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    Superior Tribunal de Justia

    RECURSO ORDINRIO EM MS N 15.154 - PE (2002/0089807-4)

    RELATOR : MINISTRO LUIZ FUXRECORRENTE : MOURA INFORMTICA LTDAADVOGADO : RODRIGO PEREIRA GUEDES E OUTROS

    T.ORIGEM : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A REGIOIMPETRADO : JUIZ PRESIDENTE DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A

    REGIORECORRIDO : UNIO

    EMENTA

    CONTRATO ADMINISTRATIVO. EQUAO ECONMICO-FINANCEIRA DO VNCULO. DESVALORIZAO DO REAL.JANEIRO DE 1999. ALTERAO DE CLUSULA REFERENTE

    AO PREO. APLICAO DA TEORIA DA IMPREVISO E FATODO PRNCIPE.1. A novel cultura acerca do contrato administrativo encarta, como nuclearno regime do vnculo, a proteo do equilbrio econmico-financeiro donegcio jurdico de direito pblico, assertiva que se infere do disposto nalegislao infralegal especfica (arts. 57, 1, 58, 1 e 2, 65, II, d, 88 5e 6, da Lei 8.666/93.Deveras, a Constituio Federal ao insculpirosprincpios intransponveis doart. 37 que iluminam a atividade da administrao luz da clusula mater damoralidade, torna clara a necessidade de manter-se esse equilbrio, ao realaras "condies efetivas da proposta".

    2. O episdio ocorrido em janeiro de 1999, consubstanciado na sbitadesvalorizao da moeda nacional (real) frente ao dlar norte-americano,configurou causa excepcional de mutabilidade dos contratos administrativos,com vistas manuteno do equilbrio econmico-financeiro das partes.3. Rompimento abrupto da equao econmico-financeira do contrato.Impossibilidade de incio da execuo com a preveno de danos maiores.(ad impossiblia memo tenetur). 4. Prevendo a lei a possibilidade de suspenso do cumprimento do contrato

    pela verificao da exceptio non adimplet contractus imputvel administrao, a fortiori , implica admitir sustar-se o "incio da execuo",

    quando desde logo verificvel a incidncia da "impreviso" ocorrente nointerregno em que a administrao postergou os trabalhos. Sanoinjustamente aplicvel ao contratado, removida pelo provimento do recurso.5. Recurso Ordinrio provido.

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    ACRDO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turmado Superior Tribunal de Justia, na conformidade dos votos e das notas taquigrficas a seguir, porunanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs.

    Ministros Humberto Gomes de Barros e Francisco Falco votaram com o Sr. Ministro Relator.Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Jos Delgado.Braslia (DF), 19 de novembro de 2002(Data do Julgamento).

    MINISTRO LUIZ FUXRelator

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    RECURSO ORDINRIO EM MS N 15.154 - PE (2002/0089807-4)

    RELATRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX (Relator): Trata-se de Recurso Ordinrio

    interposto por MOURA INFORMTICA LTDA., com fulcro no art. 105, II, "b", da

    Constituio Federal, contra acrdo que denegou a ordem nos autos de Mandado de

    Segurana impetrado contra ato de autoridade coatora consubstanciado na imposio de

    sanes administrativas e multa por inadimplncia contratual, assim ementado (fls.147):

    "MANDADO DE SEGURANA. ADMINISTRATIVO. LICITAO.EXECUO DO CONTRATO.- O peculiar regime dos contratos administrativos prev, comodesdobramento do princpio da continuidade do servio pblico, sua

    prorrogao automtica nos casos de "impedimento, paralisao esustao" (art. 79, 5, da Lei n8.666/93), no admitindo, por outrolado, a resciso unilateral por iniciativa doparticular.- Ao particular insatisfeito com a prorrogao tcita resta, emqualquer momento aps o transcurso do prazo original, denunciar

    judicialmente o contrato, como expressamente lhe facultam vriosincisos do art. 78 da Lei n 8.666/93, inclusive na hiptese de "noliberao, por parte da Administrao, de rea, local ou objeto paraexecuo de obra, servio ou fornecimento" (inciso XVI).- No proposta a resciso judicial do contrato administrativo,

    cumpre Administrao exigir do contratado o adimplemento desuas obrigaes contratuais e, em no sendo atendida, aplicar aspenalidades cabveis nos termos da legislao pertinente.

