Sobre Agentes Espaciais, Escala e Espaço - Roberto Correa

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7/21/2019 Sobre Agentes Espaciais, Escala e Espaço - Roberto Correa http://slidepdf.com/reader/full/sobre-agentes-espaciais-escala-e-espaco-roberto-correa 1/6 SOBRE A GENTES SOCWS ESCALA E PRODUÇÃO DO ESPAÇO: UM TEXTO PARADISCUSSÃO R o be r to L obato Corrêa Universi dade Federal d oR io de Janeiro Este c apítul ov i sa es tabel ecer a lgumas relações entre agentes soci ais, esca l ae pr o du çã o d o es paço . Subj acen tes estão d uas teses . A prim e i ra c on s ider a a pr odução do espaço como d ecorrente d a ação d e age nt es so ciais concretos , com p apéis o rigidament ed efinidos, portadores d ei nt eresses, c ontradições e pr át icas e spaciais que ora são própri os d e ca da um , ora são co muns. A seg unda diz re speito à escala como dimensão e spacial na qual a ação human a, se j aq ual for, efe tivam ente s e realiza. O texto, de caráter exploratóri o eco m vista sa o debate, divide-se em du as partes. Na primeir a , di scute-se brevemen te ose nti do ea importânc ia da esca la, teti ca q ue necessita de apr ofundamento . N a seg und a, e st a belecem-s e a lg um as c on e xões e ntre agentes soci ais ,s uas práti cas - que i ncluem u ma esca larida de - , e a produç ão do es paço. Aofin al, sugerem-se du as v i as d e i nvest igação para a temática da produçã o does paço. Escala: alguns pontos O con ceit od e esca laenvol ve q u atro acepções :e scal ae nqua nto t amanh o ( ec on o - mias de escala); escal a ca rt ográfica ( 1 :2.000 , ou g rand e esca la em mapa geográfico); es cala e spacial, ou á r ea de a b rangência de u mp r ocesso o u fen ô meno (l ocal, regional, nacional, global) ; e esca l a co nceitual, ou asre lações entre um objeto de pe squi sa, os questionamen tos e teorias pe rtin entes e sua re presen tação c artográfic a. So br e es te polêmico tem a consu lte- se, entre outros , Castro (1995) , Cor rêa (2003) ,S heppard e McMaster (2004) e Paas i( 2004). Aqui, cons ider aremos ases cal as e spacial econce itual. A esca la espacial constit ui traço f undamen tal da ação humana, rel acionada a práticas que se realizam em âmb it os espaciais m ais li mitados ou mais ampl o s, m as nã o

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SOBRE AGENTES

SO C W S ESC A LA

E PR O D U Ç Ã O D O ESPA Ç O : U M

T E X T O P A R A D I SC U S S ÃO

Robe rto Lo b at o C o rr êa

Universidade Federal do Rio de Janeiro

Este capítulo visa estabelecer algumas relações entre agentes sociais, escala e

produção do espaço. Subjacentes estão duas teses. A primeira considera a produção

do espaço como decorrente da ação de agentes sociais concretos, com papéis não

rigidamente definidos, portadores de interesses, contradições e práticas espaciais que

ora são próprios de cada um, ora são comuns. A segunda diz respeito

à

escala como

dimensão espacial na qual a ação humana, seja qual for, efetivamente se realiza.

O texto, de caráter exploratório e com vistas ao debate, divide-se em duas partes.

Na primeira, discute-se brevemente o sentido e a importância da escala, temática que

necessita de aprofundamento. Na segunda, est abelecem-se algumas conexões entre

agentes sociais, suas práticas - que incluem uma escalaridade -, e a produção do espaço.

Ao final, sugerem-se duas viasde investigação para a temática da produção do espaço.

