REVISTA NOSSA TRIBO Nº 7 - NOVEMBRO/DEZEMBRO 2013

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Um Ponto de Vista Cultural

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no território

O escritor cabofriense Célio Mendes Guimarães já tem data marcada para o lançamento de seu centésimo livro: dia 3 de março de 2014, no Charitas. Como a data ficou um pouco distante, Célio Mendes deverá lançar também o seu centé-simo primeiro livro. Os títulos são os seguintes: “Controvérsia”, reflexões, e “Lembrança da vida inteira”, poesia.

Curso de formação de atores

O centésimo livro

Foto: José Correia | Arquivo

Academia de Teatro Laboratório, ACATELA, é um curso de for-mação de atores aplicado pelo instrutor especialista no tema Anderson Macleyves e equipe, ba-seado nos métodos do laboratório de Jerzy Grotowski e Biomecâni-ca. As inscrições já estão abertas para vagas em 2014. Segundo a Academia, os interessados devem enviar um breve currículo e pedi-do de inscrição para o endereço [email protected]. Início das aulas: 12 de janeiro de 2014, aos domingos, das 10h às 13h. A Academia de Teatro Laboratório informa que a men-salidade tem valor popular e o curso é destinado para maiores de 15 anos, sem limite de idade. O curso dá direito a Certificado e Montagem Final de Espetáculo.

Divulgação

AconteceNo dia 14 de dezembro, Ernes-to Galiotto inaugura um Espa-ço Cultural no bairro Jacaré, em Cabo Frio.

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Ideias voandoPara lembrar os 398 anos de fundação de Cabo Frio, publicamos textos que abordam temas que vem construindo a nossa formação: o esquecimento de vultos históricos, a contribuição de livros de pesquisa da história como o clássico “Cabo Frio histórico-político” de Hilton Massa, as novas informações sobre a vida de nossa grande figura literária Teixeira e Sousa e o polêmico tema da construção civil na economia local.Saúde também é assunto cultural. Dr. Wilnes responde a quatro perguntas sobre o livro que acaba de lançar: alimentação saudável para um coração saudável.E nesta edição de novembro/dezembro um presente para a nossa tribo de leitores: uma entrevista com o genial poeta e letrista da MPB, o cabofriense Abel Silva (“só uma coisa me entristece/ o beijo de amor que não roubei”).

7NOSSOS CLÁSSICOS: HILTON MASSA, PESQUISADOR QUE SE PREOCUPAVA EM MANTER A MEMÓRIA DE CABO FRIO

10VULTOS HISTÓRICOS DE CABO FRIO ESTÃO ESQUECIDOS. A CONSTATAÇÃO É DE LUIZ CARLOS DA CUNHA SILVEIRA

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4 ENTREVISTA: ABEL SILVA, POETA CONSAGRADO DA MPB, FALA DE CABO FRIO E DE OUTROS TEMAS

LIVRO: O CARDIOLOGISTA ANDERSON WILNES EXPLICA PORQUE É POSSÍVEL CONCILIAR O PRAZER GASTRONÔMICOCOM UM CORAÇÃO SAUDÁVEL

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14A PESQUISADORA ROSE FERNANDES ESTÁ REESCREVENDO A HISTÓRIA DA VIDA DE TEIXEIRA E SOUSA

CNPJ 17.924.249/0001-96

Circulação restrita aos membros da tribo.

NOSSA TRIBONOSSA TRIBOIdéia, Projeto Gráfico e Editoria: José CorreiaEndereço: [email protected] www.facebook.com/RevistaNossaTriboFechamento: Nômade Artes Gráficas, Cabo FrioImpressão: Grafline, Rio de JaneiroCapa e página 18: Júlia Quaresma.

ASSINATURADE NOSSA TRIBO: QUEROGARANTIR O MEU NÚMERO

6 (SEIS) números + entrega por R$ 30,00 (trinta reais).Como faço para pagar?Faça o depósito na seguinte conta:Banco do Brasil, Agência: 0150-3Conta corrente: 32182-6Mas não se esqueça:Envie um e-mail para [email protected] avisando o dia e a hora que pagou. Mande seu nome com endereço completo e CEP.

Abel Silva nasceu em Cabo Frio, é casado com uma cabofriense, Lena Trindade, escreveu muitas letras de canções famosas em Cabo Frio, e nunca se desligou de sua terra.

Sua carreira na MPB começou por acaso, em 1974, atra-vés da amizade com o cantor Raimundo Fagner. A primeira canção gravada já marcava o tom de sua qualidade com Jura Secreta, em parceria com Sueli Costa, e que lançou a cantora baiana Simone.

Nos anos de 1960 e 1970, Abel Silva participou ativa-mente dos movimentos estudantis. É formado em Letras pela UFRJ e lecionou literatura brasileira na PUC do Rio e na UFRJ.

Abel Silva representa muito esse pedaço maravilhoso da história da música popular brasileira. E nesta entrevista, ele fala um pouco sobre a sua carreira, a sua poesia, sua visão sobre as relações humanas e sugere que Cabo Frio, em sua política cultural, invista mais no que é permanente.

“Tenho a sorte de ter sido gravado pelos grandes intér-pretes brasileiros”, afirma modestamente Abel Silva nesta entrevista. (José Correia)

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O grande poeta da MPBe suas raízes em Cabo Frio

Sueli Costa e Abel Silva, por Chico Caruso.

Em sua atividade de letrista de importantes canções da música popular brasileira, além de poeta e prosador, Cabo Frio é fonte de inspi-ração. Pode citar em que momentos de seu trabalho Cabo Frio aparece mais ex-plicitamente?

Abel Silva - Como você sabe, meu caro José, saí mui-to cedo de Cabo Frio com mi-nha família para o Rio, mas minha mãe era cabo-friense e a casa do meu avô Maninho Costa era o local onde eu passava as melhores férias de meio e fim de ano da mi-nha vida. Havia um serviço de alto falante que tocava muita música brasileira e me lembro particularmente de um frevo que o vento trazia e levava da praça até à rua Silva Jardim onde vovô morava e

hoje é um shopping com o nome dele. Este frevo vesper-tino talvez tenha sido a célula inicial de Festa do Interior que compus com Moraes Mo-reira anos mais tarde. O rádio foi a maior influência de toda minha geração. E esse alto falante típico das pequenas cidades do Brasil eu só podia conhecer aí mesmo. Na ado-lescência ouvi muita seresta aí principalmente aquelas em que brilhava o violão de meu xará Abel.

Quando entrei na Fa-culdade encontrei por aca-so Lena Trindade que é a própria expressão da cabo-friense e aí por causa dela acrescentei à minha vida a família Trindade e criei raízes de novo com a minha terra de nascença. Fiz muitas canções aí, na varanda de

Lizete e Cacá (Antonio Carlos Trindade) e cantamos muito na casa musical dos Mureb. Na casa de Anita Mureb com-pus “Brisa do Mar” (com João Donato), “Vento Nordeste” (com Sueli Costa) e “Asas” com (R. Fagner). Aliás, levei este parceiro e vários outros

em viagens inesquecíveis por estas praias maravilhosas daí e eles sempre se recordam destes tempos. Enfim, minha poesia literária e musical está entranhada do perfume sutil da maresia.

