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    SISTEMAS PBLICOS DE COMUNICAO NO MUNDOExperincias de doze pases e o caso brasileiro

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    Intervozes Coletivo Brasil de Comunicao Social (Gesto 2008/2009)

    Conselho Diretor

    Carolina Ribeiro

    Cristina Charo

    Daniele Ricieri

    Jonas Valente

    Mariana Martins

    Mayr Lima

    Sivaldo Pereira da Silva

    Coordenao Executiva

    Bia Barbosa

    Brulio Ribeiro

    Flvio Gonalves

    Joo Brant

    Marcos Urup

    Mariana Pires

    O presente livro est licenciado por meio da autorizao Creative Commons

    (Atribuio No Comercial Compartilhar Igual verso 2.5), disponvel em

    . Em funo da cita-

    da licena Creative Commons, os artigos que compem a obra podero ser

    reproduzidos, integral ou parcialmente, podendo ser, at mesmo, traduzidos,

    desde que sempre seja reconhecido o direito de atribuio e referncia aos

    nomes dos autores e desta obra, nos termos da licena. Adicionalmente, caso o

    uso implique alterao, transformao, ou criao de outra obra com base em

    qualquer dos artigos ou na obra completa, a obra resultante somente poder ser

    distribuda sob uma licena idntica a que ora est em vigncia. Quaisquer dessas

    condies podem ser renunciadas, desde que se obtenha permisso expressa do

    autor. O livro tambm pode ser obtido em sua verso e-book nositedo Intervozes

    . O downloadda obra gratuito.

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    SISTEMAS PBLICOSDE COMUNICAO NO MUNDO

    EXPERINCIAS DE DOZE PASES E O CASO BRASILEIRO

    comunicao

    Apoio

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    Paulus / Intervozes 2009

    Direo editorialZolferino Tonon

    Coordenao editorial

    Valdir Jos de Castro

    Produo editorial

    AGWM Artes Grficas

    Imagem da capa

    Gilberto Maringoni

    Impresso e acabamento

    PAULUS

    PAULUS 2009

    Rua Francisco Cruz, 229

    04117-091 So Paulo (Brasil)

    Tel.: (11) 5084-3066

    Fax: (11) 5579-3627

    www.paulus.com.br

    [email protected]

    ISBN 978-85-349-3026-0

    Sistemas pblicos de comunicao no mundo :

    experincias de doze pases e o caso brasileiro. So Paulo : Paulus,Intervozes, 2009. (Coleo Comunicao)

    Vrios autores. ISBN 978-85-349-3026-0

    1. Comunicao 2. Comunicao de massa Aspectos polticos3. Comunicao de massa Aspectos sociais 4. Meios de comunicao5. Poltica de comunicao 6. Polticas pblicas I. Srie.

    08-12396 CDD-302.23

    ndices para catlogo sistemtico:

    1. Comunicao pblica 302.232. Sistema pblico de comunicao 302.23

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    INTERVOZES 2009

    Rua Rego Freitas, 454, conj. 122

    01220-010 So Paulo (Brasil)

    Tel.: (11) 3877 0824

    [email protected]

    www.intervozes.org.br

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    comunic

    ao

    Agradecimentos

    Durante a produo da pesquisa, diversas pessoas einstituies colaboraram direta ou indiretamente parao andamento dos trabalhos. Assim, agradecemos aBia Barbosa, Cristina Charo, Henrique Costa,Joo Brant, Juliana Andrade Cunha, Ldia Neves,Mrcio Kameoka, Marcy Picano, Mariana Pires,

    Maurcio Hashizume, Michelle Prazeres, Wilson Gomes,Lance Bennett, Fundao Ford, Associao Brasileiradas Emissoras Pblicas, Educativas e Culturais (Abepec),Empresa Brasil de Comunicao (EBC), Universityof Washington (UW), Universidade Federal daBahia (UFBa), Universidade de Braslia (UnB) eConselho Nacional de Desenvolvimento Cientcoe Tecnolgico (CNPq).

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    PREFCIO .......................................................................................................................................13

    APRESENTAO ..........................................................................................................................17

    Captulo 1

    CONCEPES E ABORDAGENS CONCEITUAISSOBRE SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO ........................................................251. A elitista ......................................................................................................................................27

    2. A educativa ................................................................................................................................29

    3. Alternativa ao modelo comercial ............................................................................................32

    4. Sistema pblico no-estatal .....................................................................................................35

    5. A culturalista ..............................................................................................................................37

    6. A definio de mdia pblica como aparelho de Estado......................................................40

    7. O caso brasileiro ........................................................................................................................42

    8. As concepes adotadas neste trabalho ................................................................................45

    Captulo 2

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DA ALEMANHA ...................................47 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao.....................48

    II. Estrutura do sistema ................................................................................................................49

    1. Televiso ................................................................................................................................49

    2. Rdio .....................................................................................................................................50

    3. Satlite e TV digital aberta .................................................................................................51

    III. Modelo de gesto e formas de participao ........................................................................51IV. Modelo de financiamento .......................................................................................................53

    V. Programao .............................................................................................................................56

    1. Televiso ................................................................................................................................56

    2. Rdio .....................................................................................................................................58

    VI. Questes atuais em debate no pas ......................................................................................60

    Sumrio

    comunic

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    Captulo 3

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DA AUSTRLIA.....................................63 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao.....................64

    II. Estrutura do sistema ................................................................................................................66

    1. ABC (Australian Broadcasting Corporation) ....................................................................66

    2. SBS (Special Broadcasting Service) ....................................................................................67

    III. Modelo de gesto e formas de participao ........................................................................67

    IV. Modelo de financiamento .......................................................................................................73

    V. Programao .............................................................................................................................77

    1. Programao radiofnica (ABC e SBS) ..............................................................................77

    2. Programao televisiva (ABC e SBS) ..................................................................................78

    VI. Questes atuais em debate no pas .......................................................................................81

    Captulo 4

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DO CANAD..........................................85 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao.....................86

    II. Estrutura do sistema ................................................................................................................88

    III. Modelo de gesto e formas de participao ........................................................................89

    IV. Modelo de financiamento .......................................................................................................91

    V. Programao .............................................................................................................................94

    VI. Questes atuais em debate no pas ......................................................................................95

    Captulo 5

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DA COLMBIA .....................................97 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao.....................98

    II. Estrutura do sistema ..............................................................................................................1001. Estrutura de rdio ..................................................................................................................101

    2. Estrutura de televiso.............................................................................................................103

    3. Internet..................................................................................................................................104

    III. Modelo de gesto e formas de participao ......................................................................104

    1. CNTV .....................................................................................................................................104

    2. Canais regionais pblicos .......................................................................................................106

    3. RTVC .....................................................................................................................................107

    4. Conselhos autnomos ...........................................................................................................108

    IV. Modelo de financiamento .....................................................................................................108

    1. Receita proveniente do errio pblico ............................................................................108

    2. Receita proveniente de produtos e servios ...................................................................110

    V. Programao ...........................................................................................................................112

    VI. Questes atuais em debate no pas ....................................................................................115

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    Captulo 6

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DA ESPANHA ........................................117 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao...................118

    II. Estrutura do sistema ..............................................................................................................120

    1. RTVE ....................................................................................................................................120

    2. Forta ....................................................................................................................................121

    III. Modelo de gesto e formas de participao ......................................................................122

    1. RTVE ....................................................................................................................................122

    2. Forta ....................................................................................................................................125

    IV. Modelo de financiamento .....................................................................................................126

    V. Programao ...........................................................................................................................128

    1. Rdio ...................................................................................................................................129

    2. Televiso ..............................................................................................................................129

    3. Contedo internacional ....................................................................................................130

    4. Reforma da programao .................................................................................................130

    VI. Questes atuais em debate no pas ....................................................................................134

    Captulo 7

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DOS ESTADOS UNIDOS...................137 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao...................138

    II. Estrutura do sistema ..............................................................................................................140

    1. Estaes locais de rdio .........................................................................................................141

    2. Estaes locais de TV .............................................................................................................141

    3. Provedoras nacionais de programao ...................................................................................142

    4. Produtoras/distribuidoras de contedo ..................................................................................143

    5. Financiadoras .........................................................................................................................1436. Associaes ...........................................................................................................................144

    III. Modelo de gesto e formas de participao ......................................................................144

    1. CPB........................................................................................................................................145

    2. PBS ........................................................................................................................................145

    3. NPR........................................................................................................................................146

    4. Estaes locais de rdio e de televiso ...................................................................................146

    IV. Modelo de financiamento .....................................................................................................147

    V. Programao ...........................................................................................................................152VI. Questes atuais em debate no pas ....................................................................................155

    comunic

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    Captulo 8

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DA FRANA .........................................157 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao...................158

    II. Estrutura do sistema ..............................................................................................................159

    III. Modelo de gesto e formas de participao ......................................................................160

    1. France Tlvisons ................................................................................................................160

    2. Radio France .......................................................................................................................163

