Revista Solucao 200505

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Publicao institucional da ESAB Brasil Abril / 2005

1904 - 2004 ESAB 100 anosUm sculo de desenvolvimento em soldagem e corte.

Rua Zez Camargos, 117 Cidade Indstria Cep. 32210-080 Contagem / MG

NDICE

Autobiografia de Oscar Kjellberg O inventor do eletrodo revestido descreve seu trabalho e sua vida.

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Oscar Kjellberg inventor e visionrio Quem foi Oscar Kjellberg? O que o motivou?

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Descobrindo novas fronteiras Um sculo de expanso global A ESAB, que comeou bem pequena em 1904, agora uma empresa internacional. Leia tudo sobre a expanso da ESAB durante um sculo de soldagem.

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Uma tarefa diferente Esta histria nos leva de volta a 1914, quando Ragnar Asander viajou de tren para a Rssia para consertar uma serraria usando o mais novo mtodo de soldagem de Oscar Kjellberg.

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Uma histria da Soldagem Este artigo ressalta a histria da soldagem a arco que comeou no final do sculo XIX.

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Da vareta de solda ao sucesso - Revelando a histria do eletrodo revestido O sucesso do eletrodo revestido durante o sculo XX.

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Soldagem de navios, uma questo de classificao As regras unificadas das Sociedades Classificadoras so uma valiosa ferramenta na construo de navios.

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Avanos na tecnologia de soldagem ilustrados em selos postais Dr. Sejima analisa a histria da soldagem atravs de uma seleo de imagens tiradas de sua coleo de selos.

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Aos inoxidveis - passado, presente e futuro Este artigo resume sucintamente a histria do desenvolvimento do ao inoxidvel e analisa algumas tendncias futuras.

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O futuro da soldagem e da junta Desde a inveno do eletrodo revestido, h 100 anos, vrios outros processos de soldagem foram inventados. O que o futuro nos reserva?

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A histria da soldagem em alumnio Para apreciar a histria da soldagem em alumnio, importante conhecer a histria do material em si.

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E D I TO R I A L

Este nmero especial da Revista Soluo uma traduo da Revista Svetsaren, comemorativa do centenrio da ESAB, ocorrido em 12 de setembro de 2004. Para ns, da ESAB Brasil, uma oportunidade de reafirmarmos nosso compromisso de trazer para nossos clientes e para a comunidade da soldagem a melhor tecnologia em processos, mtodos e produtos para soldagem e corte, princpios que estiveram sempre presentes na nossa Empresa, nesses cem anos de existncia. 2005 trs para ns outro motivo de puro orgulho, com as comemoraes, em setembro, do cinqentenrio da instalao da nossa Fbrica de Eletrodos de Contagem (MG), que marcou o incio de uma relao de parceria e compromisso com o desenvolvimento do Brasil, que perdura at hoje. Naquele longnquo 1955, quando a famlia Pareto se associou ESAB Sucia para criar aquela que viria a ser a maior empresa de soldagem e corte da amrica Latina, um sentimento se incorporou ao esprito da nossa Empresa e se mantm at hoje: acreditar no Brasil, na capacidade dos brasileiros e na superao permanente de desafios para crescer e se fortificar. Iniciamos este novo perodo da nossa histria com esprito renovado de nossos fundadores. Estamos investindo em novos mercados, novas tecnologias, novos produtos, ampliando nossa capacidade de produo. Temos uma longa histria a nos suportar. Temos um longo futuro ainda por construir. Nossos agradecimentos a todos os colaboradores que, nesses 50 anos, ajudaram a formar a ESAB de hoje.

No dia 12 de setembro de 2004, comemoramos 100 anos de ESAB. O mundo est agora muito diferente daquele que Oscar Kjellberg, fundador da ESAB, conheceu no princpio do sculo passado. Naquela poca, a fabricao pesada em ao estava centrada na Europa e Estados Unidos, enquanto que hoje a geografia de produo literalmente global, com novas economias na sia e mercados emergentes definindo o ritmo na construo de navios e de outras indstrias de consumo intensivo de ao. Ao longo dos perodos subseqentes, muitos materiais e processos surgiram criando oportunidades de expanso e desenvolvimento. O sucesso de nossa indstria, e da forma como a servimos melhor, sempre dependeu da troca ativa de idias, tcnicas e experincias entre clientes, fornecedores, institutos de soldagem e nossos prprios engenheiros. Por quase setenta anos Svetsaren tem sido uma pea chave na motivao desse intercmbio. O meu obrigado especial a Bertil Pekkari, coordenador aposentado da Svetsaren, que, juntamente com o editor Ben Altemhi e outros membros da equipe editorial, compilaram esta edio especial centenria e deram continuidade a uma longa tradio como guardies desta extraordinria revista informativa. Jon Templeman Diretor-Presidente ESAB Holdings Limited

Edio Especial - Traduo da Revista Svetsaren, editada pela ESAB da Sucia, em comemorao aos 100 anos da Empresa.Publicao institucional da ESAB Brasil Rua Zez Camargos, 117 Cidade Industrial Cep. 32210-080 Contagem MG [email protected] - www.esab.com.br Diretor Presidente Dante de Matos Diretor de Vendas Newton de Andrade e Silva Diretor Industrial Lus Cludio Assis de Mattos Diretor Financeiro Ernesto Eduardo Aciar Gerente de Marketing Antonio Plais Produo: Prefcio Comunicao 31-3372-4027

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Autobiografia de

Oscar KjellbergViaje de volta a maro de 1918 e leia como o inventor do eletrodo revestido descreve sua vida e seu trabalho.

N

asci na parquia de Arvika, em 21 de setembro de 1870, e fui o mais velho de cinco irmos. Minha me se chamava Karolina e meu pai Johannes Kjellberg, um trabalhador ferrovirio empregado por uma empresa britnica. Meu pai foi assassinado em Heatings, nos EUA. Sa da escola em 1886, quando ento comecei a pagar pela minha educao. Torneime um aprendiz na Oficina Mecnica de Kristinehamn e trabalhei em diferentes departamentos at a primavera de 1890, quando fui para o mar para obter qualificaes prticas de trabalho com maquinrio e para ganhar dinheiro para custear meus estudos superiores. Ao longo dos anos que se seguiram, trabalhei em vrios navios a vapor, dentre eles dois anos no Guernsey af Tnsberg, na poca o maior navio dos pases nrdicos. Em 1894 e 1895, trabalhei na Oficina Mecnica de Kockum, em Malm. Na primavera de 1896 me formei como segundo oficial de mquinas pela Escola Naval de Malm. Trabalhei como responsvel pela sala de mquinas em navios suecos, rus-

sos e noruegueses, em diversas guas. Em 1898, me qualifiquei como chefe de mquinas pela Escola Naval de Malm e imediatamente aceitei um emprego de chefe de mquinas na Hallands Angbats Aktiebolag. Durante vrios perodos de licena para estudo, trabalhei como aprendiz na Fretzner em Laura Hytte e na Ottenser Eisenwerk, as maiores e mais modernas oficinas de caldeiras a vapor da Europa, naquela poca. Em 1902, me formei como Engenheiro Naval pela Escola Tcnica de Bremen. Este ttulo me qualificava para trabalhar como engenheiroresponsvel nos maiores navios de passageiros da Alemanha. Em 1903, passei em um exame especial de Eletroengenharia na Escola Naval de Gteborg. Desde que iniciei minha carreira tcnica, me senti insatisfeito com os mtodos de reparo e de remendos usados nos navios, em suas caldeiras a vapor e nos componentes de mquinas em geral. Nos idos de 1900, comecei a investigar como qualquer um destes itens de equipamento

tinha sido reparado usando soldagem. Carregar grandes componentes de mquina para dentro de um alto-forno estava fora de questo, e era ento necessrio considerar o uso de eletricidade como o meio de aquecimento que poderia, na prtica, ser levado para a pea de trabalho em um arame de cobre. No entanto, primeiramente era necessrio estudar o que tinha sido feito nesta rea. Descobri que pessoas de diversos pases j haviam pesquisado sobre esse assunto

seriamente e, em 1864, uma patente relativa ao uso de eletricidade tinha sido registrada. Ao final da dcada de 1880, a literatura da poca mencionava com muito entusiasmo a soldagem eltrica. No entanto, os mtodos no obtiveram sucesso por vrias razes que os pesquisadores da poca ignoravam. A soldagem eltrica foi um fracasso total. Desta forma, o terreno era ainda virgem mas, como problemas existem para serem superados, decidi investigar por que os engenheiros daquela poca

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no tinham analisado o assunto por completo. Estudos aprofundados sobre o que eles haviam feito provaram que esse era o problema. Obtive sucesso ao enxergar os erros dos meus predecessores e aprender com eles. Perseverei em meus experimentos e estes produziram resultados favorveis, endossando, assim, minha convico de que uma soluo poderia ser encontrada. No princpio de 1904, meus experimentos tinham avanado a tal ponto que o primeiro trabalho prtico poderia ter incio. O trabalho envolvia soldar os cilindros e as mangas do aparelho de ancoragem do canhoneiro H.M. Svensksund, que tinha congelado e quebrado. Este canhoneiro funciona at hoje sem problemas. Em meados de 1904, fundei a empresa Elektriska Svetsnings Aktiebolaget, da qual sou o presidente desde ento, para aproveitar o sucesso obtido no campo da soldagem eltrica. Nos anos de 1904, 1905 e 1907, as primeiras patentes foram registradas e obtidas. Dentre elas, a de 1907 estabelecia os fundamentos para uma era totalmente nova na soldagem eltrica, visto que essa inveno tornou possvel eliminar o oxignio do ar ao redor da pea de trabalho exposta ao calor da soldagem. A presena do oxignio tinha um efeito malfico e variava significativamente as propriedades mecnicas e qumicas da junta de solda.

A soldagem na parte inferior do objeto tambm se tornou possvel. Para alcanar isso, o efeito da gravidade no ferro fundido tinha que ser eliminado. Tal resultado foi alcanado manuseando as foras de adeso e coeso para produzir o que poderia ser descrito como uma fora ou movimento capilar conjugado que atuava no material metlico fundido e que tinha que ser transferido do eletrodo de trabalho para a pea. Como essa fora maior que a gravidade, o ferro fundido do eletrodo de trabalho gravita para cima em direo pea. Outras patentes foram obtidas para melhorias nesse mtodo. Os anos que se passaram no foram exatamente um mar de rosas, devido desconfiana total que havia frente soldagem eltrica na poca em que meu mtodo foi desenvolvido. Dar soldagem eltrica uma reputao mundial foi uma tarefa extremamente difcil, principalmente na Sucia. Os resultados foram to positivos que esse mtodo de soldagem , ainda hoje, o mais utilizado e tem sido patenteado e introduzido em todos os pases industrializados. No momento, pelo menos 3.000 hp (horse-power) esto certamente sendo utilizados para desempenhar esse trabalho na Sucia e, em nvel mundial, dezenas de milhares de horse-power esto sendo utilizados para o mesmo objetivo. Obter reconhecimento no meu prprio pas no tem sido

fcil. A imprensa especializada no compreendeu nada, e os tcnicos mais experientes, alm do falso descrdito, tiveram a coragem de apoiar e estimular a explorao desleal e o roubo de bens tcnicos que pertenciam a mim e minha empresa. A mesma coisa tambm aconteceu fora da Sucia, apesar do fato ser menos surpreendente. Apesar disso, a imprensa internacional, os consultores de destaque e princi-

palmente os tcnicos estrangeiros tm valorizado mais o trabalho que vem sendo feito aqui do que os prprios suecos. Por exemplo, a revista francesa LUsine, acostumada a falar apenas da indstria de engenharia mecnica francesa, escreveu o seguinte no dia 7 de janeiro de 1917: Para resolver os problemas colocados pela soldagem eltrica usando um eletrodo de metal como uma vareta de solda, foi necessrio encontrar

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uma forma de forar o arco em uma determinada direo e ento trazer o metal de soldagem para o ponto preciso necessrio, a fim de criar uma junta de solda uniforme, e fazer isso usando um arco suficientemente fraco para evitar danos pea de trabalho. Esse problema foi solucionado pelo engenheiro O. Kjellberg, de Gteborg, Sucia, de uma forma to elegante e direta que quiseram at a priori negar-lhe o valor

de sua inveno. Entretanto, o fato de essa soluo ter sido finalmente encontrada aps 25 anos de tentativas infrutferas e de ter tido sucesso ao criar um mtodo de soldagem eltrica industrialmente aplicvel, o que pode ser facilmente comparado com a soldagem a maarico, um sinal claro de que trata-se realmente de uma inveno. Essa inveno de um valor ainda maior, pois no exige o uso de diversos equipamentos eltricos e

mecnicos frgeis. Na verdade, ela envolve o uso de equipamentos conhecidos, o que permite resultados benficos imediatos. Algumas pessoas pensam que esse trabalho me enriqueceu e me proporcionou uma boa vida, mas no foi bem assim. No entanto, at hoje tem sido minha fonte de renda e aqueles que vm me apoiando lealmente e promovendo meu trabalho no esto decepcionados.

