Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ ROSI TEREZINHA FERRARINI GEVAERD APROPRIAÇÕES DAS NARRATIVAS DO MANUAL DIDÁTICO DE HISTÓRIA: CONCEITO ESCRAVIDÃO AFRICANA NO BRASIL CURITIBA 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

ROSI TEREZINHA FERRARINI GEVAERD

APROPRIAÇÕES DAS NARRATIVAS DO MANUAL DIDÁTICO DE HISTÓRIA:

CONCEITO ESCRAVIDÃO AFRICANA NO BRASIL

CURITIBA

2013

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ROSI TEREZINHA FERRARINI GEVAERD

APROPRIAÇÕES DAS NARRATIVAS DO MANUAL DIDÁTICO DE HISTÓRIA:

CONCEITO ESCRAVIDÃO AFRICANA NO BRASIL

Relatório de Pesquisa de Pós-Doutorado, Programa de Pós-Graduação em Educação, Setor de Educação, da Universidade Federal do Paraná.

Supervisão: Prof.a Dr.a Tânia Maria Figueiredo Braga Garcia

CURITIBA

2013

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À minha família, pelo apoio e incentivo.

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AGRADECIMENTOS

À Professora Dr.a Tânia Maria Figueiredo Braga Garcia, pela atenciosa

acolhida, apoio e disponibilidade para a minha proposta de pesquisa.

À Dr.a Maria Auxiliadora Moreira dos Santos Schmidt, por incentivar essa

caminhada, mas, especialmente, pelo convívio acadêmico e profissional.

Às amigas e amigos do grupo de Educação Histórica, pelas discussões

teóricas e momentos de convívio que contribuem significativamente para

as nossas pesquisas.

Às professoras, professores, alunos e alunas que participaram dos diferentes

contextos da investigação, pela cooperação e disponibilidade.

A todos e todas que, de alguma forma, manifestaram seu apoio para a

concretização desta pesquisa.

Aos meus familiares, muito obrigada!

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 - CONTATO COM OS MANUAIS .............................................................. 28

QUADRO 2 - HORÁRIO E FORMA DA ESCOLHA ...................................................... 29

QUADRO 3 - CRITÉRIOS DE ESCOLHA .................................................................... 30

QUADRO 4 - MANUAIS DIDÁTICOS RECEBIDOS NAS ESCOLAS

MUNICIPAIS/PNLD 2010 ........................................................................ 33

QUADRO 5 - UTILIDADE PARA O ENSINO: CARACTERÍSTICAS

APRESENTADAS PELOS PROFESSORES E PROFESSORAS .......... 34

QUADRO 6 - CONCEITO ESCRAVIDÃO: MANUAIS DIDÁTICOS PNLD/2010 .......... 37

QUADRO 7 - CONCEITO ESCRAVIDÃO: IDEIAS MAIS RECORRENTES ................. 38

QUADRO 8 - COLEÇÃO VONTADE DE SABER HISTÓRIA: CONTEÚDOS

POR ANO ................................................................................................ 43

QUADRO 9 - NARRATIVA: A MÃO DE OBRA AFRICANA .......................................... 45

QUADRO 10 - CONCEITO SUBSTANTIVO ESCRAVIDÃO AFRICANA NO

BRASIL: CATEGORIZAÇÃO .................................................................. 53

QUADRO 11 - USO DO MANUAL DIDÁTICO EM AULAS DE HISTÓRIA ..................... 61

QUADRO 12 - CONCEITO ESCRAVIDÃO: IDEIAS DOS ALUNOS .............................. 76

QUADRO 13 - CONCEITO ESCRAVIDÃO: COM QUEM APRENDEU .......................... 78

QUADRO 14 - CONCEITO ESCRAVIDÃO: ONDE APRENDEU ................................... 79

QUADRO 15 - MARCADORES TEMPORAIS UTILIZADOS PELOS ALUNOS ............. 80

QUADRO 16 - MARCADORES ESPACIAIS PRESENTES NAS NARRATIVAS

DOS ALUNOS ......................................................................................... 83

QUADRO 17 - AGENTES/PERSONAGENS HISTÓRICOS PRESENTES NAS

NARRATIVAS DOS ALUNOS ................................................................. 84

QUADRO 18 - NÍVEL DAS NARRATIVAS DOS ALUNOS ............................................. 87

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 7

1 MANUAL DIDÁTICO: UM PRODUTO DA CULTURA ESCOLAR ................ 18

1.1 MANUAL DIDÁTICO: DIFUSOR DE NARRATIVAS HISTÓRICAS ............. 18

1.2 CULTURA ESCOLAR, CULTURA HISTÓRICA E O MANUAL

DIDÁTICO .................................................................................................... 22

2 MANUAL DIDÁTICO: A ESCOLHA EM ESCOLAS MUNICIPAIS DE

CURITIBA ...................................................................................................... 27

2.1 O PROCESSO DE ESCOLHA DO MANUAL DIDÁTICO: ESTUDO

EXPLORATÓRIO ......................................................................................... 28

2.2 O PROCESSO DE ESCOLHA DO MANUAL DIDÁTICO: ESTUDO

PRINCIPAL .................................................................................................. 32

2.2.1 A escolha do manual didático .................................................................... 33

3 O MANUAL DIDÁTICO: CONCEITO SUBSTANTIVO A ESCRAVIDÃO AFRICANA NO BRASIL ................................................................................ 36

3.1 MANUAIS DIDÁTICOS PNLD/2010 E O CONCEITO SUBSTANTIVO

ESCRAVIDÃO: ESTUDO EXPLORATÓRIO ............................................... 37

3.2 COLEÇÃO VONTADE DE SABER HISTÓRIA E O CONCEITO

SUBSTANTIVO ESCRAVIDÃO AFRICANA NO BRASIL: ESTUDO

PRINCIPAL .................................................................................................. 42

3.3 O CONCEITO SUBSTANTIVO: A ESCRAVIDÃO AFRICANA NO

BRASIL ........................................................................................................ 44

4 MANUAL DIDÁTICO: USO E APROPRIAÇÕES EM AULAS DE

HISTÓRIA ...................................................................................................... 56

4.1 A RELAÇÃO DO ALUNO COM O MANUAL DIDÁTICO .............................. 56

4.2 MANUAL DIDÁTICO: EVIDÊNCIAS DO USO EM AULAS DE

HISTÓRIA .................................................................................................... 58

4.2.1 A relação da professora e aluno com o manual didático: a mediação

didática ...................................................................................................... 59

5 NARRATIVAS HISTÓRICAS: UMA MANEIRA DE ENSINAR E

APRENDER HISTÓRIA ................................................................................. 67

5.1 NARRATIVA HISTÓRICA E A APRENDIZAGEM HISTÓRICA ................... 67

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5.2 NARRATIVAS PRODUZIDAS EM CONTEXTO DE ESCOLARIZAÇÃO ..... 73

5.2.1 Narrativas produzidas em contexto de escolarização: estudo

exploratório ................................................................................................ 74

5.2.2 Narrativas produzidas em contexto de escolarização: estudo principal ..... 78

5.2.2.1 Narrativas produzidas pelos alunos: ideias dos alunos ......................... 80

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 91

REFERÊNCIAS .................................................................................................... 97

APÊNDICE - RELATÓRIO DE ATIVIDADES REALIZADAS PÓS-

DOUTORAMENTO ....................................................................... 103

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7

INTRODUÇÃO

A presente investigação se enquadra no contexto específico do ensino de

História, sendo que as atividades constitutivas dessa pesquisa inscrevem-se na área de

investigação da Educação Histórica, no Programa de Pós-Graduação da Universidade

Federal do Paraná (UFPR), na Linha de Pesquisa Cultura, Escola e Ensino, no Grupo

de Pesquisa Cultura, Práticas Escolares e Educação Histórica, mais especificamente

no Núcleo de Pesquisas em Publicações Didáticas (NPPD), sob a Supervisão da

Prof.a Dr.a Tânia Maria Figueiredo Braga Garcia.

O Núcleo de Pesquisas em Publicações Didáticas está vinculado ao Grupo

de Pesquisa Cultura, Práticas Escolares e Educação Histórica, certificado pela UFPR

e cadastrado no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq. O grupo tem como

preocupação compreender o papel que os materiais didáticos cumprem na constituição

dos "modos de ensinar", nas diferentes áreas de conhecimento. Os participantes do

núcleo participam de associações científicas nacionais, exercem coordenação de

grupos de trabalho permanentes, e desenvolvem pesquisas integradas com outras

universidades, no Brasil e, no exterior.

As atividades do referido núcleo constituem-se no estudo, a avaliação e a

produção de materiais didáticos, destinados a alunos e a professores, sendo que a

referida professora coordena os seguintes projetos: Professores, manuais didáticos

e a produção do conhecimento nas aulas (2010-2012), O uso do livro didático no

cotidiano escolar (2007-2010); A cultura escolar e a construção do método de ensino:

manuais didáticos, práticas escolares e formação docente (2001-atual).

No contexto iberoamericano, a professora participa, juntamente com a

Prof.a Dr.a Maria Auxiliadora Schmidt, do projeto La visión de Historia escolar en el

ámbito iberoamericano: un acercamiento a las percepciones de alumnos y professores

(2005-atual), contando com a participação de pesquisadores da Argentina, Brasil,

Chile, Espanha, México, Nicarágua e Venezuela.

Desde 1997 o NPPD e o Laboratório de Pesquisas em Educação Histórica

(LAPEDUH) da UFPR desenvolvem projeto de extensão e pesquisa denominado

Recriando Histórias. Este projeto é desenvolvido junto às escolas públicas de

municípios da Região Metropolitana de Curitiba, num trabalho colaborativo entre as

investigadoras da UFPR e os professores e alunos destas redes de ensino.

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Os resultados se materializaram na produção de livros paradidáticos que privilegiam

a história local e passaram a ser utilizados pelos professores e alunos em aulas

de História.

Nesse sentido, as investigações que têm sido desenvolvidas no referido

Núcleo justificam o desenvolvimento dessa investigação, particularmente, quando

trata de "compreender a presença de materiais didáticos na aula, especialmente os

livros didáticos", objetivo apontado pela coordenadora Tânia Braga Garcia (2011),

em entrevista sobre "Materiais didáticos são mediadores entre professor, alunos e o

conhecimento"

Como apontado pela referida investigadora,

Segundo mostram algumas pesquisas – que ainda são poucas, tanto no Brasil como em outros países – ao mesmo tempo em que alguns professores informam não usar os livros, preferindo preparar seus próprios materiais ou fazer seus alunos copiarem do quadro, outros professores dizem que usam os livros para estudar o conteúdo, suprindo lacunas na sua formação; outros ainda afirmam que os livros são guias para a organização das aulas, orientando temas e atividades que o professor seleciona de acordo com as orientações da escola ou com seu planejamento individual. De qualquer forma, essa diversidade de usos revela a importância que os livros continuam tendo em nossa cultura escolar, embora pouco se tenha estudado ainda sobre a presença desse material nas aulas, sobre o uso que fazem dele alunos e professores (GARCIA, 2011).

Nesse sentido, a contribuição dessa investigação será no sentido de obter

evidências sobre como ocorre o uso desse material didático em aulas de história.

Ademais, a intenção de desenvolver essa pesquisa no Pós-Doutorado está

vinculada à minha participação no grupo de pesquisa Cultura, Saberes e Práticas

Escolares e Educação Histórica, cadastrado no conselho Nacional de Desenvolvimento

Científico e Tecnológico (CNPq), bem como junto ao Laboratório de Pesquisa em

Educação Histórica, articulado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da

UFPR. Esses grupos agregam professores e alunos cujas atividades principais de

pesquisa têm como foco a Educação Histórica.

Essa área de pesquisa busca investigar as ideias históricas de alunos e

professores, tendo como fundamento principal a própria epistemologia da História.

Entre as investigações realizadas no âmbito da Educação Histórica, encontram-se

estudos sobre consciência histórica, ideias substantivas e ideias de segunda ordem

em História. Nesse contexto, essa investigação pretende verificar como ocorre o uso

do manual didático de história em processo de escolarização e observar se ocorrem

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mediações no desenvolvimento das aulas na perspectiva da Educação Histórica,

assim como verificar como o professor e alunos se relacionam com os conceitos

históricos trabalhados, e de que forma estes conceitos estão constituindo a consciência

histórica desses alunos.

Essa preocupação em relação ao ensino e aprendizagem em história já

estava presente em pesquisa desenvolvida no mestrado.1 Diante da lei2 que propõe

a obrigatoriedade da disciplina de História do Paraná, busquei investigar a presença

deste ensino em escolas da Rede Municipal de Ensino de Curitiba (RME). Procurei

reconstruir como foi se constituindo o ensino de História do Paraná, com o objetivo de

identificar as permanências, as mudanças e as descontinuidades que se efetivaram

desde as primeiras indicações desses conteúdos, enquanto saber escolar, até a

proposta curricular da RME, de 1997-2000, tendo como categoria de análise o

conceito de código disciplinar3, de Cuesta Fernandez (1997, 1998).

Naquele contexto, após análise

Dos textos visíveis (Relatórios, Regimentos, Históricos, Planos Curriculares, Diretrizes Curriculares), bem como dos textos invisíveis (a prática pedagógica por meio das entrevistas), pude constatar como foi se consolidando um código disciplinar do ensino de história do Paraná na Rede Municipal de Ensino de Curitiba (GEVAERD, 2009, p.18).

Além disso, observei, nas escolas pesquisadas, que "algumas professoras

vivenciam um processo relativo de autonomia para definir a organização curricular,

bem como a seleção de conteúdos do Currículo Básico, do manual didático ou

1 A dissertação de mestrado recebeu o título "História do Paraná: a construção do código disciplinar e a formação de uma identidade paranaense", sob a orientação da Prof.a Dr.a Maria Auxiliadora Schmidt, pelo Programa de Pós-Graduação em Educação, Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná, tendo sido defendida em agosto de 2003.

2 Lei n.o 13.381, sancionada pelo governador Jaime Lerner em 18 de dezembro de 2001, oriunda do projeto de lei de autoria do deputado Hermas Brandão, que torna obrigatório o ensino de história do Paraná no ensino fundamental (PARANÁ, 2001).

3 Código disciplinar é "uma tradição social que se configura historicamente e que se compõe de um conjunto de idéias, valores, suposições e rotinas que legitimam a função educativa atribuída à História e que regulam a ordem da prática de seu ensino. O código disciplinar da História alberga, pois, as especulações e retóricas discursivas sobre o seu valor educativo, os conteúdos de ensino e os arquétipos da prática docente, que se sucedem no tempo e que se consideram, dentro da cultura, valiosos e legítimos" (CUESTA FERNANDEZ, 1997, p.20).

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outros livros disponíveis na escola, para constituírem um saber a ser ensinado".

(GEVAERD, 2003, p.181)

As professoras selecionam, dentre os manuais didáticos oferecidos pela administração, aqueles que consideram contemplar os conteúdos de História do Paraná a serem ensinados. A partir do manual recebido, nem sempre o escolhido, a professora seleciona os conteúdos que vai ensinar, organizando o seu planejamento, bem como as atividades a serem elaboradas pelos alunos e alunas (GEVAERD, 2003, p.181).

Após a pesquisa empreendida no Mestrado ocorreram mudanças nas

indicações curriculares da RME. Em 2006, a Secretaria Municipal de Educação de

Curitiba (SME) propôs uma nova reorganização curricular, que se concretizou no

documento Diretrizes Curriculares para a Educação Municipal de Curitiba (CURITIBA,

2006). A concepção adotada nas diretrizes apresentava mudanças, na medida em

que assumia como pressupostos teóricos e metodológicos os estudos na perspectiva

da Educação Histórica, indicando, entre outras questões,

Para que o ensino de História não seja a "regurgitação do passado", o professor deve estimular o pensamento crítico de seus estudantes adotando alguns procedimentos específicos, como investigar as idéias que eles já possuem, possibilitando que reflitam sobre diferentes hipóteses em História; exercitar com seus alunos a seleção das diferentes respostas historiográficas para aquele contexto histórico; estimulá-los a construírem novas hipóteses investigativas, ou seja, novas questões de investigação (BARCA, 19984 apud CURITIBA, 2006, p.152).

A contribuição para alguns fundamentos na perspectiva da Educação Histórica

na concepção das referidas Diretrizes se deve, principalmente, à minha participação

no Seminário "Investigar no ensino, uma prática do professor", ministrado pela

Prof.a Dr.a Isabel Barca, no Programa de Pós-Graduação em Educação, organizado

pela Universidade Federal do Paraná, em 2003, quando tive acesso aos estudos e

investigações na área denominada Educação Histórica.

4 BARCA, I. Verdade e perspectivas do passado na explicação em história: uma visão pós-desconstrucionista. Revista: O estudo da história. O ensino da história: problemas da didáctica e do saber histórico. Lisboa: APH – Associação de Professores de História, n.3, p.163-173, 1998.

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A partir daquele momento tenho procurado aprofundar-me em estudos

referentes aos fundamentos teóricos e metodológicos, assim como participar de todas

as discussões, em Seminários, Jornadas, Grupos de Estudo e eventos, que têm sido

organizados por diferentes instituições, de cunho local, nacional e internacional.

Entre eles, o meu contato com o grupo português durante o meu doutoramento5, no

Estágio Científico Avançado, na Universidade do Minho, Braga, Portugal, sob a

orientação da Prof.a Dr.a Isabel Barca, visando a um maior alargamento conceitual

nessa área de investigação, pois, como acentua Barca:

O ensino de História constitui-se hoje como um fértil campo de investigação, sendo objeto de pesquisa sob diversos ângulos que integram quer perspectivas diacrônicas quer a análise de problemáticas atuais do ensino específico. É dentro desta segunda perspectiva que a investigação sobre cognição e ensino de História [...] tem-se desenvolvido com pujança em vários países [...]. Nestes estudos, os pesquisadores têm centrado a sua atenção nos princípios, fontes, tipologias e estratégias de aprendizagem em História, sob o pressuposto de que a intervenção do professor na qualidade das aprendizagens exige um conhecimento sistemático das idéias históricas dos alunos, por parte de quem ensina (e exige também um conhecimento das idéias históricas destes últimos). A análise destas idéias implica um enquadramento teórico que respeite a natureza do saber histórico e que deve refletir-se, do mesmo modo, na aula de História (BARCA, 2005, p.15).

Diante disso, no doutorado, busquei dar continuidade à pesquisa de mestrado

identificando as mudanças, permanências e descontinuidades que se efetivaram nas

narrativas da história do Paraná a partir da análise dos textos visíveis, como as

Propostas Curriculares da RME, as narrativas difundidas pelos manuais didáticos

usados pela professora e as narrativas produzidas pelos alunos.

Assim, pautando-me em investigações no âmbito da Educação Histórica,

delineei minha pesquisa, mais precisamente na linha de investigação da cognição

histórica situada, a qual engloba estudos que têm como perspectiva a compreensão

das ideias de professores e alunos em contexto de ensino – aulas de história, tomando

como referência o próprio conhecimento histórico. Realizei a investigação a partir de

observações da prática docente durante um ano letivo (2007), acompanhando

5 Com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, na medida em que foi concedida Bolsa Doutorado Sanduíche no Exterior – SWE, no período de 11 de fevereiro a 30 de junho de 2008.

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algumas aulas de história. Isto ocorreu em virtude da opção feita para a pesquisa –

um estudo de cunho etnográfico.

Partindo do pressuposto de que a história como ciência possui uma natureza

narrativista, minha tese consistiu em mostrar que existem narrativas históricas no

processo de escolarização, difundidas pelos manuais didáticos, pelas propostas

curriculares e pelas aulas da professora, e que a partir da convergência dessas

narrativas ocorre a aprendizagem histórica que se evidencia nas narrativas produzidas

pelos alunos.

Considerando isso, levantei as seguintes questões:

- Que tipo de narrativas sobre a história do Paraná é difundido pelo manual

didático, pelas propostas curriculares e pelas aulas da professora?

- Tendo em vista as narrativas difundidas na escola, como o aluno manifesta a

sua aprendizagem histórica, sob a forma de narrativas?

Para tanto, delimitei o campo de investigação: uma turma de Ciclo II -

2.a etapa - 5.o ano do ensino fundamental de uma escola da Rede Municipal de

Ensino de Curitiba, com alunos entre 9 e 11 anos de idade. A metodologia de pesquisa

consistiu em Observação não-participativa, ou seja, em acompanhar as aulas de história

da referida turma, durante um ano letivo, sem interferência nas aulas da professora.

Entre outras questões, ficou evidenciado que ocorreu uma convergência entre

as narrativas difundidas nos manuais didáticos6, na explicação da professora e nas

propostas curriculares, e isto sugere uma forte presença da perspectiva da história

tradicional do Paraná. Essa convergência se dá em torno de uma historiografia que foi

se constituindo desde o final do século XIX e, mais especialmente, nas primeiras

décadas do século XX. Trata-se da historiografia na perspectiva do paranismo, que

também encontrei quando investiguei a construção do código disciplinar da história

do Paraná, em meu trabalho de mestrado.

Constatei, de modo geral, que a concepção de história presente nas

narrativas dos manuais didáticos usados pela professora é a de uma história factual,

acrítica e cronológica. Uma história construída a partir de "grandes vultos" e "heróis",

6 Manuais didáticos usados pela professora: EITEL, L. S. Conhecendo o Paraná. São Paulo: Ática, 1995; TUMA, M. M. P. Viver é descobrir: história e geografia: Paraná. São Paulo: FTD, 1992.

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apresentando datas que determinam épocas de fatos e acontecimentos, em uma

concepção de cunho positivista da história.

Em 2009, após a defesa da minha tese, iniciei a minha participação no

"Grupo de Pesquisa em Educação Histórica" vinculado ao Projeto "Aprender a ler e

aprender a escrever em História", aprovado como bolsa produtividade do Conselho

Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ/2009-2012), e que

constitui uma das ações do conjunto de atividades do Laboratório de Pesquisa em

Educação Histórica, integrado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPR,

sob a coordenação da Profa. Dra. Maria Auxiliadora Moreira dos Santos Schmidt.

Este grupo foi criado com o objetivo de reunir um grupo de pesquisadores7,

mais especificamente, doutores e mestres com trabalhos já defendidos, para

levantamento de dados comparativos entre Brasil e outros países que realizam

pesquisas em Educação Histórica.

Estas pesquisas têm tomado como foco um conjunto de investigações sobre a

forma como a narrativa histórica escolarizada tem tratado a temática da escravidão no

Brasil e sua relação com a formação da consciência histórica de jovens escolarizados,

tendo como pressupostos teóricos os princípios específicos da Educação Histórica,

especialmente, os que fundamentam as investigações que têm como preocupação

os estudos sobre formação de consciência histórica, como os trabalhos de Lee

(2001, 2003); Rüsen (2001, 2007); Schmidt (2002, 2006); Schmidt e Garcia (2006);

entre outros.

Para nortear as pesquisas levantou-se a seguinte questão de investigação:

De que forma a instituição de determinadas narrativas históricas pela história

escolarizada tem contribuído para a formação da consciência histórica sobre a

escravidão no Brasil?

7 Dr.a Ana Cláudia Urban, Rede Estadual de Ensino do Paraná e Faculdade Sant'Ana – Ponta Grossa; Dr. Daniel Hortêncio de Medeiros, Universidade Positivo; Dr. Geyso Dongley Germinari, Pesquisador UFPR/LAPEDUH; Dr.a Marlene Terezinha Grendel, Rede Municipal de Ensino de Araucária e Rede Estadual de Ensino do Paraná; Dr.a Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd, Rede Municipal de Ensino de Curitiba; Ms. Alamir Muncio Compagnoni, Rede Municipal de Ensino de Araucária; Ms. Adriane de Quadros Sobanski, Rede Estadual de Ensino do Paraná e Rede Particular de Ensino do Paraná; Ms. Henrique Rodolfo Theobald, Rede Municipal de Ensino de Araucária; Ms. Lilian Costa Castex, Rede Municipal de Ensino de Curitiba; Ms. Lindamir Zeglin, Rede Municipal de Ensino de Araucária.

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Os pesquisadores têm investigado a temática em pauta em produtos da

cultura escolar e nas ideias de alunos e professores8, tais como: Revistas de História

(paradidáticas); Publicações acadêmicas de História (Anais); Manuais didáticos do

Ensino Fundamental e Médio (Programa Nacional do Livro Didático – PNLD9);

Questões de vestibular; Ideias de escravidão em alunos do ensino básico; Ideias de

escravidão em professores de história do ensino básico.

Dentre estes produtos da cultura escolar, tomei como foco de investigação os

manuais didáticos dos anos iniciais do Ensino Fundamental, mais especificamente

os recebidos pelo Programa Nacional do Livro Didático – PNLD/2010, 4.o e 5.o anos.

Em seguida, busquei investigar a relação entre a narrativa do manual didático usado

em sala de aula e as ideias expressas pelos alunos em suas narrativas.

Em 2010, ocorreu a ampliação do referido grupo de pesquisa, na medida em

que professores da rede estadual de ensino do Paraná que estavam desenvolvendo

suas pesquisas no Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) sentiram a

necessidade de discutir a questão da escolha dos manuais didáticos referentes aos

livros oferecidos pelo Programa Nacional do Livro Didático – PNLD 2011, referente

aos anos finais do Ensino Fundamental. Diante da necessidade apresentada pelos

professores em relação a essa escolha, a Prof.a Maria Auxiliadora Schmidt organizou

o Seminário: Manuais didáticos, com o objetivo de subsidiar os referidos professores

na análise e seleção dos livros para as suas escolas.

Durante esse processo, fiz a proposta para dar continuidade a essa pesquisa

junto ao Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Paraná (UFPR),

Pós-Doutorado, mais especificamente junto ao NPPD, com a intenção de ampliar a

investigação. Nesse sentido, o percurso da investigação desenvolvida em 2010

passou a ser considerada como estudo exploratório e, com isso, levantei a seguinte

questão de investigação para o estudo principal:

8 Alguns resultados destas investigações foram apresentados no 1.o Colóquio do Grupo de Pesquisa em Educação Histórica, com a temática Escravidão: Perspectivas da Educação Histórica, realizado no dia 12 de junho de 2010, na UFPR.

