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UNIVERSIDADE CAMILO CASTELO BRANCO Curso de Psicologia Longevidade. E como viver bem o “restante” de vida? São Paulo 2013

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UNIVERSIDADE CAMILO CASTELO BRANCO

Curso de Psicologia

Longevidade. E como viver bem o “restante” de vida?

São Paulo

2013

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UNIVERSIDADE CAMILO CASTELO BRANCO

Curso de Psicologia

ÂNGELA FELICETE

BRUNA CRISTINA PAZ DE OLIVEIRA

FERNANDA MARIA COSTA OLIVEIRA

MARIA LUZINETE RODRIGUES DE MACÊDO ALVES

NAYARA DOS SANTOS

RAMOM ALVES DE OLIVEIRA SILVA

Longevidade. E como viver bem o “restante” de vida?

Relatório Final do Estágio Básico Supervisionado da

disciplina de Psicologia da Idade Adulta e Maturidade do

Curso de Psicologia da Universidade Camilo Castelo

Branco – Unicastelo, sob orientação do Prof. José Angelo

Ortelan CRP 06-12934.

São Paulo

2013

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Sumário

Lista de figuras ........................................................................................................................ iv

Resumo .................................................................................................................................... v

1 – Introdução .......................................................................................................................... 07

2 – Longevidade ...................................................................................................................... 08

3 – Terceira Idade .................................................................................................................... 12

4 – Resultados obtidos ............................................................................................................ 21

5 – Conclusão ......................................................................................................................... 34

6 – Referências bibliográficas ................................................................................................ 36

6.1 – Referências literárias ...................................................................................................... 36

6.2 – Referências eletrônicas ................................................................................................... 36

6.3 – Referências visuais ......................................................................................................... 38

7 – Anexos ...............................................................................................................................

Projeto de pesquisa ..................................................................................................................

Relatórios de atividades em campo .........................................................................................

Tabulação de dados .................................................................................................................

Entrevistas ...............................................................................................................................

Termo de esclarecimento e livre consentimento .....................................................................

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Lista de figuras

Figura 1 – Gráfico Censo Demográfico 2010 – Aumento população de idosos no Brasil ..... 08

Figura 2 – Mapa Geográfico do Brasil .................................................................................... 09

Figura 3 – Tabela Expectativa de Vida no Brasil por Região ................................................. 10

Figura 4 – Gráfico Projeção Expectativa de Vida no Brasil.................................................... 11

Figura 5 – Gráfico Grupo Total de Entrevistados por Idade ................................................... 21

Figura 6 – Gráfico Grupo Total de Entrevistados por Sexo .................................................... 21

Figura 7 – Gráfico de Queixas – Dificuldades ........................................................................ 22

Figura 8 – Gráfico de Queixas – Desprazer ............................................................................ 23

Figura 9 – Gráfico de Queixas – Desejo de Mudança ............................................................. 24

Figura 10 – Gráfico Obstáculos Familiares ............................................................................. 26

Figura 11 – Gráfico Obstáculos Sociais .................................................................................. 26

Figura 12 – Gráfico Produtividade – Trabalho Remunerado .................................................. 27

Figura 13 – Gráfico Produtividade – Trabalho Voluntário ..................................................... 27

Figura 14 – Gráfico Produtividade – Novos Conhecimentos .................................................. 28

Figura 15 – Gráfico Conquistas – Prazeres ............................................................................. 29

Figura 16 – Gráfico Conquistas – Realização de Sonhos ........................................................ 30

Figura 17 – Gráfico Conquistas – Planos Futuros ................................................................... 31

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Resumo

Hoje, diante de tantas tecnologias o progresso traz novas técnicas e formas de se viver bem

contribuindo cada vez mais para se ter uma vida longa...e próspera? Nem sempre é o que vemos

acontecer, mesmo diante de tanta tecnologia e outros fatores sociais que surgem para facilitar o

nosso dia-a-dia e trazer maiores benefícios ao homem. A longevidade a cada década se torna

maior, e como será que essa novidade encontra hoje as pessoas idosas que foram ontem os jovens

do passado e que hoje, vivem uma expectativa de vida diferentes de sua juventude, ultrapassados

por uma nova cultura e geração? Em nossa cultura os jovens não possuem o hábito de fazerem

planos para posteridade que incluam uma data tão longínqua de mais de 30 ou 40 anos após a

fase adulta. Costumamos planejar nossa vida adulta entre os 40 a 60 anos, depois disso deixamos

a vida nos levar, e mais do que saber para onde iremos a questão é “como” e “o quê” faremos

com este final que nos resta, que se torna cada vez maior. Os resultados obtidos pela pesquisa

demonstraram que há diversos fatores implicados para dar conta de uma vivência bem sucedida

na velhice, sem que seja impossível de se realizar, mas que há necessidade de estratégias

articuladas para se ter uma vida não só longa, e sim também para vive-la com prosperidade.

Tema

Pesquisa qualitativa sobre como é possível viver bem na terceira idade, com um grupo de 33

pessoas idosas a partir de 60 anos, considerando o aumento da média de vida e expectativa de

vida maior.

Objetivo Geral

Verificar e compreender como é possível viver bem na terceira idade, frente a uma sociedade que

se desenvolve a cada dia, transformando e criando novos meios sociais diferentes do habitual

desse grupo etário, produzindo novas tecnologias e subsídios que nos conduzem a uma

longevidade cada vez maior.

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Objetivos Específicos

• Verificar quais as atividades que produzem maiores benefícios e bem-estar para as

pessoas da terceira idade.

• Averiguar quais os projetos de vida para essa faixa etária.

• Compreender quais são os obstáculos e barreiras que o grupo encontra para alcançar uma

vida próspera na terceira idade.

• Analisar os resultados presentes com uma perspectiva para o futuro desse grupo etário.

Metodologia

A pesquisa teve como população alvo pessoas da terceira idade que demonstraram ter uma “vida

ativa” e tinham interesse em manter-se produtivos nessa faixa etária, considerando dentro desse

perfil os idosos que se enquadravam em algum dos segmentos abaixo:

• Possuem independência financeira;

• São responsáveis por alguma atividade que beneficie terceiros;

• Mantêm ou possuiu nessa faixa etária algum tipo de atividade intelectual;

• Possuem desenvoltura ou autonomia em gerir sua vida social.

Como procedimento foi aplicado um roteiro de entrevistas com perguntas abertas, conforme

anexo.

Caracterização da Instituição

A pesquisa não foi realizada em nenhuma entidade. A população alvo foi com pessoas

autônomas, escolhidas aleatoriamente por indicação do nosso círculo social, e pessoas associadas

a grupos comunitários que realizam projetos e atividades específicas para esta faixa etária.

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1 – Introdução

Ao nos reunirmos para elaborarmos um tema para pesquisa relacionada a disciplina de

Psicologia da Idade Adulta e Maturidade, lembramos de nossa infância, principalmente os

integrantes mais velhos do grupo. Recordamos que quando indagados ou ao pensarmos na

velhice, logo vinha em nossa mente a ideia de uma pessoa de 50 e poucos anos com um

aspecto desanimador, caquético, já tendo vivido toda sua história de vida e sem muito mais a

acrescentar que valesse a pena, estando praticamente no limiar da morte.

O interessante é que quanto mais velho o membro do grupo, menor ficava a idade

entendida como “fim de carreira”. Hoje, essa percepção infantil que tínhamos desse quadro da

velhice mudou. Isso talvez se dê ao fato de que vivemos em outro contexto social, com novas

estruturas e papéis sociais alterados, além do progresso científico e social que promoveu

diversos benefícios na área da saúde, um dos fatores que levaram ao crescente aumento da

média de vida nas últimas décadas. Por isso, resolvemos partir desse princípio para direcionar

nossa pesquisa, a longevidade.