    Noticiam os autos que Moura Informtica Ltda fora vencedora em licitao

    promovida pelo TRF/5 Regio para o fornecimento, instalao e configurao de softwares

    de proteo para acesso externo daquele Tribunal. Homologado o certame, foi emitida nota de

    empenho em 18.12.1998, a qual previa o prazo de 30 dias para a entrega do servio e

    pagamento contratada no quinto dia til aps as instalaes. Mediante o Ofcio 006/99,solicitou o TRF o adiamento dos trabalhos, posto faltar a instalao de linha privada de

    comunicao de dados.

    Em 08/02/1999, a empresa pleiteou ao Tribunal o reajuste do preo

    contratado, tendo em vista a brusca e inesperada mudana na poltica cambial brasileira

    responsvel pela desvalorizao do Real, cujo preo do produto licitado havia aumentado

    excessivamente, posto tratar-se de material importado dos Estados Unidos. Em parecer datado

    de 10.05.1999, embora tivesse reconhecido que a responsabilidade pela mora nocumprimento da obrigao fosse do TRF, restou concludo pela impossibilidade de reajusteDocumento: 384002 - Inteiro Teordo Acrdo - Site certificado - DJ: 02/12/2002 Pgina 3de 13

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    do preo, uma vez que a variao cambial estaria includa dentro do risco da atividade

    comercial. Em 12/05/1999, o Presidente daquela E.Corte indeferiu o pedido de recomposio

    de preos, determinando que a empresa implantasse os softwares firewall, sob pena de

    instaurar-se procedimento administrativo para apurao de multas incidentes e suspenso dodireito de licitar.

    Em 14/05/1999, a Moura Informtica informou que no iria fornecer o objeto

    licitado em face do aumento do dlar, o que resultou na instaurao de procedimento

    administrativo, com as garantias da ampla defesa e do contraditrio, restando multada a

    empresa valor de R$ 3.995,00 (Trs MilNovecentos e Noventa e Cinco Reais), e proibida de

    licitar com o servio pblico pelo prazo de 06 (seis) meses.

    Inconformada, a empresa de informtica manejou Mandado de Seguranacontra a referida deciso. fl. 85, foi deferida a tutela liminar, suspendendo-se os efeitos da

    eficcia da deciso que imps as sanes. No mrito, porm, o Tribunal denegou o writ,

    acolhendo a tese sintetizada na ementa acima transcrita.

    Sobreveio o presente Recurso Ordinrio, em cujas razes alega a

    Impetrante/Recorrente que o acrdo violou o art. 78, XVI, da Lei 8.666/93, porquanto o

    Tribunal a quo no reconheceu o seu direito resciso contratual pela mora da administrao

    pblica, tampouco pelo desequilbrio econmico-financeiro do contrato, sustentado na Teoriada Impreviso e no Fato do Prncipe.

    O Ministrio Pblico, atuando no feito como custos legis , opinou no sentido

    do improvimento do Recurso, ao entendimento de que apenas um desequilbrio econmico

    relevante capaz de tornar excessivamente onerosa a execuo do contrato que se aplica a

    Teoria da Impreviso.

    o relatrio.

