Sabrina 1468- Falsas Inten+º+Áes - Susan Rae

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Falsas Intenções Susan Rae Corações em risco Elizabeth imaginava que nunca mais veria Drake McGuire... Até que um inesperado e trágico acontecimento a obrigou a enfrentar segredos do passado. Seis anos atrás, depois de um fim de semana de romance e paixão que mudou sua vida, ela desapareceu sem deixar indícios, receando envolver-se com um homem cuja profissão representava risco para ele próprio e para as pessoas que o rodeavam. E de repente o destino o trouxe de volta, não como amante, mas como seu protetor! Tomando para si a responsabilidade de garantir a segurança de Elizabeth, Drake se esqueceu de proteger seu coração dos sentimentos que deveria ter superado muito tempo atrás, e que poderiam ser mais fatais do que a mira de um inimigo perigoso...

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Transcript of Sabrina 1468- Falsas Inten+º+Áes - Susan Rae

Falsas IntenesSusan Rae

Coraes em risco

Elizabeth imaginava que nunca mais veria Drake McGuire... At que um inesperado e trgico acontecimento a obrigou a enfrentar segredos do passado. Seis anos atrs, depois de um fim de semana de romance e paixo que mudou sua vida, ela desapareceu sem deixar indcios, receando envolver-se com um homem cuja profisso representava risco para ele prprio e para as pessoas que o rodeavam.

E de repente o destino o trouxe de volta, no como amante, mas como seu protetor! Tomando para si a responsabilidade de garantir a segurana de Elizabeth, Drake se esqueceu de proteger seu corao dos sentimentos que deveria ter superado muito tempo atrs, e que poderiam ser mais fatais do que a mira de um inimigo perigoso...Ttulo Original: Heartbeats

Disponibilizao e Digitalizao: Marina

Reviso: Mi / Formatao: Edina

Captulo I

Dra. Elizabeth Iverson passeou o olhar pelas mesas que ocupavam o salo de conferncias do Hotel Chicago Palmer House.

No fazia sentido que suas mos tremessem tanto, considerando sua habilidade em passar um cateter com preciso exata, ou a destreza com que suturava os delicados vasos do corao na mesa de cirurgia.

A verdade era que nunca se sentira confortvel sob a luz dos holofotes, e a simples noo de que teria de se dirigir a setecentos ouvintes havia tirado seu sono na noite anterior.

Sei que muitos de vocs tm traos em comum com minha histriacomeou, hesitante. Sempre sonhei cursar Medicina. Em vez de roupas, minhas bonecas usavam bandagens e torniquetes, e meus pacientes eram os animais da fazenda onde cresci.

Respirou aliviada ao perceber que o comentrio havia provocado risos na audincia.

Naquela poca no havia financiamento para os estudos, e o curso de Medicina era reservado para poucos privilegiados. E por isso que nossa presena aqui esta noite to importante. Estamos ajudando a alimentar sonhos. Para mim, no se trata do glamour de ser chamada de doutora. Como cardiologista, o que realmente gratifica olhar nos olhos de um paciente e ver o brilho de esperana por saber que...

Seus lbios congelaram no meio da sentena. As palavras morreram na garganta ao mesmo tempo em que o corao disparou no peito.

No havia dvida quanto identidade do homem que entrou no salo carregando uma valise, como se tivesse acabado de chegar.

Mesmo a distncia, pde reconhecer claramente a covinha no queixo, a linha viril do maxilar e os olhos azuis-escuros como o cu da meia-noite.

Dra. Iverson, est tudo bem? o presidente do comit de organizao cochichou-lhe ao ouvido.

De sbito, ela teve conscincia do burburinho dos convidados e do tilintar dos copos.

Embaraada e frustrada pela sua reao, interrompeu o contato com aqueles olhos que pareciam penetrar sua alma e apanhou um copo de gua.

Quando ergueu o rosto, ele havia partido.

A onda de desapontamento a surpreendeu, mas ela se forou a se concentrar no discurso que havia preparado.

Sinto muito. Onde eu estava? Ah, sim. Os sonhos...

Elizabeth sentou-se e relanceou o olhar para a cadeira vazia ao seu lado. Preocupava-se com a ausncia de Julie Parks, sua melhor amiga.

Apanhou a bolsa e foi para a toalete. Seus joelhos tremiam quando se recostou no lavatrio. Abriu a torneira e lavou o rosto com gua fria, tentando se refazer do choque.

Por que ele estava l? Por que Drake McGuire reaparecera em sua vida como um fantasma do passado?

Olhou-se no espelho e seu pensamento voltou no tempo. Por mais que tentasse esquecer, a paixo avassaladora que vivera com aquele homem, seis anos antes, estava ainda vivida em sua lembrana.

Fora a ltima vez que haviam estado juntos, e ele parecia mais velho... e ainda mais atraente!

Sim, o tempo fora generoso com Drake, pensou com um sorriso.

Apanhou a ncessaire de dentro da bolsa e corrigiu a maquiagem, contemplando seu reflexo plido no espelho.

Estaria mais velha?

"Claro que sim", pensou. Tornara-se mais sofisticada e menos insegura. Examinou a pele acetinada e os cabelos naturalmente lisos, e ajeitou alguns fios cados sobre o rosto.

Seis anos no era tanto tempo para causar mudanas profundas, concluiu com um sorriso.

Alisou o vestido que comprara duas horas antes, a caminho do evento. Uma emergncia a detivera no centro cardiolgico, e no tivera tempo de passar pelo apartamento antes da festa daquela noite. Encontrara o modelo na vitrine de uma loja do shopping, e no hesitara nem um segundo em pagar uma pequena fortuna por ele. Ao vesti-lo, no banheiro do hotel, ficara satisfeita com o resultado. O modelo clssico, de corte simples e elegante, caa como luva, valorizando as curvas generosas do seu corpo.

Elizabeth alisou a barra e se preparou para sair, dizendo a si mesma que se Drake ainda estivesse l trataria de ignor-lo.

No deveria estar to chocada por v-lo. Era bvio que ele no fora ao banquete para v-la. Na certa, o comit de organizao havia contratado agentes para garantir a segurana dos convidados.

No entanto, no fazia sentido que o evento contasse com um agente especial do FBI.

Ela balanou a cabea, tentando afastar as dvidas da mente. Antes de voltar para a mesa, procurou pelo celular na bolsa.

A ausncia de Julie a deixara preocupada. Discou o nmero de sua casa e esperou que ela atendesse.

Convencera a amiga a ficar em seu apartamento at que pudesse resolver a separao traumtica, o terceiro casamento em nove anos. Julie chegara naquela tarde, e haviam combinado encontrar-se em casa e seguir juntas para o hotel.

No entanto, os planos mudaram no ltimo momento, quando Elizabeth foi chamada para uma emergncia.

Desolada, ouviu sua prpria voz na secretria eletrnica e deixou uma mensagem, tentando se convencer de que no havia razo para se preocupar. Afinal, no era a primeira vez que a amiga faltava a um compromisso.

Abriu a porta da toalete rezando para que pudesse chegar mesa sem se encontrar com Drake.

No entanto, mal teve tempo de pisar na rea de recepo quando a presena macia bloqueou seu caminho.

Dra. Elizabeth lverson... um prazer rev-la!

Ela ergueu os olhos para se deparar com os lbios sensuais curvados em um sorriso que era sua marca registrada.

O som da voz, profundo e sensual, denotava um trao de cinismo. O sangue correu mais rpido em suas veias, aquecendo-a. Forou um sorriso, obrigando-se a encarar o inevitvel.

Agente especial Drake McGuire... Estou feliz que tenha vindo para dar suporte nossa causa.

Trata-se de uma causa nobre ele comentou com um brilho divertido nos olhos, estendendo-lhe um copo. Gim tnica, com uma rodela de limo, exatamente do jeito que voc gosta, se bem me lembro.

Obrigadaagradeceu, aceitando o drinque. E para voc, usque com gelo.

Gosto da cor. Faz-me lembrar os olhos de algum que conheo. Alm disso, me deixa relaxado.

E por que precisaria disso? Elizabeth provocou, evitando olhar para ele.

Achei que me faria bem, depois de v-la fazer seu discurso. O vestido est perfeito em voc.

Elizabeth sentiu a pele arrepiar. Sorveu um gole da bebida, tentando se concentrar em qualquer coisa que no fosse o homem sua frente.

Quanto tempo faz? ele continuou, examinando-a de alto a baixo. Seis anos?

Voc faz parecer que o que houve entre ns foi mais do que um romance passageiro. Se bem me lembro, passamos apenas um fim de semana juntos. Admito que foi um bom fim de semana, mas tudo.

Um bom fim de semana? E assim que define? Os olhos de Drake se iluminaram com um brilho forte. curioso... Eu no usaria essa palavra. Lembro-me de muita paixo e calor, e no me refiro primavera em Atlanta.

A profundidade daquele olhar, somada s suas prprias lembranas, provocou-lhe tremores pelo corpo.

Tenho de voltar para a recepo. Obrigada pelo drinque. Deu-lhe as costas e fez meno de sair, mas a mo firme dele em seu ombro a impediu.

Ainda no terminei, Dra. Iverson.

Drake conteve a frustrao quando ela o repeliu com um gesto brusco e afastou-se. Observou a curva suave dos quadris, consciente do efeito que tinha sobre ele.

Aquele encontro no fora como Drake planejara, mas quando Elizabeth o fitava com os adorveis olhos cor de mbar, no conseguia resistir ao seu charme.

Desolado, colocou o copo sobre a mesa vazia mais prxima e seguiu para o elevador.

Elizabeth estacionou o carro na garagem anexa ao prdio e relanceou o olhar para a janela do segundo andar, enquanto apanhava as chaves da porta.

Havia se mudado para o pequeno e charmoso edifcio de dois andares quando fazia residncia mdica no Hospital Geral de Chicago. A tranquilidade e a segurana do bairro de classe mdia foram decisivas para que escolhesse aquela rua, e tivera a sorte de ter a melhor senhoria do mundo. Mary Parisi a auxiliara muito durante os dois anos de residncia mdica, cuidando de Layla enquanto ela estava ausente de casa.

Ultimamente, comeara a ter a estranha sensao de que a Sra. Parisi no aprovava seu trabalho, a julgar pelos frequentes comentrios sobre as longas e interminveis horas requeridas pela sua profisso, que a mantinham longe da filha.

No entanto, sua dedicao ao trabalho devia-se, em primeiro lugar, preocupao em proporcionar uma vida tranquila e confortvel para Layla.

Notou que as luzes do apartamento estavam apagadas, e se ps a pensar onde estaria Julie.

O latido de um co de uma das casas da rua provocou-lhe um arrepio na espinha. Seguiu paia a entrada olhando por sobre os ombros, com a estranha sensao de que algum a observava.

No seja paranoica! disse para si mesma, abrindo a porta do edifcio.

Entrou no hall e ouviu o som da televiso, vindo do apartamento no primeiro andar. Talvez Mary estivesse com problemas auditivos, pensou, fazendo uma nota mental para examin-la quando tivesse oportunidade. Receava que a perda de audio da bab de Layla pudesse ter efeito significativo na segurana dela.

Apanhou a chave do apartamento, e, para sua surpresa, encontrou a porta destrancada. "Onde Julie estaria com a cabea?", recriminou, pestanejando enquanto se adaptava a pouca luz.

Julie?

Esperou pela resposta, mas o apartamento se mantinha no mais absoluto silncio. Tudo que pde ouvir foi a torneira do lavatrio do banheiro gotejando, e criticou Mary secretamente por no t-la mandado consertar ainda.

