Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

15
l A NATUREZA DA SOCIEDADE A Integração e assimilação i r ..--- ^v f ..- ^ f s três culturas delZuny de Dobu, e do^vig^iutiUíiâo^\ (V sgojroenas conjurrtos de_ actos e de crencas~oetero- géneosL_Cada uma delas tem f, ^KdxAAWXXkfl VJL4-U-I-*. U1.Í.4M. M.Vr-lMt? VWAÍJ. W|1vV,ll I \Jt& L/OL& Cl ^JltVrf / tendem _as_suasi_ BPjrmas^e^^^utaje^que as suas msri^fflès~ , ^. _/ X^estimulam. Diferem umas das outras não sj5jx>rgue certa feâcão ^ \f etgjtuma e f y . . y sob duas formas_diferentes. Diferem ainda mais porque se orientam, nos seus conjuntos,, em., direc- çõesT^^SSfiiVJSêguém" caniinHós deferentes na prossecução de fins diferentes, e sobre esses fins e sobre esses meios, numa sociedade, não se podem fazer juízos em termos dos de outra sociedade, porque, essencialmente, eles são incomensuráveis. Nem todas as culturas, naturalmente, deram forma aos y^ ^ seus milhares de elementos de comportamento segundo um y < padrão equilibrado e rítmico. Como certp^JndríiduQs^cerbus i $* orjlens sociais .não subordinam jsjsujs^jcíòddades^-uiaajQifc 1 ^ ti\!ação_rej guladpra. Dispersam-se. Se, em certas ocasiões, parece orientarem-se para certos fins, «outras tomam bruscamente [247]

Transcript of Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

Page 1: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

lA NATUREZA DA SOCIEDADE

AIntegração e assimilação i

r..--- ^v f ..- ^ f

s três culturas delZuny de Dobu, e do^vig^iutiUíiâo^\ (V

sgojroenas conjurrtos de_ actos e de crencas~oetero-géneosL_Cada uma delas temf, ^KdxAAWXXkfl VJL4-U-I-*. U1.Í.4M. M.Vr-lMt? VWAÍJ. W|1vV,ll I \Jt& L/OL& Cl ^JltVrf

/ tendem _as_suasi_ BPjrmas^e^^^utaje^que as suas msri^fflès~ , . _/X^estimulam. Diferem umas das outras não sj5jx>rgue certa feâcão ^ \f

e tg j tuma e f y. . ysob duas formas_diferentes. Diferem

ainda mais porque se orientam, nos seus conjuntos,, em., direc-çõesT^^SSfiiVJSêguém" caniinHós deferentes na prossecuçãode fins diferentes, e sobre esses fins e sobre esses meios, numasociedade, não se podem fazer juízos em termos dos de outrasociedade, porque, essencialmente, eles são incomensuráveis.

Nem todas as culturas, naturalmente, deram forma aos y^ ^seus milhares de elementos de comportamento segundo um y <padrão equilibrado e rítmico. Como certp^JndríiduQs^cerbus i $*orjlens sociais .não subordinam jsjsujs^jcíòddades^-uiaajQifc1 ^ti\!ação_rejguladpra. Dispersam-se. Se, em certas ocasiões, pareceorientarem-se para certos fins, «outras tomam bruscamente

[247]

Page 2: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

lJangencjal^aparentemente inconsistente com tudoo que as precedeu, que não deixa jjrèyer ó que se seguirá.

Estajalta de mtegra.ç|a,.p.arece ser Jão^característica^deumas como a extrema integração o é de outras. E ela não de- riva era todas das mesmas circunstâncias. Tribos como as do . vinterior da Colúmbia Britânica incorporaram na sua cultura- feições que foram buscar a todas as civilizações circunvizinhas. 4^°ESãm_os_seu§..padrões da maneira.de.considerar: .a fortuna v«de uma^zona cultural^ partes das suas práticas religiosas de """outra, elementos contraditórios ainda de outra. A sua mitologiaé uma mistura de lendas incoordenadas de heróis culturais pró- ^venientes de três. diferentes ciclos míticos representados em "4regiões circunvizinhas. No entanto, a despeito de tão extrema '-iaceitação das instituições alheias, a sua cultura dá uraaJm- ^pressão de pobreza extrema. Nada é suficientemente evoluído ípara dar corpo à cultura. A sua organização social é pouco Helaborada, o seu cerimoniai é mais pobre do que o de qualquer N>outra, as suas técnicas de cestaria e de fabricação de contas ^é fraco pretexto para actividades artísticas. Como certos indi- S<víduos que foram indiscriminadamente influenciados em várias Qídirecções, os seus padrões tribais de comportamento são dês-/*coordenados e casuais. ^ - —"

Nestas tribos da/C^úmbia_ Britânica] a falta de integraçãoparece ser qualquer coisa mais funda do que uma mera exis-tência .sUnultânea de feições de diferentes povos circunvi-zinhos. Cada faceta da vida tem a sua organização própriamas que não se reflecte em qualquer outra. Na puberdadedá-se muita importância à educação mágica das crianças paraas várias profissões e à aquisição de espíritos guardiões. Nasplanícies ocidentais esta prática da visão permeia absoluta-mente o complexo conjunto da vida adulta, e as profissõesda caça e da guerra são dominadas por crenças aparentadas.Mas na Colúmbia Britânica a invocação da visão é umaactividade organizada, e a da guerra uma outra completa-

l

V

>•*Vi

mente distinta. Semelhantemente, festas e danças na ColúmbiaBritânica são actividades estritamente sociais. São aconteci-mentos festivos em que os actores imitam animais para diver-timento dos espectadores. Mas é absolutamente tabu imitaranimais que entram no número dos que podem ser espíritosguardiões. Os festivais não têm significado religioso nem sãotomados como oportunidades para transacções económicas.ǧda_actiyidade,é,_por assim dizer, insulada. Forma um com-plexo particular, e as suas motivações e fins são exclusivos doseu campo próprio e não se estendem à toda a vida do povo.Tão-pouco a cultura em conjunto é dominada por qualquerreacção psicológica característica.

Conflito de elementos heterogéneos

. Nem sempre é possível separar a ausência de integraçãocultural deste tipo da que é devida mais directamente ao factode um povo estar exposto à acção de influências contraditórias.

muitas vezes nas zonas de contacto dedefinida. ~ Estas zonas raianas .estão . abastadas do contactoíntimo com aiT tribos mais características da sua cultura eexposlS ã fortes ; influêricias estranhas. Daí resulta poderemelas "muitas" vezes assimilar ria sua organização social ou nassuas técnicas artísticas os mais contraditórios métodos. Àsvezes refundem o material heterogéneo-imim. novo conjuntoharmónico, conseguindo um resultado essencialmente diferentedo de "(qualquer das culturas bem estabelecidas com as quaispartilham tantos aspectos de còmpoitamentb. Pode "sucêHerque, se conhecêssemos bem a história passada dessas culturas.,,chegássemos a verificar que, dado um período suficientementeextenso, elementos desarmónicos que se foram buscar a cul-turas estranhas tendem à constituir um todo harmónico. Sena

[248]

Page 3: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

dúvida, em muitos casos dá-se isso. Mas numa secção trans-versal de culturas primitivas contemporâneas, que é tudoquando podemos estar certos de apreender, muitas regiõesmarginais manifestam-se claramente por uma dissonânciainiludível.

Noutros casos aJaUaj^ntegraçãojan certas culturas édeyjd^a_ou^sjcircijns.tânGÍaSí -Não é «Ta tribolnarginal cujacultura pode ser incoordenada, mas a tribo que se separa dassuas congéneres e assume a sua posição numa região decivilização diferente. Em tais casos o conflito mais salientetrava-se entre as novas influências que se fazem sentir sobre opovo da tribo e aquilo a que podemos chamar o comporta-mento nativo. O mesmo se pode dar com um povo que se nãodesloca, quando_jun^_tt3bfl,.^uer._de_graQde .prestígio_quermu^o^numerosa^ consegue introduzir grandes transformaçõesnuma zona em que se estabeleça de novo.

