Revolução Mexicana

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DA INDEPENDÊNCIA A GUERRA MÉXICO – ESTADOS UNIDOS A independência do México teve início com os movimentos revolucionários de 1810 liderados pelo pároco Miguel Hidalgo y Costilla, que clamava a libertação colonial e a devolução das terras tomadas pelos espanhóis aos indígenas. Em 1821/1822 a independência é declarada e confirmada pela Coroa espanhola e nasce nessa ocasião uma nova classe de poderio político: o caudilho. O caudilho mexicano foi o resultado das batalhas pela “independência”. Infelizes com as revoltas populares, a Espanha enviou tropas comandadas por diversos generais que viriam a se tornar latifundiários durante o século XIX, dentre eles futuros governadores, donos de cargos executivos do governo e inclusive o primeiro presidente do México, Augustín Itúrbide, que na verdade exerceu uma espécie de monarquia pré-república. Não foram raros os ensaios da revolução nas regiões do norte e centro-sul do país durante os anos de 1823 a 1910, nota-se neles uma forte presença da Igreja Católica uma vez que esta era também reprimida pelo estado que se formara, criando assim uma força nos campesinatos do norte e sul do México, que vinha muitas vezes do apoio do clero. Enquanto isso no centro político do país surgia um conflito ideológico entre federalistas e centralistas. Os primeiros “defendiam o poder local, a autonomia dos interesses regionais em relação aos nacionais e a descentralização política e financeira do país”; já os centralistas “defendiam a centralização do poder na capital do país com a constituição de um poder executivo forte capaz de definir as prioridades e os rumos da nova nação.” Lembrando que os centralistas eram formados pela elite criolla, os filhos de espanhóis nascidos no México, e pelos futuros latifundiários do país. Entretanto, estes dois diferentes núcleos da história mexicana no século XIX só viriam a se cruzar diretamente no

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DA INDEPENDÊNCIA A GUERRA MÉXICO – ESTADOS UNIDOS

A independência do México teve início com os movimentos revolucionários de 1810 liderados pelo pároco Miguel Hidalgo y Costilla, que clamava a libertação colonial e a devolução das terras tomadas pelos espanhóis aos indígenas.Em 1821/1822 a independência é declarada e confirmada pela Coroa espanhola e nasce nessa ocasião uma nova classe de poderio político: o caudilho.O caudilho mexicano foi o resultado das batalhas pela “independência”. Infelizes com as revoltas populares, a Espanha enviou tropas comandadas por diversos generais que viriam a se tornar latifundiários durante o século XIX, dentre eles futuros governadores, donos de cargos executivos do governo e inclusive o primeiro presidente do México, Augustín Itúrbide, que na verdade exerceu uma espécie de monarquia pré-república.Não foram raros os ensaios da revolução nas regiões do norte e centro-sul do país durante os anos de 1823 a 1910, nota-se neles uma forte presença da Igreja Católica uma vez que esta era também reprimida pelo estado que se formara, criando assim uma força nos campesinatos do norte e sul do México, que vinha muitas vezes do apoio do clero.Enquanto isso no centro político do país surgia um conflito ideológico entre federalistas e centralistas. Os primeiros “defendiam o poder local, a autonomia dos interesses regionais em relação aos nacionais e a descentralização política e financeira do país”; já os centralistas “defendiam a centralização do poder na capital do país com a constituição de um poder executivo forte capaz de definir as prioridades e os rumos da nova nação.” Lembrando que os centralistas eram formados pela elite criolla, os filhos de espanhóis nascidos no México, e pelos futuros latifundiários do país.Entretanto, estes dois diferentes núcleos da história mexicana no século XIX só viriam a se cruzar diretamente no ano de 1846 quando se iniciou a guerra México – Estados Unidos.Guerra que foi começada pelo processo de expansão territorial do país vizinho do norte que ocorrera em paralelo com o processo de independência do México. No ano de 1823 começam a chegar comerciantes americanos na então cidade mexicana de Santa Fé, trazendo seus escravos e uma proposta de colonização e modernização.O americano trouxe consigo novos padrões de produção agrícola e uma ideologia libertária que atraiu os federalistas do norte a uma aliança que viria a resultar na formação da República do Texas em 1835.Criou-se uma tensão entre os dois países, mas o México continuou de portas abertas para os norte-americanos, até 1846, quando, após o Congresso americano ter aceitado o pedido do Texas para ingressar na Confederação dos Estados Unidos na condição de estado, a guerra entre os países fronteiriços começou.