Escala: alguns pontos

O conceito de escalaenvolve quatro acepções: escala enquanto tamanho (econo-

mias de escala); escala cartográfica (1:2.000, ou grande escala em mapa geográfico);

escala espacial, ou área de abrangência de um processo ou fenômeno (local, regional,

nacional, global); e escala conceitual, ou as r elações entre um objeto de pesquisa, os

questionamentos e teorias pertinentes e sua representação cartográfica. Sobre este

polêmico tema consulte-se, entre outros, Castro (1995), Corrêa (2003), Sheppard e

McMaster (2004) e Paasi (2004). Aqui, consideraremos asescalas espacial e conceitual.

A escala espacial constitui traço fundamental da ação humana, relacionada a

práticas que se realizam em âmbitos espaciais mais limitados ou mais amplos, mas não

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/\ P R ) 11 U ç . À O D O E S P /\   O U IU  \N )

dissociados entre si .Envolvem distâncias e superfícies variáveis. Âmbitos ou escalas

espaciais, parafraseando Berque (I 998), são marcas e matrizes da ação do homem

inseridas em sua complexa espacialidade, que envolve distintos propósitos, meios e

sentidos. Pode-se falar em escalaridade, parte integrante da espacialidade humana,

a qual, por outro lado, é dotada de uma temporalidade, no bojo da qual sedefinem

e se redefinem as escalasespaciais da ação humana. A globalização é, nesse sentido,

entendida como o estágio superior da escalar idade humana, criada por poderosas

corporações multifuncionais e multi localizadas, cujas ações levaram à compressão

espaço-temporal em níveis impensáveis há 50 anos.

O conceito de escala espacial emerge da consciência da dimensão variável, no

espaço, da ação humana, e é útil para compor a inteligibilidade dessa ação. Essainte-

ligibilidade, contudo, está calcada na compreensão das seguintes assertivas, conforme

apontam, entre outros, Castro (1995), Corrêa (2003) eMcMaster e Sheppard (2004):

a) Os fenômenos, relações sociais e práticas espaciais mudam ao se alterar a

escalaespacial da ação humana, assim como sealtera sua representação carro-

gráfica. Uma implicação desta assertiva reside na necessidade de se construir

conceitos que possibi li tem a incorporação da escala em sua construção.

Seriam conceitos escalarmente definidos. A noção de falácia ecológica dos

sociólogos urbanos americanos das décadas de 1950 e 1960 reporta-se à

transposição de resultados obtidos em uma escala para outra.

b) A base teórica que permite explicar ou compreender fenômenos, relações e

práticas é alterada quando se muda a escala espacial. Isso implica a necessi-

dade de teorias com distintos níveis de abrangência espacial. Exemplifica-se

com asformulações deTodaro, deum lado, eGaudemar, deoutro, na expli-

cação das migrações em escala nacional ou internacional. Ambas as teorias

tornam-se pouco úteis quando seconsideram asmudanças de domicílio no

espaço intraurbano (mobilidade residencial intraurbana).

c) Não háuma escalaque

a p r io r i

sejamelhor que outra. Sua escolha, para efeito

de pesquisa, vincula-se aos propósitos do pesquisador, que constrói o seu

objeto de investigação. Nessa construção, emerge a escalaespacial apropriada,

que ressaltará alguns pontos do real, minimizando ou eclipsando outros. O

objeto construído é, em termos geográficos, escalarmente delineado.

A escala espacial, além de ser elemento fundamental para o geógrafo, constitui

parte integrante das práticas espaciais dos agentes sociais da produção do espaço. A

consciência de sua importância parece ser maior,

à

medida que se amplia a escala

dimensional do agente social. Almeida (1982), ao estudar ospromotores imobiliários

na cidade do Rio de Janeiro, reporta-se à variável escala de operações - quantos

imóveis uma dada empresa imobiliária incorporavà simultaneamente - e à escala

espacial de atuação  - em quantos bairros uma dada empresa atuava simultaneamente.

A relação entre ambas é direta e positiva.