Você sempre participou ativamente do movimento cultural do Rio de Janeiro. Olhando dos anos de 1960 e 1970 para hoje, com as muitas voltas que o país e os costumes já deram, que mudanças mais sintomáticas você percebe que acontece-ram no cenário cultural, em relação a quem produz, a quem cria?

Abel Silva - Fui um típico jovem dos anos 70, quando comecei a publicar minha poesia em livros e letras de música. Trago até hoje o es-

A célula inicial de Festa do Interior foi um frevo que o vento trazia do serviço de alto falante no centro de Cabo Frio. Abel Silva

entrevista: Abel Silva

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continua na página 6

Foto: Lena Trindadepírito libertário desta época. Sou um antigo jovem anos 1970. Na juventude conheci a maioria dos artistas mara-vilhosos da minha geração. Dividi apartamento com meu compadre Paulinho da Viola num casarão famoso que existiu em Botafogo no lugar em que é hoje o Rio Sul, gen-te como Gal, Caetano, Tim Maia, Leminski, Guarabira, enfim, uma trupe de grande valor. Há um livro chamado Solar da Fossa que conta a história deste tempo. E vai sair breve um documentário sobre o mesmo casarão. A diferença maior que noto entre os artistas que conhe-ci jovens e inéditos naque-la época para os de hoje é que simplesmente ninguém sequer pensava em grana. Nosso papo era só sobre a arte, a realidade brasileira , os ensinamentos de nossos mestres, gente que formou a nossa visão crítica e amorosa sobre o povo brasileiro. Como

Darcy Ribeiro, Sergio Buar-que, Vinicius, Jorge Amado, Gilberto Freyre, Paulo Frei-re. Nossas famílias tinham medo de nossa opção pela carreira artística. Achavam que não íamos conseguir nos sustentar com aqueles sonhos irreais. Deveríamos fazer concurso pro Banco do Brasil, ser economistas, dentistas... Ainda acho que primeiro deve vir a vocação, o talento, depois a preocupa-

Ainda acho que primeiro deve vir a vocação, o talento, depois a preocupação com o dinheiro, a fama. Abel Silva

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ção com o dinheiro, a fama, enfim é tudo consequência do trabalho e do talento. Inverter essa ordem é um equívoco e um perigo.

Sentíamos uma paixão mítica pelo povo brasileiro. Meu primeiro parceiro em música foi um negro nordes-tino analfabeto chamado João do Vale, um gênio, autor de Carcará , Pisa na Fulô, Coro-né Antonio Bento etc Eu ia passando umas letras de mú-sica, ia também tocando um violãozinho enquanto cursava faculdade e dava aulas. Até que Sueli Costa musicou Jura Secreta que estourou nas vo-zes de Simone e Fagner e me abriu os caminhos e nunca mais deixei de compor e es-crever. Tenho a sorte de ter sido gravado pelos grandes interpretes brasileiros como: Gal, Bethânia, Ellis, Nana Caymmi, Simone, Elba, Chico Buarque, Emilio Santiago, Cauby, Luis Gonzaga, Fagner e sou parceiro dos grandes compositores como: Bosco, Dominguinhos, Menescal, Donato, Sueli Costa, Moraes Moreira, Ivan Lins, Edu Lobo e tanto outros. Vivo da minha arte e disso me orgulho e sin-to grande alegria. Acho que iria dar um péssimo gerente do BB.

A gente tem uma idéia de que hoje o mundo é fragmenta-do. Antes parecia que todos sabiam do que estava acon-tecendo e que a participação era maior. O que há de real nisso? O que tem de bom, o que tem de ruim nisso, em sua opinião?

Abel Silva - Fragmentada é e sempre será a percepção humana através dos tempos. O que faz a nossa época com-pletamente original é a incrí-vel possibilidade de comuni-cação entre os seres humanos. Não há mais fronteiras para isso. Na minha adolescên-cia quem ia para o exterior trazia os discos de lá. Foi

assim que conheci jazz, Rei Charles, Louis Armstrong, Ella Fitzgerald, paixões que mantenho até hoje. Quando adolescente ia pra Cabo Frio e queria telefonar pros meus pais no Rio tinha que entrar na fila da telefônica e isso as vezes podia levar um dia! Já hoje... Eu estava numa pada-ria aqui perto de minha casa no Jardim Botânico quando um cara chegou com o celu-lar e me disse: gosto muito dessa sua apresentação aqui. E me mostrou uma entre-vista em que eu cantava e respondia às perguntas e logo juntou gente dando palpite, fazendo comentários. Não é fantástico?!

Não ando grudado com celular, não sou navegante da web, mas mesmo assim sinto uma incrível distancia do tempo em que recebia de

Abel Silva com os amigos e parceiros: Fagner, Paulinho da Viola, Macalé, João Bosco e Sueli Costa.

continuação

meus parceiros fitas cassetes com melodias para eu letrar, cheias de chiado, de barulhos de crianças. Já hoje eu recebo por mp3 gravações feitas em estúdios caseiros, enfim, um luxo.

Que potencial cultural você vê que Cabo Frio possui e que poderia investir mais?

Abel Silva -- Cabo Frio está dentro deste mundo que estou descrevendo. Não é mais uma aldeia de pescado-res, não é mais um aglome-rado de famílias tradicionais, então imagino que o jovem artista daí esteja conectado e informado com o que rola. Sobre a cidade em si, lamento que não tenhamos consegui-do manter um pouco mais do casario antigo que era lindo. O que ocorreu com a casa do grande fotógrafo

cabo-friense Wolney e a casa de dona Candinha Terra me deixou desolado. Por isso, logo que chego aí quero pas-sear no São Bento que é lindo. Temos que manter e cuidar do pouco que restou da nossa arquitetura.

Acho também que é um equívoco orientar a política cultural para mega eventos caríssimos que não deixam nada de permanente . É só ver o que a FLIP fez por Paraty, o que Festivais da Canção fa-zem pelo interior de S. Paulo e o que o Festival de Cinema faz para Cannes, uma praiazi-nha mixuruca que não chega aos pés da nossa, para ver que a politica cultural deve ser, para usar uma palavra da moda, sustentável! A cultura também define uma coletivi-dade. É o que penso.

Acho que é um equívoco orientar a política cultural para mega eventos que não deixam nada de permanente. É só ver o que a FLIP fez por Paraty, o que os Festivais da Canção fazem pelo interior de São Paulo. Abel Silva

ARARUAMAA lagoa de Araruamafoi um cuspe de Deus:limpoclarosadio.O criador andava bem de saúdebrônquios desimpedidosnada de pigarrosexcelente humor.

(Araruama, Abel Silva, trecho)

As fotos abaixo são de 1980. Aonde foram tiradas? A constatação é que Cabo Frio mudou muito.

[1] Desfile de escola de samba na avenida. Que avenida? Repare no prédio histórico lá ao fundo. Identificou?

[2] Esse hotel, o Hotel Imperial, ficava na Erico Coelho. Hoje é um shopping. Em que esquina estava localizado?

