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SIM PÓSIO Questionamentos éticos relativos à graduação e à Residência Médica Délio José Kipper Jussara Azambuja Loch Os autores, partindo dos objetivos da formação médica, consideram que estes só podem ser atingidos com a participação de pacientes como sujeitos no processo de ensino-aprendizagem e mostram os riscos e benefícios neste contexto. Levantam o problema de como realizar esta tarefa sem desrespeitar a dignidade das pessoas doentes, contemplando seus direitos de parti- cipação nas decisões sobre sua saúde. Do ponto de vista ético, apresentam os princípios e valo- res que podem justificar o fato de ter graduandos de medicina e médicos residentes participan- do dos cuidados de pacientes. Após analisar a fundamentação ética para justificar este treina- mento em serviço, apresentam algumas recomendações para a realidade brasileira e concluem chamando a atenção para as responsabilidades de todos os envolvidos na formação dos médi- cos. Unitermos: formação médica, ética, responsabilidade, pacientes-sujeitos Délio José Kipper Coordenador do CEP-PUCRS; médico pediatra – mestre em Pediatria; presidente da Sociedade Riograndense de Bioética; vice- presidente da Sociedade Brasileira de Bioética e membro do Conselho Editorial da revista Bioética Jussara Azambuja Loch Médica pediatra; professora assistente do Departamento de Pediatria da PUCRS; mestre em Bioética pela Universidade do Chile 107 128 No Brasil, segundo dados da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), 71,41% do total dos médi- cos formados em 1996 entraram em algum programa de Residência Médica. A grande procura por especialização e maior treinamento em serviço decorre de fatores varia- dos, como a perda da qualidade do ensino médico, o cres- cimento desordenado de escolas médicas e o aumento progressivo do conhecimento e das tecnologias aplicadas à medicina, que geram a impossibilidade de um treina- mento adequado durante o curso de formação, além da exigência cada vez maior da sociedade quanto à capacita- ção profissional (1). INTRODUÇÃO Bioética 2002 - vol. 10 - nº 2 Job006 Rev Bioetica N5 final 11/25/02 4:33 PM Page 107

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Questionamentos éticos relativos à graduação e à Residência Médica

Délio José KipperJussara Azambuja Loch

Os autores, partindo dos objetivos da formação médica, consideram que estes só podem seratingidos com a participação de pacientes como sujeitos no processo de ensino-aprendizageme mostram os riscos e benefícios neste contexto. Levantam o problema de como realizar estatarefa sem desrespeitar a dignidade das pessoas doentes, contemplando seus direitos de parti-cipação nas decisões sobre sua saúde. Do ponto de vista ético, apresentam os princípios e valo-res que podem justificar o fato de ter graduandos de medicina e médicos residentes participan-do dos cuidados de pacientes. Após analisar a fundamentação ética para justificar este treina-mento em serviço, apresentam algumas recomendações para a realidade brasileira e concluemchamando a atenção para as responsabilidades de todos os envolvidos na formação dos médi-cos.

Unitermos: formação médica, ética, responsabilidade,pacientes-sujeitos

Délio José KipperCoordenador do CEP-PUCRS; médicopediatra – mestre em Pediatria;presidente da SociedadeRiograndense de Bioética; vice-presidente da Sociedade Brasileirade Bioética e membro do ConselhoEditorial da revista Bioética

Jussara Azambuja LochMédica pediatra; professoraassistente do Departamento dePediatria da PUCRS; mestre emBioética pela Universidade do Chile 107 128

No Brasil, segundo dados da Comissão Nacional deResidência Médica (CNRM), 71,41% do total dos médi-cos formados em 1996 entraram em algum programa deResidência Médica. A grande procura por especializaçãoe maior treinamento em serviço decorre de fatores varia-dos, como a perda da qualidade do ensino médico, o cres-cimento desordenado de escolas médicas e o aumentoprogressivo do conhecimento e das tecnologias aplicadasà medicina, que geram a impossibilidade de um treina-mento adequado durante o curso de formação, além daexigência cada vez maior da sociedade quanto à capacita-ção profissional (1).

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Este panorama demanda uma criteriosa análi-se contextual tanto dos currículos da gradua-ção quanto dos programas de ResidênciaMédica, levando em consideração não só aprodução do conhecimento e o treinamento dehabilidades como também a aplicabilidadedeste saber à realidade social do país. E, forte-mente vinculado a estas questões, está o pro-blema de como realizar estas tarefas sem des-respeitar a dignidade das pessoas doentes, con-templando seus direitos de participação nasdecisões sobre sua saúde. Do ponto de vistaético, isto significa buscar os princípios e valo-res que possam justificar o fato de se ter gra-duandos de medicina participando dos cuida-dos de pacientes e ter médicos em processo deespecialização praticando atos médicos com-plexos.

O presente artigo tem por objetivo levantaralgumas das questões envolvidas nesta proble-mática e apresentar sugestões para a realidadebrasileira. Iniciaremos pela descrição dos obje-tivos da graduação e da residência médicas, soba perspectiva das políticas públicas de educa-ção, das necessidades dos indivíduos em for-mação, dos atributos necessários aos precepto-res nesta função e dos riscos e benefícios de serpaciente num ambiente de treinamento médi-co. Posteriormente, analisaremos a fundamen-tação ética para justificar o treinamento emserviço de alunos e profissionais em formação,para finalmente sugerirmos algumas recomen-dações.

1. Objetivos da formação médica

1.1. A perspectiva do Poder Público

1.1.a. Objetivos dos cursos de graduaçãoem Medicina

O Parecer nº 1.133/2001, da Câmara deEducação Superior do Conselho Nacional deEducação, de 3 de outubro de 2001, instituias diretrizes a serem aplicadas nacionalmentena organização, desenvolvimento e avaliaçãodos projetos pedagógicos dos cursos deMedicina (2). Neste documento, o perfil doformando em medicina é caracterizado comoum profissional com formação generalista,humanista, crítica e reflexiva. Pautado porprincípios éticos adequados, deve estar capaci-tado a atuar no processo saúde-doença, emseus diferentes níveis de atenção, com ações depromoção, prevenção, recuperação e reabilita-ção da saúde, com uma perspectiva de integra-lidade da assistência, com senso de responsabi-lidade social e compromisso com a cidadaniacomo agente promotor da saúde integral do serhumano.

Para tal, o médico deve ter as seguintes com-petências gerais: atenção à saúde; tomada dedecisões; comunicação; liderança; administra-ção e gerenciamento das instâncias de saúde eeducação permanente. E entre outras, asseguintes competências específicas para:comunicar-se adequadamente com os colegasde trabalho, os pacientes e seus familiares;informar e educar seus pacientes, familiares ecomunidade em relação à promoção da saúde,

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prevenção, tratamento e reabilitação das doen-ças, usando técnicas adequadas de comunica-ção; realizar com proficiência a anamnese e aconseqüente construção da história clínica,bem como dominar a arte e a técnica do examefísico; realizar procedimentos clínicos e cirúr-gicos indispensáveis para o atendimentoambulatorial e para o atendimento inicial dasurgências e emergências, em todas as fases dociclo biológico.