Porém a questão ainda permanecia. Quais mudanças a atualidade trouxe para essa fase

da vida, a velhice, para que ela não nos encontre naquele antigo quadro que tínhamos na

infância, sem ânimo e caquéticos? Pior agora tínhamos um agravante, a de uma existência

maior. Hoje, a expectativa de vida no Brasil chega aos 73 anos, com variações entre homens e

mulheres, então... Se antes tínhamos em mente um quadro de uma pessoa deteriorada em seus

50 anos, como seria levar essa vida adiante por ainda 20 anos, ou mais, sem cairmos no

desânimo e desinteresse pela vida? Por isso, para falarmos de longevidade, precisamos

entender um pouco mais dessa fase da vida, a Terceira Idade, e como ela se apresenta hoje na

atualidade.

Assim, o presente estudo tem como objetivo compreender como poderíamos, e se é

possível, mantermos na velhice uma vida psiquicamente saudável, mesmo que esta perdure

acima de nossas expectativas, podendo ainda usufrui-la prestigiosamente dentro de seus

limites, com uma dignidade prazerosa. Para tanto, iniciaremos fazendo uma conceituação

teórica desses dois princípios, a Longevidade e a Terceira Idade, para depois adentrarmos nos

conceitos práticos da pesquisa e nossa conclusão dos fatos apresentados.

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2 – Longevidade

No dicionário a palavra longevidade significa: longa duração da vida, muita idade.

Antigamente esse conceito era pouco utilizado em países subdesenvolvidos como o Brasil, no

entanto hoje, os estudos apontam que essa realidade vem sendo alterada cada vez mais.

Conforme estudos e pesquisas na área, a psicóloga Anita Liberalesso Neri, caracteriza esse

envelhecimento populacional do país pelo declínio da mortalidade infantil e das taxas de

natalidade, e a diminuição de mortes adultas por doenças infecciosas (Neri, 2012).

Podemos ainda associar esse declínio no Brasil, a uma política de prevenção de saúde

que promove melhorias nas condições socioeconômica e educacional, aliada a prevenção de

saúde das redes públicas, como os programas Saúde da Família e Melhor em Casa que contam

com atendimento em domicílio por equipes multidisciplinares da rede do SUS, aliada a outros

programas sociais como bolsa-família, bolsa-escola, fome-zero, entre outros, caindo assim o

número de mortalidade infantil por doenças infecto-contagiosas e parasitárias, a grande vilã

contra o aumento populacional de um país.

Comprovamos essa realidade pelo gráfico abaixo, através de pesquisa realizada pelo

IBGE no último Censo em 2010.

Figura 1

Aumento da P opulaç ão de Idos os no

B ras il

4,80%

5,90%

7,40%

1980

1985

1990

1995

2000

2005

2010

2015

1 2 3

F onte: IB G E - C ens o 2010

S eqüê

ncia2

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Conforme visto, as pesquisas do Censo apontaram nas duas últimas décadas um

aumento crescente na população acima de 65 anos no Brasil, tendo prevalência também o fato

da baixa fecundidade, em que antes era comum vermos famílias numerosas com seis ou mais

filhos, e hoje essa proporção diminuiu muito, o que também reflete numa incidência menor de

mortalidade materno infantil, mortes peri e pós-natal das mães por riscos contraídos na

gestação ou devido a complicações no parto. Dessa forma, as estatísticas apresentadas

convergem para outra, o aumento da expectativa de vida.

O quadro abaixo contempla a expectativa de vida ao nascer por estados e regiões,

demonstrando a variação dos mais e menos longevos no Brasil.

RR AP

AM PA MA CE RN PI PB PE

AC TO AL RO SE BA MT DF GO MG MS ES

SP RJ PR

SC

RS

+76 +74 +72 +70 +68

Figura 2

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Pelas pesquisas do Censo 2010, o Brasil teve um ganho de 11,24 anos no total geral

sobre a esperança de vida ao nascer nas últimas três décadas. Uma das regiões mais

surpreendida por este acréscimo inesperado foi o Nordeste, que antes tinha a expectativa de

vida menor em 58,25 anos passando agora para 71, 20 anos. Podemos até pensar que um dos

fatores implicados nesse ganho possam ser os programas sociais e de prevenção de saúde do

governo, implantado fortemente nesta região.

Tabela Expectativa de Vida no Brasil por Região – 2010 Região Homem Mulher Média

Norte 67,57 74,36 70,76 Nordeste 67,15 75,41 71,20 Sudeste 72,09 78,65 75,40 Sul 72,57 79,12 75,84 Centro-Oeste 70,43 77,08 73,64 Total Brasil 69,87 77,37 73,53

Figura 3

Fonte: IBGE – Censo 2010

É interessante salientar um dado significativo demonstrado nas estatísticas: a

predominância da longevidade das mulheres sobre os homens. Através de pesquisas, estudos

revelam que isso se deve a prevenção de vários fatores de riscos por mortes, devido ao próprio

estilo de vida da mulher que aumentam seu índice de vida, como o cuidado preventivo com a

saúde, menos incidência de mortes por alcoolismo, brigas e acidentes no trânsito, etc. Este

índice demonstra que temos mais mulheres idosas do que homens em nossa sociedade, o que

implica numa revisão de nossa cultura machista para melhor convivência dessa realidade.

Com o avanço científico e tecnológico, a medicina descobre novos aparelhos e

recursos que nos permite não só manter a expectativa de vida atual, como ir além dessa média

apresentada. O IBGE apresentou em Agosto deste ano, indicadores demográficos implícitos

na projeção da população para 2030, apontando em cada década um crescente aumento da

longevidade brasileira.

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Projeção Esperança de Vida ao Nascer no

Brasil - 1991/2030

0,00

20,00

40,00

60,00

80,00

100,00

Fonte: IBGE/DPE - Coordenação de População e

Indicadores Sociais.

Homem

Mulher

TOTAL

Homem 63,15 66,71 69,87 72,62 74,92

Mulher 70,90 74,35 77,37 79,88 81,90

TOTAL 66,93 70,44 73,53 76,16 78,33

1991 2000 2010 2020 2030

Figura 4

Com tudo isso, há ainda outros fatores relevantes permeando esse novo contexto que

está gerando especulação e preocupação de vários setores. Com o aumento da expectativa de

vida e do grupo etário de idosos surge, tanto na área da saúde como da política social e

econômica, novos desafios para gerir essa demanda que estão associados a eles como quadros

de enfermidades crônicas degenerativas e psicológicas, o que eleva o custo de saúde, além da

quebra de paradigmas sociais, para manter-se bem a velhice.

Diante das estatísticas apresentadas, tudo nos leva a crer que estamos mais próximos

desta realidade encontrada no significado da palavra longevidade: por uma vida cada vez mais

longa.

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3 – Terceira Idade

“...hoje não colho mais as flores de maio nem

sou mais veloz, como os heróis...é, talvez eu

seja simplesmente como um sapato velho, mas

ainda sirvo se você quiser, basta você me

calçar que eu aqueço o frio dos seus pés”.

(Sapato Velho - Roupa Nova, 1981).

Em nossa cultura ocidental não prestigiamos e nem costumamos pensar muito na

velhice. Costumeiramente somos educados para planejar nossa vida desde o nascimento até a

fase adulta, parando nossos projetos aí. Os pais idealizam e planejam sobre os filhos como

será sua infância, sua formação escolar, vida profissional e até mesmo o casamento. Os filhos

reproduzem esse mesmo papel, adotando metas e expectativas quanto a sua juventude, vida

acadêmica, profissional e casamento. Após essa fase, casados ou não, nos concentramos em

gerir a vida em sua demanda tão atribulada, buscando cumprir as exigências sociais que

compete a cada um, lembrando-se da velhice somente em momentos ocasionais relacionados

a questões burocráticas da aposentadoria.

