Revista_antropolitica_08 - Isac Joseph

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4ª prova - Vívian A NTROPOLÍTICA Nº 8 1º semestre 2000 Antropolítica Niterói n. 8 p. 134 1-100 1. sem. 2000 ISSN 1414-7378 Sem título-2.pmd 14/12/2007, 12:23 1

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4ª prova - Vívian

A N T R O P O L Í T I C ANº 8 1º semestre 2000

Antropolítica Niterói n. 8 p. 134 1-100 1. sem. 2000

ISSN 1414-7378

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4ª prova - Vívian

© 2001 Programa de Pós-Graduação em Antropologia e Ciência Política da UFF

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Edição de texto: Sônia PeçanhaProjeto gráfico e capa: José Luiz Stalleiken MartinsRevisão: Rozely Campello Barrôco e Taís MonteiroEditoração eletrônica: Vívian Macedo de SouzaDigitação: Camilla PinheiroSupervisão Gráfica: Káthia M. P. MacedoCoordenação editorial: Ricardo B. Borges

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Catalogação-na-fonte (CIP)

A636 Antropolítica : revista contemporânea de Antropologia e Ciência Política. — n. 1(2. sem. 95) - — Niterói : EdUFF, 1995.

v. : il. ; 23 cm.Semestral.Publicação do Programa de Pós-Graduação em Antropologia e Ciência Política da

Universidade Federal Fluminense.ISSN 1414-73781. Antropologia Social. 2. Ciência Política. I. Universidade Federal Fluminense.

Programa de Pós-Graduação em Antropologia e Ciência Política.CDD 300

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SUMÁRIO

ARTIGOS

PROLEGÔMENOS SOBRE A VIOLÊNCIA, A POLÍCIA E O ESTADO NAERA DA GLOBALIZAÇÃO ................................................................... 7Daniel dos Santos

GABRIEL TARDE: LE MONDE COMME FEERIE ................................................ 23Isaac Joseph

ESTRATÉGIAS COLETIVAS E LÓGICAS DE CONSTRUÇÃO DAS ORGANI-ZAÇÕES DE AGRICULTORES NO NORDESTE SEMI-ÁRIDO ............. 41Eric Sabourini

CARTÓRIOS: ONDE A TRADIÇÃO TEM REGISTRO PÚBLICO ................ 59Ana Paula Mendes de Miranda

DO PEQUI À SOJA: EXPANSÃO DA AGRICULTURA E INCORPORAÇÃO DOBRASIL CENTRAL ................................................................................... 77Antônio José Escobar Brussi

RESENHA

TERRA SOB ÁGUA – SOCIEDADE E NATUREZANAS VÁRZEAS AMAZÔNICAS ........................................................ 107

José Augusto Drummond

DISSERTAÇÕES (INFORMAÇÕES PARA ATUALIZAÇÃO) ........................................... 113

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ARTIGOS

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7ECONOMIA

E

POLÍTICA

NA

HISTORIOGRAFIA

BRASILEIRA

PROLEGÔMENOS1 SOBRE A VIOLÊNCIA,A POLÍCIA E O ESTADO NA ERA DA

GLOBALIZAÇÃO*

DANIEL DOS SANTOS**

A relação entre o Estado e a sociedade é uma questão central,sobretudo quando o absolutismo do primeiro, sob o manto da de-mocracia parlamentar representativa, tende a revelar-se uma dascaracterísticas da sua ação no contexto da globalização (passagemdo “Estado Social ao Estado penal”). O que, em termos de repre-sentações sociais, é definido como contrapartida ao recurso cadavez maior de estratégias públicas disciplinares e repressivas, ao usoe abuso de instituições como a polícia e a prisão, a formalizaçãodos direitos humanos, do Estado de Direito e do mercado. Esteartigo tem como objetivo elaborar alguns dos elementos prelimina-res necessários para aprofundar e alargar uma análise possíveldesta questão.

Palavras-chave: violência; polícia; Estado; democracia; sociedade

Agir sobre alguém ou fazê-lo agir con-tra a própria vontade, pouco importan-do os meios utilizados para tanto – acoação, a intimidação ou a força –, nãoé sempre percebido pela maior parte

dos cidadãos como uma violência. Esta per-cepção, mesmo de “senso comum”, éreveladora das ambigüidades que envolvema noção de violência, nos campos da ciênciae do político.

* Tradução: Cecília Campello do Amaral Mello B [email protected].** Universidade de Ottawa.

[...] a coação e, em última instância, a violên-cia são instrumentos específicos do Estado.Existe uma relação orgânica entre o Estado ea violência. Esta ligação é irredutível; éconstitutiva do Estado. [...] O Estado, afirmaNietzsche, é a espécie mais fria dos monstrosfrios. Ele mente friamente; e eis a mentira queescapa da sua boca: “Eu, o Estado, sou o Povo”(MULLER, 1995, p. 138).

A VIOLÊNCIA

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Confunde-se freqüentemente a violênciacom o ato pelo qual ela se exerce, mas tam-bém com as “disposições naturais” dos in-divíduos em exprimir brutalmente seussentimentos e convicções, a atração pelascoisas e, até mesmo, a impossibilidade deresistir a elas. Constata-se, assim, que a vio-lência dificilmente pode ser reduzida auma única fonte ou forma, pois ela é sem-pre plural quanto aos contornos ou ao con-teúdo. Conseqüentemente, é difícil abor-dar este fenômeno que persegue a huma-nidade desde suas origens, ainda que osresultados e as conseqüências sejam deuma amplitude e de uma gravidade assus-tadoras, nos planos individual e coletivo.

Podemos caracterizar a violência pela for-ça impetuosa que ela exerce, por exem-plo, a violência do vento, ou pelos impul-sos que não controlamos. Podemos tam-bém designá-la como o que é próprio dafraqueza, que “não tem freqüentementeoutro sintoma que não seja a violência; fra-ca e brutal, e brutal justamente porquefraca” (JANKELEVITCH, 1960, p.190).Desde Freud (1963, 1968a, 1968b), a vio-lência também está associada àagressividade e à saúde mental dos indiví-duos. Quando recalcamos nossos instintosagressivos, na falta de saídas social e mo-ralmente “aceitáveis” à sua energia, nós osdirigimos contra nós mesmos com maisfreqüência do que pensamos.

As contribuições de diferentes disciplinascientíficas chegaram freqüentemente aresultados semelhantes. As explicaçõesdadas a este estado de coisas, ainda quevariadas, desembocam na constataçãodesconcertante de que apreender tal ob-

jeto de estudo é, concreta e globalmente,antes de tudo, algo árduo. Nessas circuns-tâncias, referimo-nos constantemente aodireito e às normas objetivas e positivas,para deduzir um conjunto de valoresmensuráveis e mais facilmente aceitoscomo universais.

No cerne da nossa percepção sobre a vio-lência, está o fato de que nós a entende-mos, no sentido durkheimiano(DURKHEIM, 1897), como um poder“normal” que pode ser exercido contraalguém, inclusive nós mesmos, oucontra alguma coisa. Apenas definimoseste poder como uma forma de violênciaquando ele ultrapassa certos limites defi-nidos pelo Estado e seu poder legislativo,quando ele perturba uma ordem determi-nada da vida e das relações sociais, a or-dem jurídica estatal. Ele é, segundoJankelevitch (1960, p. 1991), “contempo-râneo da desordem e mesmo posterior aela, criatura da desordem, filho da desor-dem, da qual ele próprio é expressão...” eoposto à força “fundadora e regeneradorada ordem legal”:

A força, que está a meio caminho entreo direito e a violência, é violência emrelação ao direito, mas direito em rela-ção à violência; é capaz a fortiori, de fun-dar o direito, de estabelecer as normas,de criar o valor e o ideal [...](JANKELEVITCH, 1960, p. 186).

Dito isto, deve-se acrescentar que estemesmo poder pode adquirir valores con-traditórios, quando é entendido fora doquadro jurídico estatal. Assim, deve-se con-siderar a possibilidade de duas percepçõese de julgamentos múltiplos e plurais. Se apercepção estatal tende a se apresentar

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9como uniforme e única, a das sociedadescivis não pode pretender a homoge-neidade e a universalidade. Ela é, por na-tureza, múltipla e plural, por conseqüên-cia, contraditória. As sociedades civis nãosão definidas por uma ordem social abso-

AS VIOLÊNCIAS

Segundo o momento e o ponto de vistapode-se desvendar duas lógicas que orien-tam o discurso sobre a violência. Encon-tramos aí a lógica do Estado, cujo discursose apresenta como resultado da razão uni-versal e do saber/conhecimento do “bemsupremo”. Este discurso “resolve” a ques-tão da legitimidade confundindo-a, aomenos em aparência, com a questão da le-galidade. A segunda lógica é a das socieda-des civis. Seu discurso é antes de tudo rela-tivo, daí necessariamente múltiplo. Ele seapresenta sem homogeneidade, seja comoum discurso fragmentado, seja como o re-sultado do compromisso da pluralidade derazões e de saberes. Ainda que este dis-curso não resolva a questão da legalidadeque é da ordem da lógica do Estado, eleconsegue, às vezes, distinguir a legalida-de da legitimidade, que também é plural.Assim, é preciso fazer um esforço suple-mentar para articular as realidades frag-mentadas que coabitam as sociedades civis.

As duas lógicas estão interligadas, já que nãocobrem realidades separadas nem funcio-nam sem comunicação com o exterior.Ainda que sejam complementares, a lógi-ca do Estado busca freqüentemente im-por-se àquela das sociedades civis, o quepode provocar oposições e enfren-tamentos.

luta, mesmo num regime ditatorial, maspor uma “encruzilhada” aberta na qual secruzam ordens múltiplas de condições, si-tuações, interesses e aspirações diferentese diversas.

É preciso notar que as sociedades civisconstroem também definições da violên-cia e colocam limites que lhes são próprios.Contudo, estas definições e limites se dis-tinguem, por sua natureza e aplicação,daqueles que emanam da ordem jurídicado Estado. Facilitando o trabalho dos pes-quisadores, o Estado e seu direito reduzi-ram seu campo de estudo. Do lado das so-ciedades civis, o domínio da violênciaaumenta e torna-se mais complexo e cer-tamente mais complicado, isto é, mais di-fícil de se apreender, medir e explicar.

Num dos casos, a qualificação da violênciaé função da definição dada, em particular,pelas leis penais. Seu conteúdo indica ge-ralmente uma diversidade de comporta-mentos e ações físicas, e leva desigualmenterumo a soluções possíveis, dentro dos qua-dros do direito estatal (direito penal, di-reito civil, direito administrativo etc.). Emrelação a este último, é importante circuns-crever sua intervenção a partir de uma res-ponsabilidade jurídica e não moral, interven-ção que se dirige antes aos indivíduos doque às instituições. A violência é, então,uma questão de agressão física: assaltos,pancada, ferimentos, golpes e maus-tra-tos. São fatos que deixam traços materiaisquando vem o momento de destacar, ob-servar e analisar as ações e os comporta-

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mentos em questão. Trata-se, em primei-ra instância, da sua qualificação e identifi-cação. Esses traços constituem os hard facts,²evidências empíricas e provas utilizáveis edemonstráveis, segundo os gabaritos for-mais do direito e da ciência, frente aos tri-bunais e quando da apresentação das pes-quisas científicas.

No outro caso, as definições e os limitesvariam segundo a interação entre os indi-víduos, os grupos e as classes sociais, o graude heterogeneidade das sociedades civis eas relações de força entre seus componen-tes. As soluções dadas a este problema so-cial – a violência – dependem dapluralidade das definições e dos limites queaí encontramos. Nas sociedades civis, as in-tervenções que visam a comportamentosviolentos não estão unicamente circunscri-tas por uma responsabilidade normativapositiva e objetiva, comparável ao direitoestatal: acrescenta-se aí uma dose denormatividade subjetiva, acompanhada deuma responsabilidade moral, cujo caráternormativo é, às vezes, mais vago ou me-nos claro. Portanto, podemos dizer que

há violência quando, numa situação deinteração, um ou mais atores agem demaneira direta ou indireta, concentra-da ou distribuída, atentando contra umou mais outros (atores) em graus variá-veis, seja contra sua integridade física,seja contra sua integridade moral, sejacontra suas posses, seja contra suas par-ticipações simbólicas e culturais(MICHAUD, 1978, p. 20).

Neste contexto, emerge uma situação par-ticular, porém freqüente, ainda no senti-do durkheimiano de normalidade: ela dizrespeito às relações entre o exercício do

poder político e as relações tecidas nas so-ciedades civis. Nós nos referimos aqui àsrelações entre os agentes do Estado – prin-cipalmente as forças da polícia – e os cida-dãos, que os primeiros devem servir e pro-teger. Esta situação, por um lado marcadapelo poder da arrogância, e, por outro,pela fraqueza da humilhação, obriga-nosa reexaminar a noção de Estado de direi-to nos quadros da democracia represen-tativa. Encontramo-nos, então, frente auma forma insidiosa de violência, que nãodeixa quase nenhum traço, mas que é fre-qüente, diríamos até mesmo quase gene-ralizada. A violência física atinge os espíri-tos e choca os olhares, incita os cidadãos aconceberem posições extremas, isto é, avingança, que está longe de constituir umasolução satisfatória. O risco e o perigo as-sim desencadeados ameaçam a fragilida-de das democracias, em particular o seudesenvolvimento para além da esfera po-lítica, pois:

A calma dos indivíduos e das socieda-des se obtém pelas forças coercitivas(políticas, mas também civis) de umaviolência tal, que ela deixa de ser ne-cessária e passa despercebida. Paraobrigar as paixões a se exprimirem so-mente nos quartos, na intimidade ounas catástrofes [...] para jugular os gri-tos de sofrimento (ou de amor), as quei-xas da miséria, os gemidos dos velhos,a cólera dos pobres; para adormecer osque são assassinados durante suas vi-das; […] para dissimular que “o infer-no está vazio, todos os demônios estãoaqui” – que longa, terrivelmente lon-ga, tradição de leis clandestinas!(FORRESTER, 1980, p. 11-12).

As definições jurídicas mais divulgadasaplicam-se, em princípio, a todos os cida-

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11dãos. Mas as leis, elas próprias, criam ex-ceções, tais como nas áreas do esporte,medicina, mercado de trabalho e polícia,em diferentes níveis. Essas exceções sãocriadas também na área da violência, as-sim como em todas as que se reportam àsformas de apreensão da violência, às re-gras processuais para tratá-la e às sanções.Certos Estados acrescentam limites às ex-ceções, outros não. Esta situação nos re-mete à questão dos direitos da pessoa hu-mana, ao levantar problemas importantes,sendo os mais significativos aqueles quedizem respeito à fronteira da legitimida-de dos atos assim tratados e ao confrontodas duas lógicas (a lógica estatal em oposi-ção à lógica social).

A ética do poder político está mais preo-cupada em ajustar a sociedade e a nação aseus interesses e objetivos específicos doque em preservar e desenvolver o bem-estar físico e moral de seus cidadãos. Oespírito da governamentalidade, em seu

sentido mais amplo, ultrapassa o simplesexercício do poder político. Ele multiplicaas estratégias, os mecanismos e as táticasdisciplinares, coercitivas e repressivas, quevisam mais à segurança do Estado do que àsegurança dos cidadãos. Estes últimos deixamde ser membros de uma nação, vivendoentre eles e formando uma comunidade,para se tornarem sujeitos do Estado, subme-tidos a um “interesse superior” que os do-mina. Assim, obtém-se a tranqüilidade dopoder político e não a da sociedade.

Esta emancipação do poder político temconseqüências graves, na medida em quea maior intervenção do Estado conduz auma maior uniformidade e a uma “seme-lhança, não somente dos meios que ele utilizapara agir, mas de tudo o que realiza”. O Esta-do opõe-se, assim, às aspirações das socie-dades civis, à pluralidade de suas ativida-des e à sua variedade (HUMBOLDT,1792/1990).

O MUNDO GLOBAL

Os direitos da pessoa humana ficam, as-sim, reduzidos a um formalismo jurídicomonístico: estão inscritos nas declaraçõesnacionais e universais e são regulados portribunais nacionais e internacionais, dosquais estão excluídas as sociedades civis.O século XX parece terrivelmente marca-do pela violência, ainda que, ao longo dosdiferentes períodos históricos, a humani-dade tenha percorrido momentos igual-mente violentos. Não entraremos aquinuma polêmica quantitativa estéril, obser-

vamos somente que nossa vida cotidianacontemporânea traz a marca da violência.Ela adotou certamente formas e conteú-dos diferentes, como conseqüência do de-senvolvimento tecnológico sem preceden-tes que caracteriza o nosso século. Da Pri-meira Guerra Mundial à Guerra do Gol-fo, passando por Angola, pela Iugosláviae por Ruanda, o potencial destruidor daviolência coletiva e individual é sem para-lelos.

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Esta situação é por vezes interpretada eanalisada de maneira resignada,enfatizando o derrotismo e a irrespon-sabilidade: de um lado nós, do outro, eles.Segundo John Keane (1996), o mundoglobal se divide em dois campos. O pri-meiro deles seria a zona democrática, o mun-do “próspero” das democracias parlamen-tares, uma comunidade onde o desfruterelativo da paz e da segurança está asse-gurado. Esta comunidade possui Estadosfortes e um poder militar e policial apa-rentemente bem organizado, a tal pon-to que esses aparelhos do Estado não sãomais alvos dos debates democráticos nacio-nais. A segurança nacional é área reserva-da ao Estado. Este poder deixa de ser um“instrumento político” e torna-se a garan-tia da paz social e da ausência de guerra,ainda que por vezes se assemelhe a umailusão. Esta zona contém apenas 1/7 dapopulação mundial.

O restante do planeta, logo, 6/7 da popu-lação do globo, compõe a zona do outro.Aqui encaramos uma realidade provavel-mente sem igual na história humana. Elesse caracterizam por uma violência cotidia-na anárquica vinda de todas as direções,pela guerra – e seu conjunto de desgra-ças, dentre as quais não se deve ignorar owarlordism³ – pela ausência concreta denormas que existem apenas no papel, pelaausência de esperança... Esta zona é, as-sim, mais vulnerável às catástrofes natu-rais e às perturbações políticas e econômi-cas, tais como, inundações, seca, fome,corrupção, golpes de Estado. Em poucaspalavras, a zona do outro define-se, na me-lhor das hipóteses, por uma democraciade fachada e simbólica; na pior das hipó-

teses, pela ditadura, sobretudo das armas,das forças armadas, da polícia do Estadoou de grupos sociais que representam in-teresses diversos e específicos (comprado-res, especuladores, warlords, exército, po-lícia, crime organizado etc.). Quanto maisfracas são as sociedades civis, mais instávelé o “poder político” e menos paz socialexiste.

Esta perspectiva não é totalmente falsa,mas enganadora. Os “portos de paz” quea zona democrática constitui são tambémhabitados por situações de conflito violen-tas e inquietantes, pelo menos no planodo discurso e da lógica do Estado. Aglobalização tem um conteúdo econômi-co, mas também social, político, cultural,comunicacional e jurídico. Ela implica “porum lado, a difusão social e, por outro, apartilha de direcção” (DELMAS-MARTY,1998, p. 14). A atitude tradicional dos Es-tados desta zona em relação ao comporta-mento desviante, particularmente, aqueledefinido pelo direito penal como própriodas “classes perigosas”, ressurge atualmen-te com força: a guerra contra o crime tem to-mado ares de uma guerra contra os pobres (Actesde la recherche en sciences sociales, 1998;Wacquant, 1999). Ainda que traduza umcerto “pânico” frente à “contaminação”possível de suas sociedades, esta atitudecoloca os Estados da zona democrática emface da contradição mundial do trabalho:4

a produção de armas, o controle do tráfi-co de drogas e de órgãos, a corrupção dospoderes etc. derivam dos seus domínios.

A pauperização das populações da zonado outro, o saque de suas riquezas pelaaliança entre as elites dirigentes, os

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13warlords, os grupos do crime organizado,suas redes e os conglomerados econômi-cos mundiais, a pilhagem da nação pelaclasse política local e a instrumentalizaçãoquase ilimitada do Estado, ocasionam mo-vimentos populacionais em direção à zonademocrática, cujas conseqüências, suficien-temente conhecidas, tornam-se cada vezmais difíceis de serem resolvidas. O au-mento dos preconceitos raciais, os proble-mas de identidade e de enraizamento en-gendram um crescimento generalizadodas tensões sociais, das possibilidades deconflitos e de violência e, por conseguin-te, de políticas repressivas facilmenteantidemocráticas (Actes de la recherche ensciences sociales, 1999).

Esta situação da zona democrática asseme-lha-se cada vez mais a uma entropia socialcom um caráter anômico resolutamentepronunciado. Do ponto de vista das repre-sentações sociais, uma tal imagem leva associedades civis desta zona a se preocupa-rem com a violência, mais do que aquelassociedades civis da zona do outro, onde énecessária e visivelmente mais instável.Este fenômeno deve-se, em parte, à retó-rica estatal, às campanhas das forças poli-ciais, das instituições sociais e dos políti-cos, mas também, à realidade de todos osdias e à maneira como a mídia a represen-ta. Enquanto as empresas de seguro au-mentam barbaramente seus prêmios paraa segurança, assistimos a um recrudesci-mento de uma violência indizível, porquecontraditória, extrema e gratuita: assassi-natos em série, crimes contra crianças, vio-lência nas escolas dirigidas contra jovens eprofessores, violência familiar e conjugal,violência do “crime organizado” etc.

Ela também é indizível porque, apesar damanifestação midiática dos especialistas(cientistas, policiais, políticos etc.), justifi-cam-se mal tais acontecimentos e perma-nece-se sem novas soluções, a não ser asfórmulas já esgotadas. Entretanto, assiste-se ao crescimento fulgurante do mercadoprivado da segurança, do qual as políciasestatais também participam.

A violência se desloca e se aproxima cadavez mais dos “portos da paz”, ela atravessaas sociedades de uma ponta a outra. A comu-nicação é um aspecto interessante e pri-mordial da mundialização. Da imprensaescrita à televisão, passando pela auto-es-trada da informação (Internet), todas asredes de comunicação participam destapercepção sobre o crescimento e a proxi-midade da violência. Um outro aspecto damundialização diz respeito à tendência asuprimir as fronteiras e, sobretudo, a co-locar em causa a noção tradicional deterritorialidade. Notemos, porém, que estatendência é atualmente sobretudo econô-mica (o mercado). No nível político,encontramo-nos em face de uma situaçãode impasse (em vias de tornar-se caótica),cujos indícios descobrimos na ausênciacrescente de autoridade moral e política.Os únicos valores que contam são os doaumento do lucro a todo custo. É o reinodos deal makers.5 Todos os meios são bons eúteis, pouco importa se os resultados agra-vam as condições de existência e de bem-estar das sociedades civis e, dentre estas,as condições dos mais desprovidos, tantonuma zona quanto na outra.

A Comunidade européia produz leisregrando o espaço econômico e jurídico

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dos Estados membros. Este processo é maislento no domínio do direito penal e semnenhuma legitimidade, já que ela não res-peita a soberania dos seus povos. Estes es-tão de fora de todo processo verdadeirode tomada de decisões. Quando as demo-cracias parlamentares agem desta forma,a legalidade das decisões por elas toma-das tem somente a força do poder repres-

sivo, punitivo, estigmatizante e disciplinardos seus aparelhos, pois não mais pos-suem base real na sociedade. Há, aqui,um problema sério de legitimidade, deautoridade e de moralidade; um deslizeem direção a um absolutismo político cego,que leva à oposição e possivelmente aoenfrentamento entre as duas lógicas daviolência.

A POLÍCIA E O ESTADO

A polícia e o Estado precedem historica-mente a criação dos regimes democráti-cos modernos. O desenvolvimento e a evo-lução destes últimos raramente questiona-ram a existência de uma ou de outro. Aocontrário. À beira do século XXI, tem-se aimpressão de que os regimes democráti-cos reforçaram a idéia e a presença cotidi-ana de ambos, o que, à primeira vista, podeparecer contraditório frente ao movimen-to em direção à globalização. Inicialmen-te, a polícia e sua institucionalização erampercebidas e encaradas como um bem co-mum, parte do patrimônio social, cujo ob-jetivo era a “proteção da sociedade” (cida-dãos e propriedade). No final doséculo XX, a representação que se faz dapolícia é a de um serviço burocrático esta-tal ou de uma força repressiva e coerciti-va, mesmo se esta função representa me-nos de 30% das tarefas policiais. Seu prin-cipal objetivo deixou de ser a proteção dasociedade, para ser, sobretudo, a proteçãodo Estado e de interesses políticos e econômicosparticulares.

A polícia tornou-se um elemento essencialda gestão do Estado e do exercício da au-toridade, ao mesmo tempo em que é obje-

to das lutas políticas. Contudo, ela apre-senta-se também como uma instituição quecria e desenvolve valores, regras, interes-ses e objetivos, isto é, uma cultura própria.Ela mantém relações ambíguas, contradi-tórias e complexas com o poder político ecom as sociedades civis.

A polícia, como aparelho do Estado demo-crático, não deve ser “política”, isto é, ser-vir a interesses particulares, mas sim, pro-teger o bem comum e o bem-estar de todos oscidadãos, respeitando os direitos da pessoae a justiça social. Somente no sentido dorespeito dos direitos da pessoa humana éque a polícia exerceria uma função políti-ca. Hélas,6 quem define o mandato da polícia,suas tarefas, seus regulamentos? Quem avaliaseu trabalho, seus êxitos e seus insucessos? Quemcontrola a polícia? A quem ela presta contas?...O Estado e as sociedades civis vivem obce-cados por estas questões, em particular asque dizem respeito à definição das funçõesda polícia e suas responsabilidades. Con-tudo, enquanto instituição estatal, a polí-cia freqüentemente soube jogar com essasquestões e com as posições dos diferentestendência está condicionada pela divisãomundial do trabalho);

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15atores sociais, para daí tirar partido. En-tre outros fatores, a globalização conduz,com mais ou menos felicidade, a uma cer-ta normalização – entendida como umatendência para a homogeneidade e uni-formidade – da cultura, dos hábitos, dasnormas e das instituições (estrutura men-tal dominante). A polícia não escapa a essefenômeno. Porém, tal movimento parececriar, ao mesmo tempo, um certo númerode dificuldades resultantes do estado atu-al das relações entre o global e o local, pois:

1 Não existe uma polícia, mas diferentes po-lícias (no interior de cada país e entre os paí-ses; polícia estatal e polícia privada etc.);

2 Existem instituições policiais exercendofunções não-policiais e vice-versa (agentes da al-fândega, agentes fiscais, assistentes sociais,guardas de prisão, guarda-costas, segurançaprivada etc.) ou instituições policiais idênticas mascom atribuições distintas;

3 Na América do Norte, atualmente, as polí-cias privadas são dez vezes mais numerosas que apolícia do Estado (no reino da globalização, tra-ta-se de uma tendência que se alastra por to-dos os lugares, mas que assume muitas vezesuma “cor” local);

4 Há um aumento na utilização de novastecnologias como instrumento de trabalho das polí-cias estatais e privadas e como meio de vigilância econtrole (utilizados tanto pela polícia, quantopor cidadãos privados, sobretudo aqueles emsituação hierárquica superior; por empresase por instituições públicas e privadas; pelasdiferentes instâncias do poder político, desdeos municípios ao Estado central: no en-tanto, esta tendência está condicionadapela divisão do trabalho);

5 Não existe uma forma única de organi-zação das forças de polícia, mas várias (ex.: cen-tralização x descentralização, em cada paíse entre os países e segundo os tipos e fun-ções de polícia);

6 Não existe um só e único objeto (de ação)da polícia bem como sua função não visa unica-mente a um só objetivo (a pluralidade quase si-multânea de objetivos, funções e objetos ca-racteriza a polícia como uma instituição cadavez mais multifacetada e não ultra-especializa-da – ela é militar, política, profissional e civil;comunitária; coercitiva; preventiva e repres-siva; de vigilância; de informação e do risco;de segurança pública, do Estado, das empre-sas, etc. Tal situação conduz, freqüentemente,à concorrência e à competição, ou à ausênciade colaboração entre forças policiais tantoem termos nacionais quanto internacionais).

Some-se a isto o fato de que a democraciamoderna tornou-se formal e processual, aponto de confundir os meios com os fins,criando, assim, muito freqüentemente, ummundo quase abstrato e normativo(BÉNÉTON, 1997). Ela se afasta do mundoconcreto da sociedade existente, das relaçõessociais reais, um mundo que é preciso cobrircom um véu denso e obscuro, um mundoque não se deve expor à luz. Devido a isto,seremos acusados, na melhor das hipóteses,de utópicos ou de irrealistas e, na pior, deestraga-prazeres ou subversivos. Os atores so-ciais deixam de existir em movimento para setransformarem em estatuetas. Acelera-se aentrada num mundo cada vez mais reificadoonde o ser vivo torna-se uma coisa, umamercadoria.

Nesse mundo, o Estado e a polícia são nor-malmente responsáveis perante si mesmos,

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mas raramente perante as sociedades ci-vis, a não ser que estas consigam assegu-rar para si a criação de regras processuaise formais e instituições que garantam aaparência de controle civil.

Quais são as diferenças, então, entre umregime democrático e um regime ditato-rial? No primeiro, a função da polícia é con-trolar, vigiar e reprimir certos grupos quepodem parecer suspeitos ou ameaçadorespara a ordem normativa formal democrá-tica. No segundo, assiste-se à utilização to-tal das forças policiais como um instrumen-to político e de busca de um conformismo“físico”. Numa democracia, ilegalidades,abusos de poder e violências policiais po-dem ser entendidos como um crime (ra-ramente), um delito (raramente), uma in-fração moral, ética ou disciplinar (maisfreqüentemente) e, finalmente, como um“acidente” (muito mais freqüentemente).Porém, se o trabalho policial é considera-do, sobretudo, como undercover,7 a políciae o Estado reagem por um covering up.8 Épreciso, portanto, que às queixas dos ci-dadãos, some-se o trabalho da mídia, paraque estas diferentes situações sejam expos-tas e possam ultrapassar o “acidente”.Num regime ditatorial, os diferentes ro-teiros considerados frente à “utilização deuma força despropositada” (violência po-licial) raramente ultrapassam o estado dacategoria de acidente. Quando isto ocor-re, é algo excepcional. A profissionalização da polícia represen-ta, em teoria, a submissão desta às regrasdo direito, aos direitos dos cidadãos e àsregras que regem o ato de prestação decontas e de responsabilidade. O objetivoda repressão policial deve ser impedir aação dos indivíduos criminosos – e não degrupos sociais, a não ser quando estes se

constituam como organização criminal –,e de assegurar que “todo cidadão é igualperante a lei”. As forças da polícia devem-se submeter a um controle severo de suasações e à imposição de limites claros à uti-lização da violência ou aos abusos de po-der.

Apesar desta profissionalização, o dilemaainda permanece: como assegurar o res-peito aos direitos dos cidadãos e, ao mes-mo tempo, a estabilidade do Estado? Associedades civis exigem serem protegidastanto das ações dos criminosos, quanto dosabusos e da violência da polícia e do Esta-do. Este último impõe à polícia o estabele-cimento de uma ordem pública que eledefine e a manutenção da sua proteção aqualquer preço, mesmo em detrimentodos cidadãos. Isto ocorre no mesmo mo-mento em que a globalização exige dosEstados nacionais e de suas polícias umaatitude claramente dirigida de “flexibili-dade” (em relação às grandes empresas) ede repressão (em relação aos indivíduos eaos grupos sociais marginalizados).Levando-se em conta as representações so-ciais que as sociedades civis fazem da polí-cia e de suas funções, suas demandas cons-tituem um paradoxo: por um lado, umapolícia mais severa, mais repressiva e maisviolenta e, por outro, mais humana, maispróxima dos cidadãos e mais respeitosa dosdireitos da pessoa. Essas demandas dassociedades civis estão relacionadas, em cer-ta medida, com o sentimento de insegu-rança, real ou abstrato, que se manifesta,de forma confusa e tumultuada pelaexplosão de emoções, de percepções e derepresentações de crimes e de perdas devalores concretos, traduzidos pelas incivi-lidades e pelo “medo”, segundo umdesenvolvimento particular:

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17Pode-se situar no período de 1965 a 1975as tentativas modernas de reforma da po-lícia na América do Norte. Elas foram oresultado das lutas de grupos minoritários,sobretudo os afro-americanos (negros) eos latinos. A polícia revelou-se incapaz derespeitar os direitos constitucionais destesgrupos e, menos ainda, de estabelecer re-lações democráticas com eles. Segundo amaioria dos observadores e dos pesquisa-dores deste período da história da polícianorte-americana, esta demonstrou, naque-la época, toda a sua incompetência profissio-nal, seu caráter violento e antidemocrático. Estasituação também revelou uma crise agudada função policial, ligada a fatores estru-turais, isto é, uma crise de legitimidade euma crise de eficiência.

A estratégia de luta contra o crime, fun-dada sobre o modelo tradicional de polí-cia, foi extremamente ineficaz. A guerracontra o crime aparece como algo utópico esem resultados, deixando de lado o quenormalmente afeta mais os cidadãos: amanutenção da ordem cotidiana e outrosproblemas, tais como desordens urbanase incivilidades, critérios da avaliação queos cidadãos fazem sobre sua qualidade devida cotidiana. A crise financeira do Estadorevela também uma outra incapacidade,verdadeira ou falsa: o Estado-nação pa-rece incapaz de continuar a financiar –num nível em que as sociedades civis pos-sam considerar justo, eqüitativo e aceitá-vel – os serviços que deve à sua popula-ção.

• identificação de um “crime” e construção do “mêdo/pânico” (cidadãos, mídia de massa) • ligação entre o crime identificado e a realidade (representações, “peritos”, grupos sociais) • construção conceitual (intelectuais e pesquisadores) • responsabilização (atores políticos, institucionais a mídia de massa) • manifestações no espaço público (movimentos sociais, grupos de pressão e partidos políticos) • políticas criminais mais repressivas, visando a alvos precisos, principalmente jovens, drogados, “vagabundos”,

pobres, minorias, imigrantes, assistidos sociais, etc. (programas eleitorais, partidos políticos, governo e agentes políticos do Estado)

Finalmente, como já indicamos, o cresci-mento real ou imaginário do sentimentode insegurança que parece acompanhar aglobalização pode ser compreendido comodecorrente de uma política do Estado cujoobjetivo é o controle social, ou como umconjunto de percepções, sentimentos,emoções e representações, na maior partedos casos contraditórias, mas próprias àssociedades civis.Essas tentativas de reforma são, antes detudo, uma questão pragmática e, caso ne-cessário, técnica e profissional. Elas nun-ca serão reconhecidas pelos principais ato-res como uma questão política. Porém, ospilares da globalização da economia deri-vam do político: democracia, Estado dedireito e direitos da pessoa. Nesses últimos

anos, assiste-se a uma nova tentativa dereforma, tendo em vista criar uma polícia“próxima do público” (a polícia comuni-tária, para os norte-americanos, a políciade proximidade, para os europeus), visan-do a responder principalmente a duasquestões problemáticas da polícia, a saber,sua eficácia e sua imagem, e não necessa-riamente uma atuação visando à promo-ção da democracia.Uma refere-se à qualidade profissional dapolícia; a outra, à legitimidade do seu tra-balho. Lembremo-nos que a função re-pressiva ocupa, com freqüência, menos de30% das tarefas policiais! Nesse meio-tem-po, seu trabalho de vigilânciae de construção de bancos

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18de dados (arquivos de informação) cresceparalelamente ao mercado privado da se-gurança, da vigilância eletrônica e da in-formação sobre o risco. É esta dimensãocrescente, somando-se ao trabalho da po-lícia estatal, que as novas tecnologias dainformação e da vigilância vêm reforçan-do. Ela se refere à coleta de informações eà constituição de arquivos que permitama vigilância e a gestão do risco (“perigo”)por agências de polícia públicas e priva-das, com o objetivo de informar os clien-tes do mercado da segurança (ERICSON;HAGERTY, 1997). A função da polícia nãose especializou; ela se expandiu.

O caso hoje célebre da cidade de NovaIorque, com suas políticas repressivas, uti-lizando a polícia como principal instru-mento, provocou “estatisticamente” umaqueda substancial das taxas de crimi-nalidade, mas também registrou um cres-cimento comparável de queixas dos cida-dãos contra a cidade e sua polícia, por abu-so de poder e, sobretudo, por violência.Alguns casos foram amplamente divulga-dos na imprensa, como o estupro de umcidadão negro haitiano por um grupo depoliciais da cidade, seguido de uma falsaacusação, e o de um imigrante malinês,também negro, morto a tiros na saída doseu edifício. “Parece” que os policiais ati-raram 41 vezes; o imigrante foi atingidopor duas dezenas de tiros. Havia sido fal-samente acusado de estupro. Tudo issoparece indicar, como em centenas de ou-tros casos, que os negros, consideradoscomo um grupo de risco, são um dos al-vos preferidos da repressão e da violênciapolicial de Nova Iorque! O direito à vio-lência se caracteriza, portanto, por ummovimento em espiral que não parece termais fim.

E, no entanto, o “direito” e a violência nasmãos dos policiais são “legais”, enquanto quenas mãos dos cidadãos eles tornam-se ilegais...Esta questão da legitimidade/legalidade serefere, entre outros, ao debate sobre omonopólio da violência legítima, que, desdeMax Weber, desenrola-se nas ciências so-ciais, em particular no campo da sociolo-gia do Estado e da sociologia da polícia.Aliás, tratando-se da sociologia da polícia,tanto os pesquisadores quanto os cidadãosmostram-se incapazes de atacar frontal-mente este monopólio, sobretudo quan-do trata-se de pôr em questão os poderesdiscricionários da polícia, em particular asinúmeras, porém vagas, referências à quan-tidade de força que os policiais estão autoriza-dos a usar durante o exercício de suas funções.

