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42 Secupema, incluindo poças laterais, poças temporárias, ambientes inundados pela barragem e vegetação adjacente. A trilha estende-se da cultura de cana até a Barragem de Secupema; Trilhas C, D e E – Margem leste do riacho formado pela Barragem de Gurjaú e entorno da mata a oeste da Barragem de Gurjaú; Trilha F - Area de lavoura e cultivo de frutas nas proximidades da Trilha A; Trilha G - Trilha na Mata da Porteira Preta; Trilha H - Trilha na Mata do Sítio do Pica-Pau, passando pela Barragem de Secupema, dirigindo-se para oeste até a cultura de cana; Trilha I - Trilha na Mata do Bonde; Trilha J - Trilha na Mata do Enxofre (alcançada com auxílio de bote); Trilha K - Arredores dos tanques de decantação e alojamento, junto à sede da COMPESA. Com vistas a complementar os dados gerados por procura ativa, registraram-se também os exemplares eventualmente capturados em 39 armadilhas tipo pitfall montadas pela Equipe de Répteis, sendo cada armadilha composta por quatro baldes (Heyer et al. 1994). Ao longo dos meses de Agosto a Abril, 30 armadilhas foram mantidas abertas na mata adjacente à trilha principal que conecta a Barragem de Gurjaú à Barragem de Secupema (Trilha I), sendo conferidas a cada três dias. Entre os meses de Novembro a Abril, nove armadilhas adicionais foram colocadas na Mata do Enxofre (Trilha J), seguindo-se a mesma metodologia. PROCEDIMENTOS DE BUSCA ATIVA Durante todos os dias de visita à Reserva, foi efetuada uma saída a campo no período noturno para busca ativa de indivíduos. Saídas a campo também foram executadas durante o dia, para coleta de indivíduos com atividade diurna, coleta de larvas e desovas. A cada saída noturna percorreu-se ao menos uma das trilhas selecionadas para amostragem. Indivíduos adultos foram localizados visualmente, com o auxílio de lanternas, ou através de suas vocalizações. O tempo de

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Secupema, incluindo poças laterais, poças temporárias, ambientes

inundados pela barragem e vegetação adjacente. A trilha estende-se da

cultura de cana até a Barragem de Secupema;

Trilhas C, D e E – Margem leste do riacho formado pela Barragem de

Gurjaú e entorno da mata a oeste da Barragem de Gurjaú;

Trilha F - Area de lavoura e cultivo de frutas nas proximidades da Trilha

A;

Trilha G - Trilha na Mata da Porteira Preta;

Trilha H - Trilha na Mata do Sítio do Pica-Pau, passando pela Barragem

de Secupema, dirigindo-se para oeste até a cultura de cana;

Trilha I - Trilha na Mata do Bonde;

Trilha J - Trilha na Mata do Enxofre (alcançada com auxílio de bote);

Trilha K - Arredores dos tanques de decantação e alojamento, junto à

sede da COMPESA.

Com vistas a complementar os dados gerados por procura ativa,

registraram-se também os exemplares eventualmente capturados em 39

armadilhas tipo pitfall montadas pela Equipe de Répteis, sendo cada armadilha

composta por quatro baldes (Heyer et al. 1994). Ao longo dos meses de Agosto

a Abril, 30 armadilhas foram mantidas abertas na mata adjacente à trilha

principal que conecta a Barragem de Gurjaú à Barragem de Secupema (Trilha

I), sendo conferidas a cada três dias. Entre os meses de Novembro a Abril,

nove armadilhas adicionais foram colocadas na Mata do Enxofre (Trilha J),

seguindo-se a mesma metodologia.

PROCEDIMENTOS DE BUSCA ATIVA

Durante todos os dias de visita à Reserva, foi efetuada uma saída a campo no

período noturno para busca ativa de indivíduos. Saídas a campo também foram

executadas durante o dia, para coleta de indivíduos com atividade diurna,

coleta de larvas e desovas.

A cada saída noturna percorreu-se ao menos uma das trilhas selecionadas

para amostragem. Indivíduos adultos foram localizados visualmente, com o

auxílio de lanternas, ou através de suas vocalizações. O tempo de

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permanência na trilha variou conforme o número de indivíduos presentes,

oscilando entre duas e quatro horas. Saídas diurnas também oscilaram em

duração, variando de meia hora a cinco horas.

Para cada saída de campo foi preenchida uma ficha (Anexo I), em que se

anotaram dados a respeito da data de coleta, equipe de trabalho, horário de

início dos trabalhos de campo, horário de término dos trabalhos de campo,

temperatura, condições do tempo, espécies encontradas, número de indivíduos

avistados para cada espécie, ambiente utilizado por cada espécie (mata,

reservatório, poça temporária, água corrente, etc.), e micro-ambiente utilizado

(folhas sobre poça, galhos de árvores, chão da mata, etc.).

Representantes adultos das espécies encontradas foram manualmente

coletados e posteriormente sacrificados e preservados em meio líquido, de

modo a constituirem testemunhos da identificação taxonômica. Girinos também

foram coletados com auxílio de peneiras durante excursões diurnas, e

mantidos em lotes individuais.

LEVANTAMENTO QUANTITATIVO

Com vistas a permitir uma comparação quantitativa a respeito da freqüência de

encontro das diferentes espécies de anfíbios da Reserva de Gurjaú,

compilaram-se todos os registros visuais efetuados nas trilhas A, B, C, D, E, e

H, bem como nas áreas das trilhas G, I, e J onde a borda da mata se aproxima

da água da barragem, totalizando 20 noites de observação. O levantamento

quantitativo se restringiu às áreas acima mencionadas uma vez que as

mesmas se assemelham quanto aos micro-ambientes que apresentam, sendo

aparentemente ocupadas pelo mesmo conjunto de espécies. De modo a

manter a amostragem uniforme, os dados compilados para fins de análise

quantitativa foram coletados por dois componentes da equipe (G. Moura e M.

Silva). Visando a uniformizar os dados, o número de indivíduos observados por

espécie foi dividido pelo número total de homens-hora de amostragem efetuado

na noite do registro. Para fins de comparação, os resultados foram plotados por

espécie.

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15%

46%

35%

4%

Bufonidae

Hylidae

Leptodactylidae

Ranidae

PROCEDIMENTOS EM LABORATÓRIO

Os exemplares coletados para fins de identificação foram trasportados em

sacos plásticos para o alojamento. Antes de serem sacrificados, os indivíduos

foram fotografados e observados quanto à sua coloração em vida. Seguindo

recomendações e metodologias discutidas na literatura (Heyer et al. 1994), os

indivíduos foram anestesiados em solução de clorobutanona ou etanol e

fixados em solução de formaldeído a 10%. Após uma semana de fixação, todas

as carcaças foram transferidas para solução de etanol a 70%. Girinos

coletados em estágios iniciais de desenvolvimento foram mantidos em

aquários, para que se desenvolvessem, permitindo assim sua identificação.

Girinos em estágios mais avançados tiveram seu padrão de colorido descrito e

foram fixados e mantidos em solução de formaldeído a 5% (Heyer et al. 1994).

Os exemplares coletados foram adicionados à Coleção Herpetológica do

Laboratório de Vertebrados da Universidade Federal de Pernambuco.

Resultados

Componentes da Biodiversidade

Vinte e seis (26) espécies de anfíbios, todas pertencentes à Ordem Anura,

foram registradas em Gurjaú. Quatro famílias encontram-se representadas na

Reserva, a saber: Bufonidae (04 espécies), Hylidae (12 espécies),

Leptodactylidae (09 espécies) e Ranidae (01 espécie) (Tabela I, Figura 4).

Figura 4 -

Representatividade das famílias de Anuros na Reserva de Gurjaú.

A acumulação de registros de espécies não se deu de forma homogênea ao

longo dos trabalhos de levantamento. Vinte anfíbios foram registrados durante

a primeira metade dos trabalhos de campo (de Agosto a Novembro de 2002),

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8 M

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30M

ar.

20 A

br.

27 A

br.

enquanto seis táxons adicionais foram registrados entre Dezembro de 2002 e

Abril de 2003 (Figura 5).

Figura 5 - Total acumulado do número de espécies de anfíbios registradas na Reserva de Gurjaú entre os meses de Agosto de 2002 e Abril de 2003.

Tabela 6 - Lista dos anfíbios anuros da Reserva de Gurjaú. Nomes populares, quando existentes, são fornecidos na coluna à direita.

