São Carlos, v.7 n. 25 2005 - set.eesc.usp.br · Análise da capacidade resistente de consolos de...

134
São Carlos, v.7 n. 25 2005

Transcript of São Carlos, v.7 n. 25 2005 - set.eesc.usp.br · Análise da capacidade resistente de consolos de...

São Carlos, v.7 n. 25 2005

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Reitor: Prof. Titular ADOLFO JOSÉ MELFI

Vice-Reitor:

Prof. Titular HÉLIO NOGUEIRA DA CRUZ

ESCOLA DE ENGENHARIA DE SÃO CARLOS

Diretor: Prof. Titular FRANCISCO ANTONIO ROCCO LAHR

Vice-Diretor:

Prof. Titular RUY ALBERTO CORREA ALTAFIM

DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA DE ESTRUTURAS

Chefe do Departamento: Prof. Titular CARLITO CALIL JÚNIOR

Suplente do Chefe do Departamento:

Prof. Titular SÉRGIO PERSIVAL BARONCINI PROENÇA

Coordenador de Pós-Graduação: Prof. Associado MÁRCIO ROBERTO SILVA CORRÊA

Coordenadora de Publicações e Material Bibliográfico:

MARIA NADIR MINATEL e-mail: [email protected]

Editoração e Diagramação:

FRANCISCO CARLOS GUETE DE BRITO MASAKI KAWABATA NETO MELINA BENATTI OSTINI

TATIANE MALVESTIO SILVA

São Carlos, v.7 n. 25 2005

Departamento de Engenharia de Estruturas Escola de Engenharia de São Carlos – USP Av. Trabalhador Sãocarlense, 400 – Centro

CEP: 13566-590 – São Carlos – SP Fone: (16) 3373-9481 Fax: (16) 3373-9482

site: http://www.set.eesc.usp.br

SSUUMMÁÁRRIIOO Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas em temperatura ambiente e em situação de incêndio Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto 1 O segundo espectro de freqüências da teoria de viga de Timoshenko Jaime Florêncio Martins & José Elias Laier 33 Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto Gerson Moayr Sisniegas & Maximiliano Malite 51 Sistema informatizado para projeto de estruturas industrializadas de madeira para telhados Henrique Partel & Antonio Alves Dias 85 Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição da armadura de costura Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs 103

ISSN 1809-5860

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

UMA CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DE VIGAS MISTAS AÇO-CONCRETO SIMPLESMENTE

APOIADAS EM TEMPERATURA AMBIENTE E EM SITUAÇÃO DE INCÊNDIO

Larissa Degliuomini Kirchhof 1 & Jorge Munaiar Neto 2

R e s u m o

A utilização do elemento estrutural viga mista aço-concreto, que consiste da associação de vigas de aço (perfil do tipo I) com lajes de concreto (maciça ou com forma de aço incorporada), têm sido considerável nas obras de engenharia civil, tanto no contexto mundial como no Brasil. Parte da eficiência desse elemento estrutural está diretamente relacionada ao trabalho em conjunto de ambos os materiais, ou seja, do tipo de interação entre o aço e o concreto. Para um comportamento estrutural adequado das vigas mistas, essa interação é garantida por meio de elementos metálicos denominados conectores de cisalhamento, cujas principais funções consistem em transferir forças de cisalhamento longitudinais do concreto para o aço na interface entre laje e viga, bem como impedir a separação vertical entre laje de concreto e perfil metálico, movimento conhecido como “uplift”. Nesse sentido, o presente trabalho tem como principal objetivo pesquisa com base em referências bibliográficas sobre o assunto vigas mistas, bem como é proposta a elaboração de um modelo numérico tridimensional para viga mista, com vistas a simular satisfatoriamente seu comportamento estrutural, em temperatura ambiente e em situação de incêndio, cujos resultados serão comparados com valores, obtidos numérica e experimentalmente, extraídos de trabalhos apresentados por outros pesquisadores. Para a modelagem numérica, utilizou-se o código de cálculo ABAQUS ® 6.3-1, elaborado com base nos Métodos dos Elementos Finitos (MEF). Palavras-chave: Estruturas mistas; vigas mistas aço-concreto; análise numérica; incêndio.

1 INTRODUÇÃO

Os sistemas estruturais mistos têm sido bastante utilizados em obras ligadas à construção civil (por exemplo, edifícios comerciais e industriais), tanto no contexto mundial como no Brasil. Podem ser citados como exemplos as lajes mistas aço-concreto (lajes de concreto com fôrma de aço incorporada), os pilares mistos aço-concreto (pilares de aço protegidos ou preenchidos com concreto) e as vigas mistas aço-concreto (lajes de concreto sobre vigas de aço). 1 Mestre em Engenharia de Estruturas - EESC-USP, [email protected] 2 Professor do Departamento de Engenharia de Estruturas da EESC-USP, [email protected]

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

2

No contexto mundial, estudos referentes aos sistemas compostos tiveram seu início antes da primeira grande guerra, na Inglaterra, com base em uma série de ensaios para pisos. Entre 1922 e 1939, foram construídos edifícios e pontes que adotavam o sistema de vigas compostas (MALITE, 1990). Vale mencionar ainda que, entre os anos de 1920 e 1958, muitas pesquisas foram desenvolvidas e publicadas, com referência ao comportamento estrutural de vigas mistas aço-concreto, em países como Estados Unidos, Inglaterra, Canadá, entre outros, abordando inclusive estudos com referência aos efeitos da temperatura, no ano de 1950, desenvolvidos por Hirschfeld na Alemanha (VIEST, 1960). No Brasil, por sua vez, entre 1950 e 1960 a construção mista limitou-se a alguns edifícios e pequenas pontes. A partir da década de 70 e início da década de 80, a utilização do sistema misto praticamente ficou estagnada, dando-se maior preferência pelo uso do concreto armado e do concreto protendido nas edificações correntes (MALITE, 1993). Atualmente, com o aumento da produção de aço no Brasil e visando novas soluções arquitetônicas e estruturais, sua utilização vem crescendo consideravelmente na construção de edifícios industriais, comerciais, pontes, etc. A utilização deste sistema é viável e de grande vantagem, pois como se sabe o aço apresenta uma boa resposta aos esforços de tração, enquanto que o concreto apresenta uma boa resposta aos esforços de compressão (com menor custo). Além disso, a associação dos materiais aço e concreto resulta em um acréscimo de resistência e rigidez para o sistema misto, proporcionando a redução da altura dos elementos estruturais e, conseqüentemente, a economia de materiais. As vigas mistas aço-concreto, objeto de estudo do presente trabalho, são constituídas pela associação de vigas de aço solidarizadas a lajes de concreto armado, cuja associação é garantida por meio de elementos mecânicos denominados “conectores de cisalhamento”, de modo que o conjunto trabalhe para resistir a esforços de flexão. A norma brasileira “NBR 8800:1986-Projeto e execução de estruturas de aço de edifícios” trata do dimensionamento, em temperatura ambiente, de elementos estruturais de aço e também de vigas mistas aço-concreto, nesse caso, apenas para conectores de cisalhamento dos tipos pino com cabeça (stud bolt) e perfil “U” laminado. Também merece destaque, para fins de projeto em estruturas metálicas, a questão do aço em situação de incêndio. Com a publicação da norma “NBR 14323:1999-Dimensionamento de estruturas de aço de edifícios em situação de incêndio” e da norma “NBR 14432:2000-Exigências de resistência ao fogo de elementos construtivos de edificações”, muitos são os assuntos de interesse que estão surgindo com relação à resistência dos elementos estruturais de aço e mistos em situação de incêndio. Vale mencionar que, atualmente, as normas NBR 8800:1986 e NBR 14323:1999 passam por processo de revisão, de modo que alguns valores prescritos no projeto de revisão, como os fatores de redução da resistência e da rigidez dos materiais aço e concreto em função da temperatura, serão considerados na modelagem numérica de vigas mistas aço-concreto em situação de incêndio. Nesse sentido, o presente trabalho propõe a elaboração de modelos numéricos tridimensionais para viga mista aço-concreto simplesmente apoiada, por meio da utilização do programa ABAQUS versão 6.3-1, elaborado com base no Método dos Elementos Finitos. O objetivo principal é simular satisfatoriamente o

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

3

comportamento estrutural de vigas mistas, em temperatura ambiente e em situação de incêndio, cujos resultados serão comparados com aqueles apresentados por outras referências bibliográficas coletadas e pesquisadas.

2 BREVE ABORDAGEM SOBRE VIGAS MISTAS AÇO-CONCRETO

As vigas mistas aço-concreto são bastante empregadas em sistemas de pisos constituídos por vigas de aço e lajes de concreto, como por exemplo, edifícios de múltiplos andares (residencial e comercial) e pontes. A figura 1 ilustra os dois tipos de vigas mistas mais comuns empregados nas edificações correntes, as quais utilizam conectores de cisalhamento do tipo pino com cabeça (stud bolt).

Figura 1 - Tipos mais usuais de seções mistas (MALITE, 1990).

A eficiência da viga mista para resistir a esforços de flexão está associada a alguns fatores, tais como: resistência à compressão do concreto e espessura da laje (piso ou cobertura), tipo de aço da viga, existência ou não de escoramento quando da concretagem das lajes (fase de construção), interação entre viga e laje, etc. Dentre os fatores citados, enfatiza-se o aspecto da interação entre viga e laje,

garantida por meio de conectores de cisalhamento soldados na mesa superior da viga de aço (MALITE, 1990), com a função de transmitir o fluxo de cisalhamento longitudinal que se gera na interface aço-concreto, bem como a de impedir o afastamento vertical entre viga e laje, fenômeno conhecido como uplift, aspecto mencionado em TRISTÃO (2002). Diversos tipos de conectores já foram analisados e empregados em edifícios e pontes, sendo os perfis U laminados e os conectores tipo pino com cabeça (stud bolt), ambos do tipo flexível e ilustrados na figura 2, os mais utilizados e os únicos previstos na NBR 8800:86.

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

4

Figura 2 - Conectores de Cisalhamento: pino com cabeça (stud bolt) e perfil “U” laminado. (MALITE,1990)

Parte da eficiência do comportamento das vigas mistas na interface aço-concreto, ou seja, o tipo de interação existente (nula, completa ou parcial), está diretamente relacionado com o trabalho em conjunto entre ambos os materiais, conforme ilustra a figura 3. Deste modo, o termo interação total ou completa pode ser considerado quando se admitir uma ligação perfeita entre aço e concreto, sem que haja o escorregamento longitudinal relativo. Já o termo interação parcial pode ser usado quando for admitida a possibilidade de escorregamento relativo na interface aço-concreto.

P

_+

_+

P P

corte na

compressão

momentos

deformada

c = 0

q = 0

na laje

ligação

deformaçõesa meio vão aço

concreto

interação nula interação total interação parcial

Figura 3 - Interação entre o aço e o concreto no comportamento da viga mista (MALITE, 1990).

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

5

3 ESTRUTURAS DE AÇO EM SITUAÇÃO DE INCÊNDIO - BREVE HISTÓRICO

No contexto mundial, as primeiras exigências de proteção contra incêndio surgiram por volta de 1666, com a ocorrência de um grande incêndio em Londres. Porém, este tema só começou a ser realmente estudado em meados do século 19 e início do século 20. O estabelecimento das primeiras normas para testes de resistência ao fogo deve-se a ASTM - American Society for Testing and Materials, que em 1911 estabeleceu a norma Standard tests for fireproof constructions. Em 1932, a British Standard Institution publicou a norma BS 476-Fire tests on buildings materials and structures, a qual com as devidas revisões e ampliações, ainda hoje é bastante utilizada, conforme mencionado em CLARET (2000). Recentemente, entre os anos de 1995 e 1996, a British Steel, hoje conhecida como CORUS, executou 4 (quatro) ensaios com ênfase em incêndio, em uma estrutura construída em escala real com 8 pavimentos na cidade de Cardington, localizada no Reino Unido, com vistas a estudar o comportamento estrutural global da edificação quando submetida a elevadas temperaturas (EUGHAZOULLI & IZZUDDIN, 2000). No Brasil, até 1970 todos os regulamentos como Código de Corpo dos Bombeiros e Código de Obras Civis foram adaptados de seguradoras americanas, e as exigências para instalações de segurança não eram muito rigorosas (RODRIGUES, 1999). No entanto, após os incêndios ocorridos no Edifício Andraus em 1972, no Edifício da Caixa Econômica do Rio de Janeiro em 1974, e no Edifício Joelma, também em 1974, atenções especiais foram direcionadas a este assunto. Nos últimos anos, despertou-se um grande interesse pelo tema, já que o incêndio até pouco tempo atrás, dentro do contexto das estruturas de aço, parecia ser um aspecto sem solução devido à inexistência de uma norma brasileira que orientasse os projetistas na minimização desse problema. Em 1996, a Associação Brasileira de Normas Técnicas instalou uma comissão para estudar o assunto em questão. Preocupados com a segurança em situação de incêndio, representantes dos meios universitário e técnico formaram um Grupo de Trabalho com o objetivo de elaborar textos-base normativos para o dimensionamento de estruturas de aço em situação de incêndio, com base em bibliografias modernas sobre o tema proposto (SILVA & FAKURY, 2000). O texto foi aprovado e, em 1999, foi publicada a norma brasileira “NBR 14323-Dimensionamento de estruturas de aço de edifícios em situação de incêndio”. Para a aplicação do procedimento simplificado da NBR 14323/1999, percebeu-se a necessidade de uma norma para determinação da ação térmica nos elementos construtivos dos edifícios. Para tanto, foi publicada em 2000 a “NBR 14432-Exigências de resistência ao fogo de elementos construtivos das edificações. A necessidade de se considerar a ação térmica nos materiais (por exemplo, no aço e no concreto) deve-se a fato de que a exposição dos materiais a temperaturas elevadas provoca alterações em suas propriedades mecânicas. Isso pode ser traduzido pela redução nos valores do módulo de elasticidade (E) e da resistência ao escoamento do aço (fy), e pela redução nos valores do módulo de elasticidade (Ec) e da resistência à compressão do concreto (fck), as quais constituem

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

6

aspectos que devem ser levados em conta no dimensionamento das estruturas em situação de incêndio. As figuras 4 e 5 ilustram, respectivamente, os diagramas tensão x deformação do aço e do concreto em função da temperatura e a influência da temperatura na resistência e rigidez dos elementos estruturais de aço e de concreto.

0

0,25

0,5

0,75

1

1,25

0 0,05 0,1 0,15 0,2 0,25

Deformação linear específica

Tens

ão re

lativ

a 500 oC600 oC700 oC800 oC900 oC

Temperatura

0

0,25

0,5

0,75

1

1,25

0 0,005 0,01 0,015 0,02 0,025 0,03 0,035 0,04

Deformação linear específica

Tens

ão re

lativ

a

400 oC500 oC600 oC700 oC800 oC900 oC

Temperatura

(a) (b)

Figura 4 - Diagrama tensão x deformação do aço e do concreto em função da temperatura: para o aço e (b) para o concreto.

0

0,25

0,5

0,75

1

0 300 600 900 1200

Temperatura (oC)

Res

itênc

ia re

lativ

a

concretoaço

0

0,25

0,5

0,75

1

0 300 600 900 1200

Temperatura (oC)

Mód

. Ela

stic

. rel

ativ

o

aço

concreto

(a) (b)

Figura 5 – Aço e Concreto: (a) Redução da resistência em função da temperatura e (b) Redução do módulo de elasticidade em função da temperatura.

4 ASPECTOS ADOTADOS NOS MODELOS NUMÉRICOS DE VIGAS MISTAS AÇO-CONCRETO

A complexidade da análise multiaxial, nos campos das tensões e das deformações, conduz à utilização de modelos matemáticos (analíticos) bastante complexos, descritos por equacionamentos custosos, conforme verificado nos procedimentos de modelagem propostos em OVEN et al. (1997) e em GATTESCO (1999). Atualmente, com a evolução dos micro-computadores e dos códigos de cálculo para análise estrutural, a análise multiaxial (plana ou tridimensional) para as estruturas, de um modo geral, deixa de ser um problema. Por esta razão, optou-se por estudar o comportamento de vigas mistas em temperatura ambiente e em situação de incêndio, por meio de simulações numéricas

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

7

que permitam análises mais detalhadas de alguns dos aspectos de interesse do sistema misto, como por exemplo, os níveis de tensões no aço e no concreto em regiões de interesse pré-estabelecidas. Dessa forma, são aqui propostos modelos tridimensionais de vigas mistas com vistas a simular satisfatoriamente seu comportamento estrutural em temperatura ambiente e em situação de incêndio. Esta simulação numérica é realizada por meio da utilização do código de cálculo ABAQUS versão 6.3-1, elaborado com base no Método dos Elementos Finitos, o qual disponibiliza ao pesquisador recursos necessários para a modelagem em questão. Nos itens que seguem serão apresentadas às características consideradas para os modelos numéricos propostos (em temperatura ambiente e em situação de incêndio), bem como os elementos finitos adotados para a discretização da viga mista, as relações constitutivas utilizadas e as condições de contorno e de solicitação impostas.

4.1 Modelos numéricos de vigas mistas simplesmente apoiadas para análise em temperatura ambiente

4.1.1 Elementos finitos utilizados O código de cálculo ABAQUS possui uma extensa biblioteca de elementos finitos que fornece ao usuário ferramentas que possam ajudá-lo na resolução de diferentes problemas. A escolha dos elementos para a simulação numérica deve ser feita levando-se em conta vários aspectos, tais como a família a qual o elemento pertence, graus de liberdade ativos, número de nós, e principalmente, o comportamento que ele apresenta perante a análise desejada. Para a elaboração dos modelos numéricos em temperatura ambiente, foram utilizados os seguintes elementos finitos:

• Elemento finito sólido C3D8R O elemento sólido (ou contínuo), denominado por C3D8R, ilustrado na figura

6(a), é um elemento finito tridimensional que possui 8 (oito) nós, com 3 (três) graus de liberdade por nó, referentes às translações nas direções X, Y e Z (coordenadas globais). Este elemento foi utilizado para discretizar tanto o perfil metálico como a laje de concreto.

• Elemento finito treliça T3D2 O elemento treliça T3D2, ilustrado na figura 6(b) e utilizado para discretizar as armaduras transversais e longitudinais, é um elemento finito que possui 2 (dois) nós, apresentando 3 (três) graus de liberdade por nó, referentes às translações nas direções X, Y e Z. Este elemento é usado somente para transmitir forças axiais e, conseqüentemente, admite carregamentos apenas ao longo do eixo do elemento, visto que não possui rigidez para resistir a solicitações perpendiculares ao seu eixo.

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

8

• Elemento finito shell S4R O elemento finito Shell, denominado S4R, ilustrado na figura 7, possuí 4 (quatro) nós, com 6 (seis) graus de liberdade por nó, referentes as translações (ux, uy e uz) e as rotações (φx, φy e φz) segundo as coordenadas X, Y e Z. O elemento S4R foi também utilizado para discretizar a laje de concreto, com vistas a comparar a eficiência dos modelos numéricos construídos com este elemento com aqueles construídos com o elemento finito C3D8R, no referente à estabilidade numérica.

• Elemento finito REBAR O elemento finito REBAR foi utilizado para definir as camadas de armaduras que estarão inseridas no elemento Shell S4R. É necessário informar ao ABAQUS o espaçamento entre as armaduras na direção desejada, a área da seção transversal de cada barra, bem como a posição de cada camada de armaduras na espessura.

(a)

8 7

34

1

5

2

6

face 3

face 4

face 2

face 6

face 5

face 1

X

Y

Z

1

2

1

(b) Figura 6 – Elementos finitos: (a) sólido C3D8R e (b) treliça T3D2.

face 4

face 3

face 2

face 1

43

21

Figura 7 – Elemento finito shell S4R.

4.1.2 Condições de contorno e de carregamento Os modelos numéricos propostos, denominados M-IT1 e M-IT2, foram construídos em concordância com as geometrias apresentadas em HUANG et al. (1999), que por sua vez teve como base os resultados de ensaios realizados e descritos em CHAPMAN & BALAKRISHNAN (1964).

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

9

A figura 8 ilustra as condições de contorno e de carregamento utilizadas no ensaio experimental, para uma viga mista simplesmente apoiada. O carregamento concentrado é aplicado no meio do vão e coincidente com o eixo da viga. A viga mista foi apoiada sobre roletes, localizados próximos de suas extremidades, e o carregamento pontual aplicado foi distribuído em uma pequena área por meio de uma chapa de aço associada a uma chapa de madeira compensada.

Figura 8 - Viga mista ensaiada com carregamento concentrado no meio do vão. A figura 9 ilustra as condições de contorno e de carregamento, para uma viga mista simplesmente apoiada com carregamento distribuído ao longo do vão. A viga mista também foi apoiada sobre roletes, localizados próximos de suas extremidades, e o carregamento uniformemente distribuído foi aplicado entre os apoios por meio de 18 (dezoito) macacos hidráulicos interconectados.

Figura 9 - Viga mista ensaiada por com carregamento distribuído entre os apoios. Ambos os modelos foram construídos, com base nas considerações dos modelos experimentais descritas anteriormente e ilustradas pelas figuras 8 e 9, respectivamente. As figuras 10 e 11 ilustram as malhas de elementos finitos e as condições de contorno e de carregamento utilizadas na elaboração do modelo numérico M-IT1. Já as figuras 12 e 13 ilustram as malhas de elementos finitos e as condições de contorno e de carregamento utilizadas na elaboração do modelo numérico M-IT2.

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

10

(a) (b)

Figura 10 – (a) Vista geral do modelo numérico: viga de aço e laje de concreto (construída com o elemento C3D8R) e (b) Condições de vinculação e carregamento impostas ao modelo M-IT1.

(a) (b)

Figura 11 - (a) Vista Geral do modelo numérico: viga de aço e laje de concreto (construída com o elemento S4R) e (b) Condições de vinculação e solicitação impostas ao modelo M-IT1.

(a) (b)

Figura 12 - (a) Vista Geral do modelo numérico: viga de aço e laje de concreto (construída com o elemento C3D8R) e (b) Condições de vinculação e solicitação impostas ao modelo M-IT2.

(a) (b)

Figura 13 - (a) Vista Geral do modelo numérico: viga de aço e laje de concreto (construída com o elemento S4R) e (b) Condições de vinculação e solicitação impostas ao modelo M-IT2.

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

11

As translações do apoio fixo (esquerdo) para ambos os modelos (figura 10b, 11b, 12b e 13b) foram restringidas nas 3 (três) direções globais (X, Y e Z), enquanto que para o apoio móvel (direito) foram impedidas as translações vertical e transversal (Y e Z), deixando livre a translação na direção axial. É importante salientar que as duas superfícies localizadas na interface entre a malha da laje de concreto discretizada com elementos S4R e a malha da viga metálica discretizada com elementos sólidos (figuras 11 e 13), foram vinculadas de forma a trabalhar conjuntamente durante a simulação numérica.

Dessa forma, apesar da diferença de graus de liberdade por nós entre ambos os elementos, os deslocamentos que ocorrem em ambas as superfícies em resposta à aplicação do carregamento (ou da temperatura, para o caso dos modelos numéricos em situação de incêndio a serem apresentados no item 4.2.3), serão aproximadamente iguais dentro de uma tolerância especificada pelo usuário.

4.1.3 Relações constitutivas para os materiais A simulação do comportamento estrutural do aço da armadura foi feita por meio de uma relação constitutiva σ x ε do tipo elasto-plástico perfeito, associada ao critério de von Mises, com base na relação entre as tensões uniaxiais e suas respectivas deformações plásticas equivalentes. O comportamento adotado está representado por meio do diagrama tensão-deformação, ilustrado na figura 14.

Ε=tang α

yf

σ

ε

Figura 14 - Modelo elasto-plástico perfeito para as armaduras.

O comportamento adotado para a viga de aço também está associado ao critério de von Mises, para o qual adotam-se sucessivos trechos lineares para representar seu comportamento, por meio do diagrama σ x ε, conforme representado na figura 15. Neste caso, ao contrário do comportamento descrito para o aço da armadura, admite-se que o aço do perfil desenvolve deformações plásticas após atingir sua tensão de proporcionalidade (σp=0,7 fy), como também permite o acréscimo de tensões até alcançar a resistência última (σu).

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

12

Ε=tang α

ε p ε y

u

p

y

σ

ε u

ε

Ε 1

ff

f

Figura 15 - Modelo elasto-plástico multilinear com encruamento isótropo para a viga de aço. Para a laje de concreto, adotou-se o modelo CONCRETE disponibilizado na biblioteca interna do programa ABAQUS. O comportamento estrutural do concreto na compressão é simulado por meio de uma relação constitutiva σ x ε do tipo elasto-plástico multilinear, conforme figura 16(a). O comportamento do concreto na tração, por sua vez, é definido pelo ABAQUS por meio da curva descendente denominada “tension stiffening”, representada na figura 16(b).

ck0.5 f

Ε

σ

ε

fck

ε0

c

σ

ε

σ ut

σ tu

Eε =t

u

Ponto de ruptura

Curva "Tension Stiffening"

(a) (b)

Figura 16 – (a) Diagrama tensão–deformação para o concreto na compressão e (b) Modelo

“tension stiffening” para o concreto.

4.2 Modelos numéricos de vigas mistas simplesmente apoiadas para análise em situação de incêndio (sem revestimento térmico)

4.2.1 Elementos finitos utilizados A construção dos modelos numéricos para análise em situação de incêndio foi feita por meio da utilização dos mesmos elementos finitos adotados para a análise em

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

13

temperatura ambiente, ou seja, o elemento sólido C3D8R para o perfil metálico, os elementos sólido C3D8R e shell S4R para a laje de concreto, e o elementos treliça T3D2 e REBAR para discretização das armaduras transversais e longitudinais. Suas características estão de acordo com aquelas descritas no item 4.1.1 do presente trabalho.

4.2.2 Relações constitutivas para os materiais em função da temperatura Como já descrito anteriormente, os materiais aço e concreto quando expostos a elevadas temperaturas sofrem alterações em suas propriedades mecânicas, causando a redução de resistência e de rigidez do sistema, aspectos estes que sempre devem ser levados em consideração quando do dimensionamento das estruturas em situação de incêndio. Dessa forma, as simulações do comportamento estrutural da viga de aço, da laje de concreto e das armaduras, em função da temperatura, foram feitas de acordo com os modelos matemáticos apresentados no EUROCODE 2 - Parte 1-2 que trata do dimensionamento das estruturas de concreto em situação de incêndio e os apresentados no EUROCODE 4 - Parte 1-2 que trata do dimensionamento das estruturas mistas aço-concreto em situação de incêndio. O diagrama tensão-deformação para os aços estruturais, em função da temperatura, apresentados pelo EUROCODE está representado na figura 17. A figura 18 representa o diagrama tensão-deformação em função da temperatura para os aços da armadura, apresentado pelo EUROCODE. O EUROCODE 2 - Parte 1-2 propõe relações constitutivas para a resistência à compressão do concreto quando submetidas a elevadas temperaturas conforme figura 19. A curva tensão-deformação para uma dada temperatura é definida por meio de dois parâmetros: a resistência característica à compressão fck(θ) e a sua correspondente deformação εc1(θ).

p,θ

y,θ

σ

σ

Εθ

εp,θ

σ

εεy,θ εu,θ εe,θ

Figura 17 - Diagrama tensão-deformação para aços estruturais submetidos à temperatura θ, conforme EUROCODE.

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

14

Ε

ε

σ

ε

f

f

sp,θ

sy,θ

sp,θ εsy,θ εst,θ εsu,θ

s,θ

Figura 18 - Diagrama tensão-deformação para o aço da armadura submetida à temperatura θ, conforme EUROCODE.

Ε

σ

ε

f ckθ

εc1θ

cuθε

Figura 19 - Diagrama tensão-deformação para o concreto submetido à temperatura θ, conforme

EUROCODE. Vale ressaltar que os modelos constitutivos escolhidos no programa ABAQUS para a simulação do comportamento do aço e do concreto possuem limitações, pois estes não permitem valores decrescentes de tensão para definição dos ramos descendentes da curva, conforme ilustrado nas figuras 17 a 19. Dessa forma, o diagrama tensão-deformação para o aço estrutural foi obtido até o trecho correspondente a deformação de 0,15, enquanto que o diagrama tensão-deformação para o concreto, após atingida a resistência à compressão em função da temperatura fckθ, foi considerado elasto-plástico perfeito.

4.2.3 Condições de contorno e de carregamento As condições de contorno e de carregamento referentes aos modelos numéricos em situação de incêndio foram adotadas em concordância com aquelas usadas nos ensaios experimentais com ênfase em incêndio, realizados em vigas mistas simplesmente apoiadas e descritos por WAINMAN & KIRBY (1988) apud HUANG et al. (1999), conforme figura 20.

F F F F

Figura 20 - Esquema estrutural referente ao modelo experimental com ênfase em incêndio.

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

15

A figura 21 ilustra a malha de elementos finitos para os modelos numéricos em situação de incêndio, em que foram utilizados apenas elementos sólidos C3D8R para discretização da laje de concreto e viga de aço, bem como as respectivas condições de contorno e condições de carregamento aplicadas.

(a) (b)

Figura 21 – (a) Vista Geral do modelo numérico M-F1: viga de aço e laje de concreto (com o

elemento C3D8R) e (b) Condições de vinculação e carregamento impostas ao modelo numérico M-F1 em situação de incêndio.

Já a figura 22 ilustra a malha de elementos finitos em que a laje de concreto foi discretizada com o elemento finito Shell S4R e a viga metálica com o elemento sólido C3D8R.