Um estudo profundo e capaz de compreender o fenó-meno de uma cultura genuinamente não _qnentada teria uminteresse extraordinário. Provavelmente a natureza dós con-fÍÍtoT~êspeTífitos-^otr"a fácil aceitação de novas influênciasrevelar-se-ia mais importante do que quaisquer fórmulas, maisilusórias do que .esclarecedoras, como «falta de integração»,mas quais estas seriam, isso é que não é possível conjecturar.Provavelmente ejna culturas até as mais não orientadas, serianecessário tomar em consideração, ajuntamento^vque~-tendejna pôr de parte elementos: djssp.n,antes. e..es_tab)elecer.,,raais. .fir-memente elementos escolhidos. O processo talvez até se reve-lasse com maior clareza em virtude da diversidade de materialsobre que operasse. .

Alguns dos exemplos mais ao nosso dispor do conflitode elementos dissonantes provêm da história passada de tribosque • atingiram total integração. Os Kwakiutl nem semprefruíram da civilização consistente que descrevemos. Antes dese terem estabelecido na costa e na Ilha de Vancouver, parti-

flharam em geral da cultura do povojSalisjy do Sul. Ainda hojeconservam mitos, e a organização por aldeias, e a termino-logia de parentesco, que osSalish são individualistas,insignificantes^ (praticamente das mesmas .oportunidades .qu.e OS-OSP""05- A sua

importância assenta na sua perícia de caçador, na sua sorteao"jOgoTòu rio êxito que conquista ao utilizar os seus direitos,no campo do sobrenatural, como feiticeiro ou bruxo. Seriadifícil encontrar cultura com que a sua mais contrastasse doque a da Costa do Noroeste.

Mesmo este extremo contraste, porém, não milita contraa aceitação, pelos^KWãluUSÇ)do; padrão estranho. .Estes che-garam a considerar propriedade privada até nomes, mitos,"postes "de'casas, espíritos-protectores, e o direito de~sèreminiciados em certas sociedadèsV Mas ò ajustamento que"íoinecessário ainda se manifesta nas suas instituições, e ressaltacom grande relevo exactamente naqueles pontos em que asduas ordens sociais diferiam, isto é,no§jn£canismos da orga-nização sociaL Porque, atxísarJejos^Kw^lãuU^dgEtarem^Jtodoo sistema de prerrogativas e potíatches da Costa do Noroeste,flãônãdòptàram igualmente os doridamente ^atriJfoeares^dasí írlbos BõT^òrte, que"constitufam um quadro estável dentro«CiTque se~~ttãnsmitiám os privilégios. Nas tribos do Norte "o _indivíduo ãjústava-se automaticamente ao título de nobrezaa que por nascimento tinha direito. O indivíduo, entre osKwakiutl, como vimos, passava a sua vida a negociar paraobter esses títulos e podia apresentar o direito a um qualquerque fora propriedade de qualquer ramos de sua família. Os_Kwafeiutl adoptavam o sistema total de prerrogativas, mas

„,,..;.-:> —~-i='--~---^-t>^'-*^" — •„-,.,* ,-„.,_., ......XÍT.,~ J.; v-----.. --.^-;>.~- v --,•'-- '^' -~''•"*-'* •-". -'-•M

permitiam ao indivíduo liberdade no jogo do prestígio, quecoQttãStiayá com-o^sistema de castas das tnbõs"'daJílolfíçreconservayânj .ps velhos costumes dp sul apic tinham tfaziooconsigo para a costa.

v-

[250] 0251}

Page 4: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

Certas feições culturais bem definidas dos KwaMutl sãoos reflexos de conflitos específicos entre as velhas e as novasestruturas. Com. o novo relevo atribuído à propriedade, asregras da herança adquiriram uma importância nova. As tribosSalish interiores estavam laxamente organizadas em famíliase aldeias, e a maior parte dos bens destruíam-se por ocasiãoda morte. O sistema do clã das tribos do norte, rigidamentematraineai^jaap-lEKfc^taram uma solução de compromisso afirmando o direito de ogenro reivindicar privilégios dó" seu sogro, privilégios de queaquele™era '^^&am^^"rfãiâvâít6^3&'''seas filhos. Os bensherdados êrãm-nõ, põlsi 'por'Via"materna, mas saltando, poraSÍ5:![l![1í?gatívas não eram gozadas maFãpjnâs possuídascomo depósito.Còmò~vimòsr todos" esses privilégios eram negociados segundoas convencionais técnicas do potíatch. Tratava-se de umaforma de adaptação desusada e que, claramente, era uma solu-ção de compromisso entre duas ordens sociais incompatíveis.Num capítulo anterior dissemos como assim se resolvia oproblema de harmonizar duas ordens sociais antagónicas.

De modo que a integração pode dar-se perante conflitosfundamentais. Os casos de não orientação cultural podem muitobem ser menos numerosos do que de facto parecem. ^Iá.semprea possibilidade de que seja a caracterização da cultura,., não aprópria cultura, o que seja falho de orientação. Por outro lado,a natureza da integração pode estar meramente fora da nossaexperiência e ser difícil de notar. Quando estas dificuldadescircunstanciais se removam, a primeira através de um melhortrabalho de campo, a segunda por uma análise mais arguta, aimportância da integração das culturas pode tornar-se aindamais clara do que hoje é. Não obstante, é importante reconhe-cer o facto de que nem todas as culturas são, de modo nenhum,as estruturas homogéneas que delineámos no caso dos Zunie dos Kwakiutl. Seria absurdo querer meter qualquer ciiltura

dentro do leito de Pro||iíi§}de. Jima_~padraõrtTperigõ~de pôr dejiarte^ f actos importantes que nãoilustrem a proposição principal é, na melhor das hipóteses, bas-tante grave. E inadmissível lançarmo-nos numa operação quemutila o assunto e levanta novos obstáculos contra a nossaeventual compreensão deste.

Generalizações fáceis sobre a integração da cultura sãoparticularmente perigosas em «trabalhos de campo». Quandose está a dominar a língua e todas as particularidades de com-portamento de uma cultura esotérica, preocuparmo-nos com asua estrutura pode constituir um obstáculo contra uma ver-dadeira compreensão dela. O «trabalhador de campo» deve serestritamente objectivo. Tem de relatar todo o comportamentode natureza relevante, tendo o cuidado de não seleccionar,de acordo com qualquer hipótese aliciante, os factos que seajustem a uma tese. Nenhum dos povos de que tratámos nestevolume foram estudados ín loco com qualquer ideia precon-cebida de um tipo de comportamento consistente de que essacultura era exemplo, ^empkigja^jegistava.-se . Jtal_£gm0_seapresentava, sem qualquer tentativa para a. fazer. coerente_con-sigõ "própria.' M representações do todo sSo, assim, para oestudioso muito mais convincentes. Da mesma maneira, ehxdiscTisíoeTTiSoricas de "cultura toda a generalização acerca daintegração da cultura será vazia de sentido, na prppíjrçã.o__doseu carácter dogmático, e universalizado.JDo que necessitamosé ^Informações pormenorizadas acerca de limites de com-portamento contrastante e das ; motíy^«jqÍI3lC^S® Wnuma sociedade e não o são noutra. Não necessitamos de umatábua de ccayfiguração inscrita na plaitaíorma de uma escolade etnologia. Pelo contrário, as diferentes 'virtudes quejUfo^

base das suas instituições, são essenciais à compreensão tantorentes ordens sociais como da psicologia individual.

