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Contrastes Regionais que fazem Diferença no Rio Grande do Sul: Capital Social e Desempenho Institucional Everton Rodrigo Santos 1 Jucelaine Bitarello 2 Sandra Montardo 3 Valdir Pedde 4 Resumo Este artigo tem como objetivo principal compreender os mecanismos que permitem aos governos locais realizarem seus propósitos, como construir estradas, educar as crianças ou mesmo promover o desenvolvimento de maneira satisfatória. A partir da revisão da bibliografia especializada, construímos uma episteme que possibilite compreender o desempenho do Estado em suas implicações institucionais formais em si (neo-institucionalismo), bem como, suas implicações com os padrões valorativos (cultura política) que dêem sustentação a estas (“os circuitos endógenos de mútua determinação”). Assim, o conceito de capital social (CS) constitui-se na referência central deste artigo. A metodologia utilizada recolhe resultados do Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE de 2007 e do projeto “Capital Social e Desenvolvimento Regional: a Recebimento: 16/7/2009 • Aceite: 27/10/2009 1 Doutor em Ciência Política pela UFRGS, atualmente é Professor Titular no Centro Universitário FEEVALE. End: Av. Dr. Maurício Cardoso, 510 Novo Hamburgo – RS, Brasil. E-mail: [email protected] 2 Mestre em Desenvolvimento Regional pela UNISC, atualmente é Professora Adjunta no Centro Universitário FEEVALE. E-mail: [email protected] 3 É doutora em Comunicação Social pela PUC-RS, atualmente é professora em regime contínuo do Centro. Universitário Feevale. E-mail: [email protected] 4 Doutor em Antropologia pela UFRGS, atualmente é Professor Titular no Centro Universitário FEEVALE. E-mail: [email protected]

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Este artigo tem como objetivo principal compreender os mecanismosque permitem aos governos locais realizarem seus propósitos, comoconstruir estradas, educar as crianças ou mesmo promover odesenvolvimento de maneira satisfatória. A partir da revisão dabibliografia especializada, construímos uma episteme que possibilitecompreender o desempenho do Estado em suas implicaçõesinstitucionais formais em si (neo-institucionalismo), bem como, suasimplicações com os padrões valorativos (cultura política) que dêemsustentação a estas (“os circuitos endógenos de mútua determinação”).

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  • Contrastes Regionais que fazem Diferena no Rio Grande do Sul: Capital Social e Desempenho Institucional

    Everton Rodrigo Santos1 Jucelaine Bitarello2 Sandra Montardo3

    Valdir Pedde4

    Resumo

    Este artigo tem como objetivo principal compreender os mecanismos que permitem aos governos locais realizarem seus propsitos, como construir estradas, educar as crianas ou mesmo promover o desenvolvimento de maneira satisfatria. A partir da reviso da bibliografia especializada, construmos uma episteme que possibilite compreender o desempenho do Estado em suas implicaes institucionais formais em si (neo-institucionalismo), bem como, suas implicaes com os padres valorativos (cultura poltica) que dem sustentao a estas (os circuitos endgenos de mtua determinao). Assim, o conceito de capital social (CS) constitui-se na referncia central deste artigo. A metodologia utilizada recolhe resultados do Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE de 2007 e do projeto Capital Social e Desenvolvimento Regional: a

    Recebimento: 16/7/2009 Aceite: 27/10/2009 1 Doutor em Cincia Poltica pela UFRGS, atualmente Professor Titular no Centro Universitrio FEEVALE. End: Av. Dr. Maurcio Cardoso, 510 Novo Hamburgo RS, Brasil. E-mail: [email protected] 2 Mestre em Desenvolvimento Regional pela UNISC, atualmente Professora Adjunta no Centro Universitrio FEEVALE. E-mail: [email protected] 3 doutora em Comunicao Social pela PUC-RS, atualmente professora em regime contnuo do Centro. Universitrio Feevale. E-mail: [email protected] 4 Doutor em Antropologia pela UFRGS, atualmente Professor Titular no Centro Universitrio FEEVALE. E-mail: [email protected]

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    importncia do capital social no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste, de 2004. Ambos Surveys aplicados nos COREDES Vale do Rio dos Sinos e Nordeste totalizando 1206 questionrios, com erro amostral de 4% e confiana de 95%. Palavras-chave: capital social; desenvolvimento regional; desempenho institucional e democracia.

    Regional contrasts that make difference in Rio Grande do Sul: social capital and institutional performance

    Abstract

    This article's main objective is to understand the mechanisms that allow local governments to achieve their purposes, like building roads, educating children or even promote the development satisfactorily. From the review of relevant literature, we construct an episteme that allows to understand the performance of the State in their formal institutional implications itself (neo-institutionalism) and its implications, with the value patterns (political culture) that support these (the endogenous channels of mutual determination "). Therefore the concept of social capital (SC) constitutes the central reference of this article. The methodology used in gathering results of the Research Group on Regional Development / CPP FEEVALE 2007 and the project "Social Capital and Regional Development: the importance of social capital in regional development COREDE the Northeast," 2004. Both Surveys in both applied COREDES Vale do Rio dos Sinos and Northeast total 1206 questionnaires, with a sampling error of 4% and 95% confidence. Keywords: social capital; regional development; institutional performance and democracy.

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    Introduo

    Nas ltimas dcadas assistimos a um avano poltico institucional inegvel no pas. De uma maneira geral, as eleies tornaram-se rotineiras e as liberdades polticas de organizao e participao tm adquirido uma importncia central nessas sociedades. Todavia, nem sempre estes avanos polticos institucionais significaram melhora efetiva e progressiva das condies de vida dos brasileiros. Convivendo majoritariamente com os partidos, o parlamento e as eleies, os governantes no Brasil tm-se deparado com uma demanda crescente da sociedade sobre as instituies do Estado e de suas polticas pblicas. Este um fenmeno tpico de sociedades democrticas, em que as comportas que represavam a presso social sobre o Estado durante os tempos pretritos do autoritarismo foram abertas.

    Desta forma, uma das grandes questes colocadas ao Estado neste incio de sculo exatamente sobre sua eficincia e capacidade em atender as demandas provenientes da sociedade. Isto nos remete diretamente s relaes entre Estado e sociedade, buscando identificar as variveis que podem determinar um desempenho satisfatrio das instituies do Estado ou mesmo de suas fraes, como estados, prefeituras e conselhos regionais. Sob que condies polticas institucionais ou mesmo societais podemos ter um bom desempenho dos governos?

    Buscando responder a estes questionamentos, o objetivo deste artigo analisar as razes que determinam o desempenho institucional no caso brasileiro, especialmente no Rio Grande do Sul, ou seja, os mecanismos que permitem aos governos realizar seus propsitos, como construir estradas, promover a sade, educar as crianas, promover o desenvolvimento. Que fatores podem estar determinando o melhor ou o pior desempenho das instituies polticas, ou de outra forma, que fatores podem facilitar as aes governamentais? A eficincia de um governo depende das instituies polticas ou da qualidade de seus cidados (cultura poltica)?

    As respostas a estas questes so controversas. A bibliografia especializada tem-se bifurcado basicamente em duas vertentes para dar conta de explicar como um governo pode ter um bom desempenho institucional. H uma vertente terica chamada, no sentido lato sensu, neoinstitucionalista, que d nfase de uma maneira geral aos aspectos polticos institucionais do Estado. Ela chama a ateno para o fato de que um bom desempenho de um governo democrtico dependeria da arrumao de suas partes formais, de que instituies podem sim

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    influir sobre a sociedade, atravs da moldura de comportamentos polticos, estimulando ou inibindo os atores polticos. Demonstraremos esse argumento no tpico Instituies Polticas como Varivel Independente, ressaltando especialmente a criao dos municpios e suas respectivas dotaes oramentrias e dos COREDES no Rio Grande do Sul como uma varivel que pode determinar o desempenho dos governos.