Deu um passo frente e estendeu a mo para o interruptor de luz, consciente de que a porta se fechara atrs de si. Quando o aposento se iluminou, viu que o vestido que Julie usaria naquela noite estava sobre o sof.

Julie?

Um arrepio percorreu sua espinha, e hesitou entre verificar o apartamento e chamar a polcia.

Censurando-se por estar sendo exagerada, convenceu-se de que Julie mudara de ideia e provavelmente decidira ir a outro lugar.

Colocou a bolsa sobre o aparador do hall e apanhou o celular. Seguiu pelo corredor, estranhando o fato de encontrar o estojo de maquiagem da amiga aberto sobre o gabinete da pia.

Ao entrar no quarto, deteve-se porta quando uma mancha escura sobre o carpete bege chamou sua ateno. Abaixou-se para observar melhor e tocou-a com as pontas dos dedos, retirando a mo como se tivesse levado um choque.

Sangue!

Elizabeth sentiu a pulsao explodir em seus tmpanos. Acompanhou o rastro que se interrompia bruscamente, procurando todas as explicaes plausveis. Quando acendeu a luz, seus piores receios foram confirmados.

Julie estava ao lado da cama. A toalha que envolvia os cabelos, cada no cho, e os fios dourados espalhavam-se sobre a poa de sangue ao redor dela.

Ela pestanejou, negando-se a registrar o que via, e correu na direo da amiga. Pressionou os dedos trmulos no pescoo, sem encontrar pulso, enquanto seu crebro se recusava a acreditar no que j sabia.

Virou-a de costas e tentou ressuscit-la com uma desesperada massagem cardaca, rezando para que ainda houvesse tempo. Ao ver que no reagia, apanhou o celular e ligou para a emergncia.

a Dra. Elizabeth Iverson quem fala. Enviem uma ambulncia imediatamente!

Deu o endereo e deixou o celular cair, voltando a realizar a massagem e rezando para que acontecesse um milagre.

Drake perscrutou a rua de dentro do seu carro, estacionado a poucos passos do apartamento de Elizabeth. Ergueu o rosto ao ver que uma luz estava acesa no segundo andar, e decidiu esperar mais alguns minutos.

O que diria a Elizabeth? Quando a viu naquela noite, o perodo de seis anos que os separava evaporou-se subitamente.

Ela o abandonara depois de um final de semana que havia mudado sua vida, mas julgara j ter superado... No entanto, um simples olhar bastou para revelar que Elizabeth ainda fazia parte de sua vida.

Desceu do carro e caminhou na direo da entrada, quando sirenes se aproximando chamaram sua ateno. Uma ambulncia e duas viaturas estacionaram diante do edifcio de Elizabeth.

Ele deteve o passo por um momento, sentindo instantaneamente a familiar descarga de adrenalina nas veias. Sem perder nem mais um segundo, se ps a correr, e chegou porta do edifcio ao mesmo tempo que os policiais.

O que est havendo? indagou, com o corao aos pulos.

O senhor mora aqui?

No, mas...

Ento, mantenha-se afastado.

Sargento, ela no responde...

Quem no responde? Drake indagou, exasperado.

Por favor, senhor...

Agente especial Drake, FBI ele gritou, abrindo espao entre os policiais. O que est acontecendo aqui?

A rua, que estivera silenciosa um minuto antes, transformou-se no mais completo caos. Um aglomerado de curiosos se formou ao redor deles, enquanto outras viaturas se aproximavam. Os paramdicos esperavam com impacincia que os policiais os autorizassem a entrar em ao.

Por favor, deixe-nos entrar, senhora o policial pediu, com o dedo pressionado no boto do interfone.

A porta se abriu de sbito e os policiais correram pelo hall. Drake os seguiu e retirou a arma da cintura enquanto subia a escada de dois em dois degraus.

Aqui! Rpido!

Seu corao bateu descompassadamente ao reconhecer a voz de Elizabeth, e ficou aliviado ao saber que ela estava bem.

Deteve-se no batente da porta do quarto, impactado com o que viu. Ela estava debruada sobre o corpo desfalecido de uma mulher, e aplicava massagem cardaca com as mos cobertas de sangue, como se estivesse fora de si. Os cabelos estavam em desalinho, e as mechas encaracoladas caam sobre os ombros. Drake no conteve o suspiro de alvio ao ver que no era Elizabeth quem jazia no cho, ao mesmo tempo que seus olhos registravam a cena de horror.

Elizabeth...

Ela virou o rosto e os olhares se encontraram por um segundo, antes de voltar a ateno para a vtima. Mas um breve olhar foi o bastante para que ele visse o pnico no rosto de traos delicados.

Est machucada? Drake indagou, aproximando-se.

Onde esto os paramdicos? ela gritou, a um passo da histeria.

Pea aos paramdicos para subirem! Drake ordenou a um dos policiais, mesmo sabendo que era tarde demais.

Elizabeth, desista. intil...

No! ela o interrompeu, exaurida pelo esforo. No pode ser! No posso deix-la morrer!

Receio que ele tenha razo, senhora.

Ela voltou o rosto para o policial, e o silncio que preencheu o aposento pareceu durar uma eternidade,

Quando os paramdicos chegaram, ela se afastou com relutncia.

Sinto muito, senhora... O enfermeiro meneou a cabea, pesaroso. No podemos ajud-la.

Ela se foi Elizabeth balbuciou num fio de voz, antes de perder os sentidos.

Elizabeth voltou a si momentos depois, e sentou-se rapidamente, tentando se lembrar do que havia acontecido.

Voc desmaiou, e eu a trouxe para o sof Drake informou, sentando-se ao lado dela. Sinto muito, Elizabeth.

Ela o fitou como se a voz mscula estivesse vindo de algum lugar distante.

A senhora conhecia a vtima? um policial indagou ao entrar na sala.

Sim. Era minha amiga. Julie Parks.

Por favor, assine esta autorizao ele pediu, estendendo-Ihe uma folha impressa. Temos de levar o corpo para que o legista registre o falecimento.

No preciso. Ela se levantou, forando-se a recobrar as foras. Sou mdica, e posso fornecer o atestado de bito.

Tem certeza de que est em condies? Drake fitou-a, preocupado.

Atravs da nuvem de confuso em que se encontrava, Elizabeth sentiu as mos poderosas do amigo em seus ombros, e encontrou foras para reagir.

Sim afirmou, levantando-se. No posso deixar que Julie seja tratada como um corpo sem identificao.

Est bem.

Drake seguiu-a at o quarto e olhou pela primeira vez para as feies da vtima, reconhecendo os cabelos loiros, o nariz aristocrtico e os traos bonitos. Havia conhecido Julie Parks na mesma festa em que conhecera Elizabeth.

Senhora, sou forado a pedir que se retire para no corrermos o risco de contaminar a cena do crime...

As palavras ecoaram como um filme de terror, e ela deixou que Drake a levasse para fora do quarto. Respirou fundo, tentando apreender a realidade dos ltimos quinze minutos.

Sente-se. Respire fundo e tente se acalmar.

Ela no argumentou. Deixou que o corpo casse sobre a poltrona e fechou os olhos. Abriu-os ao sentir a aproximao do investigador de polcia.

Sinto muito, mas tenho de obter algumas informaes... Elizabeth fitou-o, esperando descobrir a qualquer momento que tudo aquilo no passava de um pesadelo.

Porm, a presena de Drake e o movimento de policiais em seu apartamento confirmavam a terrvel realidade.

Quem poderia ter feito isso a Julie?

No sei, mas vamos descobrir. Poderia me dizer seu nome? Reagindo como um autmato, ela respondeu ao formulrio de identificao forando-se a enunciar as palavras.

Como conheceu a vtima?

Por favor, parem de cham-la de vtima! pediu, contendo o pranto.

Enquanto explicava sua conexo com Julie, percebeu a ateno de Drake sobre ela.

H mais moradores no prdio? Quem a senhora que abriu a porta?

Mary Parisi, a senhoria. Ela mora no apartamento do primeiro andar com seu filho, Donny.

Vou verificar se ela ouviu alguma coisa. H mais algum que resida aqui?

Elizabeth sentiu o corao bater descompassadamente.

Oh, meu Deus! Layla! Cobriu o rosto com as mos, a ponto de entrar em pnico. Layla, minha filha. Est com minha me, na fazenda. Ela poderia estar aqui!

Felizmente, ela no estava disse o oficial com simpatia. Elizabeth sentiu o olhar de Drake sobre ela. Sabia que ele vira o quarto de Layla quando entrou no apartamento.

Bem, o bastante por enquanto o oficial disse, guardando o bloco de notas no bolso. Por favor, no saia da cidade. Os investigadores vo precisar do seu depoimento. E sugiro que ligue para sua me. Dentro em breve, a notcia sobre o assassinato estar nos jornais e na televiso.

Ela assentiu e olhou para o relgio. Passava das dez horas, e sua me costumava dormir cedo. Porm, no quis correr o risco de que ela visse o edifcio rodeado pela polcia no noticirio da manh.

Sharon Iverson insistiu para que a filha fosse para casa imediatamente, mas Elizabeth se recusou.

De alguma forma, ela precisava ajudar a encontrar o assassino, mesmo que significasse permanecer ali, exausta, enquanto os investigadores a bombardeavam com o que parecia ser sempre a mesma pergunta.

Agente especial McGuire!

Ambos se voltaram com a entrada de um rapaz de compleio baixa e atarracada, com os cabelos negros arrumados com uma espessa camada de gel.

Detetive O'Rilley... Drake cumprimentou-o com evidente desagrado.

H quanto tempo... No esperava v-lo por aqui.

Vocs se conhecem? Elizabeth indagou, olhando de um para outro.

Trabalhamos juntos no departamento de investigao, logo que ingressamos na polcia de Chicago.

Mas McGuire estava sempre alguns degraus nossa frente comentou o detetive com ironia.

Ela estudou-o com mais ateno, e no pde evitar compar-los.

O contraste entre os dois homens era gritante, e o detetive parecia uma sombra plida diante da poderosa presena de Drake.

Voc conhece algum que pudesse prejudicar sua amiga?

O'Rilley indagou, assumindo tom profissional.

Como eu disse, Julie tinha trs ex-maridos, mas no creio que eles seriam capazes de tamanha atrocidade.

Bem, no h evidncias de que a porta foi forada. Sua amiga conhecia o assassino, e o deixou entrar... Ela possua a chave do apartamento? Poderia ter emprestado para algum?

No creio. Tudo que sei que ela chegou por volta das duas horas nesta tarde. Dei-lhe o cdigo da garagem para que pudesse colocar o carro, e informei-a sobre a cpia que mantenho escondida. Ela usou-a para entrar. No creio que tenha tido tempo para fazer uma cpia.

H mais algum que tenha a chave do apartamento?

Nunca forneci a ningum, exceto minha me, e claro, a Sra. Parisi tem uma cpia.

Bem, vamos verificar. Voc disse que no pde vir para casa porque teve um chamado de emergncia. Lembra-se do horrio em que foi chamada?

s 17h30min. Deixei o centro cardiolgico pouco antes das 18h40min ela respondeu, massageando as tmporas.

Voc se refere ao Centro de Cardiologia Heartland, na avenida Clark? o detetive indagou, consultando o bloco de notas.

Eu j ouvi falar. Dizem que a clnica mais se parece com um hotel cinco estrelas, e atende especialmente celebridades e pessoas da alta sociedade.

Atendemos a quem necessitar Elizabeth respondeu, contendo a irritao.

Entendo. A que horas disse que saiu?

s 18h42min, para ser exata. Lembro-me de ter olhado para o relgio e decidido que no teria tempo de passar no apartamento para trocar de roupa. Liguei para Julie e decidimos nos encontrar no hotel.

