Roma

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Pra começo de conversa não é “Dona Roma”; Roma não tem “dona” e nem tem dono.” Brincando, brincando, Roma que um dia chegou a se chamar Romilda Conceição da Silva, mostra toda a sua segurança, personalidade e o bom humor. Garante que sempre foi e se sentiu assim: linda, leve, solta. “Sou uma sambista, uma passista que chegou ao título de Embaixatriz do Samba. Não vou mudar nunca.” Ok, Roma, estamos apresentados.

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Quem manda Quem

manda Quem

em Roma

e o samba

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Pra começo de conversa não é “Dona Roma”; Roma não tem “dona” e nem tem dono.” Brincando, brincando, Roma que um dia chegou a se chamar Romilda Conceição da Silva,

mostra toda a sua segurança, personalidade e o bom humor que vem distribuindo nos seus 63 anos de vida bem vivida. Mãe de Vicente Luiz Júnior, avó da menina Letícia, que hoje já está com 10 anos de idade, ela garante que sempre foi e se sentiu assim: linda, leve, solta. “Sou uma sambista, uma passista que chegou ao título de Embaixatriz do Samba. Não vou mudar nunca.” Ok, Roma, estamos apresentados.

Existem duas maneiras de se conhecer Roma: fre-quentando bailes e o carnaval de rua de Atibaia ou en-tão no prédio da Prefeitura de Atibaia, onde ela é figura importante de todos dias. As pessoas que frequenta-vam, tempos atrás, as importantes escolas de samba lá da Capital, como a Vai-Vai, por exemplo, no bairro do Bixiga também conheciam Roma. E muito bem.

O que é ser Embaixatriz do Samba? – pergunta o repórter, e Roma vai logo explicando no seu jeitão descontraído: “Embaixatriz é “a nega véia do sam-ba!” Ponto para Roma e para todos que tinham es-sas dúvidas.

Embaixatriz, portanto, é a figura que já passou por todos os pedaços, todos os patamares, todos os es-tágios e todos os caminhos do samba e hoje perten-ce à corte. É ela, a Embaixatriz Roma quem vem na frente de todos os desfiles de carnaval da cidade, na frente também, no abre-alas de cada uma das esco-las. “Ela abre o samba, abre os carnavais.” Claro que

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você já viu e já cantou junto com a Roma, Embaixa-triz dos carnavais de Atibaia.

Há dez anos Roma desfruta dessa honraria. “Um dia os sambistas da cidade se reuniram para esco-lher o rei, a rainha e as princesas do carnaval daqui. Decidiram também aclamar uma Embaixatriz, fi-gura que estaria acima de tudo na ordem das coisas do samba. Fui escolhida por unanimidade. Mais que isso, fui eleita por aclamação...” Da mesma forma que um dia a Roma italiana já mandou e comandou o mundo politicamente, a Roma patrícia nossa pas-sou a mandar no carnaval de Atibaia, respeitada em todos os rincões do samba nacional, noves fora até por gregos, troianos e romanos que ficaram seus fãs. E quem não se curvaria diante de uma Embaixatriz tão poderosa?

Nascida e criada em Atibaia, Roma já veio com mú-sica na veia. “Meu pai era tocador de violão. A gente morava em uma vila de casas ali na Rua José Boni-fácio, no centro da cidade. Virou costume o pessoal daquele lugar se reunir nos finais de semana num bailinho e coisa e tal. Comecei a dançar naquele tempo. Eu tinha oito anos.” Aquela vila de casas foi destruída, mas Roma cresceu no samba. Vai ver der-rubaram as casas para ampliar a cadeia que sempre funcionou por ali. O Brasil é um país irônico, prende até a liberdade do samba...

“Com 14/15 anos meu pai levava a gente nos baili-nhos do Sindicato dos Têxteis que ficava na rua Adol-fo André. Éramos seis irmãos. Lembro que vinha até conjuntos de fora para tocar e animar o povo. Foi aí que eu comecei a aprender a dançar”, conta Roma. Mas não foi aí que o carnaval tomou conta dela. “Por incrível que pareça naquele tempo eu nem gostava de Carnaval.” Mas num dado momento ela resolveu

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ficar junto com um mineiro que chegou todo apai-xonado. “E nós tínhamos um amigo que morava em São Paulo, bem ali na Bela Vista, terra da escola de samba Vai-Vai. Costumávamos passar fins de sema-na por lá, naquele ambiente. Tudo quanto era artista circulava ali e eu conheci todo mundo. Meu ex, que já faleceu, gostava tanto do lugar que resolveu que a gente casaria lá na Bela Vista. Tudo por causa do samba, que ele gostava muito. Depois de nove anos de convivência ele resolveu casar comigo de papel passado. Achou que casando, me prenderia para sempre. Que bobagem. Não é o papel que prende...”, filosofa Roma.

De qualquer forma, foi por causa do marido que Roma caiu no samba. “O presidente da Rosas de Ouro, famosa escola de samba lá da Capital já tinha me visto dançar e lembrou de mim quando a esco-la precisou de uma “passista-show”. Ele veio e me convidou. Só que “passista-show” tem que sair “pe-ladona”, aí o meu marido engrossou.” Roma manda a modéstia às favas e lembra: “Desculpe, mas na-quele tempo eu tinha um corpo lindíssimo, escultu-ral mesmo. Melhor até que hoje”, sorri. Foi quando o seu marido implicou e disse: “peladona não; só deixo ela sair de baiana”. E aí quem não gostou foi o presidente da Rosas de Ouro. “Resumindo, eu dei-xei de dançar na avenida para que o meu casamen-to não dançasse...” Roma lembra e morre de rir com seu jeitão alegre.