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    RECURSO ORDINRIO EM MS N 15.154 - PE (2002/0089807-4)

    VOTO

    CONTRATO ADMINISTRATIVO. EQUAO ECONMICO-

    FINANCEIRA DO VNCULO. DESVALORIZAO DOREAL. JANEIRO DE 1999. ALTERAO DE CLUSULAREFERENTE AO PREO. APLICAO DA TEORIA DAIMPREVISO E FATO DO PRNCIPE.1. A novel cultura acerca do contrato administrativo encarta, comonuclear no regime do vnculo, a proteo do equilbrioeconmico-financeiro do negcio jurdico de direito pblico, assertivaque se infere do disposto na legislao infralegal especfica (arts. 57,1, 58, 1 e 2, 65, II, d, 88 5 e 6, da Lei 8.666/93.Deveras, a Constituio Federal ao insculpir os princpios

    intransponveis do art. 37 que iluminam a atividade da administrao luz da clusula mater da moralidade, torna clara a necessidade demanter-se esse equilbrio, ao realar as "condies efetivas da

    proposta".2. O episdio ocorrido em janeiro de 1999, consubstanciado na sbitadesvalorizao da moeda nacional (real) frente ao dlarnorte-americano, configurou causa excepcional de mutabilidade doscontratos administrativos, com vistas manuteno do equilbrioeconmico-financeiro das partes.3. Rompimento abrupto da equao econmico-financeira docontrato. Impossibilidade de incio da execuo com a preveno de

    danos maiores. (ad impossiblia memo tenetur). 4. Prevendo a lei a possibilidade de suspenso do cumprimento docontrato pela verificao da exceptio non adimplet contractus imputvel administrao, a fortiori , implica admitir sustar-se o"incio da execuo", quando desde logo verificvel a incidncia da"impreviso" ocorrente no interregno em que a administrao

    postergou os trabalhos. Sano injustamente aplicvel ao contratado,removida pelo provimento do recurso.5. Recurso Ordinrio provido.

    O

    EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX (Relator): Preliminarmente, presentes ospressupostos gerais de admissibilidade recursal, o presente Recurso Ordinrio merece ver-se

    conhecido.

    O recurso tem xito.

    Ab initio , convm repisar alguns aspectos fticos. Consoante destaca-se do

    relatrio, a Moura Informtica Ltda fora vencedora em licitao promovida pelo TRF/5

    Regio para o fornecimento, instalao e configurao de softwares de proteo para acesso

    externo daquele Tribunal. Homologado o certame, foi emitida nota de empenho em

    18.12.1998, a qual previa o prazo de 30 dias para a entrega do servio e pagamento

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    contratada no quinto dia til aps as instalaes. Mediante o Ofcio 006/99, solicitou o TRF o

    adiamento dos trabalhos, posto faltar a instalao de linha privada de comunicao de dados.

    Em 08/02/1999, a empresa pleiteou ao Tribunal o reajuste do preo

    contratado, tendo em vista a brusca e inesperada mudana na poltica cambial brasileira

    responsvel pela desvalorizao do Real, cujo preo do produto licitado havia aumentado

    excessivamente, posto tratar-se de material importado dos Estados Unidos. Em parecer datado

    de 10.05.1999, embora tivesse reconhecido que a responsabilidade pela mora no

    cumprimento da obrigao fosse do TRF, restou concludo pela impossibilidade de reajuste

    do preo, uma vez que a variao cambial estaria includa dentro do risco da atividade

    comercial. Em 12/05/1999, o Presidente daquela E.Corte indeferiu o pedido de recomposio

    de preos, determinando que a empresa implantasse os softwares firewall, sob pena de

    instaurar-se procedimento administrativo para apurao de multas incidentes e suspenso do

    direito de licitar.

    Em 14/05/1999, a Moura Informtica informou que no iria fornecer o objeto

    licitado em face do aumento do dlar, o que resultou na instaurao de procedimento

    administrativo, com as garantias da ampla defesa e do contraditrio, restando multada a

    empresa valor de R$ 3.995,00 (Trs MilNovecentos e Noventa e Cinco Reais), e proibida de

    licitar com o servio pblico pelo prazo de 06 (seis) meses.

    O prprio acrdo recorrido reconhece como incontroverso o fato de que:

    "(...) poucos dias aps a expirao do prazo original do contrato, jse apresentava evidente o desinteresse da contratada em prosseguircom o contrato, ante afirmada inviabilidade do seu preo por contada mudana da poltica cambial. Mesmo assim no se preocupou emdenunciar o contrato, alimentando a esperana de que oinconveniente viesse aser superado mediante reviso contratual. Frustrada nesta sua expectativa, pleiteou a resciso amigvel, (...)(vide fls. 141/142).