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O conflito foi vencido pelos americanos em batalhas que se estenderam ao longo do que viria a se tornar parte dos EUA, chegando até a capital. Em 1848 os mexicanos derrotados assinam o Tratado de Guadalupe Hidalgo, segundo o qual o México cedia aos EUA 800.000 km² de terras por US$ 15.000.000,00 , incluindo nesse território também as terras vendidas aos norte-americanos em 1853.Após esta perca de aproximadamente 43% de seu território, o México via um novo e triste período de sua história começar. Na segunda metade do século XIX, quando o país estava sob o governo de Benito Juárez, o capital estrangeiro entrou de vez no processo de industrialização. A iniciativa privada inglesa, americana e francesa elevou o conflito entre centralistas e federalistas.Juárez (federalista) viria a ser derrubado do governo em definitivo em 1872 quando Porfírio Díaz assumiu formalmente sua presidência, o que significou a supremacia dos centralistas e a aliança com o capital inglês. O PORFIRIATO

O financiamento inglês permitiu a Díaz ampliar a rede ferroviária no México que em pouco tempo chegou a se integrar a rede norte-americana e fez com que o trem se tornasse o meio mais importante de transporte de mercadorias tanto para dentro do país quanto para fora.Esse foi somente um dos vários acordos comerciais com os estrangeiros que Porfírio Díaz fez, aliás, essa foi uma das marcas de sua ditadura. Durante o porfiriato também houve uma grande transferência de terras das comunidades indígenas para empresas estrangeiras, tanto para construção de fábricas quanto para plantio (diga-se de passagens que foram grandes extensões de terra que foram simplesmente tomadas pelo Estado); e não houve preocupação com o crescimento da classe operária que veio com essa invasão estrangeira.Diz-se invasão não só pela exploração de mão-de-obra, mas também pela exploração de petróleo, marcada pela entrada de duas empresas estrangeiras no Golfo do México: a Standard Oil (que instalou uma subsidiária chamada Huasteca Petroleum Company) e a inglesa-holandesa Shell.Além de tudo isso, essa ditadura, que foi de 1876 a 1911 (nesse meio tempo houve a eleição do general Manuel González, candidato de Díaz, que exerceu a presidência de 1880 a 1884, únicos quatro anos sem Díaz naquele período) foi fortemente influenciada pelos ideais positivistas que surgiram na Europa por volta de 1850 com o francês Augusto Comte e foram trazidas para o México pelas ocupações francesas dos anos de 1860 e disseminadas em meio aos grupos políticos da capital. Seus adeptos e defensores se tornaram mais tarde membros do gabinete de Porfírio Díaz e eram chamados “los científicos”.O ditador, munido da máxima positivista e influenciado pelos seus companheiros ilustres, convencia a todos então de que seu governo garantia a “ordem” necessária ao “progresso” do país. Só não dizia que o preço desse

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progresso era uma falsa paz, a paz porfiriana. Uma paz que era mantida pela violência do exército através da repressão. Sem dúvida, a meta de Díaz foi cumprida: o país se modernizou; entretanto foi à custa do capital estrangeiro, e enquanto a modernidade avançava importantes segmentos da sociedade mexicana eram deixados de lado, parcelas diferentes da população que em 1911, movidas cada qual por interesses diferentes, “derrubariam” a ditadura.