Estou satisfeito, abraando a teoria bsica de que as pessoas persistentes triunfaro, enquanto que as preguiosas e que vivem injustamente do suor dos outros sero um dia os perdedores. As geraes futuras decidiro se os meus esforos foram importantes e se os resultados foram para o bem geral. Partille, 28 de maro de 1918.

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Oscar KjellbergInventor e VisionrioPor: Bo Srensson, ex-funcionrio da ESAB AB, Gothenburg.

s primeiros anos da ESAB esto for temente ligados a seu fundador, Oscar Kjellberg. As invenes e a for mao da Elektriska Svetsnings Aktiebolaget (ESAB), estabelecendo a marca do grupo no mundo inteiro, resumem a vida profissional deste homem extraordinrio. Desde 1904, vrios autores j escreveram sobre a histria da ESAB. Porm, Kjellberg, o homem, sempre foi ofuscado por suas conquistas. Ento, quem foi ele? E o que o motivou?

O

Oscar Kjellberg nasceu em uma poca de progresso tecnolgico sem precedentes. A segunda metade do sculo XIX viu uma ampla inovao em todo campo cientfico e tcnico desde a medicina at a produo, estabelecendo os fundamentos do mundo que conhecemos hoje. Em toda a Europa e Amrica do Norte, revolues industriais transformaram economias nacionais totalmente agrcolas para industrializadas, auxiliadas pelo desenvolvimento do transporte mecanizado. Uma nova raa de engenheiro-empreendedor, exemplificada por Robert Stephenson, Isambard

Kingdom Brunei, Thomas Edson, Karl Benz, Samuel Colt e os Irmos Wright, surgiu paralelamente. A Sucia tambm acolheu pioneiros industriais que exibiram a habilidade de inovar e depois montar empresas que sobreviveram e prosperaram. Assim como Oscar Kjellberg, nascido em 1870, na pequena vila de Mtterud, Gustaf de Laval (inventor da primeira turbina a vapor usvel), Gustaf Daln (inventor do equipamento de farol e diretor presidente da AGA) e C.E. Johansson (as primeiras cunhas) pertencem a este clube de pioneiros.

Oscar foi o primognito de Johannes e Karolina Kjellberg, que juntos tiveram cinco filhos. Johannes, seu pai, trabalhador ferrovirio, emigrou para o Canad no incio da dcada de 1880, na esperana de achar trabalho para sustentar a famlia. Infelizmente, pouco tempo depois de sua chegada, morreu no local de trabalho, sob circunstncias at hoje obscuras. Oscar Kjellberg tinha 12 anos e esta foi com certeza uma poca muito complicada para toda a famlia. Apesar das dificuldades, ele conseguiu continuar seus estudos e, aos 16 anos, matriculou-se

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como aprendiz na Kristinehamns Mekaniska Verkstad. Dizem que ele era um aluno muito esforado e quieto e que no se contentava com as aulas que recebia durante o dia. Para tanto, pegava emprestado na biblioteca livros especializados em engenharia mecnica e os estudava durante boa parte de suas noites. H um relato de sua poca em Kristinehamn. Certa noite, Kjellberg estava sentado no banco do porto quando ento comeou uma conversa com um homem idoso. Este senhor era Axel Brostrm, que j havia comeado a construir um imprio de navios, o futuro Grupo Brostrm. Dizem que Axel Brostrm comentou que algum deveria inventar um

processo onde as placas que formam o casco do barco pudessem ser soldadas ao invs de rebitadas. Kjellberg, na poca com 17 anos, supostamente respondeu: Pois no, isto no deve ser impossvel! Em 1888, Oscar Kjellberg se candidatou para trabalhar para Axel Brostrm e foi imediatamente empregado como aprendiz de sala de mquinas, talvez pela lembrana da passagem no porto. Ele trabalhou por quatro anos em diversos navios da frota da Brostrm, alm de estudar noite. Aos 22 ele foi para o mar para trabalhar como engenheiro de montagem na Kockums Mekaniska Verkstad, em Malm, enquanto continuava seus estudos. Quatro anos depois, finalizou seus exames e estava habili-

tado a assumir a posio de responsvel pela sala de mquinas. Trabalhou em vrios navios nos dois anos subseqentes, enquanto continuava com o lado terico de seus estudos e, em 1898, passou no exame para engenheiro chefe. Kjellberg teve a oportunidade de trabalhar e continuar se especializando na Alemanha. Aos 32 anos, passou no exame para engenheiro naval. No ano seguinte, acrescentou a engenharia eltrica sua lista de qualificaes. Em 1903, Oscar Kjellberg j possua uma educao terica invejvel, boas qualificaes e 15 anos de experincia, principalmente em navios a vapor. Ele ento teve a oportunidade de trabalhar como responsvel tc-

nico em um dos maiores navios da poca, uma opo nada difcil. Mas no para Oscar Kjellberg, no entanto. Todo aquele conhecimento adquirido enquanto trabalhava para seu prprio sustento, toda aquela experincia que tinha acumulado, parece ter sido um preparo para alcanar o sonho vislumbrado naquela noite em Kristinehamn e na rpida conversa no porto. Pois no, isto no deve ser impossvel!

O inventorAo invs de investir na carreira como tcnico responsvel geral em um dos maiores navios a vapor do mundo, Oscar Kjellberg alugou uma pequena oficina

A pequena oficina em Henriksberg, em Gothenburg, onde Oscar Kjellberg conduziu seus primeiros experimentos

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Um exemplo da escrita perfeita de Oscar Kjellberg

prxima ao cais de Masthuggskajen, em Gothenburg, onde comeou seus experimentos com soldagem. Ele tinha conhecimento das tentativas anteriores com a soldagem eltrica, e encontrou artesos que sabiam soldar usando os mtodos de ento. O importante foi que ele estava totalmente a par das duas grandes falhas nos processos de soldagem existentes. Em primeiro lugar, a junta soldada no tinha a mesma qualidade que o metal base. Pelo contrrio, ela costumava ser mais frgil e porosa. Em segundo lugar, nem todas as posies de soldagem podiam ser manuseadas com sucesso; a soldagem acima da cabea, por exemplo, era pratica-

mente impossvel. Para que a soldagem se tornasse o mtodo universal de reparo que ele aspirava, ele precisaria resolver estes dois graves problemas. Um de seus pontos fortes foi sua prpria experincia prtica como engenheiro chefe em um navio a vapor. As caldeiras do navio eram rebitadas e, sem exceo, comeavam a vazar depois de algum tempo. Este era um problema srio, pois a presso no podia ser contida, o que resultava em reduo da potncia do motor. Desta forma, vazamentos tinham que ser selados o quanto antes. Uma prtica comum era forar um prego com formato de cunha, seguido de linho e bainha, para dentro da junta

de vazamento. Esta tarefa era muito difcil, realizada sob as piores condies imaginveis. A caldeira tinha que ser resfriada para que os trabalhadores pudessem suportar o trabalho nela. Alm disso, os vazamentos ocorriam tambm na parte de baixo da caldeira, tornando o acesso ainda mais difcil. Como um engenheiro de navio, Oscar Kjellberg tinha experincia de reparo destes tipos de vazamento e estava motivado a desenvolver um mtodo melhor e mais permanente de reparo. O princpio de soldagem eltrica era bem conhecido e explicado em mais de 300 patentes. Contudo, a metodologia existente no era capaz de oferecer uma soluo vivel para

reparo das caldeiras. A vantagem de Kjellberg foi sua concepo de que a soluo, apesar de tudo, se encontrava dentro do escopo da soldagem eltrica. Bastava que o mtodo e o equipamento fossem aprimorados. Trabalhando em sua oficina experimental, ele assumiu a tarefa de desenvolver uma soluo completa, contendo tanto o mtodo quanto o equipamento que seria necessrio. O prprio Oscar Kjellberg verbalizou a questo em um texto pstumo: A soldagem eltrica surgiu numa poca de total misria. No era um caminho que j havia sido desbravado. Contudo, as dificuldades existem para serem superadas e eu decidi investigar por que

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os engenheiros da dcada de 1880 tinham deixado o assunto pendente. Aps estudos detalhados do que eles haviam feito e alcanado, tornou-se ento evidente que esta era realmente a questo. Eu consegui ver os erros dos meus predecessores e aprendi com eles. Quando temos conhecimento disto, no surpresa que a soldagem como um mtodo ou um processo tenha interessado Kjellberg. Sua primeira patente, datada de 14 de julho de 1905, conseqentemente uma descrio de processo. Ele foi capaz de obter a patente baseado no processo bem documentado existente, pelo qual um arco eltrico entre um eletrodo de ferro e o material base faz o metal esquentar at liquidificar. Entretanto, ele acrescentou duas modificaes importantes: Primeiro, apenas uma pequena poro da pea poderia ser soldada, ou seja, somente o suficiente para que aparecesse uma fuso clara. Segundo, o eletrodo retirado, e a solda, ainda quente, compactada com um martelo. Em uma descrio de trabalho, que Oscar Kjellberg escreveu na mesma poca que ele recebeu sua primeira patente, h instrues detalhadas de como conseguir segurar o eletrodo na mo esquerda e o martelo com a mo direita. Este manual de instrues entitulado Mtodo de trabalho para solda-

gem eltrica, contendo material e manuseio, datado de 1 de outubro de 1904, est preservado no original. O manual, escrito mo, de 8 pginas, no contm nenhum erro de ortografia nem tampouco uma correo, tpico de sua abordagem metdica e de sua ateno para detalhes. Neste momento, importante mencionar que em 1904, Oscar Kjellberg j tinha desenvolvido a base terica para o que veio a ser sua contribuio mais importante para a soldagem eltrica o eletrodo revestido. Na ata de uma reunio de diretoria que aconteceu no mesmo ano est escrito que ele tinha guardado um relatrio confidencial em um cofre de banco. Agora sabemos que neste relatrio sigiloso h um relato dos primeiros experimentos com eletrodos revestidos. Gothenburg, uma grande cidade costeira, sabia que Kjellberg estava prestes a revolucionar a soldagem. Apesar de haver entre as pessoas certa desconfiana em relao eficcia da soldagem como um mtodo de reparo, Oscar Kjellberg logo teve a oportunidade de demonstrar a evoluo de seus mtodos. No comeo de 1904, ele reparou algumas peas de um navio de guerra sueco que haviam congelado e quebrado. O resultado foi to bom que tanto as companhias navais quanto as industriais se interessaram. Isto

provavelmente ajudou a financiar o desenvolvimento continuado da soldagem atravs da formao de uma empresa. Sua misso era usinar e soldar metais e gerenciar um negcio que promova estas atividades. Um professor da Chalmers University of Technology e um engenheiro chefe da Lindhomens Mekaniska Verkstad, em Gothenburg, faziam parte da diretoria da empresa. Oscar Kjellberg foi indicado como o diretor presidente da empresa. A reunio de abertura da empresa foi no dia 12 de setembro de 1904. O nome da

nova empresa era Elektriska Svetsnings Aktiebologet. Entretanto, foi abreviado para ESAB desde o incio. Como estava evidente no nome da empresa e tambm em seus artigos de associao, o conceito do negcio foi o mtodo de soldagem; o equipamento necessrio era de importncia secundria. Durante os primeiros momentos da empresa, a execuo de diferentes tarefas de soldagem foi seu produto e sua fonte de renda mais importante. Resolver problemas de reparo prticos foi ento a base do princpio da ESAB. Kjellberg, alm de diretor

