Sindicalização e Greves - História Recente Do Movimento Sindical Brasileiro

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    SINDICALIZAO E GREVES: HISTRIA RECENTE DO MOVIMENTO

    SINDICAL BRASILEIRO

    Walber Carrilho da CostaProfessor do Centro Universitrio do Tringulo - UNITRI e Doutorando em

    Cincias Sociais pela Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo

    Resumo: Analisando os impactos da reestruturao produtiva e do neoliberalismo

    sobre movimento sindical no mundo e, fundamentalmente, no Brasil, este artigo

    procura descobrir as origens da crise sindical brasileira aps seu grande perodo de

    expanso na dcada de 1980. Ele est dividido em trs sees. A primeira apresenta

    o declnio das taxas de sindicalizao e do movimento grevista. A Segunda discute os

    fatores que tm contribudo para as dificuldades dos sindicatos. A ltima seo

    acentua as principais concluses observadas no texto.

    Palavras-chave:reestruturao produtiva; neoliberalismo e sindicalismo.

    Abstract:Analysing the impacts of the productive restructuring and the neoliberalism

    on the trade movement in the world and fundamentally in the Brazil, this article puzzle

    the Brazilian trade union crisis's origins after your great period of expansion in the

    decade 80. it are divided into three sections. The first shows the decline of the trade

    unization rate and of the strike movement. The second discus the factors that have

    contributed for the trade unions difficulty. The last section stress the aims conclusion

    observed in the text.

    Key Words:productive restructuring; neoliberalism; and trade unionism.

    Introduo

    A economia capitalista tem passado, nas ltimas dcadas, por um grandeprocesso de reestruturao produtiva. Esta introduziu significativas mudanas nos

    padres de produo com a incorporao, capitaneada pelas grandes corporaes,

    de novas tecnologias e novos mtodos organizacionais. Juntamente a esse processo,

    alterou-se, tambm, a orientao da poltica econmica, privilegiando os preceitos

    neoliberais de economia de mercado; de abertura comercial; de integrao

    econmica; de desregulamentao; de menor interveno dos Estados na economia;

    e de privatizao das empresas estatais.

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    Os referidos processos implicaram transformaes no "Mundo do Trabalho",

    que, como resultado, tm passado por mudanas tanto quantitativas, quanto

    qualitativas, advindas, basicamente, do crescimento do desemprego e da

    informalidade, alm do surgimento de novas relaes de trabalho no interior e fora daesfera produtiva. Assim, o momento atual configura-se como um perodo de mudana

    na racionalizao produtiva, que tem trazido como resultado, dentre outros, uma

    dificuldade de ao para o movimento sindical.

    Contudo esses fenmenos no devem ser encarados de forma determinista,

    ou seja, de que a introduo de novas tecnologias e novos mtodos organizacionais,

    em um contexto de polticas neoliberais, leve, necessariamente, mesma intensidade

    de mudanas. De fato, esse resultado de um conjunto de fatores de ordem poltica,

    econmica, social, cultural e institucional, que, naturalmente, se apresentam de

    diferentes maneiras nos vrios pases e setores. Tem-se como hiptese, ento, que

    todas essas mudanas no esto concludas e fechadas. Muito pelo contrrio. Esse

    processo pleno de idas e vindas, a depender de uma srie de variveis que

    influenciam as relaes de trabalho. nessa perspectiva que se torna importante um

    estudo de tais transformaes, sendo que este trabalho visa a contribuir para a

    compreenso das razes da atual dificuldade encontrada nas aes sindicais.

    Nesse sentido, o objetivo deste artigo analisar os impactos que esse

    processo de reestruturao produtiva teve sobre o mercado e as relaes de trabalho

    em sua totalidade, priorizando as mudanas sofridas pelo sindicalismo nesse

    processo ao longo dos anos de 1990, pois foi nesse perodo que o poder de barganha

    dos sindicatos perdeu significativa capacidade, o que dificultou sua atuao como

    representante dos trabalhadores. Para tal, o artigo divide-se em trs sees para alm

    desta breve introduo. A prxima seo apresenta a crise do movimento sindical,

    sendo que a seo seguinte ressalta os principais fatores que contriburam para essa

    crise. A ltima seo objetiva sintetizar as principais idias apresentadas ao longo do

    texto.

    Reestruturao Produtiva e Crise da Organizao Sindical.

    As relaes trabalhistas do modelo de racionalizao produtiva

    Taylorista/Fordista, com os sindicatos e o Estado keynesiano formando, juntos, uma

    rede de proteo ao emprego e renda,i estavam baseadas, em sua maioria, nos

    sindicatos de massa (especialmente no setor industrial) e nas negociaes coletivas,

    representando uma expanso da base social dos trabalhadores organizados. Houve,

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    nesse perodo, um aumento da representatividade sindical, medida pelas taxas de

    sindicalizao, e de maior institucionalizao da participao poltica do movimento

    sindical.iiDesta forma, por um lado, esse sistema de produo apresentava-se como

    uma resposta do capital resistncia dos trabalhadores, com a inteno de dominar aproduo, buscando um novo tipo de controle do processo de trabalho, dividindo-o,

    simplificando-o e desqualificando-o. Por outro lado, houve um crescimento do poder

    de barganha dos trabalhadores, cujas resistncias aos novos mtodos organizacionais

    foram intensas, no s pela resistncia surdano interior das fbricas, como tambm

    em momentos de conflitos abertos, por meio de greves e manifestaesiii.

    Contudo, tal ao sindical - combativa e contestativa - vem apresentando

    dificuldades para enfrentar as mudanas que ocorreram nos processos produtivos

    com a introduo de inovaes tecnolgicas e organizacionais com base na

    flexibilizao. Tal dificuldade conseqncia de um conjunto de fatores, muitas vezes,

    especficos, que dependem de cada pas ou setor. Porm, de maneira geral, o

    complexo processo de reestruturao produtiva, fundamentado em um sistema de

    racionalizao de produo toyotista (principalmente nas grandes empresas) e um

    modelo econmico e poltico voltado para o mercado, com grandes os impactos sobre

    o "Mundo do Trabalho", contribuiu, de forma significativa, para o declnio da ao

    coletiva dos trabalhadores.

    importante ressaltar que a expresso aqui utilizada como crise do

    sindicalismo" entendida como sendo uma crise de um modelo de sindicalismo

    baseado, particularmente, no sistema Fordista/Taylorista de produo. Desta forma, o

    momento atual pode significar no o fim do sindicato, mas, sim, um perodo de

    transio, ou seja, um perodo de surgimento de um novo modelo de sindicalismo,

    voltado para a racionalizao flexvel da produo.

