Romantismo ebook
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2010 d.B. Jamais me esquecerei o dia em que fomos , eu e mais duas três mulheres, abundantemente humilhadas por aquela mega bunda, afinal vivemos no país onde tudo termina em bunda.
RomantismoTânia Regina Oliveira Ramos
Gizelle Kaminski Corso
Talvez eu seja o último românticoDos litorais desse oceano atlântico […]Se é loucura então/Melhor nem ter razão.
(Lulu Santos)
Procuremos pesquisar o termo romântico e ele se mostrará aparentemente “comum” na
atualidade, que parece se fazer presente, principalmente, entre os apaixonados ou às vésperas do
dias dos namorados. Ser romântico, ou romântica, na concepção usual da palavra, significa ter
atitudes de carinho (trazer flores, bombons, jantar à luz de velas) para com sua companheira, seu
companheiro, provocar sentimentos ternos no outro, ser sentimental, ter paixão. Essas atitudes,
esses gestos, podem muito bem ser ilustradas por canções de Roberto Carlos, nos versos,
“Quando eu estou aqui, eu vivo esse momento lindo”, “Eu tenho tanto pra ti falar, mas com
palavras não sei dizer, como é grande o meu amor por você”, “Você tem que ter um homem como
eu romântico/ que adoça a sua vida e saiba te dizer, romântico” ou por filmes gênero de Love
story, Vem dançar comigo, Uma Linda Mulher, Crepúsculo.
Com a abertura deste tópico sobre o Romantismo, pretendemos justamente demonstrar
que a concepção e entendimento da palavra “romântico”, que trataremos ao longo deste tópico,
não terá essa equivalência naturalmente, e é sempre preciso desconstruir o falso entendimento
de que o Romantismo foi um período histórico com a predominância no sujeito lírico e em temas
que tangenciavam amor, paixão e sentimentos individuais.
Segundo Elias Thomé Saliba (1991), foi Rousseau, em um trecho de Devaneios de um
caminhante solitário, de 1777, quem introduziu na língua francesa o vocábulo romântico,
que até então significava: “como nos antigos romances”, e aproximava-se
de tudo aquilo que poderia ser visto como pitoresco, romanesco, fabuloso.
Mas romântico era visto também como desordenado, confuso, oposto ao
indisciplinado, ao regrado, ao classificado, enfim, oposto ao rigor do
“clássico” (SALIBA, 1991, p. 13).
O Romantismo
Assim, o Romantismo, pode ser analisado como um movimento sociocultural que ocorreu
entre fins do século XVIII e meados do século XIX. Todos os seus projetos se alimentaram de
rupturas com o passado, ou seja, de oposição violenta ao Classicismo (clareza, transparência,
domínio do diurno) e à Ilustração, períodos em que prevaleceu forte racionalismo. Mas, o que é
o Romantismo? Escola? Período Literário? Mo(vi)mento histórico? Estado de espírito? Jacó
Guinsburg nos responde, dizendo:
o Romantismo designa também uma emergência histórica, um evento sócio-
cultural. Ele não é apenas uma configuração estilística ou, como querem alguns,
uma das duas modalidades polares e antitéticas – Classicismo e Romantismo – de
todo fazer artístico do espírito humano. Mas é também uma escola historicamente
definida, que surgiu num dado momento, em condições concretas e com respostas
características à situação que se lhe apresentou. […].
Seja como for, o Romantismo é um fato histórico e, mais do que isso, é o fato
histórico que assinala, na história da consciência humana, a relevância da
consciência histórica. É, pois, uma forma de pensar que pensou e se pensou
historicamente (1978, p. 14).
Para Michel Löwy e Robert Sayre (1995) são designados como
“românticos”, desde o século XIX, tanto escritores, poetas e
artistas quanto ideólogos políticos, filósofos, teólogos,
historiadores, economistas e outros. Para grande parte dos
autores que se ocupam do romantismo,
o fenômeno está despojado de todas as dimensões políticas e filosóficas e
reduzido a uma simples escola literária cujas características mais visíveis
são, em seguida, descritas de maneira mais ou menos detalhada. Em sua
forma mais banal, essa abordagem opõe o romantismo ao “classicismo”
(LÖWY; SAYRE, 1995, p. 12).
