Ricardo reis
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Ricardo Reis
Heterónimo
Neste trabalho vamos sintetizar as características de Ricardo Reis,
o heterónimo de Fernando Pessoa, as características estilísticas
que ele usa na escrita. Vamos analisar as partes lógicas de um
poema de Ricardo Reis «vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do
rio», a utilização de símbolos, de vários recursos expressivos, a
utilização de palavras negativas e o uso dos tempos verbais no
poema.
Introdução
É um poeta clássico, da serenidade epicurista, que aceita com calma
lucidez, a relatividade e a fugacidade(pressão) de todas as coisas.
A filosofia de Ricardo Reis é a de um epicurista(Epicurismo é o desejo para
encontrar a felicidade, buscar a saúde da alma, lembrando que o sentido da vida é o
prazer) triste, pois defende o prazer do momento “carpem diem”(aproveite o
momento) como caminho para a felicidade. Apesar deste prazer que procura e
a felicidade que deseja alcançar, considera que nunca se consegue a
verdadeira calma e tranquilidade, ou seja, sente que tem de viver em
conformidade com as leis do destino, indiferente à dor, conseguida pelo
esforço estóico(firme, senhor de si mesmo; inabalável, impassível, austero) lúcido
e disciplinado.
Síntese de Ricardo Reis
A tentativa de iludir o sofrimento resultante da consciência da pobreza da
vida, do fluir continuo do tempo e da fatalidade da morte, através do
sorriso, do vinho e das flores.
A intemporalidade das suas preocupações: a angustia do homem perante a
breve vida, a inevitável Morte e a interminável busca de estratégias de
limitação do sofrimento que caracteriza a vida humana.
EPICURISMO((é o sistema filosófico ensinado por Epicuro de Samos,
filósofo ateniense do século IV a.C)
- Busca da felicidade
- Moderação dos prazeres
- Fuga à dor
- Ataraxia (tranquilidade capaz de evitar a perturbação)
ESTOICISMO (conformismo)
- Aceitação das leis do destino
- Indiferença face às paixões e à dor
- Abdicação de lutar
- Auto disciplina
Motivos poéticos de Ricardo Reis
HORACIANISMO (Horácio foi um poeta lírico e satírico romano, além de filósofo. É conhecido por ser um dos maiores poetas da Roma Antiga).
- Carpe diem: vive o momento
- Aure mediocritas: a felicidade possível está na natureza PAGANISMO ( o paganismo é o culto e o respeito às forças da Natureza.
- Crença nos deuses
- Crenças na civilização da Grécia
- Intelectualização das emoções
- Medo da morte
Neoclassicismo ( movimento artístico internacional que surge na segunda metade do séc. XVIII
- Poesia construída com base em ideias elevadas
- Odes
Submissão da expressão ao conteúdo: a uma ideia perfeita corresponde a uma expressão perfeita.
Estrofes regulares e versos brancos. Recusa frequente à assonância, à rima interior e à aliteração. Predominância da subordinação (subordinadas causais,
concessivas, temporais … etc.) Uso frequente do hipérbato (alteração ou inversão da ordem direta
dos termos na oração, ou das orações no período) Uso frequente do gerúndio e do imperativo. O uso latinismo: atro, ledo, infero.
Caraterísticas estilísticas
Vem sentar-te comigo, Lídia, á beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendemos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos).
Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
Mais longe que os deuses.
Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassossegos grandes.
Sem amores, nem ódio, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar.
Amemo-nos tranquilamente, pensando que podíamos,
Se quiséssemos, trocar beijos e abraços e carícias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
Ouvindo correr o rio e vendo-o.
Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, que o seu perfume suavize o momento
Este momento em que sossegadamente não cremos em nada.
Pagãos inocentes da decadência.
Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-ás de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
Nem fomos mais do que crianças.
E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave á memória lembrando-te assim – á beira – rio,
Pagã triste e com flores no regaço.
