Site Terra_05_06_13
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Site Terra, 05 de Junho de 2013
Mesmo com data para acabar, lixões subsistem no Brasil.
Mais da metade dos municípios brasileiros não impõe a destinação adequada ao lixo. Assim,
cerca de 75 mil toneladas de resíduos sólidos urbanos (RSU) são encaminhadas para lixões ou
aterros controlados todo dia. “Isso se deve a uma cultura extremamente arraigada de ‘jogar o
lixo nas costas das cidades’, ou seja, de não ter gastos com a destinação dos resíduos
urbanos”, salienta Elisabeth Grimberg, socióloga que coordena a área de Resíduos Sólidos do
Instituto Pólis e o Fórum Lixo e Cidadania da Cidade de São Paulo.
O Nordeste possui 57% dos lixões, sendo que o Estado da Bahia apresenta o maior número de
municípios (360), seguido pelo Piauí (218). Já a região Sudeste concentra 60% dos aterros
controlados.
Para Carlos Silva Filho, diretor executivo da Associação Brasileira das Empresas de Limpeza
Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), a grande quantidade de lixões e aterros controlados se
deve à permissividade que se teve até hoje com as unidades de disposição inadequada. “A
sociedade agora tem tentado se mobilizar e cumprir o seu papel, e precisa exigir dos
administradores públicos sistemas adequados para destinação dos resíduos”, acredita Silva
Filho.
Foto: Mauro Pimentel/Terra
Impacto
A conscientização é necessária, já que lixões têm grande impacto ambiental. Como não
possuem preparação anterior do solo, o chorume, líquido originado pela decomposição dos
resíduos, não é tratado e pode acarretar sérias consequências ao meio ambiente.
Os aterros controlados, por mais que sejam cobertos com camadas sucessivas de terra,
também não possuem procedimentos de impermeabilização do solo, ou seja, também causam
problemas ambientais.
Para Silva Filho, do ponto de vista ambiental, tanto os lixões quanto os aterros controlados
causam os mesmos impactos negativos. “Ambos não contemplam as medidas mínimas de
proteção ambiental, tais como impermeabilização do solo, captação dos gases, drenagem e
tratamento dos líquidos. Como consequência, causam a poluição do solo, muitas vezes
permeando para o lençol freático e poluindo também as águas subterrâneas e superficiais”,
esclarece.
Segundo Antônio Tadeu Ribeiro de Oliveira, gerente de Estudos e Pesquisas Sociais do IBGE, os
lixões precisam entrar na mira dos gestores. “Por tudo que acarretam em relação aos impactos
ambientais e de saúde, os lixões se colocam como um dos principais problemas a serem
enfrentados na questão do saneamento ambiental. O caminho é a conscientização dos
gestores locais e o forte investimento na construção de aterros sanitários, que é a forma
adequada de destinação dos resíduos sólidos”, enfatiza.
Evolução
Se está longe do ideal, a situação, infelizmente, já foi bem pior. De acordo com o estudo da
Abrelpe, 58,1% do total de lixo coletado segue para aterros sanitários. Em termos
quantitativos, conforme o PNRS, de 2000 a 2008 houve um aumento de 120% na quantidade
de resíduos e rejeitos dispostos em aterros sanitários.
O percentual de municípios que encaminhavam seus resíduos aos lixões caiu de 72,3% para
50,8% entre 2000 e 2008, segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB) do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esse estudo aponta um crescimento de
17,3% para 27,7% no número de cidades que dão o destino adequado aos resíduos.
Segundo Silva Filho, é viável erradicar os lixões até 2014. “É plenamente possível atender ao
que dispõe a Lei. Para tanto, os responsáveis precisam elaborar seus planos de gestão de
resíduos e encaminhar as ações adequadas”, afirma. Ou seja, assumir a responsabilidade.
Foto: Mauro Pimentel/Terra
Foto: Mauro Pimentel/Terra
Coleta seletiva segue um desafio para o Brasil
Além do fim dos lixões, a Política Nacional de Resíduos Sólidos também obriga os municípios a
se adequarem ao sistema de coleta seletiva. Caso contrário, deixarão de receber repasses de
verbas do governo federal.