O Romantismo
Figura 1 – O viajante sobre o mar de névoa (1818),
Caspar David Friedrich (1774-1840)
1
1 Classicismo – “O termo vem de classis, “frota”, em latim, e refere-se aos classicis, aos ricos que
pagavam impostos pela frota. Um escritor “classicus” é pois um homem que escreve para esta categoria mais afortunada e mais elevada da sociedade. […]. Depois o vocábulo sofreu várias transformações, passando a designar um valor, estético, ético, mas principalmente didático: um escrito “clássico” veio a ser uma composição literária reconhecida como digna de ser estudada nas “classes” das escolas (Rosenfeld, Guinsburg, 1978, p. 262). O termo classicismo, acrescentam os autores, diz respeito a “princípios e obras que correspondem a certos preceitos modelares, os quais, por seu turno, derivam de certa fase da arte grega e a tomam como padrão. Essa codificação ocorreu principalmente no Renascimento. Foi então que a redescoberta da Antiguidade Greco-Latina ou, como passou a chamar-se, “Clássica”, a revalorização de suas produções intelectuais e artísticas, conjugando-se com um extraordinário surto da criatividade italiana e até européia, puseram novamente na ordem do dia o pensamento e os problemas estéticos” (p. 262).
Michel Löwy e Robert Sayre apresentam um estudo do romantismo como “visão do
mundo”, “estrutura mental coletiva” (Löwy; Sayre, 1995, p. 28), que seja capaz de atentar para o
romantismo como sendo um movimento que atinge todas as esferas das atividades humanas. E,
segundo os autores, é contra as características da modernidade (industrialização,
desenvolvimento rápido, conjugação da ciência com a tecnologia, por exemplo) e do
capitalismo que se insurge a “sensibilidade romântica” (desencantamento, fuga, idealização de
um tempo posterior ou anterior). Para Löwy e Sayre (p. 76), “o romantismo, propriamente dito,
enquanto resposta cultural global a um sistema sócio-econômico generalizado, é um fenômeno
especificamente moderno”.
A oposição romântica à modernidade capitalista-industrial reage a um certo número de
características dessa modernidade, a citar (Löwy; Sayre, 1995):
1) O desencantamento do mundo; tentativa de reencantar o mundo também
pela religião (magia, artes esotéricas, feitiçaria, alquimia);
2) A quantificação do mundo;
3) A mecanização do mundo;
4) A abstração racionalista;
5) A dissolução de vínculos sociais.
Embora o termo “romântico” tenha sido introduzido por Rosseau, o núcleo do fenômeno
se deu em três países: França, Inglaterra, Alemanha, na segunda metade do século XVII, sendo
impossível afirmar qual deles é o precursor.
É importante, ainda, ter em mente alguns
acontecimentos mundiais, para entender o
contexto histórico que antecedeu esse movimento
literário: a Revolução Francesa e a Revolução
Industrial, responsáveis pela formação da
sociedade moderna. Com relação à Revolução
Francesa, que estimulou burgueses e campesinos a
se rebelarem contra a nobreza monopolizadora das
grandes propriedades de terras, vale destacar o
lema Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Das três
palavras que compõem esse lema, os artistas
O Romantismo
Figura 2– A liberdade liderando o povo (1830)
Eugène Delacroix (1798-1863)
2
2 Compreendida como “fenômeno fundamental e abrangente […] [produzido] pela revolução industrial e [pela] generalização da economia de mercado” (Löwy; Sayre, 1995, p. 35).
românticos talvez tenham colocado mais ênfase em uma delas: Liberdade, “fundamentada na
afirmação de que 'os homens nascem livres e devem viver livres'” (Falbel, 1978, p. 33). Eles
queriam para si a liberdade de opinião, de criação individual, sem seguir nenhum modelo
anterior, especialmente os modelos neoclássicos, já esgotados há algum tempo. O modelo que
eles queriam privilegiar era o de sua própria imaginação, de seus sonhos, de suas fantasias. No
Romantismo, segundo Jacó Guinsburg, “o homem passa a ser o centro de si mesmo, do sentido
de seu viver; e seu estar-no-mundo, perdidos os demais focos de ordenação, constitui-se no
âmago de todo e qualquer significado de sua existência e a do mundo, para ele” (1978, p. 21).