(a) (b)

Figura 22 – (a) Vista Geral dos modelos M-F1 e M-F2: viga de aço e laje de concreto

(construída com o elemento Shell S4R) e (b) Condições de vinculação e carregamento impostas aos modelos numéricos M-F1 e M-F2 em situação de incêndio.

Salienta-se ainda que a aplicação do carregamento estático e a aplicação da temperatura foram executadas em etapas distintas. Primeiramente foi aplicada aos modelos numéricos uma força F que pode ser considerada como uma solicitação de serviço e, portanto, não causa o colapso do sistema estrutural. Logo após, aplicou-se incrementos de temperatura, de acordo com as prescrições recomendadas pela norma brasileira NBR 14323:1999 com referência ao dimensionamento de vigas mistas aço-concreto em situação de incêndio. A NBR 14323:1999 prescreve que a distribuição de temperatura em vigas mistas aço-concreto, sem revestimento térmico, deve ser tomada como não-uniforme, com a seção transversal dividida em três partes distintas: mesa inferior, alma (a temperatura da alma é considerada igual à temperatura da mesa inferior) e mesa superior, de acordo com a figura 23.

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

16

f itb f i

h f

t c

t wh

b f s

b

f st

Figura 23 - Divisão da viga de aço para distribuição de temperatura. O acréscimo de temperatura ∆θa,t das mesas inferior e superior da viga de aço durante o intervalo de tempo t∆ foi determinado conforme item 8.5.1.1 apresentado na Norma que trata dos elementos estruturais sem proteção contra incêndio. O fator de massividade expresso pela relação entre o perímetro exposto ao fogo (u) e a área da seção transversal (A) do elemento em estudo foi determinado, levando-se em conta as seguintes igualdades:

• para a mesa inferior: u/A = fifififi tb)tb(2 + • para a mesa superior sobreposta por laje maciça: u/A = fsfsfsfs tb)t2b( +

Já para a laje de concreto, a Norma prescreve que a variação de temperatura na espessura deve ser obtida dividindo-se a altura da laje em um máximo de 14 fatias, conforme apresentado na tabela A.1 (item A.2.2), extraída da NBR 13423:1999. A distribuição de temperatura pode ser tomada constante ao longo da largura efetiva b da laje de concreto. A norma ainda permite que a distribuição de temperatura ao longo da altura da laje de concreto, apesar de decrescente da face inferior (exposta ao incêndio) para a face superior, seja tomada como constante e igual a um valor médio, θc, determinado por meio de equação prescrita na NBR 14323:1999, na forma:

j

n

1jj,c

efc e

h1 ∑

=

θ=θ (1)

Na última equação, hef é definido conforme tabela A.1 (item A.2.2 da NBR 14323:1999), n é o número de fatias da laje e θc,j e ej são, respectivamente, a temperatura e a espessura das n fatias em que a laje é dividida. Considerou-se a não ocorrência de transferência de calor entre as partes da viga de aço, bem como a não ocorrência de transferência de calor entre a mesa superior e a laje de concreto.

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

17

A figura 24 ilustra a distribuição de temperatura na seção transversal da viga mista ao longo do tempo, de acordo com as especificações prescritas pela NBR 14323:1999.

0

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1000

0 10 20 30 40 50 60 70Tempo(min)

Tem

pera

tura

(oC

)

Temperatura_mesa superior

Temperatura_mesa inferior e alma

Temperatura_laje

Figura 24 - Distribuição da temperatura na seção transversal dos modelos M-F1 e M-F2,

ao longo do tempo.

5 COMPARAÇÃO ENTRE OS RESULTADOS NUMÉRICO E EXPERIMENTAL

5.1 Análise em temperatura ambiente

São apresentados neste item os resultados obtidos por meio de análise numérica para os modelos de vigas mistas simplesmente apoiadas, em temperatura ambiente (M-IT1 e M-IT2), cujas dimensões da seção transversal, tipo de carregamento aplicado e comprimento do vão, estão ilustrados na figura 25. As tabelas 1 e 2 apresentam as propriedades consideradas para os materiais que constituem os modelos numéricos M-IT1 e M-IT2, respectivamente, com referência às propriedades físicas das armaduras e da viga de aço, bem como com referência às propriedades do concreto, em que são especificadas as correspondentes resistências à compressão (fck) e a relação existente entre a resistência última à tração uniaxial (ft) e à compressão (fck). Estes dados estão em concordância com as relações constitutivas apresentadas no item 4.1.3 do presente trabalho.

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

18

40 Ø 12 mm

viga de aço

8 Ø 12 mm

M-IT2

M-IT1

20 Ø 12 mm

laje de concreto armado

Figura 25 - Dimensões utilizadas nos modelos numéricos M-IT1 e M-IT2 (unidade em mm).

Tabela 1 – Propriedades dos materiais referentes ao modelo M-IT1.

MATERIAL E (kN/cm2)

E1 (kN/cm2)

σp (kN/cm2)

σy (kN/cm2)

σu (kN/cm2)

fck (kN/cm2) ft/fck

ARMADURA 20500 - - 60,0 - - -

PERFIL METÁLICO 20500 205 21,14 30,2 45,0 - -

LAJE DE CONCRETO 3104 - - - - 2,7 0,12

Nota: Ec = 9,5 (fck+8)1/3, sendo que Ec em kN/mm2 e fck em N/mm2 (EUROCODE 2).

Tabela 2 - Propriedades dos materiais referentes ao modelo M-IT2.

MATERIAL E (kN/cm2)

E1 (kN/cm2)

σp (kN/cm2)

σy (kN/cm2)

σu (kN/cm2)

fck (kN/cm2) ft/fck

ARMADURA 20500 - - 60,0 - - -

PERFIL METÁLICO 20500 205 20,3 29,0 52,0 - -

LAJE DE CONCRETO 3495 - - - - 4,2 0,12

Nota: Ec = 9,5 (fck+8)1/3, sendo que Ec em kN/mm2 e fck em N/mm2 (EUROCODE 2).

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

19

5.1.1 Resultados obtidos com o modelo numérico M-IT1 A figura 26(a) ilustra a comparação entre valores numérico e experimental, obtidos da relação entre o carregamento aplicado e os deslocamentos verticais que ocorrem no meio do vão da viga mista, para o modelo discretizado apenas com o elemento sólido C3D8R. Vale destacar que a relação ft/fck = 0,12 adotada na tabela 1 está em concordância com valores obtidos para o concreto em ensaios de laboratório. Para este caso, o modelo numérico apresentou uma convergência satisfatória dos resultados numéricos quando comparado com os experimentais até um nível de carregamento correspondente a 313,75 kN. O procedimento adotado foi do tipo “incremental-iterativo”, utilizando-se como parâmetro de controle de convergência resíduo força com tolerância de 0,01. Por meio de análise com relação à figura 26(a) é possível constatar, conforme já mencionado, que após o nível de carregamento correspondente a aproximadamente 314 kN a execução do programa, em que são consideradas as não linearidades para ambos os materiais (aço e concreto), é interrompida em resposta a instabilidades verificadas no processo de convergência.

0

100

200

300

400

500

600

0 1 2 3 4 5 6 7

Deslocamento no meio do vão (cm)

Forç

a ap

licad

a (k

N)

Experimental_A3

HUANG et al (1999)M-IT1 (relação 0,12)

0

100

200

300

400

500

600

0 1 2 3 4 5 6 7

Deslocamento no meio do vão (cm)

Forç

a ap

licad

a (k

N)

Experimental_A3HUANG et al (1999)M-IT1 (relação 0,25)

(a) (b)

0

100

200

300

400

500

600

0 1 2 3 4 5 6 7

Deslocamento no meio do vão (cm)

Forç

a ap

licad

a (k

N)

Experimental_A3HUANG et al (1999)M-IT1 (relação 0,50)

(c)

Figura 26 - Comparação entre resultados Numérico e Experimental: (a) para ft/fck = 0,12,

(b) para ft/fck = 0,25 e (c) para ft/fck = 0,50.

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

20

Objetivando uma correta identificação das possíveis causas que conduziram às instabilidades verificadas, análises foram feitas com referência aos aspectos de não-linearidade de ambos os materiais. Neste sentido, verificou-se que os possíveis problemas de instabilidade numérica ocorreram quando da consideração da não-linearidade do material concreto, com forte influência principalmente em regiões de elevadas tensões de tração. Acredita-se que os aspectos de instabilidade estejam associados, provavelmente, a possíveis limitações do modelo “CONCRETE” quando associado ao elemento sólido C3D8R, disponibilizado pelo ABAQUS. Para verificação dos prováveis aspectos limitantes mencionados, foram adotados outros valores para relação ft/fck, no caso, 0,25 e 0,50, objetivando atingir com o modelo numérico, níveis de carregamento acima daquele identificado na figura 26(a), e, conseqüentemente, o mais próximo possível daqueles identificados nos resultados experimentais e com ajuste satisfatório. Nas figuras 26(b) e 26(c), são apresentados os resultados obtidos para valores da relação ft/fck, iguais a 0,25 e 0,50, respectivamente É importante ressaltar, que esta relação não possui sentido físico, pois como se sabe o concreto é um material frágil que resiste a tensões de tração muito baixas (da ordem de 10% da resistência última à compressão). Estas relações de ft/fck adotadas são utilizadas apenas como “estratégia numérica”, no sentido de identificar e desconsiderar possíveis limitações do modelo CONCRETE quando associado ao elemento sólido C3D8R, no referente às tensões de tração. Por meio de análises com referência às figuras 26(b) e 26(c), é possível perceber que o processo de convergência, em ambos os casos, atinge valores de carregamento iguais a 356,90 kN e 426,40 kN, respectivamente, e com concordância bastante satisfatória entre resultados numérico e experimental. Além do procedimento adotado para a verificação dos aspectos limitantes mencionados, por meio da adoção de outros valores para relação ft/fck (0,25 e 0,50), optou-se por construir um modelo numérico, com vistas a uma melhor representação do comportamento do concreto quando submetido a esforços de flexão. Dessa maneira, a malha da laje de concreto referente ao modelo M-IT1 foi discretizada com o elemento finito S4R, conforme já ilustrado na figura 11. A figura 27 ilustra a comparação entre valores numérico e experimental, por meio da relação entre o carregamento aplicado e os deslocamentos verticais que ocorrem no meio do vão da viga mista para o modelo numérico M-IT1, em que a laje de concreto foi discretizada tanto com o elemento C3D8R, como também com o elemento finito S4R. A relação ft/fck foi mantida igual a 0,12 para posterior comparação de resultados. Por meio de análise com relação à figura 27 é possível perceber uma maior estabilidade no processo de convergência alcançada pelo modelo numérico M-IT1 para a laje de concreto discretizada com o elemento finito S4R, com boa aproximação entre os resultados numéricos e experimentais, inclusive no referente ao valor do carregamento último atingido. De fato, por apresentar uma formulação cujas funções aproximadoras são polinômios de graus maiores do que aquela utilizada na formulação do elemento sólido, o elemento S4Rl possui um melhor desempenho e uma maior flexibilidade quando submetido a esforços de flexão. Para que o modelo numérico discretizado com elementos C3D8R atinja níveis de carregamento próximos daqueles alcançados com elementos S4Rl, seria

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

21

necessária uma malha de elementos finitos com grau de refinamento muito elevado, resultando em um esforço computacional significativo, invibializando o processo de convergência. Dessa forma, para a análise proposta neste trabalho, ou seja, vigas mistas simplesmente apoiadas submetidas a esforços de flexão, a utilização do elemento Shell demonstra ser a mais adequada.

0

100

200

300

400

500

600

0 1 2 3 4 5 6 7

Deslocamento no meio do vão (cm)

Forç

a ap

licad

a (k

N)

Experimental_A3M-IT1 (S4R)M-IT1 (C3D8R)

Figura 27- Comparação entre resultados experimentais e numéricos, obtidos com o elemento sólido C3D8R e com o elemento Shell S4R.

5.1.2 Resultados obtidos com o modelo numérico M-IT2 O modelo numérico apresentado a seguir, denominado de M-IT2, foi simulado de maneira análoga àquela utilizada para o modelo M-IT1. Salienta-se que as propriedades adotadas para os materiais do modelo M-IT2 estão de acordo com aquelas apresentadas na tabela 2. A figura 28(a) apresenta como resultado a comparação entre valores numéricos e experimentais, obtidos por meio da relação entre o carregamento aplicado na viga mista e os correspondentes deslocamentos verticais que ocorrem no meio do vão, para o modelo discretizado apenas com o elemento sólido C3D8R. Novamente, vale destacar que a relação ft/fck = 0,12 adotada na tabela 2 está em concordância com valores obtidos para o concreto em ensaios de laboratório. Neste caso, como se pode observar na figura 28(a), os resultados numéricos quando comparados com os experimentais apresentaram uma convergência satisfatória até um nível de carregamento correspondente a 549,56 kN (aproximadamente 550 kN). Para níveis de carregamento acima de 550 kN, não foi possível garantir o processo de convergência, em razão de ocorrência de instabilidades numéricas observadas. Novamente, utilizou-se como procedimento à consideração dos mesmos valores para relação ft/fck, utilizadas no modelo M-IT1, com vistas a atingir com o modelo numérico M-IT2 níveis de carregamentos maiores que aqueles identificados

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

22

na figura 28(a). Nas figuras 28(b) e 28(c) são apresentados, respectivamente, os resultados obtidos para as relações de ft/fck iguais a 0,25 e 0,50.

0

200

400

600

800

1000

1200

0 2 4 6 8 10 12

Deslocamento no meio do vão (cm)

Forç

a ap

licad

a (k

N)

Experimental_U1

M-IT2 (relação 0,12)

0

200

400

600

800

1000

1200

0 2 4 6 8 10 12

Deslocamento no meio do vão (cm)Fo

rça

aplic

ada

(kN

)

Experimental_U1

M-IT2 (relação 0,25)

(a) (b)

0

200

400

600

800

1000

1200

0 2 4 6 8 10 12

Deslocamento no meio do vão (cm)

Forç

a ap

licad

a (k

N)

Experimental_U1

M-IT2 (relação 0,50)

(c)

Figura 28 - Comparação entre resultados Numérico e Experimental: (a) para ft/fck = 0,12, (b) para ft/fck = 0,25 e (c) para ft/fck = 0,50.

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

23

0

200

400

600

800

1000

1200

0 2 4 6 8 10 12

Deslocamento no meio do vão (cm)

Forç

a ap

licad

a (k

N)

Experimental_U1

M-IT2 (C3D8R)

M-IT2 (S4R)

Figura 29 - Comparação entre resultados experimentais e numéricos obtidos com o elemento

sólido C3D8R e com o elemento Shell S4R. É possível perceber que nos processos de convergência ilustrados nas figuras 28(b) e 28(c) foram atingidos valores de carregamento correspondentes aproximadamente a 633 kN e 757 kN, respectivamente, e com concordância satisfatória entre resultados numérico e experimental, até os níveis de carregamento mencionados. De maneira análoga ao que foi exposto para o modelo numérico M-IT1, também foi feita à comparação entre os resultados numéricos obtidos com a malha da laje de concreto discretizada com o elemento sólido C3D8R e o elemento Shell S4R, conforme ilustra a figura 29. Mais uma vez, é possível notar, um melhor desempenho do elemento Shell frente à análise em questão.

5.2 Análise em situação de incêndio sem revestimento térmico

São apresentados neste item os resultados obtidos por meio de análise numérica para os modelos de vigas mistas simplesmente apoiadas em situação de incêndio (M-F1 e M-F2), cujas dimensões da seção transversal, o tipo de carregamento estático aplicado (F) na laje de concreto e a ação térmica aplicada na mesa inferior da viga de aço, estabelecida pela ISO 834, estão ilustrados na figura 30.

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

24

viga de aço (254x146 mmx43 Kg/m)

46 8 mm

625

4 8 mm

130

TESTE 15: (F=32,47 kN)

CURVA ISO 8344530

F F F F5662,5 1132,5 1132,5 1132,5 5662,5

TESTE 16: (F=62,36 kN)

CURVA ISO 8344530

F F F F5662,5 1132,5 1132,5 1132,5 5662,5

M-F1 M-F2

Figura 30 - Dimensões utilizadas nos modelos numéricos M-F1 e M-F2 (unidade em mm).

Tabela 3 - Propriedades dos materiais referentes aos modelos M-F1 e M-F2.

MATERIAL E (kN/cm2)

σp (kN/cm2)

σy (kN/cm2)

σu (kN/cm2)

fck (kN/cm2) ft/fck

ARMADURA 20500 - 60,0 - - - PERFIL

METÁLICO 20500 17,85 25,5 40,0 - -

LAJE DE CONCRETO 3180 - - - 3,0 0,12

Nota: Ec = 9,5 (fck+8)1/3, sendo que Ec em kN/mm2 e fck em N/mm2 (EUROCODE 2).

A tabela 3 apresenta os valores nominais das propriedades adotadas para o aço e para o concreto em temperatura ambiente, descritos por WAINMAN & KIRBY (1988) apud HUANG et al. (1999), nos testes de resistência ao fogo. A tabela 4 apresenta os coeficientes de dilatação térmica utilizados para o aço e para o concreto, de acordo com os valores recomendados no projeto de revisão da norma brasileira NBR 14323:1999. Por simplificação, os valores da tabela 4 não estão em função da temperatura, ou seja, foram adotados constantes ao longo da análise.

Tabela 4 - Coeficiente de dilatação térmica para os materiais.

MATERIAL α (10-6 oC-1)

Aço 14 Concreto 18

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

25

5.2.1 Resultados obtidos com o modelo numérico M-F1 Realizadas as primeiras simulações numéricas da viga mista em situação de incêndio, para a relação ft/fck=0,12 e com a malha de elementos finitos discretizadas com o elemento sólido C3D8R, observou-se que o processo de convergência, após o final da aplicação do carregamento estático e início do carregamento térmico, foi interrompido a uma temperatura de aproximadamente 60 ºC (medida na mesa inferior da viga), devido ao aparecimento de fissuras nos elementos finitos que compõem a parte inferior da laje de concreto (zona tracionada). Vale aqui lembrar que no modelo numérico discretizado com elementos sólidos para análise em temperatura ambiente, o processo de convergência para a relação ft/fck=0,12 também foi interrompido em resposta a instabilidades numéricas provocadas pelo concreto, com forte influência em regiões de elevadas tensões de tração. Acredita-se que os aspectos aqui observados tenham relação com o fato de os materiais aço e concreto apresentarem diferentes coeficientes de dilatação térmica e, conseqüentemente, possuirem comportamentos diferentes com relação às deformações térmicas, quando da aplicação dos incrementos de temperatura, principalmente na interface entre viga e laje. Como procedimentos adotados para verificação de possíveis limitações que surgem quando da consideração do modelo CONCRETE associado com o elemento finito sólido C3D8R, foi adotado outro valor para relação ft/fck, que consiste de procedimento análogo àquele adotado para análise em temperatura ambiente (modelos M-IT1 e M-IT2), objetivando atingir com o modelo numérico, níveis de temperatura acima daquele identificado (60oC) e, conseqüentemente, o mais próximo possível daquele obtido experimentalmente. Em caráter complementar, optou-se por construir o modelo M-F1 com a malha de elementos finitos da laje de concreto discretizada com elementos Shell S4R, para posterior comparação dos resultados numéricos com os experimentais. Na figura 31 são apresentados os resultados obtidos entre valores numérico e experimental, da relação entre a temperatura aplicada na mesa inferior e os respectivos deslocamentos verticais que ocorrem no meio do vão da viga mista. Os resultados obtidos com a utilização do elemento sólido C3D8R correspondem à relação ft/fck=0,75, enquanto que os resultados obtidos com a utilização do elemento Shell S4R correspondem à relação ft/fck=0,12. Após análises com referência a figura 31, é possível perceber que o modelo numérico que apresenta a malha de elementos finitos discretizada com elementos Shell S4R se comporta de forma mais satisfatória do que aquele com elementos sólidos, conforme já constatado nos resultados obtidos com os modelos numéricos em temperatura ambiente.

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

26

0

100

200

300

400

500

600

700

800

0 5 10 15 20 25D eslocamento no meio do vão (cm)

Tem

pera

tura

na

mes

a in

ferio

r (oC

)

E xperimental (T este 15)

H U AN G et al. (1999)

M -F1 (S4R)

M -F1 (C3D 8R)

Figura 31 - Comparação entre resultados numéricos obtidos com a utilização dos elementos

finitos dos tipos sólido C3D8R e Shell S4R.

5.2.2 Resultados obtidos com o modelo numérico M-F2 O modelo numérico M-F2 possui características geométricas idênticas àquelas apresentadas para o modelo numérico M-F1, ou seja, comprimento de vão, seção transversal e propriedades dos materiais. Porém, com referência a aplicação do carregamento estático na primeira etapa da análise, o modelo M-F2 foi submetido à aplicação de uma força igual a 62,36 kN, conforme ilustrado na figura 30. Assim como nos modelos numéricos em temperatura ambiente, no modelo em situação de incêndio M-F1, os resultados obtidos, com a laje de concreto discretizada por meio de elementos sólidos C3D8R, mostram-se satisfatórios até um dado nível de carregamento abaixo daquele esperado, devido ao aparecimento de fissuras na laje de concreto. Como já mencionado, por este elemento apresentar em sua formulação, funções aproximadoras lineares, seria necessária uma malha de elementos finitos bastante refinada, resultando em um esforço computacional muito elevado, inviabilizando o processo de convergência. Dessa forma, a laje de concreto do modelo numérico M-F2 foi discretizada apenas com elementos finitos Shell S4R, que até o presente instante, demonstrou ser mais o adequado para o tipo de análise em questão. A figura 32 apresenta os resultados obtidos entre valores numérico e experimental, da relação entre a temperatura aplicada na mesa inferior e os respectivos deslocamentos verticais que ocorrem no meio do vão, para uma relação de ft/fck=0,12. Por meio de análise da figura 32, é possível perceber um distanciamento dos resultados numéricos quando comparados com os experimentais, tanto para o modelo M-F1 como para os resultados obtidos em HUANG et al. (1999). Acredita-se que essa distância esteja relacionada à existência de problemas quando da instrumentação do modelo experimental, pois como se pode notar na figura 33, os resultados experimentais obtidos no teste 15 (curva em azul), apresentaram deslocamentos maiores do que aqueles obtidos no teste 16 (curva em

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

27

vermelho), desde o início da aplicação do carregamento estático até a aplicação da temperatura de aproximadamente 500oC.

0

100

200

300

400

500

600

700

800

0 5 10 15 20 25 30Deslocamento no meio do vão (cm)

Tem

pera

tura

na

mes

a in

ferio

r (oC

)

Experimental (teste 16)

HUANG et al (1999)

M-F2 (S4R)

Figura 31 - Comparação entre resultados numérico e experimental.

0

100

200

300

400

500

600

700

800

0 5 10 15 20 25Deslocamento no meio do vão (cm)

Tem

pera

tura

na

mes

a in

ferio

r (oC

)

Experimental_teste15

Experimental_teste16

Figura 32 - Comparação de resultados entre os testes experimentais 15 e 16.

Conforme já apresentado na figura 30 e tabela 3, os modelos experimentais apresentam as mesmas características geométricas e propriedades dos materiais, porém o carregamento aplicado na viga mista referente ao teste 16 é aproximadamente o dobro daquele aplicado na viga mista referente ao teste 15. Por apresentar um carregamento estático aplicado de valor correspondente a aproximadamente duas vezes o carregamento aplicado no teste 15, entende-se que a curva que representa os resultados obtidos no teste 16 deveria apresentar deslocamentos iguais ou relativamente maiores do que os apresentados no teste 15 para uma mesma temperatura, fato este, que ocorre somente a partir de uma temperatura de 500oC.

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

28

6 CONCLUSÕES

A proposta do presente trabalho objetivou avaliar o comportamento global de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas em temperatura ambiente e em situação de incêndio, por meio de análise numérica tridimensional. Para tanto, inicialmente construiu-se os modelos numéricos em temperatura ambiente, por meio de discretização da malha de elementos finitos da viga mista apenas com elementos finitos do tipo sólido. Considerando-se esta situação, os modelos numéricos em temperatura ambiente, denominados de M-IT1 (viga simplesmente apoiada com carregamento concentrado no meio do vão) e M-IT2 (viga simplesmente apoiada com carregamento distribuído entre os apoios), apresentaram, para a relação ft/fck = 0,12, convergência satisfatória dos resultados numéricos obtidos, valores de carregamento abaixo daqueles identificados nos ensaios experimentais. Acredita-se que a ocorrência dos problemas de instabilidade numérica identificados nos modelos, provavelmente, tenha correlação com possíveis limitações do modelo disponibilizado para o concreto quando associado ao elemento finito sólido C3D8R. Dessa maneira, objetivando atingir com os modelos numéricos propostos em temperatura ambiente, níveis de carregamento acima daqueles identificados anteriormente, e em concordância com os resultados experimentais, foram adotados outros valores para a relação ft/fck, neste caso, iguais a 0,25 e 0,50, apenas como artifício numérico no sentido de se identificar as possíveis limitações mencionadas para o concreto. Com estas relações, foi possível obter um ajuste satisfatório entre os resultados numérico e experimental para níveis de carregamento bastante próximos dos valores finais verificados experimentalmente. Além disso, com vistas a evitar as limitações mencionadas para o concreto, optou-se por construir os modelos numéricos em temperatura ambiente, com uma melhor representação do comportamento do concreto quando submetido a esforços de flexão. Dessa forma, a malha da laje de concreto foi discretizada com o elemento finito Shell, mantendo-se a relação ft/fck = 0,12. Os modelos numéricos em temperatura ambiente com laje discretizada em elementos finitos Shell S4R apresentaram uma convergência bastante satisfatória dos resultados numéricos quando comparados com os experimentais, inclusive no referente ao valor do carregamento último atingido. Esse comportamento deve-se ao fato do elemento S4R possuir um melhor desempenho e uma maior flexibilidade quando submetido aos esforços de flexão. Com referência aos modelos numéricos de vigas mistas aço-concreto em situação de incêndio, denominados de M-F1 e de M-F2, a malha da laje de concreto também foi discretizada com elementos finitos C3D8R e S4R, analogamente aos modelos numéricos M-IT1 e M-IT2. Novamente, utilizando apenas o elemento sólido C3D8R, os modelos numéricos em situação de incêndio apresentaram, para uma relação ft/fck=0,12, convergência satisfatória dos resultados numéricos obtidos, valores de temperatura abaixo daqueles identificados nos ensaios experimentais, devido ao aparecimento de fissuras nos elementos finitos que compõem a parte inferior da laje de concreto (zona tracionada). Mais uma vez, adotou-se outra relação ft/fck=0,75 como procedimento para verificação de possíveis limitações do modelo CONCRETE quando associado com o

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

29

elemento sólido C3D8R. Com esta relação, foi possível atingir valores de temperatura bastante próximos dos valores finais obtidos experimentalmente, com concordância entre resultados numérico e experimental, sem interrupção no processo de convergência. É importante salientar que o modelo numérico M-F1, quando construído com elementos finitos Shell S4R apresentou, para uma relação ft/fck=0,12, convergência satisfatória dos resultados numéricos obtidos até uma temperatura, bastante próxima daquela verificada experimentalmente. Dessa forma, para a análise proposta neste trabalho, ou seja, vigas mistas simplesmente apoiadas submetidas a esforços de flexão, a utilização do elemento Shell demonstrou ser a mais adequada. Com referência ao modelo numérico M-F2, optou-se por construir a malha da laje de concreto apenas com elementos finitos do tipo Shell, uma vez que este se mostrou mais apropriado para análise em questão. Tanto o modelo numérico M-F2 como o modelo numérico apresentado por HUANG et al. (1999), apresentaram deslocamentos no meio do vão maiores do que aqueles identificados experimentalmente por WAINMAN & KIRBY (1988), para uma certa temperatura, Acredita-se que essa diferença de resultados esteja relacionada à existência de problemas quando da instrumentação do modelo experimental, já que os resultados experimentais apresentados trazem algumas divergências as quais foram devidamente comentadas e discutidas no item 5.2.2. Outro fato que deve ser mencionado se refere às prescrições estabelecidas na Norma brasileira NBR 14323:1999. Estas prescrições, quando aqui utilizadas na simulação dos modelos numéricos em situação de incêndio, aparentemente conduziram a resultados mais conservadores quando comparados com os resultados obtidos experimentalmente. No entanto, deve-se salientar que haveria a necessidade de se realizar um número maior de simulações numéricas que comprovem que as prescrições estabelecidas na norma brasileira NBR 14323:1999 conduzem, de fato, a resultados mais conservadores e, conseqüentemente, a um dimensionamento a favor da segurança estrutural. Finalmente, fica como sugestão para o desenvolvimento de futuros trabalhos o desenvolvimento de pesquisas que abordem outros tipos de sistemas estruturais mistos, como, por exemplo, vigas mistas semicontínuas e contínuas, as quais foram recentemente incluídas no projeto de revisão da norma brasileira NBR 8800:2003. Além disso, as análises numéricas em situação de incêndio desenvolvidas nesta pesquisa poderiam ser estendidas ao estudo do comportamento de vigas mistas aço-concreto com revestimento térmico, que, atualmente, é uma solução construtiva bastante empregada, com vistas a se evitar o aumento excessivo da temperatura da estrutura em situação de incêndio. Com referência às ferramentas utilizadas na modelagem numérica deste trabalho, acredita-se que a consideração de alguns fatores, tais como a utilização de outros critérios de ruptura para o concreto, a utilização de outros elementos disponíveis na biblioteca do ABAQUS, bem como a elaboração de sub-rotinas que permitam desconsiderar a parcela tracionada do concreto possam conduzir, tanto em temperatura ambiente como em situação de incêndio, a melhores resultados dos modelos numéricos aqui propostos.

