implantação do ciclo necessário para a concretização do referido sistema, não se
responsabilizando pelo total tratamento, recuperação energética, disposição e
destinação de todos os seus produtos.
Uma possível causa desse fato está relacionada com o alto custo no tratamento
desse resíduo, necessitando de investimentos em tecnologias especificas, e também no
volume produzido que dificulta o controle efetivo de pneus descartados e sua disposição
correta.
Além disso, mesmo com o crescente progresso da legislação vigente que impõe
maior responsabilidade dos fabricantes de pneus, dentre outros, a mesma ainda não
representa obrigatoriedade em sua aplicação, conforme já mencionado.
Todas essas questões implicam na desorganização do setor, sendo este o
principio básico para implantação do sistema de logística reversa de pneus inservíveis
no município de São Paulo, o mesmo ainda encontra-se a passos lentos em direção a
sua efetiva regularização.
9. Referências
Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos, ANIP. Entrevista com o
gerente geral da Reciclanip, César Faccio. Disponível em:
http://www.anip.com.br/index.php?cont=detalhes_noticias&id_noticia=438&area=43
&titulo_pagina=%DAltimas%20Not%EDcias>. Acesso em: 20 de Setembro de 2012.
DEPARTAMENTO NACIONAL DE TRANSITO – DENATRAN. Frota de veículos por
regiões: estatística de Setembro de 2012. Disponível em: <
http://www.denatran.gov.br/frota.htm> Acesso em: 10 de Novembro de 2012.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
16
DECRETO nº 7.404, de 23 de Dezembro de 2010. Disponível em:
<http://www.abrasnet.com.br/pdf/decreto7404.pdf> Acesso em: 15 de Setembro de
2012.
LAGARINHOS, Carlos Alberto F.; TENÓRIO, Jorge Alberto S. Tecnologias utilizadas para
a reutilização, reciclagem e valorização energética de pneus no Brasil. Departamento
de engenharia metalúrgica e de materiais. Polímeros: Ciência e Tecnologia, vol. 1,
nº 02, pg. 106-118, 2008. São Carlos. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-14282008000200007&script=sci_arttext>
Acesso em: 16 de Setembro de 2012.
LEI ESTADUAL nº 12.300, de 16 de Março de 2006. Institui a Política Estadual de
Resíduos Sólidos. Disponível em:
<http://www.ambiente.sp.gov.br/legislacao/estadual/leis/2006%20Lei%2012300.pdf
> Acesso em: 16 de Setembro de 2012.
LEI 12.305 de 02 de Agosto de 2012. Instituiu a Política Nacional de Resíduos
Sólidos. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-
2010/2010/lei/l12305.htm>. Acesso em 11 de Agosto de 2012.
LEITE, Paulo Roberto. Logística Reversa: Meio Ambiente e Competitividade, 2ª.
ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2009.
RESOLUÇÃO CONAMA nº 416, de 30 de Setembro de 2009. Conselho Nacional do
Meio Ambiente. Disponível em: <
http://www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm?codlegi=616> Acesso em: 01 de
Setembro de 2012.
OLIVEIRA, Otávio José de; CASTRO, Rosani de. Estudo da destinação e da
Reciclagem de Pneus Inservíveis no Brasil. Foz do Iguaçu, PR. UNESP. 2007. XXVII
Encontro Nacional de Engenharia de Produção. A energia que move o mundo: um
diálogo sobre a integração projeto e sustentabilidade. Disponível em: <
http://www.abepro.org.br/biblioteca/enegep2007_tr650481_0291.pdf> Acesso em 17
de Abril de 2013.
INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS
RENOVÁVEIS – IBAMA. Relatório de Pneumáticos, Ano 2012: Resolução CONAMA
nº. 416/2009 (relativo ao ano de 2011). Disponível em: <
www.ibama.gov.br/phocadownload/category/4?download...2012> Acesso em: 20 de
Novembro de 2012.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática em Sustentabilidade Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179-474X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
Modelo Conceitual para Monitoramento de Metais na Coluna D’água e Eutrofização em Vias Estuarinas
Conceptual Model for Metals and Eutrophication Monitoring Associated To Estuarines Pathways
João Pedro Lago¹, Fabrício Ramos da Fonseca², Cledson Akio Sakurai¹, Caio Fontana¹
¹ Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP
Departamento de Ciências do Mar - Bacharelado Interdisciplinar em Ciências do Mar [email protected], [email protected], [email protected]
² Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial de São Paulo – SENAI-SP
Departamento de Gerência de Educação [email protected]
Resumo. Muitos dos problemas ambientais relacionam-se tanto com a abundância dos elementos como com seu comportamento e propriedades químicas (Harrison e Mora, 1996), portanto o desenvolvimento de sistemas que vislumbrem a melhoria da eficiência na detecção da poluição dos meios estuarinos, torna-se prioridade por possibilitarem prontamente as intervenções necessárias, diminuindo assim o impacto causado ao meio ambiente. Com o aumento populacional, os impactos antropogênicos ao meio ambiente apresentaram um crescimento alarmante. Este estudo é relacionado ao desenvolvimento de um sistema para monitoramento de metais na coluna d’água e da eutrofização das vias hidricas associadas à região estuarina da Baixada Santista, localizada ao sul do litoral de São Paulo, que por décadas vem sofrendo com a liberação de efluentes (industriais e domésticos) em condições impróprias nos corpos d’água estuarinos. Espera-se, com este estudo, fornecer subsídios para implantação de sistemas remotos de medição e análise de variáveis hídricas em contextos semelhantes.
Palavras-chave: recursos hídricos, detecção automatizada de poluentes, análise da qualidade de água, monitoramento remoto de metais pesados e eutrofização.
Abstract. Many environmental issues are related to certain elements’ abundance as well as their behavior and chemical proprieties (Harrison and Mora, 1996). Therefore, the development of systems that look for an improvement in pollution detection efficiency in estuary environments becomes a priority, once they allow necessary interventions to be carried out readily, thus diminishing the ecological impact. Given the population increase, anthropogenic impacts to the environment have presented an alarming increase. This study is related to the development of a new monitoring system for metals in water columns and for eutrophication of estuary pathways associated to the Baixada Santista’s estuary region, located in São Paulo’s seashore south region, that for decades has been suffering with effluents dumping (industrial and domestic) in improper conditions in estuary water corps. It’s expected, with this study, the gathering of subsides for the implantation of remote systems of measuring and analyzing of hydric variables in similar contexts. Key words: hydric resources, pollutant automated detection, water quality analysis, heavy metals and eutrophication remote monitoring.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
2
1. Introdução
Questões relacionadas ao meio ambiente no Brasil estão cada dia mais em pauta, no entanto, essas esbarram em uma característica lamentavelmente inerente ao país e que dificulta a aceleração da reversão do quadro atual: a aplicação ineficaz da legislação ambiental (Ambrozevicius e Brandimarte, 2009).
Neste contexto, a automação dos procedimentos para a coleta e gestão de de informações sobre a utilização de recursos hídricos podem contribuir materialmente para a sua melhor utilização, pois permite seu acompanhamento e controle (FONSECA et al. 2010).
Desta forma o desenvolvimento de sistemas que vislumbrem a melhoria da eficiência na detecção da poluição estuarina torna-se prioridade, pois possibilitam que as intervenções necessárias para o cessamento da ação dos agentes poluentes ocorram prontamente, diminuindo o impacto causado ao meio ambiente.
Estes impactos tem relação direta com as peculiaridades relacionadas à referida região, na qual estão inseridos diversos ecossistemas vulneráveis que coexistem com intensas atividades industriais e portuárias.
Na cidade de Santos está localizado o maior porto da América Latina, responsável, segundo a Agência Metropolitana da Baixada Santista (2004), pela movimentação de mais de 45% do PIB nacional. Estas atividades, ao passo que contribuem para o desenvolvimento econômico da região e do país, resultam em intensa perturbação dos supramencionados ecossistemas por razão do potencial de dispersão de metais pesados atrelados às atividades portuárias.
A referida região estuarina apresenta, ainda, conurbação com os municípios de Praia Grande, Guarujá, São Vicente e Cubatão, por meio das vias hídricas que cortam estas cidades. Estes municípios são caracterizados, no caso de Cubatão, pela intensa atividade industrial e, no caso das outras cidades, pelo ainda evidente déficit de moradias com coleta de esgoto adequada. Estas características afetam negativamente o equilíbrio biótico da supramencionada região agravando assim o processo de eutrofização decorrente dos despejos industriais e domésticos, ricos em nutrientes, nos corpos d’água da região.
Considerando a grande extensão territorial abrangida pela região estuarina que permeia a Baixada Santista e que requer monitoramento de poluentes, propriedades como supervisão remota, autonomia e baixa demanda de manutenção dos dispositivos que compõem um sistema concebido para este fim tornam-se imprescindíveis, uma vez que possibilitam o seu gerenciamento com mínima necessidade de intervenções humanas e reduzido custo de sustentação.
Neste contexto, apresenta-se aqui o resultado de estudos que visam subsidiar o desenvolvimento de um sistema para monitoramento contínuo do perfil de metais presentes na coluna d’água e da eutrofização no complexo estuarino da Baixada Santista, tencionando-se que este sistema complemente os procedimentos de análises químicas laboratoriais hoje utilizados para detecção de anomalias associadas à cargas poluentes presentes nestas vias.
2. Metodologia
Como descrito por Bachnack et al. (2006) pesquisas em ambientes aquáticos como estuários, rios e baías costeiras apresentam diversos desafios para o cientista. A complexidade dos sistemas costeiros e zonas litorais, que são potencialmente sujeitas ao forte impacto provocado pelas atividades aquaviárias, faz com que habitualmente os trabalhos de pesquisa nestas zonas sejam abordados de forma concreta e
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
3
específica. Neste sentido, o caráter integrado e multidisciplinar do projeto que se propõe (inclui uma avaliação integrada da contaminação e seus efeitos, mediante diversas metodologias) permite uma maior compreensão dos problemas ambientais, principalmente em sistemas litorâneos e especialmente, daqueles submetidos a atividades portuárias.
Sobre metais na coluna d’água (parâmetro de medição física)
As principais características que distinguem metais de outros poluentes é que eles não são elementos biodegradáveis, sofrem processo de bioacumulação nos seres vivos e passam por um ciclo ecológico global, tendo a água como principal caminho no ciclo. Em baixas concentrações, os metais são essenciais como catalizadores bioquímicos, mas ao apresentar aumento nos níveis de concentração, esses metais se tornam tóxicos por representarem um desequilíbrio ao ecossistema e um perigo potencial para a biota local (Baumgarten e Pozza, 2001).
Dentre os contaminantes mais agressivos e persistentes estão os metais pesados, que nada mais são que elementos químicos que possuem peso específico maior que 5 g/cm3 ou número atômico maior do que 20. No entanto, o termo “metais pesados” é utilizado para elementos químicos que em concentrações acima do comum provocam diferentes danos à biota (entre eles temos o alumínio, antimônio, arsênio, cádmio, chumbo, cobre, cobalto, cromo, ferro, manganês, mercúrio, molibdênio, níquel, selênio e zinco), portanto é preciso avaliar e monitorar continuamente suas fontes, transporte e destino (Campos et al. 2002 e Tsutiya, 1999). Muitos dos metais pesados tem origem antropogênica, e tornam-se contaminantes por meio de atividades que geram resíduos comumente lançados em corpos d’água ou em locais em terra sem preparo prévio para recebe-lo contaminando, entre outras reservas naturais os lençóis freáticos. As entradas desses e de outros metais no meio marinho ocorrem principalmente pelo fluxo de rios e deposição atmosférica, além das atividades antrópicas (Kennish, 1997). Essas entradas podem ser classificadas como provenientes de fontes difusas (originadas por condições atmosféricas) ou de fontes pontuais (caracterizadas geralmente pelo lançamento de efluentes industriais e domésticos) (Calmano et al. 1996).
Em regiões estuarinas, o principal desafio aos equipamentos de medição remota, é a grande gama de agentes interferentes na medição. Esses são presença comum na dinâmica estuarina. Nesses ambientes, a água é física e quimicamente dinâmica, tendo, nos processos de sorção, floculação e reações redox, alta variação induzida pela mudança nos gradientes de salinidade, pH, temperatura e oxigênio dissolvido. Isso pode ser contornado através da modelagem matemática, criando e prevendo diferentes cenários sobre as condições naturais do estuário, assim detectando emissões de metais e possibilitando estratégias de controle (Topping, 1982, Milani, 2004). A reunião dessas informações proverá uma estrutura para melhor compreender o transporte e ciclagem em sistemas costeiros, informação essa essencial para o coreto gerenciamento destes sistemas.
Usualmente, a medição de metais na coluna d’água é um processo que muitas vezes requer a pré concentração do analito para proceder-se com a análise laboratorial pertinente, tornando-o um método mais caro de demorado em comparação ao procedimento aqui proposto devido ao seu maior número de processos e etapas. Estes testes comumente trabalham na faixa de detecção abaixo de 0,00001 mol d/m³, mas o limite inferior de medição usualmente é definido pela limite de detecção do método analítico utilizado. Apesar disso, a água representa uma matriz de ciclagem dos metais e uma boa indicadora dos processos de contaminação e toxicidade do sistema estudado (Neto et al. 2008).
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
4
Uma forma de avaliar o índice de concentração de metais é através da metodologia de voltametria, neste caso é possível identificar o grau de condutividade do material analisado através da leitura do sensor e, assim inferir o índice de contaminação por metais. (Howel, KA et a.l 2003), assim evitamos o uso de processos lentos e caros identificar a concentração de metais (as concentrações máximas de metais para águas classe II, que são destinadas à pesca amadora, à recreação de contato secundário, à navegação a à harmonia paisagística, de acordo com Resolução CONAMA 357/2005 estão caracterizadas de acordo com a Tabela 1). Se as leituras apresentarem um padrão acima do esperado para a região naquele dado momento, podemos dizer que a contaminação por metais está em execução, ou se as leituras têm uma queda significativa podemos crer que substâncias alcalinas ou mesmo compostos reguladores de pH foram derramados no local, uma vez que a condutividade é diretamente proporcional à ionização das substâncias presentes na água (OTENIO et al., 2008).
Tabela 1 – Resolução CONAMA 357/2005 – Para águas Salobras Classe II
ÁGUAS CLASSE II - ÁGUAS SALOBRAS
PADRÕES
PARÂMETROS INORGÂNICOS VALOR MÁXIMO
Arsênio total 0,069 mg/L As
Cádmio total 0,04 mg/L Cd
Chumbo total 0,210 mg/L Pb
Cromo total 1,1 mg/L Cr
Cianeto livre 0,001 mg/L CN
Cloro residual total (combinado + livre) 19,0 μg/L Cl
Cobre dissolvido 7,8 μg/L Cu
Fósforo total 0,186 mg/L P
Mercúrio total 1,8 μg/L Hg
Níquel total 74,0 μg/L Ni
Nitrato 0,70 mg/L N
Nitrito 0,20 mg/L N
Nitrogênio amoniacal total 0,70 mg/L N
Polifosfatos (determinado pela diferença entre fósforo 0,093 mg/L P
ácido hidrolisável total e fósforo reativo total) Selênio total 0,29 mg/L Se
Zinco total 0,12 mg/L Zn
Sobre eutrofização (parâmetro biológico)
O esgoto consiste em uma mistura complexa de dejetos humanos, água, e compostos químicos derivados de produtos de uso doméstico e/ou industrial (Braga et al. 2005). Muitos poluentes como metais pesados, hidrocarbonetos e compostos organoclorados se tornam constituintes comuns do esgoto por serem facilmente absorvidos na matéria orgânica particulada (Kennish, 1997).
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
5
As fontes possíveis de esgoto para os ecossistemas costeiros são efluentes municipais, drenagens urbanas e agrícolas, lodo doméstico, e materiais dragados. Os esgotos, sem dúvida, constituem o maior perigo para a poluição marinha global (Weber, 1992). Um dos problemas gerados pelo esgoto, além da proliferação de bactérias patogênicas, é o aumento de substâncias naturais ou artificiais nos corpos d’água gerando desequilíbrio ecológico.
Para evitar um impacto em grande escala, a Resolução CONAMA 357/2005 classificou os corpos d’água em seus possíveis usos (como consumo humano, balneabilidade, preservação de espécies) e exige que os efluentes passem por diversos níveis de tratamento (tratamento preliminar, primário, secundário e terciário ou pós-tratamento) para serem posteriormente liberados aos córregos e estuários (Braga et al. 2005).
O fósforo orgânico e o nitrogênio, contidos nos esgotos lançados ao mar (regulamentados pela Resolução 430/2011), são normalmente reciclados por bactérias para suas formas inorgânicas, mas a sua introdução contínua em baías ou outros ambientes costeiros de baixa circulação podem levar a um crescimento exponencial das algas planctônicas, reduzindo a diversidade de espécies (Neto et al. 2008). Esse crescimento é conhecido como o processo de eutrofização de um ambiente.
Propõe-se a utilização de um sensor de medição de algas totais, seguido da aplicação dos dados da biomassa algal no índice de estado trófico para clorofila a de Carlson (Equação 1) para o acompanhamento do estado de eutrofização do estuário, considerando a classificação de Kratzer e Berzonick (1981) para os limites tróficos (Tabela 2).
Equação 1. Fórmula para o índice de estado trófico para clorofila a de Carlson
Tabela 2. Limites tróficos de Kratzer e Berzonick (1981)
Estado trófico Limite (IET)
Ultra-oligotrófico < 20
Oligotrófico 21 - 40
Mesotrófico 41 - 50
Eutrófico 51 - 60
Hipereutrófico >60
Os resultados do índice de Carlson baseado em clorofila a indica o estado trófico do corpo d’água sob estudo, assim podemos manter o controle da qualidade dos efluentes lançados no curso d’água, e através da setorização do mesmo podemos controlar a composição do esgoto lançado e rastrear os focos de contaminação com maior facilidade e assertividade (Mercante e Tuccy-Moura, 1999).
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
6
Critérios para especificação do subsistema de medição e análise
Tradicionalmente, análises ambientais são realizadas através de amostragem seguida de análises em laboratório. O surgimento de novas técnicas e equipamentos proporcionam cada vez mais opções para a avaliação em um menor tempo e no local da coleta, permitindo assim que a integração com outros sistemas de monitoramente possam ser mais efetivos.
Tecnologias que já são realidade nos sistemas de telecomunicações, como o WiMAX e redes 3G (que possibilitaram à Internet tornar-se a mais ampla rede utilizada para a comunicação de dados, segundo BOJKOVIC et al 2008), ainda têm sua aplicabilidade pouco explorada no setor de automação de sistemas distribuídos e podem constituir o mote de novas pesquisas quanto à sua utilização no monitoramento da qualidade dos recursos hídricos estuarinos em meios urbanos. Esses recentes avanços tecnológicos permitem a plena automatização e integração com um sistemas de distribuição baseado em fluxo e tecnologia de comunicação sem fio (Haranhan, G. et al. 2004).
Para o referido monitoramento, dois aspectos do sistema de automação devem ser estudados procurando-se soluções ótimas para a sua implantação: os subsistemas responsáveis pela medição e análise contínua das vias hídricas e o subsistema de transmissão dos dados resultantes desta análise. Este artigo trata do primeiro subsistema citado aplicado na medição dos parâmetros da eutrofização e de metais traço.
Com base nos parâmetros selecionados, foram efetuadas pesquisas relacionadas a analisadores contínuos presentes no mercado, com potencial para instalação nas vias estuarinas a serem monitoradas. Estas pesquisas levaram à seleção de um equipamento multisensor (Figura 2), integrado a uma interface baseada em tecnologia de comunicação sem fio (bluetooth), RS-485, e opções de saída USB com adaptador de saída de sinal (SOA); RS-232 & SDI-12 com DCP-SOA.
Figura 2. Configuração do sensor incorporado a um transceptor RF e transdutor acústico (Hanrahan et al. 2004).
Estes equipamento, conhecido comumente como CTD (Conductivity, Temperature, Depth measure device) funciona em uma de profundidade entre 0 a 250, a vida útil da bateria tem duração de cerca de 90 dias, com uma memória de dados de 512 MB no total, o que significa que mais de 1.000.000 leituras registradas, e também opera a temperaturas de -5 ° a 50 ° C, sem comprometer seus sensores. É uma ferramenta comum usada em oceanografia para obter perfis verticais de água.
Sensores elétricos permitem a implementação remota com capacidade de monitoramento em tempo quase real. A consequência destes desenvolvimentos é uma forma de saber as condições da água em tempo real, e, com base nisso, tem a capacidade de detectar quaisquer alterações devido à poluição ou impactos humanos quase que automaticamente.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
7
O equipamento multisensor proposto neste estudo (Figura 3) é uma alternativa prática aos tradicionais CTDs. O funcionamento do CTD é baseado no princípio de medições elétricas (Tomczac 2000), visando, primordialmente, a medição de parâmetros físicos. Propõe-se, desta forma, a incorporação de sondas multiprobe visando a adição, neste equipamento, de recursos para medição da variável biológica selecionada (eutrofização) e o acoplamento de um amostrador automático para posterior análise laboratorial, caso seja necessário.
Figura 3. Modelo de multisensor proposto para o monitoramento de metais traço e eutrofização
O sensor proposto é uma ferramenta precisa e de baixo custo para monitoramento dos níveis de água dos lençóis freáticos e água superficial, condutividade elétrica e temperatura. O sensor utiliza um transdutor de pressão ventilado para adquirir medições de níveis de água precisas de 0 à 35 m removendo os efeitos da pressão barométrica. Com uma amplitude de 0 à 120 dS/m permite realizar medições precisas de condutividade elétrica, atendendo as necessidades do projeto. O sensor ficará submerso e conectado através de um cabo para coletar e armazenar dados, além de transmitir os dados através de uma antena de radiofrequência.
O sensor proposto tem a resolução de condutividade elétrica em 0,001dS/m e de Temperatura em 0,1oC, com um tempo de medição de 300ms, o que atende as necessidades propostas.
A plataforma coleta uma amostra de água e realiza a medição da condutividade elétrica e da temperatura e armazena os dados no módulo de controle da unidade de medição, que por sua vez transmite de acordo com a parametrização os dados via radiofrequência. Os dados armazenados no módulo de controle podem ser coletados através da interface do computador e analisados em campo. No presente projeto, os sensores estarão instalados em um barco para que realize a coleta em diversos locais.
O projeto encontra-se na fase de aquisição dos equipamentos e preparação do barco para a coleta de dados, entretanto o projeto baseia-se nos resultados obtidos em outros projetos de pesquisa, então espera-se obter resultados similares a do Estuário de Tamar (Figuras 4 e 5).
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
8
Figura 4. Resultado de concentração de Chumbo (Pb) e Cádmio (Cd) (Howell et al. 2003)
Figura 5. Resultado de concentração de Cobre (Cu) (Howell et al. 2003)
No presente projeto as medições ficaram limitadas as concentrações de Cu, Pb e Cd que é o suficiente para avaliar a qualidade da água no estuário de Santos. Essas medidas serão coletadas de diferentes níveis de coluna de água, inicialmente em 1,5, 3 e 5 metros (Waeber et al. 2005). A coleta será realizada em diversas condições de marés e durante o período de um ano para uma maior amostra das condições da qualidade de água.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
9
3. Conclusão
A importância da divulgação das soluções e conhecimentos tecnológicos relacionados ao monitoramento de metais pesados e do estado de eutrofização dar-se-á, também, em função da constante e crescente evolução da aplicabilidade natural das técnicas envolvidas em sistemas desta natureza e na diversidade de configurações, tecnologias e arquiteturas possíveis para sua implementação.
Neste contexto, deve-se buscar mecanismos que possibilitem o desenvolvimento de pesquisas para este setor, de forma que as soluções desenvolvidas e as técnicas implementadas possam ser difundidas e disponibilizadas, constituindo um set de tecnologias que, impliquem maior eficácia no monitoramento da poluição estuarina.
Tecnologias que já são realidade nos sistemas de análise e medição de variáveis hídricas, como sondas multivariáveis e sensores biológicos, têm sua aplicabilidade pouco explorada e podem constituir o mote de novas pesquisas quanto à sua utilização no monitoramento do status da poluição em meios estuarinos.
Além das próprias tecnologias, o desenvolvimento de metodologias aprofundadas que contemplem o planejamento da sua integração com os sistemas pré-existentes, pautadas na priorização das partes mais críticas destes sistemas, constitui campo fértil para a realização de novos trabalhos de pesquisa.
Propõe-se, desta forma, a execução de novas pesquisas relacionadas ao desenvolvimento de sensores e métodos de análise para monitoramento contínuo de metais pesados e do potencial de eutrofização de estuários, de forma a possibilitar o aumento do espectro de detecção de compostos químicos ou biológicos que possam constituir-se em poluentes dos meios aquáticos.
Referências
AGEM – Site da Agência Metropolitana da Baixada Santista. Indicadores Metropolitanos da Baixada Santista IMBS 2004/05. Disponível em: <http://www.agem.gov.sp.br/>. Acessado: 27 set. 2013.
AMBROZEVICIUS, A. P. & BRANDIMARTE, A.L. Sociedade de risco: reflexões sobre o caso da poluição das águas da Baía de Santos SP. Leopoldianum (UNISANTOS), v. 97, p. 91-95, 2009.
BACHNAK, R.; STEIDLEY, C.; MENDEZ, M.; ESPARZA, J.; DAVIS, D. Real-Time Control of a Remotely Operated Vessel. Proceedings of the 5th WSEAS Int. Conf. on Signal Processing, Robotics and Automation, 2006.
BAUMGARTEN, M. G.; POZZA, S. A. Qualidade de águas: descrição de parâmetros químicos referidos na legislação ambiental. Rio Grande: Editora da FURG, 166 p., ISBN: 85-85042-70-2, 2001.
BOJKOVIC, Z. BAKMAZ, B. A Survey on Wireless Sensor Networks Deployment. WSEAS Transactions on Communications. Volume: 12. Volume: 7. 2008.
BUFFLE, J; TERCIER-WAEBER, M.-L. Voltammetric environmental trace-metal analysis and speciation: from laboratory to in situ measurements. TrAC Trends in Analytical Chemistry. Volume 24. p. 172–191. 2005.
BRAGA, B.; HESPANHOL, I. & CONEJO, J.G.L.; Introdução à engenharia ambiental. São Paulo: Prentice Hall., p.305., 2004.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 – Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
10
CALMANO, W.; AHLF, W.; FÖRSTNER, U. Sediment quality assessment: chemical and biological approaches. In: CALMANO, W.; FÖRSTNER, U. (eds.) Sedmentes and toxics substances. Springer, Berlin Heidelberg, New York, p. 1-35, 1996.
CAMPOS, M. L.; BENDO, A.; VIEL, F. Métodos de baixo custo para purificação de reagentes e controle da contaminação. Química Nova, 25(1): 808-813, 2002.
CARLSON, R.E.; A trophic state index for lakes. Limnol. Oceanogr., 22: 361-380, 1977.
FONSECA, F. R; DIAS, E. M; PEREIRA, S. L; FONTANA, C. F. Proposal of a Information System Guided To Administration of Hydric Supply Systems. WSEAS Transactions on Systems and Control. Issue: 6. Volume: 5. 2010.
HANRAHAN, G; PATIL, DG; WANG, J. Electrochemical sensors for environmental monitoring: design, development and applications. Journal of Environmental Monitoring Volume: 6, p.657-664. 2004.
HARRISON, M. R. & MORA, S. J. Introductory chemistry for the environmental science. Cambridge, Cambridge University, 373 p., 1996.
HOWEL, K.A; ACHTERBERG, E.P; BRAUNGARDT, C.B; TAPPIN, A.D; TURNER, D.R; WORSFOLD, P.J. The determination of trace metals in estuarine and coastal water using a voltammetric in situ profiling system. The Royal Society of Chemistry Journal. Volume: 128, p. 734-741. 2003.
HOWEL, K.A; ACHTERBERG, E.P; BRAUNGARDT, C.B; TAPPIN, A.D; WORSFOLD, P.J. Voltammetric in situ measurements of trace metals in coastal waters. TrAC Trends in Analytical Chemistry. Volume 22, p. 828–835. 2003.
KENNISH, M. J. Practical handbook of estuarine and marine pollution. Boca Raton, CRC PRESS, BOCA RATON, 524p., 1997.
KRATZER, C. R. & BERZONICK, P. L. A. A Carlson type throphic state index for nitrogen in Florida lakes. Water Res. Bull., 17: 713-714, 1981.
MERCANTE, C.T.J. & TUCCI-MOURA, A. A comparação entre os índices de Carlson e de Carlson modificado aplicados a dois ambientes aquáticos subtropicais. São Paulo, SP. Acta Limnologica Brasiliensia, 11:1-14, 1999.
MILANI, I. C. B. Determinação Polarográfica de metais em ambientes do sistema Patos-Mirim. Engenharia Oceânica da FURG, Rio Grande. Dissertação de Mestrado, 159 p., 2004.
NETO, J. A. B.; WALLNER-KERSANACH, M.; PATCHINEELAM, S. M. Poluição Marinha. Rio de Janeiro: Editora Interciência, 412 p., 2008.
OTENIO, M. H; PANCHONI, L. C; BIDÓIA, E. D. AVALIAÇÃO EM ESCALA LABORATORIAL DA UTILIZAÇÃO DO PROCESSO ELETROLÍTICO NO TRATAMENTO DE ÁGUAS. Quim. Nova, Vol. 31, No. 3, 508-513, 2008
TOMCZACK, M. Introduction to Physical Oceanography. S.l.: s.n. 2000. Disponível em: <http://as.flinders.edu.au>. Acessado em: maio de 2009.
TOPPING, G. Cooperative Report 11, International Council for the Exploration of the Sea, Copenhagen, 1982.
TSUTIYA, M. T. METAIS PESADOS: O PRINCIPAL FATOR LIMITANTE PARA O USO AGRÍCOLA DE BIOSSÓLIDOS DAS ESTAÇÕES DE TRATAMENTO DE ESGOTOS. In: 20° CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL., 1999, Rio de Janeiro.
WEBER, R. R. Sistemas costeiros e oceânicos. Química Nova, 15(2):137-143, 1992.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática em Sustentabilidade Vol. 4 n° 2 - Maio de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179474 X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
DESIGN DE MODA: POSSIBILIDADES DE INOVAÇÃO SOCIAL E
SUSTENTABILIDADE
Fashion Design: Possibilities for social innovation and sustainability
Regina Akemi Okada¹, Lilyan Berlim²
Centro Universitário UNILASSALE – Niterói – RJ
Pós–Graduação em Design de Moda e Sustentabilidade
Sociais da UFRRJ)
[email protected],[email protected]
RESUMO: Este trabalho sugere tornar o design de moda uma ferramenta sustentável
através de sua inserção em contextos sociais e disseminar modos diferentes de se
pensar sobre o mundo, introduzindo idéias no plano cultural que possam mudar concepções em relação ao "estilo de vida" das pessoas. Nessa perspectiva, serão
abordadas teorias sobre conceitos de desenvolvimento e de atribuições do design para
melhoria de qualidade de vida e promoção de bem estar. Como também, as necessárias
mudanças nos modos de se fazer moda para que o design de moda estimule soluções
criativas e gere Inovações Sociais. Assim, serão apresentadas inovações e conceitos
sobre Inovações Sociais. Mas, para fomentar novos valores e critérios, e fortalecer a
diversidade de padrões culturais, é preciso entender a amplitude social da moda e de
sua relação com a formação cultural da identidade e o consumo. Então, serão expostas
teorias que envolvem o conceito de moda e de padrões culturais estabelecidos. Também
serão descritas referências baseadas na ética e na justiça para servir como elo de
princípios integradores de contextos sociais inovadores e reger melhores convívios. Palavras-chave: design de moda, estilo de vida, desenvolvimento, Inovações Sociais, ética.
ABSTRACT: This work suggests making the fashion design to serve as a tool of
sustainable insert in social contexts and disseminate different ways of thinking about the
world, introducing ideas in cultural terms that can change values in relation to the
"lifestyle" people. In this perspective, theories of development concepts and tasks of the
design to improve quality of life and promoting wellness will be addressed. As well, the
necessary changes in ways of doing fashion for the fashion design encourage creative
solutions and manage Social Innovations. Therefore, innovations and concepts on Social
Innovations will be presented. However, to develop new values and criteria, and
strengthen the diversity of cultural patterns, one must understand the social range of
fashion and its relationship to cultural identity formation and consumption. So that,
theories involving the concept of fashion and cultural patterns will be exposed.
References based on ethics and justice to serve as a link integrator of innovative
principles governs social contexts and best gatherings are also described.
Key words: fashion design, lifestyle, development, Social Innovations, ethics.
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
2
1. Introdução
Para que o design de moda se torne uma eficaz ferramenta sustentável é preciso utilizar
suas características intrínsecas de possuir um grande potencial criativo e estimulador
para disseminar modos diferentes de se pensar sobre o mundo, e introduzir idéias no
plano cultural que possam alterar as concepções em relação ao estilo de vida das
pessoas. Isso pode ser justificado pela expressiva abrangência social da Moda nas
sociedades contemporâneas que envolvem padrões simbólicos de desejos e de consumo.
Assim, foram expostas teorias sobre o conceito de Moda e de sua relação com a
formação cultural da identidade e o consumo. Mas, segundo o designer Manzini (2008),
a interferência social só poderia emergir de dinâmicas complexas de inovações
socioculturais nas quais os projetistas (designers) podem ter um papel importante.
Desta maneira, foram propostas possíveis interferências do design mais voltadas para o
bem estar e para a melhoria de qualidade de vida. Entretanto, é importante observar
que a construção de cenários sustentáveis deve estar baseada em inovações que
atendam critérios de qualidade que sejam ao mesmo tempo sustentáveis para o
ambiente, socialmente aceitáveis e culturalmente atraentes para as pessoas. (MANZINI,
VEZZOLI, 2011).