9 O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) tem como principal objetivo subsidiar o trabalho pedagógico dos professores por meio da distribuição de coleções de livros didáticos aos alunos da educação básica. Após a avaliação das obras, o Ministério da Educação (MEC) publica o Guia de Livros Didáticos com resenhas das coleções consideradas aprovadas. O guia é encaminhado às escolas, que escolhem, entre os títulos disponíveis, aqueles que melhor atendem ao seu projeto político pedagógico. (Brasil. Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=668id=12391option=com_contentview=article).

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Como ocorre o uso e as apropriações das narrativas do manual didático por

professor e alunos no processo de escolarização?

A partir dessa questão principal, estruturei a investigação com as seguintes

questões:

- Como foi o processo de escolha do manual didático dos anos finais do

Ensino Fundamental – 6.o ao 9.o, PNLD/2011 nas escolas da RME?

- Quando o professor usa o manual didático ele usa a narrativa da forma que

está presente no manual?

- Qual a ideia expressa pelo aluno em relação ao conceito substantivo

escravidão africana no Brasil?

Para fundamentar o percurso metodológico assumido, parti das considerações

pautadas por autores da pesquisa qualitativa, tomando como referência, especialmente,

os estudos de Godoy (1995); Bogdan e Biklen (1994). Para tanto, defini os seguintes

procedimentos, inicialmente, a aplicação de um questionário exploratório para saber

o processo de escolha dos manuais adotados nas escolas municipais de Curitiba –

PNLD/2011.

Em seguida, entrevista com uma professora que participou da escolha dos

manuais didáticos para saber como a professora usa e se apropria das narrativas do

manual adotado.

Além disso, analisei o manual didático Vontade de saber história (PELLEGRINI

et al., 2009), um dos mais adotados nas escolas municipais, para buscar identificar

como o conceito substantivo escravidão africana no Brasil está proposto.

Concomitante a esse processo, acompanhei algumas aulas de história em

que a professora trabalhou o referido conceito substantivo.

Desse modo, o campo de investigação ficou definido como uma turma de

7.o ano do ensino fundamental de uma escola da Rede Municipal de Ensino de

Curitiba, com alunos entre 11 e 13 anos. A metodologia de pesquisa consistiu em

Observação não-participativa, ou seja, em acompanhar as aulas de história da referida

turma, durante o período em que a professora tratasse do conceito substantivo em

questão, sem interferência nas aulas da professora.

A estrutura do trabalho ficou constituída em cinco capítulos. O primeiro

capítulo, sob o título Manual didático: um produto da cultura escolar, foi organizado a

partir das considerações adotadas na minha pesquisa de doutorado, na medida em

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que naquele momento assumi a ideia de que o manual didático pode ser considerado

como um difusor de narrativas históricas tendo como referência, especialmente, os

estudos de Cuesta Fernandez (1997, 1998), Bittencourt (2001), Abud (1984) e

Carretero (2007). Ademais, busquei as reflexões a partir dos estudos de Schmidt

(2012) sobre a relação entre o conceito da cultura histórica de Rüsen (1994), e suas

interrelações com o ensino e a aprendizagem histórica, mais especificamente, em

relação a um dos elementos da cultura escolar – o manual didático, pois, segundo

Rüsen (2012), o livro de História é o guia mais importante da aula de História e este

deve ter algumas condições para que seja considerado um "livro ideal", e com isso

possibilite a aprendizagem da História que, no seu entender, é um processo de

desenvolvimento da consciência histórica no qual se devem adquirir competências

da memória histórica.

No segundo capítulo, sob o título Manual didático: a escolha em escolas

municipais de Curitiba, apresento como ocorreu o processo de escolha do manual

didático em escolas municipais. Retomei os estudos referentes à pesquisa qualitativa,

na medida em que essa forma de investigação tem ocupado um lugar relevante

entre as várias possibilidades de se estudar os fenômenos que envolvem os seres

humanos e suas relações sociais. No estudo exploratório obtive as informações dos

professores que estavam participando da formação continuada oferecida pela SME –

curso de história, mais especificamente, envolvendo três escolas municipais e, no

estudo principal, obtive as informações a partir de um questionário enviado a todos

os professores de história da RME.

No terceiro capítulo, sob o título O manual didático: conceito substantivo a

escravidão africana no Brasil, trato da análise de duas coleções mais adotadas pelas

escolas municipais de Curitiba. No estudo exploratório tomei como foco de investigação

os manuais didáticos dos anos iniciais do Ensino Fundamental, mais especificamente

os recebidos pelo Programa Nacional do Livro Didático – PNLD/2010. Busquei

identificar se o conceito substantivo escravidão está indicado a ser ensinado como

um conteúdo escolar a partir da análise do Guia do Livro Didático de História

(BRASIL, 2009). No estudo principal trato da análise de uma das duas coleções mais

adotadas pelas escolas de 6.o ao 9.o ano da RME: Coleção Vontade de saber

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17

história10. Em seguida, procedo à análise do conceito substantivo Escravidão

africana no Brasil, tendo como referência os estudos de Peter Lee (2005a, p.61), pois

para esse autor conceitos substantivos da história, são conceitos como comércio,

nação, protestante, escravo, tratado ou presidente, e são encontrados quando

trabalhamos com tipos particulares de conteúdos históricos. Eles são parte do que

podemos chamar de substância da história e, por isso, têm sido denominados conceitos

substantivos. Tais conceitos pertencem a diferentes tipos de atividade humana, como

a econômica, a política, a social e a cultural.

No quarto capítulo, sob o título Manual didático: uso e apropriações em

aulas de história busco analisar a relação do aluno com o manual didático de história

tendo como referência os pressupostos apontados por Rüsen (2010, p.116), quando

o autor aponta que o livro didático em toda a sua estrutura deve levar em conta as

condições de aprendizagem dos alunos. Além disso, analiso a relação da professora

e do aluno com o manual didático, mais especificamente, a mediação didática

adotada pela professora. Para identificar as evidências sobre o uso e apropriações

das narrativas do manual didático acompanhei algumas aulas que tratassem do

conceito substantivo escravidão africana no Brasil.

O quinto capítulo Narrativas históricas: uma maneira de ensinar e aprender

história, foi organizado a partir das reflexões adotadas no doutorado, mais

especificamente, a tese de que a narrativa histórica é uma maneira de ensinar e

aprender história. Para isso tomo como referência estudos de teóricos contemporâneos

que têm se voltado para as questões de como o aluno aprende história, especialmente,

os estudos de Rüsen (1992, 1993, 2001). Trato da fase da pesquisa que se refere à

apropriação, pelos alunos, do conceito substantivo escravidão africana no Brasil em

contexto de escolarização expressas em narrativas históricas.

10 PELLEGRINI, Marco César., et al. Vontade de saber história. 1.ed. São Paulo: FTD, 2009. (Coleção vontade de saber).

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1 MANUAL DIDÁTICO: UM PRODUTO DA CULTURA ESCOLAR

Para fundamentar as análises dessa investigação retomei as considerações

adotadas na minha pesquisa de doutorado, na medida em que naquele momento

assumi a ideia de que o manual didático pode ser considerado como um difusor de

narrativas históricas tendo como referência, especialmente, os estudos de Cuesta

Fernandez (1997, 1998), Bittencourt (2001), Abud (1984) e Carretero (2007).

Além disso, as reflexões aqui expostas partem dos estudos de Schmidt

(2012) sobre a relação entre o conceito da cultura histórica de Rüsen (1994), e suas

interrelações com o ensino e a aprendizagem histórica, mais especificamente, em

relação a um dos elementos da cultura escolar – o manual didático, pois, segundo

Rüsen (2012), o livro de História é o guia mais importante da aula de História e este

deve ter algumas condições para que seja considerado um "livro ideal", e com isso

possibilite a aprendizagem da História que, no seu entender, é um processo de

desenvolvimento da consciência histórica no qual se devem adquirir competências

da memória histórica.

1.1 MANUAL DIDÁTICO: DIFUSOR DE NARRATIVAS HISTÓRICAS

Em torno da questão dos manuais didáticos, Cuesta Fernandez (1998, p.106-

107), tem buscado esse material como fonte de pesquisa e os tem denominado de

textos visíveis do código disciplinar11 da história escolar (CUESTA FERNANDEZ,

1997, p.12,13). No entender do autor o texto didático é:

11 Para Cuesta Fernandes, além dos textos visíveis (como Leis, Códigos, Regulamentos e manuais didáticos), há que se buscar outras fontes para a reconstrução do código disciplinar do ensino de História. Seriam os textos invisíveis do código disciplinar, "os conteúdos escolares da prática de ensino". Deste modo, para essa reconstrução há que se "diversificar" as fontes: "fotografia, pintura, espaços e arquiteturas escolares, regulamentos, memórias de centros, testemunhos orais, entrevistas, informes administrativos" (CUESTA FERNANDES, 1997, p.12, 13, 21).

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o conjunto de suposições e normas tangíveis ou intangíveis, visíveis ou invisíveis, que governam seu discurso e seu uso: desde a freqüente adoção de um estilo frio e impessoal, como se não existisse o aluno, como se a narração fosse transescolar, até a seqüência de atividades e a atribuição de papéis aos intervenientes no processo de ensino e aprendizagem (CUESTA FERNANDEZ, 1998, p.107).

Segundo o autor, o manual didático constitui um gênero literário que se constrói

historicamente e que possui marcas que permitem diferenciá-lo de outros instrumentos

de comunicação verbal. Todo manual didático possui algumas chaves pedagógicas

explícitas ou tácitas e define, direta ou indiretamente, um modelo didático.

O manual didático possui uma "marca pedagógica", ou seja, as relações entre

texto escrito e visual, a existência de partes dedicadas a recapitular o texto principal,

os esquemas e gráficos. Esses elementos estão, habitualmente, colocados ao final

de cada tema, e são conhecidos como os "questionários de estudo", nos quais são

propostas perguntas para confirmar o que foi estudado, e que servem para memorizar

uma determinada interpretação histórica, sugerindo, outras vezes, um conjunto de

"atividades de análises e de aplicação", com a intenção de aplicar o estudo, mediante

atividades e questões de diferentes categorias, por exemplo: "Explique as diferenças

entre...". (CUESTA FERNANDEZ, 1998, p.109).

Este esquema formal contém em seu interior um "subentendido pedagógico" da

representação da história em aula, sendo que o ponto principal é o discurso

já "acabado" da história e sobre o qual deve "versar a explicação do professor"

(CUESTA FERNANDEZ, 1998, p.110).

Os primeiros manuais didáticos de história, segundo o autor, revivem

esquemas básicos da antiga história universal. O programa em que se inspiravam

impõe aos textos "uma concepção linear, diacrônica e eurocêntrica do devir histórico".

O tipo de ensino proposto nesses livros resultava da tradição da "História sem

pedagogia", ou seja, o pedido de explicação ao aluno ao final da lição, sendo que as

atividades são mero complemento ou reforço do discurso do professor, de suas

explicações ou, o que é o mesmo, do texto escrito que figura como trama narrativa

central das lições (CUESTA FERNANDEZ, 1998, p.112).

Do ponto de vista do modelo didático, o autor observa que houve algumas

mudanças desde os primeiros manuais até a década de 1970, em que os documentos

e fontes figuravam em uma posição marginal, e na década de 1980, em que o espaço

dedicado aos documentos históricos começa a competir com o espaço assegurado

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20

ao discurso narrativo. As imagens, aos poucos, deixam de desempenhar uma função

"vicária" do texto e tornam-se uma categoria componente do aparelho pedagógico dos

novos manuais. Cada vez mais, o manual didático propõe aos alunos atividades de

análise e uso de documentos históricos (CUESTA FERNANDEZ, 1998, p.115-116).

Desse modo, o autor defende que os novos manuais didáticos apresentam uma

ambivalência: por um lado, continuam utilizando como ponto central o discurso

histórico em um texto narrativo impessoal de tipo objetivo e, por outro, apresentam

fontes e documentos históricos de todo tipo, propondo atividades que recriam os

procedimentos adotados pelos historiadores e sua forma de pensar. No entanto, o

manual didático, ainda que em sua versão mais avançada, segue sendo exemplar

de um "saber fossilizado" e de uma determinada maneira de aprender e de ensinar

história (CUESTA FERNANDEZ, 1998, p.116-117).

Além de um "depositário dos conteúdos escolares" e um "instrumento

pedagógico", como indicado por Cuesta Fernandez, o manual didático é considerado

como uma "mercadoria", no dizer de Circe Bittencourt (2001, p.71-72), na medida em

que é um produto de edição que segue as tendências de fabricação e comercialização

obedecendo à lógica do mercado. Ademais, é um "veículo portador de um sistema

de valores, de uma ideologia, de uma cultura", ou, nas palavras de Cuesta Fernandez

(1998, p.28), um instrumento de "inculcação ideológica".

Para Bittencourt (2001, p.72), desde o século XIX, o manual didático tem

sido um importante instrumento utilizado em sala de aula, na medida em que tem

servido "como mediador entre a proposta oficial do poder expressa nos programas

curriculares e o conhecimento escolar ensinado pelo professor". De acordo com

Abud (1984, p.81), o manual didático tem sido um dos canais de transmissão e,

sobretudo, de "manutenção dos mitos e estereótipos" da história.

Nessa direção, Carretero (2007, p.76-79), aponta que o manual didático

adota "um discurso" e "uma voz" como se fossem próprios, assumindo a verdade do

conhecimento, reproduzindo esse conhecimento a seus destinatários diretos

(os alunos) e indiretos (os professores). Ainda para esse autor, o manual didático

contém chaves e perigos, porque em suas páginas existem palavras que se apresentam

como chaves para construir o "mundo", em que o aluno pode se deslocar pelo tempo

da história e formar uma sucessão causal de acontecimentos, desde, por exemplo, a

Idade da Pedra até o presente, ou identificar-se com heróis e pessoas de destaque

de seu país. Seu poder para cartografar o real, distinguindo-o da fantasia, e recortando

Page 22: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

21

aquilo que pode ser cognoscível, lógico e legível, coloca o manual didático acima da

autoridade da palavra do professor.

Segundo Valls (2008, p.9), os manuais escolares

han sido considerados, de forma harto simplista, como documentos de segundo o tercer orden, sin caer en la cuenta de que son los productos historiográficos socialmente más significativos en cuanto que son los que han estado más próximos a la mayor parte de la población, al menos desde la implantación de un sistema generalizado de educación durante la primera mitad del siglo XIX.12

Em seus estudos, Alain Choppin (2008), aponta que embora hoje em dia seja

comum a substituição dos livros didáticos pelos meios de comunicação, a literatura

escolar constitui em todos os países um objeto de disputa real como simbólico. Os

livros de texto são instrumentos de poder, pois:

se orientam a espíritos jovens, por sua vez manipuláveis e pouco críticos. Podem ser reproduzidos em grande número e difundidos em todo o território de um país. Fixando por escrito o conteúdo educativo, garantem, frente à palavra do professor, uma certa ortodoxia. Sua eficácia procede também da lenta impregnação que permite sua utilização freqüente, prolongada, repetida. Constituem assim poderosas ferramentas de unificação – até de uniformização – nacional, lingüística, cultural e ideológica. (CHOPPIN, 2008, p.12-13).

O autor destaca que os livros escolares assumem, conjuntamente ou não,

múltiplas funções, que podem variar de acordo com o ambiente sociocultural, a época,

as disciplinas, os níveis de ensino, os métodos e as formas de utilização, são elas:

função referencial, instrumental, ideológica/cultural e documental (CHOPPIN, 2004,

p.552-553).

A função referencial – também denominada de curricular ou programática.

Nesse caso, o livro didático é a fiel tradução do programa ou uma de suas possíveis

interpretações. Constitui o suporte "dos conteúdos educativos, o depositário dos

conhecimentos, técnicas ou habilidades que um grupo social acredita que seja

necessário transmitir às novas gerações".

12 Têm sido considerados, de forma simplista, como documentos de segunda ou terceira ordem, sem que se leve em conta que são os produtos historiográficos mais significativos socialmente, enquanto que são os que tem estado mais próximos da maior parte da população, ao menos desde a implantação de um sistema generalizado de educação durante a primeira metade do século XIX. (tradução livre).

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A função instrumental – quando o livro didático propõe métodos de

aprendizagem, exercícios ou atividades tendo a finalidade de "facilitar a memorização

dos conhecimentos, favorecer a aquisição de competências disciplinares ou transversais,

a apropriação de habilidades, de métodos de análise ou de resolução de problemas".

A função ideológica e cultural – é a função mais antiga. Desde o século XIX,

o livro didático tornou-se o instrumento privilegiado de construção de identidade.

Tem sido reconhecido, assim como a moeda e a bandeira, como um símbolo da

soberania nacional e, com isso, assume um importante papel político. Nesse caso, o

livro "tende a aculturar — e, em certos casos, a doutrinar — as jovens gerações,

pode se exercer de maneira explícita, até mesmo sistemática e ostensiva, ou, ainda,

de maneira dissimulada, sub-reptícia, implícita, mas não menos eficaz".

A função documental – o livro didático pode fornecer, desde que a sua

leitura não seja dirigida, "um conjunto de documentos, textuais ou icônicos, cuja

observação ou confrontação podem vir a desenvolver o espírito crítico do aluno".

Conforme Choppin (2004, p.549), após terem sido negligenciados, tanto

pelos historiadores quanto pelos bibliógrafos, os livros didáticos, nas últimas décadas,

vêm suscitando um vivo interesse entre os pesquisadores. Nesse período, a história

dos livros e das edições didáticas passou a constituir um domínio de pesquisa em

pleno desenvolvimento, em um número cada vez maior de países.

1.2 CULTURA ESCOLAR, CULTURA HISTÓRICA E O MANUAL DIDÁTICO

O conceito de cultura de Raymond Williams está relacionado com significados

e valores de determinadas sociedades que são mantidos graças à herança social e

demonstram ser universais, no sentido de que, quando são aprendidos, em qualquer

situação particular, podem contribuir para o crescimento das faculdades do ser

humano. Essa tradição geral, que apresenta modificações e conflitos, pode ser

chamada de cultura humana geral, que modela-se, nas sociedades, de forma local e

temporal (WILLIAMS, 2003, p.52-53).

A perspectiva desse autor sustenta alguns pressupostos para a observação na

escola, o fato de que o conhecimento trabalhado em aula é sempre resultado de

uma tradição seletiva de uma cultura vivida e registrada (GEVAERD, 2009, p.108).

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A "tradição seletiva" apresenta, de certa forma, três níveis: começa no próprio

período, de todas as atividades selecionam-se certas coisas, que se tornam em certo

sentido uma "cultura humana geral"; outra parte é o registro histórico de uma sociedade

em particular, que permanece em estado de arquivo; em terceiro, que é o mais difícil

de aceitar e avaliar, tem-se a "expulsão" de certas coisas que anteriormente faziam

parte de uma cultura viva (WILLIAMS, 2003, p.59-60).

Em certa medida, as instituições que mantêm viva essa tradição – educativas e

acadêmicas – estão comprometidas com essa seleção de acordo com os interesses

contemporâneos. Esse compromisso é importante, porque no funcionamento de uma

tradição seletiva ocorrem inversões e redescobrimentos, retornos a trabalhos dados

como mortos, e isto só é possível se existirem instituições que tenham a tarefa de

manter elementos da cultura passada, senão vivas, ao menos acessíveis (WILLIAMS,

2003, p.60).

O conceito de cultura, no dizer de Forquin (1993, p.167), contribui para a

compreensão das práticas e situações escolares, pois, no entender do autor a escola

é um 'mundo social' com "seus ritmos e seus ritos, sua linguagem, seu imaginário,

seus modos próprios de regulação e transgressão, seu regime próprio de produção e

de gestão de símbolos". A cultura da escola não deve ser confundida com a "cultura

escolar", que consiste no "conjunto dos conteúdos cognitivos e simbólicos que,

selecionados, organizados, 'normalizados', 'rotinizados'" pela didatização, constituem

o objeto da transmissão no contexto escolar.

O pensamento de Forquin permite admitir a existência de uma cultura escolar

e, portanto, a possibilidade de se encontrar um tipo de narrativa histórica – a narrativa

histórica escolarizada. Ao mesmo tempo, permite identificar elementos dessa narrativa

que são provenientes de um produto da cultura escolar – o manual didático

(GEVAERD, 2009, p.109).

Segundo Schmidt e Barca (s/d), no âmbito das investigações na área da

Educação Histórica, o conceito de cultura é um dos principais fundamentos da teoria

da consciência histórica de Jörn Rüsen (1994). Para esse autor o conceito de cultura

histórica auxilia a compreensão da produção e os usos da história no espaço público

na sociedade. Para Rüsen (1994, p.2), o conceito de cultura histórica

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24

contempla as diferentes estratégias de investigação científico-acadêmica, da criação artística, da luta política pelo poder, da educação escolar e extra-escolar, do lazer e de outros procedimentos da memória histórica pública, como concretudes e expressões de uma única potência mental.

As considerações desse autor, no entender Schmidt (s/d) possibilitam identificar

determinados elementos da cultura escolar, como os manuais didáticos, que se inserem

na dinâmica de produção da cultura histórica de cada sociedade, em diferentes

momentos históricos.

Os manuais didáticos são considerados por Rüsen (2010, p.112) como um

dos mais importantes canais para o transporte da pesquisa histórica sobre a cultura

histórica de uma sociedade.

Segundo Schmidt (s/d), essa é uma das dinâmicas da didática da história

que pode ser identificada como um dos processos que põem em causa a relação

entre elementos da cultura escolar, os manuais didáticos de história, e a cultura da

escola, isto é, as práticas e vivências próprias do universo escolar.

Os livros didáticos, no dizer de Rüsen

são submetidos aos princípios da ciência na medida em que sempre têm a tarefa de transmitir um saber sólido. A solidez do saber consiste em ser fundamentalmente submetido aos princípios de autoridade que valem para a ciência. Em geral, trata-se de um saber muito simplificado para fins escolares e selecionado a partir do capital da respectiva ciência. O limite de sua simplificação e aplicação a fins pedagógicos é o ponto em que a racionalidade metódica que o fundamenta constitutivamente é ferida como princípio (RÜSEN, 2012, p.170).

O livro de História é o guia mais importante da aula de História e este deve

ter algumas condições para que seja considerado um "livro ideal", e com isso

possibilite a aprendizagem da História que, no seu entender, é um processo de

desenvolvimento da consciência histórica no qual se devem adquirir competências

da memória histórica.

Segundo Rüsen as características de um bom livro didático podem ser definidas

como: um formato claro e estruturado; uma estrutura didática clara; uma relação

produtiva com o aluno; uma relação com a prática da aula (RÜSEN,1997, 2010).

Além disso, um livro didático de história deve apresentar uma utilidade para

a percepção histórica, uma utilidade para a interpretação histórica e para a

orientação histórica.

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Para o autor a utilidade de um livro didático para a percepção histórica

depende de três características: a maneira em que se apresentam os materiais; a

pluridimensionalidade em que se apresentam os conteúdos históricos; a

pluriperspectividade da apresentação histórica. (RÜSEN, 2010, p.119).

Em relação à utilidade para a interpretação histórica o livro didático deve

proporcionar a possibilidade de realizar estas interpretações de uma maneira concreta:

- as interpretações devem se corresponder com as normas da ciência

histórica;

- nelas devem se exercer as capacidades metodológicas;

- têm que ilustrar o caráter de processo e de perspectividade da história e

finalmente,

- na exposição histórica do próprio livro devem ficar claras as condições

linguísticas decisivas para sua força de convicção (RÜSEN, 2010, p.122).

Quanto à utilidade para a orientação histórica um bom livro didático também

estimula:

- estabelecendo uma relação entre sua própria perspectiva global e o ponto de vista presente dos alunos e alunas e mencionando os problemas relacionados com o próprio conceito da História e a integração com o próprio presente;

- introduzindo os alunos no processo de formação de uma opinião histórica e - trabalhando com referências ao presente (RÜSEN, 2010, p.125).

Com isso, "um livro didático deveria levar em conta que as crianças e jovens

aos quais se dirige possuem um futuro cuja configuração também depende da

consciência histórica que lhes foi dada" (RÜSEN, 1997, p.93).

Pois, no entender do autor:

a consciência histórica pode ser descrita como a atividade mental da memória histórica, que tem sua representação em uma interpretação da experiência do passado encaminhada de maneira a compreender as atuais condições de vida e a desenvolver perspectivas de futuro na vida prática conforme a experiência. O modo mental deste potencial de recordação é o relato da história (relatar não no sentido de entender uma mera descrição, mas no sentido de uma forma de saber e de entendimento antropologicamente universais e fundamentais). Esta forma narrativa que oferece uma interpretação da história do passado representado cumpre uma função de orientação para a vida atual. Esta função se realiza como um ato de comunicação entre produtores e receptores de histórias. Por isto, o aspecto comunicativo da memória histórica é tão importante, porque é através da narrativa (e da

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26

percepção) das histórias que os sujeitos articulam sua própria identidade em uma dimensão temporal em relação com outras (e ao articulá-las se formam) e ao mesmo tempo adquirem identificadores de direção (por exemplo, perspectivas de futuro) sobre critérios de fixação de opinião para seu próprio uso (RÜSEN, 2012, p.112).

A aprendizagem da História, segundo as considerações do autor, é um

processo de desenvolvimento da consciência histórica no qual se devem adquirir

competências da memória histórica, que podem ser divididas em três competências:

A competência perceptiva ou embasada na experiência consiste em saber perceber o passado como tal, isto é, em seu distanciamento e diferenciação do presente (alteridade histórica), em vê-lo a partir do horizonte de experiências do presente como um conjunto de ruínas e tradição. A competência interpretativa consiste em saber interpretar o que temos percebido como passado em relação e conexão de significado e de sentido com a realidade (a "História" é a encarnação suprema desta conexão). Finalmente, a competência de orientação consiste em admitir e integrar a "História" como construção de sentido com o conteúdo de experiências do passado, no marco de orientação cultural da própria experiência de vida (RÜSEN, 2012, p.114).

Rüsen (2012, p.114) destaca que na atividade mental da consciência histórica

a diferenciação entre as competências da percepção, interpretação e orientação é

fictícia, pois as três operações se apresentam em uma correlação estreita e se

sobrepõem continuamente. No entanto, graças a essas competências é que podemos

dimensionar o procedimento de aprendizagem e que é possível identificar os resultados

mais importantes que deve produzir um livro didático no processo de aprendizagem

na sala de aula.

