Revista Opinias nº 03 - Agosto de 2014

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Opinias UMA REVISTA DE IDEIAS, PENSAMENTOS E PONTOS DE VISTA CONHEÇA O PSICODRAMA O BAILE Muitos não são convidados NEPAL Surpresa em cada esquina SENTIDOS O valor da audição Ano I - nº. 3 Agosto - 2014 OS FUNDAMENTOS DO TEATRO DE IMPROVISO USADOS COMO TERAPIA

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Uma revista de ideias, pensamentos e pontos de vista

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OpiniasUMA REVISTA DE IDEIAS, PENSAMENTOS E PONTOS DE VISTA

CONHEÇA O PSICODRAMA

O BAILEMuitos não sãoconvidados

NEPALSurpresa emcada esquina

SENTIDOSO valor daaudição

Ano I - nº. 3Agosto - 2014

OS FUNDAMENTOS DO TEATRO DE IMPROVISO USADOS COMO TERAPIA

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Editorial Sumário

Expediente

Vivemos numa constante tentativa de dar à nossa vidaalgum equilíbrio para seguir na busca de nossos anseios eobjetivos. Talvez o que mais se busque, na verdade, seja“essa tal felicidade”, algo que nem sempre conseguimosdefinir exatamente o que seja. Martin Seligman, o paida psicologia positiva, teoriza que, apesar de 60% dafelicidade ser determinada pela genética e pelo ambiente,os 40% restantes cabem a nós. Segundo ele, existem trêstipos de vidas felizes: a vida de prazeres, na qual você enchesua vida com quantos prazeres puder, a vida doenvolvimento, em que você encontra a vida no trabalho,em ser pai, no amor e no lazer, e a vida que tem sentido,aquela que “consiste em saber quais são suas maiores forçase, também, em saber usá-las para servir e fazer parte dealgo maior que você mesmo”. Concordando ou não comesse enfoque, o importante é não desistirmos da busca.

Mas é preciso estar atentos, pois enquantopercorremos nossa trajetória, vamos nos deparandoconstantemente com situações, lugares, fatos e pessoas quesempre nos permitem acrescentar um elemento novo à nossabagagem vivencial. Ou seja: o próprio percurso, na verdade,nos mostra pequenos insights da felicidade que buscamoscom muita constância. Nem sempre nos damos conta, ébem verdade, e com isso podemos estar deixando passaruma parte muito importante do processo.

Na busca pela felicidade, tudo serve aoengrandecimento e à construção de nossa vida. Assim, estaedição de OPINIAS traz um pouco da percepção dediversos autores sobre os mais variados assuntos e vivências,como uma forma de contribuição para que cada leitor possater as suas próprias convicções e traga para seu cabedalaquilo que entenda ser mais útil e apropriado para aconstrução de seu templo interior.

OPINIAS - ANO I - nº. 3 - Agosto 2014 - Publicação virtual mensal da Rumo Editorial Produções e Edições Ltda. * Diretores: MarcosGimenes Salun, Luciana Gomes Gimenes e Naira Gomes Gimenes * Editor e Jornalista Responsável:: Marcos Gimenes Salun (MTb20.405-SP) * Revisão: Ligia Terezinha Pezzuto (MTb 17.671-SP). *Redação e Correspondência: Av. Prof. Sylla Mattos, 652 - cj.12 - JardimSanta Cruz - São Paulo - SP - CEP 04182-010 E-mail: [email protected] - Tels.: (11) 2331-1351 Celular (11) 99182-4815. BLOG: http://opinias2014.blogspot.com.br/ * Colaboradores desta edição: Carlos Augusto Ferreira Galvão (SP), Sérgio Perazzo (SP), Cleusa Badanai(SP), Luciana Gomes Gimenes (SP), João Baptista Alencastro (GO), Hélio Moreira (GO), Carlos Eduardo de Oliveira (SP), Heraldo Paarmann(SP), Alessandra Leles Rocha (MG), Roberto Antonio Aniche (SP), Luiz Khashoggi (RJ), Victor Eustáquio (Portugal) e Aline de Melo Brandão(PA). Matérias assinadas são de responsabilidade de seus autores a quem pertencem todos os direitos autorais. PERMITIDA a reproduçãodos artigos desde que citada a fonte e mencionada a autoria.

MARCOS GIMENES SALUNJornalistaSão Paulo - [email protected]

Sobre felicidade

Participe!Envie seu artigo ou comentários eembarque nesta aventura:[email protected]

03 AlccolismoCarlos Augusto Galvão abordacausas, consequências e indicacaminhos para esse problema

04PsicodramaSérgio Perazzo mostra um painel históricodessa terapia no Brasil e uma abordagem damorte sob o olhar psicodramatista.

08 Cores

CleusaBadanai

09 Internet

Luciana GomesGimenes

10João Baptista Alencastro estevenos frios rincões do Nepal emostra um pouco de sua aventura

Nepal

12Bailes da vidaMuitos acabam ficando do lado de forados bailes mais suntuosos..É o que HelioMoreira aborda nesta análise social.

14Carlos Eduardode Oliveira

Vinhos 16 Audição

HeraldoPaarmann

18 O melhor da festaTodo mundo gosta de festas. Mas quandoela termina, os resultados podem serdecepcionantes. É do que trata AlessandraLeles Rocha.

20 O extinto DodôO médico e filatelista Roberto Antonio Anichemostra um estudo sobre um dos temos desuas coleções: o pássaro Dodô

23 CrônicaVictorEustáquio

22 ArquiteturaLuizKhashoggi

24 Lendas da AmazôniaAline de Melo Brandão

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PorCARLOS AUGUSTO GALVÃOPsiquiatraSão Paulo - [email protected]

Desde há muito tempo o homem convive com oálcool; escrituras religiosas antigas já citam estasubstância: A religião judaica cita umas jovens que,preocupadas com a falta de varões na comunidadeonde viviam, resolveram embriagar o pai, paradeitarem com ele e dele conceberem. No Cristianismoobservamos que Jesus, na Santa Ceia, elegeu o vinhocomo representante de seu sangue e orientou seusseguidores que o bebessem em sua memória.

Nos dias de hoje o álcool, apesar de ser complementolúdico, representa uma das maiores preocupaçõesuniversais devido à doença que ele gera: o alcoolismo,que destrói organismos, famílias e sociedades. Oalcoolismo acontece devido a duas grandes vertenteshumanas: a genética e o conteúdo cultural dosindivíduos.

Existem famílias em que a incidência do alcoolismomostra claramente o componente genético, uma vezque esta doença se espalha pelas gerações, mas nãopode ser subestimado o fator cultural, visto que taldoença também aparece em indivíduos de famílias semevidência do fator genético.

Crianças costumam imitar adultos, e sempre ouvem:“Isto é coisa de gente grande”. Para elas (as crianças)se beber é coisa de gente grande, isto serve deestímulo ao consumo do álcool, principalmente nocaso dos adolescentes, já que passam a consumircerveja, por exemplo, para se mostrarem mais adultos.

Podemos dizer que hoje pelo menos a metade dosleitos hospitalares do Brasil estão ocupados pordoenças relacionadas com o álcool. A partir daíimaginemos o impacto do álcool nas sociedades emgeral. O álcool pode levar um indivíduo ao ridículo, aacidentes ou ao crime.

Ao rebaixar a cautela, o senso crítico e a cognição doindivíduo, pode levar este a atitudes impensadas,intempestivas e impulsivas. Ao rebaixar odiscernimento, leva o indivíduo a colocar a sua e avida dos outros em risco, como observamos, porexemplo, nos indivíduos embriagados que dirigemveículos. Há relatos de um padre católico que, estandoem estado de embriaguês numa missa de corpopresente, chegou perto do defunto e falou em altosbrados: - “Levanta e anda!”. Imaginem oconstrangimento.

Como se deve combater o alcoolismo? A maneiramais simples seria proibir a fabricação ecomercialização além de criminalizar o consumo. Já foitentado nos EUA e de nada adiantou; o consumo nãocaiu e a criminalidade aumentou, pois esta substânciaficou nas mãos de facínoras e organizações criminosas.

Além do que não se pode perder de vista que bebidasalcoólicas são pautas importantes na economia dealguns países, como a França, por exemplo, onde ovinho se apresenta com um de seus principaisprodutos de exportação. Campanhas sanitárias deesclarecimento teriam muita importância para debelar,ou ao menos diminuir a incidência desta moléstia.

O alvo principal destas campanhas deveria ser os queestão mais expostos ao alcoolismo: as crianças ejovens oriundos de famílias em que a incidência doalcoolismo se mostra mais acentuada, esclarecendo emostrando o mal que esta substância causa na vidados indivíduos, inclusive as crises que seguramenteenfrentam dentro de suas próprias famílias eresponsabilizando o abuso do consumo nestas crises.