    IV. Modelo de financiamento .....................................................................................................165

    V. Programao ...........................................................................................................................167

    1. Televiso Canais nacionais .............................................................................................169

    2. Televiso Canais temticos ............................................................................................170

    3. Radio France .......................................................................................................................171

    VI. Questes atuais em debate no pas .....................................................................................172

    Captulo 9

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DA ITLIA..............................................175 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao...................176

    II. Estrutura do sistema ..............................................................................................................178

    III. Modelo de gesto e formas de participao ......................................................................180

    IV. Modelo de financiamento .....................................................................................................182

    V. Programao ...........................................................................................................................183

    1. Rdio ...................................................................................................................................184

    2. Televiso ..............................................................................................................................185

    VI. Questes atuais em debate no pas ....................................................................................191

    Captulo 10

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DO JAPO ..............................................195 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao...................196

    II. Estrutura do sistema ..............................................................................................................198

    III. Modelo de gesto e formas de participao ......................................................................199

    1. Conselho diretor (board of governors) ...........................................................................200

    2. Conselho executivo (executive organ) ............................................................................201

    3. Conselho fiscal (auditory) .................................................................................................201

    IV. Modelo de financiamento .....................................................................................................203

    V. Programao ...........................................................................................................................205

    VI. Questes atuais em debate no pas ....................................................................................210

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    Captulo 11

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DE PORTUGAL.....................................213 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao...................214

    II. Estrutura do sistema ..............................................................................................................216

    III. Modelo de gesto e formas de participao ......................................................................217

    1. Assemblia geral ................................................................................................................218

    2. Conselho de administrao ..............................................................................................218

    3. Fiscal nico .........................................................................................................................219

    4. Conselho de opinio .........................................................................................................219

    5. Ouvidores ............................................................................................................................221

    IV. Modelo de financiamento .....................................................................................................221

    V. Programao ...........................................................................................................................224

    1. Rdio ...................................................................................................................................225

    2. Televiso ..............................................................................................................................226

    VI. Questes atuais em debate no pas ....................................................................................233

    Captulo 12

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DO REINO UNIDO..............................235 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao...................236

    II. Estrutura do sistema ..............................................................................................................237

    III. Modelo de gesto e formas de participao ......................................................................238

    IV. Modelo de financiamento .....................................................................................................242

    V. Programao ...........................................................................................................................246

    1. Rdio ...................................................................................................................................246

    2. Televiso ..............................................................................................................................247

    VI. Questes atuais em debate no pas ....................................................................................251

    Captulo 13

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DA VENEZUELA ...................................255 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao...................256

    II. Estrutura do sistema ..............................................................................................................258

    1. Organizaes de carter pblico ............................................................................................258

    2. Organizaes de carter estatal .............................................................................................259

    III. Modelo de gesto e formas de participao ......................................................................260IV. Modelo de financiamento .....................................................................................................263

    V. Programao ...........................................................................................................................264

    1. Organizaes de carter pblico ............................................................................................264

    2. Organizaes de carter estatal ............................................................................................265

    VI. Questes atuais em debate no pas ....................................................................................266

    comunic

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    Captulo 14

    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO DO BRASIL .............................................269 I. Histrico do sistema pblico: fundao, desenvolvimento e consolidao...................270

    II. Estrutura do sistema ..............................................................................................................274

    III. Modelo de gesto e formas de participao ......................................................................277

    IV. Modelo de financiamento .....................................................................................................281

    V. Programao ...........................................................................................................................284

    VI. Questes atuais em debate no pas ....................................................................................287

    Captulo 15

    SISTEMAS PBLICOS DE COMUNICAO: PANORAMAANALTICO DAS EXPERINCIAS EM DOZE PASES E OS DESAFIOSPARA O CASO BRASILEIRO ...............................................................................................291 I. Estrutura ..................................................................................................................................292

    II. Gesto e participao popular .............................................................................................294

    1. Formatos administrativos ..................................................................................................295

    2. Participao social ..................................................................................................................297

    III. Financiamento ........................................................................................................................300

    IV. Contedo e programao .....................................................................................................306

    V. O caso brasileiro: desafios e perspectivas ..........................................................................307

    1. Legitimao ........................................................................................................................308

    2. Gesto, autonomia e participao .........................................................................................311

    3. Distribuio............................................................................................................................314

    4. Contedo ..............................................................................................................................316

    5. Financiamento .......................................................................................................................318

    CONSIDERAES FINAIS .........................................................................................................321

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .............................................................................................323

    SOBRE OS AUTORES .................................................................................................................335

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    comunic

    ao

    Um no-assunto at h alguns anos, a radiodifuso pblicaentrou na agenda do pas. O impulso mais recente emais forte foi dado pelo governo federal ao criar, no nal

    de 2007, a Empresa Brasil de Comunicao (EBC). E nela a TVBrasil tornou-se o centro dos debates. Era um corpo estranho numpas dominado pelo modelo comercial de televiso. Muitos passa-ram a se perguntar do que se tratava. Anal, haviam sempre con-

    vivido com emissoras de TV que, na sua lgica empresarial, no sedistinguem das redes de supermercados ou de eletrodomsticos,embora ofeream, alm de mercadorias, idias, hbitos e valores.A dvida, nesse caso, era justicvel. Mas h tambm os que, nomuito bem intencionados, j tinham na ponta da lngua a deni-o para a nova TV: do governo, vai ser chapa-branca.

    Para estes qualquer explicao sobre o papel de uma TV pblica insuciente, dado o preconceito presente em suas manifestaes.Mas aos que foram tomados de surpresa e curiosidade com o sur-gimento de um novo modelo institucional de radiodifuso, dife-rente de tudo o que estavam acostumados a ver, o debate valioso.Assim como a maioria dos europeus, at a dcada de 1980, nuncahavia se deparado com uma radiodifuso mantida pela propaganda,

    PREFCIO

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    SISTEMAS PBLICOS DE COMUNICAO NO MUNDO

    aqui ns nunca havamos vislumbrado a possibilidade de ter umarede nacional de TV sem sustentao majoritariamente comercial.As dvidas eram pertinentes.

    O bloqueio ao acesso a um rdio, e depois a uma televiso, sempublicidade formou geraes alienadas. Para elas o modelo brasi-leiro era nico. Durante muitos anos, s quem tinha a possibilidadede ouvir rdio no exterior se dava conta da existncia de alternati-vas de formas eletrnicas de comunicao. revelador o relato deuma das primeiras locutoras do Servio Brasileiro da BBC, LyaCavalcanti, ao voltar ao Brasil em 1945, depois de quatro anos naInglaterra:

    Quando o navio entrou em guas brasileiras e o rdio comeou

    a transmitir anncios eu fiquei em pnico. Estava acostumada

    com a BBC que tinha programas fantsticos e no tinha ann-

    cios. Voc podia escolher o programa e de repente, aqui, voctem que enfrentar meia hora de anncios. Voc tem que ouvir

    uma coisa que no quer ouvir. Eu fiquei apavorada. Como

    que pode? Que selvagens, que loucura!

    E quando surge a televiso a possibilidade de transmisses me-nos poludas com comerciais nem sequer aventada. O discursodo dono dos Dirios e Emissoras Associados, Assis Chateaubriand(Chat), na solenidade de inaugurao da TV Tupi, em So Paulo,em 1950, gira em torno apenas dos nomes dos anunciantes danova emissora. O socilogo Renato Ortiz considerou a fala umabela pea do surrealismo poltico latino-americano. Foi mais doque isso. Tratava-se de uma consso pblica de f num modelode radiodifuso alheio a qualquer tipo de preocupao com a cul-tura ou com a educao do pas. Em palavras simples, era vistoapenas como mais um negcio voltado para a acumulao de ri-quezas materiais, associadas ao prestgio social e ao poder poltico,adquiridos por quem controlava as emissoras.

    Afora tentativas regionais, como a da criao de uma TV Edu-cativa pela prefeitura do ento Distrito Federal, no incio dos anos

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    comunic

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    PREFCIO

    151950, o nico projeto de carter nacional existente antes da atualTV Brasil girou em torno da Rdio Nacional do Rio de Janeiro. Osegundo governo Vargas chegou a outorgar uma concesso para oseu funcionamento. No entanto, pressionado pelas mesmas forasconservadoras que o levaram morte, ele no concretizou a inicia-tiva. Seu sucessor, o presidente Juscelino Kubitschek, chegou aconrmar a outorga do canal 4 do Rio para a Nacional, em 1956.Foi literalmente ameaado por Chateaubriand, temeroso da poss-

    vel concorrncia. Se V. Exa. der o canal de TV Nacional, jogotoda a minha rede de rdio, imprensa e televiso contra o seu go-verno, disse o dono da Tupi, como conta Mrio Lago em suasmemrias. JK recuou, o Brasil perdeu a sua TV pblica, masquem ganhou no foi Chat. Em 1957, Juscelino passou a conces-so para as Organizaes Globo, que, s em 1965, ps a sua emis-sora no ar. Ficava, dessa forma, intato o monoplio comercial da

    televiso brasileira. E com ele a alienao da sociedade em relaoao modelo pblico.