O poema pode-se dividir em três partes:
1ª - Desejo epicurista de usufruir o momento presente (duas
primeiras estrofes);
2ª - Renuncia ao próprio gozo desse momento que é a vida
(terceira à sexta estrofe);
3ª - Explicação dessa renúncia como única forma de anular o
sofrimento causado pela antevisão da morte (duas últimas
estrofes);
Rio
à beira do
O seu curso
Cenário de beleza natural em que se enquadra a situação amorosa
Sossegadamente fitemos o seu curso
E aprendemos que a vida passa
Símbolo da fugacidade dos bens terrenos
Enlacemos
as mãos
I
Nesta primeira parte podemos ver a atitude amorosa que resulta da
interpretação dela como símbolo de fugacidade, interpretação que a razão
comanda (aprendamos, pensemos) na constante obsessão do nada.
Por um lado determina um poeta um desejo de fruir o presente e de
aproveitar o fugaz momento, único bem que nos é dado possuir, por outro
lado reveste o amor de uma gélida frieza, pelo calculado e pensando
sentido que retira toda a espontaneidade ao mais simples gesto de ternura.
II
Desenlacemos as mãosAmemo–nos tranquilamenteSentados ao pé um do outro
Atitude amorosa
Símbolo de
Ouvindo correr o rio e vendo-o
Passividade
Nesta segunda parte do poema, é nítido o afrouxar do impulso amoroso, a
tal ponto que, do gozo do momento presente, mas não fica contida uma
emoção que aos poucos se anula para terminar numa atitude de quase
indiferença e de irremediável incomunicabilidade (sentados ao pé um do
outro).
E mais uma vez essa recusa é símbolo mais amplo de um desencantado
viver que nega qualquer paixão mais forte e todo o esforço que se sabe
impotente para alterar a força do destino cruel, numa passividade à
margem da vida, quase fora dela.
III
…se for sombra antes
E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio
Antevisão da morte
…lembrar – te – as de mim depoisSem que a minha lembrança te ardaou te fira ou te movaEu nada terei que sofrer ao lembrar – me de tiSer – me – ás suave à memória
Vitória sobre a morte, na medida em que o eu poético não sofrerá com ela
Aqui podemos ver o remédio ilusório para a obsessão da morte que, no final
do poema, Reis antevê e disfarça em eufemísticas perífrases clássicas.
É para exactamente superar a morte, ou superar – lhe pelo menos o cortejo
do sofrimento e saudade que acompanha, que ele opta por essa vivência
atrás definida, que nada deixe que se lamente ou se deseje.
Ricardo Reis usa, neste poema:
O vocativo da segunda pessoa ( «Vem sentar-te comigo, Lídia, á beira do rio»)
associado ao modo imperativo: vem, pega, deixa-as.
O uso da primeira pessoa do plural do presente do conjuntivo com sentido de
imperativo - fitemos, aprendamos, enlacemos, pensemos, desenlacemos, amemo-nos,
colhamos, relaciona-se com a existência de um interlocutor (Lídia),a quem o discurso
é dirigido.
A utilização de vários recursos expressivos:
Advérbios ou expressões adverbiais, como: sossegadamente (duas
vezes), silenciosamente, sem desassossegados grandes,
tranquilamente;
A repetição de palavras da família de laço: «enlacemos»,»
desenlacemos», «nunca enlaçamos»;
A predominância da função apelativa que o vocativo inicial logo
sugere;
O ritmo lento, pausado, sugerido pela pontuação, pelos advérbios
de modo que atrás referidos, pelo uso de sons fechados e nasais;
A metáfora do « antes» (a vida) e do «depois» (a morte) e o papel
da memoria/lembrança, na terceira parte do texto.
Concluímos que Ricardo Reis é um epicurista triste, pois
defende o prazer do momento “carpem diem” como caminho
para a felicidade. Reis Procura a felicidade que deseja alcançar,
considerando que nunca se consegue a verdadeira calma e
tranquilidade com as leis do destino.
A sua forma de expressão vai buscá-la aos poetas latinos, de
acordo com a sua formação.
Podemos obter assim, de forma mais concreta, as
características estilísticas que Ricardo Reis utiliza e perceber a
interpretação deste poema.
Conclusão