Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

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1 CIÊNCIA POLITICA E DIREITO CONSTITUCIONAL Introdução O facto político Aula: n.º 1 É comum dizer-se que a vida em sociedade é o modo natural em que ocorre a existência da espécie humana. Os indivíduos mantêm entre si, desde crescimento até à morte, mútuas relações de colaboração e de dependência. A divisão do trabalho conduziu a que cada um de nós possa beneficiar a cada momento do esforço de muitos milhões dos nossos semelhantes. Cada um de nós é logo ao nascer herdeiro de uma civilização e de uma cultura, que nos foram legadas por gerações anteriores, proporcionando-nos a utilização de bens, instrumentos e noções de adopção de um sistema de princípios, convenções e normas já antes experimentados e que norteiam a nossa conduta. Há vários modos de convivência social, ou seja, os vínculos sociais a que estamos sujeitos podem assumir várias formas. Pode-se, desde logo, referir a família, depois a aldeia ou cidade, a sociedade religiosa; a sociedade profissional; a sociedade política ou Estado; a sociedade internacional. Estas formas podem dividir-se em duas grandes classes, segundo a classificação de Max Weber 1 : as associações e as comunidades. Comunidades – Quando os indivíduos se encontram integrados nessas formas de sociedade por mero facto do nascimento, ou por acto que não tem por fim directo aderir a elas. Elas existem, independentemente da vontade dos seus membros. Exemplo: a família, o meio profissional, a nação, o meio residencial, etc. Associações – Quando resultam da união dos indivíduos, que a elas resolvam aderir por serem criadas pela sua vontade e podendo delas sair, quando quiserem. Exemplo: Clube desportivo; uma irmandade religiosa; uma sociedade comercial, etc. 1 Este grande sociólogo alemão escreveu o livro Wirtschaft und Gesellschaft ( Economia e Sociedade) que é uma das obras fundamentais da Sociologia Moderna. Max Weber retomou a distinção do sociólogo Tonnies (1877 no seu livro Gemeinschaft und Gesellschaft – Comunidade e Sociedade ), embora propondo outro método de distinção. Para Weber a comunidade seria resultante do sentimento subjectivo (origem emotiva, afectiva ou tradicional) que os indivíduos têm para constituir um todo; ao passo que a associação resultaria da vontade orientada por motivos racionais que leva os indivíduos a juntarem-se para compensarem os seus interesses ou para alcançarem um determinado fim. In Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, Marcelo Caetano, Almedina, 6ª ed., Coimbra 2003, pg 3

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CIÊNCIA POLITICA E DIREITO CONSTITUCIONAL

Introdução

O facto político

Aula: n.º 1

É comum dizer-se que a vida em sociedade é o modo natural em que ocorre a existência

da espécie humana. Os indivíduos mantêm entre si, desde crescimento até à morte,

mútuas relações de colaboração e de dependência.

A divisão do trabalho conduziu a que cada um de nós possa beneficiar a cada momento

do esforço de muitos milhões dos nossos semelhantes. Cada um de nós é logo ao nascer

herdeiro de uma civilização e de uma cultura, que nos foram legadas por gerações

anteriores, proporcionando-nos a utilização de bens, instrumentos e noções de adopção

de um sistema de princípios, convenções e normas já antes experimentados e que

norteiam a nossa conduta.

Há vários modos de convivência social, ou seja, os vínculos sociais a que estamos

sujeitos podem assumir várias formas. Pode-se, desde logo, referir a família, depois a

aldeia ou cidade, a sociedade religiosa; a sociedade profissional; a sociedade política ou

Estado; a sociedade internacional. Estas formas podem dividir-se em duas grandes

classes, segundo a classificação de Max Weber1: as associações e as comunidades.

Comunidades – Quando os indivíduos se encontram integrados nessas formas de

sociedade por mero facto do nascimento, ou por acto que não tem por fim directo aderir

a elas. Elas existem, independentemente da vontade dos seus membros. Exemplo: a

família, o meio profissional, a nação, o meio residencial, etc.

Associações – Quando resultam da união dos indivíduos, que a elas resolvam aderir por

serem criadas pela sua vontade e podendo delas sair, quando quiserem. Exemplo: Clube

desportivo; uma irmandade religiosa; uma sociedade comercial, etc.

1 Este grande sociólogo alemão escreveu o livro Wirtschaft und Gesellschaft ( Economia e Sociedade) que é uma das obras fundamentais da Sociologia Moderna. Max Weber retomou a distinção do sociólogo Tonnies (1877 no seu livro Gemeinschaft und Gesellschaft – Comunidade e Sociedade ), embora propondo outro método de distinção. Para Weber a comunidade seria resultante do sentimento subjectivo (origem emotiva, afectiva ou tradicional) que os indivíduos têm para constituir um todo; ao passo que a associação resultaria da vontade orientada por motivos racionais que leva os indivíduos a juntarem-se para compensarem os seus interesses ou para alcançarem um determinado fim. In Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, Marcelo Caetano, Almedina, 6ª ed., Coimbra 2003, pg 3

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Ponto comum a essas formas de sociedade é que elas têm uma razão de ser que

impõem aos respectivos membros, através de deveres e colaboração na obra comum e

deveres de se absterem da prática de actos que prejudiquem os interesses do grupo. De

facto, para atingir certos objectivos o grupo tem de ser organizado. Isto significa que os

indivíduos que o integram têm de se submeter a uma autoridade que representa o

interesse colectivo, tendo por objectivo a realização dos fins sociais do grupo. A

organização implica a existência de normas ou regras de conduta (disciplina). Essa

disciplina tem de ser mantida por normas jurídicas que formam o direito, que disciplina

os grupos.2

No sentido lato de "POLÍTICO" cabem todas as formas de organização social

humana. Desde as mais primárias (família, sindicato, associação, etc...) às mais

globais:

• sociedades primarias: (família, igreja, sindicato, etc...) em que os homens se

agregam constituem grupos com fins próprios, mas fins específicos e

particularizados;

• sociedade global: prossegue um fim superior, uma finalidade que engloba e

supera os fins das sociedades particularizadas - chamado bem comum.

• A sociedade global surge da própria necessidade de compatibilizar os fins

múltiplos e próprios e mesmo contraditórios das sociedades primitivas, a

fim de superar as divergências, evitar conflitos, e integrá-los num objectivo

comum.

Aula 2 29/09/06

O poder

Chama-se poder à possibilidade de impor aos outros o respeito da própria conduta ou de

traçar a conduta alheia de forma eficaz. O PODER manifesta-se na potencialidade de

alguém impor aos outros um determinado comportamento - o respeito pela

"ordem".

Existe poder sempre que alguém tem a possibilidade de fazer acatar a sua própria

vontade aos outros, ou obrigando os outros a fazer o que ele queira.

2 Todo o grupo social organizado tem a sua disciplina que é mantida por normas jurídicas que formam o direito social, institucional ou disciplinar desse grupo.

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Aristóteles distinguia poder paterno, poder despótico e poder político em função

do interesse prosseguido por quem exerce o poder;

Locke distinguia os mesmos poder paterno, poder despótico e poder político, mas

em função do fundamento do poder que é exercido;

Finalmente, Bobbio distingue antes poder económico, poder ideológico e poder

político, em função dos meios que são utilizados para condicionar o

comportamento do outro.

O poder, enquanto forma de imposição de uma ordem que permita a gestão dos

recursos necessariamente finitos ao dispor de uma sociedade, é essencial à sua

própria preservação.

A possibilidade de impor aos outros o respeito da própria conduta traduz a ideia de

liberdade, num dos sentidos deste termo. A possibilidade de traçar e impor a conduta

alheia constitui autoridade.3

• Poder de facto (força)

• Poder legítimo (reconhecimento)

• Poder social (necessidade organização)

• Poder político (sociedade política – res-publica)

• Poder político (Marcelo Caetano “poder de domínio)

Para o Professor Marcelo Rebelo de Sousa é um «poder de injunção dotado de

coercibilidade material», ou seja, «um poder de natureza vinculativa marcado pela

susceptibilidade de imposição, quer pelo uso da força física, quer da supressão, não

resistível, de recursos vitais».

Esse conceito de poder abrange, quer o poder de facto que assenta na força, quer o

poder legítimo que resulta do reconhecimento por aqueles a quem se dirige de que

ele actua de acordo com uma lei ou norma de acatamento geral. Importa para o

presente estudo o poder legítimo que pode ser reconhecido a uma colectividade ou

a um indivíduo.

Na formação de uma colectividade, está implícita a necessidade de disciplina. Em

cada sociedade, há portanto uma norma fundamental que autoriza a definir as normas de

conduta aos seus membros em todo o que diga respeito à conservação dessa sociedade e

á realização dos seus fins. Se um grupo social tem autoridade para estabelecer

3 Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, Marcelo Caetano, Almedina, 6ª ed., Coimbra 2003, pg 5

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normas de conduta dos seus membros, obrigatórias sob pena de aquele que

desobedecer sofrer um castigo, e tem liberdade para actuar, então esse grupo

possui poder.

O poder social é exercido por toda a colectividade ou, na maioria dos casos, por alguns

dos seus membros a quem seja reconhecida a qualidade de representante. O poder

social é uma consequência necessária da organização das sociedades primárias

(parentesco, vizinhança, profissão, etc). Ele surge porque elas existem e precisam de

se organizar.

Ao contrário a sociedade politica não existe antes do poder politico existir. A

sociedade política surgiu porque houve necessidade de superar diferenças e hostilidades

entre as sociedades primárias e por isso os homens criaram grupos mais amplos em que

essas sociedades primárias colaborassem e se obrigassem a deveres comuns e a regras

gerais de conduta, tendo por base a existência de um interesse geral superior a todos os

outros: a res-publica.4

A sociedade politica tem um carácter de comunidade e a sua razão de ser é o

exercício do poder político, entendido este como a autoridade da colectividade

sobre cada um dos seus membros, traduzida pela imposição de um direito comum

ao qual, todos queiram ou não, têm de se submeter. Como refere Marcelo Caetano

“ o poder político é um irresistível poder de domínio.”5

Em conclusão: as sociedades primárias resultam do impulso da natureza humana;

as sociedades políticas formam-se por decisão voluntária tendo por base interesses

colectivos que superam os interesses particulares e sob a instituição de um poder

político caminham numa direcção comum. A função deste poder político é

subordinar os interesses particulares ao interesse geral, segundo princípios

racionais de justiça que se traduzem em um Direito Comum da sociedade política

que engloba as sociedades primárias.

4 A sociedade politica é uma sociedade complexa que torna possível a convivência jurídica, entre os membros das várias sociedades primárias, graças à existência de um direito comum a todos eles, ou seja, acima dos interesse particulares ou restritos dos grupos sociais primários, eleva-se e afirma-se um interesse geral superior a todos os outros: a “res publica” (coisa pública). 5 Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, Marcelo Caetano, Almedina, 6ª ed., Coimbra 2003, pg 7. “Esse poder apoia-se na possibilidade do emprego da coacção que a sociedade política reivindica com superioridade sobre as outras formas sociais, tendendo mesmo a monopolizá-la. “

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O poder político define um Direito Comum a todos os membros da sociedade

política, com meios de coacção superiores aos das sociedades primárias, dispondo

de meios eficazes de empregar a coacção para punir os desobedientes.

Facto Político

Noção de facto politico - chamaremos facto ou fenómeno politico a todo e

qualquer acontecimento ligado à instituição, à existência e ao exercício do poder

politico.

Os factos ou fenómenos políticos podem ser objecto de estudo de acordo com métodos

próprios e diferentes ópticas por parte de várias disciplinas: a Sociologia política, a

História política, a Filosofia politica e a Ciência politica. Todas estas disciplinas têm um

objecto comum: o facto político.

À sistematização dos resultados do estudo das várias disciplinas que visam o

conhecimento do facto político pode chamar-se Ciência Política, em sentido amplo.

A Ciência Política é indispensável ao estudo do Direito Constitucional que é

formado por normas jurídicas reguladoras de factos políticos.

CIÊNCIA POLÍTICA

Conceito de ciência politica – este conceito tem sido objecto de muita discussão.

Desde logo porque os próprios vocábulos: política e político podem surgir com

significados diferentes.

Conceito restrito – é a disciplina que estuda as manifestações, as formas e as

regularidades dos factos políticos em si mesmos ou através do comportamento dos

indivíduos mediante métodos de observação.

Conceito amplo – é uma disciplina que estuda os conhecimentos relativos à

compreensão, explicação e fundamento racional dos factos políticos ordenados e

sistematizados em função do seu objecto e seja qual for o método empregado na sua

obtenção.

A Ciência Política estuda factos sociais através do método da observação, embora não

descure o método histórico e tenha tendência a usar o método comparativo.

De um modo muito simples podemos definir este conceito de Ciência Política, como a

ciência que procura ordenar, sistematizar e dar a conhecer a realidade politica. Ela

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estuda as leis que presidem ao funcionamento dos sistemas políticos e estuda as causas

com a regularidade dos fenómenos políticos.

Quer a ciência do direito Constitucional, quer a ciência política têm por objecto o

fenómeno político. Contudo a ciência do Direito Constitucional considera a

sociedade política através de normas que se lhe dirigem. Ela debruça-se sobre a

ordem da sociedade e não sobre a sociedade enquanto tal, ao passo que a ciência

politica se volta para os factos no seu desenrolar empírico e funcional. Ela tem por

objecto o Estado como sistema de relações, forças e comportamentos, tendo como pano

de fundo o poder ou a interferência do poder.

Enquanto a ciência do Direito Constitucional se ocupa principalmente da regularidade e

da validade da acção do poder como ciência normativa que é; a ciência política ocupa-se

principalmente da efectividade da acção do poder. Ela é uma ciência não normativa.

A ciência política estuda:

- Os fenómenos políticos em si próprios

- As estruturas governativas

- As estruturas de participação política

- Os sistemas de poder

Portanto a ciência política sobrepõe o seu âmbito ao Direito Constitucional, já que

estuda as estruturas políticas do Estado. A ciência política diz-nos como é na realidade,

o direito constitucional diz-nos como deve ser.

A ciência política é uma ciência descritiva, não normativa, que tem por objecto a

realidade dos factos. O Direito Constitucional é uma ciência normativa que tem por

objecto a realidade das normas.

A ciência política não é uma ciência jurídica, o direito constitucional é uma ciência

jurídica.

As análises feitas pela ciência política ajudam a compreender a realidade política, cuja

ordenação fundamental é estabelecida pela constituição do Estado. O estudo dessa

ciência é indispensável ao estudo do Direito Constitucional que sem ele se alhearia às

questões políticas dos regimes, das ideologias e dos conflitos políticos.

Importante: Não confundir ciência política com política.

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Política – é a actividade desenvolvida para a conquista e a manutenção do poder,

segundo certos ideais que se pretende fazer aceitar e realizar na sociedade. Ela é na

linguagem corrente “a arte de governar”.

Ciência é um sistema de conhecimentos, com ela pretende-se saber. Política é um

conjunto de regras práticas e com ela pretende-se agir.

Uma vez que o fenómeno político é o objecto de estudo da ciência política temos que o

analisar. Há três concepções:

1 – Entende-se o fenómeno político, como fenómeno estadual.

2 – O fenómeno político é menor que o fenómeno estadual.

3 – O fenómeno político é maior que o fenómeno estadual.

1 – Fenómeno político identifica-se com o fenómeno estadual e portanto todo o

fenómeno político é um fenómeno estadual. O fenómeno político desenvolve-se no

quadro estadual e coincide com a concretização das 3 funções estaduais: legislativa,

executiva e judicial.

2 – Fenómeno político menor que o fenómeno estadual: estes autores entendem que

efectivamente todo o fenómeno político é um fenómeno estadual, mas nem todo o

fenómeno estadual é um fenómeno político. Existem funções estaduais que não podem

ser consideradas políticas. A função judicial, segundo eles não seria política, mas

meramente técnica de aplicação do direito. Só as funções legislativa e executiva seriam

políticas por serem inovadoras e dispositivas.

3 – O fenómeno político é mais amplo que o estadual. Hoje, entendem a maioria dos

autores, que o fenómeno político é muito mais amplo do que o fenómeno estadual. A

qualidade do político não é algo definitivamente estabelecido podendo em épocas de

forte tensão social transformar-se em fenómenos políticos, actos como por exemplo: a

abertura de uma escola ou reivindicações e manifestações de um sindicato. Portanto os

fenómenos políticos não se reduzem ao Estado, pois têm em regra uma raiz mais

profunda. Eles abarcam as acções dos partidos e dos grupos de interesse (com a pressão

que tentam influenciar no poder).

Portanto o fenómeno político não se identifica com o estadual abrangendo também a

definição e o funcionamento dos partidos políticos, dos sindicatos, das associações

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patronais, da opinião pública, as manifestações, ou seja todas as forças que podem

influenciar o poder.

De certo modo, poderá dizer-se que no Estado de direito liberal o fenómeno político

se identifica com o estadual.

No Estado social democrático de direito, o fenómeno político é mais amplo que o

estadual, e no Estado autocrático ou ditatorial, o fenómeno político é

tendencialmente total, abrangendo todo o fenómeno social.

Podemos então definir o fenómeno político como aquele que pressupõe uma relação

de poder, uma diferenciação entre governante e governado ou que resulta de um

conflito de interesses tendo em vista, a conquista ou o exercício do poder político.”

O Estado e o Sistema Político

Aceitando como certo que o fenómeno político extravasa o estadual, a moderna ciência

política Norte Americana começou a estudar esses fenómenos enquadrados não na

estrutura do Estado, mas no campo global das actividades políticas de uma sociedade,

ou seja, um sistema político.

Para estudar os fenómenos políticos, David Easton foi o primeiro a aplicar o chamado

modelo sistémico, assumindo que um sistema é um conjunto de variáveis seja qual for o

grau de relação entre elas que se interligam. David Easton definiu o sistema político

como um conjunto de interacções através dos quais, numa certa sociedade, se

realiza a atribuição autoritária de valores.

Para este autor, todos os sistemas políticos, têm um ponto comum: não podem subsistir

se não desempenharem com sucesso as seguintes funções:

1 – Distribuição dos valores numa certa sociedade.

2 – A capacidade de levar a maior parte dos membros dessa sociedade a aceitar que essa

distribuição seja feita por via autoritária, pelo menos durante um maior período de

tempo possível.

Estas duas propriedades distinguem os sistemas políticos de outros sistemas sociais e

constituem as variáveis essenciais de toda a vida política. Sem elas, uma sociedade não

tem qualquer espécie de vida política. Isto levanta as seguintes questões:

1 – Como se processa a distribuição de valores a impor por via da autoridade

2 – Como funciona o sistema político.

Para responder a estas questões, David Easton elaborou a seguinte teoria:

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Ele propõe que se considere o sistema político como uma caixa preta e que ignoremos o

que se passa dentro dessa caixa. Essa caixa contudo, está inserida, ou mergulhada no

meio ambiente (ambiente social) do qual recebe pedidos e apoios, que são os chamados

inputs e outputs.

Os inputs apresentam-se como acções de causas dos fenómenos políticos, podem ser

exigências, pedidos ou apoios. Exemplo: Votos de confiança, moções de censura ao

governo; reivindicações, manifestações contra ou a favor, protestos, etc.

Os outputs são os resultados de efeito que os inputs produzem no sistema político. São

portanto as respostas que o sistema político produz face ás pressões, a fim de

adaptar as estruturas ao meio ambiente.

A resposta do Estado em relação às exigências é feita através das suas funções.

Por sua vez, as modificações do meio ambiente que resultam dos outputs provocam

novos inputs, que entram no sistema através de um mecanismo da retroacção que se

chama feed-back.

David Easton avaliou o sistema político em interacção com o meio ambiente interno e

externo. De facto, o sistema político está mergulhado no meio ambiente que o sujeita a

desafios aos quais deve dar resposta, que são os sistemas exteriores da sociedade global

em análise com os quais ela está presumivelmente em relação, como por exemplo os

sistemas políticos coexistentes, os sistemas supranacionais e os próprios sistemas

ecológicos mundiais. Meio ambiente externo que compreende todos os sistemas

internos inseridos na sociedade global em análise, designadamente por exemplo: o

sistema religioso, o sistema biológico, o sistema social, o sistema psicológico.

No meio ambiente global está inserido o sistema político aberto e em constantes trocas

com o meio ambiente. Em função do carácter aberto do sistema, a análise da corrente

input / output é indispensável juntamente com o conceito de exigências e apoios.

No conceito de exigências de pedidos cabem todas as solicitações do meio ambiente

interno e externo no sentido de atribuir ou negar valores sociais que vão desde as

liberdades e garantias políticas ao tipo de censura, ao sistema de segurança social ou

saúde, aos salários, etc.

O volume das exigências conduz ao conceito de carga e sobrecarga do sistema que

exprimem a medida em que ele pode responder de resistir às exigências. A sobrecarga

pode resultar, quer de uma quantidade excessiva das exigências, quer da sua qualidade

excessiva que não permitem uma resposta antecipada. Desse modo, o sistema político

avalia-se no fundo, como um conjunto de acções que provocam o ajuste constante entre

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as exigências do meio ambiente e a capacidade de resposta do sistema. Esse objectivo

de resposta é procurado pelas seguintes funções:

a) Expressão das exigências

b) Depuração das exigências

c) Agregação das exigências

Expressão das exigências – estas são feitas pelos partidos políticos e pelos grupos de

pressão (ex. sindicatos).

Depuração das exigências – procura seleccionar as que têm significado político e

impedir que outras possam assumir relevância política. O próprio aparelho do poder

procura antecipar as suas intervenções de modo a evitar que as exigências atinjam uma

sobrecarga. Os partidos podem, também, assumir uma função depuradora.

Agregação das exigências – procura fazer convergir para alternativas bem definidas e

limitadas as exigências dispersas no meio ambiente total. Esta função é assumida por

exemplo pelos programas dos partidos e pelos programas do governo.

Por sua vez, os apoios de suporte podem ser de três tipos:

- Apoios à sociedade global

- Apoios ao regime, que são os chamados apoios de manutenção

- Apoios ou suportes de órgãos, que são os apoios à personalidade que exerce a

função de autoridade.

Quanto aos outputs, que engloba a totalidade das respostas do sistema traduzem-se em

normas e acções. As normas dirigem-se imperativamente aos destinatários, as acções

não os atingem directamente mas actuam sobre o meio ambiente condicionando a vida

dos destinatários.

Toda a resposta do sistema acaba por vir a modificar o meio ambiente do sistema

político e desse modo acaba por alterar o fluxo das exigências, estabelecendo assim uma

corrente contínua e infindável de referências em que inputs geram outputs, que por sua

vez geram inputs, que por sua vez geram outputs. Isso chama-se efeito de retroacção ou

feed back.

Na sua globalidade, o sistema político é denominado por duas leis principais:

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1 – Lei da Homcostase – que diz que os sistemas tendem sempre para o equilíbrio

interno, apesar das pressões e dos factores de alteração que causam desestabilização os

outputs contribuem para manter o equilíbrio.

2 – Lei da Entropia – os sistemas tendem para uma ordem e complexidade cada vez

maiores afim de esbater a força dos inputs sobre o centro de decisão. O sistema vai-se

organizando cada vez melhor de uma forma a esbater a pressão e a fazer com que as

exigências (inputs) causem menos desestabilização.

Os MÉTODOS da CIÊNCIA POLÍTICA

- método de uma ciência: os processos mentais, ou lógico-racionais específicos

mediante os quais desenvolve o seu estudo. A sua actividade tende assim a:

- acompanhar o desenrolar dos fenómenos políticos;

- formular hipóteses, com base nos factos políticos apurados;

- procurar comprovar ou confirmar pela experiência as hipóteses que são

formuladas.

- formular tendências que ajudem a compreender e prever os factos políticos.

Método de investigação e análise em ciência política (perspectivas básicas)

O Prof. Adriano Moreira distingue quatro perspectivas básicas:

1 - a perspectiva das tendências individuais

2 - a perspectiva racionalista

a) teoria do processo de formação das decisões,

b) teoria dos jogos

3 - a perspectiva funcionalista

4 - a perspectiva sistémica

Perspectiva das tendências individuais – esta perspectiva funda-se quando na acção

política os homens são individualmente considerados. O que é importante é o estudo do

comportamento dos indivíduos. Esta perspectiva, mesmo quando para além do

indivíduo ela se dedica a analisar o grupo, nunca se preocupa com a escolha consciente

dos objectivos, pois ela centra a sua atenção no homem e não nos objectivos do grupo.

Perspectiva racionalista – esta perspectiva embora se preocupe com a análise do

grupo, preocupa-se também com a definição dos motivos ou dos factores que entram na

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produção da escolha do comportamento político. É uma perspectiva totalizante que para

além de considerar a personalidade básica dos indivíduos ou dos grupos, procura

analisar os objectivos conscientemente. Isto leva a distinguir os objectivos que

pertencem ao domínio da criatividade e as razões que se relacionam com a experiência

acumulada e que se reflecte na personalidade dos agentes políticos considerados a título

individual ou de grupo.

Ao permitir examinar os fenómenos políticos em função das razões e objectivos, a

perspectiva racionalista deu origem a alguns desenvolvimentos metodológicos

conhecidos por processos de formação e decisões dos jogos.

Perspectiva funcionalista – quer a perspectiva das tendências individuais, quer a

perspectiva racionalista inspiram-se no pressuposto que são os homens quem tomam as

decisões políticas e por isso eles colocam em ênfase as variáveis independentes do

ambiente político. A perspectiva funcionalista parte de outro pressuposto: para ela a

explicação dos fenómenos políticos será insuficiente se se limitar a tomar em conta o

comportamento dos agentes políticos a título individual de um grupo e entende que o

comportamento político é essencialmente resultante de uma tensão entre as

exigências e as expectativas que a sociedade global dirige aos agentes políticos e a

capacidade de resposta que elas demonstram no papel de direcção que tiveram.

Segundo esta perspectiva, a acção política é sempre condicionada não apenas pela

personalidade básica do agente, mas também pelo conjunto de funções interdependentes

e conflituantes em que ele se situa.

Perspectiva sistémica – no fundo esta perspectiva sistémica constitui uma tentativa de

síntese de todas as outras perspectivas. A origem deste modelo toma como ponto de

partida um modelo usado na biologia e foi transposto para a ciência política por David

Easton.

TÉCNICAS DE PESQUISA DOS FACTOS POLÍTICOS

As técnicas6 usadas são a análise da observação documental e da observação directa.

6 Devem obedecer aos Princípios da objectividade; da inteligibilidade ou do determinismo e ao princípio

da racionalidade

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1 - a análise documental– as fontes documentais dividem os documentos em directos e

indirectos.

Documentos directos – são todos os documentos que foram emitidos por intervenientes

no processo político.

Documentos indirectos – são os que, embora não tenham origem no processo político,

testemunham a sua actividade no poder político de forma intencional ou acidental.

2 - observação directa

a) observação directa extensiva

b) observação directa intensiva

A observação extensiva - é a que se faz em grandes comunidades sendo portanto mais

extensa mas menos profunda.

A observação directa intensiva – é a que se faz em pequenas comunidades ou em

indivíduos, logo é mais profunda.

Técnicas usadas na observação directa:

A técnica mais usada é a pesquisa por sondagem que abrange três fases essenciais.

- A amostragem

- A elaboração do questionário

- A apresentação dos resultados

Amostragem – consiste em escolher as pessoas a interrogar, escolhendo amostras

representativas da população alvo. Costumam-se usar dois métodos:

- Método das quotas – que consiste em determinar as categorias sociais, com base na

idade, religião, etc.., e em atribuir uma quota a cada entrevistado que vai fazer o

inquérito.

- Método probabilístico – as pessoas que constituem a amostra são escolhidas ao acaso

de forma que todos os membros da população tenham igual probabilidade de ser

inseridos na amostra.

Elaboração do questionário – esta fase começa com a sua elaboração (do questionário)

que tem de ser feito com muito cuidado. A natureza das perguntas e a sua ordem tem

muita importância no resultado da sondagem. Podem-se usar perguntas fechadas (sim

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ou não), ou perguntas abertas (em que o interrogado pode responder sem estar sujeito a

nenhum alternativa).

Depois de elaborado o questionário procede-se á sua aplicação. Esta pode ser feita por

apresentação directa às pessoas (preenchendo elas próprias o questionário) ou através de

um inquiridor que formula as perguntas e preenche o questionário. Quer um, quer outro

têm desvantagens em especial a apresentação directa, pois grande parte das pessoas não

responde ou perde a espontaneidade. A desvantagem na apresentação indirecta é que o

inquiridor pode influenciar o entrevistado.

A apresentação dos resultados – as centenas ou milhares de questionários têm que ser

codificados e ser submetidos a um tratamento mecanográfico próprio e esse tratamento

têm que ser feito com muito cuidado para não deturpar os resultados.

Técnicas usadas na observação directa (outras)

- Entrevista

- A medida das atitudes

- A observação participante

Entrevista – podem ser documentais, contendo informações sobre determinados dados

ou entrevistas de opinião. Podem ser dirigidas a determinadas personalidades políticas,

que se chamam entrevistas com personalidades ou entrevistas vulgares, feitas ao

cidadão comum.

A medida das atitudes – Um dos processos mais vulgares são os testes que servem para

avaliar conhecimentos, opiniões, aptidões das pessoas, etc.

A observação participante – consiste em examinar o grupo em si como colectividade.

Este método implica que o observador se misture de uma forma mais ou menos intensa

na vida dos grupos inserindo-se nas suas actividades.

O Fenómeno Político e o Estado

Estado – pode ser entendido em duas perspectivas:

1 – Estado comunidade – a sociedade de que fazemos parte e onde se exerce um poder

para a realização de fins comuns.

2 – Estado poder – referente ao poder político que se manifesta através de órgãos,

serviço e de relações de autoridade.

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O Estado é uma entidade abstracta que actua através dos seus órgãos e que é objecto de

interesse de várias ciências. Exemplo: Ciência política, ciência do direito constitucional,

a sociologia política, etc.

Segundo Freitas do Amaral, temos três acepções da palavra “Estado”

1 – Sentido internacional – é o Estado soberano, titular de direitos e obrigações na

esfera internacional (o seu objecto de estudo é o direito internacional)

2 – Sentido constitucional – é o Estado comunidade. É a comunidade de cidadãos que

nos termos do poder constituinte que em si própria (comunidade) se atribui e arroga,

assume uma determinada forma política para prosseguir os seus fins nacionais (Ciência

política, direito constitucional)

3 – Sentido administrativo – aqui o Estado é a pessoa colectiva pública, que no seio da

comunidade nacional desempenha sob a direcção do Governo a actividade

administrativa.

A delimitação do conceito jurídico de Estado em sentido político é feita através de três

elementos:

- O povo – elemento humano

- O território7 – elemento territorial

- O poder político – elemento funcional

Este tipo de Estado definido por estes três elementos é apenas um dos tipos possíveis de

Estado que é o Estado soberano nascido na Europa e difundido pelo mundo.

Definição de Estado, segundo Marcelo Caetano: “Estado é um povo fixado num

território de que é senhor e que dentro das fronteiras desse território institui, por

autoridade própria os órgãos que elaboram as leis necessárias á vida colectiva e impõem

a respectiva execução”8.

7 O território abrange o domínio terrestre (solo e subsolo), o domínio marítimo, o domínio fluvial (rios), o

domínio lacustre (lagos) e o domínio aéreo. A aquisição do território pode ser originária ou derivada

(obtida por conquistas) 8 Princípio da legalidade democrática: Todos os Estados estão subordinados à respectiva Constituição que

tem por finalidade organizar e limitar o poder político. Cada Estado, com base na sua Constituição exerce

a função legislativa, produzindo leis às quais fica subordinado. Estes aspectos estão consagrados na nossa

Constituição (art.º 3.º)

Page 16: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

16

Até fins do século XVI, não existia Estado no sentido em que hoje é entendido pois, de

facto, não existia um território fixo, um poder que se exercia sobre o território e não

existia um vínculo de nacionalidade. Só a partir do século XVI, surge o Estado moderno

ou Europeu, no sentido que hoje lhe damos. Este surge em virtude de vários factores e

condições.

Condições espirituais:

1 – A influência do renascimento, a reforma e a contra – reforma.

2 – A passagem da cultura ligada à corte e aos claustros para a cultura de massas.

3 – O espírito científico que começa a ter uma grande importância e que se revolta

contra o regime religioso.

Condições sociais e económicas:

1 – A decadência da nobreza e da aristocracia rural

2 – Os descobrimentos marítimos e a expansão colonial

3 – A ascensão da burguesia

4 – O desenvolvimento do capitalismo

5 – A revolução industrial com o surgir da classe operária, do sindicalismo e dos

conflitos sociais.

Acerca da origem do Estado há várias teses:

1 – Teses naturalistas – que assentam na ideia de o homem é por natureza um ser

gregário que tende a viver em sociedade.

2 – Teses contratualistas - estas teses têm por base uma explicação racionalista com

raízes no renascimento medieval, tendo por substrato a ideia de o homem ser um animal

social com necessidade de viver em comunidade, maior ou menor, de modo a defender-

se melhor e aproveitar as vantagens dessa associação. Para isso, ele reúne-se em

comunidades organizadas, alienando parte dos seus direitos a favor da sociedade geral

em que se integra. Essa incorporação social faz-se através de um contrato social que se

desdobra: por um lado num pacto de união, que é a criação da sociedade organizada e,

por outro, num pacto de sujeição ou submissão, que é a subordinação à vontade da

maioria que escolhe os governantes que vão ditar e fazer executar as regras necessárias

à vida social.

Page 17: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

17

3 – Teses organicistas – que oscilam entre as seguintes vertentes:

- A que entende o estado como uma medida espiritual, ou seja, o espírito do povo.

- A que procura alargar ao domínio jurídico e ao domínio político os esquemas usados

pelos cientistas da natureza que estudam o Estado como um ser vivo.

4 – Tese marxista – para esta tese o Estado surge sem natureza própria perante a

economia, como consequência da sociedade sem classes e uma máquina de domínio de

uma classe sobre as outras.

5 – Teses voluntaristas – o Estado resulta para estas teses de um acto de vontade: de

pequenos grupos ou tribos, ter-se-á passado a outras amplas devido á acção de

indivíduos ou de grupos minoritários, cuja autoridade as massas acabaram por aceitar

com maior ou menor resistência.

6 – Teses Hegelianas – que entende o Estado segundo uma óptica predominantemente

filosófica, vêem o Estado com sendo o espírito objectivo e o indivíduo só como seu

membro que tem objectividade, moralidade e verdade.

Tipos Históricos de Estado

Há várias tipologias9:

Jellinek que distingue entre Estado oriental, Estado Grego, Estado Romano, Estado

medieval e Estado moderno;

Marxista: Estado despótico; Estado esclavagista; Estado feudal; Estado capitalista e

Estado socialista;

Jorge Novais: Estado na fase constitucional e Estado pré-constitucional;

Vamos estudar rapidamente a tipologia de Jellinek:

Estado Oriental

Teocracia, isto é, poder político reconduzido ao poder religioso. O monarca é adorado

como um deus. Há reduzidas garantias jurídicas dos indivíduos, larga extensão

territorial e aspiração a constituir um império universal.

Estado Grego ou polis

O Estado é a comunidade de cidadãos embora existam também os escravos.

9 Pode ser consultado na Enciclopédia Polis uma síntese de Freitas do Amaral, nas pg. 1156-1162

Page 18: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

18

Fundamento da comunidade de cidadãos, inexistência ou deficiência de liberdade fora

do Estado. A pessoa não era um valor em si mesmo, tinha valor ligado só ao poder

político. Pouca importância ao factor territorial (pequena extensão do território; Cidade-

Estado). Diversidade de formas de governo variando de cidade para cidade.

Estado Romano – Século II antes de Cristo ao século IV depois de Cristo.

Desenvolvimento do conceito de poder político como poder supremo e uno, cuja

plenitude pode ou deve ser reservada a uma única origem e a um único detentor.

Consciência da separação entre o Estado (poder público) e o poder privado ( do pater

famílias). Distinção entre direito público e direito privado. São assegurados aos

cidadãos Romanos:

- Direito ao sufrágio

- Direito de contrair casamento legítimo

- Direito de celebrar actos jurídicos comerciais

- Direito a ascender à magistratura

A progressiva atribuição dos direitos aos estrangeiros deu lugar à formação do “ius

gentium”.

Expansão da cidadania num largo espaço territorial, contrastando com o carácter

meramente territorial das monarquias orientais e o carácter pessoal restrito das cidades-

Estado gregas.

O pretenso Estado medieval (Desde o século V até XV)

Durante a Idade Média não é possível considerar a existência de Estado pois a “ ordem

hierárquica da titularidade e exercício do poder político é feita numa relação de

soberanos e vassalos ligados por vínculos contratuais”. Em vez de um conceito de

imperium surge o conceito de dominium, em conexão com os princípios da família e da

propriedade: investidura hereditária; direito de primogenitura; inalienabilidade do

domínio territorial. As comunas, as corporações de mesteres, as universidades, etc.,

cada qual com a sua função formam-se e desenvolvem-se à margem de qualquer

estrutura administrativa organizada. Os direitos não são atribuídos individualmente mas

enquanto membros de um grupo.

Estado moderno ou Estado Europeu (Século XVI até aos dias de hoje)

Page 19: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

19

O Estado moderno vai surgir com a crise do sistema político medieval, podendo

afirmar-se que o processo de criação dos Estados europeus se encontra concluído no

momento de assinatura dos Tratados de Vestefália (1648) que puseram termo à guerra

dos trinta anos. Na base do Estado moderno vai estar o conceito de soberania

desenvolvido por Jean Bodin.

Características:

Estado Nacional, isto é, o Estado tende a corresponder a uma nação ou comunidade

histórica de cultura, deixando de ser o factor de unificação a política, a religião, a raça, a

ocupação bélica.

Secularização ou laicidade – diferenciação entre o temporal e o espiritual; a

comunidade já não tem por base a religião e o poder político não prossegue fins

religiosos.

Soberania – poder supremo dá ao Estado a capacidade para vencer as resistências

internas e permite a afirmação da sua independência em relação aos outros Estados.

O processo de criação do Estado moderno vai implicar: a centralização do poder (acabar

com o poder feudal e com os privilégios atribuídos a determinados estratos sociais;

emancipação política em relação ao Papa e ao Imperador; ligação directa entre o Estado

e o indivíduo (tratamento igual para nobre e plebeu); poder concentrado no Rei com o

surgimento de uma administração burocrática (profissionalizada e hierarquizada).

Na evolução do Estado moderno, os autores fazem algumas distinções de Estado

• Estado corporativo ou estamental (cortes)

Fins do século XV ao século XVII . Estado de transição – O rei tinha o seu poder

limitado pelas ordens.

• Estado absoluto

Máxima concentração de poder no rei. É no rei que se concentra o poder, a palavra do

rei é lei. O rei era escolhido por Deus. O rei exercia o poder religioso, tinha plena

liberdade para atingir os seus fins.

Neste tipo de Estado há o Estado propriamente dito com soberania e há o Fisco,

entidade de direito privado e sem soberania. Só o Fisco entra em relações jurídicas com

os particulares e só contra este ( Fisco) é que os particulares podem reivindicar direitos

subjectivos.