    No segundo tpico, Cultura Poltica como Varivel Independente, inverteremos o argumento, demonstrando que a cultura poltica sim um fator determinante do desempenho governamental. Para essa vertente, um bom governo dependeria dos costumes, dos valores de uma sociedade, de suas prticas polticas que ajudariam as instituies. Em outras palavras, a qualidade da sociedade seria fundamental para o xito das instituies.

    No terceiro e ltimo tpico, Instituies e Cultura Poltica. Um Sinergismo Possvel demonstraremos que instituies polticas que encontram uma sociedade organizada, horizontalizada e detentora de capital social (CS), portanto frtil socialmente (sinergismo entre as duas variveis), possuem melhores condies de obter xito em seus propsitos, destacando aqui, grosso modo, as diferenas regionais quanto dotao de CS no Estado e o grau em que esta influencia o desempenho das fraes do Estado nas duas regies em tela. Neste sentido, procuraremos dimensionar teoricamente a dotao de CS no Rio Grande do Sul, bem como seu desenho institucional a partir da criao dos COREDES, analisando comparativamente duas regies gachas. O COREDE Nordeste e o COREDE Vale do Rio dos Sinos. A metodologia utilizada para os dados empricos recolhe os resultados de pesquisa do Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE de 2007 e do projeto de pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Regional: a importncia do capital social no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste, aplicada em 2004. Ambos os trabalhos foram Surveys aplicados nos COREDES Vale do Rio dos Sinos e Nordeste totalizando cerca de 1200 questionrios, com erro amostral de 4% e confiana de 95%. Tambm utilizamos o auxlio do software SPSS para a construo das freqncias, dos cruzamentos, dos ndices, das anlises dos dados aplicando-se os testes estatsticos chi-square e o teste de regresso logstica.

    Este artigo justifica-se sob o argumento de que corroborar a hiptese da relao entre CS e desempenho institucional significa demonstrar que o sucesso de reformas polticas est relacionado com a qualidade no somente das leis e instituies que as implementam, mas

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    tambm com a do tecido social em que so implantadas. Esta hiptese, subvertendo de certa forma o argumento tradicional da virtude pblica dos governantes, quer chamar a ateno para as configuraes estruturais que esto na base do sucesso, ou no, de um bom desempenho governamental. Essa hiptese prope desta forma um dilogo entre as tradies neoinstitucionalista e culturalista. 1 Instituies Polticas como Varivel Independente

    De maneira geral podemos dizer que a perspectiva neo-institucionalista como corrente de pensamento tem suas origens remontadas ao sculo XX nos Estados Unidos, ressaltando como as instituies podem determinar o comportamento de atores, dos governos, da economia, ou mesmo do desenvolvimento econmico. Todavia, preciso ter claro que ela no constitui uma corrente de pensamento unificada, mas abarca trs mtodos distintos de anlise, segundo Hall e Taylor (2003): o institucionalismo histrico, o institucionalismo da escolha racional e o institucionalismo sociolgico. Para esses autores, os institucionalistas histricos entendem que a organizao institucional da comunidade estrutura os comportamentos e estabelece padres de interao, definindo, portanto, os resultados finais da ao humana. Para os histricos, as instituies so as regras, normas e convenes oficiais. Diferentemente dessa perspectiva, os institucionalistas racionais acreditam em atores polticos que se comportam de maneira utilitria, procurando, atravs da aplicao da racionalidade e de clculos estratgicos, maximizar seus ganhos pessoais, levando em conta o comportamento dos outros. Aqui as instituies so os acordos solidrios entre atores que compartilham vantagens. Temos assim uma aposta dos primeiros na estrutura e desses ltimos no indivduo.

    Para os institucionalistas sociolgicos, as instituies exercem sua influncia no somente por especificarem o que fazer, mas, sobretudo, o que se pode imaginar fazer num contexto dado. Em outras palavras, o conceito de instituio no se resume a regras e leis, mas ao sistema de smbolos, aos modelos morais incorporados pelos indivduos (HALL; TAYLOR, 2003). Nesse sentido, pensamos que esta concepo neo-institucionalista est na fronteira seno no dilogo com as concepes culturalistas, pois ela quebra com a dicotomia instituies e cultura, dando nfase desta forma, nos comportamentos apreendidos sob o abrigo das instituies. Desta forma, objetivando dialogar com as teorias neo-institucionalistas e culturalistas neste

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    artigo, passamos a dar maior nfase nesta ltima corrente por suas caractersticas mais comunicativas e receptivas cultura.

    Assim, ocupando a ponta dos debates acadmicos contemporneos, Douglass North, identificado com o institucionalismo sociolgico, um dos autores que vai dar especial acento s instituies a partir de uma inflexo da histria econmica para os estudos mais voltados evoluo de arranjos institucionais com seu trabalho Sources of Productivity Change in Ocean Shipping, 1600-1850, de 1968. Nessa obra, o autor escreve sobre a evoluo da produtividade da indstria de transporte ocenico e constata que as evolues institucionais foram mais importantes do que inovaes tecnolgicas para o aumento da produtividade econmica (GALA, 2003)5. Desse ponto em diante, North (2001) entende que o papel das instituies na evoluo das sociedades um fator determinante, demonstrando a influncia das instituies no desenvolvimento da sociedade, bem como comprovando como o crescimento de longo prazo ou a evoluo histrica de uma sociedade condicionada pela formao e evoluo de suas instituies. Nesse contexto, as instituies representam as orientaes criadas pelo seres humanos que do corpo prpria interao humana. Assim sendo, constituem incentivos para o intercmbio, seja ele poltico, social ou econmico.

    Essas instituies no apenas afetam o desempenho da economia, mas tambm os diferentes desempenhos econmicos que, ao longo do tempo, so influenciados pela forma como as prprias instituies evoluem. Assim, elas podem provocar a reduo da incerteza, j que proporcionam uma estrutura vida diria, definindo e limitando o conjunto de escolhas dos indivduos. Para tanto, o autor apresenta dois conceitos principais, o conceito de racionalidade e o de instituies. O primeiro o conceito de racionalidade, que desempenha um papel central na construo de sua dinmica institucional. Sintomaticamente, sua plena utilizao rejeita a rational choice6 dos neoclssicos, que segundo North (2001) possui axiomas muito rgidos (MUNHOZ, 2006).

    Dessa maneira, North (2001) prope uma teoria da racionalidade ampla, que analisa dois aspectos essenciais da conduta

    5 Essa pesquisa resultou no clssico Institutions, Institutional Change and Economic Performance, de 1990, que lhe rendeu o Prmio Nobel de Economia em 1993. 6 Estamos nos referindo aqui a teoria da escolha racional (a teoria dos Jogos) originalmente elaborada pelo matemtico norte-americano John Nash, ganhador do Prmio Nobel de Economia em 1994 e depois aplicada em diversos campos do conhecimento e particular as Cincias Sociais.

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    humana, a motivao dos indivduos e a questo da decifrao do ambiente. Nesse sentido, o autor defende a construo de modelos mais intrincados para se compreender a conduta humana dentro de um modelo individual de utilidade esperada, incorporando a ela certos aspectos como o altrusmo, os dogmas, as ideologias e as normas de conduta auto-impostas (MUNHOZ, 2006).

    No mago desta anlise est a impossibilidade do indivduo conhecer toda informao necessria para a tomada de decises timas, do que decorrem questes como a complexidade dos problemas, a falta de capacidade computacional e as realidades mutveis (GALA, 2003). Ademais, um ponto fundamental da teoria institucionalista deste autor o papel da ideologia nas sociedades, que ao restringir o comportamento individualista resultante de um clculo maximizador puro e simples, atua como uma instituio informal importante para a tomada de decises.