O enfraquecimento do Estado-nação nonível econômico como conseqüência daglobalização parece ter tido, como primeiroefeito, o fortalecimento da sua função re-pressiva e coercitiva, isto é, o uso excessivodo direito e da justiça penal em geral e omonopólio da violência “legítima” em par-ticular. Numa economia “flexível”, isto é, queoutorga às empresas um direito excessivo dedemissão de trabalhadores, e repressiva –produção de riqueza e de pobreza sem igualna história moderna – o que o Estado“globalizado” (ou inserido no contexto daglobalização) retira com uma mão – a justiça e aproteção sociais – ele dá com a outra – a violênciada polícia e da prisão, em particular, e a exclusãosocial, em geral. Tudo isso em nome do mer-cado livre, dos direitos formais da pessoae do Estado de direito, como fundamen-tos de uma democracia e de uma felicida-de globais.

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NOTAS

1 Trata-se de construir um esboço sobre esta ques-tão com base numa série de elementos, noções eprincípios preliminares, que nos permitirão, maistarde, aprofundar nossa análise.

2 “Hard facts”: fatos concretos.

3 “Warlordism”, em inglês no original. O termo éuma forma geralmente pejorativa de se desig-nar comandantes ou generais que comandamgrupos de pessoas lutando contra outros gruposdentro de um país. A tradução aproximada seriaalgo como “mandonismo”. [N. da T.]

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4 Observar o jogo de palavras – o autor refere-seironicamente à divisão mundial do trabalho como“contradição mundial do trabalho”. [N. da T.]

5 Em inglês, no original. Deal makers, fazedores denegócios. [N. da T.]

6 “Hélas” é uma interjeição intraduzível, que expri-me queixa, dor ou lamentação. [N. da T.]

7 Em inglês, no original: undercover, secreto.[N. da T.]

8 Em inglês, no original. Covering up, encobrimento.[N. da T.]

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GABRIEL TARDE: LE MONDE COMME FEERIE *

ISAAC JOSEPH* *

On tente de montrer, dans ce texte, l’originalité de l’oeuvre de GabrielTarde, sociologue français méconnu du fait de l’influencedurkheimienne dans la discipline. La pensée de Tarde s’organiseautour de trois concepts qui sont au centre de trois ouvrages majeurs:l’imitation, l’opposition et l’adaptation. La logique sociale que cestrois concepts mettent en lumière est une logique de lacommunication. Elle considère non pas les faits sociaux comme deschoses (comme le proposait Durkheim) mais toute chose comme unesociété, c’est-à-dire comme une construction sociale faite de croyanceset de désirs. Loin des métaphores mécanistes ou organicistes dusocial à l’oeuvre dans la sociologie dominante de son temps, Tardeest moderne parce qu’il comprend le social à partir de la conversationet des phénomènes publics, comme une féérie de la différenciationet de la diversité.

MOTS CLÉF: public, association, croyance.

* Une première version de ce texte est parue dans le numéro spécial de la revue Critique, n° 445-446, Juin-Juillet 1984, intitulé: «Aux sources de la sociologie». On y reconnaîtra sans peine l’influence de GillesDeleuze et de sa découverte, dans l’oeuvre de Tarde, d’un programme de recherche pour la microsociologie.Outre quelques corrections, la dernière partie du texte a été légèrement remaniée.

Il y a deux grandes erreurssociologiques, dit Tarde : deux grandsleurres. Le leurre panoramique qui nousfait croire que l’ordre des faits n’estperceptible que si l’on sort de leur détailessentiellement irrégulier pour “s’élevertrès haut jusqu’à embrasser d’une vuepanoramique de grands ensembles”; etle leurre historique qui consiste à enfermerles faits sociaux dans des formules dedéveloppement. Ce sont des leurresparce qu’il y a, dit Tarde, plus de logiquedans une phrase que dans un discours,dans un “rite spécial que dans tout uncredo”. Mais pour bien comprendre

l’erreur des sociologies “panoramiques” etdes sociologies du développement il fautaccepter que la logique sociale n’est pas unelogique de la totalisation. Le rite spécial dontparle Tarde n’est pas un phénomène socialtotal parce que la logique qui l’anime est unelogique de l’adaptation c’est-à-dire, dans sonlangage, une logique de l’invention et de lacoproduction du sens. La logique d’un faitsocial, c’est la modalité selon laquelle il estproducteur de liens. Voilà pourquoi les faitssociaux n’ont rien de naturel. Au contraireils sont parfaitement énigmatiques, ce sontdes adaptations toujours inventives. Unrapport social n’est jamais le rapport d’une

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copie à son modèle, c’est la réponse à unequestion et au fond de toute associationentre les hommes il y a une associationd’idées.

Si on ne voit dans Tarde que lecontemporain de Le Bon, on risque doncde passer à côté de ce qui fait son actualité:Tarde ne s’intéresse pas à la psychologiedes foules mais au social en tant qu’il estaffranchi de la proximité, en tant qu’ilrelève d’une physique ondulatoire. Laformation des opinions n’a rien à voir avecles stratégies de la suggestion. Un publicest un fait social tout à fait étranger auxmétaphores de la foule. Tout le monde estassis, “chacun chez soi, lisant le mêmejournal et dispersé sur un vaste territoire”.

Quel est donc le lien social entre ceshommes qui se sont détachés des foules ?Quelle est la nature du lien social qui faitles publics ? Voilà la question de Tarde.Anticipons la réponse : “Ce lien, c’est avecla simultanéité de leur conviction ou de leurpassion, la conscience possédée par chacund’eux que cette idée ou cette volonté estpartagée au même moment par un grandnombre d’hommes.” (TARDE, 1989, p. 32)Le lien social n’est donc pas organique oupanoramique, il est cérébral et micro-physique. Ce n’est pas la reproductiond’une histoire, c’est la réflexion d’uneactualité.

Si Tarde a eu plus de succès dan lasociologie américaine qu’en France, c’estsans doute parce qu’il pressentait cettepensée du social qui s’est épanouie autourde R. Park (1972) et de l’école de Chica-go;1 pensée qui fait du journal le

phénomène de socialité par excellence, etde l’espace-journal, l’espace social de notremodernité.

Pour commencer “mettons nous enprésence d’un grand objet, le ciel étoilé, lamer, une forêt, une foule, une ville” (TAR-DE, 1898). Et, ne confondons pas: le cielétoilé de Tarde n’est pas celui de Kant. Cequi est premier, “ce dont les faits sont faits”,ce n’est pas le spectacle du firmament niun “faisceau de formules explicatives”.C’est une “féerie d’idées”. Et une féerien’est pas une scène, c’est l’enchantementdevant deux séries de phénomènes: lesgrandes révolutions comme lespromenades circulaires du soleil et de lalune et quelques exceptions: étoiles erran-tes, planètes capricieuses, dont lesdéplacement sont variés et inégaux.Le seul a priori est donc celui del’indétermination du réel et les êtres quinous entourent sont des émergences. Desorte que le réel n’est pas la synthèse dudivers et qu’il n’est marqué du signed’aucune nécessité.

La différence est le seul côté substantieldes choses et c’est le deuxième principede la métaphysique de Tarde qui veutqu’exister, ce soit différer ou, et c’est lamême chose, qui affirme le caractèreinfinitésimal du réel. A titre deconséquence pour une philosophie dessciences sociales, cela signifie que la bonnequestion n’est pas : “l’individu est-il libreou non ?”, mais “l’individu est-il réel ounon?” (TARDE, 1890, p. 17). A supposerdonc que l’on veuille, pour des raisonsdiverses, aller à contre-courant de ceux quientendent “désenchanter le monde”, on

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25ne pourra pas dire que le monde est unspectacle ordonné dans l’infiniment petit.Mauvaise piste de l’atomisme. Ou alors ilfaudrait penser une merveille, le clinamen;importer le féerique. Pourtant l’atomismeest tout de même le point de départcommode d’une physique du réel(psychologique ou sociale, peu importe: ils’agit d’une physique ontologique). Il fautd’abord se convaincre de la richesse duréel, de l’infinité de ses formes, de ladémultiplication des ressources ; Tarde faitpartie de ces philosophes qui conçoiventle réel comme devenir toujours en excès.²Voilà pourquoi il faut considérer la forêtcomme le paradigme du réel. La forêt,c’est d’abord l’opposé de l’arbre et c’estaussi le règne de l’infiniment petit. Larichesse du réel doit d’abord être conçueà partir des phénomènes de contiguïté, derencontres aléatoires et innombrables.C’est-à-dire à partir de rapports. Voilàaussipourquoi la théorie de la croyance etdu désir qui entend fonder unemicrosociologie originale ne correspondqu’à une psychologie pauvre. Ce quiintéresse Tarde, le niveau d’analyse auquelil s’arrête est toujours un rapport; larépétition, l’opposition et l’adaptation ouleurs formes sociologiques – l’imitation,l’hésitation et l’invention – sont desprincipes d’organisation du réel quiconjuguent d’une part, une priorité dudiscontinu sur le continu – c’est la diversitéet non l’uniformité qui est au coeur deschoses – et, d’autre part, une intégrationde l’infini dans le fini.

Le principe de discontinuité opposera Tardeà l’évolutionnisme darwinien qui refuse deconcevoir la différenciation au sein desorganismes. (Les variations spécifiques,chez Darwin, sont pour Tarde “desdivergences sans but, des rebellions sansprogramme, des fantaisies désordonnées”).Il permet également de dégager laméthode explicative des mythes quil’encombrent: mythes des “tendancesgénérales” ou de la “force des choses” enpolitique, mythe du progrès perpétuel.Le principe d’intégration de l’infini dans lefini est l’opérateur d’une rupture avectoutes les théories qui tendent à donnerune image divisible de la réalité – individu,cellule, atome. Il interdit par conséquentde cantonner l’analyse des phénomènesmicrosociologiques à un “domaine” de lasociologie. Les concepts de la micro-sociologie ont un “territoire”, dirait Kant;ce sont des concepts régulateurs, mais ilsne sont constitutifs d’aucun domaineparticulier. Il n’y a pas de domaine propreà la microsociologie. Tout dans le réel vadu petit au grand, alors que “dans le mon-de des idées, miroir restreint du premier,tout va du grand au petit et, par les progrèsde l’analyse, n’atteint qu’en dernier lieules faits élémentaires véritablementexplicatifs” (TARDE, 1898, p. 88-89) Lamicrophysique du réel se définit commethéorie des phénomènes en tant qu’ils sontinfinitésimaux.

1 IMITATION: “TOUTE CHOSE EST UNE SOCIETE”Ce qui compte dans cette physique, encoreune fois, ce n’est pas l’individu mais

l’élément différentiel qui peut se produireentre deux individus (interpsychologie) ou

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dans l’individu (la petite idée commeinvention infinitésimale; l’hésitationcomme opposition infinitésimale). Dans lesdeux cas, la question n’est pas seulementde savoir comment naissent cesphénomènes, mais de savoir comment ilsse propagent, interfèrent, se conjuguent.La physique du réel est une physiqueondulatoire et l’ondulation est l’équivalentdans le monde physique de la générationdans le monde vivant et de l’imitation dansle monde humain.

Donc, contrairement à Durkheim, on nese donnera pas une société toute faite. Ilfaut décomposer les grands objets suivantles trois catégories de la répétition, del’opposition, de l’adaptation. Il fautretrouver “les actes individuels dont lesfaits sont faits” (TARDE, 1979, p. 1). Et àtitre de principe corollaire, on neconfondra pas amplification et homogé-néisation. L’amplification est le passaged’un ordre de différences à un autre.

Multiplicité et hétérogénéité des formesdonc, mais aussi continuité et simplicité desprocessus ondulatoires. De ce point de vue,l’épistémologie sur laquelle se fonde Tar-de est encore classique; les lois de l’universrenvoient à un principe unique. Toutphénomène est d’abord propagation etassociation. Et l’association elle-mêmeprocède d’une propagation.

Au commencement était la propagation.“Toute chose est une société et toutphénomène est un fait social” (TARDE,1998b). Tarde fonde en effet sacosmogonie sur un associationnismegénéralisé, c’est-à-dire sur “un point de

vue sociologique universel”. Tout seramène dans le monde physique àl’ondulation, tout se ramène dans le mon-de social à l’imitation. On peut doncrenverser la proposition selon laquelle lesfaits sociaux subissent les lois d’un systèmemécanique ou organique et affirmer queles faits mécaniques sont sociaux.Sociomorphisme: tout phénomène de lanature est un fait d’association, la socialitéest la réalité universelle et la socialitéabsolue se définit par la transmissioninstantanée (et non par la transparencetotale). “Pour bien entendre la socialitérelative, la seule qui nous soit présentée àdes degrés divers par les faits sociaux, ilfaut imaginer par hypothèse la socialitéabsolue, parfaite. Elle consisterait en unevie urbaine si intense que la transmissionà tous les cerveaux de la cité d’une bonneidée apparue quelque part au sein de l’und’eux y serait instantanée” (TARDE, 1979,p. 75). On peut penser bien sûr aux fouleset aux phénomènes de contagion, mais ilfaudra aussi analyser ces formes socialesmoins pauvres, les publics qui intègrentl’harmonie des différences et qui nefonctionnent pas à l’unisson. Les formessociales sur lesquelles il faut réfléchir nesont pas celles qui sont liées à la fusion dessubstances, mais celles qui naissent de laréduction du temps à l’instant : associationsunilatérales à ondulation rapide etassociations contractuelles à ondulationconvergente.

Considérer donc les faits comme dessociétés et la socialité comme association.Ce privilège de l’association se retrouvedans la hiérarchie des catégories oùl’opposition est subordonnée à la

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27répétition. C’est en effet parce que les for-ces physiques se propagent par répétitionondulatoire qu’elles interfèrent. Et “leursinterférences-chocs ne semblent servir qu’àleurs interférences-alliances, leurscombinaisons” (TARDE, 1898, p. 105): Lesguerres, les concurrences, les polémiquesse nourrissent des entrecroisements derayonnements imitatifs. A son tour donc,la répétition est subordonnée à l’inventionqui n’est jamais qu’une adaptation à unmilieu lui-même constitué d’autres ondesou rayonnements imitatifs. Touteinvention est une “co-adaptation”, uneinterférence-combinaison et lesadaptations sont des rapports decoproduction créatrice. Ce sont donctoujours de petites variations (inventions)qui se propagent, de petites différencesinventives.

Si l’on tient compte des interactions en tantqu’elles produisent des unanimités ou desconspirations, on s’apercevra que le drameest le miroir esthétique de la logique socialeen oeuvre. L’intérêt que nous prenonsdans le drame à la lutte des désirs ou desidées opposées consiste à “voir mettre enrelief, moins par des combats acharnés quepar des situations singulières,l’individualité réaliste de caractèresprofondément originaux” (TARDE, 1897,p. 420). Le drame accentue des variationset des différences. Il ne s’agit donc pas dedogmatiser la concurrence ou la guerre enles proclamant raison supérieure, commele fait la dialectique hégélienne. Il faut, aucontraire, se défaire des mythologies ducombat et de la concurrence. “Uneaffirmation suscite habituellement sarépétition, elle ne suscite que très rarement

sa négation, mais, un peu moins rarement,elle la rencontre, chose bien différente”(TARDE, 1897, p. 398). L’attrait du drame,comme le propre d’un événementhistorique, tient seulement à “l’irrégularitéexpressive” qui fait la singularité et lepittoresque d’une situation. L’opposition,dans le drame, n’est là que pour accentueresthétiquement une réalité associative.L’opposition, dans l’histoire, n’est là quepour stimuler une adaptation, c’est-à-direune invention militaire, industrielle ouscientifique. Enfin, l’adaptation ne sefonde pas sur le seul intérêt. Adaptationde luxe, pour “la beauté du monde”. Qu’ils’agisse de vie quotidienne ou d’histoire,ne pas réduire donc le socius à un rapportde forces et l’association à la soumission.Au contraire, tout porte à croire, dit Tar-de, qu’il y a eu “des dépenses inouïesd’amour et d’amour malheureux àl’origine de toutes les grandes civilisations”.En effet, ce ne sont pas des modèles decomportements qui se propagent dans lerayonnement imitatif, ce sont desconvictions. Ce sont les impulsions les plusintérieures et les plus spirituelles quisuscitent le plus d’imitation. Le croyantcommunique sa foi avant de communiquerson dogme ou encore l’imitation des idéesprécède celle de leur expression. Bref,l’imitation va du dedans au dehors.

Dans la mesure où ce ne sont pas des for-mes comportementales qui se propagentle mieux sur les rayons imitatifs, oncomprend que la proximité spatiale ait peud’importance – elle ne caractérise que lesfoules – par rapport à la simultanéité desconvictions. De ce côté-ci, on peut songeren effet à une expansion indéfinie des

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processus imitatifs, à condition d’accepterune alternance entre les momentsd’imitation et les moments d’invention.Ainsi, les interférences ne doivent pas êtreconsidérées comme des obstacles aurayonnement. Au contraire, l’imitativitécomplète “implique la faculté de résister àun exemple isolé, à une influenceparticulière” (TARDE, 1890b). C’est ce quifait la différence entre les effets deconviction et les états hypnotiques et c’estce qui explique que l’imitation, loind’étouffer l’individu, tende à l’exalter:l’individu est un être d’emprunt et decombinaison alors que l’homme des foulesest pris dans rapport d’identification. C’estd’ailleurs parce que les effets de convictioninterfèrent que l’amplification d’unprocessus ne conduit pas à sonhomogénéisation.

On se retrouve, alors, à l’opposé d’unethéorie de la manipulation. Lacaractéristique du fait social n’est pas d’êtreimposée du dehors par la contrainte. Nimême par l’obligation ou l’identification :“ce serait ne reconnaître en fait de lienssociaux que les rapports du maître au sujet,du professeur à l’élève, des parents auxenfants, sans avoir nul égard aux libresrelations des égaux entre eux” (TARDE,1893, p. xi). Dans un essai de sociologie-fiction, Fragment d’histoire future (TARDE,1980b), Tarde imagine un historiens’interrogeant sur le sens de ces fossiles dela vie sociale que sont le paysan et l’ouvrier.“Le rapport de l’ouvrier à son patron, dela classe ouvrière aux autres classes de lapopulation, et de ces classes entre elles,était-ce un rapport vraiment social ? Pasle moins du monde. Des sophistes qu’on

appelait économistes et qui étaient à nossociologues actuels ce que les alchimistesont été jadis aux chimistes ou lesastrologues aux astronomes, avaientaccrédité, il est vrai, cette erreur que lasociété consiste essentiellement dans unéchange de services ; à ce point de vue,tout à fait démodé du reste, le lien socialne serait jamais plus étroit qu’entre l’âneet l’ânier, le boeuf et le bouvier, le moutonet la bergère. La société, nous le savonsmaintenant, consiste dans un échange dereflets” (TARDE, 1980b, p. 77-78).

Toute mémoire sociale s’inscrit dans unespace d’échange de reflets. La sociologie,celle de l’anticipation féerique ou de lafiction théorique, sera l’étude des effets decommunication. Elle devra étudier“l’action de contact ou à distance – et à desdistances croissantes ou décroissantessuivant les temps” (TARDE, 1895b,p. 134), science de la circulation desopinions dans les publics ou les foules, et,fondamentalement, sciences des conversa-tions comparées. Après la catastropheglaciaire du XXVe siècle, c’est-à-dire après“l’apoplexie solaire”, l’échange de refletssera réduit à la portion congrue; il ne seraplus qu’échange de singeries, mais pourle moment et tant que certains s’évertuentencore à distribuer la rareté commeprincipe d’analyse, il faut défendre l’idéeque la société est plutôt “une mutuelledétermination d’engagements et deconsentements, de droits et de devoirs”(TARDE, 1979, p. 66).

Il n’y a aucun principe structurantimmanent à l’univers de la répétition, iln’y a que cette “idole métaphysique” (TAR-

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29DE, 1979, p. 66) que l’on appelle génied’un peuple ou d’une race, génie d’unelangue ou d’une religion. “Le géniesémitique, par exemple, était réputéabsolument réfractaire au polythéisme, ausystème analytique des langues modernes,au gouvernement parlementaire”(TARDE, 1898, p. 43-45). A partir de là,dit Tarde, on n’est pas loin de soutenir lathèse d’une distinction entre les racesinventives et les races serviles, mais de plus,on conteste la possibilité d’un prosélytismeconquérant, on nie le processus par lequelun “génie populaire franchit ses limites etse montre capable notammentd’européaniser la Chine et le Japon”. Onrefuse ainsi de voir que le génie d’unpeuple n’est que la synthèse anonyme deses originalités personnelles, “qu’il estfonction et non facteur des géniesindividuels, infiniment nombreux; il en estla photographie composite, il ne doit enêtre le masque”. On ne peut donc passolidifier ou substantifier les interactionsélémentaires, les faits de communicationque le sociologue se donne pour objets. Onne peut pas rendre compactes les fonctionsde répétition ou d’imitation en lesrabattant sur un territoire. Le privilègeexplicatif de la conscience collective,comme le privilège du local, dumorphologique, sont tributaires d’unemétaphysique de l’identité et de lasubstance. Ils ne peuvent donc convenir àune logique de la communication fondéesur la différence et l’interaction.Autrement dit, les faits sociaux ne sont pasdes choses mais des emprunts.

Deuxième principe structurantextralogique, l’échange inégal des

exemples ou, de manière plus imagée, leprincipe du château d’eau. Ce principeveut qu’au moment où il hésite entre deuxséries d’exemples – deux manières deparler, deux idées, deux croyances, deuxfaçons d’agir – un individu peut surmonterson embarras (c’est-à-dire passer d’uneopposition sociale infinitésimale à uneinvention-adaptation infinitésimale aussi),en s’appuyant sur une “présomption desupériorité”. Supériorité du patricien sur leplébéien, du citadin sur le rural, duparisien sur le provincial, selon “unecascade de l’imitation” qui va de haut enbas de l’échelle sociale (TARDE, 1898,p. 53).

Simplement il y a, à toute époque, unesupériorité reconnue, parfois à tort, et unéchange inégal des exemples qui a poureffet “d’acheminer le monde social vers unétat de nivellement comparable à cetteuniformité universelle de température quela loi du rayonnement calorifique des corpstend à établir”. Toute hiérarchie socialeobéit à un principe thermodynamique decirculation des flux du chaud vers le froidet elle a pour métaphore le château d’eauparce qu’elle assure une fonctiond’expansion du système et qu’elle luttecontre les forces de nivellement. Telle estla fonction des noblesses d’ancien régimeet des capitales d’aujourd’hui. “Ainsi lemoraliste d’aujourd’hui, pour prédirequelle sera la moralité de demain, doitavoir l’oeil sur les exemples donnés parles grandes villes, comme le moralisted’hier se préoccupait avec raison de ce quise passait au sein des cours, des salons oudes châteaux” (TARDE, 1890a, p. 324-328).

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Le principe de l’échange inégal desexemples est incapable de faire qu’unesociété prenne corps. A peine parvient-ilà assurer, de l’extérieur, l’expansion desrayonnements imitatifs. A vrai dire, il n’ya peut-être pas de principe immanentd’organisation du social chez Tarde. C’estque la société n’est ni un organisme, nimême une organisation.

Il faut d’abord cesser de comparer lessociétés à des organismes pour commencerà les comparer entre elles (TARDE, 1898,p. 51). On s’apercevra alors que ce sontdes cerveaux. Plus une société se civilise,plus elle s’apparente à un cerveau, c’est-à-dire à un organe capable de mémoire(imitation) et d’opinion (interférence etadaptation). D’autre part, à mesure qu’unesociété se civilise, elle se désorganise. Cesont les sociétés animales qui, en effet,méritent le mieux d’être appelées desorganismes sociaux. Dans une sociétéd’abeilles ou de fourmis, l’individu est unsimple organe ou cellule qui s’immole autout. Les cités antiques où règne l’esclavageleur sont comparables. Par contre, dans lesnations modernes, ce n’est qu’en temps deguerre que les sociétés ont un caractèreorganique marqué (TARDE, 1893, p. 127-133).

Mauvaise triade donc : celle de la solidaritéorganique, de l’opposition antagonique etde l’affirmation identitaire. Triade de ladialectique hégélienne ou des philosophiess’inspirant du darwinisme social, et enrègle générale, de toutes “les

interprétations ultra-militaires de la vieuniverselle” (TARDE, 1897, p. 423).

Reste que jusqu’ici les faits sociaux (et lessociétés) ne sont que des associations ou,ce qui revient au même, des mémoires. Ason tour, la mémoire sociale demande àêtre structurée suivant deux axes : lacroyance et le désir seront l’équivalent desformes a priori de la sensibilité chez Kant,l’espace comme domaine de la crédibilité,le temps comme champ du désir et de lavolonté, comme “optatif catégorique”.Enfin, on découvrira ainsi que le vrairythme de l’univers, comme celui de la“ritournelle initiale” qui monte etredescend une gamme de notes, n’est que“la tendance alternative du néant à l’infini(expansion) ou de l’infini au néant(concentration), plutôt que le passage... duoui au non ou du non au oui” (TARDE,1897, p. 172, 188, 293).

La véritable opposition sociale est un duellogique. Elle se laisse appréhender dansl’expérience de l’indécision pratique etdans celle du jugement hésitant. Qu’est-ce qui se passe dans l’esprit d’un soldathésitant entre l’obéissance etl’insoumission? Ou chez tous ceux quihésitent entre adapter ou répéter unenouvelle locution, un nouveau rite, unenouvelle école d’art? Ces hésitations quidonnent toute leur intensité au remordset au regret ou qui, plus généralement,marquent la résistance aux emprises d’unrayonnement imitatif et à l’orientation deson expansion ultérieure, sont les vraies

2 OPPOSITION: LA BIFURCATION ANTHROPOLIGIQUE

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31oppositions sociales élémentaires. Lesvraies oppositions ne sont pas descontradictions mais des rencontres. “Cettehésitation, cette petite bataille interne, quise reproduit à des millions d’exemplairesà chaque moment de la vie d’un peuple,est l’opposition infinitésimale et infinimentféconde de l’histoire; elle introduit ensociologie une révolution tranquille etprofonde” (TARDE, 1898, p. 68).

Si l’on ne prend en compte que lesreprésentations qui s’affrontent dans cesmoments d’hésitation, on risque de revenirau couple de l’affirmation et de la négationet négliger ainsi les “degrés de conviction”.Or, ce qui se propage encore une fois, cene sont ni des sensations ni desreprésentations qui n’ont pas d’intensitépar elles-mêmes, contrairement à ce queprétend la psychophysique ; ce sont desforces, quantifiables en principe.Autrement dit, les représentations netirent leur intensité que de leur crédibilitéet de leur désidérabilité et il peut se fairepar exemple que les convictions qui sepropagent soient à la fois fortes etaveugles. Servant de support à desreprésentations qualitativemen thétéro-gènes, il y a donc des croyances et desdésirs dont seule la quantité varie. Dansl’instant pratique, dans l’instant de ladécision, ces quantités sont jusqu’à uncertain point mesurables et la conclusionvictorieuse dans “ces combats singuliersdont nous sommes à la fois les champs debataille et souvent les victimes est celle quis’appuie sur les désirs et les croyances lesplus énergétiques” (TARDE, 1890a, p. 27-28).

Il faut donc admettre la dualité de lacroyance et du désir, leur indépendanceréciproque, leur nature “magnétique” etle fait que cette “bifurcation” interne est àla fois la source de toute innovation et uneforme de résistance proprementanthropologique. C’est elle, “et nullementquelque fiction politique telle que laprétendue séparation des pouvoirs, ou lessoi-disant garanties constitutionnelles, quiexplique pourquoi il y a des limites àl’oppression des esclaves par les maîtres,des peuples par les gouvernements, desminorités par les majorités, dans le casmême où le pouvoir des oppresseurs estsans borne et où leur désir, conforme à leurintérêt, est de l’exercer en entier”(TARDE, 1890a, p. 28). Par conséquent,les équilibres les plus stables dans les jeuxde domination sont ceux qui sont fondéssur la prédominance des forces les plussubjectives. Autrement dit, ce ne sont pasles servitudes qui sont volontaires mais lesassujettissements, les allégeances. Parexemple, l’une des formes les plus subtileset “civilisées” de la vie sociale, laconversation, doit beaucoup histori-quement aux visites rituelles que l’onrendait à son suzerain ou à son supérieurpour porter des présents. Il fallait alorséchanger des remerciements protecteurset des compliments. Derrière laconversation, institution obligatoire, il y adonc la prière, forme très subjectivepuisqu’elle n’est qu’une succession demonologues. Faiblesse de l’ondulation,désert de la conversation rituelle. Aucunebifurcation ici entre croyance et désirpuisqu’il n’y a même pas interférence. Aucontraire, les conversations attentives, lesconversations duels, celles dont la vitesse

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est un signe de civilisation, se nourrissentd’ondulations fortes, ou suffisammentvariables et irrégulières dans l’expressionpour s’apparenter au chant. Laconversation devient alors l’art desbifurcations et des harmonies et, pour fairel’histoire de cet art, il faut tenir compteaussi bien de la diplomatie italienne, de lacour française, de la sophistiqueathénienne, des débats romains. A chaquefois, on suppose des égaux, ou des pairs(pares aut facit aut invenit), comme l’amitié.Mais il ne s’agit pas du tout de s’interrogersur la vérité de cette supposition ou decette comparaison puisqu’il ne s’agit quede caractériser des flux. Par contre, onpeut déduire de cette présomption d’égalitéque les bonnes propagations ou les bonnesassimilations supposent ce moment où labifurcation de la croyance et du désir estvécue comme hésitation, intimidation. Cesont des moments de désubjectivation, desuspens subjectif qui rappellent que toutfait réel de communication sociale compor-te une part d’opacité intrinsèque (TARDE,1989, p. 86-111).

La sociologie, qu’elle se donne pour objetdes phénomènes interindividuels(interpsychologie) ou des phénomènesintra-individuels (intra-cérébraux), seranon pas l’analyse des systèmes de repré-sentations sociales comme le voulaitDurkheim, mais l’étude des courants decroyances (Logique sociale) dans leslangues, les mythes, les religions, lessciences et la philosophie, et l’étude descourants de désirs (Téléologie sociale) dansles lois, les moeurs, les institutions et lesindustries.

Cette opposition est sociale et nonpsychologique, elle ne concerne pas deuxperceptions ou deux jugements sensitifscontradictoires, mais deux rayons d’exemples.Les moments d’hésitation sont des noeuds,des points de suture du rayonnementimitatif. Ou bien ces noeuds cèdent sanslutte interne, ou bien ils se renforcent pourrepousser le rayon d’exemple et ils sontalors les points de départ d’une nouvellecontagion, d’un nouveau dogmatismedevenu plus intolérant et plus intense àmesure qu’il se répand. Rivalité delangues, rivalité de religions. Rivalités decourants de croyance.

Qu’y a-t-il de pire pour une société, sedemande Tarde : être divisée en partis eten sectes qui se combattent à coup dedogmes et de programmes, ou “êtrecomposée d’individus en paix les uns avecles autres, mais individuellement en luttechacun avec soi, en proie au scepticisme, àl’irrésolution, au découragement ?” (TAR-DE, 1989, p. 85-86). La paix de surfaceou les guerres de religion, “l’arène de laconcurrence industrielle ou de lacompétition politique” ou “le malaiseprofond des âmes anxieuses, indécises,découragées?” “Ce serait le dilemme offertaux derniers rêveurs – dont je suis – depaix perpétuelle.” Dilemme qui se résoutpar le mouvement propre durayonnement imitatif auquel les guerres,elles aussi, sont soumises. Même les crisesvont s’élargissant et aboutissent à des“conflits grandioses mais sans férocitéaucune, entre des colosses nationaux queleur grandeur même rend pacifiques”.³Tarde emprunte à la thermodynamiquele principe d’irréversibilité pour soutenir

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33une thèse de philosophie de l’Histoireselon laquelle les guerres et les crises sontorientées vers la paix. Comme pour lepassage de l’unilatéral au réciproque (dudécret au contrat; du dogme à la librepensée; de la cour à l’urbanité) ou del’expansion imitative à la mutualité, quicaractérisent l’évolution de la société, il ya, de manière aussi irréversible, unmouvement équivalent qui caractérise lesorganisations et les guerres et qui va du“petit au grand, du petit très nombreuxau grand très rare”. C’est même parce quetel est le sens historique de cetteirréversibilité – la “mondialisation” desconflits – que Tarde tient à la microso-ciologie, qui elle va du grand au petit, dans“le monde des idées, miroir inversé dupremier”.

Il y a pourtant un point où cettemondialisation s’arrête, avec le “retour del’esprit de nationalité” (étroitement lié aumilitarisme). Ce point est aussi celui où leflux de l’imitation a ses rivages, et où lebesoin de sociabilité diminue (TARDE,1979, p. 423-424). En ce point,s’équilibrent deux mouvements: celui oùla communication est en défaut et celui oùelle est en excès. Le penchant à imiterl’étranger, dit Tarde, “ne va pas croissantà mesure que les relations avec lui vont semultipliant [...] Quand on le connaît trop,pour pouvoir continuer à l’admirer ou àl’envier, on cesse de prendre modèle surlui.” Le point au-delà duquel lacommunication risque de faire elle-mêmeinterférence, de devenir bruit, est donccelui “où l’on est assez rapproché pouravoir toute l’illusion du décor et pas assezpour apercevoir les coulisses”. La

mondanité donc, comme moraleprovisoire, du juste milieu, dans uneévolution historique travaillée par les effetspervers de la mondialisation.

Au-delà de ce point, la béatitudeesthétique, la cérébralisation radicale dela vie sociale, la capacité de dépasser unemisanthropie générale et de ré-enchanterle monde en étant attentif à “ce principeessentiel si volatile, la singularité profondeet fugitive des personnes, leur manièred’être, de penser, de sentir, qui n’est qu’unefois et n’est qu’un instant” (TARDE, 1979,p. 424).

On retrouve ce même aboutissement, cemême lien esthétique de l’individualisationet de la socialisation dans la critique quefait Tarde des thèses durkheimiennes surla division du travail. Premièrement, il nefaut pas opposer solidarité organique etsolidarité mécanique; la division du travailn’est rien sans la communauté descroyances et des sentiments. “L’assimilationdes individus par contagion imitative etleur différenciation par coopérationlaborieuse – leur assimilation commeconsommateurs de livres et de journaux,de vêtements, d’aliments, de plaisirs mêmeet de satisfactions quelconques, et leurdifférenciation comme producteurs –, vontprogressant parallèlement et non pas l’uneaux dépens de l’autre”. Il arrive même quela solidarité organique précède la solidaritémécanique, dans le cas des échangesinternationaux. Tout lien social se fortifiedonc des similitudes et en produit toujoursde nouvelles. Deuxièmement, il faut, à titrede postulat théorique, accorder auxdifférences la primauté sur les similitudes.

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Elles en sont l’origine de fait et lefondement esthétique et scientifique. Lacuriosité scientifique et le monde de la vies’attachent à “l’étincelante fantaisie” plusqu’aux routines héréditaires. Contre “lesempiétements d’un socialisme malcompris”, il faut donc répéter qu’exister,c’est différer et que la différenciationsociale a une histoire bien plus ancienneque celle que Durkheim lui prête. Parexemple, dans l’Antiquité, la grandedivision du travail était religieuse et surtoutlinguistique: elle séparait les parleurs et lesauditeurs, le scribe et les lecteurs. En cesens, la première corporation sociale a étéle corps oratoire. Or, quel est le destin deces premières versions de la division dutravail? Elles s’atténuent progressivementpar un passage de l’unilatéral auréciproque. Dans le cas de la langue et deson usage, on peut parler d’un “passagede la division à l’uniformisation du travail”,selon un processus inverse de celui quedécrit Durkheim puisque tout le mondefinit par être tour à tour producteur etconsommateur de la parole. Troisiè-mement enfin, cette victoire de laréciprocité va de pair avec une multiplica-tion des modèles, “de sorte que plus ilss’imitent socialement, plus ils sedifférencient individuellement. Différen-ciation de luxe celle-là, bien différente dela différenciation utile qui produit etrequiert la division du travail. Mais celle-ci n’aura été que l’instrument inconscientet nécessaire de celle-là, qui est sa raisond’être. Toute évolution est suspendue àl’attrait de ce cachet unique qui spécialisetout être vivant non pour le travail, maispour le plaisir, non pour l’utilité, mais pourla beauté du monde. L’artiste a donc

raison, et le savant a tort [...] En consacrantde la sorte une portion de notre temps etde notre pensée toujours moindre auxoccupations qui nous spécialisentprofessionnellement et une proportiontoujours plus grande à celles qui noushumanisent, qui tout en nous assimilant,nous diversifient chacun dans notre sensindividuel, nous mettons la division dutravail à son véritable rang, nous affirmonssa subordination nécessaire à notresocialisation et à notre individualisationsimultanément croissantes. Qu’on mepardonne ces deux barbarismes”.(TARDE, 1998a, p. 191-192).

On voit le fossé qui sépare Tarde de sescontemporains darwiniens oudurkheimiens. Le monde qu’il décrit, nonseulement ne laisse à l’opposition que laportion congrue - c’est l’adaptation quidonne son sens à la crise et le contrat quisuccède logiquement à la domination –mais de plus, c’est un monde qui a unecourbure particulière, proprementféerique, puisqu’elle va de la diversitéempirique à la singularité esthétique. C’estcela l’originalité de Tarde: penser lemouvement qui va de la différence à lasingularité comme un mouvement à la foissocio-historique et microsociologique. Onpeut estimer que cette pensée est tributairede sa position qui lui permet de maintenirentière l’illusion du décor. Mais on peutsonger aussi aux tentatives actuelles pourfonder une “sociologie des circonstances”ou pour substituer à la notion d’intérêtcelle de face ou de visage, pourcomprendre que le discours de Tardeparvient à éviter les apories d’une sciencede l’individu tout en n’étant pas un simple“wishful thinking”.