Page 20: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

20

• Estado de Polícia

Estado como uma associação para a consecução do interesse público, devendo o

príncipe, seu órgão ou primeiro funcionário, ter plena liberdade nos meios para o

alcançar.

• Estado Constitucional, representativo ou de direito

Constitucional porque assente numa Constituição que regula a organização e a

relação com os cidadãos, tendente à limitação do poder.

De Governo representativo porque há uma separação entre a titularidade e o

exercício de poder, sendo que a primeira está radicada no povo, na nação ou

colectividade; e o segundo atribuído a governantes eleitos ou representativos da

colectividade( de toda a colectividade e não de grupos como no Estado

estamental)

De Direito porque para garantia dos direitos dos cidadãos se estabelece a divisão

de poder e o respeito pela legalidade ( formal e mais tarde material).

Fases do Estado Constitucional

Após o final da II guerra mundial a evolução do Estado tem de ser compreendida tendo

em consideração os seguintes aspectos:

• Transformação do Estado num sentido democrático, intervencionista, social, em

contraposição com o laissez faire, laissez passer,… liberal;

• Aparecimento e desaparecimento dos regimes autoritários e totalitários;

• Emancipação dos povos coloniais;

• Organização da comunidade internacional e a protecção internacional dos

direitos do homem

Jorge Miranda defende que com o final do século e do milénio se verifica:

1. O desaparecimento de quase todos os regimes autoritários e totalitários;

2. Surgimento desde 1979 de um novo modelo de Estado diverso do Estado

europeu: o Estado do fundamentalismo islâmico em que se unem lei religiosa e

lei civil, poder espiritual e poder temporal;

Page 21: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

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3. Observa-se no Estado social de Direito sintomas de crise: crise do Estado-

providência por causas administrativas, financeiras, comerciais (quebra da

competitividade devido globalização da economia);

4. Degradação da natureza e do ambiente; desigualdades económicas entre países

industrializados e países não industrializados; situações de exclusão social

mesmo nos países mais ricos; manipulação comunicacional (4º poder); cultura

consumista de massas; desaparecimento de certos valores éticos familiares e

políticos.

Estado de Direito Liberal

Assente na ideia de liberdade e, em nome dela, empenhado em limitar o poder político

tanto internamente (pela sua divisão) como externamente (pela redução ao mínimo das

suas funções perante a sociedade). O Estado só teria como única tarefa a garantia da paz

social e da segurança dos bens e das vidas, de forma a permitir o pleno desenvolvimento

da sociedade civil de acordo com as suas próprias leis naturais.

Estado Social de Direito

Reconduz-se a um esforço de aprofundamento e de alargamento simultâneos da

liberdade e da igualdade em sentido social, com a integração política de todas as classes

sociais. Integra-se no modelo do Estado constitucional, representativo ou de Direito,

pois vai articular direitos, liberdades e garantias com direitos sociais; articular a

igualdade jurídica (à partida) com igualdade social (à chegada) e segurança jurídica com

segurança social; passagem do governo representativo clássico à democracia

representativa.

Estado Totalitário

É um tipo de Estado que assume todo o poder na sociedade e identifica a liberdade

humana com a prossecução dos seus fins.

Os Elementos do Estado

Não existe uma teoria geral sobre a origem e formação do Estado. De facto o Estado

não teve só uma origem mas muitas. Formou-se de maneira independente: em diferentes

lugares, épocas e por diversas formas, por conquistas externas, desenvolvimento

interno, ou por ambos.

Page 22: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

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Desenvolveu-se um território entre uma combinação de relações territoriais e

consanguíneas.

Contudo a noção de Estado Moderno que é uma sociedade política organizada, fixada

num determinado território e dotada de um poder institucionalizado para satisfazer os

interesses gerais dos seus membros só no século XVI entrou na terminologia política.

Ele surge na Europa com a idade moderna e sob as ruínas do fundamentalismo. Teve

por base o desenvolvimento da economia mercantil e a libertação da sociedade civil do

domínio temporal da Igreja e apoiou-se na concentração do poder nas mãos do príncipe

e no despertar da consciência nacional que vai permitir encontrar um fundamento e um

fim despersonalizado para o poder. Ao contrário do que acontecia nas sociedades

primitivas onde a autoridade política era em regra o prolongamento da autoridade

familiar e das sociedades feudais onde o poder era fortemente personalizado ( pois a sua

propriedade e o seu exército confundiam-se na pessoa daquele que mandava na

sociedade política moderna onde o poder está institucionalizado), quem assegura o

poder é uma instituição despersonalizada: o Estado.

O Estado moderno é pois uma instituição social dotada de um poder racional separado

da pessoa dos governantes e sentido pelos governados.

O conjunto de governantes e de governados formam a população do Estado que vive

num determinado território, segundo regras de conduta, definidas pelos órgãos do poder

e salvaguardadas pelas autoridades públicas (povo, território, soberania).

O Professor Marcello Caetano dá-nos uma definição sucinta de Estado como a de «um

povo fixado num território, de que é senhor, e que dentro das fronteiras desse território

institui, por autoridade própria, órgãos que elaboram as leis necessárias à vida colectiva

e imponham a respectiva execução».

Segundo esta teoria, a organização política, jurídica de uma sociedade dispondo de

órgãos próprios, exercem o poder sobre determinado território, corresponde a um

conceito estático de Estado.

Direcção do estado:

- Chefe de Estado

- Parlamento

- Governo

Corpo do Estado:

- Órgãos administrativos

Page 23: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

23

- Os tribunais

- O aparelho militar

Base do Estado:

- População

Olhando o Estado pela óptica do seu funcionamento integrado, verifica-se que a

pirâmide do poder que corresponde a uma visão estática desaparece na medida em que o

órgão superior do Estado é a representação popular integrada por fracções. As fracções

que formam a maioria sustentam o governo, apoiam projectos legislativos e defendem a

sua política. As outras fracções formam a oposição e criticam o governo. Assim, as

decisões da direcção do Estado dependem de uma vontade que se forma num ambiente

social do próprio Estado, ou seja as associações e a opinião pública bem como os

partidos políticos constituem canais de comunicação entre a sociedade e o aparelho do

Estado.

Cada partido está apoiado em certas organizações às quais pertencem a maioria dos seus

deputados, que defendem os seus interesses no parlamento.

A opinião pública que se expressa através dos meios de comunicação tem influência

directa nas decisões políticas, na direcção do Estado.

A maioria dos estímulos e dos impulsos políticos provêm do ambiente social,

transformando-se em decisões executórias, através do aparelho do Estado.

Estado – é uma sociedade organizada na qual existe um sistema de canais de influência

que nascem em cada um dos cidadãos e que através dos meios de comunicação, das

associações e partidos confluem em unidades cada vez maiores até desembocar nos

órgãos superiores do Estado. Através desses canais circula a energia que sustenta o

aparelho do Estado e o mantêm em movimento. Numa visão dinâmica, o Estado surge-

nos como uma sociedade política integrada caracterizada por uma base social e o

aparelho do estado.

Nação – é uma comunidade de base cultural, ou seja, é uma forma de sociedade

caracterizada por um passado comum, um desejo de viver em comum e aspirações

comuns. Embora a nação tenda a constituir um Estado, não há uma necessária

coincidência entre esses dois conceitos.

Há nações que ainda não são Estados ou que estão repartidos por vários Estados e há

Estados que não correspondem a nação. Por outro lado, se é verdade que, em regra se

Page 24: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

24

parte da nação para se atingir o Estado, casos há também em que é o Estado que depois

de fundado vai formando uma comunidade nacional.

O Prof. Jorge Miranda aponta as seguintes características essenciais do Estado

Moderno:

- complexidade – de organização e actuação com cada vez maior diferenciação de

funções, órgãos e serviços;

- institucionalização do poder – que se encontra despersonalizado, pertencendo à

colectividade como ideia para além dos seus detentores concretos e actuais;

- autonomia – no sentido de uma dinâmica própria do poder e do seu aparelho frente à

vida social;

- coercibilidade – o Estado avoca a si o monopólio do uso legítimo da força;

- sedentariedade – fixação em determinado território;

- secularização - ou laicidade dos fins prosseguidos;

- poder soberano - concepção de poder em termos de soberania – poder supremo e

independente.

Elementos do Estado

Povo Território Poder

POVO

POVO, enquanto elemento do Estado, é aquela colectividade humana que afim de

realizar um ideal próprio de justiça, segurança e bem estar, reivindica a instituição

de um poder político privativo que lhe garanta o direito adequado às suas

necessidades e aspirações, dentro de um território que reclama como seu. Marcelo

Rebelo de Sousa define o povo como o conjunto de cidadãos ou nacionais de certo

Estado.

Povo é diferente de população que tem um sentido significado económico ( é um

conceito demográfico e económico e representa o conjunto de residentes em certo

território sejam cidadãos ou estrangeiros)

Sendo o povo a comunidade dos cidadãos ou súbditos importa determinar quais são as

pessoas que devem ser qualificadas dessa forma, tendo os Estados uma competência

exclusiva na definição das regras de aquisição e perda da cidadania, em conformidade

com o Direito Internacional.

Page 25: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

25

NACIONALIDADE

Ao vínculo jurídico que se estabelece entre um indivíduo a uma comunidade política e

que os integra em certo povo atribuiu-se a designação de Nacionalidade

Existem dois critérios essenciais quanto à atribuição de nacionalidade:

- IUS SANGUINIS (usual nos estados mais antigos)

- IUS SOLI (usual nos estados mais recentes ou com grande influência de imigrações ou

emigrações)

Também é comum distinguir:

- a AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA da nacionalidade;

- de AQUISIÇÃO DERIVADA da nacionalidade.

A nacionalidade pode ser apreciada de duas vertentes:

- enquanto um vínculo jurídico-político;

- enquanto um direito fundamental (questão da dupla cidadania e dos apátridas)

É que a atribuição do vínculo jurídico-político de nacional a determinada pessoa

humana confere-lhe determinados direitos e deveres:

- de participar na vida política do Estado;

- de beneficiar da defesa dos seus direitos dentro do território do Estado;

- de beneficiar da defesa dos seus direitos fora do território do Estado;

- de participar na defesa do território;

TERRITÓRIO

O território é formado por um certo solo e toda a altura do espaço aéreo que lhe

corresponder e, quando banhado por mar, engloba igualmente a faixa das chamadas

"águas territoriais", que abrange normalmente 3 milhas marítimas a contar da costa,

bem como o "terra" que prolonga a costa, subjacente ao mar, até que se abra o

arquipélago profundo – a plataforma submarina ou continental.

Características do território enquanto espaço jurídico próprio do Estado:

- imposição da sua autoridade sobre certo território;

- a atribuição de personalidade jurídica internacional ao Estado depende da

efectividade desse poder;

- os órgãos do Estado encontram-se sempre sedeados no seu território;

- Exclusão de poderes concorrentes de outros Estados sobre o seu território;

Page 26: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

26

- os cidadãos só podem beneficiar da plenitude de protecção dos seus direitos

pelo respectivo Estado no território deste.

Assim o poder do Estado sobre o seu território há-de ser:

- indivisível,

- inalienável,

- exclusivo.

Neste sentido, o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa refere que a função do território é

tripla:

1 - Constitui uma condição de independência nacional;

2 -circunscreve o âmbito de actuação do poder soberano do Estado,

3 - Representa um meio de actuação jurídico-política do Estado.

PODER POLÍTICO

O Prof. Marcello Caetano dá-nos a seguinte definição: “Poder Político é a faculdade

exercida por um povo de, por autoridade própria (não recebida de outro poder), instituir

órgãos que exerçam o senhorio de um território e nele criem e imponham normas

jurídicas, dispondo dos necessários meios de coacção”.

O Poder Político do Estado reveste-se das seguintes características próprias:

- É um poder constituinte, originário, que tem um fundamento próprio e não

está dependente de qualquer outro poder;

- É um poder de auto-organização, que tem por objectivo permanente e

continuado a criação de condições para a manutenção da segurança, a

administração da justiça e a promoção do bem-estar da comunidade política;

- É um poder de decisão que faz as opções consideradas e adequadas à

organização da vida da comunidade política, designadamente através da criação

de normas jurídicas.

O poder político é exercido por um conjunto de órgãos do Estado que são poderes

constituídos e que devem actuar na estrita observância das competências previstas na

lei, estando por isso limitado pelo Direito.

PODER POLÍTICO e SOBERANIA

De acordo com a doutrina de Jean Bodin, cada Povo erigido em Estado teria um

príncipe soberano, entendendo esta soberania como um poder supremo sobre o seu

Page 27: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

27

território que nenhuma lei positiva limita, e um poder independente em relação a todos

os demais poderes humanos.

O Poder Político próprio do Estado é assim um Poder Político Soberano, ou seja,

supremo e independente.

PODER POLÍTICO e DIREITO

Poder político e soberania (aparelho do poder) (existem diferenças).

O poder político – é a faculdade exercida por um povo, por autoridade própria (não

recebida de outro poder), instituir órgãos que exerçam a soberania (o domínio) de um

território e nele criem e imponham normas jurídicas dispondo dos necessários meios de

coação.

A soberania – é uma forma de poder político que corresponde à sua plenitude, é um

poder político supremo e independente. Se uma colectividade tem liberdade plena de

escolher a sua constituição e de se poder orientar no sentido que bem lhe parecer,

elaborando as leis que julgar convenientes. Então essa colectividade forma um estado

soberano.

Mas nem sempre os Estados são soberanos. Há casos em que a colectividade tem

autoridade própria para exercer o poder político formando um Estado e contudo esse

poder político está condicionado por um poder diferente e superior. É o que se passa

com os Estados protegidos, entre outros.

O poder político é exercido dentro do Estado por um conjunto de órgãos do Estado,

designados como poderes constituídos, e que devem actuar na estrita observância das

competências previstas na lei.

O poder político é um poder limitado pelo Direito:

1 - pelo direito interno;

2 - pelo direito internacional; e,

3 – pelos Direitos Humanos e Direitos Fundamentais.

ESTADO → BEM COMUM

PODER POLÍTICO → INTERESSES DOS GOVERNADOS

A Divisão do Poder Político

A divisão do poder tem a sua origem na contraposição das concepções de Montesquieu

e de Rousseau. Montesquieu faz a apologia de um regime de governo em que o poder

Page 28: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

28

esteja limitado pelo pluralismo político-administrativo e pela separação de poderes.

Rousseau tem uma concepção oposta pois entende que a única função soberana é a

função legislativa.

Jorge Miranda entende que na actualidade a ideia da separação de poderes continua a

ser válida, pelo menos nos seguintes termos:

1. Por imperativo de racionalidade jurídica e necessidade de ordem política deve o

poder estar dividido por órgãos com competências próprias de modo a que os

seus detentores se limitem reciprocamente;

2. Que não há coincidência entre os poderes (legislativo, executivo e judicial) e as

funções do Estado (política, legislativa, administrativa e judicial);

3. É essencial ao Estado de Direito a separação de poderes no que toca ao poder

judicial (reserva da função jurisdicional aos tribunais)

4. É essencial ao Estado de Direito a subordinação dos órgãos administrativos à lei;

5. A efectividade da separação de poderes depende da intervenção de diversos

partidos e forças políticas de poder;

CATEGORIAS de ESTADOS MODERNOS

Estados soberanos; Estados não soberanos; Estados semi-soberanos

Estados Soberanos: são os que desfrutam sobre um determinado território de um poder

supremo, sem igual, na ordem interna e de um poder independente, sem superior na

ordem externa. Para que o Estado seja soberano, o poder de querer e o poder de

comandar não podem estar subordinados a nenhum outro Estado.

Estados soberanos – são aqueles que na ordem interna não admitem que nenhum outro

poder se sobreponha ao seu e na ordem externa gozam todos os direitos na comunidade

internacional, a saber:

- Direito de fazer a guerra

- Direito de legação, direito de receber e enviar agentes diplomáticos

- Direito de celebrar tratos internacionais

- Direito de reclamação internacional

Os Estados soberanos dividem-se em:

- Unitários (Portugal)

- Federais (complexos) (EUA)

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Estado unitário – é um Estado simples em que há um só poder para todo o território.

Estados federais10 – são uma união de Estados membros, um só Estado central que se

rege por normas constitucionais comuns a todos os membros. Há dois tipos de

federalismo:

1 – As federações propriamente ditas ou perfeitas (EUA, Suíça, Canadá).

2 – Federações imperfeitas ou fictícias (Brasil, Austrália)

O Estado Federal (Federação ou União) tem o seu órgão legislativo (congresso ou

assembleia), o seu órgão executivo (presidente ou governo federal), os seus Tribunais

Federais, as suas leis e os seus exércitos.

O Estado Federal baseia-se na seguinte dualidade:

- numa estrutura de sobreposição - «a qual recobre os poderes políticos locais (isto é,

dos Estados federados), de modo a cada cidadão fica simultaneamente sujeito a duas

Constituições, - a federal e a do Estado Federado a que pertence - e ser concidadão de

actos provenientes de dois aparelhos de órgãos legislativos, governativos,

administrativos e jurisdicionais»;

- numa estrutura de participação - «em que o poder político central surge como

resultante da agregação dos poderes políticos locais, independentemente do modo de

formação»;

Jorge Miranda aponta os seguintes princípios directivos dos Estados Federais:

1º - Dualidade de "soberanias";

10 Três teorias sobre a construção do Estado federal: 1 – Teoria do Estado federal de dois membros 2 – Teoria do Estado federal de três membros 3 – Teoria dos chamados Estados-partes No primeiro caso – os estados federados são parte da federação e estão a ela submetidos. Esta teoria defende a primazia da federação sobre os Estados federados. A segunda teoria –os Estados federados formam juntamente com a federação uma república federal e atribui a esta república a qualidade de Estado. Esta teoria nega a primazia da federação sobre os Estados federados. A terceira teoria – a federação e os Estados federados são membros de igual categoria de um conjunto que entre si mesmo, não tem qualidade estatal, ou seja, não dá a qualidade de Estado á república federal e também nega a primazia da federação sobre os Estados federados. Diferenças entre federação e confederação: Confederação de Estados – é uma associação de Estados criados por um tratado internacional do qual resulta a instituição de órgãos comuns para prosseguir certos fins, geralmente internacionais. Exemplo: Cantões Suíços até 1848 e dos EUA entre 1781 e 1787. Federação – é uma simples associação de Estados, embora muitas vezes tenha acabado por constituir um Estado.

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30

2º - Participação dos Estados Federados na formação e na modificação da Constituição

Federal;

3º - Garantia (a nível da Constituição Federal) da existência e dos direitos dos Estados

Federados;

4 º - Intervenção institucionalizada dos Estados Federados na formação da vontade

política e legislativa federal;

5º - Igualdade jurídica dos Estados Federados;

6º - Limitação das atribuições federais;

A questão da repartição de matérias entre Estado Federal e os Estados Federados pode

também dividir-se em duas formas:

- a repartição horizontal ou material (federalismo clássico - EUA e Suíça) «em que o

dualismo de soberanias envolve um dualismo legislativo e executivo (O Estado Federal

faz e executa as suas Leis, e o mesmo acontece com os Estados Federados)»

- a repartição vertical (federalismo cooperativo - Alemanha) «em que o Estado Federal

legisla e define as bases gerais da legislação e os Estados Federados executam e

desenvolvem as bases gerais»

Diferenças entre Estado Federal e Estado Unitário regional:

1ª - Ao nível do Poder Jurisdicional;

2ª - Ao nível do Poder Constituinte;

3º - Ao nível da atribuição do Poder residual.

Estados Não Soberanos são os que não desfrutam de nenhuma prerrogativa na ordem

externa, mas têm um poder superior na ordem interna. Há situações em que determinada

colectividade tem autoridade própria para exercer poder político sobre um determinado

território, constituindo um verdadeiro Estado, no entanto, esse exercício do poder

político está condicionado por um poder diferente e superior. Os Estados federados

são a única modalidade actual de Estados não soberanos embora também tenha

existido a união real11.

11 A união real – é uma associação de união de Estados que dá lugar á criação de um novo Estado, no qual alguns dos órgãos dos Estados associados passam a ser comuns. Exemplo histórico: Portugal e Brasil, entre 1815 e 1926.

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31

Os Estados federados existem quando um certo número de colectividades territoriais,

politicamente organizadas decidem unir-se e aceitam mediante a adopção de uma

constituição comum, transferir para os órgãos da união os seus poderes soberanos de

ordem externa e reconhecem a estes órgãos competência para decidir sobre alguns

domínios da sua ordem interna.

Os Estados federados continuam a ser verdadeiros Estados12, pois podem elaborar as

suas próprias constituições e fazer leis no domínio da sua competência e dispõem de

meios próprios para fazer respeitar essas leis, mas não são Estados soberanos:

1. Porque as suas constituições têm que respeitar a constituição federal;

2. Porque as suas leis têm que se subordinar ás leis que provem dos órgãos da

federação, isto é devem obediência à constituição federal;

3. Porque não podem abandonar a federação por vontade própria;

4. Porque não podem manter relações internacionais próprias, pois perdem o

direito de legação, o direito de celebrar tratados, o direito de fazer a guerra e o

direito de reclamação internacional a favor do Estado federado.

Os Estados Semi-Soberanos são os que possuem certas prerrogativas na ordem externa

e reconhecem um poder igual ou superior na ordem interna. Por sua vez estes Estados

semi-soberanos dividem-se em:

- Estados protegidos de protectorados

- Estados exíguos (pequenos Estados)

- Estados neutralizados

Estado protegido13 de protectorado – é a situação que resulta de um acordo entre

Estados soberanos, pelo qual um Estado assume a obrigação de proteger outro,

recebendo total ou parcialmente a gestão das relações internacionais do Estado

12Os ESTADOS FEDERADOS têm o seu órgão legislativo (parlamento ou assembleia), o seu órgão executivo (governo estadual), os seus Tribunais Estaduais, as suas leis e a sua polícia armada. 13 Nos ESTADOS PROTEGIDOS existe: povo; território; poder político efectivo internamente. Mas está dependente do Estado Protector para as relações internacionais, e para aconselhamento na resolução de questões internas. Podemos assim considerar que o Estado Protegido é verdadeiramente um Estado, mas não é soberano pois não é independente nem supremo nas suas decisões.

Page 32: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

32

protegido e alguns casos, a própria política interna. Exemplo: Tunísia, Marrocos,

protegidos pela França; Manchúria pelo Japão.

O Estado protegido não perde totalmente a soberania, porque não tem que respeitar

a constituição do Estado protector, mas apenas o tratado que celebrou com ele.

Estados exíguos – são comunidades políticas que pela sua diminuta extensão

territorial e escassa população não tem condições de exercer plenamente a sua

soberania em especial ou “ius belli” (direito de fazer guerra). Exemplo: Andorra,

Mónaco e S. Marino.

Estados neutralizados – são aqueles que por vontade própria e de acordo com a

vontade manifestada pelas principais potências internacionais gozam de um

estatuto de neutralidade. Através da aceitação desse estatuto, o Estado

neutralizado abdica do direito de fazer guerra, excepto nas situações de legítima

defesa, perdendo a sua prerrogativa de soberania externa. Normalmente é aceite

a neutralização do Estado quando se pretende pôr fora das lutas políticas e

militares e dispor de zonas de paz em períodos de conflito global. Exemplo:

Suíça

ESTADOS UNITÁRIOS ≠ ESTADOS COMPLEXOS

Estados Unitários: aqueles em que existe apenas um poder político, podendo, no

entanto, existir uma descentralização política ao nível territorial, caso em que

distinguiremos entre Estados unitários centralizados e Estados unitários regionais.

Estado complexo ( ou composto): aquele que agrega diversos Estados num outro de

hierarquia superior, sendo que o poder político é repartido entre o Estado “mãe” e os

estados agregados, de tal modo que o povo e o território ficam sujeitos simultaneamente

a dois poderes políticos.

Page 33: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

33

Estados Unitários

Descentralização Política: consiste na existência de províncias ou regiões que se

tornam politicamente autónomas por os seus órgão desempenharem funções políticas,

participarem ao lado dos órgãos estaduais no exercício de alguns poderes ou

competências de carácter legislativo ou governativo.

Descentralização política é distinta de:

- desconcentração;

- descentralização administrativa;

- regionalização;

- autonomia política;

- federalismo.

Não há descentralização jurisdicional em Estados Unitários.

Estado Unitário Centralizado Ou Clássico: os órgãos políticos nacionais conservam na

sua esfera todo o poder legislativo e executivo.

Estado Unitário Regional: atribuem-se, por um processo de descentralização política, a

entidades infra-estaduais «poderes ou funções de natureza política, relativas à definição

do interesse público ou à tomada de decisões políticas (designadamente, de decisões

legislativas)».

O Estado Unitário Regional pode dividir-se entre:

- integral e parcial;

- homogéneo e heterogéneo;

- regiões com fins gerais e regiões com fins especiais;

Estados Complexos (Ou Compostos)

A «União Real»: resulta da fusão entre dois Estados Soberanos, da qual resulta a

criação de órgãos comuns de exercício de parte do poder político que exercem em

cumulação com os órgãos de cada Estado Soberano que se mantém. (Ex. Portugal e

Brasil de 1815 a 1822).

O que é distinto da União Pessoal que resulta apenas da coincidência do titular do órgão

executivo do Estado (ex.: Portugal e Espanha entre 1580 e 1640).

Page 34: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

34

Fins e funções do Estado

São fins do estado os objectivos comuns que um Povo visa alcançar pela instituição de

um Poder Político em determinado Território.

São funções do estado as «… actividades desenvolvidas pelos órgãos do poder político

do Estado, tendo em vista a realização dos objectivos que se lhes encontram

constitucionalmente cometidos.» (Jorge Miranda)

Os fins do Estado – estão sujeitos à evolução histórica e à variação da conjuntura

(económica e social)14

• Estado de Polícia: Estado Totalitário → Estado de poder absoluto →

regulamentação e fiscalização de todos aspectos da vida social.

• Estado Liberal: Advento dos Direitos do Homem → garantir a plena realização

das liberdades individuais dos cidadãos, → SEGURANÇA e JUSTIÇA, enquanto

garantia de dar a cada um o que é seu. no Estado de direito liberal, caracterizado

pelo abstencionismo e capitalismo concorrencial, do ponto de vista económico e por

um regime democrático liberal, do ponto de vista político, o objectivo primordial era

o da segurança.

O que interessava era que todos fossem iguais perante a lei, embora essa igualdade

se reconduzi-se apenas a um ponto de vista formal.

• Estado de Direito: Instituição dos princípios da democracia e da igualdade →

assegurar a igualdade de oportunidades → SEGURANÇA e JUSTIÇA,

enquanto garantia de liberdade colectiva e igualdade efectiva de direitos.

• Estado Social de Direito: Consciencialização social colectiva → garantia de

condições de dignidade humana mínimas → SEGURANÇA e JUSTIÇA +

BEM-ESTAR social, económico e cultural dos cidadãos. No Estado social de

direito, que reflecte a passagem do capitalismo concorrencial para o

intervencionismo passou a dar-se prevalência ao objectivo da justiça, quer

comutativa, quer distributiva, tratando-se de uma igualdade de situações

14 Segurança (individual e colectiva)

Justiça – satisfazer a ideia de justiça, da colectividade: Justiça comutativa e Justiça distributiva Desenvolvimento económico e social – O Estado deve promover as condições de vida dos cidadãos, manter o acesso a bens e serviços a toda a comunidade.

Page 35: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

35

económicas e sociais mais do que uma mera igualdade formal dos direitos. O

Estado procura criar estruturas para defesa dos direitos económicos, sociais e

culturais, indo além da simples defesa dos direitos civis e políticos.

FINS DO ESTADO MODERNO (Estado Social de Direito)

• a SEGURANÇA - interna e externa.

• a JUSTIÇA - realização e fiscalização de normas que regulem a sociedade em

razão da satisfação do sentimento de Justiça da sociedade, que pode revelar-se

em dois sentidos:

1 - a Justiça comutativa

2 - a Justiça distributiva

• o BEM-ESTAR - bem estar não só físico, mas também económico, social,

cultural e mesmo ecológico. Não só na promoção destas condições, como na

garantia de acesso de todos aos serviços essenciais do Estado, e na obrigação de

prestar esse serviços em igualdade de circunstâncias a todos os cidadãos. É a

actual "cultura" dos serviços públicos.

Os fins do Estado da nossa constituição (CRP)

- Artigo 1.º - “Portugal é uma república soberana”

- Artigo 2.º - “Visa a realização da economia”

- Artigo 9.º , alíneas a, b, c e d – “Segurança colectiva e segurança individual, ….”

FUNÇÕES DO ESTADO

Funções do Estado – são as actividades levadas a cabo pelos órgãos do poder político,

com vista á realização dos fins ou objectivos consagrados na Constituição.

Cada órgão realiza um conjunto de actos independentes ou dependentes de actos de

outros órgãos, mas todos eles tendo em vista a prossecução de fins comuns.

As funções do Estado são:

- Função política (legislativa e governativa)

- Função administrativa

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36

- Função Jurisdicional

Classificação de Estado, segundo as actividades que desenvolvem:

- Estado gestor – O Estado assume a tarefa de organizar os meios necessários e de

desempenhar as actividades adequadas á realização do bem comum. Neste tipo de

Estado, ele realiza por si próprio as finalidades que certamente integram os seus

objectivos.

- Estado árbitro – O Estado confia inteiramente na iniciativa e na capacidade das

instituições públicas e deixa ao critério a escolha dos meios adequados á realização

dos fins da comunidade política, acredita que uma lei natural conduzirá à

harmonização final dos resultados da livre iniciativa. Nesta classificação o Estado

assume apenas o papel de árbitro, assegurando as regras mínimas da competição.

- Estado coordenador – embora confie na livre iniciativa dos indivíduos e das

instituições, o Estado não confia na existência de uma lei natural que conduza à

harmonia final dos resultados e prefere ser ele próprio a promover essa harmonia.

- Estado revolucionário – em vez de tomar as atitudes de disciplina e correcção das

estruturas existentes para realizar as suas finalidades concretas. O Estado pode

entender que para essa realização ele necessita de alterar as estruturas,

transformando-as de forma a atingir o que ele entende ser o bem comum.

O Estado gestor tem um plano imperativo.

O Estado concorrencial tem um plano indicativo

O Estado árbitro não tem plano

O Estado revolucionário não tem plano, é um Estado de excepção.

Muitas vezes, o Estado não é gestor, nem coordenador em sentido rigoroso e puro na

sua totalidade, já que o plano pode ser imperativo para o sector público e meramente

indicativo para os sectores privados e cooperativos (é o que acontece entre nós, pela

constituição).

Page 37: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

37

O Prof. Jorge Miranda, refere dois sentidos em que podemos analisar as FUNÇÕES DO

ESTADO:

1º - «… como fim, tarefa ou incumbência, correspondente a certa

necessidade colectiva ou a certa zona da vida social» - traduz a realização dos

fins do Estado enquanto legitimação do exercício do poder!

2º - «… como actividade com características próprias, passagem a acção, ou

modelo de comportamento» - que traduz a actividade desenvolvida pelo Estado

através dos seus órgãos, contínua a repetida, definida pelas estruturas e normas

jurídicas que conformam o seu comportamento»

Neste conceito de FUNÇÃO DO ESTADO enquanto actividade, o Prof. Jorge Miranda

distingue 3 características:

a) é uma actividade específica e diferenciada, pelos seus elementos (1) materiais –

as respectivas causas e resultados que produz – (2) formais – os trâmites e as

formalidades que exige - (3) orgânicas – os órgãos ou agentes por onde corre;

b) é uma actividade duradoura – prolonga-se indefinidamente;

c) é uma actividade globalizada – tem de ser encarada como um conjunto, e não

como uma série de actos avulsos.

O Prof. Jorge Miranda propõe uma DISTINÇÃO entre funções fundamentais e

funções complementares, acessórias ou atípicas:

FUNÇÕES FUNDAMENTAIS: Correspondem à divisão tripartida entre função política

(que incluí a função legislativa e a função governativa), função administrativa e função

jurisdicional.

FUNÇÕES COMPLEMENTARES, ACESSÓRIAS E ATÍPICAS: Traduzem-se em actos

do Estado, de carácter residual, que não se reconduzem às funções fundamentais ou

clássicas. São exemplos:

- a actividade do Ministério Público em processo penal;

- órgãos que interferem no exercício da função administrativa sem dependeram da

direcção ou superintendência do Governo – Comissão Nacional de Eleições.

Assim a FUNÇÃO POLÍTICA será:

- do ponto de vista material: a definição primária e global do interesse público,

interpretação dos fins do Estado e escolha dos meios adequados para atingir em cada

conjuntura esse fins; direcção do Estado;

Page 38: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

38

- do ponto de vista formal: liberdade e discricionariedade, quer quanto ao conteúdo

(desde que respeitando as normas Constitucionais) quer quanto ao tempo e

circunstâncias de actuação (ausência de sanções jurídicas específicas);

- do ponto de vista orgânico: competência atribuído a órgãos ou colégios em conexão

directa coma forma e sistema de governo, com pluralidade de órgãos , ausência de

hierarquia e apenas relações de responsabilidade jurídica.

A FUNÇÃO ADMINISTRATIVA será:

- do ponto de vista material: a satisfação constante e quotidiana das necessidades

colectivas, prestação de bens e serviços;

- do ponto de vista formal: iniciativa no sentido das necessidades, e parcialidade na

prossecução do interesse público.

- do ponto de vista orgânico: dependência funcional e subordinação.

A FUNÇÃO JURISDICIONAL será:

- do ponto de vista material: a declaração do direito, decisão de questões jurídicas, seja

em concreto seja em abstracto;

- do ponto de vista formal: passividade (actua apenas perante a iniciativa de outrem) e

imparcialidade;

- do ponto de vista orgânico: independência de cada órgão (sem prejuízo do direito de

recurso), e, em princípio atribuição a órgão específicos, os Tribunais, formados por

juízes.

Artigo 61.º - Iniciativa privada, cooperativa e auto gestionária.

Artigo 82.º - Os sectores da propriedade dos meios de produção.

Estrutura orgânica do aparelho do poder:

A colectividade constituída em sociedade política actua como uma unidade, tem

interesses colectivos, só seus, de atingir e para os realizar necessita de impor a sua

vontade

É uma pessoa colectiva e para formar e afirmar a sua vontade, a pessoa colectiva precisa

de uma organização, ou seja, estrutura-se segundo uma diferenciação de funções, na

qual se distinguem as missões e as tarefas a desempenhar pelos indivíduos e se repartem

os poderes e deveres que competem a cada um.

Page 39: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

39

Aparecem portanto, certos elementos aos quais é reconhecida de forma expressa ou

tácita a autoridade para exprimir a vontade colectiva, são os cargos.

Nas sociedades antigas não se notava, de início, pela separação entre os cargos e as

pessoas que os exerciam, havia a chamada personalização do poder. Mas a sucessão dos

indivíduos, nos cargos, veio a fazer salientar a diferença entre o cargo em si e o

respectivo titular.

Aos cargos, colégios de assembleias, aos quais, segundo a ordem constitucional o poder

de manifestar uma vontade imputável ao Estado, chamam-se órgãos do Estado.

O facto de numa colectividade existirem membros seus que actuam como titulares dos

seus órgãos, ou seja, como encarregados de formar e manifestar a vontade da

colectividade, sem ao mesmo tempo deixarem de tratar os seus interesses individuais,

exige o estabelecimento de normas que digam com o é que o individuo deva agir

quando actua como titular do órgão do Estado.

A ORGANIZAÇÃO DO PODER POLÍTICO DO ESTADO

O Estado desdobra-se em duas facetas:

- ESTADO-SOCIEDADE (ou colectividade) - que representa um povo, senhor de um

território, ao serviço do qual existe um poder organizado;

- ESTADO-PODER (ou governo) - que representa a estrutura pela qual se exerce o

poder político, de certa forma, representa a institucionalização do poder político.

“O ESTADO-PODER”

ESTADO

PESSOA COLECTIVA

PERSONALIDADE JURÍDICA

→ distinta de cada uma das pessoas físicas que compõem a comunidade e dos próprios

governantes e

→ com capacidade para manter relações jurídicas com outras entidades, tanto no

domínio do Direito interno como no do Direito Internacional, tanto na veste de Direito

Público, como sob a do Direito privado

ESTADO

Page 40: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

40

PESSOA COLECTIVA

ORGANIZAÇÃO

actua através de ÓRGÃOS

Órgãos do Estado: são as entidades às quais a ordem constitucional reconhece o poder

de manifestar a vontade imputável ao Estado.

O estado manifesta-se na vida jurídica através dos seus órgãos e os titulares dos seus

órgãos quando actuam nos termos da lei produzem actos imputáveis aos órgãos e que

como tais passam a ser imputados ao Estado. Isto significa que a vontade do indivíduo

que actua como órgão do Estado é imputada ao Estado.

Órgão do Estado – é o centro autónomo institucionalizado da invocação de uma

vontade que é atribuída ao Estado. Cada órgão diferencia-se dos demais, pelo conjunto

de poderes jurídicos que recebe para esses fins e estrutura-se em função desses poderes

e insere-se na estrutura do Estado.

O conceito de órgão implica quatro elementos inseparáveis15:

1 – A instituição (ou oficio)

2 – A competência – o complexo de poderes funcionais que são cometidos ao órgão, ou

seja, a parcela de poderes públicos que lhe cabe. A competência pode ser delimitada em

razão da matéria, da hierarquia, do território, do tempo e do valor dos actos. A

competência deriva obrigatoriamente da lei, não se presume.

3 – O titular – a pessoa física ou conjunto de pessoas físicas que em cada momento

encarnam a instituição e formam a vontade do órgão.

4 – O cargo ou mandato – quando se trata de órgão electivo (são eleitos).

CLASSIFICAÇÃO DOS ÓRGÃOS DO ESTADO

Classificação Estrutural: 15 Conceitos essenciais:

competência dos órgãos do estado - complexo de poderes funcionais que estão cometidos a determinado órgão e que determinam a capacidade de acção do órgão, na medida em que o órgão do estado não pode actuar sem ser em conformidade com a competência que está prevista na lei. "titular" (ou "titulares") dos órgãos do estado - pessoas físicas através das quais os órgãos do Estado actuam, e cujos actos imputámos aos órgãos do Estado

Page 41: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

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a) singulares / colegiais;

b) simples / complexos;

c) electivos / não electivos;

d) representativos / não representativos;

e) constitucionais / não constitucionais;

f) de existência obrigatória / de existência facultativa;

Classificação Funcional

a) deliberativos / consultivos;

b) a se / auxiliares;

c) de competência originária / de competência derivada;

d) legislativos / governativos / administrativos /

jurisdicionais;

e) de decisão / de controlo / de fiscalização / de garantia;

Classificação Estruturais-Funcionais

a) externo / internos;

b) políticos / não políticos;

c) primários / vicários;

d) centrais / locais;

e) hierarquizados / não hierarquizados

Os órgãos superiores do Estado

Os Estado têm usualmente 3 órgãos de direcção: o Chefe de Estado, o Parlamento (ou

assembleia) e o Governo.