Com relação aos conteúdos do curso de forma-ção, o parecer preconiza como essenciais:compreensão e domínio da propedêutica médi-ca, capacidade de realizar história clínica,exame físico, conhecimento fisiopatológicodos sinais e sintomas; capacidade reflexiva ecompreensão ética, psicológica e humanísticada relação médico-paciente.

Quanto ao treinamento em serviço, destacaque a formação do médico deve incluir comoetapa integrante da graduação um estágio cur-ricular obrigatório, em regime de internato,cuja carga horária mínima deve atingir 35%da carga horária total do curso. Estas ativida-des devem ser eminentemente práticas e acarga horária teórica não poderá ser superior a20% do total por estágio.

Sobre a estrutura do curso de Medicina, oparecer determina que o aluno seja inseridoprecocemente em atividades práticas relevan-tes para a sua futura vida profissional e que ocurso deve propiciar a interação do aluno comusuários e profissionais de saúde desde o iní-cio de sua formação, proporcionando-lhe

lidar com problemas reais e capacitando-o aassumir responsabilidades crescentes comoagente prestador de cuidados e atenção, com-patíveis com seu grau de autonomia, que seconsolida na graduação com o internato.

Com vistas à avaliação das escolas de 3º grauno país, o Ministério da Educação instituiu,em 1996, o Exame Nacional de Cursos,conhecido como o “Provão do MEC” (3). Nasdiretrizes específicas para a realização da provanacional para os cursos de Medicina, as habi-lidades cognitivas dos médicos recém-forma-dos são avaliadas de acordo com o seguinteperfil delineado para o graduando: a) cidadãocom atitude ética, formação humanística,consciente da responsabilidade social; b) capa-cidade de compreender, integrar e aplicar osconhecimentos básicos na prática clínica; c)formação para atuar em nível primário deatenção e resolver, com qualidade, os proble-mas prevalentes de saúde; d) formação paraatuar nas urgências e emergências; e) capaci-dade de lidar com os múltiplos aspectos dasrelações profissionais, com ênfase na relaçãomédico-paciente; f) capacidade de atuar emequipe interdisciplinar e multiprofissional. Éimportante ressaltar que nas avaliações semostra ao aluno o que se espera dele.

As competências e habilidades a serem desen-volvidas ao longo do curso e exigidas do gra-duando são: a) comportar-se eticamente nasrelações profissionais e no contexto social; b)compreender os determinantes sociais, cultu-rais, econômicos, biológicos e políticos do pro-cesso saúde-doença e da função médica; c)

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lidar com a diversidade de comportamentos,crenças e idéias; d) realizar procedimentos clí-nicos e cirúrgicos indispensáveis para o atendi-mento ambulatorial e das urgências e emer-gências; e) comunicar-se com pacientes e seusfamiliares adequadamente; f) suportar frustra-ções e demonstrar atitude empática com osofrimento; g) reconhecer, valorizar e adequar-se às competências específicas dos integrantesde uma equipe de saúde.

Portanto, estes dois documentos exigem que aescola médica se preocupe com uma formaçãointegral do estudante, visando, além da capaci-tação técnica mínima para o exercício daMedicina, também um entendimento do seupapel social enquanto profissional e cidadão,enfatizando os aspectos de empatia, correçãomoral e respeito pela pluralidade dos valores deseus futuros pacientes e colegas.

1.1.b. Os objetivos da pós-graduação latosensu em Medicina (especialização)

No Brasil, a Lei nº 3.268, de 30.9.57, dispõeem seu artigo 17 que os médicos só poderãoexercer legalmente a Medicina, em qualquer deseus ramos ou especialidades, após prévioregistro de seus títulos, diplomas, certificadosou cartas no MEC e de sua inscrição noConselho Regional de Medicina sob cuja juris-dição se acha o local de sua atividade e, segun-do o Processo-Consulta CFM nº 913/91:“entre o médico e o paciente existe uma rela-ção jurídica perfeitamente definida por dispo-sitivos legais, existindo para ambos deveres edireitos. Destaca-se, entre os direitos dos

pacientes, o de não sofrer dano por culpa domédico” (4,5).

Desta forma, a lei define que, ao ser conside-rado apto pela escola médica e ao receber ograu de médico, este profissional é considera-do como tendo a competência mínima exigidapara exercer a profissão. Deduz-se, então, queo recém-egresso do curso de Medicina, aooptar por uma especialização, embora possuin-do as habilidades mínimas, procura a excelên-cia naquilo que se dispõe a fazer profissional-mente, atitude louvável, se não também dese-jável e necessária frente à rápida atualizaçãodas ciências biomédicas em nossos dias.

O objetivo maior da pós-graduação lato sensuem Medicina é manter ou, mais que isto, aper-feiçoar a competência adquirida na graduação,visando a excelência profissional, tornando omédico-especialista beneficente e apto a aten-der os indivíduos (e respeitar sua autonomia)na sua especialidade médica (6).

A Residência Médica é definida pela Lei nº6.932, de 7.7.81, como uma modalidade deensino de pós-graduação destinada a médicos,sob a forma de cursos de especialização, carac-terizada por treinamento em serviço, funcio-nando sob a responsabilidade de instituições desaúde, universitárias ou não, sob a orientaçãode profissionais médicos de elevada qualifica-ção ética e profissional (7).

Cleide E. P. Trindade afirma, concordando coma maioria dos envolvidos na educação médicacontemporânea, que “não há dúvidas de que a

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residência médica é ainda o melhor modo deformar um profissional médico baseando o seuaprendizado no treinamento em serviço e sob asupervisão de um preceptor” (1).

2. A perspectiva dos alunos de Medicina

Todos os professores de cursos de Medicina jáperceberam, alguma vez, a ansiedade dosrecém-ingressos em ter contato com os pacien-tes, para se sentirem sendo formados médicos.William Saad Hossne, referindo-se aomomento de ingresso do aluno na fase clínica,assim escreve: “(...) o aluno se sente atraídopela perspectiva de, finalmente, começar aaprender medicina prática” (8).

É interessante conhecer alguns testemunhos econsiderações levantadas por alunos do pri-meiro ano de graduação de um curso deMedicina ministrado no Sul do Brasil, quebem refletem a preocupação do estudante comsua formação:

“A minha expectativa, ao término do curso, éestar preparado para atuar ou, pelo menos,ajudar a minimizar o sofrimento das pessoasque chegarão até mim (...) exercer a profissão(...) sempre tendo em vista a necessidade dopaciente (...) quero me sentir preparado aentrar no mercado de trabalho, sabendo queestou apto a clinicar qualquer paciente.”

“Espero ser capaz de tratar as doenças físicas epsíquicas das pessoas que a mim recorrerem,aliviando, assim, sofrimentos.”

“Espero que a faculdade me proporcione oconhecimento e o preparo necessários paramelhorar a qualidade de vida das pessoas (...).espero, principalmente, não permitir que arotina retire de mim a sensibilidade e a compai-xão, fazendo-me um profissional mecanizado,incapaz de distinguir o paciente e a doença.”