ORDEM ANURA

Família Bufonidae

Bufo crucifer Wied-Neuwied, 1821 “sapo cururu”

Bufo granulosus Spix, 1824 “cururuzinho”

Bufo jimi Stevaux, 2002 “sapo cururu grande”, “sapo boi”

Frostius pernambucensis (Bokermann, 1962)

Família Hylidae

Hyla albomarginata Spix, 1824 “perereca verde”

Hyla atlantica Caramaschi and Velosa, 1996

Hyla branneri Cochran, 1948 “pererequinha amarela”

Hyla decipiens Lutz, 1925

Hyla aff. nana Boulenger, 1889

Hyla raniceps (Cope, 1862) “rã”

Hyla semilineata Spix, 1824 “rã de listra”

Phyllodytes luteolus (Wied-Neuwied, 1824) “sapinho amarelo”

Phyllomedusa hypochondrialis (Daudin,

1800)

Scinax auratus (Wied-Neuwied, 1821)

Scinax nebulosus (Spix, 1824)

Scinax x-signatus (Spix, 1824) “perereca de banheiro”, “raspa côco”

Família Leptodactylidae

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Adenomera cf. marmorata Steindachner,

1867

Eleutherodactylus sp. “sapinho da mata”

Leptodactylus labyrinthicus (Spix, 1824) “gia pimenta”, “rã pimenta”, “gia boi”

Leptodactylus natalensis Lutz, 1930 “caçote marrom”, “caçote”

Leptodactylus ocellatus (Linnaeus, 1758) “rã manteiga”

Leptodactylus troglodytes Lutz, 1926 “caçote da barreira”

Physalaemus cuvieri Fitzinger, 1826 “sapinho do oi”, “foi-não-foi”

Proceratophrys boiei (Wied-Neuwied, 1824) “sapo boi”, “sapo de chifre”

Pseudopaludicola sp.

Família Ranidae

Rana palmipes Spix, 1824 “caçote verde”, “caçote”

DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL

Os anfíbios de Gurjaú diferiram no tocante à utilização do espaço físico da

Reserva (Tabela 7).

Tabela 7 - Sítios de encontro das espécies de anuros da Reserva de Gurjau.

Espécie Entorno da

Represa

Interior da

Mata

Adenomera cf. marmorata X X

Bufo crucifer X X

Bufo granulosus X X

Bufo jmi X

Eleutherodactylus sp. X X

Frostius pernambucensis X

Hyla atlantica X

Hyla albomarginata X

Hyla branneri X

Hyla decipiens X

Hyla aff. nana X

Hyla raniceps X

Hyla semilineata X X

Leptodactylus labyrinthicus X X

Leptodactlys natalensis X

Leptodactylus ocellatus X

Leptodactlus troglodytes X

Phyllodytes luteolus X

Phyllomedusa hypochondrialis X

Physalaemus cuvieri X X

Proceratophrys boiei X

Pseudopaludicola sp. X

Rana palmipes X X

Scinax auratus X

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Scinax nebulosus X

Scinax x-signatus X

A maioria das espécies (58% do total) foi encontrada nas proximidades da

água represada pelas barragens da COMPESA. São elas: Bufo jimi, Frostius

pernambucensis, Hyla atlantica, H. albomarginata (Figura 6), H. branneri, H.

decipiens, H. aff. nana, H. raniceps, Leptodactylus natalensis, L. ocellatus,

Phyllomedusa hypochondrialis, Pseudopaludicola sp., Scinax auratus, S.

nebulosus e S. x-signatus. A existência de discos adesivos nos dedos das

espécies pertencentes à família Hylidae (H. atlantica, H. albomarginata, H.

branneri, H. decipiens, H. aff. nana, H. raniceps, P. hypochondrialis, S. auratus,

S. nebulosus e S. x-signatus) permitem às mesmas ocupar a vegetação semi-

aquática, arbustiva, ou arbórea junto à água. Já as espécies pertecentes às

famílias Bufonidae e Leptodactylidae (como B. jimi, L. natalensis, L. ocellatus e

Pseudopaludicola sp., por exemplo), desprovidas de discos adesivos, se

restringem ao chão das trilhas, matas, e áreas alagadas no entorno da represa.

Figura 6 - Hyla albomarginata, Gurjau, janeiro de 2003.

Oito espécies (31% do total) foram registradas tanto nas imediações da

represa, quanto no interior da mata. São elas: Adenomera cf. marmorata, Bufo

crucifer, B. granulosus, Eleutherodactylus sp., Hyla semilineata, Leptodactlys

labyrinthicus, Physalaemus cuvieri e Rana palmipes. Dentre essas,

Eleutherodactylus sp. e H. semilineata são capazes de utilizar a vegetação

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local como abrigo e área de vocalização. As demais se limitam a ocupar o chão

da mata.

Três espécies – Leptodactylus troglodytes, Phylodytes luteolus e

Proceratophrys boiei (Figura 7) – foram registradas exclusivamente em áreas

de mata. Novamente se observaram diferenças no tocante ao micro-habitat

utilizado pelas espécies: enquanto P. luteolus foi capaz de utilizar a vegetação

local como sítio de abrigo, os leptodactylideos L. troglodytes e P. boiei se

restringiram ao chão da mata, tendo sido capturados em armadilhas do tipo

pitfall.

Figura 7 - Proceratophrys boiei (Fotografia de S.A. Roda).

SÍTIOS DE VOCALIZAÇÃO E SÍTIOS REPRODUTIVOS

Através da observação de desovas, girinos, e atividades de vocalização, foi

possível registrar os ambientes utilizados para fins reprodutivos por 18 das 26

espécies locais (Tabela 8). Oito espécies – Hyla atlantica (Figura 7), H.

albomarginata, H. semilineata, H. raniceps, Phyllomedusa hypochondrialis,

Scinax auratus, S. nebulosus e S. x-signatus – vocalizaram sobre vegetação

arbustiva ou arbórea próxima à represa. Três espécies – H. branneri, Hyla aff.

nana (Figura 8) e Hyla decipiens – vocalizaram unicamente sobre as

gramíneas parcialmente submersas pela água da represa e/ou sobre a

vegetação subaquática.

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Figura 8 - Hyla atlântica Gurjaú, janeiro de 2003.

No tocante às espécies de chão, quatro espécies – Bufo jimi, Leptodactylus

labyrinthicus, Pseudopaludicola sp. e Rana palmipes – utilizaram as margens

da represa como sítio de vocalização. Pseudopaludicola sp. diferenciou-se das

demais por vocalizar unicamente em áreas encharcadas e elameadas,

geralmente por entre gramíneas parcialmente inundadas.

Figura 9 - Hyla aff. nana Gurjaú, janeiro de 2003.

Hyla semilineata e Rana palmipes foram capazes de utilizar, como sítio de

desova, a água corrente por entre as rochas abaixo da Barragem de Gurjaú.

Pseudopaludicola sp. e Scinax x-signatus também utilizaram este ambiente

como sítio de vocalização.

Leptodactylus natalensis e Physalaemus cuvieri destacaram-se das demais

espécies da Reserva por reproduzirem-se em poças temporárias, às vezes

utilizando ambientes aquáticos de curta duração. Em várias ocasiões,

indivíduos reprodutivamente ativos foram encontrados na água acumulada em

depressões rasas formadas pelos pneus dos carros que circulavam nas trilhas

A e B.

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As atividades de vocalização de Eleutherodactylus sp. Diferenciaram-se das

demais por ocorrerem na borda e no interior da mata, muitas vezes em locais

afastados da água.

No tocante à utilização de diferentes tipos de corpos d’água como sítio de

reprodução, observamos que o entorno da represa foi a área em que se

registrou o maior número de espécies com atividade de vocalização, desovas

e/ou girinos (14 táxons). Todavia, poças temporárias e áreas de gramíneas

inundadas não diferiram muito quanto ao número de anfíbios aí registrados,

tendo sido utilizadas por 11 e 10 espécies, respectivamente (Tabela 8).

Tabela 8 - Sítios de vocalização, desova, e/ou desenvolvimento de girinos pelas espécies de anuros da Reserva de Gurjau.

Espécie RepresaPoças

Temporárias AlagadosÁgua

Corrente MataBufo jmi X

Eleutherodactylus sp. X

Hyla albomarginata X X X

Hyla atlantica X X X

Hyla branneri X X X

Hyla decipiens X X

Hyla aff. nana X

Hyla raniceps X

Hyla semilineata X X X

Leptodactyluslabyrinthicus

X X X

Leptodactlys natalensis X

Phyllomedusahypochondrialis

X X X

Physalaemus cuvieri X

Pseudopaludicola sp. X X X

Rana palmipes X X X

Scinax auratus X X X

Scinax nebulosus X X X

Scinax x-signatus X X

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TOLERÂNCIA À AÇÃO HUMANA

As espécies de anuros da Reserva de Gurjaú diferiram no que diz respeito ao

grau de tolerância a modificações ambientais causadas pelo Homem (Tabela

9). Indivíduos de Adenomera cf. marmorata, Bufo crucifer, B. jimi,

Eleutherodactylus sp., Hyla semilineata, Phyllodytes luteolus, Rana palmipes e

Scinax x-signatus foram registrados em locais onde a vegetação local

encontra-se em contato com, ou é parcialmente substituída por, áreas de

cultivo e lavoura. Representantes de Bufo granulous, B. jimi, Leptodactlylus

labyrinthicus e S. x-signatus foram encontrados em imediações de construções

humanas, tal como a sede da COMPESA. Nenhuma das demais 16 espécies

(i.e., 62% do total) foi registrada em áreas intensamente modificadas por ação

humana.

Tabela 9 - Ocorrência das espécies de anfíbios em ambientes modificados pelo Homem.