Há países desenvolvidos na Europa e Oriente que possuem uma concepção diferente

sobre a velhice. Por serem países mais antigos e já terem uma cultura acostumada com a

convivência de pessoas idosas, estas sociedades constroem valores diferentes de sociedades

mais novas como o Brasil, e ainda subdesenvolvidas, que sofrem com problemas

socioeconômicos contribuindo para a precariedade na saúde e consequente mal-estar da

população. A cultura oriental é reconhecida por prestigiar e cultivar um bom relacionamento

social com seus idosos, mantida através da política, educação, alimentação, saúde pública,

higiene e lazer. Atualmente, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) e das

Nações Unidas (ONU), o índice de expectativa de vida no Japão é um dos maiores do planeta.

Apesar de vermos mudanças significativas nesse quadro, conforme estatísticas acima,

infelizmente em nossa cultura ainda não temos essa visão do idoso. A grande maioria, talvez

por essa correria desenfreada que empregamos em nossas vidas, não se dá conta do tempo

passar vivendo despreocupadamente sem pensar na velhice e em sua finitude, como se

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fossemos estagnar na meia-idade como seres imortais, esquecidos que a morte é irreversível e

que, como mortais, cedo ou tarde chegaremos a esse fim.

Não fazemos projetos para o futuro que inclua nossa velhice para com isso, irmos

acostumando gradativamente a ela e não passarmos o restante de nossas vidas lamentando o

que se perdeu. Ao contrário, somos pegos de surpresa quando chegamos a velhice e nos

deparamos frente a essa realidade, sem um preparo físico, psíquico e social.

Para o psicanalista Erik Erikson (1902–1994), o ser humano ao longo de sua vida

passa por etapas de desenvolvimento psicossocial, em que o individuo vai elaborando suas

experiências vividas psiquicamente, agregando com isso elementos positivos ou negativos

conforme suas relações sociais, que irão nortear sua vida psíquica. Assim, a velhice seria o

oitavo e último estágio dessa etapa, compreendida por ele como a fase em que o individuo

integra todas suas vivências anteriores apreendidas, elaborando a partir dessa análise,

reflexões sobre suas experiências que irão se refletir positiva ou negativamente para sua vida.

A partir desse conceito o individuo integra na velhice seu passado com o presente, o

que poderá lhe trazer um senso de desespero caso não consiga aceitar seu passado com seus

erros e acertos, agregando com isso um fator negativo nessa fase, o da desesperança. Neste

caso ele passará sua velhice com amargura, se lamentando ou reclamando, não aceitando o

seu presente e mantendo-se rígido em seus ideais e conceitos, sem permitir essa integração

com o novo, o que lhe traria novos conhecimentos e possibilidades para compreender suas

experiências com sabedoria. Em contrapartida o individuo que consegue fazer essa

autoanálise com equilíbrio psíquico integrando suas experiências passadas com sapiência,

aceitando seus erros como experiências de vida sem amargura ou lamentação, elaborando

esses fatores com integridade, ganha para si o valor da sabedoria na velhice.

Na terceira idade o idoso passa por muitas perdas significativas, como a perda do

corpo saudável e da aparência jovem, a perda do casamento ou de um grande amor, perda de

filhos ou amigos e parentes, a perda profissional e até mesmo de condições melhores

socioeconômicas. Todas essas perdas, se não forem elaboradas a contento, podem se traduzir

em mágoas e frustrações lamuriosas, sem uma integração equilibrada pelo conceito de

Erikson, convertendo-se na desesperança e podendo levar a quadros mais graves, como a

depressão.

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Podemos ver a representação desse sentido eloquente das perdas para o idoso, em

versos nesta canção:

“Não sei porque você se foi, quantas saudades eu senti

e de tristezas vou viver, e aquele adeus não pude dar

Você marcou em minha vida, viveu, morreu na minha história

Chego a ter medo do futuro e da solidão

que em minha porta bate...”

(Gostava tanto de você - Tim Maia, 1973).

Vemos algumas pessoas chegarem dessa forma a velhice, ressentidas e nostálgicas,

remoendo lembranças pretéritas sem conseguirem viver o presente para darem continuidade a

sua vida. Nesse sentido, viver para o idoso pode se tornar pesaroso, difícil diante de tantas

perdas significativas, ainda mais quando esse sujeito foi uma pessoa dinâmica,

intelectualizada e estável financeiramente, tendo uma vida social agitada, preferindo o

isolamento social do quê, muitas vezes, o olhar de repúdio ou de incompreensão por sua nova

condição física e até mesmo psíquica.

O filme francês “Amor”, escrito e dirigido por Michael Haneke lançado em 2012,

conta a história de um casal de idosos que vivem tragicamente esse período da vida,

apresentando os aspectos mais destrutivos da velhice, como a solidão e incompreensão social,

a decrepitude e a morte. Até por serem de uma realidade diversa da cultura que estamos

acostumados, com os franceses em seu contato frio sempre distantes e individualistas, o filme

demonstra fatos que nos chocam e constrange por ser diferente da nossa realidade, ou talvez

por nos vermos (ou desejarmos estar) sempre distante desta fase.

Importante ressaltar que cada sujeito tem uma história de vida que é composta por suas

relações sociais, sua cultura, seu jeito e maneira de olhar a vida. Por essa singularidade, suas

dificuldades e sucessos também são particulares, não tendo como generalizar um fato ou

conceito para todos. O que é visto por um como mal-estar e infortúnio, para outro pode ser um

evento tranqüilo, de possível superação. Nem sempre o enfrentamento dessas perdas para o

idoso trará somente prejuízos e infortúnios, podendo até mesmo ser de sua livre escolha,

como em alguns casos de afastamento social que não se caracteriza propriamente por solidão.

Assim é possível perceber que algumas perdas que tem sentido negativo para alguns,

pode ter um sentido diferente para outros. Para uma mulher que ao longo de seu casamento

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sofreu por diversas motivos com essa relação, seja pela restrição de sua liberdade ou pela

opressão do marido e condição social, ao se deparar com uma viuvez ou separação, pode

sentir um grande alívio com esse fato, diferente do sentido para uma mulher que teve um bom

relacionamento conjugal e se vê diante dessa perda.

Outro fator que ocorre na terceira idade e pode trazer sentidos diferentes ao sujeito é a

aposentadoria. Nossa legislação atual prevê a concessão da aposentadoria por idade a partir

dos 60 anos para a mulher e 65 anos para o homem. Dessa forma, diante dos índices da

longevidade crescente, um indivíduo poderá viver um terço de sua vida aposentado, o que,

dependendo de como esse indivíduo viveu até então, acarretará significados diversos para sua

nova condição. Aquele sujeito que viveu focado em suas relações profissionais, dando grande

importância aos papeis sociais e status derivados de sua profissão, sofrerá um impacto maior

com sua aposentadoria, acarretando um sentido de perda negativa em sua vida. Já o individuo

que tem uma relação adversa com o trabalho, com menos prestígio e condições desfavoráveis

socioeconômicas, pode ver na sua aposentadoria uma experiência positiva em que poderá ter

maior liberdade para fazer o que gosta sem opressão (Neri, 2012).

Vale lembrar que o homem não é produtivo somente por seu trabalho profissional.

Essa visão de valor produtivo só pelo trabalho é uma concepção da sociedade capitalista, em

que o valor do sujeito é medido por seu trabalho oferecido para a sociedade, passando a ter

um papel e identidade social que contribua para o progresso econômico, senão ele se torna um

fardo, improdutivo, que acarreta ônus a sociedade. O sujeito pode ser produtivo não só pelo

fruto do seu trabalho á sociedade, mas também por meio de suas relações, de uma vivência

construtiva para si mesmo, buscando autonomia financeira para gerir sua vida, cooperando

consigo e com os outros. Essa visão capitalista do sentido de “produção de trabalho” traz uma

conotação estereotipada da aposentadoria, que reflete num impacto negativo ao psiquismo de

muitas pessoas, vendo-se como um pária social, sem valor e significado em sua vida.