Larissa Degliuomini Kirchhof & Jorge Munaiar Neto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

30

7 AGRADECIMENTOS

Os autores do presente trabalho agradecem à FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo pelo apoio concedido ao desenvolvimento da pesquisa em questão.

8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. (1986). NBR 8800 - Projeto e execução de estruturas de aço de edifícios. Rio de Janeiro.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. (1999). NBR 14323 – Dimensionamento de estruturas de aço de edifícios em situação de incêndio – Procedimento. Rio de Janeiro

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. (2000). NBR 14432 – Exigências de resistência ao fogo de elementos construtivos de edificações – Procedimento. Rio de Janeiro.

CHAPMAN, J. C.; BALAKRISHNAN, S. (1964). Experiments on composite beams. The Structural Engineer, v.42, n.11, p. 369-383.

CLARET, A. M. (2000). Resistência ao fogo de vigas mistas aço-concreto modeladas pelo método dos elementos finitos. In: JORNADAS SUDAMERICANAS DE INGENIERIA ESTRUCTURAL, Punta Del Este, 2000. Anais... 2000.

EUGHAZOULI, A. Y.; IZZUDDIN, B. A. (2000). Response of idealized composite beam-slab systems under fire conditions. Journal of Constructional Steel Research, UK, v. 56, p. 99-224.

EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION. (1995). ENV 1992-1-2: Eurocode 2 - Design of concrete structures. Part 1-2: General rules - Structural fire design. Brussels.

EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION. (1994). ENV 1994-1-2: Eurocode 4 - Design of composite steel and concrete structures. Part 1-2: General rules and rules – Structural fire design. Brussels.

GATTESCO, N. (1999). Analytical modeling of nonlinear behavior of composite beams with deformable connection. Journal of Constructional Steel Research, Italy, v.52, p. 195-218.

HIBBITT, KARLSSON; SORENSEN, Inc. (2002). Abaqus Theory Manual & Users Manuals - Version 6.3. Pawtucket, RI, USA.

HUANG, Z.; BURGESS, I. W.; PLANK, R. J. (1999). The influence of shear connectors on the behavior of composite steel-framed building in fire. Journal of Constructional Steel Research, v.51, p.219-237.

Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 1-31, 2005

31

KIRCHHOF, L. D. (2004). Uma contribuição ao estudo de vigas mistas aço-concreto simplesmente apoiadas em temperatura ambiente e em situação de incêndio. São Carlos. Dissertação (Mestrado) – Escola de Engenharia de São Carlos – Universidade de São Paulo.

MALITE, M. (1990). Sobre o cálculo de vigas mistas aço-concreto: ênfase em edifícios. São Carlos. 144p. Dissertação (Mestrado) – Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo.

MALITE, M. (1993). Análise do comportamento estrutural de vigas mistas aço-concreto constituídas por perfis de chapa dobrada. São Carlos. 2v. Tese (Doutorado) - Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo.

OVEN, V. A.; BURGESS, I. W.; PLANK, R. J.; ABUD WALI, A. A. (1997). An analytical model for the analysis of composite beams with partial interaction. Computers & Structures, v.62, n.3. p. 493-504.

RODRIGUES, F. C. (1999). Comportamento de estruturas constituídas por perfis formados a frio em temperatura ambiente e em temperatura elevada. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL “O USO DE ESTRUTURAS METÁLICAS NA CONSTRUÇÃO CIVIL”, 2., Belo Horizonte, MG.

SILVA, V. P.; FAKURY, R. H. (2000). Normas brasileiras de estruturas de aço em situação de incêndio. In: JORNADAS SUDAMERICANAS DE INGENIERIA ESTRUCTURAL, 29., Punta Del Este 2000. Anais... 2000.

TRISTÃO, G. A. (2002). Comportamento de conectores de cisalhamento em vigas mistas aço-concreto com análise da resposta numérica. São Carlos, 114p. Dissertação (Mestrado) - Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo.

VIEST, I. (1960). Review of research on composite steel – concrete beams. ASCE, v. 86, ST6, p. 1-21.

32

ISSN 1809-5860

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

O SEGUNDO ESPECTRO DE FREQÜÊNCIAS DA TEORIA DE VIGA DE TIMOSHENKO

Jaime Florencio Martins1 & José Elias Laier2

Resumo A teoria de viga de Timoshenko leva em consideração, simultaneamente, os efeitos do momento fletor, inércia de rotação e força cortante na equação diferencial do movimento transversal da vibração de vigas. Para baixas freqüências a solução da equação diferencial depende de funções hiperbólicas e trigonométricas. Para altas freqüências a solução depende de apenas funções trigonométricas. Neste trabalho, investiga-se mais atentamente a existência do chamado segundo espectro de freqüências da teoria de viga de Timoshenko. Palavras-chave: Viga de Timoshenko; vibração; segundo espectro; acoplamento.

1 INTRODUÇÃO

Depois da publicação do artigo de TIMOSHENKO (1921), no qual o autor demonstra a contribuição da força cortante na equação diferencial do movimento transversal da vibração de vigas, surge um grande número de artigos na busca do melhor coeficiente de correção κ e na demonstração do segundo espectro de freqüências naturais. A equação diferencial da teoria viga de Timoshenko apresenta soluções que se dividem em dois grupos: para baixas freqüências a solução depende de funções hiperbólicas e trigonométricas e para altas freqüências, apenas funções trigonométricas. Traiel-Nash e Collar, em 1953, interpretaram a mudança no modo de vibração como a introdução de um segundo espectro de freqüências e “confirmaram” sua existência com resultados numéricos para vigas simplesmente apoiadas e vigas livre-livre. Esta é a primeira informação a respeito do segundo espectro de freqüências de acordo com BHASHYAM & PRATHAP (1981). ABBAS & THOMAS (1977) definem o primeiro espectro de freqüências como sendo a combinação do modelo de Euler-Bernoulli com deformação por força cortante e o segundo espectro de freqüências como sendo a soma da inércia de rotação e a deformação por força cortante. Os autores afirmam que não há segundo espectro de freqüências exceto para vigas simplesmente apoiadas. Entretanto, na conclusão do artigo, eles afirmam que o conceito de segundo espectro de freqüências deve ser abandonado e considerado apenas como resultado da combinação entre modos independentes de vibração. BHASHYAM & PRATHAP (1981) usando a técnica dos elementos finitos detectaram o segundo espectro de freqüências para vigas livre-livre, simplesmente apoiadas, engastada-rotulada e engastada-livre. Entretanto, dois anos depois

1 Professor Assistente do Departamento de Engenharia Civil da UFOP, [email protected] 2 Professor Titular do Departamento de Engenharia de Estruturas da EESC-USP, [email protected]

Jaime Florencio Martins & José Elias Laier

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

34

PRATHAP (1983) afirma que o segundo espectro precisa ser abandonado de considerações futuras. LEVINSON & COOKE (1982) afirmam que não existe o segundo espectro de freqüências em nenhum caso de vinculação. OLIVETO (1992) usando a técnica da matriz de rigidez dinâmica apresenta o segundo espectro de freqüências para vários casos de vinculação. No trabalho original apresentado por TIMOSHENKO (1921), o autor não faz nenhuma referência ao segundo espectro de freqüências. Em publicações posteriores de outros autores começa surgir controvérsia a respeito de sua existência. No presente trabalho, baseando-se na matriz de rigidez dinâmica apresentada por CHEN (1987), o segundo espectro de freqüências é apresentado como sendo a segunda freqüência correspondente a manutenção de uma componente do modo de vibração. O segundo espectro é encontrado somente na viga de Timoshenko e determinado por tentativas analisando-se o modo de vibração de cada freqüência natural. Como é visto nos exemplos, as componentes flexionais de vibração podem ter duas freqüências diferentes a elas associadas.

2 TEORIA DE VIGA DE TIMOSHENKO

Na figura 1(a) BC representa o eixo de uma viga uniforme durante vibração livre. O deslocamento vertical em uma seção transversal de abcissa x em um tempo t é representado por v. A figura 1(b) mostra as forças e momentos que atuam em um elemento de comprimento dx. A força de inércia no elemento é representada por

−••

mdx v, onde m A= ρ , sendo ρ a densidade do material e A a área da seção transversal.

Figura 1 – Vibração livre

De acordo com a segunda lei de Newton, tem-se:

∑ =••

F mdx vy então:

∂∂Vx

m v=••

(1)

O equilíbrio de momentos fletores, levando-se em consideração a inércia de rotação, fornece a expressão:

∂∂

αMx

V mr= −••

2 (2)

O segundo espectro de freqüências da teoria de viga de Timoshenko

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

35

onde α representa a rotação devido ao momento fletor. O momento fletor e a força cortante podem ser colocados nas formas: M EI= − α | (3) V AG= κ γ (4) Uma vez que v representa a deflexão produzida pelo momento fletor ( vb ) e pela força cortante ( vs ), tem-se a relação: v v vb s= + Derivando-se a expressão acima em relação a x, tem-se: v| = +α γ (5) Colocando-se as expressões (4) e (5) na equação (1), tem-se:

m v AG v••

− − =κ α( )|| | 0 (6) Da mesma forma, colocando-se as expressões (3), (4) e (5) na equação (2):

EI AG v mrα κ α α|| |( )+ − − =••

2 0 (7) Para movimentos harmônicos e estando todos os pontos em fase a solução das equações (6) e (7) pode ser da seguinte forma: v ei t= φ ω (8) α ϕ ω= ei t Onde ω representa a freqüência natural e φ e ϕ são funções apenas de x e representam a amplitude. Substituindo-se as expressões de v e α nas equações (6) e (7), têm-se: φ φ ϕ|| |+ − =c 0 (9) EI mr AG AGϕ ω κ ϕ κ φ|| |( )+ − + =2 2 0 (10) onde:

c mAG

κ

2

Eliminando-se ϕ | da equação (9) e φ | da equação (10), têm-se: φ φ φIV a b+ + =|| 0 (11) ϕ ϕ ϕIV a b+ + =|| 0 (12)

Jaime Florencio Martins & José Elias Laier

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

36

onde:

a c mrEI

= +2 2ω

b mr AG cEI

=−( )2 2ω κ

As amplitudes φ e ϕ podem ser assumidas como sendo:

φ β= Ce x

ϕ β= De x A expressão de β pode ser determinada colocando-se a expressão de φ na equação (11) ou ϕ na equação (12):

β β4 2 0+ + =a b de onde:

β12

2 42

= ±− − −a a b

β34

2 42

= ±− + −a a b

Sendo assim, φ e ϕ assumem as formas:

φ β==∑C ej

x

j

j

1

4

(13)

ϕ β==∑ D ej

x

j

j

1

4

(14)

Colocando-se as equações (13) e (14) na equação (9) tem-se a relação entre Cj e Dj: D g Cj j j= (15) onde:

g cj j

j

= +⎛

⎝⎜⎜

⎠⎟⎟β

β1 2 (16)

Das expressões de β β β1 2 3, , e β4 e equação (16) conclui-se que:

ββ

2 1

4 3

2 1

4 3

= −β= −β= −= −

g gg g

Na expressão de β1 e β3 o termo a b2 4− é sempre maior que zero, portanto, têm-se duas raízes reais. No cálculo de β1 e β3 dois casos podem ocorrer:

O segundo espectro de freqüências da teoria de viga de Timoshenko

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

37

1° caso: a b2 4− > a : Neste caso, β1 é imaginário e β3 é real. Então:

β

β

1 1

3 3

=

=

ik

k

onde:

k a a b1

2 42

=+ −

k a a b3

2 42

=− + −

Assim sendo, g1 e g3 assumem a forma: g i

g

1 1

3 3

=

=

δ

δ

onde:

δ

δ

1 112

3 332

1

1

= −⎛⎝⎜

⎞⎠⎟

= +⎛⎝⎜

⎞⎠⎟

k ck

k ck

As amplitudes φ e ϕ assumem a forma:

φ = + + +C k x C k x C k x C k x1 1 2 1 3 3 4 3* * * *sen cos senh cosh

ϕ( ) cos sen cosh senh* * * *x c kk

C k x c kk

C k x c kk

C k x c kk

C k x= −−

+−

++

++1

2

11 1

12

12 1

32

33 3

32

34 3

Onde as constantes C j

* são todas reais e determinadas usando-se as condições de contorno.

2° caso: a b2 4− < a : Neste caso, β1 e β3 são imaginários. Então:

β

β

1 1

3 3

=

=

ik

ik

onde:

k a a b1

2 42

=+ −

Jaime Florencio Martins & José Elias Laier

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

38

k a a b3

2 42

=− −

Portanto, g1 e g3 são dados por:

g i

g i

1 1

3 3

=

=

δ

δ

onde:

δ

δ

1 112

3 332

1

1

= −⎛⎝⎜

⎞⎠⎟

= −⎛⎝⎜

⎞⎠⎟

k ck

k ck

As amplitudes φ e ϕ assumem a forma:

φ = + + +C k x C k x C k x C k x1 1 2 1 3 3 4 3* * * *sen cos sen cos

ϕ( ) cos sen cos sen* * * *x c kk

C k x c kk

C k x c kk

C k x c kk

C k x= −−

+−

−−

+−1

2

11 1

12

12 1

32

33 3

32

34 3

3 EXEMPLOS

Como primeiro exemplo de aplicação, considere-se que a viga bi-apoiada da figura 2 esteja em um estado de vibração livre. Estes são os dados da viga: E= 210 GPa, I= 0,025 m4, A= 0,3 m2, ν= 0,33, r= 0,2887 m, L= 11,547 m, m=2355 kg/m,κ = 0,85.

Figura 2 - Viga sobre dois apoios

As equações do deslocamento (φ ), e da inclinação da tangente à linha elástica referente ao momento fletor (ϕ ), estão tratadas no item anterior. Para o primeiro

caso, ou seja, quando a b a2 4− > , têm-se:

φ( ) sen cos senh cosh* * * *x C k x C k x C k x C k x= + + +1 1 2 1 3 3 4 3

ϕ( ) cos sen cosh senh* * * *x c kk

C k x c kk

C k x c kk

C k x c kk

C k x= −−

+−

++

++1

2

11 1

12

12 1

32

33 3

32

34 3

O segundo espectro de freqüências da teoria de viga de Timoshenko

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

39

Impondo-se as condições de contorno para vigas bi-apoiadas, encontram-se:

φ( ) * *0 0 2 4= = +C C ϕ | * *( ) ( )C ( )C0 0 1

22 3

24= = − + +c k c k

Portanto:

C C2 4 0* *= = Para x=L, têm-se as seguintes equações de φ e ϕ|:

φ( ) sen senh* *L C k L C k L= = +0 1 1 3 3 (17)

ϕ | * *( ) ( )C sen ( )C senhL c k k L c k k L= = − + +0 12

1 1 32

3 3 Colocando-se na forma matricial, tem-se:

sen senh( )sen ( )senh

*

*

k L k Lc k k L c k k L

CC

1 3

12

1 32

3

1

3

00− +

⎣⎢

⎦⎥⎧⎨⎩

⎫⎬⎭=⎧⎨⎩

⎫⎬⎭

Se C1

* e C3* forem simultaneamente iguais a zero, não existe deformação. Esta

solução, chamada trivial, não corresponde ao problema físico de interesse, uma vez que durante a vibração livre existem deformações φ e ϕ . Portanto, o determinante da matriz dos coeficientes tem que ser nulo:

sen ( )senh ( )sen senhk L c k k L c k k L k L1 32

3 12

1 3 0+ − − = Uma vez que k3 é diferente de zero (portanto: senh k3L≠ 0), a equação acima será satisfeita somente se: sen( )k L1 0= (18) Da equação (18) e as equações (17) conclui-se que:

C3 0* = Então, as expressões de φ e ϕ são as seguintes:

φ( ) sen*x C k x= 1 1 (19)

ϕ( ) cos*x c kk

C k x= −− 1

2

11 1

Para o segundo caso têm-se as expressões de φ e ϕ demonstradas no item anterior:

φ( ) sen cos sen cos* * * *x C k x C k x C k x C k x= + + +1 1 2 1 3 3 4 3

ϕ( ) cos sen cos sen* * * *x c kk

C k x c kk

C k x c kk

C k x c kk

C k x= −−

+−

−−

+−1

2

11 1

12

12 1

32

33 3

32

34 3

Jaime Florencio Martins & José Elias Laier

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

40

Impondo-se as condições de contorno, têm-se: φ( ) * *0 0 2 4= = +C C

ϕ | * *( ) ( )C ( )C0 0 12

2 32

4= = − + −c k c k donde:

C C2 4 0* *= = Para x=L, têm-se as seguintes equações:

φ( ) sen sen* *L C k L C k L= = +0 1 1 3 3 (20)

ϕ | * *( ) ( )C sen ( )C senL c k k L c k k L= = − + −0 12

1 1 32

3 3 Colocando-se na forma matricial, obtém-se:

sen sen( )sen ( )sen

*

*

k L k Lc k k L c k k L

CC

1 3

12

1 32

3

1

3

00− −

⎣⎢

⎦⎥⎧⎨⎩

⎫⎬⎭=⎧⎨⎩

⎫⎬⎭

Impondo-se a condição de determinante nulo, encontra-se a equação:

sen ( )sen ( )sen senk L c k k L c k k L k L1 32

3 12

1 3 0− − − = A equação acima será satisfeita em duas situações: Primeira situação:

sen (k1L) = 0 (21)

Com a equação (21) e as equações (20) conclui-se que:

C3 0* = Então, nesta situação as expressões de φ e ϕ são as seguintes:

φ( ) sen*x C k x= 1 1 (22)

ϕ( ) cos*x c kk

C k x= −− 1

2

11 1

Segunda situação: sen(k3L) =0 (23) Com a equação (23) e as equações (20) conclui-se que:

C1 0* = Para esta situação as expressões de φ e ϕ são as seguintes:

φ( ) sen*x C k x= 3 3 (24)

ϕ( ) cos*x c kk

C k x= −− 3

2

33 3

O segundo espectro de freqüências da teoria de viga de Timoshenko

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

41

As equações (22), correspondentes à primeira situação, são iguais as expressões (19) do primeiro caso. Portanto, as equações (22) são uma continuação das expressões (19) e correspondem ao primeiro espectro de freqüências. Calculando-se os valores de k1 para o primeiro caso e os valores de k3 para o segundo caso, constata-se que estes valores são iguais. O gráfico mostrando a variação de k1 e k3 com a freqüência ω da viga da figura 2 está apresentado na figura 3. Uma vez que k3 assume os mesmos valores de k1, as expressões de φ dadas pelas equações (19) e (24) são iguais, o que implica em um mesmo modo de vibração flexional (mas diferente modo rotacional). Portanto, as freqüências calculadas pela condição (23) correspondem ao segundo espectro de freqüências. Entretanto, a inclinação ϕ não é a mesma para os dois casos, uma vez que nestas expressões tem a constante c:

c mAG

κ

2

Para o segundo caso o valor de ω é muito maior que no primeiro caso. Portanto, o valor de ϕ da equação (24) é muito maior do que o valor de ϕ da equação (19).

Figura 3 - Variação de k1 e k3 com a freqüência

Com a condição (18) determinam-se as freqüências naturais para o primeiro caso como segue:

k L n1 = π (25) Elevando-se a expressão (25) ao quadrado e colocando-se a expressão de k1, demonstrada no item anterior, tem-se:

a a b nL

+ −=

2 2 2

24

(26)

Substituindo-se na expressão (26) as equações de “a” e “b” tem-se depois de algumas manipulações algébricas:

Jaime Florencio Martins & José Elias Laier

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

42

ηΩ ηπ π2

2

2

4

1 1 0− + ⎛⎝⎜

⎞⎠⎟

+⎡

⎣⎢⎢

⎦⎥⎥

+ ⎛⎝⎜

⎞⎠⎟

=( ) nL r

nL

Ω (27)

onde:

ηκ

=EG

e Ω =mEAω 2

Colocando-se dos dados da viga, tem-se:

3129 0 306 11 998 0 0055 02 2 4, ( , , ) ,Ω Ω− + + =n n Para o segundo caso as freqüências são calculadas através da equação (27) (a expressão de k1 é a mesma para o primeiro e o segundo casos) e da seguinte condição:

k L n3 = π (28) Elevando-se a expressão (28) ao quadrado e colocando-se a expressão de k3 do segundo caso, demonstrada no item anterior, obtém-se:

a a b nL

− −= ⎛⎝⎜

⎞⎠⎟

2 242

π (29)

Substituindo-se na expressão (29) as equações de “a” e “b” tem-se depois de algumas manipulações algébricas:

ηΩ ηπ π2

2

2

4

1 1 0− + ⎛⎝⎜

⎞⎠⎟

+⎡

⎣⎢⎢

⎦⎥⎥

+ ⎛⎝⎜

⎞⎠⎟

=( ) nL r

nL

Ω (30)

A condição (30) é igual a equação (27). Estas equações fornecem duas raízes: a menor raiz corresponde ao primeiro espectro de freqüências e atende a

condição: a b a2 4− > , e a maior raiz corresponde ao segundo espectro e satisfaz a

condição: a b a2 4− < . Na tabela 1 estão as cinco primeiras freqüências naturais do primeiro e do segundo espectro da viga bi-apoiada da figura 2. Estas freqüências foram calculadas analisando-se os modos de vibração de número 1 até o de número 23. Tabela 1 - Freqüências naturais do 1° e do 2° espectro da viga da Fig. 2

Freqüência

Teoria de vigas de Timoshenko (rad./s) -1° espectro

Teoria de vigas de Timoshenko (rad./s) -2° espectro

1 109,15 10254,97 2 421,48 10622,45 3 900,05 11192,29 4 1502,28 11920,95 5 2191,21 12770,21

O segundo espectro de freqüências da teoria de viga de Timoshenko

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

43

Nas figuras 3 a 7 estão representados os cinco primeiros modos de vibração do primeiro e do segundo espectro. Nas figuras 8 a 12 estão representados a inclinação da tangente à linha elástica referente ao momento fletor. Destas figuras, conclui-se que a inclinação referente ao segundo espectro muda de sinal e é muito maior do que a inclinação referente ao primeiro espectro.

Figura 3 - Diagrama de φ (ω=109,15 e ω= 10254,97 rad./s)

Figura 4 - Diagrama de φ (ω= 421,48 e ω= 10622,45 rad./s)

Figura 5 - Diagrama de φ (ω= 900,05 e ω= 11192,29 rad./s)

Jaime Florencio Martins & José Elias Laier

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

44

Figura 6 - Diagrama de φ (ω= 1502,28 rad./s e ω = 11920,95 rad./s)

Figura 7 - Diagrama de φ (ω= 2191,21 rad./s e ω = 12770,21 rad./s)

Figura 8 - ϕ referente ao 10 modo (ω =109,15 rad./s e ω =10254,97 rad./s)

O segundo espectro de freqüências da teoria de viga de Timoshenko

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

45

Figura 9 - ϕ referente ao 20 modo (ω =421,48 rad./s e ω =10622,45 rad./s)

Figura 10 - ϕ referente ao 30 modo (ω =900,05 rad./s e ω =11192,29 rad./s)

Figura 11 - ϕ referente ao 40 modo (ω =1502,28 rad./s e ω =11920,95 rad./s)

Jaime Florencio Martins & José Elias Laier

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

46

Figura 12 - ϕ referente ao 50 modo (ω =2191,21 rad./s e ω =12770,21 rad./s) Com os mesmos dados do exemplo anterior, procura-se para a viga sobre três apoios da figura 13 encontrar as cinco freqüências do segundo espectro, quando se analisam as freqüências de número 1 até 45. A tabela 2 contempla os resultados de maior interesse.

Figura 13 - Viga sobre três apoios

As freqüências naturais da viga sobre três apoios (figura 13) são calculadas somando-se as freqüências de vigas simplesmente apoiadas e engastadas-apoiadas. Para as freqüências correspondentes a vigas simplesmente apoiadas têm-se o correspondente segundo espectro de freqüências, no outro caso não. Tabela 2 - Freqüências naturais do 1° e do 2° espectro da viga da Fig. 13

Freqüência

Teoria de viga de Timoshenko (rad./s)

1° espectro

Teoria de viga de Timoshenko (rad./s)

2° espectro

1 109,15 10254,96 2 167,68 3 421,48 10622,45 4 518,71 5 900,05 11192,29 6 1018,97 7 1502,28 11920,95 8 1627,90 9 2191,21 12770,21

O segundo espectro de freqüências da teoria de viga de Timoshenko

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

47

4 CONSIDERAÇÕES ADICIONAIS SOBRE O SEGUNDO ESPECTRO DE FREQÜÊNCIAS

Nas vigas apoiadas-engastadas (figura 14) não se encontram freqüências do segundo espectro conforme constatação apresentada a seguir. Para o primeiro caso, tem-se:

C C2 4 0* *= = φ( ) sen senh* *L C k L C k L= = +0 1 1 3 3

ϕ( ) cos cosh* *L c kk

C k L c kk

C k L= = −−

++0 1

2

11 1

32

33 3

Figura 14 - Viga uma vez hiperestática

Colocando-se na forma matricial:

sen senh

cos cosh

*

*

k L k Lc k

kk L c k

kk L

CC

1 3

12

11

32

33

1

3

00−

− +⎡

⎢⎢

⎥⎥⎧⎨⎩

⎫⎬⎭=⎧⎨⎩

⎫⎬⎭

Anulando-se o determinante resulta que:

c kk

k L k L c kk

k L k L++

−=3

2

31 3

12

11 3 0sen cosh cos senh

ou:

c kk

k Lk L

c kk

k Lk L

−+

+=1

2

1

1

1

32

3

3

3

0cossen

coshsenh

(31)

e, para o segundo caso, tem-se a matriz:

sen sen

cos cos

*

*

k L k Lc k

kk L c k

kk L

CC

1 3

12

11

32

33

1

3

00−

−−

−⎡

⎢⎢

⎥⎥⎧⎨⎩

⎫⎬⎭=⎧⎨⎩

⎫⎬⎭

cuja equação característica é dada por:

−−

+−

=c k

kk L k L c k

kk L k L3

2

31 3

12

11 3 0sen cos cos sen

Jaime Florencio Martins & José Elias Laier

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

48

ou: c k

kk Lk L

c kk

k Lk L

−−

−=1

2

1

1

1

32

3

3

3

0cossen

cossen

(32)

Uma vez que se tem apenas uma expressão para cada caso, não há como existir o segundo espectro de freqüências nas vigas apoiadas-engastadas dentro da visão de haver repetição de um mesmo modo para a componente flexional.

5 CONCLUSÕES

Nas vigas bi-apoiadas e nos modos similares de vigas contínuas, a teoria de viga de Timoshenko fornece dois valores diferentes de freqüência natural para um mesmo modo flexional de vibração transversal. A freqüência natural menor é conhecida como primeiro espectro de freqüências e, a maior freqüência, segundo espectro de freqüências. No trabalho original apresentado por Timoshenko, em 1921, o autor não faz nenhuma referência ao segundo espectro de freqüências. O segundo espectro ocorre somente nas vigas bi-apoiadas porque, para altas freqüências, existem duas soluções acopladas para as freqüências. Uma dessas soluções apresenta o mesmo modo flexional de vibração de uma outra freqüência mais baixa. O modo flexional de vibrar do segundo espectro tem a mesma forma do primeiro, entretanto, a inclinação da tangente à linha elástica (modo rotacional) são diferentes, sendo que a do segundo espectro é muito maior do que a que corresponde ao primeiro.

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABBAS, B. A. H.; THOMAS, J. (1977). The second frequency spectrum of Timoshenko beams. Journal of Sound and Vibration, n. 51, p.123-137 BHASHYAM, G. R.; PRATHAP, G. (1981). The second frequency spectrum of Timoshenko beams. Journal of Sound and Vibration n. 76, p. 407-420 CHEN, Y-H. (1987). General dynamic-stiffness matrix of a Timoshenko beam for transverse vibrations. Earthquake Engineering and Structural Dynamics, n. 15, p. 391-402 LEVINSON, M.; COOKE, D. W. (1982). On the two frequency spectra of Timoshenko beams. Journal of Sound and Vibration, n. 84, p. 319-326 MARTINS, J. F. (1987). Operadores de diferenças finitas de ordem elevada para malhas irregulares: aplicações na elasticidade plana. São Carlos. Dissertação (Mestrado) – Escola de Engenharia de São Carlos – Universidade de São Paulo. MARTINS, J. F. (1998). Influência da inércia de rotação e da força cortante nas frequências naturais e na resposta dinâmica de estruturas de barras. São Carlos. Tese (Doutorado) – Escola de Engenharia de São Carlos – Universidade de São Paulo. OLIVETO, G. (1992). Dynamic stiffness and flexibility functions for axially strained Timoshenko beams. Journal of Sound and Vibration, n. 154, p. 1-23

O segundo espectro de freqüências da teoria de viga de Timoshenko

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 33-49, 2005

49

PRATHAP, G. (1983). The two frequency spectra of Timoshenko beams - a re-assessment. Journal of Sound and Vibration, n. 90, p. 443-446. TIMOSHENKO, S. P. (1921). On the correction for shear of the differential equation for transverse vibrations of prismatic bars. Philosophical Magazine, n. 41, p.744-746 WARBURTON, G. B. (1976). The Dynamical Behavior of Structures. Oxford: Pergamon Press.