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3 ADAPTATION: LA SIMULTANEITE DES CONVICTIONS

Il faut se garder de tout malentendu surla notion d’adaptation. C’est à la fois la plusimportante des trois catégories à la foisphysiques et sociales que distingue Tardeet c’est le troisième moment de sa logique.L’adaptation n’est rien d’autre que lemoment de l’invention, c’est-à-dire de lacoproduction. C’est toujours cette idéed’une simultanéité créatrice, créatrice de flux,de liens, de publics. L’espace social del’invention, marqué par la circulation descroyances et des désirs, ne saurait êtredésaffecté: il est magnétisé. Dans levocabulaire des ondes et des flux,l’adaptation est d’abord une conjonction;mais cette conjonction est particulière. Sil’imitativité était complète, dit Tarde, lesfigures sociales prépondérantes seraientles figures de la fascination et relèveraientde ce qu’il appelle une théorie del’irresponsabilité. Or les courants decroyance de la logique sociale qui se ma-nifeste dans les mythes, les religions, leslangues, les sciences et la philosophie, oules courants de désirs qui construisent latéléologie sociale des lois, des moeurs etdes institutions, sont des rencontres.Accouplements logiques ou interférencesheureuses, bonheurs d’expression oupetites révoltes individuelles contre lamorale courante, ces courants s’inscriventdans des flux particuliers qui ne sont pasimitatifs et uniformisants mais inventifs etsystématisants.

Dans l’univers physique, les adaptationssont des équilibres mobiles (le bassin d’unfleuve ou le mouvement des nuages). Ceséquilibres forment des agrégats ou des

compositions qui, à leur tour s’ajustent aumilieu. S’il faut remonter de l’adaptationdu vivant à la formation d’agrégats, c’estque ce procès de composition nousrapproche du creuset du chimiste. C’estlà, par ailleurs que les “cause-finaliers”(TARDE, 1898, p. 121) doivent chercherla sagesse du monde et non plus dansl’immense coupole des cieux et c’est ainsiqu’ils admettront qu’il n’y a pas une findans la nature, mais “une multitude infiniede fins qui cherchent à s’utiliser les unesles autres” (TARDE, 1898, p. 122). Dansl’univers du vivant, la forme première decette composition des fins, c’est “l’ovulefécondé, l’intersection vivante de lignéesqui se sont rencontrées là, en uncroisement parfois heureux”. Dans ledomaine social, les adaptationsélémentaires – réponses (en paroles ou enfait) à des questions (verbales ou tacites) –sont des phénomènes interactionnels ouintra-individuels. A la limite (micro), et àl’opposé d’une philosophie de l’histoire,les adaptations sociales élémentaires, ditTarde, sont à chercher “dans le cerveaumême” (TARDE, 1898, p. 129) dans legénie individuel de l’inventeur. Non pasqu’il faille prendre le contrepied de ceuxqui s’opposent à la théorie des causesindividuelles en histoire pour rappeller lerôle des grands hommes. Ce n’est pasd’eux qu’il s’agit, mais des grandes idées,“souvent apparues en de très petitshommes, et même de petites idées,d’infinitésimales innovations apportées parchacun de nous à l’oeuvre commune”(TARDE, 1898, p. 145-146). Inventionsordinaires donc, à chercher par exemple

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dans le parler ordinaire de telle ou telleprovince pour comprendre les mutationsd’une langue. Adaptations multiples etprécises, nullement arbitraires outotalisantes. Contre Durkheim qui voitdans l’imposition le ressort de la chosesociale, Tarde (1898, p. 150) veut remonterde “l’impériosité actuelle” à la “persuasivitéantérieure”. Ceci a plusieursconséquences: méthodologique d’abord,puisque le sociologue devra procéder par“monographies narratives” (à distinguerdes “monographies descriptives”), lesseules qui lui permettront de saisir letravail des adaptations. “Ce sont leschangements sociaux qu’il s’agit de suspendresur le vif et par le menu pour comprendreles états sociaux et l’inverse n’est pas vrai”(TARDE, 1898, p. 153, nota 1).Conséquences cliniques aussi, si l’on veutcomprendre la nature des inadaptations.C’est parce que les adaptations sontmultiples et précises, parce qu’à unequestion donnée, mille réponses sontpossibles, que “les inadaptations socialesse révèlent douloureuses, énigmatiques,justification de tant de plaintes” (TARDE,1898, p. 150). Aux multiples inventionsordinaires constitutives du changementsystématique, correspondent donc desinadaptations singulières, toujoursémergentes et circonstanciées. Consé-quences enfin sur le lien social et sadynamique. La conformité des croyancesse produit toujours “peu à peu et deproche en proche”, par contagion plus quepar coopération mutuelle. C’est unecoproduction plus qu’un réel rapport deréciprocité. A titre d’exemple: le lien so-cial “entre Européens de diversesnationalités”: il s’appuie sur des procéduresde toutes sortes, formalités de la politesse

ou formules démocratiques. Avec ce typede lien, ce n’est pas la division du travaildes économistes qui progresse, c’est lacoordination de différents cercles sociauxqui se propage. “Ce que veut la chosesociale avant tout, comme la chose vitale,c’est se propager et non s’organiser”(TARDE, 1979, p. 80).

Puisque le public est la forme la plus hautede la socialité, la plus complexe et la plusdifférenciée, on peut reconstituer lalogique de l’adaptation comme unephénoménologie clinique de l’esprit quis’articulerait autour de trois figures :l’idiot, le somnambule et le timide.Phénoménologie de l’adaptation que l’onpeut lire comme une série d’agencementsd’énonciations individuelles etd’énonciations collectives (la foule, larelation spéculaire, l’expérience dupublic).

Première figure, la plus pauvre: l’hommedes foules. Figure primaire de lacommunication des esprits puisqu’elle as-simile celle-ci à la contagion. L’homme desfoules est mutilé. Il ne dispose pas de cettebifurcation anthropologique qui luipermettrait de ne pas être le pur et simplejouet des rayonnements imitatifs. Il subitla loi de la répétition, sa manièred’intégrer l’infini dans le fini estprécisément infinitive. Foulesintolérantes, mono-idéiques; individusfonctionnant au courant continu, n’ayantguère de croyances et énormément deconvictions, se nourrissant de contactsphysiques, de répétition du semblable sanscomplication. L’idiotie de l’homme desfoules est au fondement de toutes les for-mes sociales proches de l’unisson. S’il faut

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37donc diagnostiquer l’ère des foules, onpeut rappeler le principe selon lequel leprocès de civilisation diffère d’unecontagion (intuition équivalente chez Parkqui se réfère aux “catastrophes”migratoires comme élément dediscontinuité du procès) et en conclure quela foule est un groupe social primaire. Lescourants d’opinion ne naissent pas dansles rassemblements de rue. Ils sont créés,au contraire, par des gens qui ne secoudoient pas, ne se voient ni nes’entendent. Notre âge n’est pas “l’ère desfoules”. Un rapport social implique dansson concept la répétition du différent ; c’estune assimilation compliquée qui renvoienon à un unisson mais à un accord. Certes,travaillé par les lois de l’opposition, l’espritdes foules engendre l’esprit de secte. Maisil s’agit là de son semblable, objectivementet théoriquement subordonné, une formesociale qui cumule des désirs semblableset des croyances semblables. Pareillementnulles dans le cas de la foule, pareillementsophistiquées dans celui de la secte. Onpeut donc faire l’aller retour du grand aupetit et du petit au grand avec la mêmecarte, les mêmes formes de mobilisationidentitaires (unilatérales et nonréciproques). Ce sont des formesd’identification, mais elles ne sont nisocialisantes ni individualisantes. Ellesn’inventent rien (TARDE, 1890a, p. 319).

Deuxième figure: le somnambule. L’espritdu somnambule est “un firmament éteintà une étoile près”, ou alors, selon une autremétaphore c’est l’état mental du citadin,engourdi et surexcité tout à la fois, c’estl’être social lui-même comme être defascination. Premier ancrage dans le flux

imitatif, mais la fixation ne s’obtient quepar procuration. Le somnambule estirresponsable par lui-même; seulel’emprise qu’il subit et qui est de typehypnotique peut faire qu’il soit plus qu’unautomate, “une personne qui a soncaractère, ses aversions, ses préférences”.On est là, dit Tarde, au point de jonctionexpérimental de la psychologie et de lasociologie. D’une psychologie simplifiée,mais non mécaniste, et d’une sociologieégalement élémentaire des associationsunilatérales. Etat social naissant tout demême. “N’avoir que des idées suggéréeset les croire spontanées: telle est l’illusionpropre au somnambule et aussi bien àl’homme social” (TARDE, 1979, p. 83).Forme d’adaptation si l’on veut quin’aboutit qu’au transitivisme. Formed’adaptation spéculaire par “échange dereflets”. Au contraire, “l’imitativitécomplète, la faculté de subir des influencesde tous genres et de toutes parts, impli-que la faculté de résister à un exempleisolé, à une influence particulière”.

Mais la figure la plus importante, celle quiconvient à l’analyse des publics, c’est letimide., celui qui est momentanémentdémagnétisé et qui fait l’expérience de ladépossession de soi: “paralysie momentanéede l’esprit, de la langue et des bras,perturbation profonde de tout l’être”.L’intimidé s’échappe à lui-même et tend àdevenir maniable et malléable par autrui.“Mais au contraire de l’homme des foules oudu somnambule, il nage à contre-courant. Ducoup, il s’immobilise gauchement, assez fortpour neutraliser l’impulsion externe, mais nonpour reconquérir son impulsion propre”

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(TARDE, 1979, p. 93). C’est de cet équilibreprécaire et gauche que peuvent surgir lesvéritables adaptations, celles qui tentent deconjuguer activement les interférences parcequ’elles se trouvent au point de rencontre dedeux rayons d’exemples. La timidité est “unétat social naissant, qui se produit toutes lesfois qu’on passe d’une société à une autre, ouqu’on entre dans la vie sociale extérieure ausortir de la famille”. La timidité, c’est donc lafigure même de la transition, qui convientparticulièrement à une socialisation conçuecomme désorganisation progressive. Notreâge, dans la mesure où il multiplie les occasionsde croisements et d’interférences des publics,serait ainsi l’âge des tyrannies del’intimidation.Mais, en même temps, l’expérience de latimidité est l’expérience publique parexcellence et, à ce titre, elle est la marque desadaptations les plus fécondes, c’est-à-dire desseules adaptations qui soient inventives. Lepublic lui-même, comme forme dispersée dela foule, est contemporain de l’invention dela presse qui rend possible la lecturequotidienne et simultanée d’un mêmeensemble d’informations, d’une même sériede rayonnements imitatifs. Cette simultanéitéde conviction qui caractérise une opinionpublique telle qu’elle est constituée par lapresse, explique que “la formation d’un publicsuppose une évolution mentale et sociale bienplus avancée que la formation d’une foule”(TARDE, 1989, p. 38-39). En effet, un publicsuppose l’action d’une suggestion à distancequi n’est possible que chez des individus quiont déjà l’habitude de la vie sociale intense, dela vie urbaine. Les citadins disposent, enquelque sorte, d’une pré-connaissance du

regard d’autrui et de son action. De plus, dansla formation des publics, la fonctiond’amplif ication ne recouvre pasnécessairement la fonction d’homo-généisation. Au contraire, le premierpublic, celui des lecteurs de la Bible aprèsl’invention de l’imprimerie, a eu lasensation de former un corps socialnouveau, détaché de l’Eglise. Ainsi, et parceque l’on peut appartenir à plusieurspublics alors qu’on ne peut appartenirqu’à une seule foule, le public est une for-me sociale qui conjugue socialisation etdifférenciation. Conformément auprincipe de la cascade, il relance lerayonnement imitatif en le démultiplianttoujours plus, comme une “force à la foisdissolvante et régénératrice” (TARDE,1989, p. 46).

Le programme que propose la sociologiede Tarde est explicite: monographiesnarrative ou conversations comparées sontlà pour rappeler que la socialisation esttoujours un drame, et que la forme dramatiqueest celle qui correspond le mieux à cetterésolution adaptative telle qu’elle est vécue dansl’intimidation. On comprend pourquoi il nepeut pas y avoir de bonne méthode desrécits de vie. Le récit est une forme pauvre,qui néglige ce “temps d’individualismemomentané, de dissolution sociale enattendant une réorganisation sociale”.L’évolution sociale se traduit donc par uneévolution parallèle en littérature: du récitau drame, ce qui est pris en compte, c’estle concours et le conflit de deux croyancesou de deux désirs. Le drame met en scènecette bifurcation essentielle dans la théorie

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39microsociologique et qui se manifeste dansun moment d’hésitation, dans l’expériencede la timidité en public. Ainsi se confirmefinalement la rigueur d’un regardsociologique qui, fasciné par la féerie du divers,tente de retrouver dans l’unité de situation et

dans l’unité de temps la forme structurante dela communication sociale commecoproduction (ou co-adaptation) simultanéede désirs et de croyances. Affranchis del’espace, délocalisés, les publics demeurentattachés au temps de l’irrésolution et del’invention, c’est-à-dire à l’actualité.

ABSTRACT

There are two big sociological mistakes, says Tarde: two big lures. Thepanoramic lure that makes us believe that the order of the facts is onlyaudible if one comes out of their essentially irregular detail” to rise veryloud as far as kissing a panoramic view of big wholes”; and the historiclure that consists in locking the social facts in formulas of developmentin. These are lures because there is, says Tarde, more of logic in a sentencethat in a speech, in a” special ritual that in a whole creed”. But to reallyunderstand the mistake of the “panoramic” sociologies and the sociologiesof the development it is necessary to accept that the social logic is not alogic of the addition. The special ritual of which speaks Tarde is not atotal social phenomenon because the logic that enlivens it is a logic of theadaptation that wants to say, in his/her/its language, a logic of theinvention and the coproduction of the sense. The logic of a socialfact, it is the mode according to which he/it is producer of ties. Hereis why the social facts don’t have anything natural. On the contrarythey are perfectly enigmatic, these are always adaptations inventive.A social report is never the report of a copy to his/her/its model, it isthe answer to a question and there is an association of ideas in thebottom of all association between the men.

If one doesn’t see in Tarde that the contemporary of The Good, onerisks to pass next to what makes his/her/its actuality therefore: Tar-de is not interested to the psychology of the crowds but proximity isfreed to the social as it, of an undulatory physics raises as it. Theformation of the opinions doesn’t have anything to see with thestrategies of the suggestion. A public is quite a social fact foreign tothe metaphors of the crowd. Everybody is seated”, each at home,reading the same newspaper and dispersed on a vast territory“.

NOTES1 Dans sa thèse publiée en allemand, Masse und

Publikum (1972), Robert Park compare la théoriede l’imitation à la théorie de la sympathie chez

Hume et Smith et s’inspire largement de Tardedans son analyse de la foule et du public commeformes de socialité émergente. Rappelons

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REFERENCES

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également que Tarde est, avec Simmel etDurkheim, un des auteurs de référencemajeurs du fameux manuel de sociologie deRobert Park et Ernest Burgess, Introduction tothe Science of Sociology, Chicago University Press(1921), qui sera la bible de la discipline pourdeux générations d’étudiants américains desannées 20-40.

2 “Tandis que notre intelligence avec ses habitudesd’économie se représente les effets comme

strictement proportionnés à leurs causes, lanature, qui est prodigue, met dans la causebien plus qu’il n’est requis pour produire l’effet.Tandis que notre devise à nous est Juste ce qu’ilfaut, celle de la nature est Plus qu’il ne faut, tropde ceci, trop de cela, trop de tout, la réalité,telle que la voit James, est redondante etsurabondante.” (“H. Bergson sur lepragmatisme de William James”, in La Penséeet le mouvant, Paris, P.U.F., p. 240).

3 Ibid., p. 88-89

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ESTRATÉGIAS COLETIVAS E LÓGICASDE CONSTRUÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES DEAGRICULTORES NO NORDESTE SEMI-ÁRIDO

ERIC SABOURIN*

Este trabalho procura sistematizar as dinâmicas de organizaçãodos agricultores familiares do Nordeste brasileiro, a partir de exem-plos em vários municípios do Sertão nordestino. A primeira partetrata da origem e das lógicas das diferentes formas de organizaçãodos produtores existindo hoje. Na segunda parte, são identificadasas transformações dessas organizações nas duas últimas décadas.São analisadas, em particular, três principais tendências de estra-tégia coletiva em matéria de coordenação e organização dos agri-cultores familiares da região. O texto conclui com observações so-bre a institucionalização do processo de organização dos produto-res e sobre a necessidade de reconhecer os fundamentossocioeconômicos da reciprocidade, junto com os paradigmas maisclássicos do interesse individual e do holismo.

Palavras-chave: agricultura familiar, ação coletiva, reciprocidadecamponesa, organização de produtores, associações, Nordeste.

* Engenheiro agrônomo e doutor em Antropologia, pesquisador do CIRAD Tera (Centro de CooperaçãoInternacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvimento); professor visitante na UniversidadeFederal da Paraíba, Campina Grande-PB (Programa de Pós-graduação em Sociologia). Consultor doPrograma Nacional de Pesquisa sobre Agricultura Familiar da Embrapa e da AS-PTA Nordeste (Assesso-ria, Serviços a Projetos de Agricultura Alternativa).

INTRODUÇÃO

No Sertão nordestino, a criação de asso-ciações de agricultores familiares é recen-te. Teve início nos anos 80, com a inter-venção do Estado, nas trilhas das comuni-dades de base da Igreja Católica, por inter-médio dos programas especiais de lutacontra a seca (Pólo-Nordeste, Projeto Ser-tanejo, Programa de Apoio ao PequenoProdutor Rural – o PAPP, ou Projeto SãoJosé). Tratava-se de promover a “partici-pação” da população rural por meio da

criação de organizações que deviam facili-tar o acesso dos “pequenos produtores” àinovação, ao crédito e aos investimentoscomunitários. Novas estruturas de organi-zação voluntária foram-se agregando àsformas preexistentes de organização ruralnordestina. Essa superposição coloca aquestão das lógicas de coordenação da açãocoletiva e dos instrumentos teóricos dispo-níveis para abordá-la.

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Crozier e Friedberg (1977, p. 13-30) lem-bram que a ação coletiva ou “ação organi-zada” não é um fenômeno natural, mas“uma construção social cuja existência co-loca diversos problemas, a começar pelaexplicação das suas condições de emergên-cia e de permanência”.1 Em outros termos,a ação coletiva trata de elaborações sociaiscomo as regras, as normas ou as conven-ções. Segundo os mesmos autores, a orga-nização constitui um instrumento da açãocoletiva que pode ser definida em relaçãoa um conjunto de ações; mas cabe distin-guir os principais motores dessa ação co-letiva.

Na visão inspirada do individualismometodológico de Olson (1978, p. 22) oude Reynaud (1993), a ação coletiva (defesados interesses comuns de um grupo, promoçãode um objetivo coletivo) apenas é realizadapor obrigação imperativa ou quando as-sociada a benefícios (ou interesses) indivi-duais dos membros do grupo. Para os eco-nomistas, como Livet e Thevenot (1994,p. 139), a noção de ação coletiva é amplia-da à “atuação de várias pessoas [...] quan-do a conjunção dos seus atos permite cons-tatar uma certa ordem, uma certa coorde-nação”, o que qualifica pouco a naturezadas dinâmicas consideradas que vão doutilitarismo radical até as abordagensconvencionalistas.

Caillé (1998, p. 76) sintetiza a controvér-sia entre as diversas teorias pretendendoexplicar as lógicas que regem o compor-tamento dos indivíduos e dos grupos. Se-gundo Caille, elas se repartem no seio detrês paradigmas, dois deles amplamentereconhecidos, mas redutores, e um tercei-ro de entendimento mais complexo.

O individualismo (metodológico) pre-tende que todas as ações, regras ou ins-tituições provêm dos cálculos mais oumenos conscientes e racionais efetuadospelos indivíduos. O holismo [...] colo-ca, ao contrário, que a ação dos indiví-duos (ou dos grupos, das classes, dasordens) não passa da expressão de umatotalidade preexistente e determinante[...] que coloca uma série de obrigações,constrangimentos ou dívidas.

O terceiro paradigma, o da reciprocidadeou da dádiva, é, segundo Caillé (1998,p. 76),

incompreensível para os dois preceden-tes [...]. O primeiro dissolve a dádivano interesse – individual ou coletivo –e o segundo na obrigação[...]. Oparadigma da dádiva não nega a exis-tência desses dois momentos, da indi-vidualidade ou da totalidade, mas nãoaceita considerá-los como os únicos da-dos de base.

Caille prossegue: “O paradigma da reci-procidade faz da dádiva (e do seu símbolopolítico), o operador privilegiado, especí-fico da criação dos laços sociais.”

Para caracterizar os diversas modos deconstrução das organizações de produto-res na realidade nordestina, recorrer-se-á, portanto, à identificação das formas decombinação ou de oposição entre as lógi-cas associadas a esses três paradigmas: in-teresse individual, obrigações sociais e re-ciprocidade. As análises são ilustradas pordiversos casos de organização de agricul-tores nos municípios de Pintadas eMassaroca (BA), Petrolina, (PE) e Tauá(CE). Com a exceção dos pequenos colo-nos dos perímetros irrigados públicos deJuazeiro (BA) e Petrolina (PE), trata-se de

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43pequenos criadores e agricultores familia-res do Sertão, reunidos em comunidades.Parcialmente ou totalmente integrados aomercado, vivem principalmente da pecu-ária mista (caprinos e ovinos ou pequenasunidades de bovinos leiteiros) e dapolicultura de sequeiro (consórcios milho-feijão-mandioca e cultivos forrageiros).Durante os períodos de seca prolongada,a renda familiar é complementada pelapluriatividade (migração temporária,assalariamento diarista, empregos nas pre-feituras locais, mineração, pequeno comér-cio de produtos caseiros etc.) ou por trans-

ferências públicas (frentes de emergência,créditos subsidiados, aposentadoria) e pri-vadas (remessas de familiares assalariadosou migrantes). A primeira parte do textotrata da diversidade das formas de orga-nização desses pequenos produtores doSertão. Optou-se por tratar o tema a par-tir de um ponto de vista comparativo maisgeral, considerando as várias formas deorganização possíveis, em vez de exami-nar alguns poucos casos em maior profun-didade. A segunda parte analisa as princi-pais estratégias coletivas de coordenaçãono seio dessas organizações e entre elas.

1 A DIVERSIDADE DA ORGANIZAÇÃO DOS PRODUTOS

No Sertão nordestino, mudança técnica emudança social são estreitamente associa-das ao processo de organização dos atoreslocais e, no caso que nos interessa, dos agri-cultores familiares. Se a criação das coo-perativas e associações de produtores noNordeste é recente, esse é também o casodas comunidades (AMMAN, 1985, p. 27).De fato, as mudanças sociais não depen-dem unicamente das organizações formais,mas também da estruturação de relaçõesinterpessoais que asseguram um papel deinterface entre a sociedade local e a socie-dade global (BERTHOMÉ;MERCOIRET,1997, p. 11). Existe, portanto, uma rela-ção entre as formas da ação coletiva e asinstituições ou relações onde essas açõessão definidas e implementadas. No Sertãodo Nordeste, a família, o sítio, a comuni-dade rural, as redes de proximidade jáexistiam antes da criação das organizaçõesformais e continuam sendo, em grandeparte, regidos pela reciprocidade campo-nesa.

Entende-se por reciprocidade a dinâmicade dádiva e de redistribuição criadora desociabilidade (lien social), identificada porMauss (1950/1977, p. 145-279) como pres-tação total e verificada em todas as socieda-des humanas desde que Levi-Strauss(1960/1977, p. xlvi-lii), mostrou que as es-truturas elementares do parentesco sãoordenadas pelo princípio de reciprocida-de. Segundo Caille (1998, p. 76), oparadigma da reciprocidade ou da dádi-va aplica-se “a toda ação ou prestação efe-tuada sem expectativa imediata ou semcerteza de retorno, com vista a criar, man-ter ou reproduzir a sociabilidade (lien soci-al) e comportando, portanto, uma dimen-são de gratuidade” (tradução nossa).

Temple (1999, p. 3) distingue, assim, o in-tercâmbio ou a troca da reciprocidade: “Aoperação de intercâmbio corresponde auma permutação de objetos, enquanto aestrutura de reciprocidade constitui umarelação reversível entre sujeitos.”

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O sindicato, a cooperativa ou a associaçãode produtores, formalizados num quadrojurídico reconhecido pela sociedade nacio-nal e regulados por estatutos padroniza-

dos, pertencem à categoria das organiza-ções profissionais de agricultores, geral-mente regida pelas lógicas do interesse in-dividual ou coletivo.

1.1 ESTRUTURAS INFORMAIS E PERMANÊNCIA

DA RECIPROCIDADE CAMPONESA

Na zona rural do Sertão, as comunidades,as redes de proximidade, as relações fami-liares e interfamiliares, as prestações deajuda mútua constituem formas de relacio-namento e de organização reguladas pelareciprocidade camponesa (SABOURIN,2000). O funcionamento das organizaçõesinformais vem do reconhecimento pelogrupo local de regras transmitidas de umageração a outra e garantidas pela autori-dade dos chefes de família. Desenvolvem-se, a partir delas, os exemplos da organi-zação em sítios ou comunidades, das pres-tações de ajuda mútua, o “mutirão”, e dasredes de proximidade.

· As comunidades: O exemplo do distrito deMassaroca - Juazeiro (BA)

Os sítios ou comunidades reúnem, geral-mente, produtores e moradores ocupan-do as terras de uma antiga fazenda dividi-da por heranças sucessivas ou por transa-ções. Muitas vezes, a comunidade mante-ve o nome da fazenda de origem. Os mem-bros do sítio ou da comunidade são entãodescendentes de um antepassado comum,fundador ou ex-proprietário da fazenda.Na comunidade de Lagoinha, em 1991, so-bre 110 habitantes, apenas sete pessoas nãoeram descendentes do fundador da Fazen-da Lagoinha (TONNEAU, 1994, p. 164).

O uso do termo comunidade é recente,tendo sido introduzido pela ação pasto-ral da Igreja Católica durante os anos1960-70, através das Comunidades Eclesiás-ticas de Base. A comunidade reúne ainda“as famílias que rezam juntas” e não ape-nas as da religião católica. A comunidadede Caldeirão do Tibério, por exemplo, sótem famílias evangélicas. Permaneceu otermo comunidade, mais “moderno” quesítio, na medida em que foi reutilizado pe-los programas de “ação comunitária”implementados pelo Estado durante osanos 70-80 (AMMAN, 1985).

A comunidade, tradicionalmente dirigidapor um conselho informal de chefes defamília, gerencia o acesso à terra (pasta-gens comunitárias, práticas de meia), aredistribuição ou o intercâmbio de traba-lho (o mutirão, a troca de dias) e a solida-riedade interfamiliar. Esta manifesta-sepor meio da doação de alimentos ou aju-da sem retorno automático, nos casos demá colheita, acidente ou doença numa dasfamílias. Essas práticas foram limitadas pe-las secas repetidas dos últimos anos e sereproduzem nos momentos de relativaabundância. É quando são pagas as pro-messas feitas ao santo padroeiro da comu-nidade ou a um dos santos populares noNordeste (São Gonçalo, São Cristóvão),

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45pelas danças ou “rodas” para as quais sãoconvidados vizinhos, amigos e parentes dafamília que organiza a festa (LANNA,1995, p. 187-190). A lógica do sistema dereciprocidade não considera a produçãoexclusiva de valores de uso ou de bens co-letivos, mas a criação do ser, da sociabili-dade. Se para “ser socialmente” precisa dar;para dar, precisa produzir. Assim, a reci-procidade é marcada e respeitada de ma-neira privilegiada entre aqueles que par-ticipam das mesmas estruturas de produ-ção ou de parentesco.

· O mutirão

O termo mutirão2 pode designar dois ti-pos de ajuda mútua: uma tem a ver comos bens comuns e coletivos (construção oumanutenção de estradas, escolas, barra-gens, cisternas); a outra com os convitesde trabalho em benefício de uma família,geralmente, para trabalhos pesados(desmatar uma parcela, fazer uma cerca,construir uma casa etc.). O mutirão é tam-bém chamado batalhão em Massaroca, bo-léia ou balaio3 em outras zonas da Bahia.Em Pintadas (BA), utiliza-se o termo boiroubado. Antes, o produtor beneficiado cos-tumava matar um boi. Hoje, ele fornece,sobretudo, cachaça ou cerveja. Esta práti-ca é associada à festa para motivar umaajuda recíproca. A participação de todasas famílias da comunidade é desejada: oshomens jovens e adultos para os trabalhosmais duros, as crianças e as jovens para alimpeza das fontes de água e caldeirões,as mulheres para a raspa da mandioca na“farinhada”.

A regulação das diversas formas de mutirãoé característica da lógica de reciprocida-de. Trata-se de solidariedade na produ-ção e de redistribuição da força de traba-lho no seio da comunidade. Esta não éobrigatoriamente igualitária, já que o re-torno não é imediato e não tem nem umacontagem nem uma necessária simetria dasprestações. Até pode existir certa concor-rência na redistribuição de alimentos oubebidas entre as famílias, já que a prodi-galidade confere prestígio e fama que sãofontes de autoridade ou de poder nos sis-temas regidos pela reciprocidade(TEMPLE ; CHABAL, 1995, p. 17-30).Temple (1983, p. 27-28), a partir de ob-servações entre comunidades camponesasda América do Sul, já propunha conside-rar a reciprocidade não como uma “con-tra-dádiva” igualitária (a dualidade da tro-ca, segundo Polanyi, 1957), mas como “aobrigação para cada um de reproduzir adádiva, como forma de organização daredistribuição econômica”.

· As redes sociotécnicas de proximidade

Os estudos conduzidos em Pintadas eMassaroca confirmam tanto a existência deprodução e de intercâmbio de conheci-mentos entre produtores quanto a impor-tância da observação mútua e do diálogotécnico em matéria de inovação agrícola eorganizacional (SABOURIN et al., 1999,p. 148-150). As relações interpessoais con-tribuem, entre outras coisas, para a comu-nicação de idéias, informações, práticas etécnicas. Essas relações privilegiadas dediálogo técnico ou de ajuda mútua entreprodutores desenham estruturas chama-das de redes sociotécnicas (CALLON,1989).

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As redes de diálogo técnico passam, geral-mente, por agricultores “experimen-tadores”, considerados como competentespelos seus vizinhos (DARRE, 1996, p. 85-90). Em Massaroca, os produtores marcamuma diferença entre competência em ma-téria de criação e de agricultura (plantação,roça). As referências tradicionalmente “vei-culadas” pelos vaqueiros e diaristas sãohoje transportadas pelos que mais viajam:dirigentes associativos, comerciantes, agri-cultores pluriativos e agentes externos (téc-nicos, padres e vereadores). As idéias, asinformações e os fatos e objetos técnicoscirculam com relativa facilidade por essescanais. Inovações como a palma forrageira(Opuntia sp.) e a algaroba (Prosopis juliflora),introduzidas na região por grandes cria-dores, tiveram em Massaroca-BA uma di-fusão rápida, via relações interpessoaisentre agricultores, conformando uma redesupracomunitária.

· Organização dos produtores e reciprocida-de camponesa

Diversos autores brasileiros evidenciarama permanência ou a modernização das es-truturas de reciprocidade em comunida-des de agricultores e de pescadores do Sule do Nordeste (WOORTMAN, 1995;LANNA, 1995; NOGUEIRA, 1999, NO-GUEIRA ; MENDES, 2000). No Sertãonordestino, observa-se a permanência derelações de reciprocidade através dos me-canismos de dádiva, de ajuda mútua e deconvites. A dádiva interfamiliar é simétri-ca. Manifesta-se pelo dote das filhas e pe-las dotações para a instalação dos jovens,essencialmente constituídas por animaisacompanhados da sua descendência(crias), reservados e atribuídos a cada

criança desde o nascimento. A dádiva étambém associada às relações afetivas pri-vilegiadas como o compadrio. O apadri-nhamento recíproco das crianças entreduas famílias sem laço de parentesco é umaforma de aliança extremamente forte, quepermite multiplicar as redes interpessoaisalém da esfera local, das classes sociais edas categorias profissionais (LANNA,1995, p. 197). A dádiva generalizada (ofe-recida a todos) é verificada nos convitespara as festas locais e religiosas (pagamentode promessas, celebração dos santos pa-droeiros), para as festas familiares (batis-mo, matrimônio, funerais) ou domésticas(matança de um animal).

A lógica da reciprocidade motiva uma par-te importante da produção, da sua trans-missão, mas também, do manejo dos re-cursos e dos fatores de produção. O aces-so gratuito à água dos açudes, às terras devazante, às pastagens comuns do “fundode pasto”, à mão-de-obra da comunidadeou do grupo local (por meio do convite detrabalho ou do mutirão), constitui umaredistribuição dos fatores de produção. Aconstituição dos dotes (animais, terras oudinheiro), a realização das festas familia-res e religiosas, a hospitalidade (estendidaaos rebanhos dos vizinhos em caso de seca)representam tantas formas de dádiva quelevam ao crescimento da produção, namedida das possibilidades das famílias edas condições do clima. Esses custos, bemsuperiores ao nível médio de consumo deuma família, explicam também, em parte,as dinâmicas de extensão patrimonial, deprocura de novas terras para cultivar, deadoção dos cultivos comerciais ou tambémas estratégias de pluriatividade e de mi-grações. Além das formas de

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47complementaridade (ajuda mútua) ou deinteresse coletivo (solidariedade, festa co-letiva) que motivam a permanência des-sas práticas de origem camponesa, eviden-cia-se a força da dádiva4 e da redistribuiçãocomo motor da economia. Essa produçãosocialmente motivada constitui um fatorde desenvolvimento econômico que vaialém da satisfação das necessidades ele-mentares da população (subsistência) ouda aquisição de bens materiais via troca. Amotivação social da produção pode ser tãopotente como o interesse pelo lucro e aacumulação por meio do intercâmbio“mercantil” (TEMPLE ; CHABAL, 1995,p. 41-50). Pode-se, assim, distinguir redesde reciprocidade e redes de intercâmbio(algumas podendo ser mistas ou comple-

mentares), correspondendo a lógicas es-pecíficas de motivação da produção e dainovação. Por exemplo: no caso domutirão, os dias não são contados. Na tro-ca de dias, eles são contados e devolvidospara a outra família, às vezes, para efetu-ar o mesmo tipo de trabalho. Alguns agri-cultores pagam um diarista, em vez de as-sumir diretamente a prestação.

A integração ao mercado e à sociedadeglobal (administração, escola, igrejas, ser-viços técnicos) levou a sociedade rural nor-destina, dos sítios e das comunidades, adotar-se de novas estruturas de represen-tação e de cooperação, sem, portanto,abandonar (pelo menos completamente)os valores e formas de organização cam-ponesa fundadas pela reciprocidade.

1.2 AS ORGANIZAÇÕES PROFISSIONAIS DOS AGRICULTORES

As organizações formais dos produtorescorrespondem a novas estruturassocioprofissionais de caráter econômico(produtivo ou classista). Ninguém torna-se membro da associação por essência oupor nascimento, como no caso do sítioou da comunidade, mas por escolha livree voluntária e através de uma relaçãocontratual de intercâmbio (pagamento dacota). Sua regulação é, portanto, domina-da pela lógica utilitarista do interesse (in-dividual ou coletivo) ou pela lógica da obri-gação social ou política (constrangimento,dívida). Por exemplo, nos perímetros irri-gados, a adesão dos colonos à cooperativaé, muitas vezes, obrigatória. No Sertão,encontram-se as três formas clássicas deorganização profissional agrícola: o sindi-

cato, a cooperativa e a associação de pro-dutores.

· O sindicato de agricultores familiares

Os primeiros Sindicatos dos Trabalhado-res Rurais (STR) do Nordeste apareceramnos 50 e no início dos anos 60 na zona daMata. Na região semi-árida, a maioria foicriada durante o regime militar e emanci-pada nos anos 80. Para desviar os sindica-tos de sua função de reivindicação, sem terde proibi-los, o Estado transferiu para elesa gestão da assistência médica no meiorural. A nova Constituição (1988) não mu-dou esta prática, confiando de novo aosSTRs a administração local da aposenta-doria rural. Onde os conflitos fundiários e

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trabalhistas dos anos 70-80 provocaramlutas coletivas, os STRs adquiriram umacapacidade de mobilização e a legitimida-de da representação dos produtores fami-liares. Conseguiram, assim, promover pro-jetos, planos ou conselhos de desenvolvi-mento rural, ou participar da administra-ção municipal, como em Pintadas (BA) eTauá (CE).

· As cooperativas agrícolas

As primeiras cooperativas de produtorescriadas no Sertão reuniram grandes oumédios proprietários. Foi o caso dos pro-dutores de algodão no Ceará e na Paraíba,dos produtores de leite do Agreste daBahia, Pernambuco ou Sergipe. Os agri-cultores familiares conservam amargaslembranças das cooperativas. Elas são, ge-ralmente, associadas a interesses políticosou clientelistas, a sistemas de gestão pro-pícios ao desvio de fundos, cujo controlesempre escapou aos pequenos produtores.A cooperativa leiteira de Tauá (CE), porexemplo, quase sempre fechada por faltade leite, foi financiada em 1987 pelo mi-nistro da Irrigação que era oriundo destemunicípio. Os agricultores costumam di-zer que “cada cooperativa tem dono”.

Nas regiões estudadas, todas as coopera-tivas encontradas são associadas a uma tu-tela externa. Nos perímetros irrigados dePetrolina e Juazeiro, as cooperativas foramcriadas diretamente pelo Estado. Nos pro-jetos de reforma agrária, como Lagoa doAngico, em Petrolina, ou no Assentamen-to 2 de Maio, em Madalena (CE), prevale-ceu o modelo cooperativo do Movimentodos Trabalhadores Sem-Terra. O gerenteé geralmente um quadro do MST envia-do do Sul do Brasil. As ONGs conformam

o terceiro tipo de tutela. No distrito deMarruás, em Tauá (CE), a Cooperativa dosPequenos Produtores dos Inhamuns(Coopepi) foi financiada e administradadurante anos por uma ONG suíça.