Dessa forma, todo artista romântico acabou por se voltar para si mesmo, num processo
muito forte de egocentrismo, da valorização exagerada do eu individual. Os românticos faziam
uma literatura intimista e, muitas vezes, idealizadora de um mundo perfeito que,
pretensamente, existia dentro de si. Assim, o modelo “seguido” pelos românticos foi o da
irregularidade, da desobediência, da liberação em virtude daquilo que vinha sendo
feito/valorizado até então: a fonte clássica, racionalista…
Alfredo Bosi, em História Concisa da Literatura
Brasileira (46ª ed., 2006), em capítulo reservado ao
Romantismo, afirma:
O amor e a pátria, a natureza e a religião, o povo e o passado, que
afloram tantas vezes na poesia romântica, são conteúdos brutos,
espalhados por toda a história das literaturas, e pouco ensinam ao
intérprete do texto, a não ser quando postos em situação, tematizados
e lidos como estruturas estéticas (BOSI, 2006, p. 91).
O Romantismo
Figura 3 – O Colosso (1808)
Francisco de Goya (1746-1828)
2
3 A Revolução Francesa, ainda que abolisse os direitos e as instituições feudais, não aboliu a desigualdade
entre os homens. A liberdade sem a igualdade foi considerada insatisfatória, propondo-se, já naquela ocasião, que a propriedade fosse limitada perante a lei e se reduzisse a distância abissal entre pobres e ricos, ou entre os possuidores e “os que nada tinham a perder” (FALBEL, 1978, p . 34).
Nossos bosques tem mais vida
Com essa afirmação, o professor da Universidade de São Paulo, busca esclarecer a ideia de
que os conteúdos vistos como “característicos” da literatura romântica permeiam as demais
produções literárias ao longo do tempo; não são exclusivos do Romantismo. Para que o sejam, é
preciso que os textos sejam colocados em situação, ou seja, contextualizados, tematizados e lidos
como estruturas estéticas. Com isso, Bosi critica arduamente o entendimento da literatura por
suas classificações temáticas.
O Romantismo em solo brasileiro ocorre em um momento de busca pela independência
política. O Brasil era uma nação egressa do colonialismo, e mantinha ainda a rota da monarquia
conservadora, mesmo havendo manifestações republicanas. E nossa sociedade contou, segundo
Bosi (2006), tanto com os filhos de famílias abastadas do campo (Macedo, Alencar, Álvares de
Azevedo, Fagundes Varela, por exemplo) que saíam do interior para receber instrução em São
Paulo, Rio e Recife, quanto com filhos de comerciantes luso-brasileiros e de profissionais
liberais (Gonçalves Dias, Joaquim Norberto, Casimiro de Abreu, Castro Alves, Silvio Romero)
para a formação de sua inteligência. Formação de índole europeia, a qual absorvia padrões
culturais, que não os nacionais, que se refletiam na ansiedade de fundar uma marca própria
(apelo à natureza, refúgio no passado, exotismo, bem como relações de solidão, devaneio,
sonho).
As produções desse momento costumam privilegiar o tema do “sujeito”, aliás, observa Bosi
(2006, p. 93), “o fulcro da visão romântica do mundo é o sujeito”, o “eu” romântico, o membro
O Romantismo
Figura – Iracema (1865) – José Maria de Medeiros (1849-1925)
5
4 Em um momento de independência política e independência literária; porém a segunda estava “por
fazer/vir”. 5 “A natureza romântica é expressiva. Ao contrário da natureza arcada, decorativa. Ela significa e revela. Prefere-se a noite ao dia, pois à luz crua o sol impõe-se ao indivíduo, mas é na treva que latejam as forças inconscientes da alma: o sonho, a imaginação” (BOSI, 2006, p. 93).
4
que se desloca para outro habitat como forma de se desmembrar da realidade. Em relação ao
nível estético, renasce a balada e a canção em vez do soneto e da ode, e a renovação atingiu o
verso, o ritmo, e o “paisagismo árcade […] cedeu lugar ao pitoresco e à cor local” (Bosi, 2006, p.
96). No teatro, borram-se as diferenças entre comédia e tragédia e instaura-se o “drama”, que
funde grotesco e sublime. Gênero contemplado dentre todos, de acordo com Bosi, foi o
“romance”, que não se eleva mais às dimensões da ação épica, da história de uma comunidade,
mas se enriquece de um conteúdo original ao se abrir para a complexidade interior que a vida
individual passa a adquirir no “mundo moderno”; o romance é a epopeia de uma sociedade
burguesa.
Alguns escritores foram responsáveis por introduzir o Romantismo como programa
literário no Brasil. Domingos José Gonçalves de Magalhães, tendo em vista uma reforma da
literatura brasileira, fundou, em Paris, a revista Niterói, revista brasiliense (1836) com seus
amigos Porto Alegre, Sales Torres Homem e Pereira da Silva. Agraciado pelo Imperador Pedro
II, foi sempre tido como o mestre da nova poesia.