Como ela estava quando conversaram? Notou se havia mais algum no apartamento?

No havia. Julie estava alegre e animada como sempre... Elizabeth cobriu o rosto com as mos, como se o peso da realidade casse sobre ela. - Oh, meu Deus! Quem poderia ser to cruel?

Bem, vou investigar. Pode ser apenas um ato aleatrio de violncia, ou talvez tenha sido algum que ela conheceu recentemente. Voltou-se para Drake com expresso grave. E o que o trouxe cena to prontamente desta vez?

Elizabeth e eu somos amigos.

Mas vocs no chegaram juntos, no ?

No.

Conhecia a vtima?

Oua, O'Rilley, podemos responder a tudo que voc quiser amanh. Agora, gostaria de levar Elizabeth para algum lugar onde ela possa descansar.

Est bem, o bastante por enquanto. Deixe o endereo do lugar para onde vai, e o nmero do telefone. E no preciso dizer que no saiam da cidade.

Drake deu o nmero do telefone celular e o nome de um hotel a poucos quarteires dali.

Eu no posso ir com voc...

No discuta, Elizabeth. Voc no vai ficar neste apartamento por enquanto. Apanhe algumas peas de roupa e vamos sair daqui.

Elizabeth no conseguiu reagir. Sua cabea estava a ponto de estourar, e a ltima coisa de que precisava era estar perto de Drake.

No entanto, era tudo o que podia fazer naquele momento. Resignada, fez a mala sem discriminar o que colocava na bagagem e saiu do apartamento, deixando-se conduzir para onde ele quisesse lev-la.

Captulo II

Drake acomodou-se o melhor que pde no sof estreito da antessala do apartamento e fixou o olhar no teto. O ritmo suave da respirao de Elizabeth, deitada no quarto ao lado, indicava que finalmente havia adormecido.

Ele passara em uma farmcia a caminho do hotel e a obrigara a comprar medicamentos para dormir. Elizabeth ainda estava em estado de choque, e tomara dois comprimidos sem contestar.

Com um suspiro, perguntou-se pela centsima vez por que havia se metido naquilo. Sua famlia no sabia que estava l, nem planejava contar. Na verdade, no havia planejado nada.

Quando recebera o envelope com o timbre da Universidade de Chicago, no dia anterior, surpreendera-se por ter sido convidado para o banquete em prol do Fundo de Apoio para estudantes carentes. No tinha contato com a instituio em que se formara, e sups que algum membro do comit de organizao fora incumbido de avisar todos os ex-alunos.

Num impulso, fizera a mala num piscar de olhos, estimulado pelo fato de no ter nada para fazer nas quatro semanas seguintes. Pela primeira vez em muitos anos, decidira que estava na hora de afastar-se da rotina estressante como agente especial.

Ajeitou a almofada sob a cabea e sorriu com amargura ao pensar na ironia do destino, fadando-o a se privar das primeiras frias desde que entrara no FBI.

Havia um assassino cruel solta. No descansaria enquanto no o encontrasse, e um arrepio gelado percorreu sua espinha ao pensar que Elizabeth poderia ter sido a vtima.

E o pior era que o caso fora assumido pelo detetive O'Rilley, refletiu com desgosto, decidido a pedir a Joey que interviesse. Seu primo era chefe do Departamento de Polcia de Chicago, e poderia designar outro detetive para o caso, algum que tivesse chance real de descobrir o que havia acontecido.

Ele cruzou os braos sobre o peito. Como um homem como aquele conseguira tornar-se detetive? Ele sequer perguntara a Elizabeth se havia algum que pudesse desejar mat-la. Afinal, o apartamento era dela. Seria fcil confundir as duas mulheres no quarto escuro, especialmente quando Julie usava o robe de Elizabeth e uma toalha envolvendo os cabelos.

Na certa, o assassino esperava encontr-la no apartamento, e havia planejado o ato depois de observ-la e decidir sobre a melhor oportunidade de agir.

Drake fechou os olhos, esforando-se para dormir. Tinha uma enormidade de questes na cabea, mas teriam de esperar. E, como se no bastasse, tinha de conter as batidas descompassadas do corao, que parecia explodir no peito pela simples ideia de estar ao lado da mulher que ele amava.

Elizabeth abriu os olhos e levou alguns segundos para reconhecer o quarto do hotel. O ambiente estranho forneceu-lhe as irrefutveis evidncias de que a noite anterior no fora um pesadelo, como desejava, mas a dura realidade.

Olhou para o relgio de pulso e se assustou ao perceber que passava do meio-dia. Ainda sonolenta, arrependeu-se por ter tomado as plulas para dormir.

Apanhou roupas limpas e, a caminho do banheiro, ouviu o som da televiso na antessala. Na certa, Drake ainda estava l, concluiu com um misto de exasperao e alvio.

Abriu o chuveiro e deixou que o jato forte massageasse os msculos doloridos das costas. Sem que pudesse evitar, seu pensamento voltou no tempo.

Quando estava no primeiro ano de Medicina, ela e Julie decidiram participar da festa de rveillon promovida pela universidade.

Ao soar meia-noite, Kevin no estava por perto. Ela olhava ao redor, procura do namorado, quando se deparou com os olhos mais azuis que j vira.

O rapaz desconhecido se aproximara com um sorriso devastador e, tomando-a nos braos, a beijara apaixonadamente, sem lhe dar chance de reagir.

Achei que voc estava precisando disso... ele sussurrara em seu ouvido. Feliz ano novo!

Ento, Kevin aparecera em seu campo de viso, e ela se esquivara dos braos poderosos. Durante o restante da noite, o sabor dos lbios viris permanecera em sua boca. Se no fosse por isso, julgaria que aquele beijo no passara de fruto da sua imaginao.

Semanas mais tarde, avistara o desconhecido novamente no campus da universidade.

Depois de uma pequena investigao particular, descobrira que ele concluiria o curso de Direito no vero daquele ano, para ingressar na academia de polcia.

Nunca mais o vira, at que, cinco anos mais tarde, fora para Atlanta, participar de um Congresso de Cardiologia.

Na ocasio, estava noiva de Kevin, e planejavam se casar no primeiro sbado de agosto. Ele estava no ltimo ano de Direito e conseguira trabalho em um escritrio de advocacia de Chicago, enquanto ela comearia a residncia mdica no hospital universitrio daquela cidade.

A vida deles estava planejada e sob controle, exatamente como ela gostava. Acreditava que formavam o par ideal, ambos dedicados profisso e com respeito mtuo pelo trabalho do outro.

Nada poderia ser to perfeito, at que Drake McGuire a fizesse descobrir que perfeio estava longe de representar felicidade.

Elizabeth espalhou xampu sobre os cabelos, e um sorriso nostlgico surgiu em seus lbios. Lembrava-se com vivida nitidez da ocasio quando, no intervalo de uma conferncia, sentara-se mesa do bar do hotel para fazer anotaes. De sbito, percebera que algum a fitava.

Reconhecera de imediato o rapaz alto, com os mais incrveis olhos azuis que j haviam pousado sobre ela, e o sorriso devastador que a fazia derreter.

O olhar direto e sensual provocara-lhe um arrepio, e seus lbios queimaram com a lembrana do nico beijo que haviam trocado naquela inesquecvel noite de rveillon.

Ele se aproximou, e conversaram como velhos conhecidos. Esquecida da conferncia, aceitou o convite para jantar, e acabou vivendo um fim de semana de paixo explosiva, em que as carcias e os beijos daquele homem a transformaram em algum que ela jamais imaginaria que pudesse ser.

Aps terem feito amor durante toda a noite, Elizabeth acordou no domingo pela manh, e no o encontrou a seu lado na cama. O bilhete sobre o travesseiro comunicava que Drake havia sado para resolver assuntos de trabalho, e estaria de volta no final da tarde.

Com um sorriso nos lbios, ela ligou a televiso e percorreu os canais casualmente, at que uma notcia lhe chamou a ateno.

Atnita, aumentou o volume ao ver uma jaqueta com emblema do FBI aparecer na tela. A nica coisa que sabia a respeito de Drake era que se formara na mesma universidade, no ano em que ela ingressara no curso de Medicina, e que seguira carreira na academia de polcia.

Seu corao havia se acelerado no peito ao ouvir que os agentes do FBI haviam apreendido vinte quilos de entorpecentes em um sobrado no centro da cidade, e trocaram tiros com os traficantes que monopolizavam o comrcio ilegal na regio.

... Dois agentes do FBI foram os responsveis por desmascarara operao. Um deles no resistiu, e o agente especial Drake McGuire est gravemente ferido...

Elizabeth fechou os olhos, sentindo uma sbita vertigem. Ao abri-los, ainda pde ver quando os paramdicos levavam a maca para a ambulncia, e reconheceu os cabelos escuros de Drake antes que algum tapasse a cmera.

Uma onda de pnico a invadiu. A vida daquele homem representava risco dirio, e ela no podia ter um relacionamento em que a incerteza e o temor a assombrassem constantemente.

Levantou-se de um pulo e apanhou seus pertences. Tinha de voltar para Chicago e para sua vida regular e organizada o mais depressa possvel.

Decidiu simplesmente que o que ela e Drake tinham vivido no passava de uma deliciosa fantasia, e estaria em sua lembrana para sempre.

Ao chegar ao aeroporto, telefonou para o hospital para ter certeza de que ele estava bem, e entrou no avio consciente de que uma parte de si havia morrido ao ir embora.

Nunca mais viu Drake McGuire, at a noite anterior...

Drake ergueu os olhos do laptop quando sentiu a presena de Elizabeth.

Est com fome? Pedi o caf da manh, embora esteja na hora do almoo.

Por que deixou que eu dormisse tanto? ela censurou, evitando os olhos dele. Ainda estou sonolenta pelo efeito do calmante.

Ele ergueu os ombros, sem responder. Ficara tentado a entrar no quarto dela diversas vezes, mas temera no confiar em si mesmo.

Foi bom ter falado com sua me na noite passada comentou, observando-a sentar-se mesa. As notcias sobre o assassinato esto em todos os noticirios da manh.

Tem razo. Agora, tenho de ligar para os pais de Julie.

A polcia j os informou.

Ela segurou a xcara de caf no ar e o fitou, intrigada.

O'Rilley telefonou hoje cedo ele explicou, respondendo pergunta silenciosa. Pediu que fssemos delegacia prestar depoimento. No se preocupe, apenas formalidade.

Est bem. Mesmo assim, quero ligar para os pais de Julie. Ela estava em meu apartamento e na sinto responsvel pelo que aconteceu.

Entendo que queira falar com eles, mas no faa isso por se sentir culpada. Voc no pode controlar tudo, Elizabeth. Algumas coisas simplesmente acontecem.

O pensamento de Drake voltou no tempo, para aquela manh em Atlanta, quando seu parceiro morrera na troca de tiros com os traficantes. Ele tambm se sentira responsvel, mesmo que todos ao seu redor tentassem convenc-lo de que fora um heri. Depois de tantos anos, ainda no tinha conseguido superar a culpa. Naquele dia, perdera mais do que seu parceiro. Perdera Elizabeth.

Quando tentou ligar para ela do hospital, j era tarde demais.

A enfermeira lhe dissera que sua irm havia ligado para saber como estava, e soubera que era a forma de Elizabeth se despedir. Ele no tinha irm.

No entanto, no a culpava por fugir. A vida de um agente especial do FBI, cuja misso mais rotineira resumia-se em rastrear cartis de drogas, no era exatamente a promessa de um casamento estvel e tranquilo.

Obrigada por me ajudar...

A voz de Elizabeth o trouxe de volta realidade.