50

ISSN 1809-5860

Cadernos de Engenharia de Estruturas São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

COMPORTAMENTO ESTRUTURAL E DIMENSIONAMENTO DE ELEMENTOS MISTOS

AÇO-CONCRETO

Gerson Moacyr Sisniegas Alva1 & Maximiliano Malite2

Resumo

Os elementos mistos aço-concreto são constituídos pela combinação de perfis de aço e concreto, visando aproveitar as vantagens de cada material, tanto em termos estruturais como construtivos. Embora o sistema misto aço-concreto seja consagrado em diversos países há algumas décadas, existe uma carência de maiores estudos sobre a viabilidade do emprego desse sistema no Brasil. Este trabalho apresenta uma abordagem abrangente das estruturas mistas aço-concreto, com ênfase em edifícios, e dos principais elementos que compõem esse sistema: as vigas mistas, simplesmente apoiadas e contínuas, as lajes mistas e os pilares mistos. São abordados o comportamento estrutural e os procedimentos de dimensionamento recomendados pelas principais normas aplicáveis, em especial o EUROCODE 4 e o AISC. Palavras-chave: estruturas mistas aço-concreto; conectores de cisalhamento; vigas mistas; lajes mistas; pilares mistos.

1 INTRODUÇÃO

A história da construção mista está intimamente ligada ao desenvolvimento do concreto armado e das estruturas em aço. Nas construções mistas, o concreto foi primeiramente usado, no início do século, como material de revestimento, protegendo os perfis de aço contra o fogo e a corrosão. Embora o concreto tivesse uma participação em termos estruturais, sua contribuição na resistência era ignorada nos cálculos. Lajes maciças com vigas de aço revestidas foram bastante usadas nas décadas de 40 e 50, com alguma interação permitida para esta condição. O desenvolvimento dos conectores de cisalhamento contribuiu significativamente para acelerar os avanços associados às vigas mistas. Hoje, vigas e treliças mistas com conectores de cisalhamento e lajes com fôrma de aço incorporada são intensamente usadas em edifícios de múltiplos pavimentos. Avanços posteriores do concreto armado destinados aos edifícios altos determinaram o cenário da combinação do sistema aço-concreto. Neste processo, o uso do concreto desempenhando o papel de paredes resistentes à força cortante (“shear walls”) ou o de pilares mistos tubulares foram reconhecidos como sendo elementos estruturais eficientes para resistir às forças devidas ao vento, aumentando a rigidez lateral da estrutura, quando comparados à estrutura de aço correspondente. O uso desses elementos em estruturas usuais do tipo pórtico em 1Doutor em Engenharia de Estruturas - EESC-USP 2Professor do Departamento de Engenharia de Estruturas da EESC-USP, [email protected]

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

52

aço ofereceu vantagens em termos de economia e de rapidez de execução. O objetivo desta combinação foi conciliar a rigidez do concreto na resistência aos carregamentos laterais com o menor peso do material aço e sua capacidade de vencer vãos maiores em estruturas do tipo pórtico. No Brasil, as primeiras construções mistas restringiram-se a alguns edifícios e pequenas pontes construídas entre os anos de 1950 e 1960. MALITE (1990) ressalva que, com o aumento da produção de aço estrutural no Brasil e com a busca de novas soluções arquitetônicas e estruturais, foram construídos vários edifícios no sistema misto nos últimos anos. As estruturas mistas foram normatizadas pela primeira vez em 1986 pela NBR-8800: “Projeto e Execução de Estruturas de Aço de Edifícios”, a qual aborda o dimensionamento e execução somente dos elementos mistos submetidos à flexão (vigas mistas). Comparando-se com as condições correntes do concreto armado, a construção em sistema misto aço-concreto é competitiva para estruturas de vãos médios a elevados, caracterizando-se pela rapidez de execução e pela significativa redução do peso total da estrutura, propiciando assim fundações mais econômicas.

A proteção contra o fogo é um fator que, por afetar o custo final da estrutura, influencia a escolha entre as estruturas de concreto, mistas e de aço. O preenchimento ou o revestimento de perfis de aço com concreto, constituindo elementos mistos, podem ser soluções econômicas quando é necessária a proteção contra o fogo e contra a corrosão.

2 CONECTORES DE CISALHAMENTO

Realizam a ligação entre o elemento de aço e a laje de concreto. Cumprem a função de absorver os esforços de cisalhamento nas duas direções e de impedir o afastamento vertical entre a laje e viga de aço.

Os conectores classificam-se em flexíveis e rígidos. O conceito de rigidez, neste caso, está relacionado com a capacidade de restrição ao escorregamento imposta pela ligação viga de aço/laje de concreto. Os conectores do tipo pino com cabeça são os mais utilizados dentre os flexíveis, na maioria dos países, devido à facilidade de fabricação utilizando o processo de soldagem semi-automático. Além disso, apresentam a mesma resistência em todas direções. A figura 1 ilustra alguns dos tipos de conectores mais utilizados.

a) Pino com cabeça (STUD)

b) Perfil "U" laminado

d) Espiral

c) Barra com alça

e) Pino com gancho

Figura 1- Tipos usuais de conectores

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

53

CONECTOR FLEXÍVEL

CONECTOR RÍGIDO

FORÇA

ESCORREGAMENTO

FuFu = força última

Figura 2 - Curva Força x Escorregamento para conectores de cisalhamento

A característica estrutural mais importante dos conectores de cisalhamento é a relação existente entre a força F transmitida pelo conector e o escorregamento relativo s na interface aço-concreto, determinando seu comportamento “dúctil”. O diagrama típico de F x s é ilustrado na figura 2.

A flexibilidade dos conectores, portanto, garante que o colapso de uma viga mista, quando se dá a ruptura da ligação aço-concreto, seja do tipo “dúctil”. Capacidade dos conectores

Com base em resultados experimentais, as normas apresentam expressões ou tabelas para a determinação da capacidade dos principais tipos de conectores de cisalhamento. A tabela 1 contém as expressões dadas por algumas das principais normas para a obtenção da capacidade nominal dos conectores embutidos em lajes maciças. Tabela 1 - Capacidade de conectores segundo as principais normas

CAPACIDADE NOMINAL NORMA Conector tipo pino com cabeça

NBR 8800 (1986) AISC-LRFD (1994) CAN/CSA-S16.1 (1994)

usccckscn fAEfA,q ≤= 50

ck,

cc fE 5142γ= , com fck ≤ 28 MPa EUROCODE 4 (1992) Menor valor entre ⎟⎟

⎞⎜⎜⎝

⎛=

480

2df,q unπ e cckn Efd,q 2290 α=

com α = ⎟⎠⎞

⎜⎝⎛ +120

dh, cs para 43 ≤≤

dhcs e α = 1,0 para 4>

dhcs

Conector tipo perfil “U” laminado NBR 8800 (1986) AISC-LRFD (1994) CAN/CSA-S16.1 (1994)

( ) ckcwfn fLt,t,q 5003650 += 20 ≤ fck ≤ 28 MPa e γc ≥ 23 kN/m3

onde qn é a capacidade nominal do conector; Asc é a área da seção transversal do conector; γc é o peso específico do concreto (kN/m3); fu é a resistência à ruptura do aço do conector; d é o diâmetro do corpo do conector;

hcs é a altura total do pino; tf é a espessura média da mesa do conector mm; tw é a espessura da alma do conector em mm; Lc é o comprimento do perfil “U” laminado em mm.

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

54

Recomendações e restrições segundo as normas

As normas apresentam recomendações e restrições quanto à locação e espaçamento dos conectores. De maneira geral, pode-se dizer que são recomendações similares entre si. A figura 3 ilustra as restrições das normas quanto à locação e espaçamento entre conectores do tipo pino com cabeça.

a) Espaçamento longitudinal máximo e mínimo entre conectores

6d (NBR 8800, AISC-LRFD)5d (EUROCODE 4)emín

b) Espaçamento transversal, recobrimento e diâmetro máximo dos conectores

máxe6tc ou 800 (EUROCODE 4)8tc (NBR 8800, AISC-LRFD)1000 (CAN/CSA-S16.1) 4d p/ as demais

2,5d p/ lajes maciças4d (NBR 8800, AISC-LRFD)

tftc

25

2,5d tf

(EUROCODE 4)

emín emáx

Figura 3 - Restrições relativas à locação e espaçamento de conectores segundo as normas

3 VIGAS MISTAS

3.1 Generalidades

As vigas mistas aço-concreto são constituídas pela associação das vigas de aço com a laje de concreto, e surgem como decorrência natural nos pisos de edifícios e tabuleiros de pontes, havendo um somatório de vantagens estruturais nas regiões de momento positivo, em comparação com as vigas de aço isoladas, uma vez que a flambagem local da mesa e da alma (FLM e FLA), assim como a flambagem lateral com torção (FLT), são impedidas ou amenizadas. Outra vantagem da utilização de vigas mistas em sistemas de pisos é o acréscimo de resistência e de rigidez propiciados pela associação dos elementos de aço e de concreto, o que possibilita a redução da altura dos elementos estruturais, implicando em economia de material. A principal desvantagem reside na necessidade de provisão dos conectores de cisalhamento na interface aço-concreto.

Em edifícios, o perfil mais utilizado como viga de aço é do tipo “I”. As lajes de concreto podem ser moldadas in loco, com face inferior plana ou com fôrma de aço incorporada, ou ainda, podem ser formadas de elementos pré-fabricados. Alguns dos tipos mais usuais de seções de vigas mistas são indicados na figura 4.

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

55

a) Laje com face inferior plana b) Laje com fôrma de aço incorporada

d) Viga de aço parcialmente embutida no concreto

c) Viga de aço totalmente embutida no concreto

Figura 4 - Alguns tipos mais usuais de vigas mistas. MALITE (1990)

As vigas mistas podem ser simplesmente apoiadas, o que é mais usual, ou podem ser

contínuas. As simplesmente apoiadas apresentam maior eficiência do sistema misto, pois a viga de aço trabalha predominantemente à tração e a laje de concreto à compressão. As vigas contínuas, devido à presença de momentos fletores negativos, apresentam um comportamento estrutural diferente das simplesmente apoiadas. Embora os momentos fletores negativos reduzam a eficiência do sistema misto, deve-se notar que a continuidade das vigas traz vantagens sob o ponto de vista de redução de esforços e deslocamentos e da estabilidade global da estrutura.

Com relação ao método construtivo, pode-se optar pelo não escoramento da laje devido à necessidade de velocidade de construção. Por outro lado, o escoramento da laje pode ser apropriado caso seja necessário limitar os esforços e deslocamentos verticais da viga de aço na fase construtiva.

3.2 Comportamento estrutural

O dimensionamento de vigas mistas submetidas à flexão depende da caracterização do comportamento ao nível da ligação aço-concreto. Duas situações são conhecidas nesse caso: a interação completa e a interação parcial.

Na interação completa, considera-se que existe uma “ligação perfeita” entre o aço e concreto. Neste caso, não há escorregamento longitudinal relativo, verificando-se a existência de uma única linha neutra, conforme a figura 5.

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

56

a meio vãodeformações

ligaçãocorte na

deformada

q = 0

concreto

aço

interação nula

P

interação parcial

_+

interação total

P P

_+

Figura 5 - Interação aço-concreto no comportamento de vigas mistas

Quando ocorre escorregamento relativo ao nível da ligação aço-concreto, há uma descontinuidade no diagrama de deformações, caracterizando a interação parcial. Em conseqüência disso, a seção transversal da viga apresenta duas linhas neutras. O efeito do escorregamento afeta a distribuição de tensões na seção, a distribuição do fluxo de cisalhamento longitudinal na conexão e, consequentemente, a deformabilidade das vigas. Esta última é relevante em verificações no regime de utilização da estrutura.

A ligação entre o aço e o concreto é dimensionada em função do diagrama de esforços cortantes longitudinais por unidade de comprimento q , conhecido como fluxo de cisalhamento longitudinal.

No caso de interação completa, a resultante do diagrama do fluxo de cisalhamento longitudinal, aqui representada por Vh, é dada em função da máxima força cortante que se pode transmitir através da ligação, sendo esta limitada pelas resultantes máximas de tração e de compressão que podem atuar na viga de aço e na laje de concreto, respectivamente. Vh assume, portanto, o menor desses valores. O número de conectores, no caso de interação completa, deve então ser determinado para a resistir à resultante Vh.

O método construtivo também influencia o dimensionamento. No caso de construção não escorada, a viga de aço isolada deve ser capaz de resistir às solicitações provenientes do peso próprio da estrutura e das sobrecargas de construção. As verificações de flechas e da estabilidade lateral podem ser determinantes, neste caso.

O comportamento estrutural de uma viga mista depende também da existência ou não de momentos fletores negativos, decorrente das condições de vinculação dessa viga.

3.2.1 Vigas submetidas apenas a momentos fletores positivos As vigas mistas simplesmente apoiadas enquadram-se como elementos estruturais submetidos exclusivamente por momentos fletores positivos. Nessas vigas, a laje de concreto encontra-se predominantemente comprimida e o perfil de aço, tracionado.

A estabilidade local da mesa superior, caso esteja comprimida, é garantida pela ligação desta com a laje de concreto, através de conectores. A estabilidade lateral também é garantida, devido a presença da laje de concreto, que é tida como de rigidez infinita no seu plano. Em geral, a flambagem local da alma não é determinante em vigas de edifícios, onde as relações hw/tw são relativamente pequenas. Além disso, devido às dimensões usuais de lajes em edifícios, em que a área de concreto assume valores consideráveis, a posição da linha neutra na viga de aço não possibilita grandes zonas comprimidas na alma. Nas vigas simplesmente apoiadas, os momentos fletores e as forças cortantes são estaticamente determinados, e não são influenciados pela fissuração, fluência e retração do concreto.

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

57

3.2.2 Vigas submetidas a momentos fletores negativos Nas vigas mistas contínuas, além de serem submetidas a momentos fletores positivos

nos trechos intermediários dos tramos, encontram-se submetidas a momentos fletores negativos nas regiões dos apoios. A continuidade pode traz vantagens, principalmente em relação ao ganho de rigidez global da estrutura, favorecido pelas conexões viga/coluna.

Por outro lado, a existência de regiões de momentos negativos causam uma perda na eficiência do sistema misto, pois além de diminuírem a resistência à flexão provocada pela fissuração do concreto tracionado, sujeitam a zona comprimida à flambagem local ou à instabilidade por distorção da viga de aço. Além disso, os procedimentos de cálculo são mais complexos quando comparados com o caso de vigas simplesmente apoiadas.

Existe uma diferença significativa na rigidez à flexão de uma viga mista completamente fissurada e outra sem fissuração, o que leva a incertezas quanto à distribuição de momentos fletores ao longo da viga. Os três principais fatores que influenciam a resistência ao momento fletor negativo de uma viga mista são: a) Taxa de armadura longitudinal existente na laje: A altura da zona comprimida da alma é controlada pela força resistente da armadura da laje. A flambagem local da alma e as tensões de compressão na mesa da viga de aço, por sua vez, limitam a taxa da armadura longitudinal da laje. b) Instabilidade associada à distorção da seção: Uma considerável restrição lateral e ao giro é oferecida pela laje de concreto à mesa tracionada da viga de aço. A resistência a este tipo de instabilidade depende, portanto, da altura da alma capaz de transmitir a restrição até a mesa comprimida instável. c) Flambagem local da alma e da mesa na zona comprimida: O momento resistente é reduzido quando a seção é suficientemente esbelta a fim de permitir que a flambagem local se desenvolva para níveis de carregamentos abaixo dos que provocariam flambagem por distorção.

3.3 Largura efetiva

O conceito de largura efetiva permite levar em consideração o efeito “shear lag” relacionado com a distribuição de tensões axiais na largura da laje. A teoria elementar da flexão em vigas supõe que as tensões axiais não variam ao longo da mesa de uma viga. Entretanto, sabe-se que, quando a largura é muito grande, a partir de uma certa distância do eixo da alma da viga, trechos da mesa não trabalham inteiramente ao momento fletor, conforme ilustra a figura 6. Portanto, a viga é menos rígida que o indicado pela teoria elementar da flexão. No entanto, é usual substituir a largura real das mesas por uma largura reduzida, de modo que a referida teoria elementar da flexão, aplicada nesta viga de seção transversal transformada, forneça o valor correto da máxima tensão de flexão. Esta largura reduzida da mesa é denominada largura efetiva. O cálculo exato da largura efetiva no regime elástico depende de uma série de fatores, tais como das condições de apoio, da distribuição de momentos, da proporção existente entre a espessura da laje e a altura da viga, e da armadura longitudinal colocada na laje de concreto.

O cálculo da largura efetiva, o qual encontra base na teoria da elasticidade, torna-se muito trabalhoso, visto que é necessário avaliar não somente os fatores citados, como também resolver as equações que regem o fenômeno, o que inviabiliza seu cálculo em nível de projeto. Por esse motivo, o efeito “shear lag” é levado em consideração pelas normas através de recomendações práticas para a determinação do valor da largura efetiva.

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

58

B

b

σmáx

σ

Figura 6 - distribuição das tensões longitudinais na laje considerando o efeito “shear

lag”

A tabela 2 contém as expressões apresentadas pelas normas para a determinação da largura efetiva. Essa tabela é valida tanto para as vigas mistas simplesmente apoiadas quanto para as contínuas, com exceção do EUROCODE 4, que apresenta expressões diferenciadas para a obtenção da largura efetiva em vigas mistas contínuas, indicadas na tabela 3.

Na tabela 3, Lo corresponde à distância entre seções de momento nulo. Os valores de Lo podem ser obtidos a partir da figura 8, onde os valores anotados na parte superior da viga aplicam-se aos apoios e os anotados na parte inferior, aplicam-se à metade do vão. Tabela 2 - largura efetiva segundo as normas

LARGURA EFETIVA NORMA Quando a laje se estende para ambos os lados da viga

NBR 8800 (1986) Menor valor entre: L,250 ; 216 fc bt + ; ( )LjLif ee,b ++ 502

AISC-LRFD (1994) CAN/CSA-S16.1 (1994) EUROCODE 4 (1992)*

Menor valor entre: L,250 ; ( )vjvi ee, +50

Quando a laje se estende apenas para um dos lados da viga NBR 8800 (1986) Menor valor entre:

121 /Lbf + ; cf tb 61 + ; Lif e,b 501 + AISC-LRFD (1994) Menor valor entre:

850 1 /Lb, f + ; vif e,b, 5050 1 + CAN/CSA-S16.1 (1994) Menor valor entre:

101 /Lbf + ; Lif e,b 501 + EUROCODE 4 (1992)* Menor valor entre:

8/L ; vie,50 * Apenas para vigas simplesmente apoiadas

Tabela 3 - largura efetiva de vigas mistas contínuas – Eurocode 4

LARGURA EFETIVA • Quando a laje se estende para ambos os lados da viga Menor valor entre: oL,250 e ( )vjvi ee, +50

• Quando a laje se estende apenas para um dos lados da viga Menor valor entre: 8/Lo e vie,50

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

59

bf2

vje

ct

Lje

e vi

Lie

bf1

Figura 7 - Dimensões utilizadas pelas normas para obtenção da largura efetiva

0,25(L

1L

L0

L0

10,8L

L

-0,3L

L2

0,7L2

1+L2)

0,8L3

+L0,25(L2 3)

3 4L

+0,5L

0,7L4 3

1,5L L4 4 3

Figura 8 - Valores de Lo para vigas contínuas segundo o EUROCODE 4

3.4 Efeito da fluência e da retração do concreto

A fluência é usualmente associada com a redução do módulo de elasticidade do concreto em função do tempo. Como conseqüência, ocorre o aumento progressivo do coeficiente de homogeneização, ou seja, a relação entre o módulo de elasticidade do aço e do concreto. Com relação à retração, a deformação resultante da redução do volume de concreto provoca deformações adicionais no elemento misto. Assim, os efeitos da retração e fluência podem conduzir a deformações por carregamentos de longa-duração significativamente maiores que a sua deformação instantânea. O EUROCODE 4 e a norma britânica BS 5950 recomendam a verificação dos efeitos de retração quando a relação vão/altura da viga mista for superior a 20 e quando a deformação por retração livre assumir valores maiores que 400x10-6.

A norma canadense CAN/CSA–S16.1 (1994) considera o efeito da fluência através de uma redução do momento de inércia efetivo da viga mista. Esta norma também apresenta uma expressão para a consideração dos efeitos da retração no deslocamento vertical de vigas mistas simplesmente apoiadas, através da adoção de um valor para a deformação por retração livre.

3.5 Dimensionamento segundo as principais normas

O dimensionamento de uma viga mista depende de uma série de parâmetros, dentre os quais alguns são estabelecidos segundo a necessidade e a conveniência do projeto. Entre os parâmetros que devem ser estabelecidos, além das dimensões dos elementos que compõe a seção transversal, estão o tipo de interação aço-concreto e o método construtivo a ser empregado.

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

60

Neste item serão descritos os procedimentos de cálculo de algumas das principais normas que abordam o dimensionamento de vigas mistas

3.5.1 Região de momentos positivos Momento fletor resistente

A determinação do momento fletor resistente depende da classe à qual pertence a seção. A classe, neste caso, é referente à relação largura/espessura da alma. Para seções pertencentes às classes 1 e 2, as normas permitem que se calcule o momento resistente da viga mista admitindo-se a plastificação total da seção. Para seções pertencentes às classes 3 e 4, que correspondem a seções mais esbeltas que as seções da classe 1 e 2, o momento resistente deve ser calculado por meio de uma distribuição elástica de tensões, utilizando-se as propriedades da seção mista homogeneizada. Como exceção, vale salientar que a NBR 8800 não aceita a utilização de seções da classe 4, cuja alma pode sofrer flambagem local no regime elástico. As figuras 9 e 10 ilustram o diagrama típico de tensões na seção transversal adotado pelas normas para o cálculo do momento fletor resistente, tanto no caso de interação completa quanto no caso de interação parcial, admitindo-se a plastificação total (seções da classe 1 e 2).

Por equilíbrio de forças, utilizando o diagrama de tensões, obtém-se as expressões para a determinação do momento fletor resistente de cálculo, devendo-se aplicar os coeficientes de minoração de resistência dos materiais aço, concreto e conector de cisalhamento. Em seções onde o momento resistente é calculado admitindo-se a distribuição elástica de tensões, o momento solicitante de cálculo não deve produzir tensões na fibra superior da laje de concreto e na fibra inferior da viga de aço superiores às tensões máximas permitidas nos respectivos materiais, segundo os coeficientes de minoração da resistência adotados por cada norma.

CGd

tf

TransversalSeção

a)

bf

tw

Ra

b

hF

tc

L.N.P naL.N.P namesa superiorlaje

L.N.P na

b) c)

fy fy

alma

d)

fy

0,85fck0,85fck

LNP

LNP

fy

0,85fck

LNP

fy

Rc

Rf

Rc

+++

-- -

--

M

Figura 9 - Distribuição de tensões em vigas mistas sob momento positivo – Interação completa

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

61

L.N.P.

bf

b

tf

hF

d

tc

a)Seção

Transversal

tw

CG

alma

c)L.N.P. na

0,85fck

fyfy

b)L.N.P. na

mesa superior

0

0,85fck

L.N.P.

L.N.P.

fy

L.N.P.

0

fy

++

--

--

M

Figura 10 - Distribuição de tensões em vigas mistas sob momento positivo – Interação parcial No caso de interação parcial, para levar em consideração o efeito de escorregamento, as normas brasileira, americana e a canadense recomendam a substituição do módulo de resistência elástico da seção homogeneizada por um módulo de resistência elástico reduzido (ou efetivo), que depende do grau de conexão. Com relação à fase construtiva, no caso de construção não escorada, além das verificações de resistência como viga mista, deve-se fazer verificações adicionais da viga de aço isolada. Deslocamentos Os deslocamentos verticais são calculados pelo processo elástico, devendo-se incluir, ao determinar as propriedades da seção homogeneizada, o efeito da fluência do concreto, reduzindo-se o módulo de elasticidade do concreto. No caso de interação parcial, o efeito de escorregamento provoca um acréscimo nos deslocamentos verticais. Esse acréscimo, em geral, é considerado pelas normas. As normas brasileira, americana e canadense recomendam, na determinação dos deslocamentos verticais, a substituição do momento de inércia da seção homogeneizada por um momento de inércia reduzido, que é função do grau de conexão.

Com respeito à fase construtiva, no caso de construção não escorada, os deslocamentos devem ser obtidos considerando-se a superposição de dois casos: o carregamento atuante na viga de aço antes da cura do concreto e o carregamento atuante após a cura do concreto, considerando-se agora a seção mista.

3.5.2 Região de momentos negativos Conforme já mencionado, o dimensionamento de vigas mistas submetidas a momentos fletores negativos torna-se mais complexo que o de vigas submetidas apenas à momentos positivos, devido aos efeitos de fissuração do concreto e das instabilidades associadas ao perfil de aço, verificados na região dos apoios. As normas diferem quanto aos procedimentos de cálculo sobre as vigas mistas contínuas, verificando-se que existe carência de uma abordagem mais completa sobre o assunto. A norma brasileira, por exemplo, especifica que a resistência de vigas mistas sob momentos negativos seja admitida igual a da viga de aço isolada, não permitindo que se considere a contribuição da armadura longitudinal contida na largura efetiva da laje. Obviamente, isso acarreta em um dimensionamento bastante conservador. Semelhante à norma americana e à canadense, a NBR 8800 não aborda outros aspectos relevantes no

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

62

dimensionamento de vigas mistas contínuas. Como exceção cita-se o EUROCODE 4, que fornece um tratamento mais completo ao dimensionamento de vigas mistas contínuas. EUROCODE 4 (1992): Parte 1-1

Esta norma aborda os principais aspectos do comportamento estrutural das vigas mistas submetidas a momentos negativos, tais como a instabilidade da mesa inferior (efeito distorcional), o efeito da cortante no momento resistente da seção mista e a redistribuição de momentos fletores devido à fissuração do concreto. Obtenção de esforços em vigas mistas contínuas A perda de rigidez à flexão, causada pela fissuração do concreto em regiões de momento negativo, influencia a distribuição de momentos ao longo de vigas mistas contínuas. Os momentos fletores podem ser obtidos utilizando-se dois métodos de análise: rigido-plástica e elástica. No método baseado em cálculo elástico, os esforços solicitantes na viga mista podem ser obtidos por uma das seguintes opções (ver figura 11): a) Determina-se os momentos fletores iniciais considerando a rigidez à flexão da viga igual ao

valor da rigidez referente à seção “não fissurada” (EI1). Em seguida, aplica-se a redistribução de momentos, por meio de uma redução nos máximos momentos negativos dos apoios em valores que não excedam as porcentagens indicadas na tabela 4.

b) Determina-se os momentos fletores iniciais considerando a rigidez à flexão da viga igual ao valor da rigidez referente à seção “fissurada” (EI2). Da mesma forma indicada no item a), aplica-se a redistribuição de momentos segundo a tabela 4.

a) Seção "não-fissurada" b) Seção "fissurada"

EI1 EI1 EI2 EI1

Rigidez à flexão Rigidez à flexão

Figura 11 - Rigidez à flexão ao longo de uma viga mista contínua utilizada na obtenção de

momentos fletores considerando-se a análise elástica. Vale lembrar que a redistribuição de momentos exige a respectiva alteração nos momentos fletores positivos, a fim de manter o equilíbrio estático. Tabela 4 - Limites máximos da redistribuição de momentos fletores negativos em % e em relação ao momento fletor inicial a ser reduzido. Classe da seção na região de momentos negativos

1 2 3 4

Análise elástica – Seção “não-fissurada” 40 30 20 10 Análise elástica – Seção “fissurada” 25 15 10 0

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

63

Cálculo do Momento Resistente:

No cálculo do momento resistente, considera-se apenas a contribuição da viga de aço e da armadura longitudinal da laje contida na largura efetiva, desprezando-se o concreto submetido tanto à tração quanto à compressão.

O momento fletor resistente de cálculo, admitindo a plastificação total, é obtido por equilíbrio utilizando o diagrama de tensões indicado na figura 12, válida somente para seções pertencentes às classes 1 ou 2. Para as classes 3 e 4, admite-se somente a distribuição elástica de tensões.

A classe da seção transversal exerce grande influência na resistência à flexão da viga. A classe da seção, que geralmente é determinada pela alma, depende não somente da relação largura/espessura como também da distribuição de tensões ao longo da alma, conforme ilustra a figura 13.

O valor de α indica a relação entre a altura da zona comprimida e a altura da alma. Com a presença da armadura, o valor de α assume valores maiores que 0,5. Valores crescentes de α conduzem a seções de classes mais críticas.

Deve-se lembrar que, em seções de classes mais críticas, permite-se menor redistribuição de momentos, resultando em momentos negativos solicitantes maiores.

CGd

tf

Transversal

a)Seção

bf

wt

sh

b

--

L.N.P namesa superior

L.N.P na

b)

fy/γa0 0

alma

c)

fy/γa

Rs

fy/γa

fsy/γs

fy/γa +

fsy/γs

pl,RdM

Figura 12 - Distribuição plástica de tensões em vigas mistas sob momento negativo

-

Tensões na almaSeção Transversal

+

hw

αhw

hwh

M

Figura 13 - Distribuição plástica de tensões na alma – determinação da classe da seção

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

64

Interação Momento – Cortante Normalmente, despreza-se a contribuição da laje de concreto na resistência à força cortante. Assume-se então que todo o esforço cortante é resistido pela alma da viga de aço. Quando a força cortante solicitante de cálculo VSd é maior que 50% da força cortante resistente de cálculo da viga de aço Vpl,Rd, admitindo plastificação total da alma, deve-se obedecer o seguinte critério de interação entre momento e cortante:

( )⎥⎥

⎢⎢

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛−−−+≤

2

121Rd,pl

SdRd,fRd,plRd,fSd V

VMMMM (1)

onde MSd é o momento solicitante de cálculo; Mpl,Rd é o momento resistente (plastificação) da viga mista; Mf,Rd é o momento resistente da viga mista, considerando-se apenas a contribuição das mesas. Instabilidade por distorção da seção A mesa superior da viga de aço pode ser sempre considerada estável lateralmente, pois está vinculada à laje de concreto por meio dos conectores. Para a mesa inferior comprimida, entretanto, deve-se verificar a estabilidade.