    O dinamismo do movimento sindical pode ser percebido, dentre outros, por

    meio de dois importantes indicadores: a taxa de sindicalizao e a capacidade de

    organizar grevesiv. Pela Tabela I, verifica-se que, entre os anos de 1970 e 1980,

    houve uma tendncia mundial de queda nas taxas de sindicalizao. Porm, de forma

    no muito ntida, tendo, inclusive, aumentado em alguns pases (como o caso da

    Itlia, Alemanha, Inglaterra e Sucia). Foi a partir dos anos de 1980 que essa

    tendncia mostrou-se de maneira mais relevante, perodo em que todos os pases

    selecionados tiveram uma queda na taxa de sindicalizao, com exceo da Sucia,

    que s demonstrou essa tendncia aps 1990. Ao que parece, na primeira metade

    dos anos de 1990, tambm ocorreu uma queda geral nas taxas de sindicalizao.

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    Tabela 1 - Evoluo da Taxa de Sindicalizao (1970-1990)

    Pases 1970 1980 1990 1995a

    Frana 22,3 17,5 9,8 6,1Itlia 36,3 49,3 38,8 30,6bEspanha 27,4 25,0 11,0 11,4bAlemanha 33,0 35,6 32,9 29,6Inglaterra 44,8 50,4 39,2 26,2cSucia 67,7 79,7 82,2 77,2Estados Unidos 23,2 22,3 15,6 12,7a - mo-de-obra no-agrcola;b - ano de 1994;c - Reino Unido.Fonte: OCDE, citado por Dedecca (DEDECCA, S. Racionalizao Econmica eHeterogeneidade nas Relaes e nos Mercados de Trabalho no Capitalismo Avanado. In:CARLOS, Alonso B. & MATTOSO, Jorge E. L. (Orgs.). Crise e Trabalho no Brasil: modernidadeou volta ao passado?, So Paulo: Scritta, 1996, p. 65), para os anos de 1970-90 e OIT, citadopor RODRIGUES (RODRIGUES. I. J. op. cit, p. 310), para os anos de 1995.

    Todavia, um declnio nas taxas de sindicalizao, embora seja um indicador

    importante, no significa, necessariamente, uma queda no poder sindical (poltico ou

    econmico), ou seja, na capacidade dos sindicatos de impor, vetar ou modificar

    decises que partam do governo, das empresas ou de outras elites. Torna-se

    necessrio, desta maneira, fazer uma anlise sobre o movimento grevista, isto , dos

    nveis de conflito, para melhor compreenso das transformaes que vm ocorrendo

    no poder sindical nestas ltimas dcadas. A greve vista, no campo sociolgico,

    como uma manifestao de conflitos de interesses,vsendo um importante instrumento

    de reivindicao por parte dos trabalhadores, de seus direitos, de sua participao no

    espao poltico, de redefinio das relaes de trabalho e de resistncia s formas de

    dominao do capital sobre o trabalho. Sendo assim, uma forma de presso para

    obter melhorias concretas (econmicas, sociais, melhor qualidade de emprego,

    polticas etc.).

    No que diz respeito s aes e s prticas grevistas dos movimentos

    operrios, o que se observa que esse indicador tambm demonstrou uma tendncia

    geral de declnio ao longo da dcada de 1980 e incio da de 1990. Como exemplo,pode-se citar o trabalho de McLlro,vi que, em um estudo sobre os sindicatos na

    Inglaterra, expe:

    Houve em mdia apenas 893 greves por ano entre 1986 e 1989, comparadacom a mdia anual de 2.412 na segunda metade dos anos 1970, e 1.276 naprimeira metade dos anos 1980. O nmero de greves caiu para 369 em 1991,253 em 1992, 211 em 1993 e 205 em 1994, o menor nmero desde que osregistros comearam em 1891.

    O movimento de greves, nos pases da OCDE, tambm atingiu os nveis mais

    baixos ao longo dos anos de 1980 e de 1990. (...) a mdia por ano dos dias ocupados

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    em greves por 100 trabalhadores, no perodo de 1974-79 era de 40; no perodo de

    1980-1990, decresce para 25, e em 1989-90, de 16.vii

    Um estudo um pouco mais recente e bastante completo sobre a evoluo do

    movimento grevista nos principais pases centrais, pode ser visto em Rodrigues.viiiSegundo este autor, que analisa os trs principais aspectos de conflitos grevistas

    (nmero de greves, nmero de grevistas e dias de trabalho perdidos por conflitos

    trabalhistas), as principais concluses que se podem tirar, de acordo com os dados da

    OIT e que so importantes aqui ressaltar, so:

    "Todos os indicadores sugerem (...) o declnio da taxa de greves como atendncia principal na rea dos conflitos trabalhistas.Esse declnio no linear nem atinge ao mesmo tempo e com a mesmaintensidade todos os pases (...).

    Em certos casos, as quedas nacionais nas taxas de sindicalizao e de greve(...) parecem fortemente influenciadas por uma mesma causa: o declnio daimportncia de segmentos da classe trabalhadora mais propensos greve (...).(...) objetivos defensivos parecem estar na raiz da maioria das grevesdeflagradas a partir de meados de 1985 (...).(...) est contida em nossa apreciao da evoluo da curva de greve a hiptesede que a dessindicalizao diminui a fora dos sindicatos e tende a reduzir osndices de conflito trabalhista, a afetar negativamente o poder sindical, emespecial, porque os movimentos de trabalhadores (...) necessitam deorganizao (...)".

    Apesar dessa tendncia geral, o que se verifica, na realidade, que todas

    essas transformaes no ocorrem, em cada espao e tempo particular, da mesma

    forma, intensidade e ritmo. H, nos diversos pases e setores, uma srie de variveis

    culturais, polticas, econmicas e sociais, filtrando tais mudanas no sistema produtivo

    e nas relaes de trabalho, que revelam caractersticas especficas a depender de

    cada contexto.

    Tambm no Brasil o sindicalismo vem passando por uma srie de dificuldades

    devidas: a) s transformaes do processo produtivo, que foram observadas de forma

    mais significativa a partir dos anos de 1990; b) s questes macroeconmicas de

    inflao - e dos vrios planos de estabilizao durante a dcada de 1980 e a primeira

    metade da de 1990 - do pagamento da dvida externa, das elevadas taxas de juros, da

    m distribuio de renda etc.; e c) s questes polticas de represso, corrupo e

    outras.