    Da a necessidade de se qualicar o debate sobre os modelosinstitucionais de radiodifuso existentes no mundo, renando-seas anlises tericas e aprofundando-se no estudo dos casos j con-solidados historicamente. Este livro uma preciosa colaboraonesse sentido. Surge vinte anos depois de a Constituio ter sido

    promulgada, prevendo um sistema de radiodifuso em que hou-vesse a complementaridade entre os sistemas pblico, privado eestatal. Ao colocar a palavra pblico no texto legal, o ento se-nador Artur da Tvola talvez no imaginasse a polmica que pro-vocaria pelas dcadas seguintes. O que foi timo, na medida emque ampliou a discusso e aguou a criatividade de quem quertrabalhar concretamente com essa forma de fazer comunicao.

    Por tudo isso, este livro torna-se imprescindvel. Aqui estdescrito o funcionamento dos sistemas pblicos de radiodifusode doze pases, distribudos por quatro continentes. Mais impor-tante que a diversidade geogrca so as diferenas socioeconmicasexistentes entre eles, alm de uma radiograa precisa da situaoatual dos sistemas. Mostram-se modelos pblicos consolidados,

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    SISTEMAS PBLICOS DE COMUNICAO NO MUNDO

    como os do Reino Unido, da Alemanha e do Japo, ao lado deexperincias mais recentes, como as da Colmbia e da Venezuela.Sem faltar o caso brasileiro, observado por quem o acompanhadesde os seus primeiros passos.

    Esta publicao do Intervozes ampliar, com certeza, o nmerode participantes desse fascinante debate, contribuindo para rom-per com a alienao em torno do tema, ainda presente em grandeparte da sociedade brasileira.

    Laurindo Lalo Leal Filho

    Socilogo, jornalista e professor da Universidade de So Paulo

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    comunic

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    Desde 2003, ano de sua constituio formal como associaocivil, o Intervozes deniu a comunicao pblica como umade suas pautas centrais, pois observa na hegemonia das

    emissoras comerciais de radiodifuso ainda hoje os mais importan-tes veculos entre os meios de comunicao social do pas um dosgrandes obstculos garantia dos direitos humanos e consolidaodemocrtica brasileira. A presente publicao deriva justamente

    dessa leitura da realidade nacional e possui como objetivo contribuirpara suprir a ausncia de referncias que orientem o trabalho deorganizaes, ativistas e intelectuais que acreditam ser a constitui-o de um sistema pblico vigoroso um dos passos imprescindveispara o fortalecimento de nossa democracia.

    A defesa do direito comunicao, contudo, esbarra cotidiana-mente na ausncia de referncias objetivas. Se possvel observarnestes ltimos anos a ampliao dos atores envolvidos com o tema,a realidade tambm sugere serem escassos os elementos que demconsistncia s aes empreendidas pelas organizaes e movimen-tos que se engajam na luta pela garantia dos direitos e liberdadesno campo da comunicao. Quais seriam, por exemplo, as condi-es para a constituio de um sistema pblico de comunicao

    APRESENTAO

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    idealizado sob o paradigma do direito comunicao, ou seja,fundamentadas no reconhecimento do direito individual e coleti-vo de que sejamos todos produtores de informao, para alm deespectadores ou leitores, e que atue contra as diferenas econmi-cas, sociais e polticas que permitem somente a to poucos seapropriar dos meios de produo e difuso de contedos?

    Ao diagnosticar essa ausncia de referncias para alm dacrtica sistmica e estrutural forma como se organizam as comu-

    nicaes brasileiras , o Intervozes debruou-se a partir de 2005sobre a tarefa de construir, com o apoio de pesquisadores e organi-zaes comprometidas com a democratizao das comunicaes, ins-trumentos que permitissem, de um lado, a crtica fundamentada emdados objetivos e, de outro, a construo de propostas para superaro quadro de violaes permanentes ao direito comunicao.

    Foi por essa perspectiva que surgiu o Centro de Referncia

    para o Direito Comunicao. Com o apoio da Fundao Ford, oIntervozes deu incio a trs aes estratgicas complementares. Aprimeira delas foi a criao do Observatrio do Direito Comuni-cao1, portal eletrnico que desde 2007 acompanha as polticaspblicas e regulatrias setoriais. A segunda, o desenvolvimentode indicadores de efetivao do direito comunicao. Tais indi-cadores, que no momento do lanamento desta publicao ainda

    se encontravam em fase de elaborao, possuem como nalidadeconstruir parmetros objetivos que dem transparncia e materia-lidade s questes relativas comunicao e, acima de tudo, eviden-ciem se determinada realidade est prxima ou distante de garantiros direitos e liberdades inerentes condio humana. A terceiraestratgia foi justamente a elaborao de elementos que contribus-sem para constituio de um sistema pblico de comunicao.Para tanto, formulou-se uma proposta concreta para a criao edesenvolvimento de um sistema pblico no Brasil2, apresentada

    1. Disponvel em .

    2. Disponvel em .

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    19ocialmente por ocasio do I Frum Nacional de TVs Pblicas,realizado em maio de 2007. Como de conhecimento geral, desseprocesso derivou a criao da Empresa Brasil de Comunicao(EBC), iniciativa cujos resultados embrionrios sero descritos nocaptulo 14 desta publicao.

    nesse cenrio que se insere a presente contribuio. Ao bus-car elementos para a formulao da proposta a ser apresentada aosmembros do governo, do parlamento, das emissoras do campo p-

    blico e da sociedade civil, tornou-se evidente para o Intervozes aausncia de estudos e publicaes nacionais sobre o desenvolvi-mento e funcionamento dos sistemas pblicos existentes no planointernacional. At os contedos produzidos como subsdio aostrabalhos e discusses do I Frum Nacional de TVs Pblicas poucose detiveram sobre as experincias internacionais h dcadas exis-tentes no mundo.

    O despertar desse processo fez emergir uma simples pergunta:como dar incio reforma das ento instituies estatais rumo sua autonomia de gesto e nanceira, condio indispensvelpara qualicar como pblico um sistema ou mesmo uma emis-sora sem conhecer os sistemas existentes em pases com pelomenos sessenta anos de tradio em comunicao no-estatal eno-comercial? Infelizmente, seguros de que no perdemos ne-

    nhum lance desses calorosos meses de debate, constatamos queessa lacuna de fato acompanhou todo o processo de criao daEBC. Como resultado desse vazio, inversamente, assistiu-se auma srie de armaes pouco fundamentadas por parte da Secre-taria de Comunicao Social do Governo Federal (a quem coubeformular a proposta nal), que buscaram legitimar o processo deindicao pelo Executivo dos rgos de administrao e scalizaoda nova empresa em pretensas semelhanas com sistemas pblicosrespeitados mundialmente.

    Mas voltemos ao ponto anterior. A partir da constatao da quaseabsoluta ausncia de referncias sobre as experincias internacio-nais salvo raras excees, como o trabalho empreendido pelo pro-fessor Laurindo Leal Filho sobre a britnica BBC o Centro de

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    SISTEMAS PBLICOS DE COMUNICAO NO MUNDO

    Referncia pelo Direito Comunicao, para subsidiar o debate sobrea estruturao e consolidao de um sistema pblico de comunicaono Brasil, deu incio a uma pesquisa sobre as caractersticas centraisdesses sistemas em um conjunto representativo de pases.

    A escolha dos pases a serem observados baseou-se em trscritrios:

    1.no reconhecimento internacional que possuem;

    2. na sua relevncia enquanto experincia de comunicao que sepretende desvinculada de interesses de governos e dos mercados;

    3.na diversidade poltico-cultural e econmica.

    Dos vinte pases previamente eleitos, doze foram seleciona-dos: seis da Europa (Alemanha, Espanha, Frana, Itlia, Portugal

    e Reino Unido), quatro das Amricas (Canad, Estados Unidos,Colmbia e Venezuela), um da sia (Japo) e outro da Oceania(Austrlia).

    O escopo da pesquisa, alm do relato histrico sobre o sur-gimento e desenvolvimento inicial de cada um dos sistemas, composto pelas questes que, julga-se, denem as caractersticascentrais de um sistema de comunicao, a saber:

    1.a estrutura do sistema, ou seja, o nmero, o alcance e o perlbsico de suas emissoras de rdio e TV, assim como de suasoutras possveis atividades ligadas s novas tecnologias ou produo cultural;

    2.o modelo de gesto e os instrumentos de participao da socie-dade na administrao e scalizao do sistema;

    3.o modelo de nanciamento, com a origem, o volume e a dinmi-ca de gesto dos recursos;

    4.o perl da programao da(s) emissora(s) do sistema e a utiliza-o, ou no, de produo independente e regional em suas pro-gramaes;

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    5.por m, mas no menos importante, foram pontuadas as ques-tes atualmente em discusso nos doze pases pesquisados, bus-cando revelar as tenses, conitos e tendncias que emergemdos debates polticos realizados em cada uma das naes.