EspéciesÁreas de Cultivo e

LavouraImediações de Construções

Adenomera cf. marmorata X - Bufo crucifer X - Bufo granulosus - X Bufo jmi X X Eleutherodactylus sp. X - Frostius pernambucensis - - Hyla atlantica - - Hyla albomarginata - - Hyla branneri - - Hyla decipiens - - Hyla aff. nana - - Hyla raniceps - - Hyla semilineata X - Leptodactylus labyrinthicus - X Leptodactlys natalensis - - Leptodactylus ocellatus - - Leptodactlus troglodytes - - Phyllodytes luteolus X - Phyllomedusahypochondrialis

- -

Physalaemus cuvieri - - Proceratophrys boiei - - Pseudopaludicola sp. - - Rana palmipes X - Scinax auratus - - Scinax nebulosus - -

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Scinax x-signatus X X

DADOS QUANTITATIVOS

Dezoito espécies foram registradas visualmente durante os levantamentos

quantitativos: Bufo crucifer, B. granulosus, B. jimi, Eleutherodactylus sp.,

Frostius pernambucensis, Hyla albomarginata, H. atlantica, H. branneri, H.

raniceps, H. semilineata, Leptodactylus labyrinthicus, L. natalensis, L. ocellatus,

Phyllomedusa hypochondrialis, Physalaemus cuvieri, Rana palmipes, Scinax

auratus e S. x-signatus.

O número de indivíduos avistados variou entre táxons (Figura 9). Hyla

semilineata e Rana palmipes foram as espécies registradas com mais

freqüência, sendo encontradas em relativa abundância. Enquanto as

observações de indivíduos de H. semilineata deram-se de forma homogênea

ao longo dos trabalhos de campo, um maior número de indivíduos de R.

palmipes foi registrado nos primeiros meses de amostragem do que nos meses

seguintes.

Bufo jimi, Eleutherodactylus sp. e Leptodactylus labyrinthicus apresentaram

razoável número de registros visuais, sendo encontrados na maioria dos

meses. Uma das noites de levantamento (7 de Dezembro) apresentou

condições apropriadas à reprodução de B. jimi, acarretando em um grande

número de encontros de indivíduos da espécie, todos em atividade reprodutiva.

Bufo crucifer, Hyla albomarginata, H. atlantica, H. branneri, Leptodactylus

natalensis e Physalaemus cuvieri foram avistados em menores números,

porém ao menos em três ocasiões. Bufo granulosus, Frostius pernambucensis,

Hyla raniceps, Leptodactylus ocellatus, Phyllomedusa hypochondrialis, Scinax

auratus e S. x-signatus apresentaram as mais reduzidas taxas de encontros

visuais, sendo avistadas uma ou duas vezes dentre as 20 noites de

amostragem.

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Bufo crucifer

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Bufo granulosus

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07Set

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20Abr

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26Abr

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Frostius pernambucensis

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Hyla albomarginata

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Hyla branneri

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Hyla atlantica

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Hyla raniceps

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Hyla semilineata

012345678

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2Fev

.

9 Fev

.

16 F

ev.

23 F

ev.

8 M

ar.

23 M

ar.

30 M

ar.

13 A

br.

20 A

br.

26 A

br.

Bufo jimi

012345678

10Ago

.

11Ago

.

07 S

et.

07 S

et.

15 S

et.

2 Nov.

25 N

ov.

6 Dez.

7 Dez.

21Dez

.

2 Fev

.

9 Fev

.

16 F

ev.

23 F

ev.

8M

ar.

23 M

ar.

30 M

ar.

13 A

br.

20 A

br.

26 A

br.

Eleutherodactylus sp.

012345678

10 A

go.

11 A

go.

07 S

et.

07 S

et.

15 S

et.

2Nov.

25Nov

.

6 Dez.

7Dez.

21 D

ez.

2Fev

.

9Fev

.

16 F

ev.

23 F

ev.

8 M

ar.

23 M

ar.

30 M

ar.

13 A

br.

20 A

br.

26 A

br.

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54

Figura 9 - Número de indivíduos avistados por horas.homem de amostragem para cada espécie de anfíbio em trilhas da Reserva de Gurjaú (detalhes em Metodologia).

AMOSTRAGEM EM PITFALL

Um pequeno número de indivíduos foi capturado em armadilhas do tipo pitfall

(Tabela10).

Leptodactylus labyrinthicus

012345678

10 A

go.

11 A

go.

07 S

et.

07 S

et.

15 S

et.

2 Nov.

25 N

ov.

6 Dez.

7 Dez.

21 D

ez.

2Fev

.

9Fev

.

16 F

ev.

23 F

ev.

8M

ar.

23M

ar.

30M

ar.

13Abr

.

20Abr

.

26 A

br.

Leptodactylus natalensis

012345678

10Ago

.

11Ago

.

07Set

.

07Set

.

15Set

.

2Nov.

25 N

ov.

6 Dez.

7 Dez.

21Dez

.

2Fev

.

9Fev

.

16Fev

.

23Fev

.

8 M

ar.

23M

ar.

30 M

ar.

13 A

br.

20 A

br.

26Abr

.

Leptodactylus ocellatus

012345678

10Ago

.

11Ago

.

07 S

et.

07 S

et.

15 S

et.

2 Nov.

25Nov

.

6 Dez.

7 Dez.

21 D

ez.

2 Fev

.

9Fev

.

16Fev

.

23Fev

.

8M

ar.

23 M

ar.

30 M

ar.

13Abr

.

20Abr

.

26Abr

.

Phyllomedusa hypochondrialis

012345678

10 A

go.

11Ago

.

07Set

.

07Set

.

15Set

.

2Nov.

25 N

ov.

6 Dez.

7 Dez.

21 D

ez.

2Fev

.

9Fev

.

16Fev

.

23Fev

.

8M

ar.

23M

ar.

30 M

ar.

13 A

br.

20Abr

.

26Abr

.

Physalaemus cuvieri

012345678

10Ago

.

11Ago

.

07Set

.

07 S

et.

15 S

et.

2Nov.

25 N

ov.

6 Dez.

7Dez.

21Dez

.

2 Fev

.

9 Fev

.

16 F

ev.

23Fev

.

8M

ar.

23 M

ar.

30 M

ar.

13 A

br.

20 A

br.

26 A

br.

Rana palmipes

012345678

10 A

go.

11 A

go.

07 S

et.

07 S

et.

15Set

.

2Nov.

25 N

ov.

6 Dez.

7Dez.

21 D

ez.

2Fev

.

9Fev

.

16Fev

.

23 F

ev.

8M

ar.

23M

ar.

30 M

ar.

13 A

br.

20 A

br.

26Abr

.

Scinax x-signatus

012345678

10Ago

.

11 A

go.

07 S

et.

07Set

.

15Set

.

2 Nov.

25 N

ov.

6 Dez.

7 Dez.

21Dez

.

2 Fev

.

9 Fev

.

16Fev

.

23Fev

.

8 M

ar.

23 M

ar.

30 M

ar.

13Abr

.

20 A

br.

26 A

br.

Scinax auratus

012345678

10 A

go.

11 A

go.

07 S

et.

07 S

et.

15 S

et.

2Nov.

25 N

ov.

6 Dez.

7 Dez.

21 D

ez.

2Fev

.

9Fev

.

16Fev

.

23 F

ev.

8 M

ar.

23 M

ar.

30 M

ar.

13 A

br.

20Abr

.

26 A

br.

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55

Tabela 10 - Número de indivíduos capturados em 30 armadilhas na Trilha I (Agosto de 2002 a

Abril de 2003) e em 9 armadilhas na Trilha J (Novembro de 2002 a Abril de 2003).

Espécie Número de Indivíduos

Trilha I

Número de Indivíduos

Trilha J Adenomera cf. marmorata 3 -

Bufo crucifer 5 -

Bufo granulosus 1 -

Bufo jmi - -

Eleutherodactylus sp. 3 -

Frostius pernambucensis - -

Hyla atlantica - -

Hyla albomarginata - -

Hyla branneri - -

Hyla decipiens - -

Hyla aff. nana - -

Hyla raniceps - -

Hyla semilineata 3 1

Leptodactylus labyrinthicus - -

Leptodactlys natalensis - -

Leptodactylus ocellatus - -

Leptodactlus troglodytes 3 -

Phyllodytes luteolus - -

Phyllomedusa hypochondrialis - -

Physalaemus cuvieri 5 -

Proceratophrys boiei - 5

Pseudopaludicola sp. - -

Rana palmipes 1 -

Scinax auratus - -

Scinax nebulosus - -

Scinax x-signatus - -

Dentre as 26 espécies registradas na Reserva, apenas nove (35% do número

total) foram capturadas em pitfall. São elas: Adenomera cf. marmorata, Bufo

crucifer, B. granulosus, Eleutherodactylus sp., Hyla semilineata, Leptodactylus

troglodytes, Physalaemus cuvieri, Proceratophrys boiei e Rana palmipes. O

número de indivíduos coletados oscilou ligeiramente entre as espécies,

pertencendo todos à mesma ordem de grandeza e variando entre 1 e 6.

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56

DISCUSSÃO

A Classe Amphibia é composta por três ordens: Anura (incluindo os sapos, rãs

e pererecas), Caudata (salamandras) e Gymnophiona (cecílias) (Stebbins e

Cohen 1997). Os levantamentos da Reserva de Gurjaú registraram apenas a

ocorrência de anuros. Tal ausência de representantes das ordens Caudata e

Gymnophiona não surpreende. No que se refere à Ordem Caudata, apenas

uma espécie ocorre no Brasil. Trata-se de Bolitoglossa altamazonica (Cope),

cuja distribuição no território nacional é restrita à Amazônia (Frost 2002). No

que se refere à Ordem Gymnophiona, o número de representantes no país

também é baixo quando comparado ao número de anuros (Duellman 1999).

