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Seminário Internacional sobre Direito da Concorrência Conselho da Justiça Federal Brasília - 15 de abril de 2005 Maria Paula Dallari Bucci Procuradora Geral do CADE

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Seminário Internacional sobre Direito da Concorrência

Conselho da Justiça Federal Brasília - 15 de abril de 2005

Maria Paula Dallari Bucci

Procuradora Geral do CADE

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Discricionariedade Administrativa e Direito Antitruste.

Limites do Controle Judicial.

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SBDC- sistema administrativo de defesa da ordem econômica

A Lei 8884/94 instituiu uma divisão de atribuições entre Poder Executivo e Judiciário

• Aplicação de sanções e medidas restritivas- competência exclusiva do CADE

• Cessação de práticas- competência comum (art. 29 da lei 8884/94)

• Reparação de danos- idem (Lei 7347/85, art. 3º)

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Competências exclusivas do CADE

• Art. 54- controle preventivo de estruturas: decisão de aprovar, aprovar com restrições (TCD) ou reprovar

• Arts. 20 e 21- controle repressivo de condutas anticoncorrenciais: condenar ou não condenar, ou suspender o processo administrativo (TCCP)

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Iniciativa

• Iniciativa do processo administrativo (SBDC)- Secretaria de Direito Econômico

• Iniciativa do processo judicial- empresa, Ministério Público, CADE ou terceiros

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Natureza da decisão do CADE

• Decisão administrativo-judicante

• Art. 3º- “órgão judicante”, autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça

• Art. 83- aplicação subsidiária do Código de Processo Civil

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CADE como “perito” da concorrência

• Art. 89 da Lei 8884:

“Nos processos judiciais em que se discuta a aplicação desta Lei, o CADE deverá ser intimado para, querendo, intervir no feito, na qualidade de assistente.”

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Ilustrando com um caso prático...

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O caso

O Shopping Center A impõe a algumas das lojas nele instaladas cláusula de exclusividade, pela qual o locatário não poderá instalar filiais em outros shoppings apontados no contrato.

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Representação

A Representante, um shopping concorrente, Shopping B, alega que os interessados em alugar espaços no seu empreendimento têm desistido de fazê-lo, constrangidos pela exigência do Shopping A.

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O problema concorrencial

“ (...)referido mecanismo contratual passou a ter como objetivo impedir ou dificultar o normal funcionamento do negócio dos shopping centers concorrentes expressamente citados nos contratos de locação. A Representante concorda que os shoppings têm o direito legítimo de inserir cláusula de proteção contra concorrência predatória, mas considera que neste caso há abuso de direito” (extraído do Relatório)

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Defesa no processo administrativo

A Representada alega que a conduta não é anticompetitiva, pois:

• não detém poder de mercado suficiente para causar efeitos anticompetitivos;

• a intervenção no contrato livremente pactuado seria indevida intervenção estatal e infringência ao princípio da livre inciativa;

• apenas 40% dos locatários tinham a cláusula restritiva em seus contratos.

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Trâmite do processo administrativo

• Representação protocolada em dezembro de 1998

• Parecer da SDE em maio de 2001

• Julgamento final pelo CADE em março de 2004 - duas sessões, com pedido de vista de um dos Conselheiros (voto divergente)

• Tempo total no SBDC- 4 anos e meio

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Fundamentos técnicos da decisão administrativa

1) Mercado relevante:

– produto: shopping centers regionais, não abrangendo o comércio varejista de rua

– geográfico: área de atuação do shopping, aproximadamente Zonas X, Y e Z da cidade

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Fundamentos técnicos da decisão administrativa

2) Poder de mercado - O Shopping conseguia impor preços (aluguéis) muito acima de seus custos marginais.-Apesar de mais de 70% dos lojistas considerarem prejudicial a cláusula de exclusividade, todos estavam dispostos a pagar os altos preços impostos para estar no Shopping A-“(...) o comportamento do shopping de cobrar preços muito acima de seus concorrentes denota sua capacidade de agir de maneira indiferente e independente aos outros agentes.”

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Fundamentos técnicos da decisão administrativa

3) Prática das condutas

- Configurado abuso de posição dominante: a) o Shopping detinha 29% do mercado relevante de shopping centers regionais de alto padrão e b) limitava a esfera de atuação de seus concorrentes, que não poderiam contar com as lojas de “alto padrão” (barreira artificial à entrada).

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4) Racionalidade econômica da conduta: a cláusula de exclusividade dificulta aos concorrentes apresentarem a mesma diferenciação no alto nível mantida pelo Shopping A.