Em tais condições, quando os camponesessão afastados da administração, a coope-rativa torna-se uma nova autoridadegestionária dos bens comuns (água, perí-metro irrigado), um novo intermediáriopara o acesso ao mercado (leite, frutas, al-godão). Ela pode até ser percebida comoum novo patrão.

· As associações de produtores

Dada a sua flexibilidade, a associação deprodutores constitui o modelo de organi-zação local que foi mais desenvolvido nosúltimos 20 anos. Trata-se, também, para oEstado ou para a prefeitura municipal, deum meio de redistribuição clientelista viapolíticos locais. As associações foram cria-das essencialmente para captar recursos e/ou para assegurar a defesa de interessescomuns ou a gestão de bens coletivos.A maioria das associações nasceu da con-junção de três fatores: a) a necessidadepara as comunidades de dotar-se de re-presentações jurídicas; b) a intervenção deatores externos: Igreja, ONGs, extensão,projetos públicos; c) a existência de aju-das e financiamentos reservados a proje-tos associativos ou comunitários, geral-mente com finalidade produtiva.

A associação é uma sociedade civil sem fimde lucro, baseada na adesão voluntária.Reúne, muitas vezes, o conjunto dos mem-bros de uma comunidade (ou só os chefesde família), mas em torno de um objetivo

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49específico, de um projeto econômico: aces-so ao financiamento de equipamentos co-letivos (escola, água, eletricidade, posto desaúde), comercialização ou processamentodos produtos, apropriação fundiária. Asassociações devem redigir e publicar seusestatutos no Diário Oficial, eleger e reno-var uma diretoria e um conselho fiscal. Narealidade, as regras são readaptadas pelacomunidade ou pelos líderes. As eleiçõessão arranjadas anteriormente. As decisõesimportantes são tomadas antes das reu-niões formais e públicas no quadro das re-lações de proximidade e de poder entreos grupos familiares e as comunidades lo-cais.

· Complementaridade e contradição entrelógicas

Observa-se uma grande diversidade dasformas de cooperação e de organizaçãodevida à permanência de práticas campo-nesas e à adaptação permanente de novasformas de coordenação da ação coletiva.A criação de organizações de produtorespode corresponder à modernização dareciprocidade camponesa ou, ao contrá-rio, privilegiar o desenvolvimento do in-tercâmbio mercantil, via constituição decooperativas, por exemplo.O primeiro caso é verificado com as asso-ciações comunitárias de Massaroca-BA,criadas para garantir o manejo dos “fun-dos de pasto”, num contexto de especula-ção fundiária; o segundo, com as coope-rativas dos perímetros irrigados dePetrolina e Juazeiro.

Em todo caso, as novas organizações sãodestinadas a manejar a interface entre omundo doméstico local (a família, a comu-

nidade) e a sociedade externa: o merca-do, a administração, a cidade. Às vezes, amudança de sistema de organização levaa uma confusão de valores e à adoção delógicas e estratégias de natureza diferen-te, ou até oposta. Foi o caso com a instala-ção de camponeses criadores nos períme-tros irrigados do Vale do São Francisco.Confrontados com a lógica da integraçãoao mercado pela produção intensiva defrutas ou verduras, eles devem realizaruma mutação, não só do seu sistema pro-dutivo, mas do seu sistema de valores e dereferências, ou abandonar a irrigação(SABOURIN et al., 1998, p. 13). No pri-meiro perímetro irrigado da região, Be-bedouro (Petrolina-PE), houve um confli-to entre a lógica da concorrência no mer-cado e aquela do desenvolvimento da re-ciprocidade. Uma parte dos produtoresinstalados pelo Estado continuaprivilegiando uma lógica camponesa. Sa-tisfeitos com um sistema de criação e umnegócio familiar de gado, sustentado porforragens irrigadas, procuram prestígiolocal via prêmios nas vaquejadas. Esta si-tuação manteve-se provocando a maiorpreocupação dos poderes públicos que de-sejavam impor a produção de mangas euvas, considerada mais lucrativa, de ma-neira a assegurar o funcionamento da co-operativa que comercializa frutas, mas nãogado ou troféus.

Portanto, às vezes, longe de trazer só solu-ções, as novas formas de organizaçãocriam, também, novos problemas, na me-dida em que ignoram ou desrespeitam asregras da reciprocidade ou funcionam se-gundo os princípios contraditórios daconcorrência e do intercâmbio.

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2 TRANSFORMAÇÃO DAS FORMAS DE ORGANIZAÇÃO

E TENDÊNCIAS DE EVOLUÇÃO

2.1 A FORMALIZAÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES

Paralelamente ao desenvolvimento daagricultura familiar, podem ser evidencia-das transformações permanentes das ins-tituições de produtores, associadas às for-mas de recomposição das referidas lógi-cas. As principais tendências de evoluçãoobservadas são marcadas por estratégiasespecíficas em termos de coordenação co-letiva. Correspondem a processos deformalização das organizações, de diversi-ficação das atividades, de representaçãopública e de conquista de autonomia porparte das comunidades rurais. Como afir-mam Crozier e Friedberg (1977, p. 79):

a organização é um processo de cria-ção coletiva por meio do qual os mem-bros de uma coletividade aprendemjuntos, ou seja, inventam e fixam jun-tos novas maneiras de jogar os jogossociais da cooperação e do conflito e[...] adquirem as capacidades de conhe-cimento, de relacionamento e de orga-nização correspondentes (traduzido dofrancês pelo autor).

Os “motores” dessas evoluções são exami-nados de maneira a identificar as princi-pais estratégias que caracterizam as for-mas de coordenação entre produtores eentre suas organizações.

A formalização das organizações de pro-dutores, além da dinâmica associativa des-crita anteriormente, tem a ver com doisprincipais fatores. Primeiro, as comunida-des rurais passam por uma necessidadecrescente de interfaces jurídicas com a so-ciedade nacional (acesso aos financiamen-tos e ao apoio institucional, escola etc.). Poroutra parte, em um contexto novo e, mui-tas vezes, conflituoso de acesso aos recur-sos produtivos (terra, água etc.), tais arti-culações tornam-se necessárias, inclusivepara legitimar práticas camponesas de re-ciprocidade ou normas sociais ancestraiscomo o mutirão, o uso comunitário de pas-tagens (o fundo de pasto) ou o manejo co-letivo da água (açudes, cisternas, poçosetc.). As associações comunitárias de

Massaroca, por exemplo, foram criadaspara administrar os “fundos de pasto”, nocontexto da especulação fundiária e dainvasão de terras (grilhagem).

As funções de reivindicação ou de negocia-ção das instituições camponesas não desa-parecem durante essas evoluções, maspodem ser desvirtuadas ou alteradas. Ahabilidade dos responsáveis do Comitê deMassaroca, por exemplo, é saber jogarentre “moderno e tradicional”, isto é, “as-sociação formal/comunidade camponesa”para captar apoios diversificados. Da co-munidade e das relações de proximidade,das alianças individuais, dos apadrin-hamentos políticos e das redes familiaresnasce o acesso às redistribuições políticas

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estaduais e federais, por exemplo, duran-te as grandes secas. Por outro lado, a asso-ciação de produtores facilita o acesso a cré-ditos subsidiados via relações com as insti-tuições técnicas de apoio ao desenvolvi-mento (SABOURIN et al., 1996,p. 104).

O segundo tipo de interface tem a ver como acesso a mercados diversificados e comas novas exigências em termos de quali-dade dos produtos. Nos perímetros irri-gados de Petrolina e Juazeiro, a má admi-nistração das cooperativas levou à desva-lorização da produção de uva e de melão.Houve, portanto, uma rejeição do mode-lo cooperativo pelos “colonos”. Observou-se a recomposição de estruturas de ajudamútua para a comercialização ou oprocessamento das frutas por pequenosgrupos de proximidade. Isto constitui, emface do fracasso da lógica “mercantil” dacooperativa, uma reorganização a partirda lógica de confiança e dos valores domundo “doméstico”. Mas, para perenizaressas experiências, ter acesso aos financia-mentos bancários e aos mercados nacio-nais (Ceasa), os colonos são obrigados acriar de novo associações ou cooperativas.Porém, diferentemente do modelo ante-rior, essas não são mais impostas ou

gerenciadas por tutelas (SABOURIN et al.,1998, p. 13). De fato, independentemen-te da influência externa ou do uso de mo-delos fixados pela legislação (associação ci-vil, cooperativa etc.), precisa-se de novasregras, na medida em que troca-se de“mundo” ou de princípio de justificação(BOLTANSKI; THÉVENOT, 1991). Omutirão é uma instituição camponesa domundo doméstico marcada pela divisãoentre sexos, a gerontocracia e a reciproci-dade ampliada. As suas regras não têmnada a ver com o sistema de contabilidadedas prestações de trabalho do motorista docaminhão ou de serviços do trator, dita-das pela necessidade de amortização doequipamento e pela legislação trabalhista,isto é, por regulações industriais e mer-cantis. Ocorre, assim, uma criação e vali-dação de novos estatutos fixados pelainstitucionalização progressiva das formasde ação coletiva. É essencial reconhecer asdiferenças entre associação e comunidade,entre cooperativa e mutirão, entre presi-dente eleito e líder comunitário, entre se-cretário do conselho de vigilância e patriar-ca do sítio. A mudança de estruturas e demodos de regulação pode levar a uma con-fusão dos valores de reciprocidade cam-ponesa e à adoção não-controlada de ló-gicas e estratégias de natureza diferente(mercantis, industriais etc.).

2.2 DIVERSIFICAÇÃO DAS ATIVIDADES E ESPECIALIZAÇÃO DAS

FUNÇÕES

A profissão de agricultor ou de criador setransforma, o contexto socioeconômico eas instituições também. Assim, as institui-ções camponesas, estabelecidas essencial-

mente em torno da redistribuição do aces-so aos fatores de produção (terras, traba-lho e técnicas), não mais permitem respon-der ao conjunto das exigências da ativida-

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2.3 A AUTONOMIA E OS PROCESSOS DE REPRESENTAÇÃO DOS

PRODUTORES

de agropecuária e aos processos de inter-venção dos poderes públicos. As organi-zações devem, portanto, assumir novasfunções: defesa dos interesses profissionaise gestão da aposentadoria pelos sindica-tos, abastecimento em insumos ecomercialização de produtos pelas coope-rativas, acesso aos financiamentos e admi-nistração de equipamentos coletivos, nocaso das associações.

As nove associações e o Comitê deMassaroca sustentam, desde 1990, um pro-jeto de desenvolvimento local que, depoisde priorizar o apoio à pecuária e àimplementação de recursos hídricos, inves-tiu nos setores da educação, da saúde debase e interessa-se, hoje, pela transforma-ção da produção. A diretoria do Comitêque dirigia o conjunto do projeto local tevede aceitar progressivamente a criação denovas estruturas para administrar áreasespecíficas. Certos grupos de interessetemáticos transformaram-se em comissõespermanentes para a educação, a gestão dosequipamentos coletivos, o crédito e o pro-jeto de irrigação. Em Lagoinha, a implan-tação do ciclo complementar e de ativida-des de educação permanente levou, final-mente, à criação do Centro de Formação

Rural de Massaroca (SABOURIN et al.,1996, p. 144). A diversificação das ativi-dades é assim associada à multiplicação dasinstituições e, portanto, dos centros depoder. A responsável por uma escola pri-mária isolada não tem muito peso em facedo Presidente do Comitê, porém o mes-mo não ocorre com o diretor do Centrode Formação Rural.

Da mesma maneira, durante o períodomilitar, o Sindicato dos TrabalhadoresRurais constituía, geralmente, a única for-ma de representação dos produtores.A partir dos anos 1980, a tendência foicriar associações específicas para o apoioà produção agropecuária. Paralelamenteà diversificação das necessidades, obser-va-se um processo de especialização dasfunções das organizações de produtores.É também o caso das cooperativas de co-lonos do Vale do São Francisco, centradasem funções de abastecimento e decomercialização e dos Distritos de Irriga-ção, criados para assumir o manejo daágua e a administração dos perímetros ir-rigados públicos. Um segundo patamar,associado à diversificação, seria aquele da“divisão” ou do desdobramento das orga-nizações, gerando novas estruturas maisespecializadas e novos “estatutos”.

Uma das novas funções do processo deorganização dos produtores familiares tema ver com seu posicionamento político einstitucional em matéria de desenvolvi-

mento local e regional. O fenômeno de-termina a polarização das suas relaçõescom o exterior. Encontra-se associado ànecessidade de uma representação

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53socioprofissional dos agricultores familia-res e das comunidades, já que não existeescala administrativa abaixo do município.Uma das estratégias passa pela dinâmicade união das associações comunitárias paramobilizar mais forças políticas. É traduzidapela reunião de grupos de base em fede-rações: Comitê na escala do distrito emMassaroca, Conselho ou Central a nívelmunicipal em Tauá e Pintadas.

O Comitê de Massaroca jamais aceitouaumentar o números de associaçõesfederadas, para não ter de partilhar re-cursos duramente conquistados. Durantevários anos, não se preocupou em nego-ciar alianças ou cooperações com outrasorganizações de produtores na escala domunicípio de Juazeiro (SABOURIN et al.,1996, p. 109). Entretanto, examinando oprocesso desde os anos 1970, verifica-seuma evolução clara: a gestão comum do“fundo de pasto” dá lugar à criação da as-sociação comunitária (1983-1985); noveassociações locais federam-se e criam oComitê (1989); este integra a Unidade dePlanejamento Agropecuário do Municípiode Juazeiro, organizada em 1990. A par-tir de 1997, o Comitê negocia projetos deprocessamento dos produtos locais com asfederações dos municípios vizinhos deJaguarari e Uauá.

Estas organizações federativas posicionam-se em matéria de política de desenvolvi-

mento. Num município grande e polari-zado por uma cidade de porte médio comoJuazeiro, as associações somente conse-guem tratar do desenvolvimento do dis-trito ou da pequena região. Em Pintadase Tauá, as lideranças das organizações deprodutores nasceram diretamente, na es-cala municipal, com o sindicato. Após vá-rias derrotas eleitorais na conquista daPrefeitura, conseguiram finalmente a ges-tão do poder municipal, graças a aliançasnegociadas na base de projetos de desen-volvimento da agricultura e da pecuária.Essas evoluções mostram uma real con-quista de autonomia por meio das organi-zações de produtores.

O conjunto das características observadaspermite formular a configuração de ummodelo de organização associando umaestrutura federativa do tipo “planejadora”e estruturas de gestão descentralizadas. Éo papel do Comitê de Massaroca e dos seusdirigentes manter uma visão ampla e po-lítica da situação, captar informações, ar-ranjar recursos e referências novas eintermediar alianças. Às comissõessetoriais, às associações locais, aos gruposde interesse e de produção competem asfunções de manejo das ações coletivas, degestão dos bens comuns e a articulaçãocom as ações individuais. Em Pintadas, oCentro Comunitário de Serviços coorde-na na escala municipal de 20 a 30 gruposde base.

CONCLUSÕES

O quadro de análise da construção da açãocoletiva permite articular mudanças so-ciais, mudanças técnicas e evolução do con-

texto econômico e institucional. As trans-formações organizativas observadas noSertão nordestino são características de vá-

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rias dinâmicas de mudança. Traduzem di-versas formas de manejo da transição deuma economia camponesa regulada pelareciprocidade para sistemas mistos, inte-grados ao mercado regional e marcadospelas regras da sociedade nacional. Alémda oposição clássica entre “comunidade”e “sociedade” ou de esquemas redutoresdo tipo subsistência x integração ao mer-cado ou pré-capitalista/capitalista, encon-tra-se uma diversidade de situações deconvivência e de negociação entre valorese “mundos” diferentes, segundo a imagemdas “cidades” (doméstica, mercantil, industrial,cívica e inspirada) proposta por Boltanski eThévenot (1991).

Existe uma permanência, e até uma mo-dernização, das relações de reciprocidade,de maneira a garantir formas de coesãosocial ou de proximidade praticáveis emum contexto novo de modo a aproveitarnovas oportunidades. Tal aprendizagemnão se realiza sem tensões e conflitos quelimitam a coordenação. Os mesmos po-dem, também, encontrar soluções me-diante a construção de novas regras:implementação de novas formas de orga-nização, definição de ações locais outerritoriais. Este tipo de dispositivo permi-te uma abertura para projetos maiores,para uma escala de organização mais am-pla (federação), assim como para aliançasespecíficas, técnicas e políticas (via redescomerciais ou sociotécnicas). Neste senti-do, existe uma atualização da dinâmica dereciprocidade camponesa.

Os casos e estratégias apresentados per-mitem orientar a intervenção das institui-ções de pesquisa e de desenvolvimento.

Primeiro, desmintam o discurso dominan-te das instituições de assistência quanto àausência, à fraqueza ou à incapacidade deorganização dos agricultores do Nordes-te, habitual contraponto da seca para ex-plicar o fracasso das políticas públicas.

As formas de organização têm evoluídorapidamente, procurando aproveitar,quando aparecem, as novas possibilidadesde apoio externo, ou tentando trazer so-luções a problemas vividos coletivamente.A emergência rápida de uma nova formade organização – a associação – e os suces-sos reais que encontrou não devem escon-der, também, desvios possíveis, quandoexiste abuso da barganha por parte dosagricultores como dos poderes públicos.

Observa-se, portanto, a convivência simul-tânea e a recombinação permanente devárias lógicas organizativas num contextosocial em mutação. Assim, a realização e acombinação diversificada das três lógicasde construção da ação coletiva, inicialmen-te identificadas, dão lugar a várias formasde estruturação dos produtores,correspondendo a diversas funções e a di-ferentes níveis de organização. Pode-seatribuir a cada uma dessas formas umacapacidade de coordenação e de regulaçãofundada nos comportamentos dos atorese nas externalidades que produzem. As-sim, integração ao mercado e à sociedadeglobal (administração, escola, igrejas, ser-viços técnicos) tem levado as comunida-des rurais a dotar-se de novas estruturasde representação, de cooperação e de in-tercâmbio monetário, sem abandonar,portanto, as formas de organização e, so-bretudo, os valores e as práticas da reci-procidade camponesa.

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NOTAS1 Traduzido do original em francês pelo autor.2 A palavra vem do tupi mutirum ou do Guarani,

potyrom, que quer dizer colocar a mão na massa(BEAUREPAIRE, 1956).

3 O balaio é uma unidade de medida de produtosagrícolas numa cesta ou num lençol.

4 CAILLE (1998, p. 77) escreve: a dádiva, de certamaneira, não é desinteressada. Simplesmente,privilegia os interesses de amizade (aliança,afetividade, solidariedade) e deprazer e/ou decriatividade sobre o interesses instrumentais e so-bre a obrigação ou compulsão. A obstinação dasreligiões ou de numeroso filósofos em pocuraruma dádiva plenamente desinteressada é, por-tanto, sem objeto.

Os exemplos citados confirmam uma na-tureza diferente e até contraditória entrea lógica econômica da reciprocidade eaquelas do livre-câmbio. Cada uma podeser verificada na realidade; portanto, asduas podem se prevalecer de vantagensrespetivas e, sobretudo, de precedentes,alguns sendo, provavelmente irreversíveis.

ABSTRACTThis paper aims to systematise smallholder’s organisation dynamicsin the semiarid region of Brazilian Northeast. The first part analysesthe origin and the logic’s of different forms of producer’sorganisation, based on examples in diverse situations of theNortheast Sertão. In the second part, are identified and characterisedthe main transformation of these organisations in the last twentyyears. Three main collective strategies trends are analysed in termsof family farmers co-ordination and organisation. In conclusion,the text evidences the institutionalisation of the organisation processamong the smallholders of the semiarid region. It also calls torecognise the socio-economic importance of reciprocity beside thetwo more classical paradigms of individualism (individual interest)and holism.

Keywords: family agriculture, collective action, smallholder’sorganisation, peasant reciprocity, associations, Northeast.

Não se trata de negar esta realidade e dereivindicar a exclusividade de umadialética ou de outra em termos de desen-volvimento local ou regional; mas sim, dechamar para uma dupla referência, entrea reciprocidade e os paradigmas do inter-câmbio (individualismo ou holismo).

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CARTÓRIOS: ONDE A TRADIÇÃOTEM REGISTRO PÚBLICO1

ANA PAULA MENDES DE MIRANDA*

Buscou-se analisar o funcionamento de cartórios a partir do tra-balho de campo realizado em Niterói e no Rio de Janeiro. Comohipótese, considerou-se que frente a uma aparente desorganizaçãose sobrepunha um tipo de lógica, à qual só teriam acesso os funci-onários, que desenvolveram uma tradição própria da escrita, or-ganização e preservação de documentos públicos, consolidando-secomo uma espécie de poder paralelo. Conclui-se que esse processotransforma a prestação do serviço numa dádiva, onde dar, recebere retribuir são as regras que asseguram a qualidade do serviçoprestado.

Palavras-chave: cartórios, documentos públicos, informação, dá-diva

Este artigo é o resultado das reflexões de-senvolvidas durante a pesquisa de Inicia-ção Científica acerca das práticascartoriais, sob orientação do professorRoberto Kant de Lima e financiada peloCNPq durante o período de 1991-1993.O material etnográfico que serve de basepara a análise foi coletado no 11o Cartó-rio de Registro de Imóveis do Rio de Ja-neiro, 10o Ofício de Niterói, 4o Ofício da3a Vara Cível, e na 1a Vara de Família doFórum de Niterói.2

O objetivo desta pesquisa era explicitar alógica que rege os procedimentos de pro-dução, guarda e circulação de documen-tos, e compreender a relação que man-têm com o acesso à informação na socie-dade brasileira. Partiu-se da hipótese deque o cartório é uma instituição onde esseprocesso se dá segundo a influência de

uma tradição3 ibérica/mediterrânea (BRAUDEL,1988; PERISTIANY, 1988), cuja caracte-rística, destacada por Roberto Kant deLima (1991), é a existência de dois códigosopostos mas complementares, onde umsistema público de organização burocráti-ca convive com um sistema privado basea-do nas relações pessoais de amizade e pa-rentesco, e o sistema de produção de ver-dades possui características inquisitoriais einterpretativas.

Sendo o cartório uma instituição voltadaao atendimento público, deveria garantirque o direito de acesso às informações ar-mazenadas fosse pleno. No entanto, pudeconstatar que este acesso é limitado e mo-dificado por critérios implícitos às práticasde funcionamento da instituição, que alte-ram o caráter impessoal das regras públi-cas, introduzindo elementos personalistas

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e particularizantes ao funcionamento doserviço.

O trabalho de campo baseou-se em entre-vistas e conversas informais com titularesde cartórios, advogados (principais usuá-rios de cartórios), funcionários da ativa eaposentados. As dificuldades encontradasdurante a pesquisa foram várias. As entre-vistas traziam uma limitação: era precisoromper a desconfiança inicial para entãopossibilitar a aproximação entreentrevistador e entrevistado, pois haviasempre uma tentativa de “fuga” aos assun-tos mais polêmicos, e uma preocupaçãocom a não-divulgação do que era dito, quediminuía um pouco quando lhes garantiao anonimato. As conversas informais, sem-pre sem a utilização do gravador, erammais proveitosas, as pessoas ficavam maistranqüilas, pois o que diziam não estavasendo registrado, assim falavam mais aber-tamente sobre suas rotinas. Realizei tam-bém a observação da organização do es-paço e da rotina do serviço, registradas emum caderno de campo. Paralelamente efe-tuei pesquisa bibliográfica sobre o temadeste trabalho.

Ao tentar analisar as práticas dos funcio-nários dos cartórios, defrontei-me com umproblema básico: a não-existência de umapercepção dos funcionários acerca das re-presentações sobre suas práticas. Só então

percebi que o meu trabalho seria desven-dar quais eram os elementos que permiti-riam ter acesso a essa lógica. O recurso uti-lizado, seguindo a metodologia emprega-da por Malinowski (1976), visava a coletardados concretos, isto é, experiências vivi-das durante o trabalho em cartório, para,posteriormente, analisá-los. Após o relatodos casos, os funcionários faziam comen-tários que deixavam transparecer os ele-mentos que compunham esse código. Des-se modo, foi possível inferir a existênciade um mecanismo comum que regia essaspráticas.

É importante ressaltar que para realizar otrabalho de campo foi necessário que eufosse apresentada a cada entrevistado sem-pre por uma terceira pessoa, um interme-diário4 que já os conhecia, e que, às vezes,também já tinha sido entrevistado, crian-do, assim, uma rede de relações. Isto foinecessário, pois somente deste modo os en-trevistados sentiram que poderiam confiarem mim. Após a apresentação, sempre in-dagavam se eu era jornalista ou estudantede Direito. Quando explicava que estuda-va Ciências Sociais, que estava fazendouma pesquisa para a faculdade e queriaentender como funcionava o cartório, per-cebia um certo alívio das pessoas ao ve-rem que não iria denunciar nada. Só en-tão elas falavam abertamente sobre suaspráticas e sobre a estrutura do cartório.

A LEGALIZAÇÃO DOS DIREITOS – O DOCUMENTO CARTORIAL E

O ESTABELECIMENTO DA ORDEM

Historicamente, os cartórios surgiram paradar autenticidade aos contratos entre aspartes, nos quais se firmavam compromis-

sos, que lhes garantiriam, formalmente, osseus respectivos direitos.

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61Nos livros de Direito, o surgimento do car-tório está relacionado ao aparecimento daescrita enquanto instrumento fundamen-tal ao registro dos atos sociais, em oposi-ção aos acordos firmados oralmente. A es-crita se consolidou juridicamente, pois foicapaz de tornar explícito o que nem sem-pre era claro na comunicação oral, demodo que a existência do registro escritoera entendida como a garantia de umaúnica interpretação do pacto estabelecido.

O processo da escrita foi fundamental parao estabelecimento de um Estado burocrá-tico,5 que se caracteriza por uma adminis-tração especializada, onde as relações im-pessoais devem prevalecer.

Esta burocracia se opõe à “administraçãopatrimonial” (FREUND, 1975) – que sedefine pela fusão entre as esferas privadase públicas, onde a honra6 das pessoas éconsiderada um critério importante naescolha dos funcionários, e a administra-ção é baseada nas relações pessoalizadas.

Segundo Stuart Schwartz (1979), a buro-cracia, tanto em Portugal quanto naEspanha, era caracterizada, no perío-do colonial, pela presença de dois sis-temas: o burocrático e o patrimonialista, oque também ocorreu na América Latinadevido ao processo colonizador.

A presença de uma “burocracia letrada”(RAMA, 1985) serviu ainda como fatorconsolidativo na construção do Estado nosprocessos de dominação colonial, pois aju-dou a suplantar a diversidade das línguasnativas através da adoção de uma línguapública oficial, que era utilizada em ceri-

mônias e no registro escrito de documen-tos.

A utilização da escrita por parte do Esta-do trouxe uma série de implicações paraa vida social, representando um instru-mento de controle das relações espaciais etemporais. Lawrence Rosen (1980-1981)ressalta que os cartórios são capazes detransformar acontecimentos em “fatos” àmedida que os registram, pois ao registrardeterminadas coisas, tal como a proprie-dade, o cartório passa a ter o poder de ins-taurar e controlar a ordem social.

O uso da escrita também serviu para for-malizar a relação da sociedade com a lei,dando-lhe uma autonomia própria, talcomo aos seus órgãos. Assim, a ordem ju-rídica organizou-se, especializou-se e sedistanciou da sociedade.

As normas jurídicas já não residem namemória de qualquer indivíduo […]mas podem ser literalmente enterradasem documentos a ser exumados ape-nas por especialistas na palavra escrita(GOODY, 1987, p. 165).

O surgimento dos “especialistas na pala-vra escrita” diz respeito, no campo jurídi-co, ao aparecimento daqueles que elabo-ram os códigos, dos que os interpretam,dos que os aplicam e dos que utilizam os“escritos jurídicos” para a regulamentaçãodas ações e transações da sociedade. É ocaso dos tabeliães e escrivães.

Ao analisar a organização do cartório,pude perceber que há o desenvolvimentode meios próprios de proceder, osurgimento de especialistas com uma

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tradição própria da escrita, e, principal-mente, um poder paralelo, que é o mono-pólio da gestão do patrimônio. Um exem-plo muito significativo, que representa aexacerbação do poder que o registro es-crito possui em nossa sociedade, foi publi-cado no Jornal do Brasil (11/4/92), numareportagem que contava o caso de um ar-tista que se tornara dono do Sistema Solarao registrá-lo em seu nome no 1o Cartóriode Notas de São José dos Campos. Apesarde achar engraçado, o tabelião substitutodisse que não poderia deixar de registrá-lo, mesmo não acreditando que o docu-mento fosse reconhecido pelas autorida-des, pois sua função era apenas a de regis-trar o documento, e não garantir a veraci-dade de seu conteúdo. Mesmo sendo con-siderado absurdo, o registro foi realizadode acordo com os trâmites legais.

Para Angel Rama (1985), a palavra escritaé sempre acatada, mesmo que na realida-de não seja cumprida, o que expressa quea palavra escrita não emana da vida so-cial, mas lhe é imposta buscando seuenquadramento em um molde que nemsempre se adequava à realidade, é a ten-tativa de organizar a sociedade a partir dosdocumentos escritos (códigos,7 contratosetc.).

O mundo do direito não equivale, pois,ao mundo dos fatos sociais. Para entrarno mundo do direito, os “fatos” têm queser submetidos a um tratamento lógi-co-formal, característico e próprio dacultura jurídica e daqueles que a de-têm (KANT DE LIMA, 1991, p. 24).

Ao realizar as suas atribuições, o cartóriose utiliza dos mecanismos do “mundo dodireito”, mas não se restringe apenas a

reproduzi-los. A observação do funciona-mento do cartório é fundamental para oentendimento do sistema de resolução deconflitos da sociedade brasileira, pois, mes-mo sendo considerado órgão auxiliar doPoder Judiciário, desempenha um gran-de papel no controle social através de seusmétodos próprios, que produzem umadeterminada ordem social em público, aodirimir conflitos que teoricamente cabe-riam ao Poder Judiciário resolver.

A construção de uma classificação para oscartórios foi necessária para uma melhorcompreensão de seu funcionamento, e,inclusive, de suas contradições. Para isso,utilizei como referência sua relação com oEstado e com “particulares”. Deste modo,tratarei dos cartórios de registros públicosque pertencem ao Estado e têm como fun-ção “fiscalizar” os atos dos cartórios não-oficializados ou cartórios “particulares”(que são uma concessão de serviço públi-co), e também dos cartórios que acumu-lam funções.8 Devo ressaltar que essatipologia foi “construída” ao longo do tra-balho de campo, segundo as informaçõesdadas pelos entrevistados, e a comparaçãoentre o que era dito, o que se dizia que erafeito, e o que efetivamente era feito noscartórios.

O Cartório de registros públicos9 é umainstituição criada pelo Estado para servirde arquivo dos negócios realizados entreparticulares, ou entre particulares e o Es-tado. O registro é a forma de perpetuar umacordo e oficializar a sua existência atra-vés de um documento. Deste modo, regis-trar em cartório significa dar publicidade aosatos praticados. Esta publicidade é a garan-

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63tia fundamental para assegurar a valida-de de um documento contra terceiros, poisno caso da existência de dois contratos temvalidade aquele que tiver sido registradoprimeiro, não sendo considerada a anti-güidade do documento.

Para esclarecer, vejamos um exemplo dadopor um entrevistado: uma pessoa “A” pro-mete a venda de um imóvel a outra “B”,posteriormente, “A” faz uma promessa decompra e venda com a terceira pessoa “C”.“A” e “B”, e “A” e “C” lavram estas pro-messas em tabeliães diferentes, asseguran-do a posse da coisa, mas apenas “C” foiimediatamente registrá-lo no Cartório deRegistro de Imóveis, o que assegurou o do-mínio da propriedade. Quando “B” foi re-gistrar o imóvel, constatou que “C” era seunovo proprietário, e que ele havia sido le-sado por “A”.

Neste caso, “B” poderia mover uma açãocontra “A” para ressarcir-se do dano, masnão recuperaria o domínio da coisa, já valeo que foi registrado. Poderia também ga-rantir que foi o outorgante (aquele queprometeu um direito) quem lesou uma daspartes. Nesse sistema, o tabelião não terianenhuma responsabilidade, pois sua fun-ção é apenas legalizar o acordo, e não ve-rificar a autenticidade de informações.A ação fiscalizadora do Cartório de Regis-tros Públicos ocorre quando não é umamesma pessoa que ocupa as funções detabelião e titular do cartório. Muito embo-ra isto ocorra com alguma freqüência,principalmente em cidades do interior,10

esta é uma das grandes causas de fraudes.

O cartório “particular” ou não-oficializa-do é uma concessão de um serviço públi-

co, isto é, uma forma de gestão indiretados serviços públicos, visto que o Estadocontinua a ser o titular do serviço, mas oentrega a um particular que arca com “osriscos econômicos” da instituição. No car-tório “particular”, o recolhimento é feitona conta do titular, que administra o di-nheiro para manter o cartório. Ao contrá-rio, nos cartórios oficializados, o recolhi-mento das custas é feito diretamente aoEstado, e seus funcionários são funcioná-rios públicos.

Para a concessão, é necessário um acordoprévio entre o Governo e o concessioná-rio, para estabelecer as condições do fun-cionamento da instituição. Estes regula-mentos visam garantir que os serviços se-jam prestados conforme as condições im-postas pelo Governo, que pode consentirque o concessionário os altere, e tambémpode fazê-lo, unilateralmente, se o dese-jar. O Governo possui também o poder desancionar ou corrigir atos do concessioná-rio, e até de anular a concessão, se este nãoagir conforme o estabelecido no contrato.

Tradicionalmente, segundo o direito ad-ministrativo, a concessão de serviços pú-blicos é usada como uma forma típica deexploração de serviços nos estados liberais,contrários à interferência direta do Esta-do na organização da sociedade e da eco-nomia. No Brasil, entretanto, este tipo denegociação está atrelado à necessidade doEstado em criar ou manter esta interferên-cia, quando já existem relações mais “cor-diais” entre o Estado e a “sociedade”, oumelhor, entre os governantes e uma fra-ção da sociedade, a quem sempre osgovernantes devem favores.

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De acordo com a tradição, narrada pelosentrevistados, como forma de agradeci-mento, presenteava-se com uma conces-são de cartório. Deste modo, assegurava-se lealdade e gratificavam-se os bons ser-viços. Isso sempre constituiu um eficazmodo de controle político, pois quem con-cede direitos de exploração como se esti-vesse dando um presente quer defenderseus próprios interesses.

Um entrevistado ressaltou que, no princí-pio, a concessão era uma espécie de títulohereditário, que com a morte do titularpassava para seus herdeiros. Com o tem-po, esse processo foi sendo criticado porum discurso moralizador do serviço pú-blico, o que fez com que a hereditarieda-de fosse substituída pela ascensão profissio-nal. Porém isso não alterou totalmente atradição, pois os titulares começaram aempregar seus parentes como escreven-tes, e estes, pela progressão funcional, che-gavam ao posto de titular, assim sendo, ahereditariedade no cartório estava assegu-rada.

O cartório particular encerra uma contra-dição entre a concepção do que represen-ta a concessão de serviços num discursoliberal e a sua efetiva prática, comodemostra-nos o exemplo dado por umentrevistado:

O titular do cartório particular é umaescolha do governador. Então vão trêsnomes: o mais antigo, o mais graduadoe o que tem mais pontuação. Quandoo governador […] fez a reclassificação,eu tinha mais pontos do que o tabeliãoe o substituto. Mas daquela lista o go-vernador escolheu simplesmente umoutro qualquer, sem ser o mais antigo,

sem ser o melhor colocado. Ele não res-peitou. E isso é feito de uma maneiraem que sempre favorece determinadascoisas. Eles sacramentam a ilegalidade.

Na realidade, o “modelo liberal” não é ri-gorosamente seguido, pois não se respei-ta o primado da impessoalidade. Ao con-trário, o discurso liberal sofre um proces-so de transformação e é usado para camu-flar os favores pessoais, sempre utilizandosubterfúgios para parecer dentro do dis-curso legal e universal. O exemplo relata-do acima exemplifica o quanto a socieda-de brasileira é marcada por redes de rela-ções pessoais, que são instrumentos utili-zados muitas vezes para se chegar ao po-der.

A tentativa de conciliação de interessesopostos pode também ser demonstradapela existência de cartórios que possuemmais de uma função, como é o caso do car-tório do 10o Ofício de Niterói, que acumulaas funções de tabelionato e escrivania. Énecessário, portanto, fazer uma diferencia-ção entre as funções do tabelião e do es-crivão.11 Segundo os entrevistados, tabe-lião é aquele que lavra escritura, procura-ção, testamento; escrivão é aquele que es-creve processo. Devo ressaltar as categori-as utilizadas por um entrevistado ao esta-belecer a diferenciação entre as funções:

Existe uma diferença entre os cartóriosjudiciais e não-judiciais. Os judiciais li-dam com processos, e os não-judiciaiscuidam de atividades que não precisamdo judiciário, por exemplo, as escritu-ras, procurações, testamentos.

No direito brasileiro, a instituição dotabelionato é, ainda hoje, com apenas

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65algumas modificações, como era no perí-odo colonial, no que se refere à definiçãodo ofício e suas atribuições.12

O tabelião é um titular do ofício de justi-ça, que dá fé pública13 aos atos que lhe com-petem, segundo a lei. Ele declara o queaconteceu perante sua presença e das tes-temunhas, não garantindo que o conteú-do das informações é verdadeiro, mas sim,que estas ocorreram conforme o estabele-cido pela lei.

As funções do tabelião não se limitam aouvir as declarações das partes, redu-zi-las a escrito e colher as assinaturasdos pactuantes e das testemunhas.Exerce ele verdadeiro poder de polícia,14

ao indagar da capacidade das pessoasque o procuram para esses atos, ao que-rer saber dos aspectos legais das cláu-sulas ou condições contratuais, ao per-quirir da licitude do objeto […], e altaresponsabilidade, uma vez que é depo-sitário da confiança do Estado e do público,não que fiquem envolvidas porartiman1has ou ilegalidades (OLIVEI-RA, 1962, p. 87, grifos nossos).