    A ao sindical brasileira passou por um momento de grande excluso da

    poltica e dos locais de trabalho durante o perodo do regime militar, tendo pouco

    espao para apresentar reivindicaes formais. Porm, em finais da dcada de 1970,

    surgiu uma nova fase na ao sindical no pas, com o denominado Novo

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    Sindicalismo, contrariando a tendncia internacional. Esse movimento teve incio

    como uma crtica dos sindicatos dos metalrgicos do ABC paulista sobre a poltica

    social e econmica do governo federal. Foi uma ruptura com os sindicatos

    corporativistas e burocrticos. Desta forma, o Novo Sindicalismo, no Brasil, foi umaresposta e uma oposio ao sindicalismo populista e burocrtico vigente na poca. ix

    Assim, foi a partir do final dos anos de 1970 que grande parte dos sindicatos

    conseguiu recuperar seus espaos no cenrio poltico nacional, sendo que (...)

    verificou-se um crescimento na taxa de sindicalizao, no nmero de greves e na

    maior presena dos sindicatos na vida nacional.x

    Ora, obviamente, vale ressaltar que o "Novo Sindicalismo" no surgiu do nada.

    "Como diz, a greve de 1978 no uma 'coisa solta no ar', um 'novo' que irrompe

    espontaneamente";ximas, sim, dos movimentos de base, que era possvel encontrar

    no interior dos prprios modelos sindicais do pr ("Sindicalismo Populista") e do ps-

    64. O movimento operrio algo complexo e de difcil caracterizao em modelos

    rgidos. H vrios estudosxiique mostram que, apesar das caractersticas do "Velho

    Sindicalismo" (com as lideranas afastadas dos problemas de "cho-de-fbrica"),

    existia uma importante organizao de base dos trabalhadores, apesar de todas as

    dificuldades e restries, inclusive, legais. Como exemplos desses movimentos,

    podem-se citar: as greves que ocorreram entre os anos 1950 e 1970 no setor

    metalrgico paulista, com destaque para a organizao dos trabalhadores na Ford-

    Willys em So Bernardo do Campo; as greves do incio dos anos de 1950 a 1964 no

    Rio de Janeiro, convocadas, especialmente, pelo Comando Geral dos Trabalhadores

    (CGT); as greves em Contagem e Osasco em 1968; e a intensificao dos trabalhos

    de base por parte dissidente da diretoria do Sindicato dos Metalrgicos de So

    Bernardo do Campo e Diadema, que criaram o Conselho de Coordenao do

    Trabalho de Base no incio dos anos de 1970 e realizaram do I Congresso dos

    Trabalhadores Metalrgicos de So Bernardo do Campo e Diadema, em 1974. Foram,

    justamente, tais movimentos que, de maneira complexa e at mesmo contraditria,

    organizaram as bases do "Novo Sindicalismo" bem antes dos anos de 1970.

    Entretanto, apesar do "Novo Sindicalismo", atualmente, como pode ser

    observado no Grfico 1, um dos problema enfrentados pelo movimento sindical

    brasileiro diz respeito sua crise de representatividade. Essa crise se expressa na

    taxa de sindicalizao, que sempre foi baixa e revelou uma tendncia de queda ao

    longo dos anos de 1990. De 1992 a 1998, a porcentagem de pessoas associadas a

    sindicatos sobre o total do pessoal ocupado baixou de 16,7% para 15,9%, uma queda

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    de 0,8 pontos percentuais. Aps 1998, essa taxa voltou a se recuperar, chegando a

    17,7%, em 2003, sendo, inclusive, um ponto percentual acima da taxa apresentada

    em 1992. Esse crescimento na taxa de sindicalizao, porm, no foi uniforme. No

    ano de 1992, a taxa de sindicalizao dos trabalhadores urbanos estava em 17,7%,declinando pra 16% em 2002, ou seja, uma queda de 1,7 pontos percentuais em 10

    anos. Essa taxa voltou a se recuperar um pouco em 2003, chegando a 16,7%. J a

    taxa de sindicalizao dos trabalhadores rurais cresceu significativamente, passando

    de 13,9%, em 1992, para 22,0%, em 2003 (crescimento de 8,1 pontos percentuais).

    No entanto esse crescimento da taxa de sindicalizao dos trabalhadores rurais no

    ocorreu somente em decorrncia da elevao do nmero de associados, mas,

    essencialmente, em funo do declnio das pessoas ocupadas.xiiiAlm do mais, em

    termos de gnero, esse aumento de associados ocorreu, fundamentalmente, entre as

    mulheres, tradicionalmente mais frgeis nos movimentos reivindicatrios do pas.

    Assim, observa-se que o crescimento da taxa de sindicalizao, principalmente a

    partir de 1999, no pode ser entendido como uma melhora do movimento sindical,

    mas, sim, em razo do declnio dos trabalhadores ocupados nas atividades rurais e do

    crescimento significativo das mulheres entre os associados.

    Grfico 1 - Porcentagem de Pessoas Associadas a Sindicatos sobre o Total depessoas de 10 anos ou mais, ocupadas na semana de referncia - Brasil

    (1992-2003)

    13,0%

    15,0%

    17,0%

    19,0%

    21,0%

    23,0%

    1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

    Anos

    %

    Total Urbana Rural

    Fonte: IBGE/PNAD

    Vale observar tambm que, alm da tendncia de queda da taxa de

    sindicalizao, houve um aumento no nmero de sindicatos. Os ltimos dados

    disponveis mostram que, desde a dcada de 1980, tem-se observado um

    crescimento no nmero de sindicatos no pas, o que levou a uma atomizao da

    representao sindical. Segundo dados do IBGExiv, entre 1988 e 1992, a taxa de

    crescimento mdio anual no nmero de sindicatos no pas foi de 5,3% e, entre 1992 e

    2001, essa taxa foi de cerca de 4%, sendo que o nmero de sindicatos no Brasil

    passou de 11.193, em 1992, para 15.961, em 2001, com expressiva importncia para

    o crescimento de sindicatos de trabalhadores autnomos. De acordo com Comin &

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    Castroxv: "Informalmente, tcnicos do Ministrio do Trabalho estimam que o nmero

    de sindicatos no Brasil, atualmente, esteja na casa dos 20 mil" (cerca do dobro do

    incio da dcada). Os dados do Ministrio do Trabalho, citados por Almeida,xvitambm

    ratificam essa tendncia de multiplicao e fragmentao das entidades sindicais.Segundo a autora, entre os anos de 1990 e 1996, foram criadas no Brasil 5.034 novas

    entidades sindicais de empregados e empregadores nos mais diversos setores da

    atividade econmica. Isto mostra que, alm da queda na taxa de sindicalizao, houve

    ainda uma fragmentao dos sindicatos. Em outras palavras, mais sindicatos com

    menos associados e, conseqentemente, menor poder de barganha.