O Chefe do Estado

Quase todos os Estados tem um órgão supremo que garante a sua unidade e que

genericamente se designa por chefe do estado. A chefia do Estado pode revestir um

carácter singular (Imperador, Rei, Presidente da República) ou um carácter colegial (o

caso de duunviratos e triunviratos em que a chefia do Estado era feita por 2 ou 3, e os

directórios que são as chefias colegiais). O chefe de Estado pode ser designado por

herança (monarquia), por cooptação (nos sistemas colegiais) ou eleição.

A designação do chefe do Estado podem variar de país para país e de regime político

para regime político, consoante as épocas, podendo limitar-se á mera representação

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protocolar do Estado ou abranger o exercício efectivo da autoridade no domínio

governativo.

Funções – quando às assembleias políticas o chefe do Estado pode ser considerado um

mero delegado delas, não possuindo poderes próprios ou noutro extremo ao chefe do

estado compete fazer eleger as assembleias políticas, convocar as suas sessões, adiá-las,

interrompe-las ou até dissolve-las.

- Em relação à legislação também pode haver várias hipóteses:

1 – O chefe do estado não tem qualquer intervenção na elaboração e publicação das leis.

2 – Tem uma intervenção que se reduz à declaração solene de que a lei foi feita pelo

órgão competente e manda publicar a lei (promulgação).

3 – Direito a demorar a promulgação das leis que lhe forem enviadas pelas assembleias

legislativas e a devolver-lhas para que repensem certas disposições, pedindo que de

novo a discutem e votem (direito de veto suspensivo).

4 – Exigência de concordância por parte do chefe do Estado para que a lei seja posta em

vigor. Esta intervenção da vontade do chefe do Estado tem carácter constitutivo na

formação na formação da lei e chama-se ratificação.

5 – O chefe do Estado é o único legislador (ditaduras, monarquias absolutas) ou em

situações de perigo excepcional ou de calamidade pública.

- Quanto às nomeações dos ministros, as soluções mais correntes são:

1 – O chefe do Estado não tem qualquer iniciativa nesta matéria, limita-se a acatar a

escolha feita pelo paramento ou pelo chefe do partido que ganhou as eleições, ou no

caso das ditaduras, do partido único.

2 – Pode escolher os ministros (o governo), mas apenas dentro das indicações

parlamentares. Mas a permanências dos ministros no poder dependerá a partir dai dos

votos de confiança das assembleias políticas.

3 – Pode escolher os ministros por sua livre vontade sem depender da indicação ou dos

votos das assembleias políticas ou dos partidos.

- Quanto ao exercício do governo:

1 – O chefe do Estado alheado da intervenção nas decisões governativas e apenas tem o

direito de ser informado e o direito de aconselhar.

Page 43: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

43

2 – Embora não participe no exercício efectivo do governo, acompanha este de muito

perto e pode desempenhar de forma efectiva certas atribuições, conferidas por lei.

Exemplo: nomeação de altos funcionários, direcção de organismos superiores da defesa

nacional ou de relações internacionais.

3 Detém por direito o poder governativo, embora deva entregar o exercício a um

primeiro-ministro, perante ele responsável, com maior ou menor liberdade de orientação

da política interna e externa.

4 – O chefe do Estado é simultaneamente chefe do governo e exerce em colaboração

com os secretários ou ministros da sua confiança, as funções governativas.

- Quanto à função judicial: temos várias hipóteses:

1 – O chefe de Estado não tem quaisquer atribuições relativas aos tribunais e á execução

das penas.

2 – Pode com ou sem a referenda do ministro da justiça, exercer atribuições de

clemência e indultando ou comutando penas criminais.

3 – Preside ao órgão superior da magistratura, ajudando com ele na organização dos

tribunais.

4 – Em certos casos, o chefe de Estado exerce a função de julgar.

No Estado Português os poderes do Presidente da República estão descritos na C.R.P.

nos artigos 120.º a 140.º

O PARLAMENTO

- órgão colegial por excelência;

- cabe primordialmente a função legislativa;

- podem ter igualmente funções consultivas e de fiscalização;

- finalmente podem intervir no processo de formação ou destituição do governo.

A existência das assembleias representativas ou políticas (parlamentos), tornou-se

comum á maioria dos Estados contemporâneos, sendo as excepções a esta regra poucas

(ditaduras militares, regimes revolucionários e oligarquias tradicionais). A natureza, os

poderes, funções, estrutura e funcionamento dos parlamentos variam muito de país para

país, mesmo com sistemas constitucionais semelhantes. Essa variação depende de

muitos factores, designadamente da estrutura vertical do Estado, o sistema eleitoral, o

sistema de partidos e o sistema de governo.

Page 44: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

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Natureza e composição dos parlamentos

Podem integrar membros de uma classe aristocrática, designados por herança ou

pessoas nomeadas intencionalmente ou temporariamente pelo chefe do Estado ou

governo, ou pessoas delegadas de vários grupos de interesses de profissionais ou

representantes dos partidos políticos eleitos por sufrágio que pode ser directo ou

indirecto, universal ou restrito.

Poderes e funções dos parlamentos

Variam de país para país e de acordo com o sistema de governo. Geralmente compete-

lhes a votação das leis financeiras: lançamento de impostos e autoliquidação anual da

sua cobrança; a fixação da receitas e despesas do Estado através da aprovação do OGE

(orçamento geral do estado). Pertence-lhes, também, exclusiva ou cumulativamente com

outros órgãos, a função legislativa, estando esta função cada vez mais reduzida á

aprovação das bases gerais dos regimes jurídicos e ao condicionamento da autorização

por eles dada ao governo para publicar leis e decretos-leis.

Na teoria clássica da separação de poderes o poder legislativo cabia exclusivamente ao

parlamento, competindo ao governo e à administração a tarefa de executar as leis

adoptadas. Mas as tendências constitucionais contemporâneas caracterizam-se pela

redução progressiva do papel dos parlamentos na elaboração das leis.

Actualmente, na generalidade dos Estados as leis são mais produtos dos governos do

que dos parlamentos. As razões para esta desvalorização da função legislativa e do

declínio dos parlamentos são as seguintes:

- A multiplicação das tarefas legislativas exigidas pelo estado de direito social

(Welfarestate) ou Estados de providência.

- A tecnicidade cada vez mais exigida.

- A lentidão dos processos parlamentares, que não se coaduna com as exigências

crescentes.

- O receio da impopularidade resultante de votações de medidas que desagradem aos

eleitores.

- A razão política que dando competência legislativa ao governo, tal constitui um meio

de evitar determinadas leis fossem discutidas no parlamento e sujeitas á contestação da

oposição parlamentar.

Page 45: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

45

Estrutura e funcionamento dos parlamentos

Também variável conforme a constituição da cada país.

Os parlamentos podem ser de dois tipos estruturais:

Monocamarais – uma só assembleia

Bicamarais – Assegurados por duas assembleias

As câmaras altas são, em alguns casos, não eleitas (Grã Bretanha) ou então parcialmente

eleitas. A regra é a eleição, embora por um processo diferente do da primeira câmara.

No que diz respeito ás funções das câmaras altas, elas também são diferentes de Estado

para Estado.

Em certos países existe o bicamaralismo perfeito: significa que as duas câmaras

concorrem em igualdade de circunstâncias e igualdade de poderes para a elaboração das

leis e têm a mesma competência para fiscalizar a actividade do governo e da

administração pública. Noutros Países, a segunda câmara tem poderes legislativos e de

fiscalização política menos amplos que a primeira. Neste sistema só a câmara baixa

(primeira câmara) tem poderes para deliberar e o seu voto é suficiente para fazer

aprovar as leis. A câmara alta (segunda câmara), serve para sugestões de alterações,

aditamentos de impressões, levando a que se pondere e redija melhor as leis, podendo

dispor de voto suspensivo ou de mera competência consultiva.

Quer seja bicamaralismo ou monocamaralismo, os parlamentos podem funcionar em

reuniões plenários em que são convocados todos os membros ou em comissões que

podem ser permanentes ou especiais (comissões ad doc) ou em secções (que são grupos

de trabalho).

O Governo

- composto por Ministros;

- compete a autoridade de orientação política dos serviços públicos e a chefia desses

serviços e pessoal

- ao governo cabem, assim, as funções político-executivas e administrativas, embora

possam também ter atribuídas funções legislativas reduzidas;

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Também chamado de executivo – as suas estruturas e competências variam de Estado

para Estado, consoante o tipo de relações que estabelecem entre os três órgãos supremos

do estado: O chefe do estado, o parlamento e o governo.

Aulas seguintes a 12-10-2006 SISTEMAS POLÍTICOS (ou de Governo)

Os sistemas políticos (ou de governo) definem-se pelo relacionamento dos diferentes

órgãos encarregados do exercício do poder, ou seja, reflectem a estrutura interna do

poder político: a existência ou não de pluralidade de órgãos de poder, as suas

competências, relações e interdependências.

O principal elemento dos sistemas políticos é a sede do poder e todo o processo

político se traduz, essencialmente, na luta pela sua ocupação e manutenção. Há que

distinguir entre a sede do exercício do poder e a sede de apoio; e entre a sede de apoio

do poder e sede efectiva ou real.

A sede do exercício do poder é o órgão ou conjunto de órgãos sem o consentimento

dos quais o poder não está disponível. É o elemento que mais interessa para

identificar o sistema de governo pois ele diz respeito ao próprio aparelho do poder. A

sede de apoio diz respeito aos grupos, aos extractos sociais e classes que estão numa

relação de obediência consentida com o aparelho do poder e que quer de uma forma

activa, quer de uma forma passiva, não formam uma resistência que implique uma fonte

de competição pela ocupação do poder ou mesmo o eventual uso da força.

A sede efectiva diz respeito aos grupos de órgãos que têm capacidade de influenciar ou

até de controlar o exercício do poder.

A entrega da sede do exercício do poder ao partido maioritário é uma

consequência do princípio da legitimidade democrática. Ela anda associada à sede

de apoio, pois se esta deixar de se manifestar, quer de modo activo através da militância,

quer de modo passivo, baseado numa obediência silenciosa ou no alheamento á sede do

exercício do poder, dificilmente poderá continuar a exerce-lo. Em regra, as

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Constituições situam a sede do exercício do poder num dos órgãos supremos do

Estado. É esse órgão que responde perante o eleitorado, pela política geral da

governação do país e é essa importância em relação aos outros órgãos de soberania

que permite identificar o sistema de governo.

Assim conforme os órgãos legalmente proeminentes (importantes) do aparelho de

Estado são: o parlamento e o governo ou o chefe do Estado e a assembleia parlamentar,

encontramo-nos perante sistemas de governo parlamentares ou presidencialistas, ou

de convenção ou assembleia, ou regimes mistos entre os quais o semi-

presidencialista. Para esta caracterização será necessário atendermos a 3 conceitos:

- separação de poderes;

- dependência, independência ou interdependência dos órgãos;

- responsabilidade política;

Sistema de governo - Sistema presidencialista - Sistema de assembleia ou convenção - Sistema semi-presidencialista Sistema de governo parlamentarista:

Exemplo: Grã Bretanha, Alemanha, Itália Neste sistema, o governo compreende, em regra, um chefe do executivo, que se pode chamar primeiro-ministro, presidente do conselho, chanceler; também tem ministros com funções e competências diversas e, ainda, tem secretários de Estado. Neste sistema, o chefe de Estado não pertence ao governo nem detém qualquer intervenção na política governamental. A política geral do governo é definida pelo Conselho de Ministros sob orientação do chefe do executivo (primeiro-ministro). No entanto, a formação do governo depende do parlamento e é perante este responsável, a título individual ou colectivo.16 Assim:

• a função política é exercida pelo Governo e Parlamento;

• o Governo é um órgão colegial que resulta da composição e nomeação do

Parlamento;

• o Governo depende da confiança e responde politicamente directamente ao

Parlamento;

16 Muitas vezes, os ministros fazem parte do parlamento, sendo simultaneamente deputados. Neste sistema, em particular na Grã Bretanha, alguns ministros têm funções predominantemente políticas, enquanto outros desempenham funções predominantemente administrativas e os secretários de Estado exercem funções administrativas

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• o Chefe do Governo é distinto do Chefe de Estado e usualmente é o líder da

maioria parlamentar;

• o Chefe de Estado está reduzido às suas funções de representação protocolar,

com reduzidas funções de exercício efectivo de poder político.

O parlamentarismo é um sistema político de governo que se caracteriza essencialmente

pelas seguintes regras jurídicas:

- Responsabilidade do governo perante o parlamento

- Reconhecimento do parlamento como fonte de todos os poderes

- Ausência da democracia directa

- Eleição do chefe do Estado por sufrágio universal

- Direito de dissolução do parlamento pelo chefe de Estado

- Acumulação de poderes e funções

O poder executivo neste sistema está dividido por dois órgãos: o chefe do Estado que

não tem responsabilidade política e exerce apenas poderes formais, muitas vezes de

simples representação; e o governo que dirige a acção do poder executivo, assumindo a

direcção política sob a orientação do chefe do Estado.

O governo resulta das eleições directas e universais, pois a sua nomeação obedece aos

resultados das eleições parlamentares. Na medida em que o governo é investido pelo

chefe do Estado e com o apoio do parlamento, o governo só pode exercer as suas

funções, se tiver a confiança deste ou, dito de outra forma, se tiver o apoio da maioria

dos deputados.

O parlamento eleito directamente pelos cidadãos, dispõe de muitos meios para controlar

a acção do governo, além de ter a faculdade de elaborar leis, sem as quais o executivo

não poderia governar. O Parlamento pode exigir ao Governo as explicações que entenda

serem necessárias; podem criticar a acção governativa e apresentar moções de censura,

de confiança, etc..

Quando o Governo não dispuser da confiança do Parlamento, terá de se demitir ou

ser demitido. É esta responsabilidade política do governo perante o parlamento

que constitui a característica fundamental do sistema parlamentar. Este aspecto

reduz o papel do chefe do Estado a uma importância muito pequena.

Page 49: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

49

A ligação estreita entre o governo e o parlamento pressupõem que estes dois órgãos

colaborem nas funções do Estado. O executivo colabora na função legislativa e o

Parlamento na função governativa, dando ao Governo meios para agir.

Uma outra característica do sistema parlamentar reside no facto de o chefe de Estado,

em alguns regimes republicanos, não ser eleito por sufrágio universal sendo escolhido

por um colégio restrito cuja composição varia de país para país.

Sistema de Governo Presidencialista

Neste sistema, o governo engloba o chefe do Estado que é o chefe do executivo e a quem compete definir a política geral do país. Além do chefe do Estado existem os secretários de estado que são meros colaboradores do Presidente e exercem funções predominantemente administrativas. Exemplo: EUA Neste sistema puro, o governo é independente do parlamento, quer quanto à formação, quer quanto à subsistência, pois nem o parlamento pode demitir o governo, nem este pode dissolver o parlamento. Assim:

• o Chefe de Estado é eleito por sufrágio universal e directo;

• o Chefe de Estado é o Chefe do Governo, formando em total liberdade do

Parlamento;

• o Chefe de Estado possuí veto suspensivo das leis do Parlamento;

• o Chefe de Estado não possuí poder de dissolução do Parlamento

• o Parlamento não pode demitir o Chefe de Estado /Governo

• Total independência entre executivo e legislativo

• Não existe um Governo enquanto órgão colegial autónomo, o Executivo é um

órgão singular constituído exclusivamente pelo Presidente.

Este sistema funda-se no princípio da separação dos poderes; na eleição do chefe do

Estado por sufrágio universal; na atribuição ao presidente da república das funções do

chefe de Estado e chefe do executivo; na independência do governo perante o

parlamento e na responsabilidade do presidente da república dissolver o parlamento.

Nestes sistemas, as instituições estão concebidas de forma muito semelhante à ideia de

separação dos poderes tradicional. Por um lado, há órgãos que têm a incumbência de

traçar as linhas gerais da acção política mediante a função legislativa (o parlamento) e

outro encarregado de executar as leis (o presidente). Ambos os órgãos têm carácter

representativo sendo independentes quanto à origem e quanto ao exercício dos poderes

Page 50: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

50

que a Constituição lhes confere. Essa independência, que difere e contrasta com o que

se passa nos sistemas parlamentares, torna esses dois órgãos responsáveis perante o

eleitorado, dispensando a existência de um terceiro órgão que tenha por finalidade

resolver os desentendimentos que possam aparecer entre eles.

O poder judicial, por seu lado, pertence a um supremo tribunal, cujos juízes são

designados pelo Presidente sobre proposta e com o consentimento da câmara alta do

parlamento (Senado). O Presidente da República eleito por sufrágio universal é

simultaneamente o chefe do Estado e chefe do governo, competindo-lhe nesta qualidade

assegurar o exercício da função executiva. Legitimado que é por sufrágio universal, o

Presidente da República não pode ser destituído pelo Parlamento, excepto por acusação

criminal. Por sua vez, também o Parlamento eleito de igual modo por sufrágio universal

é independente do Presidente. Este não pode dissolvê-lo, nem pode fazer parte dele.

O princípio da separação dos podres e o princípio da independência são contudo

limitados por regras constitucionais e pela própria prática política que definem as

normas de relacionamento entre esses dois órgãos. De facto, o Presidente da República

tem a faculdade de vetar as leis aprovadas pelo parlamento, forçando este a revê-las.

Tem, também, a possibilidade de propor ao Parlamento projectos de lei, quer de uma

forma directa por meio de mensagens que lhe dirige; quer de forma indirecta, através

dos membros do parlamento que pertençam ao seu partido político.

O Parlamento dispõe de meios que lhe permite influenciar a acção do Presidente da

República, como por exemplo recusando aprovar certas nomeações; aceitando ou

recusando o orçamento geral do Estado ou criando comissões de investigação acerca de

determinados assuntos. 17

.

Sistemas de convenção ou assembleia

Neste sistema, a política geral do governo é traçada pela assembleia e os membros

do governo desempenham funções predominantemente administrativas. O governo

faz parte do parlamento, sendo por ele nomeado e perante ele responsável.

Caracterizam-se pela supremacia expressa do parlamento sobre o governo. Nas

assembleias representativas concentram-se por delegação do povo todos os poderes

soberanos registando, em regra, formalmente o princípio da separação dos poderes.

17 Nos sistemas presidencialistas os partidos políticos desempenham, também, um papel relevante, uma vez que o estando o Presidente da República no centro da vida política e sendo ele um alto dirigente do partido vencedor das eleições presidenciais não é difícil nem de estranhar que ele exerça essa influência ( ex.EUA)

Page 51: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

51

Neste sistema não existe poder executivo distinto da assembleia pois os membros

do governo são escolhidos por ela, de entre os seus membros, e podem por ela ser

demitidos. Tanto o poder legislativo como o poder executivo pertencem à assembleia e

o governo é uma espécie de comissão da assembleia.

Em regra neste sistema não há chefe de Estado singular; a assembleia representativa

elege entre os seus membros uma comissão permanente ou conselho de Estado.18

Este sistema foi instituído em França durante um período revolucionário, entre 1973 a

1975, e foi, também, o sistema usado nos países comunistas e, ainda, da confederação

helvética (Suíça).

Sistemas Mistos Os três sistemas de que falamos são sistemas puros, que correspondem ao sistema de

governo dos E.U.A, da Grã-Bretanha, e ao que vigorou na URSS até 1989/1990. No

entanto, esses sistemas nem sempre têm as mesmas características totalmente idênticas,

pois há sistemas de governo que não são mais do que uma mistura de características do

sistema presidencialista e parlamentar e que são designados por sistemas mistos, como o

caso do sistema semi-presidencialista. Esses sistemas de governo mistos podem assumir

uma preponderância dos elementos presidencialista (França), ou podem revestir uma

predominância dos elementos parlamentares, ou até podem assumir o equilíbrio dos

dois sistemas, todo dependendo das características concretas do Estado em questão,

contando-se como factores que podem exercer influência num determinado domínio,

que são os seguintes:

1 – A existência ou não de um governo maioritário.

2 – A consonância ou dissonância entre a eventual maioria parlamentar e a

maioria política que apoia o presidente.

3 – O facto de o líder do partido maioritário ser o chefe do Estado ou o primeiro-

ministro.

4 – A personalidade de cada um dos titulares dos órgãos.

Sistema de Governo :

Componente parlamentarista:

18Nestes sistemas, o governo é colegial. Há um órgão colectivo praticamente sem chefe. Na Suiça o presidente do conselho federal é escolhido rotativamente pelos seus membros pelo período de um ano.

Page 52: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

52

• o Chefe de Estado é eleito por sufrágio universal e directo;

• o Chefe de Estado é o Chefe do Governo, formando em total liberdade do

Parlamento;

• o Chefe de Estado possui veto suspensivo das leis do Parlamento;

Componente presidencialista:

• o Chefe de Estado não possui poder de dissolução do Parlamento;

• o Parlamento não pode demitir o Chefe de Estado /Governo;

• Total independência entre executivo e legislativo;

• Não existe um Governo enquanto órgão colegial autónomo, i.é, o Executivo

é um órgão singular constituído exclusivamente pelo Presidente.

Sistema misto – o esquema institucional é semelhante ao do sistema parlamentar, pois

também existe um chefe de Estado e um chefe do governo, e o executivo só pode

governar se tiver a confiança do parlamento. Contudo, o chefe do Estado é eleito por

sufrágio universal, não se limitando, no entanto, a ter uma função meramente

representativa ou protocolar, como no sistema de parlamentar pois, ao contrário, é ele

quem dirige o governo e toma as grandes decisões políticas, sem ser responsável por

elas perante o parlamento.

O chefe do Estado é o elemento fundamental do sistema tendo amplos poderes. O

governo que é responsável perante o parlamento que tem meios para controlar a sua

acção através de desaprovação do programa ou da aprovação de moções de censura, só

pode exercer as suas funções com o apoio do chefe do Estado.

Uma das principais características deste sistema consiste, portanto, no facto de o

executivo depender do Presidente da República e do Parlamento. Uma vez que estes

dois órgãos são eleitos separadamente por sufrágio universal, poderá levar a que o

parlamento possa dispor de uma maioria contrária à maioria que apoia o Presidente,

(tornando a situação complicada), pois neste caso o Presidente pode dissolver o

parlamento e convocar novas eleições, embora isso possa não solucionar o problema, se

os resultados eleitorais voltarem a confirmar a mesma maioria eleitoral do parlamento.19

19 Neste sistema misto de presidencialismo e parlamentarismo, o governo integra o chefe do Estado, integra o primeiro-ministro, os ministros e os secretários de Estado, podendo haver subsecretários. O chefe do Estado preside normalmente ás reuniões do conselho de ministros e pode exercer certas actividades governativas de política externa. O chefe do Estado nomeia e demite o primeiro-ministro e os ministros também são nomeados por ele. Apesar de serem propostos pelo primeiro-ministro, os ministros são responsáveis perante o presidente da república e perante o parlamento que tem competências de

Page 53: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

53

FIKEI AKI 13-10-2006

Órgãos do corpo de Estado

O aparelho administrativo

A complexidade das sociedades modernas obrigou ao aumento significativo das funções

administrativas do Estado, fazendo crescer e dar uma importância maior ao seu aparelho

administrativo.

A importância da administração pública nas modernas sociedades políticas leva

mesmo alguns autores a falar de Estado administrativo, de Estado tecnocrático e há

muitos autores que qualificam o aparelho burocrático como um “respeitável grupo de

pressão junto dos órgãos superiores do Estado”. Na verdade, a classe detentora do

aparelho administrativo do Estado, mesmo que não seja a classe governante, influencia

significativamente a orientação da política governamental, quer porque o processo

de elaboração das decisões políticas passa pelas suas mãos, quer porque a execução

dessas decisões depende muito da sua vontade de fazer prosseguir essa política. No

entanto, os agentes do aparelho administrativo estão sujeitos a diversos tipos de

controlo, com uma dupla finalidade:

-Reforçar a eficácia do serviço

-Velar pela aplicação do direito por parte desses serviços.

Esses tipos de controlo são de três tipos:

1 – Controlo interno que é feito pela própria administração.

2 – Controlo jurisdicional feito pelos tribunais.

3 – Controlo político.

censura ás actividades do executivo e exercem também funções políticas e administrativas, sendo estas exercidas em colaboração com os secretários de Estado. No caso português o chefe do Estado não integra o governo, embora tenha competência para o demitir depois de ouvido o Conselho de Estado.

Page 54: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

54

Os tribunais

São considerados pelas Constituições como um dos órgãos de soberania e têm por

função administrar a justiça.

Nos sistemas políticos ocidentais os Juízes são independentes. No entanto, a realidade

mostra que os tribunais são um poder do Estado, que podem ter uma influência mais ou

menos vasta no processo político e que desempenham um importante papel na

manutenção do sistema político e na conservação da ordem existente.

Estrutura dos tribunais

O princípio da hierarquia dos tribunais é comum à quase totalidade dos sistemas

políticos. Eles distribuem-se conforme os países por dois ou três ou mais níveis,

existindo no vértice um tribunal superior que tem a função principal de julgar os

recursos dos tribunais inferiores e de uniformizar jurisprudência.

Nos países de tradição anglo-saxónica todos os tribunais estão em regra integrados

numa estrutura única independentemente de especialização e com um único tribunal

superior no topo (só há tribunais comuns, não há tribunais especializados). Nos países

de influência Francesa, existe uma distinção entre tribunais comuns ou ordinários e

tribunais especiais como por ex. os tribunais administrativos e fiscais, tendo cada um

deles uma estrutura própria.

Os tribunais constitucionais têm fundamentalmente poderes para fiscalizar a

aplicação das normas em termos de inconstitucionalidade e desempenham um

papel importante no funcionamento do processo político. Há, contudo, países onde

estes tribunais constitucionais não existem, sendo a fiscalização da constituição da

competência dos parlamentos, como por exemplo: Grã Bretanha; os países

Escandinavos e os países socialistas – Ex. URSS; ou então dos tribunais comuns.

Estatuto dos Juízes

O modo de designação dos juízes pode ser feito:

- Por nomeação feita pelo governo

- Por eleição directa das assembleias parlamentares (escolha)

- Cooptação pelos próprios juízes.

Podem coexistir no mesmo país, as três modalidades consoante os tribunais a que se

destinem.

Page 55: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

55

Os requisitos de recrutamento dos juízes também podem variar. Por exemplo, quando os

juízes são eleitos não se exige, muitas vezes um título académico específico. Não existe

portanto uma carreira profissional específica, nem a magistratura constitui de forma um

corpo próprio. Quando são nomeados, a formação académica em direito é um requisito

indispensável e estão em regra sujeitos a um estágio especial e existe uma carreira

específica da magistratura.

No sistema português os juízes são inamovíveis, (artigo 215.º a 218º da CRP)

Cfr.

Artigo 202.º a 214.º - sobre as normas dos tribunais.

Artigo 219.º a 220.º - sobre as normas especiais do ministério público.

Artigo 221.º a 224.º - sobre as normas do tribunal constitucional.

FORMAS DE DESIGNAÇÃO DOS ÓRGÃOS DO ESTADO COM RUPTURA

DA ORDEM CONSTITUCIONAL:

1) Golpe de Estado - quando os governantes actuam através da utilização da força e

violação da legalidade vigente, com o objectivo de manter-se no poder. O golpe de

Estado é o procedimento de certos governantes que recorrem à força para alterar a

legalidade existente e mudar os titulares dos órgãos supremos do Estado.

2) Insurreição - manifestação das forças armadas, apoiadas por forças sociais ou não,

contra o governo constituído, a fim de lhe imporem certa orientação ou mudarem os

governantes;

3) Revolução - manifestação violenta de forças sociais estranhas à organização do

Estado (massas, classe ou partido), apoiadas ou não pelas forças armadas, tendo em

vista a alteração brusca do regime político ou da ideologia dominante, das leis e das

instituições fundamentais e dos titulares dos órgãos de soberania;

FORMAS DE DESIGNAÇÃO DOS ÓRGÃOS DO ESTADO

CONSTITUCIONAIS:

1) Herança - transmissão hereditária das funções por aplicação das regras de sucessão

familiar - Monarquia;

2) Cooptação - escolha do titular de um órgão por outros titulares do mesmo órgão;

3) Nomeação - designação do titular de um órgão pelo titular de um órgão diferente.

Exemplo: a nomeação de um director geral;

Page 56: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

56

4) Inerência – o desempenho de funções num órgão implica o desempenho de funções

em órgãos distintos. É a atribuição legal da qualidade de titular de um órgão

governativo ao titular de um cargo público ou privado. Entre nós, temos o exemplo de

Portugal em que o Presidente da Assembleia da República, o primeiro-ministro, o

provedor de justiça, etc., são por inerência membros do Conselho de Estado;

5) Eleição - por sufrágio de entre um determinado grupo de eleitores - colégio eleitoral.

É o processo mais usado actualmente para seleccionar os representantes públicos e

consiste na escolha através da expressão dos votos de uma pluralidade de pessoas, que

são os eleitores.

ELEIÇÃO

A eleição política é um direito político - de eleger e de ser eleito - e um modo de

intervenção dos cidadãos na vida pública, na gestão dos destinos do Estado, onde tem

prevalecência o princípio da maioria.

ELEIÇÃO - escolha de titulares de órgão do estado é diferente de REFERENDO -

consulta sobre uma questão concreta.

O corpo eleitoral ou colégio eleitoral - é o conjunto de pessoas que têm capacidade

eleitoral (reúnem os requisitos legais para votar), e varia de país para país.

As condições ou requisitos de elegibilidade e os processos de escrutínio também variam

conforme o sistema eleitoral de cada país. Ao longo do tempo, foi-se evoluindo do

sistema de sufrágio restrito, censitário ou capacitário, para um sufrágio universal.

SISTEMA ELEITORAL

É o conjunto de regras, de procedimentos e de práticas, com uma coerência e lógica

interna, que permite que os votos de determinado conjunto de cidadãos sejam

convertidos em mandatos de determinado(s) titular(es) de órgãos de poder político. A

democracia impõe que os governados (cidadãos) possam manifestar a sua vontade sobre

a forma como o poder político deve ser exercido pelos governantes. A forma

contemporânea mais eficaz de o fazer é através do sufrágio na modalidade de eleição. A

eleição é uma forma de sufrágio que tem por objectivo a escolha dos titulares dos

órgãos políticos.

O referendo é outra forma de sufrágio que tem por objectivo a deliberação ou consulta

de questões concretas.

Page 57: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

57

A eleição por força do resultado da votação vai permitir apurar uma vontade baseada no

princípio da maioria. Este princípio de maioria, fundamenta-se em dois princípios: o

principio da igualdade e da liberdade.

O sistema eleitoral tem principalmente a ver com a forma como os votos são

convertidos em mandatos.

Assim, a eleição e o sufrágio implicam que sejam definidos previamente:

- o colégio eleitoral (O colégio eleitoral, ou seja, das pessoas que podem votar em geral

ou numa determinada eleição);

- o órgão de fiscalização (As entidades ou órgãos do Estado que acompanham o

processo eleitoral, ou seja, que têm competência em matéria de fiscalização e de

contencioso eleitoral);

- o círculo eleitoral;

- o número de titulares cujo mandato se pretende eleger;

- as pessoas elegíveis para esse cargos.

TIPOS DE SUFRÁGIO (em função do colégio eleitoral):

O sufrágio universal constitui um dos mais importantes traços caracterizadores das

democracias representativas. Só existe uma democracia em sentido material se a eleição

permitir aos eleitores uma escolha efectiva entre as alternativas que correspondam à

pluralidade de interesses dessa comunidade.

O sufrágio pode ser:

1) directo (quando os eleitores escolhem imediatamente os seus representantes) /

indirecto (quando apenas escolhem pessoas que vão a seguir escolher essas

representantes);

2) restrito (limita-se a uma parte dos cidadãos e chama-se censitário em que o

direito de voto depende dos meios de fortuna e capacitário quando o direito de

voto depende dos meios de instrução e de sexo) / universal ( quando se destina á

generalidade dos cidadãos a partir de uma certa idade);

3) inorgânico (de base territorial) / orgânico (de base corporativa)

4) plural (+ que 1 voto) / múltiplo (+ que uma qualidade) / simples

5) público / secreto

6) facultativo / obrigatório (com sanção);

7) individual / por listas (lista previamente estabelecidas pelos partidos)

Page 58: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

58

8) uninominal(em que cada divisão eleitoral o eleitor só pode votar num

candidato) / plurinominal (vota em + de 1 candidato)

DIVISÃO ELEITORAL (por círculos eleitorais)

a) círculos nacionais / locais

b) círculos uninominais / plurinominais

b.1) círculos uninominais: sistema de representação maioritária (maioria relativa

/ absoluta)

b.2) círculos plurinominais: sistema de representação maioritária ou

proporcional

SISTEMAS DE REPRESENTAÇÃO

No sistema de representação maioritária ganha o partido que tiver mais votos.

a) representação maioritária

a.1) maioria absoluta

a.2) maioria relativa

Há também sistemas de representação proporcional em que existe uma correspondência

entre o número de votos por cada lista e o número de candidatos que vão ser eleitos.

Neste sistema, a representação dos mandatos pode ser feita de acordo com vários

critérios. Um deles é usado em Portugal e é designado como método de Hondt.

b) representação proporcional

b.1) quociente eleitoral

b.2) divisor comum (sistema da média mais alta de Hondt)

EXEMPLO PRÁTICO:

Colégio eleitoral: 85.000 eleitores.

Círculo eleitoral plurinominal: 4 mandatos.

Listas de candidatos: A, B, C e D.

Votação:

Lista A: 30.000 votos

Lista B: 25.000 votos

Lista C: 21.000 votos

Lista D: 9.000 votos

Como distribuir os 4 mandatos?

Page 59: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

59

SITUAÇÃO 1: sistema de representação proporcional por quociente eleitoral

Divide-se o número de eleitores pelo número de mandatos e a cada lista pertencerão

tantos candidatos eleitos quantas vezes que o quociente apurado couber no número de

votos recebidos. Se restarem mandatos por atribuir eles irão para a(s) lista(s) em que

tiver sobrado mais votos.

85.000 eleitores : 4 mandatos = 21.250 eleitores/ mandato.

VOTOS MANDATOS

LISTA A 30.000 - 21.250 8.750 1

LISTA B 25.000 - 21.250 3.750 1

LISTA C 21.000 → 21.000 1

LISTA D 9.000 → 9.000 1

SITUAÇÃO 2: sistema de representação proporcional por divisor comum («da

média mais elevada de Hondt»)

Os votos obtidos por cada lista são sucessivamente divididos por 1,2,3… e os

quocientes apurados dispostos por ordem decrescente, os mandatos caberão ás listas a

que pertencerem os quocientes mais elevados.

VOTOS / 1 /2 MANDATOS

LISTA A 30.000 30.000 15.000 2

LISTA B 25.000 25.000 12.500 1

LISTA C 21.000 21.000 10.500 1

LISTA D 9.000 9.000 4.500 0

REGIMES POLÍTICOS

Forma política

Forma política é o modo como se estrutura e se exerce o poder político em sociedade.

Este modo de estrutura e de exercício do poder político pode assumir-se de dois modos:

1.Atendendo à política, à titularidade do poder, de modo a determinar-se o título

dele e quais os órgãos estabelecidos para o exercer. Deste modo determina-se o

sistema do poder;

Page 60: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

60

2.Têm em conta as concepções fundamentais das relações com o indivíduo e a

sociedade política com a ideologia, o poder político tem por missão estabelecer-

se na ordem jurídica, neste caso temos o regime político. Quer o sistema de

governo, quer o regime são essenciais para definir a forma política do Estado.

Regimes políticos

O Regime Político é definido pela concepção dos fins e dos meios do poder e da

comunidade, representada pela expressão política da Constituição material, ou seja, este

conceito não se esgota na mera organização do poder político, prendendo-se, também,

com o respeito pelos direitos fundamentais e com a organização económica e social.

Segundo a classificação de Aristóteles havia três regimes puros:

Número dos que mandam Regimes puros Regimes corrompidos

Um só Monarquia Tirania

Alguns Aristocracia Oligarquia

Todos Democracia Demagogia

Classificação de Jean Bodin:

Real Legitima Legitima

Senhorial Senhorial Senhorial

A

Monarquia

Tirânica

B

Aristocracia

Revoltosa

C

Democracia

Classificação de Montesquieu

N.º dos que mandam Valor Espaço geográfico Regimes puros

Vários Unidade Pequenos espaços República

Um só Espaços médios

Critério de relação que se estabelece entre a população e o poder. Segundo esta

classificação temos os regimes aristocráticos e os democráticos.

Page 61: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

61

- Os aristocráticos – são aqueles em que só uma parcela da população adulta participa

na escolha e no controlo dos governantes. Essa fracção da população pode ser

constituída pelo exército, por um partido único, por uma classe social ou por uma

família. A esta categoria pertencem os regimes ditatoriais, estejam ou não baseados

numa constituição.

- Os regimes democráticos – são aqueles em que a totalidade da população adulta

pode participar de forma directa ou indirecta, na tomada de decisões e na escolha e

controlo dos governantes. Estes regimes podem assumir as seguintes formas: a

democracia directa e a democracia representativa.

- na democracia directa, a totalidade da população adulta reunida

periodicamente em assembleia plenária, pode participar directamente na

tomada de decisões.

- Na democracia representativa, a totalidade da população adulta, apenas

pode participar na designação e controlo dos governantes, mas não nas

decisões concretas.

Tendo por critério a ideologia que os orienta ou o poder que prossegue – podemos

definir esta classificação em dois grupos:

- Regimes comunistas que não consentem, nem a circulação da sede do poder, nem a

alternância ideológica o que facilmente estabiliza a forma do Estado, como

autoritário ou totalitário.

- Os regimes pluralistas que prevêem a revolução legal, que torna viável a alternância

no poder e a mudança ideológica pelo consentimento expresso da população.

O Professor Marcelo Rebelo de Sousa adianta outro critério de distinção: «a

existência ou não de uma filosofia ideológica exclusiva ou liderante, de aparelho

destinado a impô-la, de efectiva garantia dos direitos pessoais dos cidadãos e de livre

participação na designação dos governantes e no controlo do exercício das suas

funções»: Ditatorial / Democrático

REGIME POLÍTICO DITATORIAL(estes podem ser autoritários ou totalitários)

a) filosofia ou ideologia exclusiva ou dominante;

b) aparelho destinado a impor a ideologia;

c) inexistência de efectiva garantia dos direitos pessoais dos cidadãos;

d) inexistência de livre participação na designação do governantes;

Page 62: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

62

e) inexistência de controlo do exercício das funções dos governantes;

REGIME POLITICO DEMOCRÁTICO

a) pluralidade e liberdade de filosofia ou ideologia;

b) inexistência aparelho destinado a impor a ideologia;

c) efectiva garantia dos direitos pessoais dos cidadãos;

d) livre participação na designação do governantes;

e) efectivo controlo do exercício das funções dos governantes;

O Estado e o sistema político

Sistema político – é o conjunto de processos de decisão e das relações de poder que

dizem respeito à totalidade de uma sociedade global. Mas nem todos os processos de

decisão inerentes a uma sociedade global passam de uma maneira efectiva pelo aparelho

do Estado, pois as relações de poder estabelecem-se e permanecem entre o Estado e a

sociedade civil. O sistema político não pode confundir-se, portanto, com o Estado pois

há outros tipos de estruturas políticas existentes na sociedade global:

Há as estruturas do aparelho do Estado, dotadas da faculdade legítima de

recorrer à força para se fazer obedecer;

Há, também, as estruturas que embora desempenhem funções políticas não

fazem parte do aparelho do Estado.

