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SENTIMENTOS E EMOÇÕES A magia dos contos

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SENTIMENTOS E EMOÇÕES

A magia dos contos

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José Araújo

SENTIMENTOS E EMOÇÕES

A magia dos contos

Rio de Janeiro

2010

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Copyright© 2010 por José Araújo

Título Original:Sentimentos e Emoções – A magia dos contos

Editor-chefe:Tomaz Adour

Revisão:Sonia Camara

Editoração Eletrônica:Bernardo Franco

Capa:Eduardo Nunes

Conselho editorial:Tomaz AdourBarbara CassaráWaldomiro Guimarães Jr.

Usina de LetrasRua Conde de Irajá, 90 - Botafogo – (021) 2539-7909 Rio de Janeiro – RJ – CEP: 22271-020SCS Quadra 01 Bloco E - Ed. Ceará sala 809 Brasília – DF – CEP: 70303-900www.editorausinadeletras.com.br

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Para meus excepcionalmente maravilhosos e adorá-veis filhos, Bruno, Mariana e David, que não só fizeram mi-nha vida valer a pena, mas também, cada um de vocês ao seumodo, me permitiu vivenciar e compreender com alegria eprazer, o que é a grandeza de ser pai. Eu celebro o fato de tê-los a cada minuto de minha vida e admiro cada um de vocês,muito mais do que eu possa dizer.

Que no futuro Deus os abençoe, como eu sou, com fi-lhos como vocês.

Com todo meu amor,

Papai.

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SUMÁRIO

7 INTRODUÇÃO

9 REAPRENDENDO A VIVER

20 A ESPERA

37 UM PEDIDO ESPECIAL

43 O QUE VOCE QUER SER QUANDO CRESCER?

49 O PATUÁ

60 LÁGRIMAS DE DEUS NO CÉU DO SERTÃO

66 A DECISÃO

71 CAÇADOR DE CONCHAS

76 ESTRELA CADENTE

81 A PERSEGUIÇÃO

88 UM ESCRITOR NA PRISÃO

101 PARÁBOLAS DE UMA VIDA

105 A ÁRVORE DO CONHECIMENTO

118 A MANSÃO DOS ESPELHOS

128 O REENCONTRO

135 O GRANDE CONCURSO

139 PROCURANDO POR DEUS

147 OS JARDINS DO PARAÍSO

156 UMA JANELA PARA A ALMA

161 OS ALIENÍGENAS

166 A ARCA DE NOÉ DO SÉCULO XXI

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INTRODUÇÃO

Os contos têm o poder de transmitir mensagens quechegam diretamente aos nossos corações e, uma vez que alinguagem do coração é universal, essas mensagens são com-preendidas por todos ao redor do planeta e, quem sabe até,além das fronteiras do Universo.

Tendo escrito desde a juventude, em 1998 já tinhauma grande quantidade de contos escritos que se acumula-ram ao longo dos anos. Com o milagre da internet vi achance de levar minhas reflexões a todo o País e também aoexterior. A partir da pri- meira publicação, só recebia co-mentários dos leitores agradecendo por eu ter comparti-lhado com eles meus contos. Foram inúmeras as vezes emque, no final de comentários feitos nas postagens em meuBlog, eu pude ler a mesma frase: “José, eu adoro ler seus contos!”

Durante anos publiquei semanalmente um conto di-ferente, abordando sentimentos e emoções no intuito de le-var aos leitores mensagens de paz, amor, esperança e princi-palmente de fé, sem focar em nenhuma religião emespecífico, pois não importa qual seja a nossa: Deus é um sóe está em todo lugar.

Procuro desenvolver meus contos a partir de situa-ções vividas por todos nós no cotidiano e, assim, relatando avida como ela é; usando realidade, fantasia e ficção, minhasmensagens de otimismo e reflexão são transmitidas deforma simples e facilmente compreendidas por todos. Afi-nal, quando se trata de sentimentos, somos todos iguais.

Este é meu segundo livro e, como o primeiro, foi es-crito para todas as idades. Nesta obra, trago ao leitor mais al-guns de meus contos, escritos de forma simples, de coração,com o coração. É na simplicidade que encontramos as gran-des verdades.

José Araújo

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REAPRENDENDO A VIVER

Paris. Tudo começou num dia qualquer do mês deagosto, há não muito tempo atrás. Sua vida antes vazia e semgraça começou a mudar como que por encanto, desde o diaem que chegou à cidade luz.