A primeira grande apresentação de Roma no car-naval de Atibaia aconteceu em 1979. “Foi tudo sem querer. Tinha um pessoal bacana aqui da cidade que decidiu criar um bloco para sair no carnaval. Lem-braram que meu marido era sambista e convocaram toda a patota de amigos dele. Deu um conjunto le-

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gal. Tudo bem, tudo certo, o grupo ensaiou, tornou a ensaiar até que as pessoas perceberam que a coi-sa não iria rolar. Era todo mundo muito legal, gente dos melhores bairros da cidade, coisa fina mesmo. O pessoal adorava o samba, mas na verdade ninguém tinha o pique, ninguém tinha a manha, ninguém ti-nha o toque do samba no pé. Porque samba é assim, você pode até ter samba na alma, mas sambista que é sambista tem que mandar ver mesmo é no pé. A coisa ia fracassar”, conta Roma.

Mas a história continuou. “O pessoal tinha uma ideia legal de fazer com que todos os componentes do bloco saíssem com o corpo e a cara pintados de preto. Tava tudo muito bonitinho, só que as pessoas não sabiam sambar. E aí? Aí obrigaram meu marido a me buscar em casa. Ele chegou e disse: “você vai ter que sair no bloco.” Ele veio cheio de certezas e trouxe até a roupa. Era um biquíni menor que nada. Eu mesmo fiquei surpresa, pensei: “esse cara ciu-mento enlouqueceu...” Mas ele insistiu: “Não, não, o que é bonito tem que ser mostrado...”, disse. Aí eu pensei: endoidou de vez. E topei. E fui. E olha, foi um sucesso. O que eu ganhei de troféu, nossa! Os jurados tinham vindo de São Paulo. Me consagrei.” Roma sorri suas lembranças.

Sim, porque foi assim que Roma foi pra rua. “A par-tir daí ninguém me segurou mais. Antes eu já adora-va só o fato de poder ir a para os ensaios, imagine o que eu sorri quando veio a oportunidade de sambar na rua. O pessoal começou a dizer: “A Roma é uma sambista.” Sambando, sambando, até hoje Roma é a Embaixatriz do samba da cidade.

Samba à parte, para quem não sabe, Roma tem uma função importantíssima no cenário político de Ati-baia: é ela quem faz e serve o cafezinho dos “homi”

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da política da cidade. “Faz tempo que fiz concurso na Prefeitura. Fui trabalhar no Departamento Jurí-dico. O secretário era o Dr. Júlio César Ribeiro, que depois foi Secretário de Governo na administração do prefeito Flávio Callegari. O Dr. Júlio Cesar levou toda a sua equipe e eu fui junto porque ele exigiu. Era para ficar um ano e meio. Os governos foram mudando, os prefeitos foram trocando e eu fui fi-cando. Eu sei que estou lá desde 1991.”

Roma gosta do que faz, não se queixa dos seus ga-nhos na prefeitura, e diz que a pergunta mais difícil para responder é sobre quem foi o melhor prefeito em todo o seu tempo de trabalho. “Gostei de todos e nenhum deles me magoou ou feriu”, afirma. Sinal que todos se curvaram diante de Roma... Fizeram bem. “Já vivi muitos momentos bons e ruins, claro, na Prefeitura, no gabinete. Mas tudo fica no silên-cio. Eu não poderia dizer nada. Na verdade sempre fui muito bem tratada por todos.”

Roma serve café e água durante reuniões impor-tantes, fica junto do poder da cidade, mas é absolu-tamente profissional. “Não vejo, não ouço, não lem-bro. Não analiso as pessoas como políticos, analiso como pessoas, e como pessoas não tenho nada con-tra quem sempre me tratou muito bem...” Detalhe importante: Roma jura que nunca derrubou café em ninguém... Queridinha de todos os prefeitos, “eles fazem questão de me apresentar para as pessoas que visitam o gabinete dizendo: esta é a famosa Roma.”

Aposentada, nem pensa em parar. “Entro no ser-viço todo dia às 7 da manhã. Sou a pessoa mais espe-rada pelo povo. Mas tudo isso, claro, porque levo o café...”, sorri. E só serve café no gabinete do prefeito ou para pessoas com audiência marcada no gabine-te. Fica até às 14 horas quando é substituída. Mora

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nas Casas populares.Festeira não perde um agito. Já foi homenageada

por tudo quanto é clube, por tudo quanto é bairro, tudo quanto é escola de samba, enfim por Atibaia inteira. Além de homenagens em Bragança, em Ubatuba, São Paulo. Roma leva o samba e ganha ho-menagem. Um dia o pessoal do Alvinópolis decidiu fazer uma festa de aniversário para todos os aniver-sariantes do mês e chamou Roma. “Para surpresa minha a festa foi realizada para que o pessoal esco-lhesse uma rainha do pedaço, a rainha do samba, do futebol e da amizade da Maria Alvim. Aí mostraram uma camisa muito bonita com uma coroa na frente sem mostrar que a parte de trás da camisa tinha o meu nome. Só então eles anunciaram que Roma era a rainha.”

Desfile que se preze tem que ter uma Roma pu-xando o samba, pois Roma é a Embaixatriz, a rainha de todas as escolas. Roma é Roma e tem Atibaia aos seus pés... ■