    Dessa forma, a ideologia reduz a incerteza na interao entre as pessoas ao estabelecer uma base comum de crenas e regras que permitem as trocas econmicas (GALA, 2003), bem como a eficincia desempenha papel relevante no marco institucional, configurado na idia de instituies eficientes. Nesse sentido, para que a matriz institucional de determinada sociedade seja eficiente, preciso estabelecer um sistema de propriedade bem definido, acompanhado de um aparato eficaz de enforcement (MUNHOZ, 2006). Destarte, qualquer arranjo institucional ter um bom desempenho quando for capaz de definir e de garantir direitos de propriedade que conduziro as organizaes e os indivduos a investir em atividades econmicas produtivas, especialmente na acumulao de capital e de conhecimento (GALA, 2003).

    Assim sendo, North (2001) observa que os chamados pases emergentes e os subdesenvolvidos no se desenvolvem plenamente em grande parte pela ineficincia de suas instituies. Em verdade, a incerteza gerada pelo quadro institucional dificulta as transaes econmicas entre os indivduos, impedindo que os indivduos conheam antecipadamente todas as possibilidades decorrentes de suas escolhas, resultando no funcionamento ineficaz das transaes econmicas e fazendo com que os indivduos sejam incapazes de atingir solues timas a partir de suas decises. A prpria incerteza eleva os chamados custos de transao, que, desta forma, justamente a incapacidade da sociedade em estabelecer o cumprimento de contratos de forma eficaz e a baixo custo, constituindo-se na fonte

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    principal da estagnao histrica e do subdesenvolvimento contemporneo do Terceiro Mundo.

    em funo da existncia dessas incertezas, que North (2001) introduz o conceito das instituies. Ao reduzirem os custos de negociao, atenuando o problema da incerteza, as instituies facilitam a coordenao econmica e social. Por exemplo, ao comparar uma economia emergente com uma economia industrial avanada, possvel constatar as conseqncias de direitos de propriedade mal definidos ou pouco efetivos. O marco institucional conduzir at a um quadro de insegurana nos direitos de propriedade, resultante do uso de tecnologias que empregam pouco capital fixo e que no significam acordos de longo prazo.

    Tal situao ocorre em uma economia subdesenvolvida, de uma matriz institucional que carece de uma estrutura formal capaz de promover mercados eficientes (NORTH, 2001). Em suma, o autor demonstra que instituies fortes e confiveis so fundamentais para o desenvolvimento e que bastaria aos pases emergentes criarem instituies com tais caractersticas para alcanarem o desenvolvimento e, consequentemente, podemos deduzir, uma melhora no desempenho de seus governos.

    Em nosso caso especfico em tela, o estado do Rio Grande do Sul, torna-se importante esta inflexo terica para a compreenso do seu processo de desenvolvimento. Assim, as configuraes institucionais que o estado teve ao longo de sua formao acabaram dando um contorno poltico para o processo de desenvolvimento local inegveis.

    Como lembra Siedenberg (2003), a partir de 1804 que os portugueses promoveram a primeira diviso territorial do Rio Grande do Sul (na poca Provncia de So Pedro do Rio Grande do Sul), criando inicialmente 4 municpios, com a finalidade de ocupar estratgica e militarmente a regio: Rio Grande, Porto Alegre, Santo Antnio da Patrulha e Rio Pardo. Assim, ao longo de sua histria poltica tivemos outras subdivises, criando-se 88 municpios no sculo XIX e a partir da segunda metade do sculo XX, um crescimento vertiginoso dos municpios, chegando a 496.

    Estas emancipaes podem ser explicadas por duas razes bsicas: uma pela necessidade que os governos estaduais tinham em garantir e obter maior representatividade na distribuio dos recursos federais, e outra pelas demandas locais, ou seja, pelo crescimento demogrfico, pelas necessidades de melhorias na infra-estrutura urbana e na qualificao dos servios pblicos (SIEDENBERG, 2003).

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    Nesse sentido, as emancipaes geraram situaes novas, organizaram as comunidades locais com suas leis orgnicas, aproximando essas comunidades de sua estrutura estatal, canalizando recursos para a regio e localidades.

    Todavia, no final da dcada de oitenta tivemos uma engenharia poltica adicional. Com o processo de redemocratizao e consequentemente com as reformulaes constitucionais, em nvel tanto federal quanto estadual e, portanto, com uma nova dinamizao nas relaes entre Estado e sociedade no Brasil, houve a criao de uma legislao favorvel descentralizao poltica regional no estado. A partir de 1994 (no governo Alceu Collares), h a criao dos Conselhos de Desenvolvimento Regional (COREDES)7. Foram criados, entre outras, com a finalidade de fortalecer a importncia econmica do estado no PIB nacional (que estava em decrscimo), induzir diretamente o crescimento econmico, descentralizar as aes polticas e combater as disparidades regionais quanto ao desenvolvimento (SIEDENBERG, 2003).

    Entretanto, apesar dos sucessivos governos no aderirem frontalmente idia dos Conselhos num primeiro momento, os COREDES resistiram e tm se mostrado ao longo destes 13 anos, segundo especialistas, muito mais como uma instituio capaz de perceber e indicar demandas das diferentes regies do que propriamente, ser capaz de neutralizar as decises do mercado global, ou mesmo as macro-polticas econmicas de mbito federal.

    Dessa forma, os novos municpios, os Conselhos de Desenvolvimento Regional, ou seja, essas novas configuraes institucionais colaboraram, de alguma forma, para a satisfao dos cidados com o desempenho das instituies do Estado, auxiliando na organizao e aplicao de recursos. Contudo, no so somente estas variveis institucionais (conselhos, municpios, leis orgnicas) que concorrem para explicar o desempenho dos governos e o desenvolvimento regional, consequentemente.

    Invertendo o plo da determinao e da primazia, Robert Putnam (2000), por exemplo, vai argumentar em defesa da cultura poltica (comunidade cvica) como fator de determinao do desenvolvimento poltico, social e econmico de uma regio, em detrimento dos aspectos institucionais levantados por North (2001). Para Putnam (2000), os aspectos culturais so mais importantes para compreender o desenvolvimento de um pas e de uma regio do que as

    7 Atualmente temos um total de 24 COREDES no estado do Rio Grande do Sul.

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    instituies. Como vimos, viemos das regras aos comportamentos institudos e agora faremos o caminho inverso, dos comportamentos, da cultura s regras.

    2 Cultura Poltica como Varivel Independente

    Em seu trabalho, Comunidade e Democracia, Putnam (2000) est preocupado em compreender como alguns dos governos democrticos podem funcionar de maneira satisfatria, uma vez que na contemporaneidade, as democracias liberais vitoriosas com o fim do socialismo real no esto satisfazendo adequadamente as demandas do eleitorado. Ento o autor investiga o que necessrio para o bom funcionamento dos governos democrticos, quais so os pressupostos indispensveis para que a democracia responda aos desafios contemporneos. Assim, uma das questes centrais que o autor ir investigar : por que alguns governos democrticos tm um bom desempenho institucional e outros no?

    Perseguindo essa questo, o autor analisa vinte anos da histria poltica da Itlia, demonstrando que este pas apresenta grande diferena regional tanto ao Norte, em Seveso, por exemplo, quanto ao Sul do pas, em Pietraportesa. De uma localidade a outra existe um movimento que parte da modernidade capitalista industrial em alguns casos ps-industrial do norte e vai ao sul tradicional e agrcola. Essas diferenas entre esses dois extremos necessitaram da ajuda de reformas polticas para resolver seus problemas de administrao pblica, posto que na dcada de 70 criaram-se diversos governos regionais procurando descentralizar a administrao poltica italiana.

    Foram criadas 20 regies idnticas quanto aos seus poderes, entretanto, os desempenhos destas regies foram muito diferentes. Como explicar essa diferena? O autor procura testar sua hiptese de que a cultura poltica, as tradies cvicas que determinam o desenvolvimento scio-econmico de uma regio, e dentro dela, o CS.