Há ainda situações de doenças crônicas e degenerativas que acompanham a velhice,

associadas a esse quadro de perdas significativas. Diante desse novo contexto, para muitos

idosos sua vida perde o significado e ele precisaria de ajuda para retomar o sentido pela vida.

Para tanto, seria preciso uma estratégia de apoio terapêutico, juntamente com outras áreas

médicas, formando uma equipe multidisciplinar para auxiliar e amenizar os impactos

causados por esses fatores. É possível encontrar esse apoio em muitos grupos comunitários

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que se organizam e criam métodos eficazes de ajuda através de palestras informativas,

exercícios físicos, oficinas de aprendizagem, cultura e lazer que estabelecem vínculos afetivos

e contribuem para o enfrentamento dessa fase, caso contrário, é possível encontrarmos idosos

que se perderam durante essa transição sem conseguirem se adaptar a nova fase, sentindo-se

fora de contexto como dito por Arnaldo Antunes:

“Eu não caibo mais nas roupas que eu cabia,

Eu não encho mais a casa de alegria.

Os anos se passaram enquanto eu dormia...

Eu não tenho mais a cara que eu tinha

No espelho essa cara não é minha...

Não vou me adaptar, não vou me adaptar”.

(Não vou me adaptar – Arnaldo Antunes, 2007).

Essa retomada do sentido da vida se torna possível nas relações sociais, em que há

essa troca de informações não só pelos familiares como também entre amigos e outros grupos

sociais, apreciando sua experiência vivida e atualizando-o dos novos movimentos, o que

possibilitaria a ele manter essa conexão viva do passado com o presente, amenizando

prejuízos psíquicos futuro (Neri, 2012).

Porém, sempre houve na história da humanidade uma contradição entre o velho e o

jovem, entre qual teria maior valor e importância, a sabedoria e experiência do velho ou a

força a e criatividade do homem maduro, prevalecendo em muitos casos um em detrimento do

outro.

A escritora e filósofa francesa Simone de Beauvoir, (1908–1986), fez um estudo

sistemático sobre a velhice, e em seus estudos antropológicos evidencia que a velhice sempre

foi um fator ambíguo nas sociedades, dependendo mais de fatores externos para manter uma

posição razoável, do que da sua própria condição.

Fora a condição irreversível da morte, que é um dos fatores que mais assusta e

atemoriza, o declínio e situação de vulnerabilidade existiam mais a nível cultural e social. O

velho dependia da cultura para manter-se num regime favorável e até mesmo privilegiado,

caso contrário, era tratado com escárnio, repúdio e frieza. Em algumas tribos primitivas onde

a cultura exigia um ritual de abandono e morte pela chegada da velhice, os laços afetivos

mantidos por elos de amor calavam mais alto, cumprindo a contragosto a exigência cultural.

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Já em outros grupos, os velhos eram respeitos pelo temor ou opressão de suas condições

sociais ou pela religião ou por suas posses, abusando muitas vezes desse poder. E ainda em

alguns casos, os maus tratos pelos pais e sua falta de afetividade gerava para os velhos um

estado de vingança dos mais jovens, que ao se verem na condição de poder, mal tratavam e

repudiava os mais velhos, gerando um ciclo vicioso nas gerações futuras (Beauvoir, 1990).

Assim percebemos que ao longo da construção da humanidade sempre existiu essa

contradição e dúvida do papel do velho na sociedade, sendo um tema obscuro, refletida no

presente até mesmo pela carência de estudo sobre a velhice, mas apesar disso é um estado

natural do homem e que pelos relatos antropológicos, dependem de fatores sócio-culturais

para se ter um uma condição melhor na velhice.

Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, cunhou o termo “líquido” para caracterizar a

sociedade moderna, afirmando que vivemos em uma época de fugacidade estonteante em que

nossas ações e relações são baseadas numa fluidez efêmera, o que invalida qualquer base

sólida para construção de relações reais e duradouras, bem como projetos futuros e maiores

chances de assertividades em decisões. Isso porque, na atualidade nossa sociedade está

caracterizada pela rapidez das informações que chegam ao domínio público através da mídia

de massa promovida pelo avanço tecnológico. Uma informação que é atual hoje, amanhã

poderá estar ultrapassada, sem dar tempo ao indivíduo digerir com calma e racionalidade.

Tudo é muito rápido, muito veloz, e isso se reflete no campo social e psíquico do ser humano.

(Bauman, 2009).

As relações afetivas precisam de tempo para se construir, pois somente através da

confiança, do respeito e lealdade, é possível conseguirmos laços afetivos mais fortes,

robustos, resistentes aos desafios e percalços comuns á qualquer convivência. Porém, diante

de relações líquidas e fugazes ditas por Bauman, os laços se tornam também mais frágeis,

passíveis de rompimento por qualquer desventura. As decisões que devemos tomar de forma

mais ponderada, com calma avaliando os riscos, passam a ser tomadas de forma impulsiva,

para garantir uma satisfação imediata. O ganho deve ser sempre instantâneo, caso contrário, é

descartado por algo novo na prateleira que satisfaça essa condição.

Em uma sociedade líquida onde o “novo” ocupa sempre o primeiro lugar, as

conquistas indeléveis que proporcionam valores reais com bases fortes para nosso equilíbrio

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psíquico estão cada vez menores, porque não nos damos oportunidade para apreciarmos o

“velho”, trazendo no psiquismo o retrato do idoso nesse mesmo sentido, como sendo algo

descartável, um fardo inútil e estéril agregado ao sentido negativo de velhice, sem terem mais

nenhuma contribuição relevante a vida.

O filósofo e jurista italiano Norberto Bobbio (1909-2004), aos 87 anos descreve em

uma autobiografia suas aventuras e desventuras, tanto quanto algumas dificuldades

encontradas no momento por ele, pertinentes à sua idade.

“A situação agrava-se pela rapidez das transformações

devido ao progresso científico e tecnológico: o novo logo

fica velho. Para nos mantermos atualizados em qualquer

campo precisaríamos de uma agilidade mental superior á

que possuímos no passado e, ao contrário, a nossa está

diminuindo cada vez mais”.

(Bobbio, pag.49, 1997).

Com uma sociedade atual que caminha para o hedonismo, vivendo o gozo da

satisfação imediata, se torna difícil pensar como fica um grupo etário crescente de idosos

dentro dessa sociedade líquida. Como é possível ao idoso, como bem colocado por Bobbio,

acompanhar esse ritmo frenético compulsivo pelo novo, pelas satisfações imediatas, sendo

que agora para ele tudo caminha de forma mais lenta. Seria necessária uma sociedade um

pouco mais empática com a velhice buscando compreender seu estágio e tentando atenuar

esse impacto da velhice sobre o idoso da melhor maneira possível, para que ele possa

continuar a conviver e contribuir com a sociedade, e não visto apenas como algo desagradável

socialmente e lamentável, ou pior, somente como a mais nova fonte econômica midiática

como vemos anunciada com o título “Terceira Idade”, tornando-se apenas uma identidade

social criada para ser explorada financeiramente.

Os parâmetros construídos até o momento em nossa sociedade sobre o idoso, ainda são

estreitos para abarcar esse panorama social de crescimento dessa faixa etária. É preciso

disseminar mais conhecimentos de relevância que possibilitem ampliar e introduzir novos

recursos e estratégias de apoio ao idoso.