Tendo-nos dado o lírico e o dramático, faltava-lhe o épico; fê-lo
retomando Durão e Basílio, lidos sob um ângulo enfaticamente nativista,
e compôs a Confederação dos Tamoios quando Gonçalves Dias já fizera
públicos os seus cantos indianista e Alencar redigia a epopéia em prosa
que é O Guarani (BOSI, 2006, p. 99).
Gonçalves Dias, Gonçalves de Magalhães, por exemplo, constituíram o que se poderia
chamar de “primeira geração romântica”, aquela que percorreu a tradição literária nacionalista,
e pretendiam registrar a permanência dos valores primordiais, as marcas da terra, ou seja, serem
os responsáveis pela legitimação nacional na literatura. O Brasil seria o pano de fundo sobre o
qual se desenvolveriam os argumentos em prol de uma identidade nacional, da valorização da
prata da casa em relação ao estrangeiro, principalmente o europeu. A natureza é exaltada como
o que há de mais legitimamente brasileiro. “Não é à toa que os versos de Gonçalves Dias foram
retomados, quase na íntegra, para fazer parte da letra do Hino Nacional Brasileiro, numa estrofe
que institucionalizou definitivamente esta atitude” (Rouanet, 1991, p. 244). Os versos a que a
autora faz referência, “Nossos bosques têm mais vida/ Nossa no teu seio mais amores” foram
retirados do poema “Canção do Exílio”, de Gonçalves Dias, que transcrevemos a seguir:
O Romantismo
O Romantismo
Canção do Exílio
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar –sozinho, à noite–
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que disfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
6 Releia o poema de Gonçalves Dias e observe atentamente essas questões.
Gonçalves Dias
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
De Primeiros cantos (1847)
Como você pode ver neste poema, o “eu-lírico” se apresenta distante de sua terra natal,
exilado. A tropicalidade brasileira é representada primordialmente pelo cenário, que inclui
“palmeiras”, “sabiá”, “bosques”, “flores”, melhor dizendo, pela natureza, que é “uma das vigas
mestras da construção do discurso romântico, em qualquer das suas manifestações” (Rouanet,
1991, p. 245). E essa natureza é apresentada/destacada [quase] sempre por suas diferenças
relativas e comparativas à Europa, o que é possível de ser percebido nos seguintes versos de Dias:
“Minha terra tem primores,/ Que tais não encontro eu cá;/ Em cismar –sozinho, à noite–/Mais
prazer eu encontro lá”.
O país se tornou um painel pitoresco, alvo de olhares curiosos do mundo ocidental, e a
poesia, para ser boa, precisava apresentar/ser uma pintura fiel da paisagem. O tema do exílio foi
uma das constantes nas produções de inúmeros poetas brasileiros no intuito de construir uma
nacionalidade. O discurso dos poetas no Romantismo brasileiro vai ser limitado a repetições de
um “cá” e de um “lá”, de “monotonia”, de um “sempre a mesma coisa enquanto evita, a todo
custo, quaisquer acréscimos ou discordâncias” (Rouanet, 1991, p. 254) – algo que pode ser visto
no poema mencionado. Uma prole de mesmices instauradas nos temas, nos títulos dos poemas,
nas imagens, por exemplo. Ver a nossa diferença em relação às origens portuguesas, “origens
estas que se revelavam especialmente ameaçadoras em virtude da adoção, por parte da nova
Nação, da língua falada pela antiga Metrópole” (Rouanet, 1991, p. 294).
6
O Romantismo
Meus oito anosOh! dias da minha infância!
Oh! meu céu de primavera
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã!
Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha irmã!
Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
Da camisa aberto o peito,
– Pés descalços, braços nus –
Correndo pelas campinas
À roda das cachoeiras.
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis!
Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo,
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar!
Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
– Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!
Lisboa – 1857 - As Primaveras
9
Casimiro de Abreu
Oh! Souvenirs! Printemps! Aurores!
V. Hugo.
Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores.
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!
Como são belos os dias
Do despontar da existência!
– Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar é – lago sereno,
O céu – um manto azulado,
O mundo – um sonho dourado,
A vida – um hino d'amor!
Que auroras, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar
O céu bordado d'estrelas,
A terra de aromas cheia,
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar!