    No que diz respeito ao movimento operrio brasileiro, o ano de 1978

    representa um marco histrico, visto que paralisaes grevistas tiveram, a partir da,

    um crescimento de propores inditas no pas (verGrfico 2, 3 e 4). Ao observar os

    anos de 1980 em sua totalidade, o que se verificou de imediato foi o aparecimento de

    um novo ciclo de greves, com uma evoluo crescente, ao longo da dcada, de todos

    os indicadores de greves. No incio da dcada de 80, as paralisaes comearam,

    basicamente, no setor privado industrial e, ao longo do tempo, passaram a ser mais

    expressivas nos setores pblicos ou de servios, mudando, assim, as principais

    categorias grevistas. Outro aspecto importante a ressaltar foi a proporcionalidade da

    evoluo do conflito trabalhista e as etapas da transio trabalhista. As greves foram,

    tambm, alm de aes apenas de reao, a forma de ao e reconstruo do

    movimento sindical.

    Grfico 2 - Evoluo do Nmero de Greves no Brasil (1978-1999)

    0

    1000

    2000

    3000

    4000

    5000

    78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96* 97 98* 99*

    Ano

    NGreves

    Fonte: NEPP/UNICAMP, pesquisa Acompanhamento de greves no Brasil.* Dados Estimados pela variao da mdia mensal do total do nmero de greves apresentados

    pelo Boletim do DIEESE.

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    Grfico 3 - Nmero de Grevistas no Brasil (1978-99)

    0

    5.000.000

    10.000.000

    15.000.000

    20.000.000

    25.000.000

    78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98* 99*

    Ano

    NGrevistas

    Fonte: NEPP/UNICAMP, pesquisa Acompanhamento de greves no Brasil.* Dados Estimados pela variao da mdia mensal do total do nmero de grevistasapresentados pelo Boletim do DIEESE.

    Grfico 4: Jornada de Trabalho Perdida no Brasil (1978-97)

    0

    50.000.000

    100.000.000

    150.000.000

    200.000.000

    250.000.000

    300.000.000

    78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97Ano

    NGrevistas

    Fonte: NEPP/UNICAMP, pesquisa Acompanhamento de greves no Brasil.

    Esse crescimento do sindicalismo brasileiro comeou a dar sinais de

    esgotamento e crise a partir do final dos anos de 1980 e ao longo dos de 1990.

    Porm, como poder ser observado na seo seguinte, essa crise do sindicalismo

    brasileiro est relacionada no somente aos fatores gerais em funo da

    reestruturao produtiva, mas tambm s questes nacionais e peculiares daeconomia e do mercado de trabalho brasileiro.

    A reverso do movimento grevista no Brasil, nos anos de 1990, pode ser vista

    pelos Grficos 2, 3 e 4. O nmero de greves, depois de crescer um pico de 3.943

    paralisaes, no ano de 1989, caiu de forma significativa. No decorrer dos anos de

    1990, podem-se evidenciar trs perodos importantes para o movimento grevista no

    pas. O primeiro foi de 1990-92, caracterizado por declnio de todos os indicadores das

    greves. O segundo perodo, de 1993 a 1996, foi caracterizado por um crescimento no

    nmero de greves, porm, com uma certa estabilizao nos outros indicadores de

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    greves. O terceiro e ltimo perodo (de 1997 a 1999) se caracterizou por um declnio

    no nmero de greves e de grevistas, entretanto, com um crescimento, at o ano de

    1997, na jornada de trabalho perdida. Esse movimento tem atingido as conquistas

    histricas do movimento sindical, que tem sido incapaz, num primeiro momento, defrear tais transformaes.

    Principais Fatores

    Vrios so os fatores internos, externos, conjunturais e estruturais encontrados

    na literatura especializada, muitas vezes, divergentes, como sendo responsveis pela

    queda dos indicadores que evidenciam a crise do movimento sindical tanto

    internacional quanto brasileiro.

    Dentre eles, observam-se os relacionados s mutaes sofridas pelo mercado

    de trabalho. Ora, a estrutura sindical foi, historicamente, sempre vinculada aos

    trabalhadores estveis(principalmente do setor industrial). Com o desenvolvimento

    das desregulamentaes e da informalidade do mercado de trabalho, mediante a

    subproletarizao,xviios sindicatos organizados verticalmente, ou seja, vinculados a

    uma categoria profissional e mais corporativos, vm perdendo sua capacidade de

    aglutinao do coletivo. Os sindicatos tm, inclusive, dificuldades de se aproximar

    daqueles que esto fora do mercado de trabalho (os desempregados).

    Alm do mais, o mercado de trabalho tem sido, paulatinamente, dinamizado

    pelo setor de servios, diminuindo a participao relativa da indstria na oferta de

    trabalho. Essa dinmica tambm contribui para o enfraquecimento da sindicalizao,

    uma vez que so os assalariados da indstria que se associam com mais intensidade

    aos sindicatos, em relao aos trabalhadores do setor de servios, por conta prpria e

    aos parciais. Nessa tendncia, destaca-se o setor metalrgico, que apresentou, nas

    ltimas dcadas, uma das partes mais avanadas do sindicalismo e foi o setor mais

    atingido pelo progresso tcnico.No que diz respeito ao mercado de trabalho brasileiro (Tabela 2), o que se

    nota o fato de o setor industrial do pas ter seguido essa tendncia de perda de sua

    fora como principal setor que gera postos de trabalho, principalmente a partir dos

    anos de 1990, com o setor tercirio ganhando maior importncia como demandador

    de fora de trabalho. A indstria de transformao participava com uma mdia de

    20,4% do total dos trabalhadores ocupados no ano de 1982; este percentual caiu para

    14,4% no ano de 2001. J o setor de servios passou por um crescimento na mdia

    dos trabalhadores ocupados de 47,4%, em 1982, para 54,6%, em 2001. Aps 2001, a

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    Pesquisa Mensal do Emprego, do IBGE, mudou sua metodologia; porm, apesar disto

    distorcer um pouco os dados, ainda assim, pode-se verificar essa mesma tendncia

    de crescimento do setor de servios como principal setor de ocupao. Isto tem

    contribudo para o declnio do movimento sindical brasileiro, uma vez que o "NovoSindicalismo" tinha por base o setor industrial.

    Um outro fator importante, ainda relacionado s transformaes do mercado

    de trabalho, diz respeito ao desemprego e inflao. Alguns estudiosos apontam uma

    correlao, por um lado, negativa entre desemprego e sindicalizao e, por outro,

    positiva entre inflao e sindicalizao.xviiiSegundo dados da OCDE, observa-se que,

    ao longo dos anos de 1990, houve uma pequena queda na taxa de desemprego de

    seus pases membros, com exceo, principalmente, do Japo. Contudo, na maioria

    desses pases, as taxas de desemprego so relativamente altas se comparadas com

    meados dos anos de 1970, com exceo dos Estados Unidos. Assim, a elevao das

    taxas de desemprego ao longo dos anos de 1980 e a no reverso deste quadro nos

    anos de 1990 podem estar contribuindo de forma negativa para o sindicalismo, visto

    que, conforme observa Rodrigues,xix diminuem as mobilizaes dos trabalhadores,

    sobretudo, na deflagrao de greves; reduzem as taxas de sindicalizao e, por

    conseqncia, abalam as finanas sindicais e tornam os trabalhadores mais

    temerosos na participao da vida sindical e na prpria filiao aos sindicatos,

    porquanto aqueles que conseguem manter os seus empregos so menos propensos

    a aderir aos sindicados. Alm do mais, ainda de acordo com esse autor,

    "(...) a elevao dos nveis de desemprego veio junto com baixas taxas deinflao. A queda da inflao ajudou a tornar mais complexas as funes derepresentao dos sindicatos e, de certo modo, a favorecer a segmentao dasreivindicaes e contratos".