A QUEDA DO CAUDILHO DE CHAPULTEPEC

Caudilho de Chapultepec (este último é o nome do parque onde se situava o palácio usado como residência pelo presidente na Cidade do México) é um nome comumente dado nos livros didáticos de história ao governo de Díaz, governo que estava desgastado no fim da primeira década do século XX e que logo seria derrubado.A revolução se fez justamente contra o latifúndio, contra o capital estrangeiro e contra o autoritarismo, as marcas do governo Díaz. Primeiro os operários se levantaram contra o ditador, depois alguns setores do exército, seguidos da oposição política federalista e por fim os camponeses, que clamavam pela devolução de suas terras.Surgem então nos últimos anos de governo de Porfírio Díaz movimentos grevistas, investidas jornalísticas contra a continuidade dele no poder, movimentos de guerrilha desencadeados pelos magonistas (seguidores de Ricardo Flores Magón, anarquista responsável por fomentar o movimento dos grevistas e a própria revolução) e por fim a ascensão de um possível sucessor de Díaz: Francisco Indalecio Madero.Madero era um jovem advogado e em 1908 lançou um livro expondo seus ideais liberais com o título de “A sucessão presidencial de 1910”. Seu livro fez sucesso e suas idéias percorreram o México anos antes da eleição na qual viria a concorrer. Apoiado pelos seus seguidores, os chamados maderistas, ele tentou um acordo com Díaz para ser lançado como vice-presidente deste em sua possível nova reeleição, entretanto não se firma acordo nenhum e Madero se lança como candidato.Para garantir a reeleição, Porfírio manda prender Madero às vésperas do pleito, e é colocado novamente no poder com 99% dos votos. Madero foge da prisão e se refugia nos EUA, onde lança um manifesto convocando a população mexicana à rebelião.Os maderistas então começam a reunir forças ao longo de todo o México contra Porfírio Díaz, que renuncia em maio de 1911, pressionado pelas forças do movimento encabeçado por Madero, já de volta a sua terra.

A REVOLUÇÃO E SEUS NOMES

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Antes de apresentar a revolução, devem ser citados seus quatro principais nomes:

Francisco Madero: como foi dito anteriormente, Madero era um jovem advogado com idéias liberais, entretanto não tinha experiência política nenhuma e a história de sua família se opunha a seus ideais. A família dele era dona de cerca de um milhão de acres de terra com algodão e gado, além de minas e fundições;

Álvaro Obregón: pequeno proprietário de terras e chefe político da região do nordeste mexicano;

Francisco “Pancho” Villa: filho de uma família de pequenos fazendeiros que perderam suas terras para o Estado durante a ditadura de Díaz. Passou a liderar um grupo armado que no início só roubava para sobreviver, mais além viria a se tornar no grande exército do norte;

Emiliano Zapata: líder camponês que viria a se tornar o maior símbolo da revolução, se manteve a frente das reivindicações populares desde o início da revolução no sul do país, no estado de Morelos, mais especificamente no município de Ayala.

DE MADERO À CARRANZA

Logo que Madero assumiu, viu-se com um problema na mão e outro na consciência, respectivamente: conciliar os interesses conflitantes da máquina de Estado que se manteve intacta com a renúncia de Díaz e perceber que seus pensamentos simplistas de política não conseguiriam fazer isso.O senhor Emiliano Zapata tinha um projeto político muito maior do que somente convocar a população mexicana à rebelião, ele queria que a população mexicana percebesse a necessidade de uma mudança drástica na política do país e fosse à luta por suas terras de volta. Ele reivindicava, portanto, uma reforma agrária.Madero não queria esta reforma, bem como os empresários da região e as companhias estrangeiras. Zapata então não vê outra saída senão avançar sobre os latifúndios e ocupá-los, lançando também um documento que ficaria conhecido mais tarde como Plan de Ayala, declarando o presidente como inapto para realizar as mudanças necessárias ao país.Sendo assim o exército foi acionado contra a guerrilha zapatista e o panorama da revolução no sul muda, lá agora começava uma revolução social que passou a ser uma verdadeira guerra em 1913.Victoriano Huerta, uma general que havia comandado ações do exército contra Zapata durante o governo provisório de 1911, arma um golpe de estado em fevereiro de 1913, assassina Francisco Madero e assume o poder. Surge então a figura de Venustiano Carranza, governador do estado de Coahuila, que se rebela contra essa situação e lança o Plan de Guadalupe, convocando o país à guerra mais sangrenta desde os tempos de ocupação.

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Unem-se a Carranza Álvaro Obregón, chefiando as tropas do exército que apoiaram Madero e o bando armado liderado por Pancho Villa, que em pouco tempo se tornaria o exército da Divisão do Norte.Villa agora constrói uma imagem de invencibilidade diante da posição de Chefe da Divisão do Norte, e passa a enviar armas ao bando de Zapata e a pilhar soldados de Huerta, que agora perdera os apoios dos americanos, que por sua vez enviam tropas a Veracruz, onde se concentrava a maior quantidade de poços de petróleos, com medo dos villistas destruírem o porto para impedir o transporte do minério.Em agosto de 1914, já totalmente enfraquecido pelas tropas de Carranza, Huerta é deposto e exila-se nos EUA. Agora o panorama da revolução muda em todo o país, o estado criado por Díaz vem a ruínas e agora são decididos os novos rumos que a sociedade vai tomar.