Espere! Aonde voc vai?

Vou apanhar minha bagagem e chamar um txi. O detetive O'Rilley mencionou por quanto tempo tenho de permanecer afastada do meu apartamento?

Drake se levantou e fitou-a longamente, sem esconder a irritao.

No faa isso, Elizabeth. Temos de ficar juntos. Voc precisa de ajuda.

O detetive O'Rilley vai...

O'Rilley um idiota. Eu vou ajud-la.

Como? Voc nem trabalha nesta cidade...

Isso no vem ao caso. Fiz minha pesquisa particular na Internet e descobri que o marido de Julie, Stephan Parks, estava em um restaurante sofisticado em St. Louis, com sua ltima conquista. Muitas testemunhas podem confirmar seu libi.

Como descobriu?

possvel conseguir informaes incrveis pela Internet, especialmente tendo acesso ao banco de dados do FBI. Alm disso, h um agente em St. Louis que me deve alguns favores. Parece que o Sr. Parks ainda est em companhia da namorada nesta manh.

Ento, ele est fora da lista de suspeitos.

possvel, embora esse no seja um libi perfeito. Ele pode ter contratado algum para cometer o crime. Presumo que havia muito dinheiro envolvido no divrcio.

verdade. E eles estavam tendo problemas com a diviso de bens.

No seria a primeira vez que algum contrata um assassino para eliminar a esposa. Mas, claro, h outra possibilidade.

Qual ?

Ele colocou a mo nos bolsos e fixou os olhos de Elizabeth, relutante em fazer a pergunta que o atormentava.

H algum que possa desejar sua morte, Elizabeth?

O qu?! ela quase gritou, apoiando-se na cadeira. Isso um absurdo! Quem poderia desejar que eu morresse?

exatamente o que estou perguntando.

Eu sou mdica, Drake! Eu salvo vidas! Nunca fiz nada para que algum desejasse me exterminar.

E quanto ao seu ex-marido?

No tenho ex-marido.

Bem, ao menos eu no consegui encontrar ningum. Ela franziu o cenho e cruzou os braos.

Voc teve a ousadia de me investigar?

Tenho de cobrir todos os ngulos foi a resposta em tom profissional. E quanto ao pai da sua filha?

O pai de Layla no sabe da sua existncia. Decidi assumir a gravidez sozinha, e contei apenas com a ajuda da minha famlia. Minha me ficou comigo nos primeiros meses aps o nascimento de Layla, e depois que me mudei para o apartamento da Sra. Parisi passei a contar com a ajuda dela.

A expresso de Drake se suavizou. Por um momento, ela julgou que havia um brilho de admirao nos olhos do detetive. Baixou o rosto e mordeu o lbio. A ltima coisa que merecia dele era admirao.

De sbito, a tenso que pairava no ambiente se dissipou. Drake apanhou a jaqueta e fez um gesto na direo da porta.

Temos de ir delegacia.

Ela suspirou. A verdade era que se sentia segura ao lado daquele homem. Se os seus instintos estivessem corretos, ele era a pessoa mais adequada para ajud-la a desvendar a morte da amiga. O assassino de Julie tinha de ser desmascarado. Depois disso, Drake deixaria a cidade e ela poderia voltar para sua vida.

Elizabeth telefonou para os pais de Julie a caminho da delegacia. Tentou manter a voz calma e tranquila, mas no pde evitar que o pranto a interrompesse. O funeral seria na segunda-feira, no subrbio de Chicago onde a amiga nascera.

Quando chegaram delegacia, ela e Drake foram conduzidos a salas separadas. Elizabeth prestou depoimento para uma mulher que se apresentou como detetive Andi DeLuca, e no acrescentou nada ao que dissera na noite anterior.

Momentos depois, Drake encontrou-a na recepo. Embora ele tentasse disfarar, a irritao era evidente na fisionomia carregada.

Como foi?

Melhor do que voc, suponho ela comentou, avaliando a expresso fechada. Voc conhece a detetive DeLuca?

Ela foi minha parceira por alguns meses. Fiquei satisfeito ao saber que vai trabalhar com O'Rilley. Andi uma excelente profissional.

Ela foi sua parceira?

Ser minha imaginao, ou detectei uma ponta de cime?

claro que no! foi a resposta categrica, embora Elizabeth sentisse o rosto queimar.

No se preocupe, Dra. Iverson. Andi casada com meu primo.

Elizabeth o encarou com expresso de suspeita.

Voc no pediu para que ele intercedesse, no ?

Meu primo tem influncia no FBI. Falei com ele hoje pela manh para me assegurar de que o caso estar em boas mos. Sorriu e mudou de assunto. Est com fome?

Ela assentiu por fora do hbito. Ainda no conseguira administrar todos os acontecimentos desde a noite anterior.

Ns seremos liberados em breve.

Naquele momento, os detetives O'Rilley e Andi DeLuca se aproximaram.

Vocs podero ir embora em breve, mas ainda resta uma pergunta, McGuire... O'Rilley se sentou no banco frente dele e o encarou. Voc foi visto na cena do crime vinte minutos antes de a Dra. Iverson chegar. Como explica isso?

Fui visto? questionou, em tom de desafio. Quem a testemunha ocular?

Uma senhora no edifcio do outro lado da rua Andi respondeu. E o rapaz que mora no primeiro andar.

Donny?

Sim. O'Rilley respondeu com petulncia. Mostramos uma fotografia do seu namorado e ele o identificou.

O qu? Drake vociferou.

Detetive, Donny um excelente rapaz, mas tem problemas mentais, e pode ter se confundido.

No, estou certo de que no se confundiu. Ele reconheceu McGuire pela fotografia.

O'Rilley, voc est tomando o caminho errado! Drake fulminou-o com o olhar. Nunca neguei que estive no prdio de Elizabeth. Estava esperando que ela chegasse em casa.

E no viu nada suspeito enquanto esperava? indagou Andi.

No, nada.

Por que estava esperando pela doutora?

Eu j disse, somos amigos.

Quando foi a ltima vez que se encontraram?

Drake relanceou o olhar para Elizabeth, deixando claro que no estava feliz com a direo que o detetive tomava.

Oua, O'Rilley, j basta. Aconselho-o a parar de perder tempo e comear a procurar o verdadeiro assassino.

Vou liber-los, mas tenho mais uma pergunta... O que seu nome fazia na agenda de Julie Parks?

Elizabeth prendeu a respirao. Julie era a nica pessoa que conhecia a verdade sobre sua histria com Drake.

No sei, O'Rilley. Mas fique tranquilo. Quando eu descobrir, voc ser o primeiro a saber. Levantou-se e tomou a mo de Elizabeth. Vamos embora. Precisamos comer alguma coisa.

Momentos mais tarde, almoavam em um restaurante a algumas quadras da delegacia.

Por que Julie tinha meu endereo?

Elizabeth congelou o movimento, mantendo no ar o garfo que levava boca.

No tenho ideia replicou, guardando para si as suspeitas.

No sou uma pessoa fcil de ser encontrada. Nem mesmo meus primos sabem meu endereo.

Julie podia ser muito persistente quando queria alguma coisa. Teria feito qualquer coisa por mim, mesmo que se prejudicasse.

E o que ela estava tentando fazer por voc, Elizabeth? Ela sorveu um gole da bebida e tentou se acalmar.

Estou esperando Drake insistiu, recostando-se na cadeira. Elizabeth cruzou os talheres, tentando decidir o quanto lhe diria.

Quando finalmente o fitou, sentiu a sbita urgncia de abrir o corao. Desejava revelar todos os segredos que a oprimiam, e ento chorar nos ombros dele e contar como foram difceis todos aqueles anos. Mas sabia que no poderia fazer isso, ao menos por enquanto.

Sorriu, tentando relaxar a tenso, decidida a dizer apenas parte da verdade.

Creio que tenho uma ideia do por que da Julie estar interessada em encontrar voc. Entenda, ela era uma romntica incorrigvel... Infelizmente, creio que foi por isso que pediu o divrcio. Estava procura do homem perfeito.

No vejo a relao que isso possa ter comigo.

Bem, ela julgava que havia um homem perfeito para mim... No tenho tido muitos encontros, e ela se preocupava com minha solido. Julie costumava dizer que eu trabalhava demais e precisava me divertir.

Por que isso no me surpreende? Um sorriso provocante surgiu nos lbios de Drake. E asseguro-lhe que no est sozinha por causa da sua aparncia.

Elizabeth ignorou o comentrio e prosseguiu.

Eu contei a ela sobre ns dois e sobre o nosso encontro em Atlanta...

Bem, fomos "ns dois" por um perodo breve.

Eu sei. Mas, para Julie, voc passou a ser o homem perfeito para mim. Eu disse que ela era uma romntica incorrigvel. Estava tentando bancar Cupido e nos aproximar.

Ento, foi ela quem enviou o folheto sobre o banquete... Drake murmurou, pensando em voz alta.

No h dvida.

E estava endereado aos cuidados da sede do FBI em Atlanta. Confesso que fiquei surpreso por receb-lo. Ele suspirou e colocou o guardanapo sobre a mesa. Bem, isso esclarece o mistrio. E agora, o que faremos?

A pergunta soou como mera retrica, e Elizabeth no respondeu. A garonete chegou com a conta, e ela imediatamente desviou a ateno dos adorveis olhos de Drake.

Drake apanhou a carteira e pagou a refeio, impedindo-a de se manifestar.

Enquanto seguiam para o carro, ele refletiu que a revelao de Elizabeth explicava muito, mas no tudo. Havia algo que ela no lhe contara, mas trataria de descobrir.

Creio que temos de conversar com Donny Parisi anunciou, ligando o carro. Talvez ele tenha visto o verdadeiro assassino, mas duvido que O'Rilley saiba conduzir o interrogatrio.

Voc tem sido muito severo com ele.

Talvez tenha razo, mas prefiro falar com o garoto eu mesmo.

Vou com voc.

No sei se seria uma boa ideia.

Voc no conhece Donny. Ele se excita com muita facilidade. Creio que ficar mais tranquilo se eu estiver presente.

No foi o que eu quis dizer. Acho que no uma boa ideia voc voltar ao prdio.

Acredite, eu estou bem. Ademais, gostaria de conversar com Mary. Ela deve estar aborrecida e preocupada alm de tudo.

Ele assentiu, e seguiram em silncio.

Ao pararem frente do prdio, Elizabeth sentiu o estmago se contrair. As cenas da noite anterior giravam em sua cabea como um caleidoscpio macabro, provocando-lhe vertigens.

Respirou fundo e tentou reaver o controle. Drake tinha razo, ponderou ao descer do carro. Ainda no estava preparada para retornar ao seu apartamento.

Captulo III

Mary Pari si recebeu Elizabeth com lgrimas nos olhos, e abraou-a carinhosamente.

Querida, eu estava muito preocupada com voc. Deve ter sido terrvel!

Eu ainda no consigo acreditar no que aconteceu... Enxugou as lgrimas e tentou sorrir. Como est Donny?

Ficou muito abalado com os acontecimentos, e se recusa a sair do quarto. Desde ontem noite, no tivemos um s minuto de paz. Ele est assustado com as sirenes e as cmeras de televiso.

Entendo... Elizabeth pousou as mos nos ombros da simptica senhora... Mary, este Drake McGuire, agente especial do FBI. Ele est ajudando a desvendar o crime, e gostaria de conversar com Donny.

Ele avaliou a senhora de pouco mais de cinquenta anos. As linhas ao redor dos olhos revelavam um certo cansao, mas a pele rosada guardava o vio da juventude.