Page 19: RF Longevidade

19

A terceira idade sofre estigmas e paradigmas sociais ainda de conotação negativa

sobre a velhice. Há sem dúvida como vimos fatores indissociáveis de difícil elaboração, mas

que precisam ser enfrentados, como doenças crônicas degenerativas, perdas significativas e

morte. Porém, é preciso salientar outros fatores encobertos que também fazem parte dessa

fase, e que muitas vezes são esquecidos ou pouco difundidos.

Nessa fase despontam novas habilidades que se estimuladas, poderiam gerar melhor

convivência ao grupo que pertence e, muito mais, ao seu próprio benefício, porém é comum o

idoso ser discriminado por suas limitações biológicas como se vê no texto a seguir:

“A ideia nova parece uma intrusa que tenta entrar numa

sala superlotada, onde já não há lugar...O supérfluo é

repelido porque já não cabe mais. Outras vezes, para

fazer caber um e outro, nós os forçamos e deformamos. As

pessoas dizem que não entendemos nada e que estamos

superados.

(Bobbio, pag.49, 1997).

Pesquisadores de diversas áreas, entre eles o psicólogo Art Kramer da Universidade de

Illinois em Springfield, afirmam que após os 25 anos em diante perdemos pontos na

velocidade do processamento cerebral, que se referem a habilidades em nossa inteligência

fluida, área que nos torna aptos a lidar com problemas imediatos. Porém, nesse mesmo

período, ganhamos pontos em outra área cerebral, a inteligência cristalizada, que tem relação

a sabedoria, nos permitindo tomar decisões mais ponderadas. Nessa mesma linha de estudos,

outros pesquisadores ressaltam a importância dos exercícios físicos que ajudam a melhorar a

concentração e o raciocínio abstrato em idosos, estimulando o crescimento de novas células

cerebrais. Mexer o corpo também ajuda a manter o equilíbrio de glicose no sangue, que ao

envelhecermos pode ocorrer o aumento de açúcar no sangue, o que afetaria numa área no

hipocampo envolvida na formação de memórias. Já o neurobiólogo Florin Dolcos, da

Universidade de Florin no Canadá, informa que o idoso através de uma dieta simples pela

ingestão de doses regulares de dopamina, substância responsável pela sensação de prazer

encontrada em iogurtes, amêndoas e chocolates, poderá se manter em um estado emocional

considerado positivo, aliviando algumas tensões e stress comum do dia-a-dia (MenteCérebro,

Ed.179, 2009).

Page 20: RF Longevidade

20

Assim, é possível avaliar que não há somente declínios, mas também um sistema

compensatório que nos permite viver de forma equilibrada, basta que o exploremos mais,

criando formas adaptativas para o melhor aproveitamento dessa fase. Uma dieta equilibrada,

evitar substâncias tóxicas que afetam o estado mental, além de exercícios físicos regulares que

podem ser feitos até mesmo sentando como exercitar pernas e mãos, mantendo-se ativo física

e mentalmente, são atributos simples acessíveis a qualquer um.

Estes estudos científicos na área da gerontologia, psicologia, sociologia e

neurociência, entre outras, podem auxiliar numa melhor compreensão dessa faixa etária e com

isso, estabelecer princípios que possibilitem uma convivência mais tranquila e menos

estigmatizada, rompendo conceitos deturpados e favorecendo outras habilidades do idoso.

Inicialmente, em 1960, foram criadas na França as Universidades do Tempo Livre,

pensadas para atribuir melhores condições e oportunidades sociais ao idoso. Mais tarde, em

1973 também na França, criou-se a Universidade da Terceira Idade já com aspecto voltado

mais ao desenvolvimento e produtividade intelectual, com desenvolvimento de pesquisas na

área da gerontologia. Já no Brasil o SESC foi a instituição pioneira a pensar num modelo de

desenvolvimento social e educativo aos grupos maduros e da terceira idade, influenciado

pelos modelos franceses, sendo até hoje referência nesta área. Em 1960 o SESC fundou os

primeiros Grupos de Convivência e posteriormente, em 1970, as primeiras Escolas Abertas

para a Terceira Idade (Neri, 2012).

Por esses conceitos, a Universidade da Terceira Idade seria um modelo para coibir a

segregação dessa faixa etária, bem como promover a disseminação e o conhecimento positivo

sobre a velhice através do desenvolvimento e interação social entre gerações, possibilitando

maior entendimento sobre essa fase e conseqüente melhor convivência ao idoso, afinal:

“....Você tem fome de quê? Você tem sede de quê?

A gente não quer só comida,

a gente quer comida, diversão e arte....

A gente não quer só comer,

a gente quer prazer pra aliviar a dor...”

(Comida - Titãs, 1986).

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21

4 – Resultados Obtidos

Ao final das entrevistas fomos surpreendidos pelo total de entrevistados, pois no inicio

achávamos que teríamos dificuldades em encontrar o grupo de idosos pretendidos, no entanto,

conforme estatísticas do aumento populacional dessa faixa etária descobrimos em nosso

círculo social um grande número dessa população, mais do que imaginávamos ter.

A pesquisa foi realizada com um grupo de 33 (trinta e três) idosos, de ambos os sexos

e classes sociais, indicados aleatoriamente por nosso círculo social. Dentre as indicações, foi

sugerido ao nosso grupo conhecer o trabalho de dois centros comunitários que desenvolvem

projetos voltados a faixa etária da terceira idade, e assim se possível, aplicarmos a entrevista

nos integrantes destes grupos.

O primeiro grupo sugerido chama-se Renascer a Cada Dia, e se reune semanalmente

no CIFA – Centro Itaquerense das Famílias Amigas, uma agremiação pertencente a Igreja

Nossa Senhora do Carmo, situado na Rua Flores do Piauí, nº. 170 – Itaquera. Nesse grupo

foram entrevistados 12 (doze) idosos.

O segundo grupo chama-se Terceira Idade Alta e faz parte de uma ONG da

comunidade de Vila Carmozina denominada Casa São Paulo, situada na Rua Benedito Coelho

Neto, 704 – Itaquera. Nesse grupo entrevistamos 09 (nove) idosos. O restante de 12 (doze)

idosos entrevistados foi por indicações aleatórias.

O grupo total de 33 (trinta e três) entrevistados é composto por idades variadas dentro

da faixa etária da terceira idade, sendo a maior parte do sexo feminino, com muitos já

ultrapassando a média de expectativa de vida, conforme quadros abaixo:

Figura 5

Figura 6

Total Por Idade

30%

37%

27%

6%

60 á 69

70 á 79

80 á 90

91 em diante

Total Por Sexo

88% 12%Feminino

Masculino

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22

O primeiro fator levantado na tabulação dos dados são as queixas e a relevância da

condição socioeconômica dos entrevistados. A maior parte das queixas apuradas foi de

conotação social e econômica, poucos entrevistados relataram desconforto ou problemas

apresentados que fossem atribuídos exclusivamente pela condição da idade ou adquiridos

nessa fase da vida.

A maioria citada é sobre as más condições no transporte público, como a superlotação

dos ônibus, melhor adequação do transporte e também a falta de respeito dos motoristas que

não param no ponto, além de outras queixas contra políticas públicas como a falta de recursos

na saúde e asfaltamento devido nas calçadas. Sabemos que isso é um problema de ordem

pública e coletiva, e não somente o idoso sofre com essas dificuldades em seu cotidiano.

Houve também queixas pertinentes as condições financeiras e sociais, observadas em

relatos que o entrevistado atribui como fator de desprazer a contínua realização de tarefas

domésticas, a falta de estudo gerando dificuldades em suas tarefas e relações sociais, ou até

mesmo a dificuldade em realizar tarefas simples do dia-a-dia pelo excesso de trabalho rural e

físico na infância e juventude.