[3] Apresentação de evangélicos em pra-ça do centro. Que praça é essa?

Resposta: 1- Avenida Assunção, em frente ao Charitas. 2- Erico Coelho esquina com José Watzl Filho. 3 - Pra-ça Santo Antonio. (Fotos: José Correia)

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veja se localiza? NossosCLÁSSICOS

Quando em 2007 lancei meu livro de impressões sobre a história política contemporânea de Cabo Frio, “A longa marcha: a dominação política da oposição em Cabo Frio após o golpe de 1964”, convidei Hilton Massa (1916-2011) para prefaciá-lo. O reconhecido pesquisador da história cabofriense aceitou, apesar das dificuldades de seus 90 anos de idade, e, para mim, constitui um enorme orgulho ele ter visto valor naquele trabalho.

Na época, recebi um tipo de crítica que me questionava esta escolha. Afinal, Hilton Massa havia apoiado o golpe de 1964, o que contrastava com minha posição política e a linha narrativa do livro. O correto, portanto, teria sido oferecer a abertura de “A longa marcha” a alguém que sofrera as perseguições do golpe.

Hilton Massa, ou Dr. Hilton, como o chamávamos, era um ser humano civilizado, gostava do diálogo, e não intimidava ninguém com seu vasto conheci-mento, porque sempre achava que podia saber mais ainda. Os novos pesquisadores viam nele uma fonte de informação e de motivação. Ele conversava com todos que o procuravam e incentivava publicamente aqueles que avançavam na pesquisa e conseguiam publicá-la. Creio que Dr. Hilton se tornou uma refe-rência para os pesquisadores de Cabo Frio.

Os livros de Hilton Massa, “Cabo Frio , nossa terra, nossa gente ...” (1967), “Cabo Frio histórico-político” (1980) e “O sonho de tia Mexinga” (1999), são marcos em nossa cultu-ra, com um tema em comum: a formação da sociedade cabofriense. Em 1967, seu livro é lançado na data comemorativa dos 352 anos de Cabo Frio e o modelo adotado é o da divulgação dos muitos aspectos importantes e pitorescos de nossa história. “Tia Mexinga” é a história da solidificação da família cabofriense, narrada ficcionalmente. Nele, Hilton Massa aprofunda seus pensamentos, enriquece os detalhes. E “Cabo Frio histórico-político” é o livro em que ele trata mais especifi-camente sobre a nossa formação política.

Neste livro, Hilton Massa defende dois pontos de vista importan-tes: o que determinava a intensidade e a instabilidade da vida política cabofriense era a rotatividade do mando no poder central na capital (a base da liderança dos políticos locais estava ligada ao grupo a que pertencia fora da cidade), o que ele chama de caldeirão nacional, e o que atenuava os radicalismos eram as instituições locais. “Em redor [da vida política] realizam-se outras no setor cultural, educacional, artístico, religioso, desportivo, todas de envolvimento social e que completam a ‘vida política’ da cidade, no seu complexo” (pág. 211).

“Cabo Frio histórico-político” termina em 1930, quando Getúlio Vargas assume a presidência da República e o novo governo reflete marcadamente nos rumos da vida política de Cabo Frio.

Voltarei a comentar este livro de Hilton Massa.

José Correia

“Cabo Frio histórico-político”, livro de Hilton

Massa, lançado em 1980.

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Médico e Chef lançam livro com receitas recomendáveis para um coração saudável

Sabores para o coração. Este é o título do livro que o médico cardiologista Anderson Wilnes e o Chef em gastronomia Fernando Melo aca-bam de lançar em Cabo Frio. Um livro com de-liciosas receitas, sob a supervisão de Dr. Ander-son Wilnes, mais preocupado em acrescentar do que em cortar no cardápio. Nesta entrevista,

Dr. Wilnes dá preciosas informações de como se alimentar saudavelmente pensando na saúde do coração.

O livro traz a parceria com um professor e con-sultor em gastronomia. Em que essa colaboração ajudou o cardiologista na elaboração do livro?

Dr. Anderson Wilnes - Em tudo! Este é um livro de receita e esta é a especialidade do Chef Fernando Melo. Mas também é o livro para um coração saudável, que é a minha especialidade. Não conheço nenhum livro do gênero que traga este sinergismo para o bem do paciente. Que tenha além da receita light, uma dica do cardiologista em todos os pratos sobre o por que que aquela combinação faz bem ao coração. A interação foi muito boa, tive toda a liberdade de escolher os principais alimentos que iríamos trabalhar, assim como opinei em cada detalhe do processo de ela-boração do prato, em relação à interferência com a saúde cardiovascular.

Alguns detalhes que escrevemos no livro e aconteceram nos bastidores da sua elaboração tento sumariamente descrever agora:

a) Todo chef de gastronomia adora se exceder no azeite para fazer um peixe, por exemplo. Não pode, o excesso de azeite além de engordar, quan-do aquecido se transforma em gordura saturada aumentando o colesterol. Portanto, grelhamos o peixe com óleo de canola e o azeite extravirgem so-mente era acrescentado em quantidades limitadas ao desligar o fogo e reduzir a temperatura do prato;

b) Outro problema interessante foi como fazer um flan sem creme de leite? E argumentei que nem o light seria interessante. Então ele foi pra casa e experimentou o iogurte natural e deu uma bela textura, ficou excelente e leve;

c) Precisamos reduzir o uso e a necessidade do sal, para tanto estimulamos o uso de ervas aro-máticas, que aguçam o sabor, são olfativas, leves e muito saudáveis. Desmistificamos a pimenta que não faz bem ao coração, mas também não faz mal, realça o sabor e reduz a necessidade do sal. Alertamos para o não uso excessivo ou diário, pois pode causar doenças gastrointestinais.

d) Propositalmente usamos uns camarões em determinado prato, mas combinamos com outros ingredientes de baixa caloria e ficou delicioso. Nes-te momento, quem não gostou foi a nutricionista convidada de São Paulo. No entanto, ao calcular a tabela de calorias ficou surpreendentemente bai-xa e light, devido a forma do preparo. Lembrete: alguns alimentos, desde que não faça parte do cotidiano, em porções limitadas e combinados com outros alimentos de baixa caloria, podem ser consumidos com responsabilidade.

Muitos outros exemplos poderiam ser citados neste contexto da elaboração deste livro, mas desejo estimular a curiosidade do leitor para ler, descobrir, fazer a receita e provar estes não novos, mas diferentes sabores.

Que recomendações todos aproveitariam para uma alimentação sau-dável?

Dr. Anderson Wilnes - A alimentação saudável não começa na cozi-nha, mas no supermercado! Se compramos algo calórico, ninguém vai deixar estragar na geladeira ou na dispensa. Então temos que começar fazendo a feira toda semana, com frutas e hortaliças que despertem o paladar. Esses alimentos são ricos em vitaminas, sais minerais e fibras, tendo função antioxidante e, pelas fibras, ação redutora de colesterol e reguladora intestinal. As frutas e hortaliças dão o frescor na alimentação, especialmente importante, no período do verão que estamos próximos.