Adicionalmente, o hábito fossorial das cecílias torna sua amostragem difícil. A

maior parte dos registros para este grupo é feita graças a encontros casuais,

geralmente após fortes chuvas (Heyer et al. 1994). Dado que os trabalhos de

levantamento biológico em Gurjaú foram executados em meses de pouca

pluviosidade, não é de se estranhar a ausência de representantes dessa

Ordem nas amostragens.

No tocante aos anuros registrados em Gurjaú, nota-se a grande

representatividade das Famílias Hylidae e Leptodactylidae – as quais

corresponderam, respectivamente, a 46% e 35% das espécies amostradas

(Figura 4). Uma vez que essas constituem as famílias mais ricas em espécies

na região Neotropical (Duellman e Trueb 1994), não causa surpresa que o

mesmo padrão seja observado a nível local.

No que se refere a questões taxonômicas, 21 anfíbios anuros de Gurjaú

puderam ser identificados ao nível de espécie. Todavia, somente através de

uma ampla revisão das espécies brasileiras dos gêneros Adenomera,

Eleutherodactylus e Pseudopaludicola, incluindo exemplares provenientes de

outras regiões do país, será possível esclarecer a taxonomia dos exemplares

de Adenomera cf. marmorata, Eleutherodactylus sp. e Pseudopaludicola sp.

coletados na Reserva. Esses três gêneros de leptodactilídeos são notoriamente

conhecidos por sua complexidade taxonômica e pelo número de questões

ainda pendentes no que se refere à sua sistemática. Hyla aff. nana também

merece especial atenção, podendo tratar-se de uma espécie ainda não

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57

descrita. De modo a confirmar a sua identificação, será necessário coletar uma

série maior de exemplares em Gurjaú, comparando-a a espécimes de H. nana

obtidos em diversas áreas do país e fora dele. Atualmente, H. nana é tida como

espécie amplamente distribuída na América do Sul, existindo registros do

Nordeste do Brasil ao Paraguai, incluindo o norte da Argentina, leste da Bolívia,

Uruguai e Bacia do Prata (Frost 2002). É provável que uma revisão desses

exemplares revele que os mesmos representem um conjunto de espécies

distintas, fazendo de H. nana um complexo de espécies.

A anurofauna de Gurjaú contém elementos e representantes de diversos

ecossistemas brasileiros. Onze espécies encontradas em Gurjaú (ou seja, 42%

do total) são endêmicas da Mata Atlântica. Trata-se de Adenomera cf.

marmorata, Bufo crucifer, Eleutherodactylus sp, Frostius pernambucensis, Hyla

atlantica, H. branneri, H. decipiens, H. semilineata, Phyllodytes luteolus,

Proceratophrys boiei e Scinax auratus. Cinco táxons ocorrem na Mata

Atlântica, Cerrado e Caatinga: Bufo jimi, Leptodactylus labyrinthicus, L.

natalensis, L. troglodytes e Physalaemus cuvieri. Cinco espécies são

encontradas na Mata Atlântica, Amazônia/Guianas, Cerrado e Caatinga: Bufo

granulosus, Hyla raniceps, Leptodactylus ocellatus, Phyllomedusa

hypochondrialis e Scinax x-signatus. Três espécies ocorrem na Mata Atlântica

e Amazônia - Hyla albomarginata, Scinax nebulosus e Rana palmipes

(Duellman 1999). Nenhuma das espécies registradas até o momento encontra-

se na Lista Nacional das Espécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de

Extinção, recentemente atualizada pelo Ministério do Meio Ambiente e

disponível em seu website, http://www.meioambiente.gov.br /port/sbf/index.cfm.

A ocorrência de Frostius pernambucensis na Reserva de Gurjaú merece

destaque. Trata-se de uma espécie endêmica da Mata Atlântica Nordestina,

cuja distribuição conhecida limitava-se, até o momento, ao Horto Florestal Dois

Irmãos (PE) e à Reserva de Murici (AL) (Bokermann 1962, Peixoto e Freire

1998). O registro de F. pernambucensis em Gurjaú amplia sua área de

ocorrência dentro do Estado de Pernambuco, e faz da Reserva área prioritária

para conservação da espécie.

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58

À excessão de Hyla aff. nana, todas as demais espécies de anuros

encontradas em Gurjaú (Tabela 6) possuem registro de ocorrência em

Pernambuco. Compilações recentes indicam que 65 espécies de anfíbios

anuros encontram-se registradas para o Estado (dos Santos e Carnaval 2002,

O. L. Peixoto, comunicação pessoal). A anurofauna representada na Reserva

de Gurjaú inclui 40% desse número. Táxons habitat-específicos, avistados em

outras áreas de mata do Estado, não foram, até o momento, registrados em

Gurjaú. É o caso, por exemplo, de Hylomantis granulosa (Cruz), espécie

endêmica de Pernambuco e listada pelo Ministério do Meio Ambiente como

criticamente em perigo, e Scinax gr. catharinae, registrada em Jaqueira. Fato

semelhante ocorre com alguns táxons que utilizam bromeliáceas como abrigo

ou sítio de reprodução, tal como Gastrotheca fissipes (Boulenger), registrada

no Horto Dois Irmãos, Caetés e Jaqueira, e Scinax pachycrus (Miranda-

Ribeiro), encontrada em Tapacurá, Jaqueira, Brejo dos Cavalos, e na Reserva

Biológica de Serra Negra. Também não foram registradas em Gurjaú algumas

espécies tolerantes a ambientes de borda de mata e áreas abertas,

normalmente encontradas em diversas altitudes no Estado de Pernambuco. É

o caso, por exemplo, de Hyla crepitans Wied-Neuwied, H. elegans Wied-

Neuwied, H. minuta Peters e Scinax eurydice (Bokermann) (dos Santos e

Carnaval 2002).

A ausência de tais registros pode se dever ao fato da anurofauna de Gurjaú

ainda estar subestimada. Apesar da curva de acumulação de espécies ter

alcançado um platô, estabilizando-se ao fim dos trabalhos de campo (Figura 4),

é importante ter em mente que o período do ano em que o presente

levantamento foi efetuado não constitui o mais apropriado para amostragens de

anfíbios. Anfíbios são facilmente observados durante sua época de reprodução,

a qual, no Nordeste do Brasil, está intimamente relacionada ao período de

chuvas (Arzabe 1998). Uma vez que o presente levantamento iniciou-se ao fim

da estação chuvosa, tendo que ser concluído antes do início das fortes chuvas

na região da Zona da Mata Sul de Pernambuco, é possível que o número real

de espécies de anfíbios existentes na Reserva de Gurjaú exceda os 26 táxons

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59

registrados até o momento. Futuros trabalhos de campo na Reserva deverão

contribuir com novos registros para a localidade.

A ausência de determinadas espécies na Reserva pode estar também

associada às características topográficas locais. Por estar localizada em área

de mata de baixada e próxima ao mar, é natural que a anurofauna de Gurjaú

apresente diferenças em relação às observadas nos brejos, florestas de

altitude, e/ou áreas de caatinga do Estado de Pernambuco.

Observações sobre os ambientes ocupados pelas diferentes espécies de

anfíbios em Gurjaú mostraram que as mesmas são capazes de partilhar os

sítios de abrigo e reprodução existente na Reserva através da utilização

diferenciada dos vários micro-habitats disponíveis (Tabelas 3 e 4). O

estabelecimento de mecanismos de partilha de recursos entre espécies de

anfíbios – através de diferenças temporais e espaciais no que se refere aos

seus sítios de reprodução e vocalização, por exemplo – é um tema

amplamente reconhecido na literatura (Duellman e Trueb 1994, Heyer et al.

1994). Todavia, uma vez que a maioria das espécies de Gurjaú depende de

corpos d’água para se reproduzir, é importante ressaltar que a manutenção de

poças permanentes, poças temporárias, alagados e riachos na mata é crucial à

permanência das populações locais.

Quatro espécies registradas na Reserva são reconhecidamente restritas a

ambientes florestados. Trata-se de Adenomera cf. marmorata,

Eleutherodactylus sp., Frostius pernambucensis e Proceratophrys boiei.

Adenomera marmorata e espécies do gênero Eleutherodactylus depositam

seus ovos no chão úmido da mata ao invés de utilizarem o meio aquático como

sítio de desova – e conseqüentemente dependem da existência de florestas

úmidas (Lutz 1949, Heyer 1973). De modo a garantir a manutenção dessas

populações em Gurjaú, é imprescindível proteger os remanescentes de Mata

Atlântica incluída na área da Reserva, se possível reflorestando as áreas

antropicamente impactadas que hoje existem na propriedade e conectando os

fragmentos de mata ainda existentes. A baixa taxa de captura de indivíduos de

P. boiei em armadilhas (Tabela 10) pode ser interpretada como um alerta para

o perigo de extinção de algumas populações locais. Ademais, as observações

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60

de campo sugerem que apenas uma pequena parte do conjunto das espécies

locais é capaz de ocupar as áreas da Reserva mais intensamente alteradas

pelo Homem, tais como zonas de cultivo, lavoura, e habitações.