    Para Putnam (2000), CS so prticas sociais, normas e relaes de confiana que existem entre cidados numa determinada sociedade, bem como, sistemas de participao e associao que estimulam a cooperao. Quanto maior e mais rica for o nmero de possibilidades associativas numa sociedade, maior ser o volume de CS. Dessa forma, a confiana a expectativa que nasce no meio de uma comunidade de comportamento estvel e cooperativo, baseado em normas compartilhadas por estes mesmos membros (FUKUYAMA, 1996). A questo central para Putnam (2000;1996) que a confiana, a

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    cooperao e os espaos de participao social entre o Estado e a Sociedade so elementos positivos e essenciais para o bom funcionamento das instituies polticas8.

    O autor toma a varivel civismo como uma varivel independente na cultura poltica e como uma varivel dependente no desenvolvimento econmico e no desempenho institucional. Isso significa que as possibilidades de desenvolvimento scio-econmico de uma regio neste sculo dependeram menos de seu potencial scio-econmico inicial do que de seu potencial cvico (PUTNAM, 2000, p.166). Mas, como a comunidade cvica (por meio de que mecanismos) pode contribuir para a prosperidade econmica? Ela pode contribuir, por exemplo, pela cooperao horizontal entre empresas nos distritos industriais (PUTNAM, 2000). Isto se reflete na cooperao nos servios administrativos, na aquisio de matrias-primas, no financiamento e na pesquisa (PUTNAM, 2000). Ou mesmo subcontratando os concorrentes temporariamente. Elas competem sim, mas, na inovao de produtos e na eficincia.

    Pelo lado da demanda, os cidados das comunidades cvicas querem um bom governo e eles exigem servios pblicos mais eficazes e esto dispostos a agir coletivamente para alcanar seus objetivos comuns. J os cidados das regies menos cvicas costumam assumir o papel de suplicantes cnicos e alienados (PUTNAM, 2000, p.191). Pelo lado da oferta de servios do setor pblico, o governo favorecido pela infra-estrutura social das comunidades cvicas, que acabam colaborando e cooperando com o governo, visando a interesses comuns (PUTNAM, 2000).

    Assim, o autor argumenta em sua anlise das regies italianas que se formaram dois sistemas sociais equilibrados na Itlia, no norte, de comunidade cvica, um equilbrio virtuoso, ou seja, cooperao, confiana e reciprocidade. No sul, no cvico, um equilbrio vicioso de desero, desconfiana, omisso e explorao. Aplicando esta perspectiva terica ao caso do Rio Grande do Sul, Bandeira (2003), estabelece uma diferena regional no estado muito semelhante ao que Putnam (2000) fez na Itlia. Como uma primeira aproximao haveria uma diferena entre o Norte colonial, cuja matriz de imigrantes

    8 No somente para as instituies democrticas, mas tambm econmicas. Fukuyama (1996), demonstrou que a existncia de CS numa dada sociedade fator explicativo do tamanho da estrutura industrial ali existente, bem como, do desempenho econmico consequentemente. Ver tambm Fukuyama, The primacy of culture, sobre a importncia da cultura para a democracia florescer.

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    europeus, com existncia de pouca escravido e predomnio do minifndio. Em contraste, ns teramos no Sul uma matriz ibero com o predomnio do latifndio e o uso extensivo da mo-de-obra escrava.

    No que se refere primeira regio, Bandeira (2003) ressalta que estas zonas coloniais de imigrao esto dotadas de mais CS do que as da regio sul. Nas primeiras encontramos uma infinidade de associaes recreativas, clubes sociais, sociedades de canto, de atiradores e de artes, bem como uma intensa vida social colaborativa e cooperativa entre os primeiros colonos que aqui chegaram no sculo XIX.

    Nas reas de colonizao italiana, por exemplo, tambm se registram essa cooperao. Um grupo fazia a colheita quando um colono estava doente, assim como a conservao da estrada, bem como os acordos para a construo do cemitrio e da capela davam-se por iniciativa dos pequenos proprietrios rurais (DE BONI e COSTA, 1979 apud BANDEIRA, 2003). Nesse caso, a vida social desenvolvia-se no entorno da capela, entendida, no seu sentido amplo, como o cemitrio, o salo de festas e os campos de esporte. Diferentemente do Sul, onde foram os fazendeiros (os coronis que se julgavam donos do trabalho e das posies polticas dos seus empregados) que construram as capelas, que eram mantidas pelas esposas dos mesmos, os agricultores eram convidados para batizados e casamentos, mas nada contribuam para a organizao, construo ou mesmo manuteno da capela, ficando a vida social restrita ao entorno da fazenda (DE BONI e COSTA, 1979 apud BANDEIRA, 2003).

    Dentro da matriz terica do CS, tambm Monastrio (2003) analisa a qualidade das administraes municipais no estado do Rio Grande do Sul. Nas localidades, que ele denomina de planalto e serra (utilizando outra diviso territorial, mas referindo-se s zonas de colonizao), esto os melhores indicadores de qualidade da administrao pblica, em contraposio as regies da campanha (Sul). Em sua anlise, na regio da campanha, h menor formulao legislativa, menos informatizao e menos conselhos. Gasta-se o mnimo previsto na legislao com sade e educao, ao passo que na serra e no planalto, esses indicadores tendem a ser melhores pela dotao de CS.

    Nessa perspectiva, h forte inclinao patrimonialista e personalista na regio da campanha, no sul do estado, que teve uma tradio ibrica mais notada. Ns temos uma acentuao singular enrgica do afetivo, do irracional, do passional, ou antes, uma atrofia de atitudes como ordem, disciplina e racionalidade (HOLANDA 1981,

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    apud BANDEIRA, 2003). Somam-se a esse trao as longnquas distncias entre os agrupamentos e as escassas instituies de solidariedade social e de cooperao, pois, o que tomamos comumente como solidariedade entre vizinhos proveniente de impulsos da afetividade e da delicadeza moral, no da solidariedade que visa a obter uma utilidade comum (VIANNA, 1999, apud BANDEIRA, 2003)9.

    Boschi (1999), comparando duas capitais brasileiras, Belo Horizonte e Salvador, no que diz respeito s suas experincias de governana, ou seja, na transparncia, na formulao e na eficcia de polticas pblicas, argumenta que a principal diferena entre elas est relacionada existncia de CS. No primeiro caso, ns temos mais estruturas horizontais e CS que ajudam a reduzir as prticas clientelsticas e centralizadas de administrao, ao passo que em Salvador estas prticas so muito mais abundantes e, portanto, deletrias administrao local, onde ns temos menos CS e estruturas horizontais de organizao.

    Todavia, para alm dessa diviso dicotmica entre norte e sul aqui no estado, incorporamos neste artigo a diviso regional proposta por Bandeira (2003), que divide o estado em trs macros regies, Norte, Nordeste e Sul. No Sul temos uma base predominantemente agrcola formada pelo vales dos rios Jacu e Ibicu, onde temos a grande propriedade rural, a pecuria e a lavoura de arroz. Ao norte, compreendendo as reas do planalto e do Alto Uruguai, h a prevalncia da pequena e mdia propriedade, com lavouras mecanizadas do trigo e da soja. No Nordeste ns temos uma bifurcao, um Nordeste 1, que corresponde regio metropolitana pelo eixo Porto Alegre-Caxias do Sul e por reas situadas no seu entorno, e Nordeste 2, correspondendo s reas mais antigas de colonizao do estado, a regio da serra. Tanto as regies Norte quanto Nordeste 2 so aquelas mais marcadas pela imigrao europia, bem como, segundo pesquisas recentes, mais dotadas de CS, ao passo que as regies Sul e Nordeste 1 seriam aquelas com menos dotaes de CS (BANDEIRA, 2003)10.

    9 importante ressaltar que h estudos sobre o sul do estado que no autorizam uma viso estanque e caricata entre norte e sul, no sentido deste ltimo constituir-se num deserto social, existiriam formas de sociabilidade nas maiores cidades do sul. Na virada do sculo XX, Bag um exemplo desta proliferao associativista (Bandeira, 2003). 10 Contudo, importante ressaltar que na regio metropolitana ns termos cidades de imigrao alem forte no estado, como So Leopoldo e Novo Hamburgo.