Em seu artigo, que trata do livro didático "ideal", Rüsen (2010, p.111)

demonstra a importância de investigações empíricas sobre o uso e o papel que os

livros didáticos desempenham no processo de aprendizagem em sala de aula. Essa

preocupação me levou a desenvolver essa investigação sobre como esse manual é

utilizado pelo professor e como os alunos se apropriam das narrativas desse

material presente na cultura escolar.

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2 MANUAL DIDÁTICO: A ESCOLHA EM ESCOLAS MUNICIPAIS DE CURITIBA

Nesse capítulo, apresento como ocorreu o processo de escolha do manual

didático em escolas municipais Para desenvolver essa pesquisa retomei os estudos

já assumidos no doutorado, especialmente, no que se refere à pesquisa qualitativa,

na medida em que essa forma de investigação tem ocupado um lugar relevante

entre as várias possibilidades de se estudar os fenômenos que envolvem os seres

humanos e suas relações sociais.

De acordo com essa perspectiva, um fenômeno pode ser melhor compreendido

no contexto em que ocorre, devendo ser analisado numa perspectiva integrada.

Nessa metodologia, o pesquisador vai a campo buscando "captar" o fenômeno em

estudo a partir da perspectiva das pessoas nele envolvidas, considerando todos os

pontos de vista relevantes. A pesquisa etnográfica, inicialmente utilizada em estudos

antropológicos, tem sido empregada em outras áreas do conhecimento, entre elas a

educação (GODOY, 1995, p.28-29).

Em um trabalho etnográfico, é fundamental a "interação contínua entre os

dados reais e as possíveis explicações teóricas", ou seja, no decorrer da coleta de

dados o investigador deve manter-se alerta para refutar, corroborar ou alterar o modelo

teórico anteriormente adotado. Sendo o estudo de campo o elemento principal da

pesquisa etnográfica, o pesquisador deve ter uma "experiência direta e intensa

com a situação em estudo". É de cunho exploratório e os dados são coletados,

principalmente, por meio de observação participante (GODOY, 1995, p.29).

Segundo Bogdan e Biklen (1994, p.50) os dados empíricos não são recolhidos

com o objetivo de confirmar ou infirmar hipóteses construídas previamente, mas, em

vez disso, as abstrações são construídas à medida que os dados particulares

recolhidos vão sendo agrupados. No entender dos pesquisadores, é uma teoria que

se desenvolve 'de baixo para cima', em que as peças individuais são recolhidas e

depois inter-relacionadas. É designada por Grounded Theory, ou teoria fundamentada,

na qual o investigador que planeja elaborar uma teoria sobre o seu objeto de estudo

só poderá estabelecer a direção de sua pesquisa após a recolha dos dados

(BOGDAN; BIKLEN, 1994, p.50).

Tomando como referência esses pressupostos teóricos e metodológicos

desenvolvi essa investigação com os professores e professoras de escolas de 6.o ao

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9.o ano da RME. No estudo exploratório obtive as informações dos que estavam

participando da formação continuada oferecida pela SME – curso de história, mais

especificamente, envolvendo três escolas municipais13 e, no estudo principal, obtive

as informações a partir de um questionário enviado a todos os professores de

história da RME.

2.1 O PROCESSO DE ESCOLHA DO MANUAL DIDÁTICO: ESTUDO

EXPLORATÓRIO

No percurso do estudo exploratório, realizado em 2009, a minha preocupação

inicial foi saber quais os critérios que os professores e professoras de escolas da

RME levaram em consideração para a escolha do livro didático do Programa Nacional

do Livro Didático. Para obter essas informações, solicitei um relatório em que os

professores e professoras deveriam narrar como havia ocorrido a escolha do livro

didático oferecido pelo PNLD 2010/2011, para os anos finais do Ensino Fundamental,

6.o ao 9.o ano, devendo destacar:

- Como ocorreu o contato com os manuais;

- A forma e horário em que foi realizada a escolha;

- Quais os critérios de escolha;

- Citar o nome do manual escolhido como 1.a opção.

Em relação ao contato com os manuais, obtive os seguintes dados:

ESCOLA CONTATO COM OS MANUAIS

A Via editora; Entregues individualmente ou na escola; Palestras com os autores nas editoras.

B Primeiras coleções chegaram em abril de 2010; 02 coleções chegaram na semana final para a escolha, prejudicando a análise.

C Coleções foram chegando aos poucos.

QUADRO 1 - CONTATO COM OS MANUAIS FONTE: A autora

13 A RME possui 11 escolas que atendem os anos finais do Ensino Fundamental, 6.o ao 9.o ano.

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De modo geral, as coleções foram enviadas às escolas pelas editoras e, como

indicado pelas professoras da Escola C "foram chegando aos poucos". Com isso,

algumas coleções chegaram na última semana estipulada para a escolha "prejudicando

a análise" (ESCOLA B).

Algumas editoras ofereceram palestras para a apresentação das coleções.

No entanto, nenhuma escola fez referência, em seus relatórios, se participaram

desses encontros.

Quanto ao horário e a forma da escolha, os professores indicaram os

seguintes aspectos:

ESCOLA HORÁRIO/FORMA DA ESCOLHA

A

Horário de permanência concentrada; Coletivamente; Levaram em consideração as orientações: - Coordenação de História da SME (Reunião) e Guia do PNLD; Tempo para análise e escolha muito reduzido; Necessidade de reestruturação e ampliação do tempo para este fim.

B Não houve um momento específico em grupo para a análise; Análise individual; Durante as aulas vagas; Após a escolha individual fez-se a comunicação aos demais colegas.

C

Individualizada; Opiniões individuais eram repassadas em trocas de aulas ou no recreio; (isto ocorreu por motivo de falta da permanência concentrada); Definição da escolha – reunião; - momento em que puderam analisar os manuais com maior criticidade.

QUADRO 2 - HORÁRIO E FORMA DA ESCOLHA FONTE: A autora

Das três (03) escolas investigadas, somente os professores da Escola A,

conseguiram fazer a escolha coletivamente e no horário de permanência concentrada.

Nas Escolas B e C, os professores fizeram a escolha de forma individualizada, pois

não houve um momento específico para a escolha.

Na Escola A, os professores levaram em consideração, tanto as orientações

repassadas em reunião organizada pela Coordenação de História da SME, como as

orientações do Guia do PNLD 2011 (BRASIL, 2010).

Os professores da Escola B não tiveram "um momento específico em grupo

para análise", portanto, a escolha foi de forma individual e durante as aulas vagas,

ocorrendo, em seguida, o repasse da escolha para os demais colegas.

Na Escola C, a escolha foi individual e as opiniões eram repassadas no

intervalo "em trocas de aulas" ou no recreio. Isso ocorreu em virtude da falta da

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permanência concentrada.14 Após a escolha individual puderam, durante uma

reunião, analisar os "manuais com maior criticidade".

Somente a Escola A indicou as dificuldades enfrentadas, tais como: o tempo

reduzido para análise e escolha e indicaram como fundamental a "necessidade de

reestruturação e ampliação do tempo para este fim".

Em relação aos critérios de escolha das (03) escolas, obteve-se as

seguintes categorias:

ESCOLA CRITÉRIOS DE ESCOLHA

A Material que pudesse ampliar o conhecimento histórico do aluno; Coesão textual; Iconografia; Atividades bem formuladas e que levassem à reflexão dos conteúdos.

B

Conteúdos abordados de acordo com as Diretrizes Curriculares; Imagens presentes nos livros coerentes com os textos e se ofereciam possibilidades de trabalho em sala de aula; Atividades de fácil compreensão; Complexidade dos textos de acordo com as possibilidades de leitura e vocabulário dos alunos; Se o livro apresentava conteúdos específicos para a aplicação da Lei 10. 639 e da Lei 11.645(1), de maneira ética e científica, sem preconceitos e estereótipos.

C Material que contivesse documentos históricos; conceitos históricos; abertura do capítulo a partir dos conhecimentos prévios dos alunos.

QUADRO 3 - CRITÉRIOS DE ESCOLHA FONTE: A autora (1) A Lei n.o 10.639/03 foi assinada, em janeiro de 2003, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e torna

obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira em todos os estabelecimentos de ensino da educação básica (BRASIL, 2003); a Lei n.o 11.645/08 altera a Lei n.o 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei n.o 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena" (BRASIL, 2008).

Os professores da Escola A, levaram em consideração como critérios de

escolha se o material amplia o conhecimento histórico do aluno e se apresenta uma

coesão textual. Além disso, indicam que analisaram a iconografia, mas não

explicitaram de que forma isso ocorreu. Consideraram também, se as atividades

propostas estão bem formuladas e se essas possibilitam a reflexão dos conteúdos.

Na Escola B, os professores expressaram a preocupação de que o manual

didático apresentasse os conteúdos indicados pelas Diretrizes Curriculares da SME

(CURITIBA, 2006). Analisaram se as imagens presentes nos livros estavam

coerentes com os textos e se ofereciam possibilidades de trabalho em sala de aula.

14 Em 2010, a SME implementou o turno de 5 horas nas escolas de 5.a a 8.a séries. Isso dificultou a garantia da permanência concentrada para os professores em todas as escolas.

Page 32: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

31

Outra questão que levaram em consideração foi a de que as atividades

propostas pelo manual sejam de fácil compreensão pelos alunos e, os textos,

apresentem uma complexidade que está de acordo com as possibilidades de leitura

e vocabulário dos alunos.

Além disso, os professores observaram se "o livro apresentava conteúdos

específicos para a aplicação da Lei n.o 10.639/2003 e 11.645/08, de maneira ética e

científica, sem preconceitos e estereótipos". Essas leis tratam da obrigatoriedade do

ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena, respectivamente. O estabelecido

nessas leis tem sido um dos critérios de análise da Comissão dos livros didáticos

PNLD, conforme indicado no Guia

No caso da História, particular destaque, neste momento atual, deve ser dado ao cumprimento da Lei 11.645, que dispõe sobre a obrigatoriedade de as coleções didáticas conterem informações e orientações quanto ao tratamento da História da África, História das populações indígenas, bem como reflexões acerca da situação dos afrodescendentes e indígenas no Brasil contemporâneo (BRASIL, 2010, p.10).

Para os professores da Escola C a decisão da escolha ficou atrelada aos

itens: "Material que contivesse documentos históricos; conceitos históricos; abertura

do capítulo a partir dos conhecimentos prévios dos alunos" (ESCOLA C).

Os professores da Escola A escolheram a coleção Novo – História – conceito

e procedimentos, autoria de Ricardo Dreguer; Eliete Toledo, da Saraiva Livreiros

Editores. E, os professores das Escolas B e C escolheram a coleção Vontade de

saber história, de autoria de Marco Pellegrini; Adriana Machado Dias; Keila Grinberg,

da Editora FTD.

Algumas considerações podem ser apontadas. Quanto ao contato com os

manuais, os professores não tiveram acesso a todas as coleções prejudicando com

isso a escolha. Essas coleções foram enviadas às escolas pelas editoras sendo que

algumas foram entregues aos professores em data próxima ao prazo final para

a escolha. Esses fatores prejudicaram a análise das mesmas, conforme relatado

pelos professores.

De modo geral, as dificuldades apontadas pelos professores para a escolha

do manual didático foram a falta de horário específico para a análise dos manuais,

tanto de forma individual como no coletivo. Além disso, comentaram que o tempo

para análise e escolha foi muito reduzido.

Page 33: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

32

Em relação aos critérios de escolha, de modo geral, os professores

preocuparam-se em observar a iconografia, que contivesse documentos históricos,

mas não detalharam de que forma ocorreu essa análise.

Tiveram a preocupação com a apresentação dos textos, e, especialmente, se

os mesmos estavam apropriados para a compreensão dos alunos. Essa perspectiva

está presente nos critérios de Rüsen (1997, p.85), na medida em que o autor afirma

que um bom livro didático de história deve apresentar "uma relação eficaz com o aluno".

2.2 O PROCESSO DE ESCOLHA DO MANUAL DIDÁTICO: ESTUDO PRINCIPAL

Partindo dos resultados obtidos no estudo exploratório e tomando como

referência a constatação apontada por Rüsen (2010, p.111) de que existe um déficit de

investigações empíricas sobre o uso e o papel que os livros didáticos desempenham no

processo de aprendizagem em sala de aula, é que fiz a proposta para desenvolver

essa investigação no Pós-Doutorado.

Para tanto, no estudo principal, elaborei um questionário que foi enviado, em

2011, para as 11 (onze) escolas que atendem os anos finais do Ensino Fundamental

da RME.

O questionário consistiu em informações pessoais, profissionais e acadêmicas,

bem como questões sobre como foi o processo de escolha na escola.

Do total de 54 professores que atuavam nesse período, com o ensino de

História, 21 (vinte e um) devolveram os questionários15, desses somente 11 (onze)

participaram do processo de escolha.

Quanto ao tempo de serviço os dados obtidos mostraram que 05 professores

possuem mais de 20 anos de serviço; 04 professores de 10 a 20 anos; 04 professores

de 05 a 10 anos e somente 01 possui menos de 05 anos. Sendo que 07 professores

não indicaram o seu tempo de trabalho.

Em relação aos dados acadêmicos constatou-se que 09 professores são

formados em História, 04 em Estudos Sociais, 04 em Ciências Sociais, 02 em

15 Os 21 professores que devolveram os questionários trabalham em 09 das 11 escolas municipais.

Page 34: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

33

Estudos Sociais/plena em História, 01 professor tem formação em Filosofia, Direito e

História. Somente 01 professor não registrou essa informação.

Todos os professores possuem Curso de Especialização em diferentes

áreas, tais como: História do Brasil, História e Geografia do Paraná, Sociedade Pós-

Industrial: História e cidadania, entre outros. Dois (02) professores possuem

Mestrado e um professor está cursando o Doutorado.

2.2.1 A escolha do manual didático

Especificamente, para investigar como foi o processo de escolha do PNLD-

201016 nas escolas municipais propus as seguintes questões:

1) Qual foi o livro didático de História do PNLD 2010 recebido na escola?

2) O livro de História recebido do PNLD 2010 foi a 1.a opção?

3) Quais foram os critérios utilizados para a escolha?

Em relação à primeira questão, sobre o livro didático de História recebido

nas escolas em 2011, obteve-se a seguinte informação:

MANUAL DIDÁTICO RECEBIDO(1) N.o de ESCOLAS

Vontade de Saber História Autores: Marco Pellegrini; Adriana Machado Dias; Keila GrinbergEditora: FTD

04

História, sociedade e cidadania Autor: Alfredo Boulos Júnior Editora: FTD

04

Projeto Araribá Autora: Maria Raquel Apolinário Editora: Moderna

02

Novo história: conceitos e procedimentos Autores: Ricardo Dreguer; Eliete Toledo Editora: Saraiva

01

QUADRO 4 - MANUAIS DIDÁTICOS RECEBIDOS NAS ESCOLAS MUNICIPAIS/PNLD 2010 FONTE: A autora (1) Para obter os nomes dos livros recebidos pelas onze (11) escolas municipais, além dos dados

fornecidos pelos professores das nove escolas, busquei informações na Planilha fornecida pela SME/DEF – Gerência Pedagógica. (MEC/FNDE/SISCORT – Escolas Municipais. Elaboração Planilha Andréa Furtado – SME/DEF – Gerência Pedagógica/2010).

16 A escolha do PNLD ocorreu em 2010 e as escolas receberam os livros em 2011.

Page 35: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

34

Das dezesseis (16) coleções aprovadas pela comissão do PNLD 2010,

quatro (04) foram escolhidas pelos professores da RME. Os livros mais escolhidos

foram: Vontade de Saber História por professores de quatro (04) escolas e História,

sociedade e cidadania em quatro (04) escolas. Os menos escolhidos foram o Projeto

Araribá, em duas (02) escolas e Novo história: conceitos e procedimentos em uma

(01) escola.

Em relação à segunda questão O livro de História recebido do PNLD 2010

foi a 1.a opção? Do total de professores uma (01) professora afirmou "o livro escolhido

não era a minha opção, mas foi respeitada a escolha da maioria dos professores"

(Mariete17). E, muitos professores (08) estavam em licença ou não faziam parte do

quadro de professores no ano da escolha. Os demais comentaram que o livro

recebido foi a primeira escolha.

Para analisar as respostas dadas à terceira questão: Quais foram os critérios

utilizados para a escolha?, busquei elementos nas considerações de Rüsen sobre o

livro ideal.

Nos aspectos sobre a "utilidade para o ensino prático", Rüsen (2010, p.115)

aponta as características que distinguem um bom livro didático de história:

- um formato claro e estruturado;

- uma estrutura didática clara;

- uma relação produtiva com o aluno;

- uma relação com a prática da aula.

Dessas características, somente duas foram elencadas pelos professores e

professoras investigados/as. A partir das respostas obtive as seguintes características:

UTILIDADE PARA O ENSINO CARACTERÍSTICAS N.o DE PROFESSORES/AS

Formato

Conteúdo/ temas 09

Imagens 06

Textos 04

Mapas 02

Glossário 01

Relação com o aluno livro didático ajuda os alunos a

entenderem o conteúdo 01

QUADRO 5 - UTILIDADE PARA O ENSINO: CARACTERÍSTICAS APRESENTADAS PELOS PROFESSORES E PROFESSORAS

FONTE: A autora

17 Para preservar as identidades os nomes dos sujeitos envolvidos nessa investigação são fictícios.

Page 36: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

35

No aspecto utilidade para o ensino prático, de modo geral os professores e

professoras fizeram referência ao formato. Desses, 09 professores destacaram o

conteúdo e/ou temas. Segundo a professora Célia a "Apresentação do conteúdo

deve ser de forma clara e objetiva".

Algumas professoras (06) destacaram a importância das imagens, inclusive a

professora Giseli comentou que observou se as imagens apresentavam "os créditos".

Alguns professores (04) destacaram como um importante critério de escolha

do livro a análise dos textos. Na opinião da professora Mariete "Para a análise do

livro deve ser considerado os textos que apresenta". Além disso, o professor Saulo

faz referência à importância dos "textos complementares".

Uma professora destacou a relação do livro com o aluno "Se o livro é de fato

didático, ou seja, ajuda os alunos a entenderem o conteúdo com títulos e subtítulos"

(Giseli).

Esse aspecto destacado pela professora atende parcialmente um dos critérios

indicados por Rüsen (2010, p.116), na medida em que o autor aponta que

o formato e a estruturação dos materiais do livro didático devem estar configurados de tal maneira que inclusive os alunos possam ser capazes de reconhecer suas intenções didáticas, o plano de estruturação que forma sua base, os pontos mais importantes de seu conteúdo e os conceitos metodológicos do ensino.

Page 37: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

36

3 O MANUAL DIDÁTICO: CONCEITO SUBSTANTIVO A ESCRAVIDÃO AFRICANA NO BRASIL

Nesse capítulo trato da análise de duas coleções mais adotadas pelas escolas

municipais de Curitiba. No estudo exploratório tomei como foco de investigação os

manuais didáticos dos anos iniciais do Ensino Fundamental, mais especificamente

os recebidos pelo Programa Nacional do Livro Didático – PNLD/2010. Busquei

identificar se o conceito substantivo escravidão está indicado a ser ensinado como

um conteúdo escolar a partir da análise do Guia do Livro Didático de História

(BRASIL, 2009).

No estudo principal trato da análise de uma das duas coleções mais

adotadas pelas escolas de 6.o ao 9.o ano da RME: Coleção Vontade de saber

história. Essa coleção foi escolhida por quatro (04) escolas e os critérios para definir

qual a coleção seria analisada está atrelada à escolha da escola e professora que foi

foco de observação das aulas de história. Foram os seguintes critérios:

- Escola que recebeu um dos livros mais escolhidos na RME;

- Professora que participou do processo de escolha do PNLD/2011;

- Professora que respondeu ao questionário por mim enviado.

Em seguida, procedo à análise do conceito substantivo Escravidão africana

no Brasil, tendo como referência os estudos de Peter Lee (2005a, p.61), pois para

esse autor conceitos substantivos da história, são conceitos como comércio, nação,

protestante, escravo, tratado ou presidente, e são encontrados quando trabalhamos

com tipos particulares de conteúdos históricos. Eles são parte do que podemos chamar

de substância da história e, por isso, têm sido denominados conceitos substantivos.

Tais conceitos pertencem a diferentes tipos de atividade humana, como a econômica, a

política, a social e a cultural.

Page 38: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

37

3.1 MANUAIS DIDÁTICOS PNLD/2010 E O CONCEITO SUBSTANTIVO

ESCRAVIDÃO: ESTUDO EXPLORATÓRIO

No percurso do estudo exploratório tomei como foco de investigação os

manuais didáticos dos anos iniciais do Ensino Fundamental, mais especificamente

os recebidos pelo Programa Nacional do Livro Didático – PNLD/2010. Em seguida,

busquei investigar a relação entre a narrativa do manual didático usado em sala de

aula e as ideias expressas pelos alunos em suas narrativas.18

Diante disso, delineei as seguintes questões de investigação:

- De que forma a ideia de escravidão está presente na narrativa de

manuais didáticos de história dos anos iniciais do ensino fundamental?

- Tendo em vista as narrativas difundidas na escola, como o aluno manifesta

suas ideias sobre o conceito escravidão?

Inicialmente, busquei identificar se o conceito substantivo escravidão está

indicado a ser ensinado como um conteúdo escolar. Para tanto, analisei os manuais

avaliados e aprovados pelo PNLD/2010 para os anos iniciais do ensino fundamental

e apresentados no Guia do Livro Didático de História (BRASIL, 2009).

Após análise das 32 coleções19, constatei que o conceito está indicado, em

alguns anos de escolarização, de forma implícita e, em outros, de forma explícita,

conforme quadro a seguir:

INDICADO DE FORMA IMPLÍCITA INDICADO DE FORMA EXPLÍCITA

2.o ano - 03 5.o ano - 11 3.o ano - 02 4.o e 5.o ano - 07 4.o ano - 03 4.o ano - 04 5.o ano - 02

QUADRO 6 - CONCEITO ESCRAVIDÃO: MANUAIS DIDÁTICOS PNLD/2010 FONTE: A autora

18 As ideias dos alunos será foco de análise no Capítulo 5.

19 Conhecer e Crescer: História; Novo Viver e Aprender História; De Olho no Futuro: História; História, Imagens e Textos; Pelos Caminhos da História; Novo Interagindo com a História; Mundo para Todos: História; Projeto Pitanguá: História; A Escola é Nossa: História; Projeto Buriti: História; Tempo de Aprender: História; Eu Conto História: Minha Infância; Caracol: História; Aprendendo Sempre: História; Asas para Voar: História; Fazer e Aprender História; Aroeira: História; Brasiliana: História; Projeto Conviver: História; Projeto Prosa: História; História Tantas Histórias; Curumim: História; Horizontes: História com Reflexão; Novo Bem-Me-Quer: História; História no Dia a Dia; Conversando sobre História; Hoje é Dia de História; Pensar e Viver: História; Ler o Mundo: História; O Mundo em Movimento: História; História para Crianças; Para Gostar de História.

Page 39: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

38

Constatei que o conceito está indicado como conteúdo a ser ensinado, de

forma implícita em todos os anos de escolarização, do 2.o ao 5.o ano. De forma

explícita está indicado com maior ênfase nos manuais de 4.o e 5.o anos. Em 11 (onze)

coleções o conceito está indicado no 5.o ano; em 04 (quatro) está indicado no 4.o

ano e em 07 (sete) coleções está indicado no 4.o e 5.o anos.

Em seguida, analisei as narrativas dos manuais didáticos e busquei identificar

as ideias expressas nestes manuais em relação ao conceito escravidão. Obtive a

seguinte categorização:

CATEGORIAS IDEIAS MAIS RECORRENTES

Os povos que vieram da África "A gente que veio da África..."; "Os africanos..."; "Um pouco sobre a história da África...".

Trabalho escravo "... submetidos a trabalhos forçados e maus-tratos..."; "...vieram para o Brasil forçados, como escravos...".

Luta e resistência

"Desde o começo os escravos reagiram contra a escravidão...."; "Em busca da liberdade: luta e resistência..."; "Quilombos: resistência à escravidão..."; "Uma história de luta e resistência..."; "Afro-brasileiros: uma história de luta..."; "Havia quilombos em todo o Brasil, e eles significavam um ponto de resistência à escravidão; por isso, foram duramente combatidos".

Formação do povo brasileiro/cultura brasileira

"A cultura brasileira mantém traços marcantes da música, da culinária e da religião africana e absorvem palavras que hoje fazem parte da nossa língua"; "A contribuição negra está presente em vários aspectos de nossa vida, por exemplo, na culinária, na música, na dança e na religiosidade"; "Quando vieram da África, como escravos para o Brasil, os negros trouxeram muitos costumes da sua terra. Morando aqui eles mudaram seu jeito de viver, mas continuaram a participar de festas com jogos, danças e batuques. Um desses jogos praticados pelos negros é a capoeira".

QUADRO 7 - CONCEITO ESCRAVIDÃO: IDEIAS MAIS RECORRENTES FONTE: A autora

As ideias mais recorrentes foram agrupadas nas categorias Os povos que

vieram da África; trabalho escravo; luta e resistência; formação do povo brasileiro/

cultura brasileira.

Na categoria Os povos que vieram da África, encontrei ideias como "A gente

que veio da África..."; "Os africanos..."; "Um pouco sobre a história da África...",

entre outras.

Page 40: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

39

Na categoria trabalho escravo, as ideias mais recorrentes estão ligadas à

narrativas como "...submetidos a trabalhos forçados e maus-tratos..."; "...vieram para

o Brasil forçados, como escravos...".

Na categoria luta e resistência, estão agrupadas ideias como "Desde o

começo os escravos reagiram contra a escravidão...."; "Em busca da liberdade: luta

e resistência..."; "Quilombos: resistência à escravidão..."; "Uma história de luta e

resistência..."; "Afro-brasileiros: uma história de luta..."; "Havia quilombos em todo o

Brasil, e eles significavam um ponto de resistência à escravidão; por isso, foram

duramente combatidos".

Na categoria formação do povo brasileiro/cultura brasileira, ficaram agrupadas

ideias como "A cultura brasileira mantém traços marcantes da música, da culinária e

da religião africana e absorvem palavras que hoje fazem parte da nossa língua";

"A contribuição negra está presente em vários aspectos de nossa vida, por exemplo,

na culinária, na música, na dança e na religiosidade"; "Quando vieram da África,

como escravos para o Brasil, os negros trouxeram muitos costumes da sua terra.