Assim, será preciso mais que utilizar práticas e processos costumeiros e adaptados aos
limites impostos pela sustentabilidade. O design deverá mediar mudanças, estimular
soluções criativas, fomentar novos critérios e valores e gerar Inovações Sociais. Desse
modo, serão expostas possibilidades de inovações e de referências sobre o conceito de
Inovações Sociais. Mas, para seguir um caminho mais sustentável, o campo do design
de moda precisará mudar o modo como se faz moda e transitar em contextos sociais
incomuns, apoiar-se em valores culturais e em experiências práticas que estimulem o
envolvimento e o cuidado, ao mesmo tempo em que melhore a vida cotidiana das
pessoas. Também será importante conjugar ideias a limites, usar a criatividade e
satisfazer aspectos imateriais humanos. Nesta perspectiva, foram descritas algumas
propostas de novos procedimentos, atividades e outros campos de atuação do design de
moda, segundo a visão de Kate Fletcher e Linda Groose.
Estruturar contextos sociais mais sustentáveis requer o entendimento dos parâmetros
estabelecidos pela sustentabilidade, e de se conhecer de que tipo de desenvolvimento é
proposto para a vida das pessoas. Assim, este trabalho considerou teorias que sugerem
um desenvolvimento econômico diferente do convencional, como nos estudo de Amartya
Sen, Max-Neef e Ezio Manzini.
Mas, para selar melhores convívios e promover democraticamente a justiça é
fundamental adotar princípios éticos para formar um elo de integração de contextos
sociais inovadores. Assim foram expostas algumas referências éticas e de como elas
podem interferir na responsabilidade social, no comércio justo e na cidadania.
2. Fundamentação Teórica
A sustentabilidade é um conceito sistêmico que envolve aspectos econômicos,
socioculturais e ambientais e direciona as atividades humanas para atender as suas
necessidades e preservar o meio ambiente. Isto exige o desenvolvimento produtivo e
social dentro dos limites da capacidade do planeta de absorver e de se regenerar,
minimizando os impactos da ação humana e sem comprometer a satisfação das
necessidades das futuras gerações. Honrar esse compromisso exige distribuição
equânime dos recursos, segundo o princípio de que todos têm o mesmo direito de
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
3
acesso ao espaço ambiental. É nisso que se baseia o Desenvolvimento Sustentável ao
pregar a solidariedade em relação à conservação dos recursos naturais. O conceito
fundamental desta teoria está descrita no relatório Nosso futuro comum, conhecido
como relatório Brundtland elaborado pela ONU1 para oferecer parâmetros de
sustentabilidade. Os princípios sustentáveis indicam mudanças nos modos de vida da
sociedade e tem na justiça igualitária a base fundamental para que todos tenham o
mesmo direito e acesso aos recursos naturais. Ainda que isto se configure em novas
relações entre os humanos e o meio ambiente, esses princípios estabelecem objetivos de
desenvolvimento em todas as esferas sociais. Mas o que seria este desenvolvimento na
vida das pessoas? A resposta não é simples, porque o próprio conceito de
desenvolvimento é controverso. Entretanto neste trabalho, as referências estão
baseadas em autores que entendem o desenvolvimento diferente do pensamento
econômico convencional, entre eles estão; Amartya Sen (1999), que entende o
desenvolvimento como a expansão das liberdades subjetivas, Max-Neef (1998), que tem
como referência a escala humana e avalia o homem integrado na comunidade e a sua
inter-relação de necessidades e satisfações humanas, e Ezio Manzini (2008) que
relaciona desenvolvimento ao bem-estar e a qualidade de vida e ao cuidado das
pessoas, considerando o design como um mediador de mudanças.
De acordo com a opinião de Ezio Manzini (2008), a qualidade de vida está ligada ao
modo como diferentes sistemas, naturais, artificiais, físicos e socioculturais se inter-
relacionam e são dependentes do resultado do cuidado de todas as pessoas que ali
vivem. Portanto, a ideia de bem-estar deve estar atrelada ao acesso a uma variedade de
produtos e serviços, mas também à qualidade e à quantidade dos bens comuns
disponíveis. Assim, as oportunidades sociais promoveriam um maior acesso ao tipo de
vida que as pessoas gostariam de ter ou fazer (concepções relativas à funcionalidade), e
ofereceriam maior liberdade de escolhas (ser o que as pessoas gostariam de ser e levar
ao tipo de vida que o indivíduo deseja). Desta maneira, o desenvolvimento de um
contexto social seria determinado pelos diversos padrões de vida e de bem-estar
individual. Semelhante pensamento pode ser encontrado nos estudos de Amartya Sen,
em sua publicação Desenvolvimento como Liberdade (1999). Este economista fala que o
desenvolvimento pode ser visto como uma expansão de liberdades reais que as pessoas
desfrutam e requer a remoção das principais fontes de privação de liberdade, como:
fome, o não-acesso a água potável, pobreza e tirania, a carência de serviços de
educação, saúde e segurança, e a negação dos direitos políticos e civis. Isso quer dizer
que o desenvolvimento de um contexto social seria determinado pela soma dos diversos
padrões de bem estar individual, ou seja, pelo conjunto de liberdades subjetivas que as
pessoas desfrutam e indicaria o quanto elas podem exercer sua autonomia. Por exemplo,
o senso comum costuma relacionar desenvolvimento humano com o valor do PIB2 de
uma determinada população, mas os estudos de Sen mostram que afrodescendentes
americanos, apesar de viverem em um país rico, têm expectativa de vida menor que nos
países de terceiro mundo, como Gabão e Índia. Isso se deve à preponderância de fatores
culturais sobre as facilidades do mundo industrial e moderno.
Para entender a relação do desenvolvimento com as demandas sociais por um bem
estar, o economista chileno Manfred Max-Neef (apud FLETCHER, 2010) elaborou estudos
taxonômicos e identificou 'riquezas e pobrezas'. Assim, foram identificadas nove
necessidades fundamentais: subsistência, proteção, afeição, compreensão, participação,
1 A Organização das Nações Unidas, também conhecida pela sigla ONU, é uma organização internacional formada por países que se reuniram voluntariamente para trabalhar pela paz e o desenvolvimento mundial. Definição disponível em: http://www.onu.org.br Acesso em: 25 de setembro de 2011 2 Produto Interno Bruto (PIB) é a soma de todos os serviços e bens produzidos num período (mês, semestre, ano) numa determinada região (país, estado, cidade, continente), e é expresso em valores monetários e é um indicador da atividade econômica de uma região, representando o crescimento econômico.
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
4
lazer, citação, identidade e liberdade, as quais foram inter-relacionadas com promotores
de satisfação (categorias existenciais): ser, ter, fazer e interagir (estar). Dessa forma,
Max Neef compreendeu que as necessidades fundamentais são distintas das satisfações
humanas, e que o querer é insaciável e infinito. A sua metodologia se concentra em uma
escala mais humana e tem como referência as expectativas pessoais. Ele tenta captar as
necessidades culturais, emocionais e fundamentais, e mostra a amplitude de valores
envolvidos. Mas, o autor observa que os resultados são diferentes na cultura e no modo
como essas necessidades são atendidas pela sociedade, e de que este modelo poderia
ser aplicado em qualquer lugar (FLETCHER, 2010).
Outra abordagem a ser considerada é a psicológica que fala de um bem estar e
qualidade de vida está vinculada ao bem-estar individual subjetivo e ao bem-estar
social. O bem estar individual indicaria o que as pessoas sentem e pensam em relação as
suas vidas; refere-se às relações interpessoais, aos impactos de eventos da vida, a
comportamentos e a diferenças transculturais (GIACOMONI, 2004). Já o bem estar
social; se refere à satisfação pela vida, ao trabalho, às sensações de felicidade, alegria,
afeto e nas bases da psicologia positiva; nos conceitos psicossociais como; otimismo,
esperança, auto-estima, inteligência emocional, valores transcendentes, acolhimento,
proteção, responsabilidade, suporte e justiça social (SIQUEIRA, 2008).
Isso quer dizer, que um esperado desenvolvimento deve surgir por mudanças de
estruturas sociais que levem em consideração um conjunto de fatores envolvidos na vida
humana. Pois, segundo as observações do designer Manzini (2008), um contexto de vida
é composto pelo ambiente físico e social de uma pessoa, e pelas possibilidades
oferecidas ao indivíduo para que ele tenha a capacidade de fazer suas escolhas. Portanto, a proposta para cenários sustentáveis corresponderia a mudanças de "estilo de
vida" e estaria relacionado ao desenvolvimento de atividades no plano cultural que
promovam novos critérios e valores, ou seja, ações que tendam a mudar
comportamentos e, nessa perspectiva, modificar a própria estrutura de contextos
sociais.
3. Inovações Sociais
Manzini (2008) observa que algumas pessoas ou comunidades estão mudando a maneira
de agir para resolverem suas dificuldades, regenerando suas vidas e os contextos sociais
onde vivem. Elas utilizam soluções criativas e criam novas oportunidades. Isto é
chamado de Inovações Sociais3. Essas inovações consistem em novos conceitos,
estratégias e métodos capazes de atender as necessidades das pessoas no trabalho,
lazer, educação, saúde e no suporte de ações inovadoras e empreendimentos de
interesse social. As Inovações Sociais têm como propósito, favorecer o senso de
comunidade, a solidariedade e por modos de vidas mais sustentáveis. Elas formam
estruturas sociais mais abertas e flexíveis, e rompem com padrões consolidados e
experimentam novos arranjos sociais. Para o Centro para Inovação Social do Canadá4
(CSI, 2003), as Inovações Sociais nascem de ideias que resolvem desafios sociais e
culturais e tem uma nova abordagem social de bens públicos e interesses coletivos. É
3 Inovações Sociais foi descrito em Design para inovação social e sustentabilidade: comunidades criativas, organizações colaborativas e novas redes projetuais em estudo publicado nos Cadernos do Grupo de Altos Estudos; v.1 - Programa de Engenharia de Produção da Coppe/UFRJ (EMUDE apud MANZINI, 2008).
4 Centre of Social Innovation (CSI) - Centro de Inovação Social do Canadá (CAN) busca modelos de espaço de trabalho compartilhado e tem missão social que envolve artes e ambiente, justiça e educação.
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
5
um sistema de mudanças apoiado na colaboração pessoal e na criatividade. De acordo
com Langenbach (2008), as Inovações Sociais deslocariam o valor do consumo para o
valor dos relacionamentos e serviços. Assim, essas novas vivências teriam como
prioridade as necessidades humanas acima das satisfações do mercado e promoveria a
inclusão social, a capacitação de agentes ou de atores sociais e favoreceriam nas
relações de poder. Nestas novas estruturas, o conhecimento tenderia a ser
compartilhado e colaborativo e as ações e idéias estariam voltadas para o cotidiano.
Além disso, haveria mais tolerância, empreendedorismo, bens comuns e um ritmo de
vida mais lento; e como recursos sociais, estas novas estruturas utilizariam a tradição e
o respeito às estações climáticas e ao espaço local.
É significativo considerar que os padrões sustentáveis formam estruturas sociais mais
flexíveis e têm como fundamento soluções criativas e mudanças de comportamento.
Portanto, esses padrões constituiriam um caminho para mudança, uma reavaliação e
reposicionamento dos nossos modos de vida e a transformação de ações em relação ao
consumo, produção e processos. Neste sentido, estes limites não denotam conservação
em relação a ações humanas, mas sim preservação e regeneração dos meios sociais e
ambientais. Como também, seria um ganho para a vida moderna quando sob o ponto de
vista da responsabilidade, da democratização de possibilidades e do aprendizado social.
4. Bem Estar e Consumo
O conceito de bem-estar baseado em produtos teve sua origem na revolução Industrial,
no século XVIII, com a difusão da produção de massa e da concepção de que os
artefatos poderiam ser criados para trabalhar por nós, como modernos escravos
mecânicos. Isso gerou um bem-estar baseado no consumo e na minimização do
envolvimento pessoal, cuja estratégia principal seria sempre requerer menos esforço
físico, atenção, tempo e o mínimo de habilidade e de capacidade do consumidor. Mesmo
que alguns seres humanos tendam à passividade e sintam prazer em ser servidos, a
nova proposta é de um bem estar baseado na atividade, na troca participativa e no
cuidado. Isso se refletiria em nossa aptidão para cuidar de nós mesmos, da nossa
família, da vizinhança e do meio ambiente em que vivemos. Entretanto, essa ideia de
bem-estar, não deve ser considerada o único modo de ser, mas sim uma oportunidade
de oferecer uma amplitude de possibilidades, de lógicas e de diferentes aspirações
(MANZINI, 2008).
A promessa de um bem-estar baseado na aquisição de artefatos do atual modelo de desenvolvimento dos países "desenvolvidos", não pode ser mantida, pois 80% da
população estão excluídos deste bem-estar. Este consumo, segundo o WBSCD (apud
MANZINI, 2008) extrapola a capacidade de recuperação dos ecossistemas. Isso quer
dizer que a sociedade deverá se desenvolver a partir da redução dos níveis de produção
e consumo material e, simultaneamente, melhorar a qualidade do ambiente social e
físico5. Outro caminho nos aponta para um sistema cultural onde produtos e serviços
materiais regenerem a vida das pessoas. Ou seja, a compensação poderá vir de outras
formas intangíveis de qualidade de vida como as relacionadas às questões sociais e éticas. Isso mudaria a perspectiva do interesse pelas "coisas" para "experiências nas
atividades realizadas", e significa planejar diferentes combinações. Essas mudanças de
conduta transformariam as áreas de produção e consumo e definiriam novos conceitos
de qualidade de vida e a ideia de bem estar.
5 Segundo o WBCSD de 1995, o metabolismo da sociedade deverá viver bem utilizando 10% dos recursos consumidos hoje em uma sociedade industrializada.
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
6
Segundo a opinião do designer, essas transformações aconteceriam na esfera física
(fluxo de materiais e energia), na esfera econômica e institucional (relação entre os
atores sociais), e na ética, na estética e na cultura (valores que dariam legitimidade
social). Ou seja, essas mudanças aconteceriam a nível sistêmico e devem surgir através
de escolhas positivas e de valores éticos, estéticos e culturais que melhorem as
condições de vida individual e coletiva, e que não comprometam o bem-estar de todas
as vidas e das futuras gerações do planeta (perspectiva sustentável). Portanto, o
conceito de bem-estar deve ter o foco deslocado da relação-consumo para o acesso a
serviços, para a diversidade de bens comuns disponíveis e ao fortalecimento das
capacidades pessoais (MANZINI, 2008).
Sendo assim, no aspecto da dimensão social e cultural, a qualidade de vida de vida e as
condições de bem-estar das pessoas seriam determinados pelo critério do convívio, da
solidariedade e da existência de ligações sociais afetivas que unem diferentes indivíduos.
Constatar o envolvimento e o valor dessas ligações e sentir-se parte de uma comunidade
permitiriam aos indivíduos exercer suas próprias capacidades como pessoas
competentes e responsáveis. Assim, uma mudança de foco nos produtos para o foco no
modo como se fazem as coisas, levaria a cuidar das coisas, do menor de todos os
produtos até o planeta inteiro e vice-versa (MANZINI; VEZZOLI, 2011)
5. Design, Design de Moda e Inovações
No pensamento de Manzini (2008), a essência do design está relacionada à melhoria de
qualidade de vida e representa forte componente ético e cultural, e atua como mediador
entre artefatos e pessoas em suas relações cotidianas e nas expectativas de bem-estar.
Essa característica do design facilitaria a comunicação, a integração entre pessoas, a
troca de conhecimentos e a formação de compromissos que aumentassem o valor da
convivencialidade6.
Na opinião de Ivan Illich (1973), essa relação convivencial representa as ações de
pessoas que participam na criação da vida social. Isto significaria uma mudança da
produtividade para a chamada convivencialidade, substituindo o valor técnico por um
valor ético, e a substituição do valor material por um valor adquirido. Assim, a
convivencialidade seria oposta às virtudes técnicas da ciência e do poder profissional, e
representaria a relação direta entre a socialização e a aprendizagem. Isso seria possível
ao se valorizar situações educativas não formais, como a auto-formação, a formação
educacional em contextos de trabalho ou no cotidiano das pessoas. Esta teoria aborda os
limites do crescimento da sociedade humana nos países super-industrialisados e está
apoiada nas ideias de que a produção industrial cria e multiplicam as necessidades, a
medicina inventa doenças, a velocidade cria distâncias e as escolas incorporam
mecanismos industriais
"Uma sociedade convivencial é uma sociedade
que oferece ao homem a possibilidade de
exercer uma ação mais autônoma e mais
criativa, com auxílio das ferramentas menos controláveis pelos outros" (ILLICH, 1973, p.37)
Manzini (2008) sugere que hoje em dia a sustentabilidade deveria ser o meta-objetivo
de todas as possíveis pesquisas em design e descreve fundamentos que devem ser feitos
antes de começar um projeto de design sustentável que seriam:
6 Esse termo convivencialidade, Ivan Illich se define como a atitude transcendente e legítima de reconhecer o
outro com que nos relacionamos (ILLICH, 1973)
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
7
Pensar antes de fazer, considerar os objetivos e implicações gerais que
sejam eticamente aceitáveis;
promover a variedade, proteger e desenvolver a diversidade biológica,
sociocultural e tecnológica e dar importância aos produtos locais, e
respeitar os contextos locais;
usar o que já existe e reduzir a necessidade do novo, minimizar a
intervenção no que já existe e melhorar o existente, proteger ou atualizar
o conhecimento e as formas existentes de organização.
Outro setor significativo para a construção de iniciativas sociais sustentáveis seria o
Design Experimental. Esse setor envolve valores empíricos e tem como objetivo
compreender a subjetividade do homem através de sua função simbólica e assim
entender suas crenças, as tradições e a cultura local. Ele diz respeito à cultura, aos
significados e aos aspectos emocionais e sociológicos de um serviço ou de um produto.
Esse setor do design estimula a troca social, valoriza usuários e os provedores do serviço
relacionando-os à experiência que o consumidor tem do serviço. Além disso, a aplicação
dessa experiência consiste na comunicação direta, no diálogo e no entendimento da
especificidade de cada um. O que torna o design um facilitador de processos (CANDI
apud LANGENBACH, 2008).
Para o campo do design da moda, trabalhar para a sustentabilidade significa mudar os
modos de se fazer moda. Isto é, será preciso entender o que é Moda e conhecer as
atividades, oportunidades e de possibilidades criativas para então, ampliar e diversificar
seu campo de ação.
Segundo Fletcher e Grose (2010), roupas e moda são entidades diversas: as roupas
estariam relacionadas com a produção material (indústria) e a Moda, com a produção
simbólica (desejos, emoções, identidade). Ambas, as produções contribuem para o bem-
estar humano em aspectos funcionais e emocionais, e satisfariam uma série de
necessidades, tanto físicas (abrigo e proteção), quanto associadas à moda, como o de
expressão pessoal e a sensação de pertencimento. As autoras observam que o campo
capaz de unir estes dois conceitos seria a área do design de Moda, ao qual somaria as
necessidades funcionais, como matérias primas, formas, durabilidade, qualidade e as
necessidades culturais e emocionais expressas na moda (BERLIM, 2012).
Lilyan Berlim em seu livro Moda e sustentabilidade: uma reflexão necessária (2012)
observa algumas oportunidades práticas do design de moda pouco exploradas em
relação ao aspecto relacional que as pessoas têm com seus bens materiais. Na opinião
da autora, a intimidade que o ser humano tem com suas roupas e acessórios
consistiriam em aspectos mais sutis e profundos da necessidade humana, como afeto,
proteção e memória. Essas relações teriam significações mais cognitivas, afetivas e hedonistas e fariam com que as pessoas guardassem estes objetos "especiais". Assim,
quanto mais significações tiverem estes objetos, maior seria seu prazo de durabilidade e
menor sua obsolescência. Isso refletiria economicamente em oportunidades de novos
negócios, substituindo as quantidades pela qualidade de bens materiais (BERLIM, 2012).
A mesma observação está presente nos estudos de Kazazian (2005) onde o autor
esclarece que pensar no consumo de moda significa gerenciar a obsolescência produzida,
não apenas a perda de funções ou de desgaste que condicionam a vida dos produtos
(KAZAZIAN, 2005). Neste sentido, Berlim (2012) descreve alguns segmentos e
atividades de design de moda que estão surgindo a favor da sustentabilidade, que são:
O Design Emocional - estimula o aspecto relacional e íntimo entre bens
materiais e as pessoas, favorecendo a afetividade, os valores cognitivos e
hedonistas e aumentando-se a durabilidade dos mesmos;
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
8
O Design de Serviços - a prestação de serviço aumentaria a vida de bens
materiais e diminuiria a necessidade de se produzir novos objetos;
O Slow Design - envolve atores sociais do “Sistema Moda” (designers,
varejistas, comerciantes e consumidores), considera a velocidade da
natureza e dos recursos utilizados na produção têxtil para se comparar
com a velocidade com que estes bens materiais estão sendo descartados.
Conscientização dos impactos da produção dos produtos sobre as pessoas
e os ecossistemas;
O Design Participativo - os usuários e designers teriam um contato mais
profundo, favorecendo um maior compartilhamento de conhecimentos e
saberes. Isto significaria a co-participação no processo de criação e
produção;
O Open-Source Design - tem como filosofia promover o acesso e a
redistribuição universal, via licença grátis do design de um produto ou
projeto. É uma ideia de fonte aberta de informações na área do design de
moda e são ferramentas de informações, processos, materiais e utilidades.
Isto refletiria a necessidade que as pessoas têm de compartilhar suas
capacidades e conhecimentos, colaborando de modo global (via web), de
modo livre do controle do mercado ou de empresas.
Como se percebe, promover a sustentabilidade social e cultural significa priorizar
mudanças em relação aos sistemas de negócios que vão além das fronteiras corporativas
ou de disciplinas individuais. Assim, relacionar a sustentabilidade com o design de moda
se iniciaria através de novas formas de atuação e de interferências em contextos sociais
diferentes dos convencionais. Como também, uma mudança do foco restrito nos
produtos, para as mudanças dos modelos atuais de negócios, regras e metas
econômicas. Isto exige analisar estruturas, motivações e práticas de negócios já
estabelecidas, e mudanças nas novas formas de atuação dos designers.
Nesta nova perspectiva, o designer poderia atuar como ativista, comunicador (trabalhos
na internet), facilitador ou um empreendedor, incentivando a diversidade de negócios e
fortalecendo o comprometimento com a comunidade. Como empreendedor incentivaria
os trabalhos que estariam dentro dos limites da lentidão, valorizando-se os trabalhos
manuais, os de processamento natural e em pequenas escala. Na forma interdisciplinar,
ele ampliaria suas atividades práticas tradicionais para desenhar atividades, criar ideias,
plataformas e comportamentos, enfatizando processos em detrimento dos resultados.
Essas inovações práticas causariam uma abundância de experiências, criatividade e livre
pensamento, tendo como resultado um novo tipo de prosperidade: o da vida cotidiana.
Assim, embora contrarie o pensamento moderno, muitos dos problemas ambientais e
sociais na moda não tem solução apenas na técnica ou na área mercadológica, mas em
soluções morais e éticas, valores que não são aprendidos pelos negócios e pelo mercado.
A solução também pode estar num movimento profundo e abrangente de comunicação e
educação para que a população seja estimulada a conhecer melhor sobre os sistemas
ecológicos e naturais e suas interconexões com os sistemas humanos (FLETCHER;
GROSE, 2010).
As designers Fletcher e Goose (apud BERLIM, 2012) desenvolvem projetos de pesquisa
baseadas em experimentações baseadas no Saber Local (estímulo ao artesanato), no
tempo de vida das roupas (metabolismo da moda), no cuidado dos consumidores com as
roupas, Reuso (reciclagem e recondicionamento), e na Satisfação (roupas que nos fazem
felizes) (BERLIM, 2012). As pesquisadoras fizeram observações importantes sobre
algumas atividades, inovações e oportunidades para o design de moda em um futuro
sustentável:
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
9
Adequação do design de moda para os limites de impactos ambientais, novas ideias para "reconstrução ambiental e social", Inovações Sociais
mudando relações de trabalho e cultura;
promoção de estética Pluralista, diferentes modelos de negócios;
fortalecimento dos aspectos imateriais da moda;
flexibilização de processos produtivos e serviços de moda, adaptação sob
condições ambientais e capacidade dos ecossistemas regionais;
otimização de água e energia nas peças, no uso e reuso;
promoção de eco produtos e otimização de recursos;
atividades estratégicas que estimulem a atuação, a colaboração e a
participação de atores sociais, alimentando transformações sociais e
culturais;
ética, psicologia, ecologia para aplicação prática;
sucesso dos empreendimentos medidos em termos sociais, culturais e
ambientais;
produção proporcional aos benefícios sociais, ambientais e culturais;
monitoramento para alimentar o restabelecimento de qualidade social e
ambiental;
estabelecimento educacional de fontes de conhecimento lento e
incubadoras de novos modelos de negócios.
6. Sistemas Inovadores
Inovações de produtos e processos
Ezio Manzini e Carlo Vezzoli (2011), em O desenvolvimento de Produtos Sustentáveis,
falam de mudanças em todos os níveis da sociedade em que vivemos. Essas mudanças
exigiriam grandes dinâmicas em ação e a consideração dos efeitos de sua interação.
Entre eles estão: a gestão de sistemas interconectados e de fluxos de matéria e energia,
a transformação do estereótipo do trabalho (reduzindo-se em quantidade e aumentando
sua qualidade), a multiplicidade de atividades econômicas desenvolvidas de maneira
informal e voluntária, e o desenvolvimento de serviços.
Entretanto, na atualidade, para os designers de moda e para as empresas do vestuário,
são nos processos e nos materiais que envolvem a fabricação do produto é que
aparecem as mudanças ou inovações. Ou seja, no grau de influência sobre o ciclo de
vida dos produtos em todas as suas fases. Mas a sustentabilidade traz para a moda um
modo diferente de pensar o mundo, e se baseia em novos padrões e em equilíbrios a
serem alcançados. Ela requer dos designers uma fusão de experiências adquiridas e um
amplo conhecimento do sistema moda.
Segundo Fletcher e Grose (2010), é necessário se conhecer o que já foi feito para
desenvolver novas propostas e orientar cenários sustentáveis, e gerar uma simbiose
criativa e científica. Além disso, é preciso pensar em ações mais colaborativas e criar
novas formas de confeccionar roupas. Porém, num período de transição, os aspectos
físicos são ainda moldados pelos limites dos recursos naturais e energéticos, mas
significam uma oportunidade de exercício para criatividade. Abaixo serão citados alguns
aspectos importantes descritos por Manzini e Vezzoli (2011) e outros envolvidos no
projeto de design de moda e considerados por Kate Fletcher e Lynda Grose (2010):
1) pensar em processos produtivos e produtos configurados para o descarte;
2) adequar estruturas de produção já existente. Priorizar a reutilização de
recursos naturais;
3) a substituição dos atuais fontes de fibras têxteis por tecidos fabricados em
100% de pureza. Ex: 100% algodão orgânico ou 100% de poliéster, para
facilitar a reciclagem ou a compostagem;
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
10
4) diminuição de produtos químicos nas fibras têxteis e dos processos
industriais. Substituição dos produtos atuais por outros menos
impactantes;
5) inovação tecnológica na criação de fibras com qualidades sustentáveis em
termos de produção e processos, já vistas, mas hoje chamadas de "inteligentes". Ou seja, com funções específicas que reduzam a demandas
de lavagens e passadoria;
6) estímulo a modelagens com máxima simplificação (menos partes ou costuras) ou baseados no "Zero Waste", ou seja, na redução zero de
resíduos. Modelagens negativas ou Moulage;
7) reduzir o número de costuras, linhas e acessórios: evitar junções com
materiais incompatíveis, botões, colchetes, zíperes, velcros, etc;
8) criar peças modulares ou com multi-funções para prolongar seu tempo de
vida (maior qualidade dos produtos);
9) estimular a criatividade e a estética individual e coletiva;
10) estimular fluxos de serviços que promovam relações prolongadas e de
participação entre atores sociais (aluguel de bolsas, sapatos, lenços,
bijuterias ou materiais esportivos, Co-design; participação na criação e
confecção de artefatos de moda;
11) produtos que promovam maior interatividade emocional com usuários e
expectadores (eventos de troca, customização, artefatos personalizados
sob medida);
12) processos que promovam economia de recursos e tenham capacidade de
restaurar contextos de vida (processos que envolvam a inclusão social).
Dinâmica inovadora: A Natureza
Estruturas inovadoras, que tragam benefícios ao ser humano e suas necessidades,
podem surgir de novos desenhos sociais de cenários sustentáveis. Esses modelos
indicam uma abordagem mais holística, semelhantes aos sistemas naturais biológicos,
como propõe Kazazian (2005). O autor descreve o exemplo da natureza como um
sistema de diversidade complexa, mas com soluções simples. Isto porque a dinâmica do
sistema natural está presente em todas as escalas (micro e macro), o que fortaleceria a
ligação entre os elementos. Cada sistema existe pela soma de suas relações, pois cada
um beneficia o todo; é a propriedade da interdependência, e existe um tempo necessário
para estas relações durem e se transformem infinitamente, e se reorganizem em ciclos.
Esses ciclos recebem e doam energia em fenômenos auto-reguladores, promovendo o
equilíbrio sistêmico. Dessa interdependência, forma-se uma dinâmica baseada na
solidariedade associativa e colaborativa, cujo sucesso do conjunto, se encontra
potencialmente em cada indivíduo (KAZAZIAN, 2005). Essa abordagem teórica baseada
no equilíbrio cíclico e interdependente da natureza também é encontrada nas filosofias
com base naturalista do Mundo Oriental, em especial na China, há séculos. A mais antiga
do Yin-Yang está contida no Livro das Mutações, datados por volta de 700 a.C. Ela
determina que o equilíbrio é alcançado na natureza através do movimento e da troca de
energias de elementos opostos que são interdependentes entre si, pois um não existiria
sem o outro. Outra filosofia que se baseia na natureza é a dos cinco elementos. Essa foi
criada na Escola Naturalista, por volta dos séculos 350 a.C. Os cinco elementos foram
estudados a partir da observação da natureza e são encontrados em tudo o que existe.
Assim a interpretação das cinco características ou energias é simbólica, mas o respeito
por sua dinâmica é fundamental. Ela está baseada na coexistência harmônica de
elementos complexos e diferentes, mas que são interdependentes entre si, pois um não
pode ser mais forte que outro, pois é assim que sustentam o equilíbrio vital do conjunto.
Isto significa que cada elemento é importante para o todo, pois qualquer variação de
um, compromete a integridade do outro. Mas, o mais relevante nestas filosofias, é sua
aplicação para além da natureza; na própria vida humana; pois considera o homem
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
11
como parte integrante e pertencente à natureza e não distinta a ela. Uma comprovação
disto é a adoção dessa filosofia como base prática para sua medicina tradicional
(MACIOCIA, 1989).
Portanto, encontramos semelhanças significativas, nesses modelos com referências em
sistemas naturais: O caráter holístico do sistema, a interdependência, a
complementaridade, a dinâmica, a mutação, a auto regulação, o equilíbrio sistêmico, o
caráter cíclico, onde a unidade é tão importante quanto o todo. Soluções simples para
diversidades complexas, flexibilidade, solidariedade associativa e colaborativa.
Inovações em escala menores
Kate Fletcher e Lynda Grose (2010) entendem que as oportunidades de inovação
fundamentam-se em um conjunto de práticas diferentes, onde valores e relações
econômicas devem ser revistas para visões mais ecológicas, isto é, inspiradas na
natureza. Isso envolveria um trabalho mais lento, mais complexo e mais estratégico,
diferentes das encontradas nas produções em larga escala e de distribuição globalizada.
Sistemas globalizados manteriam a incapacidade de entender os impactos ecológicos e
sociais. Ao passo que, sistemas feitos em uma escala menor, mudariam também as
relações entre os materiais, pessoas, lugares, comunidades e meio ambiente. Além
disso, esta solução é mais ágil e adaptável para atuação experimental dos designers,
contribuindo no conjunto para mudanças culturais. Essa opinião também é
compartilhada por Thierry Kazazian (2005), que destaca a importância da criação de
unidades de tempo, lugar, espaço, e de ações em uma escala microeconômica como a
melhor alternativa para solucionar questões complexas e permitir intervenções
eficientes. Assim, segundo os autores, isso fortaleceria a economia local junto com a
diversidade cultural e estética, ampliando a sustentabilidade para além do produto, para
o campo social e cultural no envolvimento de empresas, design de moda e usuários
cidadãos.
Casos Inovadores de inspiração criativa
Lilyan Berlim (2012) observa que a moda é considerada um dos mais poderosos meios
de comunicação, e selecionou um trabalho criativo e relevante que promove uma
reflexão sobre o desenvolvimento sustentável através da moda, é o caso de Ronaldo
Fraga. A autora também descreve alguns exemplos sustentáveis expressivos de ações da
sociedade civil e parcerias, iniciativas empresariais e modelos de negócios alternativas
ou híbridas como: O caso da Contextura e a Coopa-Roca. Um exemplo significativo é
observado no Projeto Asas7 de Belo Horizonte. Esse projeto teve início como uma
atividade acadêmica e se expandiu para uma rede produtiva, englobando parcerias com
a iniciativa privada. Atualmente fortalece seus empreendimentos através da capacitação
multidisciplinar no aperfeiçoamento de produtos de design e focam ações coletivas,
estimulando-se a participação e a consciência social; garantindo dessa forma a cidadania
da comunidade do Aglomerado da Serra.