A relação da integração cultural com os estudos da civi-

[253]

Page 5: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

li/ação Ocidental e, consequentemente, com a teoria socioló-gica, presta-se facilmente a equívocos. Apresenta-se muitasvezes a nossa própria sociedade como um exemplo extremode falta de integração. Apsua,enprmq.,çoroplexidade e as suasrápidas; transfpnnaçõesde geração-,.para., geração,...ocasionaminevitavelmente uma falta de harmonia entre os seus elemen-tos, q^ráa^e^tejHn_iS(^edade5,mais-simple5. Mas .na maiorparte dos estudos^exagera-se e falseia-se a ausêncíâ~3ê"iníêgra-çãõ, em virtude de um simples errò'dé t&nícà. À 'sociedadepnmitiyC.p:^Ocidental, porém, está estratificada, e grupos sociais {classes)

. ___^<-_Í *-~-i- i-i-i .;;—*:*.-.-.*.v ;;,.- .:;...;-.---. :.*.-.. --^i-Q-^-^^^^-ífraí VJív-v.w.i-.i-iii.jwis.; '

diferentes, contemporâneos e no mesmo local, guiam-se porpádirÔes"cómpletamente diferentes e são actuados" por" dife-rentes motivações.

O problema da integração de uma cultura

sti / O esforço para aplicar ajdeia de área antropológica de

'-• (cul tura à sociedade moderna só~pÕ3ê~"sêr fecunda ení grau"muito limitado porquè7~hõjê, fõrmãs~diíe"fêrités W^viver "£|õsão essencialmente uma qiiéstão de disÉribuiçSò éspacíaL Há,entre os sociologistas, uma certa tendência para perder tempocom o «conceito de área de cultura». Verdadeiramente tal«conceito» não é uma realidade. Quando certas fejiç8es__ge

,/' agnlp3mr3|éõg>a|icgmente, devem... jcratar-se geograficamente.Quando tal não se dá, é ocioso erigir à categoria de princípioo_que," na rnêíhor das hipóteses, é uma íaxa categoria empírica.fta nossí civilização existe, nó ponto de vista da antropologia,uma cultura cosmopolita uniforme espalhada por todas aspartes do globo, mas existe também uma divergência semprecedentes entre à classe operária e as Quatrocentas (l), entre

(z) As quatrocentas famílias mais ricas do Mundo: mais ricas e,por consequência, mais poderosas.

[254]

aqueles grupos cuja vida tem os seus centros na igreja, e aque-les em que ela se concentra na «pista de corridas». ,A_relativaliberdade de escolha que existe na sociedade moderna tornapossívelL a formação deliberada de, gnipos,7irflj;H;manjrê_jjuedefendem princípios tão diferentes como os Clubes Rptários^C^jígsjggrich-Village (*). A natureza dos processos culturaisnão muda com estas condições modernas, mas a unidade queos inclui e dentro de que se podem estudar, já não é ogrupo local.

, A integração da cultura tem importantes consequênciassociológicas e afecta várias questões debatíveis de sociologiae psicologia social. A primeira é a controvérsia sobre se a so-ciedade é ou não um organismo. A maioria dos. modernossociologistas e psicologistas sociais tem afirmado, com argu-mentos complicados, que a sociedade não é, e nunca poderáser, nada que se sobreponha e se eleve acima dos espíritosindividuais que a compõem. Como parte da sua exposição,.t|m_ atacado_vigorosamente a «falada do conceito do grupo'»,a interjgretacão que, julgam eles, tomaria~o~^eniarr'é"o agiruma função de certa entídade. mítíca, o grupo. Ao Contrário,os que estudaram diversas culturas, em que o material mostrade uma forma suficientemente clara que todas as_ leis_ dapsicologia individual são incapazes de mterpretarjM Jiactos,ténvse muitas vezes exprimido nunuT fraseologia mística. ComoDurkheim, peroram: «Ò indivíduo" não existe», ou, como^KrpeEêri mvõcãnTuinã força que este designa por «ò~superor-gãnicõ;»^ para" expljç^rr^o ;prpce$sp.s. cultural. •

Tudo isto é em grande parte uma questão de palavras.Nenhum dos chamados organicistas crê em qualquer ordem doespírito que não seja o espírito. dos indivíduos na cultura, e,ao contrário, um tão vigoroso crítico da «falácia de grupo»como Allport, admite a necessidade do estudo científico dos

(3>( O Bairro <Ia Boémia de Nova Iorqu«X

o

Page 6: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

grupos, «âmbito da ciência especial da sociologia». A con-trovérsia entre os que consideram que era preciso concebero grupo como alguma coisa mais do que. a soma dos seusindivíduos, e os que o negam, tem-se travado em grande parteentre estudiosos que scjsejyem je^espécies^difcrentes de^ados. j JDurkheim, partindo de uma longa familiaridade com diversasculturas e especialmente com a cultura da Austrália, afirmoureiteradamente, muitas vezes numa fraseologia vaga, a necessi-dade dos estudos das culturas. Os sociologistas, pelo contrário,tratando principalmente da nossa própria cultura estandar-dizada, tentaram fazer ruir uma metodologia cuja necessidadenão se fazia absolutamente sentir na sua .tarefa.

E evidente que a soma de todos os indivíduos em Zunierige uma cultura que excede e supera o que esses indivíduosquiseram e criaram. Ojgrupo é alimentado por tradição; é('dependente de tempo». É per^^aMtê^coinSistente chamar--Ihe um todo orgânico. Õ dizermos de um tal grupo que eleescolhe os seus fins e tem objectivos deliberados; "jOiSsaconse&uSáãã"lnttudíveI do animismo engastado nà^Tttõssà1 lin-

_^_— '~~ ji =C- 5>'4"F'v'17- " J •;;-••'*•''•-"" ••'•"•>*-* v -•^*í•-----:••irf:J•--•i'^^^-v,--«^.-.*?^.TW^^I•^^I^3.•^----^»rfi^—••i-71'.'íí..^-T—*.V^.«TY':*X

cuagèm; e não devia ser erguido, contra o investigador cpmòSi Sr. .X _ ._•-, " - -.:• •' ''•'•.-•'•:'- .i'-->~'=^"'--'--' • ' ' ' • - - * • • •.. ;- •:, .x..; •. :'-.;!"t- . . . . . . . ,. •>"--.• •••=.'Tl--" ' • • • ; . • ~~j.''.Jí

uma prova de jjma^ filosofia ,Tnusgca,,. Estes fenómenos degrupo" devem ser estudados, se quisermos compreender a his-tória do comportamento humano; e a psicologia individualnão pode.jgojL.súJinieipretar..o&*factos, .que se- nos,.,.deparãm.

Em todos os estudos do costume social, a dificuldade damatéria reside em o comportamento que se estuda ter depasar pelo fundo-da-agulha da aceitação social, e só a história,no seu sentido mais lato, pode relatar essas aceitações e re-jeições sociais. O que está em jogo não é só a psicologia, étambém a história, e a história não é de modo nenhum umconjunto de factos discernível por introspecção. Por conse-quência aquelas interpretações do costume que fazem derivaro nosso esquema económico da compita humana, a guerramoderna, da combatividade humana, e todas essas explicações

[256]

fáceis e baratas que encontramos em magazines e livros mo-dernos, soam ao ouvido do antropologista um pouco a oco.Rivers foi um dos primeiros a tratar com vigor esta questão.Faz ele notar que em vez de tentar Jnterpretar o «feudo de

interpretar aràigaajça_a~^partir. jda instituição («Rudo de jãrnjlIhantemente, é necessário estudar o ciume~à~Híz" do seu con-dicionamentq pelas regulações sexuais e pelas instituições deposse locais.