Devemos reduzir a quantidade de carbohidratos da alimentação do brasileiro, pois o excesso é particularmente responsável pelo aumento na incidência da obesidade, elevação da glicemia e triglicerídeos, esco-lhendo somente 1 carbohidrato por refeição e em porção limitada. Os carbohidratos são: arroz, raízes (batata, inhame, aipim e beterraba) e seus derivados, massas (macarrão, lasanha, inhoque e pizza), derivados do trigo (pão, biscoito, bolos).

A elevação do colesterol vem pelo excesso de gorduras animais como embutidos da ave ou do boi (lingüiça, salsicha, bacon, nugets, presunto, mortadela, calabreza), gorduras da carne, frituras, leite e laticínios não light, miúdos (fígado, moela e coração) e gema de ovo.

Alguns peixes, além de serem fonte de proteínas, são ricos em Ome-ga 3, ajudando a reduzir o colesterol. Como exemplos temos bacalhau, salmão, atum, sardinha e cavalinha.

Então, um exemplo de alimentação saudável que não sai da moda é se alimentar a cada três horas com produtos de baixa caloria, começando por um bom desjejum, lanche intermediário com frutas ou iogurtes, para chegar no almoço sem muita fome. Dê preferência às hortaliças, carne branca e uma pequena porção de carbohidratos. Lanche da tarde leve e jantar cedo com pouco carbohidrato. Se for dormir mais tarde pode fazer uma colação com frutas, leite desnatado ou suco.

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Dr. Anderson Wilnes: uma alimentação saudável pode reduzir em até 30% os riscos de doenças cardiovasculares

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Que peso uma alimentação saudável tem para a saúde do coração?Dr. Anderson Wilnes - Uma alimentação saudável pode reduzir o colesterol e o LDL em até 30% (média), reduzir triglicerí-

deos, glicemia e a circunferência abdominal/peso corporal. Todas essas alterações metabólicas são fatores de riscos reconhecidos por toda a população para induzir ao aparecimento de doenças cardiovasculares futuras.

Não devamos começar a nos preocupar com uma alimentação saudável somente a partir dos 40 anos, pois a formação das placas de ateroma (de colesterol) nas artérias coronarianas começa já na infância. Por isso, devemos mudar a cultura alimentar nas nossas famílias. A atividade física é outra aliada do coração saudável e também deve ser estimulada a toda população. Não posso dissociá-la da boa alimentação, pois em cardiologia chamamos em conjunto como medidas de “Mudanças no Estilo de Vida-MEV”.

O que o motivou a escrever este livro de-dicado à alimentação saudável?

Dr. Anderson Wilnes - Este livro tem a intenção inicial de responder aquela famosa pergunta no consultório: “Doutor, você esta falando que tudo que é bom e eu como, aumenta o colesterol, o trigliceríde-os, a glicose e ainda engorda? E por vezes ainda acrescenta. Sobrou o quê para eu me alimentar?”

Sempre tive o propósito de escrever este livro e esta oportunidade surgiu quando em uma conversa na cozinha da minha residência, sexta-feira à noite num jantar informal, junto com o Chef de gastronomia Fernando Melo, que transforma qualquer ocasião normal em um prazeroso jantar, e o Editor da revista paulistana DOC, especiali-zada em publicações médicas e de elevado conceito no mercado editorial brasileiro,

Marconde Miranda, que é da nossa região, comendo um belo prato de filet alto de pitangola grelhado, numa cama de pimen-tões coloridos e cobertos por cebola roxa caramelizada, acompanhando um purê de batata baroa e um belo tinto espanhol para harmonizar, manjar dos Deuses. Foi exata-mente no meio desta degustação, entre a segunda e terceira garfadas que exclamei: “Meus pacientes definitivamente estão errados; é possível aliar alta gastronomia a alimentação saudável!” Então começamos a citar vários exemplos de maravilhosos pratos principais, entradas e sobremesas deliciosas e com baixa caloria. Então percebemos que estávamos diante de um projeto que tinha tudo para cair no gosto da população. Tínhamos a estrutura para realizar e principalmente muita vontade de realizar.

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Dr. Anderson Wilnes realiza o projeto de produzir um livro que reunisse uma alimentação saudável para um coração

saudável.

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Em época de comemoração do aniversário de Cabo Frio, cumpre ressaltar que a cidade, embora ostentando meio milênio de densa e complexa história com ramifica-ções e desdobramentos até internacionais, e às vésperas do quarto centenário da fun-dação da mesma em 2015, paradoxalmente relega ao esquecimento, salvo raríssimas exceções, os nomes dos vultos históricos que, sendo cabo-frienses ou procedentes dos mais díspares rincões do mundo, marcaram e direcionaram seu destino, especialmente aqueles pertencentes a épocas já remotas e extintas, quando estes deveriam ser os mais enfatizados.

Assim sendo, o descobridor da região e nela criador da primeira feitoria brasilei-ra, Américo Vespúcio, que viu seu nome ser atribuído a todo o hemisfério ocidental do planeta, não possui um logradouro público em Cabo Frio que ostente seu nome, embora existam, além da Avenida América Central, três ruas dedicadas a xarás seus: Américo Ferreira da Silva, Américo Gomes da Fonseca e Américo Lopes Barbosa (quem terão sido e o que terão realizado em justificativa à homenagem?)

Também o fundador da cidade e da capitania de Cabo Frio, Constantino Menelau, teve pouco mais sorte, por ter recebido uma ruela no bairro da Passagem, apresentando na placa, contudo, seu nome grafado erroneamente como “Minilau”. Ora, se os dois nomes fundamentais da história cabo-friense já são (des)tratados dessa forma, imagine-se os restantes, ainda mais que os currículos das escolas municipais cabo-frienses não incluem, ao nível mais superficial que seja, a alentada história de sua cidade e região.

Enquanto isso, ruas com nomes inócuos, tanto novas quanto antigas, esparramam-se pela cidade, adotando pedras preciosas no Portinho (ruas Topázio, Safira, Ardósia, etc.), a par de cidades e países no Caiçara (rua Finlândia ou Atenas), assim como muitos nomes pessoais que, por mais meritórios que venham a ser, pouco ou nada têm a ver com Cabo Frio (rua Rui Barbosa ou Avenida Júlia Kubitschek).

Por outro lado, muito dos nomes esquecidos por Cabo Frio são frequentemente lembrados em outras localidades nas quais por vezes tiveram importância até menor do que em Cabo Frio, como por exemplo Martim Correia de Sá e seu filho Salvador Correia de Sá e Benevides, figuras de importância até mundial na geopolítica do im-pério português da primeira metade do século 17, os quais atuaram de forma decisiva tanto na criação quanto no desenrolar da capitania cabo-friense; assim, enquanto que em Cabo Frio nada os relembra, seus nomes foram atribuídos às duas principais avenidas da cidade então fluminense e hoje paulista de Ubatuba (e ainda a uma Praia do Martim), onde ambos desempenharam papel menos significativo do que em Cabo Frio, embora nesta última existia um estádio de futebol denominado Manoel Correa, que apesar do sobrenome nada tem a ver com aqueles dois Correias históricos que, assim como todas as outras figuras extraordinárias cabo-frienses desde os ocupantes da feitoria inicial, não possuem qualquer monumento local à sua memória.