    Esses tpicos envolvem um complexo universo de dados e deanlises. Por isso, faz-se necessrio explicitar que o objetivo destapesquisa no oferecer uma anlise minuciosa sobre os sistemas

    de cada um dos pases observados, mas sim mapear as caractersti-cas fundamentais de cada um deles, com a apresentao de pistaspara aqueles que desejam aprofundar determinados aspectos dossistemas, como os modelos de gesto e nanciamento, ou ainda operl da programao das emissoras que compem os sistemas.Em alguns momentos, foi preciso estabelecer um foco, como nosdados levantados sobre essas programaes, assim como os que se

    referem audincia, que possuem nfase na televiso, por suaimportncia histrica e por serem essas emissoras, at hoje, o co-rao dos sistemas. As informaes e anlises expostas nas prxi-mas pginas pretendem, sobretudo, proporcionar aos leitores umaviso panormica dessas experincias. Julgamos ser este o melhorincentivo para futuras investigaes.

    Com a denio do escopo da investigao, os pesquisadores

    Jonas Valente e Sivaldo Pereira da Silva com o valioso apoio deFlvia Azevedo no texto sobre o sistema de Portugal , ambos jornalis-tas e integrantes do Intervozes, enfrentaram o complexo desao desuperar a j citada ausncia de produes nacionais (ou traduzidaspara o portugus) sobre o tema. No fosse a colaborao de compa-nheiros e companheiras que, em virtude de experincias prossionaisou acadmicas prvias em alguns dos pases pesquisados, contriburampara a busca ou interpretao de informaes, esses obstculos seriamcertamente mais difceis de serem superados. No menos importante eao acaso devemos agradecer foi o fato de um dos pesquisadores,Sivaldo Pereira, estar em estgio de doutorado na Universidade deWashington, em Seattle, o que ao permitir o acesso bibliograainexistente no Brasil, certamente enriqueceu o resultado nal.

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    O levantamento sobre a comunicao pblica nesses dozepases, para efeito desta publicao, foi complementado por trstextos de grande valia. O primeiro, de autoria de Jonas Valente,busca apontar as concepes mais relevantes que emergem dosdiferentes campos tericos da comunicao sobre os sistemasdesvinculados de interesses de governos ou de mercados, emuma abordagem que consideramos fundamental para compreen-der esse campo de investigao. O segundo, produzido pelo

    mesmo autor, tem como foco o histrico e a estrutura das emis-soras do campo pblico brasileiro de radiodifuso. Com aborda-gem semelhante ao realizado nos doze pases pesquisados, buscaorganizar as informaes sobre as emissoras no-comerciaisexistentes no Brasil, constituindo-se importante subsdio para aanlise crtica do estado da arte da comunicao pblica nacio-nal e permitindo tambm a comparao entre os casos interna-

    cionais e o brasileiro.O ltimo dos textos complementares, produzido a seis mos

    por Sivaldo Pereira da Silva, Jonas Valente e pelo que assina estaapresentao (em virtude da coordenao dos trabalhos da pesquisa), justamente um panorama analtico das experincias observadas,com a sistematizao de como esses pases enfrentaram e aindaenfrentam as questes ligadas estrutura, gesto, ao nancia-

    mento, ao contedo e programao de seus veculos e emissoras.E, como contribuio adicional, procurou-se, com base nos subsdiosanteriores, apresentar alguns dos desaos para a constituio deum autntico sistema pblico de comunicao no Brasil.

    No possvel concluir sem mencionar o fato de a pesquisa serpublicada praticamente um ano aps as denies do modelo sobo qual se desenvolvem as primeiras atividades da Empresa Brasilde Comunicao. Os possveis erros cometidos at o momentonesta bem intencionada tentativa de constituio de um sistemapblico nacional os quais o Intervozes no deixou nem deixarde apontar, pois esta parte de sua razo de ser enquanto organi-zao da sociedade civil podem e devem ser corrigidos. J osacertos podem ser radicalizados ou aprimorados.

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    APRESENTAO

    23O momento, anal, de construo. nesse sentido que busca

    contribuir esta pesquisa, que agora toma forma de publicao.Cumpre lembrar que os dados e reexes aqui apresentados noso apenas conjunturais e, por isso, no perdero a validade emcinco ou dez anos. Pelo contrrio, podem servir como parmetropara eventuais correes de rota, nessa difcil tarefa de construode um sistema no-comercial no Brasil. O desao, em um pas queh mais de setenta anos vive sob a hegemonia dos que utilizam os

    meios de comunicao para ns privados, certamente complexo,mas no pode deixar de ser enfrentado.

    Diogo Moyses

    Coordenador do Centro de Referncia para o Direito Comunicao

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    Ariqueza de experincias de sistemas pblicos de comunica-o no mundo acompanhada pela diversidade de deni-es, caracterizaes e abordagens. Apesar de no ser um

    fenmeno novo e datar do incio da dcada de 20 do sculo passado,no h um entendimento consolidado sobre aquilo que dene a natu-reza dos sistemas pblicos. Partindo desse pressuposto, este captulo

    de abertura pretende estabelecer um balizamento conceitual quejogue luz sobre as noes de mdia pblica existentes, visando identi-car aquela, ou aquelas, considerada referncia para este trabalho.

    A primeira discusso sobre uso idiomtico para se referir a estehistrico segmento comunicacional. Nas reexes sobre a incorpo-rao dessa idia no Brasil, predominou o uso da expresso sistemapblico de comunicao. Em outros pases, embora predomine algica de um sistema, a expresso original adotada public servicebroadcasting ou a aplicao resumida depublic broadcasting.Mesmo ouso da expresso public service broadcastingguarda sentidos distintos,sendo aplicada apenas aos veculos pblicos em alguns pases ou aoconjunto dos veculos de concessionrios de canais de rdio ou deTV terrestres, como o caso do Reino Unido.

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    CONCEPES E ABORDAGENS CONCEITUAISSOBRE SISTEMA PBLICO DE COMUNICAO

    Jonas Valente

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    Apesar dos termos diferenciados, possvel estabelecer umarelao entre a noo de sistema pblico e depublic service broadcas-tingem sentido estrito. Ambos incluem os meios geridos direta ouindiretamente pelo Estado, os princpios programticos que os re-gem e os legitimam no conjunto do sistema de mdia de um pas(ou regio) e as normas que estruturam sua organizao e funcio-namento. Esse sistema pode incluir tanto os diversos servios den-tro de uma mesma corporao, como predominante no modelo

    europeu, ou um conjunto de rgos com papis diferentes quearticulam diversos entes mantenedores de veculos, como ocorreno modelo estadunidense.

    Na literatura sobre o tema os conceitos tomam como objetotanto o servio e o sistema, considerados como arranjos institucio-nais, quanto os prprios meios de comunicao pblicos, debru-ando-se mais fortemente sobre estes ltimos. Nesse sentido, para

    estabelecer um quadro amplo, buscaremos extrair a seiva concei-tual que diferencia essa modalidade de comunicao de outras,especialmente a comercial. Adotamos uma exibilidade capaz deidenticar abordagens que se baseiam tanto na noo de sistemaquanto na caracterizao especca de um meio, como ocorre fre-qentemente em textos que apresentam reexes sobre a televisopblica. Para efeito prtico, utilizaremos como acepo sintetiza-

    dora das diversas expresses o termo mdia pblica.Trabalharemos aqui com seis concepes acerca da noo demdia pblica:

    1.elitista;

    2.educativa;

    3.pblica no-estatal;

    4.pblica como alternativa mdia comercial;

    5.culturalista;

    6.aparelhos de Estado.

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    CONCEPES E ABORDAGENS CONCEITUAIS

    27Um segundo aspecto a ser destacado antes de iniciarmos a dis-

    cusso sobre as denies a interseo entre seus postulados. Habordagens que combinam caractersticas presentes em outras outrazem caractersticas semelhantes. O critrio de apresentao dascorrentes baseou-se na compreenso de que cada uma dessas des-taca um aspecto-chave em detrimento de outros que dene a mdiapblica e a difere das outras modalidades de comunicao.

    1. A ELITISTA

    A abordagem elitista foi hegemnica na construo de grandeparte dos sistemas pblicos de comunicao europeus e ganhouvisibilidade, sobretudo, nos escritos do primeiro diretor-geral daBBC, John Reith. Tal entendimento baseado em premissas ilu-ministas, segundo as quais o conhecimento e a razo so funda-mentais para o entendimento e insero no mundo de maneiraemancipadora. Assim como outras instituies e espaos de arma-zenamento e socializao de conhecimentos, o rdio deveria con-tribuir para diminuir o abismo existente entre a riqueza culturalproduzida pelo homem em sua histria e a populao.