Asas
O projeto Asas é uma atividade de extensão da Universidade FUMEC (Fundação Mineira
de Educação e Cultura) iniciada em 2007, e tornou-se uma atividade acadêmica
integrada que agrega propostas no âmbito do ensino, pesquisa e extensão. Iniciou-se
como um projeto isolado de capacitação em artesanato e design, e atualmente tornou-se
uma rede produtiva que consistem em: Asas aglomeradas (Estamparia, oficinas de
7 Artesanato Solidário no Aglomerado da Serra. Disponível em: http://projetoasas.org/blog/
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
12
costura, bordado, e artigos para decoração e bolsas); Asas Moda Laje (núcleo de costura
e de modelagem experimental); Asas Bambu (transforma o material em acessórios de
moda e decoração); Asas psicologia (parceria com os cursos de psicologia e
administração); Asas Tecnologia Social (Projetos de capacitação em artesanato e
design). Esses projetos buscam elaborar processos produtivos complementares, visando
constituir e fortalecer uma rede produtiva no Aglomerado da Serra. A capacitação é
multidisciplinar e é elaborada com o intuito de gerar renda por meio do desenvolvimento
de produtos com alto valor agregado, que incorporem aspectos do design
contemporâneo com o artesanato urbano. Todas as ações do Asas são focados no
empoderamento (significa ação coletiva desenvolvida por indivíduos quando participam
de decisões, consciência social dos direitos sociais). Obtendo-se assim, a aquisição de
emancipação individual, consciência coletiva para superação de dependência social e
dominação política, poder e dignidade, liberdade de decidir e controlar seu destino com
responsabilidade e respeito ao outro (Cidadania). Possuem o desenvolvimento técnico e
criativo e estabelece processos colaborativos e coletivos tanto de produção quanto de
auto-gestão, para se ter uma tecnologia social replicável. Os Atuais parceiros do Asas
são: Programa Fica Vivo; ACES; Aglomeradas; BH Cidadania; Escola Municipal Padre
Guilherme Peters; Loja Grampo; Meninas do Cafezal; Quina Galeria; Serra Bambu;
Unisol; Santander; Raiz da Terra; Task; Professores da FUMEC.
Outro exemplo foi o Projeto Núcleo Design do Bem iniciado em 2010. Este projeto se
desenvolveu na Terceira Turma de Pós-Graduação de Design de Moda e Sustentabilidade
dos Institutos Superiores La Salle e tem como objetivo uma proposta criativa e
participativa que visa ampliar a atuação do design de moda na área sustentável. Ele tem
como princípios a ética, a coletividade e a solidariedade, e oferece consultorias a
terceiros em vários segmentos sociais O Núcleo possui um laboratório de pesquisas
acadêmicas e possui um embrionário atelier social que está em fase de implementação.
Núcleo Design do Bem
O projeto do Núcleo tem como objetivo criar plataformas de pesquisa e de extensão
adequando ideias criativas, fortalecendo serviços, processos inovadores, parcerias e
experiências. Entre suas atividades estão o desenvolvimento de coleções, a sugestão de
materiais e de processos de ecodesign. Recentemente, o Núcleo Design do Bem prestou
consultoria a um ranário localizado na região de Japerí (RJ) cuja atividade gerava grande
número de peles de rã residuais, o que causava um grave problema para o meio
ambiente. Num primeiro momento, foram feitas pesquisas prévias, estudos de campo e
análises preliminares, determinando-se dificuldades, potencialidades e oportunidades
encontradas na criação das rãs. Então, foi analisado o material descartado e todos os
elementos envolvidos no processo produtivo, como também foram consideradas as
expectativas das pessoas envolvidas na localidade. A escolha por um beneficiamento
ecológico e a elaboração de uma espécie de patchwork de peles foi significativa como um
diferencial sustentável e determinante para formar uma manta adequada para o design
de artefatos e bolsas. Assim, foram criados modelos de carteiras e bolsas e
desenvolvidos os respectivos protótipos. Por conseqüência, mudou-se o destino das
peles, transformando-as em artefatos de design contemporâneos que fossem
potencialmente aceitos no mercado. Como também, foi sugerida a parceria com a ONG
vinculada ao ranário para trazer benefício à mão de obra local e a integração de atores
sociais. Desta maneira, encontrou-se uma solução sistêmica através do design,
integrando princípios de preservação dos contextos econômico, ambiental, social e
ambiental.
7. Princípios éticos para integração social
O envolvimento de pessoas engajadas com os mesmos objetivos de bem estar e de
qualidade de vida serviriam para unir interesses comuns e permitiriam reger melhores
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
13
convívios. No entanto, é preciso integrar as pessoas num elo de princípios éticos e
estabelecer o respeito ao direito individual e comunitário na intenção de uma sociedade
sustentável e justa. A ética serviria como abrigo protetor para os seres humanos,
fazendo o homem a pensar, a refletir sobre si mesmo e sobre o mundo (PASSOS, 2004).
Ela constituiria as bases da responsabilidade social e serviriam a todos que reconheçam
que tem responsabilidade pelo desenvolvimento sustentável. Mas precisamos estar
conscientes de que as expectativas pessoais variam num momento específico, pois essas
são passíveis a mudanças (INMETRO, 2010). A ética estaria no consumidor consciente,
que considera o bem estar coletivo, a preservação dos recursos naturais e na
remuneração justa dos trabalhadores. Também estaria no destino do dinheiro gasto e
em atividades que são coerentes com os seus valores. E mais, nas relações comerciais e
no comércio justo, que visa transações financeiras baseadas no respeito pelo outro, e de
uma postura de igualdade entre os diferentes atores sociais (FAJARDO, 2010). Enfim, a
ética estaria na cidadania, que busca o bem comum, a participação e a interação dos
grupos sociais, superando as individualidades e fazendo com que as pessoas se sintam
integradas em uma comunidade (REIS, 1998). Portanto, essa cidadania representaria
um referencial de conquista para a humanidade e para as pessoas que buscam os seus
direitos, uma maior liberdade, melhores garantias individuais e coletivas, e que não se
conformam frente às dominações, seja do próprio Estado ou de outras instituições
(AMORIM, 2007).
Em especial, no campo do design, as novas perspectivas da Sustentabilidade direcionam
o design para aderir considerações éticas formadas pelo Internacional Council of Socity
in Industrial Design8 (ICSID) de 2005. Essas considerações éticas indicam o design a
procurar identificar e avaliar relações estruturais, culturais, organizacionais, funcionais,
expressivas e econômicas visando:
-ampliar a sustentabilidade global e a proteção ambiental: ética global
ambiental;
-fornecer benefícios e liberdade a toda à humanidade, aos grupos e aos
indivíduos: equidade;
-fomentar a participação ativa de usuários finais e de produtores, tornando-
os protagonistas do processo de geração de valor: ética social;
-apoiar a diversidade cultural, mesmo com o processo de globalização: ética
cultural;
-dar aos produtos, serviços e sistemas, formas que expressem (semiologia) e
sejam coerentes com (estética) a sua própria complexidade.
8. Amplitude social da moda
Para transformar modos de vida e estimular novos comportamentos sociais, seria
importante entender a dinâmica da Moda, a sua função cultural para a identidade
individual e social e de sua amplitude nas sociedades contemporâneas. Também é
preciso conhecer os padrões culturais estabelecidos e de possibilidades de mudanças em
relação ao bem estar e qualidade de vida. Assim, serão abordados os aspectos da
origem da Moda e de sua relação com as sociedades capitalistas democráticas
individualistas e de teorias sobre a evolução do comportamento humano em relação ao
consumo.
8 Internacional Council of Socity in Industrial Design (ICSID) de 2005. Disponível em:
http://www.icsid.org/about/about/articles31.htm
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
14
As origens da Moda podem ser encontradas no período histórico Medieval, mas
firmaram-se socialmente no Renascimento em decorrência de um cenário de estabilidade
social e econômico gerados pela redução de constantes invasões e de guerras na
Europa. Esta estabilidade favoreceu o crescimento da vida urbana, as trocas comerciais
e as integrações culturais, tornando-se um ambiente próspero. Isso permitiu a evolução
das tecnologias, da ciência e do artesanato, promovendo transformações sociais
significativas. As transgressões culturais modificaram a lógica particular do vestir das
pessoas. Neste período surgiu o vestuário diferenciado segundo o sexo, rompendo com
as tradições e favorecendo o presente e a individualidade humana. Na intenção de
emergir socialmente, a classe burguesa em disputa com a aristocracia feudal tornou a
vestimenta a base material para indicar seu status social, e assim, a moda alcançou
grande evidência (SVENDESEN, 2010)
Inovações científicas e tecnológicas, a produção de massa e novos modos de
organização do trabalho, alteraram as condições de vida da sociedade, originando a
Revolução Industrial. A transformação de uma sociedade anteriormente produtiva para
uma consumista produziu mudanças sociais significativas encorajando a revolução de
hábitos, gostos e de preferências. O desejo por itens novos simbolicamente poderosos
tornou-se um mecanismo auto-estimulador de diferenciação social, promovendo-se a
minimização de valores tradicionais e a fragmentação da cultura no mundo. A Moda
dissipou-se por diversos grupos e pessoas, consolidando-se nas sociedades modernas e
formando as chamadas Sociedades do Consumo.
Lipovetsky (1989) diz que a Moda é uma forma específica de mudança social,
independente de qualquer objeto particular, ou seja, é um mecanismo social geral sem
se relacionar apenas ao vestuário. Segundo Svendsen (2010) é difícil conceber algum
fenômeno social que não seja influenciado por mudanças na moda, quer ela seja na
forma do corpo, o design de automóveis, na política ou na arte.
Para o filósofo e sociólogo, Georg Simmel no seu livro Filosofia da Moda (1904), a Moda
carregaria sua própria morte dentro de si e sua difusão foi criada no topo da sociedade
para então depois serem disseminadas para estratos sociais inferiores. Não apenas
assinalou a diferenciação de classes, mas atribuiu vínculos entre moda e identidade; as roupas seriam parte vital para a "construção do eu". A identidade não seria apenas
fornecida pela tradição, mas algo que temos que escolher através do consumo (SIMMEL
apud SVENDSEN, 2010). O resultado seria uma tensão paradoxal entre o desejo de
imitarmos os outros e o desejo de nos distinguir. É a teoria do Trickle-down, ou seja, o
princípio da caça e fuga. Isso formaria uma dinâmica social, e a imitação proporcionaria
ao indivíduo a segurança de não estar sozinho em suas ações (MEZABARBA, 2010).
Assim, a Moda equilibraria necessidades e inclinações humanas opostas, como a
individualidade, semelhança, pertencimento, liberdade e independência.
Semelhante abordagem é encontrada nos estudos de Thorstein Veblen (1974). O autor
desenvolveu a teoria da classe Ociosa em que o indivíduo se diferencia das classes
sociais mais baixas através do consumo de objetos posicionais e do ócio, o chamado
Consumo Conspícuo. Nessa teoria, a exibição perante o outro é fundamental, pois
comunicaria e expressaria o status social. O ócio garantiria a posição honorífica e a
satisfação de necessidades físicas e espirituais, e seriam assumidas pelo consumo de
bens imateriais: talentos, habilidades, conhecimentos e capacidades. Assim, as pessoas
de classe social elevada seriam estimuladas há gastar seu tempo com o supérfluo, ou
seja, com atividades não produtivas. De acordo com o autor, neste período, a sociedade
industrial gerou um estágio pecuniário, onde o acúmulo de riquezas eram sinais de
prestígio e de emulação (competição, inveja ou rivalidade) (VEBLEN apud
CHELUCHIANCHK, A., CAVICHILLI, F., 2010).
Outro estudo importante foi o de Pierre Bourdieu que na sua publicação A distinção
(1979) analisa a sociedade de consumo com uma ênfase mais cultural; fala sobre o
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
15
habitus (sistema de disposição adquirida pela aprendizagem implícita ou explícita – agir,
pensar, sentir) formador do gosto. Esse gosto revelaria sinais complexos e qualificados
socialmente indicando que o estilo de vida seria gerado por um consumo simbólico e
cultural e funcionaria como estratégias de diferenciação usada pelas classes mais altas
em relação às mais baixas. Isso seria determinado pelas limitações materiais que
indicariam as escolhas estéticas (BOURDIEU apud MEZABARBA, 2010). Pierre Bourdieu
(1979) também fala sobre o que é entendido por apropriação de objeto de qualidade. O
autor observa que a classificação de qualidade é determinada pelo campo social, o qual
não é necessário ter razões para preferir uma coisa à outra numa sociedade de
consumo. As pessoas comprariam diferenças na forma de valores simbólicos. Portanto, é
este valor simbólico que substituiria o valor de utilidade e seria vital para a formação da
identidade pessoal e da auto realização social (BOURDIEU apud SVENDESEN, 2010).
Para Colin Campbell (CAMPBELL; COLIN; apud SVENDSEN, 2010) o homem seria um
hedonista moderno, romântico e que vive no imaginário, especialmente controlado pelo
prazer, o que revelaria que a lógica cultural da modernidade não é somente a
racionalidade instrumental, mas também a paixão e o desejo. Lipovetsky (1989) diz que
o consumo seria motivado por um desejo de experimentar bem-estar e prazer. Isto é, do
prazer de mudar constantemente; do disfarce e da metamorfose, e não determinada
pela ostentação.
Embora a distinção social seja uma das funções sociais da moda, esta não explicaria a
amplitude de sua dinâmica. Foi pela lógica e pela dignificação do Novo que a moda se
afirmou e se espalhou socialmente.
Os principais promotores de sua dinâmica são: a efemeridade e a obsolescência;
princípio o qual se cria numa velocidade cada vez maior e torna um objeto supérfluo o
mais rapidamente possível, para que um novo tenha uma chance. A moda seria uma
forma específica de mudança e de mecanismo social caracterizado por um intervalo de
tempo breve, permitindo afetar esferas muito diversas da vida coletiva. Na história
mundial o desenvolvimento e o fortalecimento da Moda significaram a redução de força
dos valores tradicionais, direcionando as sociedades do Ocidente, para as qualidades
modernas. A moda tornou-se agente e promotora da consolidação das sociedades
capitalista democrática individualista (LIPOVETSKY, 1989).
(...) "foram os valores e as significações
culturais modernas, dignificando em particular
o Novo e a expressão da individualidade
humana, que tornaram possíveis o nascimento e o estabelecimento do sistema Moda"
(LYPOVETSkY, 1989, p.11)
De acordo com Felipe Rocha, a moda é entendida como um pólo de manifestação
efêmera, quando as peças de vestuário fazem parte de um quadro de funcionalidade
material e provida dos modos de produção capitalista das Sociedades Modernas.
Entretanto, quando ela é encarada como manifestação estética e visual, ela traz a
história civilizacional do homem, e torna-se elemento de um sistema lingüístico cultural
(ROCHA, 2007).
Bauman (2008) diz que o modo de vida produzido pela sociedade moderna após o
período da Segunda Guerra até a década de sessenta, foi construído a partir das
orientações determinadas por desejos de aquisição de bens duráveis e com grande
visibilidade social; seriam as do tipo tradicionais de padrões, simbolizando estabilidade e
segurança, remetendo-se status de posse, poder e conforto, principalmente de respeito
pessoal. Neste período as pessoas consumiam mercadorias pesadas e duráveis, como
imóveis e jóias. Possuir uma grande quantidade de bens duráveis trazia segurança
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
16
contra as incertezas do destino. Nada era imediato. A prudência, a segurança e a
durabilidade eram a maior posse e prazer da chamada sociedade dos produtores.
Assim, gradativamente, mudanças sociais para uma sociedade contemporânea
transformou os ambientes existenciais em uma reconstrução das relações humanas em
relação aos objetos de consumo. O novo indivíduo descobriu o prazer de consumir,
deslocando-o para o imediato. As obrigações dos indivíduos passaram a ser sociais e a
de proteger sua autoestima. É a partir daí que começou a se consumir objetos sem
sentidos e não para suas necessidades básicas. O mercado induziu ao excesso de
mercadorias e ao anseio de cultivar os desejos. A passagem para uma sociedade
consumidora apresentou-se de maneira gradual; com a emancipação individual e de sua
limitada capacidade de escolha, para uma aquisição de liberdade de escolha e decisão
diante de suas necessidades, até a evolução no prazer de consumir. Dessa forma, a
durabilidade de mercadorias foi descartada por esta nova sociedade, não existindo mais
lealdade aos objetos consumidos. (BAUMAN, 2008)
Na interpretação de Lilyan Berlim (2012) com o surgimento da moda, obteve-se a
conotação de busca de identidade, e que as atuais teorias socioculturais definem a moda
como a construção cultural da identidade. O vestir geraria um sistema que possibilita a
experiências estéticas subjetivas, vinculando os significados de beleza, tristeza, alegria,
simplicidade, sofisticação, pobreza, tradicionalismo, vanguardismo, comprometimento
político e muitos outros (BARTHES, ROLAND apud BERLIM, 2012). Assim, a moda
tornou-se mais personalizada, com mais diversidade estilística e um meio de
comunicação e expressão da identidade social. Ou seja, ela passa a proporcionar ao
indivíduo um meio de construção da personalidade e estilo de vida pessoal. Segundo Sue
Jenkyn Jones (2005), o ato de vestir e a moda promoveriam ao indivíduo algumas
funções como: Utilidade, Moralidade, Auto-aprimoramento psicológico, Ornamentação,
Diferenciação simbólica e Filiação Social. Para Santaella (2004) a socialização dos corpos
dos indivíduos se dá pelas roupas e é no jogo das aparências que o ser social manifesta
o seu eu em relação ao seu meio ambiente (SANTAELLA apud ROCHA, 2007).
A socióloga Fátima Portilho (2005) diz que na atualidade, o papel do consumidor tem se
modificado e estaria mais ativo e tendendo para reinterpretações. Este consumidor daria
outro uso aos produtos, ideias e as mensagens que receberia. A aquisição de carros,
roupas, marcas, sapatos, mostrariam a posição ocupada na hierarquia social,
comunicaria bens e objetos, representando a materialização de valores e da visão da
relação entre humanos e da natureza. O ato de consumir diria quem sou e também
quem não sou, indicaria também minha rejeição. Os diversos tipos de estilos de vida
existentes seriam expressões de escolhas humanas manifestadas por intermédio de
objetos e códigos da cultura material. O consumo seria usado por nossa sociedade
também como um meio de ação política. (PORTILHO, F.; apud FARJADO, 2010)
A abrangência social da moda influencia e é influenciada pela arte, por expressões
artísticas (música, pintura, fotografia, escultura, literatura e cinema): sinaliza e é
sinalizada por tendências ideológicas. Aparece como forma de comunicação individual ou
institucional, estando relacionada a comportamentos psicológicos humanos (ações,
interações, ideais, pensamentos, valores, motivações e sonhos), e é um campo social
que denuncia rapidamente as transformações que irão surgir. Afirmando ou
enfraquecendo, unindo ou diferenciando indivíduos e contextos sociais. Atualmente
tornou-se uma significativa ferramenta de poder e de manipulação para satisfação
pessoal e social. (SVENDESEN, 2010)
Para Lilyan Berlim (2009), a moda também é um negócio, e a influência econômica da
moda é bastante abrangente, além dos aspectos psicológicos, artísticos, históricos temos
as áreas da agricultura de algodão; a indústria têxtil, químicas e mecânicas e empresas
de comunicação. Trata-se desde os agricultores, no plantio de algodão às diversas
funções de trabalhadores que estão envolvidos na indústria têxtil e da própria indústria
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
17
de confecção. Como também, está presente em diversas disciplinas, como: engenharia,
design, química, administração e comunicação. A autora complementa que a moda
também é um conceito multifacetado e envolve algumas áreas que estudam e
pesquisam o fenômeno, como: na Filosofia, Sociologia, Antropologia, Economia e
Psicologia. (BERLIM, 2009)
Como indústria criativa, a indústria do vestuário representa cerca de 6% do consumo
mundial, gerando cerca de 1,4 trilhões de euros em 2008. Diferença esta considerável
em comparação com a indústria automobilística de 4% do consumo mundial (GODART,
FRÉDÉRIC, 2010).
No Brasil, conforme os dados atualizados pela ABIT para o ano de 2011, o faturamento
da cadeia têxtil e de confecção brasileira é estimada em US 2,5 bilhões. O setor é o
segundo maior empregador da indústria de transformação, compreendendo mais de 30
mil empresas, gerando anualmente 1,7 milhões de empregos diretos, e gerando uma
renda indireta para oito milhões de trabalhadores, sendo 75% desta mão de obra é
feminina (BERLIM, 2012).
Na opinião de GODART (2010), a disseminação da Moda cresceu democraticamente
através dos tempos, deixando de pertencer a seletos grupos. Atinge várias idades e a
ambos os sexos, apesar das mulheres terem maior obsessão pelo assunto. Invadiu os
limites de outras áreas de consumo para além das roupas. Reside em praticamente
quase tudo o que se refere ao nosso mundo moderno, e estabelece um bom caminho
para entendermos a nós mesmos e a nossa história. A moda encontrou dificuldades em
pesquisas científicas, devido ao seu caráter mutável e por sua própria definição; parte é
encontrada na indústria do vestuário, acessórios e de cosméticos e no consumo social
formador de identidades. Também é caracterizada por ser uma atividade econômica ao
mesmo tempo artística, estética e criativa, e pertencente a uma indústria cultural e de
um processo de produção, além da primazia de representar o lazer no processo de
consumo.
9. Padrões culturais contemporâneos: O Novo e a Juventude.
Na visão de Felipe Rocha (2007), após o advento da revolução industrial, as sociedades
modernas tornaram-se mecanizadas, gerando questões relacionadas à mobilidade, a
velocidade e ao novo, e a obrigação do homem atual de ser jovem. A grande produção
em massa converteu a sociedade para uma cultura instantânea, direcionando as pessoas
para ideais baseados no progresso e para o inacabado: a juventude. Essa juventude
significaria uma "atitude" perante a vida e existiria num estado permanente, em vez de
representar apenas um estado de transição. O complexo midiático constantemente
fortalece estes valores juvenis através dos espetáculos sedutores, transformando a
sociedade, em uma sociedade do visual e da imagem. Esse espetáculo criaria uma
rigidez tal, que o homem comum não conseguiria se abrir e nem ter uma receptividade
para um diálogo autêntico. A moda afirmou o valor da imagem e tornou-se agente de
uma luta social incansável pelo desejo de permanência na juventude. Que embora tenha
promovido um tipo de qualidade de vida e de bem estar na expansão de setores
econômicos especializados na aparência e na saúde, geraram uma ansiedade coletiva
por este ideal de consumo. Mais que um aspecto social, a juventude traduz um ideal
consumista do "parecer" em que a religiosidade foi substituída pelo culto da imagem e a
qual a aparência visual é sacralizada e imperativa. (ROCHA, 2007)
Segundo a psicóloga Pascale Navarri no seu livro Moda & Inconsciente-olhar de uma
psicanalista (2010), a Moda reflete os padrões estéticos de uma época que elege e
condena, conforta e perturba. A autora fala sobre o narcisismo, da necessidade de
imitação e da rivalidade, e das várias formas das pessoas se relacionarem com o corpo.
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
18
Ela revela alguns exemplos de casos em que há uma ilusão de uma permanência na
juventude; onde crianças adultas tentam continuar em um estado infantil anterior o da
puberdade. Esta criança interior insistiria em conservar um corpo filiforme, desejosa de
ser a estrela das atenções e dos olhares. Outro comportamento observado pela autora
seria do desejo de tatuar-se que representa o único projeto possível de morrer com a
aparência da juventude. Isto seria um exemplo de dominação sobre o corpo, numa
tentativa de estabelecer o presente e o eterno sobre os seres efêmeros que somos. Além
disso, a autora destaca o caso da modelo anoréxica; cuja mulher o corpo permaneceu
como era quando estava na adolescência, ou seja, um corpo de menino com seios; e
mais, sobre o jogo da androgenia, como a supressão obrigatória das características
distintivas femininas por neutralização do feminino. Indicando o horror à feminilidade.
Uma visão antifisiológica e uma resposta do complexo de castração, segundo as análises
conceituais de Freud. Em todos os casos, há uma grande supressão da passagem do
tempo e das diferenças fundamentais que compõem a vida humana. (NAVARRI, 2010)
"Na sociedade moderna, a mulher-objeto eclode
como símbolo de independência mal dosada. –
cristaliza ainda mais o domínio masculino, num
jogo desigual. (...) a mulher assume posturas
tradicionais masculinas, sem ter que deixar de
ser mulher, mãe e essencialmente feminina. As
várias mídias da sociedade moderna fazem da
mulher um ser SURREAL, plasticamente
perfeito, coloca na mira dos anseios femininos a
profissão perfeita, a família imaculada e a
realização pessoal no corpo modelo. Na moda; a mulher é fonte, alvo, modelo e rival".
(ROCHA, 2007, p. 59)
Portanto, para que as pessoas tenham uma comunicação visual autêntica e para que a
moda adquira um perfil democrático, é preciso que a moda seja antes analisada e
mentalmente processada para então serem posteriormente disseminados e expressados
os valores e as identidades particulares.
Nesta perspectiva, seria benéfico socialmente e culturalmente se a moda conseguisse
penetrar na vida das pessoas de maneira a emancipá-las esteticamente e desatrelá-las
das imposições visuais que são apresentadas na sociedade. De fato isso não acontece, a
moda obedece a um sistema de poder no qual se apresenta como uma manifestação
estética repleta de expressões, porém obediente a sua própria lei, o que impede a
expressão do indivíduo, que sem uma racionalidade estética, perde a oportunidade de
resgatar a liberdade plena de expressão. (BRAUDILLARD apud ROCHA, 2007)
Na opinião de Lingenbach (2008) a solução poderia vir da questão social para
desconstruir essa sociedade do espetáculo e trazer o valor da cultura popular, de uma
cultura diferenciada, baseada no cotidiano e na experiência da vida.
10. Conclusão
A sustentabilidade postula o desenvolvimento em todas as esferas sociais. Mas, o tipo de
desenvolvimento abordado neste trabalho foi o do tipo que beneficia o ser humano e que
oferece oportunidades sociais apropriadas para que as pessoas tenham sua autonomia.
Embora o senso comum costume a relacionar desenvolvimento humano com o valor do
PIB de uma determinada população, aqui foram consideradas teorias que sugerem um
desenvolvimento econômico diferente do convencional, como nos estudos de Amartya
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
19
Sem (1999), Max-Neef (1998) e Ezio Manzini (2008). Entretanto, serão necessários
outros estudos experimentais fundamentados nestas teorias para maiores investigações
taxonômicas e para o entendimento das "lógicas socioculturais" em razão da diversidade
e da inter-relação de aspectos envolvidos, como a subjetividade individual, fatores
psicológicos e as características locais.
Segundo pesquisas realizadas pelo WBCSD (1995) sobre os limites das ações humanas,
o metabolismo da sociedade deverá viver bem utilizando 10% dos recursos consumidos
hoje em uma sociedade industrializada. Isso significa dizer que a redução dos níveis de
produção e consumo material deve ser compensada pela valorização de processos,
atividades e serviços que estimulem aspectos humanos mais imateriais e assim possam
modificar os padrões de vida já estabelecidos. Isso se torna possível quando temos um
sistema cultural em que a sua base é o bem estar e qualidade de vida, e onde produtos
e serviços regenerem a vida das pessoas e das vidas futuras do planeta. Isto é, quando
se tem um sistema cultural onde os valores estejam voltados para a restauração de contextos sociais. É uma mudança de perspectiva do interesse pelas "coisas" para
"experiências" nas atividades realizadas. Mas, o que se pretende é que as pessoas
possam exercer suas capacidades e talentos, e que elas possam escolher e levar a vida
que desejam.
As Soluções criativas dão origem as Inovações Sociais, mas elas também podem surgir
de processos ou no ciclo de vida de produtos. As Inovações Sociais resolvem desafios
sociais e representam novas formas de vida cotidiana. Elas podem ser criadas por meio
de novas estratégias, como novas formas de relações sociais ou de serviços, ou ainda
baseadas em dinâmicas de sistemas naturais. Mas, é preciso integrar e conectar
sistemas humanos com os sistemas naturais de modo a sensibilizar a sociedade a
conhecer melhor a natureza. E assim, unir novas ideias a limitações impostas às práticas
humanas e obter o conhecimento empírico. Entretanto, é importante considerar as
visões de Fletcher (2010), Kazazian (2005) e Manzini (2008) que sugerem que soluções
devem ocorrer em menor escala para melhor entender os impactos ecológicos e sociais.
O design de moda como questão central se deve ao grande potencial desse campo para
tornar-se uma eficaz ferramenta sustentável, e disseminar rapidamente novos critérios e
valores e modos diferentes de pensar sobre o mundo. Nessa perspectiva, significa
introduzir idéias no plano cultural que possam alterar concepções de 'Estilo de vida'.
Pois, o design de moda é uma atividade criativa, transgressora e está na sua essência
relacionada a transformações sociais, comportamentos e Moda. Porém, é necessário
modificar o modo como se faz moda e transitar em contextos incomuns. Isso significa
que o designer de moda poderá ser um agente de mudanças, atuando na sociedade
como: comunicadores, educadores e pesquisadores, facilitadores, agentes, gestores,
ativistas ou empreendedores. Ele também poderá atuar no campo da pesquisa ou no
setor privado, no setor público ou no terceiro setor e em novas formas de atuação. Além
disso, é preciso compreender e questionar os mecanismos que alimentam a dinâmica da
Moda, a efemeridade e obsolescência, e sua função cultural para identidade individual e
social, como também avaliar sua abrangência nas sociedades contemporâneas. Visto que
é necessário entender os padrões culturais estabelecidos do Novo e da Juventude, e
fortalecer a diversidade de padrões existentes para transformar as perspectivas sociais.
Pessoas comprometidas com o bem-estar e a qualidade de vida serviriam para unir
interesses comuns. Contudo, na intenção de reger melhores convívios, é preciso integrar
pessoas num elo de princípios éticos e estabelecer o respeito ao direito individual e
comunitário, para que a sociedade seja mais justa e sustentável. Pois a ética considera o
bem estar coletivo e a preservação dos recursos naturais e assim constrói as bases da
responsabilidade social, do consumidor consciente e do comércio justo. Ela também está
na cidadania, que é um referencial de conquista da humanidade através daqueles que
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
20
sempre buscam os seus direitos, uma maior liberdade e melhores garantias individuais e
coletivas.
Diante dos assuntos abordados neste trabalho, é importante observar a necessidade da
introdução curricular de disciplinas do design sustentável nos cursos de design de moda
para ampliar, diversificar e inovar práticas para além do produto moda e considerar os
aspectos imateriais, como os sócio-culturais, o bem-estar e qualidade de vida. Como
também, estimular pesquisas e novas experiências que ampliem o convívio e a
solidariedade. Visto que é importante unir valores contemporâneos e simbólicos e
integrar a ética social aos parâmetros do desenvolvimento sustentável.
Referências
AMARTYA, Sen. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das letras,
1999.
AMORIM, Maria, S.S. Cidadania e participação democrática. Anais do II Seminário
Nacional. Movimentos Sociais, participação e democracia Florianópolis: (NPMS) Núcleo
de Pesquisa em Movimentos Sociais, UFSC, 2007.
BAUMAN, Zygmunt. Vida para consumo. Tradução de Carlos Alberto Medeiros. Rio de
Janeiro: Editora Jorge Zahar, 2008.199p
BERLIM, Lilyan. Moda, a possibilidade da leveza sustentável: tendências,
surgimento de mercados justos e criadores responsáveis. Dissertação (Mestrado em
Ciências Ambientais) – Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2009.
BERLIM, Lilyan. Moda e sustentabilidade: uma reflexão necessária; São Paulo:
Estação das Letras e Cores, 2012.
BRUNDTLAND, Gro Harlem (Org). Nosso futuro comum. Rio de Janeiro: Editora
Fundação Getúlio Vargas, 1991, Our Common Future. Oxford: Oxford University Press,
1987.
CHELUCIANHAK, A. B.; A busca da excitação: A natureza e o comportamento humano
quanto ao consumo do esporte e do lazer In:____simpósio Internacional Proceso
Civilizador, 11, 2008, Buenos Aires, p. 95-104.
FARJADO, Elias. Consumo consciente, comércio justo: conhecimento e cidadania
como fatores econômicos. Rio de Janeiro: Editora SENAC Nacional, 2010
FLETCHER, Kate; GROSE, L. Moda & Sustentabilidade: design para mudança;
tradução de Janaína Marco Antonio. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2011.
GIACOMONI, Cláudia, H. Bem estar subjetivo: em busca da qualidade de vida, Temas
em Psicologia da SBP/UFSM, Rio Grande do Sul, V.12, n.1, p. 43-50, 2004.
GODART, Frédéric. Sociologia da moda; tradução de Lea P. Zylberlicht.- São Paulo:
Editora SENAC São Paulo, 2010.
ILLICH, Ivan. A Convivencialidade. Trad. Arsênio Mota. Lisboa: Europa-América, 1976
JONES, Sue, J. Fashion Design: manual do estilista. São Paulo: editora COSAC NAIF,
2005.
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
21
KAZAZIAN, Thierry. Haverá a idade das coisas leves: design e desenvolvimento
sustentável. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2005.
LANGENBACH, Marcos, L. Além do apenas funcional: inovação social e design de
serviços na realidade brasileira – Rio de Janeiro: VII 123 p.29,7 (COOPPE/UFRJ), 2008
LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades
modernas. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 1989.
MACIOCIA, Giovani. Os fundamentos da medicina chinesa: um texto abrangente
para acumputuristas e fitoterapeutas. Tradução Luciana M.D. Faber. São Paulo: Editora
Roca, 1996.
MANZINI, Ezio. Design para Inovação Social e sustentabilidade: comunidades
criativas, organizações colaborativas e novas redes projetuais. [coordenação de tradução
Carla Cipolla; equipe Elisa Sapampinato, Aline Lys Silva]. Rio de Janeiro: E-papaers,
2008 (Cadernos do Grupo de Altos Estudos; v.1- Programa de Engenharia de Produção
da Coope/UFRJ)
MANZINI, Ezio; VEZZOLI, Carlo. Desenvolvimento de Produtos sustentáveis: Os
requisitos ambientais dos produtos industriais; tradução de Astrid Carvalho -1. Ed. 3.