UM TESTE DE CONHECIMENTOS

A assertiva de que a riquíssima e diversificada história cabo-friense permanece quase que totalmente ignorada por seus próprios habitantes merece, afinal, ser com-provada, para o que proponho um teste rápido a seguir.

Pois então, você é cabo-friense, nativo ou adotivo? Então, diga-me: sabe quem foi Lourenço do Espírito Santo? Em São João da Barra, sabem. Ou quem foi Duarte Barbosa? Na Inglaterra do século 16 sabiam. Você já leu a “Utopia”, “Água Mãe” ou Viagem pelo Distrito dos Diamantes e Litoral do Brasil”? Conhece Martim Correia de Sá e seu filho Salvador Correia de Sá e Benevides? Em Ubatuba, todos os conhecem.

Os esquecidos de Cabo Frio

Pesquisador levanta 77 nomes importantes para a história de Cabo Frio. Destes, apenas 9 foram lembrados. Há casos de “desomenagens”, como Victorino Carriço e Pedro Guedes Alcoforado.

Luiz Carlos da Cunha Silveira

Os Tupinambás marcaram a história de Cabo Frio. Mas

não são lembrados.

Viajantes como Jean de Lery, André Thevet e Knivet,

estiveram em Cabo Frio no século XVI e deixaram regis-

tro do que viram.

o paradoxo cabofriense

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Já ouviu falar nos sete capitães? Em Campos dos Goytacazes, todos ouviram. Conhece o nome e a procedência do primeiro colono branco a desbravar o território do atual Uruguai? Ou onde se situava a terra mágica da fonte da eterna juventude de Ponce de Leon? Ou então onde nasceu o presidente da república brasileira Washington Luís ou em que lugar Charles Darwin permaneceu por uma quinzena aproveitando para iniciar o rascunho de sua obra revolucionária sobre a origem das espécies vivas? Bem, talvez pelo menos Vespúcio e Menelau?...

Por outro lado, se lhe perguntarem onde fica, em Cabo Frio, a Goela do Pato, o Largo da Matriz ou a Rua Direita, você saberá informar? E assim por diante, pois todos estes indivíduos, obras e lugares possuem um denominador comum: todos relacionam-se direta ou indiretamente a Cabo Frio, todos influenciaram sua história e desenvolvi-mento para o bem ou para o mal, mas sem dúvida são parte integrante da memória não apenas desta cidade, mas de toda a vasta região ao redor que fez parte da antiga capitania cabo-friense tão esquecida e que ainda hoje gravita ao redor de Cabo Frio.

Portanto, se você conhece a resposta a pelo menos algumas das perguntas acima e a muitas outras que poderiam ter sido incluídas na lista, parabéns: você pertence a uma seleta e infelizmente escassa minoria. Se, por outro lado, não souber responder a nenhuma, não se preocupe, pois a culpa não é sua nem você é o único a desconhe-cê-las; difícil é localizar alguém em Cabo Frio que tenha pelo menos ouvido falar nos esquecidos.

O PANTEON DOS OLVIDADOS

Com o objetivo de colaborar para a solução da problemática em pauta, compilei uma lista contendo 77 nomes que parecem-me particularmente significativos ao lon-go destes cinco séculos completos, verificando a seguir que, embora 9 destes tenham sido relembrados ao longo do mapa de logradouros da cidade, outros 68 permanecem lamentavelmente olvidados; ou seja, os homenageados equivalem a apenas cerca de 10% do total. Pior ainda, nestes 68 incluo 10 casos de “desomenagem” (por exemplo, Victorino Carriço, o autor do hino municipal cabo-friense), nos quais vieram a ser obliterados nomes já constantes em logradouros, inclusive os provenientes do período colonial (Rua da praia, por exemplo).

Dividi os nomes dos esquecidos (logradouros e pessoas físicas) em 13 categorias, a saber: os indígenas; os descobridores e conquistadores, tanto portugueses quanto france-ses; os homens da feitoria; os fundadores; os padroeiros; os jesuítas; os capitães-mores; os sete capitães e os pescadores; os viscondes e o presidente cabo-friense; os viajantes e visitantes; os escritores e historiadores; os engenheiros, urbanistas e empreendedores.

Não pretendo, é claro, que a atual lista seja exaustiva, pelo contrário, considero-a uma amostragem a ser bastante ampliada com contribuições de todas as origens, já que o difícil em Cabo Frio não é encontrar quem não tenha sido homenageado, embora merecendo-o, mas sim quem tenha sido. Por outro lado, não disponho de espaço neste texto para qualquer detalhamento ou comentário adicional quanto à lista e ao projeto para implantá-la e implementa-la.

Gostaria, entretanto, de finalizar enfatizando um aspecto significativo desta lista, que é o de abordar a integralidade da vida e obra daquelas personalidades vinculadas a Cabo Frio. Afinal, quem era Menelau em seu contexto pessoal, no qual a fundação de Cabo Frio constitui mero detalhe? Ou o que fez em sua vida Salema além de exter-minar os Tupinambás de Cabo Frio?

RECOMENDAÇÕES FINAIS

Ainda no intuito de implementar uma solução para a problemática em questão, sugiro, a seguir, seis procedimentos perfeitamente exequíveis e imediatos:

- Atribuição dos nomes esquecidos a logradouros significativos;- Divulgação da história municipal pela mídia e todos os meios disponíveis;- Inclusão da história cabo-friense no currículo escolar municipal;- Colocação de placas nas ruas coloniais, com seus nomes originais, junto às placas

com os nomes atuais;- Implementação do totalmente relegado turismo histórico em Cabo Frio;- Consolidação de um projeto permanente de pesquisa e divulgação dos nomes

vinculados à história cabo-friense, através do estabelecimento, manutenção e atuali-zação de um acervo específico.

O artista plástico Carlos Scliar se fixou em Cabo Frio, contribuiu para uma melhor

imagem de nossa cidade, mas ainda não foi verdadeiramen-te reconhecido. É mais um da

galeria dos esquecidos.

Autor do hino de Cabo Frio, compositor e poeta, Victo-

rino Carriço ainda está para receber a homenagem que

estabeleça sua importância.

O jornalista paraibano Pedro Guedes Alcoforado teve par-ticipação ativa em Cabo Frio nos anos de 1920. Niterói já

o homenageou com nome de rua. Em Cabo Frio, seu nome foi retirado de uma rua. Mais

um “desomenageado”.

Foto: José Correia | Arquivo

Foto: José Correia | Arquivo

12|NOSSA TRIBO

problema nacional

Brasília, 1978: como Cabo Frio tornou-se um casode CPI

Este texto é uma versão resumida de artigo apresentado à VI Semana de História Política da UERJ e publicado no Anuário de Cabo Frio em 2011. Sua principal fonte é a edição do Diário Oficial do Congresso Nacional de de-zembro de 1978, que traz o relatório final e inteiro teor dos depoimentos da CPI da Especulação Imobiliária, desen-volvida entre 5 de abril e 25 de outubro. A disponibilização do documento foi gentileza da amiga Penha Leite, a quem agradecemos.