Nos regimes democráticos não pode confundir-se Estado com sistema político, embora

seja certo que ele ocupa a parte mais relevante.

Modelos de sistema políticos:

1 – Modelo da classe dominante “Burguesia e proletariado”.

2 – Modelo da elite do poder “Fascismo”.

3 – Modelo pluralista ou de concorrente dos eleitos “Democracia”

1 – Modelo da classe dominante – é de origem e inspiração marxista. Para os

marxistas o Estado que encara o poder político é uma instituição que tem por objectivo

Page 63: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

63

assegurar os privilégios da classe dominante e a manter a exploração das classes

dominadas. Para os marxistas a classe dominante da sociedade capitalista é a que obtém

o controlo e os meios de produção e que é capaz, de por força do poder económico que

lhe é conferido, de usar o Estado como um instrumento para dominar a sociedade. Karl

Marx (1863) optou por estratificar as sociedades em apenas duas classes sociais:

Burguesia – classe dominante, detentora dos meios de produção, exploradora e

usurpadora de todos os privilégios sociais.

Proletariado – classe dominada, possuidora da força do trabalho, explorada e

permanentemente afastada do poder e dos benefícios económicos e sociais que

ele acarreta.

2 – Modelo da elite do poder – esta teoria baseia-se no princípio de que o poder

político está concentrado num grupo social restrito dotado de coesão interna,

partilhando origens sociais, “status” económicos e educação comum. Esta teoria assenta

no conceito da superioridade dos membros da elite dominante (massa organizada), em

relação à não elite (massa inorganizada).

A elite, seja por força da sua organização, ou pelo seu poder, ou pelas qualidades

pessoais dos seus membros, é sempre capaz de explorar as suas posições de modo a

assegurar o seu domínio na sociedade sobre a classe da massa inorganizada, que é

politicamente inerte e apática. Os adeptos desta teoria defendem que em todas as

sociedades há uma minoria da população com características próprias e aptidões que

lhes permitem dominar política, económica e socialmente a maioria, que não tem meios

para controlar a elite do poder. Não admitem que a massa inorganizada possa atingir o

poder (Fascismo).

3 – Método pluralista ou de concorrente dos eleitos (Democracia) – esta teoria

baseia-se no princípio de que nas sociedades não existe um grupo dominante e que a

política é fundamentalmente o resultado de compromissos entre vários grupos de

interesse, que entram em competição pela conquista do poder. Segundo esta teoria o

poder está disperso por muitos centros e nenhum deles se pode considerar totalmente

dominante. Portanto, o poder está efectivamente fragmentado e nenhum dos grupos em

competição é suficientemente forte para se impor de forma definitiva aos outros.

(Democracia).

Grupos de interesse e de pressão

Page 64: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

64

O funcionamento do sistema político depende das exigências que lhe são formuladas e

dos recursos e apoios de que dispõem e de que existem ou que provêem da comunidade

política. Nas modernas sociedades os indivíduos não conseguem em regra expressar os

seus interesses e necessidades de uma forma individualizada, nem fazer chegar as suas

reivindicações aos centros de decisão do sistema, nem têm influência na tomada de

decisões. Por isso eles necessitam de se associar em função dos seus interesses. A essas

associações chama-se em política grupos de interesse ou grupos de pressão.

Ponto comum entre grupos de pressão e grupos de interesse são as pessoas com

interesses comuns, ou com um ou mais denominadores comuns.

Diferenças:

Os grupos de interesses são associações que procuram realizar os seus fins de acordo

com a lei vigente, actuando apenas na esfera da vida privada.

Os grupos de pressão são organizações, constituídas para a defesa de interesses, que

exercem pressão sobre os poderes políticos em função das decisões que estes venham a

tomar, para que estas sejam favoráveis à realização dos seus interesses. Exercem

pressão sobre os governantes para que modifiquem a lei em benefício dos seus

interesses sem pretenderem conquistar o poder político. Os grupos de pressão estão em

conformidade com as características dos regimes democráticos constitucionais

pluralistas, e podem dividir-se em três características:

a) Grupos económicos:

1) Fundamentais;

2) Secundários.

b) Grupos não económicos:

1) Associações com objectivos políticos mas que não dependem de partidos,

Igrejas e associações religiosas, Associações culturais, Filantrópicas,

Humanitárias, etc.

c) Grupos políticos:

1) Partidos políticos

Características dos Grupos de pressão:

a) grupo organizado - organização bem estruturada e especializada na articulação de

interesses com cariz voluntário e durável;

b) visa a defesa de interesses particulares/privados - morais ou materiais

c) exercem pressão sobre o poder político com vista à satisfação do interesses;

Page 65: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

65

Espécies de Grupos de Pressão:

a) Exclusivos - actuam apenas na esfera política;

b) Parciais - quando acumulam ao fim de exercer pressão política com outras

finalidades, económicas, religiosas, culturais, ecológicas, etc...

Como actuam os grupos de pressão:

Formas de intervenção:

a) intervenção directa sobre os órgão de poder –

amistosa: contactos, negociações, informações, reuniões;

perversa: intimação, ameaça, chantagem, corrupção;

b) intervenção indirecta - actuam sobre o poder procurando influenciar os partidos

políticos, por vezes com relações estáveis ou mesmo orgânicas, ou mediante pressão

sobre a opinião pública com greves, propaganda ou informação.

Eles podem fazer pressões de forma directa ou de forma indirecta, através de partidos

ou da opinião pública, sendo um dos meios mais usados o recurso à informação através

do envio de dossiers e troca de correspondência com o poder.

Os contactos e as negociações: (visitas aos gabinetes dos ministros), são outro meio

usado para influenciar as reuniões. Como esses meios nem sempre surtem efeito, os

grupos recorrem muitas vezes à intimidação, à coacção ou mesmo à chantagem e à

corrupção. Se esses meios não forem suficientes, há também o recurso a outras formas

de acção (greve, encerramento das empresas, etc.).

Outro meio é as “caixa eleitoral”, através das quais as organizações financiam as

campanhas dos partidos que as apoiam.

Os sistemas de partidos e os grupos para-políticos:

Partidos políticos: agrupamento de cidadãos, organizado, tendo em vista participar no

funcionamento das instituições políticas (ser titulares de órgãos de poder) e exprimir

organizadamente a vontade popular (ser condicionante na formação e representante da

vontade popular nos órgãos de poder).

Partidos políticos, são organizações que lutam pela aquisição, manutenção do exercício

do poder. Características:

- São organizações com uma implementação generalizada e duradoura (representação

política global);

Page 66: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

66

- São organizações com vontade deliberada de aceder e exercer o poder político;

- São organizações de formação e expressão da vontade popular e que querem

participar no funcionamento das instituições;

- São organizações de carácter exclusivo no sentido de que a filiação num partido é

incompatível com a inscrição noutro.

A última característica distingue os partidos das associações políticas.

PARTIDOS POLÍTICOS ≠ ASSOCIAÇÕES POLÍTICAS

Os Partidos Políticos:

1. aspiram a representar politicamente a sociedade na sua globalidade exprimindo a

vontade popular na realização das opções da colectividade;

2. propõe-se exercer o poder político ou influenciar directamente o seu exercício;

3. agrupamento de carácter duradouro;

4. exige exclusividade de filiação

As Associações Políticas:

1. visam essencialmente a representação de sectores determinados da

colectividade;

2. limitam-se a participar na actividade de instâncias sociais e a tentar influenciar o

exercício do poder político;

3. podem constituir-se por prazo determinado (se perdurar pode acabar

transformando-se num partido);

4. a participação numa associação é compatível com a participação em outras ou

mesmo num partido político.

GRAUS DE PARTICIPAÇÃO PARTIDÁRIA:

1º - eleitores

2º - simpatizantes

3º - aderentes

4º - militantes

Fins e funções dos partidos políticos

Fins são os objectivos para que foram criados.

- Participar no funcionamento e no aperfeiçoamento das estruturas político-

constitucionais.

Page 67: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

67

- Representar politicamente o povo.

- Essa representação pode ser em sentido rigoroso ou perfeito nas democracias

representativas ou em sentido imperfeito, nos regimes ditatoriais.

As funções do partido variam de acordo com o ambiente em que nasceram e dividem-se

essencialmente em:

- Funções políticas e funções administrativas.

Funções políticas dos partidos

• função representativa: que é essencial e que consiste na apresentação de

candidaturas às eleições dos titulares dos órgãos do poder político; • função de titularidade e exercício do poder político: para o que é necessário

preparar quadros aptos a desempenhar o poder político e a criar estruturas de

apoio aos seus dirigentes.

• função de definição da política interna: consiste em estabelecer ou definir a

posição do partido perante os problemas da colectividade e designar os titulares

dos órgãos internos do partido.

• função pedagógica: tem por fim informar os militantes e simpatizantes e o

eleitorado em geral, sobre as principais questões da vida colectiva e das posições

que o partido assume nessas matérias.

• função de criação e apoio a estruturas paralelas: estruturas sindicais,

cooperativas, associações cientificas, etc.

• função de relações externas: tem por objectivo estabelecer ligações de

cooperação e amizade com outros partidos estrangeiros que com eles tenham

afinidades e com organizações internacionais.

Funções administrativas dos partidos

Funções administrativas em sentido rigoroso relacionadas com a organização interna do

partido (função administrativa stricto sensu) e a função financeira, como é o caso da

gestão dos recursos do partido e dos estatutos e regulamentos do partido.

Classificação dos partidos

Page 68: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

68

Os partidos podem classificar em dois grupos: os partidos de quadros e os partidos de

massas.

- Os partidos de quadros caracterizam-se por não visar um número de aderentes muito

elevado, mas tentarem reunir quadros bem preparados com pessoas de prestigio, seja

a nível moral, social, económico ou intelectual, os quais podem exercer influência

no eleitorado e dar-lhes apoio. Estes tipos de partidos nascem nos primórdios do

sufrágio censitário ou no início da institucionalização do sufrágio universal. O seu

financiamento é feito em regra por grandes capitalistas, interessa-lhes mais a

qualidade do que a quantidade dos seus membros, são partidos flexíveis,

indisciplinados pela ausência de disciplina de voto. Em regra situam-se ao centro ou

à direita do quadro político.

PARTIDOS DE QUADROS:

a. não visam um número elevado de aderentes ou militantes;

b. pretendem reunir quadros bem preparados de pessoas com prestígios moral, social,

e económico (quer pela influência que podem ter no eleitorado, pela angariação de

fundos que podem proporcionar);

c. procuram qualidade em detrimento da quantidade;

d. partidos que nasceram da institucionalização do voto universal;

e. A sua componente ideológica política é fraca

f. partidos flexíveis - ausência de disciplina de voto;

g. tem uma estrutura descentraliza com actividade periódica visando uma função

eleitoral, parlamentar e de conquista de eleitores;

h. são partidos de notáveis da grande e pequena burguesia, colocando-se

essencialmente à direita e centro do espectro político – partidário;

PARTIDOS DE MASSAS

a) procuram grande número de aderentes e militantes, procurando ir de encontro com os

seus interesses;

b) manifestam interesses extra-parlamentares, como seja a formação política das

populações e a criação e apoio a estruturas económicas e sociais de massas;

c) são financiados através das quotizações dos seus militantes, pretendendo substituir o

financiamento dos grandes capitalistas pelo financiamento popular;

Page 69: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

69

d) tem fortes ligações ideológicas;

e) são partidos rígidos - com disciplina de voto no parlamento e altamente

centralizados. Surgem com o sufrágio universal e com o desenvolvimento das teses

socialistas e comunistas. São partidos operários, disciplinados que procuram recrutar e

formar o maior número possível de militantes.

Em suma, os partidos de massa englobam um grande número de aderentes,

demonstrando um grande interesse por estes e pelos seus militantes e demonstram

interesse na formação política das populações e na criação de estruturas sociais e

económicas de massas. Recebem como financiamento as quotas pagas pelos seus

militantes.

Modalidades de partidos de massas

Os partidos sociais, os partidos comunistas e os partidos fascistas.

Estruturas dos partidos e grupos de participação

Todos os partidos têm três círculos de participação:

- O primeiro que é o mais largo engloba os eleitores são os que votam nos candidatos

apresentados pelo partido, embora não demonstrem qualquer preferência antes do

acto eleitoral.

- O segundo círculo é o dos simpatizantes, são os que embora não pertencendo ao

partido aprovam-no e apoiam-no publicamente confessando a sua preferência e ás

vezes até com algum apoio financeiro.

- O terceiro círculo é o dos militantes que são os membros activos do partido que

fazem a propaganda eleitoral20.

Estrutura orgânica dos partidos

Há a chamada lei de bronze da oligarquia partidária, segundo a qual a crescente

profissionalização, especialização e burocratização dos militantes activos, dos partidos e

dos seus filiados e em especial dos seus dirigentes, conduzem, em regra, a uma

oligarquia de chefia. Ou seja a especialização técnica que surge como uma

consequência da organização do partido acaba por fazer com que o poder de direcção

seja mais ou menos retirado às massas e fique concentrado nas mãos dos chefes. Estes

20 Há ainda um outro círculo que podemos chamar de aderentes ou filiados que estão inscritos no partido.

Page 70: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

70

que, de início, eram órgãos executivos da vontade colectiva vão-se tornando

independentes das massas e subtraindo-se ao controlo delas. Esta questão é uma questão

da democracia interna de cada partido que se relaciona com a maior ou menor rigidez e

com a autoridade do respectivo grupo parlamentar.

Os sistemas partidários

Vamos seguir uma classificação que os divide em cinco tipos diferentes:

- Monopartidismo que é o sistema de partido único

- Bipartidismo prefeito que é o sistema em que os dois primeiros partidos dividem de

modo mais ao menos igual 90% dos votos validamente expressos.

- Bipartidismo imperfeito, que é o sistema de dois partidos e meio, em que um

terceiro partido desfruta da representatividade suficiente para perturbar a dos dois

grandes partidos que só têm entre 75% a 85% do total dos votos.

- Multipartidismo integral ou prefeito que é o sistema existente nas sociedades

políticas atomizadas: significa que quando existem três ou mais partidos que

distribuem entre si de forma aproximada iguais percentagens eleitorais;

- Multipartidismo imperfeito ou de partido dominante que é o sistema em que existem

três ou mais partidos, mas em que um deles sobressai por conseguir alcançar pelo

menos 35% do eleitorado, assumindo uma posição dominante no aparelho do

Estado.

Tendo como critério o número, dimensão eleitoral e expressão no exercício do poder

político dos partidos políticos existentes podemos, assim, reduzir a 4 sistemas de

partidários:

1 - sistema de partido único

2 - sistema de partido liderante

3 - sistema bipartidário

3.a) bispartidismo perfeito

3.b) bipartidismo imperfeito

4- sistema multipartidário

4.a) perfeito

4.b) imperfeito

5 - sistema sem partidos organizados –( monarquia absoluta)

Page 71: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

71

Os grupos para-políticos e os partidos políticos

A expressão, a agregação e a depuração (filtrar) das exigências (ou outputs) não é uma

tarefa exclusiva dos partidos e dos grupos de interesses e de pressão, pois existem nas

sociedades políticas outras associações de indivíduos que desempenham um papel

activo no processo político, e que são os grupos para-políticos ou para-partidistas

(semelhantes a partidos).

Essas associações têm um âmbito de acção mais amplo e generalizado do que os grupos

de interesses ou de pressão ( estes têm interesses concretos e específicos).

Distinguem-se dos partidos políticos, porque eles não participam directamente nas

eleições, nem desempenham funções parlamentares, nem lutam pela conquista do poder.

Além disso também se distinguem dos partidos políticos porque não exigem

exclusividade aos seus associados.

Page 72: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

72

AULAS SEGUINTES A 18-10-2006

2ª PARTE – DIREITO CONSTITUCIONAL

a. O princípio do estado de direito

b. O princípio democrático

i. Caracterização constitucional do princípio democrático

ii. Concretização constitucional do princípio democrático

1. O princípio da soberania popular

2. O princípio da representação popular

3. O princípio da democracia directa

4. Traços fundamentais do regime jurídico-constitucional do

referendo

5. O princípio da participação

iii. O princípio democrático e o direito de sufrágio

iv. O princípio democrático e o sistema maioritário

.

c. O princípio da Socialidade

d. O princípio da Unidade do Estado

Introdução

Constituição e constitucionalismo

Page 73: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

73

O Estado Constitucional é o Estado com uma Constituição limitadora do poder

através do direito. Como refere Gomes Canotilho21 as ideias do governo de leis e não de

homens, de Estado submetido ao direito, de constituição como vinculação jurídica do

poder foram realizadas através dos institutos do rule of law, due processo f law,

rechtsstaat, príncipe de la legalité, faltando, no entanto, a legitimação democrática do

poder. Por isso o elemento democrático foi introduzido não só para travar o poder, mas

também pela necessidade de legitimação do mesmo poder. Mas só o princípio da

soberania popular (todo o poder vem do povo) assegura e garante a igual participação na

formação democrática da vontade popular. É este princípio da soberania popular que

permite a compreensão da moderna fórmula de Estado de direito democrático.

O constitucionalismo moderno será uma técnica específica de limitação do poder com

fins garantísticos, sendo, claramente, uma teoria normativa de política. Este

constitucionalismo moderno legitimou o aparecimento da chamada Constituição

Moderna, entendida como a “ ordenação sistemática e racional da comunidade política

através de um documento escrito no qual se declaram as liberdades e os direitos e se

fixam os limites do poder político”22

A constituição neste sentido assenta em duas ideia básicas:

- Ordenar, legitimar e limitar o poder político.

- Reconhecer e garantir os direitos e liberdades dos indivíduos.

Importa ter presente o poder constituinte e os problemas que levanta e que são

essencialmente quatro:

1. O que é poder constituinte – ele revela-se sempre como uma questão de poder, de

força ou de autoridade política, que está em condições de, em determinada situação

concreta, criar, garantir ou eliminar uma constituição percebida como lei

fundamental da comunidade política.

2. Quem é o titular do poder constituinte – qual é a grandeza política capaz de

mobilizar a força ordenadora do povo no sentido de instituir uma lei fundamental

(constituição): o titular do poder constituinte só pode ser o povo23, entendido no seu

sentido global, pluralista como conjunto de indivíduos, associações, igrejas,

comunidades, personalidades, instituições, sendo eles veiculadores de interesses,

21 J.J.Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 1998, pg 92 22 J.J.Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 1998, pg 46 23 O povo é no seu todo e não só a maioria

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74

crenças, tradições, valores, com carácter plural (com ideias diferentes), convergentes

ou conflituantes.

3. Como proceder para elaborar e aprovar uma constituição – será por

procedimento legislativo-constituinte através de uma assembleia eleita de propósito

para fazer essa constituição ou por um processo referendário-plebiscitário24 em que

o povo decide a aprovação como lei fundamental de um texto que foi submetido à

sua aprovação.

4. Saber qual o conteúdo e a legitimidade da constituição e quais os limites do

poder constituinte - ou seja, a questão de saber se existem ou não limites jurídicos

e políticos quando ao exercício do poder constituinte25.

O poder constituinte entende-se como estando vinculado à observação de certos

princípios de justiça e ao princípio do direito constitucional. Exemplo: Princípio da

independência, da observância dos direitos humanos, designadamente da Declaração

Universal dos Direitos do Homem, pois nenhum sistema jurídico interno poderá

considerar-se hoje fora da comunidade internacional.

Direito constitucional – conjunto de princípios e normas que regulam a organização, o

funcionamento e os limites do poder público do Estado, além de estabelecerem os

direitos das pessoas que pertencem à respectiva comunidade política. Isto significa que

o direito constitucional assenta numa tensão que busca um equilíbrio, muitas vezes

difícil, entre o poder público estadual (que detém o monopólio dos meios públicos,

coacção) e a comunidade de pessoas em nome da qual esse poder é exercido

(desprovido de autonomia e liberdade frente àquele poder)

O Direito Constitucional pode ser entendido como:

- Direito constitucional material (conjunto de normas e direitos fundamentais das

pessoas).

- Direito constitucional económico (a organização económica da sociedade

estabelecendo os termos da intervenção do Estado, nos planos económicos, fiscal e

financeiros).

24 É uma votação popular de um projecto de constituição elaborado unilateralmente pelos titulares do poder. 25 Existem certos princípios – dignidade da pessoa, justiça, liberdade, igualdade, através dos quais se pode apurar da bondade ou maldade de uma constituição.

Page 75: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

75

- Direito constitucional organizativo: está ligado ao modo de organização e

funcionamento do estado e os aspectos relacionados ás suas estruturas.

- Direito constitucional garantístico: é um conjunto de normas que têm por fim

estabelecer os mecanismos de defesa da constituição e da sua prevalência sobre

todas as outras normas jurídicas.

Características do direito constitucional

– Supremacia – o direito constitucional têm na ordem jurídica uma posição

suprema colocando-se no topo da respectiva pirâmide, implicando que as suas

normas e princípios não possam ser contrariadas por qualquer outra fonte de

direito.

– Transversalidade – Ao direito constitucional cabe a preocupação de traçar as

grandes opções da comunidade, o que logicamente determina o seu

relacionamento com os múltiplos temas relevantes para essa comunidade Essa

transversalidade implica muitas vezes dificuldade na tarefa de harmonizar

alguns ramos de direito

– Politicidade – Tem haver com o poder público e político.

– Estadualidade – Estuda a soberania do Estado.

– Legalismo – Assenta numa óptica legalista, porque a sua função recai na lei.

– Fragmentarismo – Compete-lhe efectuar apenas a regulamentação mínima

fundamental dos diversos institutos jurídicos, públicos e privados, em que

raramente lhe compete efectuar uma regulação completa das matérias que trata.

– Juventude – Significa que pouco tempo medeia entre a sua criação e o tempo

actual. Isso leva a que não exista uma actividade doutrinária e jurisprudencial

tão abundante como noutros ramos de direito.

– Abertura – O direito constitucional aceita contributos de outros ordenamentos

jurídicos, sobretudo na parte dos direitos fundamentais.26

26 O direito constitucional tem especiais ligações com o direito administrativo e com o direito internacional público.

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76

Podemos fazer a seguinte diferenciação:

Direito Constitucional

Em sentido material27:«o conjunto de normas jurídicas fundamentais que regem:

- a estrutura, os fins e as funções do Estado;

- a organização, a titularidade, o exercício e o controlo do poder político do

Estado;

- a fiscalização e garantia do cumprimento das normas jurídicas pelos cidadãos e

pelo próprio poder político do Estado.»

Em sentido formal: «o conjunto de normas jurídicas escritas, elaboradas por órgão

dotado de poderes especiais, através de um processo específico, diverso do que gera as

leis ordinárias.28

Em sentido instrumental: «texto único em que se compilam as normas formalmente

constitucionais: a Constituição.

1. OS PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES DA CONSTITUIÇÃO DA

REPÚBLICA PORTUGUESA

A Constituição é formada por regras e princípios de diferentes graus de caracterização.

Existem, em primeiro lugar, os principio estruturantes, constitutivos e indicativos das

ideias, directorias básicas de toda a ordem constitucional, (são as traves mestres da

constituição).

São considerados princípios estruturantes:

1 – O princípio do Estado de Direito

2 – O princípio Democrático

3 – O princípio da Socialidade

4 – O princípio da Unidade do Estado

27 Constituição material: (normativa material) – neste sentido é o conjunto de normas, que regulam as estruturas do Estado e da sociedade nos seus aspectos essenciais, seja qual for a fonte formal, donde essas normas são oriundas. Constituição real: (material) – conjunto de forças políticas ideológicas e económicas que operaram na comunidade e condicionam de forma decisiva todo o ordenamento jurídico (conceito sociológico) 28 É a constituição como acto escrito e solene, que como fonte de direitos cria normas jurídicas hierarquicamente superiores ás restantes.

Page 77: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

77

Estes princípios estruturantes ganham concretização ou densificação através de outros

princípios ou sub-princípios. Exemplo: O princípio do Estado de direito é densificado

ou concretizado através de outros sub-princípios: princípio da constitucionalidade; o

princípio da legalidade da administração

Esses princípios constitucionais chamam-se gerais ou fundamentais e podem, por sua

vez, concretizar-se ou densificar-se ainda mais através de outros princípios

constitucionais especiais. Exemplo: O princípio da legalidade da administração é

concretizado pelo princípio da preeminência ou prevalência da lei e pelo princípio da

reserva de lei.

Os princípios estruturantes não são apenas densificados ou concretizados através de

princípios constitucionais gerais ou especiais, pois a sua concretização é feita, também,

por várias regras constitucionais. Exemplo: As normas que garantem o direito de

recurso contencioso contra certos actos da administração. (artigos: 268.º, n.º(s) 4 e 5),

são uma concretização do princípio da legalidade da administração e do princípio

especial da prevalência da lei e do princípio estruturante do Estado de direito.

Princípios estruturantes ↓

Princípios constitucionais gerais ↓

Princípios constitucionais especiais ↓

Regras constitucionais ↓

Nota: Este esquema não se desenvolve apenas de cima para baixo, dos princípios mais

abertos para os princípios mais densos, ou apenas de baixo para cima, ou seja de

concreto para o abstracto.

A formação do sistema interno consegue-se através de um processo de esclarecimento

recíproco, em que os princípios estruturantes ganham densidade e transparência através

dos princípios concretizadores, e estes formam com aqueles uma unidade material (a

unidade constitucional).

Todos estes princípios e regras poderão vir a ser concretizados através da lei e da

jurisprudência.

1.1. O Princípio do Estado de Direito

Pressupostos materiais:

a) - Juridicidade

Page 78: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

78

b) - Constitucionalidade

c) - Sistema direitos fundamentais

Pressupostos formais:

d) - Princípio da divisão de poderes

e) - Garantia de uma Administração Autónoma Local

A JURIDICIDADE

O Estado de Direito implica uma Constituição que vise conformar as estruturas do

poder político e a organização da sociedade segundo a "medida do direito".

No sentido material o Direito é um meio de ordenação racional e vinculativa de uma

comunidade organizada - de uma sociedade política.

No sentido formal o Direito é o mecanismo de estabelecimento de regras e medidas, de

prescrição de formas e procedimento e de criação de instituições que cumpram a função

ordenadora necessária à realização da sua dimensão material.

Significa que o ordenamento jurídico tem que obedecer a 3 características essenciais:

1 – Ser um sistema jurídico organizado, não caótico

2 – Ser um sistema jurídico hierarquizado e encimado pela constituição

3–Ser um sistema dotado de mecanismos que, possam verificar as relações de

desconformidade das normas jurídicas, com as normas de carácter superior, este

princípio está consagrado nos (artigo 3º, n. 2 e 3).

DIMENSÃO DA JURIDICIDADE:

- criação de garantias jurídico-formais que ordenam a vida política (direito

constitucional);

- regulação das relações jurídicas, civis e comerciais (direito civil e comercial)

- regulação do comportamento da administração pública (direito administrativo)

- punir a violação de bens e valores jurídica e constitucionalmente protegidos

(direito penal e contra-ordenacional)

- criação de normas, processos e procedimentos para solucionar conflitos de

interesse público e privado (direito processual)

O Estado de Direito é um Estado de Justiça:

• respeito pelos direitos das minorias

• equidade (equilíbrio) na distribuição de direitos e deveres fundamentais;

Page 79: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

79

• igualdade de bens e oportunidades;

• a ideia de direito concretiza-se através de princípios jurídico-materiais

como o:

a) princípio da proibição do excesso;

Princípios da proporcionalidade, é muito importante no Estado

de direito e influência todo o direito público. A

proporcionalidade significa uma ponderação entre os meios a

usar e as finalidades a atingir. A ideia de proporcionalidade

reduz-nos desde logo à proibição do excesso de proibição de

uma actuação excessiva e pode decompor-se em três vertentes:

1 - A adequação ou idoneidade

2 - A necessidade

3 - A proporcionalidade em sentido estrito.

Conclusão: A actuação jurídico-pública será

adequada (ou inadequada) se se apresentar como apta (ou

inapta) à obtenção do resultado que a lei lhe faz destinar.

Será necessária se não houver outra actuação que seja

menos gravosa ou menos lesiva. Será proporcional ou

racional quando os efeitos escolhidos se apresentem

equilibrados, numa óptica da relação de custos /

benefícios. Este princípio encontra-se estipulado em vários

preceitos da constituição, em especial nos artigos 18.º e

19.º

b) princípio da segurança jurídica e da protecção da

confiança dos cidadãos;

Este princípio da segurança jurídica e da protecção e confiança dos cidadãos divide-se

em dois grupos:

1) Princípio da segurança jurídica – este princípio exige a publicação das

decisões jurídico-públicas e obriga à sua clareza e à certeza do seu sentido.A

Constituição Portuguesa consagra este principio quando estipula no seu artigo

119.º - n..º 2 a ineficácia jurídica de actos não publicados.

Este princípio consta também da lei n.º 74/98, de 11/11, que é a lei de publicação

e identificação e formulário dos diplomas. Esta preocupação da lei ordinária vai

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80

ao ponto de estabelecer um período de “vacatio legis” (vazio da lei), quando a

lei nada disser, a fim de permitir o seu conhecimento. A obrigatoriedade de

publicitação das normas jurídicas tem a importância de à partida as pessoas não

poderem invocar o desconhecimento da lei para se eximirem ao respectivo

cumprimento.

2) Princípio da protecção da confiança – tem por objectivo criar um clima de

estabilidade entre o poder público e os cidadãos destinatários dos actos jurídicos

públicos. Esta relação de confiança interliga-se com o princípio da aplicação

prospectiva de retroactividade desses actos. (artigo 12.º n.º 1 – Código Civil). O

princípio geral do direito constitucional português, nesta matéria, é o de que se

admite a aplicação retroactiva dos actos do poder público, não existindo

proibições genéricas no sentido dessa proibição, existindo algumas limitações

parcelares em face de certas realidades, que abrangem os seguintes casos:

• Irretroactividade das leis restritivas dos direitos, liberdades e

garantias( 18, nº39.

• Irretroactividade da lei penal incriminadora (artigo 29º, nº1, 2,

3 e 4).

• Irretroactividade da lei penal processual através do princípio

do juiz legal (esta competência tem de estar definida até ao

momento da prática do acto criminoso).

• Irretroactividade da lei fiscal de tributação positiva (art.

103º,nº1)

• Irretroactividade dos efeitos da declaração da

inconstitucionalidade com a formação de caso julgado (artigo

282.º)

Em contrapartida, há casos em que a Constituição impõem a aplicação de certas fontes

normativas, como por exemplo artigo 29.º - n.º 429.

c) princípio da indemnização dos danos;

29 No que se refere a este princípio, a sua aplicação têm-se apoiado em dois requisitos fundamentais: 1 - Frustração de legitimas expectativas criadas, traduzida na mudança de regimes jurídicos previamente estabelecidos. 2 - A necessidade de essa mudança ser legitima em função de um forte interesse público que a justifique (não podendo, essa mudança representar o produto de acção arbitrária, discricionária, caprichosa ou excessiva.

Page 81: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

81

Este princípio exige a obrigatoriedade de pagamento dos

sacrifícios que uma das partes tenha em qualquer contenda. Por

exemplo em questões de conflito de interesse público/interesse

privado, em que o primeiro prevalecerá, não poderá ficar o

interesse privado sem qualquer protecção e por isso a

indemnização (art. 62º, nº 2 da CRP).

d) princípio da igualdade;

É um princípio amplamente associado ao Estado de direito e

assume duas dimensões distintas mas absolutamente

complementares:

- Uma dimensão igualizadora, que significa tratar de forma

igual o que é igual.

- Uma dimensão diferenciadora, que significa tratar de

forma diferente o que é desigual.

A Constituição assume este princípio em muitos preceitos, mas a

sua formulação mais solene consta do artigo 13.º.

Os critérios de aferição previstos no n.º 2, do artigo 13.º, como a

raça, a ascendência, …., são critérios a título exemplificativo. É,

portanto, possível aplicar outros critérios para fundar um

tratamento desigualitário e legítimo, desigualmente através de

recurso à Declaração Universal dos Direitos do Homem, onde se

refere: “todos os seres humanos têm os direitos e as liberdades

proclamadas na presente declaração, sem distinção alguma,

nomeadamente, raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de

organização política, ou outra, de origem nacional ou social, de

fortuna, de nascimento e de qualquer outra situação”.

e) princípio do respeito da dignidade pessoa humana

A pessoa é colocada como fim supremo do Estado e do Direito.

Este conceito encontra a sua grande consagração nos direitos

fundamentais e assume uma posição eminente no texto da nossa

constituição, desde logo nos preceitos iniciais. (artigos n.(s) 1 – 1

parte; e também no que toca ao direito fundamental pessoal

(artigo 26.º n. 2).

Page 82: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

82

A CONSTITUCIONALIDADE

O Estado de direito é um Estado constitucional, pressupondo a existência de uma

Constituição que sirva, isto é que valha e vigore, de ordem jurídico normativa

fundamental vinculativa de todos os poderes públicos. A Constituição é uma verdadeira

ordenação normativa fundamental dotada de supremacia (supremacia da constituição),

sendo nesta supremacia normativa da lei constitucional que o primado do direito do

estado de direito encontra uma primeira e decisiva expressão30

1ª dimensão: É um Estado constitucional - existência de uma constituição formal

codificada;

2ª dimensão: Vinculação do legislador à constituição -enquanto parâmetro formal e

material da criação de direito e logo do exercício do poder legislativo, inclusivamente

quanto à própria revisão da constituição.

3ª dimensão: vinculação de todos os actos do Estado à Constituição

• - conformidade intrínseca e formal de todos os actos do poder político com a

constituição (art. 3º n.º 2 CRP)

• - sujeita os actos políticos aos parâmetros constitucionais e ao controlo da sua

conformidade (art. 3º n.º 3 CRP).

• - sujeita à conformidade da constituição mesmo a obrigação de agir do Estado -

podendo o princípio da constitucionalidade ser igualmente violado por omissão

- (art. 283º CRP)

4ª dimensão: princípios da reserva da Constituição

• - princípio da tipicidade constitucional de competências - os órgãos do Estado só

têm competência para fazer aquilo que a constituição lhes permite (as funções

atribuídas a um órgão são a medida da sua competência!) (artigo 111º n.º 2 CRP)

• - princípio da constitucionalidade de restrições a direitos liberdades e garantias -

as restrições a estes direitos devem ser feitas directamente na CRP ou através de

lei mediante autorização constitucional e apenas nos casos previstos na

constituição (art. 18º n.º 2 CRP)

5ª dimensão: força normativa da constituição - a constituição não pode ser posta em

causa quer pela alegação de "superiores interesses da nação" , quer pela alegação de

uma qualquer ideia de direito superior ou princípios transcendentes.

30J.J.Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 1998, pg 239

Page 83: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

83

Aula de 30-10-2006

SISTEMA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS

A raiz antropológica do Estado de Direito reconduz-nos à natureza do Estado como

forma de garantia do Homem enquanto pessoa, como cidadão, como trabalhador, e

como administrado. Daqui vem a natural integração de um sistema de reconhecimento e

protecção de direitos fundamentais do ser humano na própria constituição:

• - através da afirmação da integridade física e espiritual do Homem como

dimensão irrenunciável da sua individualidade autonomamente responsável (art.

24º , 25º e 26º da CRP)

• - através da garantia da identidade e integridade da pessoa mediante o livre

desenvolvimento da sua personalidade (art. 26º da CRP);

• Com o imperativo social de direito aponta-se para a libertação da angústia da

existência da pessoa mediante mecanismos de socialidade( possibilidade de

trabalho, emprego e qualificação profissional e garantia de condições mínimas

de existência através do subsídio de desemprego e do rendimento mínimo

artigos 53º, 58º, 63 e 64º);

• Garantia e defesa da autonomia individual através da vinculação dos poderes

públicos a conteúdos, formas e procedimentos do estado de direito;

• Dimensão igualdade-justiça dos cidadãos expressa na mesma dignidade social e

na igualdade de tratamento normativo (artigo 13º igualdade perante a lei e

através da lei).

PRINCÍPIO DA DIVISÃO DE PODERES

• - dimensão negativa: a separação como divisão, controlo e limite do poder;

• - dimensão positiva: a separação como constitucionalização, ordenação e

organização do poder do estado tendente a decisões fundamentalmente eficazes

e materialmente justas.

Page 84: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

84

Princípio da separação de poderes31, consiste em que cada órgão de Estado exerça uma

função de Estado. Ao Parlamento cabe a função legislativa; ao órgão executivo

(Governo) a função administrativa; ao órgão judiciário (tribunais) compete-lhe a

jurisdicional. Com esta separação limitar-se-ia de forma eficiente o poder. Apesar de se

manter ainda este princípio da divisão de poderes ele sofreu algumas alterações

perdendo a sua rigidez inicial do ponto de vista orgânico, pois a função legislativa

deixou de ser monopólio do parlamento, por várias razões que podemos resumir nas

seguintes:

a) Razões de maior tecnicidade que a lei passou a exigir e que os deputados,

muitas vezes não tinham competência a nível técnico para legislar nessas

matérias.

b) A celeridade que a produção legislativa foi exigindo cada vez mais, apesar

disso os órgãos parlamentares mantiveram sempre e mantêm ainda o primado da

competência legislativa.

Os sinais desse primado na nossa Constituição são numerosos e vão desde a

competência legislativa genérica do parlamento à competência legislativa em matérias

de reserva, nuns casos absoluta, noutros relativa ou mesmo à sujeição dos decretos-leis

à apreciação do parlamento para recusa de ratificação.

A separação e a independência dos tribunais, a quem é reservada a função jurisdicional

constitui um elemento importantíssimo do princípio da separação dos podres. E esta

reserva é até um reduto essencial desse princípio num Estado de direito.

O princípio da separação dos poderes está consagrado no artigo 111.º da constituição e a

sua exemplificação prática assenta-se no relacionamento entre os diversos órgãos de

soberania.

GARANTIA DE ADMINISTRAÇÃO AUTÓNOMA LOCAL

É um elemento constitutivo do estado de direito e que está conexionado ( pelos menos

historicamente) com o princípio democrático. A democracia descentralizada (assente

num poder local autónomo) assegurava a separação territorial de poderes contribuindo

31 Relevância jurídico-constitucional: a) princípio jurídico-organizatório (art. 111º CRP) b) princípio normativo autónomo c) princípio fundamentador de incompatibilidade

Page 85: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

85

para uma maior participação democrática no exercício de poder. A Constituição refere a

conexão, também, da administração autónoma com o princípio democrático da

organização do estado: o artigo 6º da CRP refere que “O Estado é unitário e respeita na

sua organização e funcionamento o regime autonómico insular e os princípios da

subsidiariedade, da autonomia das autarquias locais e da descentralização

democrática da administração pública.”. Por seu lado o artigo 235º, nº 1 acrescenta que

“. A organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais”.

O princípio da garantia da autonomia local terá a ver com o estado de direito nas

dimensões de autonomia normativa ( cfr. Artigo 241º sobre a competência

regulamentar) e da garantia institucional que assegura aos municípios um espaço de

conformação autónoma cujo conteúdo essencial não pode ser destruído pela

administração central32. Esta garantia de administração autónoma local foi elevada a

limite material de revisão constitucional com a Constituição de 1976.