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Decisão condenatória do CADE

O Plenário decidiu, por maioria (4x2) que a Representada havia limitado o acesso de novas empresas ao mercado e criado dificuldades ao desenvolvimento de empresa concorrente (art. 20, I c/c 21, IV e V da Lei 8884/94).

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O processo judicial

• Ação ordinária de nulidade de acórdão com pedido de medida cautelar incidental.

• A ação foi proposta em face da decisão administrativa do CADE, que impôs multa de 1% do faturamento bruto da empresa no ano anterior, além da cessação imediata da prática, inserção da empresa no CNDC e publicação da decisão em jornal de grande circulação nacional (art. 23 da Lei 8884).

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Medida cautelar concedida• Suspensão dos efeitos da decisão do CADE• Decisão baseada em argumentos econômicos:

questionamento do mercado relevante fixado pelo CADE (com base no voto divergente)

“... O CADE (...) foi longe demais ao segmentar [o mercado relevante] em mais duas operações, chegando, enfim, a um suposto, subsubmercado (dentro do submercado dos shopping centers regionais), identificado como sendo o de shopping centers regionais de alto padrão, o que, obviamente, superdimensionou a importância do Shopping A, fazendo crer que ele efetivamente teria a chamada ‘posição dominante’ no mercado.”

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Fundamentos da medida cautelar- “No que tange à substituibilidade ou não dos lojistas (e

suas marcas), estabelecidos com exclusividade no Shopping A, com vistas a se verificar se isso limitaria os estabelecimentos concorrentes na formação do seu próprio tenant mix (combinação ou mistura de lojas dentro do shopping), o elemento dúvida foi uma constante confessa do voto-condutor. Tenho para mim que as marcas associadas exclusivamente ao Shopping A são passíveis, sim, de substituição, seja pelos outros shoppings, seja pelos consumidores, por outras marcas similares, o que, em tese, não teria o condão de prejudicar a livre concorrência. Agora, respeitando a dúvida suscitada no âmbito do CADE, o mínimo que se esperaria era que tal questão fosse levada em consideração a favor das autoras, em razão de seu estado de ‘representadas’ num processo punitivo, e não o contrário, o que efetivamente aconteceu.”

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Quais os limites da revisibilidade judicial das decisões do CADE?

• Art. 5o, XXXV, da CF- inafastabilidade do controle jurisdicional

• Não há limites para a amplitude de reapreciação do juiz?

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Alguns argumentos sobre os limites...

• Decisão do CADE é altamente técnica• Decisão administrativa construída ao longo de

um processo, com as seguintes etapas: parecer SEAE (econômico), parecer SDE (jurídico-econômico), parecer ProCADE (jurídico), parecer MPF (art. 12 da Lei 8884/94, jurídico)

• Cada um dos elementos do processo (mercado relevante, poder de mercado, condutas, racionalidade econômica) é submetido a contraditório ao longo da instrução administrativa.

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Mais alguns argumentos, de ordem jurídico-institucional

• Julgamento do processo administrativo por um órgão colegiado especializado, composto de 7 membros, com formação em Economia e Direito, nomeados pelo Presidente da República após aprovação do Senado

• Separação de poderes, art. 2º da CF

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O argumento da doutrina administrativista tradicional

“O Poder Judiciário pode examinar os atos da Administração Pública, de qualquer natureza, sejam gerais ou individuais, unilaterais ou bilaterais, vinculados ou discricionários, mas sempre sob o aspecto da legalidade e, agora, pela Constituição, também sob o aspecto da moralidade (arts. 5o, inciso LXXIII, e 37)” Maria Sylvia Zanella Di Pietro

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Versão moderna do argumento da insindicabilidade do mérito dos

atos administrativos

• Controle da qualificação jurídica dos motivos

• Sentido ampliado e substantivo do controle de legalidade

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Síntese

• As decisões do CADE resultam de um processo específico, que a lei atribuiu a uma autarquia do Poder Executivo;

• Em regra, há uma fundamentação técnica bastante complexa a embasá-las

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Síntese

• O objeto do controle judicial é a legalidade substantiva (regularidade do processo e a higidez da decisão administrativa, no tocante à sua fundamentação interna).

• A referência do processo judicial deve ser o processo administrativo, não as práticas anticoncorrenciais.

• Seria temerário que o processo judicial substituísse a fundamentação técnica da decisão do CADE por uma avaliação “ad hoc” dos aspectos econômicos do caso.

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Obrigada!