“Espero ser capaz de compreender o pacien-te como um ser completo e não apenas verum órgão ou leito (...) entendendo seusreceios quanto à sua doença, respondendosuas dúvidas.”

“O mínimo que se espera da formação emmedicina é o conhecimento suficiente paraque, ao atender o paciente, possamos lidarcom seus problemas, sejam físicos ou não, esolucioná-los. Para isso, é necessário o conhe-cimento não só teórico, mas também prático,ou seja, a experiência. Para termos o mínimode experiência necessária ao exercício da pro-fissão, a universidade deve oferecer a oportuni-dade de seus alunos freqüentarem postos ehospitais.”

“Espero não somente identificar os sintomasdos pacientes e administrar a medicação corre-ta mas também deter o conhecimento paralidar com o ser humano.”

“Ao ser procurado por qualquer pessoa queprecise de ajuda médica, saber identificar oseu problema, entender suas condições (...)adquirir a confiança dessas pessoas e, princi-palmente, poder tratá-las de uma forma ade-quada.”

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Nestes depoimentos é possível identificar que,além da expectativa da capacitação técnica pro-fissional, presente em qualquer área de forma-ção, o curso de Medicina traz um ônus acessó-rio e importante, que é o senso de responsabili-dade que o aluno manifesta por estar lidandocom seres humanos e seu sofrimento. O futuromédico deseja uma experiência prática a fim depoder cumprir sua tarefa social, de aplicar seusconhecimentos para o benefício do doente.

Benedictus Philadelpho de Siqueira, em Aética do estudante de Medicina, faz algumasobservações interessantes. Para ele, a ética,entendida como a teoria ou ciência do com-portamento social do ser humano no relacio-namento com seu semelhante e o meioambiente, sofre modificações de acordo com omomento histórico em que se dá esta relação,com a complexidade da sociedade e com astransformações que o homem vai produzindono ambiente e que o estudante de Medicina,como um dos atores dessas transformações,deve ter seu código de ética constantementeatualizado quanto ao comportamento adequa-do aos que lidam com o ser humano (8).

O autor chama a atenção para o fato de que asatitudes e comportamentos éticos e o compro-misso social quase nunca constituem preocupa-ção dos jovens que estão em faculdades semcondições ótimas de funcionamento, mas que oaluno deve exigir que as escolas se preocupemem nele incorporar atitudes e comportamentosmoralmente adequados, que a sociedade esperado médico, especialmente seu compromissosocial. O estudante de Medicina tem o direito

a ter professores competentes e dedicados,principalmente para acompanhá-lo na relaçãoaluno-paciente. E o verdadeiro professor, aomesmo tempo em que ajuda o aluno a desen-volver suas habilidades psicomotoras, deve for-necer-lhe parâmetros socialmente justos e eti-camente corretos de relacionamento médico-paciente. O estudante de Medicina não deveriaaceitar que nos hospitais universitários houves-sem patamares diferentes de cidadania.

Como a defesa da vida deve ser a principal preo-cupação do estudante de Medicina, as suas atitu-des devem pautar-se pela intransigente valoriza-ção da vida humana. Não deve praticar ato quecoloque em risco a vida do paciente, evitando,assim, que sua deficiência, em algum momento,possa colocar a vida ou a qualidade de vida emrisco. Todo e qualquer ato que venha a ser prati-cado no paciente deve ser exaustivamente pratica-do em manequins ou animais de experimentação.Como o relacionamento médico-paciente é oponto central da profissão médica, somente have-rá ensino médico de qualidade onde exista umarelação efetiva aluno/paciente/comunidade.Quando o indivíduo perde sua saúde necessita demaior compreensão, sua dependência cresce e suasensibilidade aflora. Nestas circunstâncias, oaluno deve saber ouvir com atenção, ter calma eprudência nas suas atitudes, ser tolerante e razoá-vel com as manifestações do paciente, ter respei-to e dedicação (8).

2.1. A perspectiva dos educadores

Segundo Genival Veloso de França, a respon-sabilidade do preceptor é conseqüente do

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caráter peculiar da tarefa de preceptoria e deveser definida como responsabilidade derivada oucompartida, já que cada membro da equipecarrega consigo a co-responsabilidade por atosmédicos praticados. O autor acrescenta que,conseqüentemente, cada um deles é passível deresponder, ética e juridicamente, por atosmédicos realizados, bastando, para tanto, quecada instância judicante defina a responsabili-dade a ser atribuída a cada integrante da equi-pe (10).

Em 1967, George Miller já registrava que “osprofessores de medicina só podem optar comsensatez pela melhor maneira de ajudar osalunos a alcançarem um ponto determinadose estiverem certos do lugar aonde queremchegar com ele. Poder-se-ia sugerir que osobjetivos primeiros da formação médicaadvêm da filosofia do pensamento científico,das necessidades sanitárias da comunidade eda definição de “bom médico” dada pela pró-pria profissão. Assim, a definição dos objeti-vos da formação médica não é de inteira res-ponsabilidade do médico-professor. Depende,também, das necessidades da sociedade e daprofissão” (11).

Ao definir os objetivos do ensino médico, oautor cita critérios para julgar a adequação doprojeto pedagógico, afirmando que o programatem maiores probabilidades de bom desenvol-vimento quando as metas são percebidas emtermos de modificação de comportamento doaluno, antes como resultado de experiênciaque da natureza do ambiente de instrução ouda atuação do professor” (11).

Para a Associação Americana de EscolasMédicas, são tarefas dos educadores: propiciarao aluno a aquisição do conhecimento exigidodos cenários social e cultural em que se reali-zam a formação e a prática médica; ajudar oaluno a estabelecer hábitos essenciais de consi-deração e perceptividade no trato com ospacientes; treinar o aluno na aquisição dashabilidades básicas: a) para a condução daanamnese adequada e exata; b) de efetuação doexame físico e utilização eficiente dos instru-mentos comumente utilizados por todos osmédicos; c) da interpretação, para o paciente,de observações e diagnose, de modo a lhe daresperança e facilitar-lhe a compreensão, evi-tando apreensão e pessimismo indevidos; d) deobtenção de confiança dos pacientes e seusfamiliares; levar o aluno a desenvolver atitudessadias de ver também os indivíduos em suatotalidade de seres humanos complexos, inse-ridos num ambiente também complexo e cam-biante (11).

Em pesquisa realizada por Suzana M.Wuillaume e Nildo A. Batista, com precepto-res de Residência em Pediatria, no Rio deJaneiro, os entrevistados consideraram o exer-cício de uma tutoria, calcado na prática médi-ca assistencial, como um desafio, apontando aresponsabilidade profissional, o relacionamen-to humano, a capacidade de organização, aprática avaliativa e o domínio dos conteúdoscomo os eixos principais de sua atuação, acres-centando a estas habilidades a importância dosaspectos éticos e humanísticos, bem como asua capacidade de educação permanente. Ametade deles não possuía preparo específico

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para o ensino e sentia necessidade da capacita-ção didática no desempenho de suas funções(12).