A_difj£yldade do caso das interpretações simplistas _dacultura em termos de comportamento individual não está emessas interpretações serem as da psicologia, mas em elas igno-rarem ai História e o processo histórico da aceitação e rejeição,

digamos assim, das feições. Qualquer inter-pretação configuracional de culturas é, também, uma expo-sição em termos de psicologia individual, mas está na depen-dência da história, tanto como na da psicologia. Justifica-seque a atitudejpionisScajseja pos^a^ehijtlèvó.nãs instituiçõesde certas culturas^ por virtude de ser umajpossibilidade cons-tante na psicologia individual; mas justifica-se também que oseja em certas culturas é não noutras,j3or virtude de aconte-cimentõs~rIisWrÍcÒs"que aqui^ promoveram o seu desenvolvi-merãt<Qi~ã.K o tornaram inviável. Em pontos diferentes nainterpretação de formas culturais, são igualmente necessáriastanto a história como a psicologia; não podemos querer queurna faça o trabalho da outra. ^

.Y

-r

A interpretação culturalcentra a jnÉerprefação biológica

Isto cpnduz-nos a uma das mais ardentemente debatidascontrovérsias que afectara, a antropologia configuracionaLÉ ela o conflito referente às bases biológicas dos fenómenos

17. f, DE [257]

Page 7: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

sociais. Eu tenho-me exprimido como se o temperamento-humano fosse regularmente constante por toda a parte, comose em todas _as_sociedades sè^érífíclísj^ "potencialmente umadísGibuição grosseiramente semelhante de elementos" cuUurais,e como se a cultura .escolhesse dentre estes, de acordo com osseusjradrões^tradicionais,e moldasse uniformemente a vastamaioria dqs_indiylduos.-A experiência do frranse.\por exem"pio, de acordo com esta interpretação, p uma ;pnrpnçjalidaded^jjm_^rJ^nj^erp_jie.,,MdÍ¥4d^Quando ela é respehad^e_recoinpjgnsada, uma proporção con-^siderávei deles atingi-la-á ou simulá-la-á, mas na nossa civili-zação, em que "è~cÕnsidérádà~uma mancha no escudõ~dài fa-mília, essa proporção diminuirá e os indivíduos que de!a~sãocajpazes serão classificados de anormais.

"Qvfes existe outra mtèroretãca^ p^ssíveOTeinje aj^ujmen-tado•vigorosamente que essas feições não são seleccionadasculturalmente, pretendendo-se antes que elas são jransmfficíâsbiologjam2ente.,J>eguncíó esta""interpretação a distinção é racial,e os índios das Planícies evocam vàsões porque essa flecessí-dade é transmitida nos cromossomas da raça. Semelhante-mente, as culturas Pueblo prezam a sobriedádèl: a moderaçãopor essa conduta ser determinada pela sua hereditariedaderacial. Se..a interpretação biológica é .válida,_então^ não jl àhistória que devemos recorrer, mas à fisiologia.

A esta interpretação biológica, porém, nunca foi dadauma base científica sólida. Para a demonstrar seria precisoque os que a apoiam apresentassem factos do âmbito da fisio-logia que explicassem, mesmo só um pequeno número de fenó-menos sociais que ,é mister interpretar. É possível que o meta-bolismo basal ou o funcionamento das glândulas endócrinaspossam diferir significantemente em grupos humanos diferen-tes, e que tais factos nos venham a permitir compreenderdiferenças em comportamento cultural.

Mas as correlações fisiológicas que os biologistas venham

a averiguar no futuro, no ponto em que respeitem à trans-missão hereditária de feições, não podem, mesmo na melhordas hipóteses, abranger todos os factos tal como eles; se nosapresentam» Os índios Norte-Americanos são biologkajnente

fõSòs 'um"comporta'-unTji um exemplo

dê uma só raça, e~nõ~ehcãhtõ não tmento cultural 'tinisíaco. A cultextirerno de motivações diametralmente opostas.- à. -atitude

;- DionhEÍaca; e esta cultura Apolínea é partilhada^ pelos outros"' Púeblos,. um grupo dos quais* páTH^^Jertencem ao subgrupoShoshoneano, largamente representado entre as tribos Dio-nisíacas, e com quem se afirma que os Astecas estão linguisti-camertte relacionados. Outro grupo Pueblo é o Tewa, intima-mente aparentado, sob o ponto de vista biológico e linguístico*

;com o Kiowa das planícies do Sul, este, não-Pueblo. De ma-l! neira que,, configurações culturais são coisas .locais e não estão

""correlacionadas com aparentamentos conhecidos dosr váriosgrupos. Semelhantemente não há unidade- biológica nas pla-nícies ocidentais que separe estes povos quje^£yocaiiv-xis5es,de \. As tribos que fiaTMtamTésta região provêm das '

largamente -dispersas famílias Algonkiana, Athabascana eSiouanà, e cada uma delas conserva a língua do- seu troncoparticular (3). Todos estes troncos incluem tribos que evocamvisões, segundo a; maneira dos Planícies, e- tribos que o nãofazem. Só as que vivem dentro dos limites geográficos dasplanícies evocam visões, como parte essencial das: qualidadesque são próprias de qualquer homem normal.

A-explicacão ambientaLéi ainda mais imperarivajjuando,cm vez da distribuição no espaço, consideramos a dtstribukSo

-. - .__^- - „!— ff*~- 1--~^-. ........ -,.m>X-.l»w.«í.<U,I .nCk. BlT.-~ - *..-,I.J.I»\.,..-T— - r—— — l - •>.,— -- .-— -rrt--"-' -*--'— -- l ' 1 " ES**

no tempo-^As mudanças mais radicais no comportamentopsicológico dferam-se em grupos cuj^ constituição biológicanão se modificou de maneira apreciávdt. Isto pode ser profu-

(3) Os grupos língnísticos, nestes casos estão relacionados com oparentesco biológico. '

[258]

Page 8: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

samente exemplificado no nosso próprio fundo cultural. A civi-li?ação europeia esteve tão sujeita a .um comportamento mís-tico, a epidemias de fenómenos psíquicos, na Idade Média,como o esteve 'no século xix, ao mais seco materialismo.A cultura mudou de preconceitos sem ter correspondentementemudado de constituição racial do grupo.

Mas as interpretações do comportamento em termos decultura não têm necessidade de negar que também nele enjraem jogo um elemento fisiológico. Negá-lo resulta de umadefeituosa interpretação das explicações em termos de ciência.A biologia não nega a química, ainda que esta seja insuficientepara explicar os fenómenos biológicos. Mas a biologia tambémnão é Obrigada a trabalhar segundo fórmulas químicas só por-que reconhece que as leis da química estão na base dos fenó-menos biológicos. Em cada campo da ciência é necessárioinsistir nas leis* resultados que mais adequadamente explicamas situações que ise estudam, e no entanto insistir também emque existem outros elementos, ainda que se possa provar quenão -têm importância capital no resultado final. Notar, pois,que as .bases biológicas do comportamento cultural na huma-nidade são na sua maior parte irrelevantes, não é negar que.existam. É apenas insistir no facto que,:os_.factores.históricos,são os que imediatamente actuam.

i forçada a uma .atitude dessegénero, .mesmo em estudos relativos .à nossa própria cultura.Experiências importantes recentes, referentes a feiçõesda per-sonalidade, mostram que o que é crucial, mesmo em feiçõesda .honestidade e das actividades orientadoras da chefia, são

ais. Ser honesta numa situação experi-mental, quase não dava qualquer indicação sobre se a criançaroubaria ou não, noutra situação. Conclui-se que :não__haviapessoas nonestaswlesgnestas, jnas sim_situações_Jipnestas-deso-nestas. Da mesma maneira, no estudo de chefes, provou-senão 'haver feições uniformes que pudessem ser apresentadas

como pjdjrâot,,mesmo.-na<, nossaL.S0ciedà<te. A função desen-volvia: o chefe, e as suas qualidades eram as que a situaçãopunha em destaque. Nestes resultados-, «situacionais» ,transpa-recia cada vez com maior clareza- que a conduta social,, aténuma sociedade escolhida, é «não simplesmente a expressãode um'"mecanismo fixado que predetermina um modo deconduta, específico, mas antes um conjunto de tendênciasque o problema específico que se nos apresenta faz surgirde maneiras variáveis».