Segundo um entrevistado, o tabelionatofunciona como um comércio como outroqualquer onde se tem de lutar pelos clien-tes.

No tabelionato você tem que ter boasrelações. Veja, eu tenho um amigoque tem uma empresa imobiliária,uma empresa construtora que vaibotar um edifício para vender. Oedifício tem 80 apartamentos, são80 escrituras. Então eu trabalhoaquilo para mim.

Mas, segundo os funcionários, neste co-mércio só quem ganha é o tabelião e o subs-tituto, pois eles ficam com todos os traba-lhos que dão lucro. Por exemplo:

Os inventários ficam quase sempre nonome do tabelião, ele não distribui paraninguém, afinal os inventários rendemmuito porque têm muitas certidões,essas coisas...

Já na escrivania, a distribuição dos proces-sos é, teoricamente, feita pela ordem deentrada, mas, conforme nos disse um en-trevistado, isso pode ser alterado, depen-dendo da situação, para beneficiar o fun-cionário, ou para beneficiar o advogado.Vejamos os exemplos dados a respeito:

Há uma distribuição dentro do cartó-rio então nós somos cinco, você fica como processo de final 1, o outro com 2 e3, assim por diante. Quando você faz aautuação, o processo recebe um núme-ro na ordem, então todo aquele final vaificar com fulano, que fica tomando con-ta do processo. Mas, às vezes, vem pelaordem e o camarada só pega justiçagratuita, e o outro pegou vários in-ventários. Então, a gente conversae troca os processos para que o ou-tro possa ganhar um pouquinho.

Na 3a Vara Cível, tem uma juíza du-rona, então todo advogado quer queo processo vá para lá. A distribui-ção entre varas é por sorteio, masnem sempre é assim, pois o advo-gado pede, dá um dinheiro, então éo “dez por onde”.

A idéia de que o tabelionato é um comér-cio como outro qualquer nos dá a impres-são de que tudo é permitido, não há re-gras na distribuição do trabalho. Já emrelação à escrivania, percebemos clara-mente que existe uma regra explícita, queé a ordem de entrada do processo, masque essa regra pode ser flexível, depen-dendo da situação e da pessoa. Nos casosrelatados, podemos observar que as regrasforam ignoradas para beneficiar tanto aos

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próprios funcionários, quanto para aten-der à vontade de clientes.

Esta diferenciação é fundamental, poispermite explicitar que uma mesma ins-tituição lida, ao mesmo tempo, comdois tipos de relações sociais distintasuma dentro da própria sociedade, ou-tra entre a sociedade e o Estado, re-presentado aqui pelo Judiciário. E cabeao cartório “resolver” os conflitos queadvêm dessa dupla função.

Este aspecto merece especial atenção por-que, segundo os advogados, principaisusuários de cartórios, esta dupla função éresponsável por uma série de problemas,pois uma mesma pessoa lida ao mesmotempo com interesses distintos, isto é, o ti-tular do cartório, ao exercer o papel detabelião, é responsável pela “tutela admi-nistrativa dos interesses privados” (RIBEI-RO, 1955) e, ao assumir as atribuições deescrivão, responsabiliza-se pelo andamentode processos judiciais. O risco dessadualidade é a não-garantia da observân-cia dos sigilos processuais, o que coloca emrisco a “neutralidade” da Justiça.

AS PRÁTICAS CARTORIAIS – A RECIPROCIDADE E O PODER NA

BUROCRACIA

Um velho escrivão, aqueles livrosempoeirados, grandes volumes de pa-péis amontoados e toda uma burocra-cia, pronta a complicar a vida do usuá-rio (SIVIERO, 1983, p. 9).

Qualquer pessoa que já tenha ido a umcartório pôde verificar que o estereóti-po apresentado na epígrafe acima se asse-melha bastante à realidade. Dentro destequadro, pode-se imaginar o caos que re-presenta “pedir uma informação sobre umprocesso”. A confusão é tanta, que não éraro não se encontrar o processo.

Quando um advogado, ou uma pessoaqualquer, deseja informações sobre umprocesso em andamento vai ao cartó-rio. Com o número do processo, pedeao funcionário para verificar o queconsta na ficha. A ficha é o controle do car-tório, todas as informações sobre o pro-

cesso constam, ou deveriam constar, dasfichas. Entretanto, por erro ou esqueci-mento,15 às vezes, as informações não es-tão à disposição. Por isso, é prática comumdos advogados “pedirem para ver o pro-cesso”, para conferir se os dados do pro-cesso coincidem com os dados da ficha.Como isso representa uma “perda de tem-po”, os cartórios são caracterizados pelosadvogados como uma “burocracia de bal-cão”, pois são “obrigados” a verificar oprocesso encostados ao balcão, apenas aosque são “conhecidos” é permitida a rega-lia de fazê-lo em seus escritórios.

A observação do funcionamento do cartó-rio permite supor que a esta aparente de-sorganização se sobrepõe algum tipo delógica, à qual só tem acesso os funcionári-os. Isto os torna absolutamente indispen-sáveis, pois, sem eles, a burocracia simples-mente não funciona.

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67nimato e o início de uma alteração da hie-rarquia social.

O nome de quem pede o serviço, quandoenvolvido por um certo prestígio familiar,pode significar um caminho aberto sem aintermediação explícita do tradicional Q.I.(quem indica) que, entretanto, em outroscasos, é extremamente necessário e útil.

Conforme o prestígio, essa aproximaçãopode representar um adiamento no pra-zo ou um desconto significativo nos custosadicionais ou, usando a linguagemcartorial, nos custos por fora, CPF.18 Oprestígio do usuário não está necessaria-mente relacionado a sua situação econô-mica, mas sim ao valor moral que a amiza-de possui na sociedade brasileira. Esta étão importante que supera o postulado daigualdade dos homens perante a lei, con-forme expressa o dito popular: “Aos ami-gos tudo, aos inimigos a lei.”No caso, realmente aos amigos tudo é pos-sível, até burlar os mecanismos legais deum serviço, o cumprimento dos prazos ofi-ciais, tudo é esquecido em função da ami-zade. Mas quando não se é um inimigo(pois, segundo este critério, certamentenão se conseguiria o que deseja), porémapenas um desconhecido, um cidadão co-mum, sem um prestígio pessoal e sem ami-gos no cartório, só resta “penar” sob o juízoda lei, e esperar que os prazos e taxas ofi-ciais sejam respeitados. Ou, então, apelarpara o “bom senso” e tentar o tradicional“jeitinho”.

A forma como se pede o favor é fundamen-tal. Segundo depoimentos, é necessáriomuito tato, demonstrando interesse pelo

O funcionamento do cartório, portanto, sóé possível quando algum tipo de vínculonão-oficial se estabelece entre o usuário eo funcionário, criando-se uma relação deintimidade. Somente assim ocorre a cir-culação da informação. É preciso saber aquem se dirigir para se obter as informa-ções desejadas, é preciso saber com quemse está falando.

O cartório, cuja função seria dar publici-dade aos documentos que mantém sob suaguarda, acaba por se transformar, devidoa este processo, em uma instituição pos-suidora e manipuladora de informações,sendo necessária uma “informação espe-cial”, isto é, uma relação personalizada,para se obter uma informação ou um ser-viço que, a rigor, deveria ser público.

Este processo define o tipo de troca,16 pois,se o funcionário do cartório não presta umserviço, mas sim, faz um favor, isto implicauma forma de agradecimento:

que pode ser um presente, um convitepara uma cerveja e, também, o paga-mento em espécie. Isso ocorre quandoo funcionário diz que será necessário opagamento de uma taxa adicional, elesempre alega que é para outra pessoa,mas quase sempre o dinheiro é para elemesmo.

A primeira aproximação do usuário e dofuncionário pode ser mediada por indica-ção de terceiros, o que sempre é uma boareferência, pois o usuário deixa de ser um“anônimo” para ser “o conhecido de fula-no”, o que já garante um melhor atendi-mento.17 Este fato é importante, porquerepresenta a diferenciação da pessoa nomeio social, o que significa o fim do ano-

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serviço e pela pessoa a quem se vai pedir ofavor. Nunca se deve oferecer diretamen-te dinheiro, mas sim, alguma coisa quepossa ser trocada por esse serviço. O favoré fundamental em nossa sociedade, pois éo meio de burlar as normas burocráticasimpessoais que caracterizam o serviço pú-blico, a fim de se conseguir aquilo que sedeseja.

A burocracia é vista em nossa sociedadecomo um aspecto negativo do serviço pú-blico, que só existe para atrapalhar ou,como se diz em linguagem cartorária, “cri-am-se dificuldades para vender facilida-des”. Deste modo, as brechas existentes nalegislação são sempre utilizadas para bur-lar a mesma. Como afirmou um entrevis-tado:

O sistema cartorário é cheio de regras,mas há o jogo de interesses dos advo-gados. Eles aplicam todos os golpes, masàs vezes é dentro do direito dele. Porexemplo: a organização permite que eleleve o processo para “vista”, mas ele temo prazo para devolver, e ele simples-mente não devolve. Então você entracom um mandado de busca e apreen-são, mas isso leva um ano, e ele fica como processo esse tempo todo. Tem advo-gado que só trabalha em cima dessascoisas.

Na verdade, os “jeitinhos” ou “favores”podem servir tanto para adiantarquanto para atrasar o andamento doprocesso, isso depende, apenas, darelação existente entre o funcionário eo advogado, ou até do funcionário e da“parte”. Essa relação pode ser basea-da apenas na amizade, mas tambémpode ser originada pelo dinheiro.

O escrevente tem na mão o “poder deagilizar” e o “poder de retardar” o anda-mento do processo, na realidade, ele lidacom duas coisas preciosas em nossa socie-dade: a informação e o tempo. Segundoum entrevistado, o grande poder do es-crevente é que ele conhece os dois advo-gados:

O escrevente leva uma vantagem, eleconhece os dois advogados. Eles comen-tam com você aquilo que pretendemfazer. Há um segredo, mas é um segre-do muito vago. Você pode não fazer usodele, mas pode fazer19 (grifos nossos).

Dentre as formas de “atrasar” um proces-so, é interessante destacarmos o embargode gaveta. Para defini-lo, vejamos um exem-plo:

Tem advogado que pega uma ação dedespejo e diz para o cara dar para eleum tanto por mês. O camarada paga ametade do aluguel, e ele não avançacom o processo. Daquele dinheiro queele recebe, ele dá para o escrevente ametade, e o escrevente faz o embargo degaveta. É o embargo mais perigoso queexiste, porque o camarada guarda oprocesso e ninguém mais bota os olhosem cima.

Uma outra forma citada de atrasar o pro-cesso é provocar a perda dos prazos:

O cara não tem cuidado, ele marca aaudiência para o dia 25 de dezembro,quando chega o dia é feriado, então temque marcar outra data, aí ele vai mar-car em junho do ano seguinte. Isso nãoé preguiça de procurar não, há inte-resse de você fazer do processo umpula-pula. O juiz também tem interes-se em que o cartório demore, se nãoacumula muito trabalho para ele.

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69Dei um destaque maior à forma como seatrasam os processos, porque acredito queesses mecanismos possam ajudar a enten-der um pouco melhor o porquê de a Jus-tiça ser considerada lenta.

A transformação da prestação de um ser-viço em uma dádiva estabelece a “legali-zação” do princípio da troca: dar, recebere retribuir se tornam, assim, obrigaçõessociais. O entendimento deste mecanismoé fundamental para a interpretação doscódigos estabelecidos pela sociedade bra-sileira, em que a hierarquia é dissimuladapelos valores de amizade, confiança gene-rosidade, em que o “conhecimento”20 setransforma em um critério classificatórioda sociedade.

Numa relação de troca, a dádiva não re-presenta apenas um agradecimentodescompromissado, ao contrário, re-presenta a oficialização do compromis-so entre quem dá e quem recebe, sig-nificando a continuidade do vínculoestabelecido, pois o presente nunca“paga” um favor prestado.

No fundo, da mesma forma comoessas dádivas são livres, elas nãosão desinteressadas. São já contra-prestações, em sua maioria, e feitas ten-do em vista não somente o pagamentode serviços e coisas, mas também a ma-nutenção de uma aliança proveitosa eque não pode ser recusada (MAUSS,1974, p. 173).

O estabelecimento do vínculo, a partir dadádiva, e a idéia da contraprestação comobase da aliança remetem ao surgimento deuma outra categoria. A idéia de clienteaparece como resultado de um processo,

construído por ambas as partes, através doqual uma pessoa passa a se distinguir dasdemais, em função de uma atenção espe-cial que ela destina a um funcionário e dosprivilégios que recebe quando necessita dealgum serviço.

A clientela dos cartórios é, basicamente, for-mada por advogados, que utilizam maisconstantemente estes serviços e, por isto,merecem um tratamento diferenciado,desigual.21

A personalização das relações chega aoponto de em alguns cartórios existiremfuncionários responsáveis por determina-dos processos. Dizem os funcionários quea distribuição é feita pelo número de en-trada do processo. Por exemplo, o primei-ro processo fica com o funcionário “A”, osegundo, com o funcionário “B”, e assimsucessivamente. A rigor, esse procedimentoserviria para evitar o “tráfico de influên-cia” nos cartórios o que, na opinião de umentrevistado, nem sempre acontece:

É possível se dar um jeito e conseguirque o processo fique com aquele funcio-nário que já se conhece, que já é ami-go. Mas também acontece de cair comalguém que não goste de você, aí é ter-rível, porque a gente sabe que vai serdifícil de conseguir alguma coisa.

No cartório, o acesso às informações só seconcretiza após a identificação das pessoasque devem, de alguma forma, ter acesso aelas, apesar de, teoricamente, esta insti-tuição ter como função dar publicidadeàquilo que mantém sob domínio.22

A diferenciação de tratamento surge a par-tir da diferenciação entre as “pessoas”:

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aquelas que, por laços de amizade e soli-dariedade, merecem uma atenção especial,e os “indivíduos” que, por serem entida-des anônimas, são merecedoras das regras,também abstratas e impessoais.

Esta dicotomia entre pessoa e indivíduo23

representa a existência de dois sistemassociais distintos, a que cada uma dessascategorias corresponde: holismo – pessoa/individualismo – indivíduo.

Estes dois sistemas, embora bastante dis-tintos, estão presentes na sociedade brasi-leira: o primeiro é expresso pela estrutu-ra hierárquica da sociedade; o segundoestá presente nos mecanismos universa-lizantes da legislação e da economia demercado.

Como resultado dessa característica dualda sociedade brasileira, o conflito entremodernidade e moralidade se torna maisexplícito, e a explicitação do confrontoentre modernidade e moralidade é fun-

damental para que sejam discutidos osproblemas causados pelos sistemas de va-lores sociais.

Tudo leva a crer, então, que as relaçõesentre a nossa “modernidade” – que sefaz certamente dentro da égide da ide-ologia igualitária e individualista – e anossa moralidade (que parecehierarquizante, complementar e‘holística’) são complexas e tendem aoperar num jogo circular. Reforçando-se o eixo da igualdade, nosso esqueletohierarquizante não desaparece automa-ticamente, mas reforça-se e reage, in-ventando e descobrindo novas formasde manter-se (DA MATTA, 1983,p. 156).

A explicitação deste conflito não significaa destruição do princípio da hierarquia,ao contrário, representa a forma encon-trada pela sociedade para a manutençãoda coexistência dos dois sistemas de valor.Isto representa um problema para a An-tropologia, pois a construção da “identi-dade brasileira” está relacionada ao modocomo a sociedade resolve e representa estacontradição.

CONCLUSÃO

Com esta pesquisa, tentei compreendercomo uma determinada instituição, o car-tório, cuja função é dar publicidade aosdocumentos que mantêm sob o seu domí-nio, o faz na prática.

Conforme pude observar durante o tra-balho de campo, a organização burocráti-ca do cartório nada tem a ver com a buro-cracia de que Weber (1979) trata, pois emvez de baseada na igualdade perante a lei,

a organização cartorária é fundamentadano tratamento diferenciado dos casos, noprivilégio concedido a alguns de serematendidos de modo distinto dos demais.O sistema judiciário brasileiro, assim comooutros setores da administração pública,são caracterizados pela coexistência dasformas patrimonial e burocrática de orga-nização.24 Este tipo de procedimento tema ver, segundo a nossa hipótese, com umatradição ibérica, onde os domínios públi-

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71para a compreensão da circulação das in-formações: a apropriação privada dainformação que transforma as pessoas em“donos do saber”.

A idéia de que o uso dos computadoresacabaria com essa apropriação do sabernão é adequada, pois não considera que alógica do sistema permite que as pessoasse tornem as únicas detentoras do conhe-cimento, que a circulação do saber sejadependente da “boa vontade” dos que odetém. De modo que a informação só en-trará no arquivo do computador se o fun-cionário quiser, já que, como disse um en-trevistado: “nem tudo pode ser digitadosenão todo mundo vai ter acesso”.

Esta afirmação pode ser a síntese da idéiaque permeia este trabalho: a circulação dainformação não depende, apenas, da téc-nica de armazenamento ou do modo comose organizam os dados, ela depende, prin-cipalmente, das tradições culturais envol-vidas. Assim, não basta apenasinformatizar os dados para que essa lógi-ca seja alterada, é preciso que essas práti-cas “privatizadoras” sejam explicitadas ediscutidas.

A utilização de atos “fora-da-lei” (os jeitin-hos, os custos por fora) pelos funcionáriosdos cartórios é interpretada por uns comodesvio da moral, originada pelas más con-dições de trabalho e os baixos salários.Porém, outros acreditam que o que fazemé bom, pois eles têm boa vontade em aju-dar a quem precisa.

Este tipo de análise, fundada no senso co-mum da sociedade, remete a causa das

co e privado se confundem, onde o “pes-soal e o individual estão presentes de for-ma implícita na produção, guarda e colo-cação em circulação do saber e de seusobjetos (livros, documentos públicos, re-gistros de propriedade etc.)” (KANT DELIMA, 1991a). Assim sendo, as relações defavor não significam uma negação da ci-dadania, mas sim uma outra forma atra-vés da qual ela se constrói em nossa socie-dade, visto que “não há indicação de queas relações contratuais sejam liberadorasda cidadania” (MOURA, 1988, p. 202)Por esses motivos, as práticas cartoriais demanipulação de informações não são ape-nas uma mera técnica de armazenamento dedados, mas sim constituem um poderosomecanismo de controle, à medida que nãotornam universalmente público o quemantém sob sua guarda. Durante o levan-tamento bibliográfico para esta pesquisa,constatei que esta estrutura não era exclu-siva do cartório. Considerei, então, que elapoderia estar presente em outras instân-cias de produção e consagração da verda-de em nossa sociedade, podendo ser tam-bém estendida às bibliotecas e aos arqui-vos públicos, locais mediadores ao acessoàs informações,25 visto que as suas respec-tivas práticas de armazenamento de infor-mações em muito se assemelham às doscartórios.

Com relação à técnica de armazenamentodas informações, existe atualmente umdiscurso favorável à modernização do sis-tema. A informatização surge como o ins-trumento capaz de resolver todos os pro-blemas relativos à circulação da informa-ção. Porém, na sociedade brasileira, é pre-ciso se destacar um aspecto, fundamental

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NOTAS1 Agradeço à professora Laura Graziela F. F. Gomes

e ao professor-orientador Roberto Kant de Lima,que muito contribuíram para este trabalho comseus comentários e críticas, isentando-os, no en-tanto, de quaisquer erros que porventura perma-neçam no texto. Agradeço também aos funcioná-rios dos Cartórios do 10o Ofício de Niterói, do 4o

Ofício da 3a Vara Cível, da 1a Vara de Família doFórum de Niterói e 11o Cartório de Registro deImóveis do Rio de Janeiro, bem como aos demaisentrevistados pela atenção dispensada.

2 Uma primeira versão deste trabalho foi apresenta-da no Concurso Vasconcellos Torres de IniciaçãoCientífica da UFF, no ano de 1992, tendo obtidoo 3o lugar (MIRANDA, 1993).

3 A categoria tradição é entendida aqui como “siste-ma de significação que empresta sentido às práti-cas e representações de um determinado grupo”(KANT DE LIMA, 1989, p. 65).

4 É interessante destacar o papel que os intermediá-rios exercem na sociedade brasileira, ver Da Matta(1987).

5 Sobre a relação da escrita e burocracia, ver Goody(1987).

6 A honra (PITT-RIVERS, 1992) está ligada por de-finição ao exercício de um poder pessoal que con-tribui para a diferenciação e compartimentaçãoda sociedade.

7 A idéia de código remete à noção de um conheci-mento privativo, que ao ser decifrado torna-sepúblico (KANT DE LIMA, 1991).

8 Sobre a história dos Cartórios ver Oliveira (s.d.),Ribeiro (1955), Serpa Lopes (1947) e Siviero(1983).

9 O Cartório de Registros Públicos se divide em Re-gistro Civil das Pessoas Naturais, Registro de Imó-veis, Registro Civil das Pessoas Jurídicas e Regis-tro de Títulos e Documento.

10 É o caso do Cartório do 10o Ofício de Niterói.11 Sobre tabelionato ver Oliveira (s.d.) e Ribeiro

(1955).12 Sobre tabelionato no período colonial ver Schwartz

(1979).13 A fé pública representa a autoridade de uma ates-

tação. Através de uma assinatura com fé pública, oEstado impõe a certeza de que um determinadodocumento possui valor. A assinatura com fé pú-blica representa um compromisso com a honra,posto que a escrita de um documento édeclaratória, ou seja, tem um caráter pessoal, verLefebvre (1992).

14 Sobre a comparação entre cartório e polícia, verKant de Lima (1989).

15 O “esquecimento” nem sempre é apenas uma fa-lha de memória, muitas vezes está comprometi-do com outros fatores. Segundo os funcionários,as informações não constam da ficha devido aoexcesso de trabalho. Porém, segundo os advoga-dos, a ausência das informações pode represen-tar um “boicote”, pois, em alguns casos, isso poderepresentar a perda de prazos e a paralisação doprocesso, ver Le Goff (1984) e Leroi-Gourhan(1986).

ações sociais ao caráter individual (atribu-to pessoal), não permitindo perceber quea lógica dessas ações transcende os limitesdestas transações, pois está implícita naprópria organização da sociedade, na di-ficuldade da alteração de uma estruturafortemente hierarquizante, mas que cons-trói uma representação igualitária de simesma.26

O aspecto individual pode contribuir mui-to como elemento onde se materializam(mas não surgem) as estruturas e as repre-sentações da sociedade. Porém, ele nãopode ser utilizado como instrumento paraa explicação de fatos sociais, pois, certa-mente, provocará uma visão limitada dacomplexidade deste sistema simbólico.27

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7316 Sobre as relações de troca, ver Mauss (1974, v. 2).17 É o aparecimento do nome como elemento

diferenciador no meio social, tal com se refereMauss (1974).

18 É interessante observar a utilização da siglaCPF, que é um documento necessário à identi-ficação da pessoa física na sociedade brasilei-ra, para a denominação da cobrança de umserviço. Isto representa a dissimulação de umaatitude que é comum na prática cartorária, masque não pode ser explicitada. Por isso, a utili-zação de um código que só é conhecido pelaspessoas envolvidas na transação.

19 Segundo Lefebvre (1992), o segredo profissio-nal está vinculado à honra da corporação e,então, sua violação pode acarretar a descren-ça na instituição.

20 A categoria “conhecimento” é usada, aqui, nosentido do estabelecimento de relações pessoais, nautilização da intimidade como atenuante, ou não,das diferenças sociais.

21 Um funcionário entrevistado se recusou a usar acategoria cliente, dizendo que o cartório não os tem.Porém, verificamos que normalmente esta catego-ria é usada tanto por funcionários, quanto pelosusuários, que se identificam como clientes do car-tório.

22 A necessidade de personalização também foi ob-servada nas práticas de manipulação das informa-

ções das bibliotecas, onde as dificuldades de ob-tenção de informações sobre bibliografias e aces-so aos livros só são superadas, na maioria dasvezes, com o estabelecimento de um vínculo pes-soal entre o bibliotecário e o pesquisador. Istopôde ser verificado durante o levantamentobibliográfico para esta pesquisa em diversas ins-tituições: Biblioteca Nacional, Biblioteca Euclidesda Cunha, Biblioteca da Fundação Casa de RuiBarbosa, Biblioteca do Fórum do Rio de Janei-ro, Biblioteca Municipal de Niterói, Bibliotecada Faculdade de Direito da UFF.

23 Para a diferença entre indivíduo e pessoa, verDa Matta (1983) e Dumont (1985).

24 Sobre a coexistência do patrimonialismo e daburocracia no Brasil, ver Schwartz (1979).

25 Sobre etnografia das bibliotecas, ver Rocha Pin-to (1991).

26 A igualdade tem significados distintos em socie-dades hierárquicas e em sociedades individua-listas. Na primeira, ela se fundamenta na seme-lhança, ou seja, os indivíduos são iguais porquesão semelhantes; na segunda, é fundamentadana diferença, deste modo, os indivíduos sãoiguais, porque são diferentes. (KANT DE LIMA,1991)

27 Sobre os sistemas simbólicos, ver Bourdieu(1989).

ABSTRACT

Based on the ethnography of the Registry’s functions realized intwo cities, Niterói and Rio de Janeiro, this article discuss how anapparent disorder can disclose a private tradition, which only thenotaries can perceive. The ways of writing and the document’spreservation solidifies a parallel power. This process changes theservice into a gift, which to give, to receive and to reward are therules that guarantees the service’s quality.

Keywords: Registry, public’s documents, information, gift

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DO PEQUI À SOJA: EXPANSÃODA AGRICULTURA E INCORPORAÇÃO

DO BRASIL CENTRALANTÔNIO JOSÉ ESCOBAR BRUSSI*

O artigo discute a incorporação da região Centro-Oeste do Brasil,a partir da evolução e transformação da forma de interação quedesenvolveu com o ambiente econômico brasileiro. O estudo mos-tra que a incorporação da região não seguiu uma trajetória linear.Ela ocorreu a partir de saltos, induzidos pelo tipo particular deconexão que o Brasil desenvolvia com a economia-mundo capita-lista. É possível identificar três desses momentos particulares. Fo-ram eles: 1) a crise de 1913 e a Primeira Grande Guerra; 2) acrise dos anos 1930 e a Segunda Guerra Mundial, e 3) a crisedos anos 1960 e as dificuldades nas contas externas do país apartir do início dos anos 1970. Em todos esses momentos o Cen-tro-Oeste estreitou seus laços com a economia-mundo através daexpansão da produção agrícola. A integração econômica da re-gião funcionou como uma reação do país às dificuldades econômi-cas. Desse modo, o Brasil tem utilizado seu território inexplorado,sua reserva de natureza, para enfrentar e tentar superar dificul-dades econômicas.

Palavras-chave: ocupação, colonização, economia-mundo.

“Visitei Goiânia em 1937. Uma planície sem fim, que tinha algo de terreno baldio e campo debatalha... de boa vontade chamaríamos bastião da civilização... não num sentido figurativo masdireto, que adquiria assim um valor singularmente irônico. Pois nada podia ser tão bárbaro, tãodesumano, como essa iniciativa no deserto.”

C. Lévi-Strauss – Tristes trópicos

“Porque não há mais florestas em Minas.” (Migrantes mineiros, no início dos anos 1940, respon-dendo por que haviam mudado para as mediações de Goiânia).

Luís Estevam – O tempo das transformações

* Professor do Departamento de Ciência Política da Universidade de Brasília.

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INTRODUÇÃO

Os estudos que tratam dos movimentos deocupação das novas terras da região Cen-tro Oeste (CO)1 invariavelmente têm pro-curado vincular as primeiras etapas daque-la expansão aos estímulos que se dinami-zavam para além das fronteiras do estadode São Paulo, emanados pelo crescimentoda economia cafeeira e por seus desdobra-mentos industrializantes, a partir do finaldo século XIX. Com isso, o desenvolvi-mento dos primeiros encadeamentos mer-cantis, das primeiras regularidades produ-tivas e comerciais organizadas no CO (es-pecialmente naquelas regiões fronteiriçasmais próximas do sul de Mato Grosso e deGoiás) se teria organizado para satisfazernecessidades da expansão da “economia”paulista, nessa época fortemente compro-metida com a produção, beneficiamento,comercialização, transporte e exportaçãode café.2 Essa interpretação em nada sealtera caso se inclua uma intermediaçãode atividades mercantis localizadas no Tri-ângulo Mineiro (Uberaba, Uberlândia eAraguari), pois também o que ali ocorriase dava como conseqüência de impulsosprovindos de São Paulo. Desse modo, oque está sendo afirmado nessas argumen-tações é que o dinamismo e a crescentediversificação e complexidade da econo-mia cafeeira atuavam como indutores deum processo de especialização regional emsua periferia mais imediata, ao mesmotempo em que traziam aquelas novas ter-

ras à órbita do capitalismo em operaçãoem São Paulo.

O propósito do presente trabalho é o dedemonstrar que a expansão da economiapaulista – expansão e diversificação da ca-feicultura e da industrialização durante aprimeira metade do século XX – e o cres-cimento de uma economia “nacional” pro-gressivamente integrada a partir da Se-gunda Guerra Mundial tiveram menos im-portância do que convencionalmente seatribui para o processo de incorporaçãodo CO brasileiro.

As peculiaridades de origem da produçãocafeeira, dirigida exclusivamente para omercado mundial, e o mosaico de “mer-cados” locais e regionais de que era com-posto o território brasileiro constituíam acontrapartida doméstica das manifestaçõesda economia-mundo capitalista, desde oinício de nossa história presentes em nos-sa ambiência econômica. A partir dessavisão, a inclusão do CO ao circuito da pro-dução de mercadorias e da valorização docapital representaria a continuação de umprocesso cujos determinantes proviriamdos ritmos cíclicos da economia-mundo,porém com as peculiaridades da presençae, a partir de certo momento, da interven-ção do Estado brasileiro e dos interesseshegemônicos em nosso cenário político eeconômico.

REFERENCIAL TEÓRICO BÁSICO

Na teoria do sistema-mundo,3 referênciasa arenas externas mencionam um de dois

possíveis cenários, ambos enfatizando re-giões ainda não submetidas à lógica (e to-

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79das as suas conseqüências) do sistema-mundo capitalista. O primeiro cenário re-fere-se a entidades políticas estabelecidase reconhecidas, situadas fora da economia-mundo capitalista, como os impériosOtomano e Chinês nos séculos XVI eXVII. A segunda possibilidade apontapara regiões ainda não subordinadas auma dada organização política estatal ouque, caso hajam sido, ainda não se torna-ram reconhecidas pelo sistema interestatal,como a Sibéria no século XVI ou a Áfricano XVIII.

A questão mais importante presente nanoção de arena externa encontra-se natipologia das conexões que um dado ter-ritório pode estabelecer com a economia-mundo capitalista. No entanto, em ambosos caso, as arenas externas ainda não de-senvolveram “a regular flow of productsfrom the area to other areas of the axialdivision of labor of the capitalist world-economy” (HOPKINS ; WALLERSTEIN,1982, p. 129). Desse modo, identificar otipo de interação que essas áreas estabele-cem com a economia-mundo torna-secrucial para a análise, porque é a partirdele que se pode ou não conectar regiõesa um ou mais eixos da divisão mundial dotrabalho. Essa questão assume especial re-levância porque alguns tipos de trocas nãose integram ao processo regular de pro-dução e reprodução da economia-mundocapitalista e, conseqüentemente, acabampor não afetar o movimento geral de acu-mulação de capital. Aqui, variações de pre-ço, escassez ou abundância relativa nãoinduzem ou disparam reações em cadeiaque possam interferir no fluxo regular davida econômica, mesmo em extensão mais

limitada, regional, da economia-mundocapitalista.

Tal comércio tem sido denominado decomércio de luxo, e é sua dimensão quali-tativa que ressalta a especificidade do co-mércio que uma arena externa desenvol-via com a economia-mundo capitalista(WALLERSTEIN, 1982, p. 99-199; 1989,p. 131-33). Esse tipo particular de comér-cio poderia ser exemplificado por penasde pássaros, peles exóticas, seda, ou outroitem desejado porém não indispensável àreprodução das condições de produção e/ou de vida tanto dos produtores como dosconsumidores. Um aspecto decisivo dessetipo de produção e de troca é a irregulari-dade congênita que se manifesta em ativi-dades coletoras, ou naquelas cuja produ-ção ocorre de modo sazonal ou, ainda, nosinterstícios de importantes atividades re-gulares de subsistência. Um tipo relativa-mente freqüente dessa atividade produti-va provém de atividades rituais, cujo pro-duto excedente pode eventualmente sercomercializado. Com isso, temos que osvínculos comerciais com as arenas exter-nas eram, no mais das vezes, irregulares,marcados pela não-essencialidade daque-la atividade, até porque o produtocomercializado não raro revestia-se demenor interesse para seus produtores,devido ao escasso valor que a ele atribuí-am. É necessário ainda acrescentar a to-das essas limitações uma última, qual seja,a quantidade pouco expressiva de produ-tos envolvidos nesse tipo de troca.

Entretanto, além dos tipos mais comunsde arenas externas apontados acima, deve-se acrescentar um terceiro tipo, qual seja,

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o daquelas regiões ou redutos internos aoterritório de um estado nacional que, noentanto, continuam apartados do fluxocontinuado de mercadorias, mesmo per-tencendo a entidades políticas reconheci-damente participantes do sistemainterestatal. É verdade que essesinterstícios em áreas incorporadas são des-tacadas exceções na tendência secular deexpansão da economia-mundo capitalista,especialmente a partir do início do séculoXX, quando praticamente todo o globoterrestre foi entranhado em suas redes.

A despeito da pouca atenção que geral-mente os estudiosos do sistema-mundoatribuem ao tema, em pelo menos duasocasiões Hopkins e Wallerstein demons-tram preocupação sobre como tratar aque-les redutos ainda não incorporados.

Em um artigo, “Theoretical andInterpretative Issues”, Wallerstein afirma:

We are going to have to worry aboutinner boundaries, because, if we lookat it in the very early stages, there existsa set of outer boundaries, but there arealso inner areas that are not involved.The political processes of incorporatinginner areas into larger economic areasare obscure and we have to worry abouthow we will define them(WALLERSTEIN, 1982, p. 100).

Há dois problemas nessa citação que de-mandam referência: em primeiro lugar, osespaços internos não incorporados são vis-tos como traços dos primeiros momentos,dos períodos mais primitivos da economia-mundo capitalista e, em segundo, o reco-nhecimento da dificuldade para clarificaros processos políticos da incorporação.

Entretanto, em uma segunda passagem,Hopkins e Wallerstein comentam a respei-to da existência de redutos (redoubt areas)que, apesar de estarem dentro dos limitesda economia-mundo, ainda não se encon-tram incorporadas. Afirmam que:

[...] The literature on agriculturalhistory has indicated a clear patternover time of “inner” expansions, in thesense that not all the areas physicallylocated inside the outer boundaries ofthe world-economy had necessarilybeen from the outset involved in thesocial economy. There were“subsistence redoubts”. It is clear that,as a process, the incorporation of areasat the outer edges and areas that wereredoubt inside was essentially the samephenomenon economically, even if ithad a different definition juridicallyand perhaps different prerequisitespolitically. Whereas “outer” expansionhas undoubtedly reached its limits, itmay be that “inner” expansion has stillsome small distance to go (HOPKINS ;WALLERSTEIN, 1982, p. 56).

Além de reconhecerem a existência de ni-chos apartados da economia-mundo capi-talista, apesar de fisicamente localizadosdentro de seus limites, os autores apon-tam ainda duas questões de importânciapara o tema aqui discutido. Primeiro, queem sua dimensão econômica, a incorpo-ração desses tipos de arenas externas(aquelas fisicamente localizadas fora doslimites da economia-mundo capitalista eaquelas que, por qualquer razão, forammantidas isoladas, porém dentro dos limi-tes da economia-mundo) apresenta-se es-sencialmente como um mesmo fenômenoe, segundo, que esses redutos seriam “desubsistência”. Nesse último ponto, a ênfa-se a uma “economia de subsistência” apre-

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81senta-se como um traço diferenciador en-tre estes redutos e as áreas circundantesincorporadas. O que as aproximaria seriaa similitude do processo de trazê-las àambiência da economia-mundo capitalis-ta, embora cada ponto de partida e seusrespectivos conteúdos políticos e sociaispossam apresentar peculiaridades e dife-renças.

Por outro lado, os estudos sobre incorpo-ração reforçam, em parte, o entendimen-to acima, pois insistem no processo e naqualidade dos laços que vinculam um dadoterritório à dinâmica da economia-mun-do capitalista (ARRIGHI, 1979; SO, 1984;ÇIZAKÇA, 1985; KASABA, 1987;PHILLIPS, 1987; MARTIN, 1987). Osmesmos autores indicam ainda que a in-corporação das arenas externas apresen-ta-se não apenas como um prolongadoprocesso, mas também como um movi-mento descontínuo, de avanços irregula-res. Nesse sentido, a partir do reconheci-mento de uma não-linearidade no proces-so de incorporação, torna-se teoricamen-te concebível que uma dada região possaestar fora dos limites da economia-mun-do, mesmo sendo parte de um Estado per-tencente ao sistema interestatal. Assim, seimpérios muito bem estruturados como oChinês (SO, 1984) ou o Otomano(ÇIZAKÇA, 1985; KASABA, 1987) foramincorporados por partes no longo proces-so de trazê-los ao encadeamento mundialda produção capitalista, é teoricamentepossível utilizar o conceito de arena exter-na e, conseqüentemente, o de incorpora-ção, em contextos sociais onde partes doterritório de um Estado nacional são pro-gressivamente trazidas à órbita da mesmaeconomia-mundo.