Alcoolismo

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PorSÉRGIO PERAZZOPsicodramatista e escritorSão Paulo - [email protected]

O psicodrama foi trazido para o Brasil no fim dadécada de sessenta por alguns pioneiros, encantandoprofissionais da área de psiquiatria, psicologia e,consequentemente, psicoterapia e educação. Não só aforça da sua técnica, como a possibilidade de sua aplicaçãomenos elitizada em trabalhos com grupos, tanto em suavertente clínica, quanto educacional e comunitária,acenavam com promissoras possibilidades num país quevivia sob forte repressão de uma ditadura militar quesubjugou o país por mais de 20 anos.

Foi nesse terreno, a partir dos pioneiros jámencionados e contatos feitos em congressos, que umgrupo de profissionais contratou Rojas-Bermudez, umpsicodramatista colombiano radicado na Argentina, parainiciar, regularmente, a formação psicodramática deprofissionais brasileiros em São Paulo. Assim seconstituíram os primeiros grupos de psicodrama no Brasil,que formaram os primeiros professores brasileiros depsicodrama.

Entre estes primeiros psicodramatistas brasileiros,era possível encontrar vários profissionais destacados ejá muito conhecidos, como alguns psicoterapeutasreconhecidos por seu trabalho clínico, chefes de serviçosde psiquiatria e de psicologia, alguns professoresuniversitários etc, o que, desde o início, deu peso ecredibilidade ao psicodrama no Brasil.

Em 1970, este grupo de psicodramatistasorganizou no Museu de Arte de São Paulo (MASP) umcongresso internacional de psicodrama, em que foramrealizados diversos psicodramas públicos, ao ar livre, num

Breve história doPSICODRAMAPSICODRAMAPSICODRAMAPSICODRAMAPSICODRAMAno Brasil

espaço arquitetônico do MASP diretamente aberto paraa Avenida Paulista, à vista de todos.

Esse congresso mereceu ampla divulgação pelamídia e ampla pressão dos órgãos de governo, incluindouma tentativa de censura oficial. O próprio Moreno foiconvidado e era esperado, mas, acabou desistindo decomparecer, em parte também por não concordar com aorientação geral de Rojas-Bermudez, fato que só passoua ser confirmado com mais clareza muitos anos depois(1978).

Esse congresso marcou uma dissidência domovimento psicodramático brasileiro, que deu origem àsduas primeiras instituições de formação de psicodrama,ambas em São Paulo: a Sociedade de Psicodrama de SãoPaulo (SOPSP) e a Associação Brasileira de Psicodramae Sociodrama (ABPS), ambas existentes e ativas até hoje.

A ABPS seguiu em frente fiel à linha bermudianadurante muitos anos. A SOPSP trouxe Dalmiro Bustos,argentino, no início dos anos 70, refazendo suas diretrizesteóricas e técnicas.

Durante vários anos, as duas sociedades secomportavam como compartimentos estanques e seusalunos acabavam construindo preconceitos contra osmembros da outra sociedade, mesmo sem conhecê-los,só pelo que ouviam falar, uma etapa sofrida nodesenvolvimento do psicodrama brasileiro.

Em 1977, foi realizado em Curitiba um congressode psiquiatria e higiene mental. Nessa época, algunsprofissionais da SOPSP davam formação psicodramáticaem fins de semana para profissionais do Paraná, Bahia,

Um ponto de vista

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Santa Catarina e Rio Grande do Sul, enquantopsicodramatistas da ABPS faziam o mesmo no interior deSão Paulo e Ceará.

Vários destss alunos de psicodrama de Curitiba-PR integravam a Comissão Organizadora deste congressode psiquiatria e por isso tiveram peso e influência paraincluir no programa diversos trabalhos teóricos e mesas-redondas de psicodrama e, principalmente, várias vivências(workshops) de psicodrama dirigidas por professores-supervisores tanto da SOPSP quanto da ABPS, além dedois professores estrangeiros, Dalmiro Bustos e CarlosCalvente.

O resultado desta forma de organização foi areunião de alunos da ABPS e da SOPSP e de alunos depsicodrama de cidades diferentes, compartilhando asmesmas atividades psicodramáticas prático-vivenciais eteóricas, além das atividades sociais em que todoscantavam e dançavam juntos.

Este foi o marco que deflagrou a convivênciapacífica entre todos e iniciou um movimento de respeitodas diferenças existentes entre as diversas correntes.

O resultado disto tudo foi a fundação no anoseguinte (1978) da Federação Brasileira de Psicodrama(FEBRAP), a realização do 1.º Congresso Brasileiro dePsicodrama (1978) e a fundação da Revista da FEBRAP,1978 (hoje Revista Brasileira de Psicodrama).

Os primeiros congressos brasileiros depsicodrama, realizados a cada 2 anos, foram fechadosapenas para psicodramatistas brasileiros. Neles vivemosmuitos confrontos duros tanto no plano pessoal como nodas divergências teóricas e técnicas. No entanto, vivemosesse tempo de tempestades juntos.

Quando tudo isso passou e os psicodramatistasbrasileiros já conseguiam uma convivência deconsideração e respeito entre eles, apesar das diferenças,os congressos brasileiros passaram a ser abertos para ospsicodramatistas estrangeiros e até para um público deuniversitários.

O que resultou disso tudo? Hoje o Brasil tem,aproximadamente, 3.000 psicodramatistas espalhados denorte a sul do país, distribuídos em mais de 40 instituiçõesque dão formação de psicodrama, algumas em parceriacom universidades. Algumas universidades brasileiras, emsuas faculdades de psicologia, incluem no seu programade graduação a matéria psicodrama. Até hoje foramrealizados no Brasil 13 congressos brasileiros e 3internacionais de psicodrama, incluindo o IIº Ibero-Americano, além de incontáveis encontros, jornadas eoutros eventos psicodramáticos. A média de participantesnestes congressos é de 700 pessoas. Nos últimos 25 anos,os psicodramatistas brasileiros publicaram aproxi-madamente 100 livros e 1.000 artigos de psicodrama, alémde inúmeras teses de mestrado e de doutorado emuniversidades com temas de psicodrama. Toda estaprodução científica possibilitou a edição de uma coleçãode livros de psicodrama por uma editora brasileira.

São muitas as contribuições teóricas brasileirasoriginais e grande a expansão do movimentopsicodramático, de que são exemplos o grandecrescimento do psicodrama não clínico e educacional, domovimento cada vez mais forte do teatro espontâneo eda aplicação comunitária e em empresas do psicodrama,como o psicodrama público realizado em vários pontosda cidade de São Paulo e dirigido por muitospsicodramatistas simultaneamente, patrocinado pelaprópria prefeitura, quando da sua instalação em começode governo. Aliás, a abertura do congresso ibero-americano realizado no Brasil foi feita pelo próprioministro da saúde da ocasião.

Sem sombra de dúvidas o Brasil se constitui hojecomo um país em que o psicodrama veio para ficar epermanecer para o futuro. Se há uma lição a tirar detudo isso é o processo que os brasileiros se dispuseram aviver, que foi o de aceitar o desafio dos confrontos comocaminho do compartilhamento possível, da perseverançae do encontro, apesar das diferenças, o único que resultaem construção, espírito que o Brasil procura levar paraas mãos e os corações dos irmãos ibero-americanos.

Entendendo o Psicodrama

O Psicodrama é uma linha da Psicologia que

usa fundamentos do Teatro do Improviso

como método de terapia. Jacob Levi

Moreno, seu criador, o define como a ciência

que explora a verdade por meios

dramáticos.

Ao contrário das linhas mais comuns, aqui

as informações e sentimentos são obtidos

através do desempenho de papéis, agindo

livremente e comunicando, inclusive,

através da expressão corporal. Nas

sessões, o paciente liberta sua

espontaneidade e expõe seus diálogos de

forma leve e orgânica. Jacob acreditava que

para um paciente, ”seria mais eficiente e

mais produtivo se representasse seus

sintomas, como um ator numa peça, em vez

de reprimi-los ou resolvê-los.”

Uma abordagemA narrativa nas páginas seguintes é umaabordagem da morte sob o ponto de vista

do psicodrama. Como resgatar a vidaatravés do luto?

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Jacob

Levi

Moreno

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GELADA

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Tinha quase dois metros de altura. E naquelaaltura da vida que excede os dois metros, resolveucomprar um jazigo de família num cemitério-jardim, dosmuitos que existem em São Paulo. Um jazigo perpétuo.