Reimpr- São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2011.
MEZABARBA, Solange Riva. Antropologia do Consumo. Rio de Janeiro: SENAI Cetiqt -
EAD - SENAI/ CETIQT, 2010.
NAVARRI, Pascale. Moda & Inconsciente: olhar de uma psicanalista, tradução de Gian
Bruno Grosso. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2010.
PASSOS, Elizete. Ética nas Organizações. São Paulo: Editora Atlas Publicação, 2012
REIS, Elisa. Sobre a cidadania. In:___ Processos e escolhas estudos de sociologia
política. Rio de Janeiro: Contra Capa, 1998.
ROCHA, Felipe, S. Celebração midiática e cultura: o olhar ‘ilustrado’ de Folha de São
Paulo sobre a São Paulo Fashion Week. Universidade Metodista de São Paulo – Programa
de Pós Graduação em comunicação social. São Bernardo do Campo – São Paulo, 2007.
SANTOS, Boaventura Souza. Por uma concepção multicultural de direitos humanos.
In:___ Lua Nova. n.39, São Paulo: CEDEC,1997.
SIQUEIRA, Mirlene M. M; PADOVAN, Valquíria. A. R. Bases teóricas de bem estar
subjetivo, bem estar psicológico e bem estar no trabalho, Psicologia: teoria e
Pesquisa, Brasília, v.24, n.2p. 201-209, 2008.
SVENDSEN, Lars. Moda: uma filosofia; Tradução Maria Luiza X. de A. Borges - Rio de
Janeiro: Editora ZAHAR, 2010.
Web grafia Consultada
ABIT, 2012. Disponível em: < www.abit.org.br/>. Acesso em: 25 de junho de 2012
ASAS. Disponível em: < http://projetoasas.org/blog/>. Acesso em: 7 de maio de 2011
Iniciação – Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística – Vol. 4 n°2 – Maio de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
22
INMETRO. Disponível em:
<http://www.inmetro.gov.br/qualidade/responsabilidade_social/iso26000.asp>. Acesso
em: 15 de setembro de 2012
ICSID. Disponível em: <http://www.icsid.org/about/about/articles31.htm> Acesso em:
10 de outrubro de 2012
CSI. Disponível em :< http://socialinnovation.ca/about/social-innovation> Acesso em:
24 de setembro de 2012
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática em Sustentabilidade Vol. 4 no 2 – Agosto de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179-474 X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
Estudo comparativo do consumo de frutas em uma população de idosos: período atual e infância
Comparative study of consumption of fruits in elderly population: current period against childhood.
Márcia Ribeiro Quadros1, Silvania Braga de Santana Barreto1, Irene Coutinho de Macedo2
1- Estudante do curso de Bacharelado em Nutrição do Centro Universitário Senac – Santo Amaro
2- Docente do Centro Universitário Senac – Santo Amaro
[email protected], [email protected], [email protected]
Resumo. Idosos são indivíduos com idade superior a 60 anos e sofrem com transformações fisiológicas e psicossociais que influenciam no consumo alimentar. A alimentação e a nutrição são preceitos básicos para a proteção da saúde e uma dieta variada e equilibrada, contemplando o consumo regular de frutas pode proporcionar uma melhora da qualidade de vida. Foi realizada uma pesquisa em um Centro de Convivência do Idoso, com a participação de 25 idosos de ambos os sexos, na faixa etária de 60 a 82 anos com o objetivo de comparar o consumo atual de frutas com o consumo no período da infância. Observou-se uma alteração em relação aos dois períodos da vida analisados, sendo que, na infância havia uma variedade maior de frutas quando comparados à vida adulta. Apesar de, atualmente, os idosos apresentarem consumo regular de frutas, este consumo ainda é inferior ao recomendado pelo guia alimentar para a população brasileira, merecendo uma orientação adequada para o aumento do consumo. Sugere-se que novos estudos sejam realizados com vistas a promover a alimentação saudável para a população idosa. Palavras-chave: consumo alimentar; idosos; frutas.
Abstract. Elderly persons are individuals older than 60 year and usually have physiological and psychological changes that would influence their dietary pattern. Feeding and nutrition are basic concepts for health protection where a varied and balanced diet with regular consumption of fruits may improve the wellness and health of this population. The research was performed in an Elderly Community Center where 25 patients, both genders and range of aged around 60-82 years old participated in this study. The aim of this study was to compare the current against the childhood consumption of fruits. It was observed differences between the two periods of life analyzed with a more variable consumption during the childhood when compared to current age. We observed the current consumption of fruit in the elderly population. However, it is lower than the recommendation of food guide for the Brazilian population and a proper orientation for increase the consumption of fruits should be performed. It is suggested that further studies should be conducted in order to promote healthy feeding for the elderly population.
Keywords: dietary pattern; elderly; fruits.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
2
1. Introdução
De acordo com o Estatuto Nacional do Idoso são considerados idosos os indivíduos com 60 anos ou mais (Brasil, 2003).
Nas últimas décadas, em razão do aumento da expectativa de vida, a distribuição etária da população mundial tem apresentado visível alteração e consequente aumento do número de idosos, o que representa novos desafios na pesquisa nutricional.
O Brasil está passando por um processo de envelhecimento rápido e intenso. O número de idosos crescerá 3,22 vezes até o ano 2025. Com isso, a proporção de idosos que, em 1980 era menor que 6%, subirá, em menos de 50 anos, para 14%. A estimativa é que o Brasil ocupe, no ano de 2025, o sexto lugar na esfera mundial em número de idosos: 31,8 milhões (Brasil, 2008).
O envelhecimento, apesar de ser um processo natural, submete o organismo a diversas alterações anatômicas, funcionais, psicossociais e psicológicas, com repercussões sobre as condições de saúde e nutrição de idosos. Essas mudanças são progressivas, ocasionando efetivas reduções na capacidade funcional, desde a sensibilidade para os gostos primários até alterações nos processos metabólicos do organismo (Rosa et al, 2003).
O envelhecimento pode estar acompanhado de diversos tipos de doenças crônicas não transmissíveis como: doenças cardiovasculares, neurológicas, hipertensão, diabetes e alguns tipos de câncer. É frequente o uso de múltiplos medicamentos que influenciam na ingestão de alimentos, na digestão, na absorção e na utilização de diversos nutrientes, comprometendo no estado de saúde e a necessidade nutricional do idoso. As alterações psicossociais como a solidão e o isolamento social, depressão e o luto pela perda de amigos ou entes queridos também interferem, em certa medida, no interesse e na vontade de se alimentar, impactando no estado nutricional do idoso (Sampaio, 2004; Najas, 2005).
Além dessas questões listadas, em consequências dos poucos recursos econômicos provenientes de aposentadorias e pensões, os idosos podem apresentar dificuldades para a aquisição de alimentos de alto custo, especialmente alguns tipos de frutas (Viebig et al, 2009; Fisberg et al, 2013).
Estudos mostram a importância do consumo de uma dieta variada e equilibrada. Assim, as frutas, por serem ricas em vitaminas, minerais e fibras e contribuírem para a proteção à saúde e diminuir o risco de várias doenças, devem estar presente diariamente na alimentação do idoso. No entanto, observa-se, na população idosa, uma significativa redução no consumo de frutas (Brasil, 2005).
A situação nutricional da população idosa sinaliza a necessidade de buscar, conhecer e compreender todas as peculiaridades que afetam o consumo alimentar, especialmente a redução no consumo de frutas. A investigação deve considerar os hábitos regionais nos ambientes em que estão inseridos, os hábitos individuais adquiridos desde a infância, as condições socioeconômicas, as alterações fisiológicas inerentes a idade e a progressiva incapacidade para realizar sozinhos as suas atividades cotidianas
Diante do exposto, justifica-se a necessidade de realizar estudos que investiguem as motivações para o consumo de frutas na população idosa para que possam nortear ações para a promoção do aumento do consumo de frutas.
A partir da hipótese de que há alteração no consumo de frutas entre as diferentes fases da vida, este trabalho teve por objetivo avaliar quais são essas alterações e motivos, comparando o consumo na fase atual da vida dos idosos com o consumo de frutas no período de infância.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
3
2. Metodologia
O método adotado foi o da pesquisa descritiva e de campo com tratamento de dados quantitativos e qualitativos.
O pesquisa aconteceu entre os meses de maio e junho de 2013, com indivíduos idosos com idade superior a 60 anos, de diferentes classes sociais, frequentadores de um Centro de Convivência do Idoso (CCI).
Para identificar as frutas consumidas e suas respectivas quantidades foi utilizado um Questionário de Frequência Alimentar (QFA). O instrumento permite categorizar os alimentos consumidos, a porção e a frequência de consumo.
Como recursos para facilitar a identificação das frutas foram apresentadas figuras ilustrativas de diversas frutas onde cada um dos participantes sinalizava quais os alimentos mais consumia em cada uma das fases da vida. As figuras foram importantes para minimizar possíveis dificuldades de respostas por conta das falhas na memória e casos de analfabetismo.
Para identificar os motivos de consumo, introdução ou exclusão de novas frutas entre os diferentes períodos, as entrevistadoras perguntaram aos idosos e registraram em ficha.
A fim de complementar a investigação foi utilizado um questionário contendo 11 (onze) perguntas focadas em dois segmentos: o primeiro, que buscou identificar características pertinentes ao comportamento em relação ao consumo de frutas; o segundo que abordou algumas características do consumidor, como o estabelecimento utilizado para adquirir as frutas, motivo da compra, frequência de consumo e definição de qualidade.
Após a coleta de dados, as respostas foram quantificadas e identificadas para saber quais os alimentos mais ou menos consumidos nos períodos de vida dos idosos. As respostas obtidas foram organizadas em categorias segundo alterações naturais do envelhecimento, fisiológico e psicossocial.
Sobre os aspectos éticos, a realização da pesquisa foi autorizada pelo local, onde a responsável assinou uma via consentindo com a realização do trabalho. O presente projeto de pesquisa foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Centro Universitário Senac. Apenas foram incluídos na pesquisa os idosos que aceitaram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
3. Resultados e discussão
A população foi composta por vinte e cincos idosos sendo 23 do gênero feminino (92%) e 2 do gênero masculino (8%) na faixa etária do 60 a 85 anos. Segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia (2010), na população idosa o número de mulheres é bastante superior ao número dos homens visto que estes apresentam expectativa de vida menor do que as mulheres.
Como resultado da dinâmica de identificação das frutas, observou-se que as principais frutas consumidas foram banana, laranja e mamão, tanto para o período atual quanto para a infância. Assim, verificou-se que as principais frutas consumidas no período da infância são as mesmas que permanecem na fase atual. Segundo Rossi, Moreira e Rauen (2008) diversos hábitos alimentares estabelecidos na infância perduram por toda a vida.
Nas duas fases, a fruta de maior consumo foi a banana. Uma hipótese para tal preferência pode ser a facilidade de consumo desta fruta, além do preço mais acessível. De acordo com Chaimowicz (1997), o uso de prótese dentária faz com que os idosos mastiguem com menos eficiência, levando esses indivíduos a optarem por frutas macias e de fácil mastigação, que é o caso da banana. Segundo estudo
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
4
realizado no município de Jaboticabal as frutas preferidas por idosos foram banana, laranja e maçã. Possivelmente pela maior disponibilidade e acesso físico e financeiro. (Perosa et al, 2012). O consumo de frutas pode estar diretamente relacionado ao poder aquisitivo da população entre idosos, tal como verificado em estudo realizado por Viebig et al (2009) que identificaram associação positiva entre consumo variado de frutas à renda e à escolaridade.
Foi possível observar que diversas frutas que foram referidas como consumidas na infância tais como jaca, figo, abacate, araçá, fruta do conde, marmelo, abacaxi, fruta pão e ingá, não mais são consumidas na idade atual. Ao contrário, não observou-se a inclusão de novas frutas no período da velhice quando comparados ao consumo na infância.
As frutas consumidas na infância que deixam de fazer parte do consumo atual indicam que alguns hábitos da infância não perduraram para a vida adulta, alguns se perderam ao longo do tempo. A sazonalidade, a disponibilidade e acesso ao alimento podem ser os principais fatores para a alteração.
Nos discursos dos idosos foi possível observar um saudosismo em relação às frutas que consumiam na infância. Outros discursos permitiram identificar que a dificuldade financeira era um dos motivos para o baixo consumo de frutas, tanto na infância quanto na vida adulta.
Seguem alguns relatos que permitem identificar essa relação:
“Minha mãe tinha muitos filhos e não sobrava dinheiro para comprar fruta, era só o necessário. Hoje compro as mais baratinhas.”
“Lembro na minha infância quando comia fruta do conde tirada do pé. Hoje não consumo mais, pois não resido no mesmo local e o preço subiu muito.”
“A minha filha, comprava só no fim da feira! Pois as frutas ficavam mais baratas”.
“Quando criança, nunca comia fruta, morava em outro pais (guerra), hoje tenho condições de comprar a fruta que quero comer.”
De acordo com esses relatos, pode-se observar que, enquanto crianças, as frutas possivelmente estavam mais disponíveis no próprio pé ou, ainda, disponíveis no mercado. Possivelmente as frutas que estavam disponíveis no pé são, justamente, aquelas que, na atualidade são as mais raras e, consequentemente, mais caras tais como fruta pão, fruta do conde, ameixa.
Outro fator que influenciou na alteração do consumo foi a restrição alimentar sinalizada por profissionais da saúde. Um dos relatos aponta uma restrição médica.
“Quando criança morava em fazenda e comia muito abacate, hoje o médico proibiu, meu colesterol é alto, mas tenho vontade de comer”.
“No quintal da minha casa tinha um pé de caqui e eu comia muito, hoje não posso comer devido eu ter diabete”.
Alguns profissionais de saúde, especialmente médicos, fazem a orientação sobre a necessidade de restrição de algumas frutas como, no caso do diabetes, é comum a restrição de frutas muito adocicadas e, no caso de hipercolesterolemia, alguns profissionais restringem o consumo de frutas mais gordurosas como o coco e o abacate. Essa restrição pode ocasionar para o idoso uma redução no consumo de frutas, especialmente pelo receio de terem complicações clínicas.
Os autores Pinafo et al (2011) estudaram as práticas de educação em saúde por parte de equipes profissionais e identificaram um modelo educativo fortemente associado a imposições e orientações verticalizadas que demonstram uma postura superior do
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
5
profissional em relação ao paciente. Nestes casos, o paciente não tem outra escolha senão obedecer, sem questionar, as ordens médicas.
A textura das frutas também foi relatada como um dos fatores que impediam o consumo de fruta.
“Gosto muito de maçã mas tenho dentadura que me dificulta morder porque é muito dura”.
De fato, as alterações fisiológicas relativas à dentição podem alterar o consumo alimentar, especialmente de algumas frutas mais rígidas (Rosa et al, 2003)
Sobre o número de porções de frutas consumidos diariamente, observou-se que, apesar das frutas estarem presentes na dieta da maioria dos idosos, essa quantidade não atende à recomendação do Guia Alimentar para População Brasileira (Brasil, 2005), que é de 3 a 5 porções de frutas ao dia. Como pode se observar na Figura, dos 25 idosos, a maioria (60,0%) consumiram de 2 a 3 porções de frutas por dia, 4 (16%) consumiram 1 porção e apenas 6 (24%) consumiram de 3 a 5 porções por dia.
0
2
4
6
8
10
12
14
16
1 Fruta por dia 2 a 3 fruta por dia 3 a 5 frutas por dia
Figura꞉ Número de porções de frutas consumidas diariamente segundo número de idosos. São Paulo, 2013.
Os resultados obtidos mostram um consumo diário de frutas pela maioria dos idosos portanto, ainda abaixo da recomendação para uma dieta adequada. Tal como nesta pesquisa, diversos estudos tem apontado um baixo consumo de frutas em população de idosos, o que constitui um risco para o desenvolvimento de doenças e o comprometimento da qualidade de vida, sendo urgentes as ações educativas que favoreçam o aumento no consumo de frutas (Costa et al, 2004; Viegib et al, 2009; Fisberg et al, 2013; Souza e Marin-Leon, 2013).
4. Conclusão
O aumento da população idosa é um fenômeno que não pode ser negligenciado pela ciência da nutrição. Na realização do planejamento dietético alimentar é imprescindível a compreensão de todas as peculiaridades às mudanças fisiológicas
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
6
naturais do envelhecimento, da análise dos fatores econômicos, psicossociais e de intercorrências farmacológicas associadas às múltiplas doenças que interferem no consumo alimentar e na necessidade de nutrientes.
Percebeu-se que muitos dos idosos consumiam uma variedade maior de frutas na sua infância apesar de limitações financeiras. Na fase adulta as dificuldades de acesso se acentuam e incluem-se outras limitações para o consumo tais como recomendações médicas.
Apesar do consumo diário de frutas pela maioria da população estudada, ainda não atende a recomendação para alimentação saudável. Assim, sugere-se, que novos estudos sejam realizados com vistas a promover a alimentação saudável para a população idosa.
Referências
BRASIL. Estatuto do Idoso. LEI No 10.741, DE 1º DE OUTUBRO DE 2003. D.O.U. 03 de outubro de 2003. Brasília, 2003.
______. Guia Alimentar para a População Brasileira. Ministério da Saúde. Brasília, 2005
______. Envelhecimento e dependência: desafios para a organização da proteção social. Ministério da Previdência Social. Brasília, 2008
CHAIMOWICZ, Flávio. A saúde dos idosos brasileiros às vésperas do século XXI: problemas, projeções e alternativas. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 31, n. 2, Apr. 1997.
COSTA, Maria Fernanda Furtado de Lima e et al . Comportamentos em saúde entre idosos hipertensos, Brasil, 2006. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 43, supl. 2, nov. 2009.
FISBERG, Regina Mara et al. Ingestão inadequada de nutrientes na população de idosos do Brasil: Inquérito Nacional de Alimentação 2008-2009. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 47, supl. 1, fev. 2013.
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia). Censo Demográfico Brasileiro. Brasília, 2010.
NAJAS, M.; NEBULONI, C.C. Avaliação do Estado Nutricional. In: RAMOS, L.R. Geriatria e Gerontologia. São Paulo: Manole, 2005.
PEROSA, José Matheus Yalenti et al. Perfil do consumidor de frutas em cidades do interior do estado de São Paulo - SP. Rev. Bras. Frutic., Jaboticabal, v.34, n. 4, dez. 2012.
PINAFO, Elisangela et al . Relações entre concepções e práticas de educação em saúde na visão de uma equipe de saúde da família. Trab. educ. saúde (Online), Rio de Janeiro , v. 9, n. 2, out. 2011.
ROSA, Tereza Etsuko da Costa et al. Fatores determinantes da capacidade funcional entre idosos. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 37, n. 1, fev. 2003
ROSSI, Alessandra; MOREIRA, Emília Addison Machado; RAUEN, Michelle Soares. Determinantes do comportamento alimentar: uma revisão com enfoque na família. Rev. Nutr., Campinas , v. 21, n. 6, dez. 2008 .
SAMPAIO, Lílian Ramos. Avaliação nutricional e envelhecimento. Rev. Nutr., Campinas, v. 17, n. 4, dez. 2004.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
7
SOUZA, Bruna Fernanda do Nascimento Jacinto de; MARIN-LEON, Letícia. Food insecurity among the elderly: cross-sectional study with soup kitchen users. Rev. Nutr., Campinas , v. 26, n. 6, dez. 2013.
VIEBIG, Renata Furlan et al . Consumo de frutas e hortaliças por idosos de baixa renda na cidade de São Paulo. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 43, n. 5, out. 2009 .
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática: Sustentabilidade Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179474 X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
A transformação do município de Sorocaba e a interferência nas
relações socioambientais da população no período de 1654-2014
The transformation of the city of Sorocaba and interference with social
and environmental relationships of the population in the period 1654-2014
Antonio Gabriel Cerqueira Gonçalves1, Helen Camargo de Almeida2 (Orientadora) e Paulo André Tavares3 (Coorientador)
[email protected], [email protected], [email protected]
1 Estudante do Curso Técnico em Meio Ambiente (SENAC) e Licenciando em Geografia (UFSCAR) 2 Mestranda em Gestão Empresarial Sustentável e Empreendedorismo Social (UTAD - Portugal), Bacharel em Ciências Biológicas (UFMT), Bacharel em Comunicação Social - Jornalismo (FIVE), Especialista em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável (Fundação Escola Superior do Ministério Público/MT), Técnica em Gestão Ambiental (CEFET/MT) e Docente do Curso Técnico em Meio Ambiente (SENAC/SP) 3 Mestrando em Engenharia Civil e Ambiental (UNESP) e Bacharel em Ciências Biológicas (UFSCAR)
Resumo. O presente trabalho traz um levantamento das principais transformações
geoeconômicas do município de Sorocaba no período de 1654 a 2014 e como essas
mudanças influenciaram no contexto socioambiental local. Para evidenciar as
transformações econômicas e seus impactos no cenário ambiental e no
comportamento social utilizou-se quatro linhas de pesquisa e análise: Revisão de
Literatura; Captura de registros fotográficos; Levantamento de dados por meio de
pesquisa em acervo histórico / internet e Depoimentos in loco – através de gravação
de depoimento livre de moradores sobre a transformação de Sorocaba. Os principais
resultados presentes neste trabalho indicam que a forte influência de fenômenos
econômicos de grande expressividade contribuíram significativamente no contexto
socioambiental do município.
Palavras-chave: Sorocaba, Socioambiental, Impactos.
Abstract. This paper presents a collection of data of the major geo-economic
transformation in the city of Sorocaba since 1654 until 2014 and how these changes
influence the socio-environmental behavior. To highlight the economic transformation
and socio-environment impacts we used four lines of research and analysis: Literature
Review; capture photographic records; Survey data through research into historical
collection / internet and Prints in loco - by Recording Testimony Residents in the city
of Sorocaba. The main results shown in this work indicate that the strong influence of
economic phenomena of great expressiveness contributed significantly interference in
the social and environmental context of Sorocaba.
Key words: Sorocaba, Socio-environmental, Impacts.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
2
Introdução
Devido à sua condição geográfica privilegiada, desde a sua fundação, Sorocaba é um
município central no plano econômico nacional. A sua localização estratégica ao sul do
Brasil e próxima ao limite estabelecido no Tratado de Tordesilhas fez com que
Sorocaba atraísse a atenção de grandes líderes que impulsionaram a ocupação e o
desenvolvimento deste território, favorecendo a salvaguarda e a expansão do domínio
português sobre as terras conquistadas no Brasil. Dentre as lideranças que passaram
pela cidade destaca-se Baltazar Fernandes, bandeirante paulista que conseguiu iniciar
efetivamente o povoamento da região em 1654, após as duas fracassadas tentativas
de povoamento chefiadas pelo então Governador-geral do Brasil Dom Francisco de
Souza nos anos de 1599 (Vila de Nossa Senhora de Monte Serrat) e 1611 (Itavuvu)
(IHGGS, 2013).
O plano de fundo supracitado, de defesa da soberania portuguesa, possibilitou que
Sorocaba se expandisse rapidamente no decorrer de sua existência, esta assinalada
por ondas de desenvolvimento e suas respectivas interferências socioambientais que
marcaram o seu processo histórico. Durante a realização do estudo foi possível
identificar em Sorocaba a presença de quatro grandes ondas de desenvolvimento que
se desdobraram ao longo dos seguintes anos: meados dos séculos XVII e XVIII (1654
a 1750); meados do século XVIII e final do século XIX (1750 a 1897); final do século
XIX e meados do século XX (1897 a 1954) e meados do século XX até o século XXI
(1954 a 2014).
No século XVII evidencia-se o surgimento do município e o desenvolvimento do
Bandeirismo, onde a economia era voltada à subsistência. Foi neste primeiro período
em que ocorreu a expansão territorial sorocabana. Mais adiante, no século XVIII,
inicia-se a fase do Tropeirismo, que torna a localidade o eixo geoeconômico entre as
regiões norte e sul do Brasil. Em virtude da necessidade de escoamento da produção
de ouro de Minas Gerais estabelece-se em Sorocaba a Feira de Muares, que
incrementa a economia e a coloca como fonte responsável por 30% do total de
impostos arrecadados na então Província de São Paulo. Mais a frente, em razão do
surto de febre amarela que vitimou centenas na época, o Tropeirismo chega ao fim,
dando espaço à abertura do Ciclo Industrial no Século XIX, que tem como principal
marco a Estrada de Ferro Sorocabana. Por último, no século XX, o comércio volta a
ganhar força, tomando espaço das indústrias e inaugurando o período da
Terceirização (prestação de serviços), que estende-se até os dias atuais (CESAR, A.,
2002).
Nona maior cidade em população do Estado de São Paulo, Sorocaba abriga
hodiernamente 629.231 habitantes (IBGE, 2013). Polo de uma região com mais de 2
milhões de habitantes, a cidade conta com uma grande diversidade econômica, tendo
como principais bases de sua economia os setores de indústria, comércio e serviços
(PREFEITURA DE SOROCABA, 2013). Tem ainda um IDMH (Índice de Desenvolvimento
Humano Municipal) de 0,798 – considerado alto pela classificação da ONU (Exame,
2013), detém o 32° maior PIB (Produto Interno Bruto) – R$ 16.127.236,00 bilhões –
(IBGE, 2011) e é a 13ª maior localidade geradora de empregos do Brasil (AGÊNCIA
SOROCABA, 2013).
“[No contexto ambiental] a região de Sorocaba se caracteriza por
apresentar a maior concentração de fragmentos [verdes] do Estado de
São Paulo e sua vegetação típica de ecótono contribui para o seu papel estratégico no cenário da conservação da biodiversidade. [...] A paisagem atual da região de Sorocaba é composta de um mosaico de grandes áreas de monoculturas e um grande centro urbano e industrial, com algumas pequenas manchas de vegetação natural, as quais em termos socioambientais vêm sofrendo diversos impactos
negativos sejam nas áreas urbanas como nas áreas rurais, havendo
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
3
grande comprometimento de sua diversidade e estabilidade.” (SEMA, 2014)
Urbanização e Impacto Socioambiental
Os principais problemas ambientais e sociais enfrentados atualmente nas principais
cidades do planeta são seguramente provocados pela forte pressão econômica,
caracterizada pela necessidade de grandes demandas de recursos naturais, como
energia, água, minérios e recursos florestais madeireiros. A demanda por espaço é
outro fator de pressão sobre os territórios municipais. Segundo Rockwell (1999), a
urbanização está associada com o maior número de mudanças no uso do solo do que
qualquer outra atividade humana, se a “pegada ecológica” distante da cidade for
reconhecida.
Além dos impactos ambientais, o processo de urbanização e seus ciclos econômicos,
promovidos principalmente pelo crescimento industrial apresentam outro ponto crítico,
a desigualdade social.
Como sabiamente pondera Boff (2011),
“a relação do social com o ambiental [...] é intrínseca. [...] Cada um de nós vivemos no chão, não nas nuvens: respiramos, comemos, bebemos, pisamos os solos, estamos expostos à mudança dos climas,
mergulhados na natureza com sua biodiversidade, somos habitados por bilhões de bactérias e outros microrganismos. [...] Estamos dentro da natureza e somos parte dela. [...] Nós não podemos viver sem ela. [...] O social sem o ambiental é irreal. Ambos vêm sempre juntos.”
A escassez de recursos e a especulação imobiliária promove a exclusão social,
condicionando grupos sociais a viverem nas áreas periurbanas, com baixo
investimento em infraestrutura e serviços públicos precários. O processo de
crescimento e urbanização condensou benefícios a pequenos grupos sociais, o que
resultou em desigualdade social, construída ao longo dos ciclos econômicos.
O presente trabalho traz uma análise das principais transformações geoeconômicas
ocorridas no município de Sorocaba entre 1654 a 2014 e como essas mudanças
influenciaram no comportamento socioambiental da população local.
Para evidenciar as transformações econômicas do município de Sorocaba e seus
impactos no cenário ambiental e no comportamento social utilizou-se quatro linhas de
pesquisa e análise: Revisão de Literatura; Captura de registros fotográficos;
Levantamento de dados por meio de pesquisa em acervo histórico / internet e
Impressões in loco – através de gravação de Depoimento livre de Moradores sobre a
cidade de Sorocaba.
Os principais resultados presentes neste trabalho indicam que a forte influência de
fenômenos econômicos de grande expressividade contribuíram significativamente no
contexto socioambiental do município de Sorocaba.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
4
1. Objetivo
Evidenciar as principais transformações ambientais e sociais sofridas no município de
Sorocaba em decorrência dos grandes ciclos econômicos, desde a sua concepção até a
formação vigente.
2. Metodologia
Para a pesquisa foram realizadas diferentes ações a fim de se obter informações
pertinentes e qualificadas ao que é exposto neste artigo científico, a saber: revisão de
literatura; captura de registros fotográficos; levantamento de dados por meio de
pesquisa em acervo histórico / internet e impressões in loco – através de gravação
autorizada de depoimentos livres de moradores sobre a transformação da sociedade
de Sorocaba.
Na parte bibliográfica o levantamento de dados a priori concentrou-se em materiais
publicados por autores e instituições sorocabanas em razão destes conterem uma
vasta gama de conteúdos a respeito da cidade. A captura de registros fotográficos,
por sua vez, buscou identificar as transformações que se estabeleceram em Sorocaba
ao longo do seu processo histórico de desenvolvimento, através da comparação entre
imagens de épocas antigas com imagens do tempo presente.
Já a consulta na internet se fez importante em virtude da necessidade de se encontrar
mais informações a respeito do objeto de estudo, possibilitando assim, o
aprofundamento do mesmo. A modalidade de entrevistas, enfim, mostrou-se de
extrema relevância, uma vez que não há nada mais assertivo que descobrir Sorocaba
por pessoas que a vivenciam e que mantém uma sólida intimidade com ela.
Para a realização das ações listadas acima foram utilizados os seguintes recursos:
câmera digital; telefone; caneta; papel; livros, revistas, acervo histórico e internet;
computador com acesso à internet.
A câmera digital possibilitou o empreendimento da parte visual e contextual da
pesquisa. No intuito de aventar dados e chegar-se a algumas conclusões foi traçado
um roteiro de pesquisa contemplando pontos de relevante importância na cidade.
Foram impressos registros visuais das e/ou nas seguintes localidades em Sorocaba:
Avenida Afonso Vergueiro, Avenida Coronel Nogueira Padilha, Avenida Dom Aguirre,
Avenida Dr. Armando Pannunzio, Avenida General Carneiro, Avenida Pereira Inácio,
Biblioteca Municipal, Biblioteca Municipal Infantil, Câmara Municipal de Sorocaba, Casa
de Aluísio de Almeida, Catedral Metropolitana de Sorocaba, Diário de Sorocaba, E.E.
Antonio Padilha, E.E. Dr. Julio Prestes de Albuquerque – “Estadão”, E.M. Dr. Getúlio
Vargas, Estrada de Ferro Sorocabana (EFS), Fundação de Desenvolvimento Cultural
(FUNDEC), Gabinete de Leitura Sorocabano, Igreja Presbiteriana Independente, Largo
do Rosário, Mercado Municipal, Monumento à Baltazar Fernandes, Monumento à Luiz
Matheus Maylasky, Mosteiro de São Bento, Museu Histórico Sorocabano, Paço
Municipal, Palacete Scarpa, Parque Zoológico Municipal Quinzinho de Barros (PZMQB),
Pátio Cianê Shopping, Pelourinho, Praça Carlos de Campos, Praça Coronel Fernando
Prestes, Praça do Canhão, Praça Frei Baraúna – “Fórum Velho”, Praça Monsenhor
Francisco Antonio Gangrio, Praça Nove de Julho, Rio Sorocaba, Rodovia Raposo
Tavares, Rua 7 de Setembro, Rua Brigadeiro Tobias, Rua Carlos de Campos, Rua
Cesário Mota, Rua Comendador Nicolau Scarpa, Rua Coronel Benedito Pires, Rua
Francisco Scarpa, Rua Humberto de Campos, Rua Padre Luiz, Rua Santa Clara, Rua
São Bento, Rua XV de Novembro, Seminário Diocesano, Sorocaba Club, Sorocaba
Shopping Center, Terminal Rodoviário Rodocenter, Terminal Santo Antônio e Terminal
São Paulo. Além das fotografias foi realizada a coleta audiovisual de depoimentos
(ANEXO I) das seguintes personalidades sorocabanas – que foram fundamentais no
sentido de prover embasamento para a realização deste estudo: José Rubens Incao;
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
5
Andréa Cristine Freire Rezende; João Paulo Rodrigues; Adilson Cezar; Dom José
Carlos Camorim Gatti e Paulo André Tavares.
O telefone, por sua vez, mostrou-se um recurso necessário para conseguir
informações a respeito da disponibilidade dos entrevistados e combinar horários para
a realização das gravações dos depoimentos, consolidando-se assim um importante
meio de comunicação. A caneta mostrou-se um recurso indispensável uma vez que
permitiu o planejamento de ações e a realização das mais diversas anotações. O
papel, a exemplo da caneta, foi essencial, pois serviu de suporte para as anotações e,
principalmente, para a elaboração do termo de direitos autorais, em observância à Lei
n° 9.610 de 19 de fevereiro de 1988 (BRASIL, 1998). Os livros, as revistas, o acervo
histórico consultado e a internet serviram para o levantamento de dados e
consequente elaboração da pesquisa. O computador com acesso à internet, por fim,
serviu para a confecção do trabalho.