Tendo sido demonstrado ser adequadoutilizar o conceito de arena externa àque-las partes de um território nacional quecontinuaram apartadas dos processoscentrípetos da economia-mundo capitalis-ta, torna-se agora necessária uma breveapresentação do conceito de incorporação,com o intuito de evidenciar a pertinênciade sua aplicação ao processo de ocupaçãodo CO brasileiro.

Na teoria do sistema-mundo, o conceitode incorporação pertence ao quadro ge-ral das tendências seculares da economia-mundo capitalista, isto é, da direção bási-ca de desenvolvimento do conjunto do sis-tema, processo portador de desigualdadese de descontinuidades. Nesse sentido, in-corporação está inscrita no movimentogeral de expansão de um sistema que as-sumiu traços peculiares a partir do alar-gamento e aprofundamento sem fim dasrelações de produção capitalista e de seucorolário, o infinito processo de acumula-ção de capital.

Como um conceito histórico, incorporaçãoé o processo de expansão física do capita-lismo, a partir de seu núcleo europeu, des-de seu impreciso início no final do perío-do medieval. Pelo início do século XX, aeconomia-mundo capitalista tinha atingi-do seus limites de expansão: cobria a tota-lidade do planeta, com alguns interstíciossem importância deixados de lado.

A precaução a ser tomada quando se utili-za o conceito de incorporação para expli-car a absorção daquelas áreas intersticiaisà economia-mundo é a de não utilizá-lopara qualquer expansão ou realocação de

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capital, porque a economia-mundo estácontínua e ciclicamente experimentandoesses tipos de mudanças. Em primeiro lu-gar, o que realmente importa consideraré a condição econômica prévia da regiãoem estudo, as características de suas cone-xões sistêmicas anteriores ao início domovimento centrípeto que a trouxe até aeconomia-mundo e sob quais bases aque-la interação sistêmica particular foiconstruída. Em segundo lugar, deve-seavaliar como os principais traços do pro-cesso desenvolveram-se em relação ao quefoi identificado como a diferentia specificado conceito de incorporação através dahistória da economia-mundo capitalista.Em outras palavras, para ser chamado in-corporação, um processo histórico nãopode apresentar semelhanças aleatóriascom o conceito. Deve-se, de algum modo,demonstrar que uma região passou (ouestaria passando) por mudanças qualitati-vas em seu modo de interação com a eco-nomia-mundo; que o processo construiu(ou estaria construindo) laços profundose permanentes com as correntes de mer-cadorias em funcionamento na economia-mundo capitalista; que o processo de acu-mulação de capital foi (ou estaria sendo)maximizado na área em incorporação; queum novo padrão de produção para expor-tação foi (ou estaria sendo) organizado,freqüentemente sob controle de grandesempreendimentos; que o processo de in-corporação foi garantido e estimulado porefetiva intervenção estatal; que tenha sidouma resposta a pressões sistêmicas alémde ter implantado uma coerção ainda maisintensa sobre a força de trabalho(HOPKINS ; WALLERSTEIN, 1982,p. 41-82, 91-103; 121-142; HOPKINS ;

WALLERSTEIN, 1987, p. 763-769;WALLERSTEIN, 1989, p. 130-131). Seesses pré-requisitos estiverem presentes navinculação de uma área intersticial à eco-nomia-mundo, então poderemos dizerque é de incorporação que estamos tra-tando.

Conforme demonstrado a partir das con-siderações acima, o processo de incorpo-ração não significa simplesmente trazeralgumas áreas à ambiência da economia-mundo capitalista. Ela traz importantestransformações na estrutura econômica daregião em incorporação, tais como, novosprocessos de produção, novas relações detrabalho, novos produtos e novos merca-dos. Entretanto, o conjunto dos interessesenvolvidos necessita de forte interferên-cia e suporte do Estado para realizar seusobjetivos naquela parte prospectiva da eco-nomia-mundo. A presença do Estado tor-na-se indispensável especialmente porquea incorporação acontece como parte dabusca por condições de produção mais fa-voráveis (força de trabalho, recursos na-turais, novos mercados) para compensaras pressões que obstruíam ou poderiamobstruir o movimento sem fim de acumu-lação de capital no Estado incorporador(WALLERSTEIN, 1989, p. 131).

Nesse sentido, a intervenção das institui-ções e dos recursos do Estado torna-se in-variavelmente necessária para domesticaras condições e os recursos prevalecentesna região incorporada. Para tal, são ne-cessários substanciais aportes de capital ede poder à disposição do Estado nacionalenvolvido. A vasta quantidade de capitalrequerida para estimular o processo jun-

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83tamente com a crescente dificuldade polí-tica para canalizar uma cada vez maiorquantidade de recursos para tal empreen-dimento impedem que a incorporaçãoapresente um movimento linear exibindo,em vez disso, um comportamento de sur-tos, de saltos. Ou como afirmam Hopkinse Wallerstein (1987, p. 776):

[...] Expansion was neither an easy orcostless task. One did only as much asone had to do, to compensate forcurrent difficulties. Hence, expansionoccurred in spurts, a little at a time, and

hence one expanded first where it waseasiest to expand.

Do que foi dito acima e reforçado por estaúltima citação, o processo de incorpora-ção é sempre determinado pela entidadepolítica e econômica incorporadora, coma participação, na melhor das hipóteses,secundária, responsiva, dos interesses lo-calizados nas zonas incorporadas. Neste eem outros aspectos já comentados, o pro-cesso que teve lugar na região CO não fu-giu à regra. A próxima seção apresentaráalgumas evidências a esse respeito.

CENTRO-OESTE: SURTOS INCORPORADORES NO SÉCULO XX

No final do século XIX e começo do sécu-lo XX, as províncias de Mato Grosso e deGoiás continuavam apresentando aqueletipo de existência tão duramente resumi-do por Saint-Hillaire como de “tristedécadence et de ruines” (1847, p. 308-309). Os estados, apesar de ocuparem cer-ca de 25% do território brasileiro, eram osmenos populosos do país e sequer apre-sentavam município com pelo menos um(1) habitante por quilômetro quadrado,mesmo considerando suas respectivas ca-pitais. Em tal quadro de dispersãopopulacional, os pequenos agrupamentosurbanos eram completamente dependen-tes dos estímulos espasmódicos proveni-entes do campo. Assim, existindo comoreflexo da vida rural, as cidades da regiãodesempenhavam funções que se asseme-lhavam àquelas típicas das cidades das eco-nomias pré-capitalistas, ou seja, funçõesadministrativas, coercitivas e religiosas.

Por outro lado, as atividades rurais ou,mais genericamente, do setor primário, aolado da generalizada produção agrícola desubsistência, apresentavam a atividadecoletora como a mais importante, tal comoo látex e o mate no Mato Grosso. Em am-bos os casos, qualquer expansão dependiaexclusivamente dos avanços sobre novasreservas naturais de Haevea brasiliensis e deIlex paraguaiensis. Por sua vez, a pecuária,atividade usualmente lembrada como amais importante, como a que estrategica-mente iria posicionar o CO em um rudi-mento de divisão regional do trabalho aser esboçada posteriormente, ainda erauma atividade a rigor “extrativa”. O gadose reproduzia em fazendas de extensõestão vastas e a terra possuía tão pouco va-lor que não se utilizavam cercas para se-parar as propriedades. Nessa época, nasfazendas goianas, apartavam-se as criasjovens (novilhos, bezerros) do rebanho,

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perdidas na imensidão do cerrado, e asencaminhavam para Barretos para cresci-mento, engorda e posterior abate em SãoPaulo (ESTEVAM, 1998, p. 86). A partirdessa forma tão irregular de produção,não é difícil presumir quão errático era ovínculo do CO com a “economia paulista”.

A chegada da estrada de ferro (1914) afe-tou muito timidamente a vida local, ape-sar de já se notarem fluxos comerciais maisregulares com outros estados, especial-mente de gado e de arroz. A conseqüên-cia imediata, contemporânea ainda da fasede construção das ferrovias, foi a valoriza-ção das terras adjacentes ao traçado dostrilhos.

Com a expansão dos trilhos, os sertões deMato Grosso e de Goiás foram pouco apouco despertando da estagnação. A redeurbana de Mato Grosso, na época inferiorà de Goiás, tomou novo impulso, fazendoprogredir as cidades já existentes, comoCampo Grande, Aquidauana, Miranda,entre outras. Ao mesmo tempo, novas ci-dades eram criadas, tanto ao lado da fer-rovia como em localidades razoavelmentedistantes da via férrea, como Dourados,Rio Brilhante e Bonito (CORRÊA FILHO,1969, p. 621).

O surgimento e desenvolvimento de cen-tros urbanos intensificaram a utilização e,conseqüentemente, a procura por novasterras. Esta se fazia tanto através da com-pra como pela regulamentação de situa-ção de posse e, também, pela busca, a qual-quer custo, de terrenos não claramenteapropriados. Esse processo acabou intro-duzindo, pela primeira vez em Mato Gros-

so, a necessidade de demarcação das pro-priedades agrícolas, com a desagregaçãode inúmeros latifúndios. As antigas posseseram tão imensamente grandes que, mes-mo após várias divisões, era comum en-contrar propriedades de 50.000ha.(CORRÊA FILHO, 1969, p. 622).

Em Goiás, os poucos dados disponíveisindicam que o estado se tornou exporta-dor de arroz a partir da primeira décadado século XX. A inauguração da Estradade Ferro de Goiás (1914), um prolonga-mento, através do Triângulo Mineiro, daEstrada de Ferro Mogiana, estendeu ao suldo estado a facilidade e a regularidade detransporte, antes só disponível a Uberabae Araguari, no Triângulo Mineiro.

No período anterior à ferrovia, Goiás secaracterizava por exportar produtos rela-tivamente caros e exóticos (com exceçãodo gado) como peles da fauna nativa, pe-nas de pássaros, fumo e marmelada, porexemplo. Os altos custos dos transportese a disseminada economia de subsistênciaeram responsáveis por essa especialização(BORGES, 1990). Após a inauguração daferrovia, a quantidade dos produtos ali-mentares mais populares havia superadoem muito aqueles produtos mais tradicio-nais, sofisticados e/ou exóticos. Com isso,no período 1915-1920, o arroz assume aposição de principal produto agrícola deexportação de Goiás, por via ferroviária,que embarcou, em 1918, quase 7.000 to-neladas de arroz e 1.500 de feijão(BORGES, 1990, p. 125).

De fato, esses números demonstram queno sul de Goiás, na região beneficiada pela

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85ferrovia, estava em progresso a instalaçãode uma economia mercantil, embora asrelações de produção estivessem relativa-mente estabilizadas, com meeiros, possei-ros, camaradas e pequenos arrendatáriosconstituindo o grosso dos produtores di-retos permanentemente em atividade. Aolado deles e com velocidade crescente, co-meçou a surgir a figura do trabalhadorassalariado temporário, gruposseminômades que se dirigiam ao sul deGoiás sazonalmente, nos tempos de plan-tio e colheita, quando a demanda de forçade trabalho crescia extraordinariamente(BORGES, 1990, p. 107-108).

Em breves palavras, era esse o cenário pre-valecente no CO nas primeiras décadas doséculo XX, época que convencionalmentese costuma atribuir à região uma já efetivafunção complementar às atividades que sedesenvolviam em São Paulo. A comple-mentaridade se dava com a produção dealimentos naquelas áreas periféricas queestariam suprindo a demanda alimentarda força de trabalho ocupada em São Pau-lo e/ou no Sudeste (MARTINS, 1975,p. 39; BORGES, 1990, p. 89-90;ESTEVAM, 1998)

Dois são os argumentos a indicarem fato-res de ordem sistêmica (ritmos cíclicos etensões no sistema interestatal) comodeterminantes para a ocorrência daque-les impulsos incorporadores verificados noinício do século XX. Em primeiro lugar,devemos verificar o que ocorria com oabastecimento doméstico de gêneros ali-mentícios de grande consumo popular.Durante toda a República Velha (1889-1930), a orientação para o exterior daagricultura brasileira manteve-se

inalterada. Esta afirmação refere-se espe-cificamente ao privilegiamento do setorexterno no que diz respeito às políticas doEstado, às preocupações dos grupos diri-gentes e, sobretudo, às origens dos estí-mulos produtivos para a economia brasi-leira. Deste modo, a preponderância eco-nômica da monocultura em extensas re-giões, aliada a certa desconsideração como abastecimento interno – provavelmenteo efeito concreto da ideologia das vanta-gens comparativas – exigiam permanen-temente a importação de ampla varieda-de de produtos alimentícios, sendo o ar-roz um dos principais produtos invariavel-mente presentes nas pautas anuais de im-portações, com quase 62.000 toneladasimportadas no período 1908 a 1912. Em-bora declinantes, as importações de ali-mentos continuaram importantes até ametade da Primeira Guerra Mundial(1916) (Annuário Estatístico do Brasil:1908-1912, v. 2, p. 111).

No caso específico do arroz, produto quenos interessa por ser o principal item agrí-cola de exportação de Goiás, as importa-ções cresceram continuamente até o perío-do 1901-1905, diminuindo até quase de-saparecer em 1920. Já as exportaçõesapresentaram-se insignificantes até o iní-cio da guerra, quando atingiram 236.000toneladas, entre 1916-1920. Em regra ge-ral, esse é o comportamento observadopara todos os alimentos selecionados nastabelas consultadas, ou seja, ter apresen-tado significativa expansão das exporta-ções durante os últimos anos da PrimeiraGrande Guerra. (VILLELA; SUZIGAN,1975, p. 95; LINHARES; SILVA, 1979,p. 36)

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Por outro lado, é também digno de nota ocomportamento declinante das importa-ções dos principais alimentos tradicional-mente importados (arroz, feijão, batata emilho). Em todos os casos, a partir de 1917,fica evidente que o país havia se transfor-mado em exportador de alimentos, certa-mente respondendo à demanda interna-cional provocada pela guerra (VILLELA;SUZIGAN, 1975, p. 127).

Não foi possível encontrar séries estatísti-cas anuais que detalhassem a produção e/ou a exportação de grãos do CO duranteos primeiros trinta anos do século XX.Durante esse período, Goiás respondia porpraticamente toda a produção da região,de acordo com os dados do censo de 1920.

O mesmo censo de 1920 mostra tambémque, àquela altura, Goiás ainda nem delonge estava fornecendo alimentos para oSudeste em quantidade suficiente paracumprir uma propalada função na divi-são regional do trabalho, ou seja, a de pro-duzir alimentos para São Paulo, segundoa interpretação corrente que explica a co-lonização do CO no século XX como de-terminada pelos impulsos da economiacafeeira. Não poderia ser diferente pois, adespeito de todo o estímulo gerado pelaexistência real de uma demanda não sa-tisfeita, comprovada pela necessidadepermanente de importação até 1916 e peloaumento das exportações durante a guer-ra, Goiás continuava a produzir apenas4,5% do arroz (37.427,6 toneladas) e 1,5%do feijão (10.947,8 toneladas) da produ-ção nacional de 1920. Na verdade, asquantidades que exportava eram residuaisquando comparadas com a produção to-tal de arroz daquele ano (831.495,1tone-

ladas) ou mesmo quando confrontadascom as exportações (Censo de 1920 – Agri-cultura, 1924, p. 5).

A década de 1930 não trouxe mudançanesse quadro marginal da produçãoagropecuária do CO. Houve até retraçãoem termos relativos na produção da re-gião. A produção de arroz, por exemplo,equivalia, em 1930, a 8,35% da produçãonacional, enquanto que em 1939 opercentual era de 7,13%. Em outras pala-vras, os estímulos autarquizantes que acrise de 1930 impôs ao Brasil foram me-nos fortes no CO que em outras regiõesdo país, como o Sul (RS), no caso do ar-roz, estado que, de fato, produziu boa par-te do aumento da oferta naquela década,(Estatísticas da Agricultura Brasileira,1990).

Somente a partir do início da SegundaGuerra Mundial pôde-se notar avançosimportantes na produção de arroz do CO,fenômeno que ganharia impulso na déca-da seguinte.

Pode-se, portanto, afirmar que os estímu-los emanados a partir da economia cafeeirae de seu desdobramento industrializante,no período em que esta foi hegemônicano cenário econômico brasileiro, não fo-ram suficientes para transformar o CO emimportante produtor de grãos para o mer-cado doméstico paulista ou brasileiro. Ape-nas a partir de 1940 é que se percebe umatendência de crescimento da produção dearroz no CO, determinada por razões bas-tante diferentes daquelas que associavama dinâmica da agricultura da região (es-pecialmente Goiás) à oferta de alimentospara a economia cafeeira.

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87As guerras mundiais, o desaparecimentoda oferta internacional de alimentos pro-vocado pela desorganização da produçãoe do comércio internacional, as pressõesda demanda internacional, estes foram osverdadeiros estimuladores da agriculturado CO.

O segundo argumento a demonstrar opequeno impacto da dinâmica econômicapaulista sobre a região CO no período emanálise (até 1930) fundamenta-se no com-portamento do setor externo brasileironaqueles anos. A citação que se segue des-taca resumidamente os tópicos mais rele-vantes da questão.

A crise do comércio exterior que seiniciara em 1913 foi agravada durantea I Guerra Mundial. Os preços dos pro-dutos de exportação caíram a níveis ex-tremamente baixos, causando forte re-dução em seu poder de compra, que serefletiu em baixo volume de importa-ções (também afetado pela diminuiçãoda oferta externa, causada pela guer-ra), o que, por sua vez, implicou emqueda na receita federal, de vez que 2/3 dela provinham do imposto de im-portação (VILLELA; SUZIGAN, 1975,p. 117).

A citação aponta para outro decisivoestimulador da produção e da exportaçãode alimentos pelo CO. A crise econômicaque se abateu sobre o Brasil em 1913 pro-vinha, em parte, da queda dos preços docafé e da borracha. Os efeitos dessa quedae a guerra impuseram à economia brasi-leira a busca de produtos exportáveis nãotradicionais, como foi o caso dos alimentos.4

Poderia ser argumentado que a produçãogoiana de arroz contribuiu para a existên-

cia de excedentes do produto de tal modoque permitiu sua inclusão entre aquelasmercadorias exportáveis por estar o mer-cado doméstico plenamente abastecido.Isso, porém, não ocorreu. Em primeirolugar, devido à exígua quantidade produ-zida pela região. Em segundo, e muitomais importante que a pouca significânciada produção goiana, porque a decisão deseguir aumentando a exportação de ali-mentos não levou nem minimamente emconta o abastecimento interno. De fato, em1917, a escassez de alimentos e seu conse-qüente alto preço atingiram níveis tão dra-máticos, que já se ouvia no CongressoNacional sérias criticas a tal situação. Odeputado Nicanor Nascimento afirmavaque “tornou-se intolerável a vida não sódas populações paupérrimas, mas até daspopulações médias”. Mais adiante, acusa-va os exportadores de se aproveitarem dasituação dizendo: “Ao passo que a riquezaaumenta e, com ella, a exportação, o em-pobrecimento nacional é cada vez maior”(LINHARES; SILVA, 1979, p. 32).

Foi a crise do comércio exterior do Brasil,iniciada em 1913, a verdadeira causadorado início da incorporação do CO. Foi aescassez de divisas que empurrou o Esta-do brasileiro em busca de novos produtosexportáveis, para compensar a brutal di-minuição das receitas públicas necessáriaspara saldar compromissos externos. Oca-sionalmente alguns daqueles produtoseram produzidos em Goiás, no momentoem que o transporte ferroviário estavachegando à região. A forte pressão da de-manda para exportação acabou, então,sendo responsável pela expansão da agri-cultura e da pecuária goiana e pelo estí-mulo à pecuária mato-grossense. Os anos

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posteriores à Primeira Guerra Mundial,até o início da década de 1940, compro-vam nossa afirmação quando identificamosque a produção agrícola daqueles estados(no que respeita ao arroz) até regrediu emtermos relativos. Esta afirmação coincidecom a interpretação hoje corrente de quesomente como conseqüência da crise de1930 pôde-se verificar a existência de umdinamismo com alguma determinação in-terna na economia brasileira. É com essedinamismo, em parte endógeno, que seinicia, a partir de 1940, com as reformasestruturais do Estado e com oaprofundamento da industrialização ha-vidos na década anterior, um processo de

adensamento de interesses de maneira queos estímulos incorporadores internamen-te gerados começaram a se fazer sentir,progressivamente, sobre a região CO. Apartir de 1940, portanto, o eixodinamizador da incorporação se desloca-rá para incluir sistemática e permanente-mente novos interesses (já agora internos,locais e, por esse momento, nacionais),gestados durante o período anterior ecrescentemente interessados naquela in-corporação. Entretanto, a região terá deesperar um bom tempo para que trans-formações qualitativas na economia e naagricultura brasileiras alterem o ritmo, aintensidade e o destino final da incorpo-ração.

O GRANDE SURTO INCORPORADOR DOS ANOS 1970

O pesquisador Tamás Szmrecsányi iniciouum importante estudo a respeito do de-senvolvimento da agropecuária no Brasilafirmando que:

A maioria dos estudos sobre o desen-volvimento recente da economia brasi-leira identifica na industrialização doPaís o seu principal fator dinâmico, re-legando a um segundo plano o papelnele desempenhado pelas transforma-ções do setor agropecuário(SZMRECSÁNYI, 1995, p. 109).

Depois de sintetizar as razões “desta ma-neira de ver as coisas” em uma “lei dodeclínio secular da participação do setoragropecuário”, o autor progressivamentebusca demonstrar os equívocos implícitosna aceitação de tal tendência como orien-

tação absoluta para os estudos de desen-volvimento econômico.

Ao estudarmos o comportamento da agri-cultura, especialmente da agricultura deexportação, durante a década de 1960, fi-cam claros os limites e os equívocos implí-citos na aceitação irrestrita daquela “lei”.A necessidade de se introduzir variáveisindependentes especificamente ‘agrícolas’– tal como a importância do café para ascontas externas do país – acaba por imporo reconhecimento não apenas dos exage-ros da “lei do declínio secular da agricul-tura”, mas também permite que determi-nações fundamentais nas mudanças da tra-jetória da agropecuária brasileira sejam en-contradas a partir da própria dinâmica dosetor agrícola do país.

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89Com o fim da guerra em 1945 e a pro-gressiva reorganização dos mercados, aagricultura brasileira retomou rapidamen-te seu dinamismo produtivo apresentan-do, porém, duas tendências que iriam tor-nar-se cruciais para o entendimento dasdireções futuras do setor: 1) o aumento daprodutividade por hectare dos produtoscultivados para o mercado mundial, comoo café e a cana-de-açúcar, e 2) a crescentemigração da produção de alimentos pararegiões mais distantes dos centros consu-midores, como o CO e o Nordeste. É im-portante ressaltar que, a despeito de a pro-dução de alimentos ter se deslocado paraáreas mais periféricas, com baixa e estag-nada produtividade, aqueles anos foramcaracterizados como tendo produzido ali-mento suficiente para nutrir a crescentepopulação urbana, fato até então inéditona história do país.

Nas áreas mais nobres, com melhores so-los e de mais fácil acesso ao mercado mun-dial, como o Sudeste e especialmente emSão Paulo, a produção de alimentos foisendo progressivamente substituída porculturas para exportação, tendo a regiãorecuperado uma característica que haviasido parcialmente abandonada com a cri-se econômica internacional dos anos 1930,ou seja, a de ser uma região de agricultu-ra preponderantemente exportadora.O deslocamento da produção de alimen-tos para regiões mais distantes, em pro-gresso durante os anos 1950, marcou oinício de uma divisão regional da produ-ção agrícola, em que uma hierarquia delugares e de regiões foi associada a umahierarquia de produtos e de destinação.Como sempre na agricultura brasileira, ocritério utilizado na montagem dessa hie-rarquia foi a expectativa doméstica com

respeito às orientações da economia-mun-do ou, em outras palavras, a dependênciaque o país tinha na demanda agrícola daeconomia-mundo. Em tal redivisão geo-gráfica do trabalho, a região CO passou adesempenhar o papel de fornecedor dealimentos através da adição de novas ter-ras e de nova população rural reprodu-zindo, assim, o “velho” e natural processode incorporação cujo início remontava aoprincípio do século, porém com velocida-de e solidez redobradas.

Resumidamente, então, pode-se afirmarque a principal característica dos anos 1950foi fornecer divisas para o programa deindustrialização substitutiva de importa-ções, ao mesmo tempo em que alimentavaa crescente população urbana através daocupação de novas terras.

A década de 1960, deve-se dizer desde já,não foi particularmente diferente dos anos1950 no que diz respeito à produção parao mercado interno. O crescimento da pro-dução agrícola continuava a ocorrer me-diante a adição de novas terras, e oaprofundamento da especialização agríco-la regional seguiria a mesma direção doapós-guerra.

Por sua vez, o setor agrícola de exporta-ção estava vivendo um momento de radi-cais transformações. A despeito de a agri-cultura ter respondido satisfatoriamenteàs necessidades do mercado doméstico ede ser a única fonte de recursos para sal-dar os compromissos da industrializaçãosubstitutiva de importações (ISI), a cres-cente necessidade cambial para continuaraquela particular política industrializante

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tornou-se demasiado para uma agricultu-ra que havia sido mantida intocada em seusaspectos tradicionais de baixa produtivi-dade e de pouca diversificação. Tão im-portante era a participação da agriculturapara as exportações do Brasil que o valoragrícola exportado, em média, na décadade 1950, foi de 94% do total das exporta-ções do país (INTERNATIONAL..., p.1981-1986). O final do período, no entan-to, apresentava claros sinais de esgotamen-to do modelo substitutivo que, entre ou-tros problemas, indicava uma fragilidadeno setor externo, situação que se tornouaguda no final da década.

Uma discussão detalhada a respeito dacrise do final dos anos 1950 e começo dos1960 vai além dos limites deste trabalho.O que cabe enfatizar, no entanto, é que ogoverno que tomou o poder em 1964,apesar de introduzir uma série de mudan-ças de diagnósticos e nas prioridades daação governamental, não apenas se viuobrigado a reconhecer as extraordináriaspressões sobre o setor externo brasileirocomo ainda incumbiu-o de novas tarefas.

As razões da urgência para aumentar asexportações eram a necessidade de saldaros débitos herdados do períodosubstitutivo de importações e estabeleceras pré-condições para um novo surto deexpansão industrial. O desenho deste novosurto industrializante estava dirigido paraos estratos de mais altas rendas, o que ten-deria a aumentar as importações de pro-dutos e máquinas mais sofisticados, por-tanto, mais caros. Além disso, o aumentodas exportações era indispensável para fa-zer com que a comunidade internacional

acreditasse na eficácia das políticas entãoadotadas.

O problema era que havia muito pouco afazer para estimular o comércio exterior anão ser tentar diversificar as exportaçõesagrícolas, além de promover algumas ma-térias-primas como o minério de ferro. Asexportações brasileiras ainda erampesadamente dependentes de bens primá-rios, como evidenciado a partir do pesodas exportações agrícolas em 1964 (83%).Esse esforço conseguiu fazer ressurgir al-guns produtos agrícolas tradicionais, comoa cana-de-açúcar e o algodão, ao mesmotempo em que procurava adicionar outrosprodutos na pauta de exportações, comoo milho, além das primeiras incursões nomundo da soja.

Nessa mesma época, enquanto o governoestava tentando de todo o modo diversifi-car as exportações, o café estava vivendosua crise final como o principal produtobrasileiro de exportação. Devido a um con-junto complexo de razões, cujo começo re-monta ao início do século XX, estava claroque nenhum esforço reverteria o contínuodeclínio que o produto brasileiro experi-mentava no mercado mundial. A crise desuperprodução não teria fácil solução.Como já havia se tornado evidente paraos tecnocratas do novo governo, as neces-sidades financeiras que o Brasil teria deenfrentar para restabelecer suas conexõescom a economia-mundo ou, como eles ra-cionalizavam, para construir um novomodelo de economia aberta, criariam de-mandas muito superiores ao que a jádanificada economia cafeeira seria capazde suportar. O desafio, portanto, não era

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91apenas diversificar as exportações, mastambém encontrar um conjunto de pro-dutos que pudesse se firmar de modo sig-nificativo e duradouro na pauta de expor-tações do Brasil e que fosse fundado emsólidas vantagens comparativas.

Mesmo reconhecendo que um tratamen-to detalhado do longo processo que cul-minou com a devastadora crise que a ati-vidade cafeeira sofreu no início dos anos1960 vai além dos limites deste trabalho,um breve comentário a respeito dessaquestão torna-se indispensável para o con-junto da nossa argumentação.

Durante a década de 1960, a economiacafeeira sofreu a mais intensa retração desua história, mesmo se a crise dos anos1930 for levada em consideração. A áreaplantada, a produção e o rendimento porhectare sofreram quebras que foram par-cialmente recuperadas apenas em 1981.A área plantada apresentou, em 1970, umrecuo de quase 50%, quando comparadoscom os números alcançados em 1961, en-quanto que a produção total apresentouum declínio ainda mais drástico (a áreatotal caiu de 4.393.836ha em 1961, para2.402.993 em 1970, enquanto que a pro-dução declinou de 4.407.439 toneladas em1961 para 1.509.520 toneladas em 1970)(Estatísticas da Agricultura Brasileira,1990). Frente a um quadro dessa gravida-de, restam duas perguntas: o que aconte-ceu com o café nos anos 1960 e qual foi odestino dado às terras antes ocupadas comcafezais?

Uma resposta resumida à primeira ques-tão poderia ser: o declínio da importância

do café brasileiro no mercado internacio-nal e a conseqüente crise de superprodu-ção – cujo resultado imediato foi a brutalretração comentada acima – se devem, pa-radoxalmente, ao próprio sucesso das po-líticas que mantiveram o Brasil como ogrande produtor mundial de café duran-te a primeira metade século XX.5 De fato,após a supersafra de 1906, com a ameaçade quebra generalizada do setor e a pro-vável desorganização da economia brasi-leira, o Estado não encontrou opção se-não intervir diretamente na oferta do pro-duto, ao mesmo tempo em que procurou,com menos sucesso, controlar a expansãodos cafezais.

A conseqüência dessa política foi, comoesperado, a recuperação do preço inter-nacional do produto, estimulando, porrazões políticas e econômicas, a continua-ção dessa estreita intervenção do Estadonos assuntos do café. Essa convergência deinteresses nas políticas de valorização docafé no Brasil (Estado, produtores,financiadores e exportadores) não apenasreforçou as ingerências estatais no assun-to café como também acabou por familia-rizar os grupos dirigentes no Brasil com anecessidade e, mesmo, eficiência, das in-tervenções do Estado. A tradição maisintervencionista do Estado brasileiro, den-tre todos os Estados latino-americanos,observada na maior parte de nossa histó-ria republicana, em grande medida se de-veu ao sucesso das intervenções no setorcafeeiro. A esse respeito é oportuno lem-brar uma passagem muito ilustrativa deHirschman:

The low price elasticity of short runsupply characteristic of coffee hasinteresting further consequences forpublic policy making. Once the coffee-

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92growing country is ripe forindustrialization, that characteristicmakes it possible for the State to financethe needed infrastructure and tosubsidize the nascent industries by apolicy of squeezing the coffee sector bydirect or indirect taxation. Such a policywould be far less successful if the to-be-squeezed primary product had a higherprice elasticity of short-run supply, asis for example the case for cattle orwheat. [...] With respect to coffee,however, there appears the possibilityfor a truly dialectical sequence: first thespecial production and marketcharacteristics of coffee make for theformation of strong pressure group ofcoffee growers which pushes the Stateinto assuming responsibility forinterference with market forces. As aresult, the State becomes aware of itscapabilities and duties as the maker ofnational economic policy fordevelopment. At a later stage of growth,such a policy will require that incomebe redistributed away from the coffeegrowers and toward other sectors thatneeded to be nurtured. And thisredistribution can be carried out withsuccess because of the verycharacteristics of coffee that originallymade for the vigorous and successfulpressures of the coffee planters on theState (HIRSCHMAN, 1971, p. 11).

No entanto, o sucesso das políticas de va-lorização acabou por estimular outros pa-íses a produzirem café, aproveitando-sedos esforços do Brasil para manter os pre-ços altos no mercado mundial. O resulta-do foi que, nos anos 1930, a participaçãobrasileira satisfazia 52% da demanda mun-dial, enquanto no início do século essaparcela girava entre 75% e 82%.

O fim da Segunda Guerra Mundial e aregularização do comércio mundial trou-xeram de volta o problema da defesa do

café, em um contexto diferente daqueledo início do século. Tornava-se agora fun-damental garantir os rendimentos do se-tor cafeeiro, cujo produto alcançava bompreço no mercado mundial, através docontrole da oferta e da desvalorização cam-bial, de modo a permitir as necessáriastransferências para financiar o processo deindustrialização. Entretanto, a conseqüên-cia geral do processo acabava por ser umacontinuidade do observado em época pre-cedente. Estimulados pelos preços relati-vamente altos no mercado mundial, com-petidores africanos e latino-americanoscontinuavam a se aproveitar de um mer-cado favorável. Com isso, a participaçãodo Brasil no mercado mundial de café con-tinuou a declinar, caindo de 63,5% do va-lor mundial exportado em 1950 para37,3% em 1960.

Devido à importância do produto para ocomércio exterior do Brasil e às aliançasdo pacto político de dominação do perío-do, os produtores, protegidos, continua-vam a aumentar a produção, e a oferta decafé no Brasil não parava de crescer. Anun-ciada em 1959, a crise de superproduçãoe a liquidação do sistema de defesa do caféocorreram no início da década de 1960(DELFIM NETTO, 1981, p. 157).

A opção emergencial de diversificação daoferta de produtos agrícolas exportáveis,produzidos nas terras antes ocupadas comcafé, em São Paulo e no Paraná, tentadapelos tecnocratas do regime instalado em1964, não apresentava garantia segura deconstância e lucratividade tais como as quea atividade cafeeira pudera fornecer atéaquele momento. A pouca solidez da di-versificação das exportações agrícolas dos

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93anos 1960 pode ser demonstrada pelodesempenho das exportações no decênio,que mostra que a participação relativa docafé no total das exportações agrícolas co-meçou a declinar de modo consistente so-mente a partir de 1968, ano em que, pelaúltima vez, as vendas de café representa-ram mais da metade das exportações agrí-colas (IMF-IFS, 1951-1985; IBGE, 1990).

O declínio da participação do café a partirde 1970 reforça o argumento que apontaos últimos anos da década de 1960 comoum período em que começa a haver umamaturação seletiva de novas opções. Osdados sobre o comércio exterior brasilei-ro (IBGE, 1990) não deixam dúvidas arespeito da importância e urgência de seencontrar um substituto dinâmico para ocafé, para suportar um amplo programade modernização econômica, como o in-troduzido no Brasil a partir de 1967. Osdados mostram que nos anos 60 a partici-pação da agricultura nas exportações bra-sileiras representava pouco mais de 80%do total das exportações do país. É bemverdade que tal proporção apresentavaum lento declínio, acelerado a partir de1970. Desse modo, a partir do referencialavaliativo disponível em meados dos anos1960, a diversificação das exportações agrí-colas seria sempre necessária, além de umrápido aumento das exportações agríco-las ser essencial para garantir decisões re-lativas às direções econômicas do país. Essaposição peculiar da agricultura no quadrodas opções econômicas à disposição dosgovernos militares reforça o argumento deque o desenvolvimento da agriculturaapresentava-se como um dos temas estra-tégicos mais importantes para a moldagemdo que viria a ser o “modelo econômico

brasileiro”. E foi nesse contexto que o COfinalmente teve sua chance.

O que poderia estar reservado a uma re-gião que nos anos 1960 continuava a serprodutora de alimentos, embora sem ovigor de crescimento apresentado na dé-cada anterior?

O CO, de fato, apresentou crescimentobem menos espetacular na produção dealimentos, embora possa ser observado sig-nificativo crescimento na área plantada daregião. O problema foi o drástico declíniodo rendimento por hectare, durante osanos 1960. O caso do arroz foiemblemático para a agricultura da região.O índice de rendimento recuou de 100 em1950, para 79.3 em 1960 e para 65.5 em1970. Essa queda do rendimento, de ma-neira geral, explica a perda de dinamis-mo da produção de alimentos da região,fenômeno também verificado com a man-dioca e o milho (Estatísticas da Agricultu-ra Brasileira, 1990).

As razões para a estagnação da produção,em uma região que já se apresentava comoimportante fornecedora de alimentos parao país, provinham de duas vertentes deorigem comum: de um lado, o caráter cam-ponês e as condições tradicionais da pro-dução, e, de outro, a queda dos preços dosprodutos agrícolas.

Lemos e Sevilha (1979, p. 48-49, Anexovii) mostram que a produção de alimen-tos básicos no CO e no Brasil era uma ati-vidade típica de unidades de produçãopequenas ou muito pequenas. Entretan-to, os dados não mostram quais os tiposde relações de produção que preponde-ravam, mesmo reconhecendo que a maio-

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ria da produção provinha de parceiros,ocupantes ou pequenos arrendatários. Emum aspecto, entretanto, aqueles dados nãodeixam dúvida: não se tratava de produ-ção capitalista.

Tudo indica que, exatamente porque essaprodução não era capitalista, é que foipossível a expansão da área cultivada dearroz, mesmo considerando um contextode preços decrescentes como aquele dosanos 1960, época em que o índice de pre-ços do arroz caiu de 103 em 1958-1962para 86 em 1968-1969 (1948-52=100)(NICHOLLS, 1972, p. 150). De fato, ocrescimento do tamanho médio da áreacultivada no CO, mesmo com um drásticodeclínio no rendimento/ha e na taxa decrescimento das colheitas, significava queos produtores tentavam manter o montan-te total do rendimento proporcionadopelo arroz, procurando aumentar a áreaplantada, em um contexto de queda nopreço do produto. Com essa associação daprodução de alimentos com pequenos pro-dutores tornou-se possível entender a ex-pansão física da área cultivada, um cresci-mento importante considerando a quedados preços agrícolas.