1.2. O PRINCIPIO DEMOCRÁTICO

A Constituição ao consagrar o princípio democrático procurou uma ordenação

normativa para um país e para uma realidade histórica. Como refere Gomes Canotilho33

“ A Constituição de 1976 respondeu normativamente aos problemas da legitimidade-

legitimação da ordem jurídico constitucional em termos substanciais e em termos

procedimentais: normativo-substancialmente, porque a constituição condicionou a

legitimidade do domínio político à prossecução de determinados fins e à realização de

determinados valores e princípios ( soberania popular, garantia dos direitos

fundamentais, pluralismo de expressão e organização política democrática; normativo-

processualmente, porque vinculou a legitimação do poder à observância de

determinadas regras e processos. (…) a constituição respondeu aos desafios da

legitimidade-legitimação ao conformar o princípio democrático como forma de vida,

como forma de racionalização do processo político e como forma de legitimação do

poder. O princípio democrático, constitucionalmente consagrado, é mais do que um

método ou técnica de os governantes escolherem os governados, pois como princípio

normativo considerado nos seus vários aspectos políticos, económicos, sociais e

culturais, ele aspira a ser um impulso dirigente de uma sociedade. O artigo 2º conjugado

32 J.J.Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 1998, pg 247. A Constituição de 1933 destruiu este núcleo essencial ao transformar a autonomia local em administração indirecta ou mediata do estado. 33 J.J.Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 1998, pg 277 e 278

Page 86: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

86

com outros artigos (cfr. por exemplo arts. 9º e 81º), sugere a existência de um objectivo

a realizar através da democracia”.

Caracterização do Princípio Democrático

1) princípio complexo – de democracia representativa( órgãos representativos,

eleições periódicas, pluralismo partidário, separação de poderes) e de

democracia participativa( oferecer aos cidadãos efectivas possibilidades de

aprender a democracia, participar no processo de decisão, exercer controlo

crítico na divergência de opiniões, produzir inputs políticos democráticos) (art.

2º, 9º/c), 109º da CRP)

2) princípio dinâmico –aberto à liberdade de participação crítica, e logo à evolução

pessoal e de ideologias (artigo 9º/c) da CRP)

3) princípio informador do Estado e da sociedade – processo de democratização

extensiva aos vários aspectos da vida económica, social e cultural (art. 51º n.º 5;

54, nº 5/b); 38º, nº 2/a); 77º e 235º CRP).

4) princípio de organização –legitimação da titularidade e exercício do poder

político através do povo. O poder político é constituído, legitimado e controlado

por cidadãos (povo), igualmente legitimados para participarem no processo de

organização da forma do Estado e de governo.

5) princípio de realização dos direitos fundamentais - dado que a participação dos

cidadãos no processo democrático implica a contribuição de todos em igualdade

e em liberdade, (art. 48º e 109º CRP); implica participação livre assente em

garantias para a liberdade desse exercício (direito de associação, de formação de

partidos, de liberdade de expressão); prevê a abertura do processo político no

sentido da criação de direitos económicos, sociais, culturais constitutivos de uma

democracia económica, social e cultural (artigo 2º).

Princípio democrático – ao contrário do que acontece nas ditaduras em que os

governantes exercem o poder com indiferenças, mesmo contra a vontade dos

governados, nas democracias regista-se a presença efectiva destes no estatuto e

desempenho dos governantes, principalmente nos seguintes aspectos:

a) Intervenção na escolha dos governantes

b) Intervenção na fiscalização dos actos dos governantes e na possibilidade da sua

não designação.

Na prática a concretização da relação entre governantes e governados pode assumir-se:

Page 87: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

87

1) Como democracia representativa, em que os governantes mandam em nome do

povo e têm a sua confiança politica. Democracia representativa – a dimensão

representativa relaciona-se com a designação dos titulares dos órgãos públicos,

principalmente do Estado, que desempenham os mandatos em nome do povo,

em que a eleição é o modo fundamental dessa designação, e na qual participam

através do voto os cidadãos activos da comunidade.

2) Como democracia referendária, em que o povo decide pontualmente sobre

questões de governação, com a força de acto jurídico ou público34.

3) Como democracia participativa, em que o exercício dos direitos políticos que

formam a opinião pública contribuem pelo menos informalmente para a

limitação do poder do poder público e para a sua democratização.,

O princípio democrático na nossa Constituição assume-se como primeiro princípio

estruturante do direito constitucional e é referido em muitos artigos da Constituição,

desde logo no seu preâmbulo, parágrafos 1 e 2, e também (só a título de exemplo):

(artigos n.(s) 1, 2, 3, 40, n. 2 e 114, n. 2). Também na Constituição são visíveis as três

modalidades ou dimensões de democracia que atrás referimos.

CONCRETIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO

Desdobra-se em 4 princípios:

I - princípio da soberania popular

II - princípio da representação popular

III - princípio da democracia semi-directa

IV - princípio da participação

Princípio da Soberania Popular - art. 2º e 3º da CRP

a) princípio de titularidade da soberania do Estado ( o domínio político carece de

uma justificação quanto à sua origem, isto é, precisa de legitimação);

b) princípio de legitimação do poder político ( só pode derivar do próprio povo);

c) princípio da titularidade do poder (o povo é ele mesmo o titular da soberania ou

do poder35);

34Eleição e referendo, são coisas diferentes: Eleição – destina-se à escolha dos governantes. Referendo – destina-se à tomada de decisão sobre uma questão concreta

Page 88: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

88

d) princípio da soberania popular (a soberania popular existe, é eficaz e vinculativa

no âmbito de uma ordem constitucional materialmente informada pelos

princípios da liberdade política, da igualdade dos cidadãos, da organização

plural de interesses; e procedimentalmente dotada de instrumentos que garantam

a operacionalidade deste princípio ( artigo 2º e 10º);

e) princípio de legitimação material e formal da CRP ( há um plano de construção

organizatória da democracia, pois é ela que determina os pressupostos e os

procedimentos segundo os quais as decisões e as manifestações de vontade do

povo são jurídica e politicamente relevantes).

Princípio da Representação Popular - art. 10º da CRP

a) como derivação directa ou indirecta do princípio da soberania popular;

b) como exercício jurídico de funções de domínio por órgão do estado em nome do

povo;

c) como exercício do poder com vista a prosseguir os fins ou interesses do povo.

Na CRP este princípio tem a sua expressão máxima na representação parlamentar -

art. 147º da CRP.

Princípio da Democracia Semi-directa - art. 2º "in fine" da CRP

- como expressão do complexidade do Princípio democrático e aprofundamento da

democracia participativa.

Formas:

a) Referendo –artigo 115 ( cfr. art. 115º , nº 2 e 166º da CRP ; Referendo

regional artigo 232º, nº2; referendo da instituição das regiões em concreto

256º)

b) Iniciativa popular - art. 167º n.º 1 CRP

c) Veto – Instrumento político que permite aos cidadãos exigir que uma

determinada lei seja submetida a voto popular. Não previsto na CRP

d) Plebiscito – pronúncia popular sobre escolhas ou decisões políticas. Não

previsto na CRP

Princípio da Participação - art. 2º, 9º c), 48º e 109º CRP ou princípio da democracia

participativa.

35 O que significa que o poder do povo se distingue de outras formas de domínio – castas, classes, monarcas; e que há necessidade de uma legitimação democrática efectiva para o exercício do poder – a legitimação vem do povo e a esta se deve reconduzir

Page 89: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

89

Democracia participativa diz respeito à intervenção dos cidadãos individualmente, ou

principalmente em associações sociais, ou profissionais, nas tomadas de decisão das

instâncias do poder, ou nos próprios órgãos do poder. O seu objectivo é suprir a

distância entre o poder e os cidadãos, que resulta das fórmulas tradicionais da

democracia que a constituição se refere, quando fala no aprofundamento da democracia,

que tem que ser visto como um conceito dinâmico.

Os instrumentos que se colocam ao serviço da democracia participativa estão muito

relacionados com os direitos políticos, que se materializam na liberdade de opinião, de

expressão e informação (artigo 37º), liberdade de imprensa (artigo 38º) liberdade de

reunião (artigo 45º), liberdade de manifestação (45º), liberdade de associação (artigo

46º), liberdade de criação e militância nos partidos (artigo 51º), direitos de petição

(artigo 52º) e direitos de acção popular (artigos n.(s) 52º, nº 3 e 109º, 9, alínea c); 263º,

207º, 267º, n.º 5 e 6).

REFERENDO

Regime jurídico-constitucional do referendo:

a) âmbito territorial36

- a nível nacional - 115º n.º 1 e 2 e 166º CRP

- a nível local (Autarquias Locais) - 240º CRP

- a nível regional (Regiões Autónomas)- 232º, 2 CRP

b) âmbito material dos referendos nacionais

- questão de relevante interesse nacional de competência da Assembleia da

República ou Governo através de aprovação de convenção internacional ou acto

legislativo - art. 115º n.º 3 CRP

- estão excluídos: alterações à constituição; questões orçamentais, tributárias ou

financeiras; as matérias dos art. 161º e art. 164º da CRP; - artigo 115º n.º 4 CRP

c) decisão - art. 115º n.º 1 e 134º al. c) CRP

- a decisão de efectuar um referendo cabe exclusivamente ao Presidente da

República37

d) iniciativa - art. 115 n.º 1 e 2 , 161º al. j), 167º n.º 1, 197º , n.º 1, al. e) CRP

36 O referendo político nacional tem a sua argumentação básica no artigo 115º da constituição; o artigo 232º, n. 2, refere-se ao referendo regional e o artigo 240º, refere-se ao referendo local. O referendo de âmbito nacional, e só pode ter por objecto questões de relevante interesse nacional. 37 O referendo encontra-se na dependência da maioria parlamentar, mas só pode efectuar-se se o Presidente da República concordar. (artigo 115, n. 1)

Page 90: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

90

- a proposta de realização de um referendo cabe ao Governo ou à Assembleia da

República por sua iniciativa ou por iniciativa dos cidadãos38

e) eficácia jurídica - art. 115º n.º 11 CRP

- o referendo só tem eficácia jurídica quando o número de votantes for superior a

50% dos eleitores recenseados - colégio eleitoral - ou seja, nesse caso os órgão de

soberania competentes estão vinculados aos resultados do referendo, sendo

obrigados praticar os actos referendados.

h) universo eleitoral - colégio eleitoral

- os cidadãos portugueses recenseados a nível nacional - art. 115º n.º 1 CRP

- e os cidadãos portugueses residentes no estrangeiro nas matérias que lhes digam

especificamente respeito art. 115 n.º 12 e 121º n.º 2 CRP

A regulamentação do referendo é desenvolvida por duas leis ordinárias: A lei 15-A/98,

03/04 e a lei orgânica n.º 4/2000, 24/08.39

O PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO E O DIREITO DE SUFRÁGIO

O Direito de Sufrágio enquanto instrumento de realização do princípio democrático vai

ser assim determinado por 5 princípios materiais fundamentais: (artigo 10º nº 1 e 113º

n.º 1 CRP):

1 - Princípio da universalidade - art. 49º CRP

2 - Princípio da imediaticidade ou directo (contrapõe-se ao voto indirecto)121º CRP

3 - Princípio do sufrágio secreto - 10º e 113º CRP

4 - Princípio da periodicidade - 118º, 128º e123º, 171º CRP

5 - Princípio da liberdade - 48º n.º 1 CRP

Fases do procedimento eleitoral, que termina com a eleição propriamente dita:

38 Só pode ter por objecto questões que devam ser decididas, quer pela assembleia da república, quer pelo governo, através de aprovação de tratados internacionais, ou de actos legislativos, não podem ser objecto de referendo certas matérias ou assuntos (artigo 115, n. 4) O processo de referendo assenta num relacionamento especifico entre a assembleia da república e o governo, só pode recair sobre um só assunto (tema), com questões objectivas, claras e precisas que tenham uma resposta de sim ou não. O referendo é vinculativo nos termos que constam no artigo 115. 39 O instituto do referendo integra-se no sistema representativo, e este apenas se limita nos casos o afastamento da política levada a cabo pelos governantes, relativamente aos programas assentes em eleições gerais e noutros casos a corrigi-la, no sentido da vontade actual do eleitorado. Como ele se realiza esporadicamente e só acerca de questões determinadas o referendo constitui muitas vezes um contrapeso de direcção permanente da vida do Estado.

Page 91: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

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1 Registo do colégio eleitoral, através do recenseamento

2 Marcação das eleições

3 Apresentação dos candidatos

4 Campanha eleitoral

5 Votação

6 Apuramento dos resultados

7 Fase do contencioso eleitoral

8 Publicidade dos resultados

O sistema eleitoral – que pode ser definido como método que permite traduzir em

mandatos os votos que foram depositados nas urnas pelos eleitores, podem ser

analisados em termos de três categorias de representação:

1 – Representação proporcional

2 – Representação maioritária

3 – Representação minoritária

Traços do direito eleitoral Português:

A maioria dos nossos órgãos do Estado são eleitos por sufrágio directo e universal, são

os seguintes:

1 – O Presidente da República

2 – A Assembleia da República

3 – As assembleias legislativas das regiões autónomas

4 – O Parlamento Europeu

O recenseamento eleitoral (Lei n.º 13/99, 23/03), obedece aos seguintes princípios:

a) Universalidade (todos os que têm capacidade eleitoral)

b) Permanência

c) Actualização

d) Obrigatoriedade e oficialidade

e) Unicidade

O sufrágio tem as seguintes características:

Page 92: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

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1 – Universal (não aceita no nosso sistema o sufrágio do tipo capacitário,

censitário, ou de qualquer tipo discriminatório).

2 – Igual

3 – Directo

4 – Secreto

5 – Periódico

6 – Pessoal

Artigo 49, n. 2 da Constituição, refere que o exercício do direito de sufrágio constitui

um dever cívico, isto significa que ele não é obrigatório, situando-se unicamente apenas

no plano da moralidade cívica do cidadão.

O artigo 113º, nº 5 estabelece que a conversão de votos em mandatos é feita pelo

princípio da representação proporcional, sendo adoptado o método da média mais alta

de Hondt. (Artigo 149º e 260º).

Democracia referendária ou semi-directa – consiste na possibilidade de os cidadãos se

pronunciarem acerca de assuntos que se colocam à governação. Nesta dimensão é o

próprio povo que decide. O Artigo 10º,nº1 da Constituição refere-se para além do

sufrágio, o referendo como um dos meios do exercício do poder político.

O PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO E O SISTEMA PARTIDÁRIO

a) A CRP consagra o direito constitucional formal à constituição de partidos

políticos: - art. 51º CRP. Os partidos políticos constituem-se livremente, sem

dependência de autorização, embora estejam sujeitos a certos limites de proibição de

violência e de fins contrários à lei penal (artigo 46, n. 1)40.

40 O regime de partidos políticos baseia-se no direito à associação (artigo 46 e 51). Também não podem ser consentidos partidos políticos armados ou do tipo militar ou militarizado, nem de carácter fascista ou de ideologia fascista. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de um partido, ninguém pode estar escrito em mais de um partido. Os partidos não podem ser dissolvidos, nem suspensos, salvo nos casos previstos na lei e só por decisão judicial.

Page 93: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

93

b) a CRP atribui aos partidos políticos direitos fundamentais de participação

política de:

- organização e expressão da vontade popular, art. 10º,2 - participação

nos órgãos representativos - art. 114º

- direitos específicos no funcionamento da AR - art. 180º

- de influencia na formação do governo - art. 187º, 1

c) Os partidos têm direito a funcionar em liberdade externa e interna:

- liberdade externa - liberdade de fundação - art. 51º

- liberdade interna - liberdade de acção e pensamento (ideológico e

programático)

- A liberdade dos partidos encontra limites nos artigos: 51º, 3, 4, 160º, 1

d), 223º, 2, e) CRP41

d) Princípio da igualdade de oportunidade dos partidos políticos - 113º, 3, b) e c),

114º CRP

Lei orgânica dos partidos políticos (Lei n.º 2/2003, 22/08)

Existem garantias de liberdade de filiação partidária. A informática não pode ser usada

para tratamento de dados referentes a convicções políticas ou religiosas, isto encontra-se

desenvolvido na lei de protecção de dados. (Lei n.º 67/98, 26/10)

Não pode haver despedimentos por motivos ideológicos ou políticos.

Como garantia de isenção as Forças armadas são rigorosamente apartidárias (artigo 275,

n. 4). A lei pode estabelecer restrições ao direito de associação dos militares e

militarizados. (artigo 270º)

Os partidos políticos na nossa Constituição têm importância em três matérias:

1 – Em eleições

2 – Acção parlamentar (artigo 180º) e direito a constituir partidos

3 – Em certos poderes de intervenção, tais como o direito à informação

pelo governo (artigo 114º, n. 3) e apreciação dos decretos-leis (artigo

41 Não podem ter uma denominação, que contenha expressões relacionadas com religião, igreja, símbolos religiosos. Cabe ao Tribunal Constitucional verificar a legalidade da constituição dos partidos políticos e das suas coligações, e também a legalidade dos seus nomes, das suas siglas e símbolos e ordenar a sua extinção nos termos da constituição e da lei. (artigo n 233º, alínea e))

Page 94: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

94

169º). Ainda no direito das minorias à oposição democrática (artigo 114,

n. 2)

PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO E PRINCÍPIO MAIORITÁRIO

Consagração na C.R.P.:

1) princípio maioritário da deliberação dos órgãos colegiais - art. 116º, 3;

2) exigência de maioria para aprovação de certas leis –art.168º;

3) maioria qualificada para rever a CRP - art. 284º e 286º

Limites:

O direito da maioria é sempre um direito em concordância com os direitos das minorias,

nesse sentido:

- a maioria não pode dispor de determinados direitos (Sistema de Direitos

Fundamentais);

- exigência de maiorias qualificadas, que implicam a necessidade de participação

das minorias na decisão;

- finalmente há um limite interno (ético) ao princípio da maioria, a noção que

embora as decisões da maioria sejam vinculativas não são necessariamente

materialmente mais justas nem as únicas verdadeiras.

Se o sufrágio é o modo de participação dos cidadãos, o princípio da maioria é o critério

da decisão, encontrando-se consagrado expressamente, entre outros no artigos 114º,

116º e 126º.

A decisão por maioria decide sobre qualquer questões políticas, em regra, mas há certas

questões em que é exigido uma maioria agravada ou qualificada ( ex. alteração da

Constituição)

Há, ainda, a referir que na sociedade complexa e plural dos nossos dias, nem sempre a

decisão da maioria tem força suficiente para se impor, ou se mostrar idónea para a

presunção de certos objectivos da sociedade. Designadamente em matéria laboral,

salarial, a tendência é para complementar essa maioria por vontades contratuais, que é a

chamada concertação social que existe no domínio das relações laborais.

Aula de 30-10-2006 (suplementar)

Page 95: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

95

Princípio da Socialidade ou Princípio do Estado Social

A DEMOCRACIA ECONÓMICA E SOCIAL art. 2º CRP

Novo Fim para o Estado → a realização da democracia económica, social, cultural e

ambiental - art. 9º d) CRP. Que se liga com o Fim da Justiça Retributiva → a promoção

da igualdade real entre regiões e cidadãos – art. 81º a) e d) e art. 90º CRP

A democracia, económica, social e cultural é o que se costuma chamar de Estado social,

e que se traduz essencialmente na responsabilidade pública pela promoção do

desenvolvimento económico social e cultural, na satisfação dos níveis básicos de

prestações sociais para todos e na correcção das desigualdades sociais

Este princípio é um objectivo a realizar mediante a observação do princípio democrático

e o princípio do Estado de direito.

A democracia económica é referida nos (artigos 80º a 89º)

A democracia social é referida nos (artigos 63º a 72º)

A democracia cultural é referida nos (artigos 73º a 79º)

A Constituição refere no artigo 1º a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.

No artigo 2º refere claramente que visa a democracia, económica, social e cultural

(artigo n. 9º). Assume, também, o princípio ou direito à igualdade social que tem

implicações a vários níveis (direito fiscal - princípio da capacidade contributiva e a ideia

do imposto progressivo; No direito laboral a protecção do trabalhador como elo mais

fraco). Está também desenvolvida quanto à proibição da discriminação racial (artigo 13º

e 71º, n. 2), aos cidadãos portadores de deficiência (artigo 74º, n. 2, alínea g)).

Assume-se, ainda, quanto aos direitos dos Estrangeiros e Emigrantes (artigos 33º, n. 8 e

74º, n. 8, alínea j)

Com a consagração dos direitos fundamentais, com carácter económico, social e

cultural

(Artigo 58 – Direito ao trabalho)

(Artigo 53 – Direito à Segurança Social)

(Artigo 64 – Direito à Saúde)

(Artigo 65 – Direito à Habitação)

(Artigo 74 – Direito ao Ensino)

(Artigo 78, n. 1 – Fruição e Criação cultural)

(Artigo 79, n. 1 – Cultura Física e Desporto)

Page 96: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

96

A relevância do chamado Estado social é que a sua realização é um processo, um

caminhar no sentido de um crescente de justiça social, constituindo cada avanço nessa

direcção um aperfeiçoamento do Estado de direito democrático e cada progresso vai-se

radicando com um elemento adquirido desse Estado. Por isso qualquer retrocesso no

caminho percorrido não se limita a contrariar o princípio constitucional da democracia

económica, social e cultural, mas infringe também directamente o princípio do Estado

de direito democrático. Assim o princípio do Estado social constitui uma directiva

constitucional, e a sua sistemática desconsideração pode resultar em situações de

incumprimento da Constituição que afirma o princípio do não retrocesso social.

Este princípio pode formular-se do seguinte modo:

- O núcleo essencial dos direitos sociais, já realizado e efectivado através de

medidas legislativas (exemplo: Lei do Serviço Nacional de Saúde, Lei da Segurança

Social e Desemprego, etc.), deve considerar-se constitucionalmente garantido, devendo,

por isso, entender-se como inconstitucionais quaisquer medidas estaduais que não

criando outros esquemas alternativos ou compensatórios se traduzam na prática na

anulação, revogação, ou aniquilação pura e simples daquele núcleo essencial.

O princípio da democracia económica e social aponta para a proibição do retrocesso

social, também designada como proibição de contra-revolução social ou da evolução

reaccionária. Isto quer dizer que os direitos sociais e económicos (direitos dos

trabalhadores, direito à assistência, direito à educação) uma vez obtido um determinado

grau de realização, passam a constituir, simultaneamente uma garantia institucional e

um direito subjectivo. A proibição de retrocesso social não pode fazer nada contra as

recessões e crises económicas mas esse princípio limita a reversibilidade dos direitos

adquiridos ( ex. segurança social, subsídio de desemprego, prestações de saúde, etc),

sob pena de existir uma clara violação do princípio da protecção da confiança e da

segurança dos cidadãos no âmbito económico, social e cultural e do núcleo essencial da

existência mínima que é inerente ao respeito pelo princípio da dignidade da pessoa

humana. A violação deste núcleo essencial efectivado justificará a sanção da

inconstitucionalidade relativamente a normas que manifestamente aniquilem a chamada

“ justiça social”. Será inconstitucional uma lei que extinga o subsídio de desemprego ou

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97

que pretenda alargar excessivamente o tempo de serviço necessário para a aquisição do

direito à reforma.42

Este princípio da proibição do retrocesso pode, no ensinamento de Gomes Canotilho,

formular-se da seguinte forma:

O núcleo essencial dos direitos sociais já realizado e efectivado através de medidas

legislativas ( lei da segurança social; lei do subsídio de desemprego; lei do serviço de

saúde) deve considerar-se constitucionalmente garantido sendo inconstitucionais

quaisquer medidas estaduais que, sem a criação de outros esquemas alternativos ou

compensatórios, se traduzam na prática numa anulação, revogação ou aniquilação pura

e simples desse núcleo essencial. A liberdade de conformação do legislador e inerente

auto-reversibilidade têm como limite o núcleo essencial já realizado.

Princípio da Unidade

O artigo 6º da Constituição considera o princípio da unidade do Estado como princípio

estruturante do Estado, na óptica organizatório-territorial. Estado unitário será aquele

que, num determinado território e para a população que nele vive, tem uma base única

para a estadualidade ( ou estatalidade). Isto significa que: a) existe uma organização

política e jurídica ( o Estado) à qual se imputa a totalidade das competências estaduais (

defesa, justiça, representação externa, por exemplo); b) que existe uma só soberania

interna e externa, não existindo outras organizações soberanas ( como nos estados

federais); c) da unitariedade do Estado resulta a imediaticidade das relações jurídicas

entre o poder central e os cidadãos; d) do carácter unitário resulta, ainda, a ideia de

indivisibilidade territorial.

Em resumo unidade do Estado significa República una, com uma única Constituição e

órgãos de soberania únicos para todo o território nacional

Princípio da autonomia das autarquias locais

O princípio da autonomia das autarquias locais é uma das dimensões da organização do

Estado unitário (artigo 6º da CRP), ao lado do respeito pelo regime autonómico insular.

42 J.J.Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 1998, pg 320 e 321. Cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional 39/84 e 148/94.

Page 98: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

98

A Constituição refere no artigo 235º que as autarquias locais são uma componente da

organização democrática do Estado, podendo dizer-se, assim, que é um princípio

estruturante da organização política e da organização territorial do Estado.. Esta

autonomia verifica-se, desde logo, pela inserção do Poder Local num título autónomo(

Título VIII), isto é fora da administração do Estado. Depois porque a existência de

autarquias locais é uma garantia institucional (artigo 235º, nº 1), transportando um

núcleo ou reduto do poder local indisponível para o Estado. São dimensões concretas

deste núcleo essencial do poder autárquico: 1- o direito à existência (artigo 235º, nº1),

implicando autogoverno local, com órgãos representativos eleitos directa e

indirectamente pelo colégio eleitoral de base; 2- garantia de órgãos representativos

dotados de determinadas competências autárquicas; 3- garantia da prossecução de

interesses próprios das populações respectivas através de órgãos de governo próprios (

235º, nº 2). Há, assim, um conteúdo subjectivo, um conteúdo objectivo e um conteúdo

institucional globalmente integradores da autonomia das autarquias locais, isto é, a

autonomia local inclui um núcleo estável e irrevisível ( artigo 288º, alínea n)) 43,

levando a que o legislador não possa eliminá-las, embora caiba dentro da sua liberdade

de conformação ( pelo menos em relação às freguesias e municípios) a criação e

extinção de autarquias; e o direito à organização própria e o direito às competências

próprias para através dos seus órgãos representativos, livremente eleitos, prosseguirem

os interesses próprios das populações, que pode ser feita de forma autónoma ou em

cooperação com o poder político central.

O princípio da subsidiariedade

O princípio da subsidiariedade44, em articulação com a cláusula de integração europeia

(art. 7°/6) e com o princípio do Estado Unitário (art. 6.°/1) adquiriu uma dimensão

estruturante da ordem constitucional portuguesa.

O princípio da subsidiariedade densificado a nível das relações Estados-membros/União

Europeia e do Estado Unitário/regiões e autarquias locais é expressão de um princípio

geral de subsidiariedade que pode formular-se da seguinte forma: as comunidades ou

esquemas organizatório-políticos superiores só deverão assumir as funções que as

43 As leis de revisão constitucional terão de respeitar: n) A autonomia das autarquias locais; o) A autonomia político-administrativa dos arquipélagos dos Açores e da Madeira. 44 Depois da revisão de 1992, no que respeita à União Europeia, e depois da revisão de 1997

Page 99: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

99

comunidades mais pequenas não podem cumprir da mesma forma ou de forma mais

eficiente45.

O princípio da subsidiariedade articula-se com o princípio da descentralização

democrática: os poderes autonómicos regionais e locais das regiões autónomas e das

autarquias locais (comunidades de dimensões mais restritas) devem ter competências

próprias para regular e tratar as tarefas e assuntos das populações das respectivas áreas

territoriais (administração autónoma em sentido democrático). Ligado a este princípio

da administração autónoma democrática, está o principio da desburocratização (art.

267.°/ 1) assegurando a participação das populações na defesa e prossecução dos seus

interesses (princípio da subsidiariedade como princípio antiburocrático).

Em relação às relações dos Estados-membros/União Europeia o princípio da

subsidiariedade transporta duas dimensões fundamentais: (1) as competências da União

Europeia são competências de atribuição não devendo transferir-se para uma

comunidade de nível superior competências esvaziadoras da estatalidade (dos Estados

membros) e da autonomia regional e local; (2) a execução das políticas e decisões da

União Europeia devem localizar-se nos Estados membros (cfr. Tratado UE, art. 3.°/B)

na medida em que os objectivos possam ser por estes suficientemente realizados e desde

que não se trate de competências exclusivas da Comunidade.

Assim, como refere Gomes Canotilho46 “o princípio da subsidiariedade não tem

contornos definidos nem nas relações Estados membros - Comunidade Europeia nem

nas relações República - poderes regionais e locais, podendo transformar-se, até, num

princípio normativo de controlo, obrigando, por exemplo, os tribunais e outras

instâncias de controlo a fiscalizar se certas medidas comunitárias ou estatais violam o

princípio da subsidiariedade”.

INTERPRETAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO

CONCEITO DE INTERPRETAÇÃO - a interpretação das normas jurídicas implica não

só a apreensão do seu significado objectivo como a sua aplicação a situações concretas.

Como refere Jorge Miranda47 “ Há sempre que interpretar a Constituição como há

45 R. Zippelius, Teoria Geral do Estado, 3ª edição, 1997, pg 159 VITAL MOREIRA, A Administração Autónoma, pg. 250. 46 46 J.J.Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 1998, pg 340-341 47 Jorge Miranda, Teoria do Estado e da Constituição, Coimbra Editora, 2002, pg 649

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100

sempre que interpretar a lei. Só através desta tarefa se passa da leitura política,

ideológica ou simplesmente empírica para a leitura jurídica do texto constitucional”

Acrescenta o mesmo autor que “ existe, pois, hoje, o reconhecimento da importância da

interpretação constitucional – não só para o juiz ( sobretudo, quando pode desaplicar

normas inconstitucionais) mas também para os cidadãos em geral; “ chegando ao ponto

de se preconizar uma “ sociedade aberta de intérpretes da Constituição, especialmente

no domínio dos direitos fundamentais como expressão de uma res publica” como refere

Peter Haberle.

A interpretação constitucional não é diferente da que se faz em outras áreas do direito.

No entanto a interpretação constitucional tem de ter em conta condicionalismos e fins

políticos, apesar de não poder visar outra coisa que não sejam os preceitos e princípios

jurídicos que lhes correspondam.

Não há norma na C.R.P. sobre interpretação e por isso vamos socorrer-nos do artigo 9º

do Código Civil48

ARTIGO 9º

(Interpretação da lei)

1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o

pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as

circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é

aplicada.

(…)»

ELEMENTOS DE INTERPRETAÇÃO

1) elemento literal / gramatical – a “letra da lei”

2) elemento lógico – “reconstituir o pensamento legislativo”:

2.1) elemento racional / teleológico - "ratio legis", ou seja, “para quê” e “por quê”;

2.2) elemento sistemático – “unidade do sistema jurídico”;

2.3) elemento histórico – “circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições

específicas do tempo em que é aplicada”.

A INTERPRETAÇÃO DA C. R. P.

48 Há quem refira que este artigo 9º é uma norma materialmente inconstitucional e que aqui não iremos abordar.

Page 101: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

101

A função integradora da constituição reclama a função racionalizadora da interpretação

da C. R. P.. Assim, a interpretação da Constituição tem de ser objectiva e evolutiva de

maneira a assegurar a coerência e a subsistência do ordenamento.

No entanto a interpretação deverá ter sempre em conta os seguintes aspectos:

1) a Constituição deve ser entendida como um todo, na busca de uma

unidade e harmonia de sentido;

2) se existirem “contradições de princípios” deverão ser superadas quer

mediante a redução adequada do respectivo alcance e da cedência de

parte a parte; quer noutros casos, mediante a preferência ou a prioridade

na efectivação de uns princípios em relação a outros, nuns casos através

da coordenação e noutros através da subordinação. Mas é necessário

fazer-se, sempre, um esforço de concordância prática assente num

critério de proporcionalidade, podendo existir ponderação e

hierarquização dos valores inerentes aos princípios constitucionais;

3) são verdadeiras normas jurídicas e, logo, devem ser interpretadas de

forma a dar-lhes a máxima eficácia possível, ou como refere Gomes

Canotilho49 “ a uma norma fundamental tem de ser atribuído o sentido

que mais eficácia lhe dê”. Interpretar a Constituição é ainda realizar

a Constituição.

4) atender não só ao que as normas constitucionais explicitamente ostentam

como também ao que implicitamente delas resulta;

5) As normas constitucionais devem sempre ser interpretadas e aplicadas

como normas da Constituição actual, da Constituição que temos e em

vigor, e não como normas de uma Constituição futura;

6) Na interpretação dos preceitos da Constituição é legítimo e pode ser

conveniente considerar o modo como é feita a sua aplicação prática na lei

e nas decisões dos tribunais, mas sem nunca perder de vista que é a

Constituição que conforma a lei ordinária e não o contrário, pois não é a

Constituição que deve ser interpretada em conformidade com a lei, mas

sim a lei que deve ser interpretada em conformidade com a Constituição.

49 J.J.Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 1998, pg 1187.

Inclusivamente no caso das chamadas normas programáticas;

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102

Em conclusão podemos dizer que apesar de não estarem previstas normas de

interpretação na Constituição, será de recorrer a outros preceitos previstos no

ordenamento jurídico, nomeadamente ao Código Civil ( artigo 9º), pois essas regras são

válidas e eficazes e traduzem uma vontade legislativa que não é contrariada por outras

disposições. Como acrescenta Jorge Miranda50, “regras sobres estas matérias podem

considerar-se substancialmente constitucionais não repugnando, mesmo vê-las dotadas

de valor de costume constitucional (praeter legem)”.

A INTERPRETAÇÃO AUTÊNTICA DA CONSTITUIÇÃO

a) Através de Lei Ordinária?

Lei Ordinária deve obedecer à Constituição, mas:

- tem força jurídica inferior

- tem menor legitimidade democrática

b) Através do Tribunal Constitucional?

O Tribunal Constitucional tem poderes de fiscalização da conformidade das Leis

ordinárias com a Constituição, mas:

- não têm poderes legislativos

- apenas jurisdicionais

c) Através de Lei Constitucional?

SIM:

- tem a mesma força jurídica e legitimidade democrática!

Aula de 31-10-2006 (suplementar)

A INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO

Interpretar a lei ordinária de forma a que esta respeite os preceitos constitucionais

requer a prévia interpretação da Constituição no sentido de se apurar em que sentido o

legislador constitucional quereria que dar à lei ordinária caso a tivesse feito. Logo a

interpretação da constituição é relevante enquanto parte do elemento sistemático a ter

em consideração na interpretação da Lei Ordinária. Mais, a interpretação conforme a

Constituição é também a regra de interpretação decorrente da fiscalização da

constitucionalidade operada pelo Tribunal Constitucional.

50 Jorge Miranda, Teoria do Estado e da Constituição, Coimbra Editora, 2002, pg 657

Page 103: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

103

Interpretação conforme com a Constituição será discernir no limite – na fronteira da

inconstitucionalidade – um sentido que, embora não aparente ou não decorrente de

outros elementos de interpretação, é o sentido necessário e o que se torna possível por

virtude da força conformadora da Lei Fundamental.

A interpretação conforme a Constituição tem de estar sujeita a um requisito de

razoabilidade: implica um mínimo de base na letra da lei; e tem de se deter aí onde o

preceito legal conforme com a Constituição, fique privado da função útil ou onde,

segundo o entendimento comum, seja incontestável que o legislador ordinário acolheu

critérios e soluções opostos aos critérios e soluções do legislador constituinte.51

A INTEGRAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO

A CRP não regula tudo quanto dela deve ou pode ser objecto. A Constituição

expressamente o admite prescrevendo a integração pela Declaração Universal dos

Direitos do Homem no artigo 6º n.º 2 CRP e remetendo para a lei ordinária e para as

regras do Direito Internacional quanto a Direitos fundamentais não previstos na CRP

(artigo 16º n.º 1 da CRP).

Por fim, a universalidade do ser humano e da sociedade humana não é comportável num

texto constitucional, ou sequer, na previsão internacional globalmente considerada. Por

isso a existência de lacunas.

INTEGRAÇÃO DAS LACUNAS DA C.R.P.

Recurso à unidade de princípios e valores previstos na própria CRP .A integração de

lacunas de normas formalmente constitucionais deve ser feita no interior da

Constituição formal à luz de valores da Constituição material, sem recurso a normas de

legislação ordinária. Os critérios do artigo 10º da Código Civil aplicam-se pelo facto de

traduzirem uma vontade legislativa, não contrariada por nenhumas outras disposições,

podendo, da mesma forma que o artigo 9º do C.C. para a interpretação, considerar-se

normas substancialmente constitucionais não repugnando mesmo vê-las dotadas do

valor do costume constitucional (praeter legem), como refere Jorge Miranda52.

CRITÉRIOS DE INTEGRAÇÃO:

51 Jorge Miranda, Teoria do Estado e da Constituição, Coimbra Editora, 2002, pg 661 52 Jorge Miranda, Teoria do Estado e da Constituição, Coimbra Editora, 2002, pg 657

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Não há norma na C.R.P. sobre integração. Artigo 10º do Código Civil 53

«ARTIGO 10º DO CÓDIGO CIVIL

(Integração das lacunas da lei)

1. Os casos que a lei não preveja são regulados segundo a norma aplicável aos casos

análogos.

2. Há analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas da

regulamentação do caso previsto na lei.

3. Na falta de caso análogo, a situação é resolvida segundo a norma que o próprio

intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema.»

Assim, a integração de lacunas da constituição deverá ser feita por analogia ou pela

ficção da norma que o legislador constitucional criaria caso tivesse previsto a situação

em atenção à unidade do sistema constitucional.

MODIFICAÇÃO E SUBSISTÊNCIA DA CONSTITUIÇÃO

A Constituição enquanto diploma fundamental de expressão da vontade popular

materializada na criação e regulação do Estado pretende perdurar no tempo

acompanhando a vida desse Estado. Nessa medida, toda a Constituição sofrerá

inevitavelmente as vicissitudes da evolução das circunstâncias económicas, sociais,

culturais e políticas do próprio Estado e, se quiser perdurar, deverá modificar-se em

atenção a esta evolução.

Nomeadamente, a Constituição de um Estado Democrático que aceita a circunstância

dinâmica do princípio democrático, não pode deixar de ser permeável a este dinamismo,

pois a vida constitucional é igualmente um processo dinâmico. Assim, a vida do Estado

gera inevitavelmente factos e momentos históricos que se projectam na Constituição -

chamaremos a estes as vicissitudes constitucionais.

VICISSITUDES CONSTITUCIONAIS

QUANTO AO MODO

a) expressas: revisão (formal) ou ruptura constitucional.

53 Há quem refira que este artigo 9º é uma norma materialmente inconstitucional e que aqui não iremos abordar.

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105

b) tácitas: costume constitucional, interpretação evolutiva.