Voc... Eu o reconheo! ela murmurou, com expresso de desconfiana... o mesmo rosto da fotografia que aquele detetive... Como o nome dele?

O'Rilley.

Sim, isso mesmo. O detetive O'Rilley esteve aqui hoje tarde e conversou com Donny. Mostrou uma fotografia, e meu filho o reconheceu como sendo o homem que estava em frente ao prdio, pouco antes de voc chegar.

Elizabeth fez um gesto para que Drake se contivesse.

Entenda, Mary, temos de falar com Donny. Talvez ele tenha informaes que possam nos ajudar.

Sinto muito, querida, mas...

Mary, por favor. Faa isso por mim.

Ela olhou de um para o outro, e finalmente fez um gesto para que entrassem.

Drake observou que o apartamento fora modificado, e a sala ampla era dividida ao meio para dar lugar a um quarto. Um jovem, de costas para eles, mantinha a ateno fixa na tela do computador.

Donny, meu querido, voc tem visitas...

O rapaz no deu mostras de ter ouvido, e Elizabeth se aproximou.

O que est jogando? Parou ao lado dele, tomando o cuidado de no se aproximar demais. Aposto que voc j fez muitos pontos!

Eu sou o campeo o rapaz declarou, rompendo o silncio.

Donny, quero que conhea um amigo meu... Drake McGuire, ele agente especial do FBI.

No! V embora! Voc m!

Querido, por favor! Mary intercedeu. Elizabeth no m. Ela nossa amiga.

O rapaz aparentava ter cerca de vinte anos, e Drake observou claros traos fisionmicos revelando que era portador da sndrome de Down. Notou tambm a posio do console do computador frente da janela, proporcionando uma viso perfeita da rua.

Donny tem excelente memria Mary comentou, constrangida com o comportamento do filho. Ele no se esqueceu daquele incidente com Layla.

Ele ficou sem falar comigo por um ms Elizabeth explicou, respondendo pergunta silenciosa de Drake. Eu havia dado uma bicicleta nova para Layla, e a deixei na calada enquanto entrava para guardar a correspondncia. Ao voltar, ela no estava onde eu a deixara, e fiquei desesperada. Encontrei-a dois quarteires frente, e a trouxe para casa. Donny viu pela janela quando voltvamos, e eu estava furiosa. Repreendi-a severamente e a deixei de castigo.

Donny adora Layla, e achou que tinha de defend-laMary justificou.

Entendo...

Drake se aproximou e agachou-se ao lado do rapaz.

Donny, quer ver meu distintivo? Pode peg-lo, se quiser ofereceu ao rapaz, estendendo-o.

A hostilidade deu lugar ao mais puro interesse. Donny se voltou, fascinado com a pea de metal.

Aposto que pode ver muita coisa daqui... Apontou para a janela. Voc me viu ontem noite, no ?

Donny assentiu, sem desviar a ateno do distintivo.

Hum... O que voc viu ontem noite, antes que os policiais chegassem?

A pergunta fez com que a hostilidade voltasse no mesmo instante, e o rapaz devolveu o distintivo e lhe deu as costas.

V embora! Voc mau! Todos so maus!

No verdade. Estou aqui para ajudar.

Sim, voc mau! A mulher de cabelos amarelos m!

O que voc disse, meu querido? Mary se aproximou, confusa. Voc se refere amiga de Elizabeth? Ela foi m com voc?

Vo embora!

Est bem, no queremos pression-lo.

Vamos todos para a cozinha Mary sugeriu, tentando relaxar. Acabei de fazer caf, e tenho bolo de chocolate.

Eles a seguiram, e sentaram-se mesa enquanto a anfitri os servia com generosas pores de bolo e xcaras de caf fumegante.

Sinto muito pela teimosia de Donny desculpou-se, sentando-se frente deles.

No se preocupe. Estou certo de que ele vai contar o que sabe quando se acalmar.

Talvez. Donny tem excelente memria. Mary voltou-se para Elizabeth. Fiquei surpresa ao descobrir que voc tinha uma hspede. Eu no sabia que ela viria.

Desculpe, mas no me lembrei de avis-la. Voc e Donny estavam fora quando Julie chegou, e combinamos que ela pegaria a cpia da chave que fica escondida na garagem.

Oh, entendo.

Sra. Parisi, saberia me dizer se Donny ficou sozinho com a Srta. Parks?

O que quer dizer?

Houve algum momento, ontem, em que estiveram juntos, em que ela pudesse ter feito algo de que seu filho no gostasse?

Julie seria incapaz de fazer qualquer tipo de maldade! Elizabeth replicou, indignada.

Oua, talvez ela tenha feito algo que fosse mal interpretado, como quando voc repreendeu Layla. Ele disse que a moa de cabelos amarelos era m. Drake voltou-se para Mary. Eles ficaram sozinhos em algum momento?

No seria possvel. Ele ficou comigo em casa durante o tempo todo, exceto por alguns minutos, quando foi levar o lixo para fora. Donny gosta de me ajudar, e peo que faa algumas pequenas tarefas.

A que horas ele saiu?

Entre sete e sete e meia da noite... Talvez mais tarde.

E ele se comportou de forma diferente ao retornar?

No... Drake teve certeza de que ela havia se lembrado de algo, mas no disse nada. Ele foi para o quarto e ficou a noite toda jogando no computador.

Bem, ento, creio que melhor irmos embora. Elizabeth levantou-se e saiu, sem esperar por ele.

Como ousa interrogar Mary como se ela ou o filho fossem suspeitos?! indagou ao chegarem calada.

Por um momento, julgou que ele fosse responder, mas Drake simplesmente ergueu as mos.

No vamos discutir agora. Quero investigar as redondezas antes do anoitecer.

Antes que ela pudesse objetar, Drake contornou o edifcio e desapareceu do seu campo de viso.

Frustrada, ela olhou em sua volta. De sbito, sentiu-se exposta e vulnervel. Percebeu que o Jaguar vermelho de Julie ainda permanecia na garagem. Ento, um sbito pensamento lhe ocorreu, fazendo-a arrepiar. Talvez algum tivesse visto o carro da amiga na garagem e julgado que fosse o seu...

Drake teria razo? Seria ela o alvo do assassino?

Um calafrio percorreu seu corpo; cruzou os braos, sentindo um frio sbito. Seguiu para o carro de Drake e se recostou no capo, sem alternativa a no ser esperar enquanto ele acabava a inspeo.

Ao v-lo se aproximar, abriu a boca para censur-lo novamente pela conduta com Mary, mas ele a impediu com um gesto firme.

No aqui. No quero que Donny nos veja discutindo. Abriu a porta de passageiros e esperou que ela entrasse. Contornou o carro, entrou e ligou o motor.

Enquanto seguiam pelas ruas movimentadas de Chicago, Elizabeth se ps a pensar em como sua vida se transformara num verdadeiro caos da noite para o dia. Sua melhor amiga fora assassinada, e o ltimo homem que esperava encontrar estava envolvido naquela histria de terror.

Voltou-se para ele, furiosa por ter entrado em sua vida sem ser convidado. No entanto, antes que pudesse dar voz ira, Drake desviou os olhos da avenida e fitou-a com ternura.

Foi o que bastou para que uma cascata de emoes crescesse em seu peito, alimentando o fogo.

Definitivamente, no era o momento adequado para ter aquele tipo de reao.

Drake estacionou diante de um bar, desceu e contornou o carro para abrir a porta de passageiros.

Pedi que Andi nos encontrasse aqui informou, conduzindo-a para uma mesa isolada. E, por favor, peo que nunca mais interfira em meus interrogatrios. Entendo por que fez aquilo, mas espero que no se repita.

Voc deve estar brincando! Acho que tenho de lembr-lo de que nunca pedi para que investigasse o caso, e certamente eu no sabia que voc iria interrogar Mary! Como ousa? Ela j tem problemas suficientes com o filho.

Oua Elizabeth. mesmo que vocs se recusem a admitir, Donny sabe de alguma coisa, e Mary tem conscincia disso. Pude ver nos olhos dela. Estava com medo, e aposto que ela prpria se perguntou o que aconteceu na noite passada, e est tentando proteger o filho.

O que esperava? Voc acusou Donny de assassinato!

Admito que pensei nessa possibilidade. Voc mesma disse que ele muito protetor com relao sua filha. Quem sabe o que poderia ter leito se julgasse que Julie fez algum mal a ela?

Mame j havia ido apanhar Layla quando Julie chegou. Elas no se encontraram. Alm disso. Donny jamais faria algo desse tipo!

Talvez, mas temos de explorar todas as possibilidades. Algo me diz que Donny a chave do mistrio, e gosto de seguir minha intuio.

Elizabeth o encarou. Lembrava-se da ocasio em que seguira seus prprios instintos e seu mundo havia se revirado pelo avesso... Respirou fundo, sentindo a tenso que pairava entre eles.

Ali est Andi ele disse, levantando-se.

Fez sinal garonete para que trouxesse drinques e sorriu ao perceber que a agente no estava sozinha. Um homem caminhava ao lado dela, conduzindo-a na direo da mesa.

Drake! Deus, bom v-lo! Por que no disse que estava na cidade? O homem abraou-o com carinho. Rapaz, mame no est nada contente com voc! Ficou furiosa por ainda no ter ido v-la. Detesto dizer isso, mas aquela mulher conhece mais palavres do que alguns bandidos que prendi pelas ruas!

Elizabeth sorriu ao ver o afeto que havia entre os dois.

Notou a semelhana entre eles. Embora o recm-chegado no possusse a mesma estatura nem a mesma presena imponente, os traos fisionmicos eram similares.

Esta a Dra. Iverson. Elizabeth, quero que conhea meu primo, tenente Joey DeLuca.

Prazer em conhec-lo. Voltou-se para Andi. Como vai, agente DeLuca?

Chame-me Andi, por favor a agente pediu com um sorriso. Eu estou bem, mas se no tomar alguma coisa agora mesmo, sou capaz de desmaiar!

O casal sentou-se mesa, e brindaram o encontro com uma rodada de cerveja.

Conversaram animadamente, e Drake ria com vontade diante dos comentrios bem-humorados de Joey. O som preencheu o ar, acariciando Elizabeth como uma doce melodia e rompendo o momento de tristeza.

Alguma novidade? Drake indagou, depois de conversarem animadamente sobre assuntos de famlia.

O legista encontrou oito ferimentos a faca no corpo da Sra. Parks. Dois deles eram fatais, o que indica que o assassino sabia exatamente onde mirar. H indcios de que ela agonizou durante cerca de uma hora, e havia morrido entre vinte c trinta minutos antes que voc a encontrasse, Dra. Iverson. De acordo com seu depoimento, foi por volta de 22 horas, mas no puderam precisar o momento exato da morte.

Drake olhou para Elizabeth, contendo o mpeto de confort-la ao perceber que ela lutava heroicamente contra as lgrimas.

No havia impresses digitais no apartamento, alm das suas, de sua filha e de Julie. No corrimo da escada, foram identificadas marcas da Sra. Parisi e do filho dela. A arma do crime no foi encontrada, e, por mais estranho que parea, no havia mais nenhuma pista. Com todo aquele sangue, era de se esperar que o assassino tivesse deixado pegadas ao sair. Tambm no forou a entrada, nem houve abuso sexual.

Vi um rastro de sangue entrada do quarto Elizabeth comentou.

Sim, mas interrompeu-se bruscamente. Isso deixa claro que a vtima foi atacada no banheiro. Algum comentrio, Drake? Joey prosseguiu ao v-lo negar com um gesto de cabea. O assassino levou a arma embora. Talvez a tenha envolvido em uma toalha. Dra. Iverson, notou falta de algo no apartamento?