    Na prtica, o rdio e depois a televiso vinham somar-se aos

    empreendimentos culturais responsveis por gerar e dissemi-nar a riqueza lingstica, espiritual, esttica e tica dos povos enaes. Eles se colocavam no mesmo setor da sociedade emque estavam localizadas as universidades, as bibliotecas e osmuseus, e a populao os reconhecia dessa forma, distante daesfera dos negcios ou da poltica de partidos ou grupos (LealFilho, 1997, p. 18).

    A rdio pblica (meio eletrnico ento existente naquela poca)era vista como um poderoso instrumento para difundir conheci-mentos pelo seu alcance e pelas possibilidades de atrao do p-blico pela aceitao crescente que ia ganhando entre o povo. Paracumprir essa misso, deveria veicular o melhor de tudo (best of

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    SISTEMAS PBLICOS DE COMUNICAO NO MUNDO

    everything), das cincias s artes, passando pela informao jorna-lstica e pela educao:

    Como ns a concebemos [a radiodifuso pblica], nossa respon-sabilidade atingir o maior nmero possvel de lares, levandotudo que h de melhor em cada rea de empenho, realizao econhecimento humano e evitar as coisas que so, ou podem ser,nocivas (Reith, in: Golding e Murdock, 1997, p. 34).

    A alta cultura e o conhecimento, objetos da mdia pblica,envolviam aquilo que era identicado como contedo relevante eassociado aos padres morais da alta sociedade. Falando da BBC,Burns (apud Leal Filho, 1997, p. 67) arma que a cultura dessaexperincia de mdia pblica

    no uma peculiaridade dela mesma, mas de um ambiente

    intelectual composto de fora por valores, padres e crenas deuma classe mdia intelectualizada, especialmente daquela par-te educada em Oxford e Cambridge.

    Tal perspectiva partia da noo de que apenas essa elite tinhacondies de visualizar o pacote de conhecimentos necessrios populao. Em seu texto seminal, Broadcasting over Britain, Reith(p. 34) assenta de maneira clara essa concepo:

    normalmente indicadoa ns que estamos aparentemente di-recionando ao pblico o que pensamos que ele precisa, e noo que ele quer, mas poucos sabem o que querem, e menosainda sabem aquilo de que precisam.

    Assim, segundo Garnham (1990), a elite poltica e cultural doReino Unido impunha sua viso de mundo sobre o povo, opondo suaconcepo da poltica s artes e cultura das classes populares.

    Partindo do princpio de que o povo no sabe o que quer eaquilo de que precisa, Reith armava que a baixa aceitao smanifestaes artsticas eruditas devia-se ao seu desconhecimento,no sua baixa atratividade.

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    29Pessoas que se mostram mais resistentes poesia geralmente soaquelas que nunca fizeram um esforo para l-la (Reith, p. 153).

    Mas tal iluminao no deveria ser promovida apenas juntos classes populares. Reith (ibidem) revela um elitismo radicaliza-do ao armar que os conhecimentos valorosos no so importantesapenas aos pobres de renda e de formao, mas ao conjunto dapopulao.

    Na avaliao do ento dirigente mximo da BBC, para o xitode seu projeto a mdia pblica deveria informar, divertir e educar.A este ltimo propsito, ele guardava papel importante, pois eraele que poderia inuir nas novas geraes, incidindo durante seuprocesso de aprendizado para formar adultos com outro patamarde instruo. Na sua avaliao, o investimento em crianas eraestratgico, pois enfrentava menos obstculos, j que os adultos

    possuam capacidade de apreenso menor e vcios de formao, eincidiria naquelas geraes que em alguns anos estariam nos pos-tos-chave da administrao do Reino Unido.

    2. A EDUCATIVA

    Assim como a denio elitista, a educativa parte da premissa

    de que a mdia eletrnica constitui mecanismo fundamental de difu-so de contedos perante a populao. O que diferencia a primeirada segunda a nfase, decorrente de sua manifestao histrica. Naabordagem elitista houve a formulao de um projeto totalizantepela necessidade de resposta s demandas simblicas da populaoem um ambiente de monoplio estatal. O lema informar, divertir,educar sintetiza em trs propsitos a amplitude do projeto, quepor mais impositivo que fosse no poderia abrir mo da seduoproporcionada pelo entretenimento na programao.

    J os representantes da corrente aqui denominada educativaviam na mdia pblica um instrumento de ampliao da formaoda populao. No por acaso essa viso aparece fortemente naAmrica Latina durante o perodo mais intenso de industrializao

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    SISTEMAS PBLICOS DE COMUNICAO NO MUNDO

    da segunda metade do sculo XX, tanto pelas vozes de seus diri-gentes polticos quanto pelas agncias internacionais que elaboravampolticas integradas para o continente. Essas naes experimenta-vam um momento de forte expanso de seus parques industriaisem meio a uma exploso demogrca. Colocava-se o desao deatender necessidade de mo-de-obra qualicada em um contin-gente populacional em rpido crescimento. Segundo Beltrn(2002), os projetos de televiso educativa partiam da idia de que

    as mdias pblicas

    massificariam a educao, apoiariam outros processos educa-cionais e permitiriam atingir, com relativa facilidade, as popula-es que estavam excludas dos circuitos oficiais da educao(pp. 91-92).

    As resolues da 1.Reunio da Comisin Interamericana deTelecomunicaciones (Citel), realizada em Washington, em 1965,

    iniciam com a seguinte assertiva:

    Os meios de radiodifuso e televiso so meios eficientespara realizar programas educativos destinados a grupos depopulao distribudos sobre grandes extenses territoriais(MEC, 1982, p. 17).

    As concluses da 3. Reunio Anual da Citel, organizada no Riode Janeiro em 1968, destacam a importncia da teleeducao parao sucesso das naes latino-americanas.

    O desenvolvimento econmico e social dos pases latino-americanos est intimamente condicionado s mais amplas e

    eficientes oportunidades proporcionadas atravs do rdio eteleviso educativas (idem, p. 75).

    A radiodifuso pblica, para os partidrios dessa viso, estavaintimamente vinculada s polticas educacionais nacionais e regio-nais, seja substituindo as salas de aula onde elas so em nmero

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    CONCEPES E ABORDAGENS CONCEITUAIS

    31insuciente ou inexistentes, seja complementando as aulas comcontedos adicionais ou de aperfeioamento de alunos e professo-res. A televiso ganhou especial ateno por ser o meio em cresci-mento nesses pases e por seu potencial instrutivo ao combinar sonse imagens. Gordon (1967) arma que a televiso educativa

    pode tornar-se to importante para a educao como o foia inveno dos tipos mveis para a produo de livros em

    massa (p. 16).

    Thomas Clemens, diretor do Programa de Pesquisas e Dissemi-nao de Meios do Servio de Educao dos Estados Unidos, apspesquisa com diversas iniciativas de teleeducao, concluiu que:

    1) a televiso se revela capaz de ensinar com eficincia uma larga

    variedade de matrias a alunos de todos os nveis escolares;2) est em condies de expandir as oportunidades de educao;3) no constitui uma panacia em matria de educao, pois osprofessores das salas de aula constituem importante fator noque diz respeito a assegurar-se um mximo de aprendizagem;4) a aprendizagem pela televiso exige ativa participao dos alu-nos, bem como um ensino de alto nvel (Bystrom, in: Schramm,1970).

    J Gilson Amado, pioneiro da TV educativa no Brasil e pri-meiro diretor do Centro Fundao Brasileira de TV Educativa(FCBTVE), mantenedora da TVE Brasil nos anos 1960, 1970 e1980, endossava o entusiasmo com as potencialidades pedaggi-cas dessa mdia, mas defendia uma funo complementar aosbancos escolares. O documento da fundao Diretrizes para pro-

    duo um exemplo dessa perspectiva, ao armar que a TVEno pretendia

    substituir salas de aula, nem concorrer em termos quantitativos(ndices de audincia, rentabilidade pura e simples) com emis-soras comerciais, mas funcionar como uma pea motivadora

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    da educao permanente, um elemento de supra-sistemas nasredes culturais do pas (Milanez, 2007, pp. 97-98).

    Documento basilar da radiodifuso pblica dos Estados Unidos,o relatrio da Comisso Carnegie de TV Educativa, Televisoeducativa: Uma proposta de ao, esmera-se em distinguir a de-nio de televiso didtica da de televiso pblica. Segundo acomisso, a primeira visa aos estudantes na sala de aula ou fora

    dela, dentro do quadro geral de ensino formal, enquanto a televi-so pblica visa ao pblico em geral (Comisso Carnegie de TVEducativa, 1967, p. 12).

    Burke (1971) faz uma avaliao crtica sobre as funes educa-tivas que deveriam ser desempenhadas pela televiso. Ele alertapara o risco de a televiso educativa contribuir muito pouco paraa aprendizagem quando adotada como um imperativo ou um

    recurso positivo per se sem um planejamento que parta das neces-sidades reais do processo educativo e identique nestas os recursose insumos que podem contribuir para o xito do projeto.

    A questo no est em saber como e onde encaixar a televi-so no curso de um estudo, mas, antes, deveramos nos per-guntar como o aluno atingir o mximo de aprendizagem;[...] qual a relao adequada entre o professor e o aluno; o

    aluno e outras fontes de informao e estmulo, e como mediros objetivos almejados (idem, p. 141).

