Soberania Alimentar e Fome Zero

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Soberania Alimentar e Fome Zero Caren Freitas de Lima Fome Zero: Uma história Brasileira, vol II. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, dez. 2010, livro organizado pela Adriana Veiga Aranha, assessora especial do Ministério do desenvolvimento social e combate à fome, possui o trabalho de Crispim Moreira, engenheiro agrícola de formação, mestre e doutor em geografia pela UFMG. Crispim Moreira foi diretor da Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sesan) por cerca de cinco anos. Em 2008, assumiu a função de secretário Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional no MDS (Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome). Nessa resenha crítica abordaremos a obra de Crispim Moreira sobre soberania alimentar, que trás a luz a política pública do Fome Zero desde 2003 a 2010. Crispim em seu texto expõe conceitos produzidos por organizações sociais, salientando as diferenças entre o conceito da Via Campesina e OMC, que apresenta diferentes saídas. O texto está organizado em quatro seções, a primeira que trata da opção estratégica do Fome Zero de combater a fome e promover a soberania e segurança alimentar, a segunda que evidencia a operacionalização do conceito de soberania alimentar no território brasileiro, a terceira que trata do processo de territorialização do Conceito de Soberania Alimentar, e o quarto que visa analisar ações do governo do presidente Lula no sentido da solidariedade e cooperação sul-sul. Na primeira parte, o autor apresenta as diferentes concepções do conceito de soberania alimentar. Salienta a diferença entre o conceito da Via Campesina em 1996, no marco da Cúpula Mundial sobre alimentação em Roma, onde soberania alimentar e segurança alimentar não estão desconexos e a diferente concepção da ONU (OMC) em 1990, que abre caminho para a liberalização dos produtos alimentícios, estando totalmente compatível com as multinacionais e transnacionais, sem preocupação alguma com a qualidade envolvida na produção, bem como o próprio sistema em si que gera mais contradições e mais

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Resenha sobre o programa do governo petista sobre a fome na perspectiva do autor.

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Soberania Alimentar e Fome Zero

Caren Freitas de Lima

Fome Zero: Uma história Brasileira, vol II. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, dez. 2010, livro organizado pela Adriana Veiga Aranha, assessora especial do Ministério do desenvolvimento social e combate à fome, possui o trabalho de Crispim Moreira, engenheiro agrícola de formação, mestre e doutor em geografia pela UFMG. Crispim Moreira foi diretor da Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sesan) por cerca de cinco anos. Em 2008, assumiu a função de secretário Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional no MDS (Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome).

Nessa resenha crítica abordaremos a obra de Crispim Moreira sobre soberania alimentar, que trás a luz a política pública do Fome Zero desde 2003 a 2010. Crispim em seu texto expõe conceitos produzidos por organizações sociais, salientando as diferenças entre o conceito da Via Campesina e OMC, que apresenta diferentes saídas.

O texto está organizado em quatro seções, a primeira que trata da opção estratégica do Fome Zero de combater a fome e promover a soberania e segurança alimentar, a segunda que evidencia a operacionalização do conceito de soberania alimentar no território brasileiro, a terceira que trata do processo de territorialização do Conceito de Soberania Alimentar, e o quarto que visa analisar ações do governo do presidente Lula no sentido da solidariedade e cooperação sul-sul.

Na primeira parte, o autor apresenta as diferentes concepções do conceito de soberania alimentar. Salienta a diferença entre o conceito da Via Campesina em 1996, no marco da Cúpula Mundial sobre alimentação em Roma, onde soberania alimentar e segurança alimentar não estão desconexos e a diferente concepção da ONU (OMC) em 1990, que abre caminho para a liberalização dos produtos alimentícios, estando totalmente compatível com as multinacionais e transnacionais, sem preocupação alguma com a qualidade envolvida na produção, bem como o próprio sistema em si que gera mais contradições e mais fome. Ele parte desse marco teórico para embasar a política macro do Fome Zero, que atua em diversas frentes, a fim de erradicar a fome no Brasil.