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    3 Instituies e Cultura Poltica. Um sinergismo possvel.

    Dessa maneira, a proposio de cultura poltica de Putnam (2000), Monastrio (2003), Boschi (1999) e Bandeira (2001), que enfatiza a importncia do CS para explicar o desempenho institucional de uma regio, bem como a proposio de North (2001), que valoriza o peso das instituies, constituem-se em importantes variveis para explicar o desenvolvimento econmico e o desempenho das instituies, conforme acompanhamos. Contudo, pensamos que elas no podem ser compreendidas separadamente, mas devem ser integradas numa perspectiva sinergtica que combine instituies e cultura poltica, como circuitos endgenos de mtua determinao.

    Indubitavelmente, tanto os argumentos de Robert Putnam (2000), na defesa da sociedade cvica e portanto na determinao de fatores culturais, quanto os de Douglass North (2001) na identificao das instituies como fatores determinantes para o desenvolvimento econmico de uma regio so, ao mesmo tempo, contundentes e convincentes para a compreenso do fenmeno. Todavia, pensamos como Przeworski (2005), que, apesar de reconhecer que estas teorias deram de fato uma contribuio significativa para as Cincias Sociais, acredita que a procura de uma determinao primordial para o desenvolvimento e particularmente aqui para o desempenho institucional seja um equvoco epitemolgico, assim como, o marxismo o foi na busca da determinao das condies materiais sobre as instituies polticas.

    Na verdade, a proposio terica de North (2001) estimula a engenharia institucional, medida que se pode inserir qualquer instituio em qualquer contexto histrico como um judicirio independente, direitos de propriedade, bancos estatais independentes, teramos o funcionamento dessas instituies como em qualquer outro contexto, assim como o advento da prosperidade (Przeworski, 2005).

    Entretanto, no h esta linearidade. As instituies so endgenas, argumenta Przeworski (2005), o que significa dizer que [...] nada pode ser a causa primordial. As instituies no so uma causa mais profunda [exgena] podem determinar a proviso de fatores e seus usos, mas estes fatores [...] afetam o crescimento e a ulterior prosperidade, que por seu turno afeta a evoluo das instituies (PRZEWORSKI, 2005, p.76).

    Quem criou as instituies? Elas certamente no se criaram sozinhas, alm do que estas instituies podem ter efeitos diferentes, dependendo do contexto. O autor est dessa maneira chamando a ateno na crtica a North (2001) para o fato de que as instituies so

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    mutuamente interdependentes e evoluem conjuntamente com as dinmicas societais. Como exemplifica Przeworski (2005), imaginemos a criao de instituies que preservem o poder dos poderosos. Essas instituies no so autnomas, mas condicionadas pelo contexto em que esto inseridas e que foram criadas, no caso pelos poderosos. Da mesma forma podemos pensar na comunidade cvica em Putnam (2000), na determinao do desempenho das instituies. Se a cultura poltica que determina o grau de desenvolvimento de uma regio, ento determinantemente algumas regies estariam fadadas ao subdesenvolvimento perpetuamente. Contudo, contrariando essa idia, o prprio Putnam (2000) reconhece que a reforma institucional na Itlia contempornea melhorou, em geral, o desempenho das diferentes regies, muito embora mais naquelas com maiores dotaes de CS.

    Assim, as instituies no deixam de apresentar uma importncia fundamental para o desenvolvimento e para o prprio desempenho dos governos. Dito isso, nos deparamos com a dificuldade de estabelecer a estrutura causal sobre o desempenho dos governos. Seria a varivel instituies ou varivel cultura poltica que determina o desempenho satisfatrio dos governos? A soluo para a dicotomia de quem veio primeiro parece no contribuir efetivamente para a soluo do problema da eficincia das organizaes.

    Seguindo a sugesto de Przeworski (2005), optamos em compreender essas diferentes variveis como circuitos endgenos de mtua determinao e reforamento. Nesta perspectiva, abrindo mo de buscar identificar o que endgeno ou exgeno ou o que determina o qu no desempenho dos governos, optamos por identificar apenas seus recprocos impactos na sociedade, num modelo mais flexvel que combine um sinergismo possvel entre instituies e cultura poltica. Aqui, certamente, seguimos Weber, para quem no h monocausalidade para os fenmenos sociais, cabendo atitude cientfica buscar mensurar estas impactantes variveis para o desempenho institucional.

    A partir do exposto, e no intuito de mensurar o impacto das determinaes legais nos Coredes do Vale do Sinos e Nordeste, analisamos as dotaes oramentrias nessas regies a partir das cidades que as compe e o grau de satisfao de seus usurios em relao aos servios bsicos prestados pelo Estado11.

    11 O Corede Vale do Rio dos Sinos possui uma rea territorial de 1.398,5 km e composto por 14 municpios (Araric, Campo Bom, Canoas, Dois Irmos, Estncia Velha, Esteio, Ivoti, Nova Hartz, Nova Santa Rita, Novo Hamburgo, Porto, So

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    importante lembrar que o COREDE do Vale do Sinos localiza-se na megalpole portoalegrense, onde a concentrao de pessoas significativamente maior, atingindo 1.328.991 habitantes do que no COREDE Nordeste, que tem um contingente populacional de 133.827 habitantes e representa 10% da populao do Vale do Sinos. Esta explanao torna-se necessria para que se contextualize os ambientes de estudo, uma vez que, este comparativo no est baseado em gastos totais e sim, em gastos per capita.

    Na Tabela 1, podemos observar os gastos com educao, sade, obras, esporte, lazer e cultura e segurana, bem como o total dos gastos dos COREDES em 2006. Muito embora a quantia dos gastos totais seja discrepante entre os COREDES (apenas $ 171.771.940,83 de gastos no Nordeste, contra $ 1.099.110.966,13 no Vale do Rio dos Sinos) devido a suas receitas e populaes diferentes, tambm observamos que os dois principais gastos esto relacionados com educao e sade, isto porque, conforme o artigo 212 da Constituio Federal, os municpios devem aplicar anualmente vinte e cinco por cento, no mnino, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferncias na manuteno e desenvolvimento do ensino.

    Tabela 1: Gastos Comparativos por rea no Corede Vale do Sinos e Nordeste 2006 Nordeste Vale dos Sinos 1 Educao R$ 43.420.426,43 R$ 338.428.413,16 2 Sade R$ 32.455.300,07 R$ 230.535.811,82 3 Obras R$ 5.623.562,46 R$ 116.249.944,04 4 Esporte, lazer e cultura R$ 2.876.525,59 R$ 14.708.605,83 5 Segurana R$ 140.602,56 R$ 6.400.434,82 Gasto total 100% (incluindo outros setores): R$ 171.771.940,83 R$ 1.099.110.966,13 Nmero de Habitantes 133.827 1.328.991

    Fonte: Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE) e a Fundao de Economia e Estatstica (FEE).

    No caso da sade, de acordo com a Emenda Constitucional 29,

    de 13 de setembro de 2000, os municpios devem aplicar 15% do

    Leopoldo, Sapiranga e Sapucaia do Sul). O Corede Nordeste abrange uma rea de 9.063,6 km e sua diviso poltica conta com 23 municpios (gua Santa, Andr da Rocha, Barraco, Cacique Doble, Capo Bonito do Sul, Caseiros, Esmeralda, Ibia, Ibiraiaras, Lagoa Vermelha, Machadinho, Maximiliano de Almeida, Muitos Capes, Paim Filho, Pinhal da Serra, Sananduva, Santa Ceclia do Sul, Santo Expedito do Sul, So Joo da Urtiga, So Jos do Ouro, Tapejara, Tupanci do Sul e Vila Lngaro).