Quando estas situações, que mesmo numa sociedadeactuam no comportamento.humano, se amplificam até grandescontrastes -entre culturas mutuamente opostas em objectivose em motivações, como sucede, por exemplo, em Zuni eRwakiutl, á conclusão a tirar é iniludível. Se o que nos inressa é o jgffiisortaffienty^train^pl é preciso começar por

umasociedãHé "dispõe.coiHTJreender as ,f,:^ ^...-—^^^..^Porque o' comportamento humano assumirá as formas" qitè"essas instituições sugerem, mesmo até extremos de que oobservador impregnado da cultura de que é parte, não podefazer a mínima ideia.

Um tal observador só verá os estranhos acontecimentos .de comportamento nas culturasjrue lhe são alheias, não na sua; j lprópria. Mas isto é, evidentemente, apenas um preconceitolocal e temporário. Não há razão para supor que haja qualquercultura que tenha sido imbufda. d&Jftma. sanidade..eterna^eunievenha a ocupar na história o aspecto^ de spluçjão únicajàa^problema ...humano* Mesmo já só cada nova= geração- está: mais-bí;m informada dos factos do que aquela que a antecedeu.O único caminho científico a seguir é considerar o melhorqu^ pudermos .a nossa própria cultura- como um exemplo,entre muitos outros, das várias configurações da culturahumana.

Q jjadr_ãp. cultural de qualquer civilização utiliza .um. certosegmento dó grande arco de possíveis motivações e propósitos

Page 9: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

humanos, tal .qual, vimoJo num ;capítulg...anterior,._íeomoqualquer euiturjr se utjífe;a. de. certas técnicas materiais^, oufeições culturais .escolhidas. O «xtenso arco ao longo do qualse distribuem todos os possíveis comportamentos humanosé demasiadamente grande e demasiadamente fértil em contra-dições para. que .qualquer cultura utilize mesmo qualquerfracção considerável dele. O primeiro requisito 'de uma culturaé fazer uma escolha. Sem esta não há cultura que consigasequer atingir inteligibilidade, e os objectivos que uma culturaescolhe para seu uso -e que apropria são coisa muito maisimportante do que o pormenor especial de tecnologia e a for-malidade de casamento que ela também escolhe da mesmamaneira.

.Aplicação .da lição que nos dão tribos primitivas\'

Estes diferentes segmentos do arco de comportamentopotencial que diferentes povos escolheram e que adoptaramnas suas instituições tradicionais, são aqui apenas exemplifi-cados pelas três culturas de que tratámos. É extremamenteimprovável que os objectivos e motivações que elas 'escolhe-ram sejam as mais características de todo o mundo. Escolhe-mo-las .porque sabemos alguma coisa sobre elas como culturasvivas, e por consequência podemos evitar as dúvidas semprepresentes na discussão de culturas que já não é possível veri-ficar por observação.directa. A cutowra dos índios Planíciesé uma daquelas, por exemplo, acerca de que temos vasta .infor-mação, e que é singularmente consistente. Os seus padrõespsicológicos ressaltam razoavelmente claros dos textos nativos,dos relatos dos viajantes e das reminiscências e das sobrevi-•«éncSas .de costumes recolhidas pelos etnologistas. Mas a euj-tura não funciona .há algum tempo, e uma dúvida razoável

[262]

surge a seu respeito. Não é fácil dizer como a prática se ajus-tava ao dogma e quais os expedientes a que comumroentese recorria para adaptar uma ao outro.

Nõo há «tipos» fixos

se podemconsiderar «tjpjos».,LjttO- sentido-de .representarem-íSna^i!

ixa de feições. Cada uma ddas é.uma-caracterizaçãoU. e .provavelmente.,não..se. repete.-inteiramente -em

qualquer outra parte do mundo. Nada seria mais desastrosodo que qualquer esforço para considerar todas as culturascomo feições particulares de um número limitado de tiposfixos e escolhidos. Categorias constituem um inconvenientequando consideradas inevitáveis e aplicáveis igualmente atodas as civilizações e a todos os acontecimentos. Agjigressiyastendências paranóicas ^g_Dgbu_ej_da__Çosta Noroeste asso-ciam-se com feições diferentes nestas jiuas culturas^ Não háconstelação fixa. As acentuadas feições Apolíneas em Zuni.è..na Grécia tiveramuma.,evolução funda^ent^aímente .djferrente. Era Zuni a virtude do^refreamento e moderação; levou, aexcluir da sua civilização tudo-que era de natureza diferente.A civilização grega, porém, é ininteligível se nfo se reconhe-cerem as compensações Dionisíacas que ela também institu-cionalizou. Não há uma «lei» mas vários aspectos .caracterís-ticos diFereawes que uma atitude dominante pode assuntar.

Padrões de cultura que se assemelham intimamente unsaos outros, podem não escolher para ser tratada em termosdos seus objectivos dominantes a mesma situação. Na civi-lização moderna o homem que, .em questões de negócios,é impiedoso, é, muitas vezes, um marido -deferente e um paiindulgente. A luta obsessiva pelo êxito na civilização Ocidental,não se estende à vida de família em grau que se aproxime do

[2*3]

Page 10: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

que atinge na vida comercial. As instituições que se referemàs duas actividades contrastam num grau que não se verifica,por exemplo, em Dobu. A vida conjuga^ em Dobu é actuadapelos mesmos motivos que as; ,lrtnsaccões Kuia. Ã própriaculíurã~dãs hortas em Dobu_^.juma.apropriá.çlo dos inhamestle_-CTrtro£i_horteIôes. Mas a horticultura é muitas vezes umaactividadê~d<rTÕtiha"pouco afectada, seja qual for o padrãode-cultura, é uma situação a que se não alargam motivos domi-nantes, ou em que eles são reduzidos.

Esta irregularidade na extensão em que o comportamentoé tingido pela cor do padrão cultural é evidente na vidaKwakiútl. Vimos que a reacção Kwakiutl característica pe-rante a morte de um adulto de família nobre era pôr em práticaalgum piano para vingar aquela, pagar na mesma moeda àfatalidade que fizera baixar o opróbrio sobre os que ela ferira:Mas um pai e uma mãe .jovens não têm, em sinal de lutopelo seu filho, necessariamente de observar aquela atitude.As lamentações da mãe transpiram desgosto. As mulheresacorrem para carpir, e a mãe conserva nos braços a criançamorta, chorando a sua morte. Os que esculpem figuras e osque fazem bonecos, fabricam toda a espécie de brinquedosque espalham junto da criancinha. As mulheres gemem e amãe fala ao seu filho:

, «Ah! Ah! porque me fizeste isto, meu filho? Es-colheste-me para tua mãe e eu procurei fazer tudo porti. Olha os teus brinquedos e tudo que eu mandei fazerpara ti. Porque me abandonas, filho? Fiz-te algum mal?Procurarei fazer melhor quando voltares para mim,filho. Por mim faz só isto: melhora depressa, para ondevais, e logo que estiveres bem, volta para mim. Nãovaciles, peço-te. Amerceia-te de mim que sou tua ntãe,filho.»

[264]

Efa pede ao filho que lhe •morrera qãe- volife e volte anascer do seu corpo pela- segunda vez.

As canções Kwakiutl são também transbordastes de mágoa,quando os seus entes queridos partem.

Oh, ele vai partir para longe. É levado- para aquele fadolugar chamado Nova Iorque, meu querido;

Oh, pudesse eu voar a seu lado como um pobre corvozntho^meu amor.