Nas regiões de momentos negativos pode ocorrer a instabilidade associada à distorção da seção, pois a laje de concreto não consegue evitar os deslocamentos laterais em toda a seção de aço. Neste caso, a forma da seção transversal não é mantida, diferente do caso da instabilidade lateral com torção, onde ocorrem apenas deslocamentos verticais, horizontais e rotações. A figura 14 a) e b) ilustra esses dois tipos de instabilidade lateral.

na metade do vãonos apoios

c) a) b)

Figura 14 - a) Flambagem lateral com torção; b) Instabilidade associada à distorção da seção

transversal da viga de aço; c) Pórtico em “U” invertido

Em edifícios é comum que várias vigas de aço estejam conectadas à mesma laje de concreto. A tendência das mesas inferiores comprimidas de deslocar-se lateralmente provoca uma deformada em forma de um pórtico tipo “U” invertido entre duas vigas de aço adjacentes e a laje de concreto, conforme ilustra a figura 14 c).

O valor do momento resistente à flambagem por distorção de uma viga não contida lateralmente é calculado conforme a tabela 5.

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

65

Tabela 5 - Determinação do momento resistente à flambagem por distorção Classe Momento resistente à flambagem

por distorção 1 e 2

Rd,plRd

aRd,plLTRd,b MMM ≤⎟⎟

⎞⎜⎜⎝

⎛=

γγχ

3 Rd,el

Rd

aRd,elLTRd,b MMM ≤⎟⎟

⎞⎜⎜⎝

⎛=

γγχ

4 Rd,elRd,elLTRd,b MMM ≤= χ

γRd = 1,0; γa = 1,1

011

21

22

,

LTLTLT

LT ≤

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛−+

=−

λϕϕ

χ

⎥⎥

⎢⎢

⎡+⎟

⎜⎜

⎛−+=

−− 2

20150 LTLTLTLT ,, λλαϕ

αLT = 0,21 para perfis laminados αLT = 0,49 para perfis soldados.

O valor de LT−λ é dado por:

21 /

cr

plLT

MM

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛=

λ para seções das classes 1 e 2 e 21 /

cr

elLT

MM

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛=

λ para seções das classes 3 e 4.

onde Mpl,Rd é o momento resistente de cálculo da viga mista, admitido a plastificação total; Mel,Rd é o momento resistente de cálculo da viga mista, com distribuição elástica de tensões; Mpl é o valor do momento resistente da seção mista Mpl,Rd quando γa , γc , γs são iguais a 1,0; Mel é o valor do momento resistente Mel,Rd quando γa , γc , γs são iguais a 1,0; Mcr é o momento crítico elástico de flambagem por distorção.

O anexo B do EUROCODE 4 apresenta um método simplificado para o cálculo de LT−λ

e do momento crítico Mcr, com base no modelo de pórtico contínuo em “U”. No caso de vigas de aço com perfil tipo I duplamente simétricas, pertencentes à classe 1 ou 2, tem-se:

25032

44105

,

f

f

w

ay

ff

awLT

bt

th

ECf

tbht,

⎥⎥⎦

⎢⎢⎣

⎡⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛+=

λ (2)

onde ha é a altura da viga de aço em relação a sua linha de esqueleto; C4 é um coeficiente que depende da distribuição dos momentos fletores ao longo do vão. O anexo B desta norma apresenta tabelas que fornecem os valores deste coeficiente para várias configurações de diagramas de momentos.

Quando LT

λ ≤ 0,4 não é necessária a verificação da flambagem por distorção. Verificação de deslocamentos Os deslocamentos verticais de uma viga mista contínua são influenciados pela fissuração do concreto e pelo escoamento do aço da armadura nas regiões de momentos fletores negativos. Para levar em conta o efeito da fissuração, esta norma apresenta dois métodos de análise. Um dos métodos é aplicável a vigas das classes 1, 2 ou 3: calcula-se o momento de inércia I1 da seção mista “não fissurada” e o momento de inércia I2 da seção “fissurada” (ou seja, ignorando o concreto). Os momentos negativos nos apoios, obtidos pelo cálculo elástico, são multiplicados pelo fator de redução f1, dado por:

350

2

11

,

IIf

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛= com 0160 1 ,f, ≤≤ (3)

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

66

Deve-se efetuar o correspondente incremento nos momentos fletores positivos dos vãos adjacentes. Este método pode ser utilizado quando a diferença entre vãos (distância entre apoios) adjacentes não for maior que 25% e os carregamentos nos tramos da viga forem iguais. Caso contrário, deve-se utilizar o limite inferior de redução, ou seja, f1 = 0,6. No caso de vigas não escoradas, multiplica-se o momento fletor no apoio, determinado conforme os dois parágrafos anteriores, por um fator de redução adicional f2: f2 = 0,5, caso a tensão de escoamento seja atingida antes do endurecimento da laje de concreto; f2 = 0,7, caso a tensão de escoamento, resultante de cargas adicionais aplicadas, seja atingida depois do endurecimento da laje de concreto. Os deslocamentos em vigas mistas contínuas são calculados em função dos momentos solicitantes já reduzidos. Fissuração do concreto: Esta norma apresenta diversos procedimentos e condições que permitem o controle da fissuração do concreto, onde devem ser estabelecidos limites apropriados da abertura de fissura no concreto, levando-se em conta a função e natureza da estrutura. Em vigas mistas submetidas a momentos negativos, nas quais não se realize nenhum controle da abertura de fissuras do concreto, a taxa de armadura longitudinal disposta na largura efetiva da laje não deve ser inferior a 0,4% da área efetiva da laje para construção escorada e 0,2% da área efetiva da laje para construção não escorada.

Quando for necessário o controle da abertura da fissura no concreto, a área mínima de armadura longitudinal As necessária na região de momentos negativos em vigas mistas é dada por:

st

ctctcs

AfKKAσ

= (4)

onde K é um coeficiente definido conforme o EUROCODE 2 (1992): “Projeto de estruturas de concreto”. Segundo o EUROCODE 4, pode-se assumir o valor 0,8; Kc é um coeficiente que leva em conta a distribuição de tensões na laje de concreto antes da fissuração. Pode-se adotar, de forma conservadora, o valor 0,9. zo é a distância entre o centro de gravidade da laje e o centro de gravidade da seção homogeneizada, desconsiderando-se a armadura; fct é a resistência do concreto à tração. Adota-se como valor mínimo 3,0 MPa; Act é a área efetiva de concreto submetida à tração; σst é a máxima tensão permitida na armadura, a qual depende do diâmetro máximo das barras, conforme a tabela 6: Tabela 6 - Máxima tensão nas barras da armadura em função do diâmetro em barras de alta aderência Diâmetro máximo das

barras (mm) 6 8 10 12 16 20 25 32

Abertura da fissura Máxima tensão na armadura σst (MPa) 0,3 mm 450 400 360 320 280 240 200 160 0,5 mm 500 500 500 450 380 340 300 260

Quando a armadura necessária para resistir ao momento fletor, calculada no estado limite último, for maior que a armadura mínima de fissuração, a tensão de tração atuante na armadura σs, obtida pelo cálculo elástico, deve ser determinada por:

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

67

s

ctctmses A

Af,α

σσ40

+= (5)

onde σse é a tensão na armadura mais próxima da face superior da laje, calculada desprezando-se o concreto tracionado; fctm é a resistência média do concreto à tração; As é a área total de armadura longitudinal contida na largura efetiva da laje;

aa IAAI

A e I são a área e o momento de inércia, respectivamente, da seção mista, desprezando-se o concreto tracionado e a área de fôrmas de aço, caso existam; Aa e Ia são a área e o momento de inércia, respectivamente, da seção da viga de aço.

A tabela 7 apresenta o espaçamento máximo entre as barras da armadura em função da tensão atuante nessas e em função da abertura de fissura no concreto.

Tabela 7 - Espaçamento máximo, em mm, entre barras de alta aderência

Tensão na armadura σs (MPa) ≤ 160 200 240 280 320 360 400 Abertura da fissura 0,3 mm 250 200 160 110 Aplicar tabela 2

Espaçamento máx. entre barras (mm)

0,5 mm 250 250 250 250 200 140 80 Quando for aplicável a tabela 7, o controle da fissuração é dado pelo espaçamento máximo entre barras; caso contrário, o controle da fissuração é feito limitando-se o diâmetro das barras, conforme a tabela 6.

4 LAJES MISTAS

4.1 Generalidades

O sistema de lajes mistas consiste na utilização de uma fôrma de aço nervurada como fôrma permanente de suporte para o concreto antes da cura e das ações de construção. Após a cura do concreto, os dois materiais, a fôrma de aço e o concreto, combinam-se estruturalmente, formando o sistema misto. A fôrma de aço substitui então a armadura positiva da laje.

A utilização do sistema de lajes mistas em edifícios no Brasil é recente e tem aumentado consideravelmente. Na Europa e nos Estados Unidos, a utilização desse sistema em edifícios e pontes é mais comum.

Os primeiros sistemas de lajes mistas surgiram no final da década de 30, apresentando-se como substitutos ao sistema tradicional de lajes de concreto armado e sendo utilizados inicialmente em edifícios altos. Na Europa, o sistema de lajes mistas apareceu no final da década de 50, utilizando-se fôrmas de aço corrugadas, apoiadas em vigas de aço. A interação entre a fôrma de aço e o concreto, nessa ocasião, realizava-se unicamente por atrito.

Atualmente, vários sistemas têm sido utilizados no processo de construção de fôrmas para suportar o concreto durante a fase de execução das lajes. Entre esses sistemas, o steel deck constitui-se como um dos mais apropriados em termos de construção de lajes. Este sistema tem se transformado em tecnologia padrão nos países industrializados. É um processo largamente empregado na Europa, nos Estados Unidos e Japão, onde o seu uso destaca-se na construção de shopping centers, hotéis, hospitais, edifícios residenciais, edifícios comerciais ou garagens.

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

68

São diversas as funções das fôrmas de aço empregadas em lajes mistas. Além de suportarem os carregamentos durante a construção e funcionarem como plataforma de trabalho, contraventam lateralmente a estrutura, desempenhando o papel de diafragma horizontal. Além disso, pelo fato de distribuírem as deformações por retração, evitam a fissuração excessiva do concreto.

Os sistemas de lajes mistas apresentam algumas vantagens. Entre elas, pode-se citar a possibilidade de dispensa do escoramento da laje e a facilidade oferecida à passagem de dutos de eletricidade, comunicações, ar condicionado e de outros sistemas. Quando apresentam mossas, propiciam uma maior resistência mecânica ao cisalhamento, entre a fôrma de aço e o concreto. Além disso, por ser mais leve que outros sistemas, pode oferecer alguma economia no custo da fundação.

4.2 Aspectos construtivos

O comportamento misto é alcançado após o endurecimento do concreto da laje, quando a fôrma de aço transmite as tensões cisalhantes horizontais na interface com o concreto. A figura 15 ilustra os procedimentos de algumas ligações típicas em lajes mistas, os quais conferem o comportamento misto à estrutura: • Ligações mecânicas fornecidas por saliências e reentrâncias (mossas) existentes na fôrma; • Ligações por atrito, em perfis de chapa modelados numa fôrma reentrante; • Ancoragem de extremidade fornecida por conectores tipo stud ou por outro tipo de ligação

local, em combinação com a) e b); • Ancoragem de extremidade obtida pela deformação das nervuras na extremidade da fôrma,

em combinação com b).

Figura 15 - Formas típicas de ligação em lajes mistas

Altura da laje e a armadura O EUROCODE 4 (1992) faz as seguintes recomendações com relação às dimensões da fôrma de aço e da laje de concreto (ver figura 16 a, b e c): a) A altura total da laje mista h deve ser maior ou igual que 80 mm. A altura de concreto hc,

medida a partir da superfície plana superior até as nervuras da fôrma deve ser maior ou igual a 40 mm.

b) Se a laje atua como parte de uma viga mista ou é utilizada como diafragma , a altura total deve ser maior ou igual a 90 mm e hc maior ou igual a 50 mm.

c) Quando for necessária a colocação de armadura dentro da altura hc do concreto, o espaçamento máximo das barras deve atender o item 5.4.3.2.1 do EUROCODE 2 (1991):

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

69

“Projeto de Estruturas de Concreto”, com base na altura total h da laje mista, exceto quando se deseja um espaçamento inferior, a fim de controlar a fissuração.

Perfil formando um ângulo agudo com a chapa base

80 mmh

bb

ph

ob

40 mmch

Perfil formando um ângulo obtuso com a chapa base

h

bb

bo

ph

40 mmhc

Figura 16 - Dimensões típicas da fôrma de aço e da laje de concreto – EUROCODE 4

4.3 Dimensionamento de lajes mistas

Dentre os principais fatores que influenciam a resistência das lajes mistas, pode-se destacar: • Resistência do concreto; • Características geométricas da fôrma de aço; • Ancoragem existente entre a fôrma de aço e o concreto.

Devem ser considerados os seguintes estados limites: Estados limites últimos: • Flexão; • Cisalhamento longitudinal; • Cisalhamento vertical; • Punção.

Estados limites de utilização: • Deslizamento relativo de extremidade; • Flecha; • Fissuração excessiva no concreto.

Serão apresentados neste trabalho os principais procedimentos de cálculo apresentados pelo EUROCODE 4 (1992) relativos aos estados limites últimos. Resistência ao momento fletor O valor do momento resistente de cálculo em qualquer seção é determinado considerando a plastificação total da seção, limitando-se a tensão de cálculo na fôrma em fyp/γap , onde fyp e γap são, respectivamente, a resistência ao escoamento e o coeficiente de resistência da fôrma de aço. No caso de momentos negativos, a contribuição da fôrma de aço somente deve ser considerada caso haja continuidade da fôrma. O efeito de flambagem local das zonas comprimidas da fôrma de aço é levado em conta utilizando-se relações “largura/espessura” que não superem o dobro dos valores limites dados na tabela 4.2 do EUROCODE 4, para almas pertencentes à classe 1.

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

70

O colapso por flexão pode ser crítico se houver interação completa ao cisalhamento longitudinal na interface entre a fôrma de aço e o concreto, ou seja, ausência de deslizamento relativo de extremidade. Resistência ao Cisalhamento Longitudinal O deslocamento horizontal relativo excessivo entre a fôrma de aço e o concreto caracteriza o colapso por cisalhamento horizontal. Quando ocorre deslocamento relativo entre os dois materiais, o colapso por flexão não pode ser alcançado. Neste caso, o colapso ocorre com interação parcial ao cisalhamento. O resistência de cálculo ao cisalhamento horizontal pode ser determinada pelo método empírico m-k ou pelo método da interação parcial. Pelo método m-k, a resistência de cálculo ao cisalhamento longitudinal Vl,Rd é obtida através da seguinte relação semi-empírica:

vs

s

pp

Rd,l

kbLmA

bdV

γ

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛+

= (6)

onde m e k são constantes empíricas (em N/mm2) obtidas do ensaios associados ao método m-k, cujos procedimentos encontram-se no item 10.3.1 do EUROCODE 4; b é a largura efetiva da laje, em mm; Ap é a área efetiva da fôrma de aço (em mm2); dp é a distância do centro de gravidade da fôrma de aço à face superior da laje (em mm); Ls é o vão de cisalhamento, em mm; γvs é o coeficiente de minoração da resistência, igual a 1,25.

O método m-k é considerado internacionalmente como método padrão na determinação da resistência ao cisalhamento longitudinal, utilizando-se uma equação semi-empírica que relaciona a resistência nominal ao esforço cortante com os parâmetros dos testes. Esses testes baseiam-se no estudo de lajes mistas simplesmente apoiadas, com cargas concentradas distantes à 1/4 do vão da laje. O vão de cisalhamento Ls , segundo o EUROCODE 4, deve ser tomado igual a L/4. A figura 17 ilustra a geometria da laje mista do teste, bem como a disposição do carregamento aplicado e as seções críticas que caracterizam os modos de colapso.

h

3

sL

31

1

L

P

2 2

sL

Eixo do C.G. da fôrma de aço

dp

b

b) Seção transversal da laje mista

a) Seções críticas da laje mista

Figura 17 - Disposição do carregamento e geometria laje mista – Método m-k

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

71

Existem três modos possíveis de colapso neste método: a) Flexão: seção 1-1; b) Cisalhamento longitudinal: seção 2-2; c) Cisalhamento transversal: seção 3-3.

O modo de colapso previsto num teste depende da relação Ls e da altura dp . Conforme o EUROCODE 4, os resultados devem ser colocados em um gráfico cujas abcissas representem os valores de Ap/bLs e cujas ordenadas representem os valores de V/bLs, onde V é a força cortante no vão de cisalhamento . As constantes m e k são determinadas através de regressão linear, utilizando o método dos mínimos quadrados. A figura 18 ilustra a definição das constantes m e k e os possíveis modos de colapso.

k

cisalhamento verticalm

cisalhamento horizontal

Flexão

1

V

pbd

pAbL s

Figura 18 - Definição das constantes m e k e os possíveis modos de colapso.

O método da interação parcial, que consiste em uma alternativa ao método m-k, somente deve ser utilizado em lajes mistas com comportamento dúctil, observado a partir da curva força x escorregamento e da curva força x deslocamento do ensaio estático. A resistência ao cisalhamento longitudinal é obtida por meio do diagrama de interação parcial indicado na figura 19. Para construir o diagrama de interação parcial, é necessário variar os valores de η=Nc/Ncf entre 0 e 1, utilizando-se as dimensões e resistências nominais do concreto e da fôrma de aço, obtidos no ensaio.

MensaioA

ensaio0ypf

η

ypf

MpRm

C

B

1,0

MpRm

M

1,0 cNη = N

fyp

0,85fcmcN

M

Lo

teste

F/2 F/2

sL

sLo L

τu

Nc

Figura 19 - Determinação do grau de interação parcial ao cisalhamento.

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

72

A partir das cargas máximas aplicadas nos ensaios, obtém-se o momento fletor Mensaio na seção transversal sob o ponto de aplicação da carga na laje, devido à ação aplicada pelo macaco, ao peso próprio da laje e ao peso das vigas que transmitem as cargas. Na sequência, o valor de η para cada ensaio é obtido facilmente através da trajetória A-B-C, conforme indica a figura 19. Uma vez conhecidos os valores de η de cada ensaio, calcula-se a resistência última de cisalhamento τu para cada protótipo ensaiado, por meio da expressão:

( )os

cfu LLb

N+

τ com c

ckccf

fbh,Nγ

850= (7)

onde Lo é o comprimento do balanço, conforme ilustra a figura 19; hc é a altura de laje de concreto acima das nervuras. A resistência nominal ao cisalhamento τu,Rk deve ser tomada como o menor valor de τu obtido nos ensaios, reduzido de 10%. A resistência de cálculo ao cisalhamento, portanto, é calculada a partir de τu,Rk, com coeficiente γv igual a 1,25:

v

Rk,uRd,u γ

ττ = (8)

Determinada a resistência de cálculo ao cisalhamento longitudinal τu,Rd, é possível construir o diagrama de interação parcial de cálculo. Neste diagrama, o valor do momento resistente de cálculo MRd de uma seção transversal, situada a uma distância Lx do apoio mais próximo, é definido em função de Lx. A força de compressão na laje Nc , em uma seção transversal qualquer, distante Lx do apoio, é calculada pela expressão:

Rd,uxc bLN τ= (9) Com a resultante de compressão na laje Nc, por equilíbrio, calcula-se o momento resistente de cálculo MRd. A figura 20 ilustra o diagrama de interação parcial de cálculo.

O comprimento Lsf , dado pela expressãoRd,u

cfsf b

NL

τ= representa o comprimento mínimo

que deve assumir Lx para que a interação ao cisalhamento seja completa.

cisalhamento longitudinal

0

paM

p,RdM

Rd

N τb Lx=c u,Rd

M

x

=LsfcfNu,Rdb τ

Lx

L

u,Rdτ

A

A

cN

Flexão

apyp/γf

0,85f /γcck

Ncf

Figura 20 - Diagrama de interação parcial de cálculo

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

73

A partir da figura 20, observa-se que duas situações são possíveis:

a) Para Lx ≥ Lsf , a interação ao cisalhamento é completa; portanto, o colapso ocorre por flexão; b) Para Lx < Lsf , a interação ao cisalhamento é parcial; portanto o colapso ocorre por

cisalhamento longitudinal.

No dimensionamento, o momento fletor de cálculo Msd , em qualquer seção transversal, não deve ser superior ao momento resistente de cálculo MRd. Resistência ao Cisalhamento Transversal

O cisalhamento transversal costuma ser mais crítico em lajes cuja relação altura/vão são pequenas. Os métodos de cálculo da resistência ao cisalhamento transversal são baseados nos procedimentos utilizados na verificação do cisalhamento em vigas T de concreto armado. A resistência ao cisalhamento vertical é fornecida, principalmente, pelas nervuras de concreto.

A resistência de cálculo ao cisalhamento transversal Vv,Rd de uma laje mista, cuja largura b é igual a distância entre centros de nervuras, determina-se por:

( )ρτ 4021 += ,kdbbV vRdp

oRd,v (10)

onde bo é a largura média das nervuras de concreto; τRd é a resistência básica ao cisalhamento, igual a 0,25fckt /γc ; fckt = fckt,0,05 , o qual corresponde a um valor característico da resistência à tração do concreto da laje, conforme o item 3.1.2 do EUROCODE 4: Parte 1-1;

ρ é um coeficiente que leva em consideração a pequena contribuição da fôrma de aço,

dado por po

p

dbA

=ρ ;

ρ Ap é a área da fôrma de aço que se encontra sob tração, dentro da largura bo; Kv é um coeficiente que leva em consideração um acréscimo na resistência devido ao confinamento do concreto, expresso por ( ) 161 ≥−= pv d,k , com dp em m. Punção

O efeito de punção geralmente é mais crítico em lajes de pequena espessura submetidas

a cargas pontuais. O colapso ocorre em um “perímetro crítico”, definido através de um ângulo de 45°, a partir da superfície de aplicação da carga até eixo de gravidade da fôrma de aço, conforme ilustra a figura 21.

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

74

hc ch

pb + f2h

dp

dp

2hap+ f

Perímetro crítico

Área carregada

pb

ch

fh

pd

a) b)

Figura 21 - Perímetro crítico para o cisalhamento por punção A resistência de cálculo à punção Vp,Rd de uma laje mista submetida a uma área carregada de dimensões ap x bp (ver figura 21), é determinada por:

( )ρτ 4021 += ,khCV vRdcpRd,p (11) onde hc, τRd, kv e ρ conforme já definido anteriormente; Cp é o perímetro crítico. Com base na figura 21, pode-se calcular o perímetro crítico através de:

( ) fpcppcp hbhadhC 822222 ++−++= π onde bp é a dimensão da base da carga concentrada perpendicular às nervuras da fôrma de aço, em mm; ap é a dimensão da base da carga concentrada paralela às nervuras da fôrma de aço, em mm; hf é a altura da camada de revestimento do piso, em mm.

5 PILARES MISTOS

5.1 Introdução

Os pilares mistos, de maneira geral, são constituídos por um ou mais perfis de aço, preenchidos ou revestidos de concreto.

Os pilares mistos revestidos inicialmente surgiram da necessidade de proteger os perfis de aço contra a ação nociva do fogo, onde o concreto se encarregaria de fornecer tal proteção.

Posteriormente, pensou-se em utilizar o concreto como material de preenchimento para perfis tubulares, surgindo assim os pilares mistos preenchidos.

A combinação dos materiais aço e concreto em pilares mistos pode propiciar algumas vantagens. Além da proteção ao fogo e do aumento da resistência do pilar, essa combinação contribui para um aumento na rigidez da estrutura aos carregamentos horizontais devido ao vento e às solicitações decorrentes de sismos. A ductilidade é outro ponto que diferencia os pilares mistos, os quais apresentam um comportamento mais “dúctil” quando comparados com os pilares de concreto armado isolados.

Existem também outras vantagens, tal como a ausência de fôrmas, no caso de pilares mistos preenchidos, possibilitando a redução de custos com materiais e mão-de-obra.

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

75

O emprego de pilares mistos tem sido uma tendência, principalmente em edifícios de andares múltiplos, em diversos países europeus, americanos e asiáticos. No Brasil, entretanto, sua utilização ainda é restrita a poucas obras.

5.2 Classificação de pilares mistos

Os pilares mistos são classificados em função da posição em que o concreto ocupa na seção mista. A figura 22 ilustra algumas seções típicas de pilares.

Os pilares mistos revestidos caracterizam-se pelo envolvimento, por completo, do elemento estrutural em aço, conforme ilustra a figura 22 a). A presença do concreto como revestimento, além de propiciar maior resistência, impede a flambagem local dos elementos da seção de aço, além de fornecer maior proteção ao fogo e à corrosão do pilar de aço. A principal desvantagem desse tipo de pilar é a necessidade de utilização de fôrmas para a concretagem, tornando sua execução mais trabalhosa, quando comparada ao pilar misto preenchido.

Os pilares mistos parcialmente revestidos caracterizam-se pelo não envolvimento completo da seção de aço pelo concreto, conforme ilustra a figura 22 b). O EUROCODE 4 é a primeira norma a abordar esse tipo de pilar.

Os pilares mistos preenchidos são elementos estruturais formados por perfis tubulares, preenchidos com concreto de qualidade estrutural, conforme a figura 22 c) e d). A principal vantagem desse tipo de pilar é que este dispensa fôrmas e armadura. Para os pilares preenchidos circulares, é possível ainda a consideração do efeito de confinamento do concreto na resistência do pilar misto.

a) b)

d)c)

Figura 22 - Exemplos de seções típicas de pilares mistos

5.3 Comportamento estrutural

Diversos parâmetros influenciam o comportamento conjunto dos componentes aço e concreto e, consequentemente, o comportamento do pilar misto. Entre esses parâmetros, estão o efeito do confinamento do concreto, o efeito da fluência e da retração, a aderência, a forma da seção transversal, a esbeltez, a razão entre as áreas do perfil de aço e a área total da seção, entre outros. No entanto, alguns desses fatores são mais significativos do que outros na avaliação da resistência final do pilar. Efeito de confinamento

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

76

O efeito do confinamento no comportamento de pilares mistos preenchidos é um assunto ainda pouco estudado, devido principalmente à dificuldade de se realizar investigações experimentais que avaliem não somente a sua ocorrência, mas também a magnitude desse efeito em pilares de diferentes seções transversais.

O efeito de confinamento ocorre quando, a partir de um certo nível de carregamento do pilar, a expansão lateral do concreto é maior que a do perfil de aço, desenvolvendo-se, assim, pressões radiais na interface aço-concreto, estando o concreto submetido a um estado triaxial de tensões. O desenvolvimento dessas pressões radiais, combinadas com a força normal de compressão atuante, reduzem a resistência ao escoamento do perfil de aço, de acordo com o critério de von Mises. Por outro lado, ocorre um acréscimo de resistência à compressão do concreto quando comparado ao concreto não confinado. O resultado final desse efeito nos dois materiais é um ganho na capacidade do pilar misto.

A magnitude do confinamento e seus efeitos benéficos são maiores em pilares curtos que em pilares esbeltos. Esses efeitos benéficos também são mais significativos em pilares que possuem menores excentricidades com relação à força normal.

Com respeito à forma da seção transversal, pode-se afirmar que o grau de confinamento em pilares mistos com perfis circulares é consideravelmente maior que em pilares mistos de seção retangular. As normas, considerando esse fato, desprezam o efeito do confinamento na capacidade de pilares mistos de seção retangular. Efeito de retração e fluência Após o endurecimento do concreto, aço e concreto passam a trabalhar de maneira conjunta, caracterizando o comportamento misto. A partir desse momento, os efeitos da fluência e da retração produzem deformações adicionais ao concreto, as quais serão transferidas gradualmente ao perfil de aço.

A fluência conduz a deformações por carregamentos constantes de longa duração. Os efeitos da retração em pilares mistos são menores quando comparados com pilares de concreto armado, pois existe a proteção do perfil de aço diante das intempéries, no caso de pilares prenchidos.

O acréscimo de deformações produzido pela fluência e pela retração do concreto pode induzir o escoamento ou a flambagem local do perfil tubular de aço em pilares preenchidos Conexão aço-concreto

A transferência de esforços na interface dos dois materiais, aço e concreto, ocorre por aderência. Essa transmissão de esforços pode ser feita simplesmente por adesão e atrito, cuja força é proporcional à área da interface aço-concreto e ao esforço normal aplicado. A transmissão de esforços pode também realizar-se por conexão mecânica, utilizando-se conectores de cisalhamento.

As normas consideram como hipótese básica para o dimensionamento de pilares mistos a perfeita ação conjunta entre os dois materiais, ou seja, a interação completa. Para a manutenção dessa hipótese, não deve haver deslizamento relativo excessivo entre os dois materiais. É por esse motivo que o EUROCODE 4, por exemplo, estabelece a tensão máxima de cisalhamento que pode ocorrer na interface aço-concreto, denominada tensão limite de aderência, sem que seja necessário o emprego de conectores de cisalhamento.