Anncio oferecendo servios de soldagem em Newcastle e Glasgow, na Inglaterra, para companhias de navegao suecas. Note o primeiro logotipo da ESAB

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Oficina da ESAB em Mariehom, em torno de 1920 (vista do porto). Aqui, as primeiras produes de eletrodos e fontes de energia foram realizadas.

da empresa e de atuar ativamente em todas as reas da mesma, continuou a desenvolver o processo de soldagem. Sua segunda patente surgiu em 1906 e descreve um aparelho de mudana eltrica. Sua funo era limitar a sada de energia de um gerador de corrente constante. Contudo, o grande avano veio com a inveno que foi patenteada em 29 de junho de 1907. A patente chamada Procedimentos para soldagem eltrica incluindo o eletrodo apropriado para este objetivo. Sua propriedade revolucionria foi que Kjellberg revestiu o eletrodo de soldagem com material no-condutor, o que ofereceu muitas vantagens. Primeiro, o reves-

timento gerava um gs de proteo (CO2) quando derretia. Este gs impedia a formao de xidos de ferro na poa de fuso e possibilitava soldar peas mais compridas (at o comprimento de um eletrodo inteiro), sem precisar interromper a soldagem. A soldagem podia ser, conseqentemente, mais contnua. Alm disto, a patente descrevia como construir uma solda com vrias camadas. A segunda vantagem est associada com a busca por uma soluo aos problemas relacionados com posies de difcil soldagem, principalmente soldagem acima da cabea. Quando Oscar Kjellberg formulou uma receita para o revestimento que

fundia na mesma proporo que a vareta metlica de solda, ele descobriu que uma cratera se formava na ponta do eletrodo de solda. Esta cratera direcionava o fluxo do metal fundido e, aps muitos experimentos com composies diferentes de revestimento, ele conseguiu encontrar uma que permitia soldagem acima da cabea. A genialidade da patente que ela se omite de descrever a composio do revestimento, e a patente se tornou a patente principal do eletrodo revestido. Temos que ser gratos ao fato de Oscar Kjellberg ter tido experincia prtica em reparo de vazamento em caldeiras, e de os vazamentos aparecerem na parte de

baixo. Do contrrio, talvez ele tivesse se contentado apenas com a primeira patente. Dominar posies de soldagem difceis foi o desafio que levou a esta terceira patente, que a base para toda a soldagem moderna com eletrodos revestidos.

O gerente da empresaOscar Kjellberg foi descrito primeiramente como um pesquisador e inventor talentoso. Desde 1907 at sua morte, houve, no entanto, outro lado de seu carter que assumiu um papel tambm importante. possvel que seus companheiros de diretoria tenham entendido como as

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invenes de Kjellberg poderiam ser exploradas, mas sem dvida, o prprio Kjellberg contribuiu muito ativamente para este trabalho. As primeiras atividades se concentraram em Gothenburg, onde a ESAB oferecia instalaes de reparo em uma barcaa dentro do porto. Durante esta poca, ele participava de todos os tipos de trabalho. Entretanto, o treinamento de soldadores era uma tarefa que ele se predisps a liderar. Sem soldadores qualificados, a soldagem no seria capaz de ganhar terreno frente aos outros mtodos de reparo. Kjellberg pretendia que a ESAB instalasse oficinas em grandes portos no

mundo inteiro. Contudo, ele logo percebeu que a empresa necessitava de recursos financeiros para uma expanso to ambiciosa. Ento a ESAB ofereceu a licena de uso do mtodo Kjellberg para empresas suecas e estrangeiras. A princpio, a investida foi dura; a ESAB teve que aceitar inmeros acordos pouco lucrativos e, em alguns casos, uma empresa ganhava direito de exclusividade de uso da patente Kjellberg dentro de um pas inteiro. Porm, em 1911 a companhia j tinha capital suficiente para instalar sua primeira subsidiria estrangeira com fundos prprios. A ESAB j havia tido alguns licenciados na Ingla-

terra, o pas costeiro mais industrializado da poca, e levou um ano para que a subsidiria Anglo-Swedish Electric Welding Co., como era chamada- pudesse ser formada. Com sede em Londres, ela oferecia servios prticos de soldagem, como sua empresa-me. Na verdade, a subsidiria britnica foi tambm a ltima a parar suas atividades. Dois anos depois, uma segunda subsidiria estrangeira foi estabelecida na Blgica. Na mesma poca, um contrato muito amplo foi assinado com a Mitsubishi Zosen Kaisha, no Japo. Pensava-se que o mtodo Kjellberg ganharia rpida aceitao nos meios de engenharia. Mas no foi bem assim. Oscar Kjellberg teve que dedicar muito do seu tempo para convencer as pessoas da soldagem MMA (soldagem manual a arco), tanto na Sucia quanto no estrangeiro. Ele era um apresentador habilidoso e estava sempre bem preparado. O ponto forte de seu argumento era o custo benefcio para os clientes de soldagem, comparados com os outros mtodos de reparo. Ele conseguia apresentar exemplos onde reparos com soldagem tinham sido desempenhados a um custo de apenas 2% do custo de reparo de outra maneira ou para substituir por algo novo.

Provar a qualidade e a durabilidade de reparos soldados era tambm importante. Ele acompanhava todos os servios realizados pela empresa por vrios anos aps seu trmino e podia mostrar uma taxa de reclamao muito pequena para os padres da poca, de mais ou menos 0.5 a 1.0%. Oscar Kjellberg transformou-se assim em um profissional incansvel no desenvolvimento do processo de soldagem eltrica a arco, aprimorando continuamente a capacidade dos equipamentos, consumveis e tcnicas, buscando sempre convencer as pessoas atravs da demonstrao de resultados reais. Ele lidou com contratempos aumentando a sua carga de trabalho j muito grande. Participou no trabalho prtico em Gothenburg e nas subsidirias e representantes. Ele era, sem dvida, o maior especialista em soldagem da poca. As empresas e colegas o procuravam quando precisavam de orientao sobre como resolver trabalhos, principalmente os difceis. Dizem tambm que ele tinha uma memria incrvel. Tudo, desde contratos at descries de mtodo de soldagem, estava registrado na sua memria palavra por palavra, e ele nunca precisava olhar suas anotaes. Alm de ser um inventor,

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inovador, industrial e um homem de marketing, Kjellberg era tambm financeiramente astuto. Se a tarefa mais importante da ESAB era desempenhar trabalho de soldagem, sua segunda tarefa mais importante era de se manter independente de bancos e outras instituies financeiras. Ele queria que sua empresa fosse o mais auto-suficiente possvel em termos financeiros. Isto provaria ser um princpio muito bom durante e depois da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Durante a guerra, as coisas se encaminharam bem para a empresa, e quando os anos difceis do psguerra chegaram, a ESAB conseguiu sobreviver com o dinheiro que havia economizado. Durante e logo depois da guerra, uma aceitao mais ampla do processo levou as empresas a darem incio ao uso de soldagem, no apenas para trabalho de reparo mas tambm para trabalho de construo. Isto abriu novos horizontes para a ESAB. Entretanto, as sociedades de classificao inicialmente no aceitaram a soldagem como um substituto para rebitagem na construo de novos navios. Durante e depois da Primeira Guerra Mundial, porm, houve uma considervel demanda para substituir e reparar a frota naval militar e mercantil. Aqui o argumento econ-

mico era forte visto que a soldagem, ao invs de rebitagem, poderia reduzir o peso das placas de metal em at 10%. A Lloyds Register em Londres foi a primeira empresa de classificao a investigar as possibilidades de navios totalmente ou parcialmente soldados. Experincias foram realizadas nas instalaes da ESAB em Londres, com resultados altamente positivos. Conseqentemente, em 1920, a Lloyds aprovou a soldagem completa como um mtodo de produo para todos os tipos de navios. Os proprietrios de navios continuaram cticos. Ento Oscar Kjellberg encomendou a construo de uma pequena oficina flutuante. O ESAB IV foi lanado em 29 de dezembro de 1920 e se tornou o primeiro navio totalmente soldado do mundo a ser classificado pela Lloyds, contribuindo assim para eliminar o preconceito dos proprietrios de navios e estaleiros em relao aos navios soldados. O ESAB IV ainda existe at hoje e faz parte do Museu Martimo de Gothenburg. O prximo desafio da ESAB foi na verdade duplo: estabelecer uma subsidiria na Alemanha e ainda comear a fabricar fontes de energia para soldagem. Em 1921, a empresa alem foi formada e, depois

de um lento incio, tornouse a maior subsidiria do grupo. A fbrica de Fintswalde foi equipada para fabricar conversores rotativos, que comearam a ser vendidos na Sucia em 1923. Era tpico de Oscar Kjellberg que ele escolhesse comear fabricando as fontes de energia ao invs de investir em uma empresa de equipamento eltrico j estabelecida. Foi a demanda por caractersticas funcionais muito especiais que determinou a deciso de comear a fabricar conversores rotativos dentro da ESAB, visto que os compromissos que um fornecedor externo poderia exigir eram inimaginveis. Gradualmente, a produo de Finsterwalde passou a conter inmeras mquinas diferentes de soldagem e motores eltricos e muito mais. No seu pico, em 1939, cinco mil funcionrios mantinham-se ocupados, sendo mil e quinhentos com equipamentos de soldagem. As atas das reunies de diretoria e de outros registros dos primeiros 25 anos de Elektriska Svetsnings Aktiebolaget revelam que Oscar Kjellberg no deixou nada que dizia respeito a sua empresa fora de seu controle pessoal. Os registros s vezes dizem que o diretor Kjellberg informou a diretoria que ele tinha.... Em outras palavras, a ques-

to j havia sido resolvida. Poderia ser uma questo de acordos concernentes ao direito de uso da patente da empresa, grandes ou pequenas compras, ou a instalao de subsidirias no exterior. Assim como muitos industriais bem sucedidos, Kjellberg provavelmente via a empresa e a si mesmo como algo indivisvel. Dizem que ele no tinha outros interesses a no ser a empresa e seu desenvolvimento. Ele era o diretor presidente e o diretor tcnico ao mesmo tempo. Ele administrava contatos no exterior, estava envolvido com treinamento de soldadores e era um palestrante incansvel em tudo relacionado a soldagem. Dentro de seu campo, ele era a fonte de todo conhecimento. Na poca de sua morte, aos 61 anos, Oscar Kjellberg tinha recebido vrios prmios em reconhecimento aos seus esforos, inclusive a medalha de ouro da Royal Swedish Academy of Engineering Sciences (Academia de Cincias da Sucia). Ignorando a orientao mdica para reduzir a carga de trabalho, a dedicao empresa comprometeu sua sade. Ele trabalhou at o final de seus dias e morreu em 5 de julho de 1931, sentado na sua mesa, deixando a esposa e quatro filhos de luto. Seu filho mais novo,