O desafio é grande. Segundo o estudo da Abrelpe, dos 5.565 municípios brasileiros, 3.263
(58,6%) afirmaram ter “iniciativas” de coleta seletiva. Já o Perfil dos Municípios Brasileiros
(Munic) 2011, do IBGE, apontou que 1.796 municípios (32%) possuem programa, projeto ou
ação de coleta seletiva de lixo em atividade. Isso quer dizer que, de cada três cidades
brasileiras, apenas uma conta com a coleta seletiva.
“Incentivar a coleta seletiva passa pela educação e conscientização de toda a sociedade”, diz
Oliveira. “Além de possibilitar a reutilização de uma série de materiais, diminuindo a demanda
de matéria-prima, também reduz a agressão ao meio ambiente, pois são menos resíduos
destinados aos vazadouros. Isto sem contar as vantagens econômicas advindas da coleta
seletiva”, justifica.
Foto: Mauro Pimentel/Terra
Sem nenhuma coleta
A taxa de cobertura da coleta atinge praticamente 90% do total de domicílios. Na área urbana,
esse índice supera 98%. Mesmo assim, dos 61,9 milhões de toneladas de lixo produzidos em
2011, 6,4 milhões de toneladas, que encheriam 45 estádios do Maracanã, sequer foram
coletadas. Cerca de 10% do que é gerado acaba em terrenos baldios, córregos, lagos e praças.
“Por se tratar de um país continental, temos dificuldades de alcançar a totalidade do território,
mas observa-se pela linha histórica que a universalização da coleta vem caminhando e não
está muito longe de ser alcançada”, aponta o diretor executivo da Abrelpe.
Foto: Mauro Pimentel/Terra
Brasil pode reciclar muito mais
O Brasil é um dos campeões da reciclagem. Mas de apenas alguns itens entre os resíduos
sólidos. Alumínio, papel, plástico e vidro são os setores industriais que possuem participação
considerável nas atividades de reciclagem no País.
Segundo o Panorama dos Resíduos Sólidos, o Brasil reciclou 46% do papel e 47% do vidro
produzido em 2009. Já em 2011, reciclou 22% do plástico e 35,2% do alumínio. Contando
apenas as latinhas de alumínio, o País bateu o recorde no ano passado: 98,3% recicladas.
De acordo com Silva Filho, no entanto, o Brasil ainda está longe de ser um dos líderes em
reciclagem e reaproveitamento de resíduos. “O que temos são índices avançados para alguns
poucos materiais que possuem alto valor agregado, como a lata de alumínio. Para a grande
fração do lixo domiciliar, não há nenhum tipo de separação e, consequentemente, não há
reciclagem. É preciso sensibilizar a população para essa causa”.
No que se refere à matéria orgânica, o Programa Nacional de Resíduos Sólidos aponta que, por
ela não ser coletada separadamente, acaba sendo encaminhada para disposição final junto
com os resíduos domiciliares. Das 94,3 mil toneladas de lixo orgânico recolhidas diariamente
no País, somente 1.509 toneladas (1,6%) são encaminhadas para tratamento via
compostagem.
Foto: Bruno Santos/Terra
Caminhos
Silva Filho defende que as cidades brasileiras adotem o sistema de coleta de resíduos
com separação das frações seca e úmida, para viabilizar avanços na recuperação e
destinação dos resíduos. “A matéria orgânica pode ser utilizada para geração de gás ou
fertilizante. E muito do que é entendido como resto pode ser aproveitado para
geração de energia, através de processos reconhecidos e licenciados, que servem de
opção para alguns centros urbanos”, pontua.
Elisabeth reforça que 90% do total de resíduos gerados são passíveis de
reaproveitamento, seja por processo de biodigestão e/ou compostagem, seja pela
reciclagem da fração seca – metais, papel/papelão, vidros e plásticos. “Na Califórnia,
em São Francisco, por exemplo, o município recupera 80% de tudo que a população
produz e lá se utiliza sistema de biodigestão (Biogas) e a reciclagem como modalidades
de tratamento. Além de dar uma destinação adequada para os resíduos, a biodigestão
recupera o gás metano para geração de energia e produz um composto saudável que
pode ser usado nas áreas verdes das cidades”, relata.