2.2. A perspectiva do paciente

Segundo Rodhe et al (1990), citado emAlfredo Cataldo Neto, o tipo de atendimentoaos pacientes em uma estrutura assistencial,simultaneamente universitária e previdenciá-ria, envolve aspectos positivos e negativos. Porum lado, permite que se amplie a assistênciamédica tão necessária em nosso país a segmen-tos menos favorecidos da população e à comu-nidade acadêmica, tornando o ensino médicomais dinâmico e real. No entanto, um grandenúmero de profissionais em contato com opaciente (alunos, residentes e professores) e arotatividade nas diferentes equipes e nas áreasde atendimento muitas vezes impossibilita oestabelecimento de relações estáveis e contí-nuas com o paciente, despersonalizando o con-vívio (13). Isto tanto poderá influir negativa-mente na vida profissional futura do médicoem formação como também na qualidade darelação que o paciente espera ter com seumédico. Outro problema, comum na esferaprevidenciária, é que o paciente não escolhe oprofissional, interna-se em determinado hospi-tal, iniciando o vínculo com a instituição enão com o médico.

Em sua monografia de conclusão de pós-gra-duação em Marketing, Alexandre K. Kippercoloca que tratar o paciente como sendo umapessoa integral é um desafio para médicos,enfermeiros e demais profissionais, bem como

para membros do Conselho de Administração,que têm a responsabilidade final de assegurarque as necessidades dos pacientes sejam aten-didas (14).

O autor comenta que o hospital, “desde a suaformação, foi se tornando uma organizaçãocada vez mais complexa, com funções defini-das e próprias (...), contudo, encontra-se den-tro do hospital uma concentração muito gran-de de sofrimento e a presença constante damorte. Profissionais que constituem a equipede tratamento médico têm, normalmente,pouco tempo e disponibilidade para dar aten-ção às preocupações, ansiedades e medos que opaciente apresenta. E o doente, ao ser admiti-do no hospital, sente-se como uma pessoa quedeixou de ser capaz de assumir a responsabili-dade pelas suas decisões e ações para se sujei-tar às contingências impostas pela sua doença,pelo regulamento do hospital e pelo tipo detratamento a receber. Precisa, ainda, se subme-ter a normas e rotinas estabelecidas” (14).

Salienta que o doente ou ferido é uma pessoaassustada, dependente de quem cuida dela,necessitando ser confortada e tranqüilizada.Freqüentemente, no entanto, as demonstra-ções de compaixão e empatia pelo pacienteperdem-se porque nem sempre o profissionalda saúde o conhece suficientemente para per-ceber suas dúvidas, medos e necessidades. Ofato de os hospitais necessitarem manter umarígida rotina de procedimentos, com o duploobjetivo de atender o paciente e dirigir umempreendimento, impedem, geralmente, umcontato mais personalizado entre os profissio-

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nais e o paciente. No momento em que o hos-pital transforma a pessoa doente em paciente,colocando-a em uma estrutura padronizada,vestindo-a com roupas do hospital, mudandosua dieta, seus hábitos de dormir e permitindovisitas apenas em horários pré- determinados,acontece uma grande despersonalização doindivíduo (14).

Além disso, e apesar de resultados conflitan-tes, a literatura sobre os riscos de ser pacienteem hospitais universitários sugere que osdoentes permanecem mais tempo hospitaliza-dos, fazem mais exames e exigem mais supri-mentos hospitalares (15).

O paciente, num hospital-escola, é sujeitopara o treinamento de habilidades e manejo deestudantes e residentes, sendo usualmenteatendido por uma equipe constituída de alu-nos, residentes e médico-professor. Esta equi-pe varia em conhecimentos e habilidades,desde um graduando na fase inicial de seutreinamento clínico a um residente de últimoano, até um professor altamente experiente ehábil.

Assim como na pesquisa com uma droga expe-rimental, o treinamento de um aluno e de umresidente é obtido através de tentativas de acer-to/erro. O consentimento do paciente-sujeitoé necessário, ética e legalmente, para sua par-ticipação em um programa de treinamentomédico. Informações completas são impres-cindíveis para que o paciente possa tomar umadecisão livre e esclarecida sobre seu atendi-mento. Todos os membros participantes do

processo de diagnose e manejo do doentedevem se conduzir com absoluta sinceridade eo paciente deve ser informado dos potenciaisdesconfortos e riscos.

Na educação médica, alguns riscos podememergir da inexperiência individual do alunoao participar de algum cuidado, ou do residen-te ao fazer algum diagnóstico ou procedimen-to, pois, pela própria natureza do processo deensino-aprendizagem, os alunos e residentesprecisam praticar com pacientes para adquiriras habilidades, as competências mínimas ou aexcelência para, futuramente, exercer sua pro-fissão. Da mesma forma que pesquisadoresusam voluntários em projetos de pesquisa,alunos e residentes têm que utilizar pacientes-sujeitos para seu treinamento, com o objetivode tornarem-se suficientemente habilitadospara servirem a outros.

Muitas vezes, os pacientes-sujeitos não sãosuficientemente informados pelos profissio-nais a respeito da natureza do processo edu-cativo. Quase todos os pacientes-sujeitossabem que em hospitais de ensino há alunose residentes trabalhando com os professores,mas não sabem qual o grau de habilidade dosalunos/residentes ou, exatamente, quem é oresponsável último pelo manejo de seus cui-dados. Sem alarmar os pacientes, asseguraruma apropriada supervisão pode ajudar nessesentido e os professores devem informar sin-ceramente os potenciais desconfortos ou ris-cos decorrentes de ter médicos em treina-mento tomando parte nos cuidados e trata-mento.

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Mas também existem significativos benefíciospara os pacientes envolvidos no processo deensino. Como o participante de um ensaio clí-nico que pode ser o primeiro a receber umadroga experimental, também o paciente emum hospital-escola pode ser beneficiado pelavontade muito grande de alunos ou residentesem investigar uma patologia ou em fazer umdiagnóstico preciso.

Outra vantagem em ser paciente-sujeito numambiente de ensino é que, em geral, na educa-ção entre adultos, o conhecimento flui nasduas direções – do professor para o aluno e doaluno para o professor. Assim, o paciente-sujeito pode ser beneficiado pela presença demuitos professores trocando conhecimentosentre si e pelo desafio educacional que ocorrenum meio onde há muitos alunos e residentesinquisitivos (15).

Uma pesquisa realizada na faculdade deMedicina da Universidade de Newcastle, naAustrália, mostrou alta satisfação dos pacien-tes atendidos por estudantes: 56 dos 60pacientes entrevistados estavam satisfeitos.Também na Inglaterra, a verificação do graude satisfação dos pacientes atendidos por gra-duandos mostrou que os pacientes eram alta-mente favoráveis à presença dos estudantes, eos pacientes de classe economicamente maisbaixa mostravam ainda maior satisfação comeste fato (13). Estudo semelhante, desenvolvi-do no hospital-escola da faculdade de Medicinada PUCRS, por Alfredo Cataldo Neto, reve-lou que os pacientes gostavam da presença dosestudantes (98,6%), considerando sua presen-

ça como tranqüilizadora (93%), sentindo-seprivilegiados pelo fato de serem atendidos numhospital universitário (13).