Figura 7

Poucas queixas foram em decorrência da idade, tendo 02 (dois) casos apontados como

perdas significativas e 04 (quatro) casos mistos de doenças, que ao nos aprofundarmos um

pouco mais nas histórias percebemos que a maioria provém de enfermidades aprendidas em

decorrência de fatores socioeconômicos como problemas de coluna, insônia e asma, e

somente um caso de enfermidade degenerativa própria da idade, o câncer. No quesito perdas,

Page 23: RF Longevidade

23

um é de viuvez com a morte do cônjuge, trazendo um sentimento de saudade e tristeza sentido

nas entrelinhas da entrevista. Apenas um dos entrevistados apresentou como dificuldade a

solidão pela separação recente do marido e por não ter tido filhos, estando ainda se

habituando a este vazio, porém apontando a separação não como perda e sim como conquista

da liberdade. Outro entrevistado deixou transparecer sobre seu medo da morte, sentido como

um fator presente neste momento, fato de indiscutível temor nessa fase em que o individuo

passa a contabilizar perdas de seus entes queridos, percebendo-se como o próximo da lista. As

demais queixas como vimos, são em decorrência das condições socioeconômicas, tendo a

maior parte dos entrevistados sem do que reclamar.

Percebemos que na maioria eram situações já existentes antes da velhice, tornando-se

mais aguda na terceira idade, despontando no momento como situação problema, mas que já

era vivida anteriormente e, talvez pelas exigências sociais do dia-a-dia não eram sentidas de

maneira mais contundente como na fase atual.

Pelo levantamento da pesquisa, também podemos perceber o quanto a elaboração de

perdas e o enfretamento delas na terceira idade é sentida de forma individual e peculiar,

dependendo muito do contexto sócio-histórico de cada indivíduo, sendo atribuídas com

significados diferentes. Percebemos que algumas queixas apresentadas em uma pergunta, não

são sentidas pelo entrevistado da mesma forma relevante num outro quadro. Isso foi

perceptível em alguns entrevistados pelas respostas dadas com outra queixa, numa questão

similar à anterior, gerando no total um quadro geral esparso, conforme observado nos gráficos

apresentados.

Figura 8

Page 24: RF Longevidade

24

Com isso evidencia-se como o contexto sócio-cultural interfere muito no bem-estar

não só do idoso, mas de todos os indivíduos, para que na velhice possa-se ter uma condição

psíquica e socioeconômica mais confortável para o enfrentamento inevitável dessa fase.

Freud (1856–1939) em uma visão psicanalítica da sociedade, atenta por esse paradoxo

imposto pela sociedade como sendo necessário para nossa civilização, pois as regras e normas

sociais acionam o mecanismo do princípio da realidade em contradição ao princípio do

prazer, o que sem isso retornaríamos ao primitivismo.

Assim, a sociedade deve buscar sempre condições sociais satisfatórias para uma

vivência tranquila do homem, afastando-o de condições que promovam infelicidade, evitando

seu desprazer através de instrumentos bem colocados e direcionados que lhe dariam satisfação

interna como a arte, a educação e o trabalho, permitindo com isso uma vivência mental

saudável em conjunto com seu mundo externo, consonantes com sua rotina real. Porém, que

estes instrumentos sejam em condições acessíveis e possíveis para esse prazer, não como a

que vemos, em situações que promovem mais ainda sua insatisfação e seu sofrimento,

perdendo seu elo com a civilização ou levando-o cada vez mais a doenças mentais, por não

conseguir conciliar seus dois princípios, de prazer e realidade. Quanto menor condições

humanas a sociedade dá ao homem para a sua civilização, menos seres humanos civilizados

ela terá.

Figura 9

Em relação aos obstáculos sociais e familiares deflagrados na terceira idade por

preconceito ou violência psicológica ao idoso, não houve relevância apresentada. Do total das

Page 25: RF Longevidade

25

queixas, somente 04 (quatro) foram apontadas sobre a questão do preconceito ao idoso,

relatados no contexto social como falta de respeito às leis do idoso nas filas bancárias,

transporte público e em outros estabelecimentos em geral, o restante dos obstáculos são em

decorrência das más condições do transporte público. Somente 01 (um) caso foi apresentando

como obstáculo pela separação conjugal, mas conforme relato acima, não foi sentido como

perda e sim conquista da liberdade, acarretando ao entrevistado algumas dificuldades pela

solidão.

Outros 02 (dois) casos apresentados como obstáculo à idade foram em decorrência da

aposentadoria, mas que tiveram conotações distintas. No primeiro caso o entrevistado gostaria

ainda de continuar a trabalhar por gostar muito de sua profissão, mas vendo-se

impossibilitado de exercê-la pela idade, buscou com os trabalhos voluntários suprir essa

carência. No segundo caso o entrevistado atribui à terceira idade o rompimento de seu

casamento, pois após a concessão da aposentadoria, sua posição financeira sofreu uma queda

que abalou a estrutura econômica familiar, o que ocasionou um pedido de divórcio por parte

de sua esposa, gerando maiores dificuldades financeiras e familiares ao entrevistado, em que

este se viu afastado da família e mal compreendido pelas filhas, buscando estabilizar-se

financeira e afetivamente, fato entendido por ele como sendo uma dificuldade provinda da

idade, e não em decorrência de uma frágil relação afetiva e familiar rompida pelas exigências

financeiras que não teria mais condições de bancar.

Quanto a violência psicológica, muitos idosos são vitimas de familiares e amigos que

abusam dessa relação afetiva para obterem favores ilícitos como empréstimos, ou ainda casos

em que são vítimas de descaso, humilhação, agressividade verbal, isolamento familiar e

social, não sendo apresentado nenhum caso desse gênero.

No III Fórum sobre a violência doméstica e abuso em geral, um debate realizado no

mês de Março de 2013 no CEFATEF – Centro de Estudos Terapêuticos da Família foi

abordado o tema sobre a violência psicológica contra o idoso, que não deve ser entendida

quando este somente é prejudicado visivelmente em seus direitos pessoais e civis, mas

também quando é tolhido de liberdade de escolha pelos familiares e amigos, na maioria das

vezes pelo excesso de zelo, roubando-lhe a autonomia nas pequenas e simples ações do dia-a-

dia, o que pode causar-lhe constrangimento, sentimentos de incompetência e inutilidade. Por

isso, a importância de manter o respeito às escolhas do idoso, não cerceando seus desejos e

sim promovendo melhores condições para que ele possa continuar mantendo sua autonomia

Page 26: RF Longevidade

26

dentro de seus limites, sem opressões ou imposições dos familiares que limitam seus desejos

por preocupações e maior facilidade de lidarem com a situação.

No total, a maioria dos entrevistados afirmou manter na terceira idade boas relações

sociais e familiares, sem terem do que reclamar, alguns afirmando ainda que com a idade

perceberam maior respeito e admiração dos familiares e amigos para com eles, fato

constatado também por um entrevistado que passou a comparecer em reuniões escolares dos

netos por estes terem maior respeito e obediência à avó do que aos pais.

Figura 10 Figura 11

Poucos entrevistados mantêm atividades profissionais remuneradas. A maioria realiza

trabalhos voluntários, muitos no circuito familiar e alguns em trabalhos sociais, mas todos de

grande relevância para outras pessoas e a sociedade.

Para aqueles que contribuem com tarefas familiares, sua produtividade econômica está

associada a contribuição prestada aos familiares que na falta de seu auxilio precisariam

contratar outros serviços para suprir essa necessidade. Auxiliar na educação dos netos, na

locomoção a lugares necessários ou na manutenção e limpeza da casa, são tarefas vistas por

muitos como uma ocupação mínima sem relevância na economia familiar, mas na falta de

alguém que possa cumpri-las, o orçamento familiar será onerado com mais um serviço extra a

pagar, ou ainda, com a falta de um ordenado mensal pelo afastamento de um membro familiar

do trabalho para cobrir essa demanda na rotina familiar. Além de muitos contribuírem ainda

com sua aposentadoria para cobrir as despesas mensais. Tudo isso revela o quanto o idoso

ainda é produtivo e necessário para a dinâmica e estrutura familiar.