Morando aqui eles mudaram seu jeito de viver, mas continuaram a participar de

festas com jogos, danças e batuques. Um desses jogos praticados pelos negros é

a capoeira".

Pude constatar que, de modo geral, estas narrativas estão muito próximas das

narrativas de historiadores clássicos da historiografia brasileira, pois como aponta

Adriane Sobanski (2008) em sua dissertação de mestrado20, "O que temos constatado

é que sobre a História da África ainda pesam as mesmas referências culturais

idealizadas e defendidas por teóricos como Oliveira Viana, Nina Rodrigues e Gilberto

Freyre21 orientando as interpretações de um passado tido como único e verdadeiro".

Isto me levou a buscar na historiografia brasileira se existem algumas

aproximações entre as narrativas destes autores e a narrativa do manual didático.

Exemplo:

20 Dissertação de mestrado sob o título: Como os professores e jovens estudantes do Brasil e de Portugal se relacionam com a idéia de África.

21 VIANA, O. Populações meridionais do Brasil. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2005; RODRIGUES, N. Os africanos no Brasil. 6.ed. Brasília: Nacional, 1982; FREYRE, G. Casa grande e senzala. 20.ed. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1988.

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40

Na narrativa do manual didático: 2 A sociedade mineradora A extração do ouro era feito por escravos [...] O trabalho de extração do ouro era muito duro e, geralmente, feito por escravos. Muitos deles contraíam doenças respiratórias, pois passavam grande parte do dia com os pés na água (COSTA JUNIOR, 2007, p.26, grifo do autor).

Na narrativa do historiador Nina Rodrigues (1982, p.14) – Os africanos

no Brasil22:

A escravidão negra no Brasil é, pois, contemporânea da sua colonização. Somente ela guardou, nos primeiros tempos, a feição portuguesa de fenômeno secundário, limitado ao serviço doméstico. Surgiu como problema brasileiro quando, faltando o índio, que sucumbia ou era protegido pelos jesuítas, e começando a escassear os braços para a lavoura e, mais tarde, para o trabalho das minas, se criou um comércio de escravos direto, entre a nova Colônia e a África (grifo meu).

Nessa narrativa fica evidenciada a presença de alguns elementos da

historiografia clássica brasileira nos manuais didáticos analisados.

Concomitante a isto, após a análise das 32 coleções do PNLD/2010, optei

por um recorte. Identificar os manuais adotados nas escolas da Rede Municipal de

Ensino de Curitiba, na medida em que sou professora de História desta rede de

ensino e atuo na Secretaria Municipal da Educação com a formação continuada dos

professores destas escolas. Após levantamento, obtive os seguintes resultados: das

168 escolas que escolheram manuais didáticos do PNLD/2010, das 32 coleções, 19

foram escolhidas. Sendo que a mais escolhida, por 30 escolas, foi A Coleção

PROJETO BURITI: HISTÓRIA (COSTA JUNIOR, 2007).

A partir deste levantamento definiu-se a escola23 para realizar a investigação,

ou seja, uma das escolas que recebeu o livro mais adotado nas escolas municipais.

Constituindo-se, portanto, o campo de pesquisa desta fase do estudo.

Após permissão oficial da Secretaria Municipal da Educação realizou-se o

contato com a referida escola e, em seguida, conversa com as professoras para

22 1.a edição – 1932.

23 Como indicado nos procedimentos da pesquisa qualitativa o nome da escola não será identificado, bem como, os nomes das professoras e alunos são fictícios.

Page 42: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

41

explicar o motivo e procedimentos da minha investigação. Das 07 (sete) professoras

entrevistadas, 02 (duas) são de 4.o ano; 03 (três) são de 4.a série24; 02 (duas)

são corregentes25.

Quanto à formação acadêmica, todas as professoras possuem formação

superior. Sendo que 02 (duas) em mais de um curso. Concentram-se 03 (três) em

Pedagogia, 02 (duas) em Educação Artística; 01 (uma) em Ciências e Matemática;

01 (uma) em Sociologia; 01 (uma) Normal Superior.

Das 07 (sete) professoras, de modo geral, todas tem bastante tempo de

experiência profissional, próximo de 20 anos. Somente uma professora possui pouco

tempo de serviço, 07 (sete) anos.

Além destas informações, foi solicitado às professoras que preenchessem um

questionário. O objetivo foi para saber se, na opinião delas, o livro adotado e recebido

pela escola é um "Bom Livro de História". Para isto, utilizei os critérios apontados por

Rüsen (1997) em relação às condições para um bom Livro de História e categorizadas

por Medeiros (2005): Utilidade para o ensino prático; Utilidade para a percepção

histórica; Utilidade para a interpretação histórica e Utilidade para a orientação histórica.

De modo geral, as professoras consideram que este manual didático deveria:

"aprofundar mais os conteúdos", "ter um maior detalhamento dos textos", "apresenta

poucas sugestões de leituras", "apresenta poucos documentos históricos", entre

outras questões.

Quando perguntado Se já haviam trabalhado com este livro? Todas afirmaram

que sim e indicaram os conteúdos que já haviam trabalhado no ano. Constatei que o

conteúdo mais abordado foi a questão dos Indígenas, sendo que 04 (quatro)

professoras já haviam trabalhado este conteúdo. Os demais conteúdos trabalhados

foram: A questão das grandes navegações trabalhada por 02 (duas) professoras;

A chegada ao Brasil por 01 (uma); Os povos que vieram da África por 01 (uma);

A expansão da Colônia por 01 (uma) professora.

24 Usa-se a nomenclatura adotada na escola, série e ano, na medida em que a Secretaria Municipal da Educação de Curitiba iniciou, em 2007, a implementação gradativa dos 9 (nove) anos de escolarização no ensino fundamental.

25 Corregente – professora que atua como auxiliar na sala de aula, especialmente, no acompanhamento de alunos que apresentem dificuldades de aprendizagem.

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42

Algumas considerações podem ser apontadas, entre elas, a de que o conceito

substantivo escravidão está indicado de forma explícita nos manuais didáticos do

PNLD/2010, mais especificamente, nos volumes para o 4.o e 5.o anos de escolarização.

De modo geral, as narrativas dos manuais didáticos sugerem uma forte

presença da perspectiva clássica da historiografia brasileira tendo como referência

autores como Oliveira Viana, Nina Rodrigues e Gilberto Freyre.

Em relação ao manual didático recebido na escola municipal pesquisada,

PROJETO BURITI: HISTÓRIA, constatei que este é usado na sala de aula. No entanto,

constatei que este não é o único manual usado em aulas de história. Segundo as

professoras, elas utilizam, também, o que trata da História do Paraná, de autoria de

Graziella Rollemberg, recebido do PNLD/2010, pois no entender delas "este é mais

acessível para os alunos".

Nesse sentido, pode-se dizer que o manual didático de história tem sido usado

pelas professoras constituindo-se no texto visível do código disciplinar da história

escolar de acordo com Cuesta Fernandes (1997), pois, segundo este autor, este

material tem sido considerado como uma importante fonte de divulgação científica e,

portanto, uma das formas adequadas para se ensinar e aprender História.

A partir das considerações obtidas no estudo exploratório busquei dar

continuidade à investigação no Pós-Doutorado, mais especificamente, junto ao Núcleo

de Pesquisas em Publicações Didáticas (NPPD), na medida em que os investigadores

do referido núcleo têm desenvolvido ações de extensão e pesquisa relacionadas ao

uso do manual didático, foco de minha investigação.

3.2 COLEÇÃO VONTADE DE SABER HISTÓRIA E O CONCEITO SUBSTANTIVO

ESCRAVIDÃO AFRICANA NO BRASIL: ESTUDO PRINCIPAL

No estudo principal trato da análise de uma das duas coleções mais adotadas

pelas escolas de 6.o ao 9.o ano da RME: Coleção Vontade de saber história. Essa

coleção foi escolhida por quatro (04) escolas e os critérios para definir qual a coleção

seria analisada está atrelada à escolha da escola e professora que foi foco de

observação das aulas de história. Foram os seguintes critérios:

Page 44: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

43

- Escola que recebeu um dos livros mais escolhidos na RME;

- Professora que participou do processo de escolha do PNLD/2011;

- rofessora que respondeu ao questionário por mim enviado.

Segundo o Guia de livros didáticos PNLD 2011 (BRASIL, 2010), a coleção

Vontade de Saber História está estruturada a partir da cronologia da História Ocidental,

aborda os conteúdos da História Geral e do Brasil. Nos quatro volumes apresenta um

capítulo inicial com os fundamentos centrais para o estudo da História, discussões

sobre o Tempo, sentido do trabalho histórico, fontes históricas, bem como alguns

conceitos centrais para a compreensão da História. Elemento que distingue a obra

se comparada às demais coleções didáticas.

Além disso, valoriza a relação passado/presente, estimula o trabalho para a

compreensão das diferentes temporalidades históricas, dos processos apreendidos

na curta, média e longa durações, bem como da simultaneidade de acontecimentos e

temporalidades vivenciadas por diferentes sociedades no mesmo tempo cronológico.

Enuncia e procura colocar em prática a ideia da História como interpretação, enfatizando

a possibilidade de diferentes pontos de vista sobre os mesmos acontecimentos

(BRASIL, 2010, p.104).

Todos os volumes possuem 12 capítulos. Os capítulos são subdivididos em

seções e essas variam de acordo com os conteúdos:

ANO CONTEÚDOS

6.o

Origem dos Seres Humanos e o povoamento da América; Antiguidade Oriental, com o tratamento de Egípcios, Povos da Mesopotâmia, Fenícios, Hebreus, Persas, Chineses e Povos Africanos na Antiguidade; Gregos, Romanos e Cultura Clássica.

7.o

Declínio do Império Romano, Expansão do Islã, Época Medieval a Partir do Império Carolíngio, Povos Americanos Antes da Chegada dos Europeus, Reinos Africanos no Período Medieval, Europa Moderna a Partir do Renascimento, Grandes Navegações, Reformas Religiosas e Absolutismo, Colonização Espanhola e Portuguesa na América e Expansão das Fronteiras da Colônia Portuguesa na América

8.o

Antigo Regime, Iluminismo Revolução Americana, Revolução Francesa e Império Napoleônico, Revolução Industrial, Independências na América e no Brasil, Estado Nacional Brasileiro, Segundo Reinado, Transição da Monarquia à República no Brasil e África no Século XIX.

9. Segunda Revolução Industrial e Imperialismo, República no Brasil, Primeira Guerra Mundial e Revolução Russa, Mundo Pós-Guerra, Fim da República Velha e Era Vargas, Segunda Guerra Mundial, Guerra Fria, Independências na África, Pós-Guerra no Brasil, Ditadura Militar e Mundo Contemporâneo.

QUADRO 8 - COLEÇÃO VONTADE DE SABER HISTÓRIA: CONTEÚDOS POR ANO FONTE: Guia PNLD (2011)

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44

A coleção está estruturada na perspectiva da periodização européia, segundo

Jean Chesneaux (1995), uma história que toma como modelo uma cronologia

esquemática e linear, baseada na divisão quadripartite da história: antiga, medieval,

moderna e contemporânea.

Os capítulos apresentam uma estrutura regular: Observe, leia e descreva;

Conversando sobre o assunto; Enquanto isso...; O sujeito na História; Entendendo a

linha do Tempo.

As atividades, de modo geral, são divididas em: Exercícios de compreensão;

Expandindo o conteúdo; Passado e presente; Discutindo a História.

Ao final do capítulo, as seções Refletindo sobre o capítulo e Ampliando seus

conhecimentos apresentam uma síntese do conteúdo e sugestões de leituras

complementares.

3.3 O CONCEITO SUBSTANTIVO: A ESCRAVIDÃO AFRICANA NO BRASIL

O conceito substantivo A escravidão africana no Brasil aparece, mais

especificamente, no 7.o ano, no capítulo 11, sob o título A Colonização portuguesa

da América, recebendo o título de A mão de obra africana (PELLEGRINI et al., 2009,

p.170-180, 182-18326).

A narrativa está composta por narrativas do autor27, pinturas, ilustrações,

fotografias, texto historiográfico, mapa e glossário. A narrativa do autor está assim

organizada:

26 Realizei a análise da narrativa selecionada e trabalhada pela professora durante a mediação didática.

27 A coleção é da autoria de três autores, mas para a fluidez da escrita e leitura do texto optei por usar no singular: o autor.

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TÍTULO DA NARRATIVA

SUBTÍTULO PINTURA

ILUSTRAÇÃOFOTOGRAFIA

BOX TEXTO HISTO-

RIOGRÁFICOMAPA GLOSSÁRIO

A mão de obra africana

A longa trajetória

Na África

A opção pela escravização de africanos (texto)

Nos navios

Pintura: Africanos cativos sendo levados para o navio

Nos mercados Pintura: Mercado de escravos

O engenho de açúcar

O trabalho no engenho

Ilustração: Engenho

Ama de leite

A produção do açúcar

Fazendo um engenho funcionar

Ilustração: Etapas da produção do açúcar

A resistência africana

Os quilombos Ilustração: Quilombo

Os quilombos Quilombo dos Palmares

Os quilombolas Fotografia Zumbi

A cultura afro-brasileira (texto e fotografia)

Metalurgia

QUADRO 9 - NARRATIVA: A MÃO DE OBRA AFRICANA FONTE: A autora

O autor inicia a narrativa explicando a origem da mão de obra africana:

Desde que eram presos na África, até chegarem ao Brasil, os africanos escravizados

percorriam uma longa trajetória, repleta de sofrimentos e incertezas (p.177).

Em seguida, trata do motivo que levou os portugueses a adotar a escravização

dos negros:

A longa trajetória Com o aumento da produção de açúcar no Brasil, tornou-se necessário o trabalho de um número cada vez maior de pessoas. Inicialmente, os portugueses escravizaram os indígenas que aqui viviam. Depois, passaram a comprar pessoas na África e trazê-las para trabalhar como escravos no Brasil (p.177).

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Segue a narrativa sob o título Na África, enfatizando como os africanos eram

capturados, como era a compra e o transporte dos negros escravizados:

Na África Os africanos eram capturados em suas aldeias e levados para as feitorias próximas aos portos de embarque. A compra e o transporte de africanos para o Brasil eram realizados por traficantes portugueses, que negociavam com os chefes de algumas aldeias africanas, oferecendo produtos como tecidos, armas e tabaco em troca de escravos. Nas feitorias, os escravos ficavam presos em um recinto com paredes altas e geralmente sem cobertura, onde ficavam expostos ao sol e à chuva. Essa situação podia durar várias semanas (p.177).

Em seguida, apresenta, em um Box, a questão da opção pela escravização

de africanos

Foram vários os motivos que levaram os portugueses a optar pela escravização de africanos em vez de escravizarem os indígenas americanos. Primeiramente, os nativos da América não tinham resistência imunológica a muitas das doenças trazidas pelos europeus, e, por isso, a mortalidade era alta entre os indígenas escravizados. Outro motivo é que eles fugiam com mais facilidade do cativeiro, pois conheciam muito bem o território brasileiro. Além disso, a escravização de indígenas não dava lucros à Coroa portuguesa e era condenada pela Igreja Católica. Por outro lado, a escravização de africanos apresentava várias vantagens: eles eram mais resistentes às doenças europeias e não conheciam o território brasileiro, tendo mais dificuldades para fugir e sobreviver nas matas. Por fim, o tráfico de escravos da África para o Brasil, no decorrer do tempo, tornou-se uma atividade muito lucrativa, tanto para os traficantes de escravos quanto para a Coroa portuguesa (p.177).

Compondo a narrativa trata da viagem sob o título "Nos navios" ladeada pela

pintura Africanos cativos sendo levados para o navio (pintura sem autoria, datada

1850, acervo da Universidade da Virgínia, Charlottesville) contendo a seguinte

legenda: "Escravos sendo levados da feitoria para o navio". Narrativa:

Nos navios A etapa seguinte era a viagem de navio até o Brasil. Para aumentar os lucros, os traficantes levavam um número excessivo de escravos nos navios. Além disso, na maioria dos casos, a água e os alimentos eram insuficientes. Nessa viagens, que podiam durar meses, as condições eram terríveis e causavam a morte de muitas pessoas (p.177).

Em seguida, a narrativa "Nos mercados" está acompanhada da pintura

Mercado de escravos (pintura de Johann Moritz Rugendas, século XIX). Narrativa:

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Nos mercados Ao chegar ao Brasil, geralmente os africanos eram levados para um mercado de escravos. Nesses mercados, eles costumavam receber uma alimentação melhor e alguns cuidados de saúde com o objetivo de melhorar sua aparência e aumentar o seu preço de venda. Os escravos, então, ficavam expostos à venda e eram examinados minuciosamente pelos compradores, que procuravam identificar os mais fortes e sadios. Depois de vendidos, alguns escravos eram levados para trabalhar nas vilas e cidades. A maioria, porém, era levada à área rural para trabalhar na produção de açúcar (p.177).

As imagens estão relacionadas à narrativa do autor e, não estão apenas

como meras ilustrações, mas necessitam da interpretação do professor para cumprir

a sua função didática.

Portanto, essas imagens atendem a perspectiva de Rüsen (2010, p.119),

pois segundo o autor as imagens possuem uma função muito importante no livro

didático e devem

constituir a fonte de uma experiência histórica genuína: devem admitir e estimular interpretações, possibilitar comparações, mas sobretudo fazer compreender aos alunos e alunas a singularidade da estranheza e do diferente do passado em comparação com a experiência do presente, e apresentar o desafio de uma compreensão interpretativa (p.120).

O subtítulo O engenho de açúcar: o trabalho no engenho (p.178-179) está

organizado a partir da ilustração de um engenho diagramada em duas páginas, que

segundo o autor, "é uma representação artística feita com base em estudos históricos."

Inicia a narrativa explicando o que era o engenho de açúcar "O açúcar era

produzido em uma grande propriedade rural, chamada de engenho de açúcar.

Em seguida, explica como era o trabalho no engenho

O trabalho no engenho O engenho era uma grande propriedade rural, onde eram realizadas todas as etapas da produção de açúcar, desde a plantação da cana-de-açúcar até a embalagem do produto. Apesar de haver alguns trabalhadores livres, o trabalho nos engenhos era baseado na mão de obra escrava. Além das atividades relacionadas à produção açucareira, os trabalhadores de um engenho plantavam vários alimentos, cuidavam dos rebanhos de animais, faziam os trabalhos domésticos e produziam suas próprias roupas.

Pequenos textos compõem a ilustração identificando os diferentes elementos

do engenho de açúcar, tais como: canaviais, senzala, casa-grande, matas, capela, casa

de engenho, o rio, pequenas lavouras, entre outras questões.

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Os elementos presentes na ilustração, segundo o autor, tomaram como base

estudos históricos, pode-se dizer, aos moldes da historiografia clássica, pois, no dizer

de Gilberto Freyre (1988, p.36):

A casa-grande, completada pela senzala, representa todo um sistema econômico, social, político: de produção (a monocultura latifundiária); de trabalho (a escravidão); de transporte (o carro de boi, o cavalo); de religião (o catolicismo de família, com capelão subordinado ao pater familias, culto dos mortos etc); de higiene do corpo e da casa (o banho de rio, o banho de gamela, o banho de assento, o lava-pés); de política (o compadrismo).

O subtítulo A produção do açúcar: fazendo um engenho funcionar (p.180) foi

organizado a partir de uma ilustração. Segundo o autor, as ilustrações representam

as principais etapas de produção do açúcar em um engenho. A ilustração está

organizada em seis (06) quadros contendo legendas explicativas.

Inicia explicando que para a produção do açúcar era necessário o trabalho

de muitas pessoas: Para transformar a cana em açúcar, era necessário o trabalho

de muitas pessoas.

Em seguida, apresenta os quadros sob o subtítulo: Fazendo um engenho

funcionar com as seguintes legendas:

Os trabalhadores cortavam e recolhiam a cana e, em seguida, a transportavam até a casa de engenho. Assim que chegavam com a cana na casa de engenho, os trabalhadores a moíam para extrair seu caldo. Os trabalhadores cozinhavam o caldo de cana para engrossá-lo, transformando-o em melaço. Depois, o melaço era coado e despejado em fôrmas de barro, para solidificar e branquear. Depois que o açúcar solidificava e branqueava, era retirado da fôrma, batido e colocado ao sol para secar. Assim que secava, o açúcar era encaixotado e levado ao porto para ser transportado para a Europa

O subtítulo A resistência africana está subdividido em Os quilombos; Os

quilombolas; A cultura afro-brasileira (p.182-183). O item Os quilombos está composto

por narrativa do autor; ilustração de um quilombo; mapa do quilombo dos Palmares;

texto historiográfico.

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Inicia explicando que uma das formas de resistência era a formação

dos quilombos

Os quilombos Uma das formas de resistência africana contra a escravidão era a preservação dos costumes de sua terra natal, como danças, cantos e crenças. Outras ações, como a destruição de ferramentas, a queimada das plantações ou a agressão aos senhores, também eram realizadas pelos escravos africanos. As formas mais importantes de resistência, no entanto, eram a fuga e a formação de quilombos. Durante todo o período de escravidão, houve a formação de quilombos em todas as regiões do Brasil.

Em seguida, apresenta o fragmento de um texto historiográfico:

[Os] quilombos [eram] povoações constituídas fundamentalmente de escravos foragidos, mas que acolhiam também homens livres e marginalizados pela sociedade. A história mais conhecida a esse respeito é a do quilombo de Palmares, [...] onde, no final do século XVI, começou a se formar uma rede de povoados que, ao longo do tempo, atingiu uma população calculada em torno de 20 mil pessoas. Era, na verdade, um conjunto de [povoados], cada qual com seu próprio chefe, organizado numa confederação, sob o comando de um rei eleito, nos moldes africanos. [...]28

No caso desse manual, o texto historiográfico está destacado em uma caixa

de texto diferenciada pela cor, está referenciado, mas não existe um ícone que o

identifique como tal, portanto, exige a explicação da professora.

Segundo Rüsen (2010) os textos historiográficos, têm que ser claramente

diferenciados da própria documentação. Pois,

Devido à circunstância de que os textos devem transmitir experiências e apresentar o passado em sua singularidade e sua diferença temporal com o presente (e que no mais, com eles se devem praticar os processos metodológicos da forma de pensar historicamente) de nenhuma maneira devem servir exclusivamente para ilustrar a apresentação (RÜSEN, 2010, p.120-121).

Pode-se dizer que o texto historiográfico não está como mera ilustração,

mas necessita da explicação do professor para que o aluno possa perceber a

28 BERTONI, Mauro; MALERBA, Jurandir. Nossa gente brasileira: textos e atividades para o ensino fundamental. Campinas: Papirus, 2001. p.54.

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singularidade da experiência do passado – os quilombos e a sua diferença temporal

com o presente – as comunidades quilombolas.

Além disso, compondo a narrativa dos quilombos o autor apresenta o mapa

O Quilombo dos Palmares29 com a legenda dos povoados que compõem o referido

quilombo.

No entender de Rüsen (2010, p.120) os mapas são parecidos com as imagens,

mas ao mesmo tempo mais abstratos e limitados, pois "ilustram a dimensão espacial

dos processos históricos, e isso cria o difícil problema de como a apresentação

estática de um mapa pode fazer chegar aos sentidos dos alunos a extensão e a

mudança no tempo".

O subtítulo Os quilombolas o autor inicia a narrativa explicando quem eram

as pessoas que viviam nos quilombos, como era o seu cotidiano e, finalmente, como

ocorreu a destruição do quilombo. Narrativa:

Os quilombolas Os quilombolas, como eram chamados os moradores dos quilombos, viviam em liberdade. Para se alimentar, eles criavam porcos e galinhas, caçavam, pescavam e cultivavam lavouras de mandioca, milho, cana-de-açúcar, batata-doce e feijão. Como produziam além de suas necessidades, eles negociavam o excedente nos povoados vizinhos, obtendo em troca produtos como sal, tecidos, armas e pólvora. O trabalho era dividido entre os quilombolas: enquanto alguns trabalhavam na agricultura ou na criação de animais, outros se dedicavam ao artesanato, à fabricação de farinha ou à metalurgia. Havia também aqueles que se dedicavam à proteção do quilombo, devido à constante ameaça de ataques. O quilombo dos Palmares resistiu a diversas expedições militares enviadas pelo governo para destruí-lo. Somente no ano de 1694, após quase cem anos de resistência, o quilombo foi destruído.

Compondo a narrativa o autor apresenta a pintura "Zumbi" dos Palmares

(Antônio Parreiras, Zumbi, 1927) acompanhada da seguinte legenda: "Zumbi, o principal

líder do quilombo dos Palmares, tornou-se símbolo da luta dos afro-brasileiros contra

a opressão e a discriminação. Essa pintura feita pelo artista brasileiro Antônio

Parreiras (1860-1939), representa Zumbi".

A pintura complementa a narrativa do autor e possibilita interpretação da

experiência do passado – Zumbi como o principal líder do quilombo dos Palmares e

29 Adaptado de "Glória e Morte dos Palmares. Nova Escola, São Paulo, v.10, n.86, ago. 1995.

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a experiência do presente – Zumbi como o símbolo da luta dos afro-brasileiros

contra a opressão e a discriminação.

A questão da cultura afro-brasileira está destacada em um Box

acompanhada de uma fotografia30 representando capoeiristas em uma apresentação

A cultura afro-brasileira A cultura afro-brasileira é o resultado da mistura de elementos culturais africanos na formação da cultura brasileira. Em nosso país, o elemento africano se manifesta, por exemplo, na religião, na culinária, na música e na dança, bem como nas palavras e expressões africanas incorporadas ao português falado no Brasil.

Finaliza a narrativa fazendo referência ao Dia da Consciência Negra,

explicita que esse dia e uma forma de protestar contra a discriminação e a luta pela

igualdade de direitos em nosso país.

Atualmente, no dia 20 de novembro, é comemorado o Dia da Consciência Negra. Nesse dia, muitos brasileiros vão às ruas para protestar contra a discriminação e lutar pela igualdade de direitos em nosso país. Essa fotografia, tirada em 200531, retrata uma apresentação de capoeira, importante manifestação da cultura afro-brasileira, durante as comemorações do Dia da Consciência Negra, em Salvador, na Bahia.