    Tabela 2 - Indicadores do Mercado de Trabalho Brasileiro

    Mdia da participao por posio naocupao do pessoal ocupado

    Mdia da participao setorial

    do pessoal ocupado (%) EmpregadosAno Tx.Desemp.

    Ind.Const.Civil

    Comrcio Serv.C/

    cart.S/

    cart.

    Conta-prpria

    Empregador

    1990 4,9 19,9 7,8 14,7 48,7 55,1 19,4 20,1 4,31995 5,1 16,8 7,4 15,5 51,6 46,8 24,2 23,8 4,12000 8,3 14,6 6,9 15,5 54,2 43,4 27,2 24,2 4,32001 7,4 14,4 6,7 15,4 54,6 44,8 26,5 24,0 3,92002a/b 11,7 17,6 7,6 20,7 53,5 49,3 23,0 21,0 5,42003a 12,3 17,6 7,5 20,2 53,9 47,8 23,7 21,6 5,92004a/c 12,3 17,6 7,4 20,2 54,1 47,3 24,0 22,0 5,7Fonte: IBGE/PME

    a - A partir de 2002 foram usados dados referentes nova metodologia da PME/IBGE;

    b - Mdia de maro a dezembro;

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    c - Mdia de janeiro a junho.

    No Brasil, verifica-se tambm (Tabela 2) o crescimento, a partir do incio dos

    anos de 1990, das taxas de desemprego aberto, principalmente, aps 1998.

    Observou-se no ano de 2000 uma das maiores mdias das taxas de desemprego

    (8,31%) de todas as regies metropolitanas, desde o incio de sua mensurao; sendo

    que no houve um significativo declnio no ano de 2001, que ainda indicou uma

    significativa taxa de desemprego, se comparada com as de todos os anos anteriores.

    Para os dados aps o ano de 2001, j com a nova metodologia da Pesquisa Mensal

    do Emprego, os indicadores de desemprego no apresentaram uma tendncia de

    reverso.

    Paralelo ao desemprego, verifica-se tambm o avano das ocupaes informais,

    com o crescimento da populao ocupada sem carteira de trabalho e por conta-

    prpria, que aumentou de 7,1 e 3,9 pontos percentuais, respectivamente, entre os

    anos de 1990 a 2001 (Tabela 2). Isto em detrimento, particularmente, dos

    trabalhadores com carteira de trabalho que acusaram, no mesmo perodo, um declnio

    de 10,3 pontos percentuais. Tais fenmenos tm criado, para os trabalhadores

    brasileiros, maiores entraves para fazer frente ao capital nos processos de

    negociao, dificultando seu poder de barganha e afastando-os do movimento

    sindical. Alm do mais, pode-se acrescentar a esse fenmeno a queda das taxas deinflao, com o Plano Real. Nos perodos de alta inflao, a ao sindical foi

    importante para evitar perdas ainda maiores no poder aquisitivo dos trabalhadores,

    mobilizando-os em torno de grandes reposies salariais. Porm, com a estabilizao,

    tais atitudes em parte esto superadas.

    Apesar de, obviamente, relacionados, outros fatores, para alm das mudanas

    ocorridas no mercado de trabalho, so tambm importantes para a discusso da crise

    do movimento sindical. Dentre eles, est o constante movimento de individualizao

    das relaes de trabalho. Os processos de transformao produtiva tm levado a umadiminuio da relevncia dos contratos coletivos de trabalho e, por conseqncia, a

    um aumento das negociaes por locais de trabalho e individuais, principalmente se

    se levar em conta a maior "fragmentao dos interesses da classe trabalhadora",xx

    percebida pela crescente diferenciao em seu interior. De acordo com Garcia,xxiessa

    fragmentao dificulta a percepo de igualdade de situao de trabalho; a

    construo de identidades coletivas e a representatividade de interesses

    homogneos, o que colocaria os trabalhadores como "rivais ou concorrentes entre si,

    deslocando ou distribuindo, assim, o conflito para dentro do recinto assalariado". Essa

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    descentralizao vista, inclusive, nos modelos neocorporativistas de relaes de

    trabalho que, tradicionalmente, mantinham negociaes mais centralizadas.xxii Tal

    fragmentao acaba por diminuir a "(...) vocao homogeneizante das relaes de

    trabalho e do sistema legislativo (standart employment relationship)", que perduroudurante os "anos dourados"do ps-guerra.xxiii

    Tal descentralizao pode ser observada medida que os sindicatos vm se

    constituindo cada vez mais por empresas ou sindicato-casa(originrio da Toyota), o

    que fez aprofundar as dificuldades de consolidao e desenvolvimento da

    conscincia de classe. Alm do mais, os sindicatos tm-se voltado, em grande

    medida, para o sindicalismo de participao, com uma tendncia burocratizaoe

    institucionalizao, subordinando os trabalhadores ao universo empresarial e

    contribuindo para o sindicalismo de envolvimento.xxiv Segundo Alvesxxv, h uma

    captura da subjetividade operria pela lgica do capital. Assim, a crise do

    sindicalismo passa, igualmente, por uma dimenso poltica-ideolgica, sendo que os

    sindicatos integram-se lgica mercantil, com a incapacidade de preservar o poder de

    resistncia da classe.

    Alm do mais, o capital tem ampliado sua opo contrria aos movimentos de

    esquerda, crescendo sua hostilidade ao sindicalismo combativo, o que foi facilitado,

    primordialmente, pelo declnio das economias socialistas. Os sindicatos, sob o modelo

    Fordista/Taylorista, estavam mais propensos a manter um certo apoio do capital, j

    que atuavam "(...) no sentido de 'disciplinar' os trabalhadores, evitar 'greves selvagens'

    (...), melhorar a comunicao entre a gerncia e os empregados, moderar os

    aumentos de salrios (...). A ao sindical pode ainda servir de estmulo para o

    progresso tecnolgico e de melhoria da qualidade do produto".xxvi Contudo, esta

    parece no ser a perspectiva do capital no momento atual. As empresas,

    particularmente as transnacionais, inseridas em um contexto de globalizao,

    incertezas e crescimento da competitividade, agem num sentido de maior flexibilidade

    produtiva. Desta maneira, tais empresas tm-se mostrado avessas s normas

    restritivas e aos aumentos de custos impostos pelos sindicatos. Desta forma, o capital

    dificulta (onde a lei permite) o reconhecimento das organizaes sindicais e recusa as

    reivindicaes trabalhistas. Juntamente a essa rejeio aos sindicatos, as grandes

    corporaes ampliaram seus esforos para melhorar as relaes individuais com os

    trabalhadores, por meio de programas de Trabalho Participativo, Crculos de Controle

    de Qualidade, Participao nos Lucros e Resultados e outros, fazendo com que os

    sindicatos apaream como desnecessrios.