Page 27: RF Longevidade

27

Figura 12

Alguns dos trabalhos sociais desenvolvidos pelos entrevistados envolvem

responsabilidades com grupos, como uma entrevistada que é coordenadora do grupo da

terceira Idade Renascer a Cada Dia e outra entrevistada que é coordenadora em dois bairros

do Fórum do Cidadão, além de outras que auxiliam com tarefas voluntárias na área da saúde.

Uma entrevistada aposentou-se em enfermagem e agora presta serviços sociais nesta área,

outras entrevistadas acompanham pessoas nas consultas médicas ou simplesmente realizam

visitas no Hospital Santa Marcelina, levando um lenitivo de solidariedade e afeto as pessoas

enfermas, através do grupo Pastoral da Saúde mantido pela religião católica.

Figura 13

Page 28: RF Longevidade

28

Muitas atividades sociais exigem do voluntário um preparo mínimo, através de estudos

específicos como primeiro socorros e atendimento ao público, para poderem atuar na tarefa.

Com isso percebe-se que os idosos que realizam trabalhos sociais, também realizam outras

atividades intelectuais ou já realizaram conhecimentos novos nesta fase, sendo apontada por

03 (três) entrevistadas que possuem formação na Faculdade da Terceira Idade promovida pela

Universidade Camilo Castelo Branco.

É nítido o prazer dos entrevistados ao relatarem sobre estas atividades voluntárias em

que auxiliam o outro. Fora o bem-estar psíquico, também gera um interesse intelectual maior,

direcionando o idoso para busca de novos conhecimentos e maiores informações, como

apontado por entrevistados que, por realizarem trabalhos sociais que exige informações atuais

sobre a legislação, possui vários cursos e assiste várias palestras na USP Leste e pelo

Conselho Municipal do Idoso em áreas da saúde, jurídica e política.

Figura 14

Por este quesito levantando na pesquisa evidencia-se a questão de produtividade do

idoso, não a produtividade para a economia de políticas públicas, porque está é preciso de

novas estratégias governamentais para suprir uma demanda maior de idosos no país,

deflagrando um déficit crescente na previdência que necessita de um quadro superior de

trabalhadores regulamentados em contraponto com o número de aposentados para sustentar

essa demanda cada vez maior, mas o quanto o idoso pode ainda realizar ações com autonomia

contribuindo em beneficio de outras pessoas e de si próprio, inclusive por seu progresso

Page 29: RF Longevidade

29

intelectual, realizando cursos e estudos que estimulem o seu processamento cognitivo, não só

em nível de estimulação neural e memória, mas também para tornar-se um indivíduo mais

politizado, participativo e crítico diante de seus atos, facilitando seu convívio na sociedade,

ciente de seus deveres e exigindo também seus direitos como cidadão.

Com as respostas apuradas sobre projetos futuros e sonhos realizados, muitos

colocaram em evidência a conquista da liberdade, tanto profissional quanto pessoal, percebida

no contexto familiar e social em que passaram a realizar atividades que antes não podiam por

conta das responsabilidades sociais.

Na maioria dos relatos os prazeres foram em fazer algo para si, como atividades

físicas, lazer, e alguns nas realizações familiares e sociais. Observa-se que nessa fase o

individuo está mais voltado para suas questões intrínsecas do que para a conquista de valores

externos.

Um fator destacado foi a importância das atividades realizadas nos grupos de Terceira

Idade que fazem parte. Mesmo aqueles entrevistados por indicações aleatórias, também

atribuíram satisfação nos grupos que frequentam. Foi possível perceber como essa prática

para o idoso tem grande significado. É ali no contato com o grupo que ele interage com os

amigos, trocam informações, pratica exercícios para seu condicionamento físico e psíquico,

possibilitando ao idoso manter-se atualizado e conectado com o novo com bom ânimo.

Figura 15

Page 30: RF Longevidade

30

Durante a aplicação das entrevistas, tivemos a oportunidade de acompanhar uma das

atividades, ministrada pela professora de dança em um dos grupos, em que os idosos faziam

movimentos com os braços, mãos, pernas e os pés, todos sentados. Com movimentos simples

e eficientes, de forma festiva, eles demonstravam sua satisfação e felicidade pela realização

daquela pequena dança.

A neurocientista e psicóloga Kelly Lambert, professora titular da cadeira de psicologia

da Randolph-Macon College, diz que os gestos manuais que são realizados de forma

significativa ativam áreas maiores do cérebro do que a movimentação de áreas bem maiores

do nosso corpo. Quando realizamos uma pequena tarefa manual e que tenha valor e

significado íntimo, como fazer crochê para um ente querido ou folhear um álbum de

fotografias, as conexões neurais são então reforçadas e as células dessas áreas do cérebro

permanecem ligadas secretando neurotransmissores como dopamina e serotonina, que geram

a sensação de bem-estar. Há ainda fortes indícios que todo esse processo estimula a

neurogênese (produção de novas células cerebrais), um fator importante no combate à

depressão (MenteCérebro, Ed.248, 2013).

Por isso, são tão importantes essas atividades simples ministradas por estes grupos,

levando satisfação e mantendo a capacidade neural ao idoso.

Figura 16

Page 31: RF Longevidade

31

Pelo quadro apurado das realizações de sonhos, novamente retomamos o contexto

sócio-histórico e econômico do individuo. Sendo a maior parte dos entrevistados de classe

social média, com baixo poder financeiro, a maioria foi enunciado como prazer o de realizar

passeios e viagens que antes não podiam.

Uma das entrevistadas teve como realização de sonho a celebração de 60 anos de seus

votos matrimoniais, um sonho conquistado na terceira idade que na juventude, por conta das

condições financeiras dos noivos e familiares, não puderam realizar uma celebração

matrimonial como sonhava, apenas o acordo nupcial registrado em cartório e na igreja, sem

convidados. Outro entrevistado realizou na terceira idade o sonho de comprar um automóvel

antigo, adquirindo aos 70 anos um Chevrolet modelo 39, entre outros, que passado os anos já

se tornaram uma relíquia, mas um bem sonhado por ele na juventude e conquistado agora na

velhice. Outra realização peculiar foi a conquista do prêmio de Rainha da Terceira Idade por

uma entrevistada, demonstrado o quanto estes valores sentimentais são guardados em nossa

psique mexendo continuamente com nossa subjetividade, não importando o quanto tempo

transcorra para realização desse desejo, mas quando realizado traz da mesma forma satisfação

e um ganho enorme para o psiquismo do sujeito.

Figura 17

Percebe-se o quanto a terceira idade tem uma representação de liberdade para a

maioria, podendo o individuo ser livre para escolher suas atividades e prazeres sem limitação

ou opressão social, podendo ainda conquistar seus objetivos, mesmo os subjetivos, e traçar

metas sem receio. Esse condicionamento privativo é sentido na forma dos papéis sociais

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32

definidos pela demanda dos nossos compromissos e suas exigências sociais, que somos

muitas vezes compelidos a representar no papel de filho, pai, profissional, marido, amigo e

etc., todos vividos de uma só vez, e sentido por um único individuo. Com a velhice, o

individuo tem a possibilidade de retirar algumas dessas exigências sociais, sentindo-se mais

leve e livre para fazer suas escolhas condizentes com sua satisfação, e não somente pelo

cumprimento de suas responsabilidades sociais.

No final das entrevistas foi possível perceber que a maioria dos entrevistados,

conforme conceito de Erikson, conseguiram ter um desenvolvimento psicossocial equilibrado

na velhice, integrando seu passado com sabedoria no presente, olhando para os desacertos

com coragem para reverte-los com êxito em novos desafios, sem julgamentos ou lamentações.