Dos membros titulares, quatro eram da ARENA e três do MDB, composição justificada pelo fato de o MDB não pos-suir maioria na Casa, mesmo crescendo sua representação de 28% para 44% nas eleições de 1974 (Da Silva, 1990, p.377).

A escolha da relatoria deixa claro que o governo militar pretendia manter as rédeas das investigações, focadas, por exemplo, nas operações do BNH – Ban-co Nacional de Habitação, suspeitas de desvio de verbas e superfaturamentos.

As divergências entre os modelos de gestão de José Bonifácio, prefeito na-quele ano, e de Otime Cardoso, prefeito do mandato anterior, ambos do MDB, em Cabo Frio, aparecem em âmbito nacional, a partir do depoimento do então Secretário Municipal de Turismo, Márcio Werneck, convocado para falar da construção de marinas na cidade.

Em 18 de maio, Werneck afirmava, no Congresso, que Bonifácio tinha opi-nião “contrária a instalação de qualquer marina, qualquer aterro no Canal do Itajurú”.

Werneck defendia que Bonifácio teria embargado todas as construções do tipo na cidade, à exceção do Projeto Marinas do Canal, na Gamboa, devido ao fato do mesmo ter se constituído em “ato jurídico perfeito, com obtenção de todas as licenças necessárias” (Congres-so Nacional, 1978, pp.170,171). Sobre o empreendimento, defende o depoente que “a autorização foi do Presidente Médici (...) existe uma ligação entre a Presidência da República e a autorização para aterrar o Canal. Não sei dizer o porquê, mas existe”.

A discussão do conceito de ato ju-rídico perfeito acabou desdobrando-se em outro artigo científico, apresentado ao 1º Seminário Fluminense de Direito Urbanístico, no Rio de Janeiro; ao II

Encontro Nacional de Antropologia do Direito, realizado na Universidade de São Paulo, em 2011; e publicado na revista Perspectiva Sociológica, em 2010 (Moura, 2010).

Para Werneck, o Projeto Marinas do Canal, além de não cumprir “prazos e etapas prometidos” trazia “consequên-cias sociais gravíssimas” à Gamboa, que “teve sua frente (...) transformada num canal de dimensões reduzidas, sem água, praticamente, e poluído”.

A CPI sugeriu em relatório final a

abertura de Comissões Parlamentares de Inquérito nas Câmaras municipais de Araruama, Maricá e Cabo Frio para investigar construções do tipo (Congres-so Nacional, 1978, p.11). Tais solicitações jamais se concretizaram.

O relatório final foi elaborado por uma Deputada da ARENA, com críticas ao BNH; e ao Prefeito do Rio de Janei-ro, filiado à sua legenda. A presidência da CPI, do MDB, pressiona prefeituras governadas por seus próprios quadros, na busca de ilegalidades tangentes à especulação imobiliária. O governo cabofriense, convocado, remete à gestão anterior, de seu partido, a responsabi-lidade por um dos principais projetos questionados.

Oposição e situação, no ocaso da dita-dura, avançam internamente divididas, heterogêneas. As questões ambientais e o crescimento urbano trazem o interior à capital, transformando questões locais em nacionais, numa integração brasilei-ra pautada mais na suspeição jurídica do que na ruptura “lenta e gradual” de um regime autoritário.

O Projeto Marinas do Canal, hoje abriga três conjuntos condominiais: O Casa da Ilha; o Ilha do Meio; e o Marinas do Canal, no bairro da Gamboa. E nem é preciso dizer que qualquer semelhança com o presente da cidade é mera coin-cidência.

Rafael Peçanha

Rafael Peçanha - Historiador especialista em Sociologia Urbana (UERJ), mestre e douto-rando em Antropologia (UFF), pesquisador do LESCON - Laboratório de Estudos Sócioantro-pológicos sobre o Conhecimento e a Natureza.

Referências Bibliográficas:CONGRESSO NACIONAL. CPI da Es-

peculação Imobiliária. Diário do Congresso Nacional. Seção I, ANO XXXIII, número 166-A. Brasília, 1978.

DA SILVA, Francisco Carlos Teixeira. “A modernidade autoritária: do golpe militar à redemocratização 1964-1984” In LINHARES, Maria Yedda (org.). História Geral do Brasil. 9.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 1990.

MOURA, Rafael Peçanha de. A Restinga na CPI - Como Cabo Frio se torna tema de discussão nacional nos anos finais da Ditadura Militar In: Anuário de Cabo Frio - 2011.1, 2011, v.I, p. 241-256.

__________. E o mar vai virar aterro - antropo-logia, direito e conflito nas disputas por espaços num bairro do interior fluminense. Perspectiva Sociológica. , v.3, p.1 - 15, 2010.

Foto: Ernesto Galiotto

NOSSA TRIBO|13

Um terraço cultural em Cabo Frio

iniciativa cultural

Uma noite em alto estilo cul-tural. Muitos convidados em uma apresentação musical impecável com o violoncelista David Chew, a soprano Martha Herr, o saxofonista Blas Rivera e a pianista Fernanda Canaud, entre outros músicos.

Motivo: a inauguração do mais novo espaço “Terraço Cultural e Fotográfico Noris Carmen M. Ga-liotto”, na Avenida Teixeira e Souza 1450, Cabo Frio.

“Estou comemorando 30 anos do empreendimentos Galiotto e seus 92 projetos culturais, ambien-tais e filantrópicos. Este terraço é uma homenagem à minha mulher, Noris, que soube me compreender e colaborou para que pudessemos realizar tantos projetos bonitos”, afirmou Ernesto Galiotto, respon-sável pelo Terraço Cultural.

Fotos: Divulgação

14|NOSSA TRIBO

A cidade e os ermos (1)

conto

Hoje tirei uma soneca no sol em minha cama, na paz de uma tarde de domingo e foi como se estivesse lá, nos meandros de Manguinhos, com as tias a mariscarem, pe-gando camarões de risco e siris, a nos chamarem – Crianças, crianças! – e nós dentro de pequenas poças da maré seca, morninhas, gostosas, a dormitarmos, paz, sol, felicidade. Como quando ainda não havia a cidade e tudo era Gecaí, terra de meus ancestrais distantes, índios destas paragens, que contemplavam os volteios do canal, a lagoa a perder de vista, os círculos das marés – quatro por dia, duas enchentes e duas vazantes - e vinham também amar o sol e as águas, sentindo o bom do vento e a pele quentinha, a esquecerem da vida, religando-se a ela.