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    No que diz respeito s especificidades dos fatores que contriburam para os

    problemas enfrentados pelo sindicalismo brasileiro, o que importante acrescentar

    o fato de esse movimento sindical, ao longo de toda a sua histria de reivindicaes,

    no ter o costume de discutir o processo de trabalho, ficando sua agenda centrada naquesto do emprego e do salrio.xxviiAt mesmo porque as dificuldades econmicas

    enfrentadas pelo pas, especialmente na dcada de 1980, fizeram com que estas

    questes se tornassem fundamentais para a sobrevivncia do trabalhador, forando

    os sindicatos a aes defensivas e atadas ao imediatismo, regredindo em sua defesa

    de classe frente ao capital.xxviiiAssim sendo, a forma como o trabalho desenvolvido e

    como o trabalhador insere-se nele so questes que estavam fora das preocupaes

    primordiais dos sindicatos. Com as inovaes organizacionais e tecnolgicas, torna-se

    imperativo entrar na discusso do processo de trabalho.

    Desta forma, verifica-se que o projeto de modernizao da economia brasileira,

    implementado a partir do incio dos anos de 1990, com a abertura comercial; a

    diminuio da interveno estatal; a internacionalizao do capital; e a implantao

    das polticas neoliberais orientadas pela economia de mercado fizeram com que

    houvesse um deslocamento do poder do Estado para as empresas no que diz respeito

    reorganizao produtiva. Nessas condies, houve uma transformao estrutural no

    mercado de trabalho brasileiro e nos processos produtivos, com srias conseqncias

    para o sindicalismo e o movimento operrio, sendo este visto como um entrave ao

    laisser faire.

    Outros elementos importantes tambm contriburam para a crise do movimento

    operrio brasileiro. No que concerne Constituio de 1988, tem-se que esta

    consolidou, contraditoriamente, tanto avanos quanto um conservadorismo na

    estrutura sindical. Houve um aumento da liberdade sindical; foi dado ao funcionalismo

    pblico o direito de sindicalizao; e, alm do mais, foram estendidos ao campo vrios

    direitos sindicais antes restritos somente para os trabalhadores urbanos. Contudo, os

    sindicatos continuavam a ser organizados por categoria profissional, proibindo-se a

    criao de mais de um sindicato por categoria sob uma mesma base territorial.

    Somada a isso, h uma ausncia do direito legal de organizao nos locais de

    trabalho.

    Assim, nota-se, no perfil sindical brasileiro, que este revela uma

    representatividade fragmentada. Primeiro, porque a rotatividade e a flexibilidade do

    trabalho dificultam que o trabalhador se reconhea e/ou se mantenha sindicalizado.

    Nesse sentido, o sindicato corre o risco de representar os interesses somente dos

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    trabalhadores menos sujeitos rotatividade e, conseqentemente, daqueles

    trabalhadores que tm melhores condies, melhor escolaridade, melhores salrios e

    menos incertezas com relao ao mercado de trabalho. Enquanto que os

    trabalhadores mais sujeitos rotatividade, justamente aqueles mais necessitados deum representante de seus interesses, ficam margem dos sindicatos. Em segundo

    lugar, a fragmentao da representao devida, ainda, ao fato de que, no perodo

    recente, houve um aumento do nmero de sindicatos, juntamente com o crescimento

    do desemprego e da informalidade, e uma diminuio da taxa de sindicalizao, ou

    seja, aumenta o nmero de sindicatos com pequeno nmero de associados, como foi

    observado acima.

    Por ltimo, verifica-se ainda um crescimento do nmero de trabalhadores em

    pequenas e mdias empresas: um fenmeno impulsionado, basicamente, pelo

    processo de terceirizao, com as grandes empresas repassando tarefas s menores.

    justamente nessas pequenas e mdias empresas que a taxa de sindicalizao

    tende a ser menor. No Brasil, isto pode ser observado acompanhando os dados da

    Relao Anual de Informaes Sociais (RAIS), do Ministrio do Trabalho, que

    mostram que, ao longo dos anos de 1990, houve uma inverso no mercado de

    trabalho formal brasileiro. Se, no ano de 1990, a maior parte dos empregados estava

    alocada em empresas de mais de 500 trabalhadores (38,8%), no ano 2002, essa

    maioria estava representada pelas empresas de 0 a 49 trabalhadores (38,2%).

    Conforme foi observado por Rodrigues,xxix

    "(...) quanto menor a parcela dos empregados que trabalham em pequenasfirmas (...), maior tende a ser o nvel de sindicalizao. A expanso de pequenasfirmas num setor geralmente considerada uma ameaa para o sindicato".

    Uma outra caracterstica do perfil sindical no Brasil, atualmente, a

    descentralizao e pulverizao das negociaes coletivas de trabalho, pois, de

    acordo com os ltimos dados disponveis (ano de 2001), a maioria dos sindicatos

    brasileiros de base territorial municipal (53%) e intermunicipal (25%)xxx, o que mostra

    uma descentralizao das negociaes coletivas, as quais ficam restritas aos

    interesses dos trabalhadores por categorias profissionais e a uma base geogrfica

    mnima. Vale observar que contraditoriamente a essa fragmentao tem ocorrido uma

    tendncia ao crescimento dos sindicatos estaduais, em detrimento dos de base

    territorial municipal e intermunicipal. Entre 1992 e 2001, os sindicatos de base

    territoriais estaduais passaram de 15% para 20%, fenmeno que foi muito pouco

    observado se comparado com o perodo anterior (1998 a 1992). Contudo, ainda

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    assim, a base territorial dos sindicatos no pas , em grande parte, municipal e

    intermunicipal.