QUANTO AO OBJECTO

a) parciais: todas menos a

b) totais: revolução e transição constitucional

QUANTO ÁS CONSEQUÊNCIAS:

a) evolução constitucional: todas menos a ↓

b) com ruptura: revolução e ruptura não revolucionária

QUANTO À DURAÇÃO DOS EFEITOS

a) definitivos: todas menos a ↓

b) temporários: suspensão (parcial) da constituição (art. 19º, 134º d) e 138º da

CRP - estado de sítio ou estado de emergência)

RIGIDEZ E FLEXIBILIDADE CONSTITUCIONAL

Diz-se rígida a Constituição que, para ser revista, exige a observação de uma forma

particular distinta da forma seguida para a elaboração das leis ordinárias.

Diz-se flexível aquela em que são idênticos os processo legislativo e o processo de

revisão constitucional, aquela em que a forma é a mesma para a lei ordinária e para a lei

constitucional.

A rigidez constitucional é a norma nos Estados modernos e resulta da adopção do

conceito da constituição formal e instrumental.

VANTAGENS DE UMA CONSTITUIÇÃO RÍGIDA

- A superior legitimação democrática confere legitimidade à sua superior força

normativa

- Impede que a Constituição possa ser alterada levianamente sob a pressão de

quaisquer acontecimentos circunstanciais

- Garante assim a necessária estabilidade ao ordenamento jurídico e à confiança

e fiabilidade do mesmo

VANTAGENS DAS CONSTITUIÇÕES FLEXÍVEIS

- Permite a fácil actualização da constituição formal e instrumental em função

natural evolução da consciência global;

Page 106: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

106

- Impede que a Constituição formal e instrumental seja ultrapassada pela

realidade constitucional, tornando-se obsoleta, e de certo modo ilegítima, e nesse

sentido potenciando a sua própria derrogação

RIGIDEZ E FLEXIBILIDADE CONSTITUCIONAL

CONCLUSÃO:

Por um lado, os fins de Segurança e Justiça que o Estado Direito pretende alcançar

exigem estabilidade ao ordenamento jurídico e à confiança e fiabilidade do mesmo, o

que só pode ser garantido mediante a rigidez dos princípios estruturantes deste

ordenamento.

Por outro lado, é imperioso a existência da possibilidade formal de revisão, ainda que

dentro de regras mais apertadas, no sentido de impedir que a Constituição seja

ultrapassada pela realidade constitucional.

A par da rigidez, uma flexibilidade controlada de revisão, é a melhor garantia da

perpetuação da própria Constituição.

OS DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS

PROCESSO DE ACUMULAÇÃO HISTÓRICA

1ª GERAÇÃO – LIBERAL (liberdades face ao poder do estado)

2ª GERAÇÃO – DEMOCRÁTICA (igualdade, liberdade de associação, de

participação)

3ª GERAÇÃO – SOCIAL (novas liberdades: greve, sindical, etc... direitos sociais:

direitos à participação do estado)

4ª GERAÇÃO – SOLIDARIEDADE MUNDIAL ( OU SOLIDARIEDADE

INTERGERACIONAL – nosso sublinhado (Direito ao Ambiente, ao Património

Cultural)

DIMENSÕES DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

1ª - DIREITOS NATURAIS:

. reconhecidos independentemente do tempo e do lugar

2ª - DIREITOS HUMANOS:

Page 107: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

107

. reconhecidos em dado momento histórico independentemente do

lugar.

3 ª - DIREITOS FUNDAMENTAIS:

. reconhecidos em dado momento histórico e em determinado lugar

SISTEMA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS DA CONSTITUIÇÃO DA

REPÚBLICA PORTUGUESA

Direitos fundamentais – são os direitos ou posição jurídica subjectiva das pessoas

enquanto tais individual ou institucionalmente considerados, assentes na Constituição,

ou seja na Constituição formal e na Constituição material. Daí que se possa falar em

direitos fundamentais em sentido formal ou em sentido material.54

Regime jurídico dos direitos fundamentais – a Constituição não consagra um regime

unitário dos direitos fundamentais, mas ao contrário ela estabelece um regime geral dos

direitos fundamentais, aplicável a todos os direitos fundamentais, quer sejam

consagrados com os Direitos Liberdades e Garantias, quer com os direitos económicos,

sociais e culturais, e quer se encontrem no catálogo ou fora do catálogo.

Consagra, ainda, um regime específico dos Direitos Liberdades e Garantia, aplicável aos

Direitos Liberdades Garantia e aos direitos de natureza análoga.

54 Uma das classificações, muito importante é a que se refere aos Direitos Liberdades e Garantias, que se encontra no Titulo 2 da constituição, que se dividem em Direitos Liberdades e Garantias pessoais, que vêm no Capitulo 1, de participação política, que vêm no Capitulo 2 e dos trabalhadores, que vêm no Capitulo 3.

Direitos Liberdades e Garantias Pessoais Participação política Trabalhadores

Direitos económicos, sociais e culturais, têm um regime diferente dos Direitos, Liberdades e Garantias. Dos direitos fundamentais formalmente constitucionais, e direitos materiais formalmente constitucionais que não tem assento na constituição. Os primeiros, são enunciados pela constituição, mas a constituição admite outros, constantes das leis e regras aplicáveis ao direito internacional (artigo 16º) Portanto não podemos entender o artigo 16º, n. 1, como uma clausula fechada, mas sim como uma clausula aberta a outros direitos fundamentais. Direitos fundamentais dispersos (fora do catálogo), e direitos fundamentais do catálogo. Os direitos fundamentais que vêem referidos na primeira parte da constituição (artigos 12 a 80), são o que se costuma chamar os direitos fundamentais do catálogo, o mesmo não esgota o campo constitucional dos direitos fundamentais existem outros direitos fundamentais dispersos ao longo da constituição, regularmente chamados fora do catálogo. E alguns desses direitos, são direitos de natureza análoga. Exemplo: (artigos n.(s) 99º, alínea e), 103º, n. 3, 124, n. 1) Direitos de natureza análoga aos Direitos Liberdades e Garantias O (artigo 17º), fala-nos de direitos de natureza análoga aos Direitos Liberdades e Garantias. Não é fácil estabelecer os contornos desses direitos, mas é importante fazer essa qualificação, porque eles têm o mesmo regime dos Direitos Liberdades e Garantias.

Page 108: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

108

Nota: Estes dois regimes não se excluem. O que acontece é que o primeiro (regime

geral), é aplicável a todos e o segundo (regime específico), acresce para alguns deles

(Direitos Liberdades e Garantias, e direitos de natureza análogos) ao primeiro regime.

REGIME GERAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS - aplicável a todos os direitos

fundamentais, quer se encontrem no «catálogo dos direitos fundamentais» ou fora desse

catálogo, dispersos pela Constituição, ou ainda em outras fontes de direito reconhecidas

pela Constituição – artigo 16º CRP.

REGIME ESPECÍFICO DOS DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS –

consagrado nas normas constitucionais para aplicação exclusiva aos designados

«direitos, liberdades e garantias e aos direitos de «natureza análoga»55.

REGIME DOS DIREITOS ECONÓMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS – não tendo

normas de regulação específica, e aplicando-se o regime geral dos Direitos

Fundamentais, pela natureza das suas normas e preceitos é possível caracterizar um

"regime" próprio que lhes é implícito

REGIME GERAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

55 Não é fácil estabelecer os contornos desses direitos, mas é importante fazer essa qualificação, porque eles têm o mesmo regime dos Direitos Liberdades e Garantias. Como ponto de partida devemos ter em consideração o seguinte: 1 – Direitos de natureza análoga – são os que embora não venham referidos no catálogo, beneficiam de um regime idêntico aos Direitos Liberdades e garantias. Os direitos de natureza análoga, tento podem encontrar-se entre os direitos económicos sociais e culturais, como dispersos na constituição. As operações metódicas, que nos conduzem à captação da natureza análoga devem tomar em consideração um esquema que, permita classificar em cada caso concreto a analogia, relativamente aos seguintes aspectos:

- Em primeiro lugar procurar e analisar em cada uma das categorias: (Direitos, Liberdades e Garantias), e não em relação ao conjunto dos três. - Dentro de cada uma das espécies sistematizadas, na constituição, deverá procurar-se dentro da respectiva analogia.

Exemplo: passíveis de direitos de natureza análoga. Titulo da primeira parte, número um, temos o direito de resistência e o direito legitimo a defesa (artigo 21º) Direito de acesso ao direito e à justiça (artigo 20º) Direito de queixa ao provedor de justiça (artigo 23º) Titulo três da parte um, temos os direitos dos consumidores (artigo 60º) Direito da iniciativa económica privada (artigo 61º, n. 1) Direito de propriedade (artigo 62º) Na parte dois – o direito de participação dos trabalhadores, na gestão das empresas do sector público (artigo 89º) Direito de resistência fiscal (artigo 103º, n. 3) Na parte três – os direitos das administrações em geral (artigo 268º) Direito à objecção de consciência (artigo 276º)

Page 109: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

109

Regime geral: todos aplicam-se os Direitos Liberdades e Garantias

Âmbito da titularidade dos direitos fundamentais (a quem se aplicam?):

1) Princípio da Universalidade - artigo 12º da CRP

2) Princípio da Igualdade - art. 13º CRP

3) Princípio do acesso ao direito e da garantia da tutela jurisdicional efectiva -

artigo 20º da CRP

Princípios Reguladores:

1) Princípio da Universalidade - artigo 12º da CRP

Naturalmente que há direitos fundamentais, que pela sua natureza, são exclusivos de

determinadas pessoas:

Dos cidadãos portugueses - art. 15º n.º 2 ; 121º, n.º 1; 122º; 275º n.º 2 CRP.

Dos cidadãos europeus - art. 8º do Tratado da União Europeia.

Dos cidadãos dos CPLP - art. 15º n.º 3 CRP

Dos estrangeiros em geral - - art. 33º n.º 8

Fala-se ainda de Direitos Fundamentais de Pessoas Colectivas - art. 12º n.º 2 -

na medida em que estes sejam «compatíveis com a sua natureza».

Os direitos fundamentais são direitos de todos, são direitos humanos e não só dos

cidadãos Portugueses, excepto quando a Constituição, ou a lei (com autorização

constitucional), estabelecer uma reserva de direitos para os cidadãos Portugueses.

Nota: Este princípio embora inseparável do princípio da igualdade, não se confunde

com ele.

O princípio da universalidade tem a haver com os destinatários das normas, enquanto o

princípio da igualdade tem a haver com o conteúdo do direito. O primeiro tem uma

dimensão essencialmente quantitativa, enquanto o segundo tem uma dimensão

qualitativa. Na nossa Constituição, podemos detectar quatro círculos subjectivos nas

normas que consagram os direitos fundamentais:

Círculos subjectivos das normas constitucionais

1.º Círculo da cidadania Portuguesa Artigos 50º a 47

2.º Círculo da cidadania Europeia Artigo 15º, n. 5

3.º Círculo dos Países de Língua Oficial Portuguesa (PLP) Artigo 15,º n. 3

4.º Círculo da cidadania de todos Artigo 15º, n. 1

Page 110: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

110

O círculo 4.º é extensivo a estrangeiros e apátridas.

Nota: Existe um núcleo essencial de direitos fundamentais específicos de estrangeiros e

apátridas (artigos 19, n. 6)

Há direitos fundamentais exclusivos de estrangeiros (Exemplo asilo, artigo 14º),

(explosão e extradição, artigo 33)

O artigo 14º destina-se aos cidadãos Portugueses residentes no estrangeiro.

O artigo 12, n. 2, refere as pessoas colectivas, públicas e privadas.

O artigo 37º, n. 4, refere o direito ao sigilo de correspondência.

2) Princípio da Igualdade - art. 13º CRP

a) igualdade na aplicação do direito e igualdade na criação do direito - art. 13º

n.º 1 CRP;

b) princípio de justiça social, de igualdade de oportunidades - realização do

Estado de Direito - art. 58º / 2 ; 73º; 74º; 78º.

c) princípio de igualdade perante os encargos públicos - art. 22º; 62º / 2; 103º e

104º

d) a CRP concretiza diversos princípios de igualdade: arts. 29º / 4; 36º / 4; 37º;

40º; 41º; 47º; 50º; 58º; 113º / 3 / b,

e) dimensão objectiva do princípio da igualdade: para além das diversas normas

em que o princípio da igualdade está consagrado na Constituição, este vale,

acima de tudo como princípio informador de toda a ordem jurídica-

constitucional.

O Principio da igualdade desdobra-se em quatro pontos:

1 – Princípio da igualdade, na aplicação e na criação do direito (artigo 13º) “Muito

Importante”

a) Igualdade na aplicação do direito aos cidadãos – são iguais perante a lei (esta

aplicação é dividida pelos órgãos da administração pública ou pelos

tribunais).

b) Igualdade quanto à criação do direito - a lei (o legislador) trata de forma igual

o que é igual, e de forma diferenciada o que é desigual. Este conceito

corresponde a uma ideia de igualdade justa, de proibição do arbítrio.

Page 111: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

111

Nota: O princípio da igualdade não proíbe que a lei faça distinção, mas proíbe o

arbítrio, ou seja proíbe as diferenciações de tratamento que não tenham fundamento

material suficientemente razoável. Proíbe, também, a discriminação em função dos

critérios referidos no artigo 13º, e proíbe, ainda, que se dê igual tratamento a situações

essencialmente desiguais.

2 – Princípio de igualdade de oportunidade – que pretende concretizar uma política de

justiça social através da concretização dos direitos económicos, sociais e culturais.

3 – Igualdade perante os encargos públicos – devem ser repartidos de forma igual por

todos os cidadãos (por ex. impostos e restrições ao direito de propriedade). No caso de

existir um sacrifício especial de um indivíduo ou de um grupo de pessoas haverá que os

indemnizar ou compensar.

4 – Direitos especiais da igualdade – para além dos já referidos no (artigo 13º), a

Constituição concretiza o direito da igualdade em muitos outros preceitos, (artigos: 29º,

n. 4; 36º, n. 4; 37º; 40º; 41º; 47º; 50º; 113º, n. 3, alínea b) e 269º, n. 2), são estes os

direitos especiais da igualdade, relativamente a estes casos o (artigo 13º), vale como

princípio geral e isso significa que eles se sobrepõem, ou têm preferência como lei

especial, ou princípio especial, aos critérios gerais do artigo 13º.

Nota: O princípio da igualdade é um principio informador de toda a ordem jurídica

constitucional e anda associado ao princípio da não descriminação social. (o especial

sobrepõe-se ao geral).

3) Princípio do acesso ao direito e da garantia da tutela jurisdicional efectiva -

artigo 20º da CRP

É o princípio do acesso o Direito e aos Tribunais e reconduz-se fundamentalmente ao

direito a uma solução jurídica de actos e relações jurídicas controvertidas a que se deve

chegar num prazo razoável e com garantias de imparcialidade e independência.56

Regime específico dos direitos liberdades e garantias e dos direitos de natureza

análoga57:

56 O direito a uma solução jurídica acerca de actos e relações jurídicas controvertias a que se deve chegar em prazo razoável, e com garantias de imparcialidade e de independência, através de um processo jurisdicional equitativo (justo). 57

Direitos análogos aos Direitos, Liberdades e Garantias

1 O direito de acesso ao direito e aos Tribunais (artigo 20º)

Page 112: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

112

Nos termos do artigo 17º, os Direitos, Liberdades e Garantias e os direitos de natureza

análoga, têm um regime específico, cujos traços caracterizadores estão contidos no

(artigos 18º, 19º, 21º, 22º, 168º, n. 1, alínea b) 272º e 288º)

a) Aplicabilidade directa das normas que os reconheçam, consagrem e garantam

(artigo 18º, n. 1)

b) Vinculatividade de entidades públicas e privadas.

c) Reserva da lei, para a sua restrição (artigos 18º, n. 2 e 168º, n. 6, alínea b))

d) Princípio da autorização constitucional expressa, para a sua restrição (artigo

18º, n. 2)

e) Princípio da proporcionalidade, como princípio informador das leis restritivas

(artigo 18º, n. 2)

f) Princípio da generalidade e da abstracção, das leis restritivas (artigo 18º, n. 3)

g) Princípio da não retroactividade das leis restritivas (artigo 18º, n. 3)

h) Princípio da salvaguarda do seu núcleo essencial (artigo 18º, n. 3)

i) Limitação da possibilidade de suspensão, nos casos de estado de sitio

(emergência) (artigo 19º, n. 1)

j) Garantia do direito de resistência (artigo 21º)

k) Garantia da responsabilidade do Estado e de maioria das pessoas colectivas

públicas (artigo 22º)

l) Garantia perante o exercício da acção penal, e da adopção de medidas de

polícia (artigo 272º, n. 3)

m) Garantia contra leis de revisão constitucional, que restringem o seu conteúdo

(artigo 288º, alínea d))

2 O direito de resistência (artigo 21º) 3 O direito de recorrer ao Provedor da Justiça (artigo 23º)

4 O direito à retribuição do trabalho, ao limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal, a férias periódicas pagas, ao subsídio de desemprego e salário (artigo 59º)

5 O direito á propriedade privada (artigo 62º) 6 O direito das mulheres à dispensa de trabalho, por parto (artigo 68º, n. 3) 7 O direito ao ensino básico (artigo 74º, n. 2,

a)) 8 O direito de indemnização e de reserva dos proprietários, fundiários expropriados (artigo 94º, n. 1)

9 O direito de apresentara candidaturas (artigo 122º, n. 1 e 239º, n. 4)

10 O direito de participação directa em órgãos do poder local (artigo 246º e 264º) 11 O direito de participação na administração da Justiça (artigo 207º) 12 O direito de recurso contencioso e demais direitos perante a administração pública (artigo 268º) 13 Direito dos funcionários públicos (artigo 269º)

Page 113: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

113

REGIME DOS DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS

1) APLICABILIDADE DIRECTA - ART. 18º nº 1

2) VINCULAÇÃO DE ENTIDADES PÚBLICAS E PRIVADAS - ART. 18º nº 1

• 1º tipo de vinculação: do legislador

• 2º tipo de vinculação: da administração

• 3º tipo de vinculação : do poder judicial

3) RESERVA DE LEI PARA A SUA RESTRIÇÃO - ART. 18º nº 2

1) APLICABILIDADE DIRECTA - ART. 18º N.º 1

São regras e princípios imediatamente eficazes e actuais por via directa da Constituição,

ou seja, são normas directamente reguladoras de relações jurídico-materiais. O que não

significa que, em certos casos, não necessitem de uma concretização legislativa, mas

nestes o legislador está vinculado não só à realização do conteúdo material objectivo

consagrado constitucionalmente, como está vinculado a legislar (um dos casos em que é

mais perceptível a inconstitucionalidade por omissão) - art. 35º n.º 2; 36º n.º 2; 38º n.º 3;

39º, n.º 2.

As normas dos Direitos, Liberdades e Garantias e dos direitos de natureza análoga, são

regras e princípios jurídicos imediatamente eficazes e actuais, por via directa da

Constituição. São normas directamente reguladoras das relações jurídicas. Não precisam

de mediação de outras normas criadas para os concretizar, para poderem ser aplicadas.

Portanto esses princípios (D.L.G.) aplicam-se mesmo na ausência de lei ordinária

concretizadora, e são inválidas as leis que violem os preceitos constitucionais dos DLG.

2) VINCULAÇÃO DE ENTIDADES PÚBLICAS E PRIVADAS - ART. 18º n.º 1

Entidades públicas: legislador, tribunais, administração e todos os órgãos do estado.

Entidades privadas: pessoas singulares e colectivas, comerciais, ou civis.

A vinculação abrange todos os âmbitos funcionais dos sujeitos públicos e é

independente da forma jurídica através da qual as entidades praticam os seus actos.

1º tipo de vinculação: do legislador

Sentido proibitivo: não pode criar normas jurídicas contrárias às normas e princípios

constitucionais que lesem direitos, liberdades e garantias;

Page 114: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

114

Sentido positivo: tem o dever de conformar as relações do Estado e cidadãos ou entre os

cidadãos entre si de acordo com os direitos, liberdades e garantias constitucionalmente

consagrados.

Vinculação de toda a actividade do legislador estatal: leis, decretos-leis, regulamentos,

estatutos, etc..

Vinculação do "legislador" privado: estatutos, regulamentos, ou normas internas de

sociedades, associações, cooperativas, etc...

2º tipo de vinculação: da administração

Aplica-se a toda a administração (central, regional, local, directa, indirecta, autónoma e

concessionada).

Significa:

a) só deve executar as leis conformes com os direitos, liberdade e garantias

constitucionais;

b) deve executar as leis de acordo com a interpretação que melhor realize os

direitos, liberdade e garantias constitucionais.

c) no exercício de poder discricionário está obrigada a actuar em conformidade

com os direitos, liberdade e garantias, nomeadamente enquanto critério decisivo

para a interpretação de conceitos indeterminados (segurança pública, sigilo,

segredo de estado).

d) a violação de direitos, liberdades e garantias, pode originar a invalidade dos

actos da administração (ex. no Direito Fiscal)

3º tipo de vinculação: do poder judicial

Os Tribunais estão vinculados :

- à protecção dos Direitos Fundamentais 202º n.º 2;

- ao respeito pelos Direitos Fundamentais na sua actuação - art. 204º;

De que forma?:

a) os direitos fundamentais são os critérios orientadores da organização e procedimentos

judiciais (exemplo processo penal).

b) os direitos, liberdades e garantias também determinam as próprias decisões judicias:

- no âmbito da fiscalização judicial quando se coloca a questão da

desconformidades da lei com Direitos, Liberdades e Garantias

constitucionais;

- no plano da eficácia vinculativa das decisões do Tribunal

Constitucional;

Page 115: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

115

- no domínio da delimitação de competências e definição dos poderes de

cognição entre Tribunal Constitucional e os restantes Tribunais.

3) RESERVA DE LEI PARA A SUA RESTRIÇÃO - Art. 18º nº 2

Conceito de restrição: apenas existe quando há uma efectiva limitação do âmbito de

protecção desses direitos, e não quando a lei vem apenas regular, regulamentar ou

mesmo alargar o seu conteúdo.

Regime das leis restritivas – há três tipos de restrições de direito:

1) As restrições constitucionais directas (artigo 45º, n. 1 que proíbe de uma

forma tácita reuniões violentas portanto está a restringir os direitos de

reunião).

2) Restrições feitas por lei, mas expressamente autorizadas pela

Constituição, em que existe aqui uma reserva de lei restritiva: a

Constituição autoriza a lei a estabelecer as restrições ao direito (artigo

27º, n. 3).

3) Restrições que são operadas através da lei mas sem autorização expressa

da Constituição. Há quem chame a estes casos limites imanentes (artigo

45º, n. 2 - direito de reunião. Não se compreende que o direito de

manifestação, embora consagrado na Constituição, sem qualquer

restrições directas e sem autorização de lei restritiva, não possa ser

restringido por lei, proibindo manifestações violentas e com armas. (os

limites dos limites??)

As leis restritivas dos Direitos, Liberdades e Garantias, estão sujeitas a uma série de

requisitos restritivos dessas mesmas leis, tratando-se, portanto, de restrições às

restrições, ou limites dos limites.

REGIME JURÍDICO DAS LEIS RESTRITIVAS

A) formais:

- exigência de lei da AR ou de um decreto-lei autorizado -ART. 18º n.º 2 ; 165º

n.º 1, b) e n.º 2; 198º, n.º 1, b). Requisitos de lei formal (artigo 18º, n. 2) - só nos

casos expressamente previstos na Constituição podem ser restringidos os D.L.G,

e só a lei os pode restringir exigindo a intervenção de um acto legislativo (e não

de qualquer outro acto normativo), e com a forma de lei da assembleia da

Page 116: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

116

república, para ser possível proceder à limitação, ou à restrição dos D.L.G,

(artigo 165º, n. 1, alínea b). Reafirma a ideia de parlamento como amigo das

liberdades e da reserva de lei; da assembleia da república como instrumento

privilegiado da defesa desses direitos (D.L.G.). Essa ideia explica também a

corrente jurisprudencial do Tribunal Constitucional expressa em vários acórdãos,

em que refere que as restrições dos D.L.G. não fazem parte da competência

normal do Governo, dos órgãos das regiões autónomas e das autarquias locais

(artigo 165º, n. 1). Quando a restrição aos D.L.G. for feita através de decreto-lei

autorizado, esse decreto-lei tem de estar em conformidade com a lei de

autorização (artigo 165º, n. 2). Há certos Direitos, Liberdades e Garantias, que

só podem ser restringidos por lei da Assembleia da República (reserva absoluta -

artigo 164º, alínea f), h), i), j), l)e o))58

- exigência de autorização de ser expressa e contida na CRP - art. 27º n. 3; art.

28º; 34º n.º 3. Exigência de autorização de restrição expressa (artigo 18º, n. 2),

58Requisitos da lei formal – significa também a exigência de uma cadeia ininterrupta de legitimidade legal relativamente aos actos que concretamente restringem os (D.L.G.), através dessa exigência, excluí-se ou afasta-se a possibilidade de restrições ou limitações, que não tenham fundamento na lei. Exemplo: de casos de restrições, em que existia uma cadeia de legitimidade legal.

Regulamento Acto Administrativo Acto Administrativo ↑ ↑ ↑

Lei, Decreto-Lei Lei, Decreto-Lei Regulamento ↑ Lei, Decreto-Lei

Exemplos de casos de restrições, ou limitações inconstitucionais (em que há ruptura da cadeia de legitimidade legal)

Acto administrativo ↑

Regulamento Nota: Em matéria dos Direitos, Liberdades e Garantias, não há lugar para regulamento autónomos. Em especial no confronto com a administração, a reserva de lei significa em termos práticos o seguinte:

a) São vedados os regulamentos autónomos sobre Direitos, Liberdades e Garantias. b) São proibidos os regulamentos das autarquias locais no âmbito da política administrativa, sem

prejuízo do poder regulamentar de que eles dispõem, (artigo 241), e no caso de existir conflitos, entre o regulamento e a reserva de lei, tem de se dar preferência à lei.

c) Proibição da deslegalização (artigo 112, n. 7) d) Proibição ou limitação rigorosa do exercício do poder discricionário e) No de reserva Absoluta (só a assembleia pode legislar), existe a impossibilidade de se

estabelecer conceitos indeterminados. Resumo: Requisitos da lei formal: Os Direitos, Liberdades e Garantias, só podem ser regulados por lei da assembleia da república, ou nos termos do artigo 168º, por Decreto-lei, autorizado, mas há casos em que este regime não é possível, são os casos de reserva absoluta (artigo 164º). Deste modo garante-se que os D.L.G. não ficam à disposição do poder regulamentar da administração pública, e que o seu regime tem de ser definido pela Assembleia da República e não pelo governo (excepto se houver autorização da Assembleia da República, nos casos em que a Constituição o permite), e muito menos pelas Regiões autónomas ou autárquicas. Nota: Em matérias de D.L.G. não há lugar para regulamentos autónomos ou independentes.

Page 117: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

117

tem de existir uma autorização de restrição expressa na constituição, esta

individualiza expressamente os D.L.G. que podem ficar no âmbito de um reserva

de lei restritiva; portanto não há uma autorização geral de restrição dos D.L.G.,

ma nossa constituição

B) materiais:

- princípio da proporcionalidade - art. 18º n.º 2. Proibição do excesso – (artigo

18º, n. 2) este princípio significa que, no âmbito das leis que restringem os

D.L.G., essa limitação tem de ser adequada (conformidade com os fins); tem que

ser necessária ou exigível (não existir outro meio igualmente eficaz e menos

coactivo); tem de ser proporcional em sentido estrito.

- princípio da generalidade e abstracção - art. 18º n.º 3. Limites dos limites –

requisito da generalidade e da abstracção (artigo 18º, n. 3). Isto significa a

produção de leis de natureza individual e concreta que restringe os Direitos,

Liberdades e Garantias.

Nota: Não basta que as leis sejam apenas formalmente ou aparentemente gerais

e abstractos, elas também têm de o ser materialmente gerais e abstractas.

- princípio da não retroactividade - art. 18º n.º 3. Requisitos da não

retroactividade (artigo 18º, nº 3): de acordo com este princípio uma lei, que

restrinja os D.L.G. e se aplique a factos pertencentes ao passado e

definitivamente estabilizados, será inconstitucional. Exemplo: Será

inconstitucional uma lei que sujeita a imposto o rendimento recebido antes da

sua entrada em vigor, e que face a uma legislação anterior estavam isentos da

tributação fiscal (artigo 103º, nº 3)

- princípio da salvaguarda do núcleo essencial - art.18ºnº 3. Salvaguarda do

núcleo essencial – (artigo 18, nº 3) as leis restritivas dos D.L.G. não podem

diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos seus preceitos

constitucionais.

REGIME DOS DIREITOS ECONÓMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS

Estão consagrados no titulo III, na parte I da Constituição, (artigo 58º a 79º). Estes

direitos e a sua protecção andam ligados a certos pressupostos que são formados por

múltiplos factores tais como:

- A capacidade económica do Estado

- O Desenvolvimento económico

Page 118: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

118

- A distribuição dos bens e riquezas, etc.

Estes direitos, reconhecem aos cidadãos o direito a uma acção ou a uma prestação do

Estado. Exemplo: O direito ao trabalho - este direito não confere um direito subjectivo a

obter um posto de trabalho. No entanto não é um direito sem efeitos jurídicos, pois ele

obriga o Estado a definir políticas de emprego, formação profissional, etc., ou a atribuir

certas prestações.

Estes direitos devem ser entendidos como uma verdadeira imposição da Constituição,

legitimadora das transformações económicas e sociais, na medida em que estas sejam

para a concretização desses direitos.59 Além disso, a inércia do Estado quanto à criação

de condições da concretização dessas medidas, pode levar o Estado à

inconstitucionalidade das normas por omissão (artigo 283º). Não podem os poderes

públicos eliminar sem qualquer compensação ou alternativa o núcleo essencial destes

direitos, já concretizado nos direitos fundamentais. (Princípio da proibição do retrocesso

social)

Não têm normas específicas para os regular mas é possível caracterizar um "regime"

próprio que lhes é implícito: a sua exequibilidade está dependente de elementos

estruturais do Estado e da sociedade.

MODELOS DE POSITIVAÇÃO:

1) normas programáticas - art. 24º n.º 1; 63º n.º 1; art. 65º

2) normas de organização - 59º n.º 2; 63º n.º 2; 66º n.º 2.

3) garantias institucionais - 6º n.º 2, a) e b), 67º n.º 2, d).

4) direitos subjectivos públicos - como direitos reflexos para os cidadãos, isto leva-nos

para a dimensão e objectiva dos direitos sociais, económicos e culturais.

59 Deveres fundamentais – (artigo 12º) – Princípio universalidade dos direitos e deveres. Exemplo: Deveres conexos com os direitos fundamentais: - O dever cívico de voto, relacionado com o direito de voto (artigo 49, n. 2) - Dever de educação dos filhos, corresponde ao direito de educação dos pais (artigo 36, n. 5) - Dever de protecção e defesa de ambiente, relacionado com a defesa do ambiente (artigo 66, n. 1) - Dever de defesa e promoção na saúde, anda associado ao direito e aà protecção da saúde (artigo 64, n. 1) Exemplo: Deveres autónomos (não estão associados à constituição): - O dever de pagar impostos (artigo 103) - O dever de recenseamento (artigo 113, n. 2) - O dever de exploração da terra (artigo 88, n. 2) - O dever de defesa da Pátria (artigo 276) Nota: As normas da constituição que, consagram deveres fundamentais, só excepcionalmente tem a natureza de deveres directamente exigíveis, pois a generalidade desses deveres precisa de mediação legislativa. “Importante”

Page 119: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

119

DIMENSÃO SUBJECTIVA E OBJECTIVA

Dimensão subjectiva:

Os direitos económicos, sociais e culturais são verdadeiros direitos subjectivos no

espaço, independentemente da sua exequibilidade imediata no tempo tendo, por isso, a

mesma dignidade dos DLG e apenas dependem na sua exequibilidade - art. 63º, 64º,

65º, 66º, 73º, 74º, 79º...

Dimensão Objectiva:

1 - São imposições ao legislador, obrigando-o a criar condições materiais e

institucionais para o exercício desses direitos: art. 59º n.º 2 ; 63º n.º 2; 64º n.º 2, 65º n.º

2, 66º n.º 2, 67º n.º 2.

2 - como fornecimento de prestações aos cidadãos em execução destas imposições

constitucionais - art. 59º n.º 1, e) ; 63º n.º 2, 3 e 4; 64º n 2 e 3.

A existência de direitos originários a prestações revela-se em 3 situações:

1 - a partir da garantia constitucional de certos direitos.

2 - quando se reconhece o dever do Estado na criação de pressupostos materiais

indispensáveis ao exercício efectivo destes direitos.

3 - a faculdade de o cidadão exigir de forma imediata as prestações constitutivas destes

direitos (direito à saúde e ao ensino).

A violação destas normas constitucionais pela inércia, quando delas resulte um

dever do Estado de efectivação destes direitos pela sua regulamentação ou criação

de instituição, pode dar lugar a uma inconstitucionalidade por omissão.

PROBLEMÁTICA DOS DIREITOS DERIVADOS

PROGRESSO ECONÓMICO

MAIOR CAPACIDADE FINANCEIRA DO ESTADO

MAIS E MELHORES SERVIÇOS PÚBLICOS

MELHOR REALIZAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE E

UNIVERSALIDADE

Page 120: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

120

A este processo chamamos a criação de novas prestações sociais do Estado chamamos

direitos derivados que se vão consolidando na esfera jurídica dos cidadãos. Logo,

enquanto realização dos preceitos constitucionais, estes direitos derivados são também

formas de garantias de concretização já obtida, entendendo alguns autores que já não

podem ser eliminados ou restringidos livremente. É o chamado Princípio da proibição

do retrocesso social e que já referimos quando tratamos do princípio da Socialidade

enquanto princípio estruturante da Constituição da República Portuguesa.

A ORGANIZAÇÃO ECONÓMICA

NORMAS CONSTITUCIONAIS de ORGANIZAÇÃO ECONÓMICA

1 –Princípios Fundamentais: «realização da democracia económica» (art. 2º),

«promover (…) a efectivação dos direitos económicos (…) mediante a transformação e

modernização das estruturas económicas e sociais» (art. 9º)

2 – (Parte I, Título II, Capítulo III) Direitos, Liberdades e Garantias dos Trabalhadores

(art. 53º a 57º)

3 – (Parte I, Título III, Capítulo I) Direitos, e deveres económicos (art. 58º a 62º)

4 – (Parte II) Organização económica (art. 80º a 107º)

5 – (Parte III) na distribuição de competências para a definição de políticas económicas

pelos órgãos de soberania [artigos 182º, 184º, 161º g) e h), 163º, d), 164º g), 165º, e), g),

i), j), l), m), n), o), q), x), e z) ], e ainda nos limites materiais de revisão (art. 288º).

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS E ORGANIZAÇÃO ECONÓMICA

Realização da «Democracia económica e social»

(artigo 2º da CRP)

↓↓↓↓

«Subordinação do poder económico ao poder político»

(artigo 80º a) da CRP)

«Planeamento democrático do desenvolvimento económico»

(artigo 80º alínea e) da CRP)

↓↓↓↓

Realização da JUSTIÇA DISTRIBUTIVA

Page 121: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

121

Direitos, Liberdades e Garantias dos Trabalhadores como limites materiais à livre

iniciativa económica:

a) Segurança no emprego (artigo 53º)

b) Liberdade de participação democrática nas empresas (art 54º)

c) Liberdade sindical e direito à greve (artigos 55º a 57º)

Direitos, e deveres económicos como princípios estruturantes da organização

económica:

a) Direito ao trabalho e direitos dos trabalhadores (art. 58º e 59º);

b) Direitos dos consumidores (art. 60º)

c) Iniciativa mista: privada, cooperativa e autogestionária (61º)

d) Direito de propriedade privada (art. 62º)

As normas de «Organização económica»:

Regulação de natureza geral:

a) competências genéricas (artigo 81º)

b) a defesa da concorrência (81º e) e 86º n.º 1

c) o planeamento ( art. 90 a 92º e 161º g))

Regulação de natureza sectorial:

a) política agrícola (art. 93º a 98º)

b) políticas comercial e industrial (art. 99º e 100º)

c) políticas financeira e fiscal

d.1) monetária e financeira (art. 101º a 102º)

d.2) tributária (art. 103º a 104º)

d.3) orçamental (art. 105 a 107º)

A CONSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA

A) A TRIBUTAÇÃO DO RENDIMENTO

1. tributação do rendimento pessoal (artigo 104º n.º 1)

• único

• progressivo

• considerar as necessidades e os rendimentos do agregado

familiar

Page 122: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

122

= diminuição das desigualdades!

realização do fim da «Justiça distributiva»!

2. tributação do rendimento colectivo (artigo 104º n.º 2)

- incidirá sobre o rendimento real (efectivo ou presumido)

B) A TRIBUTAÇÃO DO PATRIMÓNIO (art. 104º n.º 3)

• deve contribuir para a igualdade entre cidadãos

realização do fim da «Justiça distributiva»!

C) A TRIBUTAÇÃO DO CONSUMO (art. 104º n.º 4)

• necessidades do desenvolvimento económico;

• necessidades de justiça social.

realização do fim de «Bem-Estar económico e social»!

• onerar os consumos de luxo.

realização do fim da «Justiça distributiva»!

