Ricardo coutinho e a classe artística campinense

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Ricardo Coutinho e a classe artística campinense.

De forma tímida, no último dia 22 de abril de 2010, parece ter dado início a semana de arte moderna do estado da Paraíba, coincidentemente, no dia 22 , parafraseado aqui a semana de arte paulista. O evento histórico da arte da política paraibana, aconteceu no Museu de Arte Assis Chateaubriand. A figura mais ilustre ao evento foi o Presidente da FUNJOP , o Músico de renome nacional e internacional Chico César.

O encontro que pegou a todos de surpresa, foi uma iniciativa do movimento musical campinense “Na Tora”, uma banda de músicos que tenta de forma atrevida burlar o estabelecido, e articular pessoas para uma reflexão sobre o processo de democratização dos equipamentos públicos a serviço dos artistas e da população.

De forma discreta, o Ex-Governador Cássio Cunha Lima, foi um dos primeiros a chegar ao evento, que de forma espontânea recepcionava a todos, parecia mais um artista incorporado ao pleito dos demais, que menos um político promotor de políticas culturais. Outra figura imponente presente foi o Professor Cristovão Andrade, Gilbran Asfora, Enivaldo Ribeiro e João Dantas. Mais a grande vedete era a figura do Ex-Prefeito de João Pessoa Ricardo Coutinho, um dos debatedores. Que ao olhar de um desconhecido, não se parecia um político de carreira, pois sua simplicidade, a exemplo do Cássio, se identificava mais como um artista e não mero consumidor de cultura, parafraseando aqui o próprio discurso do mesmo.

O escândalo do momento foram as palavras que saíram da boca do Mestre em dança folclórica Hipólito Lucena, um dos palestrantes da noite, convidado para fazer um breve panorama da política cultural de Campina Grande. Foi uma avalanche de denuncias, que fez estremecer no túmulo, os ossos do Ex-Prefeito Severino Cabral. Veja pequenos trechos da fala do ativista cultural que abriu o ciclo de debates da revolucionária semana da política moderna paraibana:

“Os movimentos culturais são todos desarticulados, sem nenhuma cumplicidade com o poder público, mesmo existindo uma lei municipal de incentivo a cultura, os artistas passam meses para receber o dinheiro, e quando vem receber o dinheiro já está defasado e é liberado em pequenas parcelas, que mais prejudica do que mesmo ajuda”. E o pior está por vir, quando afirma que “em 2008, 200 projetos foram aprovados, mas sequer o dinheiro foi liberado. Outro agravante de sua denuncia está relacionado aos cachês dos artistas do São João, pelos quais, muitos artistas, ainda não receberam o dinheiro pelo serviço prestado, além dos artistas que trabalharam no Alto do Natal do Sonho da Gente em dezembro de 2009, ainda não receberam um centavo”.

Segundo Hipólito, “o governo municipal tem usado o comissão para justificar que o não repasse da verba do fundo de incentivo a cultura é culpa dos membros da comissão”. Isso gerou uma perplexidade a aproximadamente 120 pessoas presentes ao evento. Parecia que tudo que Hipólito falava não era verdade, pois sempre esteve próximo do governo e acreditava na política cultural do administrador público, a exemplo de tantos outros artistas. Mais o caldo engrossou, quando chegou a afirmar que o governo municipal desconsidera qualquer forma de dialogo democrático com os artistas, quando desrespeito a indicação do nome de um artista para administrar o Teatro Municipal e nomeou um parente do Secretário de Educação para o cargo. Afirmando que Alana Fernandes, na direção daquela casa não corresponde aos anseios da classe artística, pois

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não se compreende um teatro fechado há 18 meses para uma reforma”. Logo, acrescento, como sinônimo da atividade visível, não passa apenas da propaganda da prefeitura, na parede de zinco que rodeia aquela casa de espetáculo.

Desdobrando todo o seu leque de insatisfação com a política cultural local, ou talvez para parecer brilhante aos olhos do ex-candidato ao governo do Estado Ricardo Coutinho, ele metralhou sem pena de afirmar que, “estamos caducos e para se fazer alguma coisa é preciso está aliado, uma saída cômoda para se conseguir alguma merreca em promoção da cultura, a política cultural do privilégio”. Outro dado que causou estranheza aos presentes foi a vertiginosa decadência do número de quadrilhas, segundo a sua dissertação de mestrado: antes do atual gestor municipal, o número de quadrilhas juninas chegava a 500 e hoje esse número está reduzido a 30 quadrilhas, as apadrinhadas do prefeito”.