Sucesso, realização profissional, dinheiro, status, esta-bilidade financeira. Ele achava que tinha tudo que precisavana vida. Era no trabalho duro e constante que, Gabriel pen-sava, um dia iria encontrar finalmente a tão sonhada felici-dade. Contudo, dentro dele, mesmo que não admitisse isto,nem para ele mesmo, havia um enorme vazio que ele não sa-bia como preencher.

Por vezes vagamos por caminhos errados procurandosermos felizes. Andamos longas distâncias. Tropeçamos emtantas pedras. Escorregamos e quase caímos em despenha-deiros profundos, sem ter noção do perigo que corremos.Perdemos tanto tempo seguindo mapas ou indicações de ou-tras pessoas sobre onde poderíamos encontrar a tal felici-dade, sem termos sucesso, quando tudo que tínhamos a fa-zer era ouvir a voz de nossos corações; mas infelizmente,nem sempre a coisa funciona assim. Alguns têm sorte deacordar a tempo para a vida e vivê-la em toda a sua pleni-tude, outros se vão, sem viver.

2005. Em viagem de negócios, lá estava ele, hospe-dado no “Le Montmartre Hotel”, quarto 36, no 3º andar doestonteante edifício de estilo romanesco, todo pintado debranco, o que lhe conferia uma aura de paz e tranquilidade.A única coisa que o estava incomodando era que seu Black-Berry, como sempre, não parava de tocar. A todo instante eletinha que checar sua caixa de e-mails para ficar ciente daspossíveis alterações quanto à reunião que iria acontecer na-quele dia. O sol tinha acabado de acordar de seu descansonoturno e Gabriel também. A vida francesa o cativou logo

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pela manhã quando um cheiro forte, agradável e envolventeo acordou. Era o aroma das baguetes frescas que tinham aca-bado de sair de uma fornada na padaria do outro lado darua. O quarto, que estava meio sem vida desde que ele che-gara na noite anterior, de repente ressuscitou com o cheiroque preencheu o ambiente de canto a canto. O azul claro dasparedes, com as janelas abertas, parecia se fundir com o azuldo céu limpo e claro que havia lá fora. Tudo, sem exceção,lhe dava uma sensação de que nada poderia ser mais harmo-nioso, mas o alerta de seu BlackBerry soou de novo indi-cando nova mensagem de texto. Ele resolveu ler depois.

Uma simples batida na porta de seu quarto, sem queele esperasse, e seu dia começou perfeito.

– “Le petit dejeneur est servi”.A voz, que parecia ser de uma jovem, soou um tanto

estranha. Talvez por estar um pouco incomodada pelo fatode estar trabalhando tão cedo, quando o sol mostrava seusprimeiros raios na capital francesa. Gabriel percebeu em suavoz certo sotaque brasileiro e, curioso para ver quem era, foiatender. Quando abriu a porta, a jovem já se dirigia a outroquarto com o carrinho e ele achou que ela caminhava deuma maneira engraçada. Enquanto ela se afastava, o salto deseu sapato fazia um leve barulho no assoalho de madeira aolongo do corredor. Quando ele olhou para baixo, bem emfrente aos seus pés, uma magnífica bandeja de prata, repletade delícias francesas, esperava que fosse apanhada e levadapara dentro.

Por incrível que lhe parecesse, de cada pedaço de seucafé da manhã subia uma leve fumaça que pareceu enfeitiçá-lo pelo aroma maravilhoso. Encantado, Gabriel sonhavaacordado. Ele via em sua mente as cenas de filmes antigossobre Paris, como o La Vie Parisiénne que assistira quandoainda era muito jovem. Croissants quentinhos o estavamchamando pelo nome para serem comidos. O café então, estepreenchia o quarto, de canto a canto com seu aroma incrivel-

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mente delicioso. As baguetes que o acordaram logo cedo es-tavam bem à sua frente, quase lhe implorando para seremmordidas. Depois de consumir quase tudo que lhe foi ser-vido, ele finalmente leu a mensagem recebida e ficou sa-bendo que sua reunião tinha mudado de horário. Ela seriarealizada no período da tarde e sendo assim, depois de lon-gos anos sem alguns momentos de folga, ele resolveu que iriasair para uma caminhada e encarar o dia maravilhoso de solque fazia em Paris.