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    produto da arrecadao dos impostos como forma de garantir os recursos mnimos destinados a essa rea. Assim, a sade vem em segundo lugar nos gastos nas regies, depois da educao. Destacamos que se trata de recursos mnimos, no impedindo os executivos de destinarem percentuais superiores nas leis oramentrias. Essa deliberao tambm se estende para os gastos com educao. Na seqncia de investimentos, ns temos os gastos em Obras, Esporte Lazer e Cultura e por ltimo Segurana.

    No intuito de dar uma melhor inteligibilidade a esses dados, dividimos os gastos totais pelo nmero de habitantes de cada regio para podermos visualizar o quanto cada COREDE investe em seus habitantes nas diferentes reas. Esses apontamentos esto no Grfico 1. Grfico 1: Gastos Comparativos por Habitante no COREDE Nordeste e Vale do Rio dos Sinos 2006

    Fonte: Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE)

    e a Fundao de Economia e Estatstica (FEE).

    Neste grfico observamos que tanto os COREDEs Nordeste quanto do Vale do Rio dos Sinos mantm os gastos per capita maiores

    R$ 324,45

    R$ 242,52

    R$ 42,02R$ 21,49

    R$ 1,05

    R$ 254,65

    R$ 173,47

    R$ 11,07

    R$ 87,47

    R$ 4,82

    Educao Sade Obras Esporte, lazer

    e cultura

    Segurana

    Nordeste Vale dos Sinos

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    com educao e sade, seguido de saneamento bsico e habitao (o que equivale a obras nos grficos de gastos), ficando a segurana em ltimo lugar em investimentos por habitante, seguindo a tendncia j apontada na Tabela 1.

    Todavia, muito embora o COREDE Nordeste tenha menor receita e menores gastos do que o Vale do Rio dos Sinos (pois ele tem menor populao), ele investe muito mais por habitante. Enquanto no Nordeste um habitante tem por exemplo R$ 324,45 reais destinados a sua educao, no Vale do Rio dos Sinos esta cifra cai para R$ 254,65 (uma perda de R$ 69,8 reais). No Nordeste investe-se R$ 242,52 reais em sade, e no Vale do Rio dos Sinos essa quantia cai para R$173,47 reais (uma perda de R$ 69,05 reais). No esporte, lazer e cultura, observa-se a mesma tendncia. Apenas na segurana o Vale do Rio dos Sinos investe mais do que o Nordeste.

    Acertadamente, conforme nossa orientao terica, no COREDE Nordeste, no Grfico 2, temos uma avaliao positiva (Boa) superior s avaliaes negativas (Ruim) em todas as reas avaliadas, principalmente nas duas que recebem destinaes oramentrias especificadas em lei. A educao ficou com 73,7%, que avaliaram em boa, e na sade, 63,2%. Nas obras aparecem com 54,1% de avaliao boa, na terceira colocao. Essas trs reas foram as mais bem avaliadas respectivamente perfiladas com os maiores investimentos conforme os gastos investidos por habitante no COREDE Nordeste.

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    Grfico 2: Avaliao de Desempenho do Corede Nordeste e Gastos por Habitante12

    Fonte: Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional CPP/Feevale (2007) e Projeto de Pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Territorial do COREDE Nordeste(2004).

    No Grfico 3, no COREDE do Vale do Rio dos Sinos, de modo

    geral as avaliaes positivas (Boa) dessas populaes tendencialmente apresentaram percentuais maiores do que as avaliaes negativas (Ruim) em todos os setores avaliados, exceto na rea da segurana em que tivemos 13,6% de pessoas que avaliaram em boa, contra 48,2% como ruim (cujos investimentos foram tambm menores)13. Tambm aqui, as duas reas com dotaes oramentrias maiores, educao e sade, tiveram avaliaes positivas melhores do que as negativas (abstraindo-se o erro amostral), ficando a educao com 50,1% de avaliao boa (a mais bem avaliada de todas), e a sade com 28,5%,

    12 No questionrio inicialmente a populao avaliou o saneamento e a habitao separadamente, porm ns neste Grfico 3 somamos os percentuais e fizemos uma mdia (habitao e saneamento) colocando-os sob a terminologia obras a fim de podermos comparar os dados, pois no Grfico 1 saneamento e habitao tambm esta somado. 13 No colocamos no grfico os percentuais de Ruim, mas a resposta a esta questo de avaliao de desempenho tinha trs alternativas: Boa, mais ou menos e Ruim.

    73,7 63,254,1 51,4 48,3

    R$ 324,45

    R$ 242,52

    R$ 1,05

    R$ 42,02R$ 21,49

    Educao Sade Obras Segurana Pblica Esporte/Lazer/Cultura

    Avaliao Boa (%) Gastos p/ habitante

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    esta ltima caindo para o penltimo lugar. Das duas, somente a educao manteve coerncia com os investimentos. A sade despencou, apesar de um investimento de 173,47 por habitante. Apesar de ter a segunda dotao oramentria, os investimentos em sade parecem no ter dado conta das demandas da populao do COREDE Vale do Rio dos Sinos. Contudo, as obras, que receberam o terceiro maior investimento das reas, ficaram na mdia com 47,6% de avaliao boa, tomando a segunda posio na satisfao dessa populao como podemos constatar no Grfico 3. Grfico 3: Avaliao de Desempenho do Corede Vale do Sinos e Gastos por Habitante

    Fonte: Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional CPP/Feevale (2007) e Projeto de Pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Territorial do COREDE Nordeste(2004).

    As trs primeiras reas que receberam maiores investimentos

    no COREDE Nordeste, educao, sade e obras, so as trs reas em que a populao est mais satisfeita. No COREDE do Vale do Rio dos Sinos, das trs reas que receberam maior investimento, educao, sade e obras, somente duas trouxeram resultados positivos com a satisfao da populao, educao e obras.

    No tocante questo da segurana, no COREDE Vale do Rio dos Sinos, essa rea est em ltimo lugar. No Nordeste, ela est em penltimo lugar, porm com uma avaliao boa em 51,4% contra

    13,628,5

    39,447,650,1

    R$ 4,82R$ 11,07

    R$ 173,47

    R$ 87,47

    R$ 254,65

    Educao Obras Esporte/Lazer/Cultura Sade Segurana Pblica

    Avaliao Boa (%) Gastos p/ habitante

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    apenas 13,6% do Vale do Rio dos Sinos. Cabe fazer algumas consideraes sobre essas diferenas entre as regies. Por exemplo, diferentemente do COREDE Nordeste, a regio do Vale do Rio dos Sinos acolhe trs das cidades com maiores ndices de criminalidade (homicdio, roubo e furto) do Estado, conforme estudos realizados pela Secretaria da Justia e Segurana entre os anos de 1997 a 2004 (So Leopoldo, Canoas e Novo Hamburgo), e as demais espalham-se em outras regies do estado (VIAPIANA e BRUNET, 2007). No Vale dos Sinos, tanto as dotaes oramentrias quanto a satisfao dos cidados esto em baixa.

    Todavia, no caso do COREDE Nordeste, ns temos outro fenmeno. Os dados analisados at o momento demonstram que o nvel de satisfao da populao do COREDE Nordeste bastante significativo em todas as reas analisadas, inclusive na segurana. 51,4% da populao avaliou a segurana da regio como boa, contra apenas 11,6%, de ruim. No COREDE Vale dos Sinos o percentual de ruim quase cinco vezes maior do que no Nordeste, chegando a 48,2% contra 13,6% de boa.

    Em cidades de menor porte, como o caso da maioria dos municpios do COREDE Nordeste, o fato de serem pouco industrializadas soma-se ao conhecimento das pessoas entre si e seus relacionamentos comunitrios para contribuir na preveno da criminalidade. Mesmo os percentuais baixos de investimento em segurana, no chegam a afetar sobremaneira esta regio14. Todavia, no Vale do Rio dos Sinos, pelas caractersticas contrrias, cidades industrializadas, mais populosas e com laos comunitrios frouxos temos indicadores de criminalidade mais significativos e maiores ndices de insatisfao com esta rea, muito embora no Vale do Rio dos Sinos os investimentos em segurana tenham sido maiores do que no Nordeste. A urbanizao pode se mostrar deletria a formao do capital social sob certas condies (PUTNAM, 1996).