3. Discussão

O relatório Flexner (EUA, 1910), conhecidodocumento que mudou a estrutura da escolamédica, possibilitou grande avanço no ensinoda medicina científica e no desenvolvimentodas ciências básicas, das pesquisas clínicas edos hospitais universitários. Naquela época, ena ausência de argumentos para defender ocaráter assistencial da profissão, a educaçãomédica divorciou-se das necessidades básicasde assistência à saúde do povo. Somente coma Declaração de Alma-Ata (1978) foi que acomunidade científica apontou uma contra-partida ao modelo vigente de formação médi-ca, ao sublinhar os cuidados primários desaúde como ponto-chave para atingir a metade eqüidade e justiça no atendimento de saúdeda população mundial (16).

Ao definir cuidados primários como cuidadosessenciais à saúde, baseados em métodos e tec-nologia práticos, cientificamente fundamenta-dos e socialmente aceitáveis, colocados aoalcance universal dos indivíduos, das famílias eda comunidade, mediante sua plena participa-ção e a um custo que esta comunidade e o paíspossam manter, em cada fase de seu desenvol-vimento, no espírito de autoconfiança e auto-determinação, a sociedade passou a reconhecera profissão médica sob uma perspectiva con-creta de utilidade social. Nas décadas seguin-

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tes, as instâncias públicas e privadas direciona-ram gradualmente os objetivos da formaçãomédica para atender as necessidades de saúdeda população.

A Declaração da XV Conferência Pan-Americana de Educação Médica corroboraesta posição ao ressaltar que, apesar da educa-ção médica ter sempre alcançado sucesso e oexercício da Medicina ser fonte de satisfaçãopara a sociedade e de realização pessoal para omédico, o estudante de Medicina terá seufuturo promissor comprometido se a escolamédica não refletir sobre o descompasso entreas expectativas societárias e a realidade perce-bida (16).

Também no documento preliminar daConferência Mundial de Educação Médica,consta que as escolas devem proporcionar aosalunos formação integral, assegurando-lhes,também, sólida base ética, atitude humanitáriae de serviço à comunidade; precisam gerar ati-tudes e valores que permitam cercar o atomédico da dimensão humana e ética que devecaracterizá-lo. Nesse contexto, a exigência é demaior aproximação das escolas ao meio, emespecial aos serviços de saúde, como estratégiade integração, ressaltando a importância dasatividades docente-assistenciais e a participa-ção significativa e precoce do estudante nasmesmas, bem como na hierarquização daassistência médica, objetivando sempre a liga-ção do processo educacional ao processo deprestação de serviços de saúde (17). O docu-mento afirma, ainda, que as pesquisas na áreapedagógica demonstram que a maneira mais

eficiente e duradoura de adquirir conhecimen-to, habilidade ou atitude é exercitar ações queexijam tal conhecimento, tal habilidade ou talatitude. Aprender fazendo é mais eficiente doque receber conhecimentos passivamente.Portanto, a estratégia educacional deve ser otreinamento em serviço, que possibilita a prá-tica de ações de complexidade crescente, con-forme as necessidades e determinações do ser-viço e do programa educacional.

A Declaração de Edimburgo (1993), resultadoda Conferência Mundial de Educação Médica,igualmente destaca que a organização de pro-gramas de ensino e de sistemas de avaliaçãodevem garantir a aquisição das competênciasprofissionais e dos valores sociais, e nãosomente visar a memorização da informação,comentando que “cada paciente deve poderencontrar, no médico, o ouvinte atento, oobservador cuidadoso, o interlocutor sensível eo clínico competente” (17). A educação médi-ca, portanto, deve estar alinhada com as neces-sidades da sociedade porque tanto a ética daprofissão médica quanto a dependência dasociedade assim o exigem.

Na visão destes educadores, o descompassoentre as necessidades da sociedade e a educa-ção médica está no aumento dos custos daMedicina, na formação demasiada de especia-listas, na não-promoção da saúde, na parcelasignificativa da população sem acesso à assis-tência e na erosão da confiança na relaçãomédico-paciente (16). Assim sendo, podemosconsiderar que a qualidade do curso deMedicina pressupõe dois enfoques. O primei-

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ro, é o ensino da Medicina como ciência, ondedevem ser ensinados aos estudantes os conteú-dos técnicos, os procedimentos adequados paraa realização do diagnóstico, a iniciação à pes-quisa e o uso das tecnologias disponíveis parao auxílio ao diagnóstico, além da permanenteatualização desses conteúdos. O segundo,trata da Medicina como prática assistencial,como serviço prestado à coletividade. Nessaúltima perspectiva, partindo de ações exigidaspela sociedade, é necessário que se defina opapel do médico na prestação desta assistência(quase sempre limitada pela indisponibilidadede recursos e pelas necessidades regionais), queseja dada atenção à questão da eficiência (omédico como parte de um sistema, com fun-ções definidas e trabalhando em conjunto) eque seja considerada a relação custo-benefíciode diagnósticos e tratamentos, com o objetivoprimordial de promoção da saúde, prevençãoda doença e reabilitação, com eqüidade social.

Desta forma, mesmo que os egressos possamseguir diferentes carreiras em situaçõessociais ou organizacionais diversas, ao con-cluir o curso médico todos devem possuir umconjunto de competências que lhes permitamtanto prestar serviços de assistência primáriaà população como continuar sua própria for-mação.

A competência aqui, como bem define LuizFernando Pinto, significa “o domínio doconhecimento e o controle das habilidades quedefinem e caracterizam uma profissão ante ojulgamento e a avaliação da sociedade, que nãosó espera, como exige, também, que o médico

produza benefícios através de uma eficienteutilização dessas aptidões” (18).

Do ponto de vista ético, Diego Gracia esclare-ce que são estas competências mínimas queprevinem a má prática da Medicina (imperícia,imprudência ou negligência), que, na relaçãoindividual com o paciente, tornaria os recém-egressos das escolas médicas profissionaismaleficentes e, em sua relação com a socieda-de, os tornaria injustos, na medida em que aformação adequada evita a incorreção dos atosmédicos (6).

A educação médica deve se preocupar, ainda,com o desenvolvimento da personalidade doeducando, para que ele possa ser o médicocompetente que o processo pretende formar.Entre muitos aspectos a serem considerados,figura a valorização do exercício da Medicinacomo um encontro entre pessoas: o médico eo doente, num exercício pleno de humanismo.Desde Hipócrates estão identificadas as carac-terísticas desejáveis da personalidade do médi-co: vocação, espírito científico, limite à ambi-ção e à vaidade, espírito judicioso, aceitação delimitações técnico-profissionais, discrição erespeito ao doente. O médico não deve ter como paciente uma relação de sujeito-objeto ou deobjeto-objeto, mas de sujeito-sujeito (19).