Com o corretor, à beira do túmulo aberto, trêsandares para baixo, três nichos de cada lado, duvidou,num golpe de vista:

— Não dá para o meu tamanho.Dá, não dá, dá, não dá, até que o corretor se

impacientou:— Por que não experimenta, então?Ele não teve dúvidas. De paletó e gravata,

desceu e não se fez de rogado. Deitou-se muito àvontade dentro de uma das sepulturas como quemprova um terno no alfaiate:

— Não é que você tem razão? Cabe direitinho.E ali mesmo fechou negócio.Fora o colorido que tento dar a este relato, a

cena descrita aconteceu de fato e revela um lado práticode lidar com a morte e, mais especificamente, com aprópria morte. Aliás, sempre me surpreendo com umarrepio de horror ao imaginar o que sente um atorquando é obrigado a se deitar num caixão, fingindo-sede morto, por imposição hiper-realista da peça, filme,novela de TV ou personagem.

Um paciente de sessenta anos me contava quenos últimos dois anos foi submetido a uma cirurgia depróstata para retirar um tumor maligno, mais duas decatarata, bilateral, uma outra de um câncer de pele,três biópsias e, de quebra, ainda teve duas crises degota, uma outra decorrente de um cálculo renal, umadermatite, uma gastrite e uma extrassistolia periódica.Fora o resmungo diário da 2.ª lombar e um certoexcesso de peso. Dizia-me:

— Cada vez que vou ao médico, volto sem umpedaço. Nós dois estamos entrando na idade da fadigados materiais, só para usar um velho termo daengenharia.

Em dois belíssimos filmes relativamente recentes,podemos comparar duas maneiras muito distintas de lidarcom a morte: “Sob a areia” (Sous le sable), de FrançoisOzon e “O quarto do filho” (La stanza del figlio), deNanni Moretti. A negação insistente e recalcitrante damorte, contra todas as evidências e a elaboração diária,minuciosa e dolorosa do luto é o que se opõe no confrontode conteúdo destas duas películas.

Bergman cria, em “Fany e Alexandre”, um climade morte impressionante numa cena com câmera fixa, emque apenas a movimentação dos personagens é capaz denos transmitir a dor, a solenidade do momento de morrere a desorientação que, em diferentes graus, toma contade todos. A enfermeira que sai para esvaziar a bacia, opadre que chega com o vidrinho de água-benta, o tio quepassa oferecendo o lenço, a mãe que se encurva numprenúncio de choro, uma sucessão de gestos e expressõesque constrói indelevelmente um conceito, como que osalvando no disco rígido de nossa memória. Ele conseguenos colocar no papel do menino que se aproxima do paimoribundo e que estrutura dentro de si uma compreensãoda morte a partir apenas desta movimentação das pessoas,gerando um clima específico inesquecível, configurandoum conjunto de percepções sobre o que define a morte eo morrer.

Sendo assim, com esses exemplos, a naturalidadeou a aparente naturalidade no lidar com a morte, cujoentendimento é configurado na história da construção denossas percepções frente a ela e dos sentimentos que nosprovocam e envolvem, é que vai permitir a sua elaboraçãono período de luto, com maior ou menor ajuda, parasuperar a nossa tendência natural de negá-la e ocultá-la.

Somos todos personagens do mesmo drama.Somos todos protagonistas do mesmo luto.

Prova dealfaiatea vida resgatada atravésdo luto

A mulher de “Sob a Areia”, diante dodesaparecimento do seu marido, nega todas as evidênciasde sua morte, inclusive o indiscutível exame de DNA deum corpo que é encontrado no mar. Refere-se a ele sempreno presente e se recusa a conjugar o verbo no passadosempre que ele é o sujeito. O escritório vazio do maridoé a sua corporificação ausente.

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O casal que perde o filho, também afogado,em “O quarto do filho”, vive em chaga aberta tentandosobreviver no meio de um mar diário de culpas. Oquarto do filho é a sua ausentificação presente.

São bem conhecidos os estudos de PhilippeAriès sobre o comportamento do homem ocidentaldiante da morte através da história. Se ao homemantigo era dada a oportunidade de esperar a morteno leito, cercada de rituais que a transmutavam numacerimônia pública e organizada, as transformações queesta atitude sofreu no século XX até hoje tem seupeso maior pela velocidade com que ocorreram doque pelo próprio conteúdo destas transformações.

É como um homem de oitenta anos tentarabsorver em três dias toda a massa de informações,para o bem ou para o mal, veiculada pela internet esuas implicações na vida humana deste planeta.

Desta forma, os 50 milhões de civis e os 15milhões de militares mortos na 2ª Guerra Mundial, seesfumaçam em mero detalhe estatístico, cujo horrorpersonalizado é impossível de ser avaliado e digerido.E assim, os da Guerra dos Bôers, da Russo-Japonesa,da Nipo-Coreana, da Revolução Chinesa, daRevolução Russa, da 1.ª Guerra Mundial, da Sino-Japonesa, da Guerra Civil Espanhola, da Coreia, doVietnã, de Biafra, da Bósnia, do Expurgo Soviéticode Stalin, do Expurgo da Revolução Cultural de MaoTsé-tung, dos massacres repetidos de vários paísesfamintos africanos, do Laos, do Camboja, dasMalvinas, do Iraque, do Afeganistão, da invasão daHungria e da Checoslováquia, da guerra nãodeclarada no Oriente Médio, da explosão doterrorismo internacional em suas múltiplas formas, doshomens-bombas às torres gêmeas, da caricata invasãode Granada pelos Estados Unidos, das baixas urbanasdo narcotráfico etc., etc., etc., tudo ocorrido noespaço de um século. Enfim, um mundo em guerrapermanente. Não mais a 1.ª, 2.ª ou 3.ª Mundial comfinalizações hiroshimianas ou nagazakianas. Kafkianasou brechtianas, talvez?

Não é pois de estranhar que, neste cenárioviolento de filme classe C, não tenhamos tempo sequerde enterrar os nossos mortos.

O apelo da mídia ao consumo desenfreado a quetodos estamos sujeitos, as relações de trabalho cada vezmais perversas e escravizadoras do homem robotizando--o, contribuem para lançar o amor (que é isso?) numacategoria relacional (?) sem troca e sem consistência,condenando cada um de nós a uma morte em vida, à solidãosem retorno, ao embrutecimento de nossa sensibilidade.

É neste panorama que, modestamente, somoschamados a intervir no plano individual, mesmo que grupal,restando-nos quase a tarefa de recolher os cacos de talestilhaçamento da vida.

Que fazer? É possível resgatar a vida através deum luto que nem mesmo se reconhece?

Temos a tarefa hercúlea de auxiliar o nosso próximo-paciente-semelhante a lentificar este processo vertiginosode mundo. Nosso trabalho é o de ajustador de velocímetro.É o de cocriar um ouvido em que a dor possa ser gritada.Uma almofada em que a raiva possa ser espancada. Umafonte em que a lágrima possa ser lavada e escoada. Umninho em que o afeto possa ser de novo trocado ereconstituído, um band-aid da alma arrancado e uma cicatrizregenerada a ponto de poder ser exibida semconstrangimento.

A morte é o fim de um tempo e por isso mesmoexige um tempo de muitas horas para poder encará-la,encarar-se e examiná-la em todos os seus detalhes.

A desorganização que ela traz para o nossoprocesso de vida, revolucionando o nosso átomo social,nos obriga a uma reconstituição gradativa dos diversosvínculos em que estamos inseridos.

Não é outra a razão porque tudo isso demanda muitotempo. Nunca se sabe o que se vai topar pela frente quandorevolvemos o túmulo de nossos mortos. Em vez de começara discorrer sobre uma lista de procedimentos infalíveis quetodos nós esperamos que exista em algum lugar para cuidarbem dos nossos pacientes enlutados, prefiro abrir umdiálogo compartilhado, tendo como princípio estas poucasideias gerais.

Será que um dia a nossa morte poderá ser tratadaapenas como mera prova de alfaiate?

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Os textos deste artigo são capítulos do livro“Psicodrama: o forro e o avesso” de Sérgio Perazzo

(São Paulo, Ed. Ágora, 2010)

Veja este vídeocom Sérgio Perazzo

Psicodrama eQualidade de Vida

https://www.youtube.com/watch?v=VoaCXqm_Jyo

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A cromoterapia atua com a dinâmica das cores.Sua utilização é milenar, sendo aplicada desde o antigoEgito. Em todas as épocas, as cores têm sido utilizadascom a finalidade de harmonizar ambientes, pessoas esituações, mesmo que de uma forma inconsciente. Bastaolharmos a natureza em seus diversos matizes e as coresque usamos no nosso vestuário de acordo com nossotemperamento ou estado de espírito.

Daí o motivo pelo qual grandes companhiascomerciais utilizam a cromoterapia ambiental e acuidadosa seleção de cores nos uniformes dos seusfuncionários e colaboradores a fim de trazer alegria,otimismo, confiança e credibilidade tanto àqueles que seutilizam desses uniformes, quanto aos clientes que, aoentrarem em contato com tais ambientes e pessoas,sentem traduzidos esses aspectos quando da interaçãocom eles. Para Hipócrates, saúde e doença dependemda harmonia entre o meio ambiente, o corpo e a mente.