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Bjrn seguiria os passos do pai. Em 1931, Kjellberg havia conquistado, na sua viso, aquilo que o tinha motivado todos estes anos. A soldagem eltrica a arco era um mtodo amplamente reconhecido, no somente para trabalhos de reparo, mas tambm para construo e produo. A ESAB era uma empresa bem estabelecida, respeitada, com subsdios e investimentos estrangeiros. Apesar disso, em 1931 a ESAB se viu frente a novos desafios. O conceito original do negcio, qual seja, de realizar soldagem para outras empresas, j

no era mais sustentvel e o mundo estava em recesso. Foi uma poca de mudanas requerendo novas idias e um novo conjunto de objetivos de negcio. Se Oscar Kjellberg estivesse vivo ele teria, sem dvida, respondido a esta questo com o mesmo otimismo, entusiasmo e tenacidade que o levou a responder a Axel Brostrm aquela noite, em Kristinehamn, 40 anos antes: Pois no, isto no deve ser impossvel! Agora, cabia aos seus sucessores demonstrar que aquilo era verdade. As informaes contidas

neste artigo foram reunidas por Bo Srensson de vrias fontes, inclusive das seguintes obras: Gsta Ferneborg: Oscar Kjellberg Bertil Lundberg: Maskinhistorik Publicao comemorativa: Elektriska SvetsningsAktiebolaget 1904-1929 Sixten Wilberg: En vandring genom aren, ESAB 50 anos. E tambm atravs de artigos e outros materiais histricos que foram reunidos por Eva Persson, responsvel pelo arquivo histrico da ESAB, em Gothenburg.

Sobre o autor Bo Srensson foi contratado como Gerente de Produto para fontes de energia com soldagem manual em 1972. Participou do projeto da ESAB americana em 1975. Aps um curto perodo em outra empresa, Bo retornou em 1986 para liderar um gigantesco programa de treinamento de vendedores da ESAB. Desde 1993, ele vem focalizando em tecnologia da informao e, entre 1997 e 2002, foi responsvel pelas operaes de TI da ESAB na Europa. Aposentou-se pela ESAB e agora trabalha como consultor no campo de Tecnologia da Informao.

O ESAB IV no Porto de Gothemburg, Sucia. Data desconhecida

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Descobrindo novas fronteiras

Um Sculo de Expanso GlobalEste artigo se baseia em pesquisa histrica realizada por Bo Srensson, ex-ESAB Gothenburg, juntamente com contribuies valiosas de Klaus Blome, ESAB Alemanha e Jerry Utrachi, ESAB USA.

E

lektriska Svetsnings Aktiebolaget (ESAB), estabelecida em 1904, agora uma companhia multinacional com vendas e/ou produo em 35 pases. No princpio, a primeira diretoria percebeu que as invenes de Oscar Kjellberg tinham um grande potencial fora da Sucia. Neste pequeno resumo registramos o desenvolvimento da ESAB em outros mares, rumo posio de maior fornecedor de produtos de soldagem e corte do mundo.

1904 1931 Os primeiros anosA ata da primeira reunio de diretoria da Elektriska Svetsnings Aktiebolaget, ocorrida em 12 de setembro de 1904, inclui uma referncia ao mtodo de Mr. Kjellberg para soldagem de metais. Isso antecedeu a primeira patente de Oscar Kjellberg, e a tcnica era conhecida como mtodo de soldagem secreto. Mesmo naquela poca, contudo, a ESAB decidiu vender licenas para outras empresas visando lhes permitir o uso do

mtodo Kjellberg, como um meio de gerar receita para uma empresa ainda nova e inexperiente. Em 20 de novembro de 1904, a ata faz referncia s negociaes com uma companhia de engenharia sueca para a venda de uma licena por SEK$ 10.000 para o uso do mtodo em sua totalidade. Ao final do ano de 1904, um consrcio na Cristiania (hoje Oslo) havia se interessado em aprender a soldar de acordo com o mtodo Kjellberg e comprar todos os equipamentos necessrios. A mesma ata diz que os irmos Nobel da Rssia tinham expressado interesse semelhante. Com o dinheiro dessas primeiras licenas, Oscar Kjellberg pde continuar seus experimentos. No incio, somente empresas individuais podiam adquiri-las, mas em pouco tempo, foram vendidas para todo um pas. Os pases escandinavos deram incio, comeando pela Noruega, em 1905. Pelos idos de 1908, a ata da diretoria registra negociaes conduzidas por um representante

com um futuro licenciado no Japo, e um acordo assinado com um representante nos Estados Unidos. Uma empresa estabelecida em Nova York requisitou que este representante americano, em nome da empresa, adquirisse a Electric Welding Co. por aproximadamente SEK$ 500. possvel que a Electric Welding tenha sido a primeira subsidiria internacional da ESAB, mas o que se seguiu com essa empresa desconhecido. Na verdade, somente muitos anos depois a ESAB atingiu um grande sucesso nos Estados Unidos. Durante a dcada de 1900, a Gr-Bretanha foi a lder industrial na Europa. A gerncia da ESAB tinha muito interesse em se estabelecer l e, em meados de 1909, os planos se concretizaram, com a inaugurao da British Electric Welding Co.. No entanto, com o intuito de reduzir custo, uma agncia chamada Kjellberg Syndicate foi estabelecida. Tudo indica que essa empresa no prosperou e, em 1912, a ESAB fundou a Anglo-Swedish Electric Welding Company Ltd. em Lon-

dres. Em maro de 1914, foi montada uma subsidiria localizada na Anturpia (Blgica). O incentivo para essas primeiras subsidirias na Inglaterra e Blgica provavelmente veio do plano de negcios da ESAB, que previa o estabelecimento de oficinas para oferecer servios de soldagem. Durante os primeiros anos, a maioria dos clientes era da indstria naval e dizem que o sonho de Oscar Kjellberg era fundar uma filial da ESAB em cada porto, na forma de uma oficina de soldagem. Londres e Anturpia eram na poca dois dos maiores portos martimos de mercadorias do mundo e, dessa forma, foram localizaes bvias para uma empresa nova e ambiciosa. medida que o negcio foi se expandindo, foi crescendo tambm a necessidade de mais equipamentos para atender a demanda das subsidirias e licenciados da ESAB. Em 1920, foram encerradas as negociaes com a Asea, relativas produo de dnamos, conversores e

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Figura 1: Estabelecida em 1914, a Companhia de Soldagem Eltrica BelgoSuca na Anturpia foi uma das primeiras subsidirias estrangeiras. Ela realizava trabalhos de reparo de navios no porto.

transformadores projetados para soldagem. A diretoria da ESAB decidiu, ento, desenvolver sua prpria capacidade produtiva. No dia 12 de novembro de 1921, a Kjellberg Elektroden GmbH, com matriz em Berlim, foi instalada. No incio de 1922, um terreno foi comprado em Finsterwalde para a produo de maquinrio e equipamentos. Surgiu assim a Kjellberg Elektromaschinen GmbH, com o objetivo de gerenciar essas operaes de produo. Isso garantiria os requisitos da ESAB para conversores, transformadores e outros equipamentos de soldagem. Quando Oscar Kjellberg morreu, no dia 5 de julho de 1931, a ESAB contava com

subsidirias na Finlndia, Polnia, Alemanha, Holanda, Blgica, Frana e Inglaterra, alm de licenciados em muitos outros pases. A empresa estava no auge como fornecedora de servios de soldagem para reparos e produo. Mas ainda era pequena a contribuio da venda de consumveis e mquinas de soldagem para a receita total da ESAB.

A sucessoWalter Edstrm, sucessor de Oscar Kjellberg, liderou a ESAB por vinte e cinco anos. Apesar do seu pouco conhecimento de soldagem e do mercado neste campo, tinha uma ampla experincia com vendas e condies comerciais e de produo em ou-

tros pases. Isto compensou em muito sua falta de sabedoria tcnica. Contudo, com o passar do tempo, se tornou uma autoridade em soldagem. O nome Walter Edstrm ser associado com a racionalizao metdica da produo de eletrodos e a substituio dos eletrodos revestidos por eletrodos extrudados. Mas seu maior feito a transformao da ESAB em uma companhia conhecida mundialmente at hoje. Em 1956, Walter foi sucedido por Gran Edstrm, que ficou no cargo de Diretor Geral da ESAB at 1970, quando foi sucedido por Ake Ahlstrm. Durante esse perodo, a ESAB reforou sua posio de lder eu-

ropia na rea de soldagem, e investimentos substanciais foram feitos nas fbricas de consumveis.

1931 1945 Empresas de vendas de eletrodos e mquinasWalter Edstrm reconheceu que o futuro da ESAB se encontrava na venda de consumveis, mquinas e outros equipamentos de soldagem. De certa forma, a empresa teve que se esforar para ser competitiva, visto que j nesta poca havia muitos concorrentes ativos no mercado, que vendiam mais produtos do que servios. As operaes de engenharia da ESAB na Europa

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Antnio Palis

nunca foram totalmente propriedade da ESAB, j que parceiros locais sempre estiveram envolvidos. Seguindo a sugesto de Edstrm, a ESAB comeou a aumentar sua participao nessas empresas estrangeiras, principalmente Inglaterra, Blgica e Alemanha. Novas subsidirias foram instaladas com foco exclusivo na venda de produtos. Em outros mercados, como a Espanha, vendedores foram contratados e novas empresas orientadas para vendas foram criadas. Em 1932, a LElectroSoudure Autogne Belge S.A. foi instalada na Blgica; este nome foi bem apropriado visto que poderia ser abreviado para ESAB S.A. Na Inglaterra, a Welding Supplies Ltd. foi fundada em Londres em 1933 e se

tornou a base das operaes da ESAB, envolvendo a produo e venda de produtos de soldagem no Reino Unido. Hoje, conhecida como ESAB UK. Os contratos assinados com a Burneister & Wain, na Dinamarca e a Elektrisk Sveisning, na Noruega, cediam direitos exclusivos de soldar usando o mtodo Kjellberg e de produzir eletrodos de acordo com a frmula da ESAB. Ao final de 1932, Walter Edstrm iniciou negociaes em Copenhagen e Oslo para recuperar os direitos de vender eletrodos e mquinas de soldagem. A inteno era instalar subsidirias com capital da ESAB na Dinamarca e Noruega. Concludas as negociaes, uma empresa de vendas dinamarquesa foi aberta em

Figura 2: Walter Edstrm foi o Presidente do Conselho de Administrao da ESAB de 1931 at 1956. Ele mudou a filosofia de negcio da ESAB de uma empresa de reparo para uma produtora de consumveis e equipamentos de soldagem, e expandiu suas sedes internacionais. Foi sucedido por Gran Edstrm.