Duas espécies registradas em Gurjaú são reconhecidamente associadas à

bromélias, utilizando-as como sítio de abrigo e/ou reprodução. Trata-se de

Phyllodytes luteolus e Frostius pernambucensis (Peixoto 1995, Peixoto e Freire

1998). Uma vez que bromeliáceas consistem em grande foco de atenção por

sua exploração comercial e uso ornamental, é importante que se estabeleça

um mecanismo de fiscalização sobre a retirada dessas plantas na área da

Reserva.

No que se refere às freqüências de encontro de anuros em Gurjaú (Figura 9), o

fato de algumas espécies terem sido registradas uma única vez não deve ser

visto como alarmante. Em verdade, é extremamente difícil avaliar o tamanho de

uma população de anfíbios sem se amostrar uma imensa quantidade de dias.

Como exemplo, podemos citar o caso das espécies com reprodução explosiva,

cujos machos e fêmeas vêm à água para se reproduzir durante poucas noites

ao ano, escondendo-se sob folhas, em troncos de árvores, ou permanecendo

enterrados pelo restante do tempo (Duellman e Trueb 1994). Todavia, foi

surpreendente, em Gurjaú, a baixa taxa de encontros de espécimens de Hyla

raniceps, espécie geralmente abundante em ambientes de borda de mata e

áreas abertas no Nordeste do Brasil (dos Santos e Carnaval 2002, Frost 2002).

Resultados obtidos com armadilhas do tipo pitfall (Tabela 10) foram

consistentes com as informações geradas por busca ativa. Representantes das

famílias Bufonidae, Hylidae, Leptodactylidae e Ranidae foram registrados

através da técnica. É interessante observar que uma espécie da família Hylidae

(a saber, Hyla semilineata) tenha sido amostrada nos pitfalls. Representantes

dessa família possuem discos adesivos nas pontas dos dedos dos pés e das

mãos, permitindo-lhes escalar os tubos de PVC que compõem as armadilhas, e

assim escapar com relativa facilidade. Os repetidos encontros de indivíduos de

H. semilineata no interior dos tubos de PVC dos pitfalls sugerem que a espécie

esteja utilizando-os como local de abrigo.

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61

CONCLUSÕES

Dado o presente estado de conservação da Floresta Atlântica Nordestina, é

essencial o estabelecimento de reservas e áreas de proteção ambiental que

efetivamente protejam e restaurem o ambiente natural outrora presente nesta

região. Neste contexto, a Reserva de Gurjaú tem condições de exercer um

importante papel na conservação dos recursos florestais brasileiros. Com vistas

à manutenção das populações naturais ainda existentes na Reserva, é

imprescindível que se restaurem os ambientes florestados aí existentes.

Futuramente, é desejável que se promovam corredores de mata para

comunicação entre a Reserva e outros remanescentes da Zona da Mata Sul de

Pernambuco. Vinte e seis espécies de anfíbios anuros foram registradas na

área da Reserva, das quais onze são endêmicas da Mata Atlântica. A

ocorrência de Frostius pernambucensis faz de Gurjáu a terceira área para a

qual essa espécie, endêmica da Mata Atlântica Nordestina, é conhecida. No

que se refere especificamente à comunidade de anfíbios de Gurjaú, é

importante não somente preservar e conectar os remanescentes de mata ainda

existentes na área da Reserva, mas também garantir a manutenção de

diferentes sistemas de água doce como forma de se maximizar a gama de

sítios reprodutivos disponíveis às espécies. Adicionalmente, a fiscalização

sobre retirada de bromélias é crucial para manutenção de algumas populações

locais.

AGRADECIMENTOS

Dr. Sergio P. C. Silva, Dr. Oswaldo L. Peixoto, Dr. Ulisses Caramaschi, Dr.

José Pombal Jr. e Ednilza M. Santos permitiram o acesso às coleções

herpetológicas ZUFRJ, EI-UFRRJ, MNRJ, e Coleção Herpetológica-UFPE para

fins de comparação de material, auxiliando na identificação de alguns

exemplares. Joca e Bibiu auxiliaram nos trabalhos de campo.

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ANEXO I

Resultado dos levantamentos da anurofauna de Gurjaú obtidos via busca ativa

Data 10 Ago. 11 Ago. 30 Ago.31 Ago. 07 Set 08 Set 14 Set 15 Set 17 Out. 17 Out. 18 Out. 18 Out. 19 Out. 19Out. 19 Out. 19 Out. 20 Out. 20 Out.Trilha * A B C D E F G H A C H I K J J A G CHorário N N N N N N N N N N D N D N N N D NHomens.hora 6 4 4 4 4 4 4 4 9,5 0,5 2 6 0,5 1,5 6 3,5 4,5 6Adenomera cf. marmorata 1Bufo crucifer 1 2Bufo granulosus 2Bufo jimi 1 2Eleutherodactylus sp. 1 2 2 2 5 1 2Frostius pernambucensisHyla atlantica 1 2 1Hyla albomarginata 2 1 2 1 2Hyla branneri 1 4 3 4Hyla decipiensHyla ranicepsHyla aff. nanaHyla semilineata 4 10 20 13 4 3 2 2 12 3 4 2 1Leptodactylus labyrinthicus 1 3 2 1Leptodactylus natalensis 3 3Leptodactylus ocellatus 1 1Phyllodytes luteolusPhyllomedusa hypochondrialis 1Physalaemus cuvieri 1 2 1Pseudopaludicola sp. 5 7Rana palmipes 7 28 1 3 3 3 6 1 4 1 1 3Scinax auratus 2 1 1Scinax nebulosus 4 3 1 1Scinax x-signatus 1

Data 21 Out. 21 Out. 2 Nov. 3 Nov. 25 Nov. 6 Dez. 7 Dez. 21 Dez.22 Dez. 16 Jan. 16 Jan. 17 Jan. 18 Jan. 18 Jan. 18. Jan.18 Jan. 18 Jan. 19 Jan.Trilha * G G A, B, I C G H J C, D, E C C A H, B,A J J A C H,B,A CHorário N N N N N N N N D N N N n N N N D DHomens.hora 2 4 6.5 6 6 5.5 8 8.5 4 4 1.5 4 1 7 1 3 4.5 2Adenomera cf. marmorata 2 1 1Bufo crucifer 1Bufo granulosus 1 1Bufo jimi 1 1 1 30 2 11 1Eleutherodactylus sp. 4 2 2 1 2 1 1 1Frostius pernambucensisHyla atlantica 2 2Hyla albomarginata 1 1 1Hyla branneri 1 1 4 1Hyla decipiens 1Hyla raniceps 1Hyla aff. nana 4 3Hyla semilineata 6 2 8 4 2 2 7 8 6 girinos 1 girinosLeptodactylus labyrinthicus 1 2 1 1 1Leptodactylus natalensis 2Leptodactylus ocellatus 1Phyllodytes luteolus 1Phyllomedusa hypochondrialis 1 1Physalaemus cuvieri 1Pseudopaludicola sp. 20 7Rana palmipes 5 1 1 1 3 1 girinos 4 1 1 2 girinosScinax auratus 1Scinax nebulosus 2 1Scinax x-signatus 1 2 1

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63

4.2.2 Levantamento de Répteis

Introdução

Dentre as 50.300 espécies de vertebrados, existem no mundo 7866 espécies

de répteis assim distribuídas: 4470 lacertílios (57%), 2920 serpentes (37%),

292 quelônios (4%), 156 anfisbenídeos (2%), 23 crocodilianos (0,3%) e 2

tuataras (0,025%) (Uetz 2000).

De todos os representantes vertebrados da fauna brasileira, o répteis são os

menos estudados, principalmente no litoral da região Nordeste (Morais e

Morais 1987; Borges 1991). Os poucos trabalhos existentes consideram,

basicamente, descrições de espécies e algumas poucas informações de sua

biologia, havendo por isso muita carência de dados para realização de estudos

mais aprofundados.

Em Pernambuco, o conhecimento desse grupo animal está restrito a poucas

informações sobre algumas espécies de diferentes regiões do estado,

principalmente, da caatinga (Ramos 1941; Cordeiro e Hoge 1973; Vanzolini et

al. 1980; Morais e Morais 1987; Silva 2001). Nas décadas passadas, muitos

trabalhos demográficos foram realizados com répteis, embora quase que sua

Data 19 Jan. 19 Jan. 20 Jan. 20 Jan.21 Jan. 2 Fev. 9 Fev. 9 Fev. 16 Fev. 23 Fev. 8 Mar. 23 Mar. 30 Mar. 30 Mar. 13 Abr. 20 Abr. 26 Abr. 27 Abr.Trilha * I A G G F A G G A,B C,D J A G G J B, I D,E CHorário N N N N DHomens.hora 1 3 2 4 3 4 2 2 9 9 10.5 4 2 3 6 6 6 4Adenomera cf. marmorata 1 1Bufo crucifer 1 1Bufo granulosus 1Bufo jimi 1 1 1 2 1 1 1Eleutherodactylus sp. 1 2 1 1 1Frostius pernambucensis 1Hyla atlantica 1 1 3 1Hyla albomarginata 1Hyla branneri 3 1Hyla decipiens 1Hyla raniceps 1Hyla aff. nanaHyla semilineata 1 1 girinos 1 3 8 2 1 5 4 2 5 6Leptodactylus labyrinthicus 1 3 2 2 1 1 1Leptodactylus natalensis 2Leptodactylus ocellatus 1Phyllodytes luteolusPhyllomedusa hypochondrialis 1Physalaemus cuvieriPseudopaludicola sp.Rana palmipes 1 1 14 5 2 5 1 3 7 1 6 10 1 4Scinax auratus 2 1Scinax nebulosus 2Scinax x-signatus 2 2

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totalidade realizada na América do Norte e África (Pianka 1967; Pianka 1973;

Huey e Pianka 1977).