    Os dados evidenciam a importncia do volume de investimentos em si e dos previstos em lei, que aplicados de igual forma em ambos os COREDEs, como vimos, produziram certos resultados, alguns iguais outros diferentes.

    Percebe-se que no COREDE Nordeste a populao recebeu mais investimentos per capitas do que no COREDE do Vale do Rio dos Sinos. Aquela regio, por sua vez, tambm manifestou maior satisfao 14 importante lembrar que o estado e no os municpios ou regies a responsabilidade com a segurana. Entretanto, os municpios tm cada vez mais discutido e pensado sua participao nesta rea.

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    com as instituies prestadoras de servio, do que esta. O nmero menor de habitantes somado ao investimento per capita maior no Nordeste parece explicar em parte este fenmeno. Contudo, ainda permanece uma outra questo: O investimento pblico a nica varivel que explica os nveis de satisfao com os servios prestados pelo Estado no Nordeste? Se a dotao oramentria ajuda na compreenso de parte deste fenmeno, por outro lado no ajuda explicar que a sade com a terceira dotao per capita no COREDE do Vale do Rio dos Sinos obteve o penltimo lugar na satisfao da populao. Tambm a questo da segurana pblica? Evidentemente que o municpio no tem uma responsabilizao direta pela questo da segurana e no poderamos querer uma relao entre os parcos investimentos de ambos os COREDEs com a satisfao com esta rea. Todavia, procurando evitar a monocausalidade, pensamos que, para alm do investimento dos respectivos oramentos nas regies, a qualidade do tecido social em que eles so aplicados ajuda a explicar os nveis de satisfao destas populaes, ou seja, o desempenho dos servios pblicos prestados tanto no Nordeste, quanto no Vale do Rio dos Sinos, guarda relao com os nveis de capital social que temos nestas regies, permitindo um melhor funcionamento das instituies prestadoras de servios pblicos.

    Sendo assim, torna-se importante verificarmos os nveis de capital social comparativamente entre as regies, ou seja, os nveis de confiana interpessoal e sua relao com o funcionamento das instituies.

    No Grfico 4 podemos observar que os ndices de capital social na regio do COREDE Nordeste apresentaram um ndice de 71,6% de mdio e 5,8% de alto, contra 33,8% de mdio e 0,8% de alto na regio do COREDE do Vale do Rio dos Sinos. Claramente no Nordeste h o predomnio de maior capital social entre seus habitantes do que no Vale do Rio dos Sinos.

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    Grfico 4: ndice de Capital Social (ICS) COREDE Nordeste e Vale dos Sinos15

    15 Este ndice de Capital Social (ICS) foi construdo de forma idntica para os dois COREDES a partir da seleo de 9 questes relativas ao capital social, so elas: Em termos gerais, o senhor diria que se pode confiar nas pessoas ou no se pode confiar nas pessoas? Sim (peso 2), No (peso 0); Gostaria de saber se o senhor confia muito (peso 2), pouco (peso 1) ou no confia (peso 0) na: igreja, famlia, vizinhos, associaes comunitrias, sindicatos; O senhor costuma participar de: partidos polticos, reunies polticos, comcios, associaes comunitrias, associaes religiosas, associaes sindicais, conselhos populares, ONGs, oramento participativo, abaixo assinados, manifestaes ou protestos, greves, ocupao de terrenos ou prdios pblicos, outros Sim (peso 2), No (peso 0); Nos ltimos anos, o senhor tentou resolver algum problema local do bairro/comunidade junto com outras pessoas? Sim (peso 2), No (peso 0); Dentre os grupos que eu vou mencionar, quais deles existem no seu bairro: grupo poltico, grupo ou associao cultural, grupo educacional, grupo esportivo, grupo de jovens, ONG ou grupo cvico, grupo baseado na comunidade tnica, grupos de mulheres, outro Sim (peso 2), No (peso 0); Atualmente o senhor participa de algum grupo ou organizao? Sim (peso 2), No (peso 0); Se precisasse viajar por um ou dois dias, o senhor poderia contar com vizinhos para cuidar da sua casa e/ou filhos? Sim (peso 2), Provavelmente (peso 1), No (peso 0); Em uma situao de emergncia como a doena de um familiar ou perda de emprego, o senhor receberia ajuda: familiares (peso 0), vizinhos (peso 2), colegas de trabalho (peso 2); Se um projeto da comunidade no lhe beneficia diretamente, mas pode beneficiar outras pessoas do seu bairro, o senhor contribui pra este projeto? Sim (peso 2), No (peso 0).

    65,3%

    22,6%

    0,8%5,8%

    33,8%

    71,6%

    Vale do Sinos Corede Nordeste

    Alto Mdio Baixo

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    Fonte: Projeto de Pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Regional: a importncia do capital social no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste e Grupo de Pesquisa

    em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE. Total: 1206

    A ttulo de ilustrao, no Grfico 5, temos uma das questes que

    compe nosso ndice de capital social, em que perguntamos sobre a participao em grupos ou organizaes. Observamos que mais da metade da populao do COREDE Nordeste participa de algum grupo ou organizao (56,3%), contra apenas 18,4% da regio do Vale do Rio dos Sinos. Grfico 5: Participao em Grupos ou Organizaes

    18,4%

    56,3%

    81,6%

    43,7%

    Vale dos Sinos Nordeste

    Sim No

    Fonte: Projeto de Pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Regional: a importncia do capital social no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste e Grupo de Pesquisa

    em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE. Total: 1198

    Procuramos medir os nveis de solidariedade entre as regies, o

    COREDE Nordeste nos surpreende positivamente, 61,4% das pessoas responderam que nos ltimos anos tentaram resolver algum problema local associados outras, enquanto praticamente a metade, 32,5% dos entrevistados no COREDE Vale do Rio dos Sinos, tentaram resolver

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    algum problema com a ajuda da comunidade. Ou seja, uma queda significativa no vale do Rio dos Sinos.

    Quando cruzamos os ndices de capital social com a avaliao de desempenho (Boa) nas diferentes reas no COREDE Nordeste, temos a seguinte constatao. Quanto maior o ndice de capital social, melhor a avaliao que estas populaes fazem dos servios pblicos nas regies. Ou seja, segundo a opinio destas pessoas, melhor so os servios prestados. Se 66,4% das pessoas categorizadas no nvel baixo de capital social avaliaram em boa a educao no seu municpio, este percentual cresce para 80% quando os nveis de capital social tambm crescem. No mesmo caso na sade, 54% das pessoas no nvel baixo de capital social avaliaram em boa a sade em seu municpio e no nvel alto este percentual sobe para 73,5%. Como podemos constatar no Grfico 6, h uma tendncia em aumentar os percentuais de avaliao boa conforme aumenta-se o capital social. Todavia permanece uma questo, de fato h uma relao entre capital social e avaliao de desempenho nas diferentes reas investigadas? Grfico 6: Avaliao de Desempenho por rea (Avaliao Boa) COREDE Nordeste

    Fonte: Projeto de Pesquisa Capital Social e Desenvolvimento Regional: a importncia do

    capital social no desenvolvimento territorial do COREDE Nordeste. Nota: Educao N=606/x2=7,988-P.< 0.05; Sade N=605/x2=10,714-P.< 0.05

    Habitao N=604/x2=9,428-P.< 0.05 Esporte e Lazer N=605/x2=18,431-P.< 0.05 Total: 606

    32,8%

    51,1%50,4%

    40,1%

    54,0%

    66,4%

    48,7%49,2%

    61,3%

    45,6%

    64,0%

    72,8%

    57,1%

    65,7%68,6%

    51,4%

    73,5%

    80,0%

    Educao* Sade* Saneamento Habitao* Segurana Esporte e

    Lazer*Indice de Capital Social Baixo Indice de Capital Social MdioIndice de Capital Social Alto

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    Para responder a esta questo aplicamos os chi-square tests nas seis reas, em quatro delas o teste demonstrou que h uma relao significativa entre as variveis capital social e avaliao boa. So elas, a educao*, a sade*, a habitao* e o esporte e lazer*. Somente em duas reas, segurana e saneamento no apresentarm relao significativa.