 

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SOB R E /\ G E N T E S S O C 1/\ I S. E S C / \ L /\ E I RO D U ç.À O DOE S P /\ ç 0,

As mulrifuncionais e multilocalizadas corpo rações globais, que emergiram do

processo de concentração-centralização do capital, sobretudo após a Segunda Guerra

Mundial, atuam decisivamente na (relprodução e t ransformação do espaço, fazen-

do isso em diversas escalas espaciais (local, regional, nacional, global). Mais ainda,

articulam essas escalas, dando coerência ao seu espaço de atuação (act i vi t y s pace ) .

Veja-se, entre outros, Corrêa (1997).

Asduas escalas conceituais consideradas aqui são aquelas relativas à rede urbana

e ao espaço intraurbano. Reportam-se a fenômenos e processos, assim como a repre-

sentações cartográficas diferentes, massão interdependentes, pois asaçõesque ocorrem

em uma escala afetam a outra (CoRRÊA,2003). Mais recentemente, na reunião do

Simpósio Nacional de Geografia Urbana (Simpurb) em Florianópolis, em2007, Cor-

rêa

introduz a escala intermediária da megalópole e dos eixos urbanizados, na qual a

rede urbana metamorfoseia-se em espaço intraurbano, e este assume nitidamente

a forma de segmento da rede urbana.

Apontemos, finalmente, que a despeito da importância dos conceitos de escala

espacial e escalaconceitual para a Geografia, osgeógrafos negligenciaram essa

temática,

considerando-a como naturalmente dada e não problemática. A coletânea organi-

zada por Sheppard e McMaster (2004) revela essanegligência (com suas exceções) e

aponta a relevância dos conceitos para a compreensão das práticas espaciais visando

à produção do espaço e sua lei tura. Consulte-se, adicionalmente, Marston (2000),

Brenner (2000), Brenner (2001), Marston e Srnirh (2001), que debatem a temática

da escala, evidenciando sua força e a necessidade de estudos empíricos e reflexões

teóricas. Sehá muitas questões sem respostas, issose transforma em convite para pes-

quisa. Creio ser o casodas relações entre agentes sociais, escalae produção do espaço.

Agentes da produção do espaço

A produção do espaço, sejao da redeurbana, sejao intraurbano, não é o resultado

da mão invisível do mercado , nem de um Estado hegeliano, visto como entidade

supraorgânica, ou de um capital abstrato que emerge de fora das relações sociais. É

consequência da ação de agentes sociais concretos, históricos, dotados de interesses,

estratégias e práticas espaciais próprias, portadores de contradições e geradores de

conflitos entre elesmesmos e com outros segmentos da sociedade.

As Ciências Sociais em geral, e a Geografia em específico, descobriram e tenta-

ram sistematizar os agentes sociais da produção do espaço e suas práticas espaciais,

a exemplo de Form (1971 [1954)), Capel (1972) e Bahiana (1978), este último,

entre os geógrafos brasileiros, sumariando a contribuição de inúmeros autores que

abordaram essa temática.

Os agentes sociais da produção do espaço estão inseridos na temporalidade

e espacialidade de cada formação socioespacial capitalista. Refletem, assim, neces-

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A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO

sidades e possibilidades sociais, criadas por processos e mecanismos que muitos

deles criaram. E são os agentes que materializam os processos sociais na forma de

um ambiente construido, seja a rede urbana, seja o espaço intraurbano. Afirma-se

que processos sociais e agentes sociais são inseparáveis, elementos fundamentais da

sociedade e de seu movimento.

Quem são os agentes sociais da produção do espaço? São ainda válidas as

tipologias elaboradas por Capel (1972), Bahiana (1978) e, mais tardiamente, por

Corrêa (1989). Este questionamento se justifica dada a aparente dissolução de

tipos que eram bem definidos em termos de suas ações (estratégicas e práticas).

Quest iona-se se surgiram novos agentes sociais, com novas estratégias e práticas.

Questionam-se ainda as escalas de ação dos agentes sociais e as configurações es-

paciais (rejcriadas por eles.