10
7 Que afaga; meigo, carinhoso. Afável, ameno, brando, suave. Agradável, prazeroso. Fig. Satisfeito , alegre, contente: lépido e fagueiro. 8 Entregar-se a divertimentos, danças etc.; brincar. Dar folga ou prazer a. Alargar, desapertar. Descansar, ter alívio nos trabalhos. Ter prazer com alguma coisa, gostar. 9 Q ue tem boa sorte; venturoso, afortunado, feliz, felizardo. 10D isponível em: <http://alecrim.inf.ufsc.br/bdnupill/arquivos/texto/0042-00737.html>. Acesso em: 24 jul. 2011.
7
8
O Romantismo
Estes versos do poeta Casimiro de Abreu são um bom exemplo da linguagem do
Romantismo. Veja como o poeta usa a primeira pessoa: “eu tenho”, “minha vida”, por
exemplo. O poema “Meus Oito Anos” foi um dos mais revisitados por autores do
modernismo.
Outros temas foram explorados pelos poetas: a pátria, a mãe, a família, a infância, o
amor, a natureza, a religião. O “par romântico” era sempre idealizado e era ressaltada a
beleza física e espiritual do homem e da mulher. Abaixo, vão outros exemplos da poesia
lírica romântica:
Álvares de Azevedo
Se a terra é adorada, a mãe não é mais
digna de veneração.
Digest of hindu law.
Como as flores de uma árvore silvestre
Se esfolham sobre a leiva que deu vida
A seus ramos sem fruto,
Ó minha doce mãe, sobre teu seio
Deixa que dessa pálida coroa
Das minhas fantasias
Eu desfolhe também, frias, sem cheiro,
Flores da minha vida, murchas flores
Que só orvalha o pranto!
11 Disponível em: <http://alecrim.inf.ufsc.br/bdnupill/arquivos/texto/0006-00784.html>. Acesso
em 24 jul. 2011. 12 Disponível em: <http://www.casadobruxo.com.br/poesia/a/seeu1.htm>. Acesso em 24 jul.
2011.
A minha mãe 11
Álvares de Azevedo
Se eu morresse amanhã, viria ao
menos
Fechar meus olhos minha triste irmã;
Minha mãe de saudades morreria
Se eu morresse amanhã!
Quanta glória pressinto em meu
futuro!
Que aurora de porvir e que manhã!
Eu perdera chorando essas coroas
Se eu morresse amanhã!
Que sol! que céu azul! que dove n'alva
Acorda a natureza mais louca!
Não me batera tanto amor no peito
Se eu morresse amanhã!
Se eu morresse amanhã! 12
O Romantismo
Continua-se!
O romance se tornou um gênero dominante, segundo Lawrence Hallewell (1985),
no que se refere ao mercado de livros, na França no fim da década de 1830, e a sua expansão
se deu quando os jornais da época passaram a depender das rendas da publicidade e
precisaram empenhar-se para ampliar a circulação e, consequentemente, os lucros. A
solução adotada foi justamente a de roman-feuilleton [romance-folhetim], ou “ficção em
série” (Hallewell, 1985, p. 139). Embora a ideia tenha sido introduzida ainda no final de
1820 pela Revue de Paris [Revista de Paris], a prática só se efetivou por volta de 1836. Esse
tipo de publicação “na forma de folhetim encorajava os complicados enredos
melodramáticos, com cada parte planejada para terminar de forma a deixar o leitor
aguardando ansiosamente a continuação” (Hallewell, 1985, p. 139). Isto significava que os
autores para conseguirem leitores tinham que escrever com um estilo que trouxesse
muita ação, utilizando-se muito de suspense e de história de amor. O escritor tinha que
manter o interesse do leitor para fazer com que este tivesse o interesse de saber o que
aconteceria no próximo capítulo, para que comprasse a edição seguinte – sensação que
muito bem sentimos na pele ao assistirmos a seriados ou a novelas brasileiras, por exemplo.
Entre 1839 e 1842, os folhetins-romance são praticamente diários no Jornal do
Comércio, no Brasil, traduzidos dia após dia do francês, “introduzindo angústia e suspense
com o fatídico 'continua-se'” (Meyer, 1996, p. 283). Inúmeros autores franceses (vários
esquecidos, como: Lavergne, Dash, Berthet, Souvestre, cf. Meyer) eram publicados “em
fatias” no rodapé do jornal – forma gráfica que permitia o recorte do corpo do jornal. Esses
recortes de capítulos que, reunidos, formariam um “livro”: “biblioteca dos pobres,
emprestada, trocada, colecionada” (Coco, 1991, p. 20). Mas a publicação mais esperada
pelos leitores brasileiros era aquela que chegou somente em 1844, na tradução em língua
portuguesa de R. (Justiniano José da Rocha), os Mistérios de Paris, do francês Eugene Sue.