As características pessoais do médico estãonaturalmente vinculadas às etapas que com-põem seu exercício profissional: anamnese,exame físico, diagnóstico, prognóstico e con-duta terapêutica. Cada uma destas etapasenvolve atributos e habilidades pessoais especí-

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ficos, que devem ser aperfeiçoados: a anamne-se supõe sensibilidade e percepção; o examefísico exige respeito e delicadeza; a elaboraçãodo diagnóstico, do prognóstico e da condutaterapêutica demandam lucidez e espírito judi-cioso; a relação com o paciente – o ponto maisimportante a ser considerado – envolve todoum conjunto de atributos, formado, no míni-mo, por discrição, paciência, tolerância, dedi-cação e desprendimento (19).

Colocadas as perspectivas envolvidas nestaquestão, o problema que agora se apresenta é:como fazer para que seja moralmente aceitávelter graduandos de Medicina participando doscuidados do paciente e eticamente correto termédicos em formação praticando atos médicos?

Janicemarie K. Vinicky et al, em seu excelenteartigo Patients as ‘subjects’ or ‘objects’ in resi-dency education (15) nos fornecem excelentessubsídios para fundamentar esta discussão. Osautores propõem que os critérios éticos deJames F. Childress para justificar a realizaçãode pesquisas envolvendo seres humanos podem,por analogia, ser empregados para justificartambém o treinamento médico em serviço.

A proposta de Childress considera que o projetode pesquisa deve cumprir as seguintes condiçõespara que seja moralmente executável: 1. Deveexistir uma razão moral importante para a pes-quisa; 2. Deve existir uma expectativa razoávelde que a pesquisa vai gerar o conhecimento pro-curado; 3. O uso de sujeitos humanos nesteestudo é uma questão de último recurso, ou seuuso é necessário; 4. A pesquisa deve considerar

o princípio da proporcionalidade, isto é, existeuma análise favorável de risco-benefício; 5. Apesquisa deve ter o consentimento livre e escla-recido do sujeito; 6. Os riscos e os benefíciosdevem ser distribuídos eqüitativamente entre ossujeitos humanos envolvidos.

De acordo com o primeiro critério deChildress, transportado para o cenário da edu-cação médica, torna-se necessário determinarque existe uma razão moral importante paraque os cuidados do paciente sejam prestadospor médicos em treinamento. Mesmo que nãodistribuída com eqüidade, há uma forte presun-ção de que a qualidade do atendimento médicoé um dos principais valores da sociedade e quea educação de médicos competentes - que reu-nidos a outros profissionais de saúde possamoferecer tal atendimento - é um componentebásico para a eficiência do sistema de saúdecontemporâneo. Considerando, mais além, arelevância do sistema de saúde para a qualidadede vida da população, é razoável dizer que exis-te uma obrigação moral por parte dos envolvi-dos com a educação médica em conduzi-la comeficiência e responsabilidade.

Como a prática médica possui muitos aspectosclínicos, parece indispensável que grande parteda formação deva ser feita num ambiente ondese exercem tais atividades, e a participação efe-tiva dos estudantes e residentes nos cuidadosaos pacientes torna-se um elemento essencialno seu treinamento.

O segundo critério determina a busca de umajustificativa razoável para assumir que o

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conhecimento e as habilidades são, de fato,obtidas pelos estudantes/residentes ao toma-rem parte nos cuidados à saúde. Se isto nãoocorrer, não se justifica moralmente sua parti-cipação neste processo.

Ao considerarmos as diretrizes educacionais,as expectativas da sociedade e dos própriosestudantes/residentes, anteriormente analisa-das, aliando-as às teorias pedagógicas daaprendizagem, o ‘aprender fazendo’ constitui-se em critério de obrigatoriedade e justiça paraa eficiência da educação médica.

Não se pode esquecer, no entanto, que o com-ponente que assegura a excelência da educaçãomédica - sob a forma de treinamento - é asupervisão dos aprendizes. A qualidade destatutoria é fundamental, não apenas para mini-mizar os riscos para os pacientes e avaliar odesempenho daqueles em treinamento mas paragarantir que uma situação de aprendizagemocorra de fato. Tal supervisão deve preocupar-setanto com uma adequada preparação para osprocedimentos que os alunos e residentes farãoquanto com uma observação cuidadosa sobreseu trabalho clínico e uma crítica apropriadasobre sua prática médica, visando ajudar os edu-candos na aquisição das competências mínimase da excelência profissional, objetivos constitu-tivos da educação médica.

Em terceiro lugar, é realmente necessária aparticipação do médico ou aluno em treina-mento na administração dos cuidados aopaciente? Uma resposta afirmativa a esta per-gunta é essencial na construção da justificati-

va ética para o treinamento em serviço. Apressuposição óbvia, aqui, é de que há algumgrau de risco envolvendo a participação demédicos em treinamento nos cuidados aopaciente. Há, porém, riscos maiores ao per-mitir que médicos, no futuro, exerçam a pro-fissão e pratiquem atos médicos sem nuncaterem sido treinados neles. Também existemriscos se os médicos em treinamento nãoaprenderem habilidades por falta de experiên-cia. Sob estes argumentos, e do ponto devista educacional, a necessidade de tal treina-mento clínico torna-se clara. Mas este tercei-ro critério não tem consistência apenas por-que ter alunos/residentes, cuidando depacientes, é bom e necessário para seu treina-mento, pois a necessidade de tal prática clíni-ca não é, isoladamente, uma justificativamoralmente adequada. Outros critériosdevem juntar-se a este para legitimar o treina-mento em serviço.

Os recursos pedagógicos atuais permitem àescola médica lançar mão de técnicas audiovi-suais, experimentais e demonstrativas quedevem ser utilizadas nos períodos iniciais detreinamento. Os vídeos demonstrativos, o usoeticamente apropriado de animais para experi-mentação, a utilização de modelos, bonecos,manequins e outras estratégias podem garantirum treinamento inicial.

O quarto critério, intimamente relacionadocom o terceiro, diz respeito aos riscos e aosbenefícios esperados. Considerando que hávários riscos, devemos ter uma resposta afir-mativa à seguinte questão: os riscos são pro-

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porcionais aos benefícios esperados? O fatorcrítico na análise desta questão é o reconheci-mento de que esta pergunta não pode ser res-pondida de maneira global: sempre deve refe-rir-se a um procedimento individualizado, aser realizado por um aluno/residente específi-co, para um paciente em particular, numa cir-cunstância determinada. Assim, os benefíciospara um determinado aluno ou residente sem-pre devem ser contrabalançados com os possí-veis riscos para um paciente específico. Nestecontexto, é extremamente importante um jul-gamento criterioso por parte do professor-supervisor. Ele, o professor, não pode conside-rar que alunos ou residentes, no mesmo ano detreinamento, possuam habilidades idênticaspara determinados cuidados ou que as condi-ções e circunstâncias de todos os pacientes,alvos potenciais destes procedimentos, sejamperfeitamente iguais.