Vejamos alguns pontos sobre essese outros questionamentos.

Os tipos ideais

O primeiro ponto diz respeito aos tipos ideais de agentes sociais da produção do

espaço. Considera-se como tipologia, ao menos como ponto de partida, a proposição

de Corrêa (1989) , na qual osagentes sociais são quase sempre os mesmos de outras

proposições. São eles os proprietários dos meios de produção, os proprietários fun-

diários, os promotores imobiliários, o Estado e os grupos sociais excluídos. A partir

de sua ação, o espaço é produzido, impregnado de materialidades, como campos

cultivados, estradas, represas e centros urbanos com ruas, bairros, áreas comerciais e

fabris, mas também pleno de significados diversos, como aqueles associados a estética,

status,

ernicidade e sacralidade.   exceção do Estado, essesagentessãoencontrados em

sua forma pura ou quase pura. A li teratura aponta para os proprietários de terras na

periferia rural-urbana que esterilizam suas áreas agricultáveis à espera de valorização

para fins de loteamento. Assinala também o casode empresas industriais que contro-

lam certa gleba para fins ligados à produção, como áreas de mananciais de água ou

para futuras instalações: essas empresas são, como outras, essencialmente industriais

e sua relação com a terra é temporária. Há ainda empresas ligadas exclusivamente

à promoção imobiliária, seja como incorporadora, cons trutora ou ligada a vendas.

Essas empresas são, via de regra, pequenas e anônimas, como éo caso dos milhares de

indivíduos que fazempar te dosgrupos sociais excluídos eque produzem espaço social

em terras públicas e privadas. É o casoainda de pequenos promotores imobiliários

que, na favela, produzem e vendem prédios de dois ou três andares. Consulte-se,

entre outros, Corrêa (1989) e Ribeiro (1996).

Qual a importância, no momento atual, desses agentes sociais na produção

do espaço? Será a mesma nas diferentes áreas do espaço intraurbano e nas cidades

de dist in tos tamanhos demográficos, atividades econômicas e localização no espaço

brasileiro?

 

SOBRE AGENTES SOCIAIS. ESCALA E PRODUÇÃO DO ESPAÇO

Estratégias epráticas espacia is d istintas e um único agente

A literatura aponta que um mesmo agente social, por exemplo, uma empresa

industrial, pode criar subsidiárias e investir na produção de imóveis ou na criação

de loteamentos. A construção de bairros residenciais de expressivo

status

social e dis-

tantes do local onde a empresa industrial está instalada é prát ica bastante corrente,

resultando na produção de espaços diferenciados na cidade.

A terra urbana deixou de ser estranha ao capital industrial que, a princípio,

a considerava apenas como uma base necessár ia e insubstituível para a produção.

Segundo Mingione (1977), a terra urbana passou a interessar ao capital industrial,

constituindo, assim como a produção imobiliária, alternativa para a acumulação,

deixando de ser meramente um investimento com vista s a amortecer crises cíclicas

de acumulação. Consulte-se, entre outros, Strohacker (1995) , que discute as estraté-

gias das empresas de loteamenro em Porto Alegre, no passado, visando valorizar suas

propriedades fundiárias. Consulte-se, a respeito, Silva (1993).

Estratégias epráti cas espaciais semelhantes e diferentes agentes

Inversamente, diferentes agentes sociais, cada um centrado principalmente em

estratégias e práticas espaciais pertinentes às atividades que os caracterizam, como

por exemplo, produção industrial ou promoção imobiliária, podem, sob certas

condições, desempenhar outras estratégias e práticas espaciais diferentes daquelas

que os distinguem, mas que são semelhantes entre si. A terra urbana pode ser

objeto de interesse de promotores imobiliários, de empresas industriais, do Estado e

de outros agentes. Práticas espaciais como a esterilização da terra, fragmentação

e rernembramento, assim como loteamentos descontínuos na periferia, podem ser

comuns a diferentes agentes sociais. O espaço produzido refletirá essas estratégias

e práticas espaciais. Veja-se, entre outros, Deler (1980), Durand-Lasserve (1980) e

Cardoso (1989) , esta última abordando a produção do espaço no bairro do Grajaú,

na cidade do Rio de Janeiro.