Surge a cidade e, múltipla, recria-se em várias eras, meio que inquestionável, avançando sobre o tempo, escondendo gerações, sonhos, funções. Pequenina, naqueles primeiros tempos do século XVII, vinha para proteger os domínios lu-sitanos, sediar tropas, avançar de leve sobre os areais, móveis, cheios de cajueiros. E semear dramas – para que mais servi-riam tantos ajuntamentos humanos? – também esquecidos pelas restingas, os ermos. Muitos ainda vinham pelo vento na memória das tias, fragmentos, as estórias da família do faroleiro, gente sofrida lá para a boca da barra, do outro lado, sozinhos, o homem austero, lenhador, a devastar os morros para alimentar o farol, noite após noite, arrastando pesadas achas de lenha para cima, a moça solitária a sonhar a cidade, contemplando-a lá de riba, a ver o espraiado do povoado, a ter fim lá longe, pelos lados do morro da Guia. Ficaria a vida ali, longe de tudo? Quem dera casar, fugir, viver pobre pelas brenhas, mas perto dela, podendo ir a pé, sem precisar atra-vessar o braço de mar, vender carvão, lavar a roupa dos ricos. Estudara na escola de primeiros anos, morara com parentes próximos à avenida, de criança sabia ler, mas de quê lhe adiantava, estando tudo longe e ela triste, nem livros havia ali. Tinha a amizade, laço forte com meninas do outro lado, lá pras bandas do São Bento, afortunadas por terem família de pescador, gente que sabia – e podia – estar na cidade.

Desde que surge é tirana, uns conseguem a duras penas, heranças ou fortuna estarem em seu seio, aguentarem suas transformações, outros não. Varridos para desvãos, vão pro-curar viver em suas imediações, mantendo como podem o

1 - O título e alguma inspiração foram livremente influenciados por Italo Calvino, seu clássico “As Cidades Invisíveis”.2 - Manguinhos era nossa praia, enseadas e mangues que ligavam o São Bento à Passagem, um lugar de memória, lindo, onírico.

Rossana Maria Papini

cordão umbilical. Foi o caso de Tiba, negro forte, um touro, de grandes mãos delicadas, que de pouco juízo e aspecto as-sustador, pobre feito Jó, foi sendo empurrado para os ermos e resolve ficar ali, numa ponta de esporão da lagoa, coroa de areia, próximo a forte maré cheia, um lugar bom, soprado pe-los ventos, onde colocava os peixinhos e camarões a secarem ao sol. Tinha fartura, não esquentava com nada, sabia ser curta a existência nesta terra. Construiu sua casa, chegou a forrar o chão com ladrilhos. Fora bem-nascido, amava sua natureza, dentro dela era rei, e ainda tinha a caridade de alguns cristãos, que lhe davam pequenas tarefas e não precisava sofrer no sal, carregando aquele peso de sacas, a ferir as costas, a não valer nada para aquele povo, que via nele um negro molenga, que-rendo ser criança a vida inteira. Nem entendia bem o fausto, as procissões, o foguetório que vinha do lado de lá, da cidade, assustando os cães. Os brancos e sua sociedade vergada por tantas normas, a produzir toneladas de sal. Para quê? Mesmo antes de tudo isto já havia a cidade, pequenina, escondida nos ermos de dunas, onde se vivia às vezes sossegado com muito pouco. E era isto que fazia, a deixar passar o tempo em meio aos uivos das casuarinas, sua cantiga de ninar, já que de pou-cas falas, não entabulava muitas conversações, vivia sozinho, recebendo às vezes as visitas de crianças, que corriam livres pelas redondezas, também como ele a desfrutarem do melhor, da fuga, do sol e das águas ligeiras, pertinho. Sabiam viver.

Varridos por desvãos, uns conseguem viver nas ime-diações da cidade, mantendo como podem o cordão umbilical. Tiba, que amava a natueza, foi um desses.

Foto: José Correia

NOSSA TRIBO|15

Teixeira e Sousa morou na rua Erico Coelho

Em 2012, durante as comemora-ções dos 200 anos de Teixeira e Sousa, publicamos o seu Registro de Batismo, resultado de uma pesquisa que havia começado em 2010. O documento nos revelou muitas surpresas, pois contem dados que mudam sua história, como, por exemplo, o dia do seu nascimento, conhecido como 28 de março e está registrado como “30 de março”. Como, também, a origem de seu pai, que seria português e ficamos sabendo que seus pais eram “pardos forros” e que recebeu o nome do seu padrinho, “Antonio de Souza”. Colocando esses dados dentro do contexto social de sua época, a visão que temos sobre a trajetória de Teixeira de Sousa, muda completamente, o que me motivou a reescrever a sua biografia.

Após a divulgação do registro, conti-nuamos na busca de novas informações para escrever o ensaio biográfico do autor, “Um novo olhar sobre Teixeira e Sousa”, que será lançado em março, nos aproximando o máximo possível da rea-lidade de sua trajetória, desmistificando uma biografia romantizada, própria do estilo da época.

A biografia que temos conhecimento foi escrita por três escritores, amigos de Teixeira e Sousa, logo após a sua morte: Moreira de Azevedo (1861), Félix Ferrei-ra (1868) e Joaquim Norberto (1876). A partir daí todos os demais biógrafos, em sua maioria críticos literários, apresen-taram diferentes estudos de sua obra, mas, no que se refere aos dados pessoais, mantiveram as mesmas referências.

A pesquisa tem nos revelado dados relevantes para uma visão bem diferente da história que até então estamos acostu-mados a ouvir. O trabalho de pesquisa é árduo, mas sempre nos recompensa com alguma surpresa reveladora.

Buscando o local da casa de comércio de Manoel Gonçalves de São Benedito, o pai de Teixeira e Sousa, mesmo sabendo que na época todo o comércio se concen-

Documentos de aforamentos revelam que Teixeira e Sousa morou com a família na Rua Direita (hoje, Erico Coelho) com fundos para a Rua do Meio (hoje, Bento Ribeiro)

alguns Becos, concluímos que a casa que Manoel Gonçalves morou com sua família ficava situada na Rua Direita, atual Erico Coelho, com fundos para a Rua do Meio, hoje, Rua Bento Ribeiro, e toda a lateral para este Beco, hoje denominado Travessa Duarte. Para ser mais preciso: hoje, entrando na Travessa Duarte, pela Rua Erico Coelho, a casa de Manoel Gonçalves ficava na esquina, e o quintal ocupava todo o lado esquerdo da Travessa, até a Rua Bento Ribeiro.

Os Becos da cidade tinham como referência o nome dos moradores. A Travessa Duarte já foi denominada, Beco dos Gonçalves e Beco de Seu Dio-cleciano. A casa de Teixeira e Souza, herdeiro dos Gonçalves, foi também propriedade de Diocleciano da Cunha Duarte, escrivão da Câmara, casado com D. Maria Amélia Moreira Duarte, pais de Maria Moreira Duarte e Azevedo, casada com Antonio da Cunha Aze-vedo, pais de Inah de Azevedo Mureb, casada com Mureb Pereira Mureb. Os “Mureb” foram os últimos herdeiros de Diocleciano da Cunha Duarte. Portanto, a Travessa Duarte é uma homenagem ao Seu Diocleciano.

quem procura, acha

trava na Rua da Praia, hoje Rua Jonas Garcia, não conseguimos localizá-la, mas fomos presenteados com o local de moradia de sua família.