1933, seguida da norueguesa, em 1938. Seguiu-se uma rpida expanso em novos mercados. Na Tchecoslovquia, uma subsidiria da Kjellberg Elektroden und Machinen, de Finsterwalde, foi instalada e envolvia tanto produo como vendas. No fim de 1932, a ESAB Ibrica foi fundada em Madrid para fabricar eletrodos. Essas empresas contavam

Ponte ferroviria sobre o rio Esla, na Espanha. Reforo de ao para o maior arco de concreto do mundo na poca. A ESAB Ibrica participou com produtos e tecnologia. Svetsaren, Maro de 1941, pgina 679.

com parte do capital da ESAB, uma vez que Walter Edstrm e membros da equipe de gerncia local podiam comprar ttulos das novas companhias. As subsidirias alems tinham uma situao nica, visto que elas eram autorizadas a vender tambm fora da Alemanha. A Tchecoslovquia foi mencionada, mas a Itlia tambm fazia parte do distrito das empresas alems. Em 1934, Walter Edstrm identificou a importncia do mercado italiano e em 1935 uma unidade foi instalada naquele Pas. Assim, os primeiros oito anos sob a liderana de Walter Edstrm foram caracterizados pelo rpido estabelecimento de subsidirias com parte do capital da ESAB por toda a Europa e pela criao de pontos estratgicos para a venda de consumveis e mquinas. Apesar dos eletrodos serem inicialmente importados da Sucia e as mquinas da Alemanha, a empresa logo reconheceu que

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a produo local de eletrodos seria a melhor forma de capturar uma parcela significativa do mercado e assegurar lucratividade. Mais tarde, fbricas de eletrodos foram construdas em quase todos os pases onde a ESAB tinha uma subsidiria de vendas. Parte dos lucros podiam ser transferidos para a Sucia, visto que as empresas produtoras compravam licena para a transferncia da tecnologia envolvida na exportao de frmulas suecas e tecnologia de produo. Durante esse perodo, o grupo ESAB aumentou consideravelmente sua receita (de SEK$ 912.000 em 1931 para SEK$4.554.000 em 1939). Em alguns anos, as subsidirias da Alema-

nha declararam um lucro to alto que as autoridades alems confiscaram grandes quantias de dinheiro como lucro suplementar.

Os anos de guerraPara a ESAB, assim como para a maioria das empresas, a Segunda Guerra Mundial foi um perodo muito difcil. A escassez de matria-prima impossibilitou manter a produo e, nos pases ocupados, as entregas de consumveis e equipamentos da ESAB para tropas alems eram vistas com desaprovao. Conseqentemente, o volume de operaes na Holanda e Blgica foi reduzido ao mnimo. Somente clientes estabelecidos e leais podiam esperar entregas,

quando alguma coisa era de fato produzida. As empresas norueguesas e dinamarquesas foram extremamente abaladas. Na Noruega, as foras invasoras executaram um membro da gerncia da ESAB, enquanto a fbrica em Copenhagen foi sabotada em duas ocasies, sofrendo ataques bomba. Por muito tempo, a gerncia da ESAB em Gothenburg no contactou as subsidirias na Europa e, s vezes, o nico sinal de vida eram curtos recados dizendo que os funcionrios estavam vivos. Apesar de tudo, no meio da guerra (1943), a ESAB instalou uma subsidiria na Finlndia, que produzia seus prprios eletrodos. Na Alemanha, a produo era inteiramente direcionada para a guerra. Uma empresa,

a Fimag, foi instalada para fabricar os produtos que as autoridades alems determinassem. Durante um pequeno perodo aps o incio da guerra, a ESAB conseguiu obter entregas de Finsterwalde, mas tudo indicava que a longo prazo isso no seria possvel. Consequentemente, a produo de conversores de soldagem teve incio na fbrica de Marieholm, em Gothenburg, mas as instalaes no eram apropriadas. Finalmente, a ESAB encontrou o que estava procurando em Lax instalaes que poderiam ser adaptadas, e a Assemblia Municipal estava muito interessada em apoiar os planos de negcio da ESAB. Assim, a fabricao de mquinas, que anteriormente vinham de Finsterwalde, comeou em 1942.

Figura 4: A fbrica de eletrodos Kjellberg em Finsterwalde, em torno de 1940. Aps a guerra, ela foi confiscada pelo governo alemo.

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Figura 5: Fbrica de eletrodos no Brasil.

1945 1980 consolidao e estabelecimento fora da EuropaQuando a Segunda Guerra Mundial terminou, em 1945, a infra-estrutura da Europa teve que ser reconstruda. Havia grande demanda para os produtos e servios da ESAB, mas, inicialmente, a empresa teve que se concentrar em reconstruir, reequipar e substituir suas instalaes. Aps a diviso da Alemanha, Finsterwalde estava localizada na parte oriental, e as autoridades de l desapropriaram as propriedades privadas. Assim, uma nova subsidiria alem-ocidental foi criada em 22 de julho de 1949. A princpio, um espao foi alugado em Dsseldorf mas em 1959, a empresa mudou para sua lo-

calizao atual em Solinger, que se expandiu em 1971. Para melhor servir aos clientes alemes com demanda para automao pesada, a ESAB GmbH se fundiu com a companhia Tehac, em Bockum, que possua o conhecimento em soldagem automatizada e posicionadores. Em 1982, a Arcos GmbH se uniu ESAB na Alemanha, acrescentando uma segunda marca de consumveis e de equipamentos. Em 1991, a ESAB viria a abrir um Centro de Tecnologia de 1.000 m 2 para soldagem mecanizada em Solingen. A Welding Supplies, em Londres, se expandiu rapidamente e logo necessitou de instalaes maiores, o que foi encontrado em Gilligham, em Kent. Antes da Segunda Guerra Mundial, a ESAB no tinha nenhuma representao na

Frana, mas em 1950 ela finalmente montou uma subsidiria francesa. Desde ento, a ESAB passou a ter representantes em todos os pases europeus com seus prprios pontos de vendas e, em muitos casos, com produo prpria de eletrodos. Aps a guerra, atravs de suas subsidirias na Espanha e seu distribuidor em Portugal, a ESAB fez valiosos contatos na Amrica do Sul. No Brasil, tais relaes levaram ao estabelecimento de uma unidade em parceria com a famlia Pareto, em 1953. Essa companhia rapidamente se tornou a lder no setor. Em outros pases sul-americanos, tais como Argentina e Mxico, a venda dos produtos da ESAB foi organizada atravs de representantes. As atividades na Amrica do Norte inicialmente no foram to bem-sucedidas. Em 1940, a ESAB Welding Cor-

poration tinha sua sede nos Estados Unidos, mas foi liquidada em 1962. No Canad, a companhia conhecida como ESAB Arc Rods foi fundada em 1958, em Montreal, mas tambm fechou aps um curto perodo de tempo. Mais tarde (1969), um acordo foi assinado com a Liquid Carbonic Corporation, em Toronto, envolvendo a produo de eletrodos da ESAB no Canad. Mas somente em 1972, a ESAB fez outra tentativa de instalar seu prprio ponto de vendas nos Estados Unidos. No princpio da dcada de 1970, a ESAB voltou sua ateno para o sul e para o leste. Acordos de joint-ventures envolvendo produo de eletrodos baseado em transferncia de tecnologia foram assinados, e a ESAB instalou pontos de vendas e estabeleceu uma posio forte para futuros avanos em mercados que estavam em expanso. Em 1972 e 1973, a ESAB se estabeleceu na frica do Sul, Iraque, Angola, Arglia e Turquia. No ano seguinte, foi a vez de Singapura, alm da empresa de comrcio Ekman e de um ponto de vendas no Ir. A ESAB chegou Austrlia em 1975, estabelecendo uma unidade comercial em Sidney. No mesmo ano, mais uma fbrica foi instalada na Itlia, em parceria com a companhia italiana Falck. Na Europa Oriental, foi praticamente impossvel estabelecer subsidirias para produo

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e vendas. Entretanto, a ESAB assinou acordos com fabricantes locais, que permitiram que a tecnologia de produo da ESAB e suas frmulas fossem introduzidas, apesar de tudo. Um negcio fechado em 1975 com a Csepel-Werke, na Hungria, resultou na produo de eletrodos usando os equipamentos e as frmulas da ESAB, representando o primeiro passo em direo ao seu estabelecimento naquele Pas

1962, a empresa estava muito grande para suas instalaes e uma nova fbrica foi fundada em Rodheim. Em 1975, era chegada a hora de mais uma mudana, desta vez para Karben, perto de Frankfurt, onde a operao se encontra at hoje. A gama de mquinas de corte agora tambm inclui equipamentos de plasma, a laser e de corte com jato dgua, bem como oxicorte.

No somente soldagem, mas tambm corteAo longo de sua histria, a ESAB sempre perseguiu uma poltica de parceria com seus clientes, visando ajud-los a resolver seus problemas com timo custo e benefcios de desempenho. Soldagem no um processo isolado, mas parte de um fluxo de produo onde o preparo para corte e junta to importante quanto a solda. Vendedores, especialistas e pessoal de desenvolvimento freqentemente encontraram problemas onde a soluo era uma combinao de tecnologia de soldagem e corte. Com o passar do tempo, tornou-se evidente que a empresa precisava de um envolvimento formal com tecnologia de corte. Em 1938, a ESAB se tornou parceira na KjellbergEberle, em Frankfurt, que desenvolvia e produzia equipamentos de oxicorte. Durante a Segunda Guerra Mundial, a produo foi temporariamente transferida para Lax. Em

1980 1992 um perodo de expansoA ESAB viveu trs importantes perodos de expanso durante seus cem anos de histria. No entanto, a fase que atraiu maior ateno foi durante a liderana de Bengt Eskilson. digno de figurar como exemplo em livros acadmicos como uma companhia com

uma estratgia de aquisio ativa, em uma indstria cheia de problemas, pode se tornar dominante neste setor. Bengt Eskilson assumiu como Diretor Geral em 1980. A situao anterior sua gesto est bem documentada. A ESAB e seus concorrentes tinham acumulado muitos recursos de produo na Europa. Contudo, a crise econmica da dcada de 1970 e o declnio dos estaleiros europeus, tradicionalmente um dos maiores clientes da ESAB, tornou difcil as vendas. A gerncia da ESAB pensou que isto seria uma crise econmica passageira e decidiu manter a produo e aumentar os estoques. No entanto, em 1978, tornou-se claro que o declnio no estava relacionado com fatores econmicos, mas estruturais. A indstria de soldagem

tinha um excedente muito grande na produo em geral e, principalmente, de eletrodos. Alm disso, a produo de consumveis no fazia parte da atividade principal de muitos concorrentes da ESAB. Em uma tentativa de manter os volumes de venda, teve incio uma guerra de preos e a lucratividade foi arrasada. Para a ESAB, a situao se tornou ainda mais crtica, visto que soldagem era sua nica fonte de receita. Em 1980, a companhia estava vivendo uma sria crise financeira. Em um momento de inspirao, ao invs de reduzir as operaes para escapar do problema, os donos da companhia decidiram focar na expanso. Uma nova equipe de gerenciamento em Gothenburg, liderada por Bengt Eskilson, analisou as circunstncias

Figura 6: Congresso do Instituto Internacional de Soldagem (IIW) em Oxford, 1951. Walter Edstrm participou intensamente na fundao do IIW e tornou-se o Presidente em 1960. Hoje, Bertil Pekkari segue seus passos como Presidente da IIW.