    3. ALTERNATIVA AO MODELO COMERCIAL

    Ao rejeitar as experincias de televiso educativa como modelodesejvel para um novo projeto de TV pblica nos Estados Unidos,a Comisso Carnegie defendeu que este deveria pautar-se peloatendimento de todas aquelas demandas informativas no contem-pladas pelos veculos comerciais, constituindo alternativa a estes.Est a a abordagem presente na gnese do Public Broadcasting Ser-vice (PBS) dos Estados Unidos, bem como na recente criao da

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    CONCEPES E ABORDAGENS CONCEITUAIS

    33Empresa Brasil de Comunicao (EBC) em nosso pas. No por acasoo contexto dessa perspectiva o cenrio de hegemonia dos meiosde comunicao comerciais e o enviesamento dos contedos trans-mitidos por estes, que seguem a lgica da produo de audinciaspara a venda de anncios publicitrios em detrimento do atendi-mento das diversas necessidades do(s) pblico(s).

    Ao se armar pela negao de algo, do modelo comercial, opredicado pblico circunscreve tudo o que no faz parte do seu

    oposto, ou seja, o pblico seria outro termo para designar tudo oque no comercial. No por coincidncia, nos Estados Unidos,onde essa concepo ganhou fora, a rede articulada em torno daPBS rene tanto veculos mantidos por governos como emissorasoperadas por organizaes da sociedade civil sem ns lucrativos.No Brasil, tal entendimento est na base do que se convencionouchamar de campo pblico, incluindo desde emissoras comunit-

    rias at legislativas com base numa identidade no-comercial.A distino entre um campo e outro tem por fundamento a

    relao que cada um deles estabelece com seus receptores. Enquan-to os meios com ns lucrativos tratam a audincia como massa e,portanto, buscam o gosto mdio para que seus contedos possamatingir a ateno do maior nmero possvel de pessoas, a televisopblica como alternativa deveria mirar na multiplicidade de p-

    blicos e dialogar com as demandas informativas e culturais decada um deles. Assim, a diversidade aparece como um dos pilaresdessa concepo. Analisando a formao histrica da TV pblicanos Estados Unidos, Hoynes arma:

    Televiso pblica, em sua previso nos primeiros tempos, deve-ria prover uma alternativa ao padro da televiso comercial erefletir a diversidade do pblico estadunidense. Essas duas no-es alternatividade e diversidade estavam fundamental-mente interconectadas (1994, p. 50).

    Ao olhar o pblico como um todo composto de vrias partes, amdia pblica deveria reetir na sua programao cada um desses

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    SISTEMAS PBLICOS DE COMUNICAO NO MUNDO

    segmentos. Nesse sentido, os contedos destacariam diversos as-pectos da realidade com foco nos grupos sociais, tanto produzindoprogramas de claro corte setorial quanto incorporando essas visesqueles debates de carter mais geral. Para Bucci (2006), as emis-soras pblicas, portanto,

    deveriam diferenciar-se, recusando-se a competir no merca-do e buscando dar visibilidade s expresses francamente

    minoritrias da cultura e do debate pblico, que no tm apti-do para se tornar campes de audincia e no tm veznas comerciais.

    Nesse artigo, o autor (que tambm era presidente da Radiobrs)apresentou uma tese polmica: a de que no cabia aos veculospblicos produzir entretenimento.

    O setor de radiodifuso pblica da Organizao das NaesUnidas para a Educao, a Cincia e a Cultura (Unesco) apontacomo uma das caractersticas centrais da mdia pblica, para almde oferta universal, diversidade e independncia, a distintividade(distinctiveness).

    Distintividade requer que o servio oferecido pela radiodifu-so pblica distinga-se dos demais. Na programao da ra-

    diodifuso pblica na qualidade e no carter particular dosprogramas o pblico deve conseguir identificar o que distin-gue este servio de outros. No apenas uma questo deproduzir os tipos de programas que outros servios no estointeressados em fazer, visando audincias rejeitadas por ou-tros. uma questo de fazer diferente, sem excluir nenhumgnero. Este princpio deve comandar os radiodifusores pbli-cos a inovar, criar novos gneros e formatos, dar o exemplono mundo audiovisual e estimular outras redes a seguir oexemplo (Unesco, 2000, p. 8).

    Segundo Beth Carmona, ex-presidente da TVE Rede Brasil, apresena da mdia pblica teria papel fundamental de contrapeso

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    CONCEPES E ABORDAGENS CONCEITUAIS

    35ao dar visibilidade aos contedos sem apelo comercial, mas tam-bm teria um efeito nesta prpria lgica mercantil de produocultural (Carmona, 2006). Ao buscar outros parmetros de quali-dade inovadores, diversos e mais profundos, a mdia pblica apre-senta outros referenciais que podem qualicar a condio do re-ceptor em relao s mensagens dos meios comerciais, seja pelaapresentao de outras verses daquela informao, seja pelo est-mulo freqente reexo crtica acerca dos fenmenos, bem comode seus relatos. Em alguns casos, os veculos pblicos fomentamtal postura com programao voltada especicamente para discutira comunicao, como o caso dos programas Observatrio da Im-prensae VerTVveiculados pela TV Brasil.

    4. SISTEMA PBLICO NO-ESTATAL

    Tanto nas experincias europias quanto nas americanas (in-cluindo os continentes do norte, central e sul), uma abordagemmantm-se rme na denio da mdia pblica: ela seria aquelafeita para o pblico, devendo, para isso, constituir uma indepen-dncia, protegendo-se tanto das inuncias do mercado quanto docontrole do Estado. A subordinao a qualquer um desses plos

    tiraria a dimenso universal de reexo do pblico em favor dosinteresses particulares seja de um ou mais capitais, seja de um ououtro partido. A inuncia dos primeiros impediria qualquer no-o de diversidade e de reexo ao infectar o meio pblico com algica homogeneizante e supercial da comunicao comercial. Jo controle dos segundos destruiria a independncia editorial ne-cessria transmisso de contedos equilibrados que visem apre-

    sentar aos cidados aspectos relevantes de uma questo para umatomada de posio autnoma a seu respeito.

    Nem controlada pelo mercado ou pelo Estado, a razo de ser

    da radiodifuso pblica o servio pblico. Essa a organiza-

    o da radiodifuso pblica; ela fala a todos como cidados.

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    Radiodifusores pblicos encorajam o acesso e a participao

    na vida pblica. Eles desenvolvem o conhecimento, ampliamhorizontes e permitem s pessoas entender melhor elas pr-

    prias por meio de um melhor entendimento do mundo e dos

    outros. Radiodifuso pblica definida como um local de en-

    contro onde todos os cidados so bem-vindos e consideradosiguais (Unesco, 2000, p. 4).

    A declarao do workshopde sistemas pblicos de comunicaorealizado pela Unesco no World Forum on Eletronic Media, emGenebra, em 2003, coloca essa distncia como condio para queos meios pblicos consigam produzir contedos imparciais e crti-cos. Ao afastar-se da dependncia dos dois plos, os meios pblicosgarantiriam a expresso do universal por intermdio do debate deidias entre as diversas opinies existentes sobre cada tema. Essa

    viso tem forte referencial no conceito de esfera pblica cunhadopor Habermas (1961 e 2003). Segundo o autor, ela seria a reuniode privados em um pblico que, a partir do uso da razo, discutemtemas de interesse comum, formando uma opinio sobre estes. Ascondies para a esfera pblica seriam a publicidade, como a divul-gao pblica das informaes necessrias ao debate dos temas naesfera, e o debate racional, como o meio de garantir que a opiniopblica resultante da discusso fosse a expresso no do conito deinteresses particulares, mas da sntese de argumentos com vistas naconstituio de uma posio identicada com o interesse geral.

    Diversos autores (Dahlgreen, 1995; Garnham, 1990) trabalhamtodo o sistema de mdia como uma esfera pblica moderna, masvem nas mdias pblicas a expresso por excelncia de seus prin-cpios. Gomes (1998) prefere tomar o conceito de Habermas emduas esferas: a da visibilidade pblica e a do debate pblico. En-quanto o conjunto dos meios de comunicao atenderia apenas aprimeira funo a de tornar visvel um conjunto de aconteci-mentos , apenas a mdia pblica teria a prerrogativa, exatamentepela sua distncia do mercado e do Estado, de constituir-se emespao privilegiado de debate pblico.

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    37Segundo Leal Filho (1997, p. 79), esse o modelo consagrado

    dos sistemas pblicos de comunicao da Europa.

    Criaram-se conselhos gerais autnomos, formados por repre-sentantes da sociedade, que detm a ltima palavra na admi-nistrao de emissoras onde a participao financeira do Esta-do pequena ou simplesmente inexiste como o caso daBBC de Londres.

    Para que tal misso seja concretizada, o binmio controle--nanciamento condio para garantir a independncia desejada.