A tonalidade da cor é a forma pela qualconseguimos identificar a vibração da onda energéticaluminosa, que nos envolve e impulsiona a visão, chamadade cor retiniana, que é energia luminosa e cujos impulsossão classificados e traduzidos pela retina.

Sabe-se que os olhos são terminais do cérebro eque desde a antiguidade são considerados as janelas daalma, pois é por meio deles que assimilamos asinformações expressas nos ambientes e na interaçãohumana, tanto que mais vale um gesto (que é visto) doque mil palavras.

A cromoterapia auxilia no restabelecimento físico,

energético e emocional, atuando como uma técnicacomplementar ao tratamento médico convencional. Seuuso não dispensa o uso de medicamentos. Apsicodinâmica das cores está disponível para uso comuma todas as pessoas.

As

CORESCORESCORESCORESCORESem sua vida

Opinias - Agosto 2014

PorCLEUSA BADANAIEscritora e cromoterapeutaSão Paulo - [email protected]

Os adeptos da cromoterapia entendem quecada cor possui uma vibração específica e

uma capacidade terapêutica. IsaacNewton, no século XVII, conseguiu descobriras cores do arco-íris fazendo com que um

feixe de luz do sol passasse por um prisma.O cientista alemão Johann Wolfgang von

Goethe, no século XVIII, pesquisou durantecerca de 40 anos as cores e descobriu queo vermelho tem propriedade estimulante no

organismo, o azul acalma,o amarelo provoca sensações de alegria, e

o verde é repousante. Esses efeitos sãomais ou menos intensos, dependendo da

tonalidade usada.

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474 LIVROS DE ARTE GRÁTISO Metropolitan Museum of Art, de Nova York, um dos maiores e maisimportantes museus do mundo, disponibilizou parte de suas publicaçõespara download gratuito. São 474 livros. As obras disponibilizadasforam publicadas entre 1964 e 2013 e compreendem todo o períododa história da arte — ressaltando as características artísticas distintivase influentes, classificando as diferentes formas de cultura eestabelecendo a sua periodização. Acesse: http://bit.ly/1dOCPm2

Estamos de volta com mais algumas dicas de sites e lugares interessantes paravisitar na internet. Desta vez o destaque é para a cultura e o conhecimento, comindicações úteis para quem precisa fazer um trabalho escolar, divertir-se ousimplesmente saber um pouco mais sobre milhares de assuntos.

PorLUCIANA GOMES GIMENESAdministradora de empresas eCoordenadora de comprasSão Paulo - [email protected]

BOM DE VER

OPINIÃO BEM FORMADAQuer conhecer um site de notícias e mídia com

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NEPNEPNEPNEPNEPALALALALALuma surpresaem cadaesquina

PorJOÃO BAPTISTA ALENCASTROMédico, escritor e aventureiroGoiânia - [email protected]

Antes de tudo, este país fica encravado entre o Tibet e a Índia. Cheio de gente,gente alegre, amistosa e pequena. Sua capital, Katmandu, é um sonho oriental.Lugar onde pode-se viver tranquilamente com U$ 30 por dia, contando comrefeição e habitação. Diz-se que o país é pobre, mas digno, belo. Suas montanhascom mais de 8.000 metros, incluindo o Sagarmata (mais popularmente conhecidocomo Everest) são a moldura permanente no horizonte.

Ir lá é entregar-se ao vento frio dos dias e da majestade de suas cidades e vales.Comer um momo (pastelzinho indescritível de bom) logo cedo e também sedeliciar com o mel - colhido após uma incrível perseguição de abelha amarradacom um fiozinho - é só o começo do dia. A fé é patente em todos os cantos.Monges e mais monges.

O bairro do Tamel, em Katmandu é uma Babel descolada. Trekers, aventureirosem geral e escritores em particular, lá chegam e... ficam! Nenhum risco, nenhumassalto. Somente o sobressalto de encontrar uma edição do Tibetan MedicalPaintings novinha em folha, dentro da caixa, por um preço inimaginável para ospadrões ocidentais.

Os contrafortes do Himalaia, emoldurando tudo

Sagarmata (Everest) e seus 8.848 metros de beleza

http://viajeaqui.abril.com.br/paises/nepal

Saibamais sobre o

NEPAL

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Os templos são um caso à parte. Lindos,ricos em detalhes e curvas. A praça Durbar éinesquecível com seus tipos mais diferentes eaté a janela onde a deusinha rainha Kumaripode aparecer e olhar para você. Não deixede ir ao templo Bodnath, com o inefávelestilo “stupa” com os olhos que tudo veem.

Garuda é um deus, um nome de hotel e umahistória belíssima de deus-ave, amo lendaslocais. Mergulhe um pouco no misticismonepalês. Aproveite enquanto come oonipresente dhal bath, tem pouca pimenta, secomparar com a Índia...

Demoraria páginas e páginas e não possopostar as centenas de fotos que lá saquei.Apenas digo que a trilha até o acampamentobase é um programa para fortes e quequalquer trilha ou rumo que você tomar noNepal vai ser legal.

Momo: uma das delícias do Nepal

Templos: a fé presente em todos os cantos

Vento frio e coloridas paisagens no Campo Base

Praça Durbar e seus tipos inesquecíveis

O inefável templo Bodnath

Trajes têm uma identidade independente

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PorHELIO MOREIRAMédico e escritorGoiânia - [email protected]

Não faz muito tempo a nossa querida Professora,historiadora e acadêmica da AFLAG (AcademiaFeminina de Letras Artes de Goiás) e, com muitahonra para mim, minha confreira no Instituto Históricoe Geográfico de Goiás Profa. Lena Castelo Brancobrindou, mais uma vez, os leitores do Diário daManhã com uma bela crônica que intitulou Batons &Brioches.

Se ela fosse reescrevê-la, teria muito mais argumentospara comparar a nossa atual situação política com ado tempo de Maria Antonieta, tendo em vista o maisnovo escândalo, o das passagens aéreas.Naquelaépoca, Maria Antonieta não entendia por que osfamintos, na antevéspera da tomada da Bastilha,estavam rodeando seu jardim; eles querem pães,Majestade, ter-lhe-ia informado a camareira. Se não tempão, comam brioches, teria dito a desinformada Rainha.

Da mesma maneira, alguns políticos não conseguemenxergar que a maioria da população que elesrepresentam reclamam por soluções de algunsproblemas, até pontuais, para não sermos genéricos,que poderiam ser resolvidos com a simples economiade algumas passagens aéreas utilizadas para seusfamiliares e amigos. Não querem enxergar! Um dia opovo cansa!

Não costumo, por índole, entrar na discussão dapolítica, porém, como modesto integrante da elitepensante e, até com algum poder de formar opinião,não gostaria que, no futuro, algum crítico literário, se

é que haveria algum que se preocupasse com minhaobra literária, nominasse-me alienado.

Göethe, quase que uma unanimidade pela criação deseus quarenta e cinco volumes de poemas, romances,crítica, filosofia, ciências naturais, enfim de tudo o queexiste entre o céu e a terra, mereceu do famoso críticoliterário Otto Maria Carpeaux, o seguinte comentário,que embora não concorde por inteiro, eu o transcrevo:“Göethe, espírito apolítico, egoísta, nãocompreendeu o maior acontecimento do seu tempo,a Revolução Francesa. Contra ela, colocou-se aolado das forças feudais, assim traiu o povo, do qualproviera, traiu a humanidade, cujos sofrimentosabsolutamente não o preocupavam”.

Parece que o poder embriaga o agente político e, atépor uma questão de justiça, há que se dizer que não éde agora esta espécie de torpor das alturas e que,também, não são todos os atingidos. Alguns sãoincorruptíveis, outros, como o meu amigo Hesse LuizPereira, são incorruptíveis e exageradamente honestose ao assumirem a função que lhes foi confiada, imbuem-se de uma missão transcendente ao seu período demandato e procuram “cavar masmorras ao vicio econstruir templos à virtude”.

Outro dia, lendo o agradável livro “O baile dadespedida” do inesquecível escritor Josué Montelo,lembrei-me que tive acesso, há algum tempo, aoopúsculo intitulado “Ilha Fiscal”, mandado publicar pelaMarinha Brasileira em 1963.

Muitos não são

convidados para o

BBBBBAILEAILEAILEAILEAILE

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O livro de Josué é um romance onde o autor colocauma personagem de nome Catarina para contar sobrea sua presença naquele baile, o baile mais famoso daHistória do Brasil e que teve, como cenário,justamente a citada Ilha Fiscal.

Como o livro “O baile da despedida” não entra emdetalhes sobre a festa propriamente dita, gostaria depassar aos meus leitores algumas curiosidades,colhidas daquele opúsculo.

Antes de dar algumas bisbilhotadas na festa e ferircom o aguilhão da curiosidade alguns interessados,gostaria de aproveitar a oportunidade para evidenciar,mais uma vez, a falta de sensatez de algunsgovernantes.