    Deveras, como destaca a recorrente na inicial:

    "Oque ocorreu no Brasil em janeiro desse ano foi muito mais do queuma simples desvalorizao da moeda brasileira, foi uma completa einesperada alterao dapoltica cambial nacional.

    At aquele ms, era utilizado o sistema de bandas fixas, onde ogoverno fixava um valor mximo e um mnimo para o dlar

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    norte-americano, podendo a cotao flutuar dentro desse intervalo. Esse intervalo j vinha sendo mantido e defendido pela reaeconmica do governo por vrios anos, e at poucos dias antes damaxidesvalorizao ocorrida, o ento presidente do Banco Central, oeconomista Gustavo Franco, afirmava com toda a convico e

    segurana que a poltica cambial no iria ser modificada. De repente, quando ningum esperava, houve uma mudana na

    Presidncia do Banco Central e conseqentemente uma mudana nosistema cambial adotado, que passou a ser, conforme denominaodos economistas, o de "bandas endgenas", que logo em seguida deulugara livre flutuao, at agora em vigor. Como pode to drstica e inesperada mudana no cmbio serincluda dentro dos riscos normais de uma atividade comercial. O que estaria includo dentre desse risco seria uma variaodentro das bandas j fixadas pelo governo, ou at mesmo uma

    ampliao dessa banda, mais nunca uma completa mudana napoltica cambial, que culminou com a enorme desvalorizao do realfrete ao dlar norte americano. No caso em tela essa desvalorizao causou um aumento demais de 40% no custo dos equipamentos contratados."

    Releva destacar que a prorrogao do incio do servio contratado que

    operou-se por motivos inerentes ao contratante e a desvalorizao cambial ocorrente nesse

    interregno restaram como "fatos incontroversos", posto admitido por ambas as partes.

    A diferena que a Administrao entendeu "inerente aos riscos da

    atividade " a desvalorizao cambial e impossvel a resciso unilateral do vnculo pelo

    contratado.

    Com efeito, o episdio ocorrido em janeiro de 1999, consubstanciado na

    sbita desvalorizao da moeda nacional (real) frente ao dlar norte-americano, configura

    causa excepcional de mutabilidade dos contratos administrativos, com vistas manuteno do

    equilbrio econmico-financeiro das partes.

    In casu, o objeto do contrato era a instalao de softwares de segurana paraacesso s dependncias externas do Tribunal contratante. Destaque-se que o material, objeto

    de aquisio pela empresa contratada era importado e, conseqentemente, cotado em dlar;

    fato econmico inegvel que culminou, consoante pblica e notria, na quebra de empresas

    de mdio a grande porte.

    Sobre o tema, confira o voto proferido pelo eminente Min. Pdua Ribeiro, no

    REsp 343.617, versando o desequilbrio nas aquisies de veculos importados sob o regime

    de leasing, assentou:" Entretanto, ofato econmico de que se cuida no pode, de nenhum

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    modo, ser tido como uma mera variao do valor da moeda, quedevesse ser suportada pela arrendatria por conta da sua opo derisco. A lea aceitvel em casos como este aquela que pode serantevista normalmente pelo cidado comum com base, apenas, naobservao do histrico da cotao do cmbio, e esta, como

    notrio, apresentava-se estvel h mais de quatro anos, permitindosupor que era uma tendncia segura. Portanto, foroso reconhecerque houve, sim, uma abrupta e imprevista alterao no regimecambial que vigera deste 1994. Antever essa reviravolta com tantaantecedncia, se tal era possvel, s mesmo para privilegiadosespecialistas. Por isso mesmo evidente que diante do quadro econmico que severificava a partir daquele momento, vista do fenmeno inopinado,instalou-se situao insustentvel em que uma das partes passava aauferir vantagem exagerada em prejuzo da outra. precisamente

    para corrigir distores como essa que se presta a aplicao dachamada teoria da impreviso, conforme colocou o percuciente CaioMrio da Silva Pereira:

    ' Os escritores, tanto entre ns quanto no estrangeiro,procuraram adaptar a velha clusula 'rebus sic stantibus' scondies atuais (...) A que, a nosso ver, melhor atende sinjunes sistemticas a da impreviso, aqui afeioada edifundida por ARNOLDO MEDEIROS DA FONSECA. Admitindo-se que os contratantes, ao celebrarem a avena,tiveram em vista o ambiente

    econmico contemporneo e previram razoavelmente para ofuturo, o contrato tem de ser cumprido, ainda que noproporcione s partes o benefcio esperado. Mas, se tiverocorrido modificao profunda nas condies objetivascoetneas da execuo, em relao s envolventes dacelebrao, imprevistas e imprevisveis em tal momento, e

    geradora de onerosidade excessiva para um dos contratantes,ao mesmo passo que para o outro proporciona lucrodesarrazoado, cabe ao prejudicado insurgir-se e recusar a

    prestao. No o justifica uma apreciao subjetiva do

    desequilbrio das prestaes, porm, a ocorrncia de umacontecimento extraordinrio, que tenha operado a mutao deum ambiente objetivo, em tais termos que o cumprimento docontrato implique, em si mesmo e por si s, o enriquecimento deum e empobrecimento do outro. Para que se possa, sob

    fundamento na teoria da impreviso, atingir o contrato, necessrio ocorram requisitos de apurao certa:a) vigncia de um contrato de execuo diferida ou sucessiva;b) alterao radical das condies econmicas objetivas nomomento da execuo, em confronto com o ambiente objetivo noda celebrao;

    c) onerosidade excessiva para um dos contratantes e benefcioexagerado para o outro;

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    d) imprevisibilidade da modificao." (Instituies de DireitoCivil, volume III, 7. edio, pginas 110 e 111).

    No mesmo sentido, as E. Turmas de Direito Privado do STJ acerca do fato

    econmico de 1999 tem assentado:

    "CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL. LEASING.AO REVISIONAL. CDC. APLICABILIDADE. INDEXAO.DLAR NORTE-AMERICANO. VARIAO CAMBIALABRUPTA. IMPREVISIBILIDADE CAPTAO DE RECURSOSEXTERNOS.COMPROVAO. INCIDNCIA DO ENUNCIADON. 7.

    I - No h como deixar de reconhecer no episdio da fortedesvalorizao do real frente moeda norte-americana, ocorrida em

    janeiro de 1999, evento objetivo e inesperado, a ensejar amodificao da clusula contratual de ordem a evitar locupletamentode um contratante em detrimento do outro. Precedentes. Ademais,

    segundo o acrdo recorrido, no ficou provada a aplicao derecursos estrangeiros na aquisio do bem arrendado. Questo quedemandaria reexame deprovas. Enunciado n.7/STJ.

    II - Recurso especial no conhecido." (REsp 412579, Rel. Min.Antnio de Pdua Ribeiro, DJ de 23/09/2002)

    "DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. AO

    DE CONHECIMENTO SOB O RITO ORDINRIO. CESSO DECRDITO COM ANUNCIA DO DEVEDOR. PRESTAESINDEXADAS EM MOEDA ESTRANGEIRA (DLARAMERICANO). CRISE CAMBIAL DE J ANEIRO DE 1999.ONEROSIDADE EXCESSIVA. CARACTERIZAO. BOA-FOBJETIVA DO CONSUMIDOR E DIREITO DE INFORMAO.- O preceito insculpido no inciso V do artigo 6 do CDC dispensa a

    prova do carter imprevisvel do fato superveniente, bastando ademonstrao objetiva da excessiva onerosidade advinda para oconsumidor.- A desvalorizao da moeda nacional frente moeda estrangeiraque serviu de parmetro ao reajuste contratual, por ocasio da crisecambial de janeiro de 1999, apresentou grau expressivo de oscilao,a ponto de caracterizar a onerosidade excessiva que impede odevedor de solver as obrigaes pactuadas.- A equao econmico-financeira deixa de ser respeitada quando ovalor da parcela mensal sofre um reajuste que no acompanhado

    pela correspondente valorizao do bem da vida no mercado,havendo quebra da paridade contratual, medida que apenas a

    sociedade de fomento ao crdito estar assegurada quanto aos riscosda variao cambial.

