ROTEIRO DeLeitura versão completa - · PDF fileou outra figura com...
Transcript of ROTEIRO DeLeitura versão completa - · PDF fileou outra figura com...
RO
TE
IRO
DE
LE
ITU
RA
- P
gin
a 1
RO
TE
IRO
DeL
eitu
ra -
Pg
ina
1
DeLeitura um selo da Editora Aquariana
DeLeitura
1 PROPP, Vladmir. Morfologia do conto. Lisboa: Editorial Veja, 1978.2 CASHDAN, Sheldon. Os 7 pecados capitais nos contos de fadas: como os contos de fadas influenciam nossas
vidas. Rio de Janeiro: Campus, 2000.
ROTEIRO DeLeitura verso completa
Um conto no espelho
A sabedoria no irrompe integralmente desenvolvida comoAtenas saindo da cabea de Zeus; constituda porpequenos passos a partir do comeo mais irracional.
Bruno Bettelheim
Era uma vez... assim comeavam as histrias.
Sem preocupao de realidade, tica ou esttica, esses contos, onde se assistia
interveno do maravilhoso e recriao de mundos dominados por outras leis que no as do
mundo que conhecemos, eram transmitidos oralmente atravs de geraes. O fundo era nico,
simples, fluido, fcil, mas as palavras eram do contador, sem que se perdesse o essencial da
histria. Eram contos maravilhosos, contos de fadas.
Contados e recontados de muitas formas diferentes, os contos de fadas foram exaustivamente
analisados pela literatura e pela psicologia. Este trabalho de anlise de Espelhos Partidos percorreu
dois caminhos:
No campo da literatura
Em A morfologia do conto1, seu conhecido estudo sobre o conto maravilhoso (no qual inclui
os contos de fadas), Vladimir Propp, apresenta 31 funes, as aes constantes, praticadas por
diferentes personagens e de diferentes maneiras.
No campo da psicologia
Os contos de fadas tm sido largamente analisados pela Psicologia, quer pelas figuras
arquetpicas, como o fazem os jungianos, quer pelas quatro etapas da jornada no caminho da
auto descoberta, como as classifica Sheldon Cashdan2.
RO
TE
IRO
DeL
eitu
ra -
Pg
ina
2
DeLeitura um selo da Editora Aquariana
DeLeitura
3 As quatro etapas da jornada no caminho da autodescoberta, segundo Cashdan so:
1. TRAVESSIA: leva o heri ou herona a uma terra diferente, marcada por acontecimentos mgicos e criaturasestranhas.
2. ENCONTRO: com uma presena diablica uma madrasta malvola, um ogro assassino, um mago ameaadorou outra figura com caractersticas de feiticeiro.
3. CONQUISTA: o heri ou herona mergulha numa luta de vida ou morte com a bruxa, que leva inevitavelmente
morte desta ltima.
Resumo da obra
Espelhos Partidos conta a histria da paixo vivida por Flvia, uma adolescente de quinze
anos, por um homem que tem o dobro de sua idade. Manipulada pelo egosmo e pela momentnea
falta de sensibilidade de Jlio, essa paixo nasce, cresce e evolui em encontros secretos, dentro
de uma aura de proibio, o que, por si s suficiente para envolver uma garota romntica s
antigas como Flvia. Alm disso, o fato de o pai ter-se separado de sua me, ter-se casado com
uma mulher bem mais jovem e ter com ela um filho, somado amargura que disso resulta para a
me da garota, levam-na, talvez inconscientemente, a querer viver o outro lado do amor. Explica-
-se: a me de Flvia est to centrada em seu prprio abandono, que no consegue ver em sua
filha, o ser imaturo e perdido em sentimentos conflitantes.
Flvia quer que Jlio abandone a mulher para viver com ela, a outra uma identificao
em espelho, ainda inteiro. Quando Jlio volta conscincia e reconhece seu erro, quando o
romance secreto descoberto, Flvia se v incompreendida e sozinha, ameaada ainda mais
pelo namoro/noivado da irm, Lgia, que, ao contrrio, segue todos os padres sociais. Por meio
de atitudes irracionais, cartas annimas, recados na caixa postal do telefone, Flvia busca trazer
Jlio para si, porque insiste em acreditar que ele a ama o espelho aqui j se encontra partido,
pois Flvia no se enxerga mais nele.
Finalmente, ajudada por Virginia, amiga e psicloga, Flvia retoma as rdeas da prpria
vida e d os primeiros passos em direo ao amadurecimento que resulta de toda essa experincia.
Estrutura da obra
Narrado em primeira pessoa, Espelhos tem a viso focada pela unilateralidade, e, apesar
da impresso de presente, Flvia narra os fatos depois de t-los vivido, depois de ter amadurecido.
Isso se percebe primeiro pela iseno com que ela conta, sem censura, tudo o que fez; segundo,
pela capacidade de analisar os fatos, de autoanalisar as prprias atitudes, sem complacncia.