No Brasil, são poucos os estudos que enfocam os répteis em áreas de grande

empreendimento e que supostamente sofrem forte influência da ação

antrópica. Apenas recentemente tenta-se fazer tais estudos, entretanto, quase

todos realizados nas regiões central e sudeste (Pinto 1999; Sluys 2000).

A tentativa de monitorar populações oferece a oportunidade de estimar seus

tamanhos e a distribuição de seus representantes no ambiente. Com essas

informações pode-se, com maior precisão, fazer afirmações quanto ao seu

nível atual de conservação.

O presente estudo tem como objetivo disponibilizar uma listagem das espécies

de répteis encontradas na Reserva Ecológica de Gurjaú, determinar os níveis

de conservação e oferecer informações que subsidiem um plano de manejo

sustentável considerando as atividades realizadas na estação de tratamento de

água e as populações humanas residentes na área.

METODOLOGIA

Área de Estudo

A área de estudo está contida na Reserva Ecológica de Gurjaú, município do

Cabo de Santo Agostinho (34o 56’ 30’’ W; 8o 21’ 30’’ S). A temperatura e a

pluviosidade para o município apresentam valores anuais médios,

respectivamente, de 25o C e 180 mm, enquanto a altitude varia de 30 a 50 m. A

reserva possui 600 ha, divididos em 15 matas, além de três rios e três represas

utilizadas no abastecimento de grande parte do Recife. Foram escolhidos os

maiores fragmentos de Mata para o estudo: Mata Secupema e Mata Cuxio,

cujas dimensões são, aproximada e respectivamente, 1,0 km x 0,8 km e 0,8 km

x 0,6 km.

COLETA DE DADOS

As atividades de campo foram realizadas no período de agosto de 2002 a maio

de 2003. A metodologia utilizada para avaliar a biodiversidade de répteis

consistiu no uso de três técnicas: procura ativa, uso de armadilhas de

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interceptação e queda (pit-fall) segundo a técnica de Gibbons e Semlitsch

(1981) e captura por terceiros.

A técnica de procura ativa consistiu na realização de caminhadas lentas, em

diferentes horários, desde o amanhecer até à noite, em abrigos que os lagartos

e serpentes poderiam usar como refúgio. A procura de quelônios foi realizada,

durante o período diurno, em trilhas e poças temporárias. A procura de

crocodilianos foi realizada com embarcação, à noite, com a utilização de

lanternas e laços de captura apropriados.

Foram instaladas 40 armadilhas de interceptação e queda, formadas por quatro

recipientes (canos de PVC) com 0,4 m de profundidade por 0,25 m de largura,

enterrados até a borda do solo e interligados por cercas-guia (drift-fences) de

lona plástica de 5 m de comprimento por 0,4 m de altura, formando um “Y”

(Figuras 10 e 11).

Figura 10: Esquema gráfico da armadilha de interceptação e queda. As letras A, B, C e M representam os recipientes enterrados até a margem superior do solo.

B

A

C

M

Lona plástica com

5 m de comprimento

0,4 m

0,25 m

m

0,4 m

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Figura 11 - Armadilha de interceptação e queda utilizada no levantamento dos répteis da Reserva Ecológica de Gurjaú, no período de agosto de 2002 a maio de 2003. (Foto: Maria Eduarda Larrázabal, 2002).

As armadilhas foram instaladas a cada 25 m, ao longo de um transecto de

775m na Mata Secupema (30 armadilhas) e em um transecto de 250 m na

Mata Cuxio (10 armadilhas) (Figura 11).

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Figura 12 - Área de instalação das armadilhas de queda para levantamento dos répteis da Reserva Ecológica de Gurjaú. (Fonte: FIDEM, 1987).

Embora a captura por terceiros não tenha sido incentivada, alguns exemplares

mortos foram obtidos por doação da comunidade local. Esse material foi

preservado em formol 10% até o momento da identificação e tombado na

Coleção Didática de Répteis da Universidade Federal de Pernambuco.

A maioria dos répteis foi capturada, identificada e devolvida ao mesmo local da

captura. Alguns animais foram levados ao Laboratório de Animais Peçonhentos

e Toxinas da UFPE para identificação ao nível de espécie, sendo

posteriormente soltos no mesmo ponto de captura. Alguns lagartos foram

fotografados e as fotos enviadas para o Dr. Miguel Trefault Rodrigues, Diretor

do Museu de Zoologia da USP, que gentilmente procedeu à identificação.

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ESFORÇO DE CAPTURA

A equipe empreendeu, aproximadamente, 175 horas para instalação das

armadilhas e 240 horas para coleta dos animais. A instalação das armadilhas

foi realizada utilizando períodos contínuos de quatro dias ao mês, com exceção

do mês de agosto de 2002 quando foram utilizados oito dias. A verificação das

armadilhas e a procura ativa dos répteis foram realizadas a cada três dias no

período de setembro de 2002 a maio de 2003.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram capturados e avistados um total de 246 espécimes de répteis (220

capturas e 26 avistamentos), sendo a maioria da subordem Sauria (181 spp.,

175 capturas e 6 avistamentos), seguido de Serpentes (42 spp., 40 capturas e

2 avistamentos), Crocodylia (14 spp., 5 capturas e 9 avistamentos) e Quelonia

(10 spp., 2 capturas e 8 avistamentos) (Figura 13).

Serpentes17,0%

Quelônios4,0%

Crocodilianos5,7%

Lagartos73,3%

Figura 13 - Distribuição proporcional entre número de capturas e avistamentos de répteis na Reserva de Gurjaú, de Agosto de 2002 a Maio de 2003.

O número de capturas e avistamentos de serpentes e lagartos variaram

significativamente nos meses estudados. As serpentes foram mais

abundantes nos períodos de agosto a outubro de 2002 e abril a maio de

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2003, enquanto os lagartos foram mais abundantes exatamente no período

complementar a estes meses: novembro de 2002 a abril de 2003. Os

quelônios foram avistados durante todo período de estudo e os crocodilianos

a partir de outubro de 2003 (Figura14).

Figura 14 - Distribuição mensal de capturas e/ou avistamentos dos grupos de répteis na Reserva de Gurjaú, de Agosto de 2002 a Maio de 2003. As barras representam o número de animais coletados e avistados.

Dentre os répteis capturados e avistados, os lacertílios foram os mais

abundantes. A espécies Kentropyx calcarata (Figura 15) foi capturada 60 vezes

nas armadilhas de interceptação e queda durante o período de estudo, seguida

de Anotosaura sp n. (39) e Mabuya heathi (22), porém a maioria dos animais

apresentou um número reduzido de capturas e avistamentos (Figura 16).

0

5

1 0

1 5

2 0

2 5

3 0

3 5

4 0

ago/0

2

set/02

out/0

2

nov/0

2

dez/02

jan/0

3

fev/0

3

mar/0

3

abr/03

mai/0

3

L a g a r t o s S e r p e n te s C r o c o d il ia n o s Q u e lô n io s

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Figura 15 - Kentropyx calcarata (calango) capturado na Mata do Secupema, na Reserva de Gurjaú (Fotografia Maria Eduarda Larrázabal, 2002).

Figura 16 - Número de capturas e avistamentos das espécies de répteis mais abundantes da Reserva de Gurjaú, durante o período de agosto de 2002 a maio de 2003.

Dentre todas as serpentes capturadas, a serpente fossorial Typhops sp1. foi

encontrada em maior número (Figura 17). Com certeza esse resultado não

reflete a abundância relativa dessa espécie, provavelmente, deve-se ao tipo de

armadilha utilizada, que privilegia a captura de animais terrícolas e fossoriais. O

0

10

20

30

40

50

60

K. cal

carat

a

Anatos

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M. n

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A. punctatus

P.geoffranus

Typhops sp.

LagartosQuelôniosSerpentes

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encontro dessa serpente foi fortemente relacionado com o aumento da

pluviosidade. Esse comportamento também foi encontrado na distribuição

relativa de serpentes da Amazônia.

Figura 17 - Typhops sp1 capturada na Mata do Sucupema, na Reserva de Gurjaú (Fotografia Maria Eduarda Larrázabal, 2002).

A única espécie de quelônio identificada na Reserva de Gurjaú, Phrynops

geoffroanus, pertence à família Chelidae (Figura 18, Tabela 11). Essa espécie

já havia sido descrita para o estado de Pernambuco, sendo também

encontrada na caatinga (Vanzolini et al 1980; Rodrigues 2000).

Figura 18 - Vista dorsal (A) e ventral (B) de Phrynops geoffroanus (cágado de barbicha) capturado na Mata do Secupema, na Reserva de Gurjaú. (Foto: Cláudio Cazal, 2003).

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Figura 19 - Representatividade das famílias de Lagartos na Reserva de Gurjaú, durante o período de agosto de 2002 a maio de 2003.