A necessidade da expansão física das áre-as de cultivo em um contexto de rendi-mentos decrescentes, como os anos 1960,torna-se mais evidente quando se avalia autilização de insumos agrícolas modernos(fertilizantes e sementes selecionadas). Le-mos e Sevilha (1979) afirmam que as cul-turas de arroz e de feijão quase não utili-zavam fertilizantes e sementes selecionadas(83% em Goiás e 99% no Mato Grosso e85% em ambos os estados não utilizavam

sementes selecionadas em 1970), insumosque não requerem escala de produçãopara se tornarem eficazes na agricultura.Esses números apresentam razoável expli-cação para o declínio do rendimento porhectare da região durante a década, quan-do se considera que novas terras não ne-cessariamente apresentam boa fertilidadee que aquelas supostamente mais antigase mais férteis invariavelmente começam anecessitar de cuidados especiais depois dealgumas colheitas.

Deste modo, a necessidade de aumentaro tamanho da área cultivada para equili-brar as quedas de rendas devido à quedados preços agrícolas parece ser reforçadaquando os recursos naturais (terra) são osúnicos insumos que poderiam ser levadosem consideração no processo de incorpo-ração daquela época (década de 1960).

Se a expansão da área cultivada de arrozocorreu devido à necessidade de compen-sar a queda dos preços agrícolas e do ren-dimento da região, pode-se afirmar quenos defrontamos com uma repetição da-quele tipo tradicional de incorporação cujoinício remonta à virada do século. Se ha-via diferença, esta estava na velocidade enão na forma.

Entretanto, uma mudança qualitativa ra-dical estava em gestação. Alguns autoresacreditam ser possível identificar o mo-mento em que o projeto agropecuário doregime militar foi finalmente concebido,aceito e passou a ser implantado. Ribeiro(1988) afirma que em 1967 o regime mili-tar finalmente adotou a opçãomodernizante para estimular o crescimen-

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95to da produção agrícola brasileira. A oca-sião foi o Primeiro Congresso Nacional daAgricultura, em Brasília, quando os gran-des proprietários impuseram suas posiçõespolíticas a respeito da direção a ser segui-da pelas políticas agrícolas do governo.Naquela oportunidade, os proprietáriosde terras e a tecnocracia governamentalelaboraram um conjunto de sugestões edemandas, aceitas pelos militares, que en-terraram as tímidas propostas de reformara estrutura agrária brasileira através de umprograma de redistribuição de terras. Emvez de uma orientação reformista, que in-tentava implementar as propostas conti-das no Estatuto da Terra, várias medidasforam aprovadas para manter intocada aestrutura agrária e estimular uma “políti-ca de modernização centrada no cresci-mento e diversificação das exportaçõesagrícolas” (RIBEIRO, 1988, p. 91).

As propostas modernizantes eram basea-das principalmente em programas de di-fusão de novas tecnologias, extenso apoiodo Estado (créditos e subsídios) e genero-sos incentivos para promover a pesquisacientífica na agricultura, além de transfe-rir a responsabilidade dos projetos de co-lonização para mãos privadas. O objetivoóbvio daquelas mudanças era aumentar,no mais curto espaço de tempo, a produ-tividade agrícola e acelerar o aumento dosexcedentes externos do país através docrescimento e diversificação das exporta-ções.

O processo de modernização do latifún-dio, que incluía modernização e irrestritautilização de insumos industriais (fertili-zantes, máquinas e pesticidas), a adoção

de novos produtos (soja) e sementes ge-neticamente melhoradas e adaptadas foientendido como sendo um movimento demodernização conservadora porque intro-duzia profundas transformações em umaestrutura agrária deixada intocada comtodas as suas seculares desigualdades.Além disso, o processo de modernizaçãotambém pressupunha a consolidação deuma indústria de insumos agrícolas e acrescente associação das atividades agríco-las com as industriais, fato que culminariacom a organização do Complexo Agro-in-dustrial no Brasil.

Respeitando os limites deste trabalho, se-ria agora oportuno enumerar as principaispolíticas que estimularam esse último mo-vimento do processo de incorporação daregião CO do Brasil. Complementarmen-te, alguns de seus principais efeitos devemser apontados para evidenciar as mudan-ças qualitativas provocadas por esse movi-mento final do processo de incorporaçãodo Brasil central.

A primeira e mais importante das políti-cas do Estado a fazer avançar a ocupaçãoeconômica do CO foi o acesso extrema-mente fácil e atraente de financiamentospara a agropecuária.6 Os dados dos cen-sos agropecuários do Brasil (1970-1985)mostram que a maior parte dos investi-mentos agropecuários feitos na região, noperíodo, foi financiada. Em 1970, a par-cela financiada dos investimentos foi de81%, subindo para 91% em 1975. A partirde então, ou seja, em 1980 e 1985, aquelaproporção recuou para 38% e 40% respec-tivamente. Essa diminuição também pôdeser observada no total dos financiamentos

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agropecuários do país. Entretanto, os mes-mos censos mostram que o CO foi a re-gião menos prejudicada pela diminuiçãoda oferta de dinheiro. A região manteve,em termos proporcionais, a mesma posi-ção na porcentagem de propriedades agrí-colas, entre 5% e 5,5% do total do país,enquanto sua parcela no total dos financi-amentos subiu de 13% para 19%! A partirdesses números é possível afirmar que aregião foi a que menos sofreu com o enco-lhimento da oferta de crédito dos anos1980.

Mesmo considerando que o principal estí-mulo para esse último surto de incorpo-ração tenha sido baseado em crédito sub-sidiado (SZMRECSÁNYI, 1983, p. 235),outros incentivos também muito importan-tes precisam ser lembrados. Incentivos fis-cais e investimentos em infra-estrutura (es-tradas, eletrificação, telefones, silos e ar-mazéns), pesquisa científica e extensãorural desempenharam papéis importantesno pacote de gastos públicos (gastos fede-rais, estaduais e de incontáveis municípiosenvolvidos na atração de novos investi-mentos).

Devido à diversidade de agências públi-cas envolvidas, pode-se imaginar as difi-culdades para estabelecer estimativas ra-zoáveis para uma avaliação precisa daque-les investimentos, em grande parte gene-rosamente transferidos para mãos priva-das. Scheibe (1985, p. 67) avaliou os gas-tos unilaterais do Governo Federal eminfra-estrutura, pesquisa e extensão ruralem US$ 250 milhões até 1983, um núme-ro que Mueller (1990, p. 55) julga supe-restimado. Entretanto, o Polocentro, um

programa de incentivo para a expansãoagrícola do CO, aprovou, entre 1975 e1982, 3.373 projetos de desenvolvimentorural, com um valor total de US$ 630 mi-lhões. Como a área de atuação do progra-ma incluía parte de Minas Gerais (estadoda região Sudeste), o autor afirma que71,3%, de fato, foi para o CO, ou US$ 450milhões (MUELLER, 1990, p. 55).

Além disso, como o crédito só era conce-dido aos proprietários, especialmente osgrandes, deixando de lado posseiros, ocu-pantes e parceiros, a existência de créditotão abundante acabou por provocar doisfenômenos interligados: um aumento daconcentração da propriedade agrícola eum aumento do preço da terra na região(MUELLER, 1990, p. 19; CUNHA et al.,1994, p. 52; IANNI, 1977, p. 79).

Outras duas políticas decisivas para a afir-mação e garantia dos investimentos no COforam: a política de preços mínimos(REZENDE, 1990; CASTRO ; FONSECA,1995; CUNHA et al., 1994) e a unificaçãodo preço dos combustíveis (SILVA, 1989).A política de preços mínimos garantia umretorno mínimo do capital investido, situ-ação que minimizava a incerteza da renta-bilidade do investimento, especialmentenas regiões mais distantes, porque a defi-nição do preço mínimo acompanhava arentabilidade mínima requerida paraaquelas regiões onde os custos de produ-ção eram mais altos. Por sua vez, a unifor-mização dos preços dos combustíveis foiconcebida para manter nacionalmenteuniforme o mais importante insumo deuma agricultura modernizada, o óleo die-sel. Nesse caso, custos iguais para o diesel

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97favoreciam as regiões mais afastadas, por-que não tornavam proibitivos a produçãoe o transporte de grão para os centros con-sumidores ou para os portos.

Esse pacote de incentivos diretos e indire-tos, simultâneos ou sucessivos, fornecidospelo Estado para tornar possível a rápidatransformação do CO em uma área de es-pecial significância agrícola para a econo-mia brasileira foi muito eficaz. No perío-do considerado (1970-1985), o CO foitransformado na região agrícola mais pro-missora do país, tornando-se uma das áre-as de produção de soja mais importantesdo mundo. A região tornou-se cada vezmais comprometida com a produção debens exportáveis, similarmente àquelas deincorporação mais antiga. O CO começoua seguir o padrão tradicional de incorpo-ração regional que o país tem experimen-tado desde há muito tempo, no sentido deque a incorporação agrícola sempre signi-ficou produzir diretamente para o merca-do mundial, quer a partir da organizaçãooriginária de unidades produtivas de ex-portação, quer a partir da substituição deprodução camponesa – esta sim produto-ra de alimentos para o consumo domésti-co – por produção exclusivamente dirigidapara o mercado mundial.

Esse processo intensivo de concentraçãode terra e de investimentos ocorridos noCO produziu, como esperado, importan-tes mudanças nas categorias sociais envol-vidas com a agropecuária na região. Noentanto, dentre os vários movimentos ob-servados, dois podem ser apontados comoos mais importantes. Em primeiro lugar, avisível diminuição dos ocupantes e dos

parceiros, tanto no que se refere ao nú-mero total de estabelecimentos como notamanho médio desses estabelecimentos.Os dados dos censos agropecuários doBrasil mostram que os ocupantes perde-ram, entre 1970 e 1985, metade da áreatotal que ocupavam enquanto que o tama-nho médio dos estabelecimentos diminuiuem 16% no mesmo período. O númerototal de parceiros diminuiu quase 60%entre aqueles anos (49.252 em 1970 e21.293 em 1985).

Inversamente, o crescimento dos assalaria-dos foi de quase três vezes durante aque-les anos, indo de 168.109 em 1970, para470.415, em 1985, quatro vezes mais queo crescimento total da população rural.Essa maciça adição de trabalhadores assa-lariados não proveio totalmente daproletarização dos ocupantes e dos parcei-ros, dado que o incremento de assalaria-dos foi muito maior que a soma daquelasduas categorias. Esse crescimento tão ex-pressivo baseou-se em trabalhadores imi-grantes, itinerantes ou mais permanentes,os bóias-frias.

Finalmente, o que deve ser ainda comen-tado a respeito dessas observações sobreas variações da importância relativa ou atéabsoluta – como a dramática diminuiçãodos ocupantes e dos parceiros ou o impres-sionante crescimento dos trabalhadoresassalariados – de algumas das principaiscategorias ocupacionais do meio rural doCO é que o movimento de radical trans-formação das relações de produção trazi-do pelo processo de incorporação a todocusto, tal como o implementado na região,sob o patrocínio do Estado, esteve longede ser pacífico. Os relatórios e denúnciasda Comissão Pastoral da Terra a respeito

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de incontáveis assassinatos e os 16.442casos de escravidão no Brasil em 1992 sãotestemunhas eloqüentes da extraordiná-ria violência embutida naquele processo(BRUSSI, 1996, p. 351). A propósito daestreita relação entre violência e expan-são capitalista na região, temos umaemblemática afirmação em entrevista con-cedida aos agentes da Pastoral da Terrapelo administrador da fazenda Arizona, noPará.

(A fazenda)... inspecionada de surpre-sa em março de 1990 (e o administra-dor ao ser perguntado) por que manti-nha 150 homens, mulheres e criançasem condições de cativeiro, vítimas demaus tratos físicos e humilhações, de-clarou abertamente: “Se não for dessejeito, não tem como abrir as fazendasno sul do Pará para pastagem e de-senvolvimento da agropecuária”(MERRICK, 1989, p. 47).

CONCLUSÃO

Este trabalho discutiu o processo de incor-poração da região CO do Brasil depois dolongo período de subsistência e isolamen-to que se seguiu à exaustão dos depósitosauríferos da área. A motivação nãopovoadora da exploração colonial, pelomenos no CO, produziu um movimentoentrópico depois do “ciclo do ouro”, queisolou essa região das tênues conexões queoutrora haviam sido estabelecidas com aeconomia-mundo capitalista.

Depois de um longo interregno, o CO co-meçou novamente a ser atado,sistemicamente, ao ininterrupto processode produção de mercadorias, especialmen-te no final do século XIX, com algumasatividades extrativas como o látex e o mate.

O primeiro ponto ressaltado por este tra-balho é que o processo de incorporaçãonão seguiu uma trajetória linear. Ocorreuem surtos, induzido pelo tipo particular deconexões que o Brasil desenvolvia com aeconomia-mundo capitalista. É possível

identificar nos dados da produção agríco-la do CO três desses momentos particula-res que estimularam o desenvolvimento delaços entre a região e a economia-mundo.Foram eles: 1) a crise de 1913 e a PrimeiraGuerra Mundial; 2) a crise dos anos 1930e a Segunda Guerra Mundial e 3) a crisedos anos 1960 e as dificuldades nas contasexternas que o Brasil começou a apresen-tar por aquela época.

Esses três períodos da história brasileirasão similares na medida em que produzi-ram sérias dificuldades econômicas parao país, ainda que também produziram anecessidade e a oportunidade para expan-dir as exportações para superá-las. Emtodos esses momentos, o CO apresentouexpansão em sua produção agrícola, es-treitando os laços com a economia-mun-do capitalista. Deste modo, os movimen-tos da integração econômica da região fun-cionavam como uma reação do país às di-ficuldades externas, ao mesmo tempo emque a adição de novas oportunidades de

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99investimento aparentemente permitia au-mentar as opções econômicas para enfren-tar aquelas dificuldades.

Entretanto, do mesmo modo que a incor-poração ocorria em surtos, também cadaum desses movimentos apresentou inte-ressantes singularidades. As duas primei-ras “ondas” incorporadoras foramdirigidas para a produção de alimentosbásicos, por exemplo, o arroz. Foram avan-ços mais “espontâneos”, porque não senotou a presença do Estado suportando ocrescimento, além das garantias financei-ras para a expansão dos trilhos àquelas pa-ragens. Talvez porque fossem espontâneosé que aqueles movimentos simplesmentereproduziram a estrutura social e econô-mica da produção de alimentos, funda-mentalmente baseadas em atividades“camponesas” (parceiros e ocupantes),cujas unidades de produção eram muitopequenas.

A diferença que se poderia apontar nessesdois primeiros movimentos incor-poradores do CO foi sua intensidade. En-quanto o primeiro apresentou uma expan-são mais curta e limitada, o segundo mos-trou um ímpeto mais longo. Foi duranteesse segundo movimento que Goiás tor-nou-se importante produtor de arroz parao país.

O terceiro surto incorporador, no entan-to, teve uma história completamente dife-rente. Foi intencionalmente organizadopara produzir produtos exportáveis emunidades produtivas muito grandes. Osprocessos de aquisição de terras e produ-ção agrícola foram financiados e promo-vidos pelo Estado, com especial privile-

giamento às grandes propriedades. Ocorolário dessa intervenção particular foiuma mudança radical nas relações de pro-dução, com os parceiros e ocupantes dei-xando de ser importantes categorias so-ciais na região. Foram substituídos por tra-balhadores assalariados, permanentes outemporários. Soma-se a isso o crescimen-to da violência contra camponeses e tra-balhadores, com incontáveis relatos de-nunciando escravidão, intimidação e assas-sinatos.

O que pode ainda ser acrescentado é queo modo como a expansão agrícola foi pro-movida na região, especialmente caso seconsiderem as razões que motivaram aque-le desenvolvimento (considerando quegrande parte delas proveio da urgência emenfrentar dificuldades externas), apontapara uma condição de fragilidade comrespeito ao seu desenvolvimento. O Brasilprecisa do seu território inexplorado, desua reserva de natureza, para tentar superardificuldades econômicas trazidas periodi-camente pelos movimentos cíclicos, querde origem sistêmica quer de natureza maisdoméstica. Esta interpretação é reforçadaquando se menciona a dinâmica das ex-portações do país. Soja e seus derivados,como ração e óleos, estão entre os muitopoucos produtos com os quais o país ain-da apresenta vantagem comparativa como restante da competição mundial. E ocultivo da soja está fortemente concentra-do no CO.

Assim, se a trajetória do desenvolvimentobrasileiro neste século tem estadoconectada ao avanço sobre novas terras,se o padrão brasileiro de desenvolvimen-

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to está atado ao processo de incorporação,então é possível afirmar que a incorpora-ção tem funcionado como um instrumen-to para reforçar a estrutura de domina-ção do país.

Se for assim, torna-se razoável afirmar queenquanto houver terras a serem ocupadas,a estrutura de poder e suas orientaçõespolíticas dificilmente serão mudadas.

NOTAS

1- A região CO é composta dos estados de Goiás,Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Distrito Fede-ral. Até 1988, o atual estado de Tocantins, por serparte do estado de Goiás, fazia parte do CO.Neste estudo, como os dados são anteriores a1988, Tocantins foi considerado como ainda fa-zendo parte de Goiás.

2- A respeito da importância dos estímulos da eco-nomia cafeeira e de seus desdobramentos paraexplicar a expansão econômica da região CO, verEstevam. (1996). Para uma análise a respeito dagrande autonomia da “economia paulista”, verCano (1981).

3- Um sistema-mundo foi definido como: “...a spatiotemporal whole, whose spatial scope is coextensivewith a division of labor among its constituent partsand whose temporal scope extends as long as thedivision of labor continually reproduces the‘world’ as the social whole. A world-economy wasdefined as a world-system not encompassed by asingle political entity. Historically, it wasmaintained, world-economies tended towardsdisintegration or conquest by one group andhence transformation into a world empire – aworld-system encompassed by a single politicalentity. The world-economy that emerged insixteenth century Europe, in contrast, displayedno such tendency. Not only did it survive but itbecame the only world-system – in Wallerstein’sown words – ‘that has ever succeeded inexpanding its outer boundaries to encompass theentire world,’ thereby transforming itself ‘frombeing a world to becoming the historical systemof the world.’” (ARRIGHI, 1997, p. 2) As expres-sões sistema-mundo e economia-mundo foramtraduzidas literalmente de seus correspondentesem inglês world-system e world-economy (dois subs-tantivos em vez do adjetivo seguindo o substanti-

vo como em economia mundial, por exemplo). Oautor dessa terminologia, Immanuel Wallerstein,pretende, com isso, diferenciar suas reflexões deparadigmas mais recentes que utilizam termossistema mundial e economia mundial. O autoresforça-se por demonstrar a necessidade de secompreender o capitalismo não como umsomatório de entidades econômicas nacionais, mascomo um sistema único, supranacional, divididoem múltiplas entidades jurídico-políticas nacio-nais, porém com uma única economia submeten-do cada entidade nacional (estado) à dinâmica ge-ral desse sistema. As distinções políticas, ideológi-cas e metodológicas de tais avaliações são eviden-tes.

4 “A partir de 1915 conseguiu-se diversificar as ex-portações que haviam caído muito devido à fortebaixa dos preços dos produtos tradicionais, prin-cipalmente café e borracha, não só através dasvendas dos produtos industrializados (tecidos dealgodão, açúcar e carnes frigorificadas), mas tam-bém de manganês, algodão madeira e produtosagrícolas alimentícios como arroz, feijão, milho, frutosoleaginosos, etc. A estabilidade dos preços dessesprodutos possibilitou a recuperação da receita deexportações.” (VILLELA; SUZIGAN,1975, p.118).

5 A referência bibliográfica básica a respeito da tra-jetória do café até os anos 1960 desta parte foi otrabalho de Antonio Delfim Netto, citado abaixo.

6 A participação do Estado, através de suas agênciasde financiamento, nunca foi inferior a 70% (em1985) do total do financiamento agrícola no CO,no período 1979-1985. O percentual mais alto sobresponsabilidade estatal ocorreu em 1980, quan-do 90,0% do total dos financiamentos agrícolascorreram por conta do Estado (CensosAgropecuários do Brasil – 1970-1985).

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1017 Os programas de colonização da década de 1940

foram de alcance muito limitado, sem conseqü-ências para a expansão da produção no CO, no

ABSTRACT

This study discusses the process of incorporation of the BrazilianCenter-West region through the evolution and later transformationof the mode of interaction it developed with the overall Brazilianeconomic environment. The study showed that the region’sincorporation did not follow a linear trajectory. It happened inspurts, induced by the particular kind of connection Brazil developedwith the world-economy. It was possible to identify three of theseparticular moments. They were: 1) the crisis of 1913 and the FirstWorld War; 2) the crisis of the 1930s and the Second World War,and 3) the crisis of the 1960s and the external account difficultiesthe country begun to experience in the early 1970s. In all thesemoments, the Center-West tightened its bonds with the world-economythrough the expansion of its agricultural production. The region’seconomic integration worked as the country’s reaction againsteconomic constraints. Thus, Brazil needs to rely on its unexploredterritory, its reserve of nature to try to overcome economic difficulties.

Keywords: occupation, colonization, world-economy.

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RESENHA

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107ECONOMIA

E

POLÍTICA

NA

HISTORIOGRAFIA

BRASILEIRA

TERRA SOB ÁGUA – SOCIEDADE E NATUREZANAS VÁRZEAS AMAZÔNICAS

SMITH, Nigel J. H. - The Amazon River Forest: a natural history of plants, animalsand people. New York: Oxford University Press, 1999. 208p.

JOSÉ AUGUSTO DRUMMOND*

Nigel Smith, geógrafo da University ofFlorida, experiente em pesquisas naAmazônia, escreveu este excelente livrosobre natureza e sociedade nas planíciesde inundação do rio Amazonas e de al-guns de seus principais afluentes em ter-ritório brasileiro. Com menos de 170páginas – bem escritas, fáceis de ler, ele-gantemente formatadas e ilustradas comfotografias originais –, o texto é conciso,solidamente pesquisado e contém aná-lise equilibrada. Smith descreve o coti-diano dos ribeirinhos, discute a conser-vação da natureza e estuda o desenvol-vimento social e econômico na região.A combinação desses níveis de aborda-gem é feliz, e a execução é perfeita.

O texto tem três características notáveis.Em primeiro lugar, Smith focaliza umafatia especial da Amazônia – as várzeas,sujeitas a inundações anuais, nas quaisos processos naturais e sociais têm de seadaptar aos avanços e recuos periódi-cos de volumes torrenciais de água. Asvárzeas totalizam apenas cerca de 10%das terras da Amazônia brasileira, maso seu uso e a sua ocupação são muitomais significativos do que sugere essa

cifra. Na literatura contemporânea sobre aAmazônia, as áreas de terra firme (não-inundáveis) têm recebido atenção muitomaior, especialmente os locais onde existemestradas de rodagem.

Não conheço um livro analítico contempo-râneo que dê ao leitor uma sensação tão exa-ta das particularidades sociais, físicas e bio-lógicas das várzeas amazônicas. O tom deSmith lembra o do clássico de CharlesWagley, Uma comunidade amazônica, emborahaja grande diferença de conteúdo. Smithse interessa muito mais pelos padrões de usodos recursos naturais, enquanto Wagley fo-calizou mais a cultura popular. Mas Smithchega tão perto da vida das pessoas quantoWagley, mostrando, por exemplo, como osmesmos grupos – por vezes os mesmos indi-víduos – usam os recursos distintos das vár-zeas e da terra firme.

Em segundo lugar, o texto de Smith se ba-seia em extenso trabalho de campo. Nasvárzeas isso significa gastar muito tempo,pois depende de viagens em barcos lentos,sem horários fixos e inseguros. Smith reúnemuitos anos de observações sobre o uso derecursos naturais, colhidas em vários pon-

* Ph. D. Professor do Departamento de Ciência Política, UFF. Coordenador do Programa de Avaliação eMonitoramento Ambiental, Programa Piloto para Proteção das Florestas Tropicais no Brasil, Banco Mun-dial

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108tos do médio e baixo Amazonas e dos seusprincipais afluentes. Ele registra usos“bons” e “maus” para a saúde do ambien-te natural, e mais ou menos eficazes emtermos de subsistência e de atendimentoa demandas de mercado. As observaçõese fotos se combinam com o seu bom diá-logo com os caboclos e ribeirinhos e dãoao seu texto um rico tom antropológico.O leitor aprende o que os ribeirinhosplantam e comem, e com que materiaisconstroem suas casas e canoas etc. Osabrangentes conceitos de manejoecossistêmico e de desenvolvimento sus-tentável são assim trazidos no nível bemterreno (e aquático) do cotidiano das vár-zeas amazônicas.

Em terceiro lugar, Smith tem uma visãonão-romantizada dos caboclos e dosamazônidas em geral. Smith não os cons-trói como “bons selvagens”, uma rarida-de na literatura. É estimulante ver umcientista que trata dos povos ribeirinhosda Amazônia como eles são, incluindo asmaneiras pelas quais elas mudaram e con-tinuarão a mudar. Smith não pede que a“tradição” seja “defendida” contra “for-ças externas”. Os caboclos retratados porSmith aparecem como uma gente forte,que tanto se aferra a “tradições” quantoadota “modernidades”, como qualquergrupo social que queira sobreviver a mu-danças sociais aceleradas. Eles nada têmde vítimas. Embora Smith reconheça queos estilos de vida dos caboclos ajudam apreservar e até a enriquecer abiodiversidade, ele não coloca nos seusombros a opressiva missão de se porta-rem como “bons selvagens” para prote-ger a natureza amazônica para o restan-te da humanidade.

Isso permite que Smith observe as práticasdos caboclos de forma equilibrada. Por isso,ele presta muita atenção a uma questão queconsidero crucial: as adaptações dos cabo-clos a oportunidades de mercado. Emborao autor seja favorável a esquemas de “ma-nejo comunitário de recursos”, geralmen-te com a ajuda de atores externos, Smithdestaca corretamente que muitos dessesatores externos “[...] tendem a supor queas comunidades são anticapitalistas, quan-do na verdade existe pouca evidência dis-so na Amazônia brasileira. Pelo contrário,ainda estou por conhecer uma família defazendeiros ou de pescadores que não seinteresse por ganhar dinheiro” (p. 159). Aonão idealizar os habitantes, Smith enxergamais e melhor que a maioria dos estudio-sos contemporâneos da Amazônia.

No entanto, Smith não vai ao extremo opos-to de se “desencantar” com os amazônidas.Muito pelo contrário. Logo à página 4, elediz que a sua “mensagem” é “[...] que abiodiversidade é um recurso essencial paraa adaptação dos sistemas agrícolas às con-dições em transformação da ecologia e daeconomia, e que o conhecimento local é umrecurso muitas vezes ignorado para o ma-nejo e conservação dos recursos biológicos[da região amazônica]”. A proposta básicade Smith é a intensificação dos usos huma-nos nas partes já ocupadas da Amazônia,com base na biodiversidade e no conheci-mento local existentes. Com o mesmo rea-lismo, Smith descarta a viabilidade de in-terrupção total das atividades atuais e doestabelecimento de reservas que excluamtotalmente os ribeirinhos. O autor argu-menta que a população das várzeas ama-zônicas “[...] aprendeu não apenas a convi-

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109ver com as variações sazonais dos níveisdas águas, mas a se adaptar às mudançasconstantes na configuração das terras” (p.7). Uma mistura de tradição e adaptaçõesmodernas a demandas de mercado per-mite que essas pessoas extraiam recursosnaturais e atinjam níveis de vida razoáveis.Tanto a extração quanto os níveis de vidapodem ser melhorados sem que se recor-ra à extensificacão das atividades atuais, esem que se adotem receitas agronômicasinadequadas.

Smith lembra que a maioria das políticas emedidas recentes no sentido de desenvol-ver a Amazônia se concentrou em áreasde terra firme, onde muitas vezes chegammultidões de migrantes atraídos pela faci-lidade de acesso rodoviário e pela promes-sa de terras fartas e baratas. As várzeas,alcançáveis quase exclusivamente por viafluvial, têm recebido muito menosmigrantes e muito menos atenção dos ana-listas. Mesmo com a pressão demográficamenor, Smith argumenta que chegou ahora de olhar para o desenvolvimento dasvárzeas, empregando uma “mistura depesquisa científica e conhecimento indíge-na, para [aumentar] a produtividadeagrícola”(p. 9). Este é, digamos, o eixopropositivo do livro.

O Capítulo 3, “Uma cornucópia florestal”,é o mais marcante do livro. Nele Smithfaz uma rica etnografia sobre como os po-vos das várzeas usam os recursos naturaislocais. Ele produz algo como uma clássicaetnografia da “cultura material”, instru-mento ou gênero que infelizmente os an-tropólogos parecem praticar cada vezmenos. Smith mostra como são obtidos e

usados dúzias de produtos naturais encon-trados nas várzeas: frutas, nozes, semen-tes, raízes, cascas, fibras, peixes, animaisterrestres, aves. Ele destaca o contexto dealta variabilidade biológica e genética des-ses recursos. O fruto da palmeira açaí, porexemplo, é seguido por Smith, desde suacoleta em remotos terrenos inundados, seutransporte em pequenos barcos, sua ven-da a varejo e a atacado em feiras, seuprocessamento industrial em pequenasoficinas, chegando até as pequenas lojas elanchonetes que oferecem bebidas, docese sobremesas feitas do açaí. Com menosdetalhes, Smith faz o mesmo com os fru-tos de outras palmeiras (buriti, caraná,tucumã, bacuri etc.), leguminosas, arroz,sementes de árvores e arbustos (usadascomo isca para a pesca ou como alimentopara animais domésticos). Aprendemostambém como certas árvores são planta-das ou protegidas para prover materiaisde construção, lenha e fibras. Compare-cem também algumas plantas com usosmedicinais. Para cada espécie, Smith for-nece informações sobre origem, local deocorrência natural, usos, técnicas de culti-vo e proteção contra incêndios e animaisherbívoros.

Smith trata também da mais famosa dasquestões ambientais amazônicas – odesmatamento. Ele critica o ideal de vár-zeas desmatadas, defendido por algunsagrônomos, planejadores, governantes efazendeiros. O desmatamento ao longo dasestradas na terra firme chama muito maisa atenção, mas a verdade é que existemtrechos bem grandes de várzeas parcial ouinteiramente desmatados por operaçõesmadeireiras que não dependem de estra-

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das. Smith mostra que a agropecuária devárzea pode conviver com uma coberturaflorestal relativamente densa, mas admiteque “em última instância pode-se ter lu-cro de curto prazo cortando as florestas[de várzea] de uma forma insustentável”(p. 81-82). Ao mesmo tempo, ele destacaque algumas propriedades praticam diver-sas formas de manejo agroflorestal. As-sim, muitas propriedades exibem umacolcha de retalho de remanescentes demata nativa, árvores e arbustos plantados,pastos, canteiros de culturas diversas ehortas domésticas.

O Capítulo 4 é também notável, pela for-ma equilibrada com que Smith trata dacriação de gado, outro “vilão” comum nosestudos sobre a Amazônia contemporânea.De há muito se cria gado nas várzeas ama-zônicas, mas apenas nas últimas décadasos rebanhos aumentaram a ponto de exi-gir grandes pastagens. Principalmente apartir da década de 1960, com a introdu-ção do gado bubalino (búfalos), mais e maisvárzeas foram desmatadas para abrigar osrebanhos crescentes.

Smith mantém seu realismo: a criação degado nas várzeas não vai desaparecer. Paraos criadores, bois e vacas representam “ati-vos líquidos”, dão prestígio social, servemcomo poupança em ambiente inflacioná-rio, e dão pouco trabalho (p. 97). Algunscriadores, mesmo pequenos, ganham di-nheiro com laticínios. Outro fator nadadesprezível é que os ribeirinhos apreciama carne bovina. Smith conclui que “búfa-los e o gado bovino poderão continuar adar uma contribuição valiosa para a eco-nomia regional da Amazônia, mas as prá-

ticas de manejo terão que mudar de for-ma a reduzir a destruição de cultivos e doambiente natural”(p. 99). Na página 101,Smith defende também a adoção de ani-mais domésticos menores, “mais amigá-veis” no tocante às florestas, como cabras,porcos, perus e galinhas, e mesmo a cria-ção de alguns animais nativos, como acapivara, patos e tartarugas, de forma adiversificar as fontes de proteína e redu-zir a pressão dos pastos sobre as florestas.

O Capítulo 5 examina várias formas deagricultura, apesar do fato de que “no todoa produção agrícola não é um fator signi-ficativo no desmatamento das várzeas”(p. 112). Smith faz um breve histórico donão muito conhecido ciclo da juta, plantaasiática introduzida nas várzeas amazôni-cas para fornecer matéria-prima para a sa-caria de alimentos em granel. O ciclo,iniciado em 1931, teve o seu ponto alto nadécada de 1960, chegando ao fim na dé-cada de 1980, por causa da concorrênciade fibras sintéticas. Smith registra muitaspropriedades cujas hortas produzem to-mates, melões, melancias, pepinos, cebo-las etc. para consumidores de cidades pró-ximas. Os produtores ganham um dinhei-ro rápido e seguro, mas freqüentementehá o custo do uso inadequado de pesticidase aditivos químicos.

Essas culturas, juntamente com as de man-dioca, arroz, abóboras e milho, são enca-radas por Smith como valiosos bancos dediversidade biológica e genética e de téc-nicas de cultivo. Suas variedades rústicasdevem ser estudadas por cientistas. Porexemplo, Smith registrou pessoalmente 79variedades de mandioca brava cultivadas

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111na várzea, algumas das quais sem sequerum nome popular preciso. Ele calcula quena bacia amazônica como um todo devamexistir talvez mil variedades de mandiocabrava e doce sob cultivo.

No Capítulo 6, Smith trata especificamen-te da questão da biodiversidade presentenos cultivos de várzea. Ele registra núme-ros altíssimos de espécies cultivadas ouprotegidas em simples hortas domésticas.Há até árvores nativas pouco conhecidas,indicando que a curiosidade e a opero-sidade dos ribeirinhos continua a selecio-nar plantas para cultivo. Ele registra ain-da os potenciais de atividades como a cria-ção de peixes e tartarugas em cativeiro, eda criação de abelhas de várias espécies.Na página 149, o autor faz um apelo pormais pesquisa agroflorestal nas várzeas,destacando que “nenhum modelo ou con-figuração única de manejo agroflorestal éapropriada para toda a extensão do rio[Amazonas]. A heterogeneidade ambientale as variáveis condições culturais e de mer-cado impedem que se faça um único mo-delo para o desenvolvimento”.

O Capítulo 7 conecta breve e agudamen-te as informações dos capítulos anteriorescom as questões mais gerais da preserva-ção da natureza e do desenvolvimento re-gional. Smith de novo discorda das análi-ses convencionais ao propor que, além dosprogramas de “manejo comunitário derecursos”, “[...] uma grande ênfase deveser dada ao trabalho com o setor privadopara alcançar a meta de conservar e usarmelhor a biodiversidade da região”(p. 158). Na página 159, ele afirma corre-tamente que

[um] esforço baseado em mecanismosde comando e controle do governo cen-tral para aplicar a legislação ambientalse mostrou em grande parte ineficaz,pelo menos nas áreas rurais da Amazô-nia. Ao invés de punir indivíduos eempresas que cortem florestas nas suaspropriedades, deveria se oferecer in-centivos para estimulá-los a conservaras florestas.

Smith assim reconhece as limitações da-quele que ainda é o modo preferido deabordar as questões ambientais entre ospesquisadores e ambientalistas, brasileirosou não – “louve-se a comunidade e pu-nam-se os fazendeiros”. Essa fórmula temde fato tido pouco sucesso na Amazônia.

Outras propostas polêmicas – embora euconcorde com todas elas – de Smith são:pesquisa aplicada sobre biodiversidade esua conservação; intensificação da agricul-tura de várzea; a introdução de culturas,variedades e animais domésticos de outrasregiões; a garantia de direitos pelo desen-volvimento e uso de recursos para as po-pulações locais; democratização do crédi-to. O texto conclui com diversos apêndi-ces contendo os nomes científicos e comunsde plantas cultivadas em lotes e hortas. Háainda boas sugestões para leituras especí-ficas.

Enfim, o livro é excelente. Contém exten-sa pesquisa original, é bem escrito e ilus-trado, e situa bem o leitor na complexida-de das várzeas amazônicas. Pode ser lidocomo um introdução a questões ambientaise desenvolvimentistas da Amazônia, ou deregiões tropicais em geral. No entanto, étão bem organizado que serve tambémpara discussões avançadas sobre questões

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amazônicas, e até para cursos intensivos eworkshops. Smith tem, acima de tudo, umponto de vista sóbrio sobre os amazônidasdas várzeas. É um alívio ler este livro deSmith, no contexto de tantos textos que

apresentam os amazônidas como “bonsselvagens” (a comunidade), ou como “des-truidores da natureza” (empresários e fa-zendeiros), e que tentam nos convencerque os vastos ecossistemas da Amazôniaestão a um passo da destruição.

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RELAÇÃO DE DISSERTAÇÕES DEFENDIDAS NOPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EMANTROPOLOGIA E CIÊNCIA POLÍTICA

CURSO DE MESTRADO EM ANTROPOLOGIACURSO DE MESTRADO EM ANTROPOLOGIACURSO DE MESTRADO EM ANTROPOLOGIACURSO DE MESTRADO EM ANTROPOLOGIACURSO DE MESTRADO EM ANTROPOLOGIA

1 TÍTULO: Um abraço para todos os amigosAutor: Antonio Carlos Rafael BarbosaOrientador: Prof. Dr. José Carlos RodriguesData da Defesa: 16/1/97

2 TÍTULO: A produção social da morte e morte simbólica empacientes hansenianos

Autor: Cristina Reis MaiaOrientador: Prof. Dr. José Carlos RodriguesData da Defesa: 2/4/97

3 TÍTULO: Práticas acadêmicas e o ensino universitário: umaetnografia das formas de consagração e transmissão dosaber na universidade.