PARTE I – DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS

TÍTULO I - Princípios gerais - artigo 12º a 23º

TÍTULO II - Direitos, liberdades e garantias

CAPÍTULO I - Direitos, liberdades e garantias

pessoais - artigo 24º a 47º

CAPÍTULO II - Direitos, liberdades e garantias de

participação política – artigo 48º a 52º

Page 123: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

123

CAPÍTULO III - Direitos, liberdades e garantias dos

trabalhadores – artigo 53º a 57º

TÍTULO III – Direitos e deveres económicos, sociais e culturais

CAPÍTULO I - Direitos e deveres económicos

– artigo 58º a 62º

CAPÍTULO II - Direitos e deveres sociais

– artigo 63º a 72º

CAPÍTULO III - Direitos e deveres culturais

– artigo 73º a 79º

TÍTULO II - Direitos, liberdades e garantias CAPÍTULO I - Direitos, liberdades e garantias pessoais Artigo 24º (Direito à vida) … Artigo 27º (Direito à liberdade e à segurança) PENAS E PROCESSO PENAL: Artigo 28º (Prisão preventiva) Artigo 29º (Aplicação da lei criminal) Artigo 32º (Garantias de processo criminal) Artigo 34º (Inviolabilidade do domicílio e da correspondência) FAMÍLIA Artigo 36º (Família, casamento e filiação) LIBERDADE DE EXPRESSÃO INFORMAÇÃO Artigo 37º (Liberdade de expressão e informação) Artigo 38º (Liberdade de imprensa e meios de comunicação social) Artigo 39º (Regulação da comunicação social) PARTIDOS POLÍTICOS Artigo 40º (Direitos de antena, de resposta e de réplica política) N.º 1 LIBERDADES INDIVIDUAIS

Page 124: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

124

Artigo 41º (Liberdade de consciência, de religião e de culto) Artigo 43º (Liberdade de aprender e ensinar) Artigo 44º (Direito de deslocação e de emigração) Artigo 45º (Direito de reunião e de manifestação) Artigo 46º (Liberdade de associação) Artigo 47º (Liberdade de escolha de profissão e acesso à função pública) CAPÍTULO II – Direitos, liberdades e garantias de participação política Artigo 49º (Direito de sufrágio) – Princípio da Universalidade (artigo 12º) Artigo 51º (Associações e partidos políticos) Artigo 52º (Direito de petição e direito de acção popular) CAPÍTULO III - Direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores Artigo 55º (Liberdade sindical) Artigo 57º (Direito à greve e proibição do lock-out)

TÍTULO III

Direitos e deveres económicos, sociais e culturais

CAPÍTULO I

Direitos e deveres económicos

Artigo 59º (Direitos dos trabalhadores) (princípio da universalidade e da igualdade)

Artigo 60º (Direitos dos consumidores)

Artigo 62º (Direito de propriedade privada)

CAPÍTULO II

Direitos e deveres sociais

Artigo 63º (Segurança social e solidariedade) N.º 2

Artigo 64º (Saúde) N.º 2, A)

Artigo 66º (Ambiente e qualidade de vida) 4ª GERAÇÃO D.F. (SOLIDARIEDADE

MUNDIAL)

Artigo 68º (Paternidade e maternidade)

Artigo 70º (Juventude) N.º 1 C)

CAPÍTULO III

Direitos e deveres culturais

Page 125: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

125

Artigo 74º (Ensino) N.º 2 A) e E)

Artigo 76º (Universidade e acesso ao ensino superior)

Artigo 77º (Participação democrática no ensino) N.º 1

Artigo 78º (Fruição e criação cultural) 4ª GERAÇÃO DE D.F. (SOLIDARIEDADE

MUNDIAL)

FIQUEI AQUI EM 6-11-2006

ESTRUTURA E FUNÇÃO DOS ÓRGÃOS DE SOBERANIA

ARTIGO 108º: Titularidade e exercício do poder

«O poder político pertence ao Povo (…) »

titularidade do poder político é do povo

Princípio da soberania popular (artigos 2º e artigo 3º n.º 1)

« (…) e é exercido nos termos da Constituição.»

exercício do poder político em nome do povo

Princípios da democracia representativa e participativa (artigo 2º “in fine” e

artigo 3º n.º 1 e 2)

ÓRGÃOS DE SOBERANIA

Artigo 110º n.º 1: Consagra 4 Órgãos de Soberania:

1. Presidente da República

2. Assembleia da República

3. Governo

4. Tribunais

Page 126: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

126

PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES DOS ÓRGÃOS DE SOBERANIA

Artigo 109º - Princípio da igualdade no exercício de direitos cívicos e político e não

discriminação em função do sexo no acesso a cargos políticos.

Artigo 110º n. 2: Princípio da Reserva da Constituição quanto à:

1. formação,

2. composição,

3. competência,

4. organização dos órgãos de soberania.

Artigo 111º, n.º 1: Divisão de Poderes (elemento formal do Princípio de Estado de

Direito)

Artigo 111º, n.º 2: Princípio da tipicidade constitucional de competências

(Constitucionalidade como elemento material do Princípio do Estado de Direito)

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

1º - Chefe de Estado - Artigo 120º

• representação protocolar

• garante da independência, da unidade e da democracia

• Comandante Supremo das Forças Armadas

2º - Tem legitimidade democrática directa - Artigo 121º

• é eleito por sufrágio universal, directo, secreto

• cidadãos portugueses eleitores recenseados em Portugal e no

estrangeiro;

• logo é um órgão presidencial autónomo directamente legitimado,

pelo que tem poderes próprios ao lado de poderes partilhados

3º - Garante da Constituição - Artigo 127º n.º 3

• nessa medida se justificam os seus poderes de requerer a fiscalização

da constitucionalidade das normas

Page 127: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

127

4º - Função de integração e unidade - Art. 120º

• a sua dimensão representativa interna e internacional aponta para

uma integração funcional, própria do chefe de Estado Republicano:

I. na busca de solidariedade institucional entre os vários órgão de

soberania;

II. no direito de contacto e consulta com os vários órgãos

constitucionais e forças políticas da sociedade (partidos,

organizações, grupos sociais e cidadãos);

III. nos actos de indulto e comutação de penas e atribuição de

ordens honoríficas - art. 134º, f) e i) ;

IV. na informação aos cidadãos - art. 134º e) ;

V. no exercício das funções de Comandante Supremo das Forças

Armadas - art. 134º a)

PODERES DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Poderes Próprios e Partilhados

1. - Os poderes próprios ou institucionais embora por vezes estejam condicionados à

observância de outras formalidades constitucionais, como a obtenção de pareceres

prévios ou de consulta a outros órgãos.

Exemplos: artigo 115º n.º 1; artigo 133º e), f), g), n),…; 134º; 136º n.º 1;…

2. - Os poderes partilhados revelam-se na Constituição essencialmente através do

instituto da REFERENDA. Este instituto visa a co-responsabilização de Presidente e

Governo na prática de certos actos, quer ao fazer depender certos actos do PR de

proposta do Governo – ex. artigo 133º j), l), m) e p); 140º e 197º 1, a) -, quer na

submissão das normas jurídicas emitidas pelo governo à promulgação Presidencial, e

logo à sua certificação, ex.: artigo 134º b).

PODERES DE DIRECÇÃO POLÍTICA

• art. 134º a) e 136º - direito de promulgação das leis, e

• art. 136º- direito de veto

PODERES DE CONTROLO

Page 128: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

128

• Art. 134º g) e h) - requerer a fiscalização da constitucionalidade pelo TC e veto

por inconstitucionalidade - é um poder-dever no âmbito da obrigação do PR de

ser garante da constituição

• Art. 136º - direito de veto político - verdadeiro direito político independente

• Art. 115º n.º 10 - direito de recusa de referendo - verdadeiro direito político

independente

PODERES DE EXTERIORIZAÇÃO POLÍTICA

• Art. 133º d) - direito de mensagem

• artigo 133º f) e g) – o P.R. tem poderes para nomear e demitir o Governo

A ASSEMBLEIA DE REPÚBLICA

1 - órgão representativo do povo

• art. 147º

• art. 152º, 2 - os deputados são representantes todo país e não o círculo pelo qual

foram eleito.

2 - órgão de soberania autónomo

• art. 175º a, b - competência regimental na eleição do presidente e dos membros

da mesa

• art. 173º 174º - direito de auto-reunião

• art. 176º - fixação da ordem do dia pelo presidente da Assembleia da República

• art. 181º - poderes administrativos especiais

• autonomia administrativa e financeira - a AR não está sujeita a quaisquer ordens

ou instruções de outros órgãos

3 - é um órgão permanente – (princípio democrático) – art. 179º

4 - é um órgão colegial unicameral:

a) plenário é composto por deputados directamente eleitos 148º

Page 129: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

129

b) n.º mínimo de 180 e máximo de 230 deputados, eleitos por círculos eleitorais,

plurinominais ou uninominais, de forma a assegurar a representação

proporcional segundo o método de Hondt

c) são órgãos auxiliares do funcionamento da AR:

� o Presidente da AR - art.175º

� a mesa da AR - art. 175 b)

� as comissões - art. 178º e 179º

� os grupos parlamentares - art. 180º, 176º, 3; 192, 3; 194, 1.

5 - é um órgão arbitral - deve assegurar uma estrutura harmonizante das varias

tendências representadas.

Page 130: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

130

FUNÇÕES DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

1 - Função electiva e de criação

• competências de eleição de titulares de determinados de órgãos constitucionais -

Art. 163º h e I; e 39º, 3, b).

2 - Função Legislativa

é o órgão legislativo por excelência:

� 164º - reserva absoluta de competência legislativa para certas matérias

� 165º - reserva relativa de competência legislativa para outras matérias

� E ainda competência concorrente com o Governo nas demais matérias

– competência residual concorrente – artigos 161º c) e 198º nº1 a)

A importância da função legislativa da Assembleia da República revela-se:

A. na inexistência de mecanismos de referendo nas matérias de competência

exclusiva absoluta da AR - art. 115º 4 d)

B. nas limitações à iniciativa popular - art. 167º, 1,2,3

C. na inexistência de poderes legislativos excepcionais ou constitucionais em

situações de crise,

D. na limitação à faculdade de delegação ou autorização legislativa Art. 165º, 2, 3,4,5

E. na existência de uma reserva de competência da AR 164º e 165º

3 - Função de Controlo - art. 162º

� art. 156º c, 162º a, 177º, 2 - perguntas e interpelações

� art. 178º 4, 5 – comissões

� art. 52º, 178º 3 – petições

� art. 194º, 195, 1, f - moções de censura

4 - Função de Fiscalização - art .162º

� art. 19º e 161º, l, m - estados de necessidade

� art. 162º d, e, - contas públicas e execução dos planos nacionais

� art. 163º, j - envolvimento militar no estrangeiro

5 - Função Autorizante -

Page 131: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

131

� art. 161º, d, i, l, m,

6 - Função de Representação

� na medida em que a AR representa "todos os cidadãos portugueses" - o povo - é

lhe atribuída competência para aprovação de tratados e assuntos relacionados

com as relações internacionais e a soberania do estado - art. 161º, i, m.

7 - Função Europeia

� Fala-se agora em funções da Ar na construção e acompanhamento da união

europeia - Art. 7º, 6 ; 161, n ; 112, 9

O GOVERNO

1 – Órgão executivo

- artigo 200º n.º 1 a) – define as linhas gerais das política governamental e a sua

execução

- artigo 199º n.º d) – dirige a actividade da administração pública

2 – Órgão nomeado (sem legitimidade democrática directa)

- art. 187 n.º 1 – o Primeiro Ministro é nomeado pelo P.R. “tendo em conta os

eleitorais” para a A.R.

- art. 187 n.º 2 – os Ministros e Secretários de Estado são nomeados pelo P.R. sob

proposta do Primeiro Ministro.

3 – Órgão constitucional autónomo

- tem competências política, legislativa e administrativas

- artigo 198º n.º 2 – tem competências de auto regulação

4 – Órgão colegial e solidário

- artigo 189º - decisão tomadas em conselho de ministros

5 – Órgão hierarquicamente estruturado

- artigo 191º - dependência e responsabilidade hierárquica

- artigo 201º - Competências específicas do Primeiro Ministro.

Page 132: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

132

6 – Órgão duplamente responsável

- artigo 190º e 191º - responde politicamente perante P.R. e A.R.

- artigo 133º f) e g) – o P.R. tem poderes para nomear e demitir o Governo

- artigo 163º d), e e) – A A.R. tem poderes para apreciar o programa de governo e votar

moções de confiança e censura ao governo.

- artigo 169º - a AR tem poderes para “apreciar” os actos legislativos do Governo que

não sejam da competência exclusiva deste

FUNÇÕES DO GOVERNO

1 – Função Política (ou de Governo)

- artigo 200º n.º 1 a) – definir as linhas gerais das política governamental e a sua

execução

2 – Função administrativa

- artigo 199º - Competências administrativas

- artigo 199º n.º d) – dirige a actividade da administração pública

3 – Função Legislativa

- Artigo 198º - amplas competências legislativas, originárias e derivadas.

COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS DO GOVERNO

I - Competência legislativa originária concorrente

– artigo 198º n.º 1 a) – em concorrência com a A.R.: nas matérias não previstas

nos (artigos 164º e 165º)

II – Competência legislativa originária exclusiva

– artigo 198º n.º 2 – em matérias da sua própria organização e funcionamento

III – Competência legislativa derivada

– artigo 198º n.º 1 b) – em matérias de competência relativa da A.R. mediante

autorização (artigo 165º)

Page 133: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

133

– artigo 198º n.º 1 c) – em desenvolvimento de Bases Gerais definidas pela A.R.

OS TRIBUNAIS

1 – Poder separado

- artigo 202º n.º 1 - dois sentidos: o poder judicial pertence exclusivamente aos

Tribunais, os Tribunais apenas detêm o poder jurisdicional.

2 – Órgão independente

- artigo 203º - colectiva (Tribunais enquanto judicatura)

- artigo 203º - funcional – apenas estão sujeito à Lei

- artigo 216º n.º 3, 4 e 5 – individual – incompatibilidades mínimas.

- artigo 165º - interna e externa – a sua organização é garantida pela reserva de Lei da

Assembleia da República

3 – Ausência de responsabilidade política

- artigo 216º n.º 2 - a Independência e imparcialidade dos Juízes é garantida também

através do princípio da irresponsabilidade – individual e colectiva.

4 – Órgão plural

- artigo 209º - O poder jurisdicional está dividido por diversas jurisdições:

� Direito Constitucional (Tribunal Constitucional);

� Direito Privado (Tribunais Judiciais - Civil, Criminal, Comercial, Família,

Trabalho);

� Direito Público (Tribunais Administrativos e Fiscal)

� Despesa Pública (Tribunal de Contas)

� Jurisdições facultativas (Marítimos, Arbitrais e Julgados de Paz)

� Militar (Tribunais Militares)

5 – Órgão “polarizado”

O poder jurisdicional está disperso por juízos individuais.

6 – Órgão sem legitimidade democrática directa

Page 134: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

134

A legitimidade dos Tribunais resulta da própria Constituição, enquanto “corpo”

independente e imparcial essencial ao funcionamento do Estado de Direito

SISTEMA SEMI-PRESIDENCIALISTA DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA

Presidente da

República

Assembleia da

República

Governo Os Tribunais

- eleito por sufrágio universal - declarar estado de sítio e estado de emergência

- eleita por sufrágio universal - votar o programa do governo - votar moções de censura e confiança ao governo

- Nomeado pelo PR tendo em consideração a composição da AR

- Legitimidade Constitucional.

- Órgão singular - Órgão colegial representativo do povo

- Órgão colegial (conselho de ministros)

- Órgãos singulares e/ou colectivos.

- Chefe de Estado, Comandante Supremo das Forças Armadas - Representação protocolar - Poderes políticos: direito de veto ; de requerer a fiscalização da constitucionalidade das normas jurídicas; decidir da realização de referendos.

- órgão legislativo por excelência - Reserva de leis e revisão - iniciativa de lei e referendos constitucionais

- Órgão executivo por excelência - Poderes legislativos limitados (os não reservados à AR) - Condução da Política externa - Direcção da Administração Pública - Elaboração e execução do Orçamento do Estado - Iniciativa de lei e de referendo

- dissolver a AR - nomeia o Governo com base na composição do Parlamento - demite o Governo

- votar o programa do governo - votar moções de censura e confiança ao governo

- É responsável politicamente perante o PR e a AR

- exercício em exclusividade do poder jurisdicional - independentes de todos os demais órgãos do Estado.

Page 135: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

135

A CONSTITUIÇÃO E O SISTEMA DAS FONTES DE DIREITO

1ª - Identifica as FONTES DE DIREITO:

Art. 8º - direito internacional e direito comunitário

Art. 56º, n.º 4 - convenções colectivas de trabalho

Art. 112º, n.º 1 - actos normativos:

leis, decretos-leis e decretos legislativos regionais;

n.º 6 e 7: regulamentos

n.º 5 – poder exclusivo da constituição

Art. 115º - referendo

Art. 226º - Estatutos das regiões autónomas

2ª - estabelece os CRITÉRIOS DE VALIDADE E EFICÁCIA de cada uma:

Art. 112º n.º 2 - as Leis e os Decretos-leis têm igual valor;

n.º 3 - algumas leis tem valor reforçado

n.º 4 - as Leis e decretos-leis prevalecem sobre os

decretos legislativos regionais

n.º 8 - transposição de directivas comunitárias

3ª - determina a COMPETÊNCIA das entidades que emanam normas jurídicas:

Art. 161º, 164º e 165º - Competência legislativa da AR

Art. 198º - Competência legislativa do Governo

Art. 227º - Competência legislativa das Regiões Autónomas

Art. 241º - Competência legislativa das autarquias locais.

PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES DOS ESQUEMAS RELACIONAIS DAS

FONTES DE DIREITO

Constituição e fontes de direito – a Constituição é o cume da pirâmide. Além de

identificar as fontes de direito estabelece os critérios de validade e de eficácia de cada

uma dessas fontes e determina a competência das entidades que produzem normas

jurídicas.

Page 136: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

136

Princípios estruturantes dos esquemas relacionados entre as fontes de direito são os

(três) seguintes:

1 - Princípio da hierarquia

2 - Princípio da competência

3 - Princípio básico sobre produção jurídica

1º - Princípio da Hierarquia

Princípio da hierarquia – a ideia básica deste princípio é que os actos normativos (leis,

decretos-leis, decretos legislativos regionais e regulamentos), são todos actos

normativos, mas não têm todos a mesma hierarquia, ou seja existe uma pirâmide

jurídica que a Constituição ordena de acordo com os seguintes princípios:

A hierarquização das fontes de direito é um poder cuja exclusividade constitucional

decorre do artigo 112º n.º 5, e concretiza-se nos seguintes princípios:

1) Princípio da preeminência ou superioridade dos actos legislativos (Leis,

decretos-leis e decretos legislativos regionais) relativamente aos actos

normativos regulamentares - art. 112º, 6 e 7;

2) Princípio da tendencial paridade ou igualdade entre Lei e Decreto-lei - 112º n.º 2

- o que significa poderem as leis e os decretos-lei interpretar-se, suspender-se ou

revogar-se reciprocamente60

3) Princípio da prevalência dos princípios fundamentais das leis gerais da

República sobre os actos legislativos regionais - 112º n.º 4

4) Princípio da superioridade ou proeminência das normas de enquadramento e das

leis de bases sobre as normas complementares - 112º n.º 2

5) Princípio da aplicação preferente das normas comunitárias relativamente às

normas internas nacionais - 112º n.º 8 + Tratado da UE.

6) Princípio da inderrogabilidade de norma de grau superior por norma de grau

inferior.

2 - Princípio da competência

Este princípio está associado ao facto de existir uma pluralidade no ordenamento

jurídico que não se reduz ao Estado, pois existe também o ordenamento regional, o local

60 Princípio da tendencial prioridade entre as leis e os decretos-leis, o que significa, que eles podem em princípio interpretar-se, suspender-se, ou revogar-se reciprocamente (artigo 112, n. 2)

Page 137: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

137

e o institucional (institutos públicos, empresas públicas, etc.). É também este princípio

que justifica a regulação de certas matérias por determinados órgãos, formando desse

modo blocos de competências em certas matérias. Este princípio não afecta, nem

perturba o princípio da hierarquia.

Delimita a competência legislativa dos órgãos com funções legislativas a determinadas

matérias em função da qualidade (AR, Governo) ou em função do território (Regiões

autónomas e Autarquias Locais):

� Assembleia da República – artigos 161º 164º e 165º

� Governo – artigo 198º

� Regiões Autónomas – artigos 226º a 228º

� Autarquias Locais – artigo 241º

3 – Princípio básico sobre a produção jurídica (artigo 112, n. 5)

1 – Nenhuma fonte de direito, pode atribuir a outra um valor do qual ela própria não

detém.

2 – Nenhuma fonte pode atribuir a outra um valor igual ao seu.

3 – Nenhuma fonte pode dispor do seu próprio valor jurídico, quer acrescentando, quer

diminuindo.

4 – Nenhuma fonte pode transpor para o Estado outros actos de real valor.

Nota: Nenhuma fonte de direito pode criar outras fontes com eficácia igual, ou superior

à dela própria, apenas pode criar fontes de eficácia inferior..

Com base neste princípio serão inconstitucionais:

1 – Os regulamentos interpretativos das leis, se eles se arrogarrem o direito de fazer a

interpretação autêntica da lei, mesmo quando esta expressamente o autorize, pois a

interpretação autêntica da lei só pode ser feita por acto legislativo de igual valor.

2 – Os regulamentos derrogatórios das leis, mesmo que a lei autorize a sua revogação

por fonte regulamentar.

OS ACTOS NORMATIVOS

1 - Leis Constitucionais

Leis constitucionais – a Constituição refere expressamente esta categoria (artigo 199, n. 1), alínea a)), são obrigatoriamente publicados no Diário da República, e prescreve a forma de lei constitucional para certos actos jurídicos. (artigos 284º a 289º). A reserva de lei constitucional pertence apenas ao poder constituinte e ao poder de revisão.

Page 138: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

138

CONCEITO: São as que se destinam a produzir alterações à constituição nos

termos dos artigos 284º e seguintes - artigo 166º e 161º a) da

CRP.

COMPETÊNCIA: competência exclusiva da AR - 161º a) + 284º -, por iniciativa

dos deputados - 285º,

FORMA: necessitam para a sua aprovação de uma maioria de 2/3 dos

deputados em efectividade de funções - 286º.

ESPECIFICIDADES: O Art. 119º n.º 1 a) determina a publicação das Leis

Constitucionais em Diário da República, conjuntamente com o

novo texto integral da CRP - art. 287º n.º 2.

2 - Leis Orgânicas

1 - Não se trata de uma lei diferente das outras leis da assembleia da república, elas são leis ordinárias ou comuns, ficando desse modo posta de lado a ideia de existir um escalão entre a lei constitucional e as leis ordinárias. Apesar da sua natureza de lei ordinária a Constituição confere-lhe a natureza de leis reforçadas (artigos 112º, n. 3, 280º, n. 2, alínea a) e 281º, alínea b)) 2 – As leis orgânicas estão vinculadas ao princípio da tipicidade, pois só a lei constitucional pode atribuir forma especial, valor reforçado e reserva material a certos tipos de actos legislativos. 3 – Sempre que a Constituição reservar por lei orgânica a disciplina jurídica de uma certa matéria, então o legislador orgânico é competente nessa matéria em termos exclusivos. Assim serão inconstitucionais as leis orgânicas de autorização, leis orgânicas de bases e leis orgânicas limitadas ao regime geral de certas matérias. 4 – É obrigatório a observância do princípio da competência, o princípio da hierarquia e da reserva de lei absoluta, assim a lei orgânica, pode incluir normas sobre matérias de lei ordinária, mas não pode reenviar para um lei não orgânica, algumas regulações normativas sobre matérias qual a constituição inclui no âmbito das leis orgânicas. 5 – A maior parte das leis orgânicas, são obrigatoriamente votadas na especialidade do plenário da assembleia da república, elas não são só uma reserva do parlamento mas também uma reserva do plenário (artigo 167º, n. 4). 6 – Embora não sejam as únicas as leis orgânicas exigem maioria qualificada de dois terços dos deputados presentes e portanto um largo consenso parlamentar, para a superação do veto político do Presidente da República (artigo 136, n. 3). 7 – A constituição no seu (artigo 116, n. 2) exige a forma de lei orgânica. 8 – As leis orgânicas têm um regime especial de fiscalização preventiva da sua constitucionalidade (artigo 178º, n. 4).

CONCEITO: - categoria de leis introduzida pela revisão de 1989 - conceito não

está bem definido na CRP.

- a CRP reservou a disciplina de determinadas matérias para a

Page 139: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

139

forma de Lei Orgânica, artigo 166º n.º 2

- têm um regime próprio, que será o elemento relevante do seu

conceito.

COMPETÊNCIA: - artigo 166 n.º 2 e artigos 164º e 255º

- são sempre da competência absoluta da Assembleia da

República.

FORMA: - requerem a aprovação em plenário por maioria absoluta dos

deputados em efectividade de funções - art. 168º n.º 5

ESPECÍFICIDADES

art. 278º n.º 4 - regime especial de fiscalização preventiva

art. 136º n.º 3 - exigem maioria qualificada de 2/3 dos deputados

presentes para superação do veto político.

3 - Leis de Bases (ou de Princípios)

São leis que, consagram as leis as bases gerais de um regime jurídico, deixando a cargo

do executivo os desenvolvimentos desses princípios.

O tipo de leis de bases encontra-se na Constituição (artigo 112º, n. 1, alínea c) e 164º, alínea d) e i)). Com o princípio da reserva legislativa de bases gerais pretende-se assegurar a intervenção legislativa primária da Assembleia da República, e permitir ao Governo, mesmo sem autorização legislativa, legislar sobre essas matérias, depois de fixadas essas bases gerais, através da lei do parlamento. Sobre um ponto de vista material as leis de bases constituem directrizes e limites dos decretos-leis. Embora as leis e os decretos-leis sejam actos legislativos com igual dignidade hierárquica, as leis na modalidade de leis de base adquirem um primariedade material e hierárquica, com a correspondente subordinação dos decretos-leis de desenvolvimentos (artigos 112º, n. 2, 198º, n. 1, alínea c))

CONCEITO: - consagram princípios vectores ou bases gerais do regime jurídico

de determinado instituto,

COMPETÊNCIA: - São da competência da Assembleia da República

FORMA: - Revestem a forma de Lei - artigo 166º n.º 3 + 161º c) + 164º i),

165º f), g), n), t), u), z) - e são aprovadas por maioria simples - art.

116º n.º 2 e 3

ESPECÍFICIDADES:

- Nessa medida, as Leis de Bases servem como directivas e limites

materiais aos decretos-leis do governo e decretos legislativos

regionais da Assembleias Legislativas Regionais, no âmbito das

matérias que estão reservadas a estas Leis. - Art. 198º 1, c) e 3 +

Page 140: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

140

227º n.º 1 c) e 4.

4 - Leis de autorização legislativa

Leis de autorização legislativa – através destas leis a Assembleia da República habilita

ou autoriza o Governo a emanar actos normativos com força de lei, que também se

chamam de delegação ou de autorização.

CONCEITO: Leis emitidas com base na expressa autorização de

delegação de competências constante do artigo 165º, em

que a AR autoria o Governo ou as Assembleias

Legislativas das Regiões Autónomas a legislar matérias da

sua competência relativa. - 198º b) + 227º, 1, b)

COMPETÊNCIA: Da Assembleia da República - art. 166º n.º 3 e 161º d)

FORMA: Lei - artigo 166º n.º 3 + 161º d)

ESPECÍFICIDADES: Têm um regime específico de utilização.

4.1. Regime das Leis de autorização legislativa

LIMITES

MATERIAIS61

- art. 165º n.º 2 - definem o objecto, sentido e extensão da

autorização

- art. 111º n.º 2 + 161º + 164º - não podem incidir sobre matérias

da competência exclusiva absoluta da Assembleia da República

LIMITES

TEMPORAIS:

- art. 165.º n.º 2 - indicam o prazo de duração da autorização;

CESSAÇÃO DA

AUTORIZAÇÃO62:

- 165º n.º 3 - quando é utilizada - princípio da irrepetibilidade

- quando é revogada pela AR – de

61 Um desses limites é a exigência constitucional de as leis de autorização definirem o objecto da autorização (artigo 165, n. 2), o que significa, que é necessário especificá-lo e não indicar apenas de forma vaga e imprecisa, quais as matérias que irão ser objecto dos decretos-leis delegados. Nos termos desse mesmo artigo (165, n. 2), a lei de autorização também tem de definir o seu sentido, ou seja tem de estabelecer os princípios orientadores do governo para emanar esses decretos-leis. Uma outra espécie de limites materiais, é a de que a lei de autorização não pode incidir sobre matérias necessariamente reguladas por lei formal, nesses casos estamos perante matérias de especial sensibilidade política, cujo regulamento deve ser atribuído exclusivamente e indelevelmente ao parlamento (artigo 161º e 164º). Também não pode ser objecto de autorização a emanação de actos que a assembleia da república pratica sob uma forma diversa de lei, tais como moções, censuras e resoluções. 62 Para além dos limites referidos, no (artigo 165, n. 2), a autorização pode cessar por três motivos:

Page 141: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

141

forma expressa mediante Lei revogando a autorização, ou de

forma tácita quando a AR aprova leis durante o período de

autorização regulando directamente as matérias objecto da

autorização.

- artigo 165º n.º 4 – sempre que ocorra:

� a demissão do governo

� o termo da legislatura

� a dissolução da AR

4.2. LEIS DE AUTORIZAÇÃO versus LEIS DE BASES

Semelhanças com as Leis de Bases:

I. nenhuma delas esgota a regulamentação da matéria sobre que versam carecendo

de posterior intervenção legislativa.

II. ambas delimitam e condicionam a área de intervenção legislativa do Governo e a

sua liberdade de conformação.

Diferenças com as Leis de Bases:

I. a lei de bases altera directamente a ordem jurídica, estabelecendo normas gerais

que permanecem efectivas mesmo após a sua regulamentação específica, as leis

de autorização não são directamente eficazes no ordenamento jurídico

requerendo a intervenção do decreto autorizado que vigorará na ordem jurídica.

1 – Utilização dessa autorização pelo governo (artigo 165, n. 3), vigora portanto no nosso sistema constitucional o princípio da irrepetibilidade dessa autorização, o governo não pode utilizar essa autorização mais do que uma vez, e estar-lhe também vedado a revogação, alteração ou substituição do decreto-lei autorizado. Nota: Isto não significa a proibição de utilização parcelar da autorização. 2 – Revogação pela assembleia da república, esta pode revogar a autorização, com base neste princípio, quem pode conceder também pode revogar. Essa revogação deve ser feita de forma expressa e através de um acto de igual valor ao da autorização (lei), no entanto se a assembleia da república durante o período de autorização da autorização emanar leis que, regulem directamente as matérias que eram objecto da lei de autorização, isso significa que, houve uma revogação tácita ou implícita. 3 – Caducidade pelos razões enumeradas no (artigo 165, n. 4), são três: - Demissão do governo - Termo, ou fim da legislatura - Dissolução da assembleia da república Estamos aqui perante uma relação de confiança, entre o órgão parlamentar e o governo, motivo pelo qual a autorização caduca, com a alteração de qualquer desses órgãos. (Artigo 165, n. 5) – As autorizações concedidas ao governo na lei do orçamento, só caducam no termo do ano económico a que respeitam, quando incidam sobre matérias fiscais.

Page 142: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

142

II. a lei de bases fica apenas suspensa do desenvolvimento legislativo por parte do

governo; enquanto a lei de autorização caduca se não for utilizada, ou esgota-se

nessa mesma utilização.

III. a lei de autorização delega no governo a competência ara legislar sobre aquela

assunto apenas uma vez, enquanto perante uma Lei de Bases o governo pode

livremente e sucessivamente modificar o desenvolvimento que deu á lei.

IV. só pode haver leis de autorização em matérias pertencentes ao domínio

reservado da AR, enquanto as leis de bases podem surgir em qualquer domínio

legislativo.

5 - Leis Estatutárias

As leis estatutárias, são as leis da assembleia da república que, aprovam os estatutos políticos, administrativos das regiões autónomas (artigo 226), os estatutos ocupam uma posição hierarquia privilegiada devendo considerar-se como leis reforçadas (artigos 226º, n. 2 e 280º, n. 2, alínea b)).

CONCEITO: Leis da AR que aprovam os estatutos politico-administrativos das

regiões autónomas, onde se definem os seus esquemas

organizatórios fundamentais e a regulação do exercício dos

poderes regionais

COMPETÊNCIA: - o impulso de procedimento estatutário cabe À ALR - art. 226º n.º

1

- a deliberação cabe à AR, 161º, 1, b) e 226º 1, 2 e 3

FORMA: - Têm a forma de Lei da AR, devendo ser aprovada por maioria

simples. art. 161º, 1 b) e c) e 116º.

ESPECÍFICIDADES: - - -

6 - Leis reforçadas

Leis reforçadas – algumas das categorias de leis cabem no conceito de leis reforçadas,

como é o caso das leis orgânicas, leis de autorização leis de bases e leis estatutárias

(artigo 112, n. 3), faz alusão a esse tipo de leis.

Este artigo diz-nos que devem ser consideradas como tal as leis que devam ser respeitadas por outras leis. A lei das grandes opções do plano do governo (artigos 91, 106, n. 2). A lei-quadro das reprivatizações (artigo 293). Os estatutos das regiões autónomas (artigo 226) As leis das finanças autónomas (artigo 229, n. 3 e 164, alínea t).

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143

CONCEITO: Vêm tipificadas no art. 112º n.º 3 em quatro categorias:

- leis orgânicas

- leis que carecem de aprovação de maioria de 2/3

- leis que por força da constituição sejam pressuposto

normativo de outras leis

- leis que por outras leis devam ser respeitadas

COMPETÊNCIA: São sempre Leis da AR.

FORMA: Serão assim leis reforçadas, além das Leis Orgânicas:

- as leis de bases

- as leis de autorização

- as leis de enquadramento do orçamento - 106º, 1 ; 164º,

r), 227º 1, r) e 232º 1.

ESPECÍFICIDADES: - prevalecem sobre as Leis e Decretos-leis que versam

sobre a mesma matéria - 112º n.º 3;

7 – Leis de enquadramento

Leis de enquadramento ou leis-quadro: as leis de enquadramento não se confundem com as leis de bases, pois com elas pretende-se estabelecer os parâmetros estruturantes de um sector da vida económica, social e cultural: é o que acontece com a lei de enquadramento do orçamento do Estado, com a lei-quadro da criação, modificação e extinção das autarquias e com a lei-quadro das reprivatizações.

Estatutárias Alcance geral

Orgânicas Leis Governo Reforçadas De bases

Autorização legislativa Alcance Gerais da República Assembleias L. Regionais Limitado Quadro / enquadramento

Aprovam as grandes opções

Page 144: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

144

9 Decreto-Lei

Decretos-Leis – a actividade legislativa do governo reconduz-se nos seguintes princípios: 1 – Competência legislativa originária ou independente: fala-se desta competência no caso de matérias não reservadas à assembleia da república, podendo o governo em concorrência com esta (A.R.) emanar actos legislativos primários reguladores dessas matérias, através de decretos-leis (artigo 198, n. 1, alínea a)) 2 – Competência legislativa dependente ou derivada (decretos-leis autorizados e decretos de desenvolvimento), (artigos 165º, n. 2, 3, 4, alínea b) e 198º, n. 1, alínea c)) 3 – Competência exclusiva (reserva de decreto-lei artigo 198º, n. 2): o governo tem competência legislativa exclusiva em relação às matérias que digam respeito à sua organização e ao seu funcionamento. (artigos 161º, 164º, 165º) Todos os actos legislativos do governo (decretos-leis), podem ser submetidos à apreciação da assembleia da república (artigo 169º, n. 1), para efeito de cessação de vigência ou de alteração.

CONCEITO: São os actos legislativos emanados pelo Governo

art. 112º - 198º nº 1

COMPETÊNCIA: - Governo:

I - Exclusiva - 198º n.º 2 - matéria respeitante à sua própria

organização e funcionamento.

II - Originária e concorrente - 198º 1, a) - matérias não reservada

à AR

III - dependente - decretos-leis autorizados e decretos-leis de

desenvolvimento – artigo 198º 1, b) e c)

FORMA: Art. 200º , n.º 1, d) - os decretos-leis são aprovados por conselho

de Ministros

Art. 201º n.º 3 - os decretos-leis são assinados pelo Primeiro

Ministro e pelo Ministro materialmente competente

ESPECÍFICIDADES: Art. 198º n.º 3 - os decretos-leis autorizados e os decretos-leis de

desenvolvimento devem invocar expressamente a lei de

autorização legislativa correspondente ou a lei de bases ao abrigo

da qual são aprovados.

Page 145: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

145

10. Decreto Legislativo Regional

Há também os decretos-leis regionais que respeitam às Regiões autónomas: - Poder legislativo primário (artigo 227, n. 1, alínea a)) - Poder legislativo de desenvolvimento (artigo 227, n.1, alínea c)) - Poder legislativo autorizado (artigo 227, n. 1, alínea b)) Nota: As leis regionais são sempre leis de competência especial, sob o ponto de vista espacial e sob o ponto de vista material. As leis regionais são sempre leis materialmente condicionadas:

a) Pelos princípios fundamentais das leis gerais da República (artigo 227, n. 1, alínea a))

b) Pelas leis de autorização da Assembleia da República. c) Pelas leis de bases editadas pelos órgãos de soberania da República. d) Pelas competências próprias dos órgãos de soberania.

CONCEITO: São actos legislativos no âmbito das competências das

regiões autónomas.

COMPETÊNCIA: Assembleia Legislativa da Região Autónoma:

I - poder legislativo primário - art. 227º n.º1a)

II - poder legislativo autorizado -art. 227n.º 1 b)

III - )- poder legislativo de desenvolvimento - art. 227, 1 c)

FORMA: Aplica-se a regra geral do artigo 116º.

ESPECÍFICIDADES: Art. 233º - O Representante da República assume perante

os Decretos Legislativos regionais os mesmos poderes que

o Presidente da República perante as leis e decretos lei,

competindo-lhe assinar e mandar publicar, mais podendo

exercer veto político ou ainda requerer a fiscalização da

sua constitucionalidade - art. 278º e 279º.

LIMITES MATERIAIS DOS

DECRETOS LEGISLATIVOS REGIONAIS:

1) só podem incidir ou versar sobre matérias de interesse específico da região - art.

112º n.º 4 e 227º;

2) devem respeitar os princípios gerais da República - art. 112º n.º 4 e 227, 1 a)

3) devem respeitar as Leis de autorização da AR;

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146

4) devem respeitar as leis de bases aprovadas pelos órgão de soberania da

república;

5) devem respeitar as competências próprias dos órgãos de soberania

11. – Regulamentos

Os Regulamentos – são normas emanadas pela administração no exercício da função

administrativa, e regra geral com carácter executivo, e/ou complementar da lei. É um

acto normativo mas não é um acto com valor legislativo.

Os regulamentos não constituem uma manifestação da vontade da função legislativa,

antes se revelam com expressão normativa da função administrativa, (artigo 199º, alínea

c) e g)).

Relação entre as leis e os regulamentos: há que ter em conta nesta matéria os seguintes

princípios:

1 – Princípio da preferência ou proeminência, ou primazia da lei – o regulamento não

pode contrariar um acto legislativo, pois a lei tem absoluta prioridade sobre os

regulamentos, estando expressamente proibidos os regulamentos modificativos,

suspensivos, ou revogatórios das leis (artigo 112º, n. 5).

2 – Princípio da precedência da lei – encontra-se consagrado no artigo 112º, n. 7 que

estabelece a precedência da lei relativamente a toda a actividade regulamentar e também

o dever de citação da lei habilitante para todos os regulamentos.

3 – Princípio da complementaridade ou assiduidade dos regulamentos.

4 – Princípio do congelamento do grau hierárquico de uma norma legislativa nova,

substitutiva, modificativa ou revogatória de outra, tem que ter uma hierarquia normativa

pelo menos igual à da norma que ela pretende modificar ou revogar.

CONCEITO: São normas emanadas pela administração no exercício da função

administrativa e, regra geral, com carácter executivo ou

complementar da lei - não são actos legislativos.

No entanto, é um acto normativo e não um acto administrativo. -

Art. 199º c) e g)

COMPETÊNCIA: do governo ou dos órgão da administração pública no âmbito das

suas competências

Page 147: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

147

FORMA: os regulamento emanados pelo governo assumem a forma de

decreto-regulamentar quando tal for a forma exigida pela Lei (art.º

112º n.º 6)

ESPECÍFICIDADES: As leis e decretos-leis prevalecem sobre os regulamentos (art. 112º

n.º 5)

O regulamento tem de citar expressamente a lei habilitante - 112º n.

6 e 7.

12. – Decretos

O termo decreto pode assumir vários significados: actos solenes e definitivos de um

órgão representativo ou do poder executivo, ou ainda actos do poder legislativo ainda

não definitivos.