    Tem-se, ainda, como perfil sindical brasileiro, a sua atuao assistencial e

    burocratizada. Apesar de o Novo Sindicalismo combater as prticas assistencialistas,elas ainda permanecem, principalmente os servios jurdicos e assistncia mdica,xxxi

    com pouca presena de delegados sindicais e de comisses de fbricas, dificultando

    e restringindo as aes militantes de "cho-de-fbrica".

    preciso destacar ainda que os sindicatos esto estruturados de forma

    verticalizada, permanecendo vinculados a uma categoria assalariada, com uma base

    territorial (como visto, em sua maioria, municipal), o que dificulta uma perspectiva

    horizontal mais ampla de organizao (e resistncia) de classe. Alm do mais, a ao

    sindical sempre privilegiou os interesses de determinada categoria em detrimento do

    conjunto da sociedade. O sindicato no pode, no momento atual, ter como perspectiva

    a representao somente de quem conta com um contrato formal de trabalho que o

    identifique com sua categoria, seno estar representando, progressivamente, um

    nmero menor de trabalhadores, diminuindo seu poder de barganha e de

    reivindicao.

    Alm do mais, o sindicalismo brasileiro possui um pequeno nmero de

    organizaes nos locais de trabalho, restritas a apenas um reduzido nmero de

    empresas, no sendo difundidas para o conjunto do movimento sindical. Isto

    resultado tanto da postura marcadamente contrria organizao, nos locais de

    trabalho, por parte dos empresrios, quanto da inexistncia de uma legislao que

    proteja de fato o direito organizao dos trabalhadores no interior das empresas. Os

    impactos que isto traz para o sindicalismo podem ser apreendidos no trabalho de

    Codas.xxxiiSegundo o autor, "os sindicatos de categoria sem organizao nos locais de

    trabalho so politicamente incapazes de perceber, acompanhar e responder s

    transformaes que esto acontecento no 'cho-de fbrica'".

    Verifica-se, dessa forma, que a busca pela competitividade, no Brasil, tem se

    dado com uma profunda excluso. Por um lado, pela via do desemprego, com ganho

    de produtividade pelo setor industrial combinado com uma queda no nvel de

    ocupao, com a terceirizao e a intensificao do ritmo de trabalho; por outro, pela

    excluso sindical, que tem se caracterizado por um processo de negociao da

    produtividade entre empregados e empregadores, cujas entidades sindicais no esto

    sendo reconhecidas pelos setores produtivo e governamental e, muitas vezes, pelos

    prprios trabalhadores, como interlocutores representativos (DIEESE, 1997: 11).

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    Consideraes finais

    Como foi possvel observar ao longo do presente texto, o movimento neoliberal

    e o processo de reestruturao produtiva, acompanhados pela implantao de novastecnologias; de novos mtodos organizacionais e da privatizao, contriburam para a

    diminuio das taxas de sindicalizao; o crescimento das dificuldades de aes

    coletivas, por parte dos trabalhadores, em detrimento de aes por empresas ou

    individuais; e o recrudescimento das dificuldades para um fortalecimento das aes

    sindicais de classe, e, por conseguinte, do poder de barganha dos trabalhadores,

    frente aos processos de mudana rumo s novas formas de organizao do processo

    de trabalho. Nesse contexto, as corporaes transnacionais tornam-se cada vez mais

    geis diante da resistncia dos sindicatos organizados, por meio, principalmente, da

    introduo de inovaes organizacionais e tecnolgicas. Assim, essas transformaes

    trouxeram consigo mudanas negativas ao Mundo do Trabalho, tais como elevadas

    taxas de desemprego, a informalizao das ocupaes e maiores incertezas para os

    trabalhadores, inclusive, para aqueles mais qualificados e com melhores condies

    para enfrentar os perodos recessivos. Alm disso, todas essas implicaes so ainda

    mais recrudescidas pelas polticas de reformas institucionais do Estado, como o

    caso dos processos de privatizao.

    No que diz respeito aos aspectos das mudanas rumo aos novos paradigmas

    tecnolgicos e organizacionais e seus impactos sobre as organizaes sindicais

    observou-se que os sindicatos perderam parte de sua capacidade de ao. As

    principais dificuldades verificadas foram: a) queda da capacidade dos sindicatos de

    fazer frente a esse processo de reestruturao produtiva, evidenciada pela diminuio

    do movimento grevista, ao longo dos anos de 1980, nos principais pases capitalistas

    do mundo, e, no Brasil, a partir dos anos de 1990; b) a diminuio das taxas de

    sindicalizao; c) o aparecimento de uma viso de acordos mais individualizados narelao capital-trabalho, com queda das negociaes coletivas; d) a crise da

    representatividade dos sindicatos, a qual se constitui pela no incorporao, por parte

    dos sindicatos, dos trabalhadores informais, daqueles que esto saindo do mercado

    de trabalho pelo desemprego; e e) a dificuldade de uma ao coletiva que atenda aos

    interesses da sociedade, graas aos novos mtodos organizacionais que levam a um

    individualismo dos trabalhadores.

    Observa-se, dessa forma, que as relaes de trabalho, conforme as mudanas

    por que passou a economia brasileira nos anos de 90, apresentaram uma tendncia

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    de queda do assalariamento e conseqente aumento da precarizao do Mundo do

    Trabalho, diminuindo o j escasso poder de barganha dos sindicatos e dos

    trabalhadores. Essa tendncia foi ainda mais agudizada pelas reformas do marco

    legal e institucional, rumo maior flexibilizao do trabalho, abrindo um espao aindamaior para que as empresas possam adaptar os contratos de trabalho diante do

    acirramento da competio em condies desvantajosas, oriundas das novas

    orientaes da poltica econmica.xxxiii

    No Brasil, esse processo de reestruturao produtiva ganhou impulso, a partir

    dos anos de 1990, com as polticas neo-liberais implementadas pelo governo Collor e

    ratificadas pelos dois mandatos do governo Cardoso, de privatizao, de abertura

    econmica, de flexibilizao e de ajuste fiscal. Esse processo transformou o mercado

    de trabalho e o sindicalismo brasileiro, sendo as razes do franco processo de crise

    em que se encontram, que pode ser observado: a) pelo crescimento do desemprego

    aberto; b) pela queda do emprego formal na economia brasileira, o que, por

    conseqncia, levou a aumentar a informalizao do mercado de trabalho;

    precarizando-o, com os trabalhadores part-time, autnomos, por conta-prpria e

    outros, que no possuem qualquer garantia do cumprimento das leis trabalhistas; c)

    pela diminuio da participao do setor industrial nas ocupaes e pelo aumento do

    setor tercirio, que uma conseqncia tambm do processo de terciarizao da

    economia brasileira; d) pela estrutura e um perfil dual do sindicalismo brasileiro, no

    qual convivem as caractersticas corporativistas e assistencialistas do passado

    autoritrio, mescladas com as mudanas ocorridas pelo sindicalismo, a partir do final

    da dcada de 1970, com o surgimento de Novo Sindicalismo, mais reivindicativo e

    combativo; e) pela no incorporao das mudanas nos processos produtivos nas

    reivindicaes sindicais, ficando com uma agenda, especialmente na dcada de 1980,

    centrada no emprego e no salrio; e f) pela incapacidade do movimento sindical de

    atuar de forma flexvel, coordenando diferentes nveis de negociao. De um lado, no

    tem sido forte no plano poltico para negociaes centralizadas; de outro, no

    conseguiu inserir-se nas empresas - nos locais de trabalho - para negociar questes

    especficas de cada situao de trabalho e emprego

    i PRADO, Antnio. Mudanas na negociao sindical no anos recentes. In: So Paulo emperspectiva, So Paulo: SEADE, vol. 12, n. 1, p. 30, 1998.

    iiMATTOSO, Jorge. A Desordem do Trabalho, So Paulo: Pgina aberta, 1995, pp. 47-48.iiiLEITE, Marcia Paula. O Futuro do Trabalho: Novas Tecnologias e Subjetividade Operria, So

    Paulo: Scritta, 1994, pp. 59-73.