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da ESAB e de seus concorrentes e embarcou em uma rodada de aquisies na Europa. O grupo ESAB elaborou um documento com polticas onde se dizia preparada para contribuir ativamente com a reconstruo de toda a indstria e a recuperar os concorrentes em crise por um custo menor para eles do que se tivessem escolhido se reestruturar ou fechar por conta prpria. Esta foi uma estratgia habilidosa, que teve como alvo concorrentes como GKN, Phillips e BOC. As operaes de soldagem destas empresas correspondiam a uma pequena parte em relao a todo o negcio e por isso de pequeno interesse. Entre 1981 e 1991, a ESAB adquiriu 26 companhias na Europa e nos Estados Unidos e se desfez de cinco. Fechou vrias de suas fbricas de produo, alm de outras que havia adquirido, em pases como Sucia, Reino Unido, Dinamarca, Noruega, Finlndia, Frana e Holanda. Isso resolveu o problema de superproduo. Ao mesmo tempo, ao assumir as marcas e os canais de distribuio, conseguiu aumentar sua participao no mercado. Bengt Eskilson e o Diretor de Vendas Bo Sandquist tinham aprendido como maximizar o benefcio de marcas mltiplas na Electrolux, e a ESAB estava finalmente representada na maioria dos mercados por pelo menos duas marcas diferentes. No Reino Unido, por exemplo, a

empresa adquiriu a marca Murex da BOC, a qual reteve e desenvolveu, mas simultaneamente amalgamou vrias outras marcas sob a identidade unificada da ESAB. Apesar de nem todos os investimentos deste perodo terem trazido lucro, a empresa conseguiu de certa forma aprender com a experincia; por vrios anos a ESAB foi dona de uma empresa especializada em soldagem a laser alem. Como Diretor Tcnico da ESAB, Bertil Pekkari ressalta, A negociao no nos deixou ricos, mas nos deu uma experincia grande em um setor de soldagem novo e interessante. Temos conseguido utilizar este conhecimento em muitas outras reas. Felizmente para a ESAB, seu programa de racionalizao foi apoiado por uma economia crescente. As vendas aumentaram de SEK$1.6 bilhes em 1980 para SEK$6.7 bilhes em 1990, medida em que a empresa retornava lucratividade. Isso, sem dvida, encantou os acionistas da ESAB, sendo o maior deles a empresa Incentive, controlada pelo grupo sueco Wallenberg.

Figura 7: Bengt Eskilson, Presidente do Conselho de Administrao da ESAB em 1980 e arquiteto da poltica de aquisio que converteu a ESAB na companhia lder no mercado de soldagem.

O maior mercado de soldagem do mundo EUAAo longo da dcada de 1970, a ESAB foi lder no fornecimento de consumveis e equipamentos de soldagem na Europa. Na Amrica do

Sul, a empresa era representada pela ESAB do Brasil e havia distribuidores bem sucedidos em muitos outros pases. Contudo, ela no tinha nenhuma presena corporativa nos Estados Unidos alm de uma joint-venture entre a empresa alem de mquinas de corte da ESAB (KjellbergEberie) e a empresa americana Health Engineering, com sede em Fort Collins, Colorado, da qual a ESAB tinha adquirido uma grande participao em 1976. Nos Estados Unidos, as vendas eram basicamente administradas por distribuidores e empresas como Lincoln, Hobart e Miller, tinham redes de distribuio bem estabelecidas. As empresas de soldagem que quisessem se estabelecer nos Estados Unidos tinham que obter acesso ao mercado atravs da rede de distribuidores. Uma forma de fazer isso era adquirindo companhias estabelecidas, juntamente com seus canais de distribuio. A ESAB escolheu uma soluo mais ampla. Em 1972, ela abriu um escritrio

de vendas em Detroit em parceria com a Sandvik. Sua misso era comercializar peas para os equipamentos de automao pesados que tinham sido vendidos para os estaleiros americanos, e introduzir a tecnologia europia de equipamentos semi-automticos nos EUA. Nesta poca havia uma escassez de certos tipos de eletrodos, e a ESAB americana cresceu muito com a importao de eletrodos das fbricas europias. Em 1974, o Diretor de Vendas da ESAB nos EUA, Lars Magnusson, contactou uma empresa americana chamada Chemetron, que estava interessada em vender parte de suas operaes de soldagem. A idia era assumir tambm a rede de distribuio da Chemetron. Lars Magnusson fechou o negcio no mesmo ano. Entretanto, os distribuidores da Chemetron estavam cticos tanto em relao s mquinas de soldagem importadas da Sucia quanto aos produtos herdados da Chemetron. Em 1978, a ESAB fechou a antiga fbrica

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da Chemetron em Charlottesville e retornou operao de mquina de corte em Fort Collins, Colorado. Quando a gerncia da empresa em Gothenburg analisou as razes do fracasso, eles reconheceram que era impossvel ter sucesso nos EUA sem o suporte dos distribuidores. Alm do mais, o mercado conservador de soldagem dos EUA no estava muito impressionado com a alta tecnologia europia no que diz respeito s fontes inversoras de energia. A empresa percebeu que ela s teria chance de ganhar a confiana dos clientes e dos distribuidores se adquirisse uma parcela do mercado existente. Em 1984 a gerncia da ESAB encontrou uma oportunidade de estabelecer uma posio estratgica nos Estados Unidos. A Airco tinha um perfil semelhante ao da ESAB, mas h algum tempo vinha lutando contra a queda da sua participao no mercado e da lucratividade. Em 1984 ela foi encampada pela ESAB e ento as operaes de soldagem se concentraram em Chicago. Apesar da Airco ter trazido um grande mercado e uma ampla experincia relativa aos produtos, o sucesso no mercado americano no aconteceu para a ESAB. Desta vez, contudo, Lars Westerberg, Gerente Geral da ESAB responsvel pelas operaes americanas, percebeu que, pelo fato da Airco ser

pequena demais para competir, os problemas da ESAB poderiam ser resolvidos encontrando outras companhias que complementassem aquelas que a ESAB j tinha. Uma destas empresas foi a L-Tec, anteriormente conhecida como Linde, que tinha sido parte da Union Carbide. A ESAB comeou a cortejar a L-Tec em 1987, mas a gerncia desta empresa demorou dois anos para concordar que a ESAB assumisse o controle. Passado este tempo, no entanto, a ESAB j havia desenvolvido uma estratgia mais agressiva para o mercado americano. Foi decidido que uma unio entre a L-Tec e a Airco seria insuficiente para tornar a ESAB uma fora importante no mercado norte-americano. A L-Tec tinha boas mquinas, mas deixava muito a desejar em relao aos consumveis. Felizmente outras empresas estavam disponveis para aquisio nos EUA. A Alloy Rods era uma companhia com excelente reputao, que estava oferecendo exatamente os produtos que a LTec no dispunha. Ento a ESAB comprou tanto a L-Tec quanto a Alloy Rods. A aquisio simultnea dessa empresas foi um sucesso inesperado. Concorrentes surpresos tiveram que aceitar que a ESAB tinha chegado ao mercado americano e estava l para ficar. A ESAB tornou-se a segunda maior fornecedora de sistemas de soldagem dos EUA da noite

para o dia. Em 1998 adquiriu tambm a AlcoTec, adicionando produtos para soldagem em alumnio e mais um degrau no conhecimento de processo. O importante que a nova estratgia da ESAB para a Amrica do Norte funcionou. A ESAB manteve a fora no mercado e agora um fornecedor que atende tanto clientes diretos quanto distribuidores. Sua operao nos Estados Unidos est distribuda entre os centros de Florence, Hannover, Traverse City e Ashtabula, e todas as marcas adquiridas esto unidas sob o nome da ESAB.

1990 1995 Expanso para o lesteAps o colapso do imprio sovitico, em 1991, as regras que impediam a ESAB de instalar sua produo em pases como Hungria, Repblica Checa e Polnia foram eliminadas e o investimento estrangeiro passou a ser bem-vindo. Bengt Eskilson e Lars Westerberg apresentaram para a diretoria da ESAB um plano de aquisio das maiores instalaes de produo da Polnia, Hungria e Repblica Checa. Diante da relutncia da diretoria, Eskilson explicou que o plano visava a auto-preservao da ESAB. O custo de produo de consumveis de soldagem nos pases do antigo Bloco Oriental era muito mais baixo

do que na Europa Ocidental, e uma exportao desregulamentada na Polnia, Hungria e Repblica Checa poderia colocar em risco a lucratividade dos consumveis na Europa Ocidental. A diretoria aceitou o plano e a ESAB comeou uma nova rodada de aquisies. O benefcio de se ter fornecido equipamentos de produo e frmulas para licenciados no antigo Bloco Oriental tambm se tornou evidente. Quando a ESAB veio para a fbrica de Csepel em Mor na Hungria, foi como estar voltando para casa. Com o constante apoio de Lars Westerberg, que se tornou Diretor Geral em 1991, a equipe de gerncia da rea de consumveis, sob o controle de Anders Backman e Torsten Krsell, conseguiu driblar seus concorrentes adquirindo rapidamente mais capacidade de produo. A ESAB simultaneamente conquistou uma grande parte do mercado domstico e dos canais de distribuio. Torsten Krsell assegurou que a qualidade dos produtos era compatvel com os produzidos na Europa Ocidental. Conseqentemente, clientes na Frana, Espanha e Alemanha logo passaram a ser abastecidos pela Hungria e Repblica Checa, permitindo o trmino da produo local. Este processo foi meticulosamente planejado, e a ESAB pde assim assegurar que a qualidade e o servio no mudariam.

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1994 2004 ConsolidaoUma nova fase na histria da ESAB comeou em 1994, quando ela foi adquirida pelo grupo industrial britnico Charter Plc. As aquisies estratgicas continuaram, mas esse momento marcou tambm o incio de um perodo de consolidao de mercado. Um maior crescimento do negcio pde ser observado nos locais onde a ESAB tinha construdo uma presena forte. A fase de expanso para o leste continuou com a compra da Ozas, fabricante de equipamentos lder no mercado da Polnia, com sede em Opole. Logo depois a ESAB adquiriu a totalidade da Electrody Baildon, fabricante de consumveis polo-

ns, com a qual j tinha negcios e, tambm, a Fersab, fabricante de fluxos aglomerados. Com isso, a Polnia se transformou em um dos mercados europeus mais importantes para a ESAB. Ao mesmo tempo, a empresa estabeleceu um ponto de vendas em Moscou, seguido da primeira unidade de produo de eletrodos da Rssia, uma joint-venture com sede em St. Petersburg. Na Amrica do Sul, a Conarco tornou-se parte da famlia ESAB, elevando significantemente a posio do grupo na Argentina. Um marco muito importante aconteceu em 1998, quando a AlcoTec, lder mundial em arames de alumnio, com sede em Traverse City, EUA foi adquirida.

Paralelamente a essas atividades, a ESAB continuou a expandir suas operaes pelo Oriente Mdio, com sede em Dubai e, claro, por toda a sia, e em especial na China, atualmente o mercado de soldagem em maior desenvolvimento no mundo. E assim a ESAB continua na rota estabelecida por seus fundadores h cem anos. Onde h necessidade de tecnologia de soldagem, a ESAB est presente, enquanto o avano da Internet propicia acesso informao detalhada cada vez mais rapidamente. Devemos reconhecer que o sucesso da ESAB se deve tambm a todos os funcionrios, que viajaram pelo mundo para espalhar informaes e

oferecer assistncia prtica no uso da tecnologia, dos produtos e servios da empresa nos novos mercados. Graas a esses homens e mulheres, a ESAB capaz de, em 2004, se entitular lder mundial em soldagem. Este artigo foi escrito com a assistncia de Bengt Eskilson, Lars Westerberg, Anders Backman, Anders Andersson, Curt Karisson, Klaus Blome, Jerry Uttrachi e Bertil Pekkari. Entretanto, a contribuio mais importante foi oferecida por Eva Persson, responsvel pelo arquivo histrico da ESAB. Sem Eva, esse resumo no poderia nunca ter sido escrito. Gostaria de estender o meu agradecimento a todos envolvidos neste trabalho.

Estande da ESAB na Feira Industrial de Essen, Alemanha, em 1954

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Uma Tarefa DiferentePor: Nils Asander

Elektra II

N

ils Asander, um instrutor da ESAB que se aposentou em 1982, nos leva de volta a 1914. Seu pai, Ragnar Asander, viajou de tren para a Rssia, sob condies primitivas, para reparar uma serraria, usando o novo mtodo de soldagem de Oscar Kjellberg.