Ao lado de Sue, Alexandre Dumas…De Sue também O judeu errante.
13 Segundo José Alcides Ribeiro (1996, p . 25), “romance-folhetim francês era uma narrativa longa,
publicada em parcelas consecutivas nos jo rnais diários, semanais ou quinzenais, e nas revistas editadas
periodicamente”. À exposição de Ribeiro acrescentamos a de Pina Maria Arnoldi Coco (1991, p. 21), ao
dizer que “o romance-folhetim é visto como uma produção francesa – “importada” – e, atrelada ao jornal,
como uma confecção anônima, feita em linha de montagem e visando apenas o lucro […]”. 14 As telenovelas da atualidade seguem o mesmo procedimento dos romances do sécu lo XIX , isto é,
tentam manter o interesse do espectador ao terminar os capítulos sem que ele saiba o desfecho de cada
situação. 15 “São dele as versões b rasileiras de Mistérios de Paris, O conde do Monte Cristo e muitos outros, e
trabalhava tão rapidamente que o Jorna l do Commercio conseguia sua publicação quase simultaneamente
com o jornal de Paris […]” (Hallewell, 1985, p. 139).
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O RomantismoTão fulgurante e rápida penetração do folhetim francês
sugere a constituição no Brasil, nas décadas de 1840 e de
1850, de um corpo de leitores e ouvintes consumidores de
novelas já em número suficiente para influir
favoravelmente na vendagem do jornal que as publica e
livros que as retomam (MEYER, 1996, p. 292).
Em 1858, segundo Meyer (1995, p. 287), o Jornal do Comércio iniciou a publicação
de O horóscopo, de Alexandre Dumas, que se estende até o ano de 1859. Romance
Rocambole de Ponson Du Terrail…
Assim como os romances franceses, os, hoje, romances brasileiros como A
Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo, e O Guarani, de José de Alencar também foram
responsáveis pelas fatias de leituras cotidianas dos leitores brasileiros. Alencar, de fato,
começou sua carreira literária publicando Cinco minutos, em capítulos, no Correio
Mercantil, em dezembro de 1856; apenas alguns anos mais tarde foram reunidos e
publicados em livro por B. L. Garnier.
É importante salientar que o romance, enquanto gênero literário, refere-se aos
textos narrativos desenvolvidos principalmente a partir do século XIX nas principais cidades européias, influenciado pela ascensão da Burguesia e início da imprensa.
Descendente da epopéia, ou poemas sobre as ações heróicas, teria como precursor a obra
Dom Quixote de la Mancha, de Miguel de Cervantes, publicada no início do século XVII.
Embora muitos teóricos tenham se dedicado ao tema, não há um consenso sobre como
definir o que é o romance. Isso acontece porque nem a extensão nem o modo como a trama
é articulada são suficientes para agrupar textos tão variados produzidos nos últimos
séculos sob uma mesma denominação. Além disso, discutem-se também quais as
perspectivas do romance na contemporaneidade. Apesar de seu fim já ter sido decretado
inúmeras vezes desde seu surgimento, ele ainda sobrevive, mesmo em face de uma
sociedade virtual.
Os escritores românticos trouxeram à tona os valores da sociedade burguesa, seja
contra, seja a favor. Como já afirmado acima, valores como pátria, família e religião
tiveram grande importância dentro da estética da primeira metade do século XIX.
16 Entre os primeiros folhetinistas brasileiros estariam Martins Penna, Gonçalves de Magalhães e os
historiadores Varnhagen e Pereira da Silva (cf. Hallewell, 1985, p. 140).
16
O Romantismo
Ao se ocuparem da pátria, os escritores românticos escreveram algumas narrativas
que foram classificadas como literatura nacionalista. Através delas, eles ressaltavam as
belezas da natureza, as diferenças e especificidades regionais e valorizavam o passado
histórico da pátria. No Brasil, a busca de uma origem histórica fixou-se na imagem do
índio, tematizado em muitos poemas e romances. Em algumas narrativas ele era
idealizado, puro, bom; em outras, o índio era um elemento narrativo, uma personagem,
que queria marcar a diferença do Brasil e da Europa. Através de tais protagonistas, os
autores queriam mostrar que tínhamos uma identidade própria, distinta da européia e,
sobretudo, da portuguesa.