    - ilegal a transferncia de risco da atividade financeira aoconsumidor, ainda mais quando no observado o seu direito

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    informao " (REsp 417927, Rel. Min. Nancy Andrigui, DJ de01/07/2002)

    Vislumbra-se ante o quadro econmico que o Pas se encontrava nos idos de

    1999, a incidncia irrefutvel da Teoria da Impreviso, que exonera o contratado de suaresponsabilidade, posto que a mudana da poltica econmica para o cmbio flutuante

    produziu lea administrativa, equiparvel ao caso fortuito e fora maior luzentes nos arts.

    1.058 e 1.277 do Cdigo Civil, impondo o restabelecimento do equilbrio

    econmico-financeiro rompido.

    Celso Antnio Bandeira de Mello destaca os efeitos da doutrina da

    impreviso nos contratos administrativos:

    "Agravos econmicos sofridos em razo de fatos imprevisveisproduzidos por foras alheias s pessoas contratantes e queconvulsionam gravemente a economia do contrato. Seria o caso, porexemplo, de acentuada elevao do preo de matrias-primas,causada por desequilbrios econmicos, etc. a "teoria daimpreviso", por via da qual, modernamente, se retoma o vetusto

    princpio da clusula rebus sic stantibus. Entre ns, a teoria daimpreviso perfeitamente acolhida como forma de restaurar as

    previses, consagradas na equao econmico-financeira. Comefeito, o mencionado art. 65, II, "d" , tambm mencionaexpressamente dita hiptese como abrangida nos casos ensejadores

    de restabelecimento do equilbrio inicial. (Curso de DireitoAdministrativo, 12 Edio, p. 562/563).

    Em suma, a novel cultura acerca do contrato administrativo encarta, como

    nuclear no regime do vnculo, a proteo do equilbrio econmico-financeiro do negcio

    jurdico de direito pblico, assertiva que se infere do disposto na legislao infralegal

    especfica (arts. 57, 1, 58, 1 e 2, 65, II, d, 88 5 e 6, da Lei 8.666/93.

    Deveras, a Constituio Federal ao insculpirosprincpios intransponveis do

    art. 37 que iluminam a atividade da administrao luz da clusula mater da moralidade

    tornou clara a necessidade de manter-se esse equilbrio ao realar as "condies efetivas da

    proposta".

    O episdio ocorrido em janeiro de 1999, consubstanciado na sbita

    desvalorizao da moeda nacional (real) frente ao dlar norte-americano, configura causa

    excepcional de mutabilidade dos contratos administrativos, com vistas manuteno do

    equilbrio econmico-financeiro das partes.

    Prevendo a lei a possibilidade de suspenso do cumprimento do contrato pela

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    verificao da exceptio non adimplete contratus imputvel administrao, a fortiori , implica

    admitir sustar-se o "incio da execuo" quando desde logo verificvel a incidncia da

    "impreviso" ocorrente no interregno em que a administrao postergou o comeo dos

    trabalhos. Assiste tambm razo Recorrente sobre o outro aspecto que o presente

    Recurso Ordinrio encerra, qual seja, resciso contratual em face da mora da Administrao

    em liberar o espao para a execuo do trabalho.

    O art. 78, XVI, da Lei 8.666/93 assim determina:

    "Art.78 - Constituem motivo para resciso do contrato:(...)

    XVI - a no liberao, por parte da Administrao, de rea, local, ouobjeto para execuo da obra, servio ou fornecimento, nos prazoscontratuais, bem como das fontes de materiais naturais especificadosno projeto."