Através dos dados de documentos de aforamentos e de atas da Câmara, chegamos ao local. O documento de aforamento dizia que “as casas e terre-nos pertenciam aos herdeiros do finado Tenente Dr. Francisco Gonçalves”, si-tuado na Rua Direita, com fundos até encontrar a rua do meio, e a ata que o Beco entre José Pereira Lima e Manoel Gonçalvez de São Benedicto, etc. Cruza-do os dados, e considerando que o Centro Histórico de Cabo Frio ainda mantém o planejamento urbano original, inclusive

Detalhe da Planta da Cidade de Cabo Frio- 1841

1 - Igreja Matriz de N. S. da Assumpção | 2 - Cemitério da Igreja | 3 - Casa da Câmara e Cadeia Pública | 4 - Banca de Peixe | 5 - Casa de Manoel Gonçalves de São Benedito | Rua da Praia - Jonas Garcia | Rua Direita - Erico Coelho | Rua do Meio - Bento Ribeiro | Rua do Campo - Silva Jardim

Rose Fernandes

16|NOSSA TRIBO

{Sob nossa MIRA}

Em Cabo Frio, os próximos me-ses serão bons para lançamentos de livros. Não é o horóscopo que prevê. Mas, pelo menos, é o que planejam dois autores cabofrienses. Rose Fer-nandes está para lançar uma nova tiragem de seu “Cabo Frio pólo co-lonizador do Brasil”, livro que teve edição limitada em 2013, ano em que se comemorou os 200 anos de nascimento de Teixeira e Sousa. Rose Fernandes, que está pesquisando detalhadamente a vida de Teixeira e Sousa, pretende também lançar logo o livro que irá recontar a vida de nosso glorioso escritor. Também Célio Mendes está com dois livros no forno para lançamento.

Tempo de livros

Há três anos um grupo de admira-dores do poeta Waldemir Terra Car-doso (1912-1936) lhe prestam uma homenagem colocando flores em seu túmulo e lendo poesias no cemitério da Ordem Terceira em Cabo Frio. O encontro acontece no dia 26 de janei-ro por volta das 10h. Quem gosta de poesia e quer lembrar nosso poeta é só marcar na agenda. Em 2014, o dia 26 de janeiro cairá em um domingo.

Waldemir, dia 26

O Escritório Técnico do IPHAN na Região dos Lagos, com sede em São Pedro da Aldeia, já digitalizou dois jornais de Cabo Frio, “O Canal” e “Aqui”. O IPHAN começou este ano o projeto de digitalização dos jornais locais, o que irá se transformar em uma grande fonte de consulta aberta ao público e aos pesquisadores. A iniciativa do IPHAN garantirá o que nenhuma outra instituição conseguiu fazer: a preservação da memória da imprensa local. O IPHAN digitaliza os jornais de qualquer município da Região dos Lagos.

IPHAN e os jornais

O casal Nazareth e Milton Roberto está para inaugurar um projeto de ca-ráter cultural e social no bairro Monte Alegre. O local já está construído e se-diará uma escola de música, gratuita, para os jovens do bairro. Quem quiser doar instrumentos musicais é só con-tactar Nazareth no “Tia Maluca”.

Escola de música

“Avalia-se a inteligência de um indi-víduo pela quantidade de incertezas que ele é capaz de suportar.”Immanuel Kant

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18|NOSSA TRIBO

Fuga para uma vida boa

Quando conheci a arqueóloga Maria Cristina Tenório em um sítio em Arraial do Cabo, ela descobria que a ocupação pré-histórica era permanente e dizia que há 4 mil anos a vida devia ser muito boa.

Em um dia dos anos de 1999 ou 2000 conheci a arqueóloga Maria Cris-tina Tenório, do Museu Nacional, no sambaqui do Condomínio do Atalaia, em Arraial do Cabo. Ela apontou para um determinado ponto do sítio arque-ológico e identificou uma fogueira. A arqueóloga estava encantada com aquela ocupação pré-histórica porque fugia a um padrão, não só pela alti-tude em que estava localizada, mas, conforme me disse, “pelo fato de eu ter encontrado uma sucessão de camadas de argilas com buracos de estacas que podem indicar o elo que procuro dessa organização sócio-cultural, esse lugar de congregação, que pudesse reforçar esses grupos.”

A arqueóloga Lina Kneip - cuja tese de doutoramento foi resultado de sua linha de pesquisa no sambaqui do Forte, publicada no volume n°5 da Série de Arqueologia da “Coleção Museu Paulista”, de 1977, sob o título “Pescadores e coletores pré-históricos do litoral de Cabo Frio, RJ” - tinha o entendimento de que a ocupação era temporária. “O tempo que eles ficavam aqui - entre 5.520 anos a 2.240 anos atrás - é impossível determinar: se semanas, dias, meses, não sabemos”, defendia a doutora Lina Kneip.

Mais tarde leria no livro “Pré-história da Terra Brasilis” (Editora UFRJ, 1999), em que Maria Cristina Tenório era organizadora e também ensaísta, que naquele local, no alto do morro do Atalaia, os sambaquie-iros procuravam proteção. Já era um tempo de instabilidade. Mais: era uma revisão da hipótese de arqueólogos de que esses grupos pré-históricos tinham suas casas sobre o seu próprio lixo, na medida em que no sítio de Arraial do Cabo havia “nítida divisão entre área de habitação e área de descarte”. Os pisos de argila com muitos buracos de estaca levavam Maria Cristina Tenório a crer que se tratavam de estruturas de antigas cabanas. Poderia ser exemplo de ocupação permanente, diferente do argumento de Lina Kneip.

Mas quando a conheci ali naquele ambiente pré-histórico, Maria Cristina Tenório levantou o tema do encontro entre natureza e cultura. “A vida há 4 mil anos seria bem razoável porque [os habitantes] tinham e dominavam um

ambiente excelente e, ao mesmo tem-po, possuíam uma organização social que permitia a manutenção dessa vida. De uma maneira geral, era uma vida muita boa”.

A ocupação pré-histórica em nossa Região sempre despertou meu inter-esse. Maria Cristina Tenório explicou mais: “Com 5 mil anos, são poucos sítios. Quatro mil anos é um momento de expansão. Depois, com 3 mil anos, outro momento de expansão. E com 2 mil anos, existe um outro conjunto de sítios datados. Tem momentos em que há uma retração e depois há uma retomada.”

Nossos vizinhos pré-históricos não tinham noção do que era paraíso ou vida boa porque a noção de história não vagava por estas terras perdidas. Mas, para nós, olhar para um futuro melhor ou para um passado idílico é

um conforto para a incerteza e para a descrença que muitas vezes nos tomam em tempos sombrios.

Pensadores, gozadores, escritores já definiram o homem de diversas ma-neiras: o homem é o único animal que fica triste depois que come; o homem é um animal religioso; o homem é o lobo do homem; e assim por diante. Eu acrescentaria que o homem é o único animal que vive permanentemente em fuga. Embora Bach, Haendel e Mozart tenham transformado a fuga em arte.

Crianças e adultos fogem do dentis-ta. O genro foge da sogra. O locatário foge do locador. O desesperado foge da realidade. O derrotado foge da evidên-cia. O diabo foge da cruz. Eu, muitas vezes, fujo em pensamento para esse tempo pré-histórico.

E, assim, cada um vai fugindo a seu jeito.

José Correia

Meu Diário

Arte: Júlia Quaresma

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