Pois, como poderia no mundo 700 bilhões de pessoas que vivem da terra, e no Brasil 2 milhões, estarem em situação de insegurança alimentar? O autor apresenta a globalização capitalista como produtora da fome nas cidades e campo, como ele mesmo demonstra através do PNAD, que em 2004 revelou a cifra de 11,2% dos domicílios brasileiros que sofrem de insegurança alimentar grave. Cifra que demonstra a fragilidade da soberania alimentar e a necessidade do Fome Zero no Brasil. Interessante notar que apesar de criticar a globalização capitalista como produtora da fome, não é criticado em nenhum ponto do texto o sistema de produção agropecuário no Brasil, o monocultivo e latifúndio.

O autor distingue o conceito de soberania alimentar e nutricional para explicitar a luta política do campesinato brasileiro na afirmação do seu modo de vida e reprodução, a fim de evitar homogeneização de padrões alimentares, bem como reafirmar a soberania pregada pela Via campesina, a fim de distingui-la de distorções como já ocorrido em diversos fóruns, debates sobre a temática, apesar do autor não adentrar muito nas propostas concretas enquanto saída que são diferentes, tanto pela Via Campesina, como pelo OMC.

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Na segunda parte, é tratado a Soberania Alimentar, conceito em marcha na Realidade brasileira, onde são apresentadas políticas do governo e sua representação socioespacial. Como o programa PNAE onde agricultores da agricultura familiar organizados em associações, sindicatos ou cooperativas, atores protagonistas do SAN são apresentados em relação ao fornecimento de alimentos de qualidade e frescos, entretanto, o autor oculta do texto a própria problemática dentro dos assentamentos, ocupações e da agricultura familiar em si relacionado à produção de alimentos de qualidade, já que devido a autonomia de cada um, e ao sistema em que vivemos, estarem sob julgo de uma produção, muitas vezes com demasiados agrotóxicos, além técnicas que não produzem necessariamente produtos saudáveis.

Também é bastante abordado as transferências de renda que impactam diretamente na segurança alimenta das famílias de baixa renda. Interessante destacar nesse parágrafo, pois é uma política diferente da “reforma agrária, de caráter emergencial, não garantindo a soberania dos povos (luta importante para a Via Campesina), entretanto, cabe destacar a importância desta para ter acesso aos alimentos. Ressalto que a reforma agrária no modo clássico nunca aconteceu no Brasil, e aconteceria apenas se a correlação política interna for modificada, o que não acontece até pelo próprio governo do PT ajudar a correlação interna. Importante salientar a necessidade de uma reforma agrária com todo um aparato de sustentação, não somente com a distribuição fundiária.

Na terceira parte é apresentado o conceito de território, territorialização e territorialidade. Conceitos para serem absorvidos e usados a favor de uma luta, onde território é o espaço geográfico adicionado de poder, exemplo assentamentos da reforma agrária, já o conceito territorialização é o processo em marcha, o movimento de escapar do poder do outro e ao mesmo tempo adicionar poder ao espaço, por exemplo, trabalhadores sem terra ao ocupar latifúndio e implementar seu modo de vida e o conceito de territorialidade, que é a identidade própria do sujeito político que vive no espaço, ela é carregada no movimento da sua territorialização no espaço usado.

Na quarta parte são apresentados de forma sintética os programas que afetam a agricultura familiar e camponesa: Bolsa Família, PAA, PNAE, PRONAF, Reforma Agrária dentre outros programas não governamentais como o programa de cisternas. Também a Solidariedade e Cooperação Sul-Sul: Sinais de dados, caminhos iniciados, onde é apresentado o MRE que por meio do CGFOME, busca a promoção da soberania alimentar e atua em três linhas principais: negociações internacionais, cooperação sul-sul na área de segurança alimentar e nutricional e de desenvolvimento agrícola e assistência humanitária internacional.

Por fim, no cenário internacional é demonstrada a mesma contraditoriedade política que no plano interno, por exemplo, a eliminação dos subsídios agrícolas, como a Índia que subsidia alimentação básica para uma nação que passou por várias epidemias de fome, ou seja, o Brasil defende uma eliminação de subsídios que perpetua uma não soberania alimentar frente a diferença de produtividade dos países centrais frente ao periférico, ao mesmo tempo que não adentra na própria questão da produtividade, como fertilizantes, agrotóxicos, dentre outros, que causam tão mal a saúde . Isso sem falar na política de biocombustíveis quando esses mesmo são monocultivo e que em grande parte das vezes empregam mão de obra análoga a escrava.