O quinto critério, introduzido na pesquisa bio-médica desde o julgamento de Nuremberg, serefere ao consentimento livre e esclarecido dopaciente, condição que concretiza o princípioético de respeito pela pessoa humana.

Os sujeitos de pesquisa estão protegidos pordiretrizes, resoluções ou leis (15). No Brasil,segundo a Resolução nº 196/96 do ConselhoNacional de Saúde, e complementares, osprojetos de pesquisa devem ser aprovados porum Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) oupela Comissão Nacional de Ética emPesquisa (CONEP), que analisam o estudonas suas implicações éticas, metodologia econcordância com as regulamentações fede-

rais e as normas e diretrizes internacionais.Muitas vezes, os projetos são analisadosmetodologicamente também por uma comis-são científica.

Os relatores dos protocolos de pesquisa, entreoutras coisas, devem analisar a adequação dotermo de consentimento livre e esclarecido(TCLE), incluindo sua elaboração em lingua-gem acessível, do qual devem constar: a justi-ficativa, os objetivos e os procedimentos queserão incluídos na investigação; os desconfor-tos e riscos possíveis e os benefícios esperados;os métodos alternativos existentes; a forma deacompanhamento e assistência, assim comoseus responsáveis. A garantia de esclarecimen-to, antes e durante o curso da pesquisa, sobrea metodologia, informando a possibilidade deinclusão em grupo-controle ou placebo; aliberdade do sujeito de se recusar a participarou retirar seu consentimento, em qualquerfase do estudo, sem penalização e sem prejuí-zo ao seu cuidado; a garantia de sigilo queassegure a privacidade dos sujeitos quanto aosdados confidenciais; as formas de ressarci-mento das despesas decorrentes da participa-ção no projeto e as formas de indenizaçãodiante de eventuais danos decorrentes damesma também devem estar contempladas.Este TCLE deve ser elaborado pelo pesquisa-dor responsável e ser aprovado pelo CEP quereferenda a investigação. Nos casos em quehaja restrição de liberdade ao esclarecimentonecessário para um adequado consentimento,devem ser observadas algumas exigências paraproteger os sujeitos considerados vulneráveis(18).

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O consentimento livre e esclarecido exige acompetência mental do sujeito que faz estaescolha, ou de seu representante, além deinformação adequada e esclarecimento com-pleto do pesquisador para o sujeito, propician-do o entendimento das informações pelo parti-cipante, a liberdade do sujeito em participar dapesquisa e a garantia de que o sujeito está bemconsciente das conseqüências de sua participa-ção, mesmo que o estudo não traga benefíciosdiretos para ele, mas que possa vir a beneficiaroutras pessoas, no futuro.

Uma vez obtida a aprovação doCEP/CONEP, o pesquisador deve proceder aoprocesso de obtenção do consentimento livre eesclarecido, incluindo o TCLE, para a partici-pação do sujeito no projeto de pesquisa.

Diferentemente dos participantes em ensaiosclínicos, o paciente que é sujeito no processode ensino-aprendizagem não está protegidopor normas e diretrizes específicas, mas, semdúvida, é através do seu consentimento infor-mado para a participação neste processo quesua dignidade torna-se respeitada.

Transposto para o ambiente da formaçãomédica, o respeito pela autonomia do pacientepressupõe que este conheça a natureza de ensi-no da instituição, desde o momento de suaadmissão. Não é suficiente uma concordânciageral ou um documento inespecífico para par-ticipar dos processos de ensino e pesquisa típi-cos da instituição. Para cada um dos procedi-mentos deve haver um consentimento especí-fico ou sua recusa.

É fundamental entender que o termo de con-sentimento livre e esclarecido é apenas a for-malização de um continuum de comunicação ede tomadas de decisão. O relevante nesta ques-tão não é a assinatura de um documento, maso desenvolvimento adequado do processo deinformação e aclaramento das dúvidas dopaciente, com o objetivo de, ao aceitar ourecusar determinado procedimento, esta deci-são possa ser considerada moralmente válida,alicerçada em uma análise racional de riscos,desconfortos e benefícios, contrastada comseus valores pessoais e consoante com o proje-to e a qualidade de vida que o paciente querpara si.

Sendo assim, garantido o processo de infor-mar o paciente, dirimir dúvidas sobre os proce-dimentos e quem vai realizá-los, nem sempreserá necessário um documento formal paravalidar o consentimento ou recusa. Algunspoderão argumentar o caráter de proteção legalque o documento firmado estabelece – e quenão negamos –, porém, se o propósito daobtenção do consentimento é validar etica-mente o fato de ter estudantes e residentesparticipando do cuidado dos pacientes, o pro-cesso de informação e esclarecimento e a con-seqüente aceitação ou recusa verbal, por si só,são suficientes para cumprir este objetivo.

Assim como o sujeito envolvido em um proje-to de pesquisa pode retirar seu consentimento(entendendo as conseqüências de sua decisão),também os pacientes participantes de um pro-cesso de ensino podem fazê-lo (desde queentendam a conseqüência desta retirada, como

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a dificuldade e mesmo os riscos pessoais em sertransferido para outro hospital). A possibilida-de de recusa, obviamente, traz problemasadministrativos e organizacionais importantes,mas ela é extremamente rara se a competênciado aluno/residente, para determinada tarefa,for assegurada ao sujeito e/ou a seus familia-res, inclusive com a garantia de uma supervi-são contínua e adequada.

O que se pode propor, adicionalmente, é que oscritérios utilizados para a obtenção do consen-timento informado dos participantes em proje-tos de pesquisa sirvam de modelo para guiar aelaboração de um padrão apropriado para a prá-tica clínica, desenvolvido num ambiente de for-mação de médicos e especialistas.

Além disso, o Comitê de Ética em Pesquisa eo Comitê de Bioética, que deveriam existir nainstituição, são instâncias apropriadas de auxí-lio a pesquisadores, preceptores, aprendizes eequipes clínicas para refletir sobre os aspectoséticos que emergem das relações humanas, deensino e de assistência.

O sexto critério de Childress se refere ao prin-cípio de justiça, sugerindo que os riscos e osbenefícios decorrentes da inserção do pacienteno processo de educação médica deveriam sereqüitativamente distribuídos. Uma dasmaneiras de concretizar este objetivo é garan-tir que os problemas levantados nos cinco cri-térios anteriores sejam discutidos e considera-dos para cada um - e todos - dos pacientes queingressam num hospital-escola. Esta atitudetraz à tona uma realidade comum em nossa

prática: a existência de categorias de pacien-tes, de acordo com sua inserção no sistema desaúde, através do SUS, de convênios ou demaneira privada. Assim, seria uma violação doprincípio de justiça e de respeito à dignidadedas pessoas se a obtenção do consentimentoinformado ou a recusa de tratamento fossenegado a qualquer um destes grupos depacientes.

Da mesma forma, todos os benefícios que oambiente universitário e o processo de educa-ção médica podem promover para o melhoratendimento dos doentes precisam ser ofereci-dos indistintamente a todos os que procuram ainstituição, independente do modo de inserçãona mesma.