    No lado poltico-administrativo, os colegiados de gesto, osdiversos conselhos citados por Leal Filho, devem ser organizadosde modo que assegurem a participao de diversos setores, cujasdecises devem sempre ser um resultado de negociaes, compo-sies e mediaes entre as foras da sociedade. Os governos po-dem integrar tais rgos, mas sempre em condio minoritria.Do lado do financiamento, deve-se buscar um sistema de fontesde receita que no condene a emissora pblica busca de publi-cidade no mercado, o que a remeteria ao perfil comercial, mastambm impea que governantes de planto possam interferir naconduo dos veculos pela prerrogativa de aprovao de seusoramentos.

    5. A CULTURALISTA

    Baseados na realidade latino-americana, os estudiosos vincula-dos corrente dos estudos culturais na regio (Martn-Barbero,Garca-Canclini, Orozco, Rey Beltrn, Fuenzalida) elaboraramuma denio prpria de mdia pblica apresentando um progra-ma para todo o continente. Eles estruturam tal concepo em cimade duas anlises basilares.

    A primeira diz respeito crise dos Estados nacionais e da noode pblico associada a este ente na sociedade contempornea. Coma integrao dos mercados em escala internacional no ltimo

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    quarto do sculo, fenmeno que se tornou conhecido por globa-lizao, os Estados estariam perdendo o espao que ocuparam du-rante o sculo XX para outros ncleos de sociabilidade no maisbaseados no territrio e na idia de nao, mas em comunidadesde interesse criadas a partir da multiplicao de vnculos relacio-nais e de vetores de constituio de identidades. Estas j no esta-riam presas posio nas relaes de produo, ou classes, mas nognero, na cor, na etnia, na orientao sexual, na idade, nas regiesou em interesses.

    Para Beltrn (2002, p. 89),

    a noo de carter pblico tambm est mudando. Sua assimi-lao ao carter estatal est sendo questionada, para que sejaaberta a gerao de espaos onde circulem e sejam debatidasquestes de interesse comum, e onde sejam expressas as dife-

    renas e os interesses dos diversos setores.

    Paralelamente, nesse mesmo perodo os meios de comunicaoteriam ganhado posio proeminente na circulao de discursos nasociedade, constituindo-se como locus privilegiado de produodos sentidos e de construo das identidades. Na viso dos autores,com as novas tecnologias houve uma disseminao dos recursos de

    produo cultural que gradualmente est instrumentalizando osdiversos grupos locais e de interesse a fazer parte do ambiente decirculao de mensagens, pressionando-o pela visibilidade da diver-sidade emergente nas recentes transformaes polticas, culturaise sociais no mundo.

    Com base nesse balano, os autores propem uma denio deTV pblica marcada por dois aspectos centrais: a natureza autnomae o compromisso cidado com a diversidade cultural. O primeirovai ao encontro da necessidade de superar a estreita vinculaogovernamental do passado, retirando a televiso do domnio e daorientao hegemnica do Estado, levando-a para uma autonomiasocial e poltica (Beltrn, p. 100). Os culturalistas aproximam-sedos defensores da mdia pblica como sistema independente do

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    39mercado e do Estado ao direcionar sua crtica a este ltimo. Masdiferem destes por apresentar como trao distintivo de seu projetoterico-conceitual e prtico para a mdia pblica sua noo cultural.

    Martn-Barbero utiliza esse predicado cultural, equiparandouma televiso pblica de cultura a uma televiso pblica dequalidade, que se caracterizaria por:

    1.manter uma produo cultural prpria, perpassando todas as

    faixas da programao;2. construir uma relao particular e especial com a acelerada e

    fragmentada vida urbana;

    3.desempenhar um papel alfabetizador da sociedade em relao snovas linguagens e aos meios tcnicos das sociedade conver-gente; e

    4. ter uma concepo multidimensional da competitividade en-volvendo prossionalismo, inovao e relevncia social de suaproduo.

    O seu compromisso programtico a diferiria dos modelosprivados e estatais por interpelar os cidados, convidando-os participao e ao reconhecimento social de suas diversas facetas

    multiculturais.

    cultural a televiso que no se limita transmisso de cultu-

    ra produzida por outros meios, mas a que trabalha na criao

    cultural a partir de suas prprias potencialidades expressi-

    vas. O que envolve no se limitar a ter uma faixa da progra-

    mao com contedo cultural, mas sim ter a cultura como

    projeto que atravessa qualquer um dos contedos e dos gneros

    (Martn-Barbero, pp. 71-72).

    Por mais que se aproxime da concepo abordada anteriormen-te, o central no projeto dos culturalistas latino-americanos suadefesa do programa baseado na diversidade cultural e que trabalhe

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    a cultural nacional por essa perspectiva multifacetada. Essa nfasena cultura a afasta tambm da concepo educativa, a qual criti-cada pelos autores por ser a expresso do uso pelos Estados autori-trios durante os regimes ditatoriais no continente.

    6. A DEFINIO DE MDIA PBLICA COMO APARELHO DE ESTADO

    Enquanto na abordagem culturalista o que dene os sistemas p-blicos de comunicao seu programa cultural e sua interpelao dasaudincias enquanto cidados, a viso ancorada na tradio marxistabaseia sua conceituao nos traos constitutivos da instituio Esta-do no capitalismo e de sua funo na dinmica conitante que per-meia o desenvolvimento desse sistema social: a luta de classes1.

    Nesse processo, o Estado teria a funo de assegurar a domi-nao de uma classe sobre outra, como o uso do monoplio dafora para coibir qualquer tipo de resistncia ou crtica ao siste-ma. Para Gramsci (1978), para alm da coero, a outra formacentral de dominao a direo cultural, que se d por meio daconstruo de consensos pelos aparelhos de hegemonia, como es-colas, partidos, igreja e os meios de comunicao. A funo dessesaparelhos seria reproduzir uma ideologia particular, das forasdominantes, em uma viso de mundo universal de toda a socieda-

    de. Justicam-se, assim, os interesses daquela classe, naturalizan-do seu modo de direo perante o conjunto da populao e desa-creditando as iniciativas de contestao, seja pela alegao dainviabilidade de transformao da ordem vigente, seja pela des-construo de suas propostas. Tal reproduo, claro, no ocorresem conito, sendo o reexo, no plano da conscincia, da disputaentre as foras da sociedade.

    1. Para Marx, o capitalismo estrutura-se sobre a explorao de uma pequena classe quedetm os meios de produo de riqueza, a burguesia, sobre a grande maioria de pessoasque depende de sua fora de trabalho para viver, os trabalhadores. Outra caracterstica dessesistema seria a mercantilizao incessante e crescente de toda sorte de produtos do trabalhohumano, sejam eles materiais ou imateriais.

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    41Poulantzas (1978) enriquece essa perspectiva ao denir o Estado

    como a condensao material de uma relao de foras entre clas-ses e fraes de classe (p. 147). O autor alerta que nesse conceitoo Estado no apenas uma relao de foras, mas possui materia-lidade prpria na forma de uma ossatura institucional expressaem suas diversas instituies e aparelhos. Com base nestas, o Esta-do organiza a classe dominante como sntese das disputas entresuas fraes e destas com as classes dominadas. Dessa maneira, o

    Estado no visto no apenas como agente, no apenas como arena,mas como um locus de disputa cujos aparelhos assumem auto-nomia relativa, podendo expressar graus variados de sntese dasdisputas entre as foras sociais.

    Bolao (2000) localiza no Estado um dos sustentculos da inds-tria cultural, que seria

    um elemento de mediao entre o capital, o Estado e as ou-tras instituies das ordens econmica e poltica, de um lado,e as massas de eleitores e consumidores, de outro.

    As classes dominantes, segundo o autor, organizaram um apa-rato que cumpre trs funes fundamentais perante a populao:garante a coeso social em um quadro de desigualdade (propagan-

    da), d suporte valorizao dos capitais em concorrncia no sis-tema econmico (publicidade) e atende s demandas informativasdo pblico para permitir o xito dos dois propsitos anteriores(programa).

    Os meios de comunicao pblicos seriam ento aparelhos estataisque existem para garantir os interesses gerais do Estado, visto acomo capitalista coletivo ideal, na indstria cultural, cumprindo pri-mordialmente a funo de propaganda na construo de consen-sos a partir da tenso dialtica entre as posies hegemnicas nombito do aparelho e as demandas do pblico a quem se dirige.Alm dessa dimenso ideolgica, a mdia pblica tambm seria umagente na concorrncia da indstria cultural, dependendo de recur-sos para que tenha xito na disputa pela ateno do pblico.