Mas, em nenhum momento, o leitor tem acesso ao universo mental de outros personagens. Esse
aspecto refora a viso do desenvolvimento da personagem dentro da perspectiva de Cashdan3
RO
TE
IRO
DE
LE
ITU
RA
- P
gin
a 3
RO
TE
IRO
DeL
eitu
ra -
Pg
ina
3
DeLeitura um selo da Editora Aquariana
DeLeitura
A linearidade temporal se desenrola numa trama narrativa intrincada, que se arma pela
fragmentao em quatro partes, do presente narrativo, como se diluindo a experincia nas partes
do dia, ou seja, o momento d a brecha no para a ao, mas para a anlise: manh (a travessia),
tarde (o encontro), noite (a conquista) e madrugada (a celebrao), armada em flash-back de
uma histria que est para atingir seu ponto mais crtico: a resistncia, ou a persistncia no erro,
que o que move Flvia.
Dentro de cada parte, a narrativa se desenvolve em captulos que tm como epgrafe um
trecho de um conto africano Marama e o rio dos crocodilos, um conto que tambm no tem
fadas, mas onde aparecem elementos fora da realidade concreta, podendo ser, por isso,
classificado como conto maravilhoso. A epgrafe estabelece um dilogo explicativo com o captulo
que inicia.
Percebe-se que, se Espelhos Partidos no tem fadas, tem elementos que podem caracteriz-
-lo como narrativa maravilhosa, ainda que seja atravs da imagem reflexa. No conto Chapeuzinho
Vermelho, por exemplo, no existem fadas, mas o lobo personificado o elemento maravilhoso.
Aqui, no existem lobos, mas existem homens maduros que alimentam seu ego de juventude,
Jlio se refugia de uma derrapada matrimonial na juventude inexperiente de Flvia, e s percebe o
mal que lhe causou depois de feito o estrago. O pai se recupera de um casamento desgastado
com uma encantadora mulher mais jovem.
No existe o felizes para sempre, mas fica ao menos a promessa de uma histria que se
inicia, desta vez de modo mais tradicional, Era uma vez.... As fadas foram substitudas por mulheres
corajosas que encaram seus problemas de frente e decidem resolv-los a despeito de toda dor.
muito interessante se observar que a madrasta, arqutipo de aspecto negativo,
ameaador, dominador ou sufocador, ora se manifesta na figura da me, da irm, do prprio
Jlio, numa faceta masculina, mas tambm na prpria Flvia, quando esta rouba de si mesma
a autoestima, o amor prprio. Deste modo, vencer a madrasta, como faz Marama, princi-
palmente vencer esse lado submisso, obsessivo. E a, os espelhos funcionam novamente, pois
ao trabalhar sua autoestima, Flvia acaba por mostrar a sua me o caminho do resgate. A
despeito dos aspectos negativos presentes na histria, o que predomina a esperana, que d
o sentido do maravilhoso da vida.
Os espelhos esto partidos no ttulo, no tema, pois a face que primeiro se olhou no
mais a que se viu, e na estrutura, pois o conto sem fadas vai se fragmentando, formando um
quadro de cacos. A estrutura repete o ttulo, pois se desenvolve em espelho, a imagem se reflete
e se explica num processo de auto-reflexo. Mas ao final, cada caco reflete sua imagem e o todo,
como peas de um quebra-cabea real.
RO
TE
IRO
DeL
eitu
ra -
Pg
ina
4
DeLeitura um selo da Editora Aquariana
DeLeitura
Tema da obra
O tema principal , sem dvida, a busca do autoconhecimento, pela via do amor, quer
dizer, conhecer-se, reconhecer-se, perceber o que se sente. Mas, talvez o aspecto mais importante
desse tema seja a oportunidade de conhecer e encarar o prprio lado escuro, o lado que no
socialmente aceito, que rasga a mscara de boazinha da face que os outros veem, mas, sobretudo
da que se mostra no prprio espelho. E isso que fragmenta esse espelho. Resta da o trabalho
de, como diz Ceclia Meireles, buscar Em que espelho ficou perdida a minha face?, ou melhor,
em que caco...
Aparecem ainda como temas secundrios:
relacionamento entre pais e filhos, quando a diferena de mentalidade interfere nos
relacionamentos;
relacionamento entre irmos, quando as diferenas se manifestam claramente.
Sugestes de trabalho
Trabalho de leitura extraclasse
1 passo Leitura total da obra
Sem direcionamento, com data marcada, por partes, ou no todo, visando ao conhecimento
da obra, e s primeiras impresses. Nas datas marcadas, o professor pode comandar o que se
poderia chamar de questionamentos de 1 instncia: em forma de debate, os alunos fariam quase
um julgamento das atitudes de Flvia (ainda sem muita elaborao, para que os preconceitos e
prejulgamentos se manifestem. interessante, nessa fase, que o professor faa anotaes
detalhadas das posies mais marcantes, para us-las no debate final.
2 passo Dividir a classe em trs grupos de trabalho
Grupo 1 l e analisa os elementos da narrativa do conto africano;
Grupo 2 l e analisa a abertura de cada parte (o que conta, o que anuncia);
Grupo