5.4 Dimensionamento segundo as principais normas

As principais normas que tratam do dimensionamento de pilares mistos abordam o assunto sob diferentes ângulos, pois os procedimentos e considerações dos estudos experimentais muitas vezes variam de um país para outro. Algumas normas consideram os pilares mistos como pilares de aço com capacidade estrutural aumentada devido à presença benéfica do concreto. É o caso da norma americana AISC-LRFD (1994), da norma canadense

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

77

CAN/CSA-S16.1 (1994) e da norma britânica BS 5400: Parte 5 (1979). Algumas normas, entretanto, consideram o pilar misto como um pilar de concreto com armadura especial, devido à presença do perfil de aço. Esta filosofia é adotada pelo ACI 318 (1992). Outras ainda consideram os pilares mistos como combinação dos dois raciocínios. É o caso do EUROCODE 4 (1992). Serão apresentados neste trabalho os principais procedimentos de cálculo do EUROCODE 4, o qual foi base para a elaboração a norma NBR 14323 (1999), que aborda o dimensionamento de pilares mistos a temperatura ambiente. Resistência à compressão axial:

Para a determinação da resistência à compressão do pilar misto, inicialmente calcula-se a resistência à compressão da seção, admitindo-se plastificação total, sem considerar os efeitos de flambagem global. Este efeito é considerado em seguida, recorrendo-se às curvas de resistência à compressão dos pilares de aço, cujos parâmetros também são modificados pela presença de dois materiais.

Normal resistente de cálculo: Rd,plRd NN χ= , onde χ é o coeficiente de redução resistência

associado à flambagem global, e que depende de −

λ ;

( ) ssccae IEIE,EIEI ++= 80 ; 351,

EE ccd = ;

e

R,pl

NN

=−

λ ; ( )

( )2

2

KLEIN e

= ;

Npl,R calculado com γa = γc = γs =1,0 a) Para pilares revestidos e pilares preenchidos retangulares:

s

sys

c

ckcyaRd,pl

fAf,AfAN

a γγγ++=

850

b) Para pilares preenchidos circulares:

s

sys

ck

y

c

ckc

a

yaRd,pl

fAff

dtfAfA

ηγγ

η+

⎥⎥⎦

⎢⎢⎣

⎡⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛⎟⎠⎞

⎜⎝⎛++= 1

2 1

⎟⎠⎞

⎜⎝⎛ −=

de101101 ηη ; ( ) ⎟

⎠⎞

⎜⎝⎛−=

de101 20202 ηηη onde e é a excentricidade da força normal

017518942

10 ≥+−=−−

λλη ,, ; 012325020 ,, ≤⎟⎠⎞

⎜⎝⎛ +=

λη

Verificação da flexão composta: O dimensionamento é baseado na curva de interação N x M, conforme a figura 23:

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

78

Mmax,Rd

2Nc

Nc

AE

Npl,Rd

N

0 Mpl,Rd

C

D

B M0

Npl,Rd

χ

χ

χ

d

n

1,0

µk dµ 1,0

Mpl,Rd

µZona destinada à

flexão

SdN

MSd

Figura 23 - Diagrama de interação momento-normal da seção mista Os pontos A, B, C, D podem ser obtidos por:

Ponto A Ponto B Ponto C Ponto D N = Npl,Rd

M = 0 N = 0

M = Mpl,Rd N = Nc

M = Mpl,Rd N = 0,5Nc

M = Mmax,Rd α = 1,0 para pilares preenchidos; α = 0,85 para os pilares revestidos

c

ckcc

fANγ

α= ;

c

ckpc

s

syps

a

ypaRd,máx

f,ZfZfZ

Mγα

γγ50

++=

Verifica-se a resistência do pilar misto submetido à flexo-compressão reta por meio da

seguinte condição: Rd,plSd M,M µ90≤

Onde

( )( )n

ndkd χχ

χχµµµ−−

−= ; Rd,pl

Sdd N

N=χ

MSd é o momento solicitante de cálculo, já incluído o efeito de segunda ordem; µk e µd são os valores das abcissas correspondentes às ordenadas χ e χd, obtidos da curva de interação, conforme a figura 23; χn é um fator igual a χ(1-r)/4, para distribuição de momentos linear ou aproximadamente linear, e igual a 0 nos demais casos; r é a razão entre o menor e o maior momento de extremidade, sendo positiva no caso de curvatura simples e negativa no caso de curvatura reversa; χ é o fator de redução da resistência associado à flambagem, equivalente ao parâmetro ρ da NBR 8800.

Para a verificação na flexão composta oblíqua, utiliza-se o mesmo procedimento aplicado na verificação da flexão composta reta.

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

79

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÕES

As estruturas mistas aço-concreto, formadas pela associação de perfis de aço com o concreto, constituem uma solução competitiva em sistemas estruturais de edifícios e pontes, sendo bastante empregadas em diversos países. O emprego do sistema misto no Brasil é relativamente recente e tem evoluído de forma modesta.

Nos sistemas horizontais, constituídos principalmente de lajes e vigas, a utilização de elementos mistos conduz a algumas vantagens, entre elas a rapidez de execução e o significativo aumento da capacidade estrutural das vigas, resultando em economia de material. Nesses sistemas, as vigas mistas e as lajes com fôrma de aço incorporada, caracterizando as lajes mistas, são bem utilizadas. Nos sistemas verticais, os pilares mistos têm tido sua utilização ampliada, principalmente em edifícios altos. Nesses elementos mistos, a combinação aço-concreto propicia maior rigidez à estrutura e maior resistência ao fogo. Os conectores de cisalhamento, responsáveis pela ligação entre o elemento de aço e o concreto, foram objeto de diversas pesquisas, principalmente no que se refere à sua capacidade e ductilidade, avaliada por meio de ensaios padronizados que estabelecem a curva força-escorregamento relativo. As normas apresentam expressões para o cálculo da capacidade de alguns tipos de conectores, as quais derivam de resultados experimentais.

Atualmente, o comportamento estrutural das vigas mistas simplesmente apoiadas é bem conhecido. Existem pesquisas recentes, entretanto, que procuram fazer uma avaliação mais precisa de parâmetros que são relevantes no comportamento de vigas mistas. Entre esses parâmetros, estão o efeito da interação parcial aço-concreto, a obtenção da largura efetiva da laje e o efeito da fluência e da retração do concreto. O dimensionamento de vigas mistas submetidas a momentos positivos é tratado por todas as normas. De maneira geral, essas normas apresentam procedimentos de cálculo e hipóteses comuns entre si.

Com relação às vigas mistas contínuas, existem fatores adicionais a serem analisados quando comparados às vigas simplesmente apoiadas, devido à fissuração do concreto e a instabilidade da viga de aço em regiões de momentos negativos. A NBR 8800 (1986) não aborda o caso de vigas mistas contínuas, devendo-se considerar apenas a viga de aço isolada no dimensionamento, o que representa um procedimento conservador. Entre as normas pesquisadas, o EUROCODE 4 (1992) é a que fornece um tratamento mais detalhado às vigas mistas contínuas.

Podem ser destacadas duas particularidades do comportamento de vigas contínuas, e que são apresentadas pela norma européia. A primeira delas é a obtenção dos esforços solicitantes a partir da redistribuição de momentos, devido à perda de rigidez à flexão nas regiões de momento negativo, onde ocorre a fissuração do concreto. A segunda diz respeito à verificação da estabilidade lateral: os procedimentos de cálculo são similares aos apresentados para as vigas de aço isoladas no EUROCODE 3 (1992).

As pesquisas relacionadas ao comportamento estrutural das lajes mistas são relativamente recentes. Dessa maneira, encontra-se um número menor de pesquisas em relação às vigas e aos pilares mistos. O EUROCODE 4 (1992) foi a norma abordada neste trabalho, pois trata de todos os estados limites últimos e de utilização relevantes no dimensionamento de lajes mistas. No Brasil, a utilização desse sistema é recente. Embora a NBR 8800 (1986) não faça referência a esses elementos, a norma NBR 14323 (1999) trata do dimensionamento de lajes com fôrma de aço incorporada em temperatura ambiente e em situação de incêndio, com base nas recomendações da norma européia.

Existem diversas pesquisas referentes ao comportamento estrutural dos pilares mistos. Tais pesquisas consistem basicamente na identificação de parâmetros que interferem na capacidade resistente e como esta interferência ocorre. Estes trabalhos, de maneira geral, buscam confrontar estudos teóricos e experimentais, questionando também a formulação adotada pelas normas que abordam o dimensionamento de pilares mistos.

Os dois principais tipos de pilares mistos oferecem vantagens: no pilar revestido, além da proteção ao fogo e do aumento da resistência do pilar, a presença do concreto como revestimento impede a flambagem local dos elementos que compõem o perfil de aço. No pilar

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

80

preenchido, a principal vantagem é a possibilidade de dispensar fôrmas e armadura, além da consideração benéfica do efeito de confinamento do concreto em pilares preenchidos circulares.

7 BIBLIOGRAFIA

ALVA, G. M. S. (2000). Sobre o projeto de edifícios em estrutura mista aço-concreto. São Carlos. 277p. Dissertação (Mestrado) - Escola de Engenharia de São Carlos. Universidade de São Paulo. AMERICAN CONCRETE INSTITUTE (1992). ACI 318R-92 – Building code requirements for reinforced concrete. Detroit. AMERICAN INSTITUTE OF STEEL CONSTRUCTION (1994). AISC-LRFD - Load and resistance fator design. Chicago. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (1999). NBR 14323 - Dimensionamento de estruturas de aço de edifícios em situação de incêndio. Rio de Janeiro. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (1986). NBR 8800 - Projeto e execução de estruturas de aço de edifícios. Rio de Janeiro. BRITISH STANDARD INSTITUTION (1979). BS 5400 – Steel, concrete and composite bridges. Parte 5: Code of practice for design of composite bridges. London. BRITISH STANDARD INSTITUTION (1986). BS 8110 – The structural use of concrete. London. BRITISH STANDARD INSTITUTION (1990). BS 5950 - Structural use of steelwork in building. Parte 3: Section 3.1: Code of practice for design of simple and continuous composite beams. London. BROSNAN, D.P.; UANG, C. (1995). Effective Width of Composite L-Beams in Buildings. Engineering Journal, v.32, n.2, p.73-80. CANADIAN STANDARDS ASSOCIATION (1994). CAN/CSA-S16.1-94 – Limit States Design of Steel Structures. Toronto, Ontario. CRISINEL, M.; O’LEARY, D. (1996). Composite floor slab design and construction. Structural Engineering International, v.6, n.1, p.41-46, Feb. DANIELS, B. J.; CRISINEL, M. (1993). Composite Slab Behavior Strength Analysis. Parte I: Calculation Procedure. Journal of Structural Engineering,, v.119, n.1, p.16-35, Jan. DANIELS, B. J.; CRISINEL, M. (1993). Composite Slab Behavior Strength Analysis. Parte II: Comparison with Test Results and Parametric Analysis. Journal of Structural Engineering,, v.119, n.1, p.36-49, Jan. DE NARDIN, S. (1999). Estudo teórico-experimental de pilares mistos compostos por tubos de aço preenchidos com concreto de alta resistência. São Carlos. 148p. Dissertação (Mestrado) - Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo.

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

81

DEKKER, N. W.; KEMP, A. R.; TRINCHERO, P. (1995). Factors Influencing the Strength of Continuous Beams in Negative Bending. Journal of Constructional Steel Research, v.34, n.2/3, p.161-65. DISSANAYAKE, U. I.; DAVISON, J. B.; BURGESS, I. W. (1998). Limit state behaviour of composite frames. Journal of Constructional Steel Research, v.46, n.1/3, paper n.71. EASTERLING, W. S.; YOUNG, C. S. (1992). Strength of composite slabs. Journal of Structural Engineering, v.118, n.9, p.2370-2389, Sep. EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION (1991). ENV 1992-1-1: Eurocode 2 - Design of concrete structures. Part 1-1: General rules and rules for buildings. Brussels. EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION (1992). ENV 1993-1-1: Eurocode 3 - Design of steel structures. Part 1-1: General rules and rules for buildings. Brussels. EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION (1992). ENV 1994-1-1: Eurocode 4 - Design of composite steel and concrete structures. Part 1-1: General rules and rules for buildings. Brussels. FIGUEIREDO, L. M. B. (1998). Projeto e construção de pilares mistos aço-concreto. São Carlos. 142p. Dissertação (Mestrado) – Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo. GILBERT, R. I.; BRADFORD, M. A. (1995). Time-dependent behaviour of continuous composite beams at service loads. Journal of Structural Engineering,, v.121, n.2, p.319-27, Feb. JASIM, N. A.; ALI, A. A. M. (1997). Deflections of composite beams with parcial shear connection. The Structural Engineer, v.75, n.4, p.58-61, Feb. JOHNSON, R. P. (1994). Composite structures of steel and concrete, v.1, 2.ed. Oxford: Blackwell Scientific Publications. KATO, B. (1996) Column curves of steel-concrete composite members. Journal of Constructional Steel Research, v.39, n.2, p.121-35, Sep. MALITE, M. (1990). Sobre o cálculo de vigas mistas aço-concreto: ênfase em edifícios. São Carlos. 144p. Dissertação (Mestrado) – Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo. MALITE, M. (1993). Análise do comportamento estrutural de vigas mistas aço-concreto constituídas por perfis de chapa dobrada. São Carlos. 2v. Tese (Doutorado) - Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo. MALITE, M.; NIMIR, W. A.; SÁLES, J. J.; GONÇALVES, R. M. (1998). Cold-Formed Shear Conectors for Composite Construction. In: INTERNATIONAL CONFERENCE ON COLD-FORMED STEEL STRUCTURES, 14., St. Louis, 1998. Anais... St Louis, UMR, p.409-21. MIRZA, S. A.; TIKKA, T. K. (1999). Flexural stiffness of composite columns subjected to major axis bending. ACI Structural Journal, v.96, n.1, p.19-28, Jan/Feb. MUÑOZ, P. R; HSU, C-T. T. (1997a). Behaviour of biaxially loaded concrete-encased composite columns. Journal of Structural Engineering, v.123, n.9, p.1163-71, Sep.

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

82

MUÑOZ, P. R; HSU, C-T. T. (1997b). Biaxially loaded concrete-encased composite columns: design equation. Journal of Structural Engineering, v.123, n.12, p.1576-85, Dec. OEHLERS, D. J.; COUGHLAN, C. G. (1986). The shear stiffness of stud shear connectors in composite beams. Journal of Constructional Steel Research, v.6, n.4, p.273-84, Oct. OEHLERS, D. J.; NGUYEN, N. T.; AHMED, M.; BRADFORD, M. A. (1997). Partial Interaction in Composite Steel and Concrete Beams with Full Shear Connection. Journal of Constructional Steel Research, v.41, n.2/3, p.235-48, Feb./Mar. OEHLERS, D. J.; SVED, G. (1995). Composite beams with limited-slip capacity shear connectors. Journal of Structural Engineering, v.121, n.6, p.932-8, June. PATRICK, M. (1990). A New Partial Shear Connection in Strength Model for Composite Slabs. Steel Constr. J. Austr. Inst. of Steel Constr., v.24, n.3, p.2-17. PATRICK, M. (1991). Slip Block Test Results for Bondek II Profiled Steel Sheeting. BHP Research, Melbourne Laboratories Rep. BHPRML/PS64/91/002, June. PATRICK, M.; BRIDGE, R. Q. (1994). Partial Shear Connection Design of Composite Slabs. Engineering Structures, v.16, n.5, p.348-62. SÁLES, J. J. (1995). Estudo do projeto e construção de edifícios de andares múltiplos com estruturas de aço. São Carlos. 257p. Tese (Doutorado) - Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo. SALMON, C. G.; JOHNSON, J. E. (1990). Steel structures: design e behavior. 3.ed. Nova Iorque: Harper & Row. SCHNEIDER, S. P. (1998). Experimental behaviour of connections to concrete-filled steel tubes. Journal of Constructional Steel Research, v.45, n.3, p.321-52, Mar. UY, B. (1998). Local and post-local buckling of concrete-filled steel welded box columns. Journal of Constructional Steel Research, v.47, n.1-2, p.47-72. UY, B.; Das S. (1997). Wet concrete loading of thin-walled steel box columns during the construction of a tall building. Journal of Constructional Steel Research, v.42, n.2, p.95-119. VALLENILLA, C. R.; BJORHOVDE, R. (1990). Behaviour of composite frames during construction. Journal of Constructional Steel Research, v.15, n.1/2, p.3-21. WANG, Y. C. (1999). Tests on slender composite columns. Journal of Constructional Steel Research, v.49, n.1, p.25-41, Jan. WIUM, J. A.; LEBET, J. P. (1994). Simplified calculation method for force transfer in composite columns. Journal of Structural Engineering, v.120, n.3, p.728-46, Mar. WILLIAMS, F. W.; JEMAH, A. K.; LAM, D. H. (1993). Distorcional buckling curves for composite beams. Journal of Structural Engineering, v.119, n.7, p.2134-49, July. WRIGHT, H. D.; VITEC, J. L.; RAKIB, S. N. (1992). Long-term creep and shrinkage in composite beams with parcial connection. Proceedings of the Institute Civil Engineers Structs & Bldgs, v.94, p.187-95, May.

Comportamento estrutural e dimensionamento de elementos mistos aço-concreto

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

83

NOTAÇÃO EMPREGADA Aa – área da seção transversal do perfil de aço; Ac – área da seção transversal de concreto; Ap – área efetiva da fôrma de aço (tracionada); As – área de seção transversal da armadura; b – largura efetiva da laje; bf – largura da mesa do perfil de aço; d – altura do perfil de aço; diâmetro externo de tubos circulares de aço; dp – distância do centro de gravidade da fôrma à face superior de concreto; E – módulo de elasticidade do aço do perfil; Ec – módulo de elasticidade do concreto; Es – módulo de elasticidade do aço da armadura; fck – resistência característica do concreto à compressão; fsy – resistência ao escoamento do aço da armadura; fy – resistência ao escoamento do aço do perfil; fyp – resistência ao escoamento do aço da fôrma; g – grau de conexão; h – altura total da laje mista; hc – altura de laje de concreto acima das nervuras da fôrma de aço; hF – altura nominal da nervura da fôrma; hw – altura da alma do perfil de aço; Ia – momento de inércia da seção de aço; Ic – momento de inércia da seção de concreto; Is – momento de inércia das barras da armadura; KL – comprimento efetivo de flambagem; L – vão do elemento misto; Mpl,Rd – momento resistente de cálculo, admitindo a plastificação total da seção mista; MSd – momento solicitante de cálculo; Nc – resistência de calculo à compressão axial da seção de concreto (plastificação total); Ne – normal de flambagem elástica por flexão; Npl,Rd – resistência de cálculo à compressão axial da seção mista, considerando a plastificação

total; NRd – resistência de cálculo à compressão axial da seção mista; NSd – força normal solicitante de cálculo; qn – resistência nominal de um conector de cisalhamento; t – espessura do perfil tubular; tc – espessura da laje maciça de concreto; tf – espessura da mesa do perfil de aço; tw – espessura da alma do perfil de aço; Vh – resultante do fluxo de cisalhamento longitudinal; Vl,Rd – resistência de cálculo ao cisalhamento longitudinal; VSd – força cortante de cálculo; Vp,Rd – resistência de cálculo à punção; Vv,Rd – resistência de cálculo ao cisalhamento transversal; Zpa – módulo de resistência plástico da seção do perfil de aço; Zpc – módulo de resistência plástico da seção de concreto, não fissurado; Zps – módulo de resistência plástico da seção da armadura. −

λ – índice de esbeltez reduzido; ( )eEI – produto de rigidez equivalente; χ – fator de redução associado à flambagem;

Gerson Moacyr Sisniegas Alva & Maximiliano Malite

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 51-84, 2005

84

γa – coeficiente de minoração da resistência do aço do perfil; γap – coeficiente de minoração da resistência do aço da fôrma; γc – coeficiente de minoração da resistência do concreto; γs – coeficiente de minoração da resistência do aço da armadura; χLT – fator de redução da resistência associado à flambagem lateral.

ISSN 1809-5860

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

SISTEMA INFORMATIZADO PARA PROJETO DE ESTRUTURAS INDUSTRIALIZADAS DE MADEIRA

PARA TELHADOS

Henrique Partel1 & Antonio Alves Dias2

Resumo

A norma brasileira para projeto de estruturas de madeira foi revisada recentemente para considerar critérios de dimensionamento baseados no método dos estados limites. Com isto ocorreu uma alteração fundamental no processo de dimensionamento de elementos estruturais de madeira. O objetivo deste trabalho é identificar os aspectos pertinentes do processo de dimensionamento de estruturas treliçadas industrializadas de madeira para telhados, e desenvolver um software para determinar as solicitações de cálculo e verificação dos estados limites últimos e de utilização de elementos estruturais (barras de tesouras, ligações entre barras de tesouras por conectores metálicos com dentes estampados (CDE), terças e caibros) baseadas na norma NBR 7190 - Projeto de Estruturas de Madeira da Associação Brasileira de Normas Técnicas (1997). Palavras-chave: estruturas de madeira; treliças; industrialização; software.

1 INTRODUÇÃO

Estruturas de coberturas de pequenos e médios vãos, principalmente as estruturas residenciais, são responsáveis por uma parcela bastante significativa do consumo de madeira como elemento estrutural no Brasil. Em contrapartida, a execução de tais estruturas é feita tradicionalmente por pessoal não especializado, ou seja, convencionou-se deixar a execução e até o dimensionamento empírico destas estruturas a critério dos carpinteiros. Diante da realidade de mercado com que hoje nos deparamos, e sabendo que a madeira é um material construtivo de inúmeros aspectos positivos, é evidente que os esforços que se iniciaram no sentido da industrialização da produção da madeira, com a extração programada em áreas de reflorestamento, bem como a industrialização da produção de estruturas de madeira com projetos racionalizados devem ser incentivados, tanto no âmbito político e social como no âmbito tecnológico, desenvolvendo-se

1 Mestre em Engenharia de Estruturas – EESC-USP 2 Professor do Departamento de Engenharia de Estruturas da EESC-USP, [email protected]

Henrique Partel & Antonio Alves Dias

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

86

mecanismos e ferramentas técnicas necessários ao incremento da utilização de estruturas de madeira no Brasil.

Em obras de estruturas industrializadas de madeira para cobertura, nota-se o uso crescente de madeiras de reflorestamento com dimensões de seção transversal limitadas, e geometria da estrutura simplificada, em sua maior parte composta de tesouras de duas águas e tesouras de banzos paralelos. O cálculo estrutural para dimensionamento de estruturas de madeira, em especial em estruturas treliçadas, se utiliza de grande quantidade de rotinas de cálculo numérico, quer para determinação de esforços solicitantes e deslocamentos de elementos estruturais através de análise matricial, quer para dimensionamento da seção transversal e ligações de elementos de uma estrutura típica. Além disso, para os tipos mais utilizados de tesouras, a ocorrência de elementos estruturais que obedecem a uma seqüência repetitiva de características geométricas possibilita a definição geométrica automática destas estruturas. Neste contexto se insere este trabalho, buscando desenvolver ferramenta técnica para cálculo e dimensionamento de estruturas de cobertura em madeira, visando o incentivo ao crescente uso da madeira como material construtivo no Brasil.

2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1 Alternativas estruturais

BARROS (1991) descreve algumas alternativas para estruturas treliçadas de telhados segundo a seguinte classificação: Sistema convencional Estruturas do sistema convencional são aquelas em que os elementos da estrutura principal (tesouras) bem como os componentes chamados auxiliares (terças, caibros, ripas e contraventamentos) são montados no próprio local da obra, utilizando ligações com entalhes em barras comprimidas e ligações com elementos convencionais prescritos em norma, ou sejam pinos metálicos, cavilhas de madeira e anéis metálicos, em barras tracionadas. Os espaçamentos entre estruturas principais no sistema convencional variam, em função das particularidades de cada projeto, de 2,0 a 3,0 metros para coberturas com telhas cerâmicas, e de 3,0 a 4,5 metros para coberturas com telhas onduladas de fibrocimento, metálicas, etc... A característica principal de estruturas treliçadas do sistema convencional, além dos elementos de ligação, são as barras diagonais ou montantes submetidas a esforços de tração situadas em planos diferentes do plano das demais barras, a fim de otimizar as ligações entre barras através dos elementos convencionais de ligação já citados. O sistema convencional não é considerado neste trabalho por não ser o mais adequado ao processo de industrialização de estruturas treliçadas de cobertura.

Sistema informatizado para projeto de estruturas industrializadas de madeira para telhados

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

87

Figura 1 – Estrutura de cobertura no sistema convencional

Sistema pré-fabricado No sistema pré-fabricado, o princípio básico é o da substituição das peças secundárias (terças, e caibros) por elementos da estrutura principal pré-fabricados. O sistema pré-fabricado segue algumas diretrizes básicas, como descrito : A principal característica das estruturas treliçadas pré-fabricadas é o uso de conectores metálicos com dentes estampados (CDE), conhecidos como conectores "GANG-NAIL", nas ligações entre barras de tesoura. A utilização deste tipo de conectores exige que todas as barras da estrutura treliçada, tracionadas ou comprimidas, tenham a mesma espessura e se situem no mesmo plano de montagem, ao contrário das estruturas treliçadas do sistema convencional. No sistema pré-fabricado, o espaçamento entre tesouras são reduzidos para faixas de 0,8 a 1,0 metro para os casos com telhas cerâmicas, e para 1,5 a 2,0 metros para as demais. As tesouras pré-fabricadas são bem mais esbeltas e leves, em função, é claro, das cargas de projeto e da menor área de influência. Substitui-se todo o madeiramento complementar somente por sarrafos que cumprem a função das ripas para apoio de telhas cerâmicas ou das terças, no caso de telhas de fibro-cimento ou metálica. O aumento da quantidade de tesouras é compensado pela possível redução do volume de madeira empregado nas mesmas, já considerada também a substituição das espécies de madeira, bem como a eliminação da totalidade da trama da cobertura (terças e caibros).

Henrique Partel & Antonio Alves Dias

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

88

Figura 2 – Estrutura de cobertura no sistema pré-fabricado

Sistema intermediário O sistema intermediário é caracterizado pela simples substituição da estrutura principal convencional (tesouras) pela estrutura principal pré-fabricada (tesouras pré-fabricadas), com a manutenção de todas as demais particularidades do sistema convencional, tais como espaçamento entre tesouras e componentes secundários.

Figura 3 – Estrutura de cobertura no sistema misto

2.2 Cálculo estrutural dos elementos de estruturas treliçadas de cobertura

A análise das alternativas de cálculo descritas conduz a modelos de cálculo desenvolvidos segundo uma abordagem racionalizada dos elementos de projeto, da qual podemos destacar os procedimentos seguintes:

Sistema informatizado para projeto de estruturas industrializadas de madeira para telhados

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

89

2.2.1 Cálculo dos esforços nos elementos da estrutura principal da cobertura (tesouras)

Conforme descrito por PARTEL (1988), os elementos componentes da estrutura principal (tesouras) devem ser considerados numericamente de acordo com dados que possibilitem definir cada elemento em separado, bem como a inter-relação dos elementos estruturais entre si (figura 4). Para tanto, são necessários os dados seguintes: Coordenadas dos nós da estrutura principal em relação à origem de um sistema de

eixos cartesianos. Incidência das barras da estrutura principal em relação aos nós previamente

definidos (nó inicial e nó final de cada barra).

Figura 4 – Geometria de estrutura principal definida em termos de dados numéricos

Definida a geometria da tesoura, esta deve ser submetida às diversas composições de ações e condições de contorno (restrições de apoio) consideradas no projeto, resultando nos valores de esforços solicitantes em cada barra da estrutura, bem como deslocamentos nodais e reações de apoio. Para a avaliação mais real do sistema estrutural pré-fabricado, onde o peso próprio de telhas e ripas é aplicado ao longo das barras do banzo superior, a estrutura principal pode ser considerada com os banzos contínuos, com articulações nos encontros de banzo superior com banzo inferior e nos pontos de mudança de inclinação. Os montantes ou as diagonais são considerados com extremidades perfeitamente articuladas, conforme modelo apresentado por GESUALDO e GRECO (1997). O método para cálculo dos esforços solicitantes e deslocamentos dos elementos da estrutura principal para considerar a continuidade dos banzos da tesoura é similar ao algoritmo para cálculo de pórticos planos, assumindo um único tipo básico de elemento (barras) na composição da estrutura e assumindo deslocamentos nulos segundo as coordenadas globais em nós que definem as vinculações de apoio da estrutura. SOUZA & ANTUNES (1995) fornecem os conceitos teóricos necessários ao desenvolvimento de um algoritmo elementar de cálculo de pórticos planos pelo processo dos deslocamentos, considerando apenas efeitos estáticos, com a teoria da elasticidade linear de primeira ordem. Segundo este algoritmo a estrutura se define pelos sistemas de coordenadas global e local apresentados nas figuras 5 e 6 respectivamente. Vale lembrar que neste algoritmo as barras de montantes e diagonais da estrutura treliçada serão tratadas apenas segundo as coordenadas locais em x e y, e consideradas pela simulação como tendo momento de inércia nulo. Ainda, algumas

Henrique Partel & Antonio Alves Dias

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

90

barras apresentam condições de vinculação diferentes do convencional, ou seja, uma extremidade contínua e outra articulada, caso dos banzos associados aos nós de apoio.