Os lagartos foram distribuídos em 15 espécies e sete famílias, que não

variaram significativamente em representatividade: Polychrotidae (03 sp.),

Gekkonidae (03 sp), Teiidae (03 sp), Tropiduridae (2 sp.), Scincidae (02 sp) e

Gymnophaltidae (01 sp) (Figura 19, Tabela I.). Esse resultado apresenta certa

discrepância com o padrão esperado (em que as famílias Teiidae, Iguanidae e

Gekkonidae, seriam as mais abundantes em termos de espécies capturadas).

As serpentes representaram o maior número de espécies encontradas (25

espécies), distribuídas em apenas quatro famílias, apresentando significativa

representatividade na família Colubridae (18 sp), e menor número de espécies

nas famílias Boidae (03 sp), Viperidae (02 sp) e Typhlopidae (02 sp) (Figura 20,

Tabela 11). Esse resultado está compatível com o esperado, uma vez que a

família Colubridae compreende 63% das espécies de serpentes conhecidas

(Uetz 2000).

P o ly c h ro t id a e1 4 %

G e k k o n id a e2 2 %

S c in c id a e1 4 %

T ro p id u r id a e1 4 %

G y m n o p h ta lm id a e7 %

Ig u a n id a e7 %

T e i id a e2 2 %

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Figura 20 - Representatividade das famílias de Serpentes na Reserva de Gurjaú,

durante o período de agosto de 2002 a maio de 2003.

Apenas uma espécie de crocodiliano, pertencente à família Alligatoridae foi

registrada na Reserva de Gurjaú (Figura 21, Tabela 11).

Figura 21. Caiman latirostris (jacaré-do-papo-amarelo) capturado na Barragem, na Reserva de Gurjaú. (Fotografia Cláudio Cazal, 2002).

B o id a e1 2 %

T y p h lo p id a e8 %

V ip e r id a e8 %

C o lu b r id a e7 2 %

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Tabela 11 - Lista de espécies identificadas na Reserva de Gurjaú

Classificação Nomenclatura científica – Espécie Nome popular

ORDEM TESTUDINATA

SUBORDEM PLEUDIRA

FAMÍLIA CHELIDAE 1 Phrynops geoffroanus Schweigger, 1812

Cágado de barbicha

ORDEM SQUAMATA

SUBORDEM SAURIA

FAMÍLIA IGUANIDAE 2

Iguana iguana Linnaeus, 1748 Camaleão

FAMÍLIA

TROPIDURIDAE

3 Strobilurus torquatus Wiegmann,

1834

Lagartixa

4 Tropidurus hispidus Spix 1825 Lagartixa

FAMÍLIA

POLYCHROTIDAE 5 Anolis punctatus Daudin, 1802 Papa-vento

6 Enyalius catenatus Wied 1821 Papa-vento

7 Polychrus acutirostris Spix, 1825 Camaleão

FAMÍLIA GEKKONIDAE 8 Coleodactylus meridionalis

Boulenger 1888

9 Gymnodactylus darwinii Gray 1845

10 Hemidactylus mabouia Moreau de Jones 1818

Víbora

FAMÍLIA TEIIDAE 11 Ameiva ameiva Linnaeus, 1758 Calango

12 Kentropyx calcarata Spix, 1825 Calango

13 Tupinambis teguixim Linnaeus, 1758 Teju

FAMÍLIA

GYMNOPHTALMIDAE 14Anotosaura spn.

FAMÍLIA SCINCIDAE 15 Mabuya macrorhyncha Hoge, 1946

16 Mabuya heathi Spix, 1825

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Tabela 11 - Continuação da lista de espécies identificadas na Reserva de Gurjaú.

Classificação Nomenclatura científica - Espécie Nome popular

SUBORDEM SERPENTES

FAMÍLIATYPHLOPIDAE

1718

Typhlops sp1 Typhlops sp2

Cobra –cega Cobra –cega

FAMÍLIA BOIDAE 19 Boa constrictor Linnaeus, 1758 Jibóia 20 Corallus hortulanus Linnaeus, 1758 21 Epicrates cenchria Linnaeus, 1758 Cobra siri-de-fogo

FAMÍLIACOLUBRIDAE 22 Apostolepis sp.Cope 1862

23 Atractus potschi Fernandes 1995 24 Clelia clelia Daudin, 1803 Mussurana 25 Clelia plumbea Wield, 1820 26 Dendrophidion dendrophis Schlegel,

1837 27 Drymarchon corais Boie 1827 28 Helicops leopardinus Schlegel, 1837 Cobra-d’água 29 Imantodes cenchoa Linnaeus, 1758 30 Leptodeira annulata Linnaeus, 1758 Dormideira 31 Liophis cobellus Linnaeus 1758 Jararaquinha 32 Oxybelys aeneus Wagler, 1824 Cobra-cipó 33 Oxyrhopus trigeminus Duméril, Bibron e

Duméril, 1854 Falsa-coral

34 Oxyrhopus petola Linnaeus, 1758 Falsa-coral 35 Philodryas olfersii Lichternstein, 1823 Cobra-verde 36 Pseudoboa nigra Duméril, Bibron e

Duméril, 1854 Mussurana

37 Siphlophis compressus Daudin 1803 38 Spilotes pullatus Linnaeus, 1748 Caninana 39 Linnaeus, 1748

FAMÍLIA VIPERIDAE 40 Bothrops sp. Jararaca 41 Crotalus durissus cascavella Wagler,

1824Cascavel

ORDEM CROCODYLIA

FAMÍLIAALLIGATORIDAE

42 Caiman latirostris Daudin 1802 Jacaré-do-papo-amarelo

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Vinte espécies de serpentes foram identificadas através da captura dos animais

e duas através de avistamento (Spilottes pulatus e Drymarchon corais). A

última foi avistada junto da lona de uma das armadilhas na Mata deSecupema

o que permitiu a estimativa de seu comprimento (2,6m), apresentando cor

negra uniforme e comportamento agressivo característico dessa espécie, ao

avistar a equipe (levantou a região anterior do corpo, inflando a região gular

avermelhada) (Coborn 1991; Wolfgang Wüster, comunicação pessoal).

A maioria das espécies de serpentes encontradas na reserva de Gurjaú foi

encontrada em ambientes alterados como Liophis cobella (Martins 1994) ou

tolerantes a ambientes abertos (campos ou caatinga) e fechados (matas) tais

como Boa constrictor, Clélia clelia, Corallus hortulanus, Crotalus durisus

cascavella, Epicrates cenchria, Dendrophidion dendrophis, Helicops

leopardinus, Leptodeira annulata, Oxybelis aeneus,Oxyrhopus trigeminus,

Philodryas olfersii, Psedoboa nigra, Spilotes pullatus e Crotalus durissus

cascavella (Vanzolini 1948; Cordeiro e Hoge 1973; Rodrigues 1986;

Nascimento et al 1987; Cunha e Nascimento 1993; Martins 1994; Rodrigues

2000; Marques 2001; Silva 2001; Pinho 2002). O que sugere que as Matas

estudadas na Reserva de Gurjaú, escolhidas por estarem em melhor estado de

conservação, apresentam áreas abertas, que possibilitam a presença de

animais não exclusivos às regiões de Mata Atlântica.

Da mesma forma, algumas espécies de lagartos estão relacionadas a áreas

mais ensolaradas, sendo facilmente encontradas tanto em borda quanto no

interior das matas, estando associadas a grandes clareiras no interior destas

(Pough et al 1998; Zug et al 2001). Na reserva de Gurjaú foram relatados

Ameiva ameiva, Kentropyx calcarata, Tropidurus hispidus, Tupinambis teguixin

e Mabuya heathi, espécies que apresentam pouca exigência quanto ao nível de

preservação de áreas florestais. A espécie Strobilurus torquatus destaca-se por

ser um lagarto heliófilo relativamente raro, encontrado no solo somente em

áreas degradadas, pois originalmente preferem copas de grandes árvores

(Rodrigues et al. 1989). Por outro lado, Gymnodactylus darwinii e Anotosaura

sp. n. são espécies fortemente associadas a áreas sombreadas e folhiço de

mata representadas em fragmentos bem preservados. Espécies como Anolis

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puncatatus, Enyalius catenatus e Polychrus acutirostris apresentaram baixo

nível de captura, provavelmente devido à natureza arborícola dessas espécies

(Zamprogno et al 2001).

Com relação à distribuição geográfica, apenas duas espécies de serpentes são

exclusivas de Mata Atlântica (Clelia plumbea e Siphophis compressus)

(Nascimento et al 1987; Marques 2001), cinco espécies são encontradas na

Mata Atlântica e na Amazônia (Atractus potschi, Dendrophidion dendrophis,

Imantodes cenchoa, Liophis cobellus e Oxyrhopus petolaI) (Cordeiro e Hoge

1973; Vanzolini 1986; Nascimento et al 1987; Nascimento e Lima Verde 1989;

Cunha e Nascimento 1993; Martins 1994; Marques 2001), quatro espécies são

encontradas na caatinga e Mata Atlântica (Corallus hortulanus, Helicops

leopardinus, Pseudoboa nigra e Crotalus durissus cascavella) (Cordeiro e Hoge

1973; Rodrigues 2000; Silva 2001; Pinho 2002) e oito espécies são

encontradas na caatinga, Amazônia e Mata Atlântica (Boa constrictor, Epicrates

cenchria, Clelia clelia, Leptodeira annulata, Oxybelys aeneus, Oxyrhopus

trigeminus, Philodryas olfersii e Spilotes pullatus) (Vanzolini 1948; Cordeiro e

Hoge 1973; Vanzolini 1986; Nascimento et al 1987; Nascimento e Lima Verde

1989; Cunha e Nascimento 1993; Martins 1994; Rodrigues 2000; Silva 2001;

Marques 2001).