Para que os presentes pudessem fazer uma análise comparativa da política cultural de João Pessoa em relação a Campina Grande, Chico César começou fazendo uma abordagem histórico-social da conjuntura de 1970 até os dias de hoje, passando pelos movimentos sócias, “e o que temos hoje é fruto desse legado histórico de resistência”.

Para César, “não vivemos em João Pessoa nos melhores dos mundos, até porque encontramos dessabores, por parte do governo do estado que não tem nos apoiado”. Afirmou que “João pessoa já viveu momentos bem parecidos com o de Campina Grande. Mas é preciso que as comunidades estejam organizadas, o nosso sucesso é fruto da participação popular, do respeito a diversidade cultural, da troca de experiência entre as vivências culturais dos atores culturais dos bairros – do projeto de fomento cultural FALA BAIRRO. Esse sucesso é fruto do amadurecimento político de uma sociedade, que esperou 30 anos para colocar no poder alguém identificado com as causas populares. E não fruto do respaldo de minha personalidade como uma celebridade”.

Foi uma noite de muitas surpresas, não foi um comício antecipado, mais um momento para uma reflexão apurada, o respeito a cultura de um povo, caminhando lado a lado com o político. Foi o que considerou Cesar: “fazer produção cultural não um site individual, é uma atitude política coletiva. Comunidade protagonista e não platéia. Além da capacidade de dialogar com as diversas ações dos órgãos municipais”.

O Ex-Governador Cássio, com sua modéstia, apenas pincelou a paleta dos debates, acrescentando que quando governo reservou 2 milhões para cultura, e que lamenta que alguns equipamentos de cultura estejam fechados como os Antigos Cinemas Capitólio e São José. Além da contribuição histórica, a construção do novo prédio do Museu de Arte Assis Chateaubriand, para dá dignidade ao acervo daquela instituição, penalizado pela intervenção do terminal de ônibus Integração, atitude louvável, mas que poderia ter sido escolhido outro local, e do Museu dos três pandeiros, ou seja, Museu de Arte Popular no açude velho – todas obras com orçamento assegurado, sob responsabilidade da UEPB”.

Para encerrar o ciclo de debates, Ricardo Coutinho lembrou da sua trajetória como Vereador de João Pessoa, que em 1993, foi autor da Lei Municipal de Cultura. Para ele, “não é preciso ficar fora só falando, é preciso ‘emburacar’ dentro do poder público. Todos têm o direito de participar, ninguém é dona da cultura”. Fica claro no seu discurso a afirmação da tese de Chico César, a promoção cultural é uma atitude política.

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Aproveitou a oportunidade para fazer uma crítica positiva as rádios comunitárias, ‘que foram criadas com objetivo de promoverem a produção cultural local e desviaram do objetivo criacionista, se assemelhando as demais rádios tradicionais”. Para promover o nosso artista, é preciso ‘encangá-lo’ ao lado do artista de fora, na medida que for convidado para um grande evento local. E se você quiser ver a alma do gestor público em relação a cultura, olhe o que ele destinou na lei orçamentário do município”.

Finalizando o seu discurso, “é preciso democratizar a cultura, o acesso as artes é tão importante quanto ter acesso a informação. Fazer circular a produção, levando a mesma para quem não tem dinheiro. Dá oportunidade ao povo de ver algo extraordinário”.

Aplaudido pelos presentes, ficou no ar um asterisco da esperança, da superação do estágio anterior, uma chama de continuar sonhando com dias melhores, paradoxalmente, o sentimento de vivenciarmos nossa política cultural na UTI, apenas emblemática: somos capazes e que aqui existem muitos artistas, porém, silenciados pelo ostracismo da inércia letárgica da indiferença, matar por inanição, quanto mais isolados melhor, o aniquilamento do sonho impossível. Não tão distante de gestores anteriores ao atual. Não podemos agora com esse discurso, encontrar um pode expiatório para suplantar uma realidade histórica.

Gilson NunesCrítico de Arte – Arte-Educador – Artista Plástico e Ex-Diretor do SINTAB

Campina Grande, 25 de abril de 2010.