Precisa-se de foguistaA Elektriska Svetsnings Aktiebolaget i Stockholm (ESABIS) foi montada du-

rante a dcada de 1900 como uma licenciada da patente do mtodo de soldagem de Oscar Kjellberg, usando eletrodos de fino revestimento. Mais tarde a empresa abriu uma filial em Sundsvall constituda pelo Elektra II, um barco-oficina que carregava equipamentos, inclusive um gerador de soldagem de corrente constante. Este barco oferecia a mobilidade necessria para desempenhar trabalho de soldagem nas serrarias, fbricas e barcos de mercadorias na rea de Sundsvall.

Em 1909, precisavam de um foguista no barco e Ragnar Asander, na poca com apenas 18 anos, foi indicado para o servio. Ele nasceu em 1891, no ano em que o russo Nicolai Slavjanov (1854-1897) obteve a patente da soldagem a arco usando eletrodos sem revestimento.

Treinamento de soldagem oferecidoLogo depois de comear a trabalhar na empresa, o

escritrio de Sundsvall tinha recebido tantos pedidos de informao sobre trabalho de soldagem que decidiram recrutar outro soldador. Ofereceram a Ragnar a oportunidade de fazer o treinamento, visto que ele tinha o perfil para a tarefa pois era habilidoso com as mos e um carpinteiro qualificado. Ele tambm era contra bebida alcolica; isso tornava o treinamento em soldagem mais simples, uma vez que Oscar Kjellberg no permitia que as pessoas bebessem cerveja em conjuno com a

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soldagem! Ragnar foi admitido e mandado para a matriz em Stockholm. Uma vez encerrado o treinamento, ele retornou para Sundsvall e executou inmeros trabalhos de soldagem no sul de Norrland, mas nenhum semelhante ao realizado na Rssia, em 1914.

surgido em Sundsvall, sua gerncia conhecia a ESABIS e sua capacidade de desempenhar reparos soldados. Contactaram a empresa e perguntaram se poderiam enviar algum para Kovda para soldar o suporte de serra, e Ragnar foi indicado para o trabalho.

Uma tarefa diferenteNo princpio do sculo XX havia sido montado um consrcio de serrarias anglo-suecas com escritrio em Sundsvall, sob a gerncia de um advogado chamado Berggren. Construram uma grande serraria em um local chamado Kovda, na costa sudoeste da Pennsula de Kola, logo acima do Crculo rtico. Era um enorme moinho, com seis suportes de serra. Entretanto, no final do ano de 1913, um destes suportes quebrou. Como a empresa tinha

Jornada rumo ao Mar BrancoConsiderando os padres de hoje, essa foi uma jornada pica, realizada no meio do inverno. No dia 16 de janeiro de 1914, Ragnar comeou sua jornada de trem para Karungi. Ele ento pegou um tren para Tornea, seguido de outro trem para Uleaborg. Quando alcanou Haparanda, descobriu que havia se esquecido de levar o passaporte, e foi obrigado a passar vrios dias na hospedaria at que seu passaporte chegasse pelo correio. De Uleaborg, sua jornada continuou passando

pela estao da fronteira em Kusamo, cruzando o norte da Finlndia, usando trens de vrias hospedarias. Entrou na Rssia pela cidade de Nassajrvi. O avano era lento a uma velocidade de 10 km por hora e havia de 30 a 40 km entre as hospedarias onde os cavalos eram substitudos, s vezes aps uma longa espera. A jornada ressaltou as diferenas culturais da poca. Enquanto na Finlndia ele dormia em camas, na Rssia ele era obrigado a dormir no cho sobre tapetes de pele. Refeies eram difceis na Rssia, pois todos comiam com os dedos dentro de uma mesma tigela. Ele no gostava disso e vrias vezes ia para o tren para comer um pedao do bacon americano, que havia comprado na Finlndia, com um pedao de po. Era tambm uma jornada de risco. Para viajar de tren puxado por cavalo,

o viajante precisava de um revlver para se proteger dos lobos. Ragnar tinha o que chamavam de revlver de tambor, mas felizmente ele no precisou us-lo. A jornada toda levou 8 dias. Para a consternao de todos, o prdio da serraria pegou fogo no dia anterior sua chegada. A foto da pgina seguinte mostra os seis suportes de serra, com uma seta indicando o suporte quebrado. Porm, o prdio foi rapidamente consertado e enquanto isso, Ragnar reparou o suporte de serra.

Os procedimentos de soldagemAssim como a maior parte da tecnologia do princpio do sculo XX, de acordo com os padres de hoje havia um importante componente manual na prtica de soldagem eltrica dos primeiros tempos. Mais ainda, os perigos inerentes ao trabalho com ele-

Regulagem da corrente de soldagem atravs de banheiras de gua.

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O prdio da serraria. A seta indica o suporte quebrado.

tricidade de alta corrente explica a insistncia de Oscar Kjellberg pela sobriedade entre seus tcnicos de soldagem. Consumveis previamente preparados e equipamento de suprimento de energia porttil eram inimaginveis. Em vez disso, a bagagem de Ragnar inclua montes de alma de

eletrodos e sacolas de revestimento em p. Sua primeira tarefa envolvia misturar o p at a consistncia certa para permitir que a alma do eletrodo fosse mergulhada para fazer os eletrodos. Para soldagem horizontal, ele mergulhava o arame uma vez e para soldagem vertical e acima da cabea, duas vezes. Ele

ento prendia os arames a um varal dentro da oficina e os deixava secar. O prximo passo era a corrente de soldagem. Felizmente, a serraria tinha um gerador de corrente constante de 220V alimentado por uma turbina a vapor, que produzia eletricidade para o moinho. Os cabos de soldagem ti-

veram que ser conectados diretamente a este gerador, mas a foi necessrio regular a corrente aos valores apropriados. Para fazer isso, Ragnar utilizou banheiras de gua, como podem ser vistas no diagrama da pgina 27. A banheira A foi usada para ajustes grosseiros, enquanto ajustes precisos fo-

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ram feitos usando a banheira B. Um ampermetro foi conectado por cima das placas na banheira B e um assistente ajustava a distncia entre as placas at que o ampermetro mostrasse um valor pr-determinado para o dimetro do eletrodo em questo. Os ajustes grosseiros eram feitos jogando-se sal dentro

da banheira A, se uma corrente maior fosse necessria. Para reduzir a corrente, tirava-se a gua e colocava-se gua fresca dentro da banheira. A banheira C oferecia a carga de resistncia para assegurar que a carga no gerador se mantivesse uniforme, quando nenhuma soldagem estava em processo. O contato

(K) tinha sido trazido de Sundsvall, junto com o porta eletrodo (H). Quando o preparo de junta e o realinhamento do suporte ficaram prontos, o trabalho de soldagem pde comear. Como ningum era capaz de analisar o ao do suporte, Ragnar decidiu pr-aquecer a rea de junta. Ele o fez usando dois grandes maaricos segurados por trabalhadores russos. Por causa da alta tenso, era necessrio que eles estivessem sempre com as mos e os ps secos. Naquela poca, a soldagem era feita com a mo esquerda para poder manejar o martelo de soldagem rapidamente. A ponta do martelo era alinhada com o cabo para permitir que ele entrasse na junta V e esticasse a solda, processo este que era realizado em pequenas etapas. Atravs de um intrprete, Ragnar avisou que os espectadores no olhassem para o arco, porm, depois do primeiro dia de soldagem, muitas pessoas visitaram o mdico da vila, que no compreendeu o que tinha acontecido com as pessoas que chegavam com olhos vermelhos e quase cegas. Depois ele suspeitou que poderia ter relao com a soldagem e foi visitar Ragnar. O mdico ento ficou sabendo do claro da soldagem e

dos danos que poderia causar viso. Quando o suporte foi consertado com sucesso, o gerente do moinho descobriu outras tantas tarefas e pediu que Ragnar soldasse e reparasse um pouco de corroso no fundo da caldeira. Ele cuidadosamente removeu toda a crosta da caldeira at que o metal pudesse ser novamente visto. Depois disto, pediram que ele soldasse engrenagens no fundo da caldeira de dois barcos de reboque.

Tudo est bem quando termina bemA jornada de volta para casa foi semelhante jornada de ida, e Ragnar chegou em Sundsvall no dia 16 de fevereiro, um ms depois de sua sada. Em outubro de 1917, a Revoluo Russa teve incio, e a serraria foi tomada pelos comunistas. Na mesma semana, Ragnar teve um filho que, aos 15 anos, comeou a aprender com seu pai os fundamentos da soldagem. Eu fui soldador o resto da minha vida. Aps 50 anos no negcio, eu me aposentei em 1982 como chefe da regio oriental da ESAB sueca. Adaptado de um relato original de Nil Asander, publicado pela primeira vez em maio de 2001, na revista Svetsaren.

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Uma histria da SoldagemPor: Klas Weman, ESAB Welding Equipment AB, Laxa, Sucia.

ste artigo examina a histria da soldagem a arco, que comeou no final do sculo XIX. A ESAB sempre foi associada com o desenvolvimento da soldagem desde o seu incio, quando Oscar Kjellberg formou a empresa para explorar sua inveno do eletrodo revestido. Antes da dcada de 1880, a soldagem era realizada apenas na forja do ferreiro. Desde ento a marcha da industrializao e duas guerras mundiais influenciaram o rpido desenvolvimento da soldagem moderna. Os mtodos de soldagem bsicos soldagem por resistncia, soldagem a gs e soldagem a arco foram todos inventados antes da Primeira Guerra Mundial. Porm, durante o incio do sculo XX, a soldagem e corte a gs foram dominantes para a fabricao e trabalhos de reparo. Somente alguns anos depois, a soldagem eltrica ganhou semelhante aceitao.

E

As primeiras mquinas de soldagem por resistncia foram usadas para soldagem de topo. Elihu Thomson, dos EUA, criou o primeiro transformador de soldagem em 1886 e patenteou o processo no ano seguinte. Seu transformador produzia uma potncia til de 2000A a uma tenso no vazio de 2V. Thomson desenvolveu, mais tarde, mquinas para soldagem a pontos, soldagem de costura, soldagem por projeo, soldagem de topo pela ao de fascas. A soldagem a pontos tornou-se posteriormente o mtodo mais comum da soldagem por resistncia e , hoje, extensivamente usada na indstria automotiva e em muitas outras aplicaes de chapas de metal. Os primeiros robs para soldagem por resistncia foram entregues pela Unimation para a General Motors em 1964.

Figura 1: Transformador de soldagem por resistncia criado por Thomson.

Soldagem a gsA soldagem a gs com uma chama oxicombustvel foi desenvolvida na Frana no final do sculo XIX. A primeira tocha apropriada para soldagem foi feita por Edmund Fouche e Charles Picard, em torno de 1900. A chama provou ser extremamente quente acima de 3100C e a tocha tornouse ento a ferramenta mais

Soldagem por resistnciaO primeiro exemplo de soldagem por resistncia data de 1856, quando James Joule, o homem por trs do princpio de aquecimento de Joule, conseguiu fundir e soldar um monte de arames de cobre atravs de aquecimento por resistncia eltrica.

importante para a soldagem e corte de ao. O gs acetileno j tinha sido descoberto h muito tempo quando Edmund Davy descobriu, na Inglaterra, que um gs inflamvel era produzido quando carbureto era decomposto na gua. O gs, quando queimado, provou ser excelente para iluminao, e este logo tornou-se o principal uso do acetileno. Porm, muitas exploses ocorriam quando o gs era transportado e usado. Descobriu-se que a acetona poderia dissolver grandes quantidades de acetileno, principalmente se a presso fosse aumentada. Em 1896, Le Chatelier desenvolveu uma maneira segura de armazenar acetileno usando acetona e uma pedra porosa dentro dos cilindros. Muitos outros pases fizeram uso desta inveno francesa para armazenar aceti-

leno, mas ainda assim algumas exploses ocorriam durante o transporte. O sueco Gustaf Dahln da AGA mudou a composio do teor poroso e conseguiu faz-lo 100% seguro.