Embora não tenham sido registrados endemismos dentre as 25 espécies de

serpentes amostradas em Gurjaú, sete representam novas descrições para o

estado de Pernambuco (Corallus hortulannus, Atractus potschi, Clelia plumbea,

Dendrophidion dendrophis, Drymarchon corais, Imantodes cenchoa e

Oxyrhopus petola).

Portanto, dentre as 57 espécies de serpentes registradas para o Estado de

Pernambuco, incluindo-se as sete espécies identificadas nesse estudo, a fauna

herpetológica da Reserva de Gurjaú inclui 43,86% do total de espécies do

estado de Pernambuco (Cordeiro e Hoge, 1973; Silva 2001; Pinto 2002).

Dentre as 15 espécies de lagartos capturadas em Gurjaú, quatro espécies

(Enyalius catenatus, Gymnodactylus darwinii, Strobilurus torquatus e

Anotosaura sp.n.) são endêmicas de Mata Atlântica, apresentando raríssimos

relatos em outros ambientes. Anotosaura sp. n. é uma espécie ainda não

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descrita, capturada apenas na Paraíba, portanto, constitui o primeiro relato

para Pernambuco (Rodrigues 1990).

As demais espécies são também encontradas em outros biomas: cinco

espécies são encontradas na caatinga, cerrado, Amazônia e Mata Atlântica

(Ameiva ameiva, Hemidactylus mabouia, Mabuya heathi, Mabuya

macrorhyncha, Tropidurus hispidus) (Vanzolini 1972, 1974, 1976, Vanzolini et

al 1980, Rodrigues 1987, 1990 e 2000), duas espécies em caatinga, Amazônia

e Mata Atlântica (Iguana iguana, Tupinambis teguixin) (Cunha 1961; Vanzolini

1972, 1974, 1976; Vanzolini et al 1980; Cunha 1981; Rodrigues 1987, 1990;

Silva Jr e Site Jr 1995; Rodrigues 2000), uma espécie em caatinga, cerrado e

Mata Atlântica (Polychrus acutirostris) (Vanzolini 1972, 1974, 1976, Vanzolini et

al 1980, Rodrigues 1987, 1990; Vitt 1991, Araujo e Colli 1998; Rodrigues 2000)

e uma espécie em caatinga e Mata Atlântica (Coleodactylus meridionalis)

(Vanzolini 1972, 1974, 1976; Vanzolini et al 1980; Rodrigues 1987, 1990 e

2000).

Embora tenhamos que considerar o vício de amostragem devido ao uso de

armadilhas de interceptação e queda, a grande maioria das serpentes

identificadas foi terrícola e fossorial (22 espécies terrícolas e fossoriais e três

arborícolas e subarborícolas), o que indica que um percentual alto da ofiofauna

tem condições mínimas de nicho estrutural para resistir a perturbações na

floresta (Vanzolini 1986). As armadilhas utilizadas oferecem grande sucesso de

captura para quase todos os tipos de lagartos encontrados na reserva, com

exceção dos grandes lagartos (Tupinambis teguixin) e aqueles com hábitos

extremamente arborícolas (Iguana iguana, Anoles puincatatus e Polychrus

acutirostris) ou fortemente associados a outros habitats/microhabitats.

A curva de espécies, representando o total acumulado de táxons durante o

período de estudo, sugere que não tenha sido alcançado o plateau de

saturação de espécies para serpentes. Por outro lado, os demais grupos foram

eficientemente amostrados (Figura 22).

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79

0

5

10

15

20

25

AGO SET OUT NOV DEZ JAN FEV MAR ABR MAI

Serpentes Lagartos

Quelônios Crocodilianos

Figura 22 - Curva de acumulação de espécies de serpentes e lagartos na Reserva de Gurjaú, com base em resultados de busca ativa, captura em armadilhas de interceptação e queda e captura por terceiros, entre os meses de agosto de 2002 e maio de 2003.

CONCLUSÕES

Os resultados obtidos sugerem que os fragmentos avaliados na Reserva de

Gurjaú apresentam relevante diversidade de répteis principalmente de

serpentes e lagartos, que apresentam oito novos registros para o estado de

Pernambuco, quatro espécies endêmicas e uma rara. Por outro lado, os

mesmos fragmentos estão submetidos a forte impacto pela ação antrópica.

Esta pode ser comprovada pela presença de várias espécies adaptáveis a

ambientes degradados, pelo pequeno número de animais registrados de cada

espécie, bem como pela constante destruição de armadilhas durante o estudo

e pela presença de trilhas, armadilhas de caçadores e cães domésticos no

interior das matas examinadas.

Cabe ressaltar que se faz necessário um trabalho intenso de educação

ambiental, uma vez que as serpentes são consideradas animais perigosos e

por isso são sacrificadas indiscriminadamente pela população humana local,

apesar de apenas duas espécies dentre as 22 registradas oferecerem risco.

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Além dessa atividade predatória, os lagartos Iguana iguana e Tupinambis

teguixin, o quelônio Phrynops geoffroanus e o crocodiliano Caiman latirostris

são espécies de potencial sinergético, sendo consumidas de forma não

sustentável pela população humana local.

Diante do exposto, sugere-se que há forte necessidade de execução de

medidas mitigadoras dos impactos ambientais para manutenção e recuperação

da importante fauna herpetológica evidenciada na Reserva.

Deve-se lembrar que quanto maior a área protegida, tanto maior será a

diversidade e a resistência dos animais ao desgaste causado pela proximidade

e inserção das populações humanas (Vanzolini 1986). Com certeza, medidas

que visem reconstituir os fragmentos originais trarão grandes benefícios para

fauna de répteis, tão significante e ainda tão pouco conhecida, da Reserva

Ecológica de Gurjaú.

4.2.3 Levantamento de Aves

Introdução

A Mata Atlântica é considerada o bioma de maior diversidade biológica do

planeta, no entanto, é pouco conservada. Segundo Almeida (2000), baseado

nos níveis atuais de degradação, esta floresta encontra-se com a

biodiversidade comprometida, onde muitas espécies já foram extintas, sem

mesmo serem descritas. A Floresta Atlântica colabora de forma expressiva

para que o Brasil seja considerado o país da megabiodiversidade, possuindo

um alto nível de endemismo em todos os grupos taxonômicos, incluindo aves,

primatas, borboletas e plantas (Aleixo 1997, Silva e Tabarelli 2000). É

considerada, pela UNESCO, Reserva da Biosfera, sendo uma das três maiores

prioridades de conservação do mundo (Consórcio Mata Atlântica UNICAMP,

1992; Meyrs et al. 2000)

Dos 36,8% de área original da Floresta Atlântica Nordestina, restam apenas

cerca de 3% (Willis e Oniki 1992). Para o estado de Pernambuco esta área

apresentava 34,14% do original, restando atualmente 4,6% (Gonzaga de

Campos 1912, SNE 1994).

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Segundo Sick (1997), o Brasil possui 1677 espécies de aves, entre residentes

e visitantes, das quais 212 são endêmicas e de distribuição restrita nos limites

da Mata Atlântica. As observações realizadas sobre aves em Pernambuco

ocorreram principalmente na mata Atlântica (Forbes 1881, Pinto 1940, Berla

1946, Coelho 1979, Azevedo Júnior 1990 e Azevedo Júnior et al. 1998, Telino

Júnior et al. 2000).

Segundo Roda (2002), foram registradas 498 espécies de aves para

Pernambuco, das quais 46 estão listadas como ameaçadas (IBAMA 2003).

A avifauna pode funcionar como bioindicadora das condições ambientais

constituindo um dos grupos que melhor responde a impactos causados ao

meio ambiente, uma vez que desaparecem rapidamente quando este é

alterado, atingindo níveis insuportáveis (Regalado e Silva 1997).

O levantamento avifaunístico contribui não só para a caracterização de um

ambiente, como também para um melhor conhecimento da distribuição

geográfica das espécies, além de funcionar como subsídios para trabalhos de

monitoramento e manejo (Almeida 2000, Regalado et al. 2000). Dessa forma,

fornece dados relevantes para a conservação da diversidade biológica,

extremamente ameaçada no Brasil.

A conservação consiste em uma premissa básica para a manutenção da

biodiversidade. Dentre os diversos fatores que acarretam na perda da

diversidade biológica, destaca-se a redução das áreas naturais e a caça de

comercialização, sobretudo nas proximidades dos centros urbanos (Azevedo

Júnior et al. 1998).

Desta forma, pretende-se com este estudo conhecer a composição

avifaunística da Reserva Ecológica de Gurjaú, bem como fornecer subsídios

para projetos conservacionistas, principalmente no que tange ao manejo

sustentado da Unidade.

MATERIAL E MÉTODOS

Área de Estudo

Inserida em uma única propriedade, pertencente à Companhia Pernambucana

de Abastecimento de Água (COMPESA), onde existe uma Estação de