DE CARRANZA À OBREGÓN

Carranza, assim como Madero, não quis levar a cabo a reforma agrária, levando Villa e Zapata a romperem com ele.Os líderes populares se reúnem em dezembro de 1914 pela primeira vez e decidem combater Carranza, que respondeu com armas e principalmente com o que aqui no Brasil seria a chamada malandragem.O povo da cidade não conhecia o movimento revolucionário dos campesinatos a fundo, só tinha ouvido falar que eles matavam fazendeiros e saqueavam trens. Carranza, se aproveitando desta situação, acusou Villa e Zapata de serem responsáveis pela falta de alimentos para os operários das cidades e pelo desemprego gerado pelo clima de guerra e insegurança que seus homens armados espalhavam por todo o país.Em seguida, começa a distribuir terras entre os camponeses que saem do movimento revolucionário e passam a se dedicar a terra que lhe foi dada, pouco a pouco o movimento começa a declinar.Já começou o ano de 1915 e agora Obregón faz um acordo com o presidente dos EUA, Thomas Woodrow: se Obregón eliminasse a ameaça das tropas villistas na fronteira com os EUA, ele receberia o apoio norte-americano para a sucessão de Carranza na presidência do México. Obregón vai à luta e derrota Villa.Evidencia-se novamente a luta de interesses individuais presente na revolução. Mais tarde isso significaria a ascensão de Álvaro Obregón à presidência.As tropas Zapata são reduzidas de 70.000 à menos de 15.000 homens no início do ano de 1917 quando é aprovada uma nova constituição que aumentava a participação do Estado na economia e apresentava uma nova política para o petróleo através da regulamentação do direito de propriedade da nação, representada pelo governo, sobre as terras, as águas e subsolo.Aos trabalhadores das minas e da indústria a Constituição concedeu antigas reivindicações: jornada de oito horas, salário mínimo, regulamentação do

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trabalho feminino e infantil, seguro para acidente de trabalho, livre associação e direito de greve. Por fim, em relação à Igreja, a nova Constituição retirava o estatutode cidadania do clero e restringia o funcionamento das instituições religiosas de ensino, praticamente inviabilizando a ação eclesiástica em todo o país.Em 1919 as tropas de Zapata foram reduzidas ao número de 10.000 homens e o líder do que chegou a ser um dos maiores movimentos libertários da história é assassinado numa emboscada.Em 1920 Carranza é deposto – e logo depois assassinado – através de um novo golpe de Estado cometido por Obregón, que ao assumir a presidência recebe as tropas de Villa (que agora somavam 651 homens, mas que chegaram a atingir 50.000), já rendido.O governo de Carranza foi a vida e a morte da revolução, se por um lado foi o início do que culminaria na reforma agrária mexicana dos anos 1930, por outro foi a derrubada de seus grandes defensores e reais idealizadores.

O MÉXICO PÓS-REVOLUÇÃO

Obregón exerceu seu mandato até 1924 quando foi sucedido por Elías Calles, fundador do Partido Revolucionário Nacional rebatizado em 1946 de Partido Revolucionário Institucional.Esses presidentes, seguidos posteriormente por Lázaro Cárdenas, foram responsáveis pelo impulso econômico do país gerado pela Reforma Agrária que ocorreu durante os anos de 1926/1927 à 1934/1935 redistribuindo cerca de 60% das terras que foram doadas à iniciativa privada durante os anos de 1876 a 1911, significando cerca de 10.641.471 hectares e beneficiando 870.323 camponeses.O período conhecido como maximato culmina no ano de 1938 quando as empresas petrolíferas americanas e européias são retiradas de território mexicano devido à formação da PEMEX (Petróleos Mexicanos), a única empresa petrolífera no México permitida a explorar as reservas de petróleo e gás.De 1940 a 1980 o país continua com uma alta financeira, devido à valorização do comércio interno e o PRI se mantém totalmente estável no poder.De 1980 a 1982 o país sofre uma crise financeira os primeiros indícios de que o reinado PRI estava prestes a terminar começaram a surgir.Em 1988 o candidato do PRI a presidência Carlos Salina é eleito de forma fraudulenta e em 1992 este mesmo presidente assina o NAFTA (Tratado Norte-Americano de Livre Comércio) uma união comercial entre México, EUA e Canadá. A data de um de janeiro de 1994, quando o tratado foi oficialmente iniciado, foi marcada pela volta do movimento zapatista no México.