Figura 5 - Coordenadas globais

Figura 6 - Coordenadas locais segundo sistema de referência global

No sistema estrutural tipo intermediário, o cálculo de esforços nos elementos da tesoura é feito pelo modelo clássico de treliça, no qual as extremidades de todas as barras são articuladas e a tesoura é submetida a forças concentradas aplicadas aos nós da estrutura. O algoritmo adotado para o cálculo do modelo clássico de treliça é obtido do algoritmo proposto para o cálculo de pórtico plano, com a imposição de momento de inércia nulo para todas as barras e restrições nas coordenadas globais referentes ao eixo z para todos os nós da estrutura.

2.2.2 Cálculo dos esforços em terças

As terças da estrutura de cobertura estão submetidas a esforços de flexão simples oblíqua, em função do apoio das terças sobre as tesouras. Tais esforços são quantificados em função das composições de carregamentos aplicados à estrutura e do vão livre entre apoios da terça, ou seja, o espaçamento entre tesouras da estrutura do telhado.

Sistema informatizado para projeto de estruturas industrializadas de madeira para telhados

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

91

2.3.3 Cálculo dos esforços em caibros.

Os caibros da estrutura de cobertura estão submetidas a esforços de flexo-compressão devidos à inclinação das forças atuantes em relação ao eixo longitudinal das peças. Tais esforços são quantificados em função das composições de carregamentos aplicados à estrutura e do vão livre entre apoios do caibro, ou seja, o espaçamento entre terças da estrutura do telhado.

2.3 Verificação dimensional dos elementos de estruturas treliçadas de cobertura

2.3.1 Ações em estruturas de cobertura

Segundo NBR 7190/97, as ações aplicadas a estruturas de cobertura típicas especificamente são combinadas e ponderadas conforme as considerações seguintes : Classe de Carregamento: A ação variável principal aplicada a estruturas de

cobertura típicas define a classe de carregamento como de longa duração; Carregamento: O carregamento imposto a uma estrutura de cobertura típica é

normal, incluindo apenas as ações decorrentes do uso previsto para a construção; Situação de Projeto: A situação de projeto de uma estrutura de cobertura é

considerada como duradoura, sendo, portanto, verificados os estados limites últimos e estados limites de utilização. Para estado limite último, consideram-se as combinações normais de carregamento, enquanto para os estados limites de utilização devem ser verificadas as combinações de longa duração; Combinações últimas normais de ações : Para verificação dos estados limites

últimos.

∑ ∑= ⎟

⎟⎟

⎜⎜⎜

=++=

m

i

n

jkQjFjkQFQkgiFgidF

1 2,0,1, ψγγ

Combinações de longa duração : Para verificação dos estados limites de utilização.

∑ ∑= =

+=m

i

n

jkQjFjkgiFutidF

1 1,2,, ψ

2.3.2 Verificação da segurança em peças de madeira

De acordo com as considerações adotadas, as condições de segurança das peças de madeira componentes da estrutura são verificadas como descrito nas tabelas 1 e 2 :

Henrique Partel & Antonio Alves Dias

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

92

Tabela 1 - Verificação das condições de segurança para estado limite último Estado Limite Último Banzos Montantes Diagonais Terças Caibros Tração Paralela X X X Compressão Paraalela X X X Flexão Simples Oblíqua X Flexotração X X Flexocompressão X X Cisalhamento Tangencial X X X Estabilidade X X X X Tabela 2 - Verificação das condições de segurança para estado limite de utilização Estado Limite Utilização Banzos Montantes Diagonais Terças Caibros Deformação Excessiva X X 2.3.3 Verificação da segurança em ligações entre peças de madeira

A NBR 7190/97 não fornece critérios explícitos de dimensionamento de ligações de peças de madeira por conectores metálicos com dentes estampados, objetos deste trabalho, recomendando que os valores da resistência de cálculo que podem ser atribuídos a estes conectores, correspondentes a uma seção de corte, devem ser garantidos pelo respectivo fabricante, de acordo com a legislação brasileira.

Para este trabalho foram considerados estudos que descrevem critérios de dimensionamento, como o apresentado por BARALDI (1998), que propõe três verificações básicas (tração da chapa, cisalhamento da chapa e arrancamento do conector) para a ligação de peças de madeira com conectores de dentes estampados.

3 DESENVOLVIMENTO DO SOFTWARE

3.1 Ambiente de operação do sistema

O sistema proposto é desenvolvido através do Software Borland - Delphi for Windows, visto que esta ferramenta de desenvolvimento de sistemas em ambiente Windows para processadores padrão Pentium PC vem sendo largamente utilizada na área técnica e comercial, substituindo linguagens como o Clipper e outras que operam em plataforma DOS.

3.2 Desenvolvimento do algoritmo

A partir do estudo bibliográfico foi montado o modelo matemático do sistema proposto segundo os procedimentos de análise estruturada de sistemas descrito por GANE (1983) e YOURDON (1989) de modo a possibilitar a automatização das etapas de análise estrutural, dimensionamento e verificações dos elementos estruturais. O modelo matemático do sistema é resultado de uma abordagem racionalizada dos elementos de projeto cuja inter-relação entre dados, procedimentos e ambiente externo é representada pelos diagramas de fluxo de dados (DFD) apresentados nas figuras 7 e 8.

Sistema informatizado para projeto de estruturas industrializadas de madeira para telhados

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

93

USUÁRIO

SISTEMA

RELATÓRIOARQUIVODE DADOS

Figura 7 - Diagrama de contexto - visão do sistema interagindo com o ambiente externo

Henrique Partel & Antonio Alves Dias

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

94

Figura 8 - Diagrama de fluxo de dados - visão global do sistema

.

Sistema informatizado para projeto de estruturas industrializadas de madeira para telhados

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

95

3.2.1 Definição da geometria da estrutura (Módulo 1)

Figura 9 - Diagrama de fluxo de dados - módulo 1

Henrique Partel & Antonio Alves Dias

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

96

3.2.2 Definição de materiais (módulo 2)

Figura 10 - Diagrama de fluxo de dados - módulo 2

Sistema informatizado para projeto de estruturas industrializadas de madeira para telhados

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

97

3.2.3 Definição de ações (módulo 3)

Figura 11 - Diagrama de fluxo de dados - módulo 3

Henrique Partel & Antonio Alves Dias

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

98

3.2.4 Esforços / deslocamentos (módulo 4)

Figura 12 - Diagrama de fluxo de dados - módulo 4

Sistema informatizado para projeto de estruturas industrializadas de madeira para telhados

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

99

3.2.5 Dimensionamento (módulo 5)

Figura 13 - Diagrama de fluxo de dados - módulo 5

4 CONCLUSÕES

Da revisão bibliográfica, foram destacados os aspectos fundamentais do processo de industrialização da construção, bem como as configurações estruturais para telhados mais adequadas ao processo de industrialização. Tais configurações (Sistema Pré-Fabricado e Sistema Intermediário) foram as premissas para o desenvolvimento deste trabalho.

Foram identificados métodos de análise estática da estrutura principal (tesouras) compatíveis com os recursos computacionais disponíveis, bem como rotinas de cálculo matricial de estruturas adequadas á análise estática considerada.

As premissas destacadas da revisão bibliográficas aliadas aos conceitos da NBR 7190/97 para projeto e dimensionamento de estruturas de madeira foram as diretrizes para o desenvolvimento deste trabalho, resultando no pacote técnico composto por software de domínio público para projeto e dimensionamento de estruturas treliçadas em madeira para telhados, e o correspondente manual básico de operação com as recomendações para utilização, bem como as instruções para operação e considerações adotadas no desenvolvimento deste.

Henrique Partel & Antonio Alves Dias

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

100

A contribuição deste trabalho no ambiente de industrialização de estruturas de madeira torna possível o projeto de estruturas treliçadas típicas de madeira para telhados pelos conceitos da NBR 7190/97 em tempo reduzido, minimizando a prática de dimensionamento de estruturas feitos de forma empírica e por pessoal não capacitado.

No meio acadêmico, este software poderá contribuir em trabalhos futuros voltados ao detalhamento do projeto, ou em análise e otimização de estruturas típicas de telhados pelos resultados de dimensionamento gerados pelo software.

5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. (1984). NBR 8691 - Ações e segurança nas estruturas. Rio de Janeiro. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. (1982). NBR 7190 – Cálculo e execução de estruturas de madeira. Rio de Janeiro. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. (1997). NBR 7190 – Projeto de estruturas de madeira. Rio de Janeiro. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. (1988). NBR 6123 – Forças devidas ao vento em edificações. Rio de Janeiro. AUTODESK. (1993). AutoCad – reference manual. Oakland: Autodesk. AUTODESK (1993). AutoLisp – reference manual. Oakland: Autodesk. BARALDI, L. T. (1998). Critérios de dimensionamento para treliças executadas com chapas dentadas de dentes estampados. In: ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRAS E EM ESTRUTURAS DE MADEIRA, 6., Florianópolis, 1998. Anais... Florianópolis. v.2, p.101-112. BARROS, O. J. (1991). Algumas considerações sobre a pré-fabricação das estruturas de madeira para coberturas. São Carlos. Dissertação (Mestrado) – Escola de Engenharia de São Carlos – Universidade de São Paulo. CALIL, C. J. (1996). Treliças de madeira para coberturas. São Carlos: Serviço Gráfico EESC-USP. Notas de aula - SET 406 - Estruturas de madeira. CALIL, C. J. et. al. (1998). Estruturas de Madeira. São Carlos: Serviço Gráfico EESC USP. Notas de aula - SET 406 - Estruturas de madeira. CANTU, M. (1966). Dominando o Delphi 2. São Paulo: Makron Brooks. FUSCO, P. B. (1995). A Calibração da Nova Norma de Projeto de Estruturas de Madeira. In: ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRAS E EM ESTRUTURAS DE MADEIRA, 5., Belo Horizonte, 1995. Anais... Belo Horizonte. v.2, p.247-264.

Sistema informatizado para projeto de estruturas industrializadas de madeira para telhados

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

101

FUSCO, P. B. (1995). A mudança do Modelo de Segurança nas Normas de Projeto de Estruturas. In: ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRAS E EM ESTRUTURAS DE MADEIRA, 5., Belo Horizonte, 1995. Anais... Belo Horizonte. v.2, p.265-270. GANE, C. (1983). Análise estruturada de sistemas. Rio de Janeiro: LTC - Livros Técnicos e Científicos Editora S.A. GESUALDO, F. A. R.; GRECO, M. (1998). Avaliação de Esforços de Flexão em Estruturas do tipo treliçado. In: ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRAS E EM ESTRUTURAS DE MADEIRA, 6., Florianópolis, 1998. Anais. Florianópolis. v.2, p.93-100. HUMES, A. F. P. C. et al. (1984). Noções de cálculo numérico. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil. LAHR, F. A. R. (1983). Aspecto histórico do emprego de estruturas de madeira para coberturas. In: ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRAS E EM ESTRUTURAS DE MADEIRA, 1., São Carlos, 1983. Anais. São Carlos. MOLITERNO, A (1981). Caderno de projetos de telhados em estruturas de madeira. São Paulo: Editora Edgard Blucher Ltda. MOREIRA, D. F. (1977). Análise matricial de estruturas. São Paulo: EDUSP. OZELTON, E. C.; BAIRD, J. A. (1976). Timber designers manual. London: Crosby Lockwood Staples. PARCEL, J. I.; MOORMAN, R. B. B. (1955). Analisys of statically indeterminated structures. Nova Iorque: John Wiley & Sons. PARTEL, H. (1988). Automatização do cálculo estrutural para industrialização de estruturas treliçadas de madeira. São Carlos. Relatórios de Iniciação Científica n º 1, 2 e 3. LaMEM – EESC – USP. PARTEL, H. (2000). Sistema informatizado para projeto de estruturas industrializadas de madeira para telhados. São Carlos. Dissertação (Mestrado) – Escola de Engenharia de São Carlos – Universidade de São Paulo. SOUZA, J. C. A. O.; ANTUNES, H. M. C. C. (1995). Introdução à análise matricial de estruturas, 2. ed. São Carlos: Serviço Gráfico EESC-USP. TIMOSHENKO, S.; YOUNG, D. H. (1957). Teoria das estruturas. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico. Trad. Antonio A Noronha. YOURDON, E. (1992). Análise estruturada moderna. Rio de Janeiro: Editora Campos. WAGNER, S. L. (1996). Delphi 2 em exemplos. São Paulo: Makron Brooks.

Henrique Partel & Antonio Alves Dias

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p. 85-102, 2005

102

WANG, C. K. (1953). Statically indeterminated structures. Nova Iorque: McGraw-Hill Book

ISSN 1809-5860

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

ANÁLISE DA CAPACIDADE RESISTENTE DE CONSOLOS DE CONCRETO ARMADO

CONSIDERANDO A CONTRIBUIÇÃO DA ARMADURA DE COSTURA

Rejane Martins Fernandes1 & Mounir Khalil El Debs2

Resumo

Apesar de na prática sua contribuição geralmente não ser considerada, através de diversos estudos experimentais da literatura, já foi comprovado que a armadura de costura aumenta a capacidade resistente dos consolos, além de melhorar seu comportamento quanto à fissuração e ductilidade. Com o objetivo de se analisar a contribuição efetiva dessa armadura na resistência de consolos curtos e muito curtos de concreto armado, esse trabalho propõe dois procedimentos de cálculo de biela e tirante considerando a altura útil efetiva de cada barra de costura, validando-os através de suas aplicações em 245 consolos com resultados experimentais, sendo 85 destes com armadura de costura. As duas formulações propostas foram aplicadas aos consolos curtos, e no caso dos consolos muito curtos, foram utilizadas em conjunto com uma adaptação do modelo de atrito cisalhamento da NBR-9062/85, considerando nesses modelos os Estados Limites Últimos de ruptura por escoamento das armaduras e esmagamento do concreto. Para os consolos com apenas armadura principal do tirante, 94% destes apresentaram resultados a favor da segurança quando se utilizou a primeira proposta e 91% no caso da segunda proposta, contudo a diferença da resistência teórica em relação à experimental foi inferior a 10%. Entre os consolos com armadura de costura, 98% apresentaram resultados a favor da segurança para as duas formulações propostas, sendo que dos consolos com armadura de costura que tiveram sua resistência superestimada, apenas um apresentou uma diferença superior a 10% em relação ao valor experimental. Palavras-chave: consolo; concreto armado; armadura de costura; modelos de projeto.

1 INTRODUÇÃO

Uma das principais particularidades do comportamento estrutural dos consolos curtos e

muito curtos em relação às vigas é que as hipóteses da teoria técnica de flexão não podem ser

aplicadas ao seu estudo. Para a análise da sua capacidade resistente ou o seu dimensionamento,

1 Doutora em Engenharia de Estruturas – EESC-USP, [email protected] 2 Professor Associado do Departamento de Engenharia de Estruturas da EESC-USP, [email protected]

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

104

não se pode utilizar, portanto, os modelos de cálculo de vigas que levam em consideração a

hipótese da manutenção das seções planas. Mesmo quando se considera material homogêneo,

isótropo e elástico perfeito, as tensões normais à seção transversal do consolo não variam

linearmente ao longo da sua altura e as tensões tangenciais e as tensões normais aos planos

ortogonais a essa seção não são desprezíveis. Além disso, após a fissuração do concreto, o

comportamento do consolo se modifica, ocorrendo uma diminuição de rigidez e outros

mecanismos mais complexos. Desta forma, o projeto desses elementos estruturais deve ser

objeto de recomendações específicas.

Segundo a NBR-9062/85 [1], os consolos são calculados de acordo com três modelos

para três diferentes intervalos de a/d, definida como a relação entre a distância a da força até a

face do pilar e a altura útil d do consolo:

• Consolos muito curtos (a/d < 0,5): cálculo com modelo de atrito-cisalhamento;

• Consolos curtos (0,5 ≤ a/d ≤ 1,0): cálculo com modelo de biela e tirante;

• Consolos longos (1,0 < a/d < 2,0): cálculo como viga.

Além da armadura principal do tirante, disposta no topo do consolo para absorver as

tensões de tração, uma outra armadura de importância relevante é distribuída na direção

horizontal ao longo da altura restante do consolo, a qual é denominada de armadura de costura.

Ela tem a principal finalidade de “costurar” as fissuras que venham a ocorrer na interface

consolo-pilar e promover, quando estiver adequadamente ancorada, um confinamento na biela

de compressão, garantindo, conseqüentemente, uma ductilidade à peça.

Em geral, ela não é considerada no cálculo da resistência do consolo. Com relação ao

modelo de atrito-cisalhamento, algumas das formulações da literatura levam em conta a

contribuição da armadura de costura na resistência do consolo; entretanto, para o modelo de

biela e tirante, apenas a formulação apresentada em MACHADO [2], a qual é baseada em

HAGBERG [3], considera a armadura de costura, mas concentrada em uma altura equivalente a

2d/3.

Baseando-se nisso, são apresentadas duas propostas de biela e tirante para o cálculo da

resistência de consolos, considerando o Estado Limite Último de escoamento das armaduras do

tirante e de costura e a contribuição efetiva da armadura de costura, ou seja, com cada uma de

suas barras concentrada na sua altura útil efetiva. Embora essas duas formulações possam ser

um pouco mais trabalhosas que a apresentada em MACHADO [2], elas se justificam devido à

repetição dos elementos pré-moldados e a conseqüente necessidade do refinamento do projeto

desses elementos.

Uma análise inicial de uma das formulações propostas e de alguns resultados de normas

feita pelos presentes autores pode ser encontrada em FERNANDES & EL DEBS [4].

Para validar as duas formulações propostas, foi feita sua aplicação em 245 modelos

ensaiados na literatura, sendo 146 desses consolos muito curtos, 85 curtos e 14 longos. Entre os

Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

105

consolos analisados nesse trabalho, estão os referidos em: FRANZ & NIEDENHOFF [5], KRIZ

& RATHS [6], MAUTONI [7], HERMANSEN & COWAN [8], ROBINSON [9], FRANZ [10],

MATTOCK et al. [11], YONG et al. [12], CHAKRABARTI & FARAHANI [13], FATTUHI

[14], NAEGELI [15], FATTUHI & HUGHES [16], FATTUHI & HUGHES [17], FATTUHI &

HUGHES [18], FATTUHI [19], FATTUHI [20], ZELLER [21], FATTUHI [22], FATTUHI

[23], YONG & BALAGURU [24], REIS & TORRES [25], NAEGELI [26], TORRES [27],

FERNANDES [28].

Conforme KRIZ & RATHS [6], ensaios mostram que a armadura de costura

praticamente não contribui para a capacidade resistente do consolo quando também atuam neste,

forças horizontais. Portanto, como o principal objetivo desse trabalho é avaliar a parcela de

contribuição da armadura de costura, foram eliminados desse estudo os consolos com atuação

simultânea de força vertical e horizontal. Contudo, as formulações propostas podem ser

aplicadas para o caso geral, desde que seja feito o dimensionamento separadamente do consolo

sob força vertical e horizontal, considerando-se a armadura total como a soma das armaduras

dos dois casos, e se despreze a contribuição da armadura de costura para a análise do consolo

sob forças horizontais.

Os consolos analisados tinham as seguintes características:

• Relação a/d variando de 0,11 a 1,47;

• Consolos simétricos e assimétricos submetidos apenas à força vertical, inclusive blocos

sobre estacas que recaem nos modelos de cálculo utilizados para consolos;

• Qualquer valor para a altura da face externa do consolo, apesar de na prática ser

recomendado o valor igual à pelo menos metade da altura interna;

• O tipo de ruptura foi informado;

• A ruptura não foi localizada (do pilar, da extremidade, da ancoragem ou sob a placa de

aplicação do carregamento);

• Concreto com qualquer valor de resistência à compressão;

• Armadura disposta horizontalmente ou verticalmente.

Neste trabalho, são apresentados os modelos de atrito-cisalhamento da NBR-9062/85

[1] para consolos muito curtos, de biela e tirante de LEONHARDT & MÖNNIG [29] adaptado

por EL DEBS [30], as formulações propostas considerando a armadura de costura e a

comparação dos resultados teóricos com os experimentais da literatura.

2 MODELO DE ATRITO-CISALHAMENTO

Um dos principais modelos para cálculo de consolos muito curtos (relação a/d < 0,5) é

o de atrito-cisalhamento. Esse modelo supõe que ocorra ruptura por cisalhamento na interface

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

106

consolo-pilar. Admite-se também que, através das fissuras que se formam na superfície de

transmissão dos esforços cisalhantes, ocorra inicialmente um deslocamento relativo vertical

entre o consolo e o pilar. Como essa superfície é irregular, o deslocamento relativo horizontal

ocasiona solicitações de tração na armadura distribuída que cruza a interface e,

conseqüentemente, a superfície de concreto ficará comprimida. O mecanismo desse modelo é

ilustrado na Figura 1.

A clássica Teoria de Atrito-Cisalhamento prevê a transferência de esforços de

cisalhamento através de um dado plano por meio de uma armadura distribuída que o atravessa.

Esse plano pode ser o de uma provável fissura, o da interface de ligação de materiais diferentes

ou da superfície entre dois concretos moldados em datas distintas. Vale salientar, que nesse

modelo, a armadura é suposta uniformemente distribuída ao longo da fissura potencial,

desprezando-se a excentricidade da força vertical que implicaria em uma armadura mais

concentrada na parte tracionada. Como para os modelos de biela e tirante, acredita-se que a

armadura horizontal situada na região inferior do consolo não contribua efetivamente na

resistência do consolo, pois, mesmo nos casos em que o cisalhamento predomina, existe uma

parcela da resistência oriunda da flexão. Para base de comparação entre os modelos, nos

referidos cálculos para previsão da força última, apenas considerou-se a armadura de costura

posicionada até 2d/3 em relação à face superior do consolo.

V

fissurapotencial

F

F = V / tg

R

comoF = Ast sσtg = (coef. de atrito)

resulta

A =s

st σ µV stA - armadura para proporcionar

a força normal necessáriapara o equilíbrio

Fat

µ

φ

φ

φV n

nF

V

n

n

at

at

at

Figura 1 - Modelo de atrito-cisalhamento - EL DEBS [30]

A NBR-9062/85 [1] permite a consideração do efeito favorável do engrenamento dos

agregados se a interface for atravessada por barras de aço perpendiculares à mesma e

respeitando-se as condições de segurança relativas ao coeficiente de ajustamento e as

disposições construtivas do item 7.3.3 da Norma.

A armadura principal do tirante segundo a NBR-9062/85 [1] é calculada com a

Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

107

expressão:

yd

dd

ydstir f

HV8,0.

f1A +=

µ (1)

onde o valor de µ vale:

• 4,1=µ : para concreto lançado monoliticamente;

• 0,1=µ : para concreto lançado sobre concreto endurecido intencionalmente rugoso (5

mm de profundidade a cada 30 mm)

• 6,0=µ : para concreto lançado sobre concreto endurecido com interface lisa.

É recomendado também que a área da armadura, para consolo muito curto, não seja

menor que aquela calculada com a expressão para consolo curto, com o objetivo de cobrir

algum esforço de flexão que eventualmente venha a surgir. A tensão da armadura deve ser

limitada em 435 MPa para os dois tipos de consolo.

A verificação do esmagamento do concreto pode ser feita também em termos da tensão

tangencial de referência. O valor da tensão última recomendada é dado por:

⎪⎩

⎪⎨

⎧ +

≤≤=MPa6

f30,0

)MPa(f.9,00,3

d.bV

cd

yd

wud

wd

ρ

ττ (2)

onde ρ é a taxa geométrica da armadura do tirante.

3 MODELO DE BIELA E TIRANTE

O modelo de biela e tirante, também denominado de treliça, consiste em idealizar o

comportamento do concreto, nos trechos de descontinuidade, através de bielas (campos

comprimidos) e tirantes (campos tracionados), com suas respectivas posições escolhidas a partir

do fluxo de tensões na região. Os elementos são interconectados nos nós, resultando na

formação de uma treliça idealizada. Esse modelo é o mais empregado para o cálculo de consolos

curtos.

O dimensionamento através desse modelo é feito com a verificação da resistência à

compressão em uma seção fictícia da biela e o cálculo da área da armadura do tirante em função

da tensão de escoamento do aço. Recomenda-se também a verificação da resistência nos nós, de

tal forma que as forças sejam ancoradas e balanceadas satisfatoriamente. Além da armadura do

tirante, costuma-se adicionar a armadura de costura, mencionada anteriormente, a qual é

considerada adequada quando distribuída nos primeiros 2d/3 da altura do consolo. Por essa

razão, no cálculo da capacidade resistente dos consolos analisados, apenas computou-se essa

parte da armadura de costura.

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

108

O modelo clássico consiste basicamente no equilíbrio de forças e momentos no esquema

de treliça apresentado na Figura 2

A

C BRsd

dHdV

dd n

cdR

0,9

d

hbie

a = 0,9 d

( 0,9 d ) + a2 2

2a =

2( 0,9 ) +

0,9 a

da( )

h = 0,2 dbie

a

abie

bie

bie

. a

Figura 2 - Modelo de análise e características geométricas de consolo curto – LEONHARDT & MÖNNIG [29] adaptado por EL DEBS [30]

A armadura do tirante é determinada através do equilíbrio de momento em relação ao

ponto A, resultando em:

d9,0

)dd9,0(Ha.Vf.A hdd

ydstir++

= (3)

Considerando dh/d aproximadamente igual a 0,2, tem-se:

yd

d

yd

dstir f

H2,1

d9,0a.

fV

A += (4)

Do equilíbrio de momentos em relação ao ponto C, tem-se:

bie

hddcd a

d.Ha.VR

+= ∴ ( )

22hdd

cd da9,0

a.9,0d.Ha.V

R ⎟⎠⎞

⎜⎝⎛+

+= (5)

A tensão de compressão na biela é calculada com a expressão:

d.b2,0

Rcdcd =σ ∴ ( )

22

d

hddcd d

a9,0a.Vd.H

1d.b.18,0

V⎟⎠⎞

⎜⎝⎛+⎟⎟

⎞⎜⎜⎝

⎛+=σ (6)

Desprezando o valor da parcela Hd.dh/Vd.a, que para os casos usuais é menor que 0,06, e

limitando o valor da tensão na biela em β.fcd, tem-se:

( ) cd

22d

cd f.da9,0

d.b.18,0V

βσ ≤⎟⎠⎞

⎜⎝⎛+= (7)

onde adota-se 1=β no caso de forças diretas e 85,0=β para forças indiretas.

Colocando a expressão acima na forma de tensão tangencial de referência, obtém-se:

Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

109

( )2

2

cdwu

dwd

da9,0

f.18,0d.b

V

⎟⎠⎞

⎜⎝⎛+

=≤=β

ττ (8)

4 FORMULAÇÕES PROPOSTAS

4.1 Adaptação do Modelo de Atrito-Cisalhamento

Embora o modelo de atrito-cisalhamento da NR-9062/85 [1] considere apenas a

armadura do tirante colaborando na resistência do consolo, pela clássica Teoria de Atrito-

Cisalhamento, admite-se que a transmissão das tensões de cisalhamento ocorra ao longo da

interface consolo-pilar através da armadura distribuída que a atravessa. Neste caso,

considerando-se também a armadura de costura situada nos primeiros 2/3 da altura útil d1, tem-

se para a força última Vd:

∑=

=n

1i

yidsid 8,0

f.A.V

µ (9)

Considerando a adaptação da Expressão (2), onde é feita a verificação do esmagamento

do concreto, tem-se para a tensão última, no caso de se considerar a armadura de costura:

⎪⎪⎪

⎪⎪⎪

⎧+

≤≤=

∑=

MPa6f30,0

)MPa(d.b

f.A9,00,3

d.bV *

cd

n

1i*yidsi

wu*d

wd ττ

(a)

(b)

(c)

(10)

4.2 Proposta I (Baseada em HAGBERG [3])

Com o intuito de considerar a contribuição efetiva da armadura de costura na resistência

do consolo, foi feito um refinamento no modelo de HAGBERG [3], o qual é apresentado em

MACHADO [2] e que considera duas treliças simples ligadas por uma barra vertical na posição

da carga. O modelo refinado consiste em várias treliças interconectadas em um mesmo nó, onde

cada armadura horizontal do tirante ou de costura com sua respectiva biela formam uma treliça.

O esquema desse modelo é apresentado na Figura 3..

São admitidas as seguintes hipóteses:

• As deformações elásticas dos materiais são desprezíveis quando comparadas com as

deformações plásticas. Admite-se que o concreto rompe por compressão na flexão ou

que o aço entre em escoamento antes. Portanto, tanto a ruptura do concreto à

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

110

compressão como o escoamento da armadura são considerados como critérios de

ruptura;

• A resistência à tração do concreto é negligenciada;

• O valor de cálculo da tensão de contato na placa de apoio não deve ser superior a

cdck f)250/f1.(6,0 − ( ckf em MPa);

• A geometria do modelo deve ser compatível com o modelo matemático. Deve-se,

portanto, prever uma ancoragem correta da armadura principal e o não posicionamento

da carga além da curvatura desta armadura. E a altura do consolo na sua extremidade

livre hext deve ser pelo menos metade da altura útil d1 na seção de engastamento, para

evitar rupturas secundárias;

• A armadura de costura a ser considerada no cálculo deve estar no trecho de altura igual

a 2d1/3.

A expressão para cálculo da força última é apresentada abaixo:

∑=

=n

1i*i

yidsid az

.f.AV (11)

onde:

n: número de barras longitudinais situadas no trecho de altura igual a 2d1/3.