Eu estava em estado de choque, e naquele momento no tinha condies de perceber a falta de joias, dinheiro, nem mesmo uma toalha.

Podemos afirmar que o assassino no tinha inteno de roubar. Andi completou. Tudo leva a crer que foi um crime premeditado.

No que est pensando, Drake? Joey perguntou, voltando-se para o primo.

Seu agente especial do FBI acredita que o assassino o garoto do primeiro andar Elizabeth disse em tom de denncia.

Drake recriminou-a com o olhar antes de voltar a ateno para Andi.

Concordo com suas suposies. Investiguei os arredores antes de vir para c, e no vi sinais de arrombamento, nem pegadas no jardim. Isso nos deixa a hiptese de que foi algum que estava no interior do prdio, ou que conhecia Julie.

o que confirmam as evidncias.

Sem dvida, primo. Julie foi atacada pelas costas quando saiu do chuveiro e seguia para o quarto, o que me faz pensar que havia algum no apartamento, esperando por ela. Poderamos suspeitar de algum psicopata, mas o assassinato foi realizado por algum que teve o cuidado de no deixar impresses digitais nem pistas. Creio que usava luvas, e alguma coisa para disfarar as pegadas.

Tem razo Andi murmurou, pensativa.

Tomei a liberdade de investigar o marido dela Drake informou. Ele tem um libi incontestvel, mas poderia ser um caso de assassinato encomendado.

uma possibilidade. por isso que gostaramos que voc tentasse se lembrar de qualquer pessoa que tenha conexo com Julie Andi falou para Elizabeth. Pedimos o mesmo aos pais dela. Alm disso, gostaria que fizesse uma relao de todas as pessoas que conhece, qualquer um que possa ter alguma hostilidade contra voc. No temos certeza se Julie era realmente o alvo do assassino.

Joey fitou Elizabeth com expresso preocupada.

fundamental que voc tenha proteo at descobrirmos o verdadeiro assassino. Eu poderia colocar um homem do departamento para fazer sua segurana, mas ningum seria to eficiente quanto Drake. Ele j est no caso, e creio que no se importar em cuidar disso.

Claro. Fique tranquilo, Joey.

Elizabeth olhou de um para o outro, atnita. No estava acostumada a que decidissem sobre sua vida, mas no teve foras para reagir.

Tudo o que quero voltar para o meu apartamento e prosseguir com a minha vida lamentou. Tenho de trazer minha filha para casa.

No aconselhvel, ao menos por enquanto Joey afirmou, categrico. Algum entrou no seu apartamento, e poder voltar. No seguro para sua filha.

Ela abriu a boca para dizer alguma coisa, mas no encontrou argumentos. A segurana de Layla era a nica coisa que importava.

Observou-os trocarem ideias e suposies, e manteve-se calada at se despedirem, uma hora mais tarde.

Apenas dirija pediu a Drake, quando entraram no carro. No estava disposta a conversar. A presena daquele homem em sua vida fora endossada pelo Departamento de Polcia de Chicago. O que poderia fazer para contestar?

Joey e Andi haviam determinado que Drake ficasse na mesma sute que ela, reiterando que no a abandonasse por um s minuto at que tivessem pistas do assassino.

Ela sabia que deveria estar grata por ter um agente do FBI como guarda-costas, mas aquele homem era perigoso demais para seu corao.

A caminho do hotel, Elizabeth se lembrou de apanhar as mensagens na caixa postal do celular, consciente de que era uma forma de preencher o silncio.

A maioria dos recados era dos colegas, preocupados com as notcias que viram pela televi so. A ltima mensagem fora deixada pelo Dr. Benson, seu chefe. Ele se mostrara chocado com o assassinato e sugeria que ela no fosse trabalhar na segunda-feira.

Elizabeth ponderou que seria prefervel ir para a clnica e se concentrar no trabalho a passar o dia todo ao lado de Drake. No mesmo instante, deixou uma mensagem para seu chefe dizendo-lhe que planejava estar na clnica na segunda-feira, mas sairia no perodo da tarde para o funeral de Julie.

A seguir, telefonou para sua me e falou com Layla, prometendo que a visitaria no dia seguinte.

Quando entraram na sute, anunciou que pretendia trabalhar na lista de nomes que Andi lhe pedira e se trancou no quarto.

Seus nervos estavam em frangalhos, e a proximidade daquele homem servia apenas para deix-la mais nervosa. No entanto, bastou que deitasse a cabea no travesseiro para adormecer no mesmo instante.

Na manh seguinte, Elizabeth acordou com leves batidas porta da sute, e percebeu que se tratava do servio de quarto entregando o desjejum.

Levantou, sentindo-se renovada depois da noite de sono sem necessitar de calmantes. Tomou um banho demorado, e olhou para o relgio de pulso sobre o criado-mudo.

Avaliando que ainda teria tempo para o caf da manh, vestiu o robe e abriu a porta com cuidado para ter certeza de que Drake no estava por perto. Verificou a porta para o lavabo, na sala de estar, e entrou ao ver que a porta estava fechada.

Apanhou um biscoito coberto com creme e fechou os olhos para saborear o delicioso paladar. Pegou mais um biscoito, e encheu uma xcara com caf.

Ao se voltar para entrar no quarto, a porta do banheiro se abriu de sbito. Drake saiu, vestido com apenas uma toalha ao redor da cintura. Ele estacou assim que a viu, to chocado quanto ela com aquele encontro.

Elizabeth examinou com o olhar o torso nu, acompanhando o desenho dos pelos escuros que se perdiam sob a toalha.

Censurando-se duramente, ergueu o rosto e deparou-se com os olhos de Drake pousados sobre ela. Seu pulso se acelerou ao perceber que ele tambm a avaliava.

Somente ento teve conscincia de que usava apenas o fino robe de renda transparente, e mais nada!

Esqueci o aparelho de barbear... ele explicou-se, atravessando a sala para apanh-lo na mochila.

Incapaz de se mover, Elizabeth acompanhou-o com o olhar at que a porta do banheiro se fechasse.

Lembrando-se de respirar, correu para o quarto e fechou a porta, sem notar que deixara seu desjejum intocado sobre a mesa.

Por que est fazendo isso? indagou enquanto Drake seguia pela via expressa em direo ao centro da cidade.

Ele insistira em lev-la fazenda para encontrar a me e a filha, argumentando que tinha de cuidar da sua segurana.

a forma mais rpida de voc chegar l.

Estava me referindo a outra coisa... Quero saber por que voc est aqui e, principalmente, por que se ofereceu para ser meu guarda-costas.

Digamos que est no meu sangue. No consigo resistir a um desafio.

Espero que no se sinta obrigado a me acompanhar.

Por que me sentiria?

Bem... ela hesitou, arrependendo-se por tocar naquele assunto. Talvez pelo que vivemos em Atlanta.

Voc se refere quele fim de semana em que voc me abandonou sem se despedir?

Um silncio pesado recaiu sobre o ambiente, e Drake foi o primeiro a romp-lo.

Desculpe. Eu no tinha motivos para esperar nada de voc em Atlanta. e acho que estava certa em partir. Aconteceria mais cedo ou mais tarde. Eu s no esperava que fosse to depressa.

No quero falar nesse assunto agora, Drake.

Entendo. Quero que saiba apenas que a nica coisa que eu esperava quando sa da sala de cirurgia era v-la.

Ele tocou de leve a mo delicada e sentiu uma onda de tenso percorrer os feixes nervosos.

Drake, sou imensamente grata por estar cuidando de mim, mas... No creio que isso v dar certo.

Voc no tem alternativa. Sua vida pode estar em risco, assim como a de sua filha e de pessoas que a rodeiam.

Ele retirou a mo como se tivesse levado um choque e fixou a ateno na estrada.

Desculpe-me pela hostilidade. Estou muito nervosa com tudo que aconteceu.

No se preocupe. Que caminho devo tomar para chegar fazenda?

Elizabeth passou a ensinar o caminho, tentando ignorar a carga macia de adrenalina que a impedia de raciocinar.

Drake aumentou o volume do rdio, e seguiram o restante do trajeto em silncio, entrecortado apenas pelas instrues sobre o caminho.

Captulo IV

Ao entrarem pelo porto da fazenda, uma adorvel garotinha de cabelos encaracolados correu ao encontro deles.

Mame!

Oh, meu anjo! Elizabeth desceu do carro e tomou a filha nos braos. Como vai a minha princesa?

Estou bem.

Sharon Iverson surgiu na varanda do casaro, e Elizabeth percebeu a interrogao preocupada nos olhos da me.

Beijou as bochechas coradas da menina e subiu os degraus da varanda para cumprimentar a me.

Quero que conheam o Sr. McGuire.

Prazer em conhec-lo, Sr. Mc...

McGuire Elizabeth ajudou a filha.

Sr. "Malguile" a criana repetiu com um lindo sorriso. Drake riu, encantado.

um prazer conhec-la tambm, minha linda. Por que no me chama de Drake? McGuire muito formal, no acha?

Ela concordou e se soltou dos braos da me.

Voc gosta de panquecas com recheio de geleia de amoras?

Sim, gosto muito.

Que bom! Vov preparou centenas de panquecas para o caf da manh, e eu ajudei. No , vov?

Sim, querida. A simptica senhora fez um gesto em direo porta. Vamos entrar. Layla deve estar com fome. Ela fez questo de esper-los para o caf da manh.

Sharon havia preparado um desjejum digno de reis, e ao sentar-se mesa Elizabeth percebeu que estava faminta.

No pde conter o sorriso ao ver Drake e Layla juntos. Ele parecia genuinamente encantado com sua filha, e ria a cada frase que a pequena garota dizia.

Evitou o olhar inquiridor da me durante a refeio. Explicou-lhe apenas que Drake era um amigo antigo e concordara em atuar como seu guarda-costas, fingindo ignorar o olhar significativo que recebeu dela.

Mame, vamos levar Drake parar conhecer a fazenda?

tima ideia, Layla Sharon estimulou. Enquanto isso, vou comear a preparar o almoo.

Almoo? Drake exclamou, alisando o abdmen. No consigo nem pensar em comer!

Espere s at experimentar a galinha assada com creme de milho verde que mame prepara!

Como adivinhou que exatamente o que eu planejava fazer? Eles riram, e Sharon os acompanhou at a varanda.

Sua me cuida sozinha da fazenda? ele indagou enquanto seguiam para os fundos da casa.

Oh, no! Ben Prazer arrendou as terras e assumiu a lavoura. Eu sou filha nica, e no tenho tempo para ajud-la. Mame recebeu vrias ofertas de compra, mas no suporta sequer falar no assunto.

Posso imaginar Drake comentou com um sorriso, observando Layla correr frente deles.

Esta a plantao de Ben Frazer. Estende-se por vinte hectares, e faz limite com a estrada. Meu av comeou a cultivar milho vinte anos atrs, e papai prosseguiu depois da morte dele. Ela sorriu com nostalgia. Cresci nesta fazenda, e o milharal parece ter estado a desde que me lembro por gente.

Pararam diante da plantao, e Drake perdeu o olhar na imensido verdejante.

Sua filha privilegiada por ter um espao como este para correr e brincar.

Se fosse seguir o desejo dela, nos mudaramos para c.

Layla adorvel. Notei que no se parece com voc nem com a av. Eu no saberia dizer quem mais bonita, se voc ou sua filha olhou para ela de relance , embora sejam diferentes estilos de beleza.

verdade, ela no se parece comigo Elizabeth comentou, ignorando o elogio.

Seguiram a criana at o pomar, enquanto ela refletia. Sharon tinha cabelos lisos, castanho-claros, e feies delicadas, assim como ela prpria, ao passo que a filha possua fartos cabelos cacheados, castanho-escuros, traos expressivos e queixo determinado.