Os múl tiplos papéis do Estado

O Estado capitalista desempenha múltiplos papéis em relação à produção do

espaço. Essa multiplicidade decorre do fatode o Estado constituir uma arena na qual

diferentes interesses e conflitos seenfrentam. Segundo Samson (1980), a atuação

do Estado insere-se no contexto econômico, político e social de cada momento da

dinâmica socioespacial da região em que se situa. Ainda de acordo com o autor, o

leque de possibilidades de ação do Estado inclui, entre outras, as seguintes:

• estabelecer o marco jurídico (leis, regras, normas, posturas) de produção

e uso do espaço;

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A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO

taxar a propriedade fundiária, as edificações, o uso da terra e as atividades

produtivas: diferenciais espaciais dessa taxação refletem e condicionam a

diferenciação socioespacial no espaço urbano;

produzir as condições de produção para outros agentes sociais, como vias

detráfego, sistemas de energia, água e esgotamento sanitário, assim corno o

próprio espaço físico da cidade, por meio de obras de drenagem, desmonte

e aterrarnento: a cidade do Rio de Janeiro fornece exemplos contundentes

dessa ação;

controlar o mercado fundiário, tornando-se, sob certas condições, proprie-

tár io de glebas que poderão ser permutadas com outros agentes sociais;

tornar-se promotor imobiliário, investindo na produção de imóveis resi-

denciais em determinados locais do espaço imraurbano para determinados

grupos sociais - esta ação tende, via de regra, a reforçar a diferenciação

interna da cidade no que diz respeito

à

segregação residencial;

tornar-se produtor industrial, interferindo assim na produção do espaço,

por meio da implantação de unidades fabris, e dos impactos , em outras

áreas, próximas ou longínquas, de suas instalações industriais: conjuntos

habitacionais, loreamentos populares e favelas são criados, em parte, em

decorrência das indústrias do Estado, cuja ação interfere na divisão econô-

mica do espaço e na divisão social do espaço da cidade.

Essa multiplicidade de papéis também se efetiva na escalada rede urbana. Tan-

to nessa escala corno na do espaço intraurbano estabelecem-se relações com outros

agentes sociais, corno empresas industriais e de consultoria, bancos, empreiteiras,

universidades e proprietários de terra. Nessas relações entram em jogo mecanismos

de negociação, cooptação e clientelismo, aos quais a corrupção não é e stranha.

Dada a complexidade da açãodo Estado, envolvendo múltiplos papéis, com pesos

distintos no tempo e espaço, torna-se necessário que novos estudos sejam realizados,

tanto nasesferasfederal e estadual como na municipal. Estas esferasou escalas espaciais

podem implicar diferentes ações que, no entanto, não devem estar desconectadas.

Novos e velhos agentes sociais

Bancos, companhias deseguros, empreiteiras, empresas ferroviárias e de bondes,

fábricas têxteis, firmas comerciais e de serviços, proprietários fundiários, grupos de

previdência privada, grupos sociais excluídos, indivíduos com investimentos e ordens

religiosas participam, alguns há muito tempo, em maior ou menor intensidade, do

processo de produção do espaço.A ação dessesagentes sociais- seja expressando t ipos

ideais puros ou desdobramento funcional de longa ou curta duração - está inserida

no processo de produção, c irculação e consumo de r iquezas nointerior de urna socie-

dade que se caracteriza por ser social e espacialmente diferenciada . A complexidade

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SOIlRE AGENTES SOCIAIS. ESCALA E

PRODUÇÃO

no ESI Açn

do processo de produção do espaço envolve, por exemplo, negociações entre agentes

sociais tão distintos quanto as ordens religiosas e as empresas do setor da promoção

imobiliária   FRIDMAN, 1994).