⎥⎦⎤

⎢⎣⎡ −++= )2(daa5,0a **2*2* ωω : distância da linha de ação da carga concentrada

vertical ao nó de encontro das treliças. **

ii d..5,0dz ω−= : braço de alavanca referente à armadura i de área Asi.

∑=

=n

1i sd

sidi*

RR.d

d : altura útil equivalente de consolos curtos com cargas verticais.

yidsisid f.AR = : força resistente na armadura considerada.

∑=

=n

1iyidsisd f.AR : força resistente total.

cdck*

cd f).250/f1.(85,0f −= : resistência de cálculo à compressão do concreto. No

caso dos consolos analisados, considerou-se cm*

cd ff = .

∑=

=n

1i*

cd*

yidsi*

f.d.b

f.Aω : taxa mecânica da armadura longitudinal total.

Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

111

d*

aa*

d /3

d /3

d /3

0,5h .cos

Rcd

θ∗

θ = θ∗

θ1

θ2

f *cd

aapVd

θ∗

s1dR

sdR

s2dR

s3dR1θ

θ = θ∗

s3dR

Rsd

s1dR

s2dR

θ 3

dVR cd

c1dR

c2dR

c3dR

dd

d

1

2

3

1

1

1

armadura horizontal quenão contribui na resistência

V1d

V2d

V3d

z*

bie

0,5h .sen θ∗bie

hbie

Figura 3 - Modelo de bielas e tirantes proposto baseado em HAGBERG [3] para consolos curtos com carga vertical

Fazendo-se o equilíbrio de momentos em relação ao ponto C da treliça resultante, tem-

se:

bie

*d

cd aa.V

R = (12)

Substituindo o valor de ( )2***bie z/a1/aa += na expressão acima, a resultante na

biela fica calculada conforme:

2

*

*

dcd za1VR ⎟⎟

⎞⎜⎜⎝

⎛+= (13)

onde: **** d..5,0dz ω−= : braço de alavanca referente à armadura da treliça resultante.

Considerando semelhantemente ao Modelo de LEONHARDT & MÖNNIG [29]

adaptado por EL DEBS [30], a largura da biela hbie equivalente a 20% da altura útil, a tensão de

compressão na biela é calculada com a expressão:

*cd

cd d.b2,0R

=σ ∴ 2

*

*

*d

cd za1

d.b.2,0V

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛+=σ (14)

Limitando o valor da tensão na biela em *cdf , tem-se:

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

112

*cd

2

*

*

*d

cd fza1

d.b.2,0V

≤⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛+=σ (15)

A força última Vd fica dada por:

2

*

*

**cd

d

za1

d.b.f2,0V

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛+

= (16)

Colocando a Expressão (16) na forma de tensão tangencial de referência, tem-se:

2

*

*

*cd

wu*d

wd

za1

f.2,0d.b

V

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛+

=≤= ττ (17)

A título de ilustração, apresenta-se também a expressão adaptada do modelo de

HAGBERG [3] para o cálculo da força última Vd, considerando o Estado Limite Último de

esmagamento da biela de compressão. Fazendo-se o equilíbrio das forças verticais da treliça

resultante formada pelo tirante com força resistente total Rsd e por sua respectiva biela de

compressão Rcd, obtém-se:

( )*cdd cos.RV θ= (18)

O ângulo *θ da treliça resultante é calculado conforme a seguinte expressão:

( )*** z/aarctan=θ (19)

Considerando que a força na biela se distribui ao longo da projeção da largura do apoio

aap e de sua base b, seu valor é dado por:

( )*ap

*cdcd cos.a.b.fR θ= (20)

Substituindo o valor de Rcd na Expressão (18), tem-se para a força última Vd:

( )*2ap

*cdd cos.a.b.fV θ= (21)

Onde 2

*

*

*

za1

1cos

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛+

=θ .

Com a substituição de *cosθ na Expressão (21), têm-se para Vd:

2

*

*

ap*

cdd

za1

a.b.fV

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛+

= (22)

Será visto no item de resultados, entretanto, que a Equação (22) fornece valores

sistematicamente maiores que os calculados pela Equação (16).

Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

113

4.3 Proposta II (Baseada em LEONHARDT & MÖNNIG [29])

Uma adaptação do procedimento de biela e tirante de LEONHARDT & MÖNNIG [29]

adicionando a armadura de costura também é proposta, em virtude de reduzir as diferenças entre

resultados teóricos e experimentais. Essa formulação modificada consiste na somatória das

parcelas de contribuição das armaduras horizontais do tirante e de costura até 2d1/3, segundo

ilustra a Figura 4. Considerando o estado limite último de escoamento das armaduras

horizontais, a resistência dos consolos curtos é, então, adaptada da Expressão original (3) e

calculada com a seguinte expressão:

∑=

=n

1i

iyidsid a

z.fAV (23)

onde:

n: número de barras longitudinais situadas no trecho de altura igual a 2d1/3.

yidsisid f.AR = : força resistente na armadura considerada.

ii d9,0z = : braço de alavanca referente à armadura i de área Asi.

id : altura útil efetiva da armadura i considerada.

Ressalta-se que devido a armadura de costura praticamente não contribuir para o

aumento da força horizontal, esta foi eliminada da expressão modificada.

A Expressão (23) é semelhante à Expressão (11), diferenciando-se no valor do braço zi e

na distância a da linha de ação da carga concentrada vertical ao nó inferior das treliças.

A força última Vd, considerando o Estado Limite Último por esmagamento da biela de

compressão, é dada pela Expressão (8) adaptada, substituindo-se cdf.β por *cdf e a altura útil d

pela altura útil d*, que leva em conta a contribuição da armadura de costura até 2d1/3:

( )2

*2

**cd

d

da9,0

d.b.f.18,0V

⎟⎠⎞

⎜⎝⎛+

= (24)

onde:

∑=

=n

1i sd

sidi*

RR.d

d

id : altura útil da armadura i de área Asi.

yidsisid f.AR = : força resistente na armadura considerada.

∑=

=n

1iyidsisd f.AR : força resistente total.

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

114

dV

2d/3

d/3

a

=

a

s1dR

d =

d

1dV

d

a

Rs2d

V2d

+

d

a

s3dR

V3d

+

arm. horizontalque não contribui

na resistência

1

2

3

s1dR

Rs2d

s3dR

10,

9d

0,9d

2

0,9d

3

Modelo total

Parcelas de contribuição de cadaarmadura horizontal até 2d/3

Figura 4 – Modelo de bielas e tirantes proposto baseado em LEONHARDT & MÖNNIG [29]

para consolos curtos com carga vertical

5 ANÁLISE DOS RESULTADOS DAS FORMULAÇÕES PROPOSTAS E EXPERIMENTAIS

O aumento da capacidade resistente dos consolos com armadura de costura em relação

aos que possuem apenas a armadura do tirante pode ser constatado através dos resultados

experimentais da literatura na Figura 5, onde se observa também uma diminuição da resistência

com o crescimento de a/d.

Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

115

200

400

600

800

1 000

0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 1,2 1,4 1,6a/d

V (k

N)

1. Consolos sem arm. costura 2. Consolos com arm. costura

1

2

Figura 5 – Valores experimentais da força última versus relação a/d

Desta forma, foi feita a aplicação do modelo de atrito-cisalhamento adaptado e das duas

formulações propostas de biela e tirante para os consolos sem e com armadura de costura e, para

esses últimos, efetuou-se o cálculo da resistência sem e com a contribuição da armadura de

costura até 2d/3. No caso da força última definida pelo esmagamento do concreto do modelo de

atrito cisalhamento, adotou-se o menor valor da Expressão (2).

Como são feitas comparações com resultados experimentais, os coeficientes de

segurança de todos os modelos teóricos não foram considerados. Portanto, a resistência do

concreto e a tensão de escoamento do aço foram consideradas com os valores médios fornecidos

pelos ensaios.

Analisando-se inicialmente os consolos sem armadura de costura, cujos resultados

experimentais e teóricos considerando o Estado Limite Último de ruptura por escoamento do

tirante são apresentados na Figura 6, a maioria dos pontos referentes ao modelo de atrito-

cisalhamento que se situaram na região inferior à curva experimental estão compreendidos em

valores menores da relação a/d, o que sugere que a predominância da força devido ao atrito na

interface consolo-pilar nos consolos muito curtos. Já para os consolos curtos, a força oriunda do

escoamento do tirante das formulações propostas de biela e tirante passa a ser preponderante,

conforme a observação dos pontos situados próximos da curva experimental para valores

maiores de a/d. Contudo, para relações menores de a/d, a Proposta II forneceu resistências

sistematicamente maiores que as da Proposta I, com uma distância maior, conseqüentemente, da

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

116

curva experimental.

200

400

600

800

1 000

1 200

1 400

0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 1,2 1,4 1,6a/d

V (k

N)

1. Experimental 2. Atrito - Escoam. tirante 3. Proposta I - Escoam. tirante 4. Proposta II - Escoam. tirante

1

2

3

4

Figura 6 – Resultados teóricos versus experimentais para os consolos sem armadura de costura: Estado Limite Último de ruptura por escoamento do tirante

Como ambos os modelos de atrito-cisalhamento e biela e tirante exigem a verificação

do Estado Limite Último de ruptura do concreto, apresenta-se a resistência segundo o seu

esmagamento na Figura 7.

Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

117

200

400

600

800

1 000

1 200

1 400

0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 1,2 1,4 1,6a/d

V (k

N)

1. Experimental 2. Atrito - Esmag. concreto 3. HAGBERG - Esmag. concreto 4. Proposta I - Esmag. cooncreto 5. Proposta II - Esmag. cooncreto

1

3

45

2

Figura 7 – Resultados teóricos versus experimentais para os consolos sem armadura de costura: Estado Limite Último de ruptura por esmagamento do concreto

Da mesma forma que no escoamento das armaduras, a curva teórica do modelo de

atrito-cisalhamento ficou acima da experimental para valores maiores de a/d, devendo ser

utilizado, portanto, apenas para consolos muito curtos. A proposta adaptada de HAGBERG [3],

considerando a largura da biela proporcional à largura aap do apoio, forneceu forças últimas

superiores às das Propostas I e II e aos valores experimentais na maioria, sugerindo ainda que a

ruptura pelo esmagamento do concreto não aconteceria para valores muito elevados de aap.

Desta forma, recomenda-se adotar o procedimento das duas formulações propostas.

O menor valor teórico é apresentado com o intuito de ilustrar que, apesar de algumas

curvas teóricas terem apresentado alguns trechos com valores maiores que os experimentais, o

cálculo pelos modelos de cálculo propostos induziu a resultados a favor da segurança. Para os

consolos muito curtos, esse menor valor teórico é definido pelo modelo de atrito-cisalhamento

adaptado e por uma das formulações de biela e tirante proposta, ambos considerando os Estados

Limites Últimos de ruptura por escoamento das armaduras e por esmagamento do concreto, pois

parece razoável admitir que esses consolos apresentam tanto uma parcela resistente devido ao

corte da interface pilar-consolo como outra devido à flexão do modelo. No caso dos consolos

curtos, considerou-se apenas o modelo de biela e tirante com os dois Estados Limites Últimos.

Nas Figuras 8 e 9, são apresentadas a curva experimental, as dos modelos de atrito-cisalhamento

juntamente com as Propostas I e II, respectivamente, e a curva definida pelos menores valores

teóricos. Observa-se que essa última curva ficou situada abaixo da curva experimental.

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

118

200

400

600

800

1 000

1 200

1 400

0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 1,2 1,4 1,6a/d

V (k

N)

1. Experimental 2. Atrito - Escoam. tirante 3. Atrito - Esmag. concreto 4. Proposta I - Escoam. tirante 5. Proposta I - Esmag. concreto 6. Menor valor teórico

6

1

23

4

5

Figura 8 – Resultados teóricos versus experimentais para os consolos sem armadura de costura: Modelo de atrito-cisalhamento versus Proposta I

200

400

600

800

1 000

1 200

1 400

0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 1,2 1,4 1,6a/d

V (k

N)

1. Experimental 2. Atrito - Escoam. tirante 3. Atrito - Esmag. concreto 4. Proposta II - Escoam. tirante 5. Proposta II - Esmag. concreto 6. Menor valor teórico

1

23

4

5

6

Figura 9 – Resultados teóricos versus experimentais para os consolos sem armadura de costura: Modelo de atrito-cisalhamento versus Proposta II

Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

119

Vale salientar que em poucos consolos a menor resistência teórica foi superior à

experimental e que as curvas expressam uma tendência exponencial de acordo com determinado

número de pontos. O fato da força devido ao escoamento do tirante para alguns consolos com

apenas armadura do tirante ter sido superior ao valor experimental não invalida as propostas,

mesmo porque a maioria desses modelos apresentou resultados a favor da segurança quando

analisados pelos dois Estados Limites Últimos. No caso da Proposta I, apenas 6% desses

consolos tiveram sua menor resistência teórica com valor acima da experimental, onde desses,

somente 3 consolos apresentaram diferenças entre 10% e 20% em relação aos resultados

experimentais. Já para a Proposta II, 9% dos consolos com armadura do tirante tiveram sua

resistência superestimada, com 8 consolos mostrando diferenças entre 10% e 20% referentes aos

valores experimentais.

Nas Figuras 10 e 11, são apresentados os resultados do grupo de consolos com

armadura de costura segundo o Estado Limite Último de ruptura por escoamento das armaduras.

Considerando apenas a armadura do tirante, a linha de tendência do modelo de atrito-

cisalhamento apresentou resultados a favor da segurança para relações a/d menores que 0,8,

aproximadamente. A partir daí, os resultados teóricos superaram os experimentais. Já quando se

adiciona a contribuição da armadura de costura, o modelo de atrito-cisalhamento torna-se menos

conservador, com resistências menores que as experimentais para relações a/d menores que 0,5,

aproximadamente. Ou seja, torna-se apropriado para consolos muito curtos. No caso das

Propostas I e II, constata-se uma redução significativa do conservadorismo através da

aproximação maior entre as curvas teóricas e experimentais quando no cálculo também é levada

em conta a contribuição da armadura de costura até 2d/3. No caso da Proposta II, o

comportamento das linhas de tendência foi bastante semelhante ao da Proposta I, porém

fornecendo resultados um pouco menos conservadores.

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

120

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1 000

0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1 1,1a/d

V (k

N)

1. Experimental 2. Atrito - Escoam. tirante 3. Atrito - Escoam. todas as armaduras 4. Proposta I - Escoam. tirante 5. Proposta I - Escoam. todas as armaduras1

2

3

4

5

Figura 10 – Resultados teóricos versus experimentais para os consolos sem armadura de costura: Estado Limite Último de ruptura por escoamento do tirante utilizando o Modelo

Adaptado de Atrito-Cisalhamento e a Proposta I

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1 000

0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1 1,1a/d

V (k

N)

1. Experimental 2. Atrito - Escoam. tirante 3. Atrito - Escoam. todas as armaduras 4. Proposta II - Escoam. tirante 5. Proposta II - Escoam. todas as armaduras

1

2

3

45

Figura 11 – Resultados teóricos versus experimentais para os consolos sem armadura de costura: Estado Limite Último de ruptura por escoamento do tirante utilizando o Modelo

Adaptado de Atrito-Cisalhamento e a Proposta II

Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

121

No caso do Estado Limite Último de ruptura por esmagamento do concreto, mostra-se

nas Figuras 12 e 13, o modelo de atrito e cisalhamento versus as Propostas I e II, considerando

apenas a armadura do tirante (neste caso, utiliza-se a altura útil d1), e levando em conta também,

a contribuição da armadura de costura (onde se usa a altura útil d* da treliça resultante).

Observa-se que para o modelo de atrito-cisalhamento, a consideração da armadura de costura

diminuiu as diferenças com os resultados experimentais para relações a/d menores que 0,65,

aproximadamente, pois mesmo considerando-se uma altura útil menor d*, a armadura de costura

aumenta a resistência do consolo através de sua força de escoamento na Expressão (10a). Já no

caso da Proposta II, a utilização da altura útil d* na Equação (24) leva a resultados mais

conservadores; e considerando a Proposta I, ainda adiciona-se a influência de um valor de a*

maior e z* menor na Equação (16), que diminui, conseqüentemente, a resistência teórica da

peça. Entretanto, como a influência da armadura de costura, no caso do Estado Limite Último de

ruptura por esmagamento do concreto, ainda não é bem comprovada experimentalmente,

recomenda-se considerar apenas a armadura do tirante no cálculo da força última pelas

Equações (10), (16) e (24).

A consideração da projeção da largura do apoio aap como limitante da largura da biela

hbie, no caso dos consolos com armadura de costura, também conduz a forças últimas mais

elevadas que a Proposta I, como mostra a Figura 14. Conforme seus resultados acima dos

experimentais, o modelo adaptado de HAGBERG [3] indica também que a ruptura do consolo

não poderia ser governada pelo esmagamento da biela comprimida quando a largura do apoio

aap fosse muito grande.

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

122

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1 000

0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1 1,1a/d

V (k

N)

1. Experimental 2. Atrito - Esmag. concreto (d1) 3. Atrito - Esmag. concreto (d*) 4. Proposta I - Esmag. cooncreto (d1) 5. Proposta I - Esmag. cooncreto (d*)1

2

3

4

5

Figura 12 – Resultados teóricos versus experimentais para os consolos com armadura de costura: Estado Limite Último de ruptura por esmagamento do concreto utilizando o Modelo

Adaptado de Atrito-Cisalhamento e a Proposta I

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1 000

0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1 1,1a/d

V (k

N)

1. Experimental 2. Atrito - Esmag. concreto (d1) 3. Atrito - Esmag. concreto (d*) 4. Proposta II - Esmag. cooncreto (d1) 5. Proposta II - Esmag. cooncreto (d*)

1

23

4

5

Figura 13 – Resultados teóricos versus experimentais para os consolos com armadura de costura: Estado Limite Último de ruptura por esmagamento do concreto utilizando o Modelo

Adaptado de Atrito-Cisalhamento e a Proposta II

Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

123

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1 000

0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1 1,1a/d

V (k

N)

1. Experimental 2. HAGBERG - Esmag. concreto (d1) 3. HAGBERG - Esmag. concreto (d*) 4. Proposta I - Esmag. cooncreto (d1) 5. Proposta I - Esmag. cooncreto (d*)

1

2

3

4

5

Figura 14 – Resultados teóricos versus experimentais para os consolos com armadura de costura: Estado Limite Último de ruptura por esmagamento do concreto utilizando o Modelo

Adaptado de HAGBERG [3] e a Proposta I

A verificação dos dois Estados Limites Últimos de ruptura é comprovada através das

Figuras 15 e 16 com a linha de tendência dos menores valores teóricos, que ficou situada abaixo

da curva experimental para as duas propostas desse trabalho. Os resultados foram a favor da

segurança em quase a totalidade dos consolos analisados, com exceção de dois consolos que

apresentaram resistências teóricas superiores às experimentais, um com diferença abaixo de

10% e no outro a diferença foi inferior a 20% em relação ao valor experimental, considerando

as duas propostas. Desta forma, ocorre uma economia significativa com a consideração da

parcela de resistência da peça oriunda do escoamento da armadura de costura.

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

124

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1 000

0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1 1,1a/d

V (k

N)

1. Experimental 2. Atrito - Escoam. todas as armaduras 3. Atrito - Esmag. concreto (d1) 4. Proposta I - Escoam. todas as armaduras 5. Proposta I - Esmag. concreto (d1) 6. Menor valor teórico

1

2

34

5 6

Figura 15 – Resultados teóricos versus experimentais para os consolos com armadura de costura: Modelo Adaptado de Atrito-Cisalhamento versus Proposta I

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1 000

0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1 1,1a/d

V (k

N)

1. Experimental 2. Atrito - Escoam. todas as armaduras 3. Atrito - Esmag. concreto (d1) 4. Proposta II - Escoam. todas as armaduras 5. Proposta II - Esmag. concreto (d1) 6. Menor valor teórico

1

2

3

4

5

6

Figura 16 – Resultados teóricos versus experimentais para os consolos com armadura de costura: Modelo Adaptado de Atrito-Cisalhamento versus Proposta II

Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

125

Considerando a Figura 17, observa-se que a Proposta II fornece resultados menos

conservadores que a Proposta I; entretanto, considerando apenas o escoamento das armaduras, a

força última teórica pela Proposta II foi maior que a experimental em mais consolos que no caso

da Proposta I. Desta forma, recomenda-se o uso da Proposta I, que já proporciona uma boa

economia nos consolos.

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1 000

0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1 1,1a/d

V (k

N)

1. Experimental 2. Proposta I - Escoam. todas as armaduras 3. Proposta I - Esmag. concreto (d1) 4. Proposta II - Escoam. todas as armaduras 5. Proposta II - Esmag. concreto (d1)

1

2

3

4

5

Figura 17 – Resultados teóricos versus experimentais para os consolos com armadura de costura: Proposta I versus Proposta II

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÕES

O comportamento do consolo está diretamente interligado com sua relação a/d, a qual

subdivide o seu cálculo segundo três modelos: atrito-cisalhamento para consolos muito curtos

( 5,0d/a < ), biela e tirante para consolos curtos ( 0,1d/a5,0 ≤≤ ) e teoria de vigas para

consolos longos ( 0,2d/a0,1 << ). Dentre outros parâmetros, existe a grande influência da

armadura de costura no comportamento quanto à resistência, ductilidade e fissuração do

consolo.

A validade das duas formulações propostas e da adaptação do modelo de atrito-

cisalhamento foi testada através de suas aplicações em 245 consolos com valores experimentais

da literatura, sendo 160 contendo apenas a armadura principal do tirante e 85, tendo além desta,

armadura de costura.

O aumento da armadura de costura proporcionou um crescimento significativo da

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

126

resistência dos consolos, o que pôde ser observado experimentalmente e teoricamente.

A Proposta I, aplicada juntamente com o modelo de atrito-cisalhamento aos consolos

muito curtos, superestimou a resistência em 4 consolos, os quais possuíam apenas armadura do

tirante. Já a Proposta II forneceu resultados teóricos acima dos experimentais em 6 consolos

muito curtos, os quais também continham apenas armadura do tirante.

A grande maioria dos consolos curtos (91%) apresentou resultados a favor da

segurança, quando calculados pela Proposta I. Considerando a Proposta II, em 89% dos

consolos curtos os resultados teóricos foram favoráveis. Destes consolos curtos, apenas 2 com

armadura de costura tiveram sua resistência superestimada quando calculada pelas duas

propostas.

As pequenas diferenças entre as resistências teóricas e experimentais dos consolos

analisados podem ainda ser compensadas pela adoção dos coeficientes de segurança e de outras

recomendações adicionais da NBR-9062/85 [1]. Portanto, os procedimentos apresentados nesse

trabalho fornecem indicações para um dimensionamento racional e seguro de consolos curtos e

muito curtos.

Apesar da Proposta I ter fornecido bons resultados para todos os consolos com relação

a/d superior à unidade e, no caso da Proposta II, constatou-se resultados a favor da segurança

para 12 dos 14 consolos longos analisados, esses procedimentos de cálculo não devem ser

aplicados para esse tipo de consolo, mesmo porque o número de peças verificadas foi muito

pequeno.

Nesse trabalho, fez-se a verificação da capacidade resistente do consolo. Na prática,

onde o dimensionamento consiste no processo inverso, não se dispõe da armadura e tem-se o

valor da força atuante. Nesse caso, pode-se utilizar um procedimento iterativo, considerando-se

primeiramente apenas a armadura do tirante, depois se retirando uma parcela desta para fazer

parte da armadura de costura e fazendo-se a posterior verificação da força.

No dimensionamento de consolos, ambas as parcelas referentes ao modelo de atrito-

cisalhamento e ao modelo de biela e tirante influem na resistência do consolo muito curto,

devendo-se adotar, portanto, a maior das armaduras calculadas. Já no caso, do consolo curto,

considera-se apenas o modelo de biela e tirante. Além disso, deve ser sempre considerada a

possibilidade de ruptura do concreto.

7 AGRADECIMENTOS

A FAPESP, pelo apoio financeiro da bolsa de doutorado e do auxílio-pesquisa.

Análise da capacidade resistente de consolos de concreto armado considerando a contribuição...

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

127

8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR-9062 - Projeto e execução de estruturas de concreto pré-moldado. Rio de Janeiro: ABNT, 1985. CHAKRABARTI, P. R.; FARAHANI, D. J. Further study of reinforced concrete corbels. Civil Engineering for Practicing and Design Engineers. Pergamon Journals, v.5, p.985-1002, 1986. EL DEBS, M. K. Concreto pré-moldado: fundamentos e aplicações. 1. ed. São Carlos: EESC-USP, 2000. FATTUHI, N. I. Column-load efect on reinforced concrete corbels. Journal of Structural Engineering, v.116, n.1, p.188-197, Jan., 1990. FATTUHI, N. I. Reinforced concrete corbels made with high-strength concrete and various secondary reinforcements. Journal of the Structural Division, v.91, n.S37, p.376-383, July/Aug., 1994. FATTUHI, N. I. SFRC corbel tests. ACI Structural Journal, p.119-123, Mar/Apr., 1987. FATTUHI, N. I. Strength of FRC corbels in flexure. Journal of Structural Engineering, v.120, n.2, p.360-377, Feb., 1994. FATTUHI, N. I. Strength of FRC corbels subjected to vertical load. Journal of Structural Engineering, v.116, n.3, p.701-718, Mar., 1990. FATTUHI, N. I.; HUGHES, B. P. Ductility of R.C. corbels containing either steel fibers or stirups. ACI Structural Journal, v.86, n.6, p.644-651, Nov/Dec., 1989. FATTUHI, N. I.; HUGHES, B. P. Reinforced steel an polypropylene fiber concrete corbel tests. The Structural Engineer, v.67, n.4, p.68-72, Feb., 1989. FATTUHI, N. I.; HUGHES, B. P. Reinforced steel fiber concrete corbels with various shear span-to-depth ratios. ACI Materials Journal, v.86, n.6, p.590-596, Nov/Dec., 1989. FERNANDES, G. B. Behavior of reinforced high-strength concrete corbels - Experimental Investigation and Design Model. In: CANMET/ACI INTERNATIONAL CONFERENCE ON HIGH-PERFORMANCE CONCRETE AND PERFORMANCE AND QUALITY OF CONCRETE STRUCTURES, 2., Gramado, 1999. Proceedings... Farmington Hills, ACI. p.445-462. 1999. FERNANDES, R. M.; EL DEBS, M. K. Contribuições aos modelos de cálculo para consolos curtos e muito curtos de concreto-armado. Engenharia - Estudo e Pesquisa, v.5, n.1, p.17-31, Jan/Jun., 2002. FRANZ, G. Stützenkonsolen. Beton und Stahalbetonbau, n.4, p.95-102, 1976. FRANZ, G.; NIEDENHOFF, H. Die bewehrung von konsolen und gedrungenen balken. Beton und Stahalbetonbau, v.58, n.5, p.112-120, 1963. HAGBERG, T. Design of concrete brackets: on the application of the truss analogy. ACI Journal, p.3-12, Jan/Feb., 1983. HERMANSEN, B. R.; COWAN, J. Modified shear-friction theory for bracket design. ACI

Rejane Martins Fernandes & Mounir Khalil El Debs

Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 7, n. 25, p.103-128, 2005

128

Journal, p.55-61, Fev., 1974. KRIZ, L. B.; RATHS, C. H. Connections proposals for reinforced concrete corbes. PCI Journal, v.10, n.1, p.16-61, Fev., 1965. LEONHARDT, F.; MÖNNIG, E. Construções de concreto: princípios básicos sobre armação de estruturas de concreto armado. v.3, 1.ed. Rio de Janeiro: Interciência, 1977. MACHADO, C. P. (1998). Consolos curtos e muito curtos de concreto armado. São Paulo. Tese (Doutorado) – Escola Politécnica - Universidade de São Paulo. MATTOCK, A. H.; CHEN, K. C.; SOONGSWANG, K. The behaviour of reinforced concrete corbels. PCI Journal, v.21, n.2, p.52-77, Mar/Apr., 1976. MAUTONI, M. (1972). Blocos sobre dois apoios: concreto armado. São Paulo. 89p. Tese (Doutorado) – Escola Politécnica - Universidade de São Paulo. NAEGELI, C. H. (1988). Estudo experimental de consolos em concreto armado. Rio de Janeiro. 277p. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. NAEGELI, C. H. (1997). Estudo de consolos de concreto armado. Rio de Janeiro. 224p. Tese (Doutorado) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. REIS, A. P. A.; TORRES, F. M. (1996). Estudo experimental de consolos em concreto armado. Goiânia. Universidade Federal de Goiás - Escola de Engenharia Civil. (Projeto Final de Curso). ROBINSON, J. R. Éléments constructifs spéciaux du béton armé. Paris: Eyrolles, 1975. TORRES, F. M. (1998). Análise teórico-experimental de consolos de concreto armado. São Carlos. 95p. Dissertação (Mestrado) – Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo. YONG, Y. K.; BALAGURU, P. Behavior of reinforced high-strength concrete corbels. Journal of Structural Engineerings, v.120, n.4, p.1182-1201, Jan/Feb., 1994. YONG, Y. K.; McCLOSKEY, D. H.; NAWY, E. G. Reinforced corbels of high-strength concrete. ACI SP-87 – High-strength concrete, Detroit, Michigan, 1985. ACI. p.197-212., 1985. ZELLER, W. Conclusions from tests on corbels. In: IABSE COLLOQUIUM. Stutgart, 1991. Proceedings... p.577-582, Apr., 1991.