Autor: Paulo Gabriel Hilu da Rocha PintoOrientador: Prof. Dr. Roberto Kant de LimaData da Defesa:16/6/97

4 TÍTULO: “Dom”, “iluminados” e “figurões”: um estudo sobre arepresentação da oratória no Tribunal do júri do Rio deJaneiro.

Autor: Alessandra de Andrade RinaldiOrientador: Prof. Dr. Luiz de Castro FariaData da Defesa: 3/1/97

5 TÍTULO: Mudança ideológica para a qualidadeAutor: Miguel Pedro Alves CardosoOrientador: Profª. Drª. Livia Neves BragançaData da Defesa: 7/10/97

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6 TÍTULO: Culto rock a Raul Seixas : sociedade alternativa entrerebeldia e negociação

Autor: Monica BuarqueOrientador: Prof. Dr. José Carlos RodriguesData da Defesa: 19/12/97

7 TÍTULO: A cavalgada do santo guerreiro: duas festas de São Jorgeem São Gonçalo/Rio de Janeiro

Autor: Ricardo Maciel da CostaOrientador: Prof. Dr. Roberto Kant de LimaData da Defesa: 23/12/97

8 TÍTULO: A loucura no manicômio judiciário: a prisão como terapia,o crime como sintoma, o perigo como verdade

Autor: Rosane Oliveira CarreteiroOrientador: Prof. Dr. Roberto Kant de LimaData da Defesa: 6/2/98

9 TÍTULO: Articulação casa e trabalho: migrantes “nordestinos” nasocupações de empregada doméstica e empregados deedifício.

Autor: Fernando Cordeiro BarbosaOrientador: Profa Dra Delma Pessanha NevesData da Defesa: 4/3/98

10 TÍTULO: Entre “modernidade” e “tradição”: a comunidadeIslâmica de Maputo.

Autor: Fátima Nordine MussaOrientador: Prof. Dr. Marco Antonio da Silva MelloData da Defesa: 11/3/98

11 TÍTULO: Os interesses sociais e a sectarização da doençamental

Autor: Cláudio Lyra BastosOrientador: Prof. Dr. Marco da Silva MelloData da Defesa: 21/5/98

12 TÍTULO: Programa médico de família: mediação e reciprocidadeAutor: Gláucia Maria Pontes MouzinhoOrientador: Profa Dra Simoni Lahud GuedesData da Defesa: 24/5/99

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13 TÍTULO: O império e a rosa: estudo sobre a devoção do EspíritoSanto

Autor: Margareth da Luz CoelhoOrientador: Prof. Dr. Arno VogelData da Defesa: 13/7/98

14 TÍTULO: Do malandro ao marginal: representações dospersonagens heróis no cinema brasileiro

Autor: Marcos Roberto MazaroOrientador: Profª. Drª. Livia Neves BarbosaData da Defesa: 30/10/98

15 TÍTULO: Prometer – cumprir: princípios morais da política :um estudo de representações sobre a política construídaspor eleitores e políticos

Autor: Andréa Bayerl MongimOrientador: Profª. Drª. Delma Pessanha NevesData da Defesa: 21/1/99

16 TÍTULO: O simbólico e o irracional: estudo sobre sistemas depensamento e separação judicial

Autor: César Ramos BarretoOrientador: Prof. Dr. José Carlos RodriguesData da Defesa: 10/5/99

17 TÍTULO: Em tempo de conciliaçãoAutor: Angela Maria Fernandes Moreira LeiteOrientador: Prof. Dr. Roberto Kant de LimaData da Defesa: 15/7/99

18 TÍTULO: Negros, parentes e herdeiros: um estudo da reelaboraçãoda identidade étnica na comunidade de Retiro, SantaLeopoldina – ES

Autor: Osvaldo Marins de OliveiraOrientador: Profa Dra Eliane Cantarino O’DwyerData da Defesa: 13/8/99

19 TÍTULO: Sistema da sucessão e herança da posse habitacionalem favela

Autor: Alexandre de Vasconcellos WeberOrientador: Profa Dra Delma Pessanha NevesData da Defesa: 25/10/99

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20 TÍTULO: E no samba fez escola: um estudo de construção socialde trabalhadores em escola de samba

Autor: Cristina Chatel VasconcellosOrientador: Profa Dra Simoni Lahud GuedesData da Defesa: 5/11/99

21 TÍTULO: Cidadãos e favelados: os paradoxos dos projetos de(re)integração social

Autor: André Luiz Videira de FigueiredoOrientador: Profa Dra Delma Pessanha NevesData da Defesa: 19/11/99

22 TÍTULO: Da anchova ao salário mínimo: uma etnografia sobreinjunções de mudança social em Arraial do Cabo/RJ

Autor: Simone Moutinho PradoOrientador: Prof. Dr. Roberto Kant de LimaData da Defesa: 25/2/2000

23 TÍTULO: Pescadores e surfistas: uma disputa pelo uso do espaçoda Praia Grande

Autor: Delgado Goulart da CunhaOrientador: Prof. Dr. Roberto Kant de LimaData da Defesa: 28/2/2000

24 TÍTULO: Produção corporal da mulher que dançaAutor: Sigrid HoppeOrientador: Prof. Dr. Marco Antonio da Silva MelloData da Defesa: 27/4/2000

25 TÍTULO: A produção da verdade nas práticas judiciáriascriminais brasileiras: uma perspectiva antropológica deum processo criminal

Autor: Luiz Eduardo de Vasconcellos FigueiraOrientador: Prof. Dr. Roberto Kant de LimaData da Defesa: 21/9/2000

26 TÍTULO: Campo de força: sociabilidade numa torcidaorganizada de futebol

Autor: Fernando Manuel Bessa FernandesOrientador: Profa Dra Simoni Lahud GuedesData da Defesa: 22/9/2000

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27 TÍTULO: Reservas extrativistas marinhas: uma reforma agráriano mar? Uma discussão sobre o processo deconsolidação da reserva extrativista marinha de Arraialdo Cabo/RJ

Autor: Ronaldo Joaquim da Silveira LobãoOrientador: Prof. Dr. Roberto Kant de LimaData da Defesa: 29/11/2000

28 TÍTULO: Patrulhando a cidade: o valor do trabalho e aconstrução de esterótipos em um programa radiofônico

Autor: : Edilson Marcio Almeida da SilvaOrientador: Profa Dra Simoni Lahud GuedesData da Defesa: 8/12/2000

CURSO DE MESTRADO EM CIÊNCIA POLÍTICACURSO DE MESTRADO EM CIÊNCIA POLÍTICACURSO DE MESTRADO EM CIÊNCIA POLÍTICACURSO DE MESTRADO EM CIÊNCIA POLÍTICACURSO DE MESTRADO EM CIÊNCIA POLÍTICA

29 TÍTULO: Gestão da educação municipal: a administração doPartido dos Trabalhadores no município de Angra dos Reis

Autor: Claudio BatistaOrientador: Prof. Dr. José Ribas VieiraData da Defesa: 17/10/97

30 TÍTULO: Utopia revolucionária versus realismo político: o dilemados partidos socialistas na ótica dos dirigentes do PTfluminense

Autor: Gisele dos Reis CruzOrientador: Profa Dra Maria Celina D’AraujoData da Defesa: 7/11/97

31 TÍTULO: Relação ONG – Estado: o caso ABIAAutor: Jacob Augusto Santos PortelaOrientador: Profa Dra Maria Celina D’AraujoData da Defesa:18/11/97

32 TÍTULO: Reforma do Estado e política de telecomunicações: oimpacto das mudanças recentes sobre a EMBRATEL

Autor: José Eduardo Pereira FilhoOrientador: Profª. Drª. Livia Neves BarbosaData da Defesa: 18/12/97

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33 TÍTULO: Entre a disciplina e a política: Clube Militar(1890 – 1897)

Autor: Claudia Torres de CarvalhoOrientador: Prof. Dr. Celso CastroData da Defesa: 19/12/97

34 TÍTULO: Associativismo Militar no Brasil: 1890/1940Autor: Tito Henrique Silva QueirozOrientador: Prof. Dr. Ari de Abreu SilvaData da Defesa: 22/12/97

35 TÍTULO: Escola de Guerra Naval na formação dos oficiaissuperiores da Marinha de Guerra do Brasil

Autor: Sylvio dos Santos ValOrientador: Profa Dra Maria Antonieta Parahyba LeopoldiData da Defesa: 6/2/98

36 TÍTULO: O Poder Legislativo reage : a importância das comissõespermanentes no processo legislativo brasileiro

Autor: Ygor Cervásio Gouvea da SilvaOrientador: Prof. Dr. Fabiano Guilherme Mendes dos SantosData da Defesa: 13/8/98

37 TÍTULO: A experiência do Itamaraty de 84 a 96 : entre a tradiçãoe a mudança

Autor: Joana D’Arc Fernandes FerrazOrientador: Prof. Dr. Ari de Abreu SilvaData da Defesa: 15/9/98

38 TÍTULO: Centrais Sindicais e SindicatosAutor: Fernando Cesar Coelho da CostaOrientador: Profa Dra Maria Celina Soares D’AraujoData da Defesa: 16/11/98

39 TÍTULO: A dimensão política da família na sociedade brasileira:o conflito de representações

Autor: Guiomar de Lemos FerreiraOrientador: Prof. Dr. Gisalio Cerqueira FilhoData da Defesa: 15/12/98

Sem título-9.pmd 14/12/2007, 12:23118

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Antropolítica Niterói, n. 8, p. 113–120, 1. sem. 2000

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40 TÍTULO: A OMS, o Estado e a Legislação contrária ao tabagismo:os paradoxos de uma ação

Autor: Mauro Alves de AlmeidaOrientador: Prof. Dr. Ari de Abreu SilvaData da Defesa: 21/12/98

41 TÍTULO: Violência e racismo no Rio de JaneiroAutor: Jorge da SilvaOrientador: Prof. Dr. Roberto Kant de LimaData da Defesa: 23/12/98

42 TÍTULO: Novas democracias: as visões de Robert Dahl GuillermoO’Donnel e Adam Przeworski

Autor: Jaime BaronOrientador: Profa Dra Maria Antonieta Parahyba LeopoldiData da Defesa: 16/7/99

43 TÍTULO: Conselho Tutelar: a participação popular na construçãoda cidadania da criança e do adolescente em Niterói – RJ

Autor: Maria das Graças Silva RaphaelOrientador: Prof. Dr. Ari de Abreu SilvaData da Defesa: 13/12/1999

44 TÍTULO: O Legislativo Municipal no contexto democráticobrasileiro: um estudo sobre a dinâmica legislativa daCâmara Municipal de Nova Iguaçu

Autor: Otair Fernandes de OliveiraOrientador: Prof. Dr. Ari de Abreu SilvaData da Defesa: 20/12/1999

45 TÍTULO: A gerência do pensamentoAutor: Cláudio Roberto Marques GurgelOrientador: Prof. Dr. Gisálio Cerqueira FilhoData da Defesa: 8/2/2000

46 TITULO: Violência no Rio de Janeiro: a produção racional domal – a produção legal sobre segurança pública naAssembléia Legislativa do Rio de Janeiro

Autor: Fabiano Costa SouzaOrientador: Prof. Dr. Gisálio Cerqueira FilhoData da Defesa: 9/2/2000

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47 TÍTULO: As idéias de direito no Brasil seiscentista e suasrepercussões no exercício e na justificativa do poderpolítico

Autor: Ana Patrícia Thedin CorrêaOrientador: Prof. Dr. Gisálio Cerqueira FilhoData da Defesa: 8/6/2000

48 TÍTULO: Agência brasileira de inteligência: gênese eantecedentes históricos

Autor: Priscila Carlos Brandão AntunesOrientador: Profa Dra Maria Celina Soares D’AraujoData da Defesa: 25/8/2000

49 TÍTULO: Dilemas da reforma da saúde no Brasil frente àglobalização financeira: implementando adescentralização do sistema público e a regulação dosistema privado de saúde

Autor: Ricardo Cesar Rocha da CostaOrientador: Profa Dra Maria Antonieta Parahyba LeopoldiData da Defesa: 22/9/2000

50 TÍTULO: Entre o bem-estar e o lucro: histórico e análise daresponsabilidade social das empresas através dealgumas experiências selecionadas de balanço social

Autor: Ciro Valério Torres da SilvaOrientador: Prof. Dr. Eduardo Rodrigues GomesData da Defesa: 23/10/2000

51 TÍTULO: Os empresários da educação e o sindicalismopatronal: os sindicatos dos estabelecimentos privadosde ensino no estado do Rio de Janeiro

Autor: Marcos Marques de OliveiraOrientador: Profa Dra Maria Celina Soares D’AraújoData da Defesa: 14/12/2000

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Revista AntropolíticaRevista AntropolíticaRevista AntropolíticaRevista AntropolíticaRevista Antropolítica /Artigos publicados /Artigos publicados /Artigos publicados /Artigos publicados /Artigos publicados

Revista no 1– 2o semestre de 1996

Artigos

Brasil: nações imaginadasJosé Murilo de Carvalho

Brasileiros e argentinos em Kibbutz: a diferença continuaSonia Bloomfield Ramagem

Mudança social: exorcizando fantasmasDelma Pessanha Neves

Ostras e pastas de papel: meio ambiente e a mão invisível do mercadoJosé Drummond

Conferências

Algumas considerações sobre o estado atual da antropologia no BrasilOtávio Velho

That deadly pyhrronic poison a tradição cética e seu legado para a teoriapolítica modernaRenato Lessa

Resenha

Uma antropologia no plural: três experiências contemporâneas. MarisaG. PeiranoLaura Graziela F. F. Gomes

Revista no 2 – 1o semestre de 1997

Artigos

Entre a escravidão e o trabalho livre: um estudo comparado de Brasil eCuba no século XIXMaria Lúcia Lamounier

O arco do universo moralJoshua Cohen

A posse de Goulart: emergência da esquerda e solução de compromissoAlberto Carlos de Almeida

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In corpore sano: os militares e a introdução da educação física no BrasilCelso Castro

Neoliberalismo, racionalidade e subjetividade coletivaJosé Maurício Domingues

Do “retorno do sagrado” às “religiões de resultado”: para umacaracterização das seitas neopentecostaisMuniz Gonçalves Ferreira

Resenhas

As noites das grandes fogueiras – uma história da coluna Prestes,Domingos MeirelesJosé Augusto Drummond

Os sertões: da campanha de Canudos, Euclides da Cunha; o sertãoprometido: massacre de Canudos no nordeste brasileiro, Robert M.LevineTerezinha Maria Scher Pereira

Revista no 3 – 2o semestre de 1997

Artigos

Cultura, educação popular e escola públicaAlba Zaluar e Maria Cristina Leal

A política estratégica de integração econômica nas AméricasGamaliel Perruci

O direito do trabalho e a proteção dos fracosMiguel Pedro Cardoso

Elites profissionais: produzindo a escassez no mercadoMarli Diniz

A “Casa do Islã”: igualitarismo e holismo nas sociedades muçulmanasPaulo Gabriel Hilu da Rocha Pinto

Quando o amor vira ficçãoWilson Poliero

Resenha

Nós, cidadãos, aprendendo e ensinando a democracia, de Maria

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Conceição D’Incao e Gerard Roy, a narrativa de uma experiência depesquisaAngela Maria Fernandes Moreira Leite

Revista no 4 – 1o semestre de 1998

Artigos

Comunicação de massa, cultura e poderJosé Carlos Rodrigues

A sociologia diante da globalização: possibilidades e perspectivas dasociologia da empresaAna Maria Kirschner

Tempo e conflito: um esboço das relações entre as cronosofias deMaquiavel e AristótelesRaul Francisco Magalhães

O embate das interpretações: o conflito de 1858 e a lei de terrasMárcia Maria Menendes Motta

Os terapeutas alternativos nos anos 90: uma nova profissão?Fátima Regina Gomes Tavares

Resenha

Auto-subversãoGisálio Cerqueira Filho

Revista no 5 – 2o semestre de 1998

Artigos

Jornalistas: de românticos a profissionaisAlzira Alves de Abreu

Mudanças recentes no campo religioso brasileiroCecília Loreto Mariz e Maria das Dores Campos Machado

Pesquisa antropológica e comunicação intercultural: novas discussõessobre antigos problemas.José Sávio Leopoldi

Três pressupostos da facticidade dos problemas públicos ambientaisMarcelo Pereira de Mello

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Duas visões acerca da obediência política: racionalidade e conservadorismoMaria Celina D’Araujo

Revista no 6 – 1o semestre de 1999

Artigos

Palimpsestos estéticos y espacios urbanos: de la razón práctica a la razónsensibleJairo Montoya Gómez

Trajetórias e vulnerabilidade masculinaCeres Víctora e Daniela Riva Knauth

O sujeito da “psiquiatria biológica” e a concepção moderna de pessoaJane Araújo Russo, Marta F. Henning

Os guardiães da história: a utilização da história na construção de umaidentidade batista brasileiraFernando Costa

A escritura das relações sociais: o valor cultural dos “documentos” paraos trabalhadoresSimoni Lahud Guedes

A Interdisciplinaridade e suas (im)pertinênciasMarcos Marques de Oliveira

Revista no 7 – 2o semestre de 1999

Artigos

Le geste pragmatique de la sociologie française. Autour des travaux deluc boltanski et laurent thévenotMarc Breviglieri e Joan Stavo-Debauge

Economia e política na historiografia brasileiraSonia Regina de Mendonça

Os paradoxos das políticas de sustentabilidadeLuciana F. Florit

Risco tecnológico e tradição: notas para uma antropologia do sofrimentoGlaucia Oliveira da Silva

Trabalho agrícola: gênero e saúdeDelma Pessanha Neves

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Resumo das publicações recentes dosResumo das publicações recentes dosResumo das publicações recentes dosResumo das publicações recentes dosResumo das publicações recentes dosprofessores do colegiado do PPGACPprofessores do colegiado do PPGACPprofessores do colegiado do PPGACPprofessores do colegiado do PPGACPprofessores do colegiado do PPGACP

Os fornecedores de cana eOs fornecedores de cana eOs fornecedores de cana eOs fornecedores de cana eOs fornecedores de cana eo Estado intervencionistao Estado intervencionistao Estado intervencionistao Estado intervencionistao Estado intervencionistaDELMA PESSANHA GOMES

1997. 384 P.

A autora apresenta contribuições aindapouco discutidas pelos antropólogos, aoconsiderar a especificidade da experiên-cia social e política dos fornecedores decana. Apresenta, também, com incomumriqueza de detalhes e sob uma instigantedémache antropolítica, o processo de cons-trução social e política dos fornecedoresde cana.

Devastação e preservaçãoDevastação e preservaçãoDevastação e preservaçãoDevastação e preservaçãoDevastação e preservaçãoambiental no Rio de Janeiroambiental no Rio de Janeiroambiental no Rio de Janeiroambiental no Rio de Janeiroambiental no Rio de JaneiroJOSÉ AUGUSTO DRUMMOND

1997. 306 P.

Narra e avalia os diferentes usos que asterras florestadas fluminenses sofreram,desde os anônimos povos indígenas cons-trutores dos sambaquis até a moderna ca-feicultura comercial. As características na-turais e sociais de cada um dos parquesnacionais fluminenses – Itatiaia, Serra dosÓrgãos, Tijuca e Serra da Bocaina – tam-bém são analisadas nesta obra.

A predação do socialA predação do socialA predação do socialA predação do socialA predação do socialARI DE ABREU SILVA

1997. 308 P.

Focaliza conseqüências de decisões políti-cas na área social brasileira, em particular,

no setor sanitário, analisando os efeitos dosgastos definidos para a área. Consiste emexplicar por que o processo político brasi-leiro caracteriza-se como altamente pre-datório, dilapidador e ineficiente com re-lação aos gastos públicos em geral.

Assentamento rural: reformaAssentamento rural: reformaAssentamento rural: reformaAssentamento rural: reformaAssentamento rural: reformaagrária em migalhasagrária em migalhasagrária em migalhasagrária em migalhasagrária em migalhasDELMA PESSANHA NEVES

1997. 440 P.

Analisa o processo de mudança de posi-ção social de trabalhadores rurais assala-riados para produtores mercantis, no qua-dro de aplicação do PNRA – Plano Nacio-nal de Reforma Agrária (1885) –, trans-formação possível diante da falência e dadesapropriação da área agrícola de umadas usinas da região Açucareira de Cam-pos, Estado do Rio de Janeiro.

A antropologia da academia:A antropologia da academia:A antropologia da academia:A antropologia da academia:A antropologia da academia:quando os índios somos nósquando os índios somos nósquando os índios somos nósquando os índios somos nósquando os índios somos nósROBERTO KANT DE LIMA

2. ED. 1997. 65 P.

Pretende discutir algumas questões relati-vas ao tema do colonialismo cultural, emparticular no que se refere à possibilidadeda produção de um conhecimento antro-político capaz de descobertas esclare-cedoras no âmbito da interpretação depaíses do Terceiro Mundo e, em especial,do Brasil

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Jogo de corpoJogo de corpoJogo de corpoJogo de corpoJogo de corpoSIMONI LAHUD GUEDES

1997. 355 P.

Jogo de corpo é um livro que se inscreve natemática da cultura da classe trabalhado-ra. Procura articular, a partir de trabalhoetnográfico, as concepções de homem etrabalhador, enfocando o processo deconstrução social de trabalhadores e, poressa via, de uma forma particular de cons-trução da pessoa.

A qualidade de vida noA qualidade de vida noA qualidade de vida noA qualidade de vida noA qualidade de vida noEstado do Rio de JaneiroEstado do Rio de JaneiroEstado do Rio de JaneiroEstado do Rio de JaneiroEstado do Rio de JaneiroALBERTO CARLOS DE ALMEIDA

1997. 128 P.

Define o que é qualidade de vida, escolheindicadores para quantificá-la e classificaos municípios do Estado do Rio de Janei-ro, bem como os bairros de Niterói e dacapital do Estado de acordo com aconceituação e a medição corresponden-te. Um estudo útil para a implementaçãode políticas sociais. Indicado para funcio-nários da administração pública interessa-dos em questões sociais, planejadores ur-banos e regionais, estudantes universitá-rios e cidadãos interessados na situação desua cidade. Trata-se de um trabalho pio-neiro na utilização da metodologia quan-titativa para a medição da qualidade devida em municípios brasileiros.

Pescadores de Itaipu – meioPescadores de Itaipu – meioPescadores de Itaipu – meioPescadores de Itaipu – meioPescadores de Itaipu – meioambiente, conflito e ritual noambiente, conflito e ritual noambiente, conflito e ritual noambiente, conflito e ritual noambiente, conflito e ritual nolitoral do Estado do Rio delitoral do Estado do Rio delitoral do Estado do Rio delitoral do Estado do Rio delitoral do Estado do Rio deJaneiroJaneiroJaneiroJaneiroJaneiroROBERTO KANT DE LIMA

1997. 333 P.

Inaugurando a série A Pesca no Estado doRio de Janeiro, Pescadores de Itaipu – meioambiente, conflito e ritual no litoral doEstado do Rio de Janeiro retrata a praiade Itaipu (Niterói, RJ) em um passado nãomuito distante e faz uma breve avaliaçãodas mudanças ocorridas.

Sendas da transiçãoSendas da transiçãoSendas da transiçãoSendas da transiçãoSendas da transiçãoSYLVIA FRANÇA SCHIAVO

1997. 178 P

Uma contribuição ao estudo docampesinato parcelar, tão a gosto de inú-meros antropólogos que, na década de 80,buscaram o meio rural como lugar de re-flexão sobre as mudanças que muito rapi-damente sacudiam o campo brasileiro.

O pastor peregrinoO pastor peregrinoO pastor peregrinoO pastor peregrinoO pastor peregrinoARNO VOGEL

1997. 300 P.

O autor analisa o ritual da primeira visitado Papa João Paulo II ao Brasil, revelan-do ao público acadêmico e ao leitor inte-ressado na questão religiosa, no Brasil, asimplicações simbólicas e sociológicas des-se acontecimento.

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Presidencialismo, parlamen-Presidencialismo, parlamen-Presidencialismo, parlamen-Presidencialismo, parlamen-Presidencialismo, parlamen-tarismo e crise política notarismo e crise política notarismo e crise política notarismo e crise política notarismo e crise política noBrasilBrasilBrasilBrasilBrasilALBERTO CARLOS DE ALMEIDA

1998. 251 P.

Trata-se de importante contribuição paraa compreensão de situações da crise polí-tica, bem como para o entendimento dogolpe de 64. O autor faz uma análise dahistória política brasileira, mais precisa-mente, da história do período de 1946 a1964.

Um abraço para todos osUm abraço para todos osUm abraço para todos osUm abraço para todos osUm abraço para todos osamigos: algumas conside-amigos: algumas conside-amigos: algumas conside-amigos: algumas conside-amigos: algumas conside-rações sobre o tráfico derações sobre o tráfico derações sobre o tráfico derações sobre o tráfico derações sobre o tráfico dedrogas no Rio de Janeirodrogas no Rio de Janeirodrogas no Rio de Janeirodrogas no Rio de Janeirodrogas no Rio de JaneiroANTONIO RAFAEL

1998. 178 P.

Uma investigação acerca do tráfico de dro-gas no Rio de Janeiro, em especial aqueleque é implementado no interior das fave-las cariocas.

Baseado em dados colhidos em trabalhode campo realizado nos anos de 1995 e1996, analisa as características infraccionaisdos grupamentos que atuam no tráfico nascomunidades. Um estudo corajoso sobreum dos temas mais polêmicos da atualidade.

A n t r o p o l o g i a - e s c r i t o sA n t r o p o l o g i a - e s c r i t o sA n t r o p o l o g i a - e s c r i t o sA n t r o p o l o g i a - e s c r i t o sA n t r o p o l o g i a - e s c r i t o sexumados 1 : espaços cir-exumados 1 : espaços cir-exumados 1 : espaços cir-exumados 1 : espaços cir-exumados 1 : espaços cir-cunscritos – tempos soltoscunscritos – tempos soltoscunscritos – tempos soltoscunscritos – tempos soltoscunscritos – tempos soltosL. DE CASTRO FARIA

1998. 286 P.

Apresenta ao público leitor de Antropolo-gia no Brasil o conjunto dos textos escri-tos e de programas de curso ministradospelo autor.

Professor Emérito da UFRJ e da UFF, aolongo de seus 85 anos, mais de 60 delesdedicados à atividade acadêmica inin-terrupta, Castro Faria publica seu primei-ro livro. Uma ótima leitura para aquelesque se propõem a pesquisar a história dopensamento social brasileiro e da Antro-pologia.

Violência e racismo no Rio deViolência e racismo no Rio deViolência e racismo no Rio deViolência e racismo no Rio deViolência e racismo no Rio deJaneiroJaneiroJaneiroJaneiroJaneiroJORGE DA SILVA

1998. 249 P.

Produto de esforço teórico e acadêmico, ésobretudo uma contribuição prática paraos estudiosos da questão racial e da vio-lência, bem como para os formuladores depolíticas públicas destinadas à melhoria daqualidade de vida da população, relacio-nadas com a violência e a segurança pú-blica e ao público de modo geral.

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Novela e sociedade no BrasilNovela e sociedade no BrasilNovela e sociedade no BrasilNovela e sociedade no BrasilNovela e sociedade no BrasilLAURA GRAZIELA FIGUEIREDO FERNANDES

GOMES

1998. 137 P.

Destaca o objeto das narrativas teleno-velísticas e explicita o que elas de fato dra-matizam em relação às formas de controlesocial e de resolução de conflitos existen-tes na sociedade brasileira

O Brasil no campo de futebolO Brasil no campo de futebolO Brasil no campo de futebolO Brasil no campo de futebolO Brasil no campo de futebolSIMONI LAHUD GUEDES

1998. 136 P.

Enfoca o futebol como operador da iden-tidade nacional brasileira, analisando aforma como ele se transforma em veículopara o debate sobre características do povobrasileiro. Discute também seu lugar noprocesso de socialização masculina atravésde estudo realizado numa escolinha defutebol.

Modernidade e tradição :Modernidade e tradição :Modernidade e tradição :Modernidade e tradição :Modernidade e tradição :construção da identidadeconstrução da identidadeconstrução da identidadeconstrução da identidadeconstrução da identidadesocial dos pescadores desocial dos pescadores desocial dos pescadores desocial dos pescadores desocial dos pescadores deArraial do Cabo (RJ)Arraial do Cabo (RJ)Arraial do Cabo (RJ)Arraial do Cabo (RJ)Arraial do Cabo (RJ)ROSYAN CAMPOS DE CALDAS BRITTO

1998. 265 P.

Uma etnografia da vida social e econômi-ca dos pescadores de Arraial do Cabo.Instigante análise para a compreensão dapesca enquanto atividade econômica denosso país e de nosso Estado. Traz umarelevante contribuição teórica para de-monstrar as transformações das sociedadestradicionais frente à modernidade.

As redes do suor : a repro-As redes do suor : a repro-As redes do suor : a repro-As redes do suor : a repro-As redes do suor : a repro-dução social dos traba-dução social dos traba-dução social dos traba-dução social dos traba-dução social dos traba-lhadores da pesca em Juru-lhadores da pesca em Juru-lhadores da pesca em Juru-lhadores da pesca em Juru-lhadores da pesca em Juru-jubajubajubajubajubaLUIZ FERNANDO DIAS DUARTE

1999. 289 P.

As redes do suor resulta de pesquisa sobreos processos de identificação implicados nadiferenciação pelo trabalho na pesca emJurujuba. É um dos raros trabalhos a li-dar com essa problemática no contextourbano moderno brasileiro.

A descrição etnográfica da vida de um bair-ro popular e das diversas formas do tra-balho na pesca nos leva à discussão dasquestões centrais da mudança e moderni-zação em nosso país.

Antropologia – escritosAntropologia – escritosAntropologia – escritosAntropologia – escritosAntropologia – escritosexumados – 2 : dimensões doexumados – 2 : dimensões doexumados – 2 : dimensões doexumados – 2 : dimensões doexumados – 2 : dimensões doconhecimento antropológicoconhecimento antropológicoconhecimento antropológicoconhecimento antropológicoconhecimento antropológicoL. DE CASTRO FARIA

1999. 424 P.

O segundo volume de Antropologia – escri-tos exumados apresenta a produção de L.de Castro Faria nas áreas de AntropologiaBiológica, Arqueologia, Etnologia e dos es-tudos de cultura material.

Resgata dimensões da trajetória do autorpouco evidentes para aqueles que já o co-nheceram envolvido com pós-graduação,estudos de Antropologia Social e históriada produção intelectual.

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Seringueiros da Amazônia:Seringueiros da Amazônia:Seringueiros da Amazônia:Seringueiros da Amazônia:Seringueiros da Amazônia:dramas sociais e o olhardramas sociais e o olhardramas sociais e o olhardramas sociais e o olhardramas sociais e o olharantropológicoantropológicoantropológicoantropológicoantropológicoELIANE CANTARINO O’DWYER

1998. 231 P.

O livro descreve uma viagem pericial aoalto rio Juruá, no Estado do Acre, solicita-da pela Procuradoria Geral da Repúblicapara investigar denúncias sobre trabalhoescravo. O levantamento antropológico éfeito no contexto de ameaças contra osmembros do Conselho Nacional dos Se-ringueiros, praticamente um ano depoisdo assassinato de seu líder Chico Mendes.Através dos testemunhos dos seringueiros,pode-se constatar, in loco, formas de viola-ção das liberdades pessoais e de constran-gimento ilegal perpetradas contra as po-pulações seringueiras pelos chamados pa-trões dos seringais.

Práticas acadêmicas e oPráticas acadêmicas e oPráticas acadêmicas e oPráticas acadêmicas e oPráticas acadêmicas e oensino universitário: umaensino universitário: umaensino universitário: umaensino universitário: umaensino universitário: umaetnografia das formas deetnografia das formas deetnografia das formas deetnografia das formas deetnografia das formas deconsagração e transmissãoconsagração e transmissãoconsagração e transmissãoconsagração e transmissãoconsagração e transmissãodo saber na universidadedo saber na universidadedo saber na universidadedo saber na universidadedo saber na universidadePAULO GABRIEL HILU DA ROCHA PINTO

1999, 244 P.

Um trabalho relevante, não só pela sua sin-gularidade, como também pela abran-gência e fôlego com que foi concebido erealizado. Constitui-se em fonte segura desubsídios para a compreensão de nossasinstituições universitárias e acadêmicas.

“Dom”, “Iluminados” e“Dom”, “Iluminados” e“Dom”, “Iluminados” e“Dom”, “Iluminados” e“Dom”, “Iluminados” e“Figurões”: um estudo sobre“Figurões”: um estudo sobre“Figurões”: um estudo sobre“Figurões”: um estudo sobre“Figurões”: um estudo sobrea representação oratória noa representação oratória noa representação oratória noa representação oratória noa representação oratória noTribunal do Júri do Rio deTribunal do Júri do Rio deTribunal do Júri do Rio deTribunal do Júri do Rio deTribunal do Júri do Rio deJaneiroJaneiroJaneiroJaneiroJaneiroALESSANDRA DE ANDRADE RINALDI

1999. 107 P.

Busca compreender a representação daoratória do Tribunal do júri no Rio de Ja-neiro. Segundo a autora, existe uma fór-mula, cuja função, de um ponto de vistaexterno ao campo jurídico, é persuadiraqueles a quem é dirigida; e, de um pontode vista interno, distinguir os profissionaisdeste ofício, atribuindo-lhes ou não pres-tígio.

Angra I e a melancolia de umaAngra I e a melancolia de umaAngra I e a melancolia de umaAngra I e a melancolia de umaAngra I e a melancolia de umaera: um estudo sobre aera: um estudo sobre aera: um estudo sobre aera: um estudo sobre aera: um estudo sobre aconstrução social do riscoconstrução social do riscoconstrução social do riscoconstrução social do riscoconstrução social do riscoGLÁUCIA OLIVEIRA DA SILVA

199. 284 P.

A originalidade deste livro reside na etno-grafia pioneira da única usina nuclear exis-tente no Brasil na época e na construçãode uma antropologia do trabalho em situa-ção de risco.

Instigante, dominando a literatura sobretrabalho, comunidade, risco e meio am-biente, é uma das contribuições mais no-táveis para uma sociologia do drama vivi-do pelos trabalhadores e empregados donuclear.

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1. A Revista Antropolítica, do Programa de Pós-Graduação em Antro-pologia e Ciência Política da UFF, aceita originais de artigos e rese-nhas de interesse das Ciências Sociais e de Antropologia e CiênciaPolítica em particular.

2. Os textos serão submetidos aos membros do Conselho Editorial e/ou a pareceristas externos, que poderão sugerir ao autor modifica-ções de estutura ou conteúdo.

3. Os textos não deverão exceder 25 páginas, no caso dos artigos, e 8páginas, no caso das resenhas. Eles devem ser apresentados em duascópias impressas em papel A4 (210 x 297mm), espaço duplo, emuma só face do papel, bem como em disquete no programa Wordfor Windows 6.0, em fontes Times New Roman (corpo 12), semqualquer tipo de formatação, a não ser:• indicação de caracteres (negrito e itálico);• margens de 3cm;• recuo de 1cm no início do parágrafo;• recuo de 2cm nas citações; e• uso de itálico para termos estrangeiros e títulos de livros e perió-dicos.

4. As citações bibliográficas serão indicadas no corpo do texto, entreparênteses, com as seguintes informações: sobrenome do autor emcaixa alta; vírgula; data da publicação; vírgula; abreviatura de pági-na (p.) e o número desta.(Ex.: PEREIRA, 1996, p. 12-26).

5. As notas explicativas, restritas ao mínimo indispensável, deverão serapresentadas no final do texto.

6. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final dotexto, obedecendo às normas da ABNT (NBR-6023).

Livro:MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos e outros textos escolhidos. 2.

ed. São Paulo: Abril Cultural, 1978. 208 p. (Os pensadores, 6).LÜDIKE, Menga, ANDRÉ, Marli E. D. A. Pesquisa em educação : abor-

dagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

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Antropolítica Niterói, n. 6, p. 119–121 , 1. sem. 1999

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FRANÇA, Junia Lessa et al. Manual para normalização de publicações téc-nico-científicas. 3. ed. rev. e aum. Belo Horizonte: Ed. da UFMG,1996. 191 p.

Artigo:ARRUDA, Mauro. Brasil : é essencial reverter o atraso. Panorama da

Tecnologia, Rio de Janeiro, v. 3, n. 8, p. 4-9, 1989.

Trabalhos apresentados em eventos:AGUIAR, C. S. A. L. et al. Curso de técnica da pesquisa bibliográfica:

programa-padrão para a Universidade de São Paulo. In: CON-GRESSO BRASILEIRO DE BIBLIOTECONOMIA E DO-CUMENTAÇÃO, 9. 1977, Porto Alegre. Anais... Porto Alegre: As-sociação Rio-Grandense de Bibliotecários, 1977. p. 367-385.

7. As ilustrações deverão ter a qualidade necessária para uma boa re-produção gráfica. Elas deverão ser identificadas com título ou le-genda e designadas, no texto, como figura (Figura 1, Figura 2 etc.).

8. Os textos deverão ser acompanhados de resumo em português einglês, que não ultrapasse 250 palavras, bem como de 3 a 5 pala-vras-chave também em português e em inglês.

9. Os textos deverão ser precedidos de identificação do autor (nome,instituição de vínculo, cargo, título, últimas publicações etc.), quenão ultrapasse 5 linhas.

10. Os colaboradores terão direito a cinco exemplares da revista.11. Os originais não aprovados não serão devolvidos.12. Os artigos, resenhas e demais correspondência editorial deverão

ser enviados para:Comitê Editorial da AntropolíticaPrograma de Pós-Graduação em Antropologia e Ciência Polí-

ticaCampus do Gragoatá, Bloco “O”24210-350 – Niterói, RJTels.: (21) 2620-5194 e 2719-8012

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Antropolítica Niterói, n. 6, p. 119–121, 1. sem. 1999

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