    No COREDE Vale do Rio dos Sinos, quando cruzamos os ndices de capital social com a avaliao de desempenho (Boa) nas diferentes reas como fizemos com o COREDE Nordeste, percebemos tambm a mesma tendncia. Quanto maior o ndice de capital social, melhor a avaliao que estas populaes fazem dos servios prestados na rea da sade (27,8% para 40%), saneamento (45,4% para 60%) seguraa (12,5% para 20%) e Esporte e Lazer (33,9% para 60%) nas regies. Somente na educao e habitao h uma melhora na satisfao quanto aos servios no nvel mdio de capital social, caindo ligeiramente no nvel alto. Grfico 7: COREDE Vale do Rio dos Sinos

    Fonte: Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Regional/CPP FEEVALE.

    Nota: Habitao N=600/x2=31,104-P.

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    Aplicando-se o chi-square tests nas seis reas do COREDE do Vale do Rio dos Sinos na metade delas (em trs), o teste demonstrou que h uma relao significativa entre as variveis capital social e avaliao boa. So elas, a habitao*, a segurana* e o esporte e lazer*. Portanto, o capital social impacta positivamente nas avaliaes dos servios prestados nestas regies tanto no COREDE Nordeste, quanto no COREDE do Vale do Rio dos Sinos como demonstramos.

    Uma vez demonstrada esta relao de associao com o capital social e a avaliao dos servios pblicos, tambm encontramos outras associaes.

    Na aplicao do teste de regresso logstica multinominal tomamos no Corede Nordeste a avaliao dos servios de Sade, Educao, Esporte Lazer e Cultura, Transporte e Segurana pblica como variveis dependentes e cruzamos com a confiana destas populaes nas diferentes instituies como variveis independentes16. O objetivo era descobrirmos quais variveis estavam impactando mais diretamente sobre a avaliao destes servios.

    No COREDE Nordeste, obtivemos, atravs do teste de regresso logstica multinominal, significncia nas cinco variveis dependentes. Na rea de Sade as variveis independentes que encontramos foram Governo Federal (8,218=, P=0,016) e Governo Municipal (39,99=, P=0,000), na Educao mostrou significncia nas variveis independentes Assemblia Legislativa (6,714=, P=0,035), Governo Municipal (13,892=, P=0,001) e Polcia (5,754=, P=0,056). Esporte, Lazer e Cultura tiveram duas variveis independentes, Governo Federal (9,60=, P=0,008) e Governo Municipal (14,773=, P=0,001). Na rea do Transporte teve significncia na varivel independente Governo Municipal (15,092=, P=0,001). Na rea de Segurana Pblica as variveis independentes com significncia encontradas foram Governo Federal (15,139=, P=0,001) e Polcia (28,886=, P=0,000).

    No COREDE Vale do Rios dos Sinos, aplicando o mesmo teste de regresso logstica multinominal encontramos significncia em apenas uma varivel dependente, a Segurana Pblica (55% de acerto), e as trs variveis independentes que encontramos significncia foram:

    16 A pergunta aplicada foi: Gostaria de saber se o senhor (a) confia muito, confia pouco ou no confia no: Congresso Nacional, Governo Federal, Assemblia Legislativa, Governo Estadual, Cmara Municipal, Governo Municipal, Judicirio, partidos polticos, polcia, igreja, famlia, vizinhos, associaes comunitrias, sindicatos, meios de comunicao.

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    Governo Estadual (13,405=, P=0,004), Partidos Polticos (13,456 =, P=0,004) e Polcia (39,256 =, P=0,000).

    considervel ponderar que, das quinze variveis (independentes) de confiana cruzadas, encontramos resultados significativos apenas em instituies polticas ou relacionadas, que foram seis: Governo Estadual, Partidos Polticos, Polcia, Governo Federal, Governo Municipal e Assemblia Legislativa. Ou seja, a confiana nestas instituies acaba impactando positivamente na avaliao dos servios pblicos. Variveis relacionadas s relaes pessoais, como Famlia e Vizinhos, no tiveram resultados significativos neste teste.

    Se a avaliao positiva dos servios pblicos est relacionada confiana nas instituies polticas de uma forma geral, plausvel ento que no COREDE Vale do Rio dos Sinos, de baixos ndices de capital social, de confiana interpessoal e de confiana nas instituies tambm tenhamos encontrado pouca ou apenas uma significncia na varivel segurana sendo no COREDE Nordeste o contrrio.

    Consideraes Finais

    Neste artigo, procuramos demonstrar que, instituies polticas que encontram uma sociedade organizada, horizontalizada e detentora de capital social (CS), portanto frtil socialmente (sinergismo entre as duas variveis), possuem melhores condies de obter xito em seus propsitos. Neste sentido, procuramos dimensionar teoricamente a dotao de CS no Rio Grande do Sul, bem como seu desenho institucional a partir da criao dos COREDES analisando comparativamente estas duas regies gachas. Em ambos os COREDEs como vimos as dotaes oramentrias das cidades constituram-se sumamente importante para a satisfao destas populaes locais, por exemplo, a dotao de 25% na rea da educao mostrou-se importante tanto no Nordeste como no Vale do Rio dos Sinos, onde ambas as populaes avaliaram-na positivamente esta rea, muito embora o nordeste mais satisfeito, porque mais detentor de capital social e investimentos por habitante. A sade com 15% de destinao oramentria foi avaliada positivamente no Nordeste e no Vale do Rio dos Sinos, muito embora neste ltimo tenha ficado empatada tecnicamente com os escores negativos. De qualquer forma demonstramos que as leis, as dotaes impactam positivamente nas regies. Porm no somente estas, mas tambm os ndices de capital social so importantes variveis que ajudam a melhorar o desempenho das instituies (confiana interpessoal e confiana nas instituies

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    polticas), na medida em que melhoram os ndices de capital social melhora o desempenho das instituies prestadoras de servios a comunidade isto porque os servios so melhores acessados, demandados, aproveitados por uma sociedade mais organizada e so tambm melhor avaliados. Neste sentido, o Nordeste mostrou-se como uma regio muito favorecida no somente por esta peculiaridade de ser dotada de melhores ndices de capital social, como tambm receber melhores dotaes oramentrias por habitante, assim seus nveis de satisfao so melhores l do que aqui no Vale do Rio dos Sinos.

    Todavia, a partir do exposto, dois pontos precisam ser discutidos: o primeiro diz respeito a no intitucionalizao de destinaes oramentrias para a segurana pblica, da mesma forma que acontece com a sade e a educao. Em algumas discusses parlamentares e de governos estaduais, foram pautas de discusses a criao de percentuais oramentrios segurana pblica, da mesma forma como a educao e a sade que recebem verbas especficas, tambm poderiamos ter para esta rea. O caso do COREDE do Vale do Rio dos Sinos tem indicado uma insatisfao significativa com a segurana, j o Nordeste com o esporte, lazer e a cultura. Tambm, para alm das questes oramentrias, pensarmos em polticas pblicas que incentivem a criao de capital social nos COREDEs, quer seja atravs de criao de espaos de lazer ou formas alternativas de participao comunitria, em que haja a promoo do encontro, da composio do tecido social, uma vez que identificamos este capital social como uma varivel importante que pode sinergeticamente aliada as instituies promover uma melhora do desempenho das instituies do Estado atravs da colaborao com suas iniciativas.

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