O Baile, uma homenagem à oficialidade de um navioChileno, em visita ao Brasil, ocorreu no dia 9 denovembro de 1889, portanto menos de uma semanaantes do acontecimento que iria mudar, para sempre, ahistória do Brasil.

Segundo os historiadores, por aquela época, a tensãopolítica e militar havia atingido o mais alto grau deefervescência, avolumavam-se atos de indisciplinamilitar, Ruy Barbosa e Quintino Bocaiúva pregavam,abertamente na imprensa, a instauração da república;no entanto o governo se preocupava, como de restotoda a elite política e social da Corte, exclusivamente,com a organização do baile.

Era um sábado de calor sufocante, nos lares e nossalões, a modista e o cabeleireiro vestiam e penteavamas damas; alguns vestidos precisavam ser apertados,outros, alargados; alguns cabelos precisavam serreformados porque haviam sido arranjados muito cedo(havia maior procura que oferta de profissionais).Miravam-se no espelho à procura da silhueta que nãolhes pertencia; o ruge remoça a fisionomia, o pó dearroz perfuma o olfato, desviando o olhar daspossíveis rugas.

Ao anoitecer, carros e mais carros, puxados porgarbosos cavalos, começam a chegar aoembarcadouro Pharoux, descarregando as senhorasvistosas, cobertas por capas riquíssimas e respirandoesnobismo em cada movimento e sempre observadaspor uma multidão de gente que se aglomerou nasimediações para ver o desfile claudicante de sapatosno tapete das ilusões, formado pelos paralelepípedosdesnivelados.

Do cais se avistava a Ilha, toda iluminada e iluminandotodo o litoral à custa de um foco elétrico localizado natorre principal do edifício do baile, as embarcaçõesiam e voltavam, sempre apinhadas de convidados.

A família Imperial, tendo à frente o Imperador DomPedro II, embarcou às nove horas; na ilha foramrecebidos pelos Membros do Ministério, capitaneadospelo Visconde de Ouro Preto, com direito ao hinonacional tocado pela banda de música. Houve dançanos seis salões que foram adrede preparados,inclusive, atapetados de vermelho. 

O Jantar, Oh, o jantar! Não poderei, por falta deespaço, descrevê-lo em detalhes, porém, passo-lhesum resumo do informe da Confeitaria Pascoal,encarregada do serviço: 

Havia 150 copeiros, 60 trinchadores; passaram pelacopa 12 mil garrafas de vinho, licores, champanhe,cerveja, águas gasosas, 12 mil sorvetes, 12 mil taçasde punch, 500 pratos de doces variados. Na cozinhahavia 40 cozinheiros e 50 ajudantes e foram servidos18 pavões, 80 perus, 300 galinhas, 350 frangos, 10mil sanduíches, 18 mil frituras, mil caças, 50 peixes,100 línguas, 50 mayonnaises e 25 cabeças de porcorecheadas.

A história sempre repete os fatos e os homens nãoquerem ver!

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PorCARLOS EDUARDO DE OLIVEIRAEngenheiroSanto André - [email protected]

Tintos novos, suculentos, frutados (merlot do novomundo, malbec e bonarda argentino, zinfandel ameri-cano). De maneira geral, diz-se que nenhum vinhomantém suas boas características acima dos 20ºC.Entre os tintos, a faixa de temperatura deve se manterentre os 12 e 18 graus, e acima disso apenas os tintosfortificados e doces. Esta categoria, portanto, englobaos vinhos tintos que podem ser bebidos mais frescos,desde o simples beaujolais nouveau, que pode serbebido quase gelado, até os merlot e bonarda feitospara serem bebidos jovens, sem madeira e comtaninos quase imperceptíveis, em torno dos 15 ou16ºC.

Tintos sedosos e elegantes, com sabor de frutas

vermelhas (pinot noir da Borgonha, Oregon e Chile,tempranillo de Rioja e Navarra). Estes vinhos jádevem ser tomados um pouco mais quentes, entre 16e 18ºC, dependendo da estrutura (acidez, álcool etaninos) - quanto mais corpo, maior deve ser a tempe-ratura de serviço.

Tintos intensos, com sabor de groselha e madeira

(Bordeaux, varietais de cabernet sauvignon do Chile,Argentina, EUA, tempranillo de Ribera del Duero).Beber na faixa dos 17 aos 20ºC. Só é correta aafirmação “deve-se beber vinho tinto na temperaturaambiente” para quem mora além dos trópicos. NoBrasil, onde a temperatura ambiente média dentro decasa poucas vezes desce dos 20ºC, é conveniente daruma resfriadinha mesmo nestes vinhos mais potentes,caso não sejam armazenados em ambienteclimatizado.

Salut les amis!Volto a falar um pouco mais especificamente sobre este assunto, relacionando as

temperaturas “ideais” de degustação, obedecendo uma classificação dos vinhos proposta por

diversos autores e por mim adaptada, a qual acredito ser bem sintética, porém abrangente -

seguindo alguns exemplos após a descrição de cada “categoria”. Sempre lembrando que estas

são minhas impressões pessoais e o que interessa mesmo no mundo do vinho é o gosto e

preferência de cada um!

Tintos temperados, calorosos e apimentados

(syrah do Vale do Rhône, da Austrália, vinhos doLanguedoc-Roussillon, vinhos tranquilos do Douro,malbec reserva da Argentina e carmenères “reserva”chilenos). Idem à categoria acima, em torno dos 18,19ºC.

Tintos agridoces e especiados (genericamenteitalianos de dolcetto, barbera e sangiovese, desde osChianti até o Barolo, dos Valpolicella aos Amarones).De acordo com a estrutura - vinhos mais potentes econcentrados como os Barolo ou Brunello diMontalcino em uma temperatura mais alta, 18 a 20ºC;os mais simples e ligeiros podem ser bebidos maisresfriados, em torno de 16ºC. Se o tinto passou tempodemais no balde e se resfriou demais, um pouquinhode tempo na taça ou com a taça entre as mãos já ésuficiente para que ele atinja uma temperatura maiselevada e libere o que tem de melhor.

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VINHO:

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http://www.conservadonovinho.blogspot.com.br/VISITE O BLOG e DESFRUTE MAIS

Rosés (da Provence, de Navarra ou cabernetd’Anjou). Um rosé geladinho é tudo de bom! Masnão se pode exagerar no gelo, o que amortece opaladar e impede de usufruir a delicadeza destesvinhos na boca. Novamente, depende do corpo - osmais delicados e ligeiros podem ser degustados maisfrescos, em torno de 8 ou 10ºC. Alguns rosés doNovo Mundo, mais encorpados, produzidos pelométodo de “sangria”, de variedades mais tânicas,podem acompanhar até pratos mais pesados quandoservidos em uma temperatura mais alta, de 12 a14ºC.

Brancos leves e neutros (muscadet de Sèvre-et-Maine, Chablis genérico - sem carvalho - Frascati,Pinot Griggio e chardonnay frescos do norte daItália). Eu costumo tomar estes bem gelados, emtorno de 8ºC, nunca acima de uns 10ºC, comoaperitivo, na companhia de frutos do mar...

Brancos verdes, pungentes, “crocantes”

(sauvignon blanc - Sancerre, Pouilly-Fumé,Martinbourough, Chile, chenin blanc seco do Loire -Savennières - riesling secos alemães, austríacos oualsacianos): na faixa dos 8 aos 12ºC. Os maissimples mais frios, os mais concentrados um poucomenos resfriados.

Brancos intensos, com sabor amanteigado e de

frutas secas (chardonnay criado no carvalho) -Borgonha, EUA, Nova Zelândia, Austrália -Bordeaux com sémillon - Graves, Pessac-Léognan -Rioja branco). Eu aconselharia de 10 a 14ºC, pois éuma gama muito abrangente - os mais secos, desauvignon e sémillon devem ser servidos mais friosenquanto que alguns chardonnay mais estruturadospodem chegar aos 14ºC liberando o melhor de suascaracterísticas.

Brancos maduros, com sabor de torrada e

madeira (chardonnay concentrado, criado embarricas novas, basicamente Novo Mundo - EUA,Austrália e Riojas brancos reserva ou gran reserva).Devido ao corpo pesado, estes são os brancos quedevem ser tomados a uma temperatura mais alta, emtorno de 16ºC.

Brancos aromáticos (gewurztraminer e muscatalsacianos, viognier do Rhône e torrontés argentino).Muito fragrantes e frescos, devem ser degustadostambém na faixa dos 8 aos 12ºC.

Brancos espumantes (champagne, crémants deBourgogne, do Loire e d’Alsace, blanquette deLimoux, cava espanhol, prosecco e franciacortaitalianos, espumantes nacionais). De 6 a 8ºC, sendoque alguns champagnes mais complexos podem serbebidos um pouco menos gelados. Nunca abaixo dos6ºC, o que amorteceria as papilas.