Oh, pudesse eu voar ao lado do meu querido, meu amor.Oh, pudesse eu voar ao lado do meu querido; meu des-

gosto.O amor pelo meu querido mata o meu corpo;, meu; senhor.As palavras daquele qjae me têm viva matam; o meu

corpo, meu querido..Porque ele disse que não voltará, o rosto para este lugar

, durante dois anos, meu amor.Oh> pudesse eu ser o leito de penas em que te deitasses,

meu querido.Oh, pudesse eu ser a almofada em; que repousasses a tua

cabeça, meu querido.Adeus! Eu: estou triste. Eu choro pelo meu amor.

No entanto, mesmo nestas canções Kwafciutí a mágoa teiffem si qualquer coisa do sentimento de Vergonha que caiu sobreo que sofre, e então a dor transformasse em amargo escárnio:«• no desejo de responder ao mal eom o raôl. As canções deraparigas e de rapazes repudiados não estão longe- de expressõessemelhantes, comuns na nossa própria cultura:

Oh, como podem, minha amada, os meus pensamentQS>ser levados até ti, os meus pensamentos do que fizeste-,minha amada?

Page 11: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

É rtnotivo de riso, minha amada, <é objecto de xiso o quefizeste, minha .amada,

Ê motivo de .desdém, minha amada, é motivo -de desdém oque fizeste, minha amada.

Sê feliz, minha amada, -sê feliz, .amante, jpeld que fizeste,minha .amada.

Ou -esta outra:

Ela finge que é indiferente, que me não ama, meu verda-. deiro.amor, minha querida.

Minha querida, tu exageras, o teu bom nome está a decli-nar minha querida.

Amigos, não escutemos mais os cantos de amor cantadospelos que estão longe da nossa vista.

Amigos, talvez fosse bom que eu tomasse outro verdadeiro.amor, uma mulher querida.

Tenho esperança que ela ouça o meu canto de amorquando eu chore para o meu novo amor, a minhaquerida.

É evidente que a dor facilmente passa a vergonha, mas emcertas raras situações, é permitido manifestá-la. Na vida íntimacia família Kwakíutl há também ocasião de exprimir o afecto.ardente e o fácil- «dar e tomar» das alegres relações humanas.Nem todas as situações na existência dos Kwakiutl exigemigualmente as motivações mais características das suas vidas.

Na civilização Ocidental, como na vida Kwakiutl, nemtodos os aspectos da existência se sacrificam à ânsia do poder,tão saliente na vida moderna. Mas em Dobu e Zuni, não -é tãofácil discernir quais os aspectos da vida que são considerados.ao de leve pelas suas configurações. Isso pode ser devido ànatureza do padrão cultural, ou talvez a uma disposição paraa .consistência. Por enquanto não é possível decidir.

Significdncâa da difusão e .âa configuração cultural

•Um facto sociológico é de tomar em consideração emtoda a interpretação da integração cultural. É este ,o significadodá difusão. Tem-se dedicado uma grande massa de trabalhoantrapológico à sondagenvdos factos de «espírito de imitação»humano. A extensão das áreas primitivas :por que :se .difundiramcertas feições.é um dos mais extraordinários factos da antropo-logia. .Feições de costumes, de técnicas, de oim cerimonial, deraitologia, de trocas económicas por ocasião do casamento,espalhãm-se .por continentes inteiros, e cada tribo num conti-nente apresenta muitas vezes a feição considerada sob certo /aspecto. No entanto, certas regiões, nestas grandes .áreas, inxpri-N\Smiram fjnsjr^_tiva ffieyfl^^ comutai. ) ) <\esOs Pueblos usam métodos de agricultura, artífíciosTfe"ma|iâ7 «mitos largamente espalhados, que são próprios de grandes '»

'sectores da América do Norte. Uma_cultura Apolínea noutro - jXcontinente trabalharia outr^jnajéj-ia^nma. As duas culturas vjj jjfteriam de comum a direcção em que tinham modificado a u rmatéria-prima ao seu dispor em cada continente, mas as feiçõesresultantes seriam diferentes. Configurações comparáveis. esa.d^ergites_partes_do mundo, terão, pois, inevitavelmenteLj^lê- Vrenre._^onteúdo. Podemos compreender o sentido em que acultura Pueblo se desenvolveu, coinpar.ancIp-a-«GQm outtas.ucul- V"toras da Norte América, aquelasuque ,partílhani dos mesmos \s mas que..os utilizam.de modos diferentes. Semslhan; vjf*

temente a melhor maneira de cooipreender .a acentuação doaspecto Apolíneo na civilização grega é estudá-lo ;no seu engasteLocal .entre as culturas do lyl.editerr^neo Oriental. Toda ai inter-pTetação clara dos_prpcessos. .de. integr-sção. ciiítural^ devejar^rde um conhecimento dos factos de difusão.

Poor oateD lado, o reconhecimento destes pnooessos ÔK iniíe-giação .proporcionía tí-m quadro completaiineaite difereaítE da

de feições largamente -.espalhadas. Os -estudos locais

y f )

Page 12: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

usuais do casanvento, ou: dia; iniciação, eu- dia; religião,, supõem:que cada feição é- um*, áacea: especial de comportamenlflo- quegerou as suas- motivações próprias. WestermarGk interpreta» ocasamento- como uma sitraação de preferência sexual/e a intor-pretaçião hafci*uat dos processos de iniciação considerasos: comoresultado de- convulsões dia puberdade; Por conseguinte tsdias assuas sraumerosas modifitações. são factos de uma só série^ elimitam-se EU fazer soar as >nrudaonica& em certo- impulso ounecessidade implícitos na. situação geral.

Muètô- poucas oult-uras tia-tam os seus grandes aconteci-mentos de «una forma tão singela camo- esta. Estes aoortteci-menitos, giier^sejai-Q^casaimenito. a morte, ou a iHvoca@oudosobmenlaituicaí, são ai^açõedeiueca :spcíedade lança1 snão

As motivaçõesestarâo a jsrtuiacão

colhida, mas estão nela marcadas pelo carácter geral da cultura.> IL " "" —"• :'~*--'w"'-*) *=S!w**.'«---»J«wfcMW,.i...%.,í[.._ ,V-.1..3>:..**™.«»ii«i IB,

O casamento pKwteestair relaeioniado com preferências conjngaás,que podem ser satisfeitas de outros modos, mas a acumulaçãode esposas pode ser a versão correoirtie da acumulação de bensde forímwav As práticas económicas^ podem aíastair-se tanto do.seu. papel essencial de saitísfaaser as necessidades de afimenitaçãoe- vestuário, que todas as técnicas' agrícolas se' orientem nosenltíâo da aewmulaçãí) exibi<íior<dstai que excede muito- o essen-cM: para a satisfação daquieiàs, pawnitíndò. que degeniere emmotivo de ostentação e satisfação de orgulho.

A. dífieuádíade dfe compreender atcnavés da natureza doacontecimerato' anosmo só reacções cuLturaQS reáatívamusnite sím-

0 ptes, ressaltou, mais de uma vez com evidência,, «a descriçãodias três culturas que escolhemos. O luto, em termos do que- o

/ motiva, é uma> reacção

ti-deperda^ Ora. sucede que- ntenihuana das três cultoras

r^

trouxe este tapo de (resposta para- as suas infititoiições do luto,Os Bueblos são os q.ue ma-Ss dele se àproximiaim em os se»sritos conísicterarem a morte.de um paeerate como ura dos grandesacotíCecimeníos em q«e a sociediade dispõe as suas forças dfe

[ 268-]

modo .a .afastar o desconforto dela resushaarte. Apesar de odesgosto quase -não ser institucionalizado .no seu cerimonial,reeohhece-se aii a situiaçãb je .pj&tda como emergência que -énecessáiio ateruuar. finiíre os Kwakiutl, independenitemente dehaver ou não que considerar verdadeiro desgosto, as inistituicãesdo luito são exemplos especiais de «ma pairainoia oídtuital,segimdo a quail os que são '£

moeda^Em Dobu as instituições do luto têm muito de comumcora ais do Kwakiutí mas essencMmenite são .pumições inflia?-gidas .pelos pairastes de sangue do morto só esposo sobrevi-vente, por ter ca.usado a morte a ttm dos seus membros. Isto é,as ^ániS^ãtuições do i-uto são ainda ama das numerosas circuos-tâ-nlciats que os T>obu -kn&erpretam como Jjtna trvekaan escolhendo .umia_vífmia a quem punem.