3. Resultados e Discussão
Geografia de Sorocaba
No decorrer dos seus 359 anos de existência o meio natural que data de quase 350
milhões de anos (Cruzeiro do Sul, 2004) serviu de suporte para o desenvolvimento
das atividades humanas, que permitiram Sorocaba consolidar-se como uma das
principais cidades do Estado de São Paulo e do Brasil.
“Localizada na região Sudoeste do Estado de São Paulo na chamada borda da Depressão Periférica Paulista, Sorocaba está situada no limite entre as Bacias Sedimentares do Paraná e as rochas do Embasamento Cristalino. [...] O município apresenta um clima com temperaturas
médias anuais de aproximadamente 20° Celsius, com predomínio de cobertura vegetal de fragmentos florestais remanescentes de uma zona de grande importância ecológica entre os biomas de Mata Atlântica e Cerrado, com presença de Floresta Estacional Semidecidual, Floresta Ombrófila Densa e Cerrados. [...] Neste cenário encontra-se [o Tróprico de Capricórnio] e o rio Sorocaba, o mais importante afluente da margem esquerda do rio Tietê.” (MCT, 2011 apud SEMA,
2014)
O município de Sorocaba tal como conhecemos hoje (Figura 2) é resultado de uma
série de desdobramentos territoriais que se estabeleceram ao longo do tempo.
Sorocaba é resultado da repartição do território de Santana de Parnaíba (Figura 1), de
onde provém o seu fundador, Baltazar Fernandes.
Figuras 1 e 2. Evolução Territorial de Sorocaba. Na figura 1 (à esquerda) há a representação do território inicial (1661) e na figura 2 (à direita) há a representação do território atual de
Sorocaba (área em cor laranja). Extraído de: Machado-Hess, E. S., 2012, p. 67 e p. 72.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
6
Sorocaba possui atualmente uma área de 449,804 km², onde 82,9% dessa área total
se constitui em área urbana e 17,1% em área rural. Com uma densidade demográfica
de 1.304,18 habitantes por km² (IBGE, 2013), faz limite com os municípios de Itu e
Porto Feliz (ao norte), Mairinque e Alumínio (leste), Votorantim e Salto de Pirapora
(sul) e Araçoiaba da Serra e Iperó (oeste) (Machado-Hess, E. S., 2012).
“O território do município é marcado por uma densa e perene
malha hídrica composta por cerca de 2.880 nascentes e, além
disso, conta com dezenas de córregos, e alguns rios, no qual o
rio Sorocaba e o rio Pirajibu se destacam por suas maiores
vazões.” (SEMA, 2014)
A Geografia de Sorocaba (Quadro 1) e suas implicações nos contextos econômico,
ambiental, histórico, cultural e social pode ser sintetizada da seguinte maneira:
Quadro 1. Geografia de Sorocaba.
O Relevo O Homem
O rio Favorece ao bandeirismo
A depressão periférica Favorece ao tropeirismo
As serras: (de Araçoiaba, Pirajibu e São
Francisco)
Favorece à fixação
Os campos gerais Favorece à agricultura e à pecuária Extraído de: CEZAR, A., 2002.
Biodiversidade de Sorocaba
“O território sorocabano apresenta 1.218 espécies vegetais e
animais, das quais 1.182 nativas e 36 exóticas introduzidas. As
plantas totalizam 55, das quais 441 Angiospermas, ou seja,
com sementes contidas num envoltório protetor, e 158
fitoplânctons, minúsculas formas de vida aquática encontradas
em rios e lagoas, com capacidade de promoverem a
fotossíntese. Entre as formas de vida animal, as 612 espécies
identificadas variam de zooplânctons a mamíferos. Há 58 tipos
de aracnídeos, 75 de insetos, três de centopeias, oito de
moluscos, 53 de peixes, 23 de anfíbios, 49 de répteis e 280 de
aves, das quais oito são beija-flores.” (SEMA, 2014, p. 13)
Assentada na bacia dos Rios Sorocaba e Médio Tietê,
“Sorocaba detém a segunda maior concentração de fragmentos
florestais do Estado. Estes fragmentos se inserem em uma zona
ecotonal, [...] denotando assim grande relevância no cenário da
conservação florestal.” (ALBUQUERQUE & RODRIGUES, 2000
apud SEMA, 2014, p. 38)
A biodiversidade local urge por cuidados, uma vez que “apenas 12,6% [...] da
vegetação original [...] ainda se mantém pouco alterada, [...] concentrada
principalmente nas regiões rurais do município e [em] Áreas de Preservação
Permanente.” (FUNDAÇÃO FLORESTAL, 2009 apud SEMA, 2014, p. 22)
Crescimento Populacional
Com o passar dos anos registrou-se uma progressiva perda em área territorial,
contudo, em oposição, houve um gradual e significativo aumento populacional no
município de Sorocaba (Tabela 1). Até o ano de 1900 a cidade manteve uma
população modesta, de 18.562 habitantes. Em 1960 a cidade ultrapassa a marca de
100.000 habitantes e de lá para cá o número de pessoas que vivem na cidade
registrou um aumento de 461,75%.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
7
Tabela 1. Crescimento Populacional do Município de Sorocaba.
Ano População
1661 500 habitantes1
1770 5.919 habitantes
1802 9.721 habitantes
1810 9.576 habitantes
1900 18.562 habitantes
1920 43.323 habitantes
1930 56.987 habitantes
1940 70.835 habitantes
1950 93.928 habitantes
1960 136.271 habitantes
1970 174.323 habitantes
1980 269.288 habitantes
1990 365.529 habitantes
2000 493.468 habitantes
2010 586.625 habitantes
2013 629.231 habitantes2
Fontes: IBGE, 1958; Guia Escolas, 2009; IBGE e Santos, 1999 apud BENEVIDES, G., 2013; IBGE, 2013 e SEADE, 2013.
Notas: (1) Dado aproximado. (2) Estimativa populacional do IBGE.
“Sorocaba tem uma taxa de crescimento populacional anual de 2,16%”, índice
bastante superior ao registrado no Estado, que é de 1,32%. (SEMA, 2014)
Linha do Tempo
Para melhor discorrer as mudanças que ocorreram em Sorocaba será apresentada
uma linha do tempo, a fim de posicionar espaço-temporalmente o leitor e para que o
mesmo possa compreender as consequências inferidas pelos modelos geoeconômicos
desenvolvidos ao longo do processo histórico do município de Sorocaba. Portanto, o
tópico “Resultados e Discussões” será apresentado diante de dois principais
desdobramentos: ondas de desenvolvimento1 e interferências socioambientais.
Século XVII (Bandeirismo)
1 Ao analisar o histórico de desenvolvimento de Sorocaba, é possível reunirmos os seus quatro séculos de
existência em “ondas de desenvolvimento”, isto é, períodos de tempo que abrangem um certo intervalo de anos onde é possível identificar um padrão de comportamento semelhante.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
8
Figura 3. “Elevação de Sorocaba à Vila.” Ao centro está a imagem de Baltazar Fernandes,
fundador de Sorocaba. Quadro de Ettore Marangoni, 1950. Acervo: Museu Histórico
Sorocabano.
No século XVII evidencia-se o surgimento do município e o desenvolvimento do
Bandeirismo, onde a economia era voltada à subsistência. Neste primeiro período
ocorreu a expansão territorial sorocabana, motivada por interesses políticos e
econômicos.
No ano de 1654 dá-se a fundação de Sorocaba por Baltazar Fernandes, que instalou-
se na região neste ano com sua família e escravaria vindas de Santana do Parnaíba.
De posse das terras recebidas pelo rei de Portugal, através do regime de sesmarias,
Baltazar Fernandes dá então início à construção da Igreja de N. Sr.ª da Ponte2.3
Seis anos mais tarde, em 1660, é criado o Mosteiro de São Bento, resultado da ação
de Baltazar Fernandes de trazer os monges beneditinos para Sorocaba.
Em torno do Mosteiro de São Bento, com a contribuição da comunidade indígena
então existente (Figura 3), é que Sorocaba cresceu e se desenvolveu, o que coloca a
cidade em situação única no Brasil, pois nenhuma outra cidade brasileira cresceu em
torno de um Mosteiro. Nesta época o Rio Sorocaba foi importante no sentido de
suportar hidricamente a população, mas ao contrário do que se possa imaginar não foi
à sua volta que os primeiros sorocabanos estabeleceram-se.
Século XVIII (Tropeirismo)
Figura 4. “Encontro de Tropeiros no Caminho para as Minas.” Quadro de
Ettore Marangoni, 1954. Acervo: Museu Histórico Sorocabano.
2 Sorocaba é a única cidade no país a ter uma Igreja em louvor à Nossa Senhora da Ponte, designação católica que ressalta a importância de Maria como ponte que conduz ao Céu.
3 Catedral Metropolitana de Sorocaba. Nossa Senhora da Ponte. Disponível em: <http://www.catedraldesorocaba.org.br/nossa-senhora/index.htm>. Acesso em: 29. mar. 2014.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
9
No século XVIII dá-se início ao Tropeirismo, que torna Sorocaba o eixo geoeconômico
entre as regiões norte e sul do Brasil. Em virtude da necessidade de escoamento da
produção de ouro de Minas Gerais estabelece-se em Sorocaba a Feira de Muares
(Figura 4), que incrementa a economia local e coloca a cidade como a principal fonte
de impostos arrecadados na então Província de São Paulo.
Data do ano de 1733 a passagem da “primeira tropa de muares em Sorocaba (cerca
de 2000 animais)” (CESAR A., 2002) em direção à Minas Gerais, tendo início assim o
ciclo do Tropeirismo, que virá a perdurar por quase 150 anos. “Enquanto que ao norte
a economia se baseava na mineração e na exploração das imensas reservas florestais,
no sul a motivação econômica era a produção de animais de carga e de corte, esta
região completando aquela.” (IHGGS, 2013)
Em 1750 os índios existentes em Sorocaba são libertos (ALMEIDA, ALUÍSIO de.,
2001) e passa a ser realizado o registro de animais sobre a ponte do Rio Sorocaba
(Figura 4). Devido à cobrança de taxa para ultrapassar o rio Sorocaba a cidade
tornou-se responsável, na época, por 30% do total de tributos arrecadados na
Província de São Paulo. Com a pujança econômica a localidade tornou-se importante,
“tanto que o Estado era conhecido como São Paulo de Sorocaba.
Nos meses da Feira a Vila ficava cheia de gente, o comércio e a indústria caseira (artesanato) se desenvolviam. Companhias de teatro e circo, espetáculos musicais e óperas se apresentavam primeiro em Sorocaba para depois irem para São Paulo ou outras capitais.” (Enciclopédia Sorocabana, 2002, grifo nosso)
3.1 Primeira Onda de Desenvolvimento (1654-1750) e suas respectivas
Interferências Socioambientais
Marcos inicial e final: Fundação de Sorocaba (1654) e Libertação dos Indígenas
(1750).
Ciclos econômicos vigentes: Bandeirismo, Bandeirantismo e Tropeirismo.
Interferências socioambientais: desenvolvimento da atividade agrícola (lavoura
canavieira e algodoeira); expansão territorial; presença marcante da comunidade
índigena; grande representatividade cultural; ligação com o Rio Sorocaba para
abastecimento hídrico e comércio; perfuração de poços; forte religiosidade; respeito à
terra; produção de resíduos orgânicos; exploração mineral e vegetal; atividades
artesanais; produção caseira; ourivesaria.
A biodiversidade e a sociedade local não sofreram grandes impactos neste primeiro
momento, com ressalva da comunidade indígena que sofreu as primeiras intervenções
de aculturamento.
Século XIX (Industrial)
No século XVIII Sorocaba avança, crescendo continuamente no cenário local e
nacional, tanto politicamente4, economicamente quanto culturalmente. Nesta divisão
histórica evidencia-se o fim do Tropeirismo e o começo do Ciclo Industrial. No século
XIX é possível observar a perda de importância do comércio e a construção das bases
industriais no município, que tem como marcos principais a inauguração da Estrada de
Ferro Sorocabana e o aparecimento das fábricas têxteis Nossa Senhora da Ponte
(Figura 5), Santa Rosália e Santa Maria, que renderam à Sorocaba o cognome de
“Manchester Paulista”5.6 Abrindo uma nova fase, as indústrias têxteis exercerão
4 Neste período merece destaque a atuação do Brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar, presidente por dois mandatos da então Província de São Paulo.
5 Termo cravado em 1904 por Alfredo Maia devido à semelhança da cidade no período com a cidade industrial de Manchester, na Inglaterra.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
10
grande importância como fonte de absorção de mão-de-obra e até mesmo como
instrumento de medição do tempo.
“O tempo da cidade era o tempo regido pelas indústrias e suas sirenes, indústrias do setor têxtil que dominavam a paisagem com suas chaminés e construções características e, o som da cidade, com as
sirenes. Se na Idade Média o tempo “era ritmado pelos sinos” das igrejas [...], em Sorocaba, a população urbana de grande parte do século XX se acostumou a medir o tempo com a ajuda das sirenes das fábricas. Com isso, gerações de moradores acabaram se acostumando a observar o tempo não só através dos apitos dos trens, a exemplo de parte das cidades do interior paulista, mas também pelas sirenes
dessas indústrias. [...]" (JÚNIOR, A. P., [201-?])
Figura 5. Fábrica têxtil Nossa Senhora da
Ponte. Pedro Neves dos Santos, 1924. Acervo: José Rubens Incao.
Já no início do século a indústria ganha espaço, através da fundação em 1810 da Real
Fábrica de Ferro de São João do Ipanema, por ordem de Dom João VI, Príncipe
Regente do Brasil, que consolidou-se a 1ª metalúrgica em escala industrial da América
Latina. A partir daí ocorre uma série de desdobramentos de cunho industrial,
notadamente: fundação na Chácara Amarela da 1ª fábrica de tecidos da Província de
São Paulo (1852); fundação da fábrica de chapéus (1860); inauguração da Estrada de
Ferro Sorocabana em 1875 por Luiz Matheus Maylasky - que “tornou-se o maior
parque ferroviário da América Latina” (Cruzeiro do Sul, 2005) (Figura 6); criação da
fábrica de banhas de Francesco Matarazzo (REVISTA DE HISTÓRIA, 2009);
surgimento das fábricas têxteis N. Sr.ª da Ponte – a 1ª fiação e tecelagem de seda e a
1ª de algodão no Estado de S. Paulo (1882), Sta. Rosália (1890) e Sta. Maria (1897).
Figura 6. Estrada de Ferro Sorocabana. Monsenhor Jamil, [20--?]. Acervo: José
Rubens Incao.
6 JÚNIOR, ARNALDO PINTO. A Manchester Paulista: imagens históricas de modernidade no município de Sorocaba no início do século XX. Disponível em: <http://www.ichs.ufop.br/perspectivas/anais/GT0403.htm>. Acesso em: 03 maio 2014.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
11
Os desdobramentos do século em questão tem relação direta com o cultivo do
algodão, tendo sido realizado na cidade o plantio pioneiro no Brasil de algodão
herbáceo em substituição ao arbóreo, no ano de 1856 (CÂMARA MUNICIPAL, [200-?]).
Em 1842, Sorocaba recebe o título de cidade e em 1887, antes da promulgação da Lei
Áurea pela Princesa Isabel os escravos de Sorocaba são libertados, por decisão da
Câmara Municipal no Natal daquele ano (ALMEIDA, ALUÍSIO de., 2001).
A partir da inauguração da Estrada de Ferro Sorocabana (EFS) em 1875, imigirantes
italianos, espanhóis e de outras nacionalidades são atraídos (Cruzeiro do Sul, 2004) e
o ciclo muar entra em declínio acentuado. Devido ao surto de febre amarela que
atingiu a região no final do século, vitimando centenas na época, o chamado Ciclo
Tropeiro teve o seu fim derradeiro em 1897, quando aconteceu a última feira de
muares de Sorocaba. Ainda que o combate à epidemia tenha sido pioneiro no mundo
(ACADEMIA SOROCABANA DE LETRAS, [200-]) ele não foi suficiente a ponto de
estender o Tropeirismo para o século seguinte, ciclo que vigorou no município durante
150 anos. A população foi quase toda dizimada (ALMEIDA, ALUÍSIO de., 2001).
3.2 Segunda Onda de Desenvolvimento (1750-1897) e suas respectivas
Interferências Socioambientais
Marcos inicial e final: Libertação dos Indígenas (1750) e Fim do Ciclo Tropeiro (1897).
Ciclos econômicos vigentes: Tropeirismo e Industrial.
Interferências socioambientais: Sorocaba tornará-se o eixo geoeconômico entre as
regiões Norte e Sul do Brasil com a Feira de Muares, sendo fonte geradora de 30% do
total de impostos arrecadados na então Província de São Paulo; enquanto que no Ciclo
Industrial o município passará por um processo de modernização com a Estrada de
Ferro Sorocabana e as fábricas têxteis. Nesta onda começarão os impactos
significativos no meio ambiente, que sofrerá com uma intensa exploração de recursos
minerais e florestais; com a queima excessiva de combustíveis fósseis; com a
degradação e contaminação dos solos (policultura) e com a poluição dos lençóis
freáticos; haverá o fim da escravidão e ocorrerá a chegada dos primeiros imigrantes,
que contribuirão no desenvolvimento do território.
Em decorrência da febre amarela que vitimou a população eclodirá nesta fase as obras
de assistência aos necessitados. Com forte representação paulista, a vida pacata de
Sorocaba paulatinamente perderá espaço para dar lugar à frenesi do capitalismo.
Século XX (Industrial/Terceirização)
Figura 7. Bonde da Estrada de Ferro Elétrica Votorantim sobre a ponte do Rio Sorocaba. Domingos
Alves Fogaça, 1931.
Este recorte histórico foi palco de drásticas mudanças na vida do sorocabano. Marcado
pela presença de dois grandes ciclos – Ciclo Industrial e Ciclo da Terceirização, nele
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
12
houve um desenvolvimento expressivo do conhecimento, das engenharias, das
técnicas e da tecnologia.
No século XX a população de Sorocaba passará a ser predominantemente urbana –
isso já em 1920 (Censo 1920 apud BENEVIDES, G., 2013, p. 88) e haverão
progressivas modificações que irão interferir significativamente nos hábitos e
costumes7 (Figura 7) até então existentes no município.8
No início do século vários serviços essenciais ganham forma, impactando
positivamente para a vida do cidadão. Das obras públicas criadas merece destaque a
instalação da rede de água e esgoto (1901); a chegada efetivamente da energia
elétrica (1905); a criação do serviço de bondes elétricos (1915) (Figura 7) e o início
do calçamento das ruas com paralelepípedos (1921).
Em 1929 – ano de chuva intensa no Estado de São Paulo, os sorocabanos irão
presenciar a maior enchente do Rio Sorocaba, onde este eleva-se seis metros do seu
nível normal.
“Os córregos e afluentes encheram e a represa de Itupararanga
precisou abrir todas as comportas. O resultado foi a inundação
de áreas por onde o rio Sorocaba passa em Votorantim e
Sorocaba. Casas desabaram e a água subiu tanto que atingiu a
Estrada de Ferro Votorantim e a ponte da rua 15 de Novembro,
[vias estas que ficaram inteiramente tomadas pela água].”
(Figura 8) (Estadão, 2010)
Figura 8. Rio Sorocaba na enchente de 1929. Acervo: José Rubens Incao.
Principal afluente da margem esquerda do Rio Tietê, em seu trecho urbanizado, o Rio
Sorocaba (formado pelos mananciais Sorocamirim, Sorocabaçu e Una) (Cruzeiro do
Sul, 2005) recebia passeios de barco, banhistas, nadadores, pescadores e servia como
local para a lavagem de roupas pelas donas de casa da época (Figura 9). “Numa
época em que o lazer e a prática esportiva eram necessariamente ao ar livre, suas
águas e margens eram integradas à vida da população” (Cruzeiro do Sul, 2013).
Devido à poluição intensa que sofreu a partir da década de 70, a população foi, pouco
a pouco, desvencilhando-se do Rio, o que foi prejudicial para Sorocaba como um todo.
7 Os costumes antigos rareiam neste período – destacando-se entre estes os de ordem religiosa, enquanto que os costumes típicos populares e os festejos profanos desaparecem. (IBGE, 1958, p. 309).
8 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Enciclopédia dos Municípios Brasileiros - Municípios do Estado de São Paulo. Rio de Janeiro, 1958. XXX v. p. 309.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
13
Figura 9. Mulheres lavando roupa no Rio Sorocaba. Monsenhor Jamil, [20--].
Acervo: José Rubens Incao.
Rodovias serão construídas (destaque para a Raposo Tavares), a zona industrial se
estruturará e a integração aumentará, tendo início assim uma migração populacional,
que começará a ocorrer a partir da década de 60. Ao aumentar a sua expressão
econômica Sorocaba passa a atrair os cidadãos dos mais diferentes municípios,
estreitando suas relações com Campinas e São Paulo, consolidando-se assim um
verdadeiro polo de desenvolvimento.
Em 1964 a administração pública municipal dará vida ao 1° Plano Diretor Municipal, a
ser instituído pela Lei Orgânica Municipal n° 1.438/66 (SANTORO, P. F.; CYMBALISTA,
R.; NAKASHIMA, R., 2005) com o objetivo de delimitar regras para o uso e a
ocupação do solo. Ele representou um verdadeiro avanço no sentido de propiciar
melhores condições de vida ao homem e ao meio ambiente.
A partir de 1980 o comércio volta a ganhar força em Sorocaba, tomando a posição de
destaque das indústrias e inaugurando o período da Terceirização (prestação de
serviços).
Um grande número de empreendimentos públicos e privados irão se instalar na
Sorocaba do século XX, colaborando ativamente na expansão educacional – criação de
escolas e constituição das primeiras universidades; na consolidação de centros de
comércio; na instituição de um parque industrial extremamente diversificado; na
implantação de centros de pesquisa tecnologicamente avançados; na instalação de
uma enorme rede bancária; na vinda de shoppings; e, por fim, na verticalização
urbana (CEZAR, ADILSON et al, 2001).
Outros Processos Relevantes:
Inauguração da Usina Hidrelétrica de Itupararanga – à época a terceira do
Brasil (1914);
Criação do Parque Zoológico Municipal Quinzinho de Barros (1968);
Instalação da UNISO (Universidade de Sorocaba) - a primeira universidade
(1994).
3.3 Terceira Onda de Desenvolvimento (1897-1954) e suas respectivas
Interferências Socioambientais
Marcos inicial e final: Fim do Ciclo Tropeiro (1897) e Rodovia Raposo Tavares (1954)
Ciclos econômicos vigentes: Industrial e Terceirização.
Interferências socioambientais: êxodo rural; maior consumo de recursos naturais;
grande enchente e desaparecimento de costumes típicos – em especial folclóricos.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
14
Nesse período ocorre a consolidação urbana do município, que será marcada pela
presença intensa de atividades fabris. Obras em saneamento e infraestrutura básica
serão efetuadas.
Século XXI (Terceirização)
Figura 10. Área adjacente ao Terminal Santo Antônio, tombada pelo Patrimônio Histórico, porém alterada
para dar lugar ao atual Shopping Pátio Cianê. Autoria pessoal, 2013.
A partir da virada do segundo milênio, Sorocaba começa a sofrer modificações mais
intensas. Transformações que antes eram vagarosas, agora passam a ser rápidas e
bastante impactantes (Cruzeiro do Sul, 2013), no que concerne à um ambiente sadio
e equilibrado.
Identifica-se no período recente um forte e desmedido crescimento urbano (Figura
10), que tem a sua máxima expressão na especulação imobiliária, que vem forçado de
maneira totalmente injusta o homem do campo a deixar suas raízes. O fato que é
verificado por pesquisa do IBGE - que constatou que de 2001 a 2011 as famílias que
viviam na zona rural de Sorocaba diminuíram 5,66%, ao passo que na zona urbana
houve aumento de 16,57% (Cruzeiro do Sul, 2013) - tem suas origens na
administração pública do município, que tem priorizado os interesses de uma minoria
em detrimento da coletividade como um todo.
O Plano Diretor que está em discussão para ser implementado desde 2012, que altera
radicalmente o zoneamento municipal estabelecido em Sorocaba em 2007 (Figura
12), é um claro exemplo disso. Este, se aprovado, reduzirá a zona rural de Sorocaba
de 17,1% para 14% (Cruzeiro do Sul, 2014), flexibilizará as zonas de ocupação
territorial, incentivando assim o processo de gentrificação – ao fomentar a exclusão
social através do deslocamento dos residentes com menor poder econômico para
locais cada vez mais periféricos – e ceifará pela metade a área de preservação
permanente do Rio Sorocaba (apontada em vermelho). A diferença em relação ao
Plano Diretor vigente (Figura 11) é impressionante:
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
15
Figuras 11 e 12. Mapa do Zoneamento Municipal estabelecido no Plano Diretor de 2007 (à esquerda) e nova proposta de Zoneamento Municipal. Mapa de 2013 (à direita).
No que tange a questão da ocupação territorial, além da devastação florestal, o século
XXI traz três questões importantes, que necessitam ser bem trabalhadas e
intervencionadas.
A primeira e mais iniminente é a questão da mobilidade urbana, que tem sido
desconsiderada em sua amplitude, ano após ano, pelos gestores públicos. Ainda que
na questão de ciclovias Sorocaba tenha se portado exemplarmente, incentivando o
uso da bicicleta por parte dos cidadãos (G1, 2013) que deslocam-se na segunda maior
malha cicloviária do país (G1, 2010), no que tange as vias e ao transporte público a
situação está longe de ser considerada ideal.
Sorocaba está cada vez mais estafada de carros, que atrapalham, encarecem o custo
de vida e aumentam os problemas de saúde da população. Sorocaba já possui uma
frota superior a 420.000 veículos - o que dá 0,67 veículo para cada 1 habitante
(URBES, 2014). De 2003 a 2013 a frota veicular de Sorocaba aumentou 6,5% ao ano
(URBES, 2014), em média. O índice expressivo merece sem dúvida nenhuma atenção.
Ao passo que os carros sobrecarregam as vias públicas, com uma média de cerca de 5
milhões de passageiros, o sistema de transporte público encontra-se no limite. Os
ônibus de Sorocaba a cada dia que passa estão mais lotados, mais demorados e mais
custosos (a tarifa hoje está em R$ 3,20, valor que coloca Sorocaba no ranking das
passagens mais elevadas do país), sendo motivo de estresse e insegurança aos seus
municípes.
A segunda questão, por sua vez, compete à geração e destinação de resíduos sólidos.
Com uma produção diária de “460 toneladas de lixo domiciliar, 40 toneladas de lixo
hospitalar e de lixo industrial, além de 750 toneladas de entulho” (MACHADO-HESS, E.
S., 2012, p. 110), Sorocaba não possui em seu território uma área adequada para o
armazenamento e tratamento correto dos lixo doméstico e hospitalar, que são
transferidos para Iperó (SP) e Poços de Caldas (MG), absorvendo internamente
apenas o lixo denominado como entulho, que é transportado para um aterro de
inertes situado na Zona Norte (MACHADO-HESS, E. S., 2012, p. 110). A sensibilização
ambiental; a implantação de um sistema de coleta seletiva abrangente e a adoção de
novas tecnologias são medidas que podem e devem ser incentivadas, bem como a
instalação de um aterro sanitário e industrial local mostra se prudente.
Já a terceira questão diz respeito a condição de Sorocaba enquanto Região
Metropolitana, proposta apresentada em 2005 na Assembleia Legislativa de São
Paulo. A iniciativa sancionada pelo governador Geraldo Alckmin em maio deste ano
(CEPAM, 2014) formaliza o município como polo de desenvolvimento econômico,
delegando a Sorocaba a responsabilidade de promover e impulsionar o
desenvolvimento dos vinte e seis municípios que comporão a Região Metropolitana de
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
16
Sorocaba (Alambari, Alumínio, Araçariguama, Araçoiaba da Serra, Boituva, Capela do
Alto, Cerquilho, Cesário Lange, Ibiúna, Iperó, Itu, Jumirim, Mairinque, Piedade, Pilar
do Sul, Porto Feliz, Salto, Salto de Pirapora, São Miguel Arcanjo, São Roque, Sarapuí,
Sorocaba, Tapiraí, Tatuí, Tietê e Votorantim).
Ao consolidar-se uma Região Metropolitana, Sorocaba passará a receber recursos de
um fundo estadual e dos 25 territórios que estarão na sua área de abrangência.
Governamentalmente a decisão é tida como avanço, contudo, na prática, ela abre um
leque de possibilidades com poder de acarretar uma série problemas. Recém-
constituída, a Região Metropolitana de Sorocaba já traz três grandes questionamentos
a se pensar: a viabilidade da proposta - se os municípios circunvizinhos terão
condições em manter a si próprios e Sorocaba, uma vez que passarão a ser taxados
por integrar a Região Metropolitana; a condição atual de Sorocaba – que apresenta
problemas em áreas vitais como saúde, educação, transporte, segurança, habitação,
cultura e meio ambiente e passará a ser obrigada a suprir a necessidade dos outros
25 territórios que estarão na sua área de abrangência e a efetividade da proposta em
si – que em vez de integrar os municípios poderá centralizar ainda mais Sorocaba,
acumulando aqui recursos demasiados e tornando os outros municípios zonas
periféricas e menos autônomas.
Em razão da sua localização é bem verdade que Sorocaba já exerce uma grande
influência sobre a comunidade adjacente, mas a partir do momento que esta
influência é institucionalizada ela impõe invariavelmente direitos e deveres, que
precisam ser bem observados e administrados, a fim de que se perpetue efetivamente
o desenvolvimento. Logo, longe de ser uma exceção, prevenir deve ser a lei.
Em meio aos problemas e desafios um avanço registrado e que precisa ser ressaltado
é o projeto de despoluição do Rio Sorocaba. Graças a ele gradativamente o Rio
Sorocaba tem recuperado as suas forças, e aos poucos, voltando a reconectar-se com
a população, que hoje já pode praticar a pesca em determinados trechos.
No terceiro milênio nota-se também uma preocupação maior com questões ligadas ao
bem-estar, o que indica um avanço na mentalidade sorocabana. Ao voltar-se para si
mesmo o cidadão tem mais força para ressignificar os seus valores e aspirações, o
que sem dúvida nenhuma corrobora para ações mais assertivas no sentido da
construção de uma sociedade melhor para se viver.
Neste início de século é possível identificar uma expressão avultada dos setores
comercial – shoppings, hipermercados, bancos, lojas de departamento e lojas em
geral; educacional (destaque para a implantação da UFSCAR – Universidade Federal
de São Carlos, que aumentou a oferta universitária local, atraindo estudantes das
mais diferentes regiões do Brasil e lançando as bases para uma cidade universitária);
imobiliário (destaque para os inúmeros loteamentos e condomínios); industrial –
multi-nacionais em geral (destaque para Toyota, JCB e Embraer) e tecnológico
(destaque para a instalação do Parque Tecnológico em 2012 e para a participação
local em diversos segmentos considerados de ponta, como micro-tecnologia, fibra-
ótica, telecomunicações, bateriais automotivas e energia eólica) (Cruzeiro do Sul,
2006), que expandem progressivamente o seu domínio pelas áreas de Sorocaba.
3.4 Quarta Onda de Desenvolvimento (1954-2014) e suas respectivas
Interferências Socioambientais
Marcos inicial e final: Rodovia Raposo Tavares (1954) e Presente (2014).
Ciclos econômicos vigentes: Industrial e Terceirização.
Interferências socioambientais: expansões nos mais diferentes segmentos (Comercial,
Educacional, Imobiliário, Industrial e Tecnológico); crescimento científico-tecnológico;
adensamento populacional; concentração de fluxos de energia; melhoramento do
sistema de drenagem pluvial; pressão na matriz energética; maior geração de resíduos
sólidos; maior concentração de veículos; maior emissão de gases poluentes; poluição
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
17
atmosférica devido ao excesso de queimadas de terrenos baldios; entulho; doenças
respiratórias; uniformização da paisagem – perda de seu valor cultural, patrimonial e
turístico; poluição sonora e visual; empobrecimento do solo (monocultivo); aumento dos
processos de erosão; ocupação de áreas de proteção ambiental; perda acentuada de
áreas verdes nativas9 e desequilíbrio de ecossistemas.10
Em Sorocaba ocorrerá uma explosão populacional a partir da década de 60 e com a
chegada dos bancos haverá a perda de atividades em praças públicas. Haverá aqui
um novo período industrial, que contribuirá para o desaparecimento de costumes
típicos e para a desconexão com o Rio Sorocaba.
4. Conclusão
Por meio da pesquisa foi possível constatar que ao longo dos ciclos de
desenvolvimento econômico Sorocaba sofreu forte pressão que resultou em
mudanças significativas em sua paisagem, reflexo da perda da biodiversidade e
interferência nas relações sociais, na forma dos moradores perceberem e
relacionarem-se com o município.
Na primeira onda de desenvolvimento o Bandeirismo e o Tropeirismo provocaram
interesses na região, levando a ocupação territorial e ao estabelecimento de uma
economia interna. Dentro deste contexto, o impacto ambiental era irrelevante,
diferentemente do impacto social, com o processo de aculturamento e escravidão da
comunidade indígena e a presença de escravos negros.
Na segunda e terceira ondas Sorocaba sofre grande transformação e influência da
industrialização, perdendo muita área verde, segmentando os grupos sociais e
contribuindo com a vulnerabilidade socioambiental do município.
Na quarta onda, com o fortalecimento do setor de comércio, serviços e grandes
investimentos imobiliários, as áreas verdes e as tradições não têm recebido a
merecida proteção por parte do governo, sendo desprestigiadas em favor da
construção de novos empreendimentos.
Assim, é possível afirmar que o município encontra-se em situação de alerta
no que diz respeito ao meio ambiente e que o pilar econômico está se
sobrepondo aos valores culturais e históricos, em razão do pouco apreço das
políticas públicas do município, que comprometem o desenvolvimento sustentável de
Sorocaba e expõem a sua herança cultural ao esquecimento.