    Trata-se, aqui, de fato da administrao que dilargou o incio dos trabalhos,

    uma vez que a linha privada de comunicao de dados no havia sido instalada. Exatamente

    nesse perodo operou-se a abrupta desvalorizao cambial.

    Maria Sylvia Zanella di Pietro, abordando o tema in Direito Administrativo,

    13 Edio, p. 258 conclui:

    "O fato da Administrao distingue-se do fato do prncipe, pois,enquanto o primeiro se relaciona diretamente com o contrato, o

    segundo praticado pela autoridade, no como 'parte' no contrato,mas como autoridade pblica que, como tal, acaba por praticar umato que, reflexamente, repercute sobre o contrato. O fato da Administrao compreende qualquer conduta oucomportamento da Administrao que, como parte contratual, torneimpossvel a execuo do contrato ou provoque seu desequilbrioeconmico. O fato da administrao pode provocar uma suspenso daexecuo do contrato, transitoriamente, ou pode levar a uma

    paralisao definitifiva, tornando escusvel o descumprimento docontrato pelo contratado e, portanto, isentando-o das sanesadministrativas que, de outro modo, seriam cabveis. Pode, tambm,

    provocar um desequilbrio econmico financeiro, dando aocontratado o direito a sua recomposio."

    Doutrinando sobre o tema, o saudoso Hely Lopes Meirelles mencionava

    exatamente esse fato da administrao, ao assentar: "quando a Administrao deixa de

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    Superior Tribunal de Justia

    entregar o local da obra ou servio, ou no providencia as desapropriaes necessrias, ou

    ..." (in Direito Administrativo Brasileiro, 26 Edio, p. 229).

    Ainda a esse respeito, ensina o ProfessorHely:

    "Fato da Administrao toda ao ou omisso do Poder Pblicoque, incidindo direta e especificamente sobre o contrato, retarda ouimpede sua execuo. O fato da Administrao equipara-se foramaior e produz os mesmos efeitos excludentes da responsabilidade do

    particular pela inexecuo do ajuste. (...) Em todos esses casos ocontratado pode pleitear a resciso do contrato, amigvel ou

    judicialmente, por culpa do Poder Pblico; o que no se lhe permite a paralisao sumria dos trabalhos pela invocao da exceo decontrato no cumprido, inaplicvel aos ajustes administrativos, salvo

    se o atraso foi superior a noventa dias (art. 78, XV), como jexpusemos precedentemente." (Ob.cit. p. 229, in fine)

    Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao Recurso.

    o voto.

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    CERTIDO DE JULGAMENTO

    PRIMEIRA TURMA

    Nmero Registro: 2002/0089807-4 RMS 15154/ PE

    Nmero Origem: 9905588345

    PAUTA: 19/11/2002 JULGADO: 19/11/2002

    RelatorExmo. Sr. Ministro LUIZ FUX

    Presidente da SessoExmo. Sr. Ministro FRANCISCO FALCO

    Subprocurador-Geral da Repblica

    Exmo. Sr. Dr. ANTNIO AUGUSTO CSAR

    Secretria

    Bela. MARIA DO SOCORRO MELO

    AUTUAO

    RECORRENTE : MOURA INFORMTICA LTDAADVOGADO : RODRIGO PEREIRA GUEDES E OUTROST.ORIGEM : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A REGIOIMPETRADO : JUIZ PRESIDENTE DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A REGIORECORRIDO : UNIO

    ASSUNTO: Administrativo - Licitao

    CERTIDO

    Certifico que a egrgia PRIMEIRA TURMA, ao apreciaro processo em epgrafe na sessorealizada nesta data, proferiu a seguinte deciso:

    A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr.Ministro Relator.

    Os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros e Francisco Falco votaram com o Sr.Ministro Relator.

    Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Jos Delgado.

    O referido verdade. Dou f.

    Braslia, 19 de novembro de 2002

    MARIA DO SOCORRO MELOSecretria

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