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    ivCf. Almeida (ALMEIDA, Maria H. Tavares, Sindicatos em tempos de reforma. In: So Pauloem perspectiva, So Paulo: SEADE, vol. 12, n. 1, p. 3-5, 1998) para uma reviso dosindicadores de anlise de poder dos sindicatos.

    vRODRIGUES, Iram Jcome. O Emprego como Tema Central na Agenda Sindical. In: EstudosEconmicos, So Paulo: IPE/USP, vol. 27 (especial), 1999, p. 120.

    viMcILRO, John. O Inverno do Sindicalismo. In: ANTUNES, R. (Org.). Neoliberalismo, Trabalhoe Sindicatos: Reestruturao Produtiva no Brasil e na Inglaterra. Coleo Mundo doTrabalho, So Paulo: Boitempo Editorial, 1997, p. 53.

    viiALVES, Giovanni. Reestruturao Produtiva e Crise do Sindicalismo no Brasil, Campinas:UNICAMP/IFCH. Tese de Doutorado (mimeo), 1998, p. 14.

    viiiRODRIGUES, I. J. Op. cit, p. 131-154.ix MANGABEIRA, Wilma Dilemas do novo sindicalismo: democracia e poltica em Volta

    Redonda; Rio de Janeiro: Relume-Dumar, ANPOCS, 1993, p. 13-15.x

    POCHMANN, Marcio. Mudana e Continuidade na Organizao Sindical Brasileira no PerodoRecente. In: CARLOS, Alonso B. & MATTOSO, Jorge E. L. (Orgs.). Crise e Trabalho noBrasil: modernidade ou volta ao passado, So Paulo: Scritta, 1996, p. 271.

    xiNEGRO Antnio Luigi. "Nas origens do 'Novo Sindicalismo': o maio de 59, 68 e 78 na indstriaautomobilstica". In: RODRIGUES, Iram Jcome (Org.). O Novo Sindicalismo. So Paulo:Vozes/EDUC/UniTrabalho, 1999, p. 29.

    xii Entre os estudos que mostram que mesmo no interior do "Velho Sindicalismo" havia umimportante trabalho de base, por parte dos trabalhadores, pode-se citar: MATTOS, MarceloBadar. Novos e velhos sindicalismos no Rio de Janeiro(1955-1988), Rio de Janeiro: Vciode Leitura, 1998. NEGRO Antnio Luigi. "Nas origens do 'Novo Sindicalismo': o maio de 59,68 e 78 na indstria automobilstica". In: RODRIGUES, Iram Jcome (Org.). O NovoSindicalismo. So Paulo: Vozes/EDUC/UniTrabalho, 1999, p. 9-31. ABRAMO, Las Wendel.

    O resgate da dignidade: greve metalrgica e subjetividade operria. Campinas: EditoraUNICAMP; So Paulo: Imprensa Oficial, 1999. AROUCA, Jos Carlos. O sindicato em ummundo globalizado. So Paulo: LTr, 2003.

    xiiiPara um estudo sobre outras variveis relacionadas taxa de sindicalizao Cf. CARDOSO,Adalberto Moreira. A dcada neoliberal e a crise dos sindicatos no Brasil. So Paulo:Boitempo, 2003, p. 205-247.

    xivIBGE. Sindicatos: indicadores sociais 2001. Rio de Janeiro: IBGE, 2002 p. 21-27.xvCOMIN, Alvaro A. & CASTRO, Nadya A. "As novas esferas de regulao do trabalho e o

    dilema sindical". In: SEADE, So Paulo em perspectiva, vol. 12, n. 1, jan-mar/1998. SoPaulo: SEADE, 1998, p. 51.

    xviALMEIDA, M. H. T. Op. cit. p. 6-7.xvii Termo utilizado por Antunes (ANTUNES, Ricardo. Adeus ao Trabalho? Ensaio sobre as

    Metamorfoses e a Centralidade do Mundo do Trabalho. 4 ed., So Paulo: Cortez;Campinas: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 1997, p. 44), para identificar asdiferentes formas de trabalho, cada vez mais presentes: (...) trabalho precrio, parcial,temporrio, subcontratado, terceirizado, vinculadas economia informal (...)".

    xviiiRODRIGUES, Lencio Martins., Destino do sindicalismo. So Paulo: Editora daUniversidasde de So Paulo: FAPESP, 1999, p. 190-194.

    xixRODRIGUES, L. M. Op cit. p. 191.xxIbidem, p. 177-195.xxiGARCIA, Jesus C. Delgado, Negociao coletiva de trabalho: do fordismo ao toyotismo. In:

    So Paulo em perspectiva, So Paulo: SEADE, vol. 12, n. 1, 1998, p. 90.

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    xxiiRODRIGUES, L. M. Op. cit, p. 203.xxiiiMATTOSO. Op. cit. p. 100.xxiv

    ANTUNES. R. Op. cit, p. 25.xxvALVES, G. Op. cit, pp. 85-104.xxviRODRIGUES, L. M. Op. cit, p. 219.xxviiRODRIGUES, I. J. Op. cit. p. 117-136.xxviiiANTUNES, Ricardo. O Novo Sindicalismo no Brasil. 2 ed. rev. e ampl.; Campinas, SP: Ed.

    Pontes, 1995, p. 52.xxixRODRIGUES, L. M. Op cit. p. 178.xxxIBGE, Op. cit. p. 22xxxiIBGE, Op. cit. p. 66xxxii

    CODAS, Gustavo, "O 'rapto' da vanguarda". In: SEADE, So Paulo em perspectiva, vol. 12,n. 1, jan-mar/1998. So Paulo: SEADE, 1998, p. 56.xxxiii DEDECCA, S. & BALTAR, Paulo E. A. Mercado de Trabalho e Informalidade nos Anos

    90. In: Estudos Econmicos, So Paulo: IPE/USP, vol. 27 (especial), 1997, p. 65-84.