Provavelmente, ela se parece com o pai Drake murmurou, como se pensasse alto.

Mais do que voc possa imaginar assentiu Elizabeth. Ela sorriu ao pensar na natureza impulsiva e nos olhos azuis da

filha. Sim, ela se parecia com o pai, mas no era momento de aprofundar o assunto com Drake.

Voc fica muito vontade com crianas observou, mudando o tema da conversa.

Creio que faz parte do meu instinto de sobrevivncia. Cresci em uma casa repleta de crianas. Meus tios so italianos catlicos e no acreditavam em controle da natalidade, at que, depois do sexto filho, minha tia decidiu que estava na hora de parar. Quando me adotaram, eu era a stima criana da casa.

Voc foi criado por seus tios?

Drake fez uma pausa, e Elizabeth percebeu que tentava esconder a tristeza.

Sim. Perdi meus pais em um acidente de carro fatal, quando estava com pouco mais de seis anos.

Oh, sinto muito... Meu pai faleceu h alguns anos, e foi horrvel. Posso imaginar o que perder os pais representa para uma criana to pequena.

Sim, mas tive a felicidade de crescer em uma famlia afetuosa e unida.

Mame, venha ver! Layla gritou, distraindo-a. Encontrei um ninho de passarinho com dois filhotes!

Eles entraram no pomar e se distraram com a criana. A pequena tagarelava sem parar, e voltou para casa nos ombros de Drake. Desde ento, no o deixou por um s minuto. Quis mostrar-lhe seu quarto e todos os desenhos que havia feito, alm de eleg-lo para coloc-la na cama e ler uma histria, quando anoiteceu.

Elizabeth sentiu o corao se contrair no peito quando entrou no carro para ir embora.

Gostei muito da sua famlia. Sua me adorvel e Layla uma criana encantadora Drake comentou desviando os olhos da estrada. Voc fez um timo trabalho.

Obrigada.

Elizabeth se voltou para a janela, sem conter o sorriso de orgulho nos lbios.

No que estava pensando? Algum tempo depois, Drake rompeu o silncio que se instalara entre eles.

Estava tentando pensar nos nomes para a lista de amigos e conhecidos de Julie. Infelizmente, com exceo dos ex-maridos, no consigo me lembrar de ningum. Era minha melhor amiga, mas no tnhamos crculo de amizade comum. Por mais estranho que parea, ns nos encontrvamos ocasionalmente, quando ela vinha para a cidade.

No penso que seja estranho. O importante era que podiam contar uma com a outra quando necessrio.

Mas ela no pde contar comigo na sexta-feira noite. Eu no estava l.

E, se estivesse...

Sim, eu sei. Poderia ter sido eu ela concluiu com pesar.

No seja to severa com voc, Elizabeth. Pessoas prximas s vtimas fatais sempre assumem para si a culpa pela tragdia, o que um grande erro. A culpa deve ser atribuda ao responsvel pelo crime, e no a quem sofreu a perda de um ente querido.

As palavras de Drake tiveram o efeito de um blsamo, e ela sentiu se aliviar o imenso peso que carregava nos ombros.

Vamos descobrir o que aconteceu Drake prosseguiu, em tom confiante. Andi e Joey so os melhores e, modstia parte, eu tambm sou bom no que fao.

Estou contando com isso.

Ao chegarem ao hotel, Drake insistiu para que ela o esperasse no saguo, enquanto verificava a segurana do apartamento. Minutos depois, telefonou para a recepo pedindo que ela subisse.

Quando entrou na sute, Elizabeth o encontrou ao telefone, e foi para a pequena cozinha guardar as frutas e queijos que trouxera da fazenda.

Andi e O'Rilley investigaram as redondezas do seu apartamento hoje. Ningum se lembrou de ter visto algum suspeito naquela noite, exceto eu, claro. Balanou a cabea, irritado. Eles tambm conversaram com os ex-maridos de Julie. Todos esto limpos, incluindo o atual, Stephan Parks. Andi levou peritos em papiloscopia para procurar impresses digitais no apartamento, e no encontraram nada alm do que j registraram.

Voc ainda suspeita de Donny?

Talvez ele no tenha cometido o crime, mas ainda acho que a chave do mistrio. Gostaria de conversar com ele novamente.

melhor no pression-lo.

No vou fazer isso. Temos de pensar tambm na possibilidade de que o assassino possa ser algum que invadiu a casa, como um psicopata ou um serial killer, embora no tenha havido crimes similares naquela rea. Drake sentou-se no sof e suspirou. Voc se lembra de algo incomum que tenha ocorrido na ltima semana? Qualquer coisa que a tenha deixado tensa, ou que no parecesse correto? Algum a seguiu?

Elizabeth sentou-se na poltrona diante dele e refletiu por alguns instantes.

No me lembro de nada fora da minha rotina diria. Fui para o centro cardiolgico pela manh, realizei algumas cirurgias, visitei os pacientes internados tarde, voltei e apanhei Layla na casa da Sra. Parisi, como de costume.

Ela se deteve. Sentia-se mal por ter de expor sua intimidade daquela forma, e tentou se convencer de que tudo aquilo era para seu prprio bem.

No me lembro de nada extraordinrio concluiu por fim.

Faa um esforo, Elizabeth. Isso muito srio.

Acha que no sei? Estou fora do meu apartamento, minha melhor amiga foi assassinada e no posso sequer dar um beijo de boa-noite na minha filha! desabafou, sem conter o pranto.

Levantou-se e caminhou at a janela, tentando reaver o autocontrole.

O luar refletia-se sobre o lago Michigan, iluminando a noite. Ela sorriu com amargura ao pensar que a serenidade do cenrio era diametralmente oposta s suas emoes.

Quando Drake lhe perguntara sobre o que estava pensando, no carro, ela havia mentido...

Tinha de contar sobre Layla, mais cedo ou mais tarde... mesmo que ele passasse a odi-la ao saber da verdade.

Fora egosta e covarde quando a filha nasceu, mas como explicar que sua nica preocupao era mant-la a salvo de todos os riscos que a presena de Drake poderia causar? Como justificar que no considerava que um agente especial do FBI fosse o pai ideal para sua filha?

Elizabeth suspirou, perdendo o olhar no horizonte. Tinha medo da reao de Drake ao descobrir que aquele fim de semana deixara uma consequncia que mudara sua vida...

Percebeu quando Drake se levantou e caminhou at ela, e fechou os olhos, receando que ele pudesse ler seus pensamentos.

Olhe para mim ouviu-o exigir em tom firme.

Abriu os olhos e se deparou com olhos que pareciam penetrar-lhe a alma. No reagiu ao sentir o gentil toque da boca possessiva sobre a dela. Uma cascata de arrepios percorreu seu corpo e ela entreabriu os lbios, receptiva ao contato. Mergulhando em um turbilho de emoes, enlaou-o pelo pescoo e colou-se ao corpo viril.

Podia sentir o pulsar do seu prprio corao confundindo-se com o dele, e desejou que o mundo parasse para sempre, imortalizando aquele momento.

Drake abaixou a cabea para mergulhar o rosto nos cabelos perfumados. No desejava deix-la, apesar de saber que seria o melhor a fazer. Obrigando-se a se concentrar na realidade, lembrou-se do rigoroso treinamento pelo qual passara no FBI.

No havia planejado aquele beijo, mas a situao safra do controle. J sofrer o severo castigo do remorso quando suas emoes sobrepujaram a razo, em Atlanta. Seu pensamento estava voltado para Elizabeth, e a distrao resultar na morte de seu parceiro.

Embora dissesse a si mesmo que no podia permitir que acontecesse mais uma vez, Drake no conseguia se afastar.

O incessante loque do seu celular obrigou-o a reaver o autocontrole. Distanciou-se e caminhou at a mesa para atender, e levou alguns segundos para reconhecer a voz do outro lado da linha.

Andi quer me falar sobre algo que descobriu comentou ao desligar. Ela est no saguo. Espere aqui enquanto vou encontr-la.

Vou com voc.

No. Voc precisa descansar. Eu lhe direi se for algo importante. Mantenha a porta fechada e no abra para ningum.

Com um ltimo olhar, guardou o telefone no bolso da cala e saiu. Encontrou Andi na recepo e fez uma careta ao percebei que O'Rilley estava com ela. Conduziu-os para a saleta reservada, anexa sala de espera do saguo.

O que descobriram?

D uma olhada Andi estendeu uma folha impressa. So as chamadas para a delegacia na noite do crime. Todas passaram pela central de emergncia.

O que h de errado? indagou aps estud-las rapidamente.

Veja a terceira pgina O'Rilley sugeriu com ar de triunfo H um telefonema do seu celular.

Eu liguei para saber o endereo de Elizabeth foi a resposta mal-humorada.

mesmo? E como explica o fato de ter feito esse telefonema pouco antes do crime?

Ainda no sabemos o horrio exato do ataque.

Quero uma resposta, McGuire.

Drake voltou o olhar para Andi, e ela fez um gesto discreto para que respondesse.

Isso um absurdo, O'Rilley! No sou o assassino. Liguei para a emergncia, esperando encontrar Sarah Anderson, ou algum que eu conhecesse. Sarah estava de planto, e me forneceu o endereo. Ela poder confirmar. Satisfeito?

E por que precisava do endereo? Voc sabia que Julie estava l? Talvez vocs dois j se conhecessem...

Drake conteve o mpeto de esmurr-lo, furioso com a insinuao.

Encontrei Elizabeth no banquete da universidade. No sabia onde ela morava, e tinha inteno de encontr-la, para conversarmos. Voltou-se para a oficial. Droga, Andi, voc acha que, se eu tivesse inteno de cometer um crime, teria ligado para a polcia para pegar o endereo da vtima? Poderia ter conseguido atravs do banco de dados do FBI, mas achei mais rpido ligar para a delegacia local.

Foi o que imaginei. De qualquer forma, tnhamos de perguntar Andi o tranquilizou. Verificamos as chamadas da Sra. Parks e ela esteve usando o telefone das 19h15minh s 19h44minh. Falava com o ex-marido, e j confirmamos com ele. Deve ter ido para o banheiro logo depois e, supondo que tenha levado vinte minutos no banho, possvel que o ataque tenha acontecido por volta das 20h15minh, talvez um pouco mais tarde. Parece estranho, quando havia combinado encontrar-se com Elizabeth s 19h45minh...

Se voc j sabia do horrio aproximado do ataque, por que deixou que esse... Drake engoliu a ofensa e mudou de tom. Por que deixou que ele me questionasse sobre o telefonema?

Eu queria ouvir sua resposta ela disse com um sorriso de provocao.

Talvez voc j tivesse assassinado Julie e feito o telefonema para ter um libi O'Rilley insistiu.

Certo, e ento, voltei para o centro da cidade para ouvir o discurso de Elizabeth.

Isso no um libi. Ningum mais o viu l contraps O'Rilley.

A que horas foi o discurso? Andi quis saber, ignorando a insinuao do parceiro.

No sei, mas devo ter sado do hotel por volta das 21 horas, considerando que fiz o telefonema dez minutos depois, de acordo com os registros. Andi, isso ridculo!

Est bem. O'Rilley, j terminamos aqui ela determinou. Vamos encerrar por hoje. Drake, mama DeLuca o espera para jantar na sexta-feira.

Andi, no estamos em uma reunio domstica! O'Rilley censurou, furioso. Seu marido pode ser um figuro do servio de inteligncia, mas ele no est no comando desta investigao. Vou falar com o capito sobre isso.