Agradecimentos especiais
• Adolfo Frioli (Informações – Gabinete de Leitura Sorocabano);
• Cleusa Torres Correa (Acervo Fotográfico Particular);
• Darci Paula Santos (Informações);
• Davi Deamatis (Secretário de Comunicação da Câmara Municipal de Sorocaba);
• Edimir Mecias Moraes (Informações – Gabinete de Leitura Sorocabano);
• Fernando Tadeu de Oliveira (Acervo Bibliográfico);
• Flavia Maris Gil Duarte (Historiadora do Setor de Arquivo da Câmara Municipal
de Sorocaba);
9 Estudo divulgado em 2012 intitulado "Análise Espacial de Remanescentes Florestais como Subsídio para o Estabelecimento de Unidades de Conservação" revelou que apenas 16,68% do território de Sorocaba tem cobertura de vegetação florestal, índice baixo que é característica incomum em cidades do interior.
10 SOUZA, ADRIANE. Pesquisa aponta escassez de áreas de mata em Sorocaba, SP. G1: online. Disponível em: <http://g1.globo.com/sao-paulo/sorocaba-jundiai/noticia/2012/03/pesquisa-aponta-escassez-de-areas-de-mata-em-sorocaba-sp.html>. Acesso em: 29 out. 2013.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
18
• Jarci Tania Epifania Silva (Informações);
• Jorge Luiz Cerqueira Peixoto (Acervo de Ilustrações Particular);
• José Carlos Malzoni (Informações – Gabinete de Leitura Sorocabano);
• Lucas da Silva Takahashi Toledo (Informações) e
• Murilo Rene Schoeps (Informações).
Referências
Fontes
José Rubens Incao (Funcionário Público da Biblioteca Municipal Infantil);
Andréa Cristine Freire Rezende (Psicanalista);
João Paulo Rodrigues (Gestor Ambiental);
Adilson Cezar (Professor e Diretor do IHGGS de Sorocaba);
Dom José Carlos Camorim Gatti (Monge-sacerdote do Mosteiro de São
Bento);
Paulo André Tavares (Biólogo - Bacharel).
Referencial Bibliográfico
Academia Sorocabana de Letras. Sorocaba foi a primeira cidade do mundo
a vencer a febre amarela. Disponível em:
<http://www.academiasorocabana.com.br/bon01.htm>. Acesso em: 05 dez.
2013.
Agência Estado. Ciclovia paulista vai ligar Votorantim a Sorocaba. G1: online.
Disponível em: <http://g1.globo.com/brasil/noticia/2010/07/ciclovia-paulista-
vai-ligar-votorantim-a-sorocaba.html>. Acesso em: 30 abr. 2014.
AGÊNCIA SOROCABA DE NOTÍCIAS. Sorocaba é a 13ª do país na geração
de empregos. Disponível em:
<http://agencia.prefeiturasorocaba.com.br/noticia/27412>. Acesso em: 10
fev. 2014.
ALMEIDA, ALUÍSIO de. História de Sorocaba para Crianças. Sorocaba:
Editora Ottoni, 2001. 5. ed.
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Projeto de lei
Complementar Nº 33/2005. Disponível em:
<http://www.al.sp.gov.br/propositura/?id=599177>. Acesso em: 29 out.
2013.
BENEVIDES, G. Polos de desenvolvimento e a constituição do ambiente
inovador: uma análise sobre a região de Sorocaba. 2013. 260 f. Tese
(Doutorado em Administração) – USCS - Universidade Municipal de São
Caetano do Sul, São Caetano do Sul, 2013. Disponível em:
<http://www.uscs.edu.br/posstricto/administracao/teses/2012/pdf/TESE_Gust
avo_Benevides.pdf>. Acesso em: 20 out. 2013.
BOFF, LEONARDO. Uma lei de responsabilidade sócio-ambiental?
Disponível em: <http://www.leonardoboff.com.br/site/vista/2011/jan28.htm>.
Acesso em: 23 jun. 2014.
BONORA, MÍRIAM. Novo Plano Diretor reduz área rural de 17% para 14%.
Jornal Cruzeiro do Sul: online. Disponível em:
<http://www.cruzeirodosul.inf.br/materia/543615/novo-plano-diretor-reduz-
area-rural-de-17-para-14>. Acesso em: 30 abr. 2014.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
19
BRASIL. Lei federal 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. Altera, atualiza e
consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências. Diário
Oficial [da República Federativa do Brasil]. 1998. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9610.htm>. Acesso em: 16 mar.
2014.
CÂMARA MUNICIPAL DE SOROCABA. História da Câmara Municipal de
Sorocaba. Disponível em:
<http://www.camarasorocaba.sp.gov.br/sitecamara/historiacamara.html;jsessi
onid=4349bfc1c1073320df05bce8b833>. Acesso em: 09 abr. 2013.
CÂMARA MUNICIPAL DE SOROCABA. História da Cidade de Sorocaba.
Disponível em:
<http://www.camarasorocaba.sp.gov.br/sitecamara/historiasorocaba.html;jses
sionid=c3300631a9ea0fb05fddfce0427b>. Acesso em: 30 jun. 2014.
Catedral Metropolitana de Sorocaba. Nossa Senhora da Ponte. Disponível
em: <http://www.catedraldesorocaba.org.br/nossa-senhora/index.htm>.
Acesso em: 29. mar. 2014.
CENTRO DE ESTUDOS E PESQUISAS DA ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.
Sorocaba é a nova Região Metropolitana de São Paulo. Disponível em: <
http://www.cepam.org/noticias/ultimas-noticias/sorocaba-%C3%A9-a-nova-
regi%C3%A3o-metropolitana-de-s%C3%A3o-paulo.aspx#ad-image-0>.
Acesso em: 23 jun. 2014.
CEZAR, ADILSON. História de Sorocaba - Síntese. Sorocaba: UNISO, 2002.
38 p.
CEZAR, ADILSON et al. Produção de BATISTA, ALEXANDRE, direção de CEZAR,
ADILSON. Sorocaba, IHGGS - Instituto Histórico, Geográfico e
Genealógico de Sorocaba, 2001. CD, 10m26s. Descrição do tipo: som.
Enciclopédia Sorocabana. História de Sorocaba Esquematizada. Disponível
em:
<http://www.sorocaba.com.br/enciclopediasorocabana/index.php/files/?local=t
itulos&tipo=verbetes&ler=1092707299>. Acesso em: 10 abr. 2014.
Enciclopédia Sorocabana. Sorocaba – Resumo Histórico. Disponível em:
<http://www.sorocaba.com.br/enciclopediasorocabana/index.php/?local=titulo
s&tipo=verbetes&ler=1092707050>. Acesso em: 10 abr. 2014.
FUNDAÇÃO SISTEMA ESTADUAL DE ANÁLISE DE DADOS. Memória das
Estatísticas Demográficas - Estatísticas Vitais. Disponível em:
<http://www.seade.gov.br/produtos/500anos/index.php?tip=esta>. Acesso
em: 02 dez. 2013.
G1 São Paulo. Sorocaba, em SP, tem dois veículos para cada habitante. G1:
online. Disponível em: <http://g1.globo.com/sao-paulo/anda-
sp/noticia/2013/07/sorocaba-em-sp-tem-dois-veiculos-para-cada-
habitante.html>. Acesso em: 30 abr. 2014.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Enciclopédia dos
Municípios Brasileiros - Municípios do Estado de São Paulo. Rio de
Janeiro, 1958. XXX v.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Estimativas da
população residente nos municípios brasileiros com data de referência
em 1° de Julho de 2013. Disponível em:
<ftp://ftp.ibge.gov.br/Estimativas_de_Populacao/Estimativas_2013/estimativa
_2013_dou.pdf>. Acesso em: 14. out. 2013.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
20
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Produto Interno
Bruto dos Municípios 2011. Disponível em: <
ftp://ftp.ibge.gov.br/Pib_Municipios/2011/pibmunic2011.pdf>. Acesso em: 10
fev. 2014.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - Cidades. Síntese
das Informações de Sorocaba. Disponível em:
<http://cidades.ibge.gov.br/xtras/temas.php?codmun=355220&idtema=16&se
arch=sao-paulo|sorocaba|sintese-das-informacoes>. Acesso em: 30 set. 2013.
Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Sorocaba - IHGGS. História
de Sorocaba. Disponível em:
<http://www.ihggs.org.br/index2.php?option=content&do_pdf=1&id=107>.
Acesso em: 05 dez. 2013.
Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Sorocaba - IHGGS. História
de Sorocaba. Disponível em:
<http://www.ihggs.org.br/index.php?option=content&task=view&id=350&Ite
mid=119>. Acesso em: 30 abr. 2014.
Jornal Cruzeiro do Sul. Sorocaba 350 anos: Nosso Futuro. Sorocaba: 2004.
156 p.
Jornal Cruzeiro do Sul. A Cidade: Sorocaba de Todos Nós - 351 anos.
Sorocaba: [s.n.], 2005. 212 p.
Jornal Cruzeiro do Sul. A Cidade: O antigo divide espaço com o novo -
Sorocaba 359 anos. Sorocaba: Log&Print Gráfica e Logística S.A., 2013. 116
p.
Jornal Cruzeiro do Sul. A Cidade: Sorocaba é terra de boas notícias –
Sorocaba 352 anos. Sorocaba: GloboCochrane, 2006. 132 p.
JÚNIOR, ARNALDO PINTO. A Manchester Paulista: imagens históricas de
modernidade no município de Sorocaba no início do século XX.
Disponível em: <http://www.ichs.ufop.br/perspectivas/anais/GT0403.htm>.
Acesso em: 03 maio 2014.
MACHADO-HESS, ELIZABETH de SOUZA. Atlas escolar de Sorocaba-SP:
História, Geografia e Ambiente (Anos Iniciais do Ensino Fundamental).
2012. 136 f. Apêndice de Tese (Doutorado em Geografia Humana) -
Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras, e Ciências
Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: <
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8136/tde-12062013-100702/>.
Acesso em: 27 set. 2013.
Portal Guia Escolas. Ora et labora: marco histórico de Sorocaba passa
por restauração. Disponível em:
<http://www.portalguiaescolas.com.br/interna.php?pag=espaco_educacional&
espaco_educacional_id=45>. Acesso em: 30 jun. 2014.
PRATES, MARCO; PREVIDELLI, AMANDA. As 50 melhores cidades do Brasil
para viver, segundo a ONU. Exame: online. Disponível em:
<http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/as-50-melhores-cidades-do-brasil-
para-se-viver-segundo-onu#50>. Acesso em: 10 abr. 2014.
PREFEITURA MUNICIPAL DE SOROCABA. Conheça Sorocaba. Disponível em:
<http://www.sorocaba.sp.gov.br/pagina/238/conheca-sorocaba.html>. Acesso
em: 27 nov. 2013.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
21
REVISTA DE HISTÓRIA DA BIBLIOTECA NACIONAL. Senhor indústria.
Disponível em: <http://www.revistadehistoria.com.br/secao/retrato/senhor-
industria>. Acesso em: 08 abr. 2014.
ROCKWELL, Richard C. Cities and Global Environmental Changes. 1999.
ROSA, JOSÉ ANTONIO. Dez árvores são derrubadas por dia em Sorocaba.
Jornal Cruzeiro do Sul: online. Disponível em:
<http://www.cruzeirodosul.inf.br/materia/461057/dez-arvores-sao-
derrubadas-por-dia-em-sorocaba>. Acesso em: 02 maio 2014.
SANTORO, PAULA FREIRE; CYMBALISTA, RENATO; NAKASHIMA, ROSEMEIRE.
Plano Diretor de Sorocaba: um olhar sobre os atores e a auto-
aplicabilidade dos instrumentos urbanísticos. Disponível em: <
http://www.academia.edu/3137958/Plano_Diretor_de_Sorocaba_um_olhar_so
bre_os_atores_ea_auto-aplicabilidade_dos_instrumentos_urbanisticos>.
Acesso em: 30 abr. 2014.
SECRETARIA DO MEIO AMBIENTE DA PREFEITURA MUNICIPAL DE SOROCABA.
Biodiversidade do Município de Sorocaba. Disponível em:
<https://docs.google.com/file/d/0B-QzcM8Q2OyLNlpXSGZWSTNlNms/edit>.
Acesso em: 20 jun. 2014.
SOUZA, ADRIANE. Pesquisa aponta escassez de áreas de mata em Sorocaba,
SP. G1: online. Disponível em: <http://g1.globo.com/sao-paulo/sorocaba-
jundiai/noticia/2012/03/pesquisa-aponta-escassez-de-areas-de-mata-em-
sorocaba-sp.html>. Acesso em: 29 out. 2013.
WANISE, MARTINEZ. Herança da „grande enchente‟. Estadão: online.
Disponível em: <http://blogs.estadao.com.br/sp-das-enchentes/tag/enchente-
de-1929/>. Acesso em: 10 abr. 2014.
URBES - TRÂNSITO E TRANSPORTES. Sorocaba - Dados estatísticos sobre
Acidentes de Trânsito. Disponível em: <
http://www.urbes.com.br/uploads/file/estatistica/2013/acidentes_site_apresen
tacao_2011-2012-2013.pdf>. Acesso em: 30 abr. 2014.
URBES - TRÂNSITO E TRANSPORTES. Taxas de ocupação veicular e
motorização. Disponível em:
<http://www.urbes.com.br/uploads/file/estatistica/2013/acidentes_site_taxa_
2011-2012-2013.pdf>. Acesso em: 30 abr. 2014.
Anexo (Referencial Teórico)
Para resgate da história de Sorocaba e obtenção de conhecimentos sobre as
diferentes dimensões que compõem a mesma foram realizadas entrevistas
audiovisuais e presenciais com personalidades atuantes na cidade. Neste item estão
transcritas as partes principais das mais de duas horas de material obtido através de
gravação, que contribuiu substancialmente para o entendimento do histórico de
desenvolvimento do município e embasamento desta pesquisa. Segue abaixo os
depoimentos e os seus respectivos enfoques – tendo vista a ocupação dos seus
respectivos depoentes:
Aspecto Cultural
“Eu vejo Sorocaba como uma grande casa. Nós já pegamos essa casa pronta, em uma
época em que o meio ambiente era mais visto como suprimento das necessidades.
Árvore servia pra lenha, pra ferrovia, pras indústrias. É preciso olhar pra cultura, que
é a nossa identidade, quais são os nossos valores, e a partir desses valores construir
em volta dos moradores essa casa ideal, boa e acolhedora.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
22
Sorocaba foi e é uma referência econômica nacional. Com o passar do tempo os
espaços públicos, com o progresso, foram se modificando. Com a chegada dos
shoppings o centro deixou de ser um grande espaço de lazer. Antes de tudo é preciso
que Sorocaba seja uma cidade humana, boa pra toda a população, não pra essa ou
aquela classe, mas pra todos, que o cidadão aqui possa ser satisfeito, feliz e seguro.”
José Rubens (Funcionário Público da Biblioteca Municipal Infantil e Acadêmico da
Academia Sorocabana de Letras)
Aspecto Social
"A questão social abrange a questão da saúde. O aspecto psíquico, emocional, afetivo,
psicológico de uma pessoa. As pessoas estão quebrando o estigma da procura por um
profissional, que antes era visto como uma coisa pra louco, de forma pejorativa; veem
que fazer uso de um tratamento medicamentoso é estar se conhecendo pra melhor se
relacionarem com si, com seus amigos, com sua família, com a natureza e com o
mundo.
Na questão emocional e mental Sorocaba está bem servida. Sorocaba está
preocupada com o bem-estar psíquico. Eu tenho um olhar otimista, que valoriza o
crescimento na cidade: as pessoas cuidando melhor de si, melhor se relacionando
consigo mesmas e assim com o povo, com sua família e com tudo o que abrange o
município, o seu bairro, o social."
Andréa Freire (Psicanalista)
Aspectos Ambientais e Econômico
"Com relação a área de meio ambiente é preciso que se diga que ela ainda é tratada
com desdém. O Mega Plantio que foi realizado na Zona Norte recebeu uma grande
divulgação, saiu em reportagens, mas o peixe que foi comprado não foi o peixe que
foi vendido. Há muita maquiagem nesse sentido.
Sorocaba é uma cidade muito procurada pelas ofertas de emprego: quanto mais
empresas, mais espaços urbanos vão sendo construídos, em contrapartida mais
espaços verdes vão sendo perdidos. Isso acaba trazendo um ônus para a qualidade de
vida de Sorocaba, que é privada de áreas de lazer, verde e é soterrada por mais
veículos.
Até aonde a gente vai chegar não dá pra prever, mas se a gente continuar por esse
caminho certamente não será um lugar muito agradável."
João Paulo (Gestor Ambiental)
Aspecto Cultural
"Sorocaba é uma cidade sui generis no país, porque entre todas elas, as fundadas em
torno do Mosteiro no Brasil, somente Sorocaba apresenta essa história à nós. Ele é o
prédio mais antigo de Sorocaba, em torno dele é que a população cresceu e se
desenvolveu. Todos os mosteiros coloniais que existiam no Brasil desapareceram – só
permanece o Mosteiro de Sorocaba. A cidade precisa se orgulhar do prédio do
monumento que ela tem. Isso não é um próprio da Igreja, da Ordem Beneditina, isso
é um próprio de Sorocaba. Nós aqui somos administradores, nós estamos a serviço do
Mosteiro e do povo para servir o povo, para servir Sorocaba, mas precisamos contar
com os sorocabanos para que de fato o Mosteiro continue em pé, se não ele acaba."
Dom José Carlos (Monge-sacerdote do Mosteiro de São Bento)
Aspecto Histórico
"O conhecimento do nosso processo histórico é vital para o conhecimento de nossa
identidade cultural. A identidade cultural é fundamental para nossas realizações
dentro de um espírito coletivo, comunitário e, portanto, é essencial para passarmos
para as novas gerações.
A medida em que nós avançamos tecnologicamente nós superamos o processo
geográfico. Nós precisamos perceber que a medida em que estamos evoluindo, isto é,
dentro desse sistema de progresso, nós estamos superando a natureza que nos
envolve. Quanto mais capacidade nós tivermos em relação ao domínio do nosso meio
ambiente maior é a nossa responsabilidade para com as futuras gerações."
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática: Sustentabilidade
23
Adilson Cezar (Professor e Diretor do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de
Sorocaba)
Aspecto Geográfico
"Sorocaba é uma cidade relativamente importante do Estado de São Paulo,
principalmente porque ela está próxima de dois grandes centros metropolitanos: São
Paulo e Campinas. Aqui na nossa região nós temos como rio principal o Rio Sorocaba
e a vegetação principal seria a região de transição entre Mata Atlântica e Cerrado.
Com relação ao Plano Diretor de Sorocaba a proposta de 2013 comparada a 2007
nota-se que há uma redução drástica da zona ambiental. Qual o critério que está
sendo utilizado pelos responsáveis do planejamento para definir o zoneamento
sorocabano? Tem lugares que simplesmente eram mais restritivos e se tornaram
menos restritivos. O Plano Diretor é uma ferramenta importantíssima para o
crescimento ordenado e uma gestão mais efetiva, porém cada requisito, cada
zoneamento tem que ser analisado para que se construa algo efetivo e não algo
aleatório ou para benefício de algumas pessoas."
Paulo André Tavares (Bacharel em Biologia)
SUMÁRIO
Introdução....................................................................................................... 2
1. Objetivos................................................................................................... 4
2. Metodologia................................................................................................4
3. Resultados e Discussão................................................................................ 5
4. Conclusão................................................................................................ 17
5. Agradecimentos especiais........................................................................... 17
Referências.....................................................................................................18
Anexo (Referencial Teórico)..............................................................................21
FIGURAS
Figuras 1 e 2. Evolução Territorial de Sorocaba ..................................................... 5
Figura 3. “Elevação de Sorocaba à Vila.” .............................................................. 8
Figura 4. “Encontro de Tropeiros no Caminho para as Minas.” ................................. 8
Figura 5. Fábrica têxtil Nossa Senhora da Ponte ................................................... 10
Figura 6. Estação Ferroviária Sorocabana ............................................................ 10
Figura 7. Bonde da Estrada de Ferro Elétrica Votorantim sobre a ponte do Rio
Sorocaba ......................................................................................................... 11
Figura 8. Rio Sorocaba na enchente de 1929 ....................................................... 12
Figura 9. Mulheres lavando roupa no Rio Sorocaba ............................................... 13
Figura 10. Área adjacente ao Terminal Santo Antônio, tombada pelo Patrimônio
Histórico, porém alterada para dar lugar ao atual Shopping Pátio Cianê. Autoria
pessoal, 2013 .................................................................................................. 14
Figuras 11 e 12. Zoneamento Municipal - Plano Diretor ......................................... 15
QUADROS
Quadro 1. Geografia de Sorocaba ........................................................................ 6
TABELA
Tabela 1. Crescimento Populacional do Município de Sorocaba ................................ 7
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática em Sustentabilidade Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179474 X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
CASA SUSTENTÁVEL PARA A CIDADE DE SÃO PAULO
Sustainable house in São Paulo City Silvia Silva de Lima, Virginia Celia Costa Marcelo
Universidade Anhembi Morumbi - UAM
Escola de Artes, Arquitetura, Design e Moda - Bacharelado em Arquitetura e Urbanismo
[email protected], [email protected]
Resumo. O objetivo deste trabalho é analisar a alvenaria de solo ci- mento e projetar uma edificação unifamiliar que possa ser construída em solo cimento dentro dos critérios da NBR 15220 – Parte 3: Zonea- mento bioclimático brasileiro e diretrizes construtivas para habitações unifamiliares de interesse social. Este trabalho se justificou por se ob- servar no contexto mundial a crescente preocupação com as questões ambientais e a pouca oferta de habitação popular. Buscou-se realizar um estudo dos sistemas construtivos mais utilizados: e discutir sua apli- cação, vantagens e desvantagens. A partir do estudo foi possível eleger dentre os sistemas estudados, a alvenaria de solo cimento como mais adequado para o aprofundamento das informações.
Palavras-chave: sustentabilidade, solo cimento, habitação.
Abstract. The objective of this work is to analyze the soil cement and masonry design a detached building that can be built in cement soil within the criteria of NBR 15220 - Part 3: Brazilian bioclimatic zoning and building guidelines for single-family social housing. This work was justified because they ob-serve the global context of the increasing con- cern about environmental issues and the short supply of public housing. We attempted to conduct a study of the most used building systems: and discuss its application, advantages and disadvantages. From the study it was possible to choose among all the studied systems, masonry cement soil as best suited to developing the information.
Keywords: sustainability, soil cement, housing.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
2
1. INTRODUÇÃO
Segundo o Relatório Brundtland, 1991:
“Para ser considerado sustentável, uma ação deve ter em vista 4 requisitos bá- sicos:
- Ecologicamente Correto
- Economicamente viável
- Socialmente justo
- Culturalmente aceito.”
De acordo com o anexo da Agenda 21, princípio 4: “A fim de alcançar o desen- volvimento sustentável, a proteção do meio ambiente deverá constituir parte integran- te do processo de desenvolvimento e não poderá considerar-se de forma isolada”. O conceito de sustentabilidade, entre outras coisas, está relacionado com o equilíbrio entre desenvolvimento e preservação dos recursos naturais. A preservação ambiental precisa ser considerada no processo de desenvolvimento econômico e tecnológico, afinal o planeta sustenta o desenvolvimento, pois a natureza fornece matéria prima para o avanço da ciência, além de ser nosso habitat e de milhares de outras espécies.
A forma de construir nossas casas também precisa seguir os princípios da sus- tentabilidade, a construção civil é responsável por vários impactos ambientais, entre eles a emissão de gases poluentes, o alto consumo de recursos naturais (energia, á- gua, petróleo) e a geração de uma grande quantidade de resíduos. Os edifícios, por exemplo, são grandes emissores de gases de efeito estufa, com 25% do total global e no Brasil consomem 18% da energia elétrica produzida no país (AGENDA 21 COM- PERJ, 2010). Atualmente os principais métodos construtivos utilizados são: concreto armado, alvenaria, alvenaria estrutural, pré-moldados e pré-fabricados em concreto armados e protendido, estrutura metálica e pré-fabricados em madeira e aço. A maior parte desses métodos precisa de acompanhamento profissional e usam processos ra- cionalizados, geram menos resíduos e, portanto podem ser considerados sustentáveis.
Entretanto, a maior parte das habitações construídas no Brasil é feita através da autoconstrução (GOIS, 1996), que pode ser explicada quando sem condições para comprar um imóvel pronto em áreas urbanizadas, a maioria da população urbana de baixa renda, adquire lotes em áreas periféricas, carentes de infraestrutura e serviços e com a ajuda da família, vizinhos, amigos e em alguns casos pedreiros e mestres de obras, constroem suas casas, o que se entende por um longo período e consome o tempo de descanso desses trabalhadores (RODRIGUES, 1988). A autoconstrução não tem acompanhamento técnico especializado, por isso se utiliza dos métodos que não demandam tanta qualificação na mão de obra, geram mais resíduos, porém o investi- mento é menor. (RAPOPORT, 1989).
Portanto este trabalho se pautou na procura por um método construtivo que atendesse a necessidade ambiental, que pudesse ser facilmente executado, até mes- mo por autoconstrutores, que fosse economicamente acessível às camadas mais po- bres da população e que fosse esteticamente aceito, garantindo assim o atendimento aos pilares da sustentabilidade de acordo com o Relatório Rundtland, 1991.
Após pesquisa concluiu-se que o solo cimento atende aos critérios e é estudado mais afundo no trabalho, que também apresenta um projeto de uma edificação unifa- miliar que pode ser construída utilizando a metodologia construtiva do solo cimento e de acordo com os critérios da NBR 15220.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
3
2. OBJETIVO
Analisar a alvenaria de solo cimento e projetar uma edificação unifamiliar que possa ser construída em solo cimento dentro dos critérios da NBR 15220 – Parte 3: Zoneamento bioclimático brasileiro e diretrizes construtivas para habitações unifamili- ares de interesse social.
3. METODOLOGIA
dos.
Pesquisar diferentes métodos construtivos de baixo impacto ambiental.
Realizar visita em campo para conhecer edificações construídas nestes méto-
Eleger o método que mais se adeque a realidade da autocontrução e a cultura
dos autoconstrutores.
Pesquisar mais profundamente o método escolhido.
Projetar uma edificação unifamiliar que possa ser construída no método esco- lhido e que siga as instruções da NBR 15220 – Parte 3: Zoneamento bioclimático bra- sileiro e diretrizes construtivas para habitações unifamiliares de interesse social.
4. VISITA TÉCNICA
No dia 01 de maio de 2013, visitei o Instituto de Permacultura e Ecovilas da Mata Atlântica – IPEMA, localizado na cidade de Ubatuba, que é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público. A missão do IPEMA é fomentar e difundir a per- macultura para a criação de assentamentos humanos sustentáveis.
O IPEMA vem atuando desde 1999 na conscientização e capacitação de pessoas para as áreas de permacultura, ecovilas, bioconstrução e atividades correlatas. Os cursos são realizados de maneira a estimular a discussão e o debate, na busca de so- luções criativas, originais e apropriadas aos problemas sociais, econômicos, ambien- tais e de políticas públicas.
Através da permacultura, o IPEMA promove em suas ações a ética da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da democracia e de outros valores universais, enco- rajando a experiência, a compreensão e o conhecimento de caminhos para se viver em harmonia com todos e com o planeta.(IPEMA)
Ao chegar no instituto fui recebida pelo engenheiro ambiental e coordenador do centro de permacultura Leonardo Celano Toscano de Britto, que nos direcionou até a sede do instituto e nos contou um pouco a respeito dos projetos sociais do Ipema com as comunidades locais, sobre os princípios e historia da permacultura e sobre como o consumismo afeta o desenvolvimento sustentável. Após nos direcionou para conhecer sobre as construções presentes no Instituto, começou explicando sobre o próprio edifício da sede do instituto (figura1).
O edifício da sede foi projetado pelo arquiteto Marcelo Bueno, também ideali- zador do IPEMA, e é uma construção em madeira reaproveitada dos antigos postes da rede elétrica e o telhado é em telhas feitas a partir do refugo da indústria de embala- gem de pasta de dente, há ainda sistema de captação da água da chuva.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
4
Figura 1 – Edifício Sede do Instituto
Fonte: Autoral
A segunda construção apresentada foi a cisterna (figura 2) que armazena a
água da chuva captada pelo telhado do edifício sede, feita no método ferro cimento, uma técnica que consiste em dar o formato da desejado com malha de laje depois
envolver com tela de galinheiro e saco de batata e pintar uma solução de cimento li- quida e rebocar com cimento. Uma caixa d’água convencional de 2000 litros, atual- mente custa R$ 2.000,00, já esta cisterna, de 4000 litros, feita em ferro cimento cus- tou R$ 300,00.
Figura 2 – Cisterna em ferro cimento
Fonte: Autoral
Após foi apresentada uma construção feita durante um dos cursos ministrados
pelo IPEMA, a residência do João, caseiro do instituto, em pau a pique, cobi com em- basamento e fundação em super adobe, telhado verde com telhas de tubo de pasta de dente. O super adobe consiste em sacos de farinha contínuos vendidos em rolo preen- chidos com terra socada, a desvantagem desta técnica é que em algum momento a
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
5
umidade pode passar para a estrutura e compromete-la, o mais ideal é usar a funda-
ção em pedra. O cobi, semelhante ao pau a pique, mas sem o tramado de bambu, é uma massa mais sólida, leva mais palha e mais areia, fica mais compacta, vira uma pedra depois de seca, esta técnica tem a vantagem de possibilitar a execução de pro- jetos com um traçado mais orgânico. O telhado verde foi feito com três bambus pre- gados quase que nas extremidades das telhas para conter a terra, as telhas foram forradas com lona de caminhoneiro, manta bidim e terra, na parte mais baixa há um rufo revestido com latinhas de alumínio que direciona a água da chuva para uma cis- terna de irrigação.
Falou sobre resistência das comunidades em aceitar os sistemas tradicionais por remeter a um passado sofrido e sobre mecanismos para melhorar a aparência des- tas construções, deixando-as menos rusticas, como o reboco sobre o pau a pique. Foi explicado também que a durabilidade das construções depende muito do cuidado com a execução, para garantir a durabilidade de técnicas como o pau a pique são necessá- rios beirais grandes de 80 cm á 1 m.
Figura 3 – Residência do caseiro João em pau a pique, cobi e super adobe
Fonte: Autoral
Figura 4 – Abertura zenital na residência do caseiro João
Fonte: Autoral
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
6
Após foi apresentada uma edificação que servirá para alojamento dos voluntá-
rios do instituto (figura 5), feita em pau a pique armado com bambu roliço e forro também em bambu com telhado verde. O telhado verde desta casa foi feito de manei- ra diferente, foi colocado primeiramente o bambu do forro, depois papelão para fechar os vãos entre os bambus, lona, terra e grama. Para a pintura das paredes foi utilizada uma solução de água, pó xadrez, cal e argila peneirada. As janelas foram assentadas sobre o bambu.
Comentou alguns aspectos referentes ao aumento da durabilidade do bambu relacionado com a sua colheita, que leva em conta a lua, a altura da lua, calendário astrológico.
Ao entrar na edificação é possível notar a diferença de temperatura com o ex- terior, bem mais agradável.
Figura 5 – Edificação em pau a pique
Fonte: Autoral
Figura 6 – Interior da edificação em pau a pique
Fonte: Autoral
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
7
A próxima edificação que foi visitada foi um edifício de apoio administrativo do
instituto (figura 7) feito em blocos de solo cimento, embasamento em pedra e estrutu- ra em madeira reaproveitada de postes da rede publica.
O solo cimento é uma técnica que utiliza um traço de 10:1, 10 de argila com areia para 1 de cimento, as vantagens é que os blocos não passam por queima e a apenas 3 pessoas podem fazer 300 blocos por dia.
Figura 7 – Edifício em solo cimento
Fonte: Autoral
Figura 8 – Edifício em solo cimento
Fonte: Autoral
Foi apresentada também uma zona de raízes que consome o esgoto do chuvei-
ro e o chorume do banheiro seco. Consiste em um cano ligado a uma bomba perfura- da que dissipa a água por uma superfície maior e as plantas ali presentes consomem essa água.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
8
Figura 9 – Zona de raízes
Fonte: Autoral
Figura 10 - Chuveiro cujo esgoto vai para a zona de raízes
O chuveiro é aquecido pelo sistema de serpentina interligada ao fogão a lenha.
Fonte: Autoral
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
9
Figura 11 – Banheiro Seco
Fonte: Autoral
Após visitamos o banheiro seco e foi explicado seu funcionamento. O banheiro
é elevado e abaixo do assento fica um tambor no qual o recurso humano é depositado, a descarga é serragem, para equilibrar o teor de umidade das fezes e evitar mau chei-
ro, esse banheiro não seve para fazer urinar, pois o teor de umidade pode ficar alto e provocar mau cheiro, neste banheiro há dois assentos, quando um tambor enche, usa o outro assento enquanto espera a água sair do primeiro tambor e ele se transformar em adubo.
Figura 12 - Tambor onde fica armazenado o recurso humano em decomposição
Fonte: Autoral
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
10
Figura 13 – Trançado do bambu na construção de pau a pique que abriga o gerador
Fonte: Autoral
Figura 14 – Gerador hidrelétrico de energia elétrica
Fonte: Autoral
O instituto é autossuficiente em energia elétrica, há um gerador hidrelétrico
que por dia gera 3000 wats/dia, com capacidade de gerar mais.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
11
Figura 15 – Minhocário
Fonte: Autoral
O minhocário é formado por quatro compartimentos, formado de terra, ali é
depositado o restos de alimento e as minhocas ajudam na decomposição e na forma- ção do adubo.