Das narrativas, você vai conhecer agora um fragmento de O Guarani de José de
Alencar. IV
CAÇADA
Quando a cavalgada chegou à margem da clareira, ai se passava uma cena curiosa. Em pé, no meio do espaço que formava a grande abóbada de árvores, encostado a um velho
tronco decepado pelo raio, via-se um índio na flor da idade. Uma simples túnica de algodão, a que os indígenas chamavam aimará, apertada à cintura
por uma faixa de penas escarlates: caía-lhe dos ombros até ao meio da perna, e desenhava o talhe delgado e esbelto como um junco selvagem.
[...] Era de alta estatura; tinha as mãos delicadas; a perna ágil e nervosa, ornada com uma axorca
de frutos amarelos, apoiava-se sobre um pé pequeno, mas firme no andar e veloz na corrida. Segurava o arco e as flechas com a mão direita calda, e com a esquerda mantinha verticalmente diante de si um longo forcado de pau enegrecido pelo fogo.
[…]Nesse instante erguia a cabeça e fitava os olhos numa sebe de folhas que se elevava a vinte
passos de distancia, e se agitava imperceptivelmente. Ali por entre a folhagem, distinguiam-se as ondulações felinas de um dorso negro, brilhante,
marchetado de pardo; às vezes viam-se brilhar na sombra dois raios vítreos e pálidos, que semelhavam os reflexos de alguma cristalização de rocha, ferida pela luz do sol.
Era uma onça enorme; de garras apoiadas sobre um grosso ramo de árvore, e pés suspensos no galho superior, encolhia o corpo, preparando o salto gigantesco.
[…]O índio, sorrindo e indolentemente encostado ao tronco seco, não perdia um só desses
movimentos, e esperava o inimigo com a calma e serenidade do homem que contempla uma cena agradável: apenas a fixidade do olhar revelava um pensamento de defesa.
17 Disponível em: <http://alecrim.inf.ufsc.br/bdnupill/arquivos/texto/0006-01154.html>. Acesso em: 24 jul. 2011.
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O Romantismo
Assim, durante um curto instante, a fera e o selvagem mediram-se mutuamente, com os olhos nos olhos um do outro; depois o tigre agachou-se, e ia formar o salto, quando a cavalgata apareceu na entrada da clareira. Então o animal, lançando ao redor um olhar injetado de sangue, eriçou o pêlo, e ficou imóvel no mesmo lugar, hesitando se devia arriscar o ataque.
O índio, que ao movimento da onça acurvara ligeiramente os joelhos e apertava o forcado, endireitou-se de novo; sem deixar a sua posição, nem tirar os olhos do animal, viu a banda que parara à sua direita.
Estendeu o braço e fez com a mão um gesto de rei, que rei das florestas ele era, intimando aos cavaleiros que continuassem a sua marcha.
Como, porém, o italiano, com o arcabuz em face, procurasse fazer a pontaria entre as folhas, o índio bateu com o pé no chão em sinal de impaciência, e exclamou apontando para o tigre, e levando a mão ao peito:
—É meu!... meu só! Estas palavras foram ditas em português, com uma pronúncia doce e sonora, mas em tom de
energia e resolução. O italiano riu. —Por Deus! Eis um direito original! Não quereis que se ofenda a vossa amiga?... Está bem,
dom cacique, continuou, lançando o arcabuz a tiracolo; ela vo-lo agradecerá. Em resposta a esta ameaça, o índio empurrou desdenhosamente com a ponta do pé a clavina
que estava atirada ao chão, como para exprimir que, se ele o quisesse, já teria abatido o tigre de um tiro. Os cavaleiros compreenderam o gesto, porque, além da precaução necessária para o caso de algum ataque direto, não fizeram a menor demonstração ofensiva.
Tudo isso se passou rapidamente, em um segundo, sem que o índio deixasse um só instante com os olhos o inimigo.
A um sinal de Álvaro de Sá, os cavaleiros prosseguiram a sua marcha, e entranharam-se de novo na floresta.
Mas a maior herança que o romantismo deixou foi a idealização do par romântico:
uma moça graciosa, bonita, meiga, delicada, educada e um rapaz belo, corajoso, forte e
puro de alma. Os dois tinham que manter uma relação singela e terna, quase sempre se
realizando no casamento final. Se o casal não fazia nada “errado”, segundo a moral
burguesa e cristã da época, casariam e seriam felizes para sempre. O romance A
Moreninha, escrito por Joaquim Manuel de Macedo, é um bom exemplo desses elementos
da prosa romântica.