O hotel onde ele estava hospedado parecia estar ani-nhado aos pés da praça de Montmartre. Ainda era muitocedo quando ele o deixou. Mal saiu para a rua e já pôde ver eouvir as pessoas caminhando e conversando na praça quaseem frente ao edifício. De repente, acomodados em círculos,como numa galeria a céu aberto, os lendários artistas deMontmartre estavam lá, bem na sua frente. Todos eles pare-ciam prontos para vender, com alguma peça de arte, um pe-daço de suas almas, pois tudo que faziam tinha sempre partedelas. Eram tantas e tão belas peças de vários estilos diferen-tes, que ele ficou extasiado diante da diversidade de coresmixadas em telas de todos os tamanhos e formas. Atônitocom tanta beleza, ele observava tudo com extrema atenção.Era extraordinário ver como as mãos ágeis daqueles artistasdesenhavam círculos e linhas perfeitas. Eles conseguiam darvida e forma a coisas que para Gabriel não tinham nada deinteressante. Davam a tudo, em que tocavam com sua arte,um significado através de cores e formas. Gabriel percebeuque cada pessoa que passava em frente às obras de arte ficavaabsorta em pensamentos. Era como se a arte daqueles artis-tas os levassem a outra dimensão, onde tudo que estivesse àsua volta, além daqueles objetos, não significasse mais nada.Fascinado, ele lembrava de que nunca em sua vida tinha se-quer parado para admirar a beleza de uma flor.

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Os artistas pareciam estar todos em outro mundo.Tudo que lhes importava era criar e dar formas à sua imagi-nação. Envolvendo o ambiente mágico daquela galeria a céuaberto, havia uma música que, com seus acordes, parecia to-car a alma de todos que estavam lá. Ele ficou um longotempo admirando, apaixonado, aqueles homens e mulheres,que faziam de sua própria vida uma obra de arte. Quantacoisa linda ele deixara de ver e conhecer em sua vida tão cor-rida e sem tempo para nada, muito menos para si mesmo epara aqueles que o amavam. Um tempo depois, quando re-solveu sair da praça, outro estágio daquele mundo mágico eencantador surgiu à sua frente. Uma velha senhora estavaem pé no meio de uma multidão que a rodeava. Ela tocavaalgo que parecia ser um antigo instrumento tradicional damúsica francesa. Desconhecido para Gabriel, era algo quelembrava muito uma sanfona nordestina, mas com for-mas muito diferentes. Ela tocava sem parar, fazendo soar emcada canto do lugar uma estranha mas encantadora canção,que arrebatava a atenção e o coração de todos que por lápassavam.

Quando chegou a Paris na noite anterior, ele estavasem a menor inspiração. Tudo que ele sabia é que estava lá,como esteve em muitos outros países apenas por obrigação.Tinha um dever a cumprir e nada mais. O que ele queria eraacabar logo com o que tinha ido fazer e poder voltar para oRio de Janeiro, onde seu trabalho o esperava e havia muito aser feito. Ele não parava nunca. Já havia morado em SãoPaulo e em tantas outras capitais do Brasil. Viver em cidadesgrandes e barulhentas já era rotina em sua vida. Paz, sossegoe inspiração, eram coisas com que ele nem se preocupava, oupelo menos achava que não. Gabriel não tinha ido procurarinspiração em Paris, mas foi lá que aos poucos sua vida mu-dou e tudo aconteceu de uma forma que ele nunca poderiater imaginado. Mais à frente, sem estar preparado para tal,outra surpresa surgiu em seu caminho. Depois de andar al-

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guns quarteirões apreciando os cafés, padarias e bares locais,com pessoas elegantemente sentadas em cadeiras nas calça-das, conversando e saboreando as delícias locais, lá estavaela, dominando tudo à sua volta com sua glória, atraindomultidões com sua magnificência. De um branco celestial,com seus mínimos detalhes tão perfeitos que nem pareciamser reais, com sua estrutura prevalecendo sobre qualquer ou-tra nas proximidades, causando espanto e admiração por suagrandeza e beleza: “La Basilique du Sacre-Coeur de Mont-martre”. Uma das mais magníficas visões de arte arquitetô-nica de todos os tempos.

Ao aproximar-se dela, Gabriel se emocionou ao ler assimples palavras que estavam gravadas numa pedra, e seucoração se encheu de paz, de fé e da crença de que Deusexiste e está em todo lugar. Fazia muito tempo que ele não selembrava de nosso criador. Era católico, mas não frequen-tava igrejas. Para ele, santuários como aquele não passavamde construções monumentais, mas as frases lá escritas, queeram uma mensagem de boas vindas a todos que por ela pas-sassem, tocaram profundamente o seu coração. Por váriasvezes ele as leu antes de resolver seguir caminho. Gravadasna pedra elas diziam:

“Sejam bem vindos!”“Peregrinos, visitantes ou apenas caminhantes; “Aqui, Deus lhes dá as boas vindas e sentido à sua

vida! “Aqui, Deus espera por você para lhe oferecer todo

seu amor! Com lágrimas nos olhos, ainda muito emocionado,

sentindo no peito uma paz que nunca sentira, em dado mo-mento sua atenção desviou-se para uma velha senhora, queestava sentada nas escadarias de mármore perolado daigreja. Ela tinha as mãos mais velhas que ele já tinha visto emtoda a sua vida, mas elas se moviam com uma agilidade e ra-pidez incrível, tricotando um casaco para o pequeno prín-

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cipe que estava sentado ao seu lado. Numa questão de se-gundos, Gabriel viu unirem-se diante dele duas gerações tãodiferentes. O pequeno anjo que estava com a cabeça encos-tada no ombro da velha mulher tinha cabelos loiros e cache-ados, que o fazia lembrar um querubim. Foi mais um mo-mento da mais pura emoção. Ele pode ler nos olhos dogarotinho que ele sabia que ainda havia muito trabalho a serfeito, mas estava lá, sorrindo de vez em quando enquantodeslizava seus dedinhos sobre a parte do casaco que já estavafeita. Seus olhos brilhavam de emoção e excitação. Certa-mente, ele estava ansioso pelo resultado final.

Era possível enxergar no olhar e no sorriso do garoti-nho sua alegria e felicidade, quando seu casaco estivessepronto e pudesse ser vestido. Aquela foi mais uma cena que otocou profundamente, como ele nunca achou que poderiaacontecer. Gabriel se esqueceu do motivo pelo qual tinha idoa Paris. Aos poucos, sem mesmo saber que estava acon-tecendo, ele estava reaprendendo a viver, a dar valor às pe-quenas grandes coisas da vida. Envolto pela magia da cidadeluz, sem acreditar que estava tendo aqueles pensamentos, elesonhava em um dia poder mudar-se para lá e viver outravida. A vida simples e absolutamente mágica que ele ha-via descoberto naquelas poucas horas, caminhando pelobairro de Montmartre desde que saiu do hotel após o seucafé da manhã.

Seu BlackBerry tocou mais uma vez. Contudo, outravez o cheiro de baguetes frescas, vindo agora de outra pada-ria nas redondezas, foi mais forte e desviou sua atenção docelular. Ele não atendeu à ligação. Gabriel sacudiu a cabeça eriu de si mesmo. Ele não estava acreditando no que estavalhe acontecendo naquele lugar. Como poderia ele, um ho-mem de negócios, que não tinha nem tempo para respirar,sonhar em se libertar de todas as suas responsabilidades, detodos os seus compromissos inadiáveis e suas obrigaçõesforçadas pelas engrenagens desumanas do mundo dos negó-

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cios? Desde que se entendeu por gente e começou a traba-lhar, sua vida nunca mais fora dele. Viveu quase uma vida in-teira dedicada a fazer o que os outros queriam que elefizesse. Afinal, no mundo dos negócios, os anseios e desejosdo ser humano não importam. Nele, cada membro da ditasociedade dos homens é um objeto que, após ter sido usadoaté o desgaste total, é substituído por outro que, por sua vez,também é considerado de utilidade para o sistema enquantoestiver produzindo. Quando não tiver mais condições físicasou psicológicas para continuar, é deixado de lado, sem aomenos receber uma explicação justa e honesta do porquê.Depois de ter tomado um táxi em Montmartre indo em dire-ção aos Champs de Mars, passando pelos Champs Elyseés,ao virar uma esquina, perto da Place Du Trocadéro, ele pe-diu ao motorista para parar.

Caminhando devagar, conhecendo e admirando tudoà sua volta, ao virar uma esquina, os murmúrios de umamultidão ao longe, o fizeram seguir em sua direção. Mesmoreceoso sobre o que iria encontrar, sua curiosidade era muitoforte para que ele deixasse de ir até onde estavam aquelaspessoas que faziam todo aquele barulho. Ao virar outra es-quina, sua atenção foi atraída para o seu lado esquerdo e aose virar, ele não pode acreditar no que estava vendo. No meiode uma verdadeira massa de pessoas, dedos apontavam paracima, flashes de câmeras eram disparados um atrás do outro,vozes de homens, mulheres e crianças em todas as línguas semisturavam no ar pronunciando palavras de exclamação eadmiração que eram ouvidas por toda parte. Era como seuma grande celebridade estivesse diante deles. Uma verda-deira multidão de pessoas estava olhando admirada paraaquele símbolo, para aquela estrela sem igual.