Ressalta-seaqui a produção de um  es paçovernacular , efet ivada por aqueles que

invadem e ocupam terras públicas e privadas, produzindo favelas, ou por aqueles

que, no sistema de mutirão, dão conteúdo aosloteamentos populares dasperiferias urba-

nas. No processo d eprodução do espaçovernacular , entram em cena novos agentesso-

ciais, corno aqueles ligados

à

criminalidade e ao setor informal de produção de imóveis.

A terra urbana e a habitação são objetos de interesse generalizado, envolvendo

agentes sociaiscom ou sem capital, formal ou informalmente organizados. Estabelece-se

urna tensão, ora mais, ora menos intensa, porém permanente, em torno da terra urbana

e da habitação. Se isso não constitui a contradição básica, transforma-se, contudo,

em problema para urna enorme parcela da população.

O estudo das estratégias e práticas espaciais vernaculares complernenta aqueles

voltados à ação de poderosos grupos capitalistas nesse vital processo de (rerprodução

do espaço, a materialidade que é simultaneamente marca ematriz da humanidade.

 g entes soci is e esc l  

Inúmeros agentes sociais operam nas duas escalasconceituais aqui consideradas.

Em outras palavras, uma rua, um bairro, uma cidade, uma rede urbana e seu conteú-

do agrário, um país ou o espaço global constituem campos de atuação de poderosas

corpo rações, como, entre outros, aponta Corrêa (1997). A atuação dessas corporações

é decisiva para a produção do espaço, contribuindo para:

produzir

 company toums ,

bairros no interior de uma cidade, ou ainda

apropriar-se, defatoou simbolicamente, de certos espaços públicos: algumas

cidades dependem de uma única empresa, que controla a maior parte dos

empregos ali existentes, a exemplo de Turim (Fiar), Eindhoven (Philips) e

Seatle (Boeing); .

dar continuidade ao processo de descentralização d~ atividades terciárias,seja

pela realocação de unidades varejistas, seja pela criação de novas unidades

fora do centro: desse modo participam do processo de perda econômica e

simbólica do centro, contribuindo, assim, para a redivisão econômica do

espaço;

alterar a funcionalidade dos centros da rede urbana, seja pela criação espa-

cialmente seletiva de especializações produtivas, seja pela redução de sua

capacidade produtiva, ou, ainda, pela convergência de atividades, criando

economias de aglomeração e crescimento urbano;

criar uma nova divisão territorial do trabalho, por intermédio da difusão

de inovações, envolvendo novos produtos (trigo, leite, soja, café, laranja

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A PRODUÇÃO J)O ESI.ACO URBANO

SOBRE .AGENTES SOCIAl ;. ESCAl.A F. I ROJ)UÇÃO DO ESPAÇO

etc.)   novos meios para a produção (rn.iquinas. depósitos, silos, usinas de

beneficiamemo c transformação erc.);

• através do Estado, impregnado de interesses seus, criar infraestrutura viá-

ria e energética que lhe é benéfica, ainda que possa servir a muitos outros

agentes sociais e indivíduos.

Que peso tem corporações como Nestlé, Souza Cruz, Bunge, Ermírio de

Moraes, Vale, Brascan, Unilever e Mirsui na (re)configuração econômica do espaço

nas duas escalas aqui consideradas? Consulte-se a respeito, entre outros, Corrêa (2006)

e Silva (2003), que discutem, respectivamente, o papel da Souza Cruz e do grupo

Maggi na produção do espaço.

