Sobre alcoolismo e Trabalho

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Marcos Liboni - Psiquiatra http://www.bonde.com.br/folha/folhad.php?id_folha=2-1--3335-20100817 17/08/2010 VÍCI O E PRECONCEITO - 'Demitir alcoólatra é o mesmo que dispensar quem tem câncer' Especialista enfatiza que o alcoolismo é uma doença e elogia projeto que veda demissão por justa causa O funcionário alcoólatra não pode ser demitido por justa causa, a não ser que se recuse a se submeter a t ratamento ou se estiver embriagado no ambiente de trabalho. É o que prevê um projeto de lei aprovado no início do mês pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado, de autoria do senador Marcello Crivela (PRB-RJ). A proposta modifica a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos da União (RJU) e o Plano de Benefícios da Previdência Social para que o alcoolismo passe a ser consi derado doença. Dessa forma, o trabalhador dependen te de bebida alcoólica passa a ter direito à proteção do Estado. O projeto está em tramitação agora na Câmara dos Deputados. Para o psiquiatra Marcos Liboni, a medida é acertada. ''Ajudar as pessoas que sofrem com o alcoolismo para que continuem amparadas pelo trabalho quando estiverem passando por uma crise é um avanço'', avalia o professor da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e diretor do Departamento de Psiquia tria da Associação Médica de Londrina (AML). Nesta entrevista, Liboni enfatiza que o alcoolismo é uma doença e critica a falta de estrutura do Estado para tratamento dos dependentes. ''O Brasil trata essa questão com irresponsabil idade'', destaca. O senhor concorda com a proibição da demissão por justa causa devido ao alcoolismo? Essa medida é um avanço. O Estado vai ajudar as pessoas que sofrem com o alcoolismo para que continuem amparadas pelo trabalho quando estiverem passando por uma crise. Demitir um alcoólatra pode ser um ônus para agravar o problema dele. O alcoólatra pode conviver bem com o vício e continuar tendo um bom desempenho profissional? Não. A pessoa que é realmente alcoólatra não lida bem com isso. Existem os bebedores sociais, que têm contato com o álcool, mas não desenvolvem um problema maior. Há os abusadores, que são os indivíduos que fazem happy hour umas três vezes por semana e ingerem álcool com essa frequência. E existem os dependentes, que são as pessoas que precisam beber para ''funcionar'' melhor. Elas preferem beber do que tr abalhar, do que ter relacion amen tos f amiliares. Manter um funcionário alcoólatra não representa risco para o bom funcionamento das empresas? Precisamos considerar que entre 10% e 12% da população adulta são depen dentes do álcool. Isso r epresenta uma boa part e das pessoas economicamente ativas no Brasil. É muito mais caro para a empresa demitir o funcionário alcoólatra, que é treinado e conhece a rotina da organização, do que Folha de Lon drina - Envie para um amigo h ttp://www.bonde.com.br/folha/folha for m .php?oper=imprima&id=3... 1 de 2 30/9/2010 17:22

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contratar outro, que vai exigir investimento e corre o risco de também ter problema com o álcool. Demitir o funcionário alcoólatra é o mesmo que dispensar que tem câncer.

Então o alcoolismo é realmente uma doença?

Sim. Tem gente que fala que não é doença e sim safadeza e que a pessoaconsegue parar de beber quando quiser. Mas isso não é verdade. Claro que émais fácil ajudar a pessoa que quer ser ajudada, mas o alcoolismo não é

safadeza.Qual o tratamento mais indicado?

O tratamento envolve um compartilhamento de responsabilidades. O alcoolismo éuma doença que traz alterações no funcionamento do organismo. Vários órgãosse tornam reféns da presença do álcool. Por isso, pelo menos na fase inical dotratamento, durante uns trinta dias, deve haver acompanhamento médico paraevitar que a pessoa sinta os efeitos da abstinência, que pode levar até à morte. Apessoa, quando começa a se tratar, precisa abandonar totalmente a bebida. Épossível substituir o efeito do álcool com medicações que podem oferecer umcerto conforto à pessoa que consegue ficar sem beber.

Quanto tempo de tratamento é necessário para que o viciado consiga viver bem

sem a ingestão de bebida alcoólica?

Depende. O álcool é a pior droga que existe. É uma droga legalizada, mas é aque mais causa dano. Depois do cigarro é a que mais mata. E tem o endosso doEstado, que recebe impostos por isso. Mas o Estado gasta muito com arecuperação das pessoas viciadas e com os danos provocados pela bebidaalcoólica. Um estudo apresentado na década de 1990 mostrou que o álcool éresponsável pela arrecadação de 2,8% do Produto Interno Bruto (PIB) e que ogasto com (os danos provocados pela) bebida chega a 5,5% do PIB do País.Gasta-se muito mais do que se arrecada. O Brasil trata essa questão comirresponsabilidade.

E como essa questão deveria ser tratada pelo Estado?

A primeira coisa é elevar cada vez mais os impostos das bebidas e limitar avenda. É preciso também investir na educação. E educação começa em casa.Além disso, tem que existir o papel repressor e, principalmente, estrutura paratratar os alcoólatras. A lei proíbe a demissão do dependente e obriga que ele sejaencaminhado para tratamento. Mas onde essa pessoa será tratada? Além deexistirem poucos locais próprios para tratamento, a estrutura é muito precária. Ogoverno investe pouco e existem poucos profissionais envolvidos.

A oferta do álcool é muito grande e o apelo também. Pessoas famosas fazempropagandas de bebida, que deveriam ser limitadas. Uma figura de grande apelopopular acaba influenciando a atitude dos jovens.

Uma pessoa pode ser ex-alcoólatra, livrando-se completamente do vício?

Não. A pessoa sempre será um acoólatra em recuperação e não pode ter contatocom a substância.

Paula Costa BoniniReportagem Local

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