Então, vamos fazer uma síntese das principais idéias da literatura romântica:
� Liberdade de criação individual;
� Fuga de modelos;
O Romantismo
� Individualismo;
� Intimismo;
� Subjetivismo;
� Fantasia, sonho, imaginação;
� Fuga da realidade;
� Idealização da realidade;
� Conflito “eu” e o mundo;
� Temas como nacionalismo, regionalismo, natureza, indianismo, saudosismo,
amor, religiosidade, morte, pessimismo, tédio.
Poderíamos, ainda, falar de Castro Alves que reforçou o sentimento nacionalista a
servir de bandeira a causas nobres, como a luta contra a escravidão. Eis um fragmento de
um dos seus mais belos poemas, O Navio Negreiro, que poderão ler na íntegra no site de
Literatura Brasileira da UFSC.
Era um sonho dantesco... O tombadilhoQue das luzernas avermelha o brilho,
Em sangue a se banhar,Tinir de ferros...estalar de acoite...
Legiões de homens negos como a noite Horrendos a dançar...
O movimento romântico se prolongou muito no Brasil, podendo nele ser
reconhecido três gerações de poetas e romancistas. Poderemos hoje também dar
visibilidade a tantas mulheres que escreveram poesia e prosa no século XIX e foram
esquecidas pela historiografia literária brasileira, tão preocupada em ratificar o cânone
literário hegemônico e masculino. A leitura renovada de escritores, escritoras e obras do
movimento romântico, que pode ser considerado o momento de afirmação de uma
literatura nacional e da paisagem literária de nosso século XIX de tantas marcas e de tantos
marcos. Ao se entender o movimento romântico e suas manifestações literárias passa-se a
ter outras referências e outros paradigmas não mais simplificadores como os que
apontamos no início desse tópico: Afinal, o que é ser romântico para você?
Referências
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2006.
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�COCO, Pina Maria Arnoldi. “O triunfo do bastardo: uma leitura dos folhetins
cariocas do século XIX”. Anais do 2º Congresso da ABRALIC. Volume III. Belo Horizonte,
1991, p. 19-24.
�FALBEL, Nachman. Os fundamentos históricos do Romantismo. In:
GUINSBURG, Jacó. O Romantismo. São Paulo: Editora Perspectiva, 1978. p. 23-50.
�GUINSBURG, J. Romantismo, Historicismo e História. In: GUINSBURG, Jacó.
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�HALLEWELL, Lawrence. O livro no Brasil (sua história). São Paulo: T. A.
Queiroz/EDUSP, 1985.
�LÖWY, Michel; SAYRE, Robert. Revolta e melancolia: o romantismo na
contramão da modernidade. Tradução de Guilherme Teixeira. Petrópolis, RJ: Vozes,
1995.
�MEYER, Marlise. Folhetim: uma história. São Paulo: Companhia das Letras,
1996.
�NUNES, Benedito. A visão romântica. In: GUINSBURG, Jacó. O Romantismo.
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�RIBEIRO, José Alcides. Imprensa e ficção no século XIX. São Paulo: Ed. da
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�ROUANET, Maria Helena. Eternamente em berço esplêndido: a fundação de
uma literatura nacional. São Paulo: Siciliano, 1991.
�SALIBA, Elias Thomé. As utopias românticas. São Paulo: Brasiliense, 1991.
Créditos
Curso de Licenciatura em Letras- Português na Modalidade a Distância
Diretor da Unidade de Ensino: Felício Wessling MargottiChefe do Departamento: Izabel Chirstine SearaCoordenadoras de Curso: Roberta Pires de Oliveira e Zilma Gesser NunesCoordenador de Tutoria: Renato Miguel BassoCoordenação Pedagógica: LANTEC/CEDCoordenação de Ambiente Virtual: Hiperlab/CCE
Laboratório de Novas Tecnologias- LANTEC/CEDCoordenação Geral: Andrea LapaCoordenação Pedagógica: Roseli Zen Cerny
Material Hipermídia Supervisão e Design de Hipermídia: Marilisa Bialvo Hoffmann, Francisco Fernandes Soares NetoConteúdo: Layout e Programação: Marilisa Bialvo Hoffmann
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