Gabriel ficou perplexo. Trezentos e vinte e quatro me-tros de ferro envelhecido, ainda tão longe dele, mas aos olhosde sua mente tão palpáveis. Colossal, inspiradora, esplên-dida, um dos pouquíssimos monumentos reconhecidos por

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todos ao redor do mundo. Mudo, sem pronunciar uma únicapalavra, ele não pode deixar de compará-la com uma rainhaque estava em pé naquele lugar, olhando lá de cima seus sú-ditos cá embaixo. Vendo a Torre Eiffel predominando osChamps de Mars, com toda a sua magnificência e grandeza,convivendo lado a lado até mesmo com uma pequena flor,que à sua maneira, era tão ou mais bela do que a própriatorre, fez com que Gabriel tomasse uma decisão que muda-ria sua vida para sempre.

Naquela tarde, ele não compareceu à reunião de ne-gócios que tinham marcado para ele no Hotel de Ville noMarais. Os executivos que o aguardaram por mais de 2 ho-ras, nervosos e impacientes, desistiram de esperar e indigna-dos com a ausência de Gabriel, foram embora para seus ho-téis, prometendo que aquilo não iria ficar assim.

Naquela tarde seu BlackBerry bateu o record de avi-sos de mensagens e toques de ligações. Gabriel não atendeu.

Enquanto aqueles homens de negócios, tanto os cli-entes de sua empresa quanto seus colegas de trabalho, ti-nham fortes dores de cabeça, até azia e mal estar pelo quetinha acontecido, Gabriel percorria todos os lugares da ci-dade e nem sentia o tempo passar. Partindo de onde estava,aos pés da Torre Eiffel, com a ajuda de um taxista cheio degentileza e atenções, ele rumou para Saint Germain, conhe-ceu o Quartier Latin, onde era difícil encontrar alguém quefalasse francês. Conheceu o Palais de Justice e depois pas-seou de Bateau Mouche pelo rio Sena. Mais ao final da tarde,ainda com um céu azul anil, sentindo-se mais leve do quenunca, ele foi para o Marais e de lá seguiu rumo a Saint Mar-tin, onde jantou às margens do canal. Já era tarde da noitequando ele voltou ao Montmartre Hotel e, mesmo àquelashoras, seu BlackBerry não parava de tocar.

Após uma agradável noite de sono, como há muitoele não tinha, mais uma vez acordou pela manhã com ocheiro das baguetes frescas da padaria do outro lado da rua.

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Gabriel levantou-se, tomou um banho demorado ouvindomúsicas de Piaf que sempre curtira e depois tomou seu caféda manhã com todo o prazer, degustando cada pedacinho deseu croissant fresquinho, coisa que antes ele não fazia porquenão tinha tempo. Sua vida tinha mudado. Ele já não era omesmo desde sua primeira manhã em Paris.

Seu BlackBerry tocou. Na telinha uma mensagem detexto apareceu. Reunião importante. Rio de Janeiro. Ama-nhã. 19 horas. Hotel Copacabana Palace. Gabriel leu amensagem, olhou para cidade lá fora, olhou de novo para oseu BlackBerry, levantou-se e foi até a porta do banheiro,deu uma parada, um pouco pensativo, mas logo entrounele por uns instantes. Depois de dar descarga no vaso sani-tário, ele saiu, voltando para o quarto onde arrumou as ma-las para partir.

Galeão, Rio de Janeiro. Ao se aproximar do aero-porto, da janela do avião, a imagem do Cristo Redentor comos braços abertos parecia ser um convite para um abraço ca-rinhoso. Pouco depois, o voo vindo da França havia pousadoe os passageiros começaram a desembarcar. Um grupo deexecutivos o aguardava no portão de desembarque com ansi-edade e nervosismo. Gabriel era o homem chave para o fe-chamento de um grande contrato naquele dia. Mas o que elenão sabia era que o grupo empresarial para quem trabalhavatinha um plano para demiti-lo logo depois de efetivada atransação, para que seu cargo fosse ocupado por outra pes-soa: mais jovem, inexperiente, mas amiga do filho do Dire-tor Presidente. Após a assinatura do tão desejado contrato,que segundo o cliente, só seria assinado com a presença deGabriel, ele receberia o famoso bilhete azul e sua carreira nomundo dos negócios, aos 45 anos, teria um triste fim.

Muitas pessoas saíam pelo setor de desembarque e ogrupo de executivos estava cada vez mais ansioso pela che-gada de Gabriel. Eles esperavam que ele já estivesse prontopara a reunião que seria dentro de meia hora. Um sorriso se