5. MÉTODO ELEITO
Alvenaria de Solo Cimento
De uma maneira geral, a alvenaria pode ser definida como um sistema constru- tivo que consiste na moldagem de unidades (pedras, tijolos, blocos) unidas por um ligante (a argamassa). A alvenaria de pedras, sem dúvida, é um dos mais antigos, sistemas construtivos utilizados pelo homem. Historicamente, o tijolo foi um produto de substituição, utilizado primeiramente em regiões onde havia escassez de pedra natural e madeira.
Segundo Pisani, na história da arquitetura encontram-se há aproximadamente cinco mil anos alvenarias com terra crua e alguns tipos de aditivos e que muitas solu- ções plásticas distintas foram utilizadas com sucesso, podendo este material e suas possibilidades de técnicas construtivas atenderem a vários partidos arquitetônicos, de residências a muralhas.
De acordo com Freire (1976), a utilização do cimento como agente estabiliza- dor de solos teve início nos EUA em 1916, quando foi empregado para solucionar pro- blemas causados pelo tráfego de veículos de rodas não pneumáticas (CASTRO, 2008).
Desde então, o solo-cimento teve grande aceitação, passando a ser utilizado na construção e pavimentação de estradas de rodagem e em vias urbanas, na construção de aeroportos e acostamentos, revestimento de barragens de terra e canais de irriga- ção, fabricação de tijolos, pavimentação de pátios industriais e de áreas destinadas ao estacionamento de veículos, construção de silos aéreos e subterrâneos, construção de casas e pavimentação de estábulos, além de muitas outras aplicações (CASTRO, 2008), como Vila Operária de João Monlevade - MG de Lucio Costa, que utilizou o sis- tema construtivo de pau-a-pique e o painel monolítico de solo-cimento e outras cons- truções em solo cimento ensacado.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
12
Usado inicialmente na confecção de base e sub-base de pavimentos de estrada
no Brasil, o solo-cimento foi utilizado em habitações a partir de 1948, em experiências desenvolvidas pela Associação Brasileira de Cimento Portland - ABCP, que regulamen- tou, fomentou e pesquisou a sua aplicação, levando, em 1941, à pavimentação do aeroporto de Petrolina – PE. A rede pavimentada de solo-cimento no Brasil alcançava, em 1970, a casa dos 7500 quilômetros (CASTRO, 2008).
Apesar dos pontos positivos destacados, no Brasil, o interesse pelo solo cimen- to na construção de habitações (como componente de alvenaria) foi desaparecendo na proporção que outros materiais, na maioria dos casos mais industrializados, surgiam no mercado. Assim sendo, sua utilização é mais expressiva em obras de pavimentação (cerca de 90% das bases de nossas rodovias são de solo-cimento compactado), refor- ços e melhorias de solos e, finalmente, em barragens e contenções (GRANDE, 2003). O descenso deve-se também pelo preconceito cultural que associa às construções em terra a miséria, segundo o arquiteto e urbanista, Fernando Bussoloti (2013) “Da elite às camadas mais populares, as construções com terra são tratadas com preconceito hoje em dia. São ligadas á miséria, a abrigos temporários que não se encaixam nos padrões de uma casa acabada e permanente.”
Descrição
Segundo a norma NBR - ABNT 12253 (2012) o solo-cimento pode ser definido como um produto endurecido, resultante da cura de uma mistura homogênea compac- tada de solo, cimento e água, em proporções estabelecidas através de dosagem, exe- cutada conforme a NBR 12254.
Os componentes do solo-cimento são: cimento, água e solo, podendo ser em- pregados materiais alternativos (plástico, borracha, papel, vidro, resíduos de demoli- ção, rejeitos de produção industrial e outros). A cal também pode ser utilizada no so- lo-cimento como potencializador de suas propriedades e como agente corretivo da acidez do solo (CASTRO, 2008).
Para a obtenção do solo-cimento, o solo é o componente mais utilizado, o cimento entra em uma quantidade que varia de 5 a 10% do peso do solo, o suficiente para estabilizar o solo e conferir as propriedades de resistência desejadas para o composto. Segundo GRANDE (2003), a adição de cimento ao solo permite obter um material com as seguintes vantagens:
• Absorção e a perda de umidade do material não causam variações volumétricas consideráveis;
• O material não se deteriora quando submerso na água;
• Há aumento da resistência à compressão;
• Em consequência de uma menor permeabilidade, é mais durável.
Aio et al. (2004) apud Silveira (1966), afirmam que os principais fatores que afetam as propriedades do solo-cimento são: tipo de solo, teor de cimento, teor de umidade, compactação e homogeneidade da mistura, além de outros fatores como idade e tempo de cura da mistura (CASTRO, 2008).
Segundo a ABCP (1985) – Associação de Cimento Portland, os solos mais are- nosos são os que se estabilizam com menores quantidades de cimento, sendo neces- sária a presença de argila na sua composição, visando dar à mistura, quando umede- cida e compactada, coesão suficiente para a imediata retirada das formas. Praticamen- te qualquer tipo de solo pode ser utilizado, entretanto os solos mais apropriados são os que possuem teor de areia entre 45 e 50%. Somente os solos que contêm matéria orgânica em sua composição (solo de cor preta) não podem ser utilizados (CASTRO,
2008).
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
13
As proporções ideais de cada material no composto do solo-cimento variam de acordo com a composição do solo utilizado (RIBEIRO FILHO et al., 2006). Apesar dos avanços introduzidos nos métodos de dosagem, as pesquisas continuam na tentativa de simplificar ainda mais a metodologia empregada. Nesse contexto tem sido estuda- do um método simples e rápido para dosagem de misturas solo-cimento, baseado na interação elétrica entre as partículas de cimento e de argila contida no solo. Esse mé- todo, denominado de “Método Físico-Químico de Dosagem”, foi proposto pelo “Central Road Research Institute of India” (CHADDA, 1971). Segundo Chadda (1971), em uma mistura solo-cimento, as partículas de cimento comportam-se como eletricamente carregadas, o que aumenta a condutividade elétrica da massa compactada. A intera- ção elétrica entre as partículas argilosas e as do cimento em hidratação, produz rápi- das alterações físico-químicas, resultando em uma substancial variação volumétrica da mistura solo-cimento quando esta se encontra em suspensão aquosa. Assim, com ba- se nas variações volumétricas ocorridas durante o processo de interação do solo com o cimento, pode-se determinar o teor de cimento que leva a uma mistura estável (CAS- TRO, 2008).
O solo-cimento é um material, no qual as características técnicas atendem aos requisitos de desempenho para a aplicação em diversos tipos de serviços, como: base para pavimentos rodoviários e aeroportuários, confecção de tijolos e paredes maciças, blocos para alvenaria, proteção de taludes de barragens de terra, revestimento de canais, etc.
Além disso, NEVES (1989) destaca que o bloco solo cimento, produzido por sistemas manuais ou automatizados, constitui um elemento de viabilidade comprova- da em diversos programas habitacionais realizados tanto por mutirão, como por admi- nistração direta, fato que demonstra a transferência de tecnologia pela fácil assimila- ção dos operadores dos equipamentos e também de mão de obra já familiarizados com o sistema construtivo em alvenaria. (PENTEADO E MARINHO, 2011).
A construção de paredes com solo-cimento pode ser feita a partir de dois mé- todos: de paredes monolíticas e o da produção de tijolos ou blocos prensados. Já a proteção de taludes pode ser feita com a técnica de solo cimento ensacado, também conhecida como "Rip-Rap".
Segundo Ribeiro Filho (2006), as paredes monolíticas são formadas através da compactação do solo cimento dentro de fôrmas próprias e deslocáveis. A compactação do solo-cimento é feita no local da obra, em camadas sucessivas, no sentido vertical.
É necessário molhar as paredes periodicamente durante uma semana para que seja feita a cura adequada e se evitem trincas. A aplicação de chapisco e reboco são dis- pensáveis devido ao acabamento liso e à impermeabilidade do material, sendo neces- sária apenas à aplicação de pintura na parede. (CASTRO, 2008)
Os tijolos de solo-cimento são produzidos utilizando-se prensa manual ou hi- dráulica. A mistura fresca de solo-cimento é colocada dentro de moldes e prensada. Depois de retirado da prensa, o bloco é estocado em local coberto, onde é molhado periodicamente durante uma semana para ser curado adequadamente (CASTRO, 2008). Os tijolos de solo cimento não são queimados como os tijolos comuns, portanto não consomem combustíveis durante a sua fabricação, gerando menos impacto sobre o meio ambiente. Para queimar mil dos tijolos convencionais é necessário 1m³ de ma- deira, o que corresponde a seis árvores médias, a queima emite CO para a atmosfera, o que gera aumento do efeito estufa (PROMPT, 2008).
O solo cimento ensacado conhecido também como "Rip-Rap" pode ser utilizado para proteger superficialmente o talude, geralmente utilizado para obturação das ero- sões, em casos especiais poderá ser utilizado para construir muros de arrimo de gra- vidade, não é indicado para contenção pela baixa eficiência, a não ser que seja segui- do de chumbadores, telas e concreto – projetado (JUNIOR, 2013). Quando o solo é
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
14
colocado dentro de sacos de aninhagem com um coquetel de sementes, o Rip Rap ve-
getativo cumpre sua função de preencher a erosão e ainda irá reflorestar o local e os materiais de intervenção serão incorporados pela natureza.
Vantagens e Desvantagens
Com o solo cimento poupamos também o custo ambiental e econômico do transporte, já que podemos fabricá-lo no canteiro de obras e usamos principalmente matéria-prima local. Além do mais, não há desperdício de material em obra, já que os tijolos quebrados podem ser moídos e reaproveitados (PROMPT, 2008). O uso de tijo- los de solo cimento dispensa acabamento, já que esteticamente o produto final é acei- tável.
Segundo a ABCP (1995), a utilização do solo-cimento na construção de habita- ções permite redução de custos que pode chegar a 40%. Contribuem para isto o baixo custo do solo, que o material usado em maior quantidade, e também a redução dos custos com transporte e energia. Existe ainda a possibilidade de se reduzir os custos com mão-de-obra, pois o processo não requer, em grande número, profissionais espe- cializados em construção (CASTRO, 2008).
Apresentam boas condições de conforto, comparáveis às construções de alve- naria de tijolos e ou blocos cerâmicos, não oferecendo condições para instalações e proliferações de insetos nocivos à saúde pública, atendendo às condições mínimas habitacionais (CASTRO, 2008).
É um material de boa resistência mecânica e perfeita impermeabilidade, resis- tindo às intempéries e à umidade, facilitando a sua conservação. A aplicação do cha- pisco, emboço e reboco são dispensáveis, devido ao acabamento liso das paredes mo- nolíticas, em virtude da perfeição das faces (paredes) prensadas e a impermeabilidade do material, necessitando aplicar uma simples pintura com tinta à base de cimento, aumentando ainda mais a sua impermeabilidade, assim como o aspecto visual e con- forto térmico (CASTRO, 2008).
Desse modo, conforme Grande (2003), o uso dos tijolos de solo-cimento pro- duzidos, por meio de prensas manuais, com aplicações de técnicas simples e soluções viáveis permite o desenvolvimento de componentes de sistemas construtivos com as seguintes vantagens:
Controle de perdas (a alvenaria modular minimiza o desperdício);
• disponibilidade de abastecimento;
• baixo custo em comparação às alvenarias convencionais;
• durabilidade e segurança estrutural;
• funcionalidade de seus equipamentos, permitindo uma operação direta no canteiro de obras, independentemente de sua localidade;
• eficiência construtiva devido ao sistema modular, pelo qual os tijolos são somente
encaixados ou assentados com pouca quantidade de argamassa;
• os tijolos podem ser produzidos com furos internos que permitem a passagem de tubulações sem a necessidade de cortes ou quebras;
• facilidade de manuseio devido aos encaixes, que agilizam a execução da alvenaria;
• baixa agressividade ao meio ambiente, pois dispensa a queima;
• economia de transporte quando produzido no próprio local da obra.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
15
Normas
NBR 12023: Solo-cimento - Ensaio de compactação. 1992. Prescreve os métodos para determinação da relação entre o teor de umidade e a massa específica aparente seca de misturas de solo e cimento, quando compactadas na energia normal.
� NBR 12024: Solo-cimento - Moldagem e cura de corpos de prova cilíndricos. 1992. Prescreve os métodos de moldagem e cura de corpos-de-prova cilíndricos de solo- cimento.
� NBR 16096: Solo-cimento - Determinação do grau de pulverização - Método de en- saio. 2012. Estabelece o método para determinação do grau de pulverização do solo para a execução de base de solo-cimento.
� NBR 12025: Solo-cimento - Ensaio de compressão simples de corpos de prova cilín- dricos. 2012. Estabelece o método de ensaio de resistência à compressão simples de corpos de prova cilíndricos de solo-cimento. Este método aplica-se tanto à determina- ção em laboratório do teor de cimento para a estabilização do solo quanto ao controle da qualidade do solo-cimento na obra.
� NBR 12253: Solo-cimento - Dosagem para emprego como camada de pavimento. 2012. Estabelece os requisitos para a determinação da quantidade de cimento Por- tland capaz de estabilizar solos, para emprego como camada de pavimento de solo- cimento, pela medida da resistência à compressão simples de corpos de prova cilíndri- cos. Esta Norma se aplica aos solos que atendem aos requisitos da ABNT NBR 11798.
� NBR 11798: Materiais para base de solo-cimento - Requisitos. 2012. Estabelece os requisitos para os materiais a serem utilizados na execução de camadas de base de pavimentos de solo-cimento.
� NBR 10834: Bloco de solo-cimento sem função estrutural — Requisitos. 2012. Esta- belece os requisitos para o recebimento de blocos de solo-cimento, destinados à exe- cução de alvenaria sem função estrutural.
� NBR 8492: Tijolo de solo-cimento — Análise dimensional, determinação da resis- tência à compressão e da absorção de água — Método de ensaio. 2012. Estabelece o método para análise dimensional, determinação da resistência à compressão e da ab- sorção de água em tijolos de solo-cimento para alvenaria sem função estrutural.
Equipamentos para fabricação
Prensas manuais
A fabricação de componentes de alvenaria de solo estabilizado tem sua evolu- ção devido ao CENTRO INTERAMERICANO DE VIVIENDA Y PLANEJAMENTO – CINVA (1961) com a criação da “Prensa Cinva-Ram”. Trata-se de uma prensa manual para a produção de tijolos de solo cimento compactado. No Brasil, os tijolos de solo cimento compactados foram pesquisados principalmente pelo IPT (1997a, 1997b, 1978). (GRANDE, 2003)
Desde então, vários fabricantes desenvolveram prensas manuais e hidráulicas para a fabricação de diversos tipos de tijolos e blocos de solo cimento compactado. Segundo FARIA (1990) e VIOLANI (1987), poucos daqueles fabricantes conseguiram permanecer no mercado, pois se constatou um abandono dessa tecnologia devido a um preconceito em relação ao material. (GRANDE, 2003)
O processo de moldagem possibilita manter a regularidade dimensional das faces dos tijolos, conforme a ABCP (1988), implicando em menor consumo de arga- massa de assentamento e de revestimento, isso se houver necessidade, pois a molda- gem permite obter um design diferenciado dos tijolos, possibilitando modulações e
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
16
encaixes que podem reduzir à zero o consumo de argamassa de assentamento
con- forme ASSIS (1995). (GRANDE, 2003)
Atualmente os tijolos de solo cimento podem ser produzidos por prensas ma- nuais ou motorizadas. São encontradas prensas com capacidade de produzir de 300 a 12.000 unidades/dia (GRANDE, 2003). São de fácil manuseio e ocupam espaços pe- quenos, podendo ser instalados em áreas de três a cinco metros quadrados e pé direi- to de dois metros, incluindo os espaços necessários para o abastecimento e operação (PISANI, 2003). Seguem os modelos mais comercializados no mercado brasileiro:
Prensa portátil e manual para a prensagem de tijolos maciços convencionais, de solo cimento. A produção é reduzida e é recomendada para obras de pequeno a médio porte, com consumo de, no máximo, 800 peças por dia. O peso médio é de 40 kg. São fáceis de transportar por serem portáteis e desmontáveis. O espaço ocupado para a utilização do equipamento é de aproximadamente 3 metros quadrados. A pro- dução varia de 60 a 100 peças por hora. (PISANI, 2003)
Prensa manual para tijolos de solo cimento maciços comuns ou com encaixes universais, vazados com furos de 5 cm de diâmetro ou com 5 cm de espessura, 10 cm de largura e 20 cm de comprimento. A mistura de solo cimento, ainda úmida é coloca- da no bocal da prensa e a alavanca é acionada utilizando apenas a força manual. Esta prensa é formada por articulações com rolamentos para que os tijolos moldados man- tenham a forma constante e o molde é preso por intermédio de parafusos, o que per- mite a troca de modelos de tijolos, como por exemplo, os meios tijolos e as canaletas. São prensados dois tijolos por operação. Seu peso é de aproximadamente 80 kg e pa- ra opera-la são necessários três trabalhadores, um abastecendo a máquina, o segundo prensando e o terceiro é o encarregado do preparo da mistura de solo cimento. A pro- dução varia de 200 a 300 tijolos por hora, dependendo das condições locais e da mão de obra. (PISANI, 2003)
Prensa manual para elementos de encaixe universais, com 6,25 cm de espes- sura, 12,5 cm de largura e 25 cm de comprimento, contendo furos internos com 6,66cm. Pode ser acoplada a forma para meio tijolo com 6,25 cm x 12,5 cm x 12,5 cm e forma para canaletas. Pesa aproximadamente 150 kg e é operada por dois trabalha- dores e produz de 150 a 200 módulos por hora. (PISANI, 2003)
Destorradores ou Trituradores
Máquina destinada a destorroar e triturar o solo, formando uma mistura mais homogênea, para que o tijolo resultante seja de melhor qualidade. Minimiza o consu- mo de cimento porque elimina a necessidade de peneiramento do solo. Alguns mode- los podem triturar em média 6 metros cúbicos de solo por dia e possuir motor elétrico de 2 HP. É aconselhável que a mistura seja triturada pelo menos duas vezes para ficar bem homogeneizada. (PISANI, 2003)
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
17
Tipos de Tijolos
No mercado brasileiro são encontrados diversos tamanhos e modelos de tijolos de solo-cimento. Estes são escolhidos de acordo com o projeto, mão de obra, materi- ais e equipamento locais e outras condicionantes especificas. A tabela 1 abaixo rela- ciona alguns tipos: (PISANI, 2003).
Tipo Dimensões Características
Maciço comum 5x10x20 cm
5x10x21 cm
Assentamento com consumo
de argamassa similar dos tijo- los maciços comuns.
Maciços com encaixes 5x10x21 cm
5x11x23 cm
Assentamento com encaixes
com baixo consumo de arga- massa.
½ tijolo com encaixes 5x10x10,5 cm
5x11x11,5 cm
Elemento produzido para que
não haja quebras na formação dos aparelhos com juntas de- sencontradas.
Tijolos com dois furos e encaixes
5x10x20 cm
6,25x12,5x25 cm
7,5x15x30cm
Assentamento a seco com cola branca ou argamassa bem plástica. Tubulações passam nos furos verticais.
½ tijolo com furo e
encaixe 5x10x10 cm
6,25x12,5x12,5 cm
7,5x15x15 cm
Elemento produzido para acer-
tar os aparelhos, sem a neces- sidade de quebras.
Canaletas 5x10x20 cm
6,25x12,5x25cm
7,5x15x30cm
Elemento empregado para e- xecução de vergas, reforços estruturais, cintas de amarra- ção e passagens de tubulações horizontais.
Tabela 1 – Tipos e dimensões de tijolos de solo cimento produzidos no Brasil. (PISANI,2003)
Todos os tipos de tijolos podem ser trabalhados para serem revestidos ou dei- xados aparentes, se forem para serem deixados aparentes é necessário cuidar na prensagem para que as faces externas possuam textura e resistência adequada. As alvenarias podem ser pintadas para ficarem mais protegidas das intempéries. Os tijo- los podem ser totalmente maciços ou de encaixe, com furos, os furos objetivam:
O encaixe, facilitando o assentamento e diminuindo o tempo de execução e a quantidade de argamassa ou cola;
Diminuir o peso das alvenarias, o que diminui o dimensionamento das funda- ções e outras estruturas;
Aumentar o isolamento termo-acústico, pois os furos compõem câmaras de ar no âmago das alvenarias. (PISANI, 2003)
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
18
Produção dos tijolos
A forma de produzir os tijolos de solo cimento varia de acordo com os objetivos de sua utilização (resistência, aparência, pesos, formato, cor, textura, componentes e outros) e de acordo com o processo a ser utilizado (processos manuais, mecânico ou hibrido). Levando em consideração estes aspectos, segundo Pisani, podem-se relacio- nar as seguintes etapas: (PISANI, 2003)
Escolha do tipo de solo segundo as características que se deseja obter:
• Resistência mecânica;
• Resistência à abrasão;
• Impermeabilidade;
• Durabilidade;
• Exigências
estéticas. Outras
propriedades:
• Proporcionar
dosagem econômica;
• Ser abundante o suficiente para atender a demanda;
• Estar próximo ao local de fabrico;
• Não conter gravetos, seixos e pedregulhos em excesso para não comprometer o processo de fabricação. (PISANI, 2003)
Retirada do solo na jazida, pode ser:
• Manual (pás, picaretas e enxadas);
• Motorizadas (retroescavadeira, lâminas ou outras máquinas de terraplanagem). (PISANI, 2003)
Transporte do solo: o material escavado deve ser levado até o local do preparo, e este pode ser:
• Manual (carrinhos de mão, latas, caçambas, etc.)
• Motorizada (caminhões basculantes). (PISANI, 2003)
Preparo do solo:
• Retirada dos gravetos, pedregulhos, seixos rolados e outros materiais que pos-
sam dificultar o amassamento e gerar possíveis patologias no tijolo e consequente- mente nas alvenarias;
• Peneiramento – deve ser feito em peneiras com malhas de 4 a 6 milímetros para que os torrões sejam separados, para que depois de acumulados sejam molha- dos, dissolvidos e após a secagem passarão por novo peneiramento.
• Trituramento – permite uma produção maior e com mais qualidade que o pe- neiramento manual. (PISANI, 2003)
Dosagem: os componentes de um tijolo de solo cimento são:
• Solo devidamente preparado;
• Aglomerante (cimento portland);
• Água potável;
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
19
• Aditivos: nesta faze pode ser adicionado algum tipo de aditivo (corantes, ci- mentos refratários, impermeabilizantes, etc.)
• Outros componentes: podem ser colocados na massa para melhorar algumas de suas propriedades, desde que devidamente dosados após ensaios (agregados miú- dos, escórias ou fibras). (PISANI, 2003)
Amassamento: o amassamento deve ser feito até que a massa esteja totalmente ho- mogênea para que as propriedades dos tijolos se mantenham iguais em todo o volu- me. Este pode ser:
• Manual: revolvendo com pás os componentes em um terreiro, que deverá ser revestido com um tablado de madeira ou em um cimentado. Não deve ser feito sobre a terra para que as ferramentas não retirem o solo local, alterando assim a dosagem;
• Mecânico: por meio de trituradores (não devem ser utilizadas as betoneiras para o preparo do solo cimento);
• Deve-se preparar a quantidade de mistura para, no máximo, uma hora de mol- dagem com o objetivo de manter as propriedades desejadas, devido à cura do cimen- to. (PISANI, 2003)
Moldagem: durante a moldagem devem-se tomar as seguintes precauções:
• Verificar os pré-requisitos da máquina compactadora;
• Limpar as formas de restos de moldagens anteriores;
• Utilizar desmoldante se for necessário;
• Colocar a quantidade de mistura necessária, que será reduzida em até 50% do volume, dependendo das dimensões e forma do tijolo;
• Manter a câmara compactadora sempre limpa para que restos de mistura não danifiquem as moldagens subsequentes,
• Verificar se o local da cura está devidamente preparado para receber as unida- des frescas. (PISANI, 2003)
Cura e estocagem: as recomendações para que o tijolo tenha boa qualidade são:
• Os elementos devem ser empilhados assim que retirados da forma, para que não haja danos oriundos de grandes movimentações com o tijolo ainda úmido;
• O local de armazenamento dever estar totalmente em nível para que os ele- mentos não deformem;
• As pilhas devem manter o número de fiadas de acordo com o peso e formato do tijolo para que não haja sobrecarga nas fiadas inferiores (seguir sempre recomen- dações dos fabricantes de equipamentos, estes costumam indicar pilhas com até um metro de altura). Esta sobrecarga pode deformar o tijolo, tornando-o inutilizável;
• Não é indicada a mobilidade dos tijolos nos três primeiros dias;
• Nos três primeiro dias de cura deve ser pulverizada água sobre os tijolos, de duas a quatro vezes por dia, dependendo da temperatura, mantendo-os umedecidos;
• Não armazenar em ambientes exposto ao vento e ou sol;
• As pilhas podem ser cobertas com lonas plásticas ou impermeáveis durante os três primeiros dias, para minimizar a perda de água;
• Após sete dias o material do tijolo apresenta uma resistência aproximada entre 60 a 65% da resistência de calculo e pode ser transportado e até utilizado com mais cuidados;
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
20
• A cada dia a mais de cura, o tijolo apresenta a resistência maior, podendo ser transportado com mais segurança;
• Após 28 dias a cura está completa e o tijolo apresenta aproximadamente 95% da resistência de cálculo. Este é o prazo ideal para transporte e utilização do tijolo. (PISANI, 2003)
Transporte do tijolo curado: nesta fase, as seguintes precauções devem ser tomadas com o tijolo de solo cimento:
• Deve ser empilhado em nível nos carrinhos de mão ou caminhões;
• Não deve ser arremessado para que não trinque, quebre ou lasque, perdendo o formato perfeito para a modulação. (PISANI, 2003)
Ensaios
De acordo com (FREIRE & BERALDO, 2003), no caso da não existência de um solo adequado próximo ao local da obra, é possível a mistura de solos. Por exemplo, caso haja um solo no local da obra ou próximo dela composto em sua maior parte por argila, é possível adicionar areia, obtendo-se assim o solo arenoso propício para a mistura. O solo adequado para produção de solo-cimento não deve conter material orgânico, como folhas, pedaços de galhos ou raízes. A presença destes pode resultar em inibição ou retardo da reação de hidratação do cimento. A verificação visual da existência ou não de substâncias orgânicas presentes no solo é fácil de ser feita. No entanto, por análise visual, torna-se difícil a percepção da constituição do solo, em termos de quantidades de areia e de argila. O ideal é que sejam feitos ensaios, em laboratório, para determinação da sua granulometria e limites de consistência. Objeti- vando facilitar a verificação, nos canteiros de obras, da adequabilidade do solo para compor misturas de solo-cimento, já que nessas instalações não costumam existir laboratórios, pode-se lançar mão de ensaios práticos, que podem ser realizados in loco, para caracterização expedita do solo:
• Teste da caixa: é o ensaio simplificado para determinação da variação volumé- trica do solo. (ABCP, 1986);
• Ensaio do vidro: este ensaio tem por finalidade a verificação da porcentagem de areia no solo. A percentagem de areia, para que o solo seja adequado para aplica- ção em solo-cimento, deve estar em uma faixa de 50% a 90% (ABCP, 1980);
• Ensaio do bolo: este ensaio é realizado pegando uma porção de solo bastante úmido e fazendo uma bolinha. Esta deve ser colocada na palma da mão e com a outra mão são dados entre 20 e 30 golpes na bolinha, até o momento em que a água aflore, deixando a superfície com aspecto liso e brilhante. Segundo UCHIMURA (2006), o solo será adequado para aplicação em solo-cimento, quando a água aflorar com os golpes e o brilho desaparecer ao pressionar a bolinha levemente com os dedos;
• Ensaio de resistência seca: com o solo bem úmido, são feitas duas ou três pas- tilhas com espessura de cerca de 1 cm e diâmetro variando entre 2 e 3 cm. As pasti- lhas devem secar por dois ou mais dias. Decorrido esse tempo, tenta-se esmagá-las e, segundo ABCP (1984), o resultado desse esmagamento é avaliado da seguinte forma: se for difícil de esmagá-las, o solo possui grande resistência; não sendo difícil o esma- gamento, mas havendo dificuldade ao tentar reduzi-las a pó, o solo possui média re- sistência e; não havendo dificuldade no esmagamento nem na tentativa de redução após, o solo possui baixa resistência. (PENTEADO E MARINHO, 2011)
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
21
6. PROJETO
Localização
O local de intervenção escolhido foi o bairro Jardim São Savério, uma área pe- riférica da região sudeste da cidade de São Paulo, localizada próximo ao Parque do Estado. O local que pertence ao distrito de Cursino e a subprefeitura do Ipiranga e é limítrofe com o município de São Bernardo do Campo.
A principal via de acesso ao local são as avenidas Miguel Stéfano e do Cursino, a Avenida dos Ourives é a via local que corta o bairro e liga a Avenida do Cursino com a cidade de São Bernardo do Campo.
O terreno escolhido fica em uma região de favela, terreno plano com 7,5m de frente por 12m de fundo.
Transporte
O acesso da região pode ser feito através de automóveis particulares e trans- porte coletivo, o bairro é atendido por duas linhas: 4709-10 Vila Mariana – Jardim São Savério e 475-R Terminal Parque Dom Pedro II – Jardim São Savério. O transporte coletivo é alvo constante de reclamações por lotações, inconstância no serviço e má qualidade dos ônibus.
Topografia
A topografia do bairro é bastante irregular, por ser uma área cercada por cór- regos, apresenta grande declividade. O terreno está localizado em uma área de topo de vale, por isso apresenta maior planicidade.
Zoneamento
A área está em Zona Especial de Interesse Social – ZEIS na categoria 1, ou seja, áreas ocupadas por população de baixa renda, abrangendo favelas, loteamentos precários e empreendimentos habitacionais de interesse social ou do mercado popular, nos quais podem ser feitas recuperação urbanística, regularização fundiária, a produ- ção e manutenção de Habitações de Interesse Social, incluindo equipamentos sociais e culturais , espaços públicos e comercio de caráter local. (LEI Nº 13.430, de 13 de se- tembro de 2002)
Partido Arquitetônico
O partido arquitetônico foi baseado nas recomendações da NBR 15220 – Parte 3: Zoneamento bioclimático brasileiro e diretrizes construtivas para habitações unifa-
miliares de interesse social, da qual foi possível extrair as seguintes diretrizes projetu- ais levando em consideração a localização do terreno escolhido para o projeto da casa sustentável:
- A cidade de São Paulo pertence a zona bioclimática 3, sendo assim as estratégias de condicionamento térmico são:
• Aberturas para ventilação: médias - 15% < A < 25% da área do piso.
Sala e cozinha
Área de piso: 32,91m
Área das aberturas: 7,2m
A área das aberturas é 21,88% da área de piso.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
22
Figura 16: Planta sala e cozinhas com dimensões
Fonte: Autoral
Dormitório
Área de piso: 10,23
Área das aberturas: 1,80m
A área das aberturas é 17,6% da área de piso.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
23
Figura 17: Planta dormitório com dimensões
Fonte: Autoral
Dormitório
Área de piso: 12,73
Área das aberturas: 2,80m
A área das aberturas é 22% da área de piso.
Figura 18: Planta dormitório com dimensões
Fonte: Autoral
• Sombreamento das aberturas: permitir sol durante o inverno.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
24
Proposto uso de cobertu- ras retráteis para som- breamento das aberturas no verão e possibilidade de recolhimento nos pe- ríodos mais frios.
Proposto o uso de
persianas embuti- das nas janelas, para ajudar a con- trolar a iluminação natural e sombre- amento da fachada.
Figura 19: Esquema adotado para o sombreamento das aberturas.
Fonte: Autoral
As janelas dos dormitórios foram localizadas na fachada leste para que os moradores possam acordar com a luz solar, além de garantir o resfriamento do dormitório até a noite, uma vez que não recebe a radiação no período da tarde por não estar localizado na fachada oeste. Na fachada oeste foi localizada apenas uma janela sombreada para garantir que o interior da edificação não fique muito quente.
- Vedações externas:
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
25
Tabela2 : Retirada da NBR 15220 – Parte 3: Zoneamento bioclimático brasileiro e di- retrizes construtivas para habitações unifamiliares de interesse social, página 17.
• Parede: Leve e refletora
Considerado do projeto: Vedações em tijolo modular de solo cimento
• Cobertura: Leve e isolada
Considerada no projeto:
Tabela3: Retirada da NBR 15220 – Parte 3: Zoneamento bioclimático brasileiro e dire- trizes construtivas para habitações unifamiliares de interesse social, página 22.
- Estratégias de condicionamento térmico passivo:
• As sensações térmicas são melhoradas através da desumidificação dos ambien- tes. Esta estratégia pode ser obtida através da renovação do ar interno por ar externo através da ventilação dos ambientes.
• Temperaturas internas mais agradáveis também podem ser obtidas através do uso de paredes (externas e internas) e coberturas com maior massa térmica, de forma que o calor armazenado em seu interior durante o dia seja devolvido ao exterior du- rante a noite, quando as temperaturas externas diminuem.
-No verão:
• Ventilação cruzada. A ventilação cruzada é obtida através da circulação de ar pelos ambientes da edificação. Isto significa que se o ambiente tem janelas em apenas uma fachada, a porta deveria ser mantida aberta para permitir a ventilação cruzada. Também deve-se atentar para os ventos predominantes da região e para o entorno, pois o entorno pode alterar significativamente a direção dos ventos. (NBR 15220,
2003).