Brancos doces (Sauternes, Barsac e Monbazillac naFrança, chenin blanc doces do Loire, vinhosbotritizados da Alsace, colheitas tardias alsacianos ealemães, eiswein alemães, tokaji húngaro, moscatéisespanhóis e portugueses). Controverso - muitosautores recomendam uma temperatura na faixa dos14ºC, o que acho alta. Já tomei muito vinho docegeladinho com sobremesa e estava uma delícia! Abaixa temperatura ressalta a acidez destes vinhos, oque harmoniza melhor com o doce do próprio vinho edas sobremesas.

Vinhos fortificados e calorosos (Porto, Madeira,Xerez Pedro Ximenes, Marsala, vin santo, Banyuls,Maury). O Porto eu deixo na temperatura ambientemesmo, enquanto se recomenda tomar os outros emtorno de 18ºC. Mas também já bebi o PedroXimenes, que é bem doce - com gosto de figo seco emelado - gelado, acompanhando a sobremesa - e émuito bom.

Vinhos fortificados e pungentes (xerez fino,manzanilla, madeira e marsala secos, vin jaune doJura). Eu também gosto de degustar estes vinhos bemgelados, como aperitivo, acompanhando alguma coisabem salgadinha.

Santé! Au revoir!

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Acabei de assistir a um vídeo em que uma mulher temsua primeira experiência auditiva. Automaticamente mevi em reflexão total, pois eu sei o que é ter acapacidade auditiva, mas não faço a menor ideia doque é não tê-la. Na minha profissão - Músico - qual aimportância dessa capacidade? Pergunta óbvia?Infelizmente não.

Nós músicos precisamos tanto da nossa capacidadeauditiva, que é tão óbvia, que quase cometemos acrueldade de não valorizar essa condição. Precisamosdesenvolver capacidades mecânicas, precisamospossuir bons instrumentos, mas antes de tudo issoprecisamos da capacidade auditiva. Talvez muito maisdo que o ato de tocar.

Na medida em que vamos amadurecendomusicalmente, percebemos que não adiantaabsolutamente nada ficar horas e horas estudandomecânicas se a nossa capacidade de ouvir e escutarnão for usada antes de qualquer ato musical. Nãoentrarei no mérito das pessoas que desenvolveram umasingular capacidade de se expressarem musicalmentesem a capacidade auditiva. Obviamente são pessoasabsolutamente admiráveis e ímpares.

Retomando o assunto, aprendemos também que aolongo da vida precisamos ouvir e escutar mais e falarmenos. Na verdade o problema não é o quantofalamos, mas sim sobre o quê e como falamos. Pensarsobre isso já faria com que falássemos bem menos.

Venho pensando muito sobre essas duas palavras queparecem sinônimos: ouvir e escutar. Já fiz algumasinvestigações e muitos estudiosos entendem que ambas- obviamente - fazem parte da capacidade auditiva,porém não funcionam da mesma maneira. 

Ouvir é uma audição superficial, ou mais geral, semmuita seleção. Escutar é uma seleção, ou seja,selecionamos e analisamos com mais profundidade. 

A importância da

AAAAAUDIÇÃOUDIÇÃOUDIÇÃOUDIÇÃOUDIÇÃOPorHERALDO PAARMANNMúsico e professor de músicaSão Paulo - [email protected]

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Esta nota é apenas para que tenhamos mais atenção anossa capacidade auditiva. Da mesma forma que osolhos são as janelas da alma, os ouvidos são as janelasdo espírito. Em outras palavras, somos atingidos commais profundidade pelos sons e não conseguimos tertanto controle sobre o que e não ouvir. Nãoconseguimos impedir totalmente o que não queremosouvir e escutar, porém quanto aos olhos bastam serfechados, Já tentou impedir a sua audição com estamesma facilidade?

Portanto, gostaria de convidá-los a assistir a doisvídeos: o primeiro é sobre um CirurgiãoOtorrinolarigologista Charles Limb, que também émúsico, e trabalha com reabilitação auditiva fazendoimplantes de cóclea (ouvido interno).

Ex-guitarrista do ULTRAJE A RIGOR (1991/2012), Heraldo dedica-se àmúsica, lecionando teoria musical e ensinando diversos instrumentos,além de tocar em algumas bandas. Conheça um de seus trabalhos:QUARTETO KROMAhttps://www.facebook.com/quartetokroma?fref=ts

O segundo vídeo é sobre o momento em que JoeMilne, a mulher que eu citei no início desta nota -ouviu pela primeira vez em sua vida, após o implantede cóclea. Os dois vídeos se relacionam mas não sãoda mesma equipe médica. 

Tenho certeza que esta experiência de assistir a essesvídeos fará com que pensemos mais sobre a nossafantástica capacidade de ouvir e escutar.

Fica aqui a minha contribuição para as pessoas queacham que escutar música ruim se justifique apenaspara diversão e alegria desenfreada; até entendo, masnem tudo que “reluz” aos ouvidos é ouro! 

LINKS PARA OS VÍDEOSCharles Limb realiza implantes cocleares, umacirurgia que trata a perda auditiva e pode restaurar acapacidade de ouvir o discurso. Mas como músicotambém, ele fala sobre o que os implantes ainda nãopodem: eles não deixam experimentar a músicaainda. (Há um exemplo de arrepiar os cabelos).Nesta palestra no TEDMED, ele analisa o estadoda arte e perspectivas. Você poderá ajustar oidioma das legendas na tela do vídeo.

A primeira audição - Joe Milne que sofre desíndrome de Usher era surda desde o nascimento.Ela tinha implantes cocleares bilaterais equipadosque permitiram que ela ouvisse pela primeira vez.

Este vídeo mostra o momento emocionanteem que eles foram ligados!

http://www.ted.com/talks/charles_limb_building_the_musical_muscle

https://www.youtube.com/watch?v=IyDdVJ81Ixs#t=82 

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O melhorO melhorO melhorO melhorO melhorda fda fda fda fda festaestaestaestaesta

PorALESSANDRA LELES ROCHAProfessora, Bióloga e EscritoraUberlândia - [email protected]

Quem não gosta de festa?! Imagino que todoser humano em seu juízo perfeito gosta de se divertir,de comemorar, de extravasar a sua alegria entreamigos e familiares; afinal, ninguém consegue mesmoviver sob o jugo do trabalho, das obrigações, dosafazeres em tempo integral. A máquina humanaprecisa de modo imprescindível dos seus momentosde ócio para não enlouquecer.

Entretanto, enquanto “fazemos festa” o mundonão para de girar e a vida não deixa de seguir seufluxo, repleto de alegrias e tristezas, esperanças edecepções, virtudes e defeitos. É aí que se encontra ogrande paradoxo: equilibrar o bom senso e a euforiapara não se perder nas garras de uma “ingenuidadecrédula” que tenta, tão somente, afastar o ser humanoda realidade e deixá-lo pertencer, ainda que porpouco tempo, ao berço de uma verdade idealizada.Ora, ora! Mas, sonhos e fantasias não têmsustentação! São como nuvens que se desenham e seapagam ao movimento dos ventos.  E como diziam osantigos, no alto de sua sabedoria, “o melhor da festa éesperar por ela”, porque depois nada mais resta doque lembranças de um tempo fugaz.

Terminada a Copa do Mundo de Futebol, asociedade brasileira reflete bem essa situação. Deconhecimento público, esse grande evento noscolocou diante de uma imensa linha divisória entre arazão e a emoção: como anfitriões, o encantamentodespertado pelo futebol desporto – paixão nacional –e pelas disputas históricas entre as seleções; mas, queagora vê o seu brilho maculado por tudo aquilo queenvolveu a preparação para a festa.  De repentedescobrimos o custo financeiro, ético e moral que seesconde por detrás das ufanistas bandeirolasdependuradas pelas ruas e janelas.

Longe de um evento de poucos tostões, a Copamostrou as cifras de bilhões em investimentos para serrealizada. Alguns até tentaram justificar que o retornofinanceiro seria expressivo e “o fim justificava osmeios”. Mas sabemos que não é bem assim! Naverdade, diante das crônicas mazelas sociais que searrastam pelos séculos aqui na Terra Brasilis, bommesmo seria aplicar esse dinheiro na construção deuma sociedade mais digna, verdadeiramente capaz deexibir a sua força cidadã. Ao contrário disso,mantemos a prática de oferecer do bom e do melhorpara as visitas, enquanto escondemos o ronco doestômago vazio, a inabilidade com o próprio idioma, odescascado das “mobílias”, a ausência de bonsmodos,… enfim. Enquanto o “ópio da Pátria deChuteiras” nos entorpece os sentidos, a base dapirâmide social brasileira sobrevive ao infortúnio dainflação, da ausência de atendimento médico-hospitalar nos serviços públicos de saúde, as escolas“desabam” de diversas formas sobre a cabeça dealunos e funcionários, os “arrastões” de violênciafazem suas vítimas e engrossam as estatísticas,… etc.etc. etc.