V em frente, O'Rilley. Sugiro apenas que no ligue esta noite para reclamar. Tente amanh. Voltou se para Drake com um sorriso. Ligue quando precisar.

De volta sute, ele se surpreendeu ao encontrar Elizabeth adormecida no sof.

O que vou fazer com voc? sussurrou, observando o rosto de traos perfeitos.

Sentou-se na poltrona e suspirou. Havia um assassino solta, e O'Rilley estava obcecado por encontrar alguma pista que o incriminasse.

No confiava na habilidade do detetive. Se quisesse manter Elizabeth a salvo, teria de averiguar por conta prpria e colaborar com Andi na investigao.

As 07h30min do dia seguinte, Elizabeth estacionou na vaga reservada no estacionamento do luxuoso prdio de cinco andares.

Logo que saiu do carro, Drake seguiu frente, para ter certeza de que o caminho estava seguro. Entrou no suntuoso saguo do centro cardiolgico e chamou-a com um gesto discreto.

Voc acha que isto mesmo necessrio? ela indagou, incomodada com a curiosidade que despertaram.

Tenho de fazer meu trabalho foi a resposta, dada em tom profissional.

Adentraram a recepo e ele olhou ao redor.

Uau! O'Rilley tinha mesmo razo! Parece que estou entrando em um hotel cinco estrelas, e no em um hospital. Aposto que seu salrio uma pequena fortuna.

No posso reclamar, mas no foi por isso que aceitei o trabalho ela afirmou, seguindo para o elevador.

mesmo? Ento, voc recebe ajuda do pai de Layla? Afinal, no fcil cuidar sozinha de uma criana.

Ela no respondeu, e seguiu para as escadas.

Voc no usa o elevador?

Prefiro aproveitar a chance de me exercitar respondeu, galgando os degrau1; com agilidade.

A verdade era que, desde um incidente traumtico na infncia, Elizabeth desenvolvera tendncia claustrofobia, mas no pretendia revelar a Drake.

Uma simptica enfermeira se aproximou para cumpriment-la, logo que chegaram ao andar da enfermaria.

Dra. Iverson! Que surpresa, no espervamos v-la hoje.

Bom-dia, Sra. Davis. Este o Sr. McGuire, que ficar comigo durante a manh. Tente no prestar ateno nele.

A enfermeira relanceou o olhar para Drake. Seria impossvel no notar a presena daquele homem, especialmente trajando o elegante terno esportivo, que aumentava ainda mais o seu charme.

Como est o planto de hoje? ela indagou, tentando desviar a ateno da jovem senhora para longe de Drake.

Ouviu atenta o relato sobre as intercorrncias da noite, e iniciou a rotina diria de visitar os pacientes internados na enfermaria.

Envolveu-se na atividade da manh, e no percebeu que Drake havia desaparecido. Por volta das onze horas, ele foi encontr-la em seu consultrio.

Podemos conversar?

Elizabeth concluiu que a pergunta era mera retrica ao v-lo entrar e fechar a porta.

Como foi sua manh?

Felizmente, no houve nenhuma ocorrncia grave. Ela se levantou, caminhando at a janela para admirar o jardim.

timo. Gostaria de falar sobre seus pacientes. Voc perdeu algum recentemente, algum que tenha deixado algum familiar inconsolado?

Voc deve estar brincando!

Por qu? No seria a primeira vez que algum culpa o mdico pela perda de um ente querido. Sei que houve poucos falecimentos no ltimo ms, mas possvel que algum tenha se revoltado.

Como descobriu sobre o ndice de mortalidade?

meu trabalho. Mas devo acrescentar que a maioria de suas enfermeiras muito discreta.

Elas so pagas para serem discretas e para no dizerem nada antitico, como exige a profisso.

Bem... Ele sorriu, e os belos olhos azuis se iluminaram. Digamos que minha boa aparncia e meu distintivo encurtaram o caminho.

Oh, perfeito! Agora, todos j sabem que o FBI tem um agente me vigiando!

No todos, apenas algumas enfermeiras. E eu disse que a investigao era secreta.

Est bem. Elizabeth suspirou, cansada demais para discutir sobre o assunto. Estamos em um centro cardiolgico. natural que a mortalidade seja elevada.

De sbito, ela se lembrou de um acontecimento na semana anterior. O marido da Sra. Babcock havia falecido na mesa de cirurgia. Ela ficara arrasada, mas Elizabeth no teve certeza se seria melhor contar a Drake.

No entanto, havia um assassino solta, e considerou que isso estava acima da tica.

H algum... Um paciente que vi em julho. Ele retornou na semana passada com fortes dores no peito, mas no pude atend-lo por estar envolvida em um procedimento com outro paciente. O Dr. Benson assumiu o caso e indicou cirurgia, mas ele no resistiu.

Ela havia ficado surpresa com a conduta do mdico, pois os exames radiogrficos no indicavam necessidade de interveno cirrgica. No entanto, seria inconcebvel questionar o homem que lhe ensinara tudo que sabia.

Lembrou-se de seu constrangimento quando a Sra. Babcock a abordara no corredor, inconformada por no t-lo atendido pessoalmente.

Isso acontece com frequncia?

A voz de Drake a distraiu de seus pensamentos.

No comum, mas alguns pacientes podem reagir mal mesa de cirurgia.

Bem, isso razo mais do que suficiente para deixar um familiar furioso.

A Sra. Babcock estava mais desapontada do que furiosa. No creio que investigar familiares em luto seja o caminho certo.

Est bem. Vou deix-la trabalhar. Se voc se lembrar de mais alguma coisa, no deixe de me comunicar. Tenho de verificar mais algumas informaes, mas voltarei a tempo de irmos ao funeral de Julie.

Ela assentiu, mas seu pensamento ainda estava distante. Logo que Drake saiu, levantou-se e seguiu para o consultrio do Dr. Benson.

Bom-dia cumprimentou ao entrar.

Claire Daniels ergueu os olhos da tela do computador e sorriu.

A jovem tinha a mesma idade de Elizabeth, e era bonita e eficiente. Usava os cabelos loiros presos em um comportado rabo-de-cavalo. e maquiagem discreta, apenas para realar os traos delicados do rosto bem-feito.

Elizabeth sempre se perguntara por que uma jovem to bonita ainda no havia se casado. O Dr. Benson tambm parecia dedicar-lhe ateno especial, considerando-a quase como filha.

Uma ponta de apreenso a oprimiu. O clebre cirurgio a protegia, e sempre a escolhia dentre todos os mdicos para acompanh-lo nas cirurgias. Elizabeth o admirava e respeitava, e sentia-se culpada pelo que pretendia fazer.

Voc sabe se o Dr. Benson est com o pronturio do Sr. Babcock?

Vou verificar. A jovem se levantou e abriu a gaveta do arquivo. Ele no a esperava hoje. Pediu que eu organizasse sua agenda para que algum cuide dos seus pacientes.

Obrigada, Claire, mas achei que vir trabalhar seria bom para me ocupar.

Entendo. Todos ns ficamos horrorizados com o que aconteceu. E o pior pensar que poderia ter sido voc...

Elizabeth concordou, sem evitar um calafrio percorrer seu corpo. J ouvira aquela suposio por tantas vezes que chegava a acreditar que fosse verdade.

Infelizmente, eu no estava l. Se estivesse, talvez o assassino tivesse pensado duas vezes ao me encontrar no apartamento.

Quem sabe? Claire se voltou e ergueu os ombros. No encontrei nada.

Talvez esteja no arquivo morto. Voc se importaria de verificar?

Sinto muito, mas no est aqui a moa comunicou ao voltar, instantes depois. No me lembro de ele ter me dado esse pronturio, mas posso estar enganada.

Est bem. Vou verificar no setor de registros.

Ah, Elizabeth... Eu achei que tinha ouvido sua voz!

Ela se voltou ao ouvir o som da voz masculina. O Dr. Noel Young, um dos mdicos protegidos do Dr. Benson, entrou na antessala do consultrio. Todos sabiam que o jovem mdico a cortejava abertamente, mas Elizabeth nunca demonstrara interesse em se relacionar com ele. Mesmo assim, o rapaz no desistia.

Como est? ele indagou com sinceridade.

Estou bem, dentro do possvel.

E quanto sua filha?

Ela franziu o cenho. No gostava da ideia de que Layla estivesse relacionada ao crime.

Ela est bem. Est na casa da minha me, na fazenda. Ficar l at que tudo volte ao normal.

timo. E melhor que a menina esteja protegida.

Claire limpou a garganta. Havia boatos de que ela e o jovem mdico estavam envolvidos, e eram encontrados juntos em diversas ocasies. Aquela era uma das razes pelas quais Elizabeth evitava a proximidade com o Dr. Young.

Desculpe-me, mas tenho de me apressar. O funeral de Julie ser dentro de uma hora.

Ela se afastou, sem que a presena do jovem mdico a tivesse distrado de seu objetivo.

Enquanto se dirigia para o setor de registros, tentava afastar do pensamento o mal-estar que a conversa com Claire havia provocado.

Por mais que evitasse formar opinio sobre o que acontecera, no deixava de ficai- intrigada com o desaparecimento do pronturio do Sr. Babcock.

Entrou no elevador e apertou o boto do subsolo, esperando que sua pequena investigao particular no a levasse para um caminho do qual poderia se arrepender depois.

Captulo V

Frustrada pela falta de sorte, Elizabeth agradeceu ao funcionrio que a atendera na sala de registros e consultou o relgio. Passava da unia hora, e Drake provavelmente estava procurando-a pelo prdio todo.

Antes de seguir para o funeral, ela passar no apartamento para trocar de roupa. Quando fizera a mala para se hospedar no hotel, havia se esquecido de colocar na bagagem o tailleur preto, apropriado para a ocasio.

Ao chegar porta, quase trombou com o Dr. Young.

Elizabeth! O que est fazendo aqui?

O mdico deu um passo frente e colocou a mo na parede, perto da sua cabea, bloqueando a sada. Por instantes, Elizabeth julgou que ele examinava a sala, como se tentasse descobrir alguma pista sobre o que a levara l... Ou seria apenas imaginao?

Talvez as perguntas de Drake a tivessem deixado paranoica, fazendo-a suspeitar de todos, concluiu.

Vim verificar o registro de um paciente respondeu, omitindo parte da verdade.

No se preocupe com seus pacientes. Voc precisa relaxar. O mdico olhou-a longamente. Detesto ter de dizer isto, mas sua aparncia est pssima. Nunca a vi to abatida, nem mesmo depois de um planto de doze horas.

Obrigada pela preocupao. Prometo que vou tentar descansar. E agora, se me der licena, eu realmente tenho de ir.

Ele hesitou por um momento e retirou a mo devagar.

Est bem. Sei que no est interessada em mim, mas conte comigo se precisar. Ficarei feliz em ajudar. No se esquea de que tem amigos, embora na maior parte do tempo voc aja como se estivesse em uma ilha deserta. Eu s a vejo sorrir quando est com seus pacientes.

No verdade... Elizabeth comeou a protestar, mas foi interrompida.

Infelizmente, minha querida doutora, verdade, embora eu deteste ter de dizer.

Voc est sendo melodramtico. Ela umedeceu os lbios, constrangida em admitir para si mesma que o Dr. Young tinha razo. Bem, j que est disposto a me ajudar, gostaria de lhe pedir um favor.

Ele sorriu, pronto para ouvi-la.

A Sra. Beal est agendada para esta tarde, e eu gostaria que a atendesse.

A est voc novamente falando sobre trabalho!

Ela est se queixando de mal-estar e dor de cabea prosseguiu, ignorando o comentrio. Todos os exames indicam que est bem, mas achei melhor examin-la. Sei que ela sofre de ansiedad