•A tradição comsádera uma qTJBstão.simpldssima partir deuana conjurutura fornecida pelo ambiente ou pelo curso davida .e wilízái-la para fins que genericaan.en)te -não têm correla-ção com -ela. O carácter paurioular da. con.jtii«tuipa podie ficartão, apagado qtue, por exemplo, .a- monte de uma criamçai moti-varia pela papeira «naíojye o assaissinato de uma pessoa quenada tem que ver com o facto. Oirtoro .exemplo é o de a pri-

«Je ^aima xapariga implicar .aj.BedJBt?ribuicãode pratíc ie|iite todos IBS bens de uariãTtdfô. O "luieo, o cisa-meato, tos ritos dia piiberdade ou .qisalquer facto :de naturezaeoomómica, não sã» casos especiaás -de compoitainento -humano,cada -um com os seus próprios 'móbiles e motivações geraásq«ie âeteí minaram a sua- história passadai e deteunuinairão.» suahJstôrâa futuira, mas sim certas cirounstâaacias de q.ue qualquersociedade :pode .tançar-itnã© ipaosa dar expressão às-stsas intençõescuterais iBaihnente importanutes.

de vista* a unidade sociolo-•ê, :(DiãO '-a-

tarai. Qs-<estmdcss da família, da «conomia .prirnM-va, .-ou-.dais

•[269..]

Page 13: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

ideias morais; necessitam ser parcelados em estudos que po-nWann em relevo- as diferentes conifigaraçôes que reiteradamerotedominaram essas feições. A natureza peculiar dia>vidai;KwakitJtlnunca se nos pode apresentar com clatneza numa discussão quesingulariza para objecto de estudo a f amíHa, e deriva, o compor-tamento Kwakiutl no casamento, da situação casamento. Seme-lhantemente, q cagmgnito n^noga própria GivDízaigão é tiimãsituação que nunca se^pode escfáexaff__oams^vaa& mera va-riãmíB da wnl&rsèxusd e da vida doméstica. Sem a ideia cnraer?-tadora"que,~ nã'iíÍQS9a civilização em geral, o objectivo supremodo homem é acumuilair bens privados e multiplicar oportuna"dades de osPeracaçao, a moderna sôeuàçãcr da . esgósa.... ^ jmo-dmrâis emoções de jâúme^i^ jgusimerate inintdsgíyeis. As'nossas atí^^^gara^cçjrn. ( nossos SMías são auflias tantostestemunhos da. naalidaxte deste sme^o.,pbjejtwo.icui|tu!rai. ,Os

espoataneamen-te respeitados desde a infâijcia, como o são; emcestasconto os nossos bens de {artunav por que mós sacrificamos oude que colhemos glória, conforme os casos.

dos ,,J Êsíe padrão não é

inerente .às situações pai/filhos, como tão inconscientementeadmitimos. Ê imposto à situação pelas -terwlêneiais .mais in-fitteri^. da nosaa outcura^ e aipenflEr sina is eiroanstâircias emufeseuimos as mossas ideias fââiaB tradicionais.

À mrfid^."q 'Sios"í5rmõ¥ tÕrnãíwloTnate cientes do que éã ettltiura, poderemos: isolair o peqtaennno -micleo genérico mintaanulação, dos vastos acréscimos de (natureza local e cuitsiralapostos pelo htamem. O fapto de estes acréscimos não seremconsequências inevitáveis da «fnuação oonuáxleJiaida em si, nãoos toma .mais fàoeis: de modífiçair ou. menos importamities- parao .nfâisso oomporOamewto. De facto, são* ualvez rnaãs áifíceis demodificaa' do que esperávamos. Modifkaições pormemiorizajdas

[.270]

no. Gomportamenito da <m-ãe- nas primeiros tempos da viria de-seus filhos* por exemplo,, talvez sejam impróprios- paira pouparuma criança roervosa. quando perainite ek surge uma-, situaçãodesagradável, que pode ser agravada-por outros, coritaetos queela venha a 'ter e que porvenituira se aiaa-garô da- mãe até àescola, às suas 'actividades e à. sua esposa. Todo o curso davida. que se ergue pararate- ela .põe em refevo es aspectos. Hgrivalidade e de posse. Pode suceder que: a 'maneira: de a criança

- ,..-ii •—" " '•• i "••••""• PI ii»Mii |ifci...i.n«iu i.j 'f ' TTtirni1 ri* ""li—I'T Vrn:ii-i-iifc-niriniii-u_i • •JT-J—mit- iT-?l r-"T r™

resolver a- questão resida- na; boa istnte; ptr .na1 indiferença. Eraqualquer caso,, a solução dJo problema bem: pcxiia 'insistir menosnas dificuldades essenciais à situação pai/filho e insistir mais

-t -^»i;^i»Oí1=»^^-«"^-->ri»i:Í^^..U>"'VSv.^-J^v".i».^

do ego- e a exploração das relações pessoais.

Valor social

O problema do vaifoir soeiaj^ está- inttàmainieTftic implícito nofepgo das dífeneiHies eatan^úxUza^õ^s^d^culim^r^^âísciffiscâsdo valor sociall têm-ise oitíinariairhenite contentado com eonstderas* desejáveis certas.feiçõets4w»»aí3ias-e indicar um objectivosocial que implicalsse essas virCiídes. Sem dúvida, diz^se, a-explo^cação dos oyffiros em relações pessoais e as airroganiítes exigênciasdó ego são males, ao passo que a prâtida de..actividades .colec-tivas é um -bem; um teanperapienito que não procura sartisfaçãionem no sadismo wem mo matsoquusmo: e que admite o vivar edeixar viver, é irai bem. Mais '\imia oixíem social que, 'como: aZuni, toma como padirão esfie «bem» está' longe de ser unta-utopia. Ela maamífesta também o defeito das suas-visitmdes. Nelanão ha lugar, por exemple, parauenidênciias que costuima/mosprezar altamente, como vontade -fonte, ou knáciativa pessoal, oudecisão para se ergiw contra^ nam mar de oomplicarçôeis, Ê ío-corrigivelmeiite: branda. A •aoti-vidadè em grupo-qye permeia aexírtência em Zuíii ignoxa- a viria hminíaina:— o- nascer, amar,morrer, o êxito, o- ínteocesso e-o privilégio. Uma exibição ritual

Page 14: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

:scrve os seus fins.e Mo-dá importância a infteresses mais huma-JKJS. A imunidade a quaisquer fornnas de exploração social o«de sadismo social, aparece JJB ointea f aee da. moeda sob a formade uni cerrmosnialisino infindo -que mão visa a satisfazer finsmaas elevados da existência humana. Estamos peraráte a reali-dade iniludível de que toda a parte superior tem a sua parteinferior, de que -um lado direito impMca -um lado esquerdo.

A complexidade do .problema dos valores sociais é excep-] danalmenste claara na cutara Kwakhrtl. O móbil principal,que\s irostàcuiicões Kwakiuitl, e que elas partilham lar-'

gameate com a sociedade "moderna, é a rivalidade. A rivalidadeé uma .luita que não se conieenitra. nos verdadeiros objectivosda actividade inasno-exceder •um competidor. A atenção deixade incidir n© proporcionar a satisfação de necessidades de umafamília ou na ;posse de bens utilizáveis e que se possam gozar,mas sim em uteapassair os vizinhos e possuir mads que ninjguóm.A rivalidade, ao contrário da concorrência, não concentra asua atenção na actividade original; quer, ao fazer um cesto ouao vender sapatos, criar uma situação artificial: o jogo da osten-tação que uras podem ganhar à custa dos outros.