Para a especialista em resíduos sólidos, a dificuldade dos municípios brasileiros em
avançar nesse sentido está na indefinição de como o setor empresarial vai participar e
se responsabilizar efetivamente pela fração seca e no desconhecimento de processos
de tratamento de resíduos úmidos (orgânicos), tais como a biodigestão e a
compostagem. “A população deve separar seus resíduos em três tipos de materiais –
úmidos limpos, secos limpos e rejeito (fraldas descartáveis, porcelana, espelhos, panos
velhos, couros, bituca de cigarro etc) – e a coleta deve ser feita de forma diferenciada,
em que cada tipo de resíduos seguirá para tratamentos diferentes”, orienta.
Foto: Bruno Santos/Terra
Geração de energia
Segundo o Atlas Brasileiro de Emissões de GEE (gases do efeito estufa) e Potencial
Energético na Destinação de Resíduos Sólidos, recente estudo divulgado pela Abrelpe,
o Brasil pode gerar 282 megawatts de energia a partir do biogás. No momento, o
aproveitamento de biogás para produção de energia no País é incipiente. “Ainda
estamos bastante distantes do ideal de recuperação e aproveitamento de biogás.
O lixo brasileiro tem um potencial considerável para ser explorado, que pode chegar a
uma geração em torno de 300 megawatts no ano de 2039, que seria suficiente para
abastecer uma cidade de cerca de 2 milhões de habitantes”, prevê Silva Filho.
Foto: Volker Thies/Wikimedia
Equação do lixo está longe de ser resolvida
Todo ano, 1,3 bilhão de toneladas de resíduos urbanos são geradas no mundo. Mas a
estimativa do departamento de desenvolvimento urbano do Banco Mundial pode
assustar ainda mais: até 2025, a produção anual chegaria a 2,2 bilhões de toneladas. E
o custo do problema quase duplicaria, de US$ 205 bilhões para US$ 375 bilhões por
ano.
No Brasil, conforme dados do Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2011, da
Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe),
representante no Brasil da Associação Internacional de Resíduos Sólidos (ISWA, da
sigla em inglês), a quantidade de resíduos sólidos gerados por dia é de 195.090
toneladas, 1,213 quilo por habitante, totalizando 61,9 milhões de toneladas de lixo
produzidos em 2011.
Foto: Mauro Pimentel/Terra
Aumento do lixo
Elisabeth lembra como era menor a produção de lixo anteriormente à industrialização
intensa das últimas décadas. Antes, tinha-se basicamente resíduos orgânicos, sobras
de alimentos que costumavam ser aproveitados como alimentação de animais
domésticos, além de jornais e vidros, que já eram coletados informalmente para a
cadeia do reaproveitamento.
“As poucas embalagens que se usavam nas compras a granel eram de papel, que
também se degradava com facilidade”, aponta Elisabeth. “Não havia essa quantidade
insustentável de embalagens plásticas”.
Carlos Silva Filho, diretor executivo da Abrelpe, explica que, entre 2008 e 2011, houve
um crescimento médio de 16% na geração de resíduos sólidos. “O crescimento
populacional, somado ao aumento da urbanização e ao aumento do poder aquisitivo
das pessoas, trazem impactos direto na geração de resíduos e ainda não conseguimos
desfazer essa equação”, alega.
Para reverter essa tendência, Silva Filho argumenta que é preciso trabalhar o aspecto
cultural dos cidadãos, além de alterar o processo produtivo, adaptando-o para
sistemas mais amigáveis ao meio ambiente. “É um processo que leva tempo, mas que
precisa ser iniciado o quanto antes”, ressalta.
Foto: Bruno Santos/Terra
Fonte:
http://noticias.terra.com.br/ciencia/infograficos/fim-dos-lixoes/