Muitos responderam sobre a juventude ou as vivências passadas não com

contrariedade ou saudosismo, mas sim como fato vivido, trazendo dessa experiência passada

um aprendizado para o presente. Como num relato que das experiências de trabalho rural e

pesado sofrido na infância, resquícios do tempo da escravidão vivenciado ainda quando

criança, resultando no entendimento do entrevistado, maior resistência para enfrentar na

atualidade os problemas frenéticos do dia-a-dia, inclusive maior disponibilidade física e

saúde. Foi nítido em alguns relatos que para adaptar-se a nova fase, muitos entrevistados

buscaram novas tarefas e conhecimentos, evitando a monotonia e o condicionamento estéril.

Também foi possível perceber que os entrevistados que tinham uma rotina mais agitada,

continuando a realizar suas tarefas ou outras responsabilidades significativas, possuía um

brilho no olhar ao falar, uma vivacidade e bom humor característico de pessoas satisfeitas e

realizadas, sentido em algumas frases colhidas em muitos, ditas de forma tão simples e

espontânea: “Hoje eu sou feliz” ou “Já realizei tudo o que tinha pra realizar”.

Em alguns foi percebida a satisfação de realizar a entrevista, de falar sobre suas

experiências até como certa carência, mas sendo natural desta fase em que o idoso gosta de

relembrar e comentar sobre sua vida aos mais jovens, fato bastante positivo para manter essa

troca intergeracional. De todos os casos apresentados, somente um foi percebido de forma

mais contundente como má elaboração do desenvolvimento psicossocial na velhice pelo

conceito de Erikson. O entrevistado durante todo tempo se posicionou como vítima das

queixas apresentadas, sempre retornando numa mesma situação que lhe foi desagradável em

todas as perguntas, até nas que eram em relação aos prazeres e conquistas, sugestionando o

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33

problema como obstáculo para todos seus infortúnios e enfrentamentos, sem aparentar

superação do mesmo para integração com o presente, o que lhe possibilitaria vislumbrar

novas oportunidades e conquistas.

O psicólogo suíço, Carl Gustav Jung, compara a vida psíquica humana ao ciclo do sol

em quatro etapas. A primeira e segunda etapa seria equivalente a infância e juventude, em que

o indivíduo percorre sua jornada exuberante, irradiando sua luz externamente com o objetivo

de alcançar o topo mais alto, cobrindo a todos com seus raios de luz, o que equivale ao

exercício desprendido pelo individuo a nível social, familiar, profissional, etc. Já, a partir do

seu cume ao atingir o meio-dia, seria correspondente a terceira e quarta etapa equivalente a

meia-idade e velhice, em que ele passa a reverter sua luz para dentro de si, recolhendo

inversamente sua luz para si, que seriam todos os valores e ideais adquiridos pela manhã,

declinando-se, diminuindo sua luz e calor até chegar o cair da noite, o fim da vida.

“...Quando moro numa casa que eu sei que vai desabar sobre a

minha cabeça nos próximos dez dias, todas as minhas funções

vitais são afetadas por estes pensamentos; mas se me sinto

seguro, posso viver nela de maneira normal e confortável”.

(Jung, 1971, § 792).

Assim, seria imprescindível que o homem também se preparasse para a velhice,

olhando para dentro de si e se ocupando dos valores construídos e apreendidos da infância até

a meia-idade, retirando suas máscaras sociais, a persona, e se confrontando com sua sombra,

para que seu entardecer não seja constituído por bases insólita e fugaz, ou ilusória.

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34

5 – Conclusão

O homem em seu percurso relega a velhice, talvez por ser uma fase em que ele deverá

confrontar-se consigo mesmo, conforme o oitavo estágio psicossocial de Erikson, antevendo

antecipadamente esse confronto como desconfortável e indesejável não se permitindo a um

prévio preparo psíquico para o fato.

Isso decorre ao olharmos para a velhice sempre em seu aspecto mais trágico e

tenebroso, como a decrepitude e a morte. Uma civilização que sempre cultuou valores

externos, enaltecendo o corpo e status sociais, vê refletida na velhice fatores irreversíveis e

inversos ao seu culto, ocasionando desespero e desprezo, por algo que não sabe como lidar.

O culto ao corpo, cada vez mais crescente devido ao favorecimento da tecnologia, cria

padrões de beleza que não cabem à velhice. O corpo não é entendido como um instrumento

necessário que precisa estar sã para se viver, mas sim, como um objeto de prazer para

satisfazer as exigências mais esdrúxulas do individuo, por uma demanda social cada vez mais

líquida e hedonista.

Na grande maioria, o belo, mesmo quando subjetivo, sempre esteve associado à

juventude, e o velho à feiura. Como as fadas boas representadas por mulheres jovens e

crianças, e as bruxas por velhas feias e más. Mesmo quando surge uma bruxa bonita e

formosa, logo sua intenção em ludibriar é desmascarada e ela se transforma numa bruxa velha

repugnante e má. Assim, a moral e a virtude também têm sua representatividade no novo,

ficando o velho sem referência para alguém querer conquistar. Sem contar a morte que vem

de acréscimo no pacote da velhice, um fator desconhecido e sem precedentes que causa a todo

ser humano medo e insegurança. Ou seja, no final das contas, é mais do que normal o papel de

vilã que recai sobre a velhice.

Por esses fatores, a velhice se torna difícil e até mesmo intragável contando, portanto,

além do esforço individual do idoso para este enfrentamento, também de estratégias e

planejamentos sociais que aliviem o papel da velhice, como vimos na pesquisa; ONGs e

instituições que desenvolvam um trabalho de apoio à terceira idade; familiares e amigos que

apóiem e facilitem o percurso dessa fase; faculdades e entidades que levem o conhecimento e

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35

oportunidade de progresso intelectual, e ainda; a elaboração de uma estrutura socioeconômica

que promovam o bem-estar geral a esse grupo.

Todos esses elementos servem como apoio a essa fase delicada da vida humana,

levando-os a deslocar dos fatores externos que os guiaram até hoje, a focarem-se mais nos

internos, conduzindo-os a um bem-estar psíquico para integração dessa fase da vida com

sabedoria.

Precisamos pensar na velhice como uma fase contínua da vida que, como vimos, ainda

é possível ter produtividade, interação social, desenvolvimento intelectual e psíquico, e não

puramente como uma fase terminal sem créditos para o presente e futuro. É interessante se

tomar medidas preventivas de planejamento futuro não só a níveis sociais, mas em nossas

metas e projetos individuais, que abranjam também essa fase da vida.

Para pensar no bem-estar da velhice é preciso levar em conta todos os aspectos que

englobam o idoso, estruturas biológicas, física, psíquica, econômica e social. Qualquer um

desses fatores se pensados isoladamente, não fornecem subsídios suficientes para se tentar

alcançar êxito na velhice por uma longevidade não só maior, mas melhor.

“Viver é afinar o instrumento

de dentro pra fora, de fora pra dentro.

A todo hora a todo momento,

de dentro pra fora, de fora pra dentro.

Tudo é uma questão de manter,

a mente quieta, a espinha ereta

e o coração tranquilo...”

(Serra do Luar – Walter Franco, 1981).

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36

6 – Referências Bibliográficas

6.1 – Referências literárias

BAUMAN, Z. Vida líquida. São Paulo: Zahar, 2009.

BEAUVOIR, S. de. A velhice. São Paulo: Nova Fronteira, 1990.

BOBBIO, N. O tempo da memória. São Paulo: Campus Elsevier, 1997.

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6.3 – Referências visuais

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{http://www.cinefilmesonline.net/2013/01/assistir-filme-amor-online-legendado.html}.

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