4. Recomendações

As instituições de ensino devem adequar-se aoprocesso pedagógico para as escolas deMedicina, determinado pelo Poder Público, ecriar sistemas de avaliação permanente com oobjetivo de garantir que os objetivos técnicos epedagógicos estão sendo alcançados.

As instituições de ensino devem favorecer aformação pedagógica dos professores, já queuma das justificativas éticas para ter alunosparticipando dos cuidados diretos ao paciente eresidentes praticando atos médicos complexosé atingir competências mínimas para os pri-meiros e a excelência profissional para ossegundos, objetivos que só serão alcançadossob adequada supervisão técnica e didática.

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As instituições de ensino devem garantir aograduando um ambiente adequado para odesenvolvimento dos conhecimentos, habilida-des e atitudes apropriadas, com participaçãoprecoce no sistema de saúde, necessários aoexercício profissional e ao compromisso ético esocial do futuro médico.

Estas instituições devem, sistematicamente, sequestionar se os alunos e residentes não estãosendo pressionados a realizar tarefas para asquais não estão capacitados, não só para pro-tegê-los mas também para ter uma atitude res-peitosa e humana com aqueles que estão sendopreparados para serem humanos com seuspacientes.

As instituições de ensino devem estabeleceruma política para todos os aspectos dos cuida-dos realizados por alunos, residentes e profes-sores e criar mecanismos para a avaliação decomo esta política de atendimento aos pacien-tes é implementada e qual a satisfação dosusuários com os cuidados oferecidos.

Todos os pacientes devem ser informados sobrea natureza de ensino e o funcionamento dainstituição, previamente à sua admissão.Devem ser esclarecidos os benefícios e os even-tuais riscos existentes nos ambientes de treina-mento profissional, e este deve ser distribuídocom eqüidade.

No processo de obtenção do consentimentodeve ser discutido, de modo honesto, o envol-vimento de alunos e residentes nos seus cuida-dos, e deve ser esclarecido que cada membro da

equipe realizará as tarefas para as quais tenhacompetências específicas, sempre sob a super-visão de um médico experiente e plenamentecapacitado.

O consentimento do paciente para participardo processo de ensino deverá ser específicopara cada procedimento ou tratamento neces-sário, sob supervisão.

A prática do consentimento informado não émeramente uma obrigação ética ou legal, masuma oportunidade apropriada para treinar ashabilidades técnicas de comunicação com osdoentes e suas famílias, para aprofundar a con-fiança na relação médico-paciente e paratransmitir empatia, solidariedade, otimismo eesperança.

As instituições de ensino devem ter políticas,normas e controles sobre a obtenção dos con-sentimentos e uma definição clara sobre quemserá o responsável por esta tarefa.

O governo deve assegurar recursos para o bomprocesso educacional e não punir estas insti-tuições pelos seus custos operacionais maiselevados.

Conclusão

Ao final desta exposição, nos parece razoávelafirmar que o treinamento em serviço possuifortes argumentos para ser considerado comouma estratégia eticamente apropriada para aeducação médica, desde que respeitados os cri-

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térios analisados neste artigo. Sua utilização,em conjunto, é importante para consolidar asjustificativas morais para o treinamento emserviço. Como Vinicky et al (15), acreditamosque sua interpretação e aplicação exigem,além de consistência, racionalidade e pratici-dade, atitudes virtuosas, prudentes e etica-mente adequadas por parte de todos aquelesque têm a responsabilidade de executar o ensi-no médico.

A profissão médica é dedicada a promover asaúde, prevenir as doenças, tratar os doentes ereabilitá-los. A graduação dos alunos e o trei-namento de residentes se destina aos mesmosobjetivos, embora em níveis diferentes. Assimcomo a atividade profissional, também o ensi-no médico e o treinamento de residentesimplicam em responsabilidades éticas impor-tantes, que devem ser compartilhadas por alu-nos, residentes, educadores, instituições deensino e treinamento, autoridades, pacientes esociedade.

Uma das características da ética contemporâ-nea e de toda ética da responsabilidade é suadesconfiança na formulação de proposições

deontológicas de caráter absoluto e carentes deexceções (19). No tema do treinamento emserviço, jamais se conseguirá uma fórmula dejustiça absoluta. É necessária uma contextua-lização histórica para poder responder aos pro-blemas concretos do cotidiano do ensino daMedicina.

Para tanto, é preciso que cada componentedesta estratégia de ensino-aprendizagem tenhaum comprometimento e uma visão responsá-vel das atribuições que lhe cabem, otimizandobenefícios tanto para aqueles em treinamentoquanto para os pacientes aos seus cuidados,buscando, em última instância, qualidade, efi-ciência e excelência.

Não se pode, nesta questão, tomar decisõesmeramente táticas, favorecendo um ou outrolado, sendo obrigatória a análise rigorosa dosdireitos e dos deveres de cada uma das partesenvolvidas, em um debate plural e crítico cujoobjetivo deve ser o de tornar o treinamento emserviço condizente com o papel que a socieda-de espera da profissão médica, solidamentefundamentada nos princípios de justiça e derespeito pelo ser humano.

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ABSTRACTQuestioning the ethics of medical school and residency

This paper argues that medical school objectives will only be achieved when patients areinvolved as subjects in the education process. The pros and cons of such approach areanalyzed. The authors explore alternative ways through which this task can be accom-plished without disrespect to the rights of the ill and in such a way as to ensure their rightto participate in decisions affecting their health. Holding an ethical point of view, thepaper presents the principles and values based on which a joint approach to patient careby medical undergraduate students and resident physicians may be justified. After analy-zing the ethical foundations to validate such in-service training, the authors make recom-mendations tailored to the medical reality in Brazil, and finally draw one’s attention tothe responsibility of all players involved in medical education. Uniterms: medical education, ethics, responsibility, patient-subjects

RESUMENCuestionamientos éticos relativos a la graduación y a la Residencia Médica

Los autores, partiendo de los objetivos de la formación médica, consideran que estos solopueden ser alcanzados con la participación de pacientes como sujetos en el proceso deenseñanza-aprendizaje y muestran los riesgos y beneficios en este contexto. Destacan elproblema de como realizar esta tarea sin irrespetar la dignidad de las personas enfermas,contemplando sus derechos de participación en las decisiones sobre su salud. Del puntode vista ético, presentan los principios y valores que pueden justificar el hecho de tenergraduados de medicina y médicos residentes participando de los cuidados de los pacien-tes. Después de analizar el fundamento ético para justificar este entrenamiento en servi-cio, presentan algunas recomendaciones para la realidad brasileña y concluyen llamandola atención para las responsabilidades de todos los involucrados en la formación de losmédicos.Unitermos: formación médica, ética, responsabilidad, pacientes-sujetos

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Délio José KipperHospital São Lucas da PUC-RSDepartamento de Pediatria - 5º andarAv. Ipiranga, 6690Jardim BotânicoCEP: 90640-000Porto Alegre - RS - Brasil

ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA

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