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    Assim, essa abordagem difere-se no s das concepes elitistae educativa por seu corte crtico e anticapitalista, mas tambmdaquela que v a mdia pblica como independente do Estado edo mercado. Para a viso marxista, as instituies pblicas noexistem fora do Estado, mas, ao contrrio, so seus aparelhos.No existiria, portanto, uma mdia pblica e outra, estatal, mas,sim, uma mdia mais democraticamente controlada no aparelhodo Estado, pblica, e outra controlada diretamente por um poderda Repblica, ou governamental. Como arma Portales (2002,pp. 128-129):

    O estatuto jurdico da televiso pblica o ponto de partidapara entender a sua misso. Se a gerao, o controle e a re-moo das autoridades dependem diretamente do chefe dogoverno, a conduta do meio dever seguir a orientao do go-

    verno de turno; estamos falando, portanto, de uma televisogovernamental Caso contrrio, se no processo de gerao,controle e remoo das autoridades da empresa intervieremrgos plurais e representativos do Estado, ser possvel darautonomia empresa em relao ao poder e aos interessesimediatos do governo.

    7. O CASO BRASILEIROPor m, propomo-nos a situar o caso brasileiro dentro deste

    quadro apresentado. O Brasil teve como marco do nascimento desua radiodifuso a Rdio Sociedade do Rio de Janeiro, de inspira-o elitista, mas certamente mais preocupada com a veiculao decontedos culturais do que seus pares contemporneos comerciais.Com a legislao do governo Vargas, optou-se pelo modelo institu-cional estadunidense, dando prioridade aos operadores privados.Houve ainda um parntese muito particular com a estatizao daRdio Nacional, mas que de longe passou por preocupaes sejacom a representao da diversidade brasileira, seja com a indepen-dncia de governantes de planto.

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    43A retomada da experincia de mdia pblica no pas se deu na

    dcada de 1960 e exatamente a que comea a formao do com-plexo quadro legal e conceitual dessa modalidade em nosso pas.Como resultado da preocupao dos militares com a necessidadede constituir um sistema de educao da massa pela televiso nopas, o Decreto-Lei 236, de 1967, instituiu a gura da televisoeducativa como tipo de radiodifuso de sons e imagens voltada divulgao de programas educacionais, palestras, aulas, confern-

    cias e debates. A norma estabeleceu ainda o carter no-comercialdesse tipo de comunicao, proibindo qualquer tipo direto ou in-direto de publicidade ou patrocnio.

    Desde ento houve a criao de um sistema de emissoras edu-cativas comandada pelo governo federal (por meio da criao daFundao Centro Brasileiro de TV Educativa e, posteriormente,pelo nascimento da TVE) e pelos governos estaduais, bem como

    pelas universidades federais. A quase totalidade dos Estados crioua sua emissora, que passou a combinar contedos educativos (nosentido apresentado anteriormente), alguma programao cultu-ral e jornalismo geralmente subordinado aos gabinetes de gover-nadores. A nica emissora que, pelo menos em discurso, alegavater um projeto de independncia era a TV Cultura, de So Paulo,mantida pela Fundao Padre Anchieta e controlada por um con-

    selho nos moldes europeus.O segundo grande marco da consolidao do nosso confusoquadro institucional da comunicao pblica foi a aprovao daConstituio Federal de 1988. Em seu artigo 223, a Carta Magnaestabelece que a concesso de outorgas deveria observar a comple-mentaridade dos sistemas pblicos, estatal e privado. Criou-se aa idia de um sistema pblico, diferenciado tanto do privadoquanto do estatal. Pesquisadores e militantes que participaram daconstituinte atribuem tal redao que diferencia pblico de esta-tal resistncia a este ltimo por causa da ento recente experin-cia com a ditadura militar no pas. Aprovada a Constituio, omodelo institucional das comunicaes brasileiras passou a ter oque poderamos chamar de duas camadas de regulao: uma,

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    presente na Carta Magna, que estrutura o modelo em sistemas; eoutra, no plano da regulamentao dos servios de radiodifuso,que distingue as modalidades de comunicao pelas suas outorgas(comercial, educativa e comunitria).

    Enquanto o conceito de sistema pblico permaneceu como le-tra morta na mais importante norma do pas, a designao pblicaconsolidou seu signicado associado independncia tanto demercados quanto de governos, sendo buscado pelas emissoras edu-cativas como um ttulo para aquelas que conseguissem alcanaressa condio. Em diferentes ocasies, emissoras como a TVE doRio Grande do Sul ou a Rede Minas passaram a denominar-sepblicas ou alegar estar em processo de publicizao por busca-rem uma estrutura de gesto mais participativa.

    O terceiro grande marco da estruturao do quadro institu-cional da comunicao pblica no pas deu-se com a criao da

    Empresa Brasil de Comunicao (EBC), articulada com o claropropsito de diferenciar-se do que at ento havia sido constru-do pelo governo federal em termos de comunicao prpria paraoperar uma efetiva mdia pblica. A lei que criou a empresa,Lei n.11.652/2008, a primeira a fazer meno ao artigo 223 e

    institui os princpios e objetivos dos servios de radiodifuso

    pblica explorados pelo Poder Executivo ou outorgados aentidades de sua administrao indireta e autoriza o PoderExecutivo a constituir a Empresa Brasil de Comunicao EBC (Brasil, 2008).

    Com a aprovao dessa lei, cria-se a gura do servio de radio-difuso pblica, mas apenas como aquele prestado pelo PoderExecutivo no mbito federal, incluindo as entidades de sua admi-nistrao indireta. Entre esses princpios esto aqueles referentes programao j previstos na Constituio Federal (preferncia analidades educativas, artsticas, culturais e informativas, promooda cultura regional e estmulo produo independente), a autono-mia em relao ao governo federal e a participao da sociedade

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    45civil no controle da aplicao dos princpios do sistema pblico deradiodifuso, respeitando-se a pluralidade da sociedade brasileira.Seus dirigentes, ao situarem-na dentro do sistema de mdia brasi-leiro, diferenciam-na das emissoras educativas, as quais seriamestatais (com exceo da TV Cultura). Poder-se-ia dizer, relacio-nando s concepes apresentadas anteriormente, que a viso portrs do modelo da EBC aproxima-se daquela que compreende amdia pblica como um espao democrtico necessrio entre o

    mercado e o Estado.O captulo destinado ao caso brasileiro descreve com mais detalhes

    o sistema pblico de comunicao do pas dentro das categoriaselencadas pela metodologia da pesquisa realizada. Esta breve di-gresso histrica serviu apenas para evidenciar o complexo quadroinstitucional no qual ainda est organizada a mdia pblica de nos-so pas. Considerando a criao da EBC como primeira referncia

    muito parcial complementaridade dos sistemas pblico, privadoe estatal, conrma-se a estrutura regulatria em duas camadas jabordadas anteriormente.

    8. AS CONCEPES ADOTADAS NESTE TRABALHO

    Conforme mencionado na apresentao da metodologia dapesquisa, este estudo combina algumas concepes elencadas nestecaptulo. Do ponto de vista da delimitao do sistema pblico decomunicao, aproximamo-nos das vises da mdia como aparelhode Estado ao no diferenciar as corporaes pblicas dos veculosde poderes das repblicas. Em um caso especco, o dos EstadosUnidos, a designao prpria do pas a respeito do que era a PBS,que inclui de meios governamentais a de ONGs, nos aproximouda concepo de alternativa ao comercial.

    Se na delimitao no houve distino entre pblico e estatal,certamente enquanto coletivo nos aproximamos da viso que pregaa mdia pblica como um espao entre esses dois plos ao reservar-mos centralidade independncia de mercados e governantes de

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    planto por meio de um controle democrtico e participativo cal-cado na promoo de diferenciados e complementares mecanismosde participao. Conforme mencionado no incio deste captulo,as concepes no podem ser vistas como referenciais fechados,mas podem ser adotadas de maneira geralmente combinada para aanlise dos variados modelos existentes no mundo.

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    Resumo

    O servio pblico de radiodifuso da Repblica da Alemanha operado por

    um conjunto de emissoras estaduais e regionais, a Arbetitsgemeinschaft

    der offentlich-recht-lichen-Rundfunkanstalten der Bundes-republik Deutsch-

    land (ARD), e por um canal nacional, o Zweites Deutsches Fernsehen (ZDF).

    Os grupos so independentes, sendo o primeiro ligado aos governos esta-

    duais e o segundo, ao governo federal. No entanto, ambos desenvolvemuma srie de atividades conjuntas, mantendo at mesmo faixas de progra-

    mao e emissoras em parceria. O ZDF, ao contrrio da ARD, no funciona

    de maneira federada e no possui afiliadas. Situada em Mainz, a emissora

    transmite para toda a Alemanha, a exemplo da BBC no Reino Unido. J a

    ARD possui um canal nacional (Dars Erste) e sete servios regionais opera-

    dos por oito organismos pblicos de radiodifuso distribudos entre os lan-

    ders(Estados). O ZDF e o Dars Erste disputam acirradamente a liderana de

    audincia no pas. O financiamento baseado na cobrana de uma taxa

    aos cidados e na venda de anncios publicitrios com restries. A pro-

    gramao marcada por revistas eletrnicas, muita informao e conte-

    dos de forte carter regional.

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    SISTEMA PBLICO DE COMUNICAODA ALEMANHA

    Jonas Valente

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    I. HISTRICO DO S