Exemplos de decretos na Constituição da República Portuguesa:

- Decretos do Presidente da República (artigo 119º, n.1, alínea d))

- Decretos de dissolução da Assembleia da República (artigo 172º, n. 2)

- Decretos de nomeação dos membros do governo (artigo 183º, n. 3)

A eficácia do decreto do Presidente da República sob o ponto de vista jurídico depende

da publicação no Diário da República. (artigo 119º)

Decretos do Governo (artigo 134º, alínea b))

Podemos distinguir entre decretos regulamentares, que precisam de promulgação do

Presidente da República, e decretos simples que apenas exigem a assinatura do

Presidente da República.

CONCEITO:

A CRP acolhe 2 conceitos distintos:

I - actos solenes e definitivos do órgão representativo ou do poder executivo

II - actos diplomas já aprovados pelo órgão legislativo mas ainda não promulgado pelo

Chefe de Estado - art. 136º e 278º

TIPOS DE DECRETOS PREVISTOS DA CONSTITUIÇÃO

1) Decretos do Presidente da República - 119º, n.º 1, d) e 172º n.º 2, 183º n.º 3 - devem

entender-se que assumem a forma de decreto todos actos políticos do Presidente da

República

Page 148: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

148

2) Decretos do Governo

- artigo 134º, b) decretos regulamentares que requerem a promulgação do Presidente

da República

- decretos simples que apenas requerem a assinatura PR

- decretos de aprovação de tratados e acordos internacionais - 197, n.º 2 e 278º n.º 1

- requerem assinatura do PR e eventual fiscalização da constitucionalidade.

- decretos aprovados em Conselho de Ministros e remetidos ao PR para serem

promulgados como Decreto-lei art. 136, n.º 4.

3) Assembleia da República

- decretos aprovados em plenário e remetidos ao PR para serem promulgados como

Lei – art. 136º n.º 1.

4) Decretos das Regiões Autónomas -

- decretos legislativos regionais - são actos legislativos que já falamos supra - 227º

a) b) c) d) 112, 1 e 4, 119, 1, c)

- decretos regulamentares regionais - são decretos para regulamentação das leis

gerais emanadas dos órgãos de soberania 227º, 1, d) - 119º, 1, h); 278º 2

12. - Actos Normativos Atípicos

a) regimentos das assembleias - 175º a) que estabelecem as normas necessárias à

organização e funcionamento da AR;

b) resoluções - 119,º n.º 1 e) - resoluções da AR, 162º c) e 169º, 4 ; e resoluções do

Conselho de Ministros, artigo 131º, nº1;63

c) normas constitucionais consuetudinárias - costume, convenções constitucionais,

praxes constitucionais, precedentes judicias em matéria constitucional

d) referendo - art. 115º

Direito comunitário na hierarquia das fontes de direito:

A tese hoje dominante é a de que o ordenamento nacional e o ordenamento comunitário,

são autónomos, o que não significa que não haja relações entre eles. A determinação

63 Normalmente são uma forma desses órgãos manifestarem as suas intenções e tomarem decisões, sem que seja necessário adoptar um acto normativo, são obrigatoriamente publicadas no Diário da República.

Page 149: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

149

dessas relações resulta de atribuição de normas constitucionais com as normas

comunitárias, além dos tratados que instituíram a União Europeia (U.E.). Muitas normas

de direito comunitário e em especial os regulamentos constituem direito directamente

aplicável em todas os estados membros, sem necessidade de qualquer acto interno (lei

ou decreto-lei) de transposição. Têm pois validade e eficácia imediatas na ordem

jurídica interna o que corresponde à tese da primazia do direito comunitário.

As directivas comunitárias – são actos normativos que, vinculam os estados membros a

uma resolução de resultado, devendo ser transpostos para o direito interno por lei ou

decreto-lei. Neste caso há um prazo para a transposição e a partir do fim desse prazo

pode ser invocada a aplicabilidade dessa directiva comunitária.

NOÇÃO INCONSTITUCIONALIDADE

Todos os actos normativos devem estar em conformidade com a Constituição, como

prevê o artigo 3º, nº 3, querendo com isto dizer que os actos legislativos e os restantes

actos normativos devem estar subordinados, formal e procedimental e substancialmente

(material) ao parâmetro constitucional.

O parâmetro constitucional, como refere Gomes Canotilho64, assenta em duas posições:

1. o parâmetro constitucional equivale à constituição escrita ou leis com valor

constitucional, dai resultando que a conformidade dos actos normativos só possa

ser aferida, do ponto de vista da constitucionalidade ou inconstitucionalidade,

segundo as normas e princípios escritos da Constituição;

2. o parâmetro constitucional é a ordem constitucional global e dessa forma o juízo

da legitimidade constitucional deve fazer-se não só de acordo com as normas e

princípios escritos das leis constitucionais, mas tendo também presentes

princípios não escritos integrantes da ordem constitucional global( princípios

reclamados pelo espírito ou valores que informam a ordem constitucional

global).

A resposta a esta questão do parâmetro constitucional é dada pela própria Constituição

quando refere que “ só são inconstitucionais as normas que infrinjam as normas e

princípios consignados na Constituição” artigos 3º, nº3 e 277º,nº1. Mas o que se deve

entender por princípios consignados na Constituição? Serão só os princípios escritos ou

também os não escritos? Como diz Gomes Cantilho, em relação a estes últimos só

64 GOMES CANTOTILHO, op. cit., pg 811 e 812

Page 150: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

150

deverão ser considerados os que sejam reconduzíveis a uma densificação ou revelação

específica de princípios constitucionais positivamente plasmados. São exemplos: o pp

da proporcionalidade ou do”uso moderado do poder”, enquanto subprincípio

densificador do princípio do Estado de Direito Democrático e que está implícito em

várias normas constitucionais ( arts. 18º, nº2; 19º; 273º,nº2); o pp da não

rectrocatividade; o pp da protecção da confiança que tb não tem relevo autónomo como

princípio constitucional, mas pode e deve ser incluído no parâmetro constitucional

como princípio concretizante do Estado de Direito. Da mesma forma o pp do não

retrocesso social ou pp da proibição da evolução reaccionária, pois contribui para a

densificação das ns e pps constitucionais referentes aos direitos económicos, sociais e

culturais..

Como se vê só a Constituição pode ser considerada como a norma de referência ou

parâmetro normativo do controlo da constitucionalidade dos actos normativos. Mas,

como refere Cardoso da Costa, é a Constituição no seu todo, quer no que respeita Às

regras de competência e de procedimento legislativo, como aos seus princípios materiais

e valores nela incorporados e que é tomada como padrão do julgamento da

inconstitucionalidade65.

VER PG 813

A inconstitucionalidade é a desconformidade de uma norma ou de um acto praticado

por um órgão de poder político com o texto da Constituição

TIPOS DE INCONSTITUCIONALIDADE:

POR ACÇÃO ou POR OMISSÃO

1) DIRECTA ou INDIRECTA

2) MATERIAL, FORMAL e/ou ÓRGÂNICA

3) TOTAL e PARCIAL

4) ORIGINÁRA e SUPERVENIENTE

65 CARDOSO DA COSTA, J.M., A Justiça Constitucional no quadro das funções do Estado, vista à luz das espécies, conteúdos e efeitos, das decisões sobre a constitucionalidade das normas jurídicas, in VII Conferência dos Tribunais Constitucionais Europeus, 1987, pg 51

Page 151: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

151

INCONSTITUCIONALIDADE POR ACÇÃO e POR OMISSÃO

Há inconstitucionalidade por acção quando a violação resulta de uma actuação de um

órgão do poder

EXEMPLO:

- aprovação de uma Lei que permite o recurso à tortura por agentes de autoridade para

obtenção de confissão de crime, viola activamente o disposto no artigo 25º n.º 2 da

CRP.

Há inconstitucionalidade por omissão quando a desconformidade resulta da não

actuação de um órgão legislativo ou uma actuação insuficiente no desenvolvimento das

normas constitucionais não exequíveis por si próprias.

EXEMPLO:

- A omissão da aprovação de legislação que defina o conceito de dados pessoais para os

efeitos do artigo 35º n.º 2 da CRP, viola a obrigação que a constituição impõe ao

legislador de legislar sobre esta matéria.

INCONSTITUCIONALIDADE POR ACÇÃO – 1) DIRECTA e INDIRECTA

Fala-se em inconstitucionalidade directa quando ela resulta da violação da

Constituição ou dos seus princípios (artigo 277º da CR).

EXEMPLO:

- quando um decreto-lei viola um «Direito Liberdade ou Garantia» previsto num artigo

da Constituição.

Fala-se em inconstitucionalidade indirecta (ou ilegalidade) quando uma norma viola

normas interpostas, ou seja, normas às quais a CRP atribui um valor superior ao da

primeira, à violação da hierarquização constitucional das normas - 280º n.º 2.

EXEMPLO:

- quando um decreto-lei autorizado viola os termos da Lei de Autorização respectiva.

Page 152: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

152

INCONSTITUCIONALIDADE POR ACÇÃO – 2) MATERIAL, FORMAL e

ORGÂNICA

- inconstitucionalidade material ou substancial que ocorre quando resulta da

contradição entre um acto normativo e o conteúdo de uma norma ou princípio

constitucional - quando o mesmo não é "conforme a constituição".

EXEMPLO:

- a aprovação de uma Lei que permite o recurso à tortura por agentes de autoridade para

obtenção de confissão de crime, viola o conteúdo do disposto no artigo 25º n.º 2 da CRP

- inconstitucionalidade formal quando o acto normativo adopta uma forma ou

processo diferente dos constitucionalmente prescritos.

EXEMPLO:

- a aprovação de uma Lei Orgânica por uma maioria inferior à maioria absoluta dos

deputados em efectividade de funções, viola o formalismo imposto no artigo 168º n.º 4

da CRP para a aprovação de normas desta natureza

- inconstitucionalidade orgânica quando o acto normativo provém de um órgão

constitucionalmente incompetente para o efeito

EXEMPLO:

- quando o Governo aprova um Decreto-Lei sobre uma matéria da reserva absoluta da

Assembleia da República (artigo 164º da CRP).

INCONSTITUCIONALIDADE POR ACÇÃO – 3) TOTAL e PARCIAL

A inconstitucionalidade é total se abrange todo o acto normativo.

EXEMPLO:

- quando o Governo aprova um Decreto-Lei autorizado em violação de uma Lei de

Autorização Legislativa, todo o Decreto-Lei é inconstitucional.

Page 153: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

153

A inconstitucionalidade é parcial se abrange apenas parte do acto normativo, algum

ou alguns artigos, ou mesmo um segmento da norma jurídica.

EXEMPLO:

- no caso de aprovação da lei que aprova o novo Código do Trabalho, o Tribunal

Constitucional considerou que apenas alguns dos artigos deste Código violavam a

Constituição e que tal não afectava a validade dos demais artigos do Código, logo,

apenas parte dado acto normativo é inconstitucional.

INC. POR ACÇÃO - 4) ORIGINÁRIA e SUPERVENIENTE

A inconstitucionalidade é originária quando uma norma ordinária contraria uma

norma constitucional que lhe é anterior no tempo.

EXEMPLO:

- quando o acto normativo viola uma norma constitucional que já se encontrava em

vigor à data da sua aprovação.

A inconstitucionalidade é superveniente quando uma norma ordinária, inicialmente

conforme a constituição, passa a ser inconstitucional por entretanto entrar em vigor uma

norma constitucional que a contraria (apenas é relevante no caso de

inconstitucionalidade ser material).

EXEMPLO:

- a aprovação de uma revisão constitucional, vem introduzir na Constituição alterações

que entram em contradição com normas ordinárias em vigor; face à superioridade

hierárquica das normas constitucionais, as normas ordinárias em vigor com a nova

norma constitucional passam a ser inconstitucionais.

TIPOS PROCESSUAIS DE FISCALIZAÇÃO

1) FISCALIZAÇÃO ABSTRACTA ou CONCRETA

A fiscalização abstracta destina-se a verificar da conformidade formal, orgânica e

material de normas jurídicas face à Constituição sem considerar nenhuma situação

real concreta.

Page 154: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

154

A fiscalização concreta destina-se a apreciar da inconstitucionalidade de

determinada norma com pertinência para uma causa concreta colocada perante um

Tribunal.

2) FISCALIZAÇÃO PREVENTIVA ou SUCESSIVA

Diz-se preventivo o processo destinado a verificar da constitucionalidade de

determinados projectos de norma jurídica antes dos mesmos se tornarem num acto

perfeito e definitivo, no caso dos actos legislativos antes de serem promulgados.

Diz-se sucessivo o processo destinado a verificar da constitucionalidade de normas

jurídicas já promulgadas, independentemente de já terem sido publicadas ou de

terem entrado em vigor.

A fiscalização da inconstitucionalidade por acção (artigo 277º C.R.P.) pode ser:

- abstracta preventiva – artigos 278º e 279º da C. R. P.

- abstracta sucessiva – artigos 281º e 282º da C. R. P.

- concreta sucessiva - artigo 280º da C. R. P.

A fiscalização por omissão é sempre abstracta (artigo 283º da C. R. P.)

1) FISCALIZAÇÃO ABSTRACTA PREVENTIVA

1.a) OBJECTO – 278º, n.º 1 e 2 CRP

• normas constantes de Tratados Internacionais antes de ratificados pelo

Presidente da República (n.º 1);

• decretos para promulgação como lei ou decreto-lei pelo Presidente da

República(n.º 1);

• decretos legislativos regionais e decretos regulamentares regionais antes de

assinados pelos Representantes da República (n.º 2).

1.b) LEGITIMIDADE – 278º, n.º 1 e 2 CRP

• Presidente da República no caso dos Tratados e Decretos sujeitos à sua

ratificação e promulgação – 278º n.º 1

Page 155: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

155

• Representantes da República no caso dos decretos legislativos e regulamentares

regionais – 278º n.º 2

• Primeiro Ministro ou de 1/5 dos deputados em efectividade de funções no caso

de se tratarem de decretos para serem promulgados como Leis Orgânicas – 278º

n.º 4

1.c) PROCESSO

• O Presidente da República e os Representantes da República têm 8 dias a contar

da recepção do diploma para requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação

da sua constitucionalidade - 278º n.º 3

• O Primeiro-Ministro ou 1/5 dos deputados em efectividades de funções no prazo

de 8 dias da notificação feita pelo Presidente da Assembleia da República do

envio do decreto ao Presidente da República dos decretos destinados a serem

promulgados como Leis Orgânicas– 278º n.º 5 e 6.

1.d) EFEITOS – 279º

• Se o Tribunal Constitucional não se pronunciar pela inconstitucionalidade, o

Presidente da República ou os Representantes da República deverão promulgar

ou assinar tais decretos, sem embargo de continuarem a poder exercer o

respectivo veto político dentro do prazo legal - artigos 136º n.º 1 e 233º n.º 2

• Se o Tribunal Constitucional se pronunciar pela inconstitucionalidade deve o

Presidente da República ou o Representante da República, não ratificar o

tratado, ou vetar o decreto e devolve-lo ao órgão que o aprovou. – 279º n.º 1

Processo subsequente ao veto por inconstitucionalidade:

• Neste caso o decreto não pode ser promulgado ou assinado sem que o órgão que

o tenha aprovado expurgue a norma julgada inconstitucional, ou no caso das

leis, tratados e decretos legislativos regionais, sem que o mesmo seja confirmado

por maioria de dois terços dos deputados presentes desde que superior à maioria

absoluta, da Assembleia da República ou Assembleia Legislativa Regional

respectivamente. – 279º n.º 2 e 4

Page 156: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

156

• Se o diploma for reformulado pode ser sujeito a nova apreciação da

constitucionalidade – 279º n.º 3.

2) FISCALIZAÇÃO ABSTRACTA SUCESSIVA

2.a) OBJECTO – 281º n.º 1

• Apreciação da constitucionalidade de quaisquer normas jurídicas já promulgadas

ou assinadas;

• Apreciação da ilegalidade resultante da violação de normas de hierarquia

superior por normas de valor inferior – 281, n.º 1, b) c) e d)

2.b) LEGITIMIDADE

• os constantes do n.º 2 do artigo 282º no âmbito das suas competências

• oficiosamente no caso de o Tribunal Constitucional já ter julgado a mesma

norma inconstitucional em 3 casos concretos

2.c) PROCESSO

• O requerimento pode ser efectuado a todo o tempo e a apreciação da

inconstitucionalidade abstracta sucessiva não determinam a suspensão da

vigência ou aplicação da norma, ou sequer a suspensão da sua eventual

publicação caso ainda não se tenha verificado, pois o Tribunal Constitucional

não pode adoptar providências cautelares.

d) EFEITOS: Força obrigatória geral – 281º n.º 1, 2, e 3

• tratando-se de inconstitucionalidade originária, produz efeitos desde a entrada

em vigor da norma declarada inconstitucional, retroactivamente, e determinada a

repristinação das normas por ela revogadas – 282º, n.º 1.

• tratando-se de inconstitucionalidade superveniente, apenas produz efeitos após a

entrada em vigor da norma constitucional ou legal posterior, retroactivamente, e

não produz a repristinação das normas por esta revogadas – 282º n.º 2.

Excepções à força obrigatória geral da declaração de inconstitucionalidade em

fiscalização abstracta sucessiva:

Page 157: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

157

• não há retroactividade dos efeitos quanto a casos julgados, salvo decisão em

contrário do Tribunal Constitucional, quando a norma respeitar a matéria penal,

disciplinar, de mera ordenação social e for de conteúdo menos favorável ao

arguido – 282º n.º 3.

• a retroactividade definida nos números 1 e 2 pode ser restringida quando o

Tribunal Constitucional entender ser justificado por razões de segurança

jurídica, equidade ou interesse público de excepcional relevo – 282º n.º 4.

2. e) Passagem da FISCALIZAÇÃO CONCRETA à FISCALIZAÇÃO ABSTRACTA:

Quanto ao OBJECTO:

• Nos termos do 281º n.º 3, o Tribunal Constitucional também aprecia em

abstracto e com força obrigatória geral as normas que haja julgado

inconstitucionais em três casos de fiscalização concreta.

• O relevante nas 3 situações de fiscalização concreta é a identidade da norma

ordinária julgada inconstitucional e não da norma constitucional violada.

Quanto à LEGITIMIDADE

• A iniciativa é dos próprios juízes do Tribunal Constitucional ou do Ministério

Público – conforme Lei do Tribunal Constitucional

3) FISCALIZAÇÃO CONCRETA SUCESSIVA

3. a) OBJECTO

1 – Apenas no âmbito de decisões dos Tribunais e nunca de qualquer órgão de soberania

– 280º, n.º 1, 2 e 5.

2 – O objecto do recurso é só da constitucionalidade directa ou indirecta (ilegalidade) da

norma e não do mérito da decisão do caso concreto – 280º n.º 6.

3 – Restringe-se às normas aplicáveis a um caso concreto submetido a julgamento em

Tribunal comum - 280º n.º 1, 2 e 5:

� decisões judiciais que recusem aplicar normas com fundamento em

inconstitucionalidade directa ou indirecta (ilegalidade),

Page 158: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

158

� decisões que apliquem norma cuja inconstitucionalidade directa ou indirecta

(ilegalidade) haja sido suscitada durante o processo.

� Decisões que apliquem normas anteriormente julgadas inconstitucionais pelo

próprio Tribunal constitucional – 280º n.º 5.

3. b) LEGITIMIDADE

• a parte que alegou a inconstitucionalidade no caso de aplicação da norma

ordinária – 280º n.º 4 – sendo que esta deverá ter sido suscitada em primeira

instância ou em fase de recurso para os Tribunais comuns superiores, e não

apenas no recurso para o Tribunal Constitucional – 280º n.º 1, b) e 2, d).

• qualquer parte, desde que tenha interesse e legitimidade processual para isso, no

caso de recusa de aplicação com fundamento em inconstitucionalidade – artigo

280 n.º 4 (à contrário).

• o Ministério Público é obrigado a recorrer de recusa de aplicação de norma

constante de convenção internacional, de acto legislativo ou de decreto

regulamentar, e nos casos de aplicação de norma anteriormente julgada

inconstitucional pelo próprio Tribunal constitucional – artigo 280º n.º 3 e 5.

3.c) PROCESSO

• Segue a tramitação prevista no processo dos Tribunais Comuns e do próprio

Tribunal Constitucional.

3.d) EFEITOS

• Faz caso julgado apenas no âmbito do processo judicial em que foi suscitada a

inconstitucionalidade.

• apenas se debruça sobre a constitucionalidade da norma, e não sobre a decisão

da questão concreta em juízo

4) FISCALIZAÇÃO DA INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO

4.a) OBJECTO - 283º n.º 1

Page 159: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

159

São pressupostos da inconstitucionalidade por omissão:

• que o não cumprimento da CRP derive da violação de certa e determinada

norma:

• que se trata de norma constitucional não exequível por si mesma;

• que, nas circunstâncias concretas da pratica legislativa, faltem as medidas

legislativas necessárias para tornar exequível aquela norma.

4.b) LEGITIMIDADE - 283º n.º 1

• o Presidente da República e o Provedor de Justiça, e no caso de "violação dos

direitos da regiões autónomas, os presidentes das assembleias legislativas da

regiões autónomas.

4.c) PROCESSO - 283º n.º 1

• A requerimento a todo o tempo de qualquer das pessoas com legitimidade.

4.d) EFEITOS - 283º n.º 2

• O Tribunal Constitucional dá conhecimento dessa omissão ao órgão legislativo

competente, mas a CRP é omissa quanto à consequência da manutenção da

omissão, após esta comunicação.

Admite-se que seja requerido novo processo de fiscalização por omissão se esta se

mantiver.

REGIME DE REVISÃO DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA

PORTUGUESA

Revisão da Constituição: Competência Assembleia da República (artigo 284, n. 1). Revisão ordinária – cinco anos, sobre a data da última revisão da Constituição. Revisão extraordinária – a qualquer momento a requerimento de quatro quintos dos deputados em exercício em efectividade de funções (artigo 285).

Page 160: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

160

Alterações – (artigo 286, n. 1), maioria de dois terços dos deputados em efectividade de funções. Essas alterações têm que ser reunidas em apenas uma única lei de revisão (artigo 286, n. 2). O Presidente da República não pode recusar a promulgação de leis de revisão (artigo 286, n. 3) Limites matérias da revisão (artigo 288).

1 – INTENCIONALIDADE – Artigos 285º e 287º n.º 1

Art. 285º n.º 1 - A iniciativa pertence aos deputados e não aos grupos parlamentares

nem ao PR..

Art. 285º n.º 2 - Implica a iniciativa de apresentação de um projecto de revisão que

defina expressamente as alterações à CRP pretendidas.

2 – COMPETÊNCIA

Art. 161º a) e 284º - Compete exclusivamente à Assembleia da República

3 – COMPETÊNCIA EM RAZÃO DO TEMPO

Art. 284º n.º 1 - As revisões “ordinárias” apenas podem acontecer 5 anos após a

publicação da última lei de revisão.

Art. 284º n.º 2 – A Assembleia da República pode assumir poderes extraordinários de

revisão, antes deste prazo, por maioria de 4/5 dos deputados em efectividade de funções.

4 – NORMALIDADE CONSTITUCIONAL

Art. 289º + 19º n.º 8 – as revisões apenas podem ocorrer em situações de normalidade

constitucional, e nunca estando declarado o Estado de Sítio ou Estado de emergência.

5 – FORMALISMO DA APROVAÇÃO

Page 161: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

161

Art. 285º n.º 2 – apresentado um projecto, qualquer outro a ser apreciado na mesma

altura deve ser apresentado no prazo de 30 dias.

Art. 286 n.º 1 – é necessária uma maioria de 2/3 dos deputados em efectividade de

funções.

Art. 286º n.º 2 – as alterações aprovadas serão reunidas numa única lei de revisão.

6 – PROMULGAÇÃO

Art. 286º n.º 3 – O Presidente da República não pode recusar a promulgação de uma lei

de revisão, ou seja, não pode exercer o direito de veto.

No entanto:

• cabe ao Presidente da República verificar do cumprimento dos formalismos

necessárias à aprovação de uma Lei Constitucional, caso verifique a falta de

algum desses requisitos deve devolver o projecto à Assembleia da República

para a superação desses vícios;

• não deverá igualmente promulgar a lei constitucional se ela provier de uma

órgão constitucionalmente incompetente;

• Art. 134º g) – há quem defenda ainda a hipótese de requerer a fiscalização

preventiva da fiscalização por parte do Presidente da República.

LIMITES MATERIAIS AO PODER DE REVISÃO:

O artigo 288º da CRP define o ponto de rigidez formal da Constituição da República

Portuguesa:

• Quanto à aos princípios estruturantes do Estado Português - alíneas a) a c), e h) a

o) ;

Page 162: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

162

• Quanto ao Sistema de Direitos e Deveres Fundamentais – alíneas d) e e);

• Quanto à organização económica do Estado – alíneas f) e g)

Resolução de casos de fiscalização de constitucionalidade

NOTAS PARA A RESOLUÇÃO DE CASOS PRÁTICOS DE FISCALIZAÇÃO DA

CONSTITUCIONALIDADE

1º PASSO - Identificação dos TIPOS de INCONSTITUCIONALIDADE

potencialmente presentes no caso concreto apresentado:

1.1) No caso da questão se levantar relativamente a actos normativos a questão a

colocar-se será a da eventual inconstitucionalidades por acção (quando a violação

resulta de uma actuação de um órgão do poder), pois a inconstitucionalidade por

omissão apenas existirá quando a desconformidade resulta da não actuação do órgão

legislativo ou uma actuação insuficiente no desenvolvimento das normas constitucionais

não exequíveis por si próprias.

Devemos ainda caracterizar a inconstitucionalidade quanto aos seguintes critérios:

1.2) Quanto ao vício da norma verificar se é uma:

- inconstitucionalidade material ou substancial, quando resulta da contradição entre

um acto normativo e o conteúdo de uma norma ou princípio constitucional (por

exemplo: artigo 3º n.º 3, artigo 18º da CRP).

- inconstitucionalidade formal quando o acto normativo adopta uma forma ou

processo diferente dos constitucionalmente prescritos (por. exemplo: art. 166º e 168º).

Page 163: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

163

- inconstitucionalidade orgânica quando o acto normativo provém de um órgão

constitucionalmente incompetente para o efeito (violação dos princípios dos artigos

110º n.º 2 e 111º, n.º 1 da CRP)

1.3) Quanto à norma ou princípio violado verificar se é uma:

- inconstitucionalidade directa (quando ela resulta da violação da Constituição ou dos

seus princípios – por exemplo artigo 280º n.º 1 da CRP)

- inconstitucionalidade indirecta (ou ilegalidade) (quando uma norma viola normas

interpostas, ou seja, normas às quais a CRP atribui um valor superior ao da primeira, à

violação da hierarquização constitucional das normas – por exemplo art. 280º n.º 2).

1.4) Quanto à extensão do vício verificar-se-á uma:

- inconstitucionalidade total (se abrange todo o acto normativo)

- inconstitucionalidade parcial (se abrange apenas parte do acto normativo, algum ou

alguns artigos, segmento de artigo).

1. 5) No caso de estarmos perante uma norma já promulgada devemos ainda verificar se

estamos perante uma:

- inconstitucionalidade originária (quando uma norma infra-constitucional contraria

uma norma constitucional que lhe é anterior no tempo)

- inconstitucionalidade superveniente (quando uma norma ordinária, inicialmente

conforme a constituição, passa a ser inconstitucional por, entretanto, entrar em vigor

uma norma constitucional que a contraria quanto à matéria).

2º PASSO - Identificação do PROCESSO de FISCALIZAÇÃO aplicável ao caso

concreto:

2.1) No caso de estarmos perante um acto normativo ainda não promulgado pelo

Presidente da República ou ainda não assinado pelo Representante da República

apenas será possível a FISCALIZAÇÃO ABSTRACTA PREVENTIVA.

2.1.1. OBJECTO

Art. 278º CRP - Fiscalização da constitucionalidade de:

Page 164: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

164

- normas constantes de Tratados Internacionais antes de ratificados pelo Presidente da

República;

- de decretos para promulgação como lei ou decreto-lei, antes de promulgados pelo

Presidente da República;

- de decretos legislativos regionais antes de assinados pelos Representantes da

República.

2.1.2. LEGITIMIDADE

Art. 278º n.º 1- Do Presidente da República no caso dos Tratados e Decretos sujeitos à

sua ratificação e promulgação

Art. 278º n.º 2 - Dos Representantes da República no caso dos decretos legislativos

regionais

Art. 278º n.º 4 - Do Primeiro Ministro ou de 1/5 dos deputados em efectividade de

funções no caso de se tratarem de decretos para serem promulgados como Leis

Orgânicas

2.1.3. PROCESSO

Art. 278º n.º 3 - O Presidente da República e os Representantes da República têm 8 dias

a contar da recepção do diploma para requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação

da sua constitucionalidade.

Art. 278º n.º 5 e 6 – O Primeiro-Ministro ou 1/5 dos deputados em efectividades de

funções devem requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação da constitucionalidade

dos decretos destinados a serem promulgados como Leis Orgânicas no prazo de 8 dias

da notificação feita pelo Presidente da Assembleia da República ao Primeiro Ministro e

aos Grupos Parlamentares do envio do decreto ao Presidente da República.

2.1.4. EFEITOS

136º, n.º 1 e 233º, n.º 2 - No caso de o Tribunal se pronunciar pela constitucionalidade

de decretos sujeitos à sua apreciação preventiva, o Presidente da República ou o

Ministro da República deverão promulgar ou assinar tais decretos, sem embargo de

continuarem a poder exercer o respectivo veto político dentro do prazo legal.

Art. 279º n.º 1 - Se o Tribunal Constitucional se pronunciar pela inconstitucionalidade

de qualquer normas constante de decreto ou tratado que lhe haja sido submetido para

Page 165: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

165

apreciação preventiva, deve o Presidente da República ou o Representante da

República, não ratificar o tratado, ou vetar o decreto e devolve-lo ao órgão que o

aprovou.

Art. 279º n.º 2 e 4 - Neste caso o decreto não pode ser promulgado ou assinado sem que

o órgão que o tenha aprovado expurgue a norma julgada inconstitucional, ou no caso

das leis e tratados, sem que o mesmo seja confirmado por maioria de dois terços dos

deputados presentes desde que superior à maioria absoluta da Assembleia da República.

Art. 279º n.º 3 - Se o diploma for reformulado, pode o presidente da República ou o

Representante da República promulgado ou assinado, ou requerer nova apreciação da

sua constitucionalidade.

2.2) No caso de estarmos perante um acto normativo já promulgado pelo

Presidente da República ou assinado pelo Representante da República,

independentemente de já ter sido publicada ou entrado em vigor, e fora do âmbito

de qualquer processo judicial comum, apenas poderemos estar perante uma

FISCALIZAÇÃO ABSTRACTA SUCESSIVA.

2.2.1. OBJECTO

Art. 281º n.º 1, a) - apreciação da inconstitucionalidade directa de quaisquer normas

jurídicas já promulgadas ou assinadas;

Art. 281, n.º 1, b) c) e d) - Apreciação da inconstitucionalidade indirecta (ilegalidade)

resultante da violação de normas de hierarquia superior por normas de valor inferior

2.2.2. LEGITIMIDADE

Art. 282º, n.º2 - todos os constantes

2.2.3. PROCESSO

O requerimento pode ser efectuado a todo o tempo e até à decisão final do Tribunal

Constitucional, o processo a apreciação da inconstitucionalidade abstracta sucessiva não

determinam a suspensão da vigência ou aplicação da norma, ou sequer a suspensão da

sua eventual publicação caso ainda não se tenha verificado, pois o Tribunal

Constitucional não pode adoptar providências cautelares.

2.2.4. EFEITOS

Page 166: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

166

Art. 282º n.º 1, 2, e 3 - Força obrigatória geral

Art. 282º, n.º 1 - tratando-se de inconstitucionalidade originária, produz efeitos desde a

entrada em vigor da norma declarada inconstitucional, retroactivamente, e determina a

repristinação das normas por ela revogadas

Art. 282º n.º 2 - tratando-se de inconstitucionalidade superveniente, apenas produz

efeitos após a entrada em vigor da norma constitucional ou legal posterior,

retroactivamente, e não produz a repristinação das normas por esta revogadas

Art. 282º n.º 3 - não há retroactividade dos efeitos quanto a casos julgados, salvo

decisão em contrário do Tribunal Constitucional quando a norma respeitar a matéria

penal, disciplinar, de mera ordenação social e for de conteúdo menos favorável ao

arguido.

Art. 282º n.º 4 - a retroactividade definida nos números 1 e 2 pode ser restringida

quando o Tribunal Constitucional entender ser justificado por razões de segurança

jurídica, equidade ou interesse público de excepcional relevo.

2.3) No caso de estarmos perante uma questão de constitucionalidade levantada no

âmbito de um processo judicial comum pendente, estamos perante uma

FISCALIZAÇÃO CONCRETA SUCESSIVA.

2.3.1. OBJECTO

Art. 280º, n.º 1, 2 e 5 – Só há recurso à fiscalização concreta sucessiva directa para o

Tribunal Constitucional no âmbito de decisões dos Tribunais e nunca de qualquer órgão

de soberania.

Art. 280º, n.º 6 – O objecto do recurso é só da constitucionalidade directa ou indirecta

(ilegalidade) da norma e não do mérito da decisão do caso concreto

Art. 280º n.º 1, 2 e 5 – O âmbito da fiscalização concreta restringe-se às normas

aplicadas a um caso concreto submetido a julgamento em Tribunal comum, e logo a

título incidental e desde que com interesse (nexo causalidade) com a questão em juízo.

Art. 280º n.º 5 – Tipos de decisões:

- decisões judiciais que recusem aplicar normas com fundamento em

inconstitucionalidade directa ou indirecta (ilegalidade),

- que apliquem norma cuja inconstitucionalidade directa ou indirecta (ilegalidade) haja

sido suscitada durante o processo.

Page 167: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

167

- que apliquem normas anteriormente julgadas inconstitucionais pelo próprio Tribunal

constitucional.

2.3.2. LEGITIMIDADE

Art. 280º n.º 4 - No caso de aplicação de norma cuja inconstitucionalidade directa ou

indirecta (ilegalidade) haja sido suscitada, só pode recorrer com este fundamento para o

tribunal Constitucional a parte que alegou a inconstitucionalidade

Art 280º n.º 1, b) e 2, d) – sendo que, neste caso, a questão da inconstitucionalidade

deverá ter sido suscitada em primeira instância ou em fase de recurso para os Tribunais

comuns superiores, e não no recurso para o Tribunal Constitucional.

No caso de recusa de aplicação de norma com fundamento em inconstitucionalidade

directa ou indirecta (ilegalidade) qualquer parte pode recorrer para o tribunal

constitucional desde que tenha interesse e legitimidade processual para isso.

Art. 280º n.º 3 e 5 - O Ministério Público é obrigado a recorrer para o Tribunal

Constitucional nos casos de decisão judicial que recuse a aplicação de norma constante

de convenção internacional, de acto legislativo ou de decreto regulamentar, e nos casos

de aplicação de norma anteriormente julgada inconstitucional pelo próprio Tribunal

constitucional.

2.3.3. PROCESSO

A recurso para o Tribunal Constitucional respeita as normas de processo dos Tribunais

Comuns e do próprio Tribunal Constitucional.

2.3.4. EFEITOS

A decisão de inconstitucionalidade de uma norma no âmbito de fiscalização concreta

sucessiva faz caso julgado, quanto a essa inconstitucionalidade, mas apenas no âmbito

do processo em que foi suscitada

Por outro lado, a decisão do Tribunal Constitucional apenas se debruça sobre a

constitucionalidade da norma, e não sobre a decisão da questão concreta em juízo. Logo

a decisão do Tribunal Constitucional não substitui a decisão do Tribunal recorrido, ou

sequer a anula, apenas ordenando que o mesmo profira nova decisão em conformidade

com o julgamento de constitucionalidade das normas aplicadas.

Em caso de decisão de inconstitucionalidade de norma aplicada pelo Tribunal, ou de

conformidade de norma não aplicada pelo Tribunal com fundamento em

Page 168: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

168

inconstitucionalidade, os autos baixarão ao tribunal de onde provieram a fim de este,

consoante o caso, reforme a decisão ou a mande reformar em conformidade com a o

julgamento da questão de inconstitucionalidade.

2.4.) No caso de estarmos perante uma norma julgada inconstitucional por 3 vezes

em sede de fiscalização concreta pode igualmente haver lugar à FISCALIZAÇÃO

ABSTRACTA SUCESSIVA:

2.4.1.) Quanto ao OBJECTO:

Nos termos do 281º n.º 3, o Tribunal Constitucional também aprecia em abstracto e com

força obrigatória geral as normas que haja julgado inconstitucionais em três casos de

fiscalização concreta.

O relevante nas 3 situações de fiscalização concreta é a identidade da norma julgada

inconstitucional e não do fundamento da inconstitucionalidade.

2.4.2) Quanto à LEGITIMIDADE

A iniciativa é dos próprios juízes do Tribunal Constitucional ou do Ministério Público

(Lei do Tribunal Constitucional).

2.4.3) No mais aplicam-se as regras gerais da fiscalização abstracta sucessiva (ver ponto

2.2.)

2.5) O facto de estar a decorrer uma fiscalização concreta sucessiva da

constitucionalidade não impede que as pessoas com legitimidade para o efeito

requeiram a fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade da mesma

norma. Nem o facto de estar a decorrer uma fiscalização abstracta sucessiva de

determinada norma, ou existir uma decisão de conformidade do Tribunal

Constitucional sobre essa norma, não impede que no âmbito de um processo

pendente nos tribunais comuns se requeira a fiscalização concreta sucessiva da

constitucionalidade.

Page 169: Sebenta Ciencia Politica e Direito Constitucional

169

2.6) Finalmente, no caso de estarmos perante a omissão de aprovação de legislação

necessária à exequibilidade de norma constitucional estaremos perante uma

FISCALIZAÇÃO DA INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO:

2.6.1. OBJECTO

Art. 283º n.º 1 - São pressupostos da inconstitucionalidade por omissão:

a) que o não cumprimento da CRP derive da violação de certa e determinada norma;

b) que se trata de norma constitucional não exequível por si mesma;

c) que, nas circunstâncias concretas da pratica legislativa, faltem as medidas legislativas

necessárias para tornar exequível aquela norma.

2.6.2. LEGITIMIDADE

283º n.º 1 - em geral cabe ao Presidente da República e ao Provedor de Justiça; no caso

de "violação dos direitos da regiões autónomas cabe aos presidentes das assembleias

legislativas da regiões autónomas.

2.6.3. PROCESSO

Art. 283º n.º 1 - a requerimento a todo o tempo de qualquer das pessoas com

legitimidade.

2.6.4. EFEITOS

Art. 283º n.º 2 - o Tribunal Constitucional dá dessa omissão conhecimento ao órgão

legislativo competente, mas a CRP é omissa quanto à consequência da manutenção da

omissão, após esta comunicação.

Admite-se que seja requerido novo processo de fiscalização por omissão se esta se

mantiver.