Do ponto de vista ético e moral, a situação nãofoi melhor. Primeiro, porque não há “verniz” queconsiga extirpar o nosso “ranço colonialista”. Aoprimeiro grito de uma “metrópole”, ou instituição a elaligada, nossa obediência bovina se aflora e passamos acumprir ordens sem questioná-las. É verdade! Foiassim que a Federação Internacional de Futebol –FIFA “aceitou” nossa proposta de sediar a Copa doMundo de 2014; mas, nos impôs a subserviência,inclusive, ferindo a nossa liberdade de expressão eproibindo quaisquer tipos de manifestação popular emrelação aos problemas sociais do país, até mesmo

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cartazes nos limites das arenas onde se realizariam osjogos. Nossa tal “concordância” se legitimou atravésda Lei Geral da Copa (Lei n.º 12.663, de 5 de junhode 2012). De repente, ficou permitido “permitir” e aavalanche de possíveis violações aos direitoshumanos, especialmente no que diz respeito àspéssimas condições de trabalho dos operários dasobras propostas no projeto, à informação eparticipação pública sobre a realidade dos fatos, àsquestões ambientais e ao direito do consumidor, ficouescancarada.   

Não há como negar que, apesar dos oito anosque separaram a escolha do Brasil como sede dosjogos e o evento propriamente dito, prometemosmuito, demais; mas, muitas dessas promessas ficarampelo caminho, apesar dos bilhões gastos. E entre oque foi e não feito, nos deparamos com a má gestãodos recursos e a fragilidade das obras, a qualculminou na morte de vários trabalhadores, odesabamento de elementos de mobilidade urbana(uma viga do Monotrilho, linha 17-Ouro, caiu na zonasul de São Paulo e matou um operário e feriu emestado grave outros dois e, mais recente, um Viadutoem construção sobre a Avenida Pedro I, parte dasobras do BRT da capital mineira, desabou, matando

duas pessoas e ferindo outras vinte) e tantos outrosdescasos com o cidadão brasileiro.)

Em meio a tudo isso e lendo a obra excepcionalde Edson Monteiro – CORRUPÇÃO: uma endemiasem remédio? (Letra Capital, 2013) – mais reafirmo aminha discordância quanto à afirmação de JeanJacques Rousseau, em seu O Pacto Social (1762), quediz “o homem nasce livre e bom, a sociedade ocorrompe”.  Não, como na capa do livro a umidadeaflora na fragilidade das paredes de uma construção,nós nos permitimos à maldade, à falta de ética e moral,por escolha.

Talvez, o quinhão de responsabilidade dasociedade seja o de unir as deformidades éticas emorais dos indivíduos, potencializando a força dessasna desconstrução da própria sociedade. Enquanto nosmantemos inertes e insensíveis às dores do mundo, doqual fazemos parte essencial, mas insistimos em dividi-lo segundo nossos próprios preceitos, e nospermitimos marejar os olhos de emoção, num exemplode civismo superficial e torto já que não possuímosverdadeiramente a pujança da cidadania correndopelas veias, isso é ou não é uma escolha?!  Como bemcolocou Simone de Beauvoir, “O opressor não seriatão forte se não tivesse cúmplices entre os própriosoprimidos” e a corrupção, entre tantos outros malesque afloram do comportamento humano, sóencontraria remédio eficaz se não despertasse no serhumano o péssimo hábito de justificar o injustificável,de encontrar sempre um modo de fazer das pioresatrocidades um elemento indispensável ao bem-estar eà construção social. Portanto, de que lado queremosestar?Parece mesmo haver uma dificuldade imensa decompreensão do ser humano quanto a sua existênciacoletiva. O mesmo que se queixa da enxurrada demazelas presentes no seu cotidiano de labutas e clamaaos céus a providência divina da transformação; é oque apaga instantaneamente da memória tamanharudeza mediante o agrado envolvido em “pão e circo”.

Infelizmente, ainda depositamos a nossa“felicidade” nas “chuteiras” alheias, quando deveríamostomar as rédeas da vida nas mãos e sorver daspróprias experiências o néctar de uma felicidade quepode até ser agridoce; mas, que contenha o alimentosagrado da nossa dignidade, da nossa identidadecidadã. Talvez o dia em que entendermos tudo isso,pensaremos duas vezes antes de despender nossochoro, nossas velas, nosso dinheiro; pois, como já ditoanteriormente, o melhor da festa é somenteesperar por ela.

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O Pássaro Dodô, também chamado de Dronte(Raphus cucullatus) foi uma ave não voadora extintadas Ilhas Maurícias, uma das ilhas Mascarenhas nacosta leste da África, perto de Madagascar, no Ocea-no Índico. A ave mais próxima geneticamente foi atambém extinta solitário-de-rodrigues, também dasubfamília Raphidae da família das pombas; sendoque a mais semelhante ainda viva é o pombo-de-nicobar.

O Dodô tinha cerca de um metro de altura e podiapesar entre 10 e 23 quilos. A aparência externa éconhecida apenas por pinturas e textos escritos noséculo XVII, e por causa dessa considerávelvariabilidade a aparência exata é um mistério. Poucose sabe com exatidão sobre o habitat e ocomportamento, pois há poucos e discordantes textosdescritivos: plumagem cinza acastanhado, pataamarela, um tufo de penas na cauda, cabeça cinza sempenas, e o bico de cerca de 23 centímetros, amarelo everde.

A moela ajudava a ave a digerir os alimentos, incluindofrutas, e acredita-se que o principal habitat tenha sidoas florestas costeiras nas áreas mais secas das IlhasMaurícias. As pedras da moela do Dodô eram debasalto (segundo alguns textos) e não existiam no localonde tinham sido desenterrados os ossos do Dodô,mas a milhas de distância. Essa pedra ia crescendo àmedida que crescia a moela, até atingir proporções dotamanho de um ovo de galinha. A pedra da moela dosDodôs era a preferida para amolar facas!

Presume-se que o Dodô tenha deixado de voardevido à facilidade de se obter alimento e à relativainexistência de predadores nas Ilhas Maurícias.

A primeira menção ao Dodô que se conhece foiatravés de marinheiros holandeses em 1598 (osportugueses visitaram a ilha em 1507, mas não fizeramrelatos da ave). Nos anos seguintes, o pássaro foipredado por marinheiros famintos; seus animaisdomésticos e espécies invasoras que foramintroduzidas durante esse tempo alimentavam-se dosovos nos ninhos. A última ocasião aceita em que o

O extintopássaroDODÔDODÔDODÔDODÔDODÔ

PorROBERTO ANTONIO ANICHEMédico, filatelista e escritorSão Paulo - SP

[email protected]

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Dodô foi visto data de 1662. A extinção não foiimediatamente noticiada e alguns a consideraram umacriatura mítica. No século XIX, pesquisas conduzirama uma pequena quantidade de vestígios, quatroespécimes trazidos para a Europa no século XVII.Desde então, uma grande quantidade de materialsubfóssil foi coletado nas Ilhas Maurício, a maioria dopântano Mare aux Songes.

A extinção do Dodô em apenas cerca de um séculoapós seu descobrimento chamou a atenção para oproblema previamente desconhecido da humanidade,envolvendo o desaparecimento por completo dediversas espécies.

As primeiras descrições conhecidas destas aves foramfeitas pelos holandeses, que chamaram o pássaromauriciano de walghvogel ( “pássaro chafurdador” ou“pássaro repugnante”), em referência ao seu gosto.Embora muitos escritos posteriores digam que a carneera ruim, os primeiros jornais apenas diziam que acarne era dura, mas boa, embora não tão boa como ados pombos, abundantemente disponíveis. O nomewalgvogel foi usado pela primeira vez na revista dovice-almirante Wybrand van Warwijck que visitou ailha em 1598 e denominou-a Maurícia.

Alguns autores atribuem o nome Dodô à palavraholandesa dodoor para “preguiçoso”, mas eleprovavelmente está relacionado à palavra dodaars(“nó-bunda”), referindo-se ao nó de penas sobre otraseiro do animal. O primeiro registro da palavradodaerse está no relato do capitão Willem vanWestsanen de 1602. Thomas Herbert usou o termoDodô em 1627, mas não está claro se ele foi o

primeiro a vê-lo, pois os portugueses já haviamvisitado a ilha em 1507, embora não tenhammencionado a ave. De acordo com o MicrosoftEncarta e o Chambers Dictionary of Etymology,Dodo seria derivado do português arcaico doudo(atualmente doido). Também há textos afirmando queo nome foi uma aproximação onomatopaica do somque elas produziam, um piado de duas notas, quesoava como “doo-doo”.