Nessa perspectiva, consideram-se diversas manifestações de processos SOCIaIS

mais amplos, da formação sucial da área em estudo, por intermédio de um ou mais

agentes sociais em uma dada área. Na Geografia, isso corresponde metodologicamente

ao método regional, não à proposição hartshorniana, mas àquela que, entre outros,

foi apontada por Berry (1971), suficientemente aberta para incorporar processos e

formas diversos.

b) A segunda proposta diz respeito ao estudo da ação (estratégias e práticas) de

um agente social em sua espacialidade multiescalar, pressupondo a constru-

ção prévia, ou no decorrer da ação, de seu   activity

sp ace ,

Pensa-se e age-se

com investimentos em uma rua, um bairro, uma cidade, um território

nacional ou toda a superfície terrestre. Como variam as ações desse agente

em cada área, em cada escala?Que conflitos e negociações foram efetivados

para que determinados objetivos fossem alcançados? Que impactos sociais,

econômicos e políticos resultaram? Os impactos na (re)organização do espaço

são, nesse sentido, particularmente relevantes. Na perspectiva do agente

social em estudo, que relações existem entre as diversas escalas espaciais de

sua atuação? Veja-se, a respeito, Silva (1995).

Essa proposta se insere na tradição da pesquisa sistemática em Geografia, na

qual um tema ou agente é analisado em sua espacialidade. As descobertas e hipóte-

ses verificadas podem ser numerosas e contribuírem para a inteligibilidade da ação

humana. Por outro lado, os resultados alimentam os estudos realizados segundo a

proposição anteriormente discutida e vice-versa. Ressalta-se que, na perspectiva em

tela, não se produz, sem uma sólida teoria, um estudo de caso, mas estudos explora-

tórios ou de verificação.

Ao se comparar dois ou mais agentes sociais, introduz-se a premissa dos estudos

comparativos (que também podem ser feitos considerando-se duas ou mais áreas),

assumindo também um caráter diacrônico. Mas tudo isso pressupõe outras proble-

máticas associadas ao método comparativo, fora das intenções deste trabalho.

Temas para pesquisa

A despeito do relativamente amplo conhecimento elaborado sobre as relações

entre agentes sociais da produção do espaço, escala e conflitos (não considerados neste

texto), há lacunas, controvérsias e inconsistências em torno delas que são simulta-

neamente importantes em si e submetidas a um intenso e, por vezes, contraditório

dinamismo. O que segue são duas propostas gerais para pesquisa sobre essas re lações.

Ressalte-se que estas propostas não são excludentes e o que levará à escolha de uma ou

outra deriva da problemática que construirmos a respeito da realidade. Que proble-

mas teóricos e empíricos estão suscitando esclarecimentos? Isso significa que

a p rior i

não há proposta melhor que outra. A apresentada a seguir procura levar em conta a

tradição dapesquisa geográfica, que está alicerçada em dois ângulos não dicotômicos

de se olhar a realidade. Acredita-se que esses dois ângulos, que secomplementam,

possam estar contidos nas pesquisas sobre agentes sociais, escala e conflitos.

a) A primeira proposta está focada no estudo de uma dada área , seja ela uma

rua, um bairro, uma cidade ou o segmento de uma rede urbana. Esta dis-

tinção, no entanto, nos obriga a considerar a escala espacial adequada. A

produção dessa área resulta da ação de um ou de diversos agentes sociais,

cujas ações (estratégias e práticas) podem se superpor ou sejustapor, sendo

marcadas por complementaridade ou antagonismo. As resultantes espaciais

podem ser numerosas, expressas na configuração espacial, no conteúdo

social e nas contradições e conflitos. O devir pode serpensado, ao menos

em relação a certo lapso de tempo, garantida a permanência das práticas

espaciais e da inércia espacial. Pense-se, por exemplo, na produção de uma

 c ompany toum  ,

ou num bairro como o Grajaú, na cidade doRio de Janeiro

(CARDOSO,1989), ou na rede urbana e seu conteúdo agrário, do norte do

Paraná, ou ainda na cidade de Brasília (Plano Piloto e núcleos em torno

do Distrito Federal e em Goiás). Consulte-se, adicionalmente, Azambuja

(1991), que estudou a cidade gaúcha de Ijuí.

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