Em seguida, o autor apresenta as Atividades, de modo geral de perguntas e,

alguns textos com perguntas para direcionar a interpretação dos mesmos.

Como parte do item Atividades faço o destaque para uma fonte histórica – o

relato de um africano, na medida em que foi trabalhado pela professora. Esse relato

pode ser considerado como fonte histórica, no entanto, aparece como "texto

para leitura" e, segundo o manual do professor aparece indicado como "trecho de

texto" (p.14).

30 Fotografia de capoeiristas. Autoria de Sérgio Pedreira/Folha Imagem. (2005).

31 Referenciada anteriormente.

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O relato do africano chamado Mahommah G. Baquaqua (BAQUAQUA32 apud

PELLEGRINI et al., 2009, p.186), escrito no início do século XIX, trata da forma como

ele foi capturado em sua aldeia e transportado como escravo para o Brasil.

Fragmento da narrativa:

[...] Levaram-me à casa de um homem branco, onde [permaneci] até a manhã seguinte [...]. Depois [...], levaram-me ao rio e colocaram-me num barco [...] Estávamos há duas noites e um dia nesse rio, quando chegamos a um lugar muito bonito, cujo nome não me lembro. Não ficamos ali por muito tempo, tão logo os escravos foram reunidos e o navio estava pronto para velejar [...] (p.186).

Segundo Rüsen (2010) a apresentação de documentos nos livros didáticos e

o estímulo à interpretação dos mesmos podem prevalecer sobre os textos do autor,

de modo que os alunos, com a ajuda do professor, podem elaborar sua própria

exposição com o material disponível.

De acordo com Peter Lee (2003, p.25), o uso de fontes históricas em aulas

de história pode ajudar os alunos a compreender que a história pode ser explicada

pela ideia de "testemunho e de objetos", pois estes fornecem "pedaços do passado"

No entanto, para o autor, essa explicação tem limitações. Ele argumenta:

Só quando as crianças compreendem os vestígios do passado como evidência no seu mais profundo sentido – ou seja, como algo que deve ser tratado não como mera informação, mas como algo de onde se possam retirar respostas a questões que nunca se pensou colocar – é que a história se alicerça razoavelmente nas mentes dos alunos enquanto atividade com algumas hipóteses de sucesso (LEE, 2003, p.25).

No caso desse manual didático, o relato do africano não está apresentado

como uma fonte histórica, cabendo ao professor a explicação de que esse relato é

um vestígio do passado e que pode ser usado como evidência histórica.

Após a análise da estrutura da narrativa do manual didático fiz a

categorização do conceito substantivo escravidão africana no Brasil. Obtive as

seguintes categorias:

32 BAQUAQUA, Mahommah G. Biografia de Mahommah G. Baquaqua. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.8, n.16, p.270-272, mar. 1988.

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CATEGORIAS NARRATIVAS

Trabalho

A mão de obra africana A opção pela escravização O engenho de açúcar: O trabalho no engenho A produção do açúcar: Fazendo um engenho funcionar

Sofrimento Na África – capturados; transportados; compra; Nos navios – condições precárias; Nos mercados – expostos à venda.

Luta e resistência A resistência africana: Os quilombos; Os quilombolas.

Cultura A cultura afro-brasileira.

QUADRO 10 - CONCEITO SUBSTANTIVO ESCRAVIDÃO AFRICANA NO BRASIL: CATEGORIZAÇÃO FONTE: A autora

Na categoria trabalho, as ideias mais recorrentes estão ligadas a narrativas

como "A mão de obra africana"; "A opção pela escravização"; "O trabalho no engenho";

"A produção do açúcar" e "Fazendo um engenho funcionar". Exemplo de narrativa:

O trabalho no engenho O engenho era uma grande propriedade rural, onde eram realizadas todas as etapas da produção de açúcar, desde a plantação da cana-de-açúcar até a embalagem do produto. Apesar de haver alguns trabalhadores livres, o trabalho nos engenhos era baseado na mão de obra escrava. Além das atividades relacionadas à produção açucareira, os trabalhadores de um engenho plantavam vários alimentos, cuidavam dos rebanhos de animais, faziam os trabalhos domésticos e produziam suas próprias roupas (p.178).

A ideia de sofrimento está expressa nas narrativas que tratam das condições

de vida no continente africano, mais especificamente, a forma como eram capturados,

transportados e comprados. As condições precárias que enfrentavam nas viagens

nos navios. Assim como, as condições em que eram expostos quando estavam à

venda nos mercados no Brasil. Exemplo de narrativa:

Nas feitorias, os escravos ficavam presos em um recinto com paredes altas e geralmente sem cobertura, onde ficavam expostos ao sol e à chuva. Essa situação podia durar várias semanas (p.177).

As ideias de luta e de resistência estão contempladas no fragmento da

narrativa que trata, mais especificamente, da vida dos negros nos quilombos. Excerto

da narrativa:

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As formas mais importantes de resistência, no entanto, eram a fuga e a formação de quilombos. Durante todo o período de escravidão, houve a formação de quilombos em todas as regiões do Brasil (p.182).

A categoria cultura está expressa no segmento da narrativa:

A cultura afro-brasileira é o resultado da mistura de elementos culturais africanos na formação da cultura brasileira. Em nosso país, o elemento africano se manifesta, por exemplo, na religião, na culinária, na música e na dança, bem como nas palavras e expressões africanas incorporadas ao português falado no Brasil (p.183).

A obra apresenta uma narrativa que se aproxima das narrativas tradicionais,

pois, de modo geral, a periodização empregada, seguindo a análise de Nadai (1992/93,

p.151), apresenta um encadeamento de ações que são explicadas sucessivamente,

ou seja, uma concepção da história política tradicional, no dizer de Janotti (2001,

p.48), uma história que centra seu estudo "nos eventos circunstanciais e das

situações conjunturais efêmeras" em que os acontecimentos eram organizados de

forma contínua e sem contradições.

Elaborada em tópicos, de forma fragmentada e minimizada, seguindo a lógica

apontada por Rüsen (2012, p.170): "trata-se de um saber muito simplificado para fins

escolares e selecionado a partir do capital da respectiva ciência".

Numa concepção da historiografia brasileira recente e distanciando-se da

narrativa do manual didático, o historiador Luiz Felipe Alencastro, em sua obra

O trato dos viventes: formação do Brasil no Atlântico Sul (2000), aponta a importância

de entendermos as relações entre África, a Coroa Portuguesa e o Brasil, pois sem

percebermos essas relações não conseguiremos compreender como ocorreu a

formação econômica do Brasil. Nas palavras do autor: "Desde o final do século XVI,

surge um espaço aterritorial, um arquipélago lusófono composto por enclaves da América

portuguesa e das feitorias de Angola. É daí que surge o Brasil no século XVIII"

(2000, p.09).

O autor explica como essas duas partes unidas pelo oceano se completam

num só sistema de exploração colonial.

Além dessa perspectiva, encontram-se os estudos de João Luís Fragoso em

sua obra Homens de grossa aventura (1998), quando o autor busca mostrar um

modelo explicativo econômico que destoa da historiografia tradicional. Tomando

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como referência o sistema agrário escravista-exportador, procura apresentar as

formas de acumulação presentes na "economia colonial" do Sudeste, no século XIX.

Procura explicitar que a economia colonial, em seu processo de produção, tinha

certa autonomia frente à Metrópole; fenômeno que ajuda a repensar a dependência

econômica da Colônia em relação à Metrópole.

Na perspectiva da educação histórica o ensino e aprendizagem ocorre

quando apresentamos aos alunos diferentes perspectivas da história, pois como

aponta Barca:

A História dá respostas provisórias porque pode haver pontos de vista diferentes, utilizando as mesmas fontes, e porque vamos descobrindo novas relações com o passado, novas perspectivas. Esta é uma característica fascinante da produção histórica, que devemos passar aos alunos sem cair no relativismo de considerar que todas as respostas sobre o passado têm a mesma validade (BARCA, 2001, p.39).

Nesse sentido, pode-se dizer que esse manual didático não possibilita um

trabalho nessa perspectiva, cabe ao professor na sua mediação didática buscar

outras fontes históricas, outras concepções historiográficas para compor sua aula,

pois de acordo com Peter Lee:

A tarefa dos professores de História é ajudar os alunos a compreender que a História não é dada quer, misteriosamente, por manuais ou testemunhas neutrais, mas que é provisória. Mas a tarefa não pode parar aí: os estudantes precisam de uma ferramenta intelectual que lhes permita distinguir entre diferentes tipos de interpretações históricas. Os estudantes podem então reconhecer que explicações e narrativas requerem justificações mais complexas do que afimações factuais isoladas. Eles podem então começar a ver que muitas das bases factuais da História são, na realidade, muito seguras, e que, se as explicações e as narrativas são provisórias e contestáveis, isto não as reduz automaticamente ao estatuto de serem apenas questões de opinião pessoal (LEE, 2005, p.1).

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4 MANUAL DIDÁTICO: USO E APROPRIAÇÕES EM AULAS DE HISTÓRIA

No presente capítulo, busco analisar a relação do aluno com o manual didático

de história tendo como referência os pressupostos apontados por Rüsen (2010,

116), quando aponta que o livro didático em toda a sua estrutura deve levar em

conta as condições de aprendizagem dos alunos.

Em seguida, analiso a relação da professora e do aluno com o manual didático,

mais especificamente, a mediação didática adotada pela professora. Para identificar as

evidências sobre o uso e apropriações das narrativas do manual didático acompanhei

algumas aulas que tratassem do conceito substantivo escravidão africana no Brasil.

4.1 A RELAÇÃO DO ALUNO COM O MANUAL DIDÁTICO

Para Rüsen (2010, p.116) o livro didático tem que levar em conta as condições

de aprendizagem dos alunos e alunas, deve estar de acordo com a capacidade de

compreensão e, isso vale acima de tudo ao nível de linguagem utilizado. Segundo

o autor

Ao se dirigir aos alunos, não se deveria esquecer que a experiência histórica tem um potencial próprio de encantamento que se pode aproveitar como oportunidade de aprendizagem. O espanto e a diferença do passado podem ser apresentados de uma maneira que se acredita ser interessante e curiosa. Precisamente as crianças e jovens – sobretudo nos primeiros anos de ensino histórico – são fáceis de fascinar mediante as experiências do diferente na história (2010, p.117).

Tendo como referência os critérios apontados por Rüsen da relação do

aluno com o livro didático organizei um questionário que consistiu em questões

pessoais e questões específicas sobre o manual didático de história. Dos 35 alunos

matriculados 34 estavam presentes e todos responderam ao questionário.

A primeira questão refere-se a dados familiares, mais especificamente, foi

perguntado com quem o aluno mora para obter informações sobre a composição

familiar dos mesmos. Obteve-se os seguintes resultados, 11 alunos moram com pai

e mãe; 08 com pai, mãe e irmão ou irmã; 04 moram com só com a mãe. Sendo que

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11 alunos indicaram outros integrantes familiares como avós, tio/a, primo/a, padrasto,

madrasta e madrinha como componentes de suas famílias.

A outra questão diz respeito às atividades de lazer. Para tanto, propôs-se a

seguinte questão: Quando você não está estudando o que você costuma fazer?

Foi indicado aos alunos que poderiam escolher quantas atividades realizassem, sem

limite de escolhas.

A atividade de lazer que os alunos mais apreciam é assistir televisão, com

27 escolhas, seguida de utilizar a internet que foi escolhida por 21 alunos, escutar

música por 20 alunos, praticar esporte por 15, reunir com amigos(as) por 12 alunos,

praticar jogos eletrônicos por 12 alunos, sendo que a escolha de menor incidência,

08 alunos, foi leitura de livros e revistas. No item Outras atividades, 04 alunos

fizeram diferentes indicações, sendo cursos (01), jogo no celular (01), ir na chácara

(01) e fazer capoeira e ir para a aula de desenho (01).

A diversidade de atividades de lazer que os alunos praticam vai de encontro

com o pensamento de Raymond Williams (2003, p.53-58) na medida em que esse

autor afirma que existe uma "estrutura de sentimentos comum" em crianças e jovens.

Na pesquisa em questão, fica explícita a existência desse "sentimento comum" pelas

escolhas expressas pelos alunos.

As demais questões são referentes ao uso do manual didático de História

adotado na escola para tentar identificar a relação do aluno com o mesmo.

Em relação à questão 1 Você lê o livro didático de história durante as aulas?,

obteve-se os seguintes resultados: 19 alunos afirmaram que leem muito o livro

didático durante as aulas, sendo que 15 afirmaram que leem pouco, mas nenhum

aluno disse nunca ler o manual durante as aulas.

Ao serem questionados Por quê? leem muito o livro durante as aulas, os

alunos apresentaram diferentes ideias. Após análise obtive a seguinte categorização,

apresentadas por ordem da maior para menor incidência: sete (07) alunos afirmaram

que leem para fazer atividades; quatro (04) disseram que ajuda no aprendizado; três

(03) para acompanhar a aula, dois (02) para explicar o conteúdo, um (01) para

compreender o conteúdo.

Somente dois (02) alunos fizeram referência à história, como Vagner que

afirmou: "Para ter mais facilidade de estudo pras provas e para saber mais sobre

história" e Mario que disse: "Porque é interessante interagir na aula e é legal aprender

mais sobre história".

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58

A questão 2 Você lê o livro didático de história fora da escola? Obteve-se a

seguinte categorização: a maioria dos alunos (25) afirmaram que leem pouco o livro

didático de história fora da escola, 03 afirmaram que leem muito e 06 disseram que

nunca leem.

As três alunas, que afirmaram que leem muito, justificaram suas respostas

nas seguintes perspectivas: revisar a matéria, considera interessante ler o livro e para

obter conhecimento: Leni respondeu: "Porque eu sempre gosto de dar uma revisada

nas matérias". Raquel disse: "Pois acho muito interessante". E Lúcia escreveu: "Para

obter mais conhecimento sobre a matéria".

A questão 3 Quando você lê o livro didático de história, você o lê, a maioria

dos alunos assinalou mais de uma opção, sendo que a maioria dos alunos (28) disse que

lê para estudar para as avaliações, (21) disseram que é para acompanhar as aulas e,

alguns alunos (15) afirmaram que leem porque se interessam por fatos históricos.33

Apesar de não ter sido solicitada justificativa nessa questão, dois alunos

fizeram um comentário após a escolha: Vagner afirmou "Porque queria saber um

pouco mais sobre os séculos XIX e XX". E Leni afirmou "Porque eu não gosto de

ficar sem ler os livros didáticos".

Pode-se dizer que a relação do aluno com o manual didático está mais voltada

para as questões gerais, como acompanhar as aulas, estudar para as avaliações,

poucos alunos fizeram referência aos conceitos históricos.

4.2 MANUAL DIDÁTICO: EVIDÊNCIAS DO USO EM AULAS DE HISTÓRIA

Olhar a aula de história não poderia prescindir dos pressupostos de Dubet e

Martucelli (1997, p.14), quando afirmam que os alunos não se formam somente pela

aprendizagem de papéis propostos pela escola, mas em sua "capacidade para

manejar suas experiências escolares sucessivas". Os alunos se socializam por meio

de diferentes aprendizagens: a cultura escolar, o manejo subjetivo dos conhecimentos

e o conhecimento que eles trazem.

33 Nessa questão ocorreu uma discrepância numérica, na medida em que alguns alunos escolheram mais de uma opção.

Page 60: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

59

Segundo os autores, esse trabalho de educação não se realiza somente em

relação aos aspectos pedagógicos de professores e alunos, mas envolve também uma

multiplicidade de relações e esferas de ação. Os alunos são, ao mesmo tempo, alunos

e crianças, são alunos e adolescentes. Possuem uma vida fora da escola e administram,

à sua maneira, todas estas dimensões de sua experiência. Tornam-se sujeitos nas

diferentes dimensões de sua experiência (DUBET; MARTUCELLI, 1997, p.14).

Para compreender o que a escola fabrica, no dizer de Dubet e Martucelli (1997,

p.15-16), não basta estudar os programas, os métodos de trabalho. É necessário

também captar a maneira como os alunos "constroem sua experiência, 'fabricam'

relações, estratégias, significações por meio das quais se constituem neles mesmos".

No entender dos autores, a experiência mais individual é socialmente construída nas

relações sociais, e esta experiência deve ser captada no grupo que "testemunha

uma condição comum e socialmente situada".

Para definir em que escola poderia acompanhar as aulas e observar o uso

do manual didático adotei os critérios já referenciados anteriormente:

- Escola que recebeu um dos livros mais escolhidos na RME;

- Professora que participou do processo de escolha do PNLD;

- Professora que respondeu ao questionário por mim enviado.

4.2.1 A relação da professora e aluno com o manual didático: a mediação

didática

Inicialmente, fiz o contato com a escola e professora e marcamos uma data

para explicar o objetivo da pesquisa e os procedimentos adotados na investigação.

A entrevista foi realizada em setembro com o objetivo de obter informações sobre o

uso do manual didático adotado na escola.

Quanto ao uso do livro didático adotado na escola, a professora afirmou:

"Tenho usado bastante o livro didático e ele normalmente é referência de material

escrito que a gente usa nas aulas de história no dia a dia" (LEILA34, 2011).

34 Os nomes adotados são fictícios para preservar as identidades.

Page 61: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

60

Quando questionada sobre que conteúdos já havia trabalhado ela comentou

que "Com as turmas de 7.o ano, trabalhei os seguintes conteúdos: Fim do Império

Romano; Idade Média, Idade Moderna e As Grandes Navegações" (LEILA, 2011).

A outra questão foi "se ela considera o livro didático adotado como um bom

livro de história". Ao que ela respondeu:

Quando a gente escolhe um livro didático são várias questões que a gente precisa considerar. Ultimamente, a opção tem sido muito mais pedagógica do que dentro de uma linha historiográfica. O que a gente tem levado em consideração é se esses textos são acessíveis para a criança, se as atividades propostas são possíveis do aluno desenvolver sozinho, a linguagem quanto mais simples a gente tem achado melhor. Porque às vezes o livro didático é muito bom, mas as crianças têm muitas dificuldades em interpretar os textos. Então, [o livro escolhido] é bom... dentro do trabalho que a gente propõe. Lembrando que nenhum livro didático é perfeito (LEILA, 2011).

A professora considera o livro escolhido como um bom livro e salienta que a

escolha realizada pelos professores35 recaiu mais nas questões de compreensão

por parte dos alunos e nem tanto pela linha historiográfica do autor. Segundo a

professora, no livro adotado "as questões são mais simples, eles [os alunos] têm

mais autonomia para fazer as questões".

A perspectiva apontada pela professora em relação à compreensão do texto

por parte dos alunos está presente nos critérios de Rüsen (2010, p.116) na medida

em que o autor afirma que o livro didático ideal, entre outras questões, deve levar

em conta as condições de aprendizagem de alunos e alunas, bem como tem que

estar de acordo com sua capacidade de compreensão.

Entendendo a escola como espaço de escolarização (SCHMIDT; GARCIA,

2006), acompanhei algumas aulas de História, em uma turma de 7.o ano do ensino

fundamental, com alunos entre 11 a 13 anos de idade, para observar de que forma o

conceito substantivo Escravidão está sendo ensinado como um conteúdo escolar

com a intenção de identificar o uso e apropriações que alunos e professora fazem

das narrativas históricas presentes no manual didático adotado por uma escola da

rede municipal de ensino de Curitiba.

35 A escolha do livro didático realizada na escola em 2010 é referente às obras indicadas pela comissão de avaliação do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD).

Page 62: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

61

Para obter evidências sobre o uso do manual didático em aulas de história

combinei com a professora para acompanhar as aulas que tratassem do conceito

substantivo escravidão africana no Brasil. Das 06 aulas36 em que ela trabalhou o

referido conceito, em 05 aulas usou o manual didático, sendo que na última aula foi

para acompanhar a correção das atividades realizadas pelos alunos. Conforme o

quadro a seguir:

AULAS USO DO MANUAL DIDÁTICO NARRATIVA

1.a Não utilizou o manual

Fílmica: Fragmento do filme Amistad(1); Poema: Navio Negreiro de Castro Alves.

2.a Análise dos documentos históricos - pinturas; Leitura da narrativa do autor; Proposta de atividade do manual.

A mão de obra africana (p.177) - A longa trajetória; Na África; A opção pela escravização; Nos navios; Nos mercados

3.a

Análise da ilustração; Leitura da narrativa do autor; Atividade: Descreva um dia de trabalho no engenho de açúcar.

O engenho de açúcar (p.178-179)

4.a Análise da ilustração; Leitura da narrativa do autor

A produção do açúcar (p.180)

5.a

Análise do mapa – Quilombo dos Palmares; Explicação e contextualização da ilustração, pintura e fotografia; Leitura da narrativa do autor; Atividades propostas no manual: Exercícios de compreensão.

A resistência africana Os quilombos Os quilombolas A cultura afro-brasileira. (p.182-183)

6.a Para a correção das atividades realizadas pelos alunos.

QUADRO 11 - USO DO MANUAL DIDÁTICO EM AULAS DE HISTÓRIA FONTE: A autora (1) Referência: SPIELBERG, S. Amistad. Direção de Steven Spielberg. Estados Unidos, 1997, 154 min. color. son.

Na primeira aula a professora não utilizou o manual didático. Iniciou o conteúdo

com a projeção do filme Amistad, tendo como pano de fundo a declamação, por

Paulo Autran, da poesia Navio Negreiro de Castro Alves.

Antes de iniciar a projeção comentou sobre a produção do filme, ano e

diretor, bem como sobre o conteúdo do filme. Explicou que selecionou uma parte do

filme que diz respeito às condições dos negros escravizados durante a viagem em

um navio negreiro. Explicou que durante a projeção seria recitado um poema que

36 O período das observações ocorreu no segundo semestre de 2011: 20 set; 21 set; 27 set; 28 set; 30 set; 03 out.

Page 63: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

62

trata da escravidão. Comenta que Paulo Autran era um ator e que Castro Alves é

considerado um dos poetas mais famosos da literatura brasileira e que fez essa

poesia por defender a ideia da abolição da escravatura.

Após a projeção analisou, juntamente com os alunos, a narrativa do filme

evidenciando alguns pontos relevantes, tais como: porque os portugueses

escravizaram os africanos, formas de resistência, como eram os negros escolhidos

para serem escravizados, entre outras questões.

Como atividade para ser realizada em casa distribuiu aos alunos trechos da

poesia. Cada qual deveria ler e interpretar o significado da letra: O que o autor quis

dizer quando escreveu.

Na segunda aula, utilizou o manual didático. Iniciou a análise dos

documentos históricos, mais especificamente, as pinturas: Africanos cativos sendo

levados para o navio37 e Mercado de escravos de Rugendas38. A primeira obra não

tem a identificação da autoria, mas faz referência à data – 1850 e, a segunda foi

produzida por Johann Rugendas, no século XIX.

A professora destacou as pinturas, comentou que essas pinturas são uma

representação, contextualizou as imagens, fazendo referência à datação – século e

ano em que foram produzidas, assim como a autoria das obras.

Em seguida, os alunos fizeram a leitura da narrativa do autor sob o título

A mão de obra africana contendo os seguintes itens: A longa trajetória; Na África;

A opção pela escravização; Nos navios; Nos mercados (PELLEGRINI et al., 2009,

p.177). No decorrer da leitura a professora fez a explicação do contexto histórico.

Logo após, selecionou o documento histórico que o manual apresenta ao

final do capítulo como "texto", que consiste em um trecho do relato de um africano,

chamado Mahommah G. Baquaqua, que no início do século XIX foi capturado em

sua aldeia e transportado como escravo para o Brasil. Fragmento da narrativa:

37 1850. Universidade da Virgínia, Charlottesville.

38 Pintura de Johann Moritz Rugendas, Século XIX. Coleção particular.

Page 64: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

63

[...] Levaram-me à casa de um homem branco, onde [permaneci] até a manhã seguinte [...]. Depois [...], levaram-me ao rio e colocaram-me num barco [...] Estávamos há duas noites e um dia nesse rio, quando chegamos a um lugar muito bonito, cujo nome não me lembro. Não ficamos ali por muito tempo, tão logo os escravos foram reunidos e o navio estava pronto para velejar [...].39

Após leitura do relato a professora propôs a realização da atividade proposta

no manual, mais especificamente, para o aluno identificar o significado das palavras

desconhecidas e perguntas de interpretação do texto.

O trabalho desenvolvido com a fonte histórica foi de leitura e interpretação

do texto, não houve um trabalho mais específico do documento como fonte histórica,

portanto não ficou evidenciado qual a relação que os alunos conseguiram estabelecer

com o documento, e, se conseguiram entendê-lo, como aponta Lee, "como evidência

no seu mais profundo sentido". Isso requer um estudo e uma pesquisa mais específica.

Na terceira aula iniciou com a análise da ilustração que representa um

engenho de açúcar (p.178-179). Em seguida, foi realizada a leitura da narrativa do

autor e a explicação por parte da professora.

Solicitou aos alunos a realização da seguinte atividade: Descreva um dia de

trabalho no engenho de açúcar.

Na quarta aula, analisou as ilustrações que representam as principais etapas

da produção do açúcar em um engenho (p.180). Após a leitura da narrativa do autor

solicitou aos alunos a produção de narrativa histórica, sob o título Descreva um dia

de trabalho no engenho de açúcar.

A professora iniciou a quinta aula retomando algumas questões já discutidas

em aulas anteriores. Em seguida, faz a análise do mapa – Quilombo dos Palmares;

a análise da ilustração que representa um quilombo; a pintura que representa

Zumbi40 e a fotografia que representa uma apresentação de capoeira.41 Em seguida,

os alunos fizeram a leitura das narrativas sob o título A resistência africana e os

itens: Os quilombos; Os quilombolas e A cultura afro-brasileira (p.182-183).

39 BAQUAQUA, Mahommah G. Biografia de Mahommah G. Baquaqua. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.8, n.16, p.270-272, mar. 1988.

40 Quadro de Antônio Parreiras – Zumbi. 1927. Museu Antônio Parreiras, Niterói. In: PELLEGRINI et al., 2009, p.183.

41 Foto: Sérgio Pedreira/Folha Imagem. In: PELLEGRINI et al., 2009, p.183.

Page 65: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

64

Nesse caso, durante a leitura não foi feita nenhuma referência quanto à

especificidade do referido texto, portanto não ficou evidenciado se os alunos perceberam

essa diferenciação.