A..,5 j <l .. SlP ri*ffl!/ e-d*:sOraitíva> Oóupa «a escalados valoríes huttníanos /um lugar muito baixo. É uima tirania,a q.ue, desde .que estàimiJada em qualquer cultura, ninguémse -pode subtrair. A ânsia- de supemoridaJde é devoradora; nadaa satisfaz. A hnta -perpetuai-se. Quanlto mães bens a comamidadeacumula, com:maòor.n!Úme«> de fichas os homens jogam, mais.o jogo está tão .longe de estar ganho como estava quarado aisapostas eram modestas. Nats inatótiâções Kwakiuití (tal rivalidadeatinge o acuane ^do absumdo, confundindo investimento comdestruição Cotal de bens. A. disputei da superioridade .-toma prin-cipaihnenite a íorma.da acumulação de bens, mas moitas'vezes,também, e sem .a consciência de quasíto ais duas coisas sãodi£erenites,,a .de detatruãcão das mais elevadas um/idades de valor.os seus cobres, .e a. .de ifogutíisas • em - que 'se reduzem a cinzas.

[272]

casas, mantas e camioas. O desperdício social é evidenrte. Tãoevidente como ma obsessiva rivaíldade de Middletown em quese conisftroem oaisaB, se compram roupais e se dão festas paraprovatLqtte não se foca atrás dos ovatros.

O quadro é bem desagradável. Na vida Kwakiuitl a_nva-lidade vai tôo longe: quejto.do- o êxito deve. assejoitair na ruína.dos rivais; em Middletown,.chega ia tal ppjito que.gostos indi-,vidoiais e saitísfações-dilectas são redueidas a um mínimo e oqije_se j>rocuíra acima de tudo é seguár a moda. Bm ambos oscasos é evidêiBbe que mo sé busca a riqueza pelo que ela- vaiecomo meio de satisfazer necessidades 'humanas, mas como umasérie de tentos no jogo da rivalidade. Se o esforço pelo êxitofosse eliminado da vida económica, como é em Zufii, a distri-buição e a wtitózação da riqueza seguiria «leis» complétamentediferentes.

No eDítanto, como se pode ver wa.sociedaKle Kwakiuíl e noáspero individualismo da vida dos pioneiros Americapos, aprossecução do êxito pode conferir vigor e servir de estímuloà existência. A vida Kwakiutl é rica e vigorosa a seu modo.O seu objectivo preferido tem as suas viitudes próprias, e osvalores sociais na civilização Kwakiutl são adnda mads inex-tricavetaiente eniredaidos do que nia Zuni. Seja quial for a suaorientação social, ,uma sociedade que a põe em prática comvigor desenvolverá cearas vfocudes naitraató nos objectivos queescolheu, e é muitíssimo improvável que até mesmo a miadsperfeita sociedade possa inrtensMcar numa ordem sociaJ todasas virtudes que prezamos ma- vida humaofc A «topía não sepode atingir como uma esttruiCusra final e perfeita demtoo de q.uea vida humana floresça sem defeito. Utopias como esta teriamde se considera-r puro soahíarHacoKlado. Todas as melhorias içaisda ordem social dependem de discriminações mais modestase mais difíceis. É possível analisar rxxrmerjorizadaimeate insti-tuições dnfereates e cafeilaa: o preço por quanto elas se fazempagar em capital social, era feições de comportamento menosdesejáveis cpue elas estimulam, em frustração e sofrimento

18 - P. DE CULTURA [273]

Page 15: Ruth Benedict - Padrões de Cultura 1.pdf

humanos. Se uma sociedade se resolve a pagar esse preço pelassuas feições preferidas e próprias, desenvolver-se-ão den-Crodeste padrão cer-fios valores, por muito «mau» que ele seja.Mas o risco é grande e a ordem social pode não suportar opreço por <jue o paga. Pode iw sob eles com todos os capri-chosos prejuízos de revolução e desastre económico e emo-ciona]. Na sociedade moderna é este o problema /mais instanteque esta geração tem de enírenitar, e aqueles a quem ele per-segue imaginam mãos vezes do que seria desejável que umareorgasnázação econiómica trairá ao «munido uma Utopia comque eles soniham acondados, esquecendo que não há ordemsocial que possa separar as suas virtudes dos seus defeitos. Nãohá egferada-real que conduza a uma real Utopia.

Necessidade de emitir juízossobre a nossa própria civilização

s Há, p^réro?_um_sxe»c&^-.nos à medida queipos. vamos ,faimHiarizanido..cojn.a.ess,ênoa..dacultora. Podemos 'habítuar-^nos a pronuaidãMios sobre as feições

, dominantes da .nossa própria ciyilizaicão. .É isto bem ddffcil pairaquem tenha sido criado sob o seu poder. E é adoida mais difíciltomar em conta, como é preciso tomar, a nossa predilecção porelas. Sãonos cão familiares como uma velha, querida habitação.Qualquer mundo em que elas se nos apresentem parece-nossombrio e insuportável. E no entanto são exactamente essasfeições que pela influência de um processo cultural funda-men/tail isão a maior paute das vezes levadas aos extremos.Ultrapassam-se a si próprias, e mais do que quaisquer outrassão sujeitas a esoaparem-se ao nosso controle. Exactamentenaquele ponto onde há mais probabilidades de a ^críticaser necessária, é que estamos expostos a não a exercer. A revisãovem sempre, mas por meio da- revolução ou da desintegração.A possibilidade dó progresso ordeiro é excluída porque a

[274]

l

geração em questão não soube fazer um balanço das suas ins-tituições MpenCrofiaáas. Não as soube avaliar em termos deganhos e pendas, porque já perdera a capacidade de as consi-derar objectivamente. A situação tinha de chegar a «m pontocrítico anifes de ser possível qualquer alívio de tensão.

A apreciação das (mossas feições dominanites, até aqui tomesperado até caria feição em questão ter perdido o carácter dequestão viva e pram.en.te. A religião só foi discutida objectiva-mentte qiuarado deixou de ser a feição cultural a que a nossacivilização estava maás incondicionalmente confiada. Agora,pela primeim vez, o estudo comparado das religiões pode livre-mente tratar de qojialquer ponitto em discussão. Ainda não épossível discutir assam o capitalismo, e, durante uma guieira, íiguerra, como iastáituáçãio, e os problemas das relações intema-cioirais, são também tabus. £ no entarcito, os traços dominantesda nossa civilização estão necessitados de análise especial.Necessitamos compreender que eles são compulsivos, mia porserem fundamentais e essenciais na naltureza humana, mas simporque são locaás e exagerados na nossa própria cultura. Aquelemodo de viver que o Dobuano considera fundamental à natu-reza buanama é -um modo essencíailmenite traicoeho e salva-guardado por temores mórbidos. Da mesma maneira o Kwakiurlsó pode conceber a vida como uma sórie de skmaçoes de riva-lidade, em q.ue o êxit» é medido pela •humilhação dos outros.A sua crença basekrse rta importância dessais foi^nas de vidanas suas civilizações. Mas_.^JLmjMrtâgjçia.jle uana mstituíçãgnuma cultura não dá direciaimeínite^4a aualjSe^^blMdáde. A discussão é suspeita, e todo o con-trole cultural <jue conseguimos exercer terá de depender dograu em que pudermos apreciar objectivamente as feiçõespreferidas e apaixonadamente fomentadas da nossa civilizaçãoocidental.

[2751