Soldagem a arcoEm 1810, Sir Humphrey Davy criou um arco eltrico estvel entre dois terminais o fundamento para o que se tornou conhecido como soldagem a arco. Na Primeira Feira Mundial de Eletricidade, em Paris, em 1881, o russo Nikolai Bernardos apresentou o mtodo para soldagem a arco, no qual ele gerou um arco entre um eletrodo de carvo e a pea de trabalho (Figura 2). Uma vareta ou um arame de metal de adio poderiam ser alimentados para dentro do arco ou na poa de fuso. Ele era, naquela poca, um aluno do laboratrio francs

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de Cabot e, juntamente com seu amigo Stanislaw Olszewski, conseguiu uma patente em vrios pases, de 1885-1887. A patente mostrava um porta eletrodo antigo, veja figura 2. A soldagem a arco de carvo ganhou popularidade ao final do sculo XIX e nos primeiros anos do sculo XX. Um conterrneo de Bernardos, Nicolai Slavianoff, desenvolveu ainda mais o mtodo e, em 1890, ganhou uma patente para o uso de uma vareta de metal como eletrodo, ao invs de carvo. O eletrodo derretia e assim funcionava tanto como fonte de calor quanto metal de adio. Entretanto, a solda no era protegida do ambiente e, em decorrncia disso, surgiram problemas de qualidade. O sueco Oscar Kjellberg, ao usar o mtodo para o reparo de caldeiras a vapor em navios, observou que o metal de solda estava cheio de poros e pequenas aberturas que im-

possibilitavam conseguir uma solda estanque. Com o objetivo de melhorar o mtodo, ele inventou o eletrodo revestido, cuja patente veio no dia 29 de junho de 1907 (patente sueca de nmero 27152). A melhoria de qualidade significou um marco na soldagem eltrica, visto que agora ela tambm poderia ser usada para aplicaes industriais. A ESAB tinha sido fundada em 12 de setembro de 1904, como uma empresa de reparo de navios. Mais tarde, na dcada de 30, novos mtodos foram desenvolvidos. At ento, toda a soldagem a arco era realizada manualmente. Foram feitas tentativas para automatizar o processo com um arame contnuo. A inveno mais bem sucedida foi a soldagem a arco submerso (SAW) onde o arco submerso em uma cobertura de fluxo fusvel granular. A soldagem a arco em um ambiente de gs protetor foi patenteada em 1890, por

Figura 2: Mtodo de Bernardos para soldagem com eletrodo de carvo.

Figura 3: Uma ilustrao da patente sueca de Oscar Kjellberg (1907), mostrando o uso de um eletrodo revestido.

C.L.Coffin. Durante a Segunda Guerra Mundial, porm, a indstria de aviao precisou de um mtodo para soldar magnsio e alumnio. Em 1940, nos EUA, teve incio uma intensa experimentao para proteger o arco atravs de gases inertes. Atravs de um eletrodo de tungstnio, o arco poderia ser mantido sem derreter o eletrodo, o que possibilitou a soldagem com ou sem material de adio. O mtodo agora chamado de soldagem TIG (Gs Tungstnio Inerte) Alguns anos mais tarde, o processo de soldagem TIG foi aprimorado, usando-se um arame de metal consumvel como eletrodo. Inicialmente, os gases protetores foram os gases inertes hlio ou rgon. Lyubavskii e Novoshilov tentaram, com sucesso, usar o CO2 (gs ativo) por sua facilidade de obteno (soldagem MAG). Atravs do mtodo de transferncia globular, eles reduziram alguns problemas causados pela intensa gerao de respingos. Nesta poca, a maioria dos processos de soldagem modernos j tinham sido inventados. Estes mtodos foram seguidos mais tarde, por outros mtodos, tais como

soldagem a laser e soldagem por frico, ambos desenvolvidos pelo Instituto de Soldagem (TWI) na Inglaterra (Tabela 1).

Fontes de energiaUma das razes pelas quais a soldagem eltrica no foi introduzida antes do final do sculo XIX pode ser a falta de fontes de energia apropriadas. No final do sculo XVIII, os italianos Volta e Galvani conseguiram produzir corrente eltrica com elementos galvnicos. Um avano importante ocorreu em 1831, com a criao dos princpios de Michael Faraday para o transformador e gerador. Os primeiros experimentos de soldagem foram realizados com vrios tipos de solues para o fornecimento de corrente de soldagem. Sir Humphrey Davy usou uma bateria como fonte de energia para os primeiros experimentos com arco eltrico, em 1801. Bernardos usou um motor a vapor de 22 hp para alimentar um gerador de corrente constante (DC) e 150 baterias para produzir a eletricidade

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Processo de soldagemSoldagem por resistncia Soldagem oxicombustvel Soldagem aluminotermia Soldagem a arco manual Soldagem por eletroescria

Abrev.

InventorElihu Thomson

Ano1886-1900 1900 1900 1907 1908 1940 1950

InstitutoThomson Electric Welding

PasEUA Frana

OAW TW MMA, SMAW ESW

Edmund Fouche, Charles Picard Goldschmidt Oscar Kjellberg N. Bernardos R.K. Hopkins

Goldschmidt AG ESAB

Alemanha Sucia Rssia EUA

Paton Welding Institute Basf

UkrSSR Alemanha EUA EUA EUA EUA

Soldagem plasma

PAW

Schonner, R.M. Gage

1909 1953

Soldagem TIG

TIG, GTAW

C.L. Coffin, H.M. Hobart e P.K. Devers

1920 1941 1926 1930 New York Navy Yard Airco & Battelle Memorial Institute National Cube Co.

Soldagem a arco com arame tubular Soldagem de pinos (Stud Welding) Soldagem MIG

FCAW

Stoody

EUA

MIG, GMAW

H.M. Hobart e P.K. Devers

1930 1948

EUA EUA USSR

Soldagem a arco submerso Soldagem MAG Corte laser Soldagem a laser Soldagem por frico

SAW MAG, GMAW

Robinoff Lyubavskii e Novoshilov Peter Houldcroft

1930 1953 1966 1970 1991

BWRA (TWI)

Inglaterra Inglaterra

LBW FSW

Martin Adams Wayne Thomas e outros

TWI

Inglaterra

para sua soldagem a arco. O peso total somente das baterias era de 2.400Kg. Thomson usou um transformador quando desenvolveu mquinas para soldagem por resistncia. Oscar Kjellberg usou tenso de 110V de corrente constante e reduziu a corrente para um nvel apropriado deixando a corrente passar atravs de um barril cheio de gua salgada. A AEG, na Alemanha, produziu um gerador de soldagem em 1905. Ele era alimentado por um motor assncrono trifsico e tinha caractersticas adequadas para soldagem. Pesava 1000 Kg e produzia 250 A. A corrente constante (DC) foi normal para soldagem a arco at a dcada de

1920. O avano dos eletrodos revestidos possibilitou usar corrente alternada (AC), e o transformador de soldagem tornou-se logo popular, pois era mais barato e consumia menos energia. No final da dcada de 1950, comearam a ser produzidos os retificadores estticos de soldagem. Inicialmente, foram usados os retificadores de selnio, substitudos logo depois pelos retificadores de silcio. Mais tarde, os retificadores tiristorizados possibilitaram controlar a corrente de soldagem eletronicamente. Hoje, estes so usados com frequncia, principalmente para fontes de energia de soldagem maiores. O maior avano nas fontes de energia foi a fonte inversora de soldagem. O primeiro

prottipo deste mtodo foi construdo na ESAB em 1970, mas somente em 1977 passou a ser usado industrialmente. Em 1984, a ESAB introduziu a fonte inversora Caddy de 140 A, pesando apenas 8 Kg.

Processos de soldagem avanadosQuando a soldagem plasma foi introduzida, ela provou ser uma fonte de energia muito mais concentrada e quente, possibilitando aumentar a velocidade de soldagem e diminuir o aporte de calor. Vantagens semelhantes foram detectadas quando a soldagem a laser e eletrnica foram introduzidas, na dcada de 1960. A quali-

dade e as tolerncias poderiam melhorar alm do que tinha sido anteriormente possvel. Novos materiais e combinaes de metais dissimilares poderiam ser soldados. O feixe super estreito demandou o uso de equipamentos mecanizados. Robs tm sido usados para soldagem por resistncia desde 1964. Os robs de soldagem a arco apareceram por volta de 10 anos mais tarde. Os robs eltricos puderam ento ser projetados com a devida preciso para satisfazer as demandas da soldagem MIG. Originalmente, os robs foram programados com os mesmos dados de soldagem usados pelos soldadores manuais. Muitas tentativas foram

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realizadas para aumentar a produtividade do processo MIG. O canadense John Church usou altas velocidades de avano de arame e um gs protetor com 4 componentes. Com processos semelhantes, tornou-se possvel dobrar a velocidade de avano, ainda usando equipamento de soldagem normal. O mtodo de usar dois arames na mesma poa de fuso soldagem tandem ou bifsica tem demonstrado ser ainda mais produtivo. O mtodo mais recente de alta produtividade a soldagem hbrida, onde dois processos diferentes so combinados. O mais promissor talvez seja a soldagem hbrida laserMIG, onde altssima velocidade e alta penetrao so alcanados. A soldagem mecanizada permitiu novos aplicativos. A soldagem com junta estreita economizou tempo e consumveis e reduziu a distoro na soldagem de sees pesadas. Inicialmente, usou-se apenas o processo MIG, mas depois a soldagem a arco submerso e a soldagem TIG

tambm foram usados. Por volta de 1980, a ESAB entregou equipamentos pesados para soldagem a arco submerso e soldagem com junta estreita para a Volgadonsk, na antiga Unio Sovitica. A soldagem por frico foi patenteada em 1992 pela TWI. O mtodo funciona muito bem para alumnio, o qual pode ser unido sem ser derretido e produz uma junta de altssima qualidade. O processo no usa consumveis, tem um consumo mnimo de energia e baixo impacto ambiental. to simples e eficaz que deve ser considerado uma das inovaes mais formidveis na rea de soldagem do sculo XX.

mais intenso de ligas de alumnio e ao mais resistentes. Uma visita s feiras de soldagem mostra claramente que o desenvolvimento de componentes eletrnicos, tecnologia de computadores e comunicao digital influencia o desenvolvimento dos equipamentos de soldagem. Novos processos tais como o hbrido laser/MIG e a soldagem por frico foram introduzidos, mas os mtodos TIG, MIG e a arco submerso continuaro, sem dvida, a dominar.

Sobre o Autor: Klas Weman, MSc, tem uma larga experincia no desenvolvimento de equipamentos de arco, fontes de energia e processos de soldagem na ESAB Welding Equipment AB, em Laxa, Sucia. Anteriormente, foi professor adjunto no Departamento de Tecnologia de Soldagem no Royal Institute of Tecnology, em Estocolmo. E-mail: [email protected]

Referncias: Bergsmannafreningen. Wermlndska Bergsmannafreningen. Annaler 1887. Cary, Howard B. Modern Welding Technology, 4 Edio, 1998. Prentice Hall. O livro pode ser encomendado no Departamento de Materiais de Treinamento, Hobart Institute of Welding Technology, 400 Trade Square East, Troy, OH 45373. http://www.welding.com/history_of_welding.shtml#1 Jeffersons Welding Encyclopedia, 18 Edio. Sociedade Americana de Soldagem. Katz, Eugeni (2003), Elihu Thomson, 3 de fevereiro de 2004. http://www.geocities.com/bioelectroc