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
26
Vento predominante na cidade de São Paulo: A primeira predominância anual é a dire-
ção sudeste com 19,6%, a segunda é o vetor Sul, com 16%, e a terceira é a direção Leste, com 8,8%, dados medidos na estação meteorológica do Aeroporto de Congo- nhas entre 1983 e 1992.(ATLAS AMBIENTAL DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, 2000)
Figura 20: Ventilação Cruzada
Fonte: Autoral
- No inverno:
• Aquecimento solar da edificação. A forma, a orientação e a implantação da edi- ficação, além da correta orientação de superfícies envidraçadas, podem contribuir para otimizar o seu aquecimento no período frio através da incidência de radiação solar. A cor externa dos componentes também desempenha papel importante no aquecimento dos ambientes através do aproveitamento da radiação solar. (NBR 15220, 2003).
• Vedações internas pesadas (inércia térmica). A adoção de paredes internas pesadas pode contribuir para manter o interior da edificação aquecido.
Projeto
Ficha técnica
Área total: 81m²
Descrição: 2 dormitórios, banho, sala, cozinha, área de serviço.
Método proposto: Estrutura convencional com fechamento em alvenaria modular de solo cimento. Foi escolhida a estrutura convencional ao invés da alvenaria estrutural em solo cimento, pois para os tijolos de solo cimento alcançarem boa resistência, é necessário acompanhamento técnico e como a autoconstrução é caracterizada pela falta de acompanhamento técnico, conclui-se que por os autoconstrutores dominam as técnicas da estrutura convencional, é mais seguro utilizar-se da estrutura convencio- nal para o projeto.
27
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
N
(])
Rua Memorialde Aires
Figura 21: Planta térreo cotada- sem escala
Fonte: Autoral
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
28
Figura 22:Planta térreo – sem escala
Fonte: Autoral
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
29
Figura 23: Planta 1º pavimento – sem escala
Fonte: Autoral
30
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
Figura 24: Corte AA – sem escala
Figura 25: Corte BB – sem escala
Fonte: Autoral
31
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
Figura 26: Corte CC – sem escala
Fonte: Autoral
Figura 27: Corte DD – sem escala
Fonte: Autoral
32
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
Figura 28: Corte EE – sem escala
Fonte: Autoral
Figura 29: Fachada Norte – sem escala
Fonte: Autoral
33
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
Figura 30: Fachada Leste – sem escala
Fonte: Autoral
Figura 31: Fachada Sul – sem escala
Fonte: Autoral
34
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
Figura 32: Fachada Oeste – sem escala
Fonte: Autoral
7. Conclusão
Foi possível concluir que o solo cimento é um método que pode ser utilizado na construção de casas populares em sistema de mutirão, desde que haja acompanha- mento técnico, que é possível construir de maneira econômica e sustentável e oferecer melhor conforto térmico aos usuários através de estratégias projetuais simples, como as descritas na NBR 15220.
Referências
RELATÓRIO BRUNDTLAND. Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimen- to. Nosso futuro comum. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1991.
AGENDA 21, Anexo. Declaração do Rio de Janeiro sobre o meio ambiente e desenvol- vimento. Disponível em: < http://ecolnews.com.br/agenda21/ > Acesso em: fevereiro de 2012.
AGENDA 21 COMPERJ. Construções Sustentáveis. Disponível em: <http://www.agenda21comperj.com.br/noticias/construcoes-sustentaveis > Acesso em: fevereiro de 2012.
AGENDA 21 PARA A CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL. Tradução de I. Gonçalves. São Pau- lo: D. M. Weinstock, 2000.
GOIS, Ancelmo. Cimento para os pobres. Veja, vol. 1, n 1440, pág. 45, abril de 1996.
RAPOPORT, Amos. House, form and culture. Englewood Cliffs: Prentice Hall, 1969.
ROAF, Susan. Ecohouse: A Casa Ambientalmente Sustentável. Porto Alegre: Bookman,
2006.
35
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
RODRIGUES, Arlete Moysés. A Moradia Nas Cidades Brasileiras. São Paulo: Contexto ,
1988.
ABNT. NBR 15220-3 – Zoneamento bioclimático brasileiro e diretrizes construtivas para habitações unifamiliares de interesse social. Rio De Janeiro: ABNT, 2003.
PISANI, Maria Augusta Justi. Um material de construção de baixo impacto ambiental: O tijolo de solo-cimento. Ae Ensaios. 2003.
CASTRO, Sidcley Ferreira. Incorporação de resíduos de caulim em solo-cimento para construções civis/ Sidcley Ferreira Castro. – Campina Grande, 2008.
GRANDE, F. M. Fabricação de Tijolos Modulares de Solo-cimento por Prensagem Ma- nual com e sem Adição de Sílica Ativa, Escola de Engenharia de São Carlos – USP, São Carlos, 2003.
BUSSOLOTI, Fernando. Como funcionam as construções com terra e adobe. Artigo publicado no portal UOL. Disponível em: < http://ambiente.hsw.uol.com.br/adobe.htm>. Acesso em outubro de 2013.
ABNT. NBR 12253 – Solo-cimento - Dosagem para emprego como camada de pavi- mento. Rio De Janeiro: ABNT, 2012.
SILVEIRA, A. Estabilização de solos com cimento – síntese de notas de aula. EESC –
USP. Publicação 128, p.1-44, 1966.
ABCP – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CIMENTO PORTLAND. Fabricação de tijolos de solo-cimento com a utilização de prensas manuai: prática recomendada. Publicação
ABCP, São Paulo, 1985.
RIBEIRO FILHO, J. N.; SILVA G. C.; LUCENA, K. F. M.; CARVALHO, N. H. C. Projeto
e Execução de Casa Ecoeficiente em Campina Grande –PB. I Congresso de Pesquisa e
Inovação da Rede Norte Nordeste de Educação Tecnológica, 2006.
CHADDA, L.R. A rapid method of assessing the cement requeriment for the stabiliza- tion of soils. IndianConcrete Journal, 45(7): 298-314, 1971).
NEVES, C. M. M. Tijolos de solo-cimento. IN: Dez Alternativas Tecnológicas Para Habi- tação. Brasília. Anais. MINTER/PNUD. p. 141-166. 1989.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
36
PENTEADO, Priscilla Troib .; MARINHO, Raquel Cruz. Análise comparativa de custo e
produtividade dos sistemas construtivos: alvenaria de solo-cimento, alvenaria com blocos cerâmicos e alvenaria estrutural com blocos de concreto na construção de uma residência popular. Departamento acadêmico de construção civil – Universidade Tec- nológica Federal do Paraná, Curitiba, 2011.
RIBEIRO FILHO, J. N.; SILVA G. C.; LUCENA, K. F. M.; CARVALHO, N. H. C. Projeto e Execução de Casa Ecoeficiente em Campina Grande –PB. I Congresso de Pesquisa e Inovação da Rede Norte Nordeste de Educação Tecnológica, 2006.
PROMPT, Cecilia. Solocimento. Curso de Bioconstrução. MMA, Brasilia–DF, p. 36-39,
2008.
JUNIOR, Luiz Antonio Naresi Junior. Solo Ensacado - Rip-Rap. Disponível em: < http:// https://sites.google.com/site/naresi1968/naresi/41-solo-ensacado---rip-rap> Acesso em outubro de 2013.
ABCP – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CIMENTO PORTLAND. Solo-cimento na habita- ção popular. Publicação ABCP, 2 ed., 6p, São Paulo, 1995.
ABNT. NBR 12023 – Solo-cimento - Ensaio de compactação. Rio De Janeiro: ABNT,
1992.
ABNT. NBR 12024 – Solo-cimento - Moldagem e cura de corpos de prova cilíndricos. Rio De Janeiro: ABNT, 1992.
ABNT. NBR 16096 –Solo-cimento - Determinação do grau de pulverização - Método de ensaio. Rio De Janeiro: ABNT, 2012.
ABNT. NBR 12025 – Solo-cimento - Ensaio de compressão simples de corpos de prova cilíndricos. Rio De Janeiro: ABNT, 2012.
ABNT. NBR 11798 – Solo Materiais para base de solo-cimento - Requisitos. Rio De
Janeiro: ABNT, 2012.
ABNT. NBR 10834 – Solo Bloco de solo-cimento sem função estrutural — Requisitos. Rio De Janeiro: ABNT, 2012.
ABNT. NBR 8492 – Tijolo Maciço De Solo-Cimento: Determinação da resistência à compressão e da absorção d´água. Rio De Janeiro: ABNT, 1984.
CENTRO INTERAMERICANO DE VIVIENDA Y PLANEJAMENTO (CINVA). Guia de auto- construción. Bogotá . CINVA. 1961.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
37
FARIA, J. R. G. Unidade de Produção de tijolos de solo estabilizado. Dissertação de
Mestrado, EESC – USP, São Carlos.1990.
VIOLANI, M. A. F. Estabilização do latossolo roxo para a produção de tijolos – a expe- riência de Londrina. Escola de Engenharia de São Carlos . 1987.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CIMENTO PORTLAND. Fabricação de tijolos de solo ci- mento com a utilização de prensas manuais: pratica recomendada. Publicações ABCP, São Paulo, SP.1988.
ASSIS, J.B.S de. Bloco intertravado de solo cimento “tijolito’. In: Workshop Arquitetu- ra da Terra, São Paulo. Anais. NUTAU-FAUUSP. P. 149-162. 1995.
FREIRE, Wesley Jorge; BERALDO, Antônio Ludovico. Tecnologias alternativas de cons- trução. Editora da Unicamp, Campinas, 2003.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CIMENTO PORTLAND. Dosagem das misturas de solo- cimento: normas de dosagem e métodos de ensaio. ABCP, São Paulo, SP.,1980.
UCHIMURA, M. S., Dossiê Técnico – Solo-cimento. Instituto de Tecnologia do Paraná
(TECPAR), 2006.
ATLAS AMBIENTAL DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO. Unidades Climáticas Urbanas da
Cidade de São Paulo. Laboratório de Climatologia, Universidade de São Paulo – USP,
2000.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática em Sustentabilidade Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179474 X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
Soluções práticas para retenção de águas pluviais como medida alternativa para mitigação de alagamentos: Um estudo de
viabilidade aplicado ao bairro do Boqueirão em Santos/SP.
Practical solutions for rainwater retention as an alternative measure to flooding mitigation: A feasibility study applied to the neighborhood of Boqueirão in Santos
/ SP
Hugo Barros 1, Eduardo Antonio Licco2, Olavo Stoeber3
1, 3. Engenheiro Ambiental pelo Centro Universitário Senac 2. Professor do Centro Universitário Senac
Resumo. Os alagamentos localizados ocorrem de forma generalizada, principalmente por
deficiências do sistema de drenagem. No município de Santos, os problemas relacionados
à alagamentos não são recentes, ocorrendo com frequência anual, em maior ou menor
escala, em diversas localidades. O bairro do Boqueirão é um dos que sofrem e
continuarão sofrendo com os alagamentos por não dispor de rede de microdrenagem e
não haver previsão para implantação. Neste contexto, este artigo tem por objetivo
verificar a viabilidade de implantação de mecanismos práticos de retenção das águas
pluviais como medida alternativa para mitigação dos efeitos dos alagamentos ocorrendo
no bairro do Boqueirão. O desempenho das técnicas dos telhados verde, cisternas e
redução da capacidade de escoamento dos sistemas de captação de águas pluviais é
analisado a partir de uma simulação envolvendo um setor crítico do bairro. Os resultados
do estudo mostram ser viável a implantação das técnicas de retenção de água
estudadas, apontando para uma redução de 6% no volume da água acumulada,
suficientes para evitar os alagamentos mais críticos.
Palavras chave: alagamentos, águas pluviais,
Abstract. Localized flooding occurs widely, especially for deficiencies in the urban
drainage system. In the city of Santos, the problems related to flooding are not recent,
occurring on an annual basis in different localities. The neighborhood of Boqueirão, one
of the most important of the city, is one of suffering and will continue suffering from the
floods caused by summer rains due to lack of minor drainage network and no forecast for
implantation. In this context, this paper aims to determine the feasibility of implementing
practical arrangements for retention of rainwater as an alternative measure to mitigate
the effects of floods occurring in the Boqueirão neighborhood. The technical performance
of green roofs, cisterns and reduced flow capacity of rainwater catchment systems is
analyzed from a simulation involving a critical segment of the neighborhood. The results
of the study show the feasibility of the techniques for water retention studied, indicating
a reduction of 6 % in the volume of accumulated water, sufficient to prevent critical
flooding.
Key words: flooding, rain water
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
2
1. Introdução
Com o crescimento da urbanização, crescem as áreas impermeabilizadas, reduzem-se as
áreas verdes e alteram-se as condições climáticas locais, o que implica na ocorrência de
fenômenos como ilhas de calor e precipitações de grande intensidade. (MIOTO, 2011).
Em decorrência da interação entre os diversos fatores da expansão urbana surge, como
relevante problema social e de saúde pública, a questão dos alagamentos provocados
pela intensa impermeabilização do solo urbano. A cidade de Santos é um exemplo típico
de área urbanizada sujeita a alagamentos. Conforme a cidade avançou em seu processo
de urbanização e, como consequência direta, no aumento de áreas impermeáveis, os
sistemas locais de drenagem foram se tornando insuficientes, levando a intensos
alagamentos em alguns pontos da cidade (CBH-BS, 2009).
Conforme consta em relatório da Agência Metropolitana da Baixada Santista (2002),
existem bairros na cidade que ainda não dispõem de sistemas de microdrenagem. Um
deles é o bairro do Boqueirão, um dos mais importantes do município, abrigando
universidades (Universidade Santa Cecília, Centro Universitário Lusíadas), ampla zona
comercial com shoppings centers, bares, padarias, restaurantes e buffets, extensa área
residencial e um dos hospitais mais conceituados do Estado, o Hospital Guilherme Álvaro.
No Boqueirão, quase que anualmente, por ocasião das chuvas de verão, ocorrem
extensos alagamentos (Figura 1) com graves prejuízos socioeconômicos; o último deles
foi registrado em Fevereiro de 2014.
Figura 1: Alagamento na Rua Dr. Oswaldo Cruz, Bairro do Boqueirão, Fonte: BARROS,2012.
Conforme pesquisado pelos autores junto aos órgãos competentes da Prefeitura de
Santos não se espera a curto ou médio prazo, nenhuma obra pública voltada para a
implantação de rede de drenagem na região do Boqueirão que possa evitar ou mesmo
amenizar os alagamentos registrados.
Neste contexto, considerando-se não ser possível evitar a ocorrências de chuvas intensas
durante o verão, nem aumentar a velocidade de escoamento das águas que precipitam
na região do Boqueirão restaria, como solução prática para minimizar os impactos dos
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
3
alagamentos, os mecanismos de retenção da água de chuva e o seu descarte controlado.
Em áreas intensamente ocupadas como o bairro do Boqueirão os mecanismos práticos de
retenção das águas de chuva seriam os telhados verdes, as cisternas para retenção da
água da chuva coletada nos telhados e áreas impermeabilizadas e a redução forçada na
capacidade de escoamento dos sistemas de captação de águas pluviais.
Uma vez caracterizado o problema, este artigo tem por objetivo verificar a viabilidade de
implantação de mecanismos práticos de retenção das águas pluviais, analisando o
desempenho das técnicas dos telhados verde, cisternas e redução da capacidade de
escoamento dos sistemas de captação de águas pluviais, a partir de uma simulação
envolvendo um setor crítico do bairro do Boqueirão.
2. Conceitos
Os alagamentos são decorrências previsíveis da relação entre perigos naturais (chuvas
fortes, marés altas e frentes frias), extensa população exposta e elevada vulnerabilidade
da cidade a chuvas intensas (ausência de drenagem eficiente). Conforme explica Licco
(2013) “Para reduzir o risco de desastres, é importante reduzir o nível de vulnerabilidade
e manter a exposição ao perigo em um mínimo como, por exemplo, realocando
populações e propriedades” (Figura 2). Todavia, nem sempre é factível interferir com as
populações, (relocações) ou mesmo reduzir as vulnerabilidades (neste caso, com a
implantação de sistemas de drenagem). Embora complexo é possível todavia, reduzir
indiretamente, a intensidade do perigo, não interferindo com a precipitação em si, mas
captando parte da chuva que cai e retendo-a até que a precipitação se reduza a índices
suportáveis.
Figura 2: Perigo, exposição e vulnerabilidade. Na impossibilidade de evitar a exposição, ou reduzir a vulnerabilidade, resta reduzir o perigo em sua intensidade.
Fonte: LICCO, 2013.
Tecnologias práticas para retenção de águas pluviais
Cisternas. A tecnologia de cisterna é uma forma básica e popular de retenção de água
pluvial. A água da chuva é captada através do escoamento da mesma pelo telhado das
residências ou construções, passando pelas calhas e caindo direto na cisterna que tem
como função o armazenamento dessa água precipitada (MINISTÉRIO DE
DESENVOLVIMENTO SOCIAL, 2013).
Sabe-se que as cisternas tem grande importância na captação de água de chuva, tendo a
água captada utilização para fins não potáveis como irrigação de jardins, lavagens de
pisos, descargas e limpeza em geral.
As cisternas nem sempre são utilizadas para captação da água da chuva para ter fins de
uso. Muitas vezes podem funcionar apenas como retentores, com as funções de
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
4
armazenamento temporário e liberação controlada da água para as galerias pluviais após
o término da chuva.
A norma ABNT NBR 15527 – Aproveitamento de coberturas em áreas urbanas para fins
não potáveis estabelece os requisitos necessários para realizar um projeto de
aproveitamento de água de chuva de coberturas em áreas urbanas. Esse aproveitamento
é para fins não potáveis, podendo a água acumulada ser aproveitada na lavagem de
pisos, em espelhos d’água, irrigação de jardins, descargas em bacias sanitárias, lavagem
de veículos e usos industriais.
Para concepção do sistema de aproveitamento de água de chuva é preciso atender as
normas ABNT NBR 5626 (Instalação Predial de Água Fria) e ABNT NBR 10844
(Instalações Prediais de Águas Pluviais). Para que o estudo possa ser realizado é
indispensável que conste o alcance do projeto, a população que utilizará a água de chuva
e a determinação de volume trabalhado, definido pelo projetista. Para isso é necessário
que haja a série histórica de precipitação do local onde será implantado o projeto. As
coberturas horizontais, por exemplo, tem de ser projetadas de forma a não possibilitar o
empoçamento. Isto se aplica para lajes projetadas que sejam impermeáveis e que
tenham uma acumulação temporária. A laje deve ainda possuir uma declividade de
0,5%, garantindo assim o escoamento da água até os pontos de drenagem que devem
ser múltiplos. Para dimensionamento do reservatório é necessário considerar que o
volume de água de chuva aproveitável depende do coeficiente de escoamento superficial
da cobertura, bem como da eficiência do sistema de descarte do escoamento inicial.
Sistema de Retenção e Descarte Controlado. Essa tecnologia possibilita a retenção
de água em lajes. É possível através desse método represar uma quantidade mínima de
água, de forma a não comprometer a construção. Esse armazenamento tem como
objetivo represar água com uma profundidade de cinco centímetros em média (PROSAB,
2009). Com essa característica de acumular água temporariamente, o sitema de redução
na velocidade de descarga, também conhecido como estrangulamento, pode reter a água
de chuva até que o evento de precipitação tenha acabado, liberando posteriormente a
quantidade de água retida para as galerias pluviais (PROSAB, 2009).
Telhados Verdes. “Denomina-se telhado vivo ou verde, aquele no qual há utilização de
vegetação para cobrir edificações, com impermeabilização e drenagem adequadas”
(GRAMACHO, BARROSO, MACHADO, et al 2013). De acordo com Costa, Costa e Poleto
(2012), o conceito telhado verde foi concebido com o valor estético, no qual o Jardim
Suspenso da Babilônia é o registro mais antigo de vegetações que foram implantadas em
construções.
O interesse atual no uso de telhados verdes está na diminuição do escoamento
superficial da água de chuva e no combate às ilhas de calor no meio urbano (USEPA,
2008). Segundo a Environmental Protection Agency (USEPA), um dos maiores benefícios
dos telhados verdes é justamente a questão de absorver volumes de água de chuva e
com o tempo liberá-los em um ritmo controlado e reduzido, desempenhando um papel
para amenizar os impactos dos sistemas de drenagem nos grandes centros urbanos. A
USEPA considera ainda que o telhado verde promove uma melhoria na qualidade do ar e
da água e supre a necessidade de sistemas de aquecimento e refrigeração nas
edificações, tendo assim uma significância alta para o desenvolvimento sustentável no
meio urbano.
Segundo testes realizados por Costa, Costa e Poleto (2012), foram comparados dois
protótipos, um sem cobertura vegetal e o outro com telhado verde. Com os experimentos
foi possível perceber que quando há obstáculos, no caso a vegetação do telhado verde, o
pico de vazão é menor, levando a uma probabilidade menor de geração de enchente. Por
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
5
conta desses ensaios, é possível afirmar de que a possibilidade de uso de telhados verdes
para reter e retardar águas pluviais é viável, servindo como solução alternativa para as
questões de alagamentos.
A estruturação do telhado verde em uma laje exige que a mesma seja impermeabilizada.
A camada impermeabilizante tem a função de proteger a laje conta infiltrações, evitando
assim problemas estruturais. É necessário que haja uma camada drenante, com a função
de drenagem da água da chuva, permitindo que o excesso de água escoe, além de servir
como filtro, separando os poluentes.
Uma parte importante do sistema é a vegetação que pode variar de gramíneas até
plantas ornamentais. A escolha da vegetação vai de acordo com o objetivo do telhado e a
preferência deve ser pela vegetação regional por conta de costume com o clima. Neste
contexto, existem 3 tipos de telhados verdes: extensivos, semi-intensivos e intensivos.
Os intensivos tem como objetivo comportar plantas de nível médio e grande; os
extensivos tem como foco maior ser um espaço visitado ou visto por pessoas e é
formado por gramado e os semi-intensivos unem a característica dos intensivos e
extensivos.
No presente estudo a escolha feita foi pelo telhado verde extensivo, considerando a baixa
manutenção, a necessidade de uma estrutura menos elaborada, pesar menos em relação
aos outros dois e seu custo ser menor.
3. Metodologia
O método utilizado no desenvolvimento deste estudo estimativo envolveu o levantamento
da séria histórica de chuvas no município de Santos e a distribuição dos pontos de
alagamento, obtidos junto à Prefeitura Municipal e Defesa Civil. Após a aquisição de tais
dados, passou-se à etapa de correlacionar as intensidades de chuva com os episódios de
alagamento, obtendo-se uma estimativa da intensidade necessária, para o
desencadeamento dos episódios registrados.
Para o cálculo do desempenho das técnicas escolhidas para retenção da água de chuva
definiu-se uma área (setor) de interesse no bairro do Boqueirão. Para tanto trabalhou-se
uma sub-área, com dimensões de 500 por 500 metros, definida por suas características
de ocupação socioeconômica, por não possuir sistema de microdrenagem (conforme
informado pelo PRIMAC) e por ser duramente afetada nos eventos de alagamento. Esta
segmentação não afeta o desenvolvimento do trabalho em si uma vez que a escolha da
“área de telhado” (área de captura da água da chuva) não se altera significativamente
trabalhando-se com o total do bairro ou com uma fração dele, considerando-se a
homogeneidade de ocupação do solo.
A sub-área de estudo apresenta uma adequada diversidade de edificações (o que permite
a combinação de mais de uma tecnologia) e um grande fluxo de pessoas devido a
presença de centro comercial, universidades e escolas, hospitais além de moradias
(figura 3).
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
6
Figura 3: A sub-área de 500x500 metros no Bairro do Boqueirão utilizada para a simulação feita. Fonte: Google Earth, adaptado pelos autores, 2013.
A Figura 4 mostra a seleção dos telhados seguindo critérios de compatibilidade com as
três tecnologias pretendidas. O sistema baseado na captação e armazenamento em
cisternas é possível para a maioria dos telhados tradicionais de duas quedas (também
conhecidos como duas águas) mais comumente encontrados1. Em relação aos sistemas
de retenção e para telhado verde se faz necessário a menor inclinação possível,
preferencialmente lajes planas.
No caso dos sistemas de retenção, a laje será utilizada como reservatório temporário
para o descarte controlado posterior ao episódio de precipitação.
1 Além deste fator, deve ser considerado também, a disponibilidade de área útil no terreno na edificação para a
colocação das cisternas.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
7
Figura 4: Disposição dos mecanismos de retenção de águas pluviais.
Fonte: Google Earth, adaptado pelos autores, 2013.
4. Resultados
Frequências e intensidades de chuvas
Com base nos dados de precipitação obtidos junto a Defesa Civil de Santos, foi possível
estabelecer as frequências de chuvas que precipitam em Santos e suas diferentes
intensidades (Figura 6). O período de pertinência dos dados foi de 3 anos, de 2010 à
2012.
De acordo com dados associando intensidade de chuva e ocorrência de alagamentos
relevantes em Santos, são necessárias chuvas com intensidade de 65 mm/h ou mais.
Esta informação merece cuidados considerando a fragilidade do sistema de coleta e
processamento de dados pluviométricos disponíveis para o município de Santos2. Por esta
razão optou-se pelo levantamento de informações sobre alagamentos e intensidade
chuvas do bairro do Boqueirão, chegando-se ao valor de 95 mm/h. Para tanto os autores
entrevistaram alunos e funcionários da Universidade Santa Cecília e do Centro
Universitário Lusíadas para identificar os dias em que houve alagamentos no local nos
últimos 3 anos e a precipitação registrada.
2 Observou-se que em datas com registro na Defesa Civil de Santos de precipitação zero há anotação de alagamentos e datas com precipitações superiores a 150 mm de chuvas não há registros de alagamentos
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
8
Figura 6: Frequência de Chuvas em Santos de 2010 à 2012. Fonte: Os autores a partir de dados da Defesa Civil de Santos, 2013.
A figura 7 mostra a curva acumulada de precipitações no município de Santos indicando
que precipitações na casa dos 95 mm (seta azul) têm probabilidade de ocorrência menor
do que 2,7%.3
Figura 7: Curva acumulada de precipitação em Santos/SP. Fonte: Os autores a partir dos dados da Defesa Civil de Santos, 2013.
3 Os dados obtidos foram colocados em ordem decrescente por faixa de precipitação, calculando-se a probabilidade
individual de ocorrência de cada uma delas.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
9
Áreas passíveis de captação da água da chuva
A área possível de captação da água de chuva foi obtida levantando-se a “área de
telhado” dentro do perímetro da sub área de 500 por 500 metros. O resultado obtido foi
de 22.794,59 m2, assim distribuídos:
Área total viável para aplicação da técnica da vazão diminuída:
3153,22 m2;
Área total viável para aplicação da técnica de telhados verdes:
7707,19 m2;
Área total viável de telhado para captação e retenção da água em cisternas4:
11.934,18 m2.
Em se considerando o limite de captação de 60 mm/h de precipitação que sugere a
legislação estadual (Lei 12526/07) seriam retidos, no máximo
22794,59m2 x 0,060m = 1.368m3/h
frente a uma precipitação de
250.000m2 x 0,095m = 23.750m3/h
o que representaria uma redução efetiva de
(1368/23750) x100=5,8%
no volume de água precipitada.
Desempenho das técnicas de controle
Como desempenho teórico das técnicas de controle analisadas com vistas à mitigação de
alagamentos na área em estudo, verifica-se que a área viável de telhado para retenção
da água de chuva seria suficiente para reduzir cerca de 6% do volume precipitado, o que
reduziria uma precipitação real de 95 mm/h para uma virtual de 89 mm/h (Figura 7, seta
verde), insuficientes para causar alagamentos. Com a adoção dessa solução a
precipitação crítica passaria de 95 mm/h para 101 mm/h (Figura 8, seta vermelha) e a
probabilidade de ocorrência de alagamentos para 2,2%.
4. Análise e Considerações
Em face dos resultados obtidos a aplicação de mecanismos práticos de retenção das
águas precipitadas para a mitigação de alagamentos na área contemplada mostra-se
factível. Embora a redução obtida tenha sido pequena ela se mostrou suficiente para
reduzir os impactos das precipitações extremas.
Apesar de existir viabilidade técnica, não se pode garantir a adesão da população para a
implantação de tais soluções, primeiramente pela frequência das ocorrências, segundo
pela falta de incentivo governamental para tanto e terceiro por envolver um investimento
que popularmente é entendido como dever de estado.
Deve-se destacar que para um combate eficaz aos focos de alagamento que ocorrem em
Santos, há a necessidade de se integrar os sistemas de retenção com uma adequada
implementação e manutenção dos sistemas de micro e macrodrenagem. Além disso é
necessária a busca de melhorias nas questões administrativas do município como o
desenvolvimento de um plano de expansão urbana coerente com as características da
cidade e políticas públicas mais eficientes.
4 Esta é a área efetivamente possível de ser utilizada, considerando-se na sua escolha a
disponibilidade de área para implantação das cisternas.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
10
Figura 8: Curva acumulada com precipitações real, virtual e crítica.
Fonte: Elaborado pelos autores com base nos dados da Defesa Civil de Santos, 2013.
Não menos importante na condução desta problemática é a necessidade de otimização
na obtenção e confiabilidade dos dados pluviométricos na cidade. Atualmente a coleta de
dados vêm de uma única estação o que em parte compromete a significância das
informações deles decorrentes Soma-se ainda que a interpretação realizada pelos órgãos
responsáveis é extrapolada para toda a área insular de Santos, descaracterizando assim
as peculiaridades de cada bairro e como consequência dificultando estudos que atendam
de maneira satisfatória as necessidade específicas.
Por fim, apesar da viabilidade dos mecanismos de retenção, a aparente intensificação nas
precipitações e em suas frequências tende a cancelar, com o tempo, os ganhos obtidos
com a captação das águas de chuvas. O tempo de retorno para chuvas maiores ou iguais
a 95 mm por hora são estimadas pelo DAEE, para Santos, em 20 anos, mas
efetivamente, têm ocorrido com frequência quase que anual, o que invalida as projeções
feitas pela Prefeitura local em termos de investimentos em infraestrutura de drenagem.
6. Referências
AGEM, Agência Metropolitana da Baixada Santista; CBH-BS, Comitê da Bacia Hidrográfica
da Baixada Santista Relatório Síntese – Plano de Bacia Hidrográfica 2008-2011./
Comitê da Bacia Hidrografica da Baixada Santista – São Paulo, 2009.
AGEM, Agência Metropolitana da Baixada Santista. Relatório Final - Programa
Regional de Identificação e Monitoramento de Áreas Críticas de Inundações,
Erosões e Deslizamentos – PRIMAC Região Metropolitana da Baixada Santista –
RMBS./ Agência Metropolitana da Baixada Santista – São Paulo, 2002.
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística - Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014 Edição Temática em Sustentabilidade
11
COSTA, Jefferson da; COSTA, Anderson; POLETO, Cristiano. Telhado Verde: Redução e
Retardo do Escoamento Superficial. REA - Revista de Estudos Ambientais: FURB,
Blumenau, v. 2, n. 14, p.50-56, 01 jul. 2012. Anual. Faculdade Regional de Blumenau (.
Disponível em: <http://proxy.furb.br/ojs/index.php/rea/issue/view/251>. Acesso em: 05
ago. 2013. Costa, Costa, Poleto (2012) ou (COSTA; COSTA; POLETO, 2012).
GRAMACHO, Bruna Bastos; BARROSO, Felipe Kreuts; MACHADO, Márcio Ferreira.
Construção Sustentável: Soluções para construir agredindo menos o Ambiente.
Caderno de Graduação: Ciências Exatas e Tecnológicas, Aracaju, v. 1, n. 16, p.97-110,
01 mar. 2013. Anual.
LICCO, Eduardo A. Vulnerabilidade Social e Desastres Naturais: Uma Análise
Preliminar Sobre Petrópolis, Rio de Janeiro. InterfacEHS, vol. 8, n. 1, 2013.
MIOTO, Ricardo. Aquecimento Global faz Garoa virar Temporal. Disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1301201122.htm. São Paulo, SP,
13/01/2011. (acessado em 09/2013).
PMS, Prefeitura Municipal de Santos. Relatório R4 – Proposta do Plano Municipal
Integrado de Saneamento Básico./ Prefeitura Municipal de Santos – Santos, 2010.
PROSAB. Manejo de Aguas Pluviais Urbanas/ Antonio Marozzi Righetto (coordenador).
Rio de Janeiro: ABES, 2009
SILVIA, Vera Lúcia Pereira de Azevedo; FONTANINI, Patricia Stella Pucharelli. Aplicação
de conceitos enxutos e sustentáveis no processo de projeto das edificações –
Telhado Verde. Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178, 25 e
26 de setembro de 2012.
U.S.Environmental Protection Agency (EPA). Green Roof 1595 Wynkoop Street.
US.EPA, 2009. Disponível em:
http://www.epa.gov/region8/greenroof/documents/EPAGreenRoof_factsheet.pdf
(acessado em 09 set. 2013).
Iniciação - Revista de Iniciação Científica, Tecnológica e Artística Edição Temática em Sustentabilidade Vol. 4 no 2 - Agosto de 2014, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2179-474X © 2014 todos os direitos reservados - reprodução total ou parcial permitida, desde que citada a fonte portal de revistas científicas do Centro Universitário Senac: http://www.revistas.sp.senac.br e-mail: [email protected]
Avaliadores Ad-Hoc
Alcir Vilela Junior
Alessandro Augusto Rogick Athiê
Alexandre Saron
Célio Takashi Higuchi
Claudia Coelho Hardagh
Daniela Nunes Figueira
Eduardo Antonio Licco
Estéfano Semene Gobbi
Everton Bonturim
Fábio Rubens Soares
Gustavo Alves Andrade dos Santos
Hélio Cesar Oliveira da Silva
Ingrid Schmidt Hebbel Martens
Luiz Alexandre Kulay
Maria Aparecida Cruz Constatino
Maria Eduarda Araújo Guimarães
Marselle Bevilacqua Amadio
Reinaldo Azevedo Vargas
Renato Arnaldo Tagnin
Rodrigo de Freitas Bueno
Valéria Cássia dos Santos Fialho