Rumo à Cura
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29 • CORREIO BRAZILIENSE • Brasília, domingo, 13 de setembro de 2009
Pesquisadores do Laboratório de Me-tabolismo da Célula Tumoral, do Insti-tuto de Ciências Biomédicas da Uni-versidade de São Paulo (USP), deram
um importante passo rumo à cura do glioma,um dos tipos mais comuns e mais agressivosde câncer cerebral. A novidade está na desco-berta de que o ácido gama-linolênico, subs-tância presente em alimentos como nozes eem óleos vegetais, faz com que o tamanho dostumores diminua e a formação de microvasossanguíneos seja menor.
O glioma é um tipo de câncer que atinge aglia, um conjunto de células que envolve os neu-rônios e são responsáveis por sua sustentação enutrição. A doença representa 5% de todos oscasos de câncer no mundo. Estima-se que ematé 95% dos casos os tratamentos atuais comquimioterapia, radioterapia e cirurgia não con-sigam conter o avanço da doença, levando a bai-xos índices de sobrevivência. O glioma foi res-ponsável pela morte do senador americano TedKennedy, no mês passado.
A pesquisa da Universidade de São Paulo(USP) durou sete anos, e resultou nas teses dedoutorado do dentista Juliano Miyake e do far-macêutico Marcel Benadiba, orientados pelaprofessora Alison Colquhoun. Eles injetaramcélulas doentes em dois grupos de ratos, incen-tivando o desenvolvimento de gliomas. Após14 dias, foram instaladas bombas osmóticasembaixo da pele dos animais. Em um dos gru-pos, essa bomba levava ácido gama-linolênicopara as áreas afetadas pela doença. No outro,era bombeada uma solução líquida cerebralsintética, que não tem qualquer ação no orga-nismo das cobaias.
Após 14 dias injetando a substância nos ani-mais, os pesquisadores verificaram que, com-parando os dois grupos, os animais que rece-beram o ácido tinham tumores 75% menores, ea quantidade de vasos sanguíneos que alimen-tavam as células cancerígenas era 44% menor.O ácido também diminuiu em 32% a concen-tração de uma enzima que destrói substânciaslocalizadas entre as células tumorais e facilita oseu crescimento. “Após análise dos tumores,verificamos que o ácido tem um efeito anti-ploriferativo no glioma dos animais, sem afetaras células próximas que estavam saudáveis”,explica Marcel Benadiba.
Contra a remissãoOs atuais tratamentos disponíveis para o
glioma são pouco eficazes, pois o tipo de câncertem alto poder de se espalhar por regiões saudá-veis do cérebro e da medula espinhal, o que fazcom que a cirurgia para sua retirada seja muitasvezes inútil, pois os tumores acabam se desen-volvendo em outras áreas. A substância pode serusada no futuro para diminuir o tamanho e a vi-talidade dos tumores, para facilitar a sua retira-da e evitar que eles reapareçam posteriormente.
De acordo com Marcel Benadiba, o efeitoocorre pela incapacidade das células canceríge-nas de lidarem com o excesso de ácido gama-li-nolênico. “A substância desregulou a produçãode diversas proteínas que estão diretamente en-volvidas no processo de reprodução celular.Com uma quantidade menor dessas proteínas,as células de câncer não conseguiam completarseu ciclo de crescimento.” Eles chegaram a estaconclusão após verificarem na amostra umagrande quantidade de células em estágios ini-ciais de desenvolvimento, que não conseguiramatingir a fase adulta.
Outra vantagem constatada da substânciafoi a sua ação seletiva. Diferentemente damaioria dos tratamentos quimioterápicos atu-ais, em que a medicação destrói tanto célulascancerígenas quanto saudáveis, gerando diver-sos efeitos colaterais, na ação do ácido gama-li-nolênico a alteração ocorreu apenas nas célu-las doentes. “Não encontramos toxicidade naspartes saudáveis do cérebro. Isso se dá por umacapacidade das células normais de metabolizaro ácido, impedindo que ele atrapalhe o ciclocelular”, explica Marcel.
Os pesquisadores aguardam agora a autori-zação de órgãos de controle, para que a subs-tância seja testada em humanos. A nova fasedos estudos deve ser feita em centros de pes-quisa parceiros do Laboratório de Metabolismoda Célula Tumoral da USP. O pesquisador Julia-no Miyake espera que o tratamento tenha umefeito semelhante em humanos. “Apesar de pa-recidos, os organismos de humanos e ratos sãodiferentes, e somente os testes em pacientesvão comprovar se é possível desenvolver ummedicamento a partir do ácido.”
Embora a descoberta não resulte em umasolução imediata, os cientistas esperam que elapossa abrir caminho para novas pesquisas queajudem na luta contra o câncer. “Talvez não se-ja a cura definitiva, mas pode ajudar a prolon-gar a vida e facilitar o tratamento dos pacien-tes”, completa Miyake.
Rumo àcura
Pesquisadores da USPdescobrem como o
ácido gama-linolênico,presente em alimentoscomo nozes e em óleos
vegetais, faz ostumores cerebrais
chamados gliomasdiminuírem de
tamanho
29 • CORREIO BRAZILIENSE • Brasília, domingo, 13 de setembro de 2009