O último Dodô foi morto em 1681, e não foipreservado nenhum espécime completo, apenas umacabeça e um pé. Os restos do último Dodô empalhadoconhecido tinham sido mantidos no AshmoleanMuseum em Oxford, mas em meados do séculoXVIII, o modelo - salvo as peças ainda existenteshoje - estava completamente estragado e foi jogadofora.

Em 1681, menos de 100 anos depois da chegada dosholandeses à ilha, o Dodô foi declarado oficialmenteextinto. Hoje, tudo o que resta do animal sãoesqueletos em museus na Europa, nos Estados Unidose também em Maurício. A ciência garante que trêsespécies de Dodô se extinguiram nas três ilhas nos trêsúltimos séculos, e que só uns treze animais vivosviajaram das Mascarenhas para outras partes domundo, entre elas um para o Japão.

Por fim, o Pássaro Dodô ficou imortalizado por fazerparte do desenho animado Alice no País dasMaravilhas, de Walt Disney, sendo parte da culturapopular, frequentemente como um símbolo da extinçãoe obsolescência, sendo frequente o seu uso comomascote das Ilhas Maurício.

Para saber mais:

http://www.sppaulista.com.br/

O autor é membro da SociedadePhilatélica Paulista. Saiba maissobre filatelia e conheça coleções de

selos, exposições e palestras filatélicasde Roberto Antonio Aniche:

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Opinias - Agosto 2014

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Há uma casa que está em nosso pensamento e que nos perturba duranteanos, até que um dia nós resolvemos colocá-la em prática. E é aí quesurgem os maiores tormentos. A escolha do terreno, do bairro oucidade, a cara da casa, seu formato aberto ou fechado, que amigosvamos receber nesta casa, que móveis, quadros, tapetes vamoscolocar... A angústia deste início é a mesma quando resolvemosmelhorá-la, diminuindo seu tamanho ou ampliando-a.

Houve um tempo em que se gastava muita energia na intenção de seresolver pequenos problemas. O pior é que hoje não mudou muitonosso raciocínio quanto à ideia de morar, principalmente no Brasil, ondea casa básica é um quadrado ou retângulo que os malévolos portuguesesnos deixaram como herança nefasta. Mas, vamos neste sonho durantemuito tempo, colocando em armários invisíveis da nossa vida a nossaresponsabilidade de morarmos em um bloco geométrico que resolvemoschamar de casa.

Há ainda a casa indefinida do pensamento, que é aquela que o nossopatamar financeiro não alcança. A casa fidalga, que nos remete a sonhosdistantes, a casa em que desejaríamos morar, a casa que era de umimportante homem de negócios da cidade, com seus panos de vidro,seus jardins... A casa ensolarada da viúva bela e que nos deixava com odesejo de estar lá. A casa que tinha sempre, à tardinha, um casal deidosos na varanda tomando chá. A casa dos coqueiros enormes, a demuitas árvores que escondiam a casa, transformando-a num cenáriobucólico de saudades da infância. A casa que gostaríamos de terconstruído e não tivemos a coragem de fazê-lo.

Como dizia João Cabral de Melo Neto: “O homem é o animal mais bemvestido e calçado, ergue imensas paredes para se proteger do abismohorizontal do espaço, se isolando do ar abraçado.” E nós vamos vidaafora nos defendendo de abismos horizontais, nos isolando de ares,porém sem abraços, já que colocamos enormes muros entre nossasvidas. Isto sem falar nos muros mentais.

Somos estranhos. Realmente moramos muito mal, escondendo as nossascasas entre grandes muros. É a prova de que temos vergonha do quesomos. Nossa mesquinhez do morar não fica somente aqui. Vai muitomais além do que supomos. Moramos em quadrados ou retângulos demedo e inveja. E com toda certeza ainda não moramos nem na casa enem na terra dos sonhos. Dito e feito: somos a estranha espécie dos semtetos com tetos mal e porcamente acabados.

a casa dos

SONHOSSONHOSSONHOSSONHOSSONHOS

PorLUIZ KHASHOGGIArquiteto e designer

Nilópolis - [email protected]

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Opinias - Agosto 2014

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PorVICTOR EUSTÁQUIOAfrican Studies PhD fellow - EscritorTorres Vedras - [email protected]

Dizem que com o tempo aprendemos a mitigar ador que se sente perante a morte de alguém que amamos.Mas se a morte nos envelhece e acelera o tempo, fazsentido gastar o tempo que nos resta, cada vez menor,para aprendermos o que inelutavelmente recusaremossempre a aprender? É que a dor não se extingue, mas otempo há de acabar.

Dizem que há certas coisas que são da esferaprivada e que o melhor é calá-las, não se vá contagiaros demais com dores alheias. Mas se a dor é comum,porque a ela ninguém escapa, de uma forma ou de outra,mais tarde ou mais cedo, faz sentido evocar o pundonorpara tamanha condenação que a todos toca?

Dizem que são misteriosos os desígnios de quem,porventura, estará algures a decidir estas coisas. Por mim,não vejo mistério nenhum. Apenas dor. Individual ecoletiva. A minha dor como a dor de todos os outros.Sobretudo porque não creio que haja paraísos quecheguem para tantos mortos. E tantas dores.

Tenho saudades do tempo em que não pensavanisto porque, em boa verdade, começo a suspeitar deque, com o tempo, o que aprendemos não é a mitigar ador; mas a ampliá-la. Pela simples razão de que, naentrega ao combate em busca de paliativos, estamosapenas a aproximar-nos cada vez mais da percepçãoatroz da nossa condição de finitude.

A minha moral não é uma lição. Nem um apelo.Nem um desabafo. Nem um grito de pânico. É tãosomente uma moral, a minha, que não serve para nada.Nem para os que dela comungam.

Se concordarias com isto? Claro que não! Poriasas mãos à cabeça por tanta incredulidade. Pelo desânimode descobrires que nada aprendi do que me quisesteensinar. Contudo, deixaste de cá estar para mo dizer. E

eu cá continuo, sem igualmente poder dizer-te quelamento imenso. O quê ao certo, não sei. Mas lamento.

Às vezes, no longo solilóquio em que descubroestar sem saber quando começou, julgo que nãodecidiste partir por vontade própria. Outras vezes, pensoo contrário. Às vezes, conto os dias desde que vi o teuúltimo olhar já embaciado. Sim, porque eu estava lá,embora provavelmente não soubesses. Ou preferissesnão saber. Outras vezes, recuso-me a fazer contas.Porque tento afastar da memória aquele dia, aquela hora,aquele minuto, aquele exato segundo. É um pensamentointrusivo, recorrente, mas também ambíguo. Tanto mecorrói como me sustenta. É que, pelo menos naquelemomento, não estive ausente. Não me demiti de estarpresente no princípio deste silêncio que se prolongaráaté à eternidade. Apesar de ser enorme a vontade de ocalar.

Dizem que com o tempo aprendemos a silenciar ador. Que acabamos por aceitar que não há tempo paratanto desperdício de tempo. Mas como se silencia umacoisa que já é silenciosa? Quanto tempo é necessário,do tempo que não temos? E por que é que dizem o quedizem, do tanto que dizem, quando não há nada paradizer? Se calhar, é pela mesma razão que eu falo. E falo.Embora nada diga.

De todos ossilêncios quequeremos

CALARCALARCALARCALARCALAR

Conheça o novo romance do autor:A CIDADE DOS SETE MARESEditora Edições EsgotadasLisboa - Portugalhttp://www.edicoesesgotadas.com/livro?i=87

Opinias - Agosto 2014

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Lendas

AMAZÔNICASAMAZÔNICASAMAZÔNICASAMAZÔNICASAMAZÔNICASPorALINE DE MELO BRANDÃOMédica e escritoraBelém - [email protected]

Esta é a lenda contadade um amuleto da sorte,lenda de mata fechadada Amazônia, bem ao norte.

Dizem que há muitos anosos deuses urdiam planosnas fontes do Nhamundá,lago Yaci - Oaruálago que espelha a luaonde ela nada e flutuasua face prateadanaquela água encantada.

Lá se banhavam, faceiras,Amazonas, índias belas,jovens valentes, guerreiras,plumas azuis e amarelas.

Mergulhavam pra buscardas profundezas do rioum antigo talismã,amuleto arredondadobem pequeno, esverdeado,chamado muyraquitãque doavam aos guerreirosGuaçarís, belos e fortes,seus vigorosos parceiros,para aumentar suas sortes,ajudá-los na floresta,mãe do verde e encantarias,onde Uyara dorme a sestae o Curupira vigia.

Seu Menino, a Cobra-D´Águanaquele lugar nascera,Uirapurú canta a mágoano (en) canto que acontecera.

Dizem, sem tirar - nem pôr,que boto conquistadorem noite de lua cheiacom as virgens, faz amor,

deixando na gravidezdessas meninas - donzelasuma saudade sem vezpra sempre a morar com elas.

Imagem: http://joseronaldodiascampos.blogspot.com.br/