Durante a leitura a professora faz análise do mapa – Quilombo dos Palmares.

Em seguida, solicita que observem e faz a explicação e contextualização da ilustração

que representa um quilombo; da pintura que representa Zumbi42 e da fotografia que

representa uma apresentação de capoeira43.

Como atividade a professora solicitou aos alunos a realização de algumas

questões propostas no manual, denominadas Exercícios de compreensão.

Na sexta aula a professora utilizou o manual didático para a correção das

atividades realizadas pelos alunos.

Constatei que o livro didático tem sido usado pela professora constituindo-se

no texto visível do código disciplinar da história escolar de acordo com Cuesta

Fernandez (1997), pois, segundo esse autor, esse material tem sido considerado

como uma importante fonte de divulgação científica e, portanto, uma das formas

para se ensinar e aprender História.

Além disso, observei que a professora usou de forma parcial as narrativas

do manual, na medida em que se apropriou de alguns segmentos para trabalhar

com seus alunos. A professora selecionou o que considerou importante, escolheu

alguns segmentos para trabalhar com os alunos. Essa perspectiva está apontada

por Circe Bittencourt (2001, p.73-74), pois segundo a autora mesmo que o manual

didático se caracterize pelo texto "impositivo e diretivo", cabe ao professor, entre outras

questões, a seleção dos capítulos a serem trabalhados, a metodologia adotada para

a leitura, assim como as tarefas decorrentes da leitura, que são opções do professor.

Essa sistemática esteve presente em sala de aula.

A professora utilizou diferentes fontes históricas, além das presentes no

manual didático, filme, poesia e música. Essa maneira de organizar a sua mediação

didática está pautada na educação histórica, pois como aponta Barca,

42 Quadro de Antônio Parreiras – Zumbi. 1927. Museu Antônio Parreiras, Niterói.

43 Foto: Sérgio Pedreira/Folha Imagem.

Page 66: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

65

Em História, a aprendizagem é orientada para uma leitura contextualizada do passado a partir da evidência fornecida pelas variadíssimas fontes. A História não trata de certezas sobre um passado considerado fixo até que novos factos sejam descobertos; existem construções historiográficas diferentes, por vezes a responder a perguntas muito próximas, mas com enfoques diferentes. Numa sociedade aberta, torna-se cada vez mais óbvia esta característica da História – a de que não se aceita apenas "uma grande narrativa" acerca do passado –, já que os historiadores podem produzir narrativas divergentes, fruto de perspectivas diferenciadas sobre as mesmas fontes ou situações (BARCA, 2006, p.95).

Em relação às características definidas por Rüsen no que distingue um bom

livro didático de história constatei que essas estão parcialmente atendidas no livro

adotado, na medida em que, segundo a professora, esse manual possui questões

"mais simples, eles [os alunos] têm mais autonomia para fazer as questões". Essa

perspectiva está presente nos critérios de Rüsen (2010, p.116), mais especificamente

na questão da relação com o aluno, pois como o autor afirma o livro didático ideal

deve levar em conta as condições de aprendizagem de alunos e alunas, bem como

tem que estar de acordo com sua capacidade de compreensão e, principalmente, no

que se refere à linguagem utilizada.

Outra característica, parcialmente contemplada, refere-se às imagens.

Segundo Rüsen (2010, p.119-120) as imagens têm uma função muito importante e

não devem ter a função de ilustração, mas devem ser fonte de uma experiência

histórica. O livro em questão apresenta algumas imagens, que foram identificadas,

datadas e interpretadas pela professora, portanto auxiliaram na análise do contexto

histórico estudado. Essa intervenção auxiliou a percepção histórica dos alunos.

Quanto ao texto historiográfico analisado pela professora, este está destacado

do texto do autor, no entanto, não existe um ícone que o defina como tal. A explicação

de que é um texto historiográfico foi realizada pela professora. Portanto, a característica

apontada por Rüsen, nessa questão, está parcialmente atendida, na medida em que

o autor aponta que os textos historiográficos, têm que ser claramente diferenciados

da própria documentação. Esses devem transmitir experiências e apresentar o passado

em sua singularidade e sua diferença temporal com o presente. De nenhuma

maneira devem servir exclusivamente para ilustrar a apresentação. Além disso, com

eles se devem praticar os processos metodológicos da forma do pensar historicamente

(RÜSEN, 2010, p.120).

Page 67: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

66

Constatei que a professora, de modo geral, segue a narrativa do manual

didático. No entanto, em vários momentos ela complementa com reflexões que considera

importantes para a compreensão do contexto que está a estudar, especialmente,

quando trata de questões de localização temporal, de preconceito e discriminação

racial, da existência de quilombos no Paraná, sobre a carta de alforria, abolição da

escravatura, da Lei Áurea, entre outras. Algumas dessas questões ficaram expressas

pelos alunos em suas narrativas.

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67

5 NARRATIVAS HISTÓRICAS: UMA MANEIRA DE ENSINAR E APRENDER

HISTÓRIA

No presente capítulo, retomo as reflexões já adotadas no meu estudo de

doutorado, mais especificamente, a tese de que a narrativa histórica é uma maneira

de ensinar e aprender história. Para tanto, me apropriei de estudos de teóricos

contemporâneos44 que têm se voltado para as questões de como o aluno aprende

história, e, entre esses, os estudos de Rüsen (1992, 1993, 2001). Segundo esse autor

(1993, p.85), a aprendizagem histórica é "a consciência humana se relacionando com o

tempo, experimentando o tempo para ele ter algum significado, adquirindo a competência

de dar sentido (significado) ao tempo e desenvolvendo esta competência".

Em seguida, trato da fase da pesquisa que refere-se à apropriação, pelos alunos,

do conceito substantivo escravidão africana no Brasil em contexto de escolarização

expressas em narrativas históricas, tanto no percurso do estudo exploratório como

do estudo principal.

5.1 NARRATIVA HISTÓRICA E A APRENDIZAGEM HISTÓRICA

A aprendizagem que constitui a consciência histórica vem em destaque nas

narrativas, ou seja, no ato de contar histórias, pois esta é uma forma coerente de

comunicação e trata da identidade histórica tanto do comunicador como do receptor.

Isto ocorre porque as narrativas são produtos da mente humana e, com seu auxílio,

as pessoas envolvem lugar e tempo de uma forma aceitável por elas próprias

(RÜSEN, 1993, p.85).

Aprender, diz Rüsen (2007, p.106), "é um processo dinâmico, ao longo do

qual o sujeito aprendiz passa por mudanças". Nesse processo, o sujeito adquire

alguma coisa, apropria-se de algo. No aprendizado histórico ocorre a apropriação da

'história', ou seja, "um dado objetivo, um acontecimento que ocorreu no tempo

44 Dentre esses teóricos, destaco: Peter Lee, Rosalyn Ashby, Keith Barton, Hilary Cooper, Isabel Barca, Maria Auxiliadora Schmidt, Tânia Braga Garcia, entre outros.

Page 69: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

68

passado, torna-se uma realidade de consciência, torna-se objetivo". O aprendizado

histórico é um processo da consciência que se dá entre dois pontos, de um lado "um

dado objetivo da mudança temporal do homem e de seu mundo no passado" e, de

outro, "um sujeito determinado, uma autocompreensão e uma orientação da vida no

tempo". Segundo esse autor, o aprendizado histórico ocorre num movimento duplo,

"algo objetivo torna-se subjetivo, um conteúdo da experiência de ocorrências temporais

é apropriado" e, ao mesmo tempo, "o sujeito confronta-se com esta experiência, que

se objetiva nele" (RÜSEN, 2007, p.106).

Como indicativos do "como" aprender a história, Schmidt (2008) faz as

seguintes considerações:

- a aprendizagem histórica como uma construção, mas não centrada na aprendizagem espontânea;

- aprender a partir dos conhecimentos tácitos ou prévios dos alunos e das suas representações, em que eles possam adquirir as ferramentas necessárias para aprender a pensar historicamente, captando e valorizando a diversidade das fontes e dos pontos de vista históricos, reconstruindo, por adução, o percurso da narrativa histórica, participando do processo de fazer o conhecimento histórico, de construí-lo;

- aprender por meio do desenvolvimento de projetos e práticas interdisciplinares;

- aprender a construir noções temporais, superando a linearidade histórica e buscando entender a multiplicidade do tempo e a multiperspectividade da história;

- aprender a partir de novas relações com os materiais didáticos e fontes históricas, incorporando fontes orais e a memória histórica (SCHMIDT, 2008).

Observa a autora que aprender história nessa perspectiva promove uma

aproximação da aprendizagem histórica com a epistemologia histórica, mais

especialmente em relação ao método próprio dos historiadores, ou seja, com as

formas de produção do conhecimento histórico.

No entender de Rüsen (1992, p.30), a aprendizagem histórica, é realizada

por meio de três operações/competências: experiência, interpretação e orientação.

A 'competência de experiência' é a capacidade de olhar o passado e buscar sua

qualidade temporal, diferenciando-a do presente; 'competência de interpretação' é a

habilidade para reduzir as diferenças de tempo entre o passado, o presente e o futuro.

A temporalidade funciona como um instrumento de interpretação de experiências do

passado e uma compreensão do presente; 'competência de orientação' é a habilidade

Page 70: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

69

para utilizar a interpretação do passado, analisar a situação presente e projetar um

curso de ação futura.

Nesse sentido, segundo Rüsen (2001, p.155), a narrativa histórica é um

"modo específico de sentido sobre a experiência do tempo" e, para a constituição

desse "sentido", a narrativa deve estar vinculada à "experiência do tempo de maneira

que o passado possa tornar-se presente no quadro cultural de orientação da vida

prática contemporânea".

Para esse autor, a narrativa histórica tem uma especificidade, a de que "os

acontecimentos articulados narrativamente são considerados como tendo ocorrido

realmente no passado". Além disso, a coesão interna da narrativa é constituída como a

representação temporal que está "vinculada à experiência e como significativa para o

auto-conhecimento e para a orientação dos sujeitos narradores" (RÜSEN, 2001, p.155).

Ainda em relação à consciência histórica, na busca de uma compreensão

dos significados das narrativas produzidas pelos jovens, Barca (2006a) desenvolveu

o estudo, implementado no Projecto Hicon, Consciência Histórica: teoria e práticas,

com alunos do 10.o ano de escolaridade no sistema educativo português45, do qual

obteve um conjunto de construtos que forneceram indicadores para as questões

de investigação:

1. Tipologia narrativa - o nível da trama narrativa e listagem de marcadores temporais;

2. Esquema narrativo - mensagem nuclear substantiva e idéias de segunda ordem acerca de mudança e identidade;

3. Função social das idéias implícitas nas 'narrativas' produzidas (BARCA, 2006).

A partir desses construtos, as tramas das histórias de Portugal e do mundo

contemporâneo produzidas pelos jovens portugueses apresentaram níveis diferenciados,

desde o mais elaborado ao menos elaborado:

1. Narrativa completa - quando respeitam as balizas temporais propostas, apresenta eventos ou acontecimentos de ruptura, interligando-os por situações que constituem causas ou consequências dessas rupturas;

2. Narrativa emergente - quando respeitam uma cronologia básica em relação aos eventos propostos, no caso da pesquisa com os jovens portugueses,

45 No Brasil, corresponde ao 1.o ano do ensino médio.

Page 71: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

70

a cronologia ficou centrada em "dois momentos chave no país: a ditadura salazarista e o período iniciado com o 25 de Abril de 1974";

3. Cronologia; 4. Lista de eventos - a-cronológica; 5. Considerações gerais (BARCA, 2006).

As tendências encontradas nas produções desses jovens portugueses, nas

palavras de Barca (2006), podem indicar algumas hipóteses problematizadoras

sobre a função social que a disciplina de história está a veicular:

1. Apesar de os programas da disciplina de História nos últimos anos de escolaridade básica (7.o, 8.o e 9.o anos) se reportarem ao Mundo actual, parece que no final deste ciclo de ensino é a História do país que permanece mais nítida no pensamento juvenil. A identidade nacional surge delineada numa narrativa com contornos estruturados, enquanto que a idéia de História do mundo aparece tênue, comprometendo uma perspectiva de desenvolvimento da identidade 'planetária', que será desejável também promover. Estará o Ensino da História, em Portugal, a reforçar apenas os laços de pertença à escala nacional, descurando escalas mais vastas da história da humanidade, ou serão os interesses da juventude que atribuem muito mais significado à História do país do que à do mundo?

2. Os personagens individuais são pouco mencionados, e o seu protagonismo histórico surge sobretudo pela negativa. Como poderão os jovens pensar o seu papel na sociedade se a participação individual não é valorizada positivamente?

3 - Os sentidos de mudança na História, implícitos nos relatos dos jovens, apontam para idéias que não se reduzem a cenários lineares de progresso ou declínio: parte deles mostra consciência de que a história humana é feita de aspectos positivos e negativos, e que podem ser relativizados conforme os interesses e os pontos de vista. Estas visões indiciam que em Portugal a História ultrapassou já uma visão cristalizada e redutora da realidade, abrindo caminho à compreensão da complexidade (BARCA, 2006).

Outro estudo que teve como preocupação as narrativas históricas produzidas

por alunos foi realizado por Carretero e Jacott (1997), os quais apontam a importância

de dois elementos na narrativa para a explicação de acontecimentos históricos:

"os agentes" a quem são atribuídos certas ações e os "motivos" que explicam

essas ações.

Os autores (1997, p.87) iniciam a reflexão afirmando que a disciplina de história

tem sido ensinada sem considerar a interação complexa existente entre as estruturas

sociais e políticas. Comentam que a história tem sido criticada por apresentar

"personagens caricaturados que desempenham o papel de protagonistas", utilizados

para explicar os acontecimentos, sem levar em conta os fatores abstratos dos fatos.

Como exemplo, citam que um ensino nessa perspectiva, ao explicar os conflitos

Page 72: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

71

bélicos, toma como fundamental a figura de um "rei determinado ou o seu confronto

com o rei vizinho", não sendo considerados os aspectos sociais e políticos que

os produzem.

Em suas pesquisas, Carretero e Jacott (1997, p.88) têm argumentado que

"a visão da História como relato tem sido revitalizada, e nela os personagens, sejam

eles concretos ou abstratos, adquirem uma especial relevância".

Partindo dessas considerações, Carretero e Jacott (1997, p.92), ao pesquisarem

alunos de diferentes idades e níveis de escolarização46, procuraram saber qual o

"papel" que os alunos "conferem aos agentes [históricos] dentro da causalidade

histórica". Pretendiam analisar os "tipos de agentes incluídos nas narrativas produzidas

pelos alunos de diferentes grupos quando explicam por que se produziu o

'descobrimento' da América". Para empreender essa pesquisa, propuseram os

seguintes questionamentos:

Que tipo de elementos causais (agentes, motivos, estrutura sócio-política, etc.) os alunos incluem em seus relatos quando explicam a ocorrência de um fato histórico? Qual a importância que conferem aos agentes históricos nas suas explicações? Quais os tipos de agentes aos quais fazem referência os alunos de diferentes idades e de diferentes áreas de especialização? E, conseqüentemente, que tipo de motivos atribuem a esses agentes históricos? (CARRETERO; JACOTT, 1997, p.92).

Para os autores, o interesse nesses estudos recaiu em ver as diferenças que

existem em relação à compreensão histórica por parte de alunos de diferentes

idades e o desenvolvimento cognitivo, bem como as implicações na área da educação.

Comentam que a maioria dos estudos sobre desenvolvimento cognitivo tem sido

realizada mediante "tarefas abstratas", e que não têm sido levadas em consideração

as relacionadas com a História e as Ciências Sociais.

46 O público pesquisado era constituído de 100 (cem) alunos espanhóis. Foram formados cinco grupos de vinte alunos, cada grupo pertencente a diferentes níveis de escolarização: 6.a e 8.a séries do primeiro grau; 2.o ano do segundo grau; estudantes universitários do 5.o ano do curso de Psicologia e 5.o ano de História.

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72

No referido estudo, os relatos produzidos pelos alunos foram analisados

considerando dois elementos da narrativa que, no dizer dos autores, são essenciais

na explicação de acontecimentos históricos: "os agentes, a cujas ações é atribuída a

produção de determinados acontecimentos históricos, e os motivos que permitem

explicar essas ações" (CARRETERO; JACOTT, 1997, p.93).

Após a análise dos relatos dos alunos foi estabelecida uma categorização.

Inicialmente, em relação aos agentes históricos: "agentes pessoais, agentes pessoais-

sociais e agentes sociais". Na primeira categoria, foram localizados os alunos que

consideraram "somente as ações de agentes individuais nas suas narrativas sobre o

'descobrimento' da América"; na segunda categoria, foram incluídos os alunos que

consideraram "tanto as ações de agentes pessoais quanto a participação de agentes

sociais"; na terceira categoria, foram situados os alunos que fizeram suas narrativas

baseados nas ações de agentes sociais. Em seguida, em relação aos motivos das

ações, foram considerados todos os tipos a que os alunos fizeram referência

em seus relatos, sendo que os mesmos foram distribuídos em cinco categorias:

"de procura, pessoais, científicos, religiosos, econômicos e políticos" (CARRETERO;

JACOTT, 1997, p.93).

Os resultados apresentados por Carretero e Jacott (1997, p.99) indicaram

que os alunos, tanto os mais jovens como os adultos, demonstraram sua compreensão

dos fatos históricos de uma "forma personalista"; que os alunos que não são da área

de história priorizaram, em seus relatos e explicações históricas: os sujeitos e

suas ações, indicando que "a compreensão da História por sujeitos que não são

especialistas se dá de uma forma narrativa".

Ademais, neste trabalho a narrativa está sendo tomada na perspectiva dos

estudos de Husbands (2003) sobre a narrativa histórica escolar. Segundo o autor, a

narrativa é uma das formas pelas quais alunos e professores dão sentido ao passado

histórico, quando pensam sobre as versões do passado. Assim, por meio das narrativas

torna-se possível, em aulas de história, tratar de ideias mais abstratas sobre as

suposições e crenças das sociedades do passado, sobre as formas como trabalharam

ou fracassaram, e sobre como as pessoas representavam suas relações com

os outros.

Narrar histórias em aulas de história é uma forma de relatar o passado e,

consequentemente, interpretar este passado e, por isso, as narrativas são um

componente significativo do pensamento histórico e uma ferramenta central no ensino e

Page 74: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

73

na aprendizagem em história, podendo ser considerada como fundamental nessas

aulas. No entanto, ressalta o autor, na aprendizagem histórica a narrativa não é um

fim em si mesma, mas um meio para determinado fim, isto é, para a produção de

uma compreensão sobre o passado – a compreensão histórica. E isto significa:

contar histórias, mas também pedir aos alunos que as recontem; submetê-las a um exame crítico, criando um sentido da sua 'naturalidade', assim como da sua lógica. Envolve uma dúvida cética implícita sobre o caráter das histórias que contamos. Significa relacionar histórias àqueles 'princípios organizadores' – as idéias de causa, continuidade, mudança – do complexo discurso histórico (HUSBANDS, 2003, p.51).

Finalmente, a narrativa está sendo entendida aqui como um princípio da

educação histórica, na medida em que, para Lee (2005a, p.32), compreender a história

envolve conceitos tais como evidência, causa, mudança, explicação, consciência

histórica e narrativa, entre outros.

Os historiadores, diz Lee (2005a, p.32), falam e escrevem sobre coisas que

acontecem no mundo. As suas histórias estão repletas de pioneiros, políticos e

batalhas. Eles dão aos seus leitores explicações e, para isto, usam a evidência e

escrevem narrativas. Mas, seus livros não são sobre a ideia de explicação, ou a

noção de evidência, ou sobre o que é uma narrativa histórica; em vez disso eles

usam as suas próprias compreensões de evidência ou explicação para escrever

livros sobre Colombo, os Maias ou a Revolução Americana.

Lee (2005a, p.32) enfatiza que a intenção não é sugerir que os alunos, na

sala de aula, passem a fazer a história da mesma maneira que os historiadores, mas

o objetivo é que os alunos tragam para a escola ideias tácitas do que seja a história,

e que os professores abordem essas ideias. Isso, diz o autor, "se nós desejamos

ajudá-los a progredir na compreensão do que professores e historiadores dizem a

respeito do passado".

5.2 NARRATIVAS PRODUZIDAS EM CONTEXTO DE ESCOLARIZAÇÃO

Essa fase da pesquisa refere-se à investigação da apropriação, pelos alunos,

do conceito substantivo escravidão africana no Brasil em contexto de escolarização.

Page 75: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

74

Nesse sentido, delineei minha pesquisa, mais precisamente na linha de investigação

da cognição histórica situada, a qual engloba estudos que têm como perspectiva a

compreensão das ideias de professores e alunos em contexto de ensino – aulas de

história, tomando como referência o próprio conhecimento histórico.

Os objetivos centrais dessas investigações têm procurado:

- compreender os processos cognitivos dos sujeitos ao pensarem História; - examinar as relações entre as idéias tácitas (idéias que os alunos

constroem a partir de suas vivências) e os conceitos históricos; - explorar a compreensão dos alunos quanto aos conceitos históricos quer

de natureza substantiva quer de natureza epistemológica (por exemplo, interpretação de fontes) (BARCA; GAGO, 2001, p.242).

As pesquisas na área da educação histórica, mais especialmente sob o

enfoque de cunho qualitativo, têm investigado, por um lado, os conceitos substantivos,

e, por outro, as ideias sobre "a natureza da História" (BARCA, 2005, p.16). Nessa

investigação o conceito substantivo Escravidão africana no Brasil. De acordo com Schmidt (s/d), na esteira dos estudos desenvolvidos por

investigadores como Charlot (2000), Dubet (2006), Dubet e Martuccelli (1997):

os estudos relacionados ao campo da Educação Histórica, abrem um diálogo com as teorias educacionais que procuram entender o significado dos processos de escolarização, particularmente no que se refere aos processos de ensino e aprendizagem, face ao declínio da escola como instituição com a "função de", para entendê-la como o espaço da experiência (individual e social) dos sujeitos com o conhecimento (SCHMIDT, s/d).

A partir desses pressupostos busquei investigar as ideias dos alunos e a

relação desses com o conhecimento histórico, mais especificamente com o conceito

substantivo escravidão, tanto no estudo exploratório como no estudo principal.

5.2.1 Narrativas produzidas em contexto de escolarização: estudo exploratório

No estudo exploratório quando perguntei para as professoras Se já haviam

trabalhado com o livro adotado? Todas afirmaram que sim e indicaram os conteúdos

Page 76: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

75

que já haviam trabalhado no ano, tais como: Os antigos povos indígenas; A época

das grandes navegações; A chegada dos portugueses ao Brasil; entre outros.

Constatei que o conteúdo mais abordado foi a questão dos Indígenas, sendo

que 04 (quatro) professoras já haviam trabalhado este conteúdo. Os demais

conteúdos trabalhados foram: A questão das grandes navegações trabalhada por 02

(duas) professoras; A chegada ao Brasil por 01 (uma); Os povos que vieram da

África por 01 (uma); A expansão da Colônia por 01 (uma) professora.

A segunda questão: Você já trabalhou o conteúdo histórico "Escravidão" neste

ano? Caso negativo. Você concordaria em investigar os conhecimentos prévios de

seus alunos sobre este conteúdo histórico?

A professora Ana comentou que "Sim, já houve introdução ao conteúdo",

mas que gostaria de investigar os conhecimentos prévios de seus alunos para

"saber o que eles haviam aprendido". As demais professoras, não haviam trabalhado

este conteúdo e concordaram em aplicar o instrumento de pesquisa com seus alunos.

Diante disso, no decorrer do 2.o semestre de 2010 foram aplicados dois

instrumentos de pesquisa aos alunos de 4.o ano e 4.a série desta escola em relação

ao conceito substantivo escravidão. O primeiro questionário tinha a intenção de obter

as ideias prévias dos alunos. Para tanto, solicitei Escreva o que você sabe sobre

"Escravidão". O outro questionário foi aplicado após a mediação das professoras.

Neste, solicitei Escreva o que você aprendeu sobre "Escravidão".

Para fins de análise tomei a atividade desenvolvida pela professora Andrea,

4.a série C. Dos 25 alunos matriculados, 18 alunos participaram dos dois momentos

da investigação. No que se refere à análise, utilizei-me da categorização em relação

às ideias mais recorrentes no manual didático usado pela professora e comparar

com as ideias previas dos alunos e as ideias após a mediação da professora. Após

análise dos dados obtive a seguinte categorização em relação ao conceito escravidão:

Page 77: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

76

CATEGORIAS DO MANUAL IDEIAS PRÉVIAS IDEIAS APÓS A MEDIAÇÃO

Os povos que vieram da África _____ Os portugueses buscavam os negros na África para trabalhar como escravos

Trabalho escravo

Trabalho de graça; Trabalhos pesados; Os negros foram forçados a trabalhar; Trabalhavam para achar ouro/procurar ouro; Trabalhar para uma pessoa sem querer trabalhar; Os negros foram forçados a trabalhar.

Trabalharam muito; Trabalhar sem pagamento/ de graça; Trabalhar nas fazendas.

Luta e resistência Quem tentava fugir morria Batiam neles [negros] Não dar comida

Batiam nas crianças e adultos Tinha morte envolvida

Formação do povo brasileiro/cultura brasileira

_____ _____

QUADRO 12 - CONCEITO ESCRAVIDÃO: IDEIAS DOS ALUNOS FONTE: A autora

Na categoria Os povos que vieram da África, no questionário das ideias

prévias nenhum aluno fez referência sobre este conteúdo. Após a mediação da

professora um aluno expressa em sua narrativa este conteúdo:

Que os portugueses buscavam os negros na África para trabalhar como escravos sem pagar nada para trabalhar nas fazendas, coletores de café, agricultores e etc... É assim que os escravos trabalhavam sem pagarem nada. (Leandro, 9 anos)

Na categoria trabalho escravo, tanto no questionário das ideias prévias como

no aplicado após a mediação da professora, os alunos expressaram as ideias com

maior ênfase, tais como: Trabalho de graça; Trabalhos pesados; Os negros foram

forçados a trabalhar; Trabalhavam para achar ouro/procurar ouro; Trabalhar para

uma pessoa sem querer trabalhar. Exemplo de narrativa:

Aprendi que os brancos que vinham para o Brasil para mandar nos negros funcionava assim: os brancos vendiam os negros para trabalharem nas fazendas para servir a comida e limpar... (Nadia, 9 anos)

Page 78: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

77

Na categoria luta e resistência, os alunos fizeram referência aos maus-

tratos, fuga e morte. Exemplo de narrativa:

A escravidão era nos anos 50 (sic) que tinha que obedecer os brancos eles mandavam colher café, feijão, trigo e os negros respeitavam [e] quem tentava fugir morria, quando trabalhavam para achar ouro uns morriam de pneumonia, outros demoravam para morrer com a mesma doença, outros morriam de tanto idoso e de tanto apanhar. (Edson, 10 anos).

Na categoria formação do povo brasileiro/cultura brasileira, tanto no questionário

das ideias prévias como no aplicado após a mediação da professora, nenhum aluno

fez referência sobre este conteúdo.

Alguns alunos (02) fizeram referência à escravidão indígena no questionário

das ideias prévias e após a mediação da professora. Somente um (01) aluno fez

referência, nos dois questionários, à escravidão indígena.

Ideias prévias do aluno:

Escravidão começou quando os brancos chegaram ao Brasil em busca de riqueza e encontraram os indígenas assim os brancos escravizaram os indígenas. (Rodrigo, 10anos)

Ideias do aluno após a mediação da professora:

A escravidão aconteceu quando os portugueses desembarcaram no Brasil e encontraram tribos indígenas e as escravizaram e mataram. (Rodrigo, 10 anos)

Alguns alunos (03) usaram alguns marcadores temporais, como: "A escravidão

aconteceu no Brasil há muitos anos..." (Nadia, 10 anos).

Em relação às ideias dos alunos sobre o conceito substantivo escravidão

pode-se dizer que a maioria dos alunos apresentou uma mudança conceitual entre

as ideias prévias e as apresentadas após a mediação da professora. Algumas ideias

expressas na narrativa do manual didático foram expressas pelos alunos, sendo que

a ênfase foi para as questões relativas ao trabalho, maus-tratos, fuga e morte.

Page 79: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

78

5.2.2 Narrativas produzidas em contexto de escolarização: estudo principal

No estudo principal a recolha de dados consistiu em duas produções dos

alunos. A primeira para investigar os conhecimentos prévios com a pergunta: O que

você entende por escravidão. E a segunda, após a mediação didática, foi proposta a

seguinte questão: Imagine que você foi convidado para participar de um concurso

sobre conteúdos de História. Você deverá contar sobre a Escravidão no Brasil. Dos 35 alunos matriculados, 31 fizeram a 1.a narrativa, 31 fizeram a

2.a narrativa. Sendo que 27 alunos produziram as duas narrativas solicitadas.

Além da atividade proposta para investigar os conhecimentos prévios dos

alunos em relação ao conceito escravidão, solicitei que indicassem "Com quem

aprendeu" e "Onde aprendeu" sobre esse conteúdo histórico. As informações

ficaram assim categorizadas:

COM QUEM APRENDEU NÚMERO DE ALUNOS

Professor(a) 25 Especificaram: Nome da professora

08

Professora de história 07 Professora de geografia 01 Professora de ensino religioso 01 Professora de capoeira 01

Familiares/família 09 Especificaram: Pais

03

Madrinha 02 Avó 01 Irmã 01 Tia 01 Padrinho 01

QUADRO 13 - CONCEITO ESCRAVIDÃO: COM QUEM APRENDEU FONTE: A autora

A maioria dos alunos (25) disse que aprendeu com a professora. Dentre

esses, alguns alunos (08) especificaram o nome de suas professoras e outros

especificaram a disciplina: professora de história (07 alunos); de geografia (01 aluno);

de ensino religioso (01 aluno) e a professora de capoeira (01 aluno).

Alguns alunos (09) disseram que aprenderam com familiares ou com a

família, sendo com os pais (03 alunos); madrinha (02 alunos); avó, irmã, tia e padrinho

indicados por 01 aluno respectivamente.

Page 80: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

79

Em relação à questão "onde aprendeu", as respostas ficaram assim

categorizadas:

ONDE APRENDEU NÚMERO DE ALUNOS

Escola 22

Novela

Especificaram: Chica da Silva Escrava Isaura Novela sobre escravidão Novela "sinhazinha"

11

Especificaram 06

Livros 06

Filmes

Especificaram: O Besouro Amistad

05

Especificaram 03

TV 05

Internet 03

Documentários 02

Reportagem 01

Pesquisas 01

Capoeira 01

Desenho 01

Casa 01

QUADRO 14 - CONCEITO ESCRAVIDÃO: ONDE APRENDEU FONTE: A autora

A maioria dos alunos (22) disse que aprendeu na escola. Alguns alunos (11)

disseram que aprenderam com as novelas, sendo que alguns (06) especificaram o

nome das novelas: Chica da Silva e Escrava Isaura, ou disseram que era "novela

sobre escravidão", e, novela sobre "sinhazinha".

Alguns alunos (06) indicaram que aprenderam em livros e alguns (05) com

filmes. Desses alunos (02) especificaram o nome dos filmes: "O Besouro" (02) e

Amistad (01).

Alguns alunos indicaram que aprenderam com a televisão (05 alunos), com

a Internet (03 alunos) e com documentários (02 alunos).

As demais formas foram indicadas com menor ênfase pelos alunos, como

reportagem, pesquisas, capoeira, desenho e em casa, que foram citadas por 01

aluno, respectivamente.

Page 81: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

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5.2.2.1 Narrativas produzidas pelos alunos: ideias dos alunos

Neste segmento procuro identificar nas narrativas produzidas pelos alunos,

tanto nos conhecimentos prévios como após a mediação didática, os marcadores

temporais, marcadores espaciais e os personagens/agentes pessoais/sociais que

constituem as narrativas, e, a partir da identificação desses marcadores, identifico os

níveis das narrativas produzidas pelos alunos.

Os critérios de análise das narrativas foram estabelecidos a partir dos estudos

de Barca (2006), Husbands (2003), Carretero e Jacott (1997).

A partir dos elementos sugeridos por esse conjunto de autores, foi feita a

categorização das ideias contidas nas narrativas dos alunos. Esta categorização

consistiu em um estudo empírico baseado na metodologia da investigação qualitativa

na perspectiva da Grounded Theory (BOGDAN; BIKLEN, 1994), na qual as abstrações

são construídas à medida que os dados particulares que foram recolhidos vão

sendo agrupados.

As narrativas dos alunos apresentaram os seguintes marcadores temporais:

MARCADORES TEMPORAIS CONHECIMENTOS

PRÉVIOS APÓS A MEDIAÇÃO

Verbo no passado 27 27

Mudança temporal 04 17

Termos indicativos de passado 04 05

Datação/marcos cronológicos 04 05

Passado que está no presente Nenhum 08

QUADRO 15 - MARCADORES TEMPORAIS UTILIZADOS PELOS ALUNOS FONTE: A autora

Todos os alunos usaram, em suas narrativas, tanto nos conhecimentos prévios

como após a mediação didática, marcadores temporais. Para fins de exemplificação

optei por utilizar as narrativas após a mediação didática, na medida em que apresentaram

mais elementos de temporalidade. Todos os alunos usaram palavras que indicam

que os acontecimentos ocorreram no passado. Fragmento de narrativa:

Os africanos eram capturados e trazidos para o Brasil. Quando chegavam aqui vestiam uma roupa simples e eram batizados na capela como cristãos. Alguns trabalhavam na casa do senhor do engenho que se localizava em um local mais alto, para observar o trabalho escravo. Principalmente as mulheres

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trabalhavam na casa do senhor de engenho, pois amamentavam os seus filhos. Quando chegava a noite, os escravos iam dormir na senzala para acordar cedo novamente e ir ao trabalho. Quando acordavam trabalhavam com a cana que era um cultivo muito importante. Para trabalhar com a cana tinha um processo: cortavam a cana e levavam até a casa do engenho, moíam, ferviam até virar uma calda quente, depois eram colocadas em uma forma de barro, depois quebravam e eram levadas ao porto e transportadas até a Europa. Enquanto eles trabalhavam os feitores cuidavam deles para não fugirem, mas alguns fugiam e ficavam nos quilombos, mas lá não haviam só escravos que fugiam mas sim trabalhadores livres que preservavam os costumes da sua terra natal, fuga. Quilombolas eram comunidades que ficavam. [sic]. Muitos costumes africanos nós temos hoje em dia como: comidas: vatapá, feijoada, danças: samba, capoeira, religião, expressões (palavras). A escravidão foi abolida em 1888 com a lei Áurea. O trabalho do engenho era baseado no trabalho escravo mas também em trabalhadores livres. (Anelise, 11 anos)

Alguns alunos (17) expressaram em suas narrativas a mudança temporal,

elaboraram uma trama que apresenta a experiência ocorrida no passado e as

dificuldades enfrentadas pelos afrodescendentes na atualidade, como o preconceito

e racismo. Exemplo de narrativa:

No Brasil os portugueses compravam os escravos para conseguir trabalho usavam os escravos em vários serviços, nos engenhos de cana de açúcar entre outros. Alguns negros como forma de resistência se suicidavam outros abortavam a gravidez e outros se revoltavam e fugiam. Para os negros se defenderem eles criavam quilombos e lá eles viviam, eles realizavam atividades como agricultura e comércio, lá eles usavam a cultura que lês tinham na África. Depois de muitos anos uma lei que proibia o trabalho foi assinada e a partir dai eles começaram a ter salário, mas até hoje muitas pessoas tem preconceitos com os negros. (Fernando, 12 anos)

Alguns alunos (05) usaram termos que indicam a passagem do tempo: há

muito tempo; tudo começou; depois de um tempo; antigamente; atualmente; depois

de muito tempo. Exemplo:

A escravidão no Brasil foi difícil para os afrodescendentes assim chamados. Muitos eram mortos por maus tratos ou falta de alimento na exportação de negros para os navios negreiros, para servirem de escravos, para os brancos, depois de um tempo os negros começaram a trabalhar nas moendas de cana-de-açúcar tendo como vigias os feitores, como os negros trabalhavam sem ganhar nada não gostavam de trabalhar por 12 ou mais de 17 horas por dia construíram os quilombos. Quilombos eram lugares onde os negros fugiram para se abrigarem-se, para modo de passar o tempo os negros praticavam a capoeira, como atualmente é praticada. Recebendo a carta de alforria poderiam ser livres e viverem nos quilombos depois de muito tempo morando nos quilombos eram chamados de quilombolas. (Gil, 12 anos)

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82

Nessa narrativa o aluno usa termos que indicam a passagem do tempo, faz

uma interpretação da experiência do passado, ou seja, a prática da capoeira "para

modo de passar o tempo os negros praticavam a capoeira" relacionando com a

experiência do presente "como atualmente é praticada".

Poucos alunos (05) usaram marcadores cronológicos. Exemplo:

A escravidão no Brasil começou no século XVI e durou 300 anos e eram feitos de escravos os africanos e eles eram trazidos por navios e eram muito precário o estado de higiene dos escravos muitas vezes as mulheres grávidas se suicidavam pois eram a resistência da escravidão muitas vezes quando estavam nos engenhos eles destruíam o engenho colocando fogo destruindo as ferramentas [...]. Quando eles fugiram formaram os quilombos que eram as comunidades que onde viviam vários povos e etnias da África. Que o líder foi Zumbi dos Palmares. Palmares foi a comunidade que reportou o maior grupo de escravos então no dia 20 de novembro é comemorada o dia da consciência negra a [em] homenagem a Zumbi dos Palmares por sua morte na guerra contra os portugueses. (Bruno, 12 anos)

De modo geral, os alunos não usaram a cronologia como marcadores

temporais. Os que usaram fizeram referência ao século XVI referindo-se ao início do

período em que os portugueses trouxeram os escravos africanos ao Brasil; 1500

como o ano em que os portugueses vieram ao Brasil; 20 de novembro a data em

que é comemorada o dia da consciência negra.

Alguns alunos (08) expressaram que o passado está no presente. Exemplo:

Os escravos trabalhavam em produções de açúcar e as amas de leite cuidavam dos filhos do rei. Na lavoura a cana era colocada de molho moída e assim virava açúcar e era embalada. E na produção da cana quem cuidava para que os escravos não fugissem eram os "escravos livres". A escravidão durou muito tempo já acabou, mas agora tem um outro tipo de escravidão que é o preconceito e o "racismo". Policiais não tem respeito pelos negros não podem ver negros na rua que já suspeitam deles e partem para a agressão. "todo camburão tem um pouco de navio negreiro" [...]. (Emília, 11 anos)

A aluna Emília expressa em sua narrativa que a escravidão "já acabou",

mas que ainda permanece em nossa sociedade "um outro tipo de escravidão" que é

o "preconceito e o racismo". A aluna, ao interpretar o passado – a escravidão

africana, explica um problema enfrentado no presente – o preconceito e o racismo,

Page 84: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

83

para isso, utiliza-se da letra da música47 trabalhada pela professora durante a

mediação pedagógica.

Após a identificação de marcadores temporais busquei identificar os marcadores

espaciais presentes nas narrativas dos alunos:

MARCADORES ESPACIAIS CONHECIMENTOS

PRÉVIOS APÓS A MEDIAÇÃO

Brasil 09 16

África 05 10

América 02 _

Portugal _ 02

Ásia 01 _

Europa 01 02

Inglaterra 01 _

Quilombos - 17

Engenho (de açúcar) _ 06

Casa do senhor/casa de engenho/casa grande 01 06

Senzala 04 04

QUADRO 16 - MARCADORES ESPACIAIS PRESENTES NAS NARRATIVAS DOS ALUNOS FONTE: A autora

De modo geral, os alunos usaram marcadores espaciais em suas narrativas.

A maior parte dos alunos, tanto nos conhecimentos prévios (09 alunos) como na

narrativa após a mediação didática (16 alunos), fez referência ao Brasil como local

onde ocorreu a escravidão.

Em seguida, fizeram referência ao continente africano, nos conhecimentos

prévios (05 alunos) e na narrativa após a mediação didática (10 alunos), a África

local onde os africanos eram escravizados.

Os demais marcadores espaciais, América, Portugal, Europa, Inglaterra,

referenciados ou no manual didático ou na mediação da professora foram pouco

utilizados nas narrativas dos alunos.

Dos marcadores espaciais relacionados ao contexto da escravidão africana

no Brasil o mais citado pelos alunos na narrativa após a mediação didática foram

os Quilombos (17 alunos), sendo que um desses alunos fez referência ao Quilombo

dos Palmares.

47 Música "Todo camburão tem um pouco de navio negreiro", O Rappa.

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Os demais marcadores espaciais, como engenho (de açúcar) foi referenciado

por (06) alunos após a mediação didática; casa do senhor/casa de engenho/casa

grande foi referenciada por (06) alunos e a senzala por (04) alunos.

A trama da narrativa do manual didático e as produções dos alunos foram

construídas a partir das ações dos agentes/ personagens históricos sociais e pessoais.

Os alunos utilizaram agentes/personagens históricos em suas narrativas,

tanto dos conhecimentos prévios como após a mediação didática:

AGENTES/PERSONAGENS HISTÓRICOS CONHECIMENTOS

PRÉVIOS APÓS A MEDIAÇÃO

Sociais

17 23 Escravos/ Pessoas escravizadas

Negro(s)/pessoas negras 16 14

Homens brancos/pessoas brancas 09 10

Portugueses 05 09

Índios/indígenas 03 02

Mulheres/mulheres negras 03 16

Ama de leite 07

Crianças 02 02

Senhor de engenho/ donos dos escravos/ dos negros

03 10

Fazendeiros 02 _

Feitores _ 07

Africanos _ 04

Quilombolas _ 05

Escravos livres/libertos/ex-escravo _ 05

Sinhá _ 02

Pessoais

01 _ Princesa Isabel

Zumbi dos Palmares _ 02

Poeta Castro Alves _ 01

Pedro Álvares Cabral _ 01

QUADRO 17 - AGENTES/PERSONAGENS HISTÓRICOS PRESENTES NAS NARRATIVAS DOS ALUNOS

FONTE: A autora

Os agentes/personagens históricos usados com maior ênfase pelos alunos

foram: escravos/pessoas escravizadas, nos conhecimentos prévios (17 alunos) e

após a mediação (23 alunos); negros e/ou pessoas negras, nos conhecimentos prévios

(16 alunos) e após a mediação (14 alunos); homens brancos/pessoas brancas, nos

conhecimentos prévios (09 alunos) e após a mediação (10 alunos).

Page 86: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

85

As mulheres foram citadas com maior ênfase após a mediação (16 alunos),

sendo que algumas narrativas (07 alunos) fizeram referência à condição dessas

mulheres, especificamente, como "ama de leite", que amamentavam ou cuidavam

de crianças.

Os senhores de engenho/donos dos escravos/dos negros foram usados com

maior relevância após a mediação didática (10 alunos).

Os demais agentes/personagens históricos foram citados com menor relevância

peloa alunos, tais como: fazendeiros citado nos conhecimentos prévios (02 alunos);

após a mediação didática: feitores (07 alunos); africanos (04 alunos); quilombolas

(05 alunos); escravos livres/libertos/ex-escravo (05 alunos); sinhá (02 alunos).

Os agentes/personagens históricos individuais foram pouco citados. Nos

conhecimentos prévios somente um aluno fez referência à Princesa Isabel e após a

medidação didática os alunos fizeram referência aos personagens: Zumbi dos Palmares

(02 alunos); Poeta Castro Alves (01 aluno) e Pedro Álvarez Cabral (01 aluno).

Após a identificação de marcadores, temporais, espaciais e agentes/

personagens históricos presentes nas narrativas dos alunos procurei analisar a

estrutura das narrativas, mais especificamente, quanto à apropriação pelos alunos

do conceito substantivo escravidão africana no Brasil. Para isso, tomei como base a

narrativa do manual didático e a mediação didática da professora.

Todos os alunos (27) fizeram referência ao trabalho escravo, sendo que

dezenove (19) especificaram que esse trabalho era realizado nos engenhos. Desses,

nove (09) alunos explicaram como era o trabalho no engenho e como era feita a

produção do açúcar, narrando com detalhes o processo da feitura do açúcar,

baseados na narrativa do manual didático. Fragmento de narrativa:

Alguns trabalhavam na casa do senhor do engenho que se localizava em um local mais alto, para observar o trabalho escravo. Principalmente as mulheres trabalhavam na casa do senhor de engenho, pois amamentavam os seus filhos. Quando chegava a noite, os escravos iam dormir na senzala para acordar cedo novamente e ir ao trabalho. Quando acordavam trabalhavam com a cana que era um cultivo muito importante. Para trabalhar com a cana tinha um processo: cortavam a cana e levavam até a casa do engenho, moíam, ferviam até virar uma calda quente, depois eram colocadas em uma forma de barro, depois quebravam e eram levadas ao porto e transportadas até a Europa. (Leni, 11 anos)

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Outra questão contemplada por quinze (15) alunos foi a que trata da resistência

africana, alguns relatam as diferentes formas, tais como a formação dos quilombos,

citada por quinze (15) e dos quilombolas por seis (06) alunos. Exemplo de narrativa:

Os portugueses obrigavam os negros a trabalhar pesado no campo não tinham muito tempo para descansar, por isso negros cansados disso fizeram quilombos, que era o lugar pra qual eles fugiam em busca de uma vida melhor. Trabalhando tanto e sendo tratados como animais muitos dos escravos apelavam pelo suicídio. E muitos se matavam no navio se jogando ao mar, mas além disso muitas mulheres faziam aborto para que seus filhos não sofram como elas, essa eram formas de resistência. (Martina, 11 anos)

A questão da resistência foi um fato muito citado pelos alunos, especialmente

ao narrado no filme48 quando mostra a mulher escrava, com o filho no colo, jogando-se

no mar, fato explicado, posteriormente, pela professora dizendo que essa era uma

das formas de resistência dos escravos. Isso foi registrado por oito (08) alunos.

A escravidão no Brasil começou no século XVI e durou 300 anos e eram feitos de escravos os africanos e eles eram trazidos por navios e eram muito precário o estado de higiene dos escravos muitas vezes as mulheres grávidas se suicidavam pois eram a resistência da escravidão muitas vezes quando estavam nos engenhos eles destruíam o engenho colocando fogo destruindo as ferramentas, etc. Quando eles fugiram formaram os quilombos que eram as comunidades que onde viviam vários povos e etnias da África. Que o líder foi Zumbi dos Palmares. Palmares foi a comunidade que reportou o maior grupo de escravos então no dia 20 de novembro é comemorada o dia da consciência negra a [em] homenagem a Zumbi dos Palmares por sua morte na guerra contra os portugueses. (Bruno, 12 anos)

A viagem nos navios foi contemplada por treze (13) alunos. Essa explicação

consta como um dos itens da narrativa do manual didático, mas a narrativa do filme

foi a mais contemplada pelos alunos.

As questões presentes no livro e menos citadas foram: o mercado onde os

negros eram levados para serem comercializados por quatro (04) alunos; cultura

afro-brasileira expressa por três (03) alunos; dia da Consciência negra e 20

novembro citada por dois (02) alunos; e Zumbi dos Palmares por um (01) aluno.

A questão da discriminação racial que consta no manual didático e foi trabalhada

pela professora foi referenciada por quatro (04) alunos.

48 A professora usou em sua mediação didática um fragmento do filme Amistad de Steven Spielberg.

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No entanto, os alunos expressam algumas ideias que não estão presentes

no manual, mas comentadas pela professora. A mais citada pelos alunos (10) foi a

questão da carta de alforria, e, alguns alunos (04) fizeram referência à abolição ou à

Lei Áurea.

Apenas um (01) aluno faz referência ao poema de Castro Alves trabalhado

em sala de aula:

O poeta Castro Alves era contra a escravidão e no dia que era a comemoração da independência do Brasil ele leu um poema de 7 páginas para expressar o que ele sentia e o que pensava sobre a escravidão [...]. (Mario, 12 anos)

As questões de discriminação e preconceito constam no manual didático e

foram trabalhadas pela professora foram referenciadas por quatro (04) alunos.

Fragmento de narrativa:

A escravidão durou muito tempo já acabou mais, agora tem um outro tipo de escravidão que é o preconceito o "racismo". Policiais não tem respeito pelos negros não podem ver negros na rua que já suspeitam deles e partem para a agressão. "todo camburão tem um pouco de navio negreiro" [...]. (Emília, 11 anos).

Pode-se dizer que todos os alunos ao produzirem suas narrativas usaram

elementos do manual didático. Constatei que ocorreu uma progressão nas ideias

dos alunos, em relação ao conceito escravidão, quando comparei as ideias prévias e

as expressas após a mediação da professora.

Tendo identificado os marcadores das narrativas dos alunos e da validade

do conteúdo histórico, procurei observar os níveis apresentados nas tramas das

narrativas dos alunos. Após análise obtive diferentes níveis em relação às tramas das

narrativas. De acordo com os níveis obtidos, as narrativas ficaram assim agrupadas:

NÍVEL NÚMERO DE ALUNOS

Narrativas emergentes, embora com hiatos 05

Narrativas que relacionam a experiência do passado e a experiência do presente, embora com hiatos

08

Narrativas fragmentadas 11

Narrativas na forma de ideias soltas 04

TOTAL 28

QUADRO 18 - NÍVEL DAS NARRATIVAS DOS ALUNOS FONTE: A autora (1) A narrativa de um aluno foi considerada em dois níveis diferentes, com isso ocorreu uma

discrepância no total das narrativas.

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Quanto ao nível da trama das narrativas produzidas pelos alunos, o predomínio

foi para as narrativas fragmentadas como demonstrado no quadro acima. A seguir,

descrição dos níveis e respectivos exemplos:

Narrativas emergentes, embora com hiatos - 05 (cinco) narrativas

assumiram a forma de narrativas emergentes, com hiatos temporais. Apresentam

uma contextualização, alguns acontecimentos, embora com algumas lacunas, no

decorrer da construção da narrativa.

De modo geral, os alunos iniciam a narrativa enfatizando que os africanos

foram trazidos ao Brasil para o trabalho escravo. Destacaram a forma de trabalho nos

engenhos, nas lavouras e o trabalho das mulheres na casa do "senhor de engenho".

Destacam também as formas de resistência que os escravos utilizavam para demonstrar

a não aceitação da escravidão, como o suicídio, destruição dos engenhos, a destruição

de ferramentas e a formação de quilombos.

A escravidão no Brasil começou no século XVI e durou 300 anos e eram feitos de escravos os africanos e eles eram trazidos por navios e eram muito precário o estado de higiene dos escravos muitas vezes as mulheres grávidas se suicidavam pois eram a resistência da escravidão muitas vezes quando estavam nos engenhos eles destruíam o engenho colocando fogo destruindo as ferramentas, etc. Quando eles fugiram formaram os quilombos que eram as comunidades que onde viviam vários povos e etnias da África. Que o líder foi Zumbi dos Palmares. Palmares foi a comunidade que reportou o maior grupo de escravos então no dia 20 de novembro é comemorada o dia da consciência negra a homenagem a Zumbi dos Palmares por sua morte na guerra contra os portugueses. (Bruno, 12 anos)

Narrativas que relacionam a experiência do passado e a experiência do

presente, embora com hiatos - 08 (oito) narrativas assumiram a forma de narrativa

que relacionam a experiência do passado e a experiência do presente. Apresentam

uma contextualização, alguns acontecimentos, relacionam a experiência do passado

e a experiência do presente, embora com lacunas na trama da narrativa. Fragmento

de narrativa:

A escravidão durou muito tempo já acabou, mas, agora tem um outro tipo de escravidão que é o preconceito o "racismo". Policiais não tem respeito pelos negros não podem ver negros na rua que já suspeitam deles e partem para a agressão. "todo camburão tem um pouco de navio negreiro". No lugar onde os quilombos ficavam era produzida a cultura dos negros artesanato, comida, religião [...]. (Emília, 11 anos)

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Narrativas fragmentadas - 11 (onze) narrativas assumiram a forma de

narrativa fragmentada, pois embora apresentem uma contextualização, anunciem

alguns acontecimentos do contexto proposto e apresentem alguns marcadores históricos,

fazem-no de forma compartimentada. Exemplo de narrativa:

Tudo começou na África com os negros sendo embarcados no navio passavam fome frio e etc... Já quando chegavam ao Brasil eles eram levados e colocados em um barracão para vender a maioria deles era levado aos engenhos. Lá eles colhiam cana cozinhavam o caldo da cana e colocavam em formas para esbranquiçar e para ficarem duros em grandes blocos e quebrar para ficar bem fino. Tinha escravos que ficavam na casa grande limpando ou arrumando e fazendo um monte de coisas. Os escravos trabalhavam até 14 horas por dia eles acordavam com o nascer do sol e iam dormir já tarde. Os escravos que tinha dinheiro suficiente para comprar carta de alforria eles seriam livres para sempre. (Antonio, 12 anos)

Narrativas na forma de ideias soltas - 04 (quatro) alunos produziram

narrativas sob a forma de ideias soltas. Eles anunciaram alguns acontecimentos, porém

estes figuram como fatos isolados, não apresentando uma trama, não chegando a

ser uma narrativa histórica. Por exemplo:

Os escravos eram pessoas que trabalhavam bastante e eram maltratados e machucados e não recebiam dinheiro pelo trabalho deles. Na África os negros viviam livres mais quando viravam escravos a vida deles piorou. Os negros enfrentavam o racismo das pessoas. Os racistas são as pessoas que odeiam os negros só por causa da cor da pele. Quando os escravos fogem do lugar onde eles estão trabalhando eles vão pros quilombos. Os quilombos são lugares onde os escravos podiam viver tranquilos, até o antigo líder deles atacar. (Patrick, 13 anos)

O predomínio foi para as narrativas fragmentadas, isto pode indicar, no dizer

de Schmidt (2006), a necessidade do desenvolvimento de um novo tipo de cognição

histórica, pautado em novas concepções da aprendizagem histórica ou do que é o

"aprender a história", tomando como os pressupostos e princípios da educação

histórica, os quais são fundamentados na própria ciência da história.

Poucos alunos (08) fizeram a relação da experiência do passado com a

experiência do presente, de modo geral, narraram o passado sem fazer relação com

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90

o presente; nenhum aluno perspectivou ações futuras, evidenciando que essas

narrativas constituíram um sentido histórico "do passado pelo passado".

Constatei que a maioria dos alunos ao produzirem as narrativas usou de

forma mais evidenciada os elementos do manual didático e, poucos elementos da

mediação didática da professora. De modo geral, pode-se dizer que ocorreu uma

progressão nas ideias dos alunos em relação ao conceito escravidão africana no

Brasil, na medida em que se apropriaram dessas ideias expressando-as em suas

narrativas. Pode-se dizer que a narrativa da maioria dos alunos apresenta elementos

de uma consciência histórica tradicional, pois na perspectiva de Rüsen (1993, 1992)

esses alunos articulam as tradições e relembram as origens que constituem a vida

no presente.

Poucos alunos fazem uma relação entre os acontecimentos do passado e o

presente, nesse caso, as questões do preconceito e da discriminação, que constam

no manual didático, e que foram trabalhadas pela professora. Essas narrativas

possuem elementos de uma consciência histórica ontogenética, pois segundo Rüsen

(1993, 1992) histórias deste tipo dão direção à mudança temporal e apresentam a

continuidade como um desenvolvimento no qual a alteração de modos de vida é

necessária para a sua permanência, ou seja, a capacidade do aluno em relacionar

acontecimentos do passado que estão presentes no presente, a relação entre o

processo de escravidão e as questões de preconceito e de discriminação enfrentadas

pelos afro-descendentes na atualidade.

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91

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A investigação desenvolvida no pós-doutorado consistiu em uma continuidade

da pesquisa desenvolvida no doutorado.

Em 2009, após a defesa da minha tese, iniciei a minha participação no

"Grupo de Pesquisa em Educação Histórica". Esse grupo constitui uma das ações

do conjunto de atividades do LAPEUH, sob a coordenação da Prof.a Dr.a Maria

Auxiliadora Moreira dos Santos Schmidt. O grupo foi criado com o objetivo de reunir um

grupo de pesquisadores, mais especificamente, doutores e mestres com trabalhos já

defendidos, para levantamento de dados comparativos entre Brasil e outros países

que realizam pesquisas em Educação Histórica.

Em 2010, ocorreu a ampliação do referido grupo de pesquisa, na medida em

que professores da rede estadual de ensino do Paraná que estavam desenvolvendo

suas pesquisas no Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) sentiram a

necessidade de discutir a questão da escolha dos manuais didáticos referentes aos

livros oferecidos pelo Programa Nacional do Livro Didático – PNLD 2011, referente

aos anos finais do Ensino Fundamental. Diante da necessidade apresentada pelos

professores em relação a essa escolha, a Profa. Maria Auxiliadora Schmidt organizou

o Seminário: Manuais didáticos, com o objetivo de subsidiar os referidos professores

na análise e seleção dos livros para as suas escolas.

Durante esse processo, fiz a proposta para dar continuidade a essa pesquisa

junto ao Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Paraná (UFPR),

Pós-Doutorado, mais especificamente junto ao NPPD, com a intenção de ampliar a

investigação. Nesse sentido, o percurso da investigação desenvolvida em 2010 passou

a ser considerada como estudo exploratório e, com isso, levantei a seguinte questão

de investigação:

Como ocorre o uso e as apropriações das narrativas do manual didático por

professor e alunos no processo de escolarização?

Para responder a essa questão central estruturei a investigação com as

seguintes questões:

- Como foi o processo de escolha do manual didático dos anos finais do

Ensino Fundamental – 6.o ao 9.o, PNLD/2011 nas escolas da RME?

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- Quando o professor usa o manual didático ele usa a narrativa da forma que

está presente no manual?

- Qual a ideia expressa pelo aluno em relação ao conceito substantivo

escravidão africana no Brasil?

Para fundamentar o percurso metodológico, parti das considerações assumidas

no doutorado, pautei-me em autores da pesquisa qualitativa, tomando como referência,

especialmente, os estudos de Godoy (1995); Bogdan e Biklen (1994).

No percurso do estudo exploratório a minha preocupação inicial foi saber

quais os critérios que os professores e professoras de escolas da RME levaram em

consideração para a escolha do livro didático do PNLD. Para obter essas informações,

solicitei um relatório em que os professores e professoras deveriam narrar como havia

ocorrido a escolha do livro didático oferecido pelo PNLD 2010/2011, para os anos

finais do Ensino Fundamental, 6.o ao 9.o ano. No estudo principal obtive as informações

a partir de um questionário enviado a todos os professores de história da RME.

De modo geral, as dificuldades apontadas pelos professores para a escolha

do manual didático foram a falta de horário específico para a análise dos manuais,

tanto de forma individual como no coletivo. Além disso, comentaram que o tempo

para análise e escolha foi muito reduzido.

Em relação aos critérios de escolha, os professores preocuparam-se em

observar a iconografia, que contivesse documentos históricos. Assim como, tiveram a

preocupação com a apresentação dos textos, e, especialmente, se os mesmos estavam

apropriados para a compreensão dos alunos. Essa perspectiva está presente nos

critérios de Rüsen (1997, p.85), na medida em que o autor afirma que um bom livro

didático de história deve apresentar "uma relação eficaz com o aluno".

Fizeram referência ao formato, destacaram a importância do conteúdo e/ou

temas. Salientaram a importância das imagens, os textos, bem como a importância

dos textos complementares.

A fase seguinte da pesquisa foi a análise dos manuais adotadas em escolas

municipais. No estudo exploratório busquei identificar se o conceito substantivo

escravidão está indicado em manuais didáticos dos anos iniciais do Ensino

Fundamental, mais especificamente os indicados pelo Programa Nacional do Livro

Didático – PNLD/2010 e presentes no Guia do Livro Didático de História (BRASIL,

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93

2009). E no estudo principal trato da análise de uma das duas coleções mais adotadas

pelas escolas de 6.o ao 9.o ano da RME: Coleção Vontade de saber história.

Após análise das 32 coleções constatei que o conceito substantivo escravidão

está indicado como conteúdo a ser ensinado de forma explícita nos manuais de 4.o e

5.o anos. Sendo que as ideias mais recorrentes foram agrupadas nas categorias Os

povos que vieram da África; trabalho escravo; luta e resistência; formação do povo

brasileiro/cultura brasileira.

Pude constatar que, de modo geral, estas narrativas estão muito próximas das

narrativas de historiadores clássicos da historiografia brasileira, referências culturais

idealizadas e defendidas por teóricos como Oliveira Viana (2005), Nina Rodrigues

(1982) e Gilberto Freyre (1988).

A Coleção Vontade de saber história apresenta o conceito substantivo

escravidão africana no Brasil, mais especificamente no manual do 7.o ano. Pode-se

dizer que a narrativa está elaborada em tópicos e apresentada de forma fragmenta,

seguindo a perspectiva de Rüsen (2012, p.170) como "um saber muito simplificado

para fins escolares".

Ademais, observei que a narrativa não apresenta a escravidão como decorrência

de um processo econômico. Constata-se, no decorrer da narrativa, a ausência de

estudos na perspectiva da historiografia recente. Como por exemplo, as relações

apresentadas por Luiz Felipe Alencastro, em sua obra O trato dos viventes: formação

do Brasil no Atlântico Sul (2000). Para esse autor é importante entendermos as

relações entre África, a Coroa Portuguesa e o Brasil, pois sem percebermos essas

relações não conseguiremos compreender como ocorreu a formação econômica do

Brasil. Nas palavras do autor: "Desde o final do século XVI, surge um espaço

aterritorial, um arquipélago lusófono composto por enclaves da América portuguesa

e das feitorias de Angola. É daí que surge o Brasil no século XVIII" (p.9). O autor

busca mostrar como essas duas partes unidas pelo oceano se completam num só

sistema de exploração colonial.

Ou, os estudos de João Luís Fragoso em sua obra Homens de grossa aventura

(1998), quando o autor busca mostrar um modelo explicativo econômico que destoa

da historiografia tradicional. Tomando como referência o sistema agrário escravista-

exportador, procura apresentar as formas de acumulação presentes na "economia

colonial" do Sudeste, no século XIX. Procura explicitar que a economia colonial, em

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94

seu processo de produção, tinha certa autonomia frente à Metrópole; fenômeno que

ajuda a repensar a dependência econômica da Colônia em relação à Metrópole.

Com a intenção de identificar o uso e apropriações que alunos e professora

fazem das narrativas presentes no manual didático acompanhei algumas aulas de

História, em uma turma de 7.o ano do ensino fundamental. Com isso, pude observar

de que forma o conceito substantivo escravidão africana no Brasil está sendo

ensinado como um conteúdo escolar.

A metodologia de pesquisa consistiu em Observação não-participativa, ou

seja, em acompanhar as aulas de história da referida turma, durante o período em

que a professora tratasse do conceito substantivo em questão, sem interferência nas

aulas da professora.

Algumas considerações podem ser apontadas, entre elas a de que o manual

didático de história tem sido usado pela professora constituindo-se no texto visível

do código disciplinar da história escolar de acordo com Cuesta Fernandez (1997).

Além disso, observei que a professora usou de forma parcial o manual, na medida

em que escolheu alguns segmentos para trabalhar com seus alunos. Essa perspectiva

está apontada por Circe Bittencourt (2001, p.73-74), pois segundo a autora mesmo

que o manual didático se caracterize pelo texto "impositivo e diretivo", cabe ao

professor, entre outras questões, a seleção dos capítulos a serem trabalhados, a

metodologia adotada para a leitura, assim como as tarefas decorrentes da leitura,

que são opções do professor. Essa sistemática esteve presente em sala de aula.

Em relação ao uso do manual didático pelos alunos pode-se constatar que a

maioria o faz para responder atividades propostas pela professora, somente um (01)

aluno disse que é para compreender o conteúdo, de modo geral, o uso está mais voltado

para as questões de aprendizagem, poucos alunos fizeram referência aos conceitos

históricos ou demonstraram interesse em aprender determinados feitos históricos.

O uso do manual didático pela professora e as apropriações da narrativa

desse manual foram expressas pelos alunos em suas narrativas. Pode-se dizer que

todos os alunos ao produzirem suas narrativas usaram com maior ênfase elementos

da narrativa do manual didático. Constatei que ocorreu uma progressão nas ideias

dos alunos, em relação ao conceito escravidão africana no Brasil, quando comparei

as ideias prévias e as expressas após a mediação da professora.

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Os alunos, de modo geral, utilizaram palavras que indicam a passagem do

tempo, especialmente os verbos no passado e expressões como antigamente, há muito

tempo, entre outras. Sendo que as mais utilizadas foram em relação ao trabalho

realizado pelos escravos; às condições de vida dos escravos, tais como, o tratamento

que os escravos recebiam, as condições de sofrimento a que eram submetidos –

capturados, vendidos; resistência à escravidão; organização em comunidades –

Quilombos; entre outras questões.

Pode-se dizer que a narrativa da maioria dos alunos apresenta elementos de

uma consciência histórica tradicional, pois na perspectiva de Rüsen (1993, 1992)

esses alunos articulam as tradições e relembram as origens que constituem a vida

no presente.

Poucos alunos fazem uma relação entre os acontecimentos do passado e o

presente, nesse caso, as questões do preconceito e da discriminação, que constam no

manual didático, e que foram trabalhadas pela professora. Essas narrativas possuem

elementos de uma consciência histórica ontogenética, pois segundo Rüsen (1993,

1992) histórias deste tipo dão direção à mudança temporal e apresentam a continuidade

como um desenvolvimento no qual a alteração de modos de vida é necessária para

a sua permanência, ou seja, a capacidade do aluno em relacionar acontecimentos do

passado que estão presentes no presente, a relação entre o processo de escravidão e

as questões de preconceito e de discriminação enfrentadas pelos afrodescendentes

na atualidade.

Nesse sentido, Barca (2011, p.8) aponta que:

Embora os diversos tipos de consciência histórica não se manifestem de forma estanque, nem os quatro tipos elencados devam ser considerados como os únicos enquanto manifestações de orientação temporal, parece ser cada vez mais nítido o reconhecimento de que é uma consciência de tipo "genético" que melhor equipa cognitivamente o ser humano para enfrentar os desafios e problemas nestas primeiras décadas do século XXI. Neste sentido de "consciência histórica genética", o passado é encarado como fonte para a compreensão significativa do mundo que se apresenta com permanências e mudanças complexas.

Ademais, levando em consideração a perspectiva de Rüsen (2001, p.155) de

que a narrativa histórica é um procedimento mental que confere sentido ao passado

e tem como finalidade dar uma orientação para os sujeitos narradores, a professora,

ao mediar a narrativa do manual didático, está constituindo, em parte, a sua própria

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96

consciência histórica e a de seus alunos. Neste caso, uma consciência histórica

tradicional, com alguns momentos de reflexões que propiciaram, ainda que de

forma tênue, uma consciência histórica exemplar e, em alguns momentos, uma

consciência crítica.

Page 98: Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd

97

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RÜSEN, J. História viva: teoria da história: formas e funções do conhecimento histórico. Tradução de Estevão de Rezende Martins. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2007.

RÜSEN, J. O livro didático ideal. In: SCHMIDT, M. A; BARCA, I.; MARTINS, E. R. M. (Orgs.). Jörn Rüsen e o Ensino de História. Curitiba: Ed. UFPR, 2010. p.109-127.

RÜSEN, J. Aprendizagem histórica: fundamentos e paradigmas. Curitiba: W.A. Editores, 2012.

SCHMIDT, M. A. Jovens brasileiros e europeus: identidade, cultura e ensino de história (1998-2000). Perspectiva, Florianópolis, v.20, n.Especial, p.183-208, jul./dez. 2002.

SCHMIDT, M. A. Perspectivas da consciência histórica e da aprendizagem em narrativas de jovens brasileiros. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PESQUISADORES DO ENSINO DE HISTÓRIA: NOVOS PROBLEMAS E NOVAS ABORDAGENS, 7., 2006, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: FAE/UFMG, 2006.

SCHMIDT, M. A. Idéias de aprendizagem histórica difundidas em manuais destinados a professores no Brasil: 1917-2004. In: CONGRESSO LUSO-BRASILEIRO DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO, 7., 2008, Porto. Anais... Porto – Portugal: Universidade do Porto, 2008.

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102

SCHMIDT, M. A. Cultura histórica e cultura escolar: diálogos a partir da educação histórica. História Revista - Revista da Faculdade de História e do Programa de Pós-Graduação em História, Goiânia, v.17, n.1, p.91-104, jan./jun. 2012.

SCHMIDT, M. A. Cultura histórica, ensino e aprendizagem de história: questões e possibilidades. Texto em fase de edição. (s/d).

SCHMIDT, M. A.; BARCA, I. (Orgs.). Aprender história: perspectivas da educação histórica. Ijuí: Ed. Unijuí, 2009. (Coleção Cultura, Escola e Ensino).

SCHMIDT, M. A.; BARCA, I. Cultura histórica, ensino e aprendizagem de história: questões e possibilidades. Texto em fase de edição, s/d.

SCHMIDT, M. A.; GARCIA, T. M. B. Consciência histórica e crítica em aulas de história. Fortaleza: Secretaria da Cultura do Estado do Ceará/Museu do Ceará, 2006.

SOBANSKI, A. Q. Como os professores e jovens estudantes do Brasil e de Portugal se relacionam com a idéia de África. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação de Educação, Linha de Pesquisa Cultura, Escola e Ensino, Setor de Educação – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2008.

TUMA, M. M. P. Viver é descobrir: história e geografia: Paraná. São Paulo: FTD, 1992.

VALLS, R. La enseñanza de la Historia y textos escolares. Buenos Aires: Libros del Zordal, 2008.

VIANA, O. Populações meridionais do Brasil. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2005.

WILLIAMS, R. La larga revolución. Buenos Aires: Nueva Visión, 2003.

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APÊNDICE

RELATÓRIO DE ATIVIDADES REALIZADAS PÓS-DOUTORAMENTO

PRODUTOS DA PESQUISA

2011

Capítulos de livros publicados

GEVAERD, R. T. F. "Percebo que os textos estão acima da compreensão das crianças" ideias expressas pelas professoras em relação ao manual didático. In: CAINELLI, Marlene; SCHMIDT, Maria Auxiliadora (Org.). Educação histórica: teoria e pesquisa. Ijuí: Unijuí, 2011. p.331-348. v.1

GEVAERD, R. T. F. A ideia de escravidão: da narrativa do manual didático às narrativas produzidas pelos alunos. Trabalho apresentado nas XI Jornadas Internacionais de Educação Histórica, 2011, Braga - Portugal. XI Jornadas Internacionais de Educação Histórica: Consciência histórica na era da Globalização. Braga - Portugal: UMinho, 2011.

Comunicação oral

Apresentou a pesquisa com o título: "Ideia de escravidão: da narrativa do manual didático às ideias expressas pelos alunos" no IX Encontro Nacional dos Pesquisadores do Ensino de História (ENPEH), na Universidade Federal de Santa Catarina, na cidade de Florianópolis, nos dias 18, 19 e 20 de abril de 2011.

Apresentou a pesquisa com o título: Textbooks in history classes: a way to form the historical consciousness of teachers and students in the History Educators International Research Network [HEIRNET] Conference which occurred on 18 to 20 July 2011, in Universidade do Minho, Braga.

2012

Publicação em revista científica

Manual didático de história: o processo de escolha em escolas municipais de Curitiba. Revista de Educação Histórica – REDUH – LAPEDUH – UFPR, n.1, p.27-38, jul./nov. 2012. Disponível em: http://www.lapeduh.ufpr.br/revista2012/

Conceito substantivo escravidão africana no Brasil: uso e apropriações das narrativas do manual didático pelos alunos e professora. Revista ANTÍTESES, v.5, n.10, p.589-611, jul./dez. 2012. Disponível em: http://www.uel.br/revistas//uel/index.php/antiteses/ article/view/13340/12125

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Conferência

Proferiu conferência com o título "Ensino de História na perspectiva da Educação histórica: o caso da Rede Municipal de Ensino de Curitiba" no 2.o Seminário Internacional de Educação Histórica: a didática da história e a produção da consciência histórica, realizado na Universidade Federal de Santa Maria, nos dias 12 e 13 Julho, 2012.

Mesa redonda

Participou de Mesa Redonda com o tema "Perspectivas da Educação Histórica na II Semana de História: Temáticas e Perspectivas", realizada no dia 10/10/2012 nas Faculdades Integradas de Itararé, Itararé, São Paulo. Narrativas do manual didático: uso e apropriações pela professora e alunos

Sessão Temática

Coordenou a Sessão Temática Livros didáticos, ensino e aprendizagem da história na Conferência Regional IARTEM BRASIL 2012, "Desafios para a superação das desigualdades sociais: o papel dos manuais didáticos e das mídias educativas", realizada na Universidade Federal do Paraná (Brasil), no período de 29 a 31 de agosto de 2012, organizada pelo Núcleo de Pesquisa em Publicações Didáticas/UFPR.

Sala de Debates

Coordenador de Sala de Debates do 2.o Seminário Internacional de Educação Histórica: a didática da história e a produção da consciência histórica, realizado na Universidade Federal de Santa Maria, nos dias 12 e 13 Julho 2012.

Comissão científica

XII Congresso Internacional Jornadas de Educação Histórica- "Consciência Histórica e as Novas Tecnologias da Informação e Comunicação", nos dias 18, 19, 20 e 21 de julho de 2012, no edifício D. Pedro I da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, Brasil.

IX History Educators International Research Network Conference – HEIRNET: "Historical Consciousness in the Information, Communication and Technology Era, 14,15 16 and 17 July, 2012, in the D. Pedro I building of the Federal University of Paraná, Curitiba, Paraná, Brazil.

2.o Seminário Internacional de Educação Histórica: a didática da história e a produção da consciência histórica, realizado na Universidade Federal de Santa Maria, nos dias 12 e 13 Julho 2012.

Conferência Regional IARTEM BRASIL 2012, "Desafios para a superação das desigualdades sociais: o papel dos manuais didáticos e das mídias educativas", realizada na Universidade Federal do Paraná (Brasil), no período de 29 a 31 de agosto de 2012, organizada pelo Núcleo de Pesquisa em Publicações Didáticas/UFPR.

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5.o Seminário de Educação Histórica – Identidades e Educação Histórica, promovido pelo Laboratório de Pesquisa em Educação Histórica da Universidade Federal do Paraná nos dias 17/05, 25/10, 29/11 de 2012 e 07/02 de 2013.

Comunicação Oral

Presented the work "The substantive concept of slavery: use and appropriations of textbook narratives by teacher and students" in the IX HEIRNET, "History Educators International Research Network Conference' – "Historical Consciousness and New Information and Communication Technologies, which occurred on days 14,15 16 and 17 July, 2012, in the D. Pedro I building of the Federal University of Paraná in Curitiba-Paraná, Brazil.

Apresentou a pesquisa com o título: "Narrativas do manual didático: apropriações pelos alunos do conceito substantivo escravidão" no XII Congresso Internacional Jornadas de Educação Histórica- "Consciência Histórica e as Novas Tecnologias da Informação e Comunicação", nos dias 18, 19, 20 e 21 de julho de 2012, no edifício D. Pedro I da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, Brasil.

Apresentou a pesquisa com o título: "Manual didático: uso e apropriações das narrativas históricas por professores e alunos", no IX Seminário ANPED SUL, no campus universitário da Universidade de Caxias do Sul, em Caxias do Sul, Rio Grande do Sul, no período de 29 de julho a 1.o de agosto de 2012.

Apresentou a pesquisa com o título: "O processo de escolha e o uso do manual didático em aulas de história: o caso em escolas municipais de Curitiba", no 4.o Seminário de Educação Histórica promovido pelo Laboratório de Pesquisa em Educação Histórica da Universidade Federal do Paraná, 2012.

Apresentou a pesquisa com o título "Conceito substantivo escravidão em manuais didáticos do ensino fundamental: um estudo comparativo", na Conferência Regional IARTEM BRASIL 2012, "Desafios para a superação das desigualdades sociais: o papel dos manuais didáticos e das mídias educativas", realizada na Universidade Federal do Paraná (Brasil), no período de 29 a 31 de agosto de 2012, organizada pelo Núcleo de Pesquisa em Publicações Didáticas/UFPR.

Presented the work Textbook in History classes: a way to form the historical consciousness of teachers and students in the 1st Conference of the International Research Association for History and Social Sciences Education – IRAHSSE. History and social sciences education: achievements and perspectives. Roma, Sapienza Università di Roma, 3-5 de September, 2012.

Apresentou a pesquisa com o título: A narrativa do manual didático de história: conceito substantivo escravidão africana no Brasil, no 5.o Seminário de Educação Histórica – Identidades e Educação Histórica, promovido pelo Laboratório de Pesquisa em Educação Histórica da Universidade Federal do Paraná nos dias 17/05, 25/10, 29/11 de 2012 e 07/02 de 2013.

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2013

Comunicação Oral

Apresentou a pesquisa com o título "Conceito substantivo escravidão: uso e apropriações das narrativas do manual didático pela professora e alunos", no 5.o Seminário de Educação Histórica – Identidades e Educação histórica, promovido pelo Laboratório de Pesquisa em Educação Histórica (LAPEDUH) da Universidade Federal do Paraná no dia 07 de fevereiro de 2013.

Apresentou a pesquisa com o título "Narrativas históricas e a formação da consciência histórica: conceito substantivo escravidão africana no Brasil", no Simpósio Temático Aprendizagem, competências e formação da consciência histórica no XXVII Simpósio Nacional de História, no período de 22 a 26 de julho de 2013.

Apresentou a pesquisa com o título "Narrativas históricas e a formação da consciência histórica: conceito substantivo escravidão africana no Brasil", no Simpósio Brasileiro de História da Historiografia – Teoria da história e história da historiografia: diálogos Brasil-Alemanha, realizado em Mariana, entre os dias 12 e 15 de agosto de 2013.

Mesa Redonda

Participou em mesa redonda "Conocimientos, identidad y saberes escolares" em El V Simposio Internacional de Didáctica de las Ciencias Sociales en el ámbito Iberoamericano: Historia e identidades culturales; XIII Congresso Internacional Jornadas de Educação Histórica, celebrado en la Faculdad de Formación del Professorado de la Universitat